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1.PROBLEMATIZAÇÃO
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O conceito jurídico de comunidade tradicional adotado nesse trabalho é trazido no Decreto Presidencial
n0 6040 de 2007 que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais que preceitua no art. 3: Povos e Comunidades Tradicionais: grupos
culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de
organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua
reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e
práticas gerados e transmitidos pela tradição.
a fim de escolher os pratos tradicionais que fossem tradicionais aos mais velhos e de
alguma forma o consumo destes esteja se perdendo tornando necessário , na visão
das lideranças, o “resgate”, pois não se encontra facilmente no dia a dia e a maioria
das crianças desconhece.
2. METODOLOGIA
O Estado do Ceará tem 14 povos (Figura 2); dos 24 territórios indígenas com
processo de demarcação em curso, apenas a Terra Indígena Tremembé de Almofala
teve a homologação publicada, em 06 de maio de 2003. Destes, cerca de 4 etnias
possuem territórios localizados na Zona Costeira, sendo que existem comunidades que
além dos povos indígenas, enfrentam as mesmas problemáticas relacionadas ao
reconhecimento de seus territórios pelo Estado.
O Pescador da Sabiaguaba, 29 anos, Comunidade da Boca da Barra, afirmou
que “A gente passa por esse mesmo processo dos indígenas. Nossa comunidade não
é reconhecida e querem nos tirar do lugar em que vivemos, que tem até sítio
arqueológico com datação de mais de 4 mil de anos” (2019). O Governo do Estado do
Ceará, conforme o "Mapa dos Conflitos envolvendo a Injustiça Ambiental e Saúde no
Brasil" (2019) alega que a área ocupada pela comunidade de pescadores é um parque
de proteção ambiental, o Parque do Cocó, Decreto nº 11.986 de 2006. Há uma
proposta, elaborada pelo Ecos da Cidade, para manter a comunidade Sabiaguaba
como Área de Preservação Ambiental (APA), um território essencial para a
conservação dos costumes da Comunidade.
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Processo artesanal de tostar a castanha em telhas de aluminio em churrasqueira improvisada.
farofa da castanha com rapadura, quando chegava a época do caju ela
olhava pra mim e já mandava eu coletar uns cajus (...)
O Grolado é bastante reconhecido como comida que faz parte do dia a dia dos
povos indígenas do Ceará, Antunes et al. (2016) destaca esta produção como memória
povo Jenipapo - Kanindé :
Concluímos que a preparação do produto Grolado, se dar por meio do
reaproveitamento da borra , ue está entre a goma resultado do
procedimento descrito. Mais um prato típico do grupo indígena Jenipapo-
Kanindé faz-se referência à memória e à identidade cultural dos povos
indígenas e consequentemente à cultura alimentar cearense.
Pretende-se realizar uma reflexão, a partir da tradição na produção e no
consumo local, o que nos remete às nossas próprias raízes históricas.
(p.40).
O Grolado, por ser mais popular entre as crianças não foi executado, apenas
houve um debate a respeito da preparação. Contudo o grolado é uma “espécie” de
farofa feita com a goma de tapioca e coco .
Durante as entrevistas foi questionado aos entrevistados se eles reconheciam as
três preparações como comida tradicional de sua comunidade, apenas um não
reconheceu as três preparações, contudo dos demais nem todos as consideram a
comida mais tradicional ou como elemento que caracterize como identidade da
comunidade priorizando outros insumos ou preparações.
Em entrevista realizada em 12/06/19 com o índio Tapeba,aldeia lagoa dos
Tapeba, 25 anos, conta que nunca comeu tombancia, contudo nos informou que
algumas famílias de sua aldeia costumam consumir a preparação. Ao ser questionado
sobre a cambica, ele reconhece a preparação, mas não a considera uma comida
tradicional para seu povo. Para o mesmo, comida tradicional é algo mais ancestral, ele
considera que para seu povo o tradicional seria : o aluá de coco babão também
conhecido como catolé e a farinha também feita deste coco. Já o grolado e outras
preparações com a goma de tapioca são preparações que fazem parte do seu dia a
dia.
A Índia Anacé, 85 anos, Aldeia Mangabeira, lembra, em entrevista realizada em
12/06/19, que no passado costumava consumir o grolado com camarão, com piabuçú,
piaba e cará .
4. CONSIDERAÇOES FINAIS
As preparações a partir do caju, mandioca, batata doce acompanhadas de
peixes, mariscos e frutos do mar fazem parte da identidade cultural dos povos
indígenas da zona costeira cearense.
Analisando as preparações realizadas na oficina de cultura alimentar na
comunidade da Boca da Barra na Sabiaguaba que são tombancia, cambica e grolado é
notória a similaridade aos hábitos alimentares indígenas dos povos entrevistados como
Tremembé da Barra do Mundaú, Anacé da Japuara, Tapeba e Jenipapo- Kanindé .
Durante as cinco entrevistas realizadas durante o mês de junho de 2019
podemos perceber também que ainda é significativa a presença das carnes de caça
nas refeições dos entrevistados.
A respeito de cultura alimentar a fala dos entrevistados nos revela uma relação
bem mais profunda onde está em pauta a relação com a ancestralidade, os
ensinamentos que ultrapassam gerações há séculos, a relação espiritual de sagrado
com a terra onde procura-se consumir preferencialmente aquilo que está ao alcance
das mãos respeitando a sazonalidade das plantas e o defeso dos animais para que
nunca falte alimento.
5. REFERÊNCIAS
ANTUNES, Ticiana et al. Grolado: Comida de Ìndio?: Considerações sobre a relação
entre comida e cultura do povo indígena Jenipapo- Kanindé do Ceará. Gastronomia:
Da tradição a Inovação, Fortaleza, v. 1, n. 1, p.39-40, 23 set. 2016. Anais do II
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