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0.1 Vectores contravariantes 0.2 Formas-1 ou covectores 0.3 Tensor da métrica 0.

4 O sı́mbolo de Levi-Civita

Mecânica Analı́tica
Capı́tulo 0: Introdução ao Cálculo Tensorial

H. Terças

Instituto Superior Técnico


(Departamento de Fı́sica)
0.1 Vectores contravariantes 0.2 Formas-1 ou covectores 0.3 Tensor da métrica 0.4 O sı́mbolo de Levi-Civita

0.1 Vectores contravariantes

0.2 Formas-1 ou covectores

0.3 Tensor da métrica

0.4 O sı́mbolo de Levi-Civita


0.1 Vectores contravariantes 0.2 Formas-1 ou covectores 0.3 Tensor da métrica 0.4 O sı́mbolo de Levi-Civita

Nestas notas de apoio, pretendemos introduzir as noções fundamentais


do cálculo tensorial necessárias que estarão na base das ferramentas da
Mecânica Analı́tica (e, na verdade, de toda a fı́sica clássica e moderna),
reunindo os principais conceitos e respectivas propriedades.
0.1 Vectores contravariantes 0.2 Formas-1 ou covectores 0.3 Tensor da métrica 0.4 O sı́mbolo de Levi-Civita

0.1 Vectores contravariantes


Dada uma base de um espaço vectorial, B = {~e1 , ~e2 , ..., ~en }, define-se
vector (ou ‘campo vectorial’) como
n
X
~v = vi~ei .
i=1

A mudança para uma nova base B 0 = {~e01 , ~e02 , ..., ~e0n } é feita recorrendo à
transformação linear ~v 0 = A · ~v , ou explicitamente
 0    
v1 A11 · · · A1n v1
 ..   .. .. ..   ..  .
 . = . . .  .  (1)
vn0 An1 ··· Ann vn
Usaremos a convenção de Einstein (soma sobre ı́ndices repetidos)
!
X
0
vµ = Aµν vν ≡ Aµν vν . (2)
ν
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Questão: Qual a forma da matriz A? Para a determinarmos,


necessitamos recorrer à matriz mudança de base, Λ
Λ
→ B0
B =−

~e01 P (~e01 , ~e1 ) · · · P (~e01 , ~en )


    
~e1
 ..   .. .. .. ..  ,
 . = (3)

. . .  . 
~e0n P (~e01 , ~en ) · · · P (~e0n , ~en ) ~en
onde os elementos da matrix Λ correspondem à projecção dos versores
“novos” nos “antigos”, i.e.1

Λµν = P (~e0µ , ~eν ),


(que pode não corresponder ao simples produto interno - ex. espaços
curvos). De forma compacta, e na notação de Einstein

~e0µ = Λµν ~eν .

1 Em espaços euclideanos, P (~e0µ , ~eν ) = ~e0µ · ~eν .


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Como sabemos da Álgebra Linear, a matriz A deve conter os “antigos”


elementos da base {~eν }, expressos em termos dos “novos” elementos
{~e0µ }, i.e.
 0  
P (~e1 , ~e01 ) · · · P (~e1 , ~e0n )
 
v1 v1
 ..   .. .. ..   .. 
 . = . . .  . , (4)
vn0P (~en , ~e01 ) · · · P (~en , ~e0n ) vn
T
ou seja, ~v 0 = A · ~v = Λ−1 · ~v , o que nos permite concluir
T
Aµν = Λ−1
µν .
Os vectores que se transformam de acordo com a Eq. (2) chamam-se
contravariantes e identificam-se com o ı́ndice superscrito, i.e

∂x0µ −1 T
x0µ = Aµν xν , onde Aµν =

ν
= Λµν . (5)
∂x
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• Exemplo: Transformação de escala em R2


Seja B = {~e1 , ~e2 } a base usual de R2 , na qual o contravector ~v = v µ se
escreve
v µ = (α, β).
Defina-se B 0 = {~e01 , ~e02 } = {2~e1 , 12 ~e2 }. Assim,
   
2 0 T 1/2 0
Λ= =⇒ A = Λ−1 = .
0 1/2 0 2
Usando a regra de transformação contravariante da Eq. (5), temos
α 
v 0µ = Aµν v ν = , 2β .
2
µ
Os elementos do contravector v contraem quando os elementos da
base dilatam (daı́ se chamarem componentes “contravariantes”).
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0.2 Formas-1 ou covectores


Outro objecto matemático de importância no cálculo tensorial é a
forma-1, construı́do a partir de um escalar, f (xµ ), na seguinte forma

~ = ∂f ~eµ .
∇f
∂xµ
Questão: Como é que este objecto se transforma numa mudança de
∂f
coordenadas? Definamos wµ ≡ ∂x µ . Então,

∂f ∂f ∂xν µT ∂f ν ∂f
wµ0 =
= = A−1 ν = A−1 µ ν ,
∂x0µ ∂xν ∂x0µ ∂xν ∂x
onde usámos a propriedade
−1T  0ν −1
∂x0µ ∂xν

µT ∂x
A−1 == = .
ν ∂xν ∂x µ ∂x0µ

Finalmente, com Λνµ = A−1 µ , temos

wµ0 = Λνµ wν .
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• Exemplo: (Ainda) a transformação de escala R2

Vejamos o exemplo anterior para este caso, com a mudança de base


B 0 = {~e01 , ~e02 } = {2~e1 , 12 ~e2 }.
   
2 0 T 1/2 0
Λ= =⇒ A = Λ−1 = .
0 1/2 0 2

Seja ainda ∇f~ = (∂x f, ∂y f ) = (α, β) o gradiente de f num determinado


ponto (x, y) do plano.
     
~ 0 f = ∂f , ∂f =

∂f
,
∂f
= 2
∂f 1 ∂f
, ,
∂x0 ∂y 0 ∂(x/2) ∂(2y) ∂x 2 ∂y
de onde se usou (x0 , y 0 ) = (x/2, 2y) (como consequência de
x0µ = Aµν xν ). Se escrevermos ∇f~ = wµ~eµ , temos

∴ wµ0 = Λνµ wν = (A−1 )νµ wν .


wµ é a componente de um vector covariante, ou um co-vector.
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Por forma a distinguirmos contravectores e covectores, usamos a seguinte


notação com ı́ndices subidos e descidos
 µ
v : vector contravariante (ou vector)
wµ : vector covariante (ou co-vector)
De uma forma geral, se v µ designar a componente de um vector num
determinado espaço vectorial, vµ designa a sua componente no espaço
dual
~v = v µ~eµ = vµ~ µ ,
tal que
ν
~eµ · ~ = δµν .

Índices covariantes contraem com ı́ndices covariantes



µ
 v
 = Aµν v ν
µ T ν
A−1 vν = A−1

 vµ

= vν
ν µ
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Algumas propriedades interessantes do produto


• “A norma ||w||
~ = wµ wµ é um invariante (escalar)”
α α
wµ0 w0µ = A−1 µ wα Aµβ wβ = A−1 µ Aµβ wα wβ = δβα wα wβ = wα wα X

• “O produto interno (covariante) definido como h~a, ~bi = aµ bµ é


invariante (escalar)

a0µ b0µ = Aµα aα A−1 b
µ β
= δαβ aα bβ = aα bα = aβ bβ .

• “O produto interno (usual) definido como h~a, ~bi = aµ bµ não é


invariante (pseudo-escalar)

a0µ b0 µ = Aµα aα Aµβ aβ = AT µ
Aµβ aα aβ 6= aα aα .

A última igualdade só se satisfaz caso AT = A−1 (é circunstancial).


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0.3 Tensor da métrica


Comecemos por determinar a invariância do produto interno
generalizado definido por sg = h~a, ~big = wµ wν aµ bν
α β
s0g = wµ0 wν0 a0µ a0ν = A−1 µ
wα A−1 ν
wβ Aµρ aρ Aνσ bσ .
Contraindo os ı́ndices contra- e covariantes do mesmo nome,

s0g = δρα δσβ wα wβ aρ bσ = wα wβ aα bβ = sg .


O caso de interesse é obtido para o caso de wµ = ~eµ , levando à definição
do tensor da métrica

gµν = ~eµ ⊗ ~eν = [e1 , ..., en ].[e1 , ..., en ]T .


O tensor da métrica é simétrico,

gµν = gνµ .
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• Exemplo 1 : Métrica cartesiana de R2 . Com B = {~e1 , ~e2 }, onde


~e1 = (1, 0) e ~e2 = (0, 1), temos

 
1 0
g = ~e1 ⊗ ~e1 + ~e1 ⊗ ~e2 + ~e2 ⊗ ~e1 + ~e2 ⊗ ~e2 = = I.
0 1

• Exemplo 1 : Métrica alternativa de R2 . Com B = {~e1 , ~e2 }, onde


~e1 = (1, 0) e ~e2 = (cos θ, 1), temos

 
1 cos θ
g = ~e1 ⊗ ~e1 + ~e1 ⊗ ~e2 + ~e2 ⊗ ~e1 + ~e2 ⊗ ~e2 = = I.
cos θ 1
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A métrica transforma-se como um tensor,

0
α β ∂xα ∂xβ
gµν = ~e0µ ⊗ ~e0ν = A−1 A−1 ~eα ⊗ ~eβ = gαβ
µ ν ∂x0µ ∂x0ν
De uma forma geral, um tensor de grau n satisfaz

∂xν1 ∂xν2 ∂xνn


Tµ0 1 µ2 ...µn = · · · Tν ν ...ν (6)
∂x0µ1 ∂x0µ2 ∂x0µn 1 2 n

Contudo, há quantidades com carácter tensorial (i.e. que “se parecem”
com tensores) mas não se transformam de acordo com a regra anterior.
Exemplos triviais são o sı́mbolo de Kronecker que temos utilizado, δµν ,
ou o sı́mbolo de Levi-Civita, µνα . Um exemplo menos trivial é

Mµν = µνα aα .
A transformação de Mµν não é da forma da Eq. (6),
0
α β
Mµν = 0µνα a0α = µνα Aα β
β a 6= A
−1
µ
A−1 ν
Mαβ
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• Exercı́cio: Usar a regra de transformação de tensores para determinar


a métrica em coordenadas polares.
Partimos da métrica em coordenadas cartesianas em R2 , gµν = δµν .
As coordenadas “antigas” e “novas” escrevem-se então

xµ = (x, y), x0µ = (r, θ),


satisfazendo as transformações x = r cos θ, y = r sin θ. Da Eq. (6),
temos então

0 ∂xα ∂xβ ∂xα ∂xα


gµν = 0µ 0ν
δαβ = .
∂x ∂x ∂x0µ ∂x0ν
Explicitamente,

∂x ∂x ∂y ∂y ∂x ∂x ∂y ∂y
grr = + = 1, grθ = + = 0 = gθr
∂r ∂r ∂r ∂r ∂r ∂θ ∂r ∂θ

 
∂x ∂x ∂y ∂y 1 0
gθθ = + = r2 =⇒ g=
∂θ ∂θ ∂θ ∂θ 0 r2
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Podemos, ainda, utilizar a métrica para transformar covectores em


contravectores, i.e. para “subir” e “descer” ı́ndices. Para tal,
observemos a seguinte transformação

0
gµν a0µ = (A−1 )α
µ (A
−1 β
)ν gαβ Aµρ aρ = (A−1 )βν gαβ δρα aρ = (A−1 )βν gαβ aα ,

que é a de um vector covariante se o último termo for um covector.


Assim,

aα = gαβ aβ .
A mesma propriedade se pode aplicar a tensores, desde que se conserve o
número de ı́ndices covariantes e contravariantes não contraı́dos em
ambos os membros da equação

ωµν = g να ωµα , ω µν = g να g µβ ωαβ .


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0.4 O sı́mbolo de Levi-Civita


O sı́mbolo de Levi-Civita αβµ , com µ = {1, 2, 3} é definido da
seguinte forma



 1, para uma permutação par dos ı́ndices 123



αβµ = −1, para uma permutação ı́mpar dos ı́ndices 123




0, se pelo menos dois ı́ndices forem repetidos

Algumas propriedades úteis:




 αµν αρσ = δµρ δνσ − δµσ δνρ



αβν αβµ = δνµ (δαα + δββ ) = 2δνµ




αβν αβν = 6

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O sı́mbolo de Levi-Civita é útil para o cálculo vectorial. Por exemplo, o


produto externo:2
~c = ~a × ~b,
que em componentes se escreve

cµ = µαβ aα bβ .

Para termos uma ideia explı́cita, a componente 1 (ou x) do vector c é

c1 = 1αβ aα bβ = 123 a2 b3 + 132 a3 b2 = a2 b3 − a3 b2 .


|{z} |{z}
=1 =−1

 
~ · ∇
• Exercı́cio: Mostre que ∇ ~ × ~a = 0.
h  i  
∇~ · ∇ ~ × ~a = ∂µ ∇ ~ × ~a = ∂µ µαβ ∂α aβ = µαβ ∂µ ∂α aβ .
µ

Como o termo ∂µ ∂α é simétrico, podemos trocar os ı́ndices α e β. Mas


como µαβ = −µβα , a igualdade só é satisfeita se for identicamente nula.

2 Consideremos espaços ortonormados, xµ = xµ .

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