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Notas de aula n° 3 – Permeabilidade e percolação

Como, em muitos casos práticos, a água não permanece em repouso no solo, é


importante que se estude como esse movimento ocorre (Figura 1). O que permite essa
movimentação da água no solo é uma propriedade chamada de permeabilidade, numericamente
expressa pelo coeficiente de permeabilidade (k). Esse coeficiente varia de acordo com:
 A densidade do solo;
 Temperatura: quanto maior a temperatura, menor a viscosidade da água, logo
mais facilmente se escoa e aumenta o coeficiente de permeabilidade;
 Distribuição granulométrica;
 Estrutura do solo: camadas de solo depositadas pela água são mais permeáveis
horizontalmente que verticalmente;
 Descontinuidades no solo.

Figura 1 - Percolação

O conhecimento da permeabilidade de um solo é de importância em diversos problemas


práticos de engenharia, tais corno: drenagem, rebaixamento do nível d'água, recalques, etc.
A determinação experimental da permeabilidade do solo é obtida a partir da Lei de
Darcy e pode ser encontrada a partir de ensaios com filtros de areia (Figura 2) sendo a
velocidade do fluxo de água no solo ( v ) diretamente relacionada ao gradiente hidráulico (i).

Figura 2 - Ensaio para determinação da velocidade do fluxo de água


v=k ∙ i
(3.1)
Onde:
v=¿ velocidade média aparente do fluxo de água;
k =¿coeficiente de permeabilidade;
i=¿ gradiente hidráulico
Já o gradiente hidráulico pode ser determinado em função da perda de carga e do
caminho do fluxo (eq. 3.2).
h
i= ( adimensional)
L
(3.2)
Assim, a vazão (Q ) pode ser determinada de acordo com a eq. 3.3.

Q= A ∙ v =A ∙ k ∙ i
m3
s ( )
(3.3)
Deste modo, o coeficiente de permeabilidade pode ser determinado tanto em função da
vazão quanto em função da velocidade.

k= ( )
v m
i s
(3.4)

k=
Q m
( )
A∙i s
(3.5)
Como a área da seção transversal na qual a água percola é consideravelmente menor
que a área total (a água somente se movimenta pela área de vazios), a velocidade de percolação
( v s) deve ser determinada a partir do índice de vazios ou pela porosidade do solo:
1+ e v
v s= ∙ v=
e n
(3.6)
k ∙i
v s=
n
(3.7)
Ex. 3.1 – A Figura 3 mostra um filtro instalado entre dois tanques. Calcule o coeficiente
de permeabilidade e a velocidade de percolação.
Figura 3 - Exercício

A quantidade de água coletada na saída em t = 60 s foi de q=0,0608 m3 .


R:
q 0,0608 −3 3
Q= = =1,01∙ 10 m /s
t 60
Coeficiente de permeabilidade:
Q 1,01 ∙10−3 −3
k= = =2,7 ∙10 m/ s
Ai 0,5 ∙ 0,75
A velocidade do fluxo:
−3 −3
v=ki=2,7∙ 10 ∙ 0,75=2,02 ∙10 m/ s
A velocidade de percolação:
1+ e 1,6
v s= ∙ v= ∙ 2,02 ∙10−3=5,4 ∙ 10−3 m/s
e 0,6

O coeficiente de permeabilidade pode ser deduzido a partir de diversos ensaios em


laboratório ou em campo, sendo os últimos mais caros, porém de maior nível de confiança.
Quando não for possível fazer nenhum ensaio pode-se usar a tabela a seguir como referência:

Solo k (m/s)
Pedregulho −2
10 a 1
Areia 10−2 a 10−5
Silte −5
10 a 10
−8

Argila −8
10 a 10
−12

Ensaios de campo são feitos, geralmente, para rebaixar o nível d’água do terreno,
resolver problemas de percolação em conexão com a estabilidade estrutural ou verificar se a
fonte de água pode ser utilizada.
Há basicamente dois problemas usuais dependendo da posição da camada do solo
contendo água. A primeira é com solo uniforme de granulometria grossa se estendendo do nível
do terreno até a camada impermeável. Pode ocorrer ruptura devido erosão retrogressiva
(piping), como na Figura 4.

Figura 4 - Piping
A segunda situação é aquela em que o solo é uniforme de granulometria situado entre
duas camadas impermeáveis, contendo água sob artesianismo. Neste caso pode ocorrer ruptura
por cisalhamento.
Para desenvolver o ensaio é preciso partir das seguintes hipóteses:
 O nível d’água no terreno é estático em todas as direções;
 A camada permeável é homogênea e horizontal;
 O poço de bombeamento penetra na base da camada impermeável;
 O revestimento do poço é furado até o lençol freático;
 O coeficiente de permeabilidade da camada a ser bombeada é maior que 10−4
m/s;
 O coeficiente k do solo é uniforme e constante em qualquer ponto.
A Figura 5 representa o ensaio de bombeamento para o primeiro caso (camada não
confinada). Podemos perceber que devido ao bombeamento do poço central, a água flui em
direção a ele, formando uma curva de rebaixamento.
Figura 5 - Esquema de bombeamento de camada não confinada
Para o cálculo do coeficiente de permeabilidade do solo, podemos considerar a Figura 6
e as equações a seguir.

Figura 6 - Esquema para cálculo do coeficiente de permeabilidade


A equação da curva de rebaixamento é descrita por:


y= H 2−
Q
π ∙k
∙ ln( )
R
r
(3.8)
Já a equação de rebaixamento:
z=H − y
(3.9)
A altura máxima da água no poço central é dada por:

h= H −
2 Q
π ∙k
∙ ln
( )
R
r0

(3.10)
Logo, o valor máximo do rebaixamento é:
z máx =H−h
(3.11)
O fluxo de água bombeado para fora do poço:

π ∙k ∙ ( H −h )
2 2
Q=
ln
R
r0 ( )
(3.12)
Como o valor máximo teórico ocorre quando h ≈ 0, o fluxo máximo de água é dado por:
2
π ∙k ∙H
Q máx =
ln
( )
R
r0
(3.13)
Por fim, o coeficiente de permeabilidade pode ser expresso por:

k=
Q
π ∙ ( H −h )
2 2
∙ ln
( )
R
r0

(3.14)
A determinação do raio de influência R é realizada com o auxílio de poços secundário
que medem o rebaixamento da água. Assim, como em alguns casos esse raio pode ser muito
grande, pode ser conveniente utilizar a seguinte equação:

k=
Q
π ∙ ( y 2− y 1 )
2 2
r
∙ ln 2
r1 ()
(3.15)
Ex. 3.2 – Um ensaio de bombeamento foi executado em uma camada de areia limpa,
com espessura de 4,7 m, subjacente a um solo impermeável. O lençol freático original estava a
1,5 m abaixo da superfície. A vazão no regime permanente a partir do poço central era 43 m³/h.
O nível d’água observado em cada poço, sob um fluxo uniforme é apresentado na tabela abaixo.
Calcule o coeficiente de permeabilidade da areia.
Central
Nº do poço 0 1 2 3 4 5
Raio (m) 0,15 3 12 20 50 76
Profundidade da água 1,96 1,77 1,65 1,61 1,53 1,5
(m)
Rebaixamento (m) 0,46 0,27 0,15 0,11 0,03 0

R: Dados:
Espessura da camada impermeável = 4,7; profundidade do lençol freático = 1,5 m,
Q=43 m /h; R=76 m; r 0 =0,15 m.
3

Determinar a vazão em m³/s.


m3 43 3 −2 3
Q=43 = m /s=1,194 ∙ 10 m /s
h 3600
Determinar o H:
H=Camada imperável− profundidade lençol freático
→ H=4,7−1,5=3,2 m
Determinar o h:
h=H−z 0=3,2−0,46=2,74 m
Agora se determina o coeficiente de permeabilidade:

k=
Q
π ∙ ( H −h )
2 2
∙ ln
( )
R
r0

k=
1,194 ∙ 10−2
π ∙ ( 3,2 −2,74 )
2 2
∙ ln ( )
76
0,15
−3
=8,66∙ 10 m/s

Fazer com os poços 3 e 4. Eq. 3.15


y 3=H −z 3=3,2−0,11=3,09 m
y 4 =H−z 4 =3,2−0,03=3,17 m
r 3 =20 m; r 4 =50 m

( ) r4
( )
−2
Q 1,194 ∙10 50
k= ∙ ln = ∙ ln =6,95 ∙10−3 m/ s
π ∙ ( y4− y3 )
2 2
r 3 π ∙ ( 3,17 −3,09 )
2 2
20

Quando a camada de água se encontra confinada entre duas camadas impermeáveis, a


curva de rebaixamento não deve ser diminuída abaixo da base da camada confinante superior,
como mostrado na Figura 7.
Figura 7 - Camada de água confinada entre camadas impermeáveis.
Neste caso, a equação de rebaixamento é dada por:

y=h+
Q
2 ∙ π ∙ k ∙ h0
∙ ln( )
r
r0

(3.16)
A equação de rebaixamento será:
z=h A− y
(3.17)
Coeficiente de permeabilidade da camada permeável:

k=
Q
2∙ π ∙ h0 ∙ ( h A −h )
∙ ln
( )
R
r0

(3.18)
Ou utilizando os dados a partir de dois poços de observação:

k=
Q
2∙ π ∙ h0 ∙ ( y 2− y 1 ) ()
∙ ln
r2
r1
(3.19)
Até aqui estudamos apenas a determinação da permeabilidade em solos estratificados,
agora introduziremos o estudo em solos compostos por diferentes camadas, também chamados
de estratificados (Figura 8). Nestes casos, é necessário verificar a permeabilidade tanto vertical
quanto horizontal, sendo a última, geralmente, maior que a primeira.
Figura 8 - Análise de solos estratificados
Neste caso, o valor médio do coeficiente de permeabilidade horizontal para várias
camadas é dado por:
1
k H= ∙ ∑( k ∙ z)
H
(3.20)
Já para a permeabilidade vertical:
H
k V=
∑ ()
z
k
(3.21)
Ex. 3.3 – Foram realizados três ensaios de permeabilidade em 3 camadas mostradas na
Figura 9. Os coeficientes de permeabilidade horizontal e vertical relevantes são apresentados
para cada camada. Calcular a permeabilidade média nas duas direções.
Figura 9 - Exercício 3.3
R:
Horizontal:
1 1
∙ ∑ ( k ∙ z ) = ∙ ( 3,7∙ 10 ∙ 3+ 4,42 ∙10 ∙ 2+6,11∙ 10 ∙ 4 )=160 ∙10 m/ s
−1 −2 −2 −3
k H=
H 9
Vertical:
H 9 m
k V= = =0,065 =65 mm/ s
∑()z
k
3
0,225
+
2
0,0391
+
4
0,0537
s

As representações gráficas da passagem de água através de um material permeável são


chamadas de redes de fluxo. Essas são compostas por linhas de fluxo (LF) e Linhas
Equipotenciais (LE).
As linhas de fluxo representam os caminhos da água através do solo (Figura 10).

Figura 10 - Linhas de fluxo


Uma situação indesejada é a da saída do fluxo de água em taludes, o que pode causar
arraste de partículas e erosão. Para evitar esse tipo de problema, nesses casos devem ser feitos
filtros para sua drenagem (Figura 11).
Figura 11 - Linha de fluxo em talude
Já as linhas equipotenciais representam pontos de pressões iguais dentro da massa do
solo, causada pelas forças de percolação (Figura 12) e são normais às linhas de fluxo (Figura
13).

Figura 12 - Linha equipotencial

Figura 13 - Linhas equipotenciais e linhas de fluxo


Solos submersos permeáveis são considerados linhas equipotenciais enquanto cortinas
impermeáveis são linhas de fluxo (Figura 14).

Figura 14 - LEs e LFs


A análise de redes de fluxo pode ser utilizada para resolver três tipos de problemas de
percolação: estabelecer a vazão, calcular a pressão de fluxo atuando na estrutura e determinar se
o piping de determinado solo pode ser causado por percolação ou não.
A vazão (Figura 15) pode ser determinada a partir do número de quadrados desenhados
na rede de fluxo ¿), do número de canais da rede de fluxo ( N f ), da perda de carga total ( H ) e do
coeficiente de permeabilidade.

Figura 15 - Determinação da vazão

Q=k ∙ H ∙ ( )
Nf
Ne
(3.22)
Sendo:
H=N e ∙ Δ h
(3.23)
Já para encontrar a poropressão é preciso primeiro determinar a perda de carga no ponto
x ( H x) a partir do número de quadrados e o ponto x (Figura 16) e a entrada de água ( N x).

H x =H ∙
( )
Nx
Ne
(3.24)
Figura 16 - Determinação da poropressão

A altura piezométrica em x (h x ) é dada por:

h x =H T −H ∙
( ) Nx
Ne
(3.25)
Assim, a poropressão de percolação no ponto x é:
u x =γ w ∙h x
( 3.26 )
Ex. 3.4 – Para a Figura 16 determine a altura piezométrica e a pressão de percolação no
ponto x. Considere: H 0=22m ; H T =30 m e H=18 m .
R:
Nx=5,5; N e =12;
Nx 5,5
h x =H T −H ∙ =30−18∙ =21,75 m
Ne 12
u x =γ w ∙h x =9,81 ∙ 21,75=213,37 kN /m²

A diferença de potencial entre dois pontos do solo é chamada de gradiente hidráulico (i)
e pode ser calculada pela relação entre a perda de carga na percolação e a distância entre os
pontos (Figura 17):
perdade cargana percolação h1 −h2
i= =
Distância de percolação a
(3.27)
Figura 17 - Diferença de potencial

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