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03/11/2016 A 

inaplicabilidade da pena de confissão ficta ao reclamante ausente à sessão de audiência ­ Trabalho ­ Âmbito Jurídico

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A inaplicabilidade da pena de confissão ficta ao reclamante ausente à
sessão de audiência
Daniel Melo Garcia
 
  

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03/11/2016 A inaplicabilidade da pena de confissão ficta ao reclamante ausente à sessão de audiência ­ Trabalho ­ Âmbito Jurídico

     

Resumo: os magistrados trabalhistas têm aplicado, de forma ampla e irrestrita, a pena de confissão aos
reclamantes que não comparecem a uma das audiências. Todavia, este é um assunto que merece uma
reconsideração, posto que a única punição que consta no Texto Consolidado é a possibilidade de arquivamento
do feito, em casos em que o acionante não comparece. A presente faina tem como objetivo esmiuçar a questão e
demonstrar que não se deve aplicar a pena de confissão nestes casos, sob pena de flagrante ofensa a caríssimos
valores constitucionais.

Palavras­chave: confissão ficta; revelia; punição.

Sumário: 1. Introdução 2. Do flagrante desrespeito ao princípio da legalidade 3. Fundamentos de hermenêutica
4. Fundamentos processuais 5. Analogia com processo penal 6. Sistemas e ônus da prova 7. Conclusões.
Referências.

1. INTRODUÇÃO

Sobre o tema da aplicação da pena de confissão ao reclamante, infelizmente, não é vasto o acervo doutrinário
que versa sobre a matéria. Muito pelo contrário, sendo irrisória e nula a produção literária sobre o mote. Em
determinadas situações, os aplicadores do direito são levados a não questionar e dar continuidade à aplicação de
determinados dispositivos legais sem que sejam feitos os devidos temperamentos e críticas.

É o que tem ocorrido com a errônea aplicação do artigo 844 da Consolidação das Leis do Trabalho, em
decorrência das notificações expedidas, em que membros do Poder Judiciário fazem constar, expressamente,
que a parte ausente poderá vir a sofrer a pena de confissão. Todavia, esta matéria tem sido, indevidamente,
aplicada ao reclamante, sujeito processual que provoca a máquina judiciária, sem que esta postura punitiva
tenha respaldo legal.

Para comprovar o que está aqui sendo apresentado, será feita acurada análise dos dispositivos legais atinentes à
matéria, com a devida análise da matéria sobre os prisma dos princípios justrabalhistas e fundamentos
hermenêuticos que regem o processo do trabalho, além de traçar uma analogia com demais ramos da ciência
processual (civil e penal). Por fim, deverá ser brevemente trabalhada a questão do sistema das provas no direito
pátrio e do ônus probandi daqueles que estão insertos em uma relação processual trabalhista.

2. DO FLAGRANTE DESRESPEITO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Não é por motivos fúteis que o legislador constituinte de 1988 erigiu o princípio da Legalidade como um direito
fundamental expresso. Não fosse tamanha a importância de tal preceito, não teria sido feita reiteradas alusões a
um mesmo valor. Por conhecer o passado ditatorial e contínuo desrespeito às normas legais que se fazem
presentes na conjuntura jurídico­política pátria, os escritores da Lei Fundamental tiveram o trabalho de fazer
constar em três diferentes passagens[1] a reafirmação e tutela do caríssimo respeito que se deve fazer presente
quando o tema é afeto ao respeito às normas legais positivamente postas e as amarras estatais a serem firmadas.

Todos estes dispositivos significam recados do constituinte originário à vontade sempre presente dos
administradores e aplicadores da lei de, reiteradamente, descumprirem os mandames e fundamentos
constitucionais. Por tais motivos, fora a legalidade erigida como baluarte constitucional.

Nesta toada, ainda não se pode ainda olvidar que não é possível a aplicação de uma pena sem que esteja
determinado comportamento prévia, clara e devidamente descrito em uma cominação legal anteriormente
produzida. Assim, se nem mesmo um sujeito que descumpre a lei e pratica uma conduta descrita na norma como
crime ou contravenção penal pode ser sujeitado a uma inflição de pena sem que haja previa prescrição em lei
para tanto, não se pode pensar em aplicar uma punição ao reclamante, sem que tal restrição esteja previamente
descrita em lei.

Sobre o princípio da legalidade, em sede de direitos fundamentais, é importantíssimo vincar que:

“De um lado representa o marco avançado do Estado de Direito, que procura jugular os comportamentos, quer
individuais, quer dos órgãos estatais, às normas jurídicas das quais as leis são a suprema expressão. Nesse
sentido, o princípio da Legalidade é de transcendental importância para vincar as distinções entre o Estado
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constitucional e o absolutista, este último de antes da Revolução Francesa. Aqui havia lugar para o arbítrio.
Com o primado da lei cessa o privilégio da vontade caprichosa do detentor do poder em benefício da lei, que se
presume ser a expressão da vontade coletiva.

De outro lado, o princípio da legalidade garante o particular contra os possíveis desmandos do Executivo e do
próprio Judiciário. Instaura­se, em consequência, uma mecânica entre os Poderes do Estado, da qual resulta
ser lícito apenas a um deles, qual seja o Legislativo, obrigar os particulares.”[2]

A atual aplicação da pena de confissão ao reclamante não tem base/fundamento legal, sendo uma mera extensão
interpretativa dos órgãos jurisdicionais a uma norma expressa que somente poderia ser aplicada aos reclamados.

A atividade interpretativa deve estar jungida a determinadas limites e restrições, sendo a literalidade do texto a
primeira amarra que não pode ser desconsiderada, sob pena de total desvirtuamento e ruptura com o valores que
foram insertos pelo legislador no texto escrito. Por tal motivo, far­se­á, a seguir, uma breve análise acerca do
fenômeno interpretativo e as primeiras razões para não ser possível aplicar tal pena ao sujeito que inicial o
processo do trabalho.

3. FUNDAMENTOS DE HERMENÊUTICA

Inicialmente, deve­se tomar como basilar referência à máxima de que uma norma restritiva de direito não pode
ser interpretada extensivamente. Desta forma, parte­se da ideologia primacial de que o patrimônio jurídico do
jurisdicionado deve ser protegido contra indevidas investidas interpretativas que busquem, extensivamente,
restringir situações que não foram expressamente albergadas.

Em primeiro lugar, isso configura uma reafirmação e reforço do princípio da legalidade, anteriormente
trabalhado, e, em segundo plano, forma de privilegiar a segurança jurídica, evitando­se desvios interpretativos
por maus aplicadores do direito que busquem subverter a teleologia da norma que se está a interpretar.

Não fora por questões outras que o princípio da legalidade é um direito fundamentalmente assegurado na
Constituição. para que um indivíduo possa ter a sua esfera de direitos restringida, a norma punitiva não pode vir
a ser aplicada extensivamente, estendendo­se a circunstancias e situações que não foram previamente previstos
e delimitados em lei. O que se encontra prevista nos textos codificados é uma garantia mínima que o cidadão
possui de que não terá a sua esfera de direitos invadida pelo ente estatal, sem que haja prévia, clara e expressa
lei nesse sentido.

Desta forma, não se pode pensar em usar de uma interpretação extensiva num sentido que claramente extrapole
o texto formal, para que se venha a impingir uma punição a um dos sujeitos processuais. Caso contrário, estar­
se­ia dando privilégio a uma postura desmedida, em que a legitimidade do comando normativo poderia ser
questionada, uma vez que:

“Os resultados práticos da aplicação das normas jurídicas não constituem preocupação apenas sociológica,
mas, muito pelo contrário, são elementos essenciais para determinar como, a partir destes dados empíricos,
devam ser interpretadas (ou reinterpretadas), legitimando a sua aplicação.

O Direito deixa de ser aquela ciência preocupada apenas com a realização lógica dos seus preceitos; desce do
seu pedestal para aferir se esta realização lógica esta sendo apta a realizar os seus desígnios na realidade da
vida em sociedade. Uma interpretação/aplicação da lei que não esteja sendo capaz de atingir concreta e
materialmente os seus objetivos, não pode ser considerada como a interpretação mais correta.”[3]

Nesta toada, a Norma Consolidada não alberga previsão punitiva expressa e o uso indevido da analogia ou de
uma interpretação extensiva findam por macular diretamente o thelos constitucional, o qual fez questão de
prever, em diversas passagens, o princípio da legalidade. Sobre o tema, relevantes as palavras de García de
Enterría[4]:

“La sociedad actual no las comparte ya, y, mucho más, ocurre todavía que, como un resultado de la experiencia
histórica inmediata, ha comenzado a ver en la ley algo en sí mismo neutro, que no sólo no incluye en su seno
necesariamente la justicia y la libertad, sino que con la misma naturalidad puede convertirse en la más fuerte y
formidable "amenaza para la libertad", incluso en una forma de organización de lo antijurídico", o hasta en un
instrumento para "la perversión del orden jurídico".

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Caso contrário, voltemos, pois, ao tempos anteriores às revoluções burguesas e inglesas, em que o déspota podia
decidir ao seu bel talante e alvedrio e não precisava se restringir a qualquer amarra legal.

Para evitar que isso ocorra, deve ser frustrados os abusos interpretativos que atualmente são feitos em relação ao
artigo 844 da Consolidação das Leis do Trabalho, com a consequente interpretação extensiva de que seria
possível aplicar a pena de confissão ao reclamante ausente à audiência, posto que isto esteja em
desconformidade não só com a sistemática das normas processuais como também seja violador direto e frontal
do comando protetivo insculpido na Carta Maior.

Como forma de respaldar o que está aqui sendo aventado, será feita detida análise dos dispositivos processuais
constantes no Texto Celetista em cotejo com o Código de Processo Civil.

4. FUNDAMENTOS PROCESSUAIS

Ab initio, convém aclarar que será feita uma análise conjunta dos dispositivos celetistas e do código processual
civil, mas está utilização da ritualística cível é altamente dispensável, diante da clareza do artigo 844 da CLT
que trata da matéria e da pungente desnecessidade de aplicação do CPC, por aplicação direta do artigo 769, da
CLT[5].

Mesmo que não seja necessário recorrer ao direito processual comum, uma vez que o direito processual do
trabalho não seja omisso quanto à matéria, de grande ajuda será disponibilizar alguns segmentos do CPC, uma
vez que não se pode negar que dá tratamento mais técnico e minudenciado à matéria que o texto consolidado.

Em breves linhas, concordar que seja aplicada a pena de confissão ao reclamante é o mesmo que possibilitar as
consequências da revelia recaia sobre o autor, o que, em hipótese alguma deve ser permitido, uma vez que de
hialina clareza que isto configure uma inversão/distorção aplicativa do texto processual. Assim, é fácil entender
que o artigo 844 não tem tido uma das melhores interpretações pelos juízes e aplicadores do direito em geral.

A confissão ficta não poderia ser aplicada ao acionante, sendo verdadeiro desacerto ter procedido a tal praeter
legem punição, o que desborda, e muito, de qualquer noção de legalidade e previsibilidade que deve imperar em
um processo judicial em que esteja garantida a lealdade processual, a qual é de aplicação obrigatória, também,
ao magistrado.

Não se pode olvidar que por versar a causa acerca de direitos trabalhistas, normas de ordem pública e de
evidente indisponibilidade, e por ser omissa a Consolidação das Leis do Trabalho, deve ter aplicação o quanto
disposto no art. 320 do CPC:

“Art. 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente [presunção de veracidade
dos fatos alegados pelo autor: II ­ se o litígio versar sobre direitos indisponíveis;”

Sendo todos os direitos consagrados no Texto Consolidado indisponíveis e de ordem pública, por imperiosa
necessidade demonstrada no transcorrer histórico, a presunção de veracidade por falta de impugnação não
poderia, nunca, ser aplicada ao reclamante, figura alvo de proteção e tutela pelo princípio tuitivo das normas
juslaborais.

Além disso, vale salientar que o art. 844 não traz disposição expressa acerca da aplicação de revelia ao
reclamante, tão somente se reportando à contumácia do reclamado. Desta forma, tendo em visto o quanto
presente no art. 769, deve ser aplicado o art. 320 do CPC. Assim, se não pode a revelia ser aplicada ao
acionante, por consectário lógico os seus efeitos também não podem ser reputados ocorridos.

A presunção de veracidade dos fatos alegados e a penalidade de confissão são efeitos expressos previstos no
código processual civil da ocorrência do fenômeno da revelia. Efetuar o magistrado a importação de tais efeitos
ao processo trabalhista, aplicando­o ao autor da ação, mesmo na ausência de norma procedimental, é ferir de
morte o basilar princípio da legalidade, constitucionalmente assegurado.

Ressalte­se que este princípio está erigido no rol expresso de direitos fundamentais para evitar esdrúxulas
situações de total imprevisibilidade pelo cidadão, sem o que, estar­se­ia impingindo uma restrição indevida ao
patrimônio jurídico da parte sem que esta medida restritiva estivesse prevista em lei. Como é possível que a
pena de confissão seja atribuída ao reclamante sem que se faça existente nenhum lastro legal?

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Entender de modo diverso irá abrir um perigosíssimo espaço para o ativismo judicial exacerbado, sacrificando
todo e qualquer sentimento de segurança jurídica – outro direito fundamental constitucionalmente garantido –
com uma atuação totalmente desprendida da legalidade, o que, findará por inutilizar o baluarte do devido
processo legal, em sua vertente formal, o qual deve, sempre estar presente, sob pena de se colocar em risco
todos os avanços e conquistas alcançados desde idos de 1789.

Não se pode negar que o ativismo judicial é uma conquista belíssima, permitindo ao magistrado, diante dos
casos concretos que lhe são apresentados, adequar o quanto disposto abstratamente nas normas, deixando de ser
submisso ao legalismo e ao conceitualismo, o que, sem dúvidas contribui para o ideal de justiça ser alcançado.

Contudo, existem alguns limites que são instransponíveis, há “a necessidade de uma atuação judicial mais ativa,
pautada, sobretudo, nos valores constitucionais”[6]. Nesta feita, os princípio s constitucionalmente assegurados
devem funcionar como balizas para impedir a surpresa ou inversão total do sistema jurídico, como forma de
garantir ao jurisdicionado um mínimo de previsibilidade e segurança.

O art. 844 tem uma redação clara e fácil, dividida em dois períodos separados por uma vírgula, estando bem
delimitadas as consequências de cada uma das ausências, estando distribuída tanto para o reclamante
(arquivamento) quanto o reclamado (revelia e confissão quanto à matéria de fato). É possível identificar o
quanto se está a afirmar quando se faz uso de destaque – para tanto, será feito uso do itálico para realçar a
penalidade legalmente aplicável ao reclamante ausente à audiência e negrito para a consequência da ausência do
reclamado:

“Art. 844 ­ O não­comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação, e o não­
comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão quanto à matéria de fato.”

É de hialina clareza o disposto no art. 844, sendo interpretação diversa uma ofensa à literalidade do dispositivo,
o que não deve ser, em hipótese alguma, permitido. Ademais, deve­se vincar que normas restritivas de direito
não podem, nunca, ser interpretadas extensivamente, pois tal permissivo redunda em flagrante ofensa à
tipicidade e legalidade, necessárias à escorreita aplicação de tais previsões normativas.

Ao reclamante, sujeito processual que se encontra na parte autora da ação trabalhista, somente pode vir a ser
aplicada a pena de arquivamento, o que, por não ter sido aplicado no momento oportuno, resultou em evidente
preclusão.

Além disso, caso não se entenda pela ocorrência da preclusão, ad argumentandum tantum, se o magistrado não
optou pelo arquivamento do feito, mesmo ausente o reclamante, deve­se entender que entendeu o julgador que a
presença do acionante não era imprescindível para o solver a lide. Assim, a aplicação da pena de confissão é
uma medida restritiva que apenas e tão somente pode vir a ser impingida á parte ré da relação processual
trabalhista.

Aplicar no processo do trabalho a pena de confissão ao reclamante que se ausentou a uma das audiências soa tão
absurdo quanto um juiz cível começar a decretar a revelia do autor. É mister vincar fortemente os significados e
efeitos de cada instituto para que sejam evitadas algaravias conceituais que levam à má e errônea aplicação do
direito.

Não se quer dizer com isso que a ausência do reclamante deve passar incólume. Caso o autor da ação não
compareça à audiência e a sua falta gere um lapso probatório, pode, e deve, o magistrado julgar em sentido
contrário ao quanto formulado na petição inicial, indeferindo os pedidos do demandante. Contudo, isto somente
pode acontecer por ausência de provas, e não pelo mero não comparecimento do autor à sessão.

Desta forma, por conta da injustificada falta, caso esta venha a acarretar deficiência no colhimento das provas,
aí sim, deve o magistrado indeferir os pleitos formulados na inicial, por falta de material probatório, e não
adotar uma postura em que se absolutiza a presunção relativa de que o não comparecimento do autor vai gerar
uma deficiência probatória.

Ademais, existem matérias que somente podem vir a ser provadas documentalmente e é ônus do empregador
trazer tais materiais ao processo. Nestes casos, mesmo diante da ausência do reclamante, adotar a presunção de
forma absoluta finda por gerar injustiças e descumprir flagrantemente normas protetivas da relação de trabalho.

Não é a toa que existe um código de processo com as normas bem definidas e estabelecidas. Isto decorre da
necessidade que existe de previsibilidade, intimamente relacionada com a previsão anterior e expressa em lei
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quanto a dispositivos que venham a restringir a esfera de direitos dos jurisdicionados.

Caso contrário, e tendo em vista uma interpretação sistemática do direito (englobando agora o ramo processual
penal na análise que será feita da matéria) estará sendo dado um tratamento muito mais rigoroso a um
trabalhador, sujeito hipossuficiente que teve os seus direitos violados e não adimplidos, do que o quanto
referente ao posicionamento já amplamente consagrado em sede criminal, uma vez que o réu – sujeito acusado
de ter cometido um crime, ou seja, que tenha violado os bens jurídicos mais preciosos do ordenamento jurídico.
É o que se passará a discutir a seguir.

5. ANALOGIA COM PROCESSO PENAL

No processo penal figuram o Estado (polo forte da relação) e um réu, parte hipossuficiente e que está em vias de
ter a sua liberdade ou bens atingidos pelo mais poderoso instrumento punitivo estatal. Por esta razão, lhe são
concedidas inúmeras benesses e tratamentos menos rigorosos, uma vez que o desequilíbrio fático entre os
sujeitos envolvidos na relação processual deve ser compensado por um desequilíbrio jurídico que favoreça a
isonomia.

Da mesma forma, no que diz respeito à relação entre empregado e empregador, percebe­se um claro
desequilíbrio fático que é compensado por expedientes jurídicos na tentativa de criar uma esfera de embate em
que os dois polos da relação possam estar em mesmo nível.

Assim, traçando­se uma relação entre a posição ocupada pelo réu no processo penal (parte fraca da relação) e o
reclamante na lide trabalhista (parte hipossuficiente), não há como se considerar possível que seja dada ao
acusado o direito de não comparecer às audiências. Todavia, ao trabalhador que assim atue, seja feita uma
inversão completa, penalizando­o com uma confissão ficta que poderá redundar em improcedência dos pedidos
sem que seja analisado o sistema do ônus da prova.

Será que um suposto criminoso deve ter o seu patrimônio jurídico mais tutelado e protegido do que um
individuo que labuta para o sustento próprio e da sua família? Deve­se pensar em lealdade processual e do
processo cooperativo, mas isso não pode vir a ser flagrantemente restritivo a uma das partes.

O Estado é a parte forte e o jurisdicionado a parte fraca, possibilitando o texto legal uma chance ao
hipossuficiente de não produzir provas contra si mesmo ou colaborar com a parte contrária. No processo do
trabalho, a situação é muito semelhante, pois o trabalhador é a parte inferior da relação e o patrão é a parte
hiperssuficiente, não se podendo pensar de tamanha diferença na aplicação das normas.

Se no processo penal a parte fraca da relação é devidamente protegida e tutelada, por que razão o trabalhador,
parte hipossuficiente e que se encontra na mesma situação de penúria e irregularidade não pode ser também
protegido?

Mais uma vez é assegurado uma maior proteção àquele que claramente descumpre as normas, relegando a
segundo plano quem, de fato, merece proteção. Será que isto não é consequência daqueles que se encontram
com paletó e gravata e no uso das forças políticas  e econômicas e nos centros de poder? O descumprimento da
norma é benéfico, sempre, àqueles que querem o mau uso e aplicação do direito. Quem pode o mais, pode o
menos; portanto, não é possível que um criminoso possa ter um tratamento mais benéfico e tutelar que o
cidadão de bem que  cumpre com as regras e está a buscar verbas de caráter nitidamente alimentar.

Ademais, não se poderia deixar de fazer referência ao direito ao silêncio que é possibilitado ao suposto
criminoso, acusado em um processo penal. Em sentido contrário, o patrono do reclamante não pode se
intrometer no interrogatório procedido pelo magistrado, sendo considerado, inclusive, como abuso e
desrespeito, a postura do reclamante que não queira responder às perguntas. Por que motivos um criminoso goza
de maiores prerrogativas que um trabalhador?

Com isso, percebe­se um tratamento muito mais rigoroso e detrimentoso ao trabalhador do que ao criminoso do
processo criminal, ou seja, neste país o sujeito que está sendo acusado de descumprir normas e violar bens
jurídicos preciosíssimos (bens jurídicos penalmente tutelados) encontram muito mais proteção no direito do que
os simples trabalhadores que prestam seus serviços e vendem a sua força de trabalho e, muitas vezes, tem de
recorrer ao Poder Judiciário para receber as verbas trabalhistas a que tinham direito, mas que não foram
devidamente cumpridas.

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Assim, tem menos direito aqueles que estão batalhando por fazer serem cumpridos os seus direitos do que
aqueles que violam direitos, sendo esta uma flagrante contradição existente no direito pátrio, devendo­se
estender determinadas prerrogativas e benesses também ao trabalhador pobre que recorre ao órgão jurisdicional
para receber verbas a que fazia jus.

6. SISTEMAS E ÔNUS DA PROVA

Vige na sistemática processual, em regra, o princípio do livre convencimento motivado, em que o magistrado
tem ampla liberdade de apreciação das provas, aquilatando­as ao seu bel talante e alvedrio, tendo apenas a
obrigação constitucional (art. 93, inciso IX, da CF) de motivar o seu ato decisório.

Contudo, não se pode olvidar que há algumas passagens nos textos processuais em que a prova somente é
possível através de certo instrumento ou forma previamente determinada pelo legislador. É o sistema da prova
legal ou tarifada.

Como exemplo de provas legais ou tarifadas, podem ser citados o artigo 108, do Código Civil (Não dispondo a
lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição,
transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valores superiores a trinta vezes o
maior salário mínimo vigente no país) e o artigo 401, do Código de Processo Civil (A prova exclusivamente
testemunhal só se admite nos contratos cujo valor não exceda o décuplo do maior salário mínimo vigente no
país, ao tempo em que foram celebrados).

Nestes dois exemplos, caso haja a transferência de um imóvel de valor superior a 30 salários mínimos sem que
seja feita por escritura pública, ou caso seja celebrado um contrato qualquer que exceda 10 salários mínimos e
se queira prová­lo por meio testemunhal, devem tais atos ser desconsiderados validamente, pois a legislação
pátria exigiu determinada forma específica para cada um deles. Para eles não se aplica a liberdade das formas!

É o mesmo que acontece com o pedido de demissão/recibo de quitação de rescisão, que exige a assistência do
respectivo sindicato ou perante autoridade do MTE, o que, de fato, não houve.  Neste sentido, pode­se
considerar o citado art. 477 do Texto Consolidado como um exemplo de prova tarifada, em que o legislador
vincula o julgador a determinada espécie probatória, como forma de assegurar e resguardar direitos e promover
a segurança jurídica do jurisdicionado.

No caso, para que seja válido o pedido de demissão ou quitação da rescisão deve estar o obreiro assistido por
sindicato, sendo este um elemento essencial de validade do ato jurídico praticado, não podendo, portanto, ser
desconsiderado em desfavor de uma mera presunção ficta.

Se for tomado como referência um processo do trabalho em que o reclamante tenha indeferido os seus pedidos
de verbas rescisórias por não ter comparecido ao processo, com a decisão proferida, a ilegalidade de um ato
findou por ser desconsiderada, sendo indevidamente suprida, a posteriori, pelo não comparecimento do
reclamante à audiência. Ilação outra não há de que a confissão – dita ficta – fora, em verdade, absoluta, tendo o
condão, inclusive, de convalidar um ato violador de disposição legal expressa, malferindo regramentos tuitivos
e valores protetivos da Consolidação das Leis do Trabalho.

Este tipo de decisão deve ser vista com todas as ressalvas possíveis, uma vez que os pedidos presentes na
petição inicial devem ser verdadeiramente analisados, de acordo com a sistemática processual vigente hodierna,
e não à bel vontade de um magistrado que quis ter o seu trabalho facilitado, indeferindo de forma apriorística
todos os pleitos formulados na exordial.

É importante trazer este exemplo processual para demonstrar que a decisão proferida no caso hipotético que se
está a analisar é completamente desproporcional e desarrazoada, tendo o magistrado buscado um subterfúgio
para que não necessitasse analisar, de fato, o que era requerido no processo, sendo muito mais fácil indeferir
todos os pedidos, inclusive o de justiça gratuita (que depende de mera declaração da parte e que para ser
revogado deve haver prova em sentido contrário produzida pela ré adversa).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESPROVIMENTO. CONFISSÃO FICTA. PRESUNÇÃO RELATIVA.
PROVA DOCUMENTAL. CONJUNTO PROBATÓRIO. A aplicação da pena de confissão à parte que não
comparece à audiência na qual deveria prestar depoimento pessoal não tem eficácia iure et de iure. A presunção
legal é juris tantum, podendo ser infirmada por outras provas produzidas nos autos. Agravo de Instrumento a

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que se nega provimento.” (AIRR 3473400­91.2002.5.02.0902, Rel: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de
Julg.: 23/02/2005, 3ª T, Data de Publicação: DJ 22/03/2005)

Desta forma, percebe­se que a presunção relativa quanto a veracidade dos fatos (ressalte­se: dos fatos) fora
indevidamente tomada em termos absolutos pelo D. Magistrado, proferindo uma decisão que desborda dos
limites da legalidade, conforme demonstrado em tópico anterior, como também da constitucionalidade, por ser
flagrantemente desproporcional e não razoável, o que fere os princípios constitucionais implícitos da
razoabilidade e proporcionalidade nas modalidades necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido
estrito.

“HORAS EXTRAS. CONFISSÃO FICTA. PRESUNÇÃO RELATIVA. PROVA DOUMENTAL.
DEPOIMENTO PESSOAL DA AUTORA. A aplicação da pena de confissão ficta gera presunção relativa de
veracidade dos fatos articulados na inicial, especialmente em face da prova documental constante nos autos e do
depoimento pessoal da autora. Recurso parcialmente provido.” (RO 01143­2009­003­22­00­4, Relator: LIANA
CHAIB, Data de Julgamento: 06/08/2010, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJT/PI, Página não
indicada, 3/9/2010)

“REVELIA. CONFISSÃO FICTA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. Para superar o quadro decorrente da
aplicação da revelia e pena de confissão, é necessário que haja a concorrência de outros elementos probatórios
capazes de convencer o juízo em sentido distinto, o que não é a hipótese dos autos, eis que não houve produção
de prova oral nem documental quanto à matéria de fato. Recurso conhecido e provido parcialmente”. (RO
00507­2008­006­16­00­0, Rel.: LUIZ COSMO DA SILVA JÚNIOR, Data de Julgamento: 03/06/2009, Data de
Publicação: 26/06/2009)

Uma vez que, mesmo o reclamante tenha estado ausente da audiência, o magistrado não arquive o processo,
resta implicitamente demonstrado que a presença a parte não era imprescindível para o deslinde da demanda.
Deve­se, também, atentar para a lealdade processual que se deve fazer presente pela atuação do órgão
jurisdicional, não podendo praticar atos que criem legítimas expectativas na parte e depois venha a trair tal
situação com comportamentos que sejam contraditórios, posto que nosso sistema jurídico vede o venire contra
factum proprium.

Existem demanda trabalhistas, por exemplo, que independem da presença da parte, não havendo motivos, pois,
para que venha a serem os pedidos julgados improcedentes por mera ausência da parte a uma audiência.

Além disso, é extremamente comum que o magistrado, estando ausente o reclamante, não permita que o
advogado do acionante faça perguntas aos prepostos da empresas, o que finda por demonstrar que não é dada à
parte a possibilidade de produzir provas sobre as circunstâncias de fato que poderiam elidir a presunção ficta
que está insculpida no artigo 844 da CLT.

Se o magistrado nega ao patrono da parte a chance de fazer perguntas aos prepostos das empresas que estão
presente, como é possível que se considere que não fora feita a prova de uma circunstância fática que poderia
ser conseguida por meio de interrogatório das partes presentes? Termina­se dando prevalência a uma mera
presunção jurídica, ao passo que deveria ser privilegiada a verdade dos fatos, a verdade real, o que, de fato, é
almejado em todo e qualquer processo.

Desta forma, não se pode olvidar, jamais, que a ausência do reclamante à audiência poderia, no máximo, gerar
uma confissão ficta, ou seja, juris tantum, podendo ser elidida por prova produzida em sentido contrário. Fora
atribuído pelo órgão decisor uma presunção juris et de jure, o que, de forma alguma, se coaduna com as
previsões processualísticas.

Assim, fazia­se imperiosa e necessária a oitiva dos prepostos para que fosse possível os esclarecimentos acerca
dos fatos que estavam sendo postos em litígio. Todavia, decidira o juízo de piso por absolutizar a presunção
relativa prevista no diploma processual para que não se estendesse longamente o momento instrutório.

Diante disso, a confissão ficta não pode ser aplicada à matéria, pois tal comportamento redunda em ofertar
caráter absoluto à pena aplicada pelo não comparecimento do reclamante à audiência, postura que finda por
desconsiderar, por completo, o quanto legalmente previsto para a validade de determinada prova, valorizando
sobremaneira uma mera presunção ficta criada pela lei quando houvesse espaço para a sua aplicação. Ou seja, a
confissão ficta somente pode se fazer incidir em circunstâncias que a lei não lhe tenha oposto uma determinada
forma. Caso contrário, é uma burla à proteção criada pela lei, infringindo claramente a finalidade da norma.

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Deve­se ter em alta conta o quanto decidido pelo TRT 2 no seguinte recurso ordinário:

“Efeitos da revelia e da pena de confissão sobre pedidos que exigem prova documental de constituição do
direito. Os efeitos da revelia e da pena de confissão não se prestam a criar direitos que dependam,
necessariamente, de prova documental, como é o caso do contrato de trabalho temporário, ante os termos do art.
11 da Lei 6.019/74.” (RO 11604­2002­902­02­00­7, Relator: PAULO AUGUSTO CAMARA, Data de
Julgamento: 07/05/2002, 4ª T, Data de Publicação: 17/05/2002)

Por conta disso, algumas das verbas discutidas em um processo do trabalho podem depender apenas de prova
documental e não podem ser indeferidas pela simples ausência do reclamante à assentada de audiência. Entre
elas, evidencie­se, por exemplo, o pleito relativo ao FGTS, que é assente na jurisprudência o seguinte
posicionamento:

“FGTS. Em que pese a pena de confissão ficta aplicada ao reclamante, tem­se que era da empregadora o ônus de
providenciar na juntada aos autos dos documentos necessários à comprovação do efetivo recolhimento do FGTS
relativos ao período do contrato de trabalho. Assim, diante da ausência da prova documental exigida para
comprovação do recolhimento do FGTS, impõe­se a reforma da sentença para determinar o recolhimento do
FGTS do contrato de trabalho à conta do autor, nos meses de dezembro de 2004 e de 03 de junho de 2005 a 04
de julho de 2005. Apelo parcialmente provido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Preenchido requisito legal,
são devidos honorários de assistência judiciária. Apelo provido.” (RO 00623­2006­012­04­00­4, Rel.: ROSANE
SERAFINI CASA NOVA, Data de Julgamento: 15/04/2009, 12ª Vara do Trabalho de Porto Alegre)

Tomando­se, neste momento, como referência uma demanda obreira em que se discutam verbas rescisórias, não
se pode olvidar da necessária e indispensável forma ad solemnitatem  que deve existir para o termo de quitação.
Não é por motivos fúteis que o legislador celetista fez constar previsão expressa quanto à prova que deveria
constar em relação ao pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão do contrato de trabalho no art. 477,
in verbis:

“Art. 477 – [...]

§ 1º ­ O pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de trabalho, firmado por empregado
com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou
perante a autoridade do Ministério do Trabalho e Previdência Social. 

§ 2º ­ O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do
contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor,
sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.”

Conforme anteriormente dito, não pode ser dado valor absoluto à confissão ficta, para que não sejam
desconsideradas regras basilares previstas no Texto Consolidado. Ressalte­se que o ônus de produzir tal material
probatório é exclusivamente dos reclamados, tendo em conta que haveria um completo esvaziamento da justiça
obreira se fosse o empregado obrigado a trazer tais documentos ao processo, uma vez que, em regra, não os
possuem.

Com isso, resta evidenciado que fora flagrantemente violada uma regra expressamente consignada para evitar
abusos por parte do empregador, todavia, mesmo afirmando o caráter ficto da confissão pelo não
comparecimento do reclamante, findou tal presunção sendo absolutizada pelo juízo, superando, até mesmo, a
necessidade de uma específica e legalmente prevista espécie de prova para que fosse provada a matéria em
juízo.

Em regra, vige no ordenamento jurídico pátrio a tese da liberdade das formas, uma vez que “A validade da
declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir[7]” (grifou­
se).

Nesta toada, uma vez que expressamente previsto na Consolidação das Leis do Trabalho que “O pedido de
demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de 1
(um) ano de serviço só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a
autoridade do Ministério do Trabalho e Previdência Social (sic)”[8], não poderia o mandamento celetista ser
desconsiderado em detrimento da consideração de que a presunção ficta se sobrepõe a uma prova legalmente
estabelecida.

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Temos, pois, uma lei exigindo expressamente uma forma especial para a prática de determinado ato, o que não
fora, in casu, respeitado, mas, mesmo assim, o dispositivo fora contrariado, dando­se prevalência probatória à
confissão ficta em detrimento da rescisão/pedido de demissão formalmente legítimo. Com isso, uma prova
considerada relativa findou por ter a sua aplicação absolutizada pelo juízo, sobrepondo­se, inclusive, a uma
disposição legal que exigia determinada forma específica para a produção da matéria probatória.

Não se pode olvidar que a assistência sindical na rescisão ou no pedido de demissão tem natureza ad
solemnitatem, sendo da própria essência do ato, dependendo da forma especial legalmente delimitada e exigida.
Portanto, não se pode reputar minimamente válido o conteúdo probatório deste documento que desatendeu as
prescrições legais. Frise­se que a forma a ser adotada no pedido de demissão/quitação da rescisão não tem
natureza ad probationem, mas sim ad solemnitatem, ou seja, deve vir a ser observada a propósito da prática de
um determinado ato, conforme as prescrições que a lei contém.

Diante disso, a confissão ficta não pode ser aplicada à matéria, pois tal comportamento redunda em ofertar
caráter absoluto à pena aplicada pelo não comparecimento do reclamante à audiência, postura que finda por
desconsiderar, por completo, o quanto legalmente previsto para a validade de determinada prova, valorizando
sobremaneira uma mera presunção ficta criada pela lei quando houvesse espaço para a sua aplicação. Ou seja, a
confissão ficta somente pode se fazer incidir em circunstâncias que a lei não lhe tenha oposto uma determinada
forma. Caso contrário, é uma burla à proteção criada pela lei, infringindo claramente a finalidade da norma.

A preocupação com a formalidade do documento rescisório é tamanha que chega o legislador
infraconstitucional a permitir que alguns outros órgãos possa efetuá­lo; tudo com fulcro na ideia de proteção e
tutela daquele sujeito que pode ser vítima de abusos e desmandos pelo detentor do poder econômico, é o que se
pode inferir do seguinte dispositivo do susodito artigo:

“§ 3º ­ Quando não existir na localidade nenhum dos órgãos previstos neste artigo, a assistência será prestada
pelo Represente do Ministério Público ou, onde houver, pelo Defensor Público e, na falta ou impedimento dêste,
pelo Juiz de Paz”.

Com isso, percebe­se que a intenção do legislador é tutelar e proteger o obreiro, para evitar que não deixe de
receber as verbas rescisórias a que faz jus. Diante da necessidade de instrumento para validar o quanto efetuado
no ato de rescisão e tendo em conta que tal documento somente pode ser trazido ao processo pelas reclamadas,
devendo estas sofrer as consequências por tal comportamento omissivo, razões não há para que não sejam
concedidas tais verbas ao reclamante, mesmo que ausente à audiência.

Frise­se, é absurdo não conceder tais verbas ao trabalhador apenas por que não compareceu a uma das
audiências, ferindo de morte não só o mandamento expresso do art. 477 como também se mostrando
cristalinamente desproporcional, uma vez que a única punição existente é aquela prevista em lei, não podendo o
magistrado retirar do reclamante todos os demais direitos que possui, afastando, inclusive, basilares baluartes
processuais, ao indeferir os pleitos formulados por ter atribuído valor absoluto a uma presunção que é
nitidamente relativa.

Fere de morte o mais comezinho senso de justiça impedir a atuação processual e dar enorme valor a uma mera
presunção relativa em vez de ser privilegiada a verdade real, tão importante e necessária, principalmente no
processo do trabalho, em que uma das partes goza de flagrante hipossuficiência técnica e econômica.

7, CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto, pode­se chegar às seguintes conclusões:

a. A aplicação da pena de confissão ficta ao reclamante que não comparece à audiência na Justiça do Trabalho
fere o princípio da legalidade, pois esta penalidade não ter base nem fundamento legal, sendo mera extensão
interpretativa dos órgãos jurisdicionais (que deve ser evitada);

b. No mesmo sentido, não se deve considerar como minimamente possível que a interpretação das normas
jurídicas não estejam jungidas a limites e restrições – como a literalidade do texto, por exemplo – para que não
seja desvirtuado o sistema nem haja uma ruptura com valores idealizados pelo legislador;

c. O artigo 844 da Consolidação das Leis do Trabalho não alberga a punição de confissão ao reclamante que não
compareça à audiência, tão­somente se reportando à contumácia do reclamado. Ademais, tendo em conta a

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omissão celetista ao caso, deve­se aplicar o art. 320 do Código de Processo Civil, não sendo cabível a revelia ao
acionante e, por consectário lógico e consequencial, todos os seus demais efeitos (confissão ficta, por exemplo).

A presunção de veracidade dos fatos alegados e a penalidade de confissão são efeitos expressos previstos no
código processual civil da ocorrência do fenômeno da revelia. Efetuar o magistrado a importação de tais efeitos
ao processo trabalhista, aplicando­o ao autor da ação, mesmo na ausência de norma procedimental, é ferir de
morte o basilar princípio da legalidade, constitucionalmente assegurado.

Ao reclamante, sujeito processual que se encontra na parte autora da ação trabalhista, somente pode vir a ser
aplicada a pena de arquivamento, o que, por não ter sido aplicado no momento oportuno, resulta em evidente
preclusão.

d. Ao serem comparadas as normas presentes no Código de Processo Penal e na Consolidação das Leis  do
Trabalho, percebe­se um tratamento muito mais benéfico ao criminoso, do que ao obreiro, mesmo que se possa
traçar uma relação de equivalência entre os dois quando se está a compará­los com o polo oposto da relação
processual (Estado/forte x Réu/fraco; Reclamadas/forte x Reclamante/fraco).

Será que um suposto criminoso deve ter o seu patrimônio jurídico mais tutelado e protegido do que um sujeito
que labuta para sustento próprio e de sua família e que está indo ao processo para obter verbas alimentares que
lhe foram subtraídas?

e. A ausência do reclamante pode, no máximo, gerar uma confissão (verdadeiramente) ficta, ou seja, juris
tantum, podendo ser elidida por prova em sentido contrário; equivocam­se os magistrados quando atualmente
absolutizam tal presunção ficta e denegam os pedidos de forma indiscriminada.

Referências
ARAGÃO,  Alexandre  Santos.  O  Princípio  da  Eficiência.  Revista  Eletrônica  de  Direito  Administrativo
Econômico, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, no. 4, nov/dez 2005, jan 2006. p. 2. Disponível na
Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 jan. 2012.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, 12ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 1990
BEBBER, Júlio César. Processo do Trabalho: adaptação à contemporaneidade. São Paulo: LTr, 2011
BRASIL. Decreto­Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. Código Penal. Rio
de Janeiro, RJ: Senado, 1943.
_______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
_______. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: Senado, 2002.
_______.  Tribunal  Superior  do  Trabalho.  Agravo  de  Instrumento  em  Recurso  de  Revista  (AIRR)  3473400­
91.2002.5.02.0902, Rel: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julg.: 23/02/2005, 3ª T, Data de Publicação:
DJ 22/03/2005.
_______.  Tribunal  Regional  do  Trabalho.  Recurso  Ordinário  (RO)  00623­2006­012­04­00­4,  Rel.:  ROSANE
SERAFINI CASA NOVA, Data de Julgamento: 15/04/2009, 12ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
_______. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário (RO) 11604­2002­902­02­00­7, Relator: PAULO
AUGUSTO CAMARA, Data de Julgamento: 07/05/2002, 4ª T, Data de Publicação: 17/05/2002.
_______. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário (RO) 11604­2002­902­02­00­7, Relator: PAULO
AUGUSTO CAMARA, Data de Julgamento: 07/05/2002, 4ª T, Data de Publicação: 17/05/2002.
_______. Tribunal Regional  do  Trabalho.  Recurso  Ordinário  (RO)  01143­2009­003­22­00­4, Relator: LIANA
CHAIB, Data de Julgamento: 06/08/2010, 2a T, Data de Publicação: DJT/PI, Página não indicada, 3/9/2010.
GARCÍA  DE  ENTERRÍA,  Eduardo.  Reflexiones  sobre  la  Ley  y  los  principios  generales  del  Derecho.  1.  Ed.
Madrid : Editorial Civitas, 1996, p. 28.
 
Notas:
[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo­se aos brasileiros e aos
estrangeiros  residentes  no  País  a  inviolabilidade  do  direito  à  vida,  à  liberdade,  à  igualdade,  à  segurança  e  à
propriedade, nos termos seguintes :
II ­ ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
XXXIX ­ não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal  e  dos  Municípios  obedecerá  aos  princípios  de  legalidade,  impessoalidade,  moralidade,  publicidade  e
eficiência e, também, ao seguinte:
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Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da
administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e
renúncia  de  receitas,  será  exercida  pelo  Congresso  Nacional,  mediante  controle  externo,  e  pelo  sistema  de
controle interno de cada Poder. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado
à  União,  aos  Estados,  ao  Distrito  Federal  e  aos  Municípios:  I  ­  exigir  ou  aumentar  tributo  sem  lei  que  o
estabeleça;
[2] BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional, 12ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 1990. p.
172
[3]  ARAGÃO,  Alexandre  Santos.  O  Princípio  da  Eficiência.  Revista  Eletrônica  de  Direito  Administrativo
Econômico, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, no. 4, nov/dez 2005, jan 2006. p. 2. Disponível na
Internet: <http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 10 jan. 2012.
[4] GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo. Reflexiones sobre la Ley y los principios generales del Derecho. 1. Ed.
Madrid : Editorial Civitas, 1996, p. 28.
[5]  Art.  769  ­  Nos  casos  omissos,  o  direito  processual  comum  será  fonte  subsidiária  do  direito  processual  do
trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.
[6] BEBBER, Júlio César. Processo do Trabalho: adaptação à contemporaneidade. São Paulo: LTr, 2011. p. 81.
[7] Art. 107, do Código Civil (Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002).
[8] Art. 477, par. 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto­Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943)
 

Informações Sobre o Autor
Daniel Melo Garcia

Advogado; Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia; Membro associado do
Conselho Nacional de Pesquisa e Pós­Graduação em Direito

 
    
     

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GARCIA, Daniel Melo. A inaplicabilidade da pena de confissão ficta ao reclamante ausente à sessão de
audiência. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito­
juridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11506&revista_caderno=25>. Acesso
em nov 2016.

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audiência. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 100, maio 2012. Disponível em: <http://www.ambito­
juridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11506&revista_caderno=25>. Acesso
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