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pequeno manual

todo mundo
faz teatro
Por Filinto Coelho & Renan Ribeiro abril 2020

O TODO MUNDO FAZ TEATRO


Bem vindx ao excitante, fantástico, inspirador e sempre surpreendente mundo do
teatro! O TODO MUNDO FAZ TEATRO é um método que promove cursos de arte
dramática e canto destinados a pessoas sem experiências anteriores e que, em
princípio, não desejam uma formação profissional. Acreditamos que somos capazes
de nos expressar através da arte, basta sermos encorajados a descobrir os nossos
próprios caminhos. Nem todo mundo pode ser um ator profissional, mas todos
podem se expressar artisticamente.
Nestes tempos difíceis, em que estamos em casa (os que podem!), muitas vezes
ficamos sem ideias para nos distrair. Esse trabalho foi feito apenas com a intenção
de ajudar você e as pessoas que estão com você (por perto ou à distância) a se
divertirem. Dá pra utilizar esse material com pessoas de todas as idades e mesmo
quem não sabe ler pode participar (é só alguém que sabe ensinar as falas).
Se quiser compartilhar com a gente o seu resultado ficaremos gratos porque
também nos divertiremos com você!
Em breve tudo isso vai passar, mas por enquanto é preciso ficar em casa, ajudar as
pessoas que mais precisam e lembrar que a arte está sempre ao nosso dispor: em
troca basta nunca esquecer o seu valor!
Divirtam-se!

Filinto Coelho & Renan Ribeiro


Professores e fundadores do Todo Mundo Faz Teatro
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O MANUAL
Vejam que legal! Manual pode ser usado como adjetivo (que se faz com as mãos,
leve, portátil, etc.) e como substantivo (um guia prático para a execução de uma
tarefa). Para nós, esses dois sentidos se complementam, pois aqui vamos ensinar a
fazer coisas com as mãos (e por consequência com o corpo todo). É claro que a
cabeça vai ajudar, mas como uma peça de teatro é sempre um trabalho artesanal, é
das mãos que emerge a obra.
Aqui você vai encontrar um texto teatral (A SOPA DE PEDRAS) e as orientações
gerais para transformá-lo numa encenação com pessoas. É importante saber que
você pode sempre fazer do seu jeito se alguma coisa que falarmos aqui não lhe
agradar. O manual é pra ser mexido e transformado sempre!

O TEXTO
A SOPA DE PEDRAS é um texto escrito por Filinto Coelho. Só que ele é baseado em
histórias orais sobre Pedro Malasartes. Pedro Malasartes é um personagem
tradicional das culturas portuguesa e brasileira. Pedro é um trickster, um tipo de
personagem que aparece em todo o mundo e que, com esperteza, acaba levando
vantagem sobre os seus algozes.
Você pode encontrar muitas aventuras de Pedro em livros e na internet. A sopa de
pedras é apenas uma delas. Em geral, Pedro anda sozinho, mas na adaptação demos
alguns irmãos a ele para que mais pessoas possam participar da peça.
O texto pode se passar em qualquer época porque, infelizmente, até hoje ainda
existem muitas pessoas com fome pelo mundo.

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FORMAS DE MONTAR (leia o texto antes de ler essa parte)

No teatro, a gente chama a peça pronta de montagem. É por isso que falamos de
usar as mãos e de artesanato. A peça gasta um tempo para ser montada: os atores
precisam aprender as falas, inventar os personagens, alguém vai criar a música, o
figurino, o cenário e tudo o mais. Isso não acontece do dia para a noite. É preciso ter
um pouco de paciência! E trabalhar duro!
Como estamos todos em casa (os que podem!), vamos ensinar duas formas de
montar essa peça. Uma com quem está por perto de você fisicamente e outra
através de gravação de vídeo por celular para você poder incluir pessoas que estão
distantes, mas que podem querer participar!

 Em casa
Aqui você junta todo mundo que está disponível e distribui os personagens.
As pessoas podem escolher quem elas querem interpretar ou alguém pode
ser o diretor (que é uma espécie de chefe de equipe) e escolher da forma que
achar que vai funcionar melhor.
Veja que no original temos 8 personagens, mas se você não tiver 8 pessoas
em casa, alguns deles podem ser cortados. Nesse caso, outro personagem
assume as falas do que vai desaparecer da estória.
Vamos dar um exemplo: você conta com cinco atores. Vamos precisar manter
Pedro (ele é o principal), dois feirantes, a beata e um dos irmãos.
Outro exemplo: três atores! Pedro e dois feirantes. Nesse caso, Pedro vai ter
que se disfarçar depois de pedir a comida para os feirantes pela primeira vez.
Quer mais um exemplo? Se você estiver sozinho, pode fazer todos os
personagens! Igual como quando a gente brinca com bonecos. Vai mudando a
voz e a postura. Vai ficar engraçado!
Lembre que, no teatro, homens podem fazer papel de mulher e mulheres
podem fazer papel de homem. É só um papel. Um faz de conta! Mas também

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isso não impede que ao invés de Pedro não possamos ter uma Maria
Malasartes! Fica por sua conta!

 On-line
Aqui você pode pedir às pessoas para gravarem as suas participações em
separado e depois editar as falas na ordem correta. É quase como fazer
cinema!
Existem alguns aplicativos gratuitos de edição:

Em casa ou online não deixe de filmar e, se quiser, publicar para que mais
pessoas vejam! Marque o Todo Mundo Faz Teatro para que possamos
compartilhar.

OS PERSONAGENS
1. Pedro é um rapaz jovem, pobre, muito inteligente e criativo. Ele deve ser ágil
como um mágico e animado como um youtuber.
2. Chica é a irmã de Pedro que tem a idade mais próxima dele. Ela é mais calma
e dá bastante suporte aos planos do irmão.
3. Bibi e Zinha são os irmãos menores de Pedro. Ainda acreditam que as pessoas
são capazes de enxergar e ajudar aos necessitados. São ingênuos.
4. Os feirantes dessa história só pensam em ganhar dinheiro. Como são tão
ávidos em levar vantagem acabam sendo enganados por Pedro. Eles são
metidos e ambiciosos.
5. A beata da nossa história é muito religiosa, mas não se preocupa em ajudar
ninguém. Acaba sendo feita de besta também. Ela pode ser muito séria e ter o
nariz empinado.

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O FIGURINO
O figurino de uma peça pode ser costurado ou comprado. Existem roupas que não
se encontram em lojas, como um vestido longo de princesa, por exemplo. Neste
caso, uma costureira será necessária. Em todos os casos, quem faz o figurino é
alguém chamado figurinista. Essa pessoa vai pesquisar a época em que se passa a
peça e criar os trajes a partir desta pesquisa. É claro que mesmo sendo feitas,
algumas coisas podem ser adaptadas. As cores são muito importantes. Existem
figurinos que trabalham de forma mais monocromática e outros explodem em cores
muito variadas. Normalmente as cores buscam simbolizar algumas coisas e podem
ser interessantes para identificar mais rapidamente um personagem. Um
personagem vestido de amarelo pode ser alguém muito solar e cheio de energia,
enquanto um vestido de cinza pode ser alguém mais reservado. Não é regra, mas
pode funcionar dependendo da relação.
Na nossa peça, Pedro e os irmãos são pobres e podem usar roupas mais velhas e
desajustadas. Os feirantes podem se vestir de forma mais arrumada e a beata de
forma muito discreta. Em casa vai ser fácil: é só abrir o guarda roupas!

O CENÁRIO
Um cenário pode ser uma tarefa divertida que envolva todo o seu grupo. A primeira
coisa é perceber onde (e quando) a ação da peça acontece. A história pode se passar
o tempo todo num só local, uma sala de estar, por exemplo, ou em vários lugares. É
importante ter em mente que, diferente da novela e do cinema, o teatro sugere
mais as coisas do que mostra. A estória pode se passar na cozinha de um castelo
imenso e isso ficar claro, não pela existência do castelo em si, mas pelas falas dos
atores e pelas situações. Quando uma personagem, uma criada, entra na cozinha e
diz “Esses banquetes para 200 pessoas me deixam exausta!” fica claro para o

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público que além daquela cozinha existe o tal banquete. Não é mais preciso
mostrar.
A nossa estória se passa numa feira livre. Se você quiser que seja um ambiente rural
pode usar bandeirolas de papel e esteiras de palha para sugerir um ambiente mais
rústico. Se escolher uma feira urbana, um painel feito de jornais colados uns aos
outros produzirá um belo efeito. Pichações num lençol velho liso ou em folhas de
papel coladas também transmitem o clima de uma cidade grande.
Não deixe que a falta de recursos limite a sua produção. Pense nisso como um
estímulo a sua imaginação. Às vezes o próprio local da apresentação já é um cenário
maravilhoso.

A MÚSICA
A música e o teatro são companheiros inseparáveis. Numa peça de teatro, a música
pode ser incidental – que é o que a gente conhece por trilha sonora – e ajudar a dar
o clima das cenas. Todo mundo que já viu cenas de suspense no cinema, na TV e no
teatro sabe do que estamos falando. Aquela música ao fundo nos envolve e
desperta muitas emoções. No teatro, a música também pode ser cantada – e aí
temos os musicais! Nos musicais, a canção é interpretada pelos personagens e pode
servir como diálogo ou como uma demonstração poética do que o personagem está
sentindo ou passando.
Na nossa peça dá pra escolher. Você pode usar uma trilha incidental e pode cantar
também. Já pensou Pedro e os irmãos indo embora enquanto cantam uma música
muito alegre? Vale a pena experimentar!

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A SOPA DE PEDRAS

Personagens:
1. Pedro Malasartes
2. Chica
3. Bibico
4. Zinha
5. Feirante 1
6. Feirante 2
7. Feirante 3
8. Beata

(FEIRA)
BIBICO – Nossa! Quanta delícia que esses feirantes tão anunciando, Pedro!
CHICA – Anunciando a venda, Bibico! Precisa de dinheiro pra comer essas delícias!
ZINHA – Mas eu tô com tanta fome! Será que eles não têm pena de nós, não?
CHICA – Onde é que já se viu gente de posses ter pena de quem não tem posses?
BIBICO – Vamos pedir um taquinho de comida pra eles!
CHICA – Cês vão tomar é um não na tampa da cara!
PEDRO (QUE ESTAVA CALADO SÓ ESCUTANDO) – Deixa eles, Chica!
(BIBICO E ZINHA COMEÇAM A PEDIR COMIDA)
BIBICO (COM CARA SOFRIDA) – Dá um taquinho dessa carne de sol pra um menino
que não tem nada não...
FEIRANTE 1 – Vai procurar o que fazer, sinhó filhote de urubu com soluço!
ZINHA (COM RAIVA) – Vá-se pra disgrama, casquinha! (PARA OUTRA VENDEDORA,
COM CARA SOFRIDA) Dá um tiquinho desse arroz pra uma menina que não tem
nada não...
FEIRANTE 2 – Sai daqui pra não espantar a freguesia, seu palito vestido!

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BIBICO (COM RAIVA) – Vá-se pra disgrama, casquinha! (PARA OUTRA VENDEDORA,
COM CARA SOFRIDA) Dá um pouquinho dessa farofa pra um menino que não tem
nada não...
FEIRANTE 3 – Essa farofa custa dinheiro, seu mendigo morto à fome!
ZINHA (COM RAIVA) – Vá-se pra disgrama, casquinha! (DE VOLTA PARA OS IRMÃOS)
Só tem casquinha, nessa cidade!
PEDRO – Deixe comigo!
CHICA – Aprendam como se faz com o nosso irmão.
PEDRO – Bons dias, minha nobre gente boa. Meu nome é Pedro Malasartes, estou
chegando de uma viagem onde aprendi a arte da cozinha maravilhosa e espantosa!
FEIRANTE 1 – E o senhor cozinha o quê?
PEDRO – Pedras!
(TODOS FICAM ESPANTADOS)
FEIRANTE 2 – Pedras?!
FEIRANTE 3 – Mas isso é impossível!
BEATA – Deve ser coisa do dêmo!
PEDRO – Vocês acham estranho porque não são viajados como eu!
FEIRANTE 1 (GANANCIOSO) – Eu quero aprender a cozinhar pedras!
FEIRANTES 2 & 3 – Nós também!
PEDRO – Eu ensino! Só preciso de uma panela...
FEIRANTE 1 (DANDO) – Tá na mão!
PEDRO – De umas pedras...
FEIRANTE 2 – Aqui! (DÁ AS PEDRAS)
PEDRO (COLOCANDO AS PEDRAS E MEXENDO COM UMA COLHER DE PAU) – Vai
ficar uma delícia! (PENSA) Ih, tá faltando manteiga...
FEIRANTE 3 – Toma aqui! (DÁ)
PEDRO – Podia ter um pouquinho de carne de sol pra temperar...
FEIRANTE 1 – Tome!
PEDRO – E arroz pra dar um gostinho...
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FEIRANTE 2 – Tome!
PEDRO – E farofa...
FEIRANTE 3 – Aqui!
PEDRO (MEXENDO TUDO) – Essas pedras tão ficando uma delícia!
BEATA – O cheiro está bom mesmo!
PEDRO (TERMINANDO) – Está pronto! Vou convidar esses meninos pobres para
provarem...
(ZINHA, BIBICO E CHICA COMEÇAM A COMER COM PEDRO)
PEDRO (TIRANDO AS PEDRAS) – Cuidado com essas sementinhas que ficaram na
comida...
BIBICO E ZINHA (TIRANDO AS PEDRAS) – Nós tamo tirando!
CHICA (TIRANDO AS PEDRAS) – Pra não estragar os dentes!
FEIRANTE 1 (GULOSO) – Eu quero provar!
FEIRANTE 2 E 3 – Nós também!
PEDRO (CALMO) – Eu prometi ensinar a receita aos senhores e foi isso que eu fiz!
Agora cada um faz a sua comida!
FEIRANTE 1 – É justo!
FEIRATE 2 – Vou correndo catar umas pedras bem bonitas!
FEIRANTE 3 – Eu que vou! Minha sopa vai ficar melhor que a de vocês!
FEIRANTE 1 – Ninguém vai fazer melhor que eu!
(OS FEIRANTES SAEM PARA CATAR PEDRAS)
PEDRO – Já acabaram de comer, meninos?
CHICA – Pança cheia!
PEDRO – Então vamos embora que eu já cumpri a minha missão!
BEATA – Homem bom! Distribuindo conhecimento de graça!
PEDRO – Pois! (VAI EMBORA COM OS IRMÃOS SE ACABANDO DE RIR)

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