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Espinores, Quadrivetores

e Matrizes de Dirac
Sérgio F. Novaes
Espinores, Quadrivetores e Matrizes de Dirac S. F. Novaes

1 Grupo de Lorentz e o SL(2, C)


Introduzimos os espinores complexos de duas componentes e apresentamos
sua conexão com os quadrivetores de Minkowski. Estabelecemos nossas notações
e convenções e apresentamos alguns resultados do cálculo espinorial necessários
para o desenvolvimento deste trabalho.

Os geradores de “boosts” (Ki ) e de rotações (Ji ), correspondentes a uma


transformação de Lorentz geral, respeitam as relações de comutação

[Ki , Kj ] = −iijk Jk ,
[Ji , Jj ] = iijk Jk ,
[Ji , Kj ] = iijk Kk , (1)

onde ijk é o tensor totalmente anti-simétrico em três dimensões. Podemos ver


que estes geradores não formam uma álgebra fechada. No entanto, é possı́vel
construir as combinações lineares,
1 1
Ni = (Ji + iKi ) e Mi = (Ji − iKi ) (2)
2 2
que satisfazem

[Ni , Nj ] = iijk Nk ,
[Mi , Mj ] = iijk Mk ,
[Ni , Mj ] = 0 . (3)

Desta forma, Ni e Mi geram independentemente dois grupos SU (2) que


comutam entre si. A maneira usual de caracterizar as representações irredutı́veis
do grupo de Lorentz é através dos auto-valores dos operadores de Casimir, Ni Ni
e Mi Mi , quais sejam n(n + 1) e m(m + 1). Desta forma a as representações
podem ser rotuladas pelo par (n, m), com n, m = 0, 12 , 1, 32 · · ·. Os estados em
uma dada representação são distinguidos pelos auto-valores de N3 e M3 . Uma
vez que Ji = Ni + Mi o spin de uma determinada representação é identificado
com n + m
As representações espinoriais do grupo de Lorentz ( 21 , 0) e (0, 12 ) são rea-
lizadas pelo espinores complexos de duas componentes. As transformações de

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Lorentz (Λ) nesta representação podem ser escritas como o produto de uma matriz
hermitiana (“boosts”) por uma matriz unitária (rotações). A forma explı́cita de Λ
para a representação ( 21 , 0) é dada por
" #

Λ( 1 ,0) = exp i (θ~ − i~
α) ,
2 2
enquanto para representação (0, 12 ) temos,
" #

Λ(0, 1 ) = exp i .(θ~ + i~
α) ,
2 2

onde α ~ é o parâmetro de “boost” (rotação).


~ (θ)
As matrizes complexas (2 × 2), Λ( 1 ,0) e Λ(0, 1 ) , que possuem determinante
2 2
unitário, formam o grupo linear especial, SL(2, C), que opera em um espaço
complexo bidimensional,

SL(2, C) = {Λ = (2 × 2) : Λij ∈ C, det|Λ| = 1} .

Os 6 parâmetros reais do grupo SL(2, C) são capazes de especificar uma transformação


de Lorentz geral.

2 Espinores e Quadrivetores

Os elementos do espaço em que as matrizes Λ atuam são usualmente chama-


dos de espinores de duas componentes,1
 
ξ1 
ξa =  ,
ξ2
que se transforma sob Lorentz como

ξ 0 a = Λa b ξb , (4)

enquanto o espinor dual transforma-se como (Λ−1 )T , ou seja

ξ 0a = (Λ−1 )b a ξ b . (5)
1
Adotamos a convenção para os espinores da referência [5], com o tensor métrico de
Minkowski dado por gµν = gνµ = diag(1, −1, −1, −1).

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Estas transformações mantém invariante a combinação ξ2 η1 − ξ1 η2 , o que


sugere a definição do produto escalar espinorial, invariante sob Lorentz, como

< ξη >≡ ξ a ηa = ξ 1 η1 + ξ 2 η2 = ξ2 η1 − ξ1 η2 , (6)

e a introdução do espinor métrico


 
0 1 
ab ≡  , (7)
−1 0

de tal forma que


ξ a = ab ξb e ξa = ab ξ b .
Podemos ver que  é antissimétrico, e satisfaz

ab = −ab ,
ab bd = δ a d ,
ab ba = 2 ,
ab dc + ad cb + ac bd = 0 . (8)

Como consequência destas relações, produto escalar espinorial possue as


seguintes propriedades

< ξη >= − < ηξ > ,


< ξξ >= 0 ,
< aξ, η >= a < ξη > ,
< ξ + η, ζ >=< ξζ > + < ηζ > ,
< ξη > |ζ > + < ηζ > |ξ > + < ζξ > |η >= 0 . (9)

Podemos também estabelecer uma conexão entre a inversa e a transposta de


uma matriz A através do uso de (7), qual seja, (A−1 )a b = ac Ac d db .
Tomando o complexo conjugado de (4), vemos que o espinor ξ¯ȧ ≡ ξa∗
transforma-se como Λ∗ , ou seja

ξ¯ȧ0 = (Λ∗ )ȧ ḃ ξ¯ḃ . (10)

Uma vez que a matriz Λ∗ não pode ser obtida de Λ atravéz de uma transformação
de similitude, ambas as representações do grupo de Lorentz não são, em geral,

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equivalentes. Apenas no caso particular das rotações espacial para a qual a transfor-
mação é unitária [i.e. Λ∗ = (Λ−1 )T ], os espinores ξ a e ξ¯ȧ transformam-se da
mesma maneira.
Definindo o espinor métrico “pontuado”

ȧḃ = −ȧḃ ≡ ab , (11)

de tal forma que


ξ¯ȧ = ȧḃ ξ¯ḃ e ξ¯ȧ = ȧḃ ξ¯ḃ .
Portanto, para o caso de um espinor misto, Saḃ = Aa B̄ḃ , temos S aḃ ≡ ad ḃċ Sdċ .
Podemos ver que ξ¯ȧ transforma-se sob Lorentz como (Λ−1 )† , ou seja

ξ¯0ȧ = (Λ∗ −1 )ḃ ȧ ξ¯ḃ . (12)

Definimos também o produto escalar entre dois espinores pontuados como

< ξη >† ≡= ξ¯ȧ η̄ȧ . (13)

Usualmente dizemos que os espinores ξa (ou de quiralidade esquerda) trans-


formam-se sob a representação ( 21 , 0) do grupo de Lorentz enquanto os espinores
ξ¯ȧ (ou de quiralidade direita) transformam-se sob a representação conjugada (0, 12 ).
Sob transformações de paridade, Ki → −Ki e Ji → Ji e portanto ( 21 , 0) ↔
(0, 21 ). Em particular, um espinor de Dirac transforma-se segundo a combinação
( 21 , 0) ⊕ (0, 12 ).
Estabelecemos agora uma relação entre matrizes e quadrivetores de Lorentz.
Definindo a base para as matrizes (2 × 2),

σaµḃ = (σ 0 , σ i ) ,

que inclui as matrizes de Pauli mais a identidade,


   
1 0  0 1 
σ0 =  , σ1 =  ,
0 1 1 0
   
0 −i  1 0 
σ2 =  , σ3 =  . (14)
i 0 0 −1

Definimos também as matrizes σ̄ como


˙
σ̄ µȧb = ȧd bc σcµd˙ ≡ (σ 0 , −σ i ) . (15)

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As matrizes σ e σ̄ satisfazem numericamente σaµḃ = σ̄µȧb e também as seguintes


relações
σaµċ σ̄ ν ċb + σaνċ σ̄ µċb = 2g µν δa b , (16)
σ̄ µȧc σcνḃ + σ̄ ν ȧc σcµḃ = 2g µν δ ȧ ḃ , (17)
σaµḃ σ̄ ν ḃa = 2g µν σaµḃ , (18)
˙ ˙
σaµḃ σ̄µdc = 2δa c δḃ d , (19)
˙ ȧd˙ bc
σ̄ µȧb σ̄µdc = 2  , (20)
σaµḃ σµcd˙ = 2ac ḃd˙ . (21)
Para todo quadrivetor real sµ = (s0 , si ), nós podemos construir a matriz
hermitiana S de acordo com a regra,
 
s0 + s3 s1 − is2 
Saḃ = σaµḃ sµ = 
s1 + is2 s0 − s3
 
s0 − sz −sx + isy 
=  . (22)
−sx − isy s0 + sz
A relação entre sµ e S é um para um, e a inversa é dada por,

sµ = 12 σ̄ µȧb Sbȧ . (23)

onde utilizamos a relação (18). Assim todo quadrivetor é levado na matriz hermi-
tiana S.
Podemos ver que o produto escalar de dois quadrivetores rµ e sµ , utilizando
a relação (20), fica
rµ sµ = 21 Rbȧ S̄ ȧb ≡ 21 {R, S̄} . (24)
Em particular o quadrado do quadrivetor sµ escreve-se,

sµ sµ = 21 {S, S̄} = det|S| . (25)

No caso particular em que sµ sµ = rµ rµ = 0 os espinores associados a


estes quarivetores (22) podem ser escritos como o produto de dois biespinores,
i.e. Saḃ = sa s̄ḃ e Raḃ = ra r̄ḃ . Através de (24) podemos estabeler uma importante
relação entre o produto escalar de Minkowski e o módulo ao quadrado do produto
interno espinorial (6)

r · s = 21 rb r̄ȧ s̄ȧ sb = 12 |< rs >|2 . (26)

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3 Espinores de Dirac

Uma representação particularmente útil das matrizes γ µ de Dirac para de-


screver partı́culas de massa nula é a chamada representação de Weyl,2
 
0 σaµḃ 
[γ µ ]AB =  , (27)
σ̄ µȧb 0

A matriz γ 5 nesta representação é dada por


 
h iA −δa b 0 
γ5 ≡ iγ 0 γ 1 γ 2 γ 3 =  . (28)
B 0 δ ȧ ḃ

A representação de Dirac usual (D) pode ser obtida da representação de


Weyl (W ) através da da transformação de similitude,

γW = U γD U −1 ; ψW = U ψD , (29)

com a matriz U dada por,


 
1 1 −1 
U=√  .
2 1 1

Nós escrevemos o espinor de Dirac em termos de dois espinores bidimen-


sionais ξa e η̄ ȧ como,  
ξ a
ψ A =  ȧ  . (30)
η̄
Os projetores de quiralidade direita (R) e esquerda (L) são usualmente
definidos como,
1
R = (1 + γ 5 ) ,
2
1
L = (1 − γ 5 ) , (31)
2
2
Os ı́ndices de Lorentz são denotados pelas letras gregas µ, ν, · · · variando portanto de 0, · · · , 3.
Os ı́ndices dos espinores de quatro componentes A, B, · · · variam de 1, · · · , 4, enquanto os ı́ndices
dos espinores bidimensionais a, b, · · · assumem os valores 1, 2.

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levando à identificação ,
   
ξa   ψL 
ψA =  ≡ . (32)
η̄ ȧ ψR
Definindo a métrica para os espinores de quatro componentes E, em termos
da métrica dos espinores de duas componentes como,
 
ab 0 
E AB = −EAB = , (33)
0 ȧḃ
podemos escrever o espinor ψA como,
 
ξa 
ψA = EAB ψ B =  ,
η̄ȧ
e o espinor conjugado como,
h iB  
ψ̄A ≡ ψB† γ 0 = η a ξ¯ȧ . (34)
A

Por outro lado, podemos definir a operação de conjugação de carga como ψ C =


−iγ 2 ψ ∗ = C ψ̄ T , com C dado por Eq. (33), obtendo,
 
 A ηa
ψC =  ȧ  . (35)
ξ¯

References
[1] E. M. Corson, “Introduction to Tensors, Spinors, and Relativistic Wave-
Equations” (Hafner Pub. Co., New York, 1953).

[2] W. L. Bade e H. Jehle, Rev. Mod. Phys. 25, 714 (1953).

[3] P. A. Carruthers, “Spin and Isospin in Particle Physics” (Gordon and Breach
Science Pub., 1971).

[4] Yu. V. Novozhilov, “Introduction to Elementary Particle Theory” (Pergamon


Press, 1975).

[5] J. Wess e J. Bagger, “Supersymmetry and Supergravity” (Princeton Univ.


Press, Princeton, 1983).

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