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Relatório de atividades
OURO PRETO
2021
Clarice Lispector, Marguerite Duras, Nathalie Sarraute: mulheres à procura de um
novo romance
Esta mesa apresenta algumas aproximações entre a escrita de Clarice Lispector e duas
escritoras francesas que foram suas contemporâneas: Marguerite Duras e Nathalie Sarraute.
Gostaria de expor algumas coisas que me chamaram a atenção na fala da professora Germana
(UnB) sobre Nathalie Sarraute, que é uma escritora pouco conhecida no Brasil. A escrita de
Sarraute tem muitos pontos de confluência com a de Clarice, embora, como ressalta a
professora Teresa, Clarice não fosse vinculada à escola do novo romance, ou novo olhar
francês. Segundo a professora Germana, Sarraute “se investe na literatura colocando a luva
pelo avesso da criação”. Ambas são de origem judaica e estrangeira: Sarraute é Russa. E
ambas têm por tema a metalinguagem, ou a escrita sobre a escrita. As questões do silêncio,
do indizível e da distensão do tempo também estão presentes na literatura de Sarraute, assim
como na de Clarice. A obra de Sarraute também está vinculada à renovação da estética
literária na França, e se opunha à literatura “engajada”. Assim como Clarice, Sarraute
contesta o “modo de fala” tradicional do romance. Sartre escreve o prefácio de seu primeiro
romance, mas ela acaba rompendo com a tutela do escritor e procura, de forma independente,
uma nova maneira de escrever. “A questão Sarrauteana tem então a ver com a representação
de uma sensação estética que ficasse longe dos clichês da linguagem comum, estereotipada e
convencional [...]. Ela procurava evitar o desgaste das palavras que se tornaram reificadas
pelo sistema-mundo capitalista e perderam seu poder verdadeiro de representação”. Sarraute
critica Balzac e Proust por estarem apegados à uma forma de expressão burguesa e não terem
se aprofundado na construção imanente de uma nova linguagem.
Victor Burton, responsável pela edição da obra de Clarice pela editora Rocco, fala
sobre a opção de colocar as pinturas de Clarice nas capas dos livros, que surgiu a partir de
uma recusa do herdeiro de Clarice pelo projeto gráfico anterior. A partir dessas capas, as
pinturas de Clarice, que até então eram pouco conhecidas, começam a ganhar lugar de
destaque. Carolina destaca que existe um livro de Carlos Mendes de Sousa sobre as pinturas
de Clarice1 e a relação delas com sua escrita. Pedro Vasques explica de que forma ela acredita
que existe relação entre as pinturas e a escrita na obra de Clarice, a partir de Água viva.
Esta mesa traz uma tradutora e um tradutor da obra de Clarice para o francês. Ao
mencionarem as dificuldades suscitadas pela tradução, muitas questões de caráter filosófico
aparecem. Por conta da profundidade do contato que os tradutores têm com o aspecto
imanente da escrita, é inevitável o encontro com este caráter filosófico, que, em Clarice, não
se dissocia da construção da forma. Izabella conta sobre a tradução da obra infanto-juvenil A
mulher que matou os peixes. Cenas corriqueiras, com galinhas, são intercaladas por frases de
denso cunho filosófico. Esta característica da escrita de Clarice, diretamente vinculada ao
trabalho com a linguagem, em sua opinião, é o que oferece maior dificuldade para a tradução.
W. B. Lemos comenta que, por este motivo, a escritora Gertrude Stein é considerada
“praticamente intraduzível”.
O Livro das Horas: a hora das estrelas (Homenagem pelos 100 anos de nascimento da
escritora Clarice Lispector)
Nélida Piñon
A escritora Nélida Piñon conversa com Guiomar sobre estórias que surgiram através
de sua amizade pessoal com Clarice. Das estórias contadas por Nélida, todas muito
interessantes, me chamou a atenção a referência à atividade de Clarice como pintora, sobre a
qual Guiomar pergunta [a partir de 43”].
Nélida fala sobre dois quadros de Clarice que ela possui. Clarice pintou 22 quadros. A
maioria deles está na Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro. Em Uma aprendizagem ou o
livro dos prazeres, a personagem, Lori, era originalmente uma escritora, mas Nélida leu antes
da publicação e disse a Clarice: “Eu disse para ela que era muito interessante que fosse uma
escritora, mas que, evidentemente [...] você vai ser muito testada fazendo uma espécie de
romance em que a personagem é escritora”. Clarice decide então que a personagem seria uma
pintora. Nélida conta que Clarice posou para o pintor italiano Giorgio de Chirico, referência
da arte de vanguarda até os dias atuais:
Nélida complementa: “Eu não vi a Clarice falar demais desses quadros [...]. Eu não vi
a Clarice arrebatada pelo exercício da pintura. Nunca vi”. Clarice não tinha material de
pintura, não tinha um cavalete, pintava sobre madeiras. Nélida acredita que provavelmente
Clarice pintava de forma improvisada, assim como escrevia com a máquina de escrever sobre
os joelhos.
Clarice: uma vida que se conta
Guiomar pergunta para Nádia [1:08”] com relação à crítica que era dirigida à Clarice
na época, e seu desejo de estudar direito: “Ela está escrevendo em um momento em que a
maior parte da crítica literária brasileira está seduzida pelo marxismo e não compreende o
intimismo da obra dela, como uma obra que fala para a consciência, que desfia o fluxo do
inconsciente, então essa obra que parece não ser engajada, que parece, assim, recusar ver os
problemas do mundo”. Neste contexto, Clarice escreve A hora da estrela, que, segundo
Guiomar, “[...] de uma certa forma, parece uma reação diante dessa imagem da Clarice como
alguém que não quer saber dos problemas do mundo, dos problemas da sociedade. A hora da
estrela é um texto que, de uma certa maneira, consegue fazer uma amálgama entre estas
preocupações sociais e ao mesmo tempo esse mundo íntimo, esse mundo de investigação da
interioridade, que sempre marcou a obra dela”. Neste sentido, Nádia e Guiomar discorrem
sobre a complexidade da personagem Macabéa.
Clarice, hoje
Mediação: Ovídio