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A PRÁTICA DA DINÂMICA DE GRUPO NA MAÇONARIA

Charles Evaldo Boller

É no debate, na actividade em grupo que o ser humano, considerando os seus


valores e princípios, acumula conhecimentos em resultado da experiência da vida
em grupo. Esta experiência de vida em comum com as pessoas tem carácter de
transmitir complicados processos de pensamento em resultado da reciprocidade dos
processos da comunicação humana. Isto acontece na divisão do trabalho e na
organização social, e principalmente numa sessão maçónica, onde os homens se
reúnem para discutir temas e com certeza sempre saem de uma reunião com
pensamentos individuais melhorados. Sobressai o património cultural da
comunidade e cada indivíduo é enriquecido de forma surpreendente. Todos os
participantes beneficiam do esforço intelectual de cada membro do grupo.

Uma analogia simples é comparar as actividades do pensamento ao facto de


vivenciar que é da reunião de pequenas poupanças que surge o desenvolvimento
social. São exemplos: as instituições bancárias, as empresas de investimento,
cooperativas, sociedades anónimas, e outras. Basta estender este raciocínio para
o trabalho em grupo de um debate bem dirigido. Os debates da Maçonaria funcionam
qual cooperativa intelectual; todos ganham dividendos imediatos em resultado da
sua produção em equipa. Somam-se as experiências individuais e cada participante
passa a ser depositário do conhecimento dos demais participantes.

Quando se cria em Loja um processo sistemático de transmissão de experiência,


além de transformar os momentos de reunião em algo prazeroso ela se torna
rentável até em termos financeiros porque os dividendos do investimento
intelectual ocorrem imediatamente se a experiência acumulada em resultado do
somatório das experiências individuais for colocada em prática. É onde o Maçom
se torna homem de acção e progride no seu meio social. Desenvolver os processos
mentais não é tarefa individual, algo que se possa efectuar com sucesso longe do
convívio social: o acumulo de conhecimentos é um processo colectivo e a sua
aplicação é individual; dependendo apenas de como cada participante aceita mudar
a si próprio; é a prática do famoso “conhece-te a ti mesmo” de Sócrates.

O interessante destes procedimentos é a ascensão de uma nova era de transmissão


de experiências. Com isto desaparece a figura do professor, do ministro, do
sábio, e prevalece a força do grupo sem a ocorrência de desperdícios da
experiência acumulada. O coordenador de um grupo de debate não é professor ou
chefe. Os debates devem nivelar a loja; todos os degraus e balaustradas devem
sumir para que aconteça a igualdade do grupo. O coordenador é quem menos fala,
mas pode ser aquele que detém maior conhecimento sobre o assunto em questão.
Quem debate são os membros do grupo, o coordenador é mero participante em pé de
igualdade e tem autoridade apenas para ceder a palavra ou retornar o debate ao
tema quando eventualmente ocorre desvio. Com a participação activa de cada
membro no debate, os participantes passam a gostar cada vez mais das actividades
culturais porque é a essência do ócio criativo defendido por Domenico de Masi.

No debate desaparecem as cercas divisórias incutidas pela divisão do trabalho da


sociedade que dá aos participantes classificações como: engenheiro, médico,
balconista, arquivista, e outros. Estas designações funcionam como etiquetas que
são afixadas a cada cidadão e muitas vezes os fazem despercebidos no meio social
em que vivem, como é o caso das actividades mais humildes, mas extremamente
importantes como por exemplo: garis, faxineiros, copeiros garçons, e outros. O
debate em loja tem o objectivo de eliminar estas diferenças e propiciar a
participação de todos em pé de igualdade. Vale o poder do pensamento. E é desta
diferença cultural que o grupo de debate se vale para melhorar cada um dos seus
participantes. São eliminadas as estereotipadas diferenças burocráticas e
enaltecidos os valores de cada indivíduo.

Todos os maçons são cultos na base experimental de valores e princípios. Todo


homem é culto. Por vezes o mais humilde participante de um grupo de debate é o
que mais contribui com experiência ao tema que está em discussão. Frequentemente
é dos calados e humildes que afloram as melhores soluções ao tema que está em
discussão. Dai um dos graus do Rito Escocês Antigo e Aceito afirmar que o
conhecimento não é questão do cargo, mas resultado do espírito colaborativo que
surge num grupo de debates. Num debate ninguém dorme. Não existem as aulas
ministeriais, desaparece a figura do doutor e do professor; todos são iguais
conforme estipulado pelo dístico: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

Comparando a actividade oratória numa palestra com um vibrante debate entre


diversos irmãos: com cinco minutos de oratória as mentes dos ouvintes iniciam um
processo de divagação, em sete minutos desvio para outros pensamentos, em dez
minutos acontece bloqueio total das palavras do orador, o ouvinte pode chegar
até a dormir; resultado: pouco é aproveitado por se tratar de actividade
passiva. Num debate isto não acontece. Todos ficam ligados ao debate porque
podem ser accionados a qualquer momento a se pronunciarem sobre o assunto e só
esta expectativa mantém todos vigilantes a activos; resultado: muito do
conhecimento compartilhado é aproveitado pelos elementos do grupo.

Numa loja maçónica existe o ambiente propício para o desenvolvimento de debates


produtivos e motivadores porque as sessões estão pautadas em: Disciplina
treinada de falar um de cada vez, sem apartear o orador que está com a palavra;
O princípio da autoridade calcada na hierarquia que todos respeitam e obedecem;
não degeneração em sufocação da liberdade ou coacção; A hierarquia não impede
que os membros se considerem pessoas livres e questionem ordens – sem
questionamento desaparece a responsabilidade; Homens motivados em serem amigos
da sabedoria (“Philos” e “Sóphia”), o filosofar maçónico que faz a todos
crescerem muito além daquilo que cada um tem em si antes de adentrar ao templo;
personalização do indivíduo – são construídos homens diferentes de instrumentos
de uma linha de produção ou simples executores de ordens; Conscientização da
necessidade de participação de indivíduos menos cultos; grupo que desenvolve um
ambiente amoroso e fraterno; princípio da igualdade; obediência às leis e
regulamentos; e outras características.

As sessões com debates atraem as pessoas porque cada obreiro sai fortalecido e
renovado da reunião para as suas actividades do quotidiano. Torna-se mais astuto
na convivência com outras pessoas, fugindo às demandas improdutivas e com isto
cresce no meio social. Tal disposição mental é resultado da convivência e do
treino a que se sujeita dentro da loja em debates onde a sua capacidade
intelectual vive em constante desafio para montar o pensamento para o bem da
comunidade. E como construtor da sociedade o Maçom obtém sucesso no seu meio
social e dá honra e glória ao Grande Arquitecto do Universo.
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Bibliografia
ANTISERI, Dario; REALE, Giovanni, História da Filosofia, Antiguidade e Idade
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