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1- Introdução
Com base na análise dos dados catalogados, nota-se que a riqueza pessoal em São Paulo
do Muriahé no período compreendido entre os anos de 1870 a 1888, esteve composta
basicamente pela posse de escravos, seguido das terras e café até a década anterior a abolição
da escravidão. Visto que a necessidade de crédito nos anos próximos a abolição resultou em
um aumento significativo das dívidas ativas na participação dos investimentos na região,
principalmente através de particulares possuidores de grandes fortunas que realizavam
empréstimos com juros a outros. Conforme constatamos no inventário datado de 25/03/1883
do Desembargador Antônio Augusto da Silva Canêdo 1, que havia realizado empréstimos para
58 pessoas particulares, com uma média de 4:894$617 para cada um, com um montante total
de 283:887$797.
Acreditamos que, essa necessidade pelo crédito ocorria devido aos vários movimentos
pró-abolição que aconteciam no país no período, e a um ofício encaminhado pela presidência
da província a Câmara municipal da cidade no dia 12 de novembro de 1883 pedindo a
introdução de colonos nas terras, em substituição aos braços escravos que tendiam a
desaparecer2. Levando a grande parte dos moradores da freguesia a terem a convicção de que
o processo de abolição era apenas uma questão de tempo e decidissem não realizar
investimentos com o risco de perderem capitais.
Diante desse contexto, percebemos que nesse primeiro período, o perfil socioeconômico
dos habitantes de São Paulo do Muriahé estava voltado predominantemente para o meio rural.
Com os ativos, escravos, terras, café, e dívidas ativas entre os principais, que juntos
1
Inventário do Desembargador Antônio Augusto Canêdo, disponível no Fórum Tabelião Pacheco de Medeiros,
Muriaé- MG.
2
Ata de 12/11/1883. Livro 2. Paço da Câmara Municipal de Muriaé.
representavam 86,20% dos investimentos entre os anos de 1870-1880 e 85,53% do período de
1881-1888.
A partir dessas perspectivas, podemos afirmar que o trabalho dialoga com o trabalho
efetuado por Rita Almico referente às transformações da riqueza de Juiz de Fora no mesmo
período abordado por nós, a autora observa que,
Numa sociedade cuja economia tem como principal produto o café,
que tem neste período o início de seu apogeu na cidade e em toda uma
região, ocupando cada vez maiores proporções de terras cultiváveis,
derrubando matas virgens para a lavoura cafeeira ser implementada, a forma
de trabalho predominante é o braço escravo, e a necessidade de crédito é
primordial para a reprodução das unidades produtivas, é perfeitamente
compreensível que esses ativos supracitados ocupem as primeiras posições
na composição das fortunas da época (ALMICO, 2001: 92).
Por se localizarem na Zona da Mata mineira, São Paulo do Muriahé e Juiz de Fora
possuíam dinâmicas econômicas parecidas, com sociedades que majoritariamente
concentravam seus investimentos no desenvolvimento da cultura cafeeira, fazendo da região a
principal produtora de café em Minas Gerais durante o século XIX.
Dessa forma, considerando as mudanças ocorridas no passar dos anos, como a abolição
da escravidão em 1888, que alterou a forma de trabalho existente no Brasil e a Proclamação
da República, em 1889, procuramos abaixo evidenciar algumas transformações na
composição da riqueza dos moradores no período entre 1889-1910.
Como mencionado acima, São Paulo do Muriahé era uma das principais produtoras de
café da Zona da Mata mineira na segunda metade do século XIX, e com o passar dos anos,
sua produção se intensifica, favorecida pelo escoamento, via estrada de ferro, elevando o
município a ser o principal produtor da rubiácea no início do século XX.
Nesse segundo momento, continuamos a utilizar a metodologia de dividirmos o período
em duas fases (1889-1900 e 1901 a 1910), sendo analisado um total de 112 inventários,
distribuídos da seguinte maneira; 4 de 1889, 2 de 1890, 1 de 1891, 4 de 1892, 6 de 1893, 11
de 1894, 5 de 1895, 2 de 1896, 4 de 1897, 6 de 1898, 10 de 1899,4 de 1900, 4 de 1901, 3 de
1902, 4 de 1903, 10 de 1904, 12 de 1905, 5 de 1906, 6 de 1907, 4 de 1908, 2 de 1909 e 3 de
1910. Buscamos através dessa segunda análise, perceber as transformações ocorridas nos
investimentos de capitais da população, visto que com a abolição da escravidão, um dos
principais ativos que concentrava as riquezas deixava de existir.
Nos anos entre 1889-1900, temos o café como o principal concentrador de
investimentos dentro das riquezas pessoais com (29,42%), seguido pelas terras com (24,41%)
e as casas com (23,60%). Logo em seguida, podemos observar o aumento do percentual das
benfeitorias (10,46%), e os outros ativos que aparecem com menores participações como os
animais com (3,71%), objetos (1,93%), títulos (0,75%), terrenos (0,08%), alimentos (1,62%) e
as dívidas ativas (3,98%), que obtiveram uma grande queda, levando-nos a levantar a hipótese
de ter sido impulsionada pelo surgimento das agências bancárias em cidades próximas ao
município como em Leopoldina e Juiz de Fora no ano de 1889.
5- Considerações Finais
Esperamos que a análise dos dados acima levantados tenha contribuído para um maior
entendimento das transformações dos investimentos realizados pelos moradores de São Paulo
do Muriahé, que representavam “ser o movimento dessas formas de riqueza a expressão da
transição em curso no momento” (ALMICO, 2001: 5).
Devido à delimitação do artigo não realizamos discussões aprofundadas sobre essas
modificações. Porém, com as observações feitas percebemos que o início do processo de
desenvolvimento urbano em São Paulo do Muriahé se inicia de fato após a abolição da
escravidão, quando a população, além de realizar investimentos no rural, inicia aplicações
econômicas no espaço urbano, com as construções de casas.
Desta forma, a pesquisa se justifica devido à importância do estudo regional e por
entendermos que muitas dessas incógnitas do passado, podem ajudar a revelar traços e
características do presente, contribuindo para desmistificação ou confirmação de paradigmas
tradicionais e generalizantes sobre o eixo econômico e social vigente nesses lugares.
Bibliografia