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Direitos reservados aos autores.
O conteúdo desta obra é de exclusiva responsabilidade dos autores.
Conselho editorial:
Dr. Carlos Leandro Esteves
Drª. Eliana Ramos Ferreira
Dr. Carlos Augusto Bastos.
Drª. Edilza Joana Oliveira Fontes
Dr. José do Espírito Santo Dias Júnior
Dr. Wesley Garcia Ribeiro Silva
Dr. Wesley Oliveira Kettle
ISBN: 978-85-69642-07-7
2
Sumário
Prefácio ............................................................................................. 06
Edilza Joana Oliveira Fontes.
3
Narrativa RAP e Consciência histórica: Um breve debate entre as
rimas de Pelé do Manifesto e a Teoria de Jörn Rüsen. .................... 89
Prof. Esp. Rafael Elias de Queiroz Ferreira.
4
Ensino de História, pesquisa e o relato de uma experiência de
educação patrimonial em Mosqueiro. ............................................. 181
Prof. Esp. Daniel Rodrigues Tavares.
5
Prefácio
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pública na cidade de Ananindeua. O autor destaca a importância do
recurso imagético como opção metodológica que auxilia os alunos não-
ouvintes a compreenderem os conteúdos históricos. O texto aponta
possibilidades sobre o uso de maquetes e vídeos como recursos
didáticos no processo de ensino-aprendizagem para este público
escolar, afim de que não se sintam à margem do processo educacional,
bem como a relevância que a educação histórica possui para o debate
em questão, ele abre possibilidades para a discussão da memória como
objeto e fonte de pesquisa histórica em sala de aula.
7
determinado conhecimento histórico, que este não fique limitado ao uso
do livro didático. O uso de ferramentas disponibilizadas na web como
o blog, sites e redes sociais proporcionam uma variedade de fontes
históricas para uso em sala de aula quando problematizadas pelo
professor de História. O texto apresenta possibilidades para apresentar
uma intervenção no espaço escolar quanto ao uso de determinada
tecnologia no processo de ensino-aprendizagem.
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profissional do Ensino de História, ele consegue mobilizar os
conhecimentos históricos para uso em sala de aula. Apresenta as bases
teóricas e metodológicas do historiador alemão Jörn Rüsen para fazer
um estudo de caso da música “Sou Neguinho” a partir de dois conceitos
apresentados por Rüsen que são a narrativa histórica e a consciência
histórica destacando especificamente sua categoria crítica, a relação
passado-presente e sua perspectiva para a escrita da História, e por fim,
ressalta a identidade negra construída por meio desta música de
periferia. O texto abre possibilidades para fazer uma intervenção no
espaço escolar sobre a relação Ensino de História, Música e identidades
negras na periferia de Belém.
9
perspectiva a noção de Amazônia dentro de uma abordagem da história
cultural. O autor apresenta o papel que os livros didáticos exercem
como mediador do processo de ensino e aprendizagem, bem como a sua
apropriação no espaço escolar por alunos e professores. O texto abre
diálogos para fazer um debate aprofundado sobre como os alunos e
professores de História aprendem os temas de História da Amazônia no
Ensino Médio, podendo explorar os trabalhos existentes no estado do
Pará sobre a disciplina Estudos Amazônicos, a sua função e prática
pedagógica no espaço escolar para que não se limite a “historiografia
da falta” sobre a Amazônia nos livros didáticos de História, bem como
apresentar uma intervenção por meio deste produto cultural em uma
escola no estado do Pará.
10
estruturas conjunturais desta disciplina escolar para repensar o ensino
de História e a importância do conhecimento histórico para a formação
da cidadania. O texto abre possibilidades para que se aprofundem as
experiências e os sentidos do saber histórico dentro de um determinado
contexto no Brasil, bem como analisar as mudanças e permanências no
espaço escolar mediante uma observação direta neste espaço.
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possibilidades para dialogar com os teóricos que trabalham o conceito
saber escolar, bem como apresentar uma intervenção a esta proposta de
ensinar determinados conteúdos históricos.
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legislação vigente desde a LDB publicada em 1996 e suas alterações ao
logo no início do século XXI, bem como os pressupostos direcionados
para o conhecimento histórico e para o saber histórico escolar. O texto
abre portas para debater a formação de professores de História e a
perspectiva que o curso de História deste campus universitário pode
apresentar a partir da Base Nacional Curricular Comum (BNCC)
lançada em dezembro de 2017.
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O ENSINO DE HISTÓRIA NO CONTEXTO DE UMA ESCOLA
INCLUSIVA: ENTRE O TRADICIONAL E AS
POSSIBILIDADES DE ACESSIBILIDADE
Introdução
15
sua utilização no ambiente escolar é importante para que seja
estabelecida uma relação de alteridade, onde ocorram trocas e
valorização dos diferentes saberes presentes na escola, e em especial
nas aulas de História, a qual se caracteriza por ser uma disciplina que
interpreta as ações dos homens a partir das mais diferentes narrativas
no tempo histórico. Trata-se, portanto, de uma área do saber de
fundamental importância para construção de identidades, e também
para a compreensão das relações entre os diferentes grupos que
interagem na sociedade, e consequentemente, na comunidade escolar.
Este cenário nos convida a refletir sobre o direito de acesso que
os diferentes grupos do interior da sociedade têm em relação ao ensino
de História, e ainda mais, o direito de se reconhecerem como sujeitos
que interagem e influenciam no processo histórico através de lutas
efetivadas por grupos de identidade que não se reconheciam nos
conhecimentos propagados nas salas de aula. Assim, é importante
superar a questão da surdez apenas como deficiência que deve ser
tratada do ponto de vista médico, no sentido de buscar igualar grupos
desiguais, o que se coloca agora é a ampliação dessa discussão para a
questão das identidades, das culturas, das etnias, dos gêneros, das
políticas. Se os surdos têm que ser “incluídos” em algum lugar, devem
sê-lo no lugar e no espaço dos debates (SÁ, 2010, p. 25).
O fato destes alunos estarem inseridos em ambientes escolares
que pouco reconhecem suas necessidades educacionais especiais, nos
leva a indagar, como é a experiência de estar em uma sala de aula, não
poder ouvir o que os professores falam e posteriormente ser cobrado
pelo aprendizado dos conteúdos em atividades e provas? A proposta de
nosso trabalho é refletir sobre essa vivência que acompanha a pessoa
com surdez por toda sua trajetória escolar. Desta forma, daremos ênfase
ao espaço escolar enquanto uma construção social onde as relações e
práticas sociais se estabelecem no campo das experiências vividas,
destacando aqui o alunado surdo.
Diante de uma barreira que inviabiliza a concretização do
processo ensino/aprendizagem: a da comunicação, pretendemos
16
apontar estratégias facilitadoras referentes ao ensino de História para
educandos com surdez. Para isso, pretendemos utilizar reflexões que
tem orientado práticas pedagógicas em uma unidade escolar do ensino
regular, onde atuo como professor itinerante e professor da sala de
recursos, no Atendimento Educacional Especializado (AEE), desde
2015. Serão trabalhadas turmas de Ensino Médio que possuam surdos
matriculados, da Escola Estadual Luiz Nunes Direito (LND), a qual foi
fundada em 1980 no bairro do Coqueiro, no conjunto habitacional
Cidade Nova IV, na cidade de Ananindeua-Pará, município pertencente
a região metropolitana de Belém, pelo então governador Tenente
Coronel Alacid da Silva Nunes. A escola, que atualmente está inserida
em um espaço considerado da chamada classe média, recebe alunos de
várias comunidades adjacentes, como por exemplo: 40 horas, Icuí-
Guajará, Icuí-Laranjeira e Paar2. Ao longo dos anos esta instituição
passou a absorver a maior parte dos educandos com necessidades
educacionais especiais da região, sendo muito comum ouvirmos de
membros da comunidade escolar que se trata de uma “escola de
referência” em inclusão, sobre tudo em relação à alunos com surdez,
tendo 19 surdos matriculados em 2015, 20 em 2016 e 28 no ano letivo
de 2017.3 Sendo que a pesquisa teve como foco o turno da manhã, pois
este concentra 27 dos atuais 28 surdos matriculados.4
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Este texto é parte de uma pesquisa maior, sobre ensino de
História para alunos surdos que está sendo desenvolvida no âmbito do
mestrado profissional em ensino de História – PROFHIST, no polo da
UFPA, campus Ananindeua.
Para a dissertação entrevistamos pais, gestores, alunos e ex-
alunos surdos da escola LND. Para este trabalho, apresentamos alguns
recortes desta pesquisa, destacando aqui algumas entrevistas,
caracterizamos o ensino nas salas regulares e apontamos uma das
propostas metodológicas que utilizamos no ensino de História para
surdos.
O historiador François Furet afirma que a História para existir
como disciplina escolar, teve que sofrer várias mutações, de modo a
constituir um campo do saber ao mesmo tempo intelectualmente
autônomo, socialmente necessário e tecnicamente ensinável (FURET,
s.d., p.134). A preocupação de Furet em relação ao conhecimento
histórico precisar ser tecnicamente ensinável, nos convida a refletir
acerca da realidade dos alunos surdos na escola brasileira, pois a estes
é colocado o desafio de aprender a disciplina, que é essencialmente
ensinada pelos professores através da oralidade, o que já os exclui por
sua própria condição de pessoa surda, e que ainda é explicada em uma
língua que não é a sua, além do predomínio da Língua Portuguesa,
através de textos escritos, práticas tradicionais que pouco geram
interesse nos alunos.
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Nesse sentido, vejamos os depoimentos de Augusto e Ana5,
respectivamente:
Antes, no primeiro e segundo ano, eu lembro que
não tinha interpretes, era difícil estudar porque os
professores ensinavam falando, e os surdos não
entendem, só veem a boca se mexendo, travava
tudo. Alguns professores tinham paciência com a
gente, o professor de química era muito legal, ele
ensinava primeiro os ouvintes, mas depois
ensinava só para os surdos. Ele não tinha um
conhecimento profundo de Libras, só uma base,
mas se esforçava para ensinar. No terceiro ano eu
passei no vestibular, na Uepa, vieram os
professores do Astério de Campos, mas no outro
ano eu já sai.6
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que destaca ainda a atuação do professor de Química pelo esforço em
estabelecer comunicação em LSB. No depoimento de Ana, podemos
observar a inquietação em relação às metodologias utilizadas para
efetivar aprendizagem junto aos surdos: “eu me pergunto, como
explicar para os surdos?” Essa reposta precisa ser dada à esta aluna
pelos órgãos e profissionais da educação, por hora, a certeza que ela
tem é apenas que “os professores não sabem”.
De forma geral, e especificamente nas aulas de História, é
perceptível que as aulas na escola LND são ministradas
supervalorizando os conteúdos, basicamente através das aulas
expositivas orais e buscam respostas-padrão de todos os alunos, nas
atividades propostas. Ao se referir a este modelo escolar, Maria Tereza
Mantoan afirma que se tratam de escolas em que seus métodos e
práticas preconizam a exposição oral, a repetição, a memorização, os
treinamentos, o livresco, a negação do valor do erro. São escolas que
estão sempre preparando os alunos para o futuro: seja a próxima série a
ser cursada, o nível de escolaridade posterior, ou o exame vestibular
(MANTOAN, 2013, p. 60).
Diante das dificuldades de comunicação com os professores, e
mesmo pelo menor período de tempo em que professores e alunos estão
juntos em sala de aula, os alunos ouvintes acabam ganhando um grande
protagonismo no sentido de facilitar o desenvolvimento das atividades
dos surdos. Não é incomum os alunos ouvintes procurarem os
profissionais do AEE para informar sobre trabalhos, dando maiores
esclarecimentos acerca do que o professor falou sobre alguma atividade
em sala. Alguns ouvintes desenvolvem grande interesse pelos surdos e
pela Libras, buscando estar sempre próximos para aprenderem a Língua
de Sinais, e nos procuram também nesse sentido, de tentar obter
conhecimentos sobre como se comunicar com os surdos.
É importante ressaltar que muitas vezes são estabelecidas
relações de amizade entre alunos surdos e alunos ouvintes, que mesmo
sem dominar a Libras, buscam estratégias de comunicação para
viabilizar a comunicação, seja através da escrita, de mímica, mostrando
20
imagens, etc.7 Essas relações de proximidade costumam ocorrer com
mais frequência entre ouvintes e surdos oralizados, pois o elemento
“fala”, acaba sendo determinante para aproximá-los. Se pegarmos como
referência as duas alunas surdas entrevistadas para a dissertação, Clara
é oralizada, enquanto que Ana não é, além de constatar pela observação
que Clara possuía relações de amizade com alunas ouvintes, fato que
não se repete com Ana, a qual é a única menina entre os surdos dos dois
segundos anos, e no cotidiano observamos ela apenas em contato com
os meninos surdos, podemos observar esta questão também nas
entrevistas, pois Ana em nenhum momento citou os (as) alunos (as)
ouvintes em suas respostas, enquanto que Clara fez menção à eles/elas
em vários momentos.
Ao ser perguntada sobre a experiência de ser surda e ter
estudado em uma escola inclusiva, Clara destacou em dado momento
de sua resposta:
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Em relação às aulas de História, a entrevistada frisa novamente
a relação com as ouvintes, dizendo “os professores faziam muitos
exercícios em grupo, aí as ouvintes me ajudavam”.
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Devido à ausência de interpretes e a má formação dos
professores, no sentido de melhor compreender as possibilidades
metodológicas que podem contemplar os surdos, o dia a dia das aulas
acabam por se restringir as aulas expositivas orais, com os conteúdos
sendo explorados, normalmente, através de textos copiados no quadro.
Rafael se reporta a esta questão, quando perguntado sobre sua
experiência nas aulas de História, ele nos diz: “O professor de História
chega e escreve muitas palavras no quadro, depois começa a falar...eu
não entendo. Falta interprete de Libras, faltam imagens, aí os surdos
iriam aprender”.
23
eu entendo um pouco as palavras, mas quando ela fala, fica confuso, é
muito difícil. Escrito fica mais claro para mim”.9
24
Provas escritas
11
25
exceções são em momentos de formação ministradas pelos professores
itinerantes, porém, estes espaços são raros ao longo do ano letivo, além
de que nem sempre é possível reunir todos os professores de História
no mesmo dia e horário no espaço escolar para participarem da
atividade proposta.
As avaliações escritas costumam ser extensas, se analisarmos
que há apenas um professor de História no AEE para colaborar com a
interpretação das provas, levando em consideração que são diversas
provas, de várias turmas com surdos, torna-se um trabalho de extrema
dificuldade, pois nos dias de avaliação, devido a necessidade de
interpretação, os surdos se juntam todos no auditório da escola, é feita
uma separação por turmas e séries, o professor que está interpretando a
prova passa a dividir sua atenção para cada turma, sendo necessário
umas aguardarem enquanto outras são contempladas. Neste sentido,
provas com textos muito longos e sem apelo visual levam os alunos e o
interprete a um alto grau de stress e ansiedade, pois a espera dos alunos
torna-se prolongada e o tempo estimado para conclusão da avaliação
costuma ser extrapolado.
Normalmente, as avaliações de todas as disciplinas, costumam
ser aplicadas através de provas escritas, de modo geral, nos parece que
os professores ainda possuem grandes dificuldades em se desatrelarem
deste modelo mais tradicional e consolidado na escola brasileira. Ao
refletir acerca dos exames aplicados nas universidades francesas, mas
que por analogia, nos serve para pensar a escola brasileira, em particular
a escola LND, Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron, nos mostram
que eles não são apenas as representações e as práticas dos agentes, mas
também da organização e do funcionamento das instituições.
Destacando o que o autor chamou de angústia ante os vereditos totais,
brutais e parcialmente imprevisíveis das provas tradicionais. Dentro da
lógica da manutenção de um modelo que se pretende hegemônico,
temos sua reprodução, a qual impõe o exame não somente como a
expressão mais legível dos valores escolares e das escolhas implícitas
do sistema de ensino, já que ele acaba por impor uma definição social
26
do conhecimento e da maneira como deve ser manifestado, mas oferece
ainda, um de seus instrumentos mais eficazes ao empreendimento de
inculcação da cultura dominante e do valor dessa cultura (BOURDIEU;
PASSERON, 1992, p. 153).
Seminários
27
Neste momento é muito comum os alunos desconhecerem
algumas palavras e seus respectivos sinais, todos costumam colaborar
e passam a ensinar os sinais uns para os outros, o professor do AEE
também intervém para ensinar palavras e sinais desconhecidos dos
alunos, assim como não é incomum o professor desconhecer um sinal e
os alunos o ensinarem, o que demonstra a complexidade do ato de
ensinar e aprender, pautando o conhecimento em um compartilhamento
de experiências onde “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende
ensina ao aprender”(FREIRE, 1997. p.25). Quando nenhum presente
conhece um dado sinal, o mais usual é recorrer a aplicativos de celular
ou dicionários online que possam fornecer a informação necessária,
caso a dúvida persista, buscamos o auxílio de interpretes e outros surdos
que possam colaborar conosco.
Quando uma expressão não possui o sinal correspondente, os
alunos são orientados a utilizarem o recurso da datilologia, ou seja,
soletrar a palavra com as mãos através do alfabeto manual, conforme o
exemplo abaixo, onde utilizamos a palavra “colonos”:
12
http://www.ideiacriativa.org/2014/03/alfabeto-de-parede-em-
libras-para.html. Acesso em 20 jul. 2017.
28
responsáveis por explicar partes do conteúdo, que abrangem seus
respectivos textos, imagens e/ou vídeos.
Esta atividade ocorre no auditório da escola ou na sala de
recursos, em dias agendados pelo professor. Há um esforço no sentido
do professor do AEE estar presente nas apresentações dos grupos
formados por ouvintes, para interpretar a apresentação para os surdos,
porém, por incompatibilidade de horário de trabalho, nem sempre isso
é possível, o que ocasiona uma perda significativa na aprendizagem aos
alunos.
No dia marcado para a apresentação dos surdos, é necessário a
presença dos professores, os quais fazem perguntas, comentários e a
avaliação com base nas apresentações, o professor do AEE, que nesse
momento, atua como interprete, tanto da Libras para o Português, como
do Português para a Libras, e os demais alunos, que além de assistirem,
podem fazer intervenções ao fim de cada seminário.
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dividiu a turma em grupos para que cada um entregasse um trabalho
destacando um aspecto da Belle Époque, para os surdos o professor
solicitou que pesquisassem sobre o cinema Olympia.13
Começamos por explicar para os surdos o que foi a chamada
Belle Époque, para isso utilizamos livros didáticos, paradidáticos e sites
da internet. Em seguida apresentamos um vídeo hospedado no site You
Tube, este, com duração de cerca de 11 minutos, foi produzido com fins
didáticos em 2012, por Katiuscia de Sá, que integrava o grupo de
produção audiovisual Igara,14 para as comemorações de 100 anos do
cinema, e destaca desde sua fundação, destacando o público para o qual
foi pensado, o cinema mudo, as inovações técnicas, os diferentes grupos
empresariais ao qual pertenceu, até passar para a responsabilidade do
poder público municipal, o qual desenvolve projetos para que alunos da
rede pública tenham acesso ao cinema.15 O vídeo foi explicado em
Libras e pausado em vários momentos para ser melhor explicado, ou
para dar espaço às intervenções dos alunos.
A partir da construção desta base de conhecimento, propomos
a construção de maquetes do cinema. Os alunos sugeriram que fossem
feitas três maquetes: uma da fundação, outra dos anos de 1980/1990 e
ainda outra atual. Os surdos praticamente desconheciam o cinema, pois
costumam frequentar os cinemas nos shoppings da cidade e nenhum
13
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=CNWYp8WLwIE&t=307s. Acesso
em: 02 dez. 2017.
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soube informar se o cine Olympia possuía um sinal em Libras.
Resolvemos estabelecer que todos, alunos e professor, iriam pesquisar
junto à surdos mais velhos o sinal do cinema. Nenhum surdo consultado
soube informar o sinal do cinema, e por tanto foi utilizado o recurso da
datilologia.
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transformações arquitetônicas sofridas pelo cinema nesses mais de 100
anos, o que foi importante no sentido da compreensão das diferentes
temporalidades, assim como os diferentes usos do cinema, e ainda ao
final, reproduziram o documentário que serviu de base para a pesquisa,
neste momento atuei como interprete para mediar a comunicação entre
surdos e ouvintes ali presentes.
Conclusão
Referências
32
FURET, François. A Oficina da história. Lisboa: Gradiva, s.d.
Sites
https://www.youtube.com/watch?v=CNWYp8WLwIE&t=307s.
Acesso em: 02 dez. 2017.
http://studioigaradeanimadores.blogspot.com.br/. Acesso em 18
dez. 2017.
http://www.ideiacriativa.org/2014/03/alfabeto-de-parede-em-libras-
para.html
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34
HISTÓRIA E IMAGEM: REFLEXÕES SOBRE AS CHARGES
E O ENSINO DE HISTÓRIA
35
uma característica exclusiva da contemporaneidade. A imagem está no
cotidiano das sociedades humanas anteriormente à escrita, tornando-se
uma das formas mais antigas de comunicação. Seus usos e objetivos
foram variáveis na história e as intencionalidades apontam para o poder
que ela tem em seus múltiplos interesses (PAIVA, 2006).
As reflexões sobre história e imagem são pertinentes para a
historiografia e também para o ensino de história, na medida em que a
presença das imagens na vida humana tem sido recorrente ao longo do
tempo. Esse campo de estudos e os usos da imagem tem se tornado cada
vez mais próximo dos historiadores e professores de história, uma vez
que as discussões específicas e interdisciplinares possibilitam retornos
de pesquisa e de ensino que são muito proveitosos. É necessário,
portanto, problematizar essa relação da história com a imagem para que
se possa refletir teórica e metodologicamente sobre seus usos pela
historiografia e mais especificamente pelo conhecimento histórico no
espaço escolar.
Para tanto, inicialmente é preciso refletir sobre o que é imagem.
Qual o conceito de imagem? O que caracteriza uma imagem? Talvez
pareça desnecessário refletir sobre o conceito de imagem, já que
facilmente conseguimos nos relacionar com a ideia da linguagem
visual. Mas é exatamente sua naturalização que torna necessária
problematizar. A pesquisadora Leonor Amaral aponta que essa
discussão sobre imagem não é nova, pois remonta a antiguidade e a
filosofia grega com Platão ao retratar o mito da caverna, onde há relação
do mundo real e o mundo das sombras e reflexos. Nesse sentido
platônico, a imagem seria entendida como espelho do real (AREAL,
2003, p. 59). Essa compreensão abstrata da imagem leva à múltiplos
questionamentos: imagem é a verdade mais valiosa do que as palavras?
É um espelho do real? É uma representação? Essas são algumas
reflexões pertinentes para iniciar esse debate teórico.
A palavra imagem tem origem no latim, imago e significa
semelhança, representação, retrato (PIETROFORTE, 2017, p. 34). Há
autores que apontam sua origem etimológica como eidolon,
36
significando “fantasma dos mortos”, “espectro” e somente depois passa
a ser representação, retrato (DEBRAY apud MONTEIRO, 2013, p. 4).
Antonio Pietroforte afirma que a palavra imagem é polissêmica, pois
em seu diálogo com os campos de estudo da semiótica2 pode referir-se
à imagem na fotografia, no cinema, na pintura entre outras inúmeras
formas de linguagem visual, mas também ao texto escrito, já que antes
de se ler, qualquer que seja a escrita, é visual (PIETROFORTE, op. cit.
p. 33). Nesse sentido, a imagem não possui uma única definição e não
está relacionada apenas a iconografia. Sendo assim, ele afirma que
podemos definir, de forma geral, que a imagem está ligada a
“representação e pode referir-se ao que se vê, ouve-se ou se imagina”
(Idem, Ibidem, p. 34). A ideia de imagem está relacionada a uma
diversidade de tipos imagéticos: imagem ótica, mental, sonora, literária
entre outras (AREAL, op. cit. p. 59-80). É o sentido mais abrangente
do conceito de imagem. Essa definição conceitual parte da perspectiva
etimológica e linguística e se relaciona com os campos de discussão da
semiótica de forma mais geral. No entanto, como essa linha de
pensamento abarca os elementos mais amplos e detalhados da estrutura
e dos significados plásticos, linguísticos e estilísticos da imagem,
inclusive abarcando a questão textual e mental, ou seja, a imagem é tudo
que se visualiza (materializado ou não, iconográfico ou não) não nos
serviremos dessa base teórica, embora seja importante explicitá-la e
também dialoguemos com a mesma quando for pertinente.
Em contrapartida a essa visão mais ampla sobre a imagem, há
uma perspectiva que aponta para a imagem, enquanto elemento icônico,
enfatizando o aspecto da iconografia no sentido visual como
proeminente3. Essa forma de entender a imagem parte do princípio da
37
especificidade da linguagem visual em detrimento do imaginário, e é
compreendida como uma construção social e cultural, considerada
como fonte histórica de um dado tempo e como tal, deve ser pensada e
analisada pelo historiador.
Enquanto há uma linha de pensamento que supervaloriza a
imagem (como na epígrafe do artigo), defendendo que a imagem é
superior à escrita ou a oralidade, Burke afirma que “[...] as imagens são
feitas para comunicar. Num outro sentido, elas nada nos revelam.
Imagens são irremediavelmente mudas” (BURKE, op. cit. p. 43). O
historiador, nesse sentido, não pode esperar que a imagem “fale” por si
só. Tal como as demais fontes históricas, a imagem deve ser
interrogada, problematizada, criticada, já que as mesmas possuem
prerrogativas de documento para a produção da pesquisa histórica.
Além do aspecto da consideração da imagem como produção
cultural e social de uma dada sociedade no tempo e de ser uma fonte
histórica, a imagem, quando relacionada ao ensino de história e/ou ao
espaço da sala de aula em geral, é considerada como um recurso
didático, que contribui com a relação de ensino e aprendizagem. Esses
três aspectos dizem muito sobre o conceito de imagem que se propõe
aqui. Outro aspecto teórico é apontado por Martine Joly, pois afirma
que a imagem é sempre passível do sujeito para produzi-la ou
reconhece-la, pois é uma construção (JOLY, 1994, p. 13). Esse dado é
fundamental, pois as imagens em geral são tratadas como o recorte do
real, inerte em uma fotografia ou mesmo a imitação, cópia ou
representação de um evento ou fato histórico, personagem ou qualquer
que seja materializado em suportes.
Atrelado a essa discussão sobre o aspecto da imagem como
elemento construído pelo sujeito, Joly aponta mais um elemento
interessante em relação ao debate teórico sobre imagem. Ou seja, a
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imagem sempre necessita de outro elemento real, pois a mesma se
caracteriza como uma representação, um espelho construído. Não
haveria imagem sem haver um elemento real, pois a primeira é reflexo
ou representação do segundo. Maria Lúcia Kern concorda com essa
premissa ao afirmar que: “desde o princípio, a imagem esteve
relacionada à representação e à imitação do real” (KERN apud
MONTEIRO, op. cit. p. 4). Esse debate sobre a imagem abrange áreas
distintas do conhecimento desde a linguística e semiótica até a arte e a
história. Os posicionamentos se dão, portanto, de acordo com as
especificidades das destas áreas, embora não seja possível aprofundar a
discussão sem que haja essa reflexão entre esses diversos campos de
saber. Por exemplo, Joly afirma que:
No domínio da arte, com efeito, a noção de
imagem está ligada essencialmente à
representação visual: frescos e pinturas, mas
também iluminuras, ilustrações decorativas,
desenho, gravura, filmes, vídeo, fotografia e
mesmo imagens compostas. A estuária (sic) é
mais raramente considerada como imagem
(JOLY, op. cit. p. 19).
39
seus desdobramentos teórico-metodológicos, como veremos mais
adiante.
Dialogando com Ralf Bohnsack, Vinicius Liebel afirma que os
estudos relacionados à imagem podem partir de duas perspectivas. Uma
seria a compreensão “sobre a imagem” e outra “através da imagem”
(LIEBEL, 2011, p. 173). Isto significa que a primeira reflete sobre a
imagem a partir de si própria, com os elementos de composição da
mesma, considerando a obra de forma interna. A segunda aponta para a
compreensão para além da imagem, ou seja, do próprio contexto
histórico na qual foi produzida e que está presente na imagem produzida
por alguém inserido nesse contexto. Essa discussão de Bohnsack é
pertinente, pois alia duas perspectivas que não podem ser deixadas de
lado pelos historiadores: a análise da fonte em si, mas também sua
relação com o contexto. O cruzamento metodológico desses aspectos é
capaz de construir interpretações mais complexas e completas de um
dado tempo. É algo semelhante a chamada análise do discurso4, na qual
um texto só é passível de compreensão e interpretação se analisado de
forma contextualizada, extrapolando o aspecto hermenêutico do
mesmo.
Nesse sentido, a ideia de imagem que se pensa neste artigo é
compreendida como uma construção social e cultural, fonte histórica e
recurso didático e está relacionada à imagem estática, com ou sem
acompanhamento textual, em formato iconográfico com predominância
não verbal em diálogo com o texto, pois quando tratamos das charges,
especificamente, esse sentido apresentado por Pietroforte será retomado
em alguns momentos.
Para especificar um pouco essa discussão generalizada sobre o
conceito de imagem, discutiremos sobre as iconografias que mais nos
40
interessa nesse trabalho – as charges. Dentre os tipos de imagens mais
comuns que existem em nosso cotidiano atualmente, estão as charges.
Elas estão presentes nos jornais televisivos ou impressos, nas redes
sociais, nos livros e revistas, enfim, em diferentes lugares e suportes,
que se tornam acessíveis a qualquer pessoa. Entretanto, inicialmente é
necessário um debate sobre o conceito de charge. A charge é um gênero
que pode ser caracterizado como uma linguagem e um instrumento
didático bastante interessante para a aprendizagem da história por
conseguir aliar uma série de elementos intrínsecos ao gênero e outros
específicos de cada charge em si. Apesar de haver um uso do termo
charge atrelado à ideia de caricatura como se ambos fossem o mesmo,
existem diferenças importantes como aponta Marcelo Romero em seu
artigo Charge: História e Conceito, ao buscar analisar as
transformações no conceito de charge desde sua origem. Para o autor
apesar de hoje haver uma forte conexão entre charge e caricatura, essa
associação se deu a posteriore.
Etimologicamente a palavra charge advém do francês (mas
também pode ter sua origem no italiano caricari, com o mesmo
significado) e tem o sentido de carga, de carregar em exagero e/ou
distorção de uma representação de alguém. Essa prática remonta ao
século XVII com os irmãos Agostinho e Annibale Carracci (ROMERO,
2014, p. 18). As nomenclaturas podem ter o mesmo significado,
entretanto, carregar era a intenção e caricari era a técnica usada para
alcançar o objetivo de carregar.
A questão do exagero na construção de uma representação de
alguém não era a única intencionalidade das primeiras charges. E o
exagero não era no sentindo cômico como se faz atualmente, ou seja, se
usa os traços exagerados para dar o tom engraçado, mas Romero aponta
que esse exagero era com a intenção de destacar um traço de
deformidade no caráter (revelar o verdadeiro caráter) ou um aspecto
grandioso de um determinado personagem. O historiador Ernest
Gombrich afirmava que tal como o pintor desejava revelar o caráter da
41
sua tela, também “o caricaturista tem um objetivo correspondente”
(GOMBRICH apud ROMERO, p. 19).
Nesse sentido, podemos interpretar que essas charges não
tinham apenas o caráter cômico seja na intenção ou na arte em si, pois
a conotação cômica fora sendo incorporada ao longo do tempo nesse
tipo de imagem. Sendo assim, havia não apenas um elemento e objetivo,
mas vários outros tais como: exagero não cômico dos traços marcantes,
revelação dos defeitos do caráter e a mostra da grandiosidade de um
personagem. Com o tempo o elemento da caricatura é desvencilhado da
charge e esta última ganha contornos próprios, associados ao cartum,
que não estivessem necessariamente ligados a deformação do
personagem (Idem, ibidem, p. 21). Nesse sentido Romero afirma que:
42
por muitos artistas e estudiosos como sinônimos, devido a essa
proximidade histórica que as etimologias e os termos possuem. Embora
cada um tenha uma especificidade, há quem trabalhe com caricatura e
charge como sendo a mesma coisa (MOTTA, 2006).
43
propagandas, charges, desenhos, mapas: tudo
pode servir ao único grande objetivo da escola:
ajudar a ler o mundo, não apenas a ler letras
(KARNAL, 2010, p. 20).
44
Outro aspecto importante é a mensagem diferenciada de outros
tipos de imagens como a pintura ou a fotografia. A charge traz o aspecto
do cômico e da sátira, como elemento fundamental de sua composição
e que talvez seja um dos que mais chame a atenção não apenas dos
alunos, mas de qualquer leitor. As charges provocam o riso, pois tornam
uma situação que é crítica e complicada em compreensiva através da
comicidade. O riso é um elemento importante nesse sentido. Fruto de
estudos profundos (MINOIS, 2003), ele é capaz de gerar interesse nos
alunos e “prender sua atenção”.
Georges Minois faz um estudo importante sobre a temática do
riso (e do escárnio) e traz algumas contribuições para esse debate.
Utilizando o termo de Gilles Lipovetsky, Minois afirma que estamos
imersos em uma “sociedade humorística” (MINOIS, Idem, ibidem, p.
15). O humor é um elemento interessante para uso na sala de aula
(SALIBA, 2002). As demandas dos alunos perpassam por essa questão
também. É comum encontrar alunos que reclamam de professores
carrancudos e embora não seja uma exigência profissional, podemos
afirmar que entre uma aula sisuda e uma que faz uso de estratégias
humorísticas os discentes têm mais possibilidades de aprender. Embora
isto seja uma generalização que deva ser feita com os devidos cuidados,
é inegável que muitos alunos mobilizem a memória de algo engraçado
que o professor disse, do que o conteúdo propriamente dito.
Quando os alunos têm contato com uma charge nas aulas, após
uma leitura rápida da imagem (“abreviação narrativa” para Rüsen), o
riso é o resultado de uma interpretação da mensagem que a charge
trouxe. Mas não é apenas o entendimento da ideia que traz o riso, pois
existem charges que criticam, ironizam e satirizam o tema, mas o que
traz as gargalhadas são os aspectos disformes dos personagens, ou as
expressões ou ainda os traços dos desenhos. Isto significa que o riso é
um aspecto mobilizador de sentidos e significados que os leitores (no
caso os alunos) que aliam o cômico as operações mentais da consciência
histórica da experiência e da interpretação, pois a primeira está ligada
aos conhecimentos prévios e aos saberes individuais e coletivos que
45
cada pessoa tem e a segunda ao contato desse arcabouço anterior com
novos temas, discussões e problemas trazidos na sala de aula. O
encontro da experiência existente com novas problemáticas e
perspectivas trazidas pelo professor geram interpretações e
ressignificações desses conhecimentos.
O aspecto da ironia, da metáfora e da ambiguidade, ou seja,
elementos que aguçam a capacidade interpretativa, a percepção e
compreensão crítica de uma discussão sobre um dado tema, também são
essenciais7. É possível através da charge ri, mas ao mesmo tempo
refletir, questionar, criticar e entender os discursos e interesses.
É lugar comum entre os historiadores do campo do ensino de
história que a formação dos alunos da educação básica deva
necessariamente perpassar pelo desenvolvimento de capacidades de
compreender, analisar, comparar, criticar, refletir. Tornou-se até um
“jargão”, que um dos objetivos do ensino de história seja a formação de
um aluno que pense e que seja crítico. Entretanto, as práticas de aulas
em forma de monólogos ou mesmo de uso tradicional dos livros
didáticos acabam por efetivar formações de alunos que tenham muitas
dificuldades com essas competências.
As charges, com seus elementos intrínsecos, instigam os alunos
a desenvolverem esse tipo de práticas. Observação, atenção, capacidade
de relacionar, de comparar, aumento da percepção dos sentidos e dos
significados dos elementos de uma charge, todos esses aspectos são
possibilitados pela charge. Se queremos que as imagens, e no nosso
caso, as charges sejam interpretadas de forma efetiva por nossos alunos
46
é necessário que mudemos nossa postura no tratamento das mesmas. A
ironia, o duplo sentido e a metáfora, elementos usuais em uma charge,
estão atreladas à dimensão da interpretação mobilizada pela consciência
histórica.
Por exemplo, a interpretação possibilitada por um tipo de
consciência histórica tradicional é diferente de uma compreensão da
consciência histórica crítica. Os elementos analisados em uma imagem
dependem da percepção de cada um, considerando o aspecto cognitivo,
mas as interpretações e a maneira de enxergar essas mensagens das
charges se diferenciam, dependendo da tipologia de consciência
histórica predominante.
Mais um ponto interessante sobre as charges é a mobilização
de conhecimentos prévios8, atualizados ou passados. Essa “exigência”
das charges contribui para aumentar o interesse dos alunos em relação
aos temas que são próprios do seu arcabouço de conhecimentos, pois
estão ligados às suas realidades. Essa mobilização se dá a partir da
memória, dos signos, dos símbolos para poder relacionar à mensagem
das charges.
Conhecimentos prévios fazem parte da primeira dimensão da
consciência histórica ruseniana, ou seja, a experiência. Esse aspecto é
pensado por Rüsen com as bases de discussões propostas por Reinhart
Koselleck e o conceito de “espaço de experiência” (KOSELLECK,
2006, p. 305-327). Os conhecimentos que os alunos já trazem consigo
são mobilizados, sejam eles advindos do senso comum, da história
47
ensinada ou mesmo das “narrativas concorrentes”9 para a leitura e
interpretação das charges.
Nepotismo
48
A capacidade de síntese de uma discussão maior e mais
complexa também é outro elemento importante das charges. Em uma
única imagem, a riqueza e a sutileza acabam por dar margem a reflexões
mais profundas e compreensões de temas complexos. Esse ponto se
relaciona com o debate feito sobre a ideia de que, para Rüsen, as
imagens são “abreviações narrativas” (FRONZA, 2014, p. 176), tão
importantes quanto as narrativas escritas. Isto significa que a charge
carrega um poder de sintetizar uma discussão política, uma crítica social
ou qualquer tipo de tema, sem precisar de muitas palavras ou muitas
imagens.
Bem-vindo 2017
49
personagem que representa 2017 está a olhar assustado para o ano que
está encerrando.
A síntese de um ano difícil na política brasileira, marcada pela
corrupção e pelos escândalos, noticiados no Brasil e no mundo
chegaram aos nossos alunos, que conseguiram relacionar tal charge
com esses problemas. A metodologia de reflexão foi um debate com os
alunos que puderam expor suas posições sobre a política, citando: a
lava-jato, o impeachment, os desvios de dinheiro públicos, as prisões
de políticos entre outras questões. Essas reflexões foram importantes
para pensar na capacidade de síntese que uma charge pode ter e ao
mesmo tempo nas possibilidades dessas charges gerarem discussões
amplas e complexas.
A dimensão temporal também pode e deve ser trabalhada em
relação às charges, pois é um aspecto importantíssimo para a história,
seu ensino e para a consciência histórica. Pensar no “quando” a
iconografia humorística foi produzida nos diz muito sobre o contexto
de uma época. Esse aspecto está intimamente relacionado com a
concepção de imagem como fonte histórica, pois uma charge pode ser
produzida “no” ou “sobre” um contexto histórico.
O tipo de consciência histórica genética, construído por Rüsen,
apresenta uma característica interessante e fundamental para o ensino
de história e para a aprendizagem histórica10. É o aspecto da noção de
historicidade. Esse elemento é muito caro para a história e para seu
10
50
ensino. Essa possibilidade de compreensão das características do tempo
pelos alunos, a partir da consciência histórica, contribui de forma
significativa para o processo de ensino e aprendizagem.
Conclusão
Referências
51
BURKE, Peter. Testemunha Ocular: História e imagem. Bauru, SP:
EDUSC, 2004.
52
LIEBEL, Vinicius. Entre sentidos e interpretações: apontamentos
sobre análise documentária de imagens. ETD (Educação Temática
Digital), Campinas, v. 12, n. 2, jan.-jun., 2011, p. 173.
MARTINS, Estevão Rezende. Historicidade e consciência histórica. In:
SCHIMIDT, Maria Auxiliadora et al. (Orgs.). Jörn Rüsen e o ensino de
história. Curitiba: Editora UFPR, 2011.
MINOIS, Georges. A história do riso e do escárnio. São Paulo: Editora
Unesp, 2003.
MONTEIRO, Charles. Pensando sobre história, imagem e cultura
visual. Revista Patrimônio e Memória. São Paulo, Unesp, v. 9, n.2, p.
3-16, julho-dezembro, 2013.
MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Jango e o golpe de 1964 na caricatura. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.
OLIVEIRA, Arineia Olga de. O uso de tiras, cartuns e charges nas
aulas de língua portuguesa do ensino médio. Cadernos PDE –
Produções didático-pedagógicas. Os desafios da escola pública
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construção da imagem. 2ª ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto,
2017.
ROMERO, Marcelo. Charge: história e conceito. CES Revista, Juiz de
Fora, v. 28, n. 1, jan./dez. 2014.
53
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partir do caso alemão. Práxis Educativa, Ponta Grossa-PR, v. 1, n. 1,
15 de jul.-dez., 2006.
54
AS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO E
O ENSINO DE HISTÓRIA
Introdução
55
modernos, de última geração, que facilitam nossas vidas ou que estejam
ligados à área de entretenimento como nos jogos de vídeo game,
aplicativos para celulares e a informática em geral. Mas tecnologia não
é somente isso, é muito mais, abrangendo inúmeras outras coisas que,
de tão obvias, acabam passando despercebidas aos olhos das pessoas.
Para Lemos (2002) o homem é um ser técnico por definição, e
essa técnica se situa como uma evolução zoológica da espécie humana
na sua confrontação com a natureza, portanto, segundo ele, a
tecnicidade humana aparece como uma tendência universal e
hegemônica, sendo a primeira característica do fenômeno humano.
Kneller (1978), diz que as palavras tecnologia e técnica tem
origem na Grécia, techné em grego, tendo um sentido em se alterar o
mundo de forma prática. A palavra tecnologia provém de uma junção
do termo tecno, do grego tchné, que é saber fazer, e logia, do grego
logus, que significa razão. Assim, tecnologia significa a razão do saber
fazer (RODRIGUES, 2001).
Segundo Mendes (2011), no século XXI se constata que a
sociedade produz e acolhe inovações tecnológicas em ritmo acelerado,
como computadores, smartphones, notebooks, jogos eletrônicos,
somados aos antigos meios de comunicação de massa, como o rádio, a
TV, o cinema e dentre outros que geram um bombardeio de
informações para as pessoas, configurando a chamada sociedade da
informação, fazendo com que tenhamos mais informações diárias do
que as pessoas de séculos anteriores tinham em sua vida inteira.
As novas gerações do século XXI são chamadas de Nativos
Digitais2, pois nasceram e cresceram convivendo com o mundo digital,
Esse termo foi cunhado pelo educador americano Marc Prensky. Ver
mais em PRENSKY, M.: Digital Natives Digital Immigrants. In: PRENSKY,
Marc. On the Horizon. NCB University Press, Vol. 9 No. 5, Outubro, 2001.
Disponível em: https://www.marcprensky.com/writing/Prensky%20-
56
estão frequentemente conectadas à internet, interagem com amigos
reais e virtuais, se informam e se divertem através das redes sociais, ou
seja, fazem parte de um grupo que tem nas Tecnologias de Informação
e Comunicação (TIC’s), quase que uma extensão do seu corpo.
Nesse ponto se observa que essas inovações tecnológicas
provocam marcas profundas na sociedade, contribuindo para
transformações no âmbito social, cultural, político, econômico,
filosófico ou institucional. Dando segmento a essa ideia, Moran (2000)
comenta que, assim como ocorrem mudanças na sociedade, seja nas
formas de organização, de produção de bens, de como as pessoas se
divertem ou comercializam, o campo da educação está muito
pressionado para mudar também, por isso os educadores e mais
especificamente os professores de história devem ficar atentos a tais
mudanças e adequarem as suas metodologias de ensino ou
desenvolverem outras para que possam estar inseridos com mais
intensidade nessa nova sociedade de informação.
Para Ginzburg (2010), a nossa existência é altamente
modificada pela chamada revolução tecnológica, mas a partir do século
XX, com a revolução digital3 é que as mudanças tiveram um ritmo mais
acelerado. Essas modificações podem ser facilmente observadas,
inclusive em relação à leitura, onde Chartier (2009), diz que isso fez
com que a própria maneira de se ler fosse alterada, não somente pelo
surgimento do livro eletrônico, mas também pela forma com que os
textos são reproduzidos e de como e onde se lê.
%20Digital%20Natives,%20Digital%20Immigrants%20-%20Part1.pdf.
Acesso em 22/08/2017.
3
57
Cecília Tavares (2012), explica que “desde a década de 1960,
os historiadores que trabalham com longas séries de informações
geradas por fontes demográficas e econômicas começaram a usar
computadores”, isso aconteceu, sobretudo por conta da capacidade de
armazenamento desses equipamentos, mas, além disso, podemos
destacar também a nova possibilidade de se trabalhar com programas
que continham modelos matemáticos e estatísticos proporcionando
certa segurança nas análises de registros em seu conjunto.
O impacto que a internet, por exemplo, teve para os
historiadores está relacionado inicialmente a formação de grupos de
discussão, que foi importante dentro das possibilidades de formação de
bancos de dados, onde documentos estariam protegidos de forma
digital, somando-se a isso, a possibilidade de acesso a textos em revistas
digitais (POIRRIER, 2010), e logicamente, que se insere neste contexto,
a divulgação do conhecimento histórico, que se modificou com a
criação de novas plataformas tecnológicas, inclusive digitais.
58
propõem o desenvolvimento de capacidades e habilidades cognitivas,
tais como: estabelecer relações históricas entre o passado e o tempo
presente, valorizar o patrimônio sociocultural e o direito à cidadania,
respeitando a diversidade social, étnica e cultural dos povos.
Um dos desdobramentos referentes a esses debates foi pensar o
ato de ensinar, mais especificamente ensinar História, como algo que
requer um diálogo permanente com diferentes saberes, produzidos em
diferentes níveis e espaços (QUEIROZ, 2002), tornando obsoletos os
propósitos da escola tradicional4 relatada por Nadai (1993), onde a
disciplina História seria engessada nas questões de ordenação mecânica
de fatos, com uma visão eurocêntrica, como se não houvesse história
sem a presença dos europeus, exaltando as tidas “grandes figuras”,
como reis imperadores e presidentes e focando em decorar datas.
Ferreira (1999) aponta alguns pontos interessantes que são
relevantes para o entendimento do desinteresse dos alunos:
59
educacionais, ou seja, a permanência de uma escola tradicional que se
sustenta ainda na aquisição cumulativa de informações. Logicamente,
que houve mudanças para os tempos atuais (século XXI), mesmo que
ainda existam permanências citadas anteriormente, e uma delas é o
trabalho da história de forma crítica, colocando os alunos, assim como
os professores, como protagonistas, concebendo o currículo como uma
construção e valorizando a pluralidade cultural.
Nesse sentido, são importantes as novas abordagens no ensino
de História para que o processo de ensino e de aprendizagem seja
proveitoso tanto para os professores, quanto para os alunos, e essas
novas abordagens e novas linguagens também devem estar interligadas
ao contexto em que os alunos se inserem, na chamada Era Digital,
sempre tendo cautela. Karnal (2007) explica que as aulas podem ser
extremamente conservadoras e ultrapassadas (seguindo a ideia de
tradicional frisado anteriormente), mesmo contando com todos os mais
modernos meios audiovisuais, como smartv e datashow, por exemplo.
Complementando essa ideia, Anita Lucchesi e Bruno Carvalho (2016)
fazem também uma crítica ao pensamento de redenção da história por
meio das tecnologias, já que segundo eles não existe “solucionismo”
tecnológico.
Portanto, utilizar as tecnologias no ensino de história pode ser
benéfico, mas:
60
Levando em consideração essa informação, Sonia Miranda
(2012) diz que um dos desafios que a aprendizagem histórica tem nos
dias de hoje é exatamente fazer a interlocução entre o nosso campo de
saber e os novos tipos de processos educativos. No tocante a educação,
a busca por melhoria deve ser constante, mas para que isso aconteça:
A qualidade da educação envolve dimensões extra
e intraescolares e, nessa ótica, devem se
considerar os diferentes atores, a dinâmica
pedagógica, ou seja, os processos de ensino-
aprendizagem, os currículos, as expectativas de
aprendizagem, bem como os diferentes fatores
extraescolares (...) (DOURADO; OLIVEIRA,
2009, p. 205).
61
História. Somando-se a isso, Flávia Caimi (2006) acrescenta que
somente terá o efeito esperado (o processo de ensino), no momento em
que o professor perceber que não basta se apropriar do conhecimento
histórico, como também preocupar-se com o estudo da aprendizagem
para assim, tentar compreender como pensa o jovem, ou seja, é
interessante o conhecimento das orientações e diretrizes educacionais,
como também da capacidade de se atualizar frente à demanda
tecnológica e estudantil que se apresenta no século XXI.
Fazer o uso das TIC’s é importante no ensino de História e saber
utilizá-las como ferramentas pedagógicas é muito importante, já que
essas novas tecnologias representam, evidentemente, novos desafios
para a mídia-educação, que deve aprender a lidar com uma cultura
midiática muito mais interativa e participativa entre os jovens.
O professor deve conhecer as particularidades do ambiente
onde se vai trabalhar e observar o espaço escolar, pois é sabido que em
muitas escolas não se encontra tais ferramentas ou estas estão em
péssimas condições de utilização, fazendo com que não ocorra uma
adequação com a proposta de ensino, e assim utilizar o chamado “plano
B”, como o uso do smartphone do professor para demonstrações de
imagens, por exemplo. Dentro dessas novas tecnologias, a internet sem
sombra de dúvidas é uma das principais ferramentas digitais que
possibilita diversas formas de comunicação e proporcionam a
interdisciplinaridade5 da educação (MERCADO, 2002).
Os professores devem se atualizar e se capacitar para atender as
demandas que pululam o meio escolar, uma vez que estão cheios de
jovens e crianças que tem as tecnologias como parte de seu cotidiano,
por isso é interessante perceber que:
62
(...) a tecnologia tende a apresentar novidades a
cada dia e assim aumenta a demanda por uma
educação que privilegie o uso das linguagens das
tecnologias, aumentando também a demanda por
professores que as utilizem em processos
significativos de aprendizagem. Com essas novas
demandas, muitos professores estão buscando
novos caminhos, mas são poucos os que
encontram caminhos que sejam diferentes de uma
educação tradicional, centrada na informação
(SCHERER, 2003, p. 270).
63
Ao mesmo tempo em que se ampliou a pesquisa
histórica nas últimas décadas, expandiu-se a
infraestrutura e popularizou-se o uso da
informática, resultando num amplo esforço de
digitalização e publicação de fontes históricas, por
meio de sofisticadas plataformas virtuais ligadas a
museus, bibliotecas, arquivos e empresas
jornalísticas, vistas também como uma
modernização praticamente obrigatória,
incentivada por políticas públicas. (ROSA, 2011,
p.14)
64
segundo o autor, com que aumente também a demanda por professores
que as utilizem em processos significativos de aprendizagem.
O uso da internet tem crescido muito entre crianças e
adolescentes e isso pode ser facilmente observado, basta olharmos em
nosso cotidiano ou mesmo na escola para comprovar tal afirmação.
Sustentando essa ideia, a pesquisa Kids Online 2015, feita pelo Centro
de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação do
Comitê Gestor da Internet no Brasil (2016), apontou que 79% das
crianças e adolescentes no Brasil de 9 a 17 anos são usuários de internet,
isso representa mais de 23 milhões de pessoas nessa faixa etária. A
pesquisa, ainda, aponta que o objeto mais utilizado para acessar a
internet é o celular, seguido pelo computador de mesa, notebooks, etc.
Esse tipo de tecnologia também pode ser utilizado como
ferramenta pedagógica nas aulas de história, pois existem jogos com
temas históricos, aplicativos específicos para a disciplina História, além
de pesquisas que podem ser feitas no aparelho, buscando imagens,
vídeos e textos que possam tornar a aula mais dinâmica e interessante.
O papel do professor é importante, pois pode direcionar a
pesquisa ou mesmo deixá-la livre, se preferir, para depois debater com
os alunos acerca do que foi encontrado, observando as diversas visões
dos alunos, referentes aos temas propostos em sala de aula, como “a
segunda guerra mundial”, por exemplo, fazendo os alunos pesquisarem
a batalha de Stalingrado.
Não se pode hoje em dia, em qualquer profissão, se eximir de
trabalhar com as tecnologias existentes, e para os professores a
realidade não é diferente, haja vista que vivemos na chamada Era
Digital, onde os tablets, notebooks e smartphones fazem parte do
cotidiano das pessoas, inclusive dos estudantes, e é fundamental a
utilização das novas linguagens aplicadas no ensino de História, mas
sem a substituição dos conteúdos da disciplina propriamente dita, e sim
fazendo um diálogo ou uma incorporação dessas ferramentas para a
educação.
65
Gerar o interesse nos alunos para o estudo da História é um dos
maiores desafios para os professores, e por isso “levar em conta o
universo da criança ou do adolescente não é, pois, abdicar do rigor
intelectual ou do valor do conhecimento histórico, mas garantir que a
apropriação deste conhecimento ocorra permeada de sentido e
significação (...)” (CAIMI, 2006). As diversas possibilidades
proporcionadas pela internet e, dentro disso, as redes sociais como o
Facebook, nos dão uma infinidade de ferramentas, que sabendo
trabalhá-las podem gerar profícuos trabalhos. Para Lucia Santaella
(2007)
66
os trabalhadores se valem para executar uma tarefa, nesse sentido, as
tecnologias podem ser usadas como ferramentas pedagógicas com o
intuito de fornecer aos alunos, dentro e fora da sala de aula, uma nova
experiência, com troca de conteúdos didáticos que facilitem o ensino e
o aprendizado.
Michel de Certeau (1998) já dizia que cada sociedade se pensa
“historicamente” com os instrumentos que lhe são próprios, no nosso
caso, que estamos inseridos na sociedade da informação, temos como
instrumentos, as novas tecnologias de informação e comunicação
(NTIC), como os smartphones, tablets, vídeo games, smartvs e dentre
outros, que estão conosco quase que o tempo todo, como uma extensão
do nosso corpo.
Conclusão
Referências
67
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais: História / Secretaria de Educação
Fundamental – Brasília: MEC/SEF, 1998.
68
FERREIRA, Carlos Augusto Lima. Ensino de História e a
incorporação das novas tecnologias da informação e comunicação:
uma reflexão. In: Revista de História Regional. Ponta Grossa:
Departamento de História: Universidade Estadual de Ponta Grossa,
1999, Vol. 4 – nº 2, p. 139/156.
69
MAIATO, Alexandra Moraes. Neurociências e aprendizagem: O papel
da experimentação no ensino de ciências. 2013. 81 f. Dissertação
(Mestrado) - Curso de Programa de Pós-graduação em Educação em
Ciências, Universidade Federal do Rio Grande - Furg, Rio Grande,
2013.
70
Nicolas (Dir.). Historiographies. concepts et débats. Paris: Gallimard,
2010.
71
72
FONTES NA PEDRA: O USO DA PINTURA RUPESTRE NO
SEXTO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
73
merecem até mesmo mais atenção de estudiosos em detrimento de
outras2.
Ao sentir esta necessidade de problematizar com os alunos
sobre este preconceito com relação ao período “pré-histórico”, escolhi
como referência a pintura rupestre. Ela se configura como uma fonte
histórica, que mesmo sendo evidenciada nos manuais didáticos de
ensino fundamental, pouco se explora nos capítulos destinados ao
entendimento do trabalho desempenhado pelos historiadores, ou para as
fontes históricas em específico. Fazer uso deste vestígio, que muito se
relaciona no imaginário dos estudantes a um período de “pouco
desenvolvimento”, é de suma importância para que se possa promover
um melhor entendimento deste período da existência humana que é
tradicionalmente estigmatizado.
Apesar de seus problemas, não podemos nos abster do uso dos
livros didáticos em nossa prática em sala de aula, uma vez que ele se
constitui, em especial para os alunos, como uma das suas fontes de
informação. Ao analisar alguns manuais didáticos fornecidos na rede
estadual de ensino no estado do Pará (em especial os que constituem o
Plano Nacional de Livro Didático (PNLD 2017, 2018 e 2019), são raras
as referências à pintura rupestre no capítulo que trata especificamente
do trabalho com as fontes históricas. Vários foram os manuais didáticos
que foram disponibilizados para a análise aos professores de História
da EEEFM Professor Waldemar Ribeiro, também para docentes de
várias escolas da rede estadual. O livro escolhido para as turmas de
sexto ano foi o da Patrícia Ramos Braick, “Ensinar história: das origens
do homem à era digital”.
74
Este artigo busca explicitar uma prática de ensino que toma
como ponto de partida a aplicação de um questionário em sala de aula.
Os estudantes serão questionados sobre seu entendimento no que diz
respeito ao registro rupestre (com a apresentação de uma pintura
rupestre) e sobre quem teria produzido tais vestígios. Após a
identificação dos conceitos que serão expostos nas respostas dos
estudantes, eles serão estimulados a refletir sobre a supervalorização
dos registros escritos e a marginalização dos registros não escritos (em
especial a pintura rupestre).
A atividade foi aplicada na Escola Estadual de Ensino Médio e
Fundamental Professor Waldemar Ribeiro (escola que estou lotado no
município de Belém). Vale a pena destacar que se trata de uma escola
que conta com algumas condições básicas para que o processo ensino-
aprendizagem ocorra de maneira satisfatória (destaque para as salas de
aula que contam com condicionadores de ar, que mesmo apresentando
problemas, amenizam o forte calor característico de nossa região). Foi
aplicada a estratégia de ensino na turma do sexto ano do período
matutino (vale ressaltar que esta é a única turma de sexto ano do ensino
fundamental que se encontra em minha lotação de 2017).
Sem dúvida que uma das formas mais recorrentes de
representação de tempo nos manuais didáticos, em especial nos
destinados ao sexto ano do ensino fundamental, são as linhas do tempo.
Sônia Regina Miranda discorre da seguinte forma sobre as linhas do
tempo presentes nos livros didáticos do PNLD de 2005 e 2011:
75
entendido como algo que se desenrola em função
de um sentido de sequência e de uma perspectiva
genético-evolutiva (MIRANDA, 2012, p. 252).
Imagem 1
76
praticamente de lado nos manuais didáticos que tive contato ao longo
de minha experiência como professor do ensino básico:
77
de Ensino Médio e Fundamental Professor Waldemar Ribeiro) também
se configura como proposta nos PCNs:
78
não existem. Com tudo o que a habilidade do
historiador lhe permite utilizar para fabricar o seu
mel, na falta das flores habituais. Logo, com
palavras. Signos. Paisagens e telhas. Com as
formas do campo e das ervas daninhas. [...] Numa
palavra, com tudo o que, pertencendo ao homem,
depende do homem, serve o homem, exprime o
homem, demonstra a presença, a atividade, os
gostos e as maneiras de ser do homem (FEBVRE
apud LE GOFF, 1998, p. 530).
79
o século XIX – História Antiga, Medieval,
Moderna e Contemporânea – está presente em
grande parte dos livros didáticos: retrocede-se às
origens estabelecendo-se trajetórias homogêneas
do passado ao presente, e a organização dos
acontecimentos é feita com base na perspectiva de
evolução” (BEZERRA, 2003, p. 37-49).
80
espécies que antecederam à nossa: 99,9% do
passado, portanto. Apenas 0,1% do tempo da
existência do homem e dos seus ancestrais na
cadeia evolucionária corresponde ao período em
que existe a escrita” (FUNARI & NOELLI, 2006,
p. 13).
81
o establishement de amanhã, transformando-se,
por sua vez, no alvo dos novos rebeldes. Mesmo
assim, algumas de suas preocupações básicas
permanecem, pois a revista e os indivíduos a ela
associados oferecem o mais sistemático exemplo,
neste século, de uma interação fecunda entre a
história e as ciências sociais (BURKE, 1997, p.
13).
82
Há aqui a pretensão de fazer com que os estudantes entrem em
contato visual, através de material impresso, com as pinturas rupestres
que foram encontradas na região amazônica (em especial as que foram
objeto de estudo da arqueóloga Edithe Pereira, que se encontram na
região de Monte Alegre – PA). Quando se fala deste largo período
anterior ao que se convencionou chamar de História, existe no Brasil
uma tradição que acabou por promover uma forte valorização de
pinturas rupestres de determinadas áreas: europeias e nordestinas.
Quando os manuais didáticos tratam de pinturas rupestres
encontradas no que hoje conhecemos como Brasil, se configura quase
que uma “regra” a utilização de imagens e textos que se relacionam com
o Parque da Serra da Capivara (PI), em detrimento de manifestações
rupestres de outras regiões. No caso do livro didático utilizado na
Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental Professor Waldemar
Ribeiro, foram identificadas referências à pintura rupestre nas páginas
47, 69, 70 e 77:
Imagem 2
83
Imagem 3
Imagem 4
84
No Brasil, essa forma de expressão cultural dos
povos pré-históricos existe de Norte a Sul. No
entanto, as pesquisas arqueológicas que
dedicaram atenção a essas figuras rupestres
concentraram-se nas regiões Sul, Sudeste,
Nordeste e Centro-Oeste do país. Na Amazônia,
as pinturas e gravuras rupestres, conhecidas há
séculos, foram objeto mais de curiosidade do que
de estudos. Sua existência na região, apesar de ser
um fato, não foi considerada no registro
arqueológico das pesquisas desenvolvidas na
região a partir da década de 1950. A explicação
para essa omissão pode ser encontrada na base
teórica das pesquisas realizadas nesse período.
Assentadas em dois postulados básicos, o
determinismo ambiental e o difusionismo, as
pesquisas arqueológicas desenvolvidas na
Amazônia, por quase quatro décadas, tiveram seus
interesses voltados, principalmente, para a
procura e análise de vestígios cerâmicos
(PEREIRA. 2003, p. 13).
85
Buscando mudanças para que as aulas de História se tornem
mais atraentes aos olhos curiosos dos alunos do sexto ano do ensino
fundamental, será estabelecida como estratégia de ensino fazer com que
a aula vá além da exposição de acontecimentos históricos que estão
cristalizados com programas curriculares e nos manuais didáticos.
Referências
86
FUNARI, Pedro Paulo & NOELLI, Francisco Silva. Pré-história do
Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.
87
88
NARRATIVA RAP E CONSCIÊNCIA HISTÓRICA: UM
BREVE DEBATE ENTRE AS RIMAS DE PELÉ DO
MANIFESTO E A TEORIA DE JÖRN RÜSEN
89
A juventude periférica se apropria das rimas do Rap, que narra
os acontecimentos vivenciados nas áreas de periferia, nos morros, vielas
e favelas, na rua, na escola, na cidade, nos confrontos com a polícia.
Em resumo, o Rap acaba por transformar-se para essa juventude como
uma ferramenta que narra sua existência. Desta feita, podemos
compreender o gênero musical Rap como um meio de comunicação dos
jovens através do qual falam tudo o que veem, sabem, sentem e escutam
sobre o seu lugar. Lair Aparecida Delphino Neves (1999) revela-nos o
potencial, bem como o conteúdo da música Rap. Para ela,
90
meio que mostrar a luz, porque o que eu
vivo é o que aquelas pessoas que moram lá
vivem. Então, quando eu falo de racismo
na música “Sou Neguinho” eu quero
atingir aquelas pessoas principalmente. Eu
tento levar um pouco do meu
conhecimento, das minhas experiências e
vivências, do meu ponto de vista pra quelas
pessoas que moram ali, naquela periferia.3
91
lugar” (ROLNIK, 1996, p. 32), as regiões periféricas dos grandes
centros urbanos, decorrentes de um processo de favelização.
92
Narrativa rap e consciência histórica nas rimas de Pelé do
Manifesto
93
Belém que curtia a galera de fora começou
a me ver diferente, entendeu? Pô é o Pelé,
não é mais o Allan, é o Pelé. Ele já é um
MC. Então a galera começou a me ouvir de
fato e começou a prestar atenção naquilo
que eu falava nas letras.5
94
lugares assim, a maioria das vezes as
pessoas querem subir no palco e me
abraçar. Porque aquilo que eu canto, a
maioria das vezes é o que elas vivem. É
como se fosse uma troca de experiências.
Eu falo aquilo que tá na alma deles e é o
que tá na minha também. A gente percebe
o brilho no olhar de cada pessoa que tá ali
assistindo a gente, sabe que aquilo é
verdadeiro. Então isso pra mim é a melhor
coisa que existe.6
95
do “eu”: a identidade histórica (RÜSEN,
2001, p. 156. Grifo meu).
96
presente e a função prática que caracterizam o modo narrativo de tornar
o passado em uma história” (RÜSEN, 2001, p. 158-159).
O modo narrativo analisado por Rüsen nos faz entender que a
narrativa deva possuir um começo, um meio e um fim e para ele, o fim
seria o momento presente da situação narrativa. Nas rimas do Rap de
Pelé do Manifesto, essa ordem se faz presente. Na composição “Sou
Neguinho”, o rapper narra uma contraposição da ideia de paraíso que
foi imputada à América Portuguesa, quando do “descobrimento” do
Brasil. O fator, força, dessa crítica se faz presente na narrativa de Pelé
do Manifesto por meio da experiência histórica da escravidão negra de
origem africana e do tráfico de escravos.
97
Mas o que seria a consciência histórica que as rimas narradas
por Pelé do Manifesto engendram? De forma precipitada, poderíamos
relacionar consciência a um patamar de reflexão e também poderíamos
adjetivar o termo histórica como sendo a experiência humana no tempo,
mas Jörn Rüsen pode nos ajudar a definir de uma forma mais clara e
precisa esse conceito.
98
periferia. O rapper narra com muito entusiasmo9 essa passagem onde
ele afirma que:
99
constituindo sentido à experiência vivida e,
consequentemente, definindo as decisões
humanas.
11
100
A consciência histórica, tal qual proposta pelas reflexões de
Jörn Rüsen, vem no sentido de promover o entrelaçamento de ser e
dever em uma narrativa que se refere a acontecimentos do passado com
a perspectiva de entendimento e compreensão do presente e conferir
uma perspectiva futura a essa atividade atual. A narração é a forma
linguística pela qual a consciência histórica realiza sua função de
orientar decisões. Para Rüsem, a partir “desta visão, as operações pelas
quais a mente humana realiza a síntese histórica das dimensões de
tempo simultaneamente com as do valor e da experiência se encontram
na narração: o relato de uma história” (RÜSEN, 2011, p. 59).
A essa especificidade, Rüsen chama de competência narrativa.
Essa competência é definida como sendo a habilidade que a consciência
histórica tem para acionar os procedimentos que dão sentido ao
passado, engendrando uma orientação temporal efetiva na vida prática
presente no exercício da recordação de uma determinada realidade
passada. Esse dar sentido ao passado é definido por Jörn Rüsen em três
elementos que constituem juntos uma narração histórica: a forma, o
conteúdo e a função. A forma para Rüsen seria “a competência para a
interpretação histórica; já o conteúdo para o historiador alemão seria a
competência para a experiência histórica; enquanto a função seria a
competência para a orientação histórica” (RÜSEN, 2011).
101
Para exemplificar melhor, observe a tabela12 abaixo elaborada
por Jörn Rüsen para detalhar de forma mais clara os quatro tipos de
consciência histórica e seus seis elementos constitutivos.Tabela 1:
Tipologias de consciências históricas em Jörn Rüsen.
12
102
Sistematização Relação de Autoconfia Mudança e
dos modelos conceitos nça na transformação dos
culturais e de próprios a refutação conceitos próprios
Orienta- vida por regras e de como condições
ção da imitação – princípios obrigações necessárias para a
vida role-playing. gerais. externas – permanência e a
interior Legitimação role- autoconfiança.
do papel por playing
generalização.
A moralidade A moralidade Ruptura do Temporalização
é um conceito é a poder da moralidade. As
preestabelecid generalidade moral dos possibilidades de
Rela- o de ordens de obrigação valores um
ções obrigatórias; a dos valores e pela desenvolvimento
com os validade moral dos sistemas negação de posterior se
valores é de valores. sua convertem em
morais inquestionável validade. uma condição de
Estabilidade moralidade.
por tradição.
A razão Argumentação Crítica dos A mudança
Relação subjacente aos por valores e temporal se
com o valores é um generalização, da converte em um
raciocí- suposto referência a ideologia elemento decisivo
nio efetivo que regularidades como para a validade
moral permite o e princípios. estratégia dos valores
consenso do discurso morais.
sobre questões moral.
morais.
103
“contrahistória” (RÜSEN, 2011, p. 67). Esse tipo de consciência
histórica é pertinente às rimas narradas por Pelé do Manifesto, em
especial na narrativa Rap “Sou Neguinho”, onde valores
preestabelecidos são questionados, bem como aponta-se para uma
perspectiva de mudança.
A consciência histórica crítica aciona uma categoria específica
de experiência do passado, que são os desvios, as expectativas de se
efetivar o contrário da ordem estabelecida. As narrativas produzidas por
este tipo de consciência histórica produzem outros entendimentos de
históricos, diferenciando-os de formulações preestabelecidas e
sustentadas por outros ao longo do tempo. Por meio dessas histórias
críticas dizemos “não” às orientações temporais predeterminadas de
nossa vida (RÜSEN, 2011, p. 67).
13
104
políticas, étnicas e econômicas das populações afro-brasileiras ainda
persistem no tecido social, mesmo após a abolição da escravatura. Essa
interpretação crítica presente nas rimas de Pelé do Manifesto foi
conceituado por Carlo Hasenbalg como sendo um ciclo de
desvantagens, que, segundo ele, faz com que haja um processo de
agudização das condições de subalternidade dos não brancos
(HASENBALG, 1979).
105
minha letra / Meu orgulho tá no peito e não
guardado na gaveta14
Referências
14
106
HASENBALG, Carlos Alfredo. A discriminação e desigualdades
raciais no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1979.
107
108
O NAZISMO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA
BRASILEIROS: CONTRIBUIÇÕES PARA UMA HISTÓRIA
DO TEMPO PRESENTE.1
Introdução
109
humanos, personifica-se em atrocidades como intolerância, xenofobia
e etnocracia.3
110
diante de olhos cerrados à reflexão histórica, cairão por terra os
princípios de humanidade que ainda têm nos sustentado.
111
É de fundamental importância, portanto, o diálogo com a
bibliografia especializada, destacando-se, no campo do ensino de
história, as ideias de presentismo, de Henry Rousso (2016); função
social do livro didático, de Luís Reznik (2004); e consciência histórica,
de Jörn Rüsen (2006). No que diz respeito ao nazismo, a fundamentação
se dá a partir de Hannah Arendt (2012) e Daniel J. Goldhagen (1997).
Estes estudiosos, associados a outros que aparecerão ao longo do
trabalho, foram escolhidos por adotarem pressupostos que se opõem ora
a um ensino tradicional, ora a uma visão meramente política e
economicista do totalitarismo.
112
Segundo François Hartog (1996), o fim da Segunda Guerra Mundial
mudou a concepção de tempo do homem que, se antes tinha no futuro
o que chama de “utopias revolucionárias”, passou a ver o mundo pelo
imediatismo do presente, onde as incertezas do vir a ser anulariam suas
esperanças de mudar a sociedade.
113
vista pode parecer contraditório, já que não está havendo relação direta
do tema em si com o tempo vivido, pois o nazismo enquanto política de
Estado, chegara ao fim em 1945 juntamente com a guerra. No entanto,
o que estamos aqui considerando são as abordagens do tema nos livros
didáticos de história produzidos recentemente no Brasil associadas à
necessidade de se repensá-las a partir da propagação de ideias nazistas
que, ressalvadas as especificidades de nosso tempo, possuem um
embasamento teórico nos próprios preceitos de Adolf Hitler.
114
Ainda segundo as autoras, a reatualização de quaisquer temas,
do ponto de vista histórico, faz parte do ofício do historiador. Por outro
lado, essa relação com as questões do presente se baseia na memória
coletiva, o que faz com que o historiador se comprometa com uma
história que é de todos, especialmente com fatos que envolvam a
intolerância, a fim de que não caiam no esquecimento. Essas
proposições são importantes na atualidade, quando ainda nos
deparamos com a negação da existência do holocausto ou de que os
campos de concentração garantiam uma vida digna aos judeus e a outras
minorias. Mas, a rememoração do já ocorrido, não deve querer sair do
esquecimento resumindo-se à lembrança, como se o passado fosse algo
acabado e incontestável. Outra vez recorremos às ideias roussonianas
que enfatizam a utilidade do presentismo a partir de uma distinção
conceitual do contemporâneo, pois este parece ser marcado no tempo
por catástrofes cronologicamente definidas, como 1945, enquanto a
abordagem do tempo presente tem uma dimensão maior, pois não
começa no fato em si, mas no significado que a catástrofe emprega em
suas vítimas.
Ressaltamos, então, que o ensino de história, caso o queiramos
dentro de uma reflexão crítica, deve se pautar na história do tempo
presente, e esta, por sua vez, pode buscar maior legitimação no próprio
espaço escolar. Desta maneira, ao se complementarem numa via de mão
dupla, os conteúdos estudados passarão a ter maior significado,
atingindo a definição rüseniana, posteriormente comentada, de
consciência histórica.
115
didático no ensino básico do país, seja como instrumento empregado
nos processos de ensino e de aprendizagem, seja como recurso de
formação continuada ao professor. No Guia dos Livros Didáticos de
História para o ano de 2015, é sintomática a avaliação que levou em
conta certas demandas sociais, tais como as questões afro-brasileiras e
os usos de fontes históricas, além da utilização de novas abordagens
historiográficas, como a própria história do tempo presente.
116
Importante é considerar esta classificação nas análises sobre a
produção didática, pois revela não apenas permanências e mudanças,
mas possibilidades dos usos de suas narrativas. A proposta deste
trabalho não é um julgamento maniqueísta dos livros didáticos, mas
justamente propor reflexões sobre seus usos visando à formação da
consciência histórica do aluno. Por isso, o que nos interessa não são as
mudanças, mas certas permanências, especialmente no que diz respeito
ao nazismo enquanto conteúdo curricular. Tais permanências, que
devem ser superadas, estão diretamente ligadas à relação entre o saber
histórico acadêmico e o saber histórico escolar, refletindo na produção
e nos usos feitos dos livros didáticos em sala de aula, o que exige uma
discussão sobre a didática da história.
A reflexão sobre a didática da história proposta por Klaus
Bergmann (1985), incide sobre a relação entre o que se pesquisa, isto é,
o objeto, e as práticas sociais. Neste sentido, o ensino de história (ou
didática da história, como ele mesmo define), deve ser encarado como
um campo científico, cujo objetivo é contribuir para a formação crítica
do aluno, ressaltando o significado do que se aprende para a práxis
social. A didática da história, assim, deve buscar a superação do
conceito de verdade absoluta delimitada em um dado contexto espaço-
temporal. Novos olhares sobre o objeto pesquisado e ensinado se fazem
necessários, sempre levando em conta as necessidades da vida prática.
117
Segundo Monteiro (2007), a transposição didática deve ser
substituída pelo que chama de “interpelação didática”. Pois, enquanto
aquela legitima a produção acadêmica como absolutamente apropriada
sem possibilidade de contestação, esta última surge como uma
alternativa para um ensino que reconhece o universo escolar como
produtor de conhecimento capaz de influenciar, até mesmo, as
demandas de pesquisas acadêmicas.
118
deve ser sistemática, acerca dos feitos do “nosso
povo”, “nossa terra”, “nossa gente”; isto é, atribui-
se a tarefa de ser um dos principais lugares da
memória sobre o passado brasileiro, formador da
identidade nacional dos pequenos seres que serão
cidadãos brasileiros (REZNIK, 2004, p. 340).
119
viés que entendemos como primordial para uma (re)leitura do nazismo
nos livros didáticos de história brasileiros, pois a falta de relação do
nacional-socialismo alemão com a vida prática enquanto conteúdo a ser
debatido em sala de aula, o desconhecimento real das atrocidades do
holocausto ou seu negacionismo, que culminam no apoio e na apologia
ao discurso hitlerista, podem ser apontados como elementos de
permanência dessa ideologia até os dias de hoje, com as devidas
ressalvas do tempo presente.5 Em outras palavras, problematizar o
nazismo nos livros didáticos é uma maneira de despertar a consciência
histórica dos alunos com o objetivo moral e ético de superar um
aprendizado equivocado e as divergências entre os homens.
120
discursos como o de que o fascismo italiano ou o salazarismo
português, também eles, foram de caráter totalitário.
Um exemplo prático, à título de ilustração, é o livro de Gilberto
Cotrim (2016), cuja análise sobre o totalitarismo começa
caracterizando-o como um regime unipartidarista pautado em uma
ideologia oficial e assegurado por uma polícia de Estado, sendo que seu
sustentáculo reside na propaganda e no intervencionismo econômico.
Embora tudo isso faça parte do corpus do totalitarismo, há pouca ênfase
em seu distintivo maior: o racismo seguido da política sistematizada de
extermínio em massa. O antissemitismo é apontado como parte da
doutrina nazista, sem, contudo, ser caracterizado como política de
Estado. Nem mesmo o termo “holocausto” é utilizado pelo autor.
Chegamos, então, a outro ponto fundamental: o de saber se os
livros didáticos estão discutindo a questão do antissemitismo em uma
abordagem temporal que facilite a compreensão de seu surgimento,
bem como suas influências no tempo presente, ou se apenas o
apresentam de forma superficial delimitando-o como uma “criação
nazista”. Braick e Mota (2016), na obra didática História - Das
Cavernas ao Terceiro Milênio, tratam do tema de forma bastante
peculiar. Sem utilizar o termo “antissemitismo”, preferindo
“perseguição aos judeus”, associam o fato somente à ascensão de Hitler
ao poder chegando à catarse no período da Segunda Guerra Mundial
com a “solução final”, tal como neste trecho,
121
Portanto, o que temos é mais uma descrição do que ocorria nos
guetos, sem uma discussão dos fatores histórico-culturais do
antissemitismo, então apresentado como algo peculiar àquele período.
Muito menos há qualquer referência à disponibilidade do povo alemão
em participar voluntariamente com o regime, o que confirmaria a tese
de que as pessoas comuns simplesmente sofriam uma lavagem cerebral
e que apenas cumpriam ordem. Daniel J. Goldhagen (1997), em seus
estudos sobre os perpetradores de Hitler, busca a superação de uma
visão simplista a partir da hipótese de que eles sabiam o que estavam
fazendo, mas o autor vai além, buscando investigar se o faziam
acreditando que os judeus merecessem tal tratamento, e em caso
positivo, por qual razão e, mais ainda, por que não se negaram a fazê-
lo.
Se à primeira vista esta análise parece taxativa, reafirmamos
que aqui não está em questão apontar erros e acertos dos livros didáticos
em primazia às pesquisas acadêmicas, pois estaríamos entrando em
contradição ao nosso objetivo maior: mostrar a possibilidade dialógica
entre distintas formas de saber histórico. Estamos constatando, nos
exemplos dados, a distância ainda existente entre a produção científica
e as demandas escolares, o que se reflete em algumas abordagens nos
livros didáticos brasileiros que, se não problematizados, jamais serão
exímios instrumentos que contribuam às necessidades práticas do
mundo vivido.
Portanto, a complexidade dos estudos acadêmicos pode e deve
ser adaptada aos livros didáticos e, para isso, reafirmamos a importância
do tempo presente. Não podemos subestimar os alunos finalistas da
educação básica (e aqui ponderamos que nosso campo de ação são os
livros didáticos do Ensino Médio) como incapazes de compreendê-las.
Uma nova narrativa pode ser construída visando a apropriação das
produções científicas ao campo do ensino de história a partir de
demandas sociais do presente, o que facilita a arguição do aluno.
A narrativa destes autores, assim como a de outros textos
didáticos, deixa de lado fontes importantes que poderiam ajudar o aluno
122
a melhor compreender os fatos e a refletir sobre eles, a fim de estudar o
nazismo não como um mero regime político, mas também como um
movimento cultural e ideológico. Um exemplo é a própria fala de Hitler
ao dizer que “o futuro do movimento depende do fanatismo, mesmo da
intolerância, com a qual seus adeptos o defendem como a única causa
justa e defendem-na em oposição a quaisquer outros esquemas de
caráter semelhante” (HITLER, 2016, p. 257).
Esta posição do principal líder do movimento é reveladora por
exceder explicações de cunho meramente econômico, ou seja, aquelas
que reduzem o nazismo como consequência da crise de 1929. A
ideologia, quando apontada nos livros didáticos, resume-se a seus
aspectos político-econômicos, não sendo associada à formação cultural
do povo alemão. Daí a importância da teoria de Louis Dupeux (1992),
outra importante pesquisa acadêmica a ser refletida didaticamente, uma
vez que investiga o nazismo pela perspectiva de aceitação da maior
parte do povo alemão e que, portanto, não se concretizou pelas ações de
um único homem.
Assim, o estudo do nazismo como conteúdo curricular deve ser
enfrentado como essencial num mundo em que a intolerância tem se
feito presente de diferentes maneiras e, mais precisamente, no mundo
ocidental, onde ainda se fazem ouvir as vozes dos seguidores de Hitler
que, inclusive, negam a própria existência do holocausto. Uma nova
leitura do movimento do Reich permitirá uma reflexão maior, por parte
do aluno, sobre determinadas práticas sociais do presente, em que o
racismo tem se manifestado tanto em políticas de Estado como em
ações isoladas de grupos neonazistas, ganhando cada vez mais força.
Somente com uma proposta de ensino reflexivo, poderemos formar
sujeitos conscientes do seu tempo aptos a fazer suas escolhas com o
mínimo embasamento histórico.
123
Conclusão
124
indague, não tendo no saber acadêmico, também este inacabado, uma
verdade absoluta.
As leituras realizadas no campo do ensino de história e da
historiografia sobre o nazismo, diante das demandas do tempo presente,
permitem-nos afirmar que a problematização do tema nos livros
didáticos não é apenas possível, mas também necessária, já que a
ausência de significação do que é ensinado e aprendido em sala de aula
– e as obras didáticas despontam, após o professor, ou até mesmo antes
dele, como repositórios da verdade – pode comprometer a visão crítico-
reflexiva do aluno, reduzindo a história a uma narrativa impossível de
ser contestada e modificada.
Essa falta de reflexão e da relação do que se estabelece
enquanto objeto de ensino com as demandas individuais e sociais do
tempo vivido, compromete a formação da consciência histórica na
escola e, por conseguinte, reflete na forma como o aluno vai se inserir
sociedade, tal como nos disse Rüsen. Neste sentido, o papel do
professor torna-se fundamental para dirimir o fosso existente entre
saber escolar e saber acadêmico. Usando de sua autonomia, o professor
pode e deve selecionar novos conteúdos a serem ensinados, optando
sobre o que é importante a discutir em sala dentro de um contexto capaz
de construir diferentes narrativas. Portanto, o que está posto nas
produções didáticas deve dialogar com outras fontes a fim de tornar
possível a compreensão dos usos sociais da história, tal como nos
afirma o professor Durval Muniz Albuquerque Junior ao dizer que,
125
com a diferença, aceitar a opinião e o ponto de
vista diferente como tendo direito à existência,
representar a formação de subjetividades mais
bem preparadas para a convivência democrática
(ALBUQUERQUE JUNIOR, 2012, p. 33).
126
Referências
127
DUPEUX, Louis. História Cultural da Alemanha (1919-1960). Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira,1992.
GOLDHAGEN, Daniel Jonah. Os carrascos voluntários de Hitler: o
povo alemão e o holocausto. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
Guia de Livros Didáticos: PNLD 2015: História: Ensino Médio.
Brasília: Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2014.
128
ROUSSO, Henry. A Última Catástrofe: a história, o presente, o
contemporâneo. Rio de Janeiro: FGV, 2016.
129
130
A HISTÓRIA DA AMAZÔNIA E OS LIVROS DIDÁTICOS DO
ENSINO MÉDIO
Introdução
131
que, em diversas gerações, e à luz delas, se voltaram a este ou aquele
objeto que porventura nos interessa atualmente” (MALERBA, 2002, p.
36). Esse exercício é chamado pelo historiador de caráter auto reflexivo
da operação historiográfica, por isso, toda representação produzida pelo
conhecimento histórico também é uma espécie de ação memorial.
Seguindo essa perspectiva, cabe mencionar primeiramente o
interesse do pesquisador pelo livro didático e posteriormente localizar
e relacionar a ação-experiência, docência- pesquisa com essa miríade
de outros estudos que se interessaram pela temática e seus pressupostos
teórico-metodológicos.
Essa relação entre o sujeito e o objeto da pesquisa marcou a
identidade pessoal e profissional do pesquisador, por mais que a
subjetividade deva ser controlada pela objetividade (RICOUER, 2007),
a mesma não deixa de interferir nas escolhas e recortes que o historiador
precisa fazer para produzir sua análise principalmente quando
pensamos no binômio professor/pesquisador. Essa questão identitária
do profissional da educação precisa ser levada em consideração, pois:
“entendemos que uma identidade profissional se constrói a partir da
significação social da profissão, da revisão constante dos significados
sociais da profissão, da revisão das tradições.” (PIMENTA, 2006, p.
12).
Assim, recordo-me que parte dos meus interesses em História
se deu no contexto de maior difusão do livro didático nas escolas nos
anos 90, ainda nos tempos de aluno da educação básica. Ao cursar
história no início da década seguinte comecei a perceber a diferença
entre a historiografia e a literatura didática, na época era comum a
crítica feita pelos professores universitários ao material didático
escolar, imbuídos pela necessidade de atualizar o conhecimento
histórico escolar – baseando-se na concepção de transposição didática,2
132
alguns chegavam a ser mais radicais ao defender a necessidade de
eliminar aquele recurso marcado por deficiências, lacunas variadas,
desvios historiográficos e dominação ideológica.
Ao sair das montanhas da academia para os vales da sala de
aula, percebi que o livro didático ainda era um material importante e já
com amplo uso nas escolas públicas de nível médio a partir do
Programa Nacional do Livro Didático (PNDL) de 2008, que garantiu a
distribuição de coleções para o último nível da educação básica para
disciplinas como História, Geografia e Química. A primeira,
geralmente em volume único de abordagem integrada, aliando história
do Brasil com de outros lugares.
Essas experiências concretas vivenciadas no espaço escolar me
levaram aos estudos de um dos recursos didáticos mais utilizados, o
livro didático, que é um dos recursos centrais nas aulas de história,
embora saibamos que não é o único a interferir na formação da
consciência histórica dos alunos. Essa abordagem representa dentro da
pesquisa no Ensino de História em termos quantitativos, um número
elevado de trabalhos acadêmicos.3 A seguir faremos uma análise desse
movimento crescente no campo empírico em questão e seus vínculos
com uma historiografia ligada ao campo cultural.
133
O livro didático de História – uma abordagem da História Cultural
134
apropriação do material no espaço escolar e não mais apenas como
meros receptáculos passivos como nas análises anteriores.
Para esta análise e as que seguiram neste paradigma nos anos
seguintes foi fundamental o diálogo com as reflexões teóricas de
historiadores vinculados a chamada Nova história cultural (vertente
francesa) ou da história do livro e da leitura, que discutiram amplamente
sobre o lugar social da leitura, do texto, da produção historiográfica,
bem como das apropriações a partir do universo simbólico cultural dos
leitores e os usos do mesmo para dar sentido ao lugar social dos sujeitos
históricos. Essa tradição também teve outras vinculações para além do
campo historiográfico, tais como: A sociologia tributária dos estudos de
Pierre Bourdieu e das novas teorias do currículo escolar de matriz
anglo-saxônica ao pensar a escola enquanto produtora de uma cultura
própria com seus ritos, símbolos e práticas sociais.
Uma noção que ganhou muita visibilidade neste processo foi o
de representação e imaginário (termos elaborados no campo da
psicologia) que penetrou as ciências sociais principalmente a sociologia
e a história; de certa forma influenciou e continua influenciando os
estudos sobre livro didáticos nas duas últimas décadas.
Inicialmente a pesquisa mencionada no início desse texto
pretendia abordar as representações amazônicas nos livros didáticos de
História do Ensino Médio, seguindo essa vertente de análise, porém,
esse termo está mais para uma noção e não conceito, pois, carece de
uma reflexão aprofundada e ainda não se tornou uma denominação
polissêmica como cultura, símbolo ou ideologia (BARROS, 2013). Não
vamos adentrar muito nessa questão, mas é pertinente frisar enquanto
crítica “conceitual”, uma vez que vinculamos esse estudo ao campo da
História Cultural.
Nesse sentido, para abordar esse campo historiográfico que
envolve a maioria dos estudos sobre o uso do livro didático como objeto
e/ou fonte de pesquisa, vamos apontar as principais balizas, conforme
definições apresentadas, a História Cultural se divide em algumas
abordagens tais como: tradição francesa (Nova História Cultural),
135
Escola Inglesa e a polifônica cultural (BARROS, 2013). Observaremos
a seguir as duas primeiras, por considerarmos pertinentes para essa
análise.
Essa tradição dos estudos culturais se tornou bastante comum
principalmente a partir dos anos 60-70 com a chamada virada cultural,
alguns fazendo crítica aos modelos racionais anterior, marcado pelo
determinismo seja liberal-positivista ou marxista ortodoxo, passando a
ressignificar o conceito de cultura advogando como um campo
autônomo dentro da estrutura social.
Nesse ponto é que nos referimos a noção de representação, na
matriz francesa da Nova História cultural: a ideia de uma representação
social foi pensada como crítica a noção de mentalidade surgida no bojo
do grupo dos Annales, por considerarem um termo estático e amplo
demais para dar conta da complexidade dos fenômenos culturais; a
noção ganhou força junto com a ideia de apropriação e práticas sociais.
Nessa concepção podemos definir um livro enquanto:
136
Não há dúvida de que a historiografia é uma
representação do passado. Há como sustentar
uma divergência, contudo, quanto à suposta
desvinculação dessa representação de seu
referente histórico. Tendo a concordar com
Reinhardt Koselleck quando afirma, ao pensar a
relação entre representação, acerca de até que
ponto a Historie narra quando descreve, apontam,
no âmbito do conhecimento, para diferentes
tramas temporais do movimento histórico. O
descobrimento de que uma “história” está desde
sempre já pré-formada, eu diria “prefigurada”,
extra-linguisticamente “não apenas limita o
potencial de representação, como também
reclama do historiador estudos objetivos de
existência das fontes (MALERBA, 2002, p. 42).
137
Ensino de História, ou apresentar outros olhares sobre as linguagens e
narrativas empregadas nesse campo investigativo.
A seguir, abordaremos outros elementos importantes para a
pesquisa mencionada no início do texto, que ajudaram nos pressupostos
teórico-metodológicos do projeto, tais como: o conceito de consciência
histórica e sua relação com a chamada Didática da História, o papel do
livro didático nesse contexto e a questão regional silenciada ou não,
neste material didático em suas narrativas sobre História do Brasil.
138
diferentes países (RÜSEN, 2011, p.110). Por isso, além de analisar as
recentes coleções didáticas aprovadas no PNLD 2015-2018,
entrevistaremos alunos do terceiro ano do Ensino Médio para saber
como os tais estudantes utilizam o livro didático e o que pensam sobre
a forma como é abordada a história regional, e enfim procurar mapear
as diferentes consciências históricas desses jovens e o papel que o livro
didático exerce nesse processo, com ênfase na aprendizagem histórica.
Um ponto que devemos salientar é a pressão exercida pelo
Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, ao definir temas para o
eixo cognitivo – Ciências Humanas e suas tecnologias no qual se
vincula o conhecimento histórico, de caráter mais abrangente sem se
ater as especificidades histórico-geográficas do país, acabou se
firmando como a principal forma de acesso ao nível superior. A
Amazônia aparece dentro dessa abordagem muito ligada ao campo da
natureza ou dos aspectos econômicos.
Essa visão economicista da região Amazônica, que transparece
nos documentos oficiais norteadores do Ensino de História, está
relacionada com certa produção historiográfica que continua a
influenciar a forma de produzir materiais didáticos, pois existe toda uma
pressão no processo de produção do livro didático que envolve os
agentes do Estado enquanto política pública, os movimentos sociais que
pressionam pelo direito de memória. Essa historiografia tradicional que
interfere na construção das narrativas didáticas presente nos manuais
aprovados no PNLD, entende a região como um traço distintivo de uma
nacionalidade (leia-se aos processos históricos forjados no centro-sul),
construídos pela intelectualidade das primeiras décadas do século XX,
entendendo a Amazônia como um espaço de produção econômica sem
identifica-la enquanto produto dos diversos sujeitos históricos
(BITTENCOURT, 2008).
A questão regional e construção da nacionalidade também são
discutidas pelo historiador Durval Muniz Albuquerque Júnior, o
historiador adverte da necessidade de problematizar o regional
enquanto um produto histórico, produzido nas relações sociais e nas
139
tensões provocadas por homens e mulheres no tempo e no espaço,
sendo este último produto social e não algo externo aos sujeitos que
interferem no seu “universo regionalizado”, não apenas natural
(ALBUQUERQUE JR. 2011. p. 36-37).
Por isso, é necessário verificar se esta história regional é
problematizada e não apenas desdobramento de uma História do Brasil,
se ela se faz presente nos livros didáticos e na prática de ensino dos
alunos inseridos em um recorte da realidade amazônica, não apenas
constatando a ausência, mas buscando entender os motivos dela,
partindo, sobretudo, dos temas apresentados nos materiais, bem como
do contexto no qual foram produzidos, entendendo a produção e difusão
do livro didático como um processo complexo que envolve diferentes
indivíduos para além dos autores.
Na próxima seção, apresentaremos uma possibilidade de
intervenção pedagógica pensando o objeto de estudo (análise de livros
didáticos) com o contexto social dos alunos mencionados na pesquisa.
140
também o educador Paulo Freire (1996), é necessário envolve-los tanto
no ensino quanto na pesquisa.
Considerando essas premissas como já mencionamos, um dos
objetivos deste estudo é perceber como o livro didático interfere nessa
atribuição de significado para o mundo fornecido pelo estudante, como
esse aluno constrói suas representações sobre a história da Amazônia
partindo da sua própria realidade, percebendo-o enquanto sujeito
histórico e não simplesmente um ser que se adapta a normatização da
escola e do saber.
Esse posicionamento se faz necessário ao repensar o papel do
saber histórico na educação básica, que perpassa pelo livro didático, não
se encerra apenas no seu texto propriamente dito, mas na dinâmica das
tensões do mundo social, nas formas de uso desses conhecimentos que
precisa ser repensado no seu fazer-se e para além do seu cariz
disciplinar, como aponta:
141
A partir desse pensamento, retomo uma experiência
significativa que pretendemos refazer para efeitos dessa pesquisa: no
ano de 2014 durante a escolha da coleção do livro didático para a Escola
Estadual de Ensino Médio Desembargador Augusto Olímpio, realizei
uma pequena oficina apresentando para os alunos um tema do conteúdo
escolar procurando identificar com os estudantes como essa temática
era abordada nas diferentes coleções apresentadas na escola.
A atividade serviu como um dos parâmetros para definir a
escolha da coleção, considerando a visão dos alunos sobre o material.
Assim, para o PNLD 2018 foi retomado esse procedimento
metodológico com ênfase na História da Amazônia, procurando
perceber a forma como alunos e alunas se posicionam diante desta
questão. A partir dos seus questionamentos iremos propor a produção
de um e-book, com uma coletânea de textos didáticos buscando
possíveis articulações entre os temas abrangentes do ENEM com as
especificidades da historiografia amazônica, seguindo uma abordagem
relacional, problematizada e percebendo a historicidade da região
amazônica.
Conclusão
142
textos e imagens que o mesmo dispõe e percebê-lo enquanto natureza
polifônica sujeita a inúmeras intervenções, desde o autor até aquele que
o utiliza, sabendo-se que não é o único a influenciar a consciência
histórica de alunos e professores, porém, em muitas realidades ainda
desempenha um papel central na prática de ensino de História das
escolas brasileiras.
Perceber a forma como o livro didático dialoga com as outras
linguagens no processo de formação de consciências históricas, bem
como da aprendizagem histórica é um caminho inovador na pesquisa,
pois, como apontamos. ainda são poucas as pesquisas que pretendem
observar esse recurso didático com ênfase na aprendizagem e no sentido
que é dado ao conhecimento histórico, neste caso, como tais coleções
influenciam na formação das identidades de jovens que vivem em um
contexto amazônico.
Referências
143
BITTENCOURT, Circe M. Fernandes. Livro didático e conhecimento
histórico: uma história do saber escolar. Tese (Doutorado em História
Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – USP,
1993.
144
MARTINS, Marcos Lobato. “História Regional”. In: PINSKY, Carla
Bassanezi (org.). Novos Temas nas aulas de História. 2ª ed. São Paulo:
Contexto, 2010.
145
146
SUPERANDO O FARDO: HAYDEN WHITE E O ENSINO DE
HISTÓRIA
147
mas seu exame como tal tem sido impedido por diversas considerações,
sendo uma delas a de que este exame é, por muitos, considerado
antiantropológico, pois existe a crença de que o que o etnógrafo
propriamente dito deve fazer, propriamente, é ir a lugares, voltar de lá
com informações sobre como as pessoas vivem e tornar essas
informações disponíveis à comunidade especializada, de uma forma
prática, em vez de ficar vadiando em bibliotecas, refletindo sobre
questões literárias (GEERTZ, 2009, p. 11). Outra objeção, para Geertz,
provêm, sobretudo dos consumidores, e é a de que os textos da
Antropologia não são dignos dessa atenção esmerada, pois os bons
textos dessa ciência, segundo a visão de alguns desses consumidores,
devem ser simples e despretensiosos, sem um convite a uma minuciosa
leitura literocrítica (GEERTZ, 2009, p. 12). Mas Geertz acredita que a
objeção mais vigorosa, que é bastante generalizada na vida intelectual
dos últimos tempos, seja a de que concentrar nosso olhar nas maneiras
como são enunciadas as afirmações de um saber solapa nossa
capacidade de levar a sério qualquer dessas afirmações (GEERTZ,
2009, p. 12). Então, Geertz, em sua análise, parte da premissa de que
existe a importância do texto antropológico enquanto escrita, e que, o
lugar óbvio para se iniciar esse engajamento é a questão do que vem a
ser um ‘autor’ na antropologia, pois, por mais que em outros campos do
discurso o autor esteja morrendo, na Antropologia ele, para Geertz,
ainda está vivíssimo (GEERTZ, 2009, p. 18).
Como podemos notar, a questão da importância da escrita na
produção científica no campo das ciências humanas é crucial, e neste
aspecto, dentro da historiografia, poucos autores se empenharam tanto
quanto Hayden White. Os ensaios dele sempre despertaram grandes
repercussões entre historiadores, filósofos e críticos literários, que ao se
depararem com a obra de White, acabam por sentir a necessidade de
repensar os fundamentos e a epistemologia de suas disciplinas.
Historiadores, em especial, se sentem impelidos a discutirem sobre os
escritos de White e a lhe imporem respostas, negações e
questionamentos. Nesse sentido, um dos temas mais debatidos por
148
White é a crença de que há um problema que nem os filósofos nem os
historiadores costumam encarar com a devida seriedade e ao qual os
teóricos da literatura não concederam a merecida atenção, tratando-se
da questão relativa ao status da narrativa histórica, que ele considera
exclusivamente como um artefato verbal que pretende ser um modelo
de estruturas e processos há muito decorridos e, portanto, não-sujeitos
a controles experimentais ou observacionais (WHITE, 2014, p. 98).
Assim, para este autor, o trabalho histórico seria uma estrutura verbal
na forma de um discurso narrativo em prosa, que combinaria uma certa
quantidade de dados, a conceitos teóricos, usados para explicar esses
dados, e a uma estrutura narrativa, que os apresenta como um ícone de
conjuntos de eventos presumivelmente ocorridos em tempos passados
(WHITE, 2008, p. 11). Para Hayden White, existe uma relutância em
considerar as narrativas históricas como aquilo que elas manifestamente
são, de acordo com ele, ficções verbais, cujos conteúdos são tanto
inventados quanto descobertos e cujas formas têm mais em comum com
os seus equivalentes na literatura do que com os seus correspondentes
nas ciências (WHITE, 2014, p. 98).
Para White, o conhecimento é construído através de tropos
prefigurativos e de processos tropológicos. Assim, seguindo os quatro
principais tipos de tropo (metáfora, metonímia, sinédoque, ironia) que
funcionam como fundamentação para toda interpretação histórica, estão
os quatro tipos de explanação em três agrupamentos, ou seja, quatro
enquadramentos (romântico, trágico, cômico, sátira) associados com os
quatro tipos de argumento (formista, mecanicista, organicista,
contextualista) e quatro posições ideológicas, a anarquista, o
radicalismo, o conservadorismo e o liberalismo (ASSIS & CRUZ,
2010, p. 115).
Hayden White sabe que essas afirmações provocam
inquietações em diversos grupos de intelectuais, e ele admite que os
eventos históricos diferem dos eventos ficcionais, pois os historiadores
ocupam-se de eventos que podem ser atribuídos a situações específicas
de tempo e espaço, eventos que são, ou foram, em princípio observáveis
149
ou perceptíveis, ao passo que os escritores imaginativos – poetas,
romancistas, dramaturgos – se ocupam tanto desses tipos de eventos
quanto dos imaginados, hipotéticos ou inventados, mas, para White, o
que deveria interessar é o grau em que o discurso do historiador e o do
escritor imaginativo se sobrepõem, se assemelham ou se correspondem
mutuamente, pois ele acredita que, embora os historiadores e os
escritores de ficção possam interessar-se por tipos diferentes de
eventos, tanto as formas dos seus respectivos discursos como os seus
objetivos na escrita são os mesmos, assim como as técnicas ou
estratégias de que ambos se valem na composição dos seus discursos
(WHITE, 2014, p. 137).
Nesse sentido, Hayden White esclarece que, antes da
Revolução Francesa, a historiografia era considerada
convencionalmente uma arte literária, tida como um ramo da retórica,
com sua natureza ‘fictícia’ geralmente reconhecida, sendo que havia
uma distinção entre o estudo da história e a escrita da história, sendo
que a escrita era um exercício literário, especificamente retórico, e o
produto desse exercício devia ser avaliado, tanto segundo princípios
literários, quanto científicos, pois nesta época acreditava-se que a
oposição básica se dava muito mais entre ‘verdade’ e ‘erro’ que entre
fato e fantasia, depreendendo-se daí que existia a crença de que muitos
tipos de verdade, mesmo na história, só poderiam ser apresentados ao
leitor por meio de técnicas ficcionais de representação. Assim, tanto
quanto a razão, a imaginação devia estar implícita em qualquer
representação adequada da verdade; e isto significava que as técnicas
de criar ficção eram tão necessárias à composição de um discurso
histórico quanto o seria a erudição (WHITE, 2014, p. 139).
Entretanto, para Hayden White, no começo do século XIX,
tornou-se convencional, pelo menos entre os historiadores, identificar a
verdade com o fato e considerar a ficção o oposto da verdade, portanto,
um obstáculo ao entendimento da realidade e não um meio de apreendê-
la. Desse modo,
150
A história passou a ser contraposta à ficção, e
sobretudo ao romance, como a representação do
‘real’ em contaste com a representação do
‘possível’ ou apenas do ‘imaginável’. E assim
nasceu o sonho de um discurso histórico que
consistisse tão-somente nas afirmações
factualmente exatas sobre um domínio de eventos
que eram (ou foram) observáveis em princípio,
cujo arranjo na ordem de sua ocorrência original
lhes permitisse determinar com clareza o seu
verdadeiro sentido ou significação (WHITE,
2014, p. 139).
151
como uma forma de atividade intelectual que é ao mesmo tempo
poética, científica, e filosófica em suas preocupações (WHITE, 2008,
p. 14-15).
Ainda discutindo o caráter artístico da história, Hayden White
compara literatura e história, afirmando que a segunda, tal qual a
primeira, se desenvolve por meio da produção de clássicos, cuja
natureza não pode ser invalidada nem negada, a exemplo dos principais
esquemas conceituais das ciências. E é, segundo ele, esse caráter de
não-invalidação que atesta a natureza essencialmente literária dos
clássicos históricos em cujas obras-primas existe algo que não pode ser
negado, e esse elemento não-negável é a sua forma, a forma que é a sua
ficção (WHITE, 2014, p. 106).
Hayden White acredita que as situações históricas são narradas
de acordo com a sutileza do historiador, que deve harmonizar a situação
específica de enredo com o conjunto de acontecimentos históricos aos
quais ele busca conferir um sentido particular, sendo que esta operação
é, essencialmente, literária e criadora de ficção. Apesar disso, a
narrativa histórica não deve ser depreciada enquanto fornecedora de um
tipo de conhecimento (WHITE, 2014, p. 102). Para que seu valor
diminuísse, segundo ele, deveríamos acreditar ser verdadeira a ideia de
que a literatura não tem nada para ensinar acerca da realidade, por conta
de ela ter sido o produto de uma imaginação (WHITE, 2014, p. 115).
Além disso, vista de um modo puramente formal, uma narrativa
histórica é não só uma reprodução dos acontecimentos nela relatados,
mas também um complexo de símbolos que nos fornece direções para
encontrar um ícone da estrutura desses acontecimentos nessa tradição
literária (WHITE, 2014, p. 105).
Enfatizando as semelhanças entre escrita histórica e escrita
ficcional, White acredita que os acontecimentos são convertidos em
estória pela supressão ou subordinação de alguns deles e pelo realce de
outros, por caracterização, repetição do motivo, variação do tom e do
ponto de vista, tudo isso consistindo em técnicas que normalmente se
espera encontrar na urdidura do enredo de um romance ou de uma peça
152
(WHITE, 2014, p. 100). Ele ressalta que a maioria das sequências
históricas pode ser contada de inúmeras maneiras diferentes,
fornecendo interpretações diferentes daqueles eventos e a dotá-los de
sentidos diferentes (WHITE, 2014, p. 101).
Nesse ponto, chegamos a outro tema basilar na obra de White,
que é a questão da interpretação na história. Segundo ele, os teóricos da
historiografia geralmente concordam em que todas as narrativas
históricas contém um elemento de interpretação irredutível e
inexpungível, pois o registro histórico é ao mesmo tempo compacto
demais e difuso demais e, em virtude disso, o historiador deve
interpretar a sua matéria a fim de construir o padrão em que irá produzir
as imagens em que deve refletir-se a forma do processo histórico
(WHITE, 2014, p. 65). Sendo assim, o historiador precisa ‘interpretar’
o seu material, preenchendo sempre diversas lacunas que existem nas
informações, a partir de inferências ou de especulações, pois, de um
lado, sempre existem mais fatos registrados do que o historiador pode
talvez incluir na sua representação narrativa de um dado segmento do
processo histórico; de outro lado, no empenho de reconstruir ‘o que
aconteceu’ num dado período da história, o historiador deve
inevitavelmente incluir em sua narrativa um relato de algum
acontecimento ou conjunto de acontecimentos que carecem dos fatos
que poderiam permitir uma explicação plausível de sua ocorrência
(WHITE, 2014, p. 65). Nesse cenário, White (2014, p. 65) define que:
153
Discutindo o tema da interpretação na história, White retoma a
questão da cientificidade da história, afirmando que filósofos
contemporâneos a ele tenderam a diminuir a importância do elemento
interpretativo nas narrativas históricas, pois costumavam trabalhar com
a convicção de que as instituições poéticas e científicas são mais
diferentes do que semelhantes, e, na busca por recuperar a reivindicação
de um status científico por parte da história, desprestigiavam a
interpretação, com a suposição de que ela não é conhecimento, mas
apenas opinião, e na crença de que o que não é objetivo num sentido
científico não é digno de ser conhecido (WHITE, 2014, p. 69).
Hayden White acredita então que, na história, bem como nas
demais ciências humanas, toda representação do passado tem
implicações ideológicas especificáveis e que, portanto, é possível
discernir pelo menos quatro tipos de interpretação histórica que tem
suas origens em tipos diferentes de comprometimento ideológico,
sendo elas a idiográfica, a contextualista, a organicista e a mecanicista
(WHITE, 2014, p. 88). Desse modo, a interpretação entra na
historiografia pelo menos de três maneiras: esteticamente, na escolha
de uma estratégia narrativa; epistemologicamente, na escolha de um
paradigma explicativo; e eticamente, na escolha de uma estratégia pela
qual as implicações ideológicas de uma dada representação possam ser
deduzidas para a compreensão de problemas sociais do presente
(WHITE, 2014, p. 89). Assim, o papel da interpretação na história é tão
decisivo que define até mesmo as diferenças entre escolas de
historiografia conflitantes, sendo que elas podem ser caracterizadas
pelas preferências que dão a uma ou a outra combinação de estratégias
interpretativas (WHITE, 2014, p. 90).
Um dos temas mais polêmicos estudados por Hayden White,
que se entrecruza com todas as discussões que fizemos até agora, é a
questão do fardo da história. Nesse sentido, Márquez afirma que em
um ensaio com este nome, White apresenta um balanço geral do modo
hostil como a história disciplina é vista pela comunidade intelectual de
um modo geral dos fins do século XIX até os meados dos anos 60
154
(MARQUEZ, 2008, p. 14). Esse fardo se deve a um ressentimento que,
segundo Hayden White, é motivado pelo que parece ser a má fé do
historiador em reivindicar os privilégios tanto do artista quanto do
cientista, ao mesmo tempo em que recusa submeter-se aos modelos
críticos que atualmente vão sendo estabelecidos na arte ou na ciência
(WHITE, 2014, p. 40). White salienta acreditar que é bem possível que
a tarefa mais difícil que a geração de historiadores da época dele possuiu
foi a de realizar a exposição de que a disciplina histórica possuía um
caráter historicamente condicionado, mas também presidir à dissolução
da reivindicação de autonomia que a história mantém com respeito às
demais disciplinas, e, além disso, promover a assimilação da história a
um tipo superior de investigação intelectual que, por estar fundada
numa percepção mais das semelhanças entre a arte e a ciência que das
suas diferenças, não pode ser adequadamente assinada nem por uma
nem por outra (WHITE, 2014, p. 52).
À ideia do fardo da história, White acrescenta a de fardo do
historiador, que, segundo ele, é restabelecer a dignidade dos estudos
históricos numa base que os coloque em harmonia com os objetivos e
propósitos da comunidade intelectual como um todo, ou seja,
transforme os estudos históricos de modo a permitir que o historiador
participe positivamente da tarefa de libertar o presente do fardo da
história (WHITE, 2014, p. 53). Para resolver essas questões, White
(2014, p. 53) acredita que:
155
quer que seja sensível à diferença radical do nosso
presente relativamente a todas as situações
passadas, o estudo do passado “como um fim em
si” só pode afigurar-se uma forma de
obstrucionismo insensato, uma oposição
intencional à tentativa de entrar em contato com o
mundo atual em toda a sua estranheza e mistério.
No mundo em que vivemos diariamente, quem
quer que estude o passado como um fim em si
deve parecer ou um antiquário, que foge dos
problemas do presente para consagrar-se a um
passado puramente pessoal, ou uma espécie de
necrófilo cultural, isto é, alguém que encontra nos
mortos e moribundos um valor que jamais pode
encontrar nos vivos. O historiador contemporâneo
precisa estabelecer o valor do estudo do passado,
não como um fim em si, mas como um meio de
fornecer perspectivas sobre o presente que
contribuam para a solução dos problemas
peculiares ao nosso tempo.
156
58). É aí que estão os meios para atingir a meta de solução do fardo da
história, que consistem no que Marquez chama de desafio literário de
Hayden White, no campo dos estudos históricos, e que reconhece ser
como inalcançável, bem como prejudicial à capacidade de constituição
do sentido histórico, a pretendida objetividade “científica” voyeurista;
e recorrer a técnicas de expressão literária, simbolistas, expressionistas,
realistas, surrealistas e modernistas para proceder à inserção
revolucionária do passado na vida atual (MARQUEZ, 2008, p. 18).
157
apresentação dos conteúdos de ensino, os quais
são apenas meios utilizados para alcançar um fim.
Permanece o fato de que o estudo dos ensinos
efetivamente dispensados é a tarefa essencial do
historiador das disciplinas.
158
O conceito de história que flui dos programas e
dos currículos é, assim, basicamente aquele que a
identifica ao passado e, portanto, à realidade
vivida, negando sua qualidade de representação
do real, produzida, reelaborada, na maioria das
vezes, anos, décadas ou séculos depois do
acontecido. Essa forma de ensino, determinada
desde sua origem como disciplina escolar, foi o
espaço da história oficial na qual os únicos
agentes visíveis do movimento social eram o
Estado e as elites.
159
Sobre essa situação da história enquanto matéria escolar,
Albuquerque Júnior (2012, p. 31) diz que:
160
elevado do que o que ela ocupa nos dias de hoje (WHITE, 2014, p. 116).
Para ele, a distinção mais antiga entre ficção e história, na qual a ficção
é concebida como a representação do imaginável e a história como a
representação do verdadeiro, deve dar lugar ao reconhecimento de que
só podemos conhecer o real comparando-o ao imaginável. Ele arremata
a questão, esclarecendo, em tom interrogativo:
161
benéfica para os estudantes, as escolas e, até mesmo, para os
professores, que são levados a repensar suas práticas, teorias, bem como
o exercício da escrita e a difusão do conhecimento, desse modo,
facilitando a superação do fardo da história, bem como da crise da
história.
Valorizar a história enquanto texto escrito apresenta
significativa importância até mesmo para alunos em privação de
liberdade, que necessitam sentir algum tipo de aplicabilidade nos
conhecimentos escolares, o que vem a ser materializado com a
produção de textos de cunho histórico, e sua posterior publicação, que
vem para contribuir, até mesmo, com a elevação da auto-estima de toda
a comunidade escolar, afinal, como nos adverte Albuquerque Júnior
(2012, p. 33-34):
Referências
162
REZNIK, Luíz & ROCHA, Helenice. Qual o valor da História hoje?
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2012.
163
RORTY, Richard. El giro linguístico. Barcelona: Paidós, 1998.
WHITE, Hayden. Meta-história: a imaginação histórica do século XIX.
São Paulo: Edusp, 2008.
164
AS ORIGENS E O ENSINO DA DISCIPLINA HISTÓRIA:
ENTRE CIENTIFICIDADE, POLÍTICAS EDUCACIONAIS,
HISTORICIDADE E ESTRUTURAS CONJUNTURAIS.
165
educacionais, vários autores vêm discutindo através de diversas
pesquisas e proposições teóricas o surgimento e o desenvolvimento da
mesma, como elemento de formação institucional e instrumento
formativo de destacada relevância social.
Em meio a isso, comumente surgem discussões pertinentes às
formatações assumidas pela produção do saber histórico e suas
maneiras de ensino em diferentes momentos históricos. E,
frequentemente, é evidenciada a aproximação do ensino da disciplina
História, com formulações que ultrapassam as tendências pedagógicas
emergentes no meio educacional, fazendo com que seus princípios e
objetivos formativos nem sempre sejam visualizados como únicos
vieses norteadores do ensino de História disponibilizado nos meios
universitário e escolar.
Questões de natureza política, econômica, culturais e religiosas
são, geralmente, visualizadas como tendências emergentes ou nuances
impostas e absorvidas na disciplina História quanto a sua formatação e
maneira de ensino. Tal situação, deixa entendido a existência de
influências ideológicas e metodológicas externas ao meio educacional
formal, oriundas de diferentes instituições sociais como, por exemplo,
as igrejas, os núcleos familiares, o universo midiático e o Estado. O que
vêm influenciar, direta ou indiretamente, o que deve ser ensinado e, por
conseguinte, aprendido.
Seguindo esse curso analítico e buscando apresentar a
emergência da História como disciplina escolar, Lucini (2000, p. 61-
62) propõe que a mesma “surgiu de maneira autônoma da França do
século XIX, sendo fundada e baseada por um discurso enciclopedista,
progressista, linear e eurocêntrico”. Tal afirmação, nos ajuda a entender
as origens da disciplina História como atreladas ao pensamento
positivista, prevalecente na época, e que impunha ao seu método de
pesquisa e ensino o modelo das ciências sociais, porém estando
vinculado as tendências políticas latentes do período.
Em concordância com o anteriormente apresentado, Fonseca
(2006, p. 12) focaliza e destaca o século XIX como “cenário
166
inaugurador da disciplina História por tratar-se de um momento onde
tanto a disciplina escolar História quanto o campo da investigação
histórica adquirem estatutos melhor definidos e estrutura mais
elaborada”.
Dessa forma, observa-se a organização estrutural e funcional de
seus fundamentos disciplinares como marco iniciador da disciplina
História no meio educacional formal, o que de certa maneira vem
aproximá-la às concepções metodológicas condizentes às tendências
cientificistas do período. Nisso se enquadra o Positivismo, tendência
filosófica emergente e influente na época, predisposta a assolar as
formulações historicistas e a produção do conhecimento científico do
momento.
Apesar das atuais e frequentes críticas feitas a possível pioneira
estruturação teórica e metodológica da disciplina História a ser ensinada
nos meios acadêmicos e escolares a partir do século XIX, sua
estruturação na época era vista como associada à tendência
epistemológica mais adequada e pertinente aos objetivos a serem
almejados e às potencialidades a serem desenvolvidas pelos indivíduos
envolvidos em seu ensino e estudo: o método científico. Estando este,
sob a égide das concepções positivista, tão frequentes e caras à época.
Quando nos referimos à identificação do surgimento da
disciplina História, como componente curricular oficializado no Brasil,
tende-se a atrelar tal emergência às propostas educacionais oriundas
durante o período imperial. Propostas estas que almejavam a construção
e fortalecimento de uma noção de identidade nacional, entendida como
base fundamental para a estruturação política, econômica e cultural de
uma nação recém-independente carente de relatar (ou construir) seus
percursos percorridos e definir futuros caminhos a serem seguidos.
Nesse contexto, Abud (1998, p. 29-30) sinaliza a “criação do
Colégio D. Pedro II na cidade do Rio de Janeiro, no final da Regência
de Araújo Lima, em 1837, como marco inicial para a institucionalização
da disciplina História como elemento escolar curricular”. Vale destacar,
também, a fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
167
(IHGB), em 1838, como elemento de destaque no período, devido o
mesmo ser configurado como instituição acadêmica, formadora e
orientadora das discussões temáticas e propostas pedagógicas a
prevalecerem nas instâncias de ensino do país.
Nesta instituição, se evidenciava o predomínio da
hierarquização factual, da produção historiográfica linear e do destaque
dado aos grandes fatos e seus vultos históricos (grandes personalidades)
como fundamentação teórico-metodológica predominante, necessária e
predisposta a um ensino de História desejável no período.
Mediante o que foi até aqui abordado, podemos averiguar e
visualizar a influência de determinantes sociais predominantes no início
do século XIX como elementos incentivadores do desenvolvimento
historiográfico nacional, então em construção, propondo adequações às
disposições político-ideológicas prevalecentes. No caso citado,
encontravam-se intrínsecas a afirmação e confirmação da estrutura
monárquica e, posteriormente, disposta à edificação de uma nova
proposta governativa: a República.
Com a implantação do regime republicano e a consolidação da
influência oligárquica na estrutura político-social nacional, podemos
visualizar o ensino da disciplina História envolto em vieses de
pretensão elitista e de cunho incentivador do desenvolvimentismo
brasileiro. Da mesma forma e contrapondo-se a uma tendência mais
“progressista”, o caráter conservador e atrelado a métodos importados,
tende também a ser observado, sendo necessário atrelar-se o ensino de
História às práticas tradicionais, assim como as novas tendências
oriundas do crescimento urbano e populacional, característicos do
desenvolvimento econômico nacional vivenciado.
Ao analisar esse período, Baldin (1989, p. 41-42) salienta que
“as determinações das Reformas de Ensino cobradas pelas elites
brasileiras começaram a manifestar sinais de alterações apenas com a
lenta ruptura do poder político existente na tradicional estrutura
socioeconômica surgida desde o período colonial e ainda prevalecente”.
168
Isso veio fazer do conservadorismo um dos aspectos mais marcantes e
destacados na implementação de políticas educacionais no Brasil.
Com a ocorrência do golpe de 1930 e o advento da Era Vargas
(1930-1945) a “ideia de edificação de parâmetros de uma identidade
nacional tomou força” (SÁ, 2006, p. 17). Nesta proposta, encontra-se
inclusa a intenção de formação de um cidadão disposto ao cumprimento
das determinações governamentais, estando o mesmo, sob o jugo do
pensamento nacionalista e de uma forte noção de centralização política.
Assim sendo, o processo modernizador e de desenvolvimento da
sociedade brasileira encontrou-se atrelado ao aceleramento produtivo
almejado e representado pelo incentivo dado ao desenvolvimento da
industrialização.
Nesse ínterim, observa-se um discurso tecnicista pairando
sobre o meio educacional nacional, recaindo sobre a disciplina História
a função de possibilitar ao povo brasileiro a visualização de suas
potencialidades e a necessidade de seu enquadramento nesse processo
de modernização. Mediante a ênfase dada ao ensino técnico-
profissional visando, especialmente, a preparação de mão-de-obra para
o mercado industrial capitalista, quais respingos dessa realidade
recairão sobre a estruturação e o ensino de História?
Nesse contexto e a procura de respostas, a noção tecnicista
passa a ser interpretada como formatação latente do pensamento
científico disposto a aplicação no meio educacional, que nas palavras
de Francisco Campos, Ministro da Educação do Governo Provisório de
Vargas: “as transformações não se operam pelas ações das mentalidades
primitivas, mas pela influência das ciências e das artes, de filósofos,
pesquisadores, engenheiros, artistas” (ABUD, 1998, p. 36).
Fonseca (2006) ao discutir a formatação assumida pela
disciplina História no meio educacional brasileiro do pós-golpe de
1930, destaca que a Reforma Educacional Francisco Campos a colocou
como instrumento central da chamada educação política. Proposta
enfatizada no discurso frequente em relação a importância da noção de
coletividade, do conhecimento das origens e da estruturação das
169
instituições políticas e administrativas para o desenvolvimento político
e econômico do país.
Dessa maneira, entende-se esse momento como definidor da
disciplina História como instrumento de estudo da mudança, que desde
o século XIX, já se aproximava do método científico atrelado a uma
concepção evolucionista, que visualizava o homem como um indivíduo
propenso ao Progresso e à Civilização. Tal situação, em termos
políticos, impunha sobre a História a noção de elemento investigador e
apresentador de uma genealogia da nação, formadora de um sentimento
unificador: o da identidade nacional.
Com a Reforma Educacional de Gustavo Capanema, em 1942,
sobre a disciplina História recaiu a função de possibilitar uma formação
moral e patriótica, disposta a adoção de um maior grau de
“cientificidade” quanto a identificação dos genes da nação brasileira e
a estruturação e ensino do saber histórico. Apesar disso, esse momento
configurou-se como mais um período dosado pelas pressões de setores
católicos ligados à educação, fazendo-nos entender que até durante a
década de 1950, o ensino de História pouco se afastou das concepções
e práticas tradicionalistas.
Ao analisar esta situação Abud (1998) destaca que mesmo após
o fim da Era Vargas e com o surgimento da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Brasileira (4.024/61), o sistema educacional brasileiro não
fugiu à concepção pragmática disposta à formação da cidadania.
Definindo assim um papel diretivo do discurso político nacionalista
sobre as fundamentações de caráter científico, como balizamento
teórico e metodológico a serem assumidos pela disciplina História no
ambiente escolar.
Com a emergência do Regime Ditatorial Militar, a partir de
1964, quando, segundo Scheffer, et al. (2008) a verticalização do ensino
se tornou ainda mais acentuada, as abordagens referentes ao ensino de
História prevalecentes focalizavam a ruptura entre produção teórica e
abordagens metodológicas. Fato este observado pelo evidente estímulo
170
dado a separação e distanciamento entre o universo acadêmico e escolar
quanto à estruturação curricular das disciplinas escolares.
Nesse contexto, o discurso de valorização da cidadania, do
desenvolvimento e do nacionalismo tonou novo ânimo e se consolidou
nos currículos e estruturas disciplinares, através de tendências
pedagógicas e políticas educacionais.
Fonseca (2003) ao analisar este período, destaca que as
mudanças educacionais implementadas após o Golpe Militar fizeram
com que a disciplina História voltasse a se tornar um importante alvo
do poder político autoritário constituído, enquadrando sua conotação e
existência no meio educacional como instrumento atrelado ao ideário
de segurança nacional e progresso econômico almejado.
Nesse contexto, destaca-se a dimensão assumida pela formação
de profissionais da área e a produção de materiais didáticos como
intimamente relacionados às propostas governamentais de ensino.
Assim sendo, visualizou-se um distanciamento ainda maior dos
discentes em relação ao entendimento e envolvimento da dimensão
disciplinar onde os mesmos se visualizassem como personagens
importantes na produção do saber histórico (SCHEFFER et al., 2008).
Dessa maneira, o professor passou a ser entendido
fundamentalmente como um elemento transmissor de um saber pronto
e moldado aos interesses governamentais, processado através da
abordagem de fatos fragmentados com o intuito de formação de
consciências acríticas e passivas, eficientes na absorção de normas, mas
pouco questionadoras e capazes de entender e tentar modificar a
realidade em que se encontravam inseridas.
Estudos referentes às interferências governamentais feitas na
estrutura curricular da disciplina História nesse período, como os de
Fonseca (2003) e Horn e Germinari (2006), tendem a indicar a
consolidação da Lei 5.692/71 como matriz definidora dessa proposta,
sendo que a partir dela os conteúdos programáticos das disciplinas
História e Geografia foram unificados em uma nova proposta
disciplinar: os Estudos Sociais. Tal situação não esteve restrita a
171
simples adoção de uma nova nomenclatura, representou uma forte
mudança na formatação e na concepção de ensino das referidas
disciplinas.
Assim sendo, pode-se entender essa medida “educacional”
como um discurso político, no qual se objetivava instituir através do
ensino dos Estudos Sociais (por mais incrível que pareça) uma maior
aproximação com o método científico, dispondo aos discentes um
melhor entendimento da realidade socioeconômica vivida no país.
Porém, destaca-se que a adoção dessa proposta, acarretou na
fragmentação do conhecimento pertinente a essas áreas de estudo, onde
a organização curricular tornou as disciplinas envolvidas em
compartimentos estanques e isolados da realidade vivenciada.
Mediante a instalação de propostas governamentais como esta,
imbuídas da intenção de como se produzir e ensinar o conhecimento
histórico, quais indivíduos ousariam idealizar uma reformulação dos
procedimentos condizentes ao ensino e ao fazer histórico da época?
Haveria possibilidade do surgimento de uma reformulação teórica e
metodológica nos diferentes níveis de ensino, sendo que estas se
encontravam sujeitas, além da ação de políticas “educacionais”
tendenciosas, à vigilância governativa ditatorial?
Procurando responder a estes questionamentos, Baldin (1989)
enfatiza que uma nova clientela frequentadora do meio acadêmico,
demonstrando sua insatisfação com a estruturação imbuída à disciplina
História, buscou reascender o estudo das fundamentações teóricas, da
formação pedagógica e da reformulação curricular, condizentes a
mesma. Essa concepção identifica-se com o início das propostas de
renovação da disciplina História através da tentativa de reelaboração de
seus métodos de pesquisa, escrita e ensino, a partir de questionamentos
e discussões surgidas no ensino superior.
Essa perspectiva procura entender a renovação da História no
meio educacional como tentativa de edificação de uma disciplina mais
propensa às discussões teóricas e metodológicas. Proposta está surgida,
justamente, onde a presença militar mais se fazia efetiva e controladora:
172
as Universidades. Sobre essa realidade, Bittencourt (1998, p. 13)
destaca que:
No processo da chamada “abertura política” do
final dos anos 1970, professores do ensino médio
e das universidades iniciaram uma fase de
reaproximação entre os níveis de ensino e os
debates encaminhavam-se na volta de História e
Geografia como disciplinas autônomas no 1º grau.
O retorno, no entanto, não foi pacífico. Foi
acompanhado de discussões que passaram a
considerar a necessidade de aprofundas as
questões relativas ao conhecimento que
tradicionalmente vinha sendo ensinado e às novas
tendências e avanços nos campos historiográfico
e pedagógico.
173
veículos de difusão do conhecimento científico. Além disso, as mesmas
já serem entendidas como locais de iniciação do entendimento da
educação como um dos direitos humanos necessários ao adequado
funcionamento do Estado.
Em sua análise referente à disposição formativa educacional
pertinente à década de 1970, Fonseca (2003) focaliza as discussões
sobre a posição social e disciplinar da ciência como uma das questões
mais delicadas ao meio educacional do período. Isso encontra eco na
concepção de que a sugestão de abertura de discussões sobre a
possibilidade de produção historiográfica em diferentes níveis de
ensino vinha abalar, diretamente, a noção latente de hierarquização da
produção do conhecimento, dando-se sempre destaque aos meios
acadêmicos. Visão essa, consistente, consagrada e muito defendida na
época, e ainda hoje.
Questões desta natureza vieram levantar debates sobre o papel
de maior relevância, a ser assumido pela História como disciplina
escolar, tais como: como se definiria e processaria sua construção
teórica e vieses metodológicos a serem assumidos? Qual sua relação e
aproximação com os interesses políticos governamentais de
determinados períodos?
Propondo-se a discutir essas questões referentes à estruturação
e ao ensino de História, Baldin (1989, p. 21) destaca que a História pode
ser entendida como Ciência quando: “vê o processo de transformação
da natureza e das sociedades, processo este produzido com a
participação efetiva dos homens”. Daí, pode-se identificar um de seus
direcionamentos e sentidos.
Por esse prisma, entende-se a relevância de uma visão
processual e participativa da produção do saber histórico pode se
configurar como uma tentativa de renovação do entendimento sobre o
fazer histórico a ser disposto aos cursos universitários e às escolas da
época. Mas, desde sempre, entendendo-se que para a efetivação de tal
proposta, um longo caminho ainda havia de ser percorrido.
174
Segundo Sá (2006), a proposição da História Regional passou
a ser destacada como sentido inicialmente seguido na tentativa de
inserção de uma visão mais elucidativa da precípua participação de
todos os homens na construção da realidade histórica, estando esta
tendência não muito distante e nem totalmente desvinculada do
cotidiano vivenciado por docentes e discentes. Tal proposição veio ser
disposta em formulações e produções teóricas que vislumbraram esse
direcionamento como possibilidade e tentativa de renovação.
Além desse enfoque localista, Fonseca (2003, p. 117) destaca
esse momento como “fortemente influenciado por uma tendência
historiográfica estrangeira: a Nova História Francesa, que pressupõe o
desenvolvimento de investigações de temas diversos, condizentes a
diferentes dimensões sociais e, muitas vezes, entendidos como
marginais”.
Tal proposição passou a ser entendida como adoção de uma
nova forma de visualização do funcionamento da sociedade, então,
fortemente assolado pela interpretação universalista de tendência
marxista cuja explicação de ordem econômica era tida como veículo
mais adequado à compreensão das transformações ocorridas no macro
social.
Com o lento processo de redemocratização da estrutura política
nacional, esboçado no final da década de 1970 e início da de 1980, a
produção historiográfica começou a aproximar-se da possibilidade de
se pensar a realidade brasileira de uma nova maneira (MALTEZ, 2008).
Isso implicaria na adoção de mudanças teóricas, estruturais e
metodológicas quanto ao ensino da disciplina História. Esta proposta
sendo condizente às possíveis modificações curriculares e a novos
vieses a serem assumidos nas publicações didáticas e paradidáticas.
Nessa nova realidade, volta a tomar força nos meios
universitário, escolar e editorial a possibilidade de se sintonizar o saber
histórico escolar com o saber histórico acadêmico, determinando a
busca de formulações teóricas e disposições metodológicas que
possibilitem um conhecimento satisfatório do saber de cunho histórico
175
disposto aos diferentes níveis de ensino. Devendo estar atrelada, esta
proposição, ao conhecimento e discussão da produção historiográfica
vigente no país.
Sobre esta proposta, Fonseca (2006, p. 59), indica a emergência
do discurso de “necessária incorporação de tendências historiográficas
da época, na elaboração de currículos e textos didáticos, estando entre
elas a História das mentalidades e do cotidiano, propostas tidas como
inovadoras quanto à pesquisa e ao ensino de História”.
Com a consolidação do processo de redemocratização e a
criação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) a produção
historiográfica e a elaboração de políticas educacionais no Brasil
tendem a assumir um formato mais participativo e dialógico
(MANOEL, 2008). Assim sendo, a busca por uma estruturação teórica
e metodológica mais adequada começa a nortear as proposições
educacionais; o que vem, consideravelmente, dar uma nova formatação
à disciplina escolar História, porém sem desvinculá-la, totalmente, de
suas nuances tradicionais.
Frente este novo contexto, um dos aspectos a ser destacado,
desta tendência renovadora, diz respeito a inserção do aluno no cenário
de produção do conhecimento histórico, transmutando-o de paciente
contemplativo para agente transformador e reconhecedor de seu papel
e dimensão nessa realidade. O que poderia lhe possibilitar a
identificação de sua existência como sujeito da história, não estando
mais preso as noções de distanciamento e desvinculação dos
acontecimentos no tempo, que o reduziam a espectador neutro, passível
apenas de exercer sua interpretação factual.
Com esse intuito, a necessidade de resgate da História enquanto
ciência passou a ser entendido e relacionado como uma realidade
disposta ao desenvolvimento de um novo método e uma nova visão
sobre os seus objetos e objetivos de estudo, que se dispusessem à
superação da moral religiosa e de seu papel como elemento de formação
cívica, disposta a mesma em tempos anteriores.
176
Procurando identificar essa nova tendência formativa do saber
histórico, Bittencourt (1998, p. 25) alerta que: “nenhuma disciplina
escolar pode ser entendida como transposição literal da ‘ciência-mãe’
no meio educacional, pois as mesmas sobrevivem com a influência
direta dos valores contemporâneos, dos problemas sociais, além do
saber erudito”. Tal afirmação, abriria campo para discussões referentes
a ideia de transposição didática e as relações possíveis entre Escola e
Universidade na produção historiográfica.
Mediante as questões apresentadas, a discussão interpretativa
referente à possibilidade de aproximação ou distanciamento do saber
histórico em relação ao conhecimento científico perfaz uma dimensão
temporal relacionada às vertentes diretas e indiretas condizentes ao
meio social em que esta área do conhecimento se encontra inserida.
Nesse contexto, os objetivos almejados com a estruturação e o ensino
de uma disciplina escolar não se encontram restritas unicamente as
especificidades relativas aos meios escolar e educacional.
Ademais, entender a historicidade e as intencionalidades que
configuraram e ainda vêm formatando as nuances estruturais da
História, tanto como instrumento de pesquisa e estudo no universo
acadêmico ou como componente curricular escolar, pode lançar luzes
sobre interesses, tendências e práticas revisionistas que indivíduos e
grupos sociais frequentemente defendem sobre essa área do
conhecimento. Pois, entender a História como construção
eminentemente humana, pode salvaguardá-la de seu entendimento com
uma dimensão divinizada, neutra e incólume a vicissitudes e interesses
escusos, produzindo pouca criticidade quanto a sua função e
estruturação.
Nisso, mediante as forças do ontem e do agora, das
coletividades e dos indivíduos, e das diversas realidades socioculturais,
pode-se propor uma nova dimensão de se pensar e utilizar o
conhecimento histórico quanto sua funcionalidade, utilidade e
importância: como realidade instigante, diversa e complexa, tanto
quanto as estruturais sociais e as dimensões humanas nelas inclusas.
177
Referências
178
MANOEL, I. O ensino de História no Brasil: origens e significados.
Dep. Hist. – FHDSS – Unesp. Disponível em: <
http://www.franca.unesp.br > Acesso em: 10 out. 2008.
179
180
ENSINO DE HISTÓRIA, PESQUISA E O RELATO DE UMA
EXPERIÊNCIA DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM
MOSQUEIRO1
181
historicismo, que transforma a disciplina num instrumento pedagógico
voltado para a formação do cidadão, assim como se faz na busca da
compreensão da genealogia das nações europeias. O Colégio Pedro II,
criado na primeira metade do século XIX, inseriu os estudos históricos,
em seu primeiro regulamento, a partir da sexta série, com a utilização
de compêndios e manuais franceses, como o de Charles Seignobos –
“A história das civilizações”. A História do Brasil era um apêndice da
história da civilização (europeia), “relegada aos anos finais dos
ginásios, com número ínfimo de aulas, sem uma estrutura própria,
consistia em um repositório de biografias de homens ilustres, de datas
e batalhas” (NADAI, 1993, p. 145-146).
O currículo da disciplina de então expressava a ideologia do
Estado, portanto, materializava os interesses das classes dominantes na
maneira de se educar historicamente o cidadão em formação, no sentido
de mostrar-lhe que sua identidade se formou pela contribuição mútua e
harmoniosa entre três etnias: brancos europeus, indígenas americanos e
negros africanos. Num tipo de história narrada sem violência, sem
conflito, de forma unívoca, com muitos silêncios sobre a escravidão
negra e indígena, sobre a opressão imposta e acerca das resistências de
índios e negros. Como resultado desse currículo destacam-se
desigualdades sociais mascaradas, ausência de democracia, dominação
oligárquica e a sustentação de estereótipos como o da unidade
territorial, povo cordial, abençoado por Deus, país repleto de belezas
naturais (NADAI, 1993, p. 149-150). Além de que a História da
América e da África foram, na prática, esquecidas por esse currículo em
que há demasiada importância à Grécia e Roma, assim como se
confundia tempo histórico e cronologia, com a ideia de que o
movimento histórico decorre da ação de sujeito ilustres – por isso a
exaltação dos heróis nacionais nos feriados e festas cívicas (NADAI,
1993, p. 151).
182
Circe Bittencourt discute o ensino de história no contexto das
primeiras décadas do século XX, atentando para a formação do cidadão
patriótico, em sua relação com a civilização e o trabalho, num contexto
social e político no qual ficava nítido que para os filhos das classes
abastadas eram reservadas as posições de destaque na sociedade, o que,
portanto, sucedia uma vida de estudos propedêuticos até alcançarem a
formação em nível superior; enquanto para os filhos da classe
trabalhadora, o ensino deveria se preocupar com a preparação para o
trabalho. Nesse ínterim o ensino ofertado nas escolas alinhava-se a esse
propósito, vejamos:
A escola que todos os brasileiros deveriam
frequentar seria, assim, a preparação para um
sistema social sem conflitos, embora a estrutura
de classes (...) [de] “castas”, fosse mantida. A
harmonia e a conciliação entre as classes sociais
estariam garantidas através das concepções
difundidas pela escola, sendo o trabalho
concebido como o esforço de todos para construir
a riqueza da Nação, omitindo o enriquecimento de
indivíduos ou classes sociais. Não seria também
pelo trabalho que haveria diferenciações na
sociedade, porque a unidade dos cidadãos seria
mantida em torno dos interesses do estado e
estariam os cidadãos promovendo a unidade
nacional. (BITTENCOURT, 1990, p. 103-104).
183
contrapartida, compartimentalizou, fragmentou e passou a controlar
ideologicamente os cursos (GUIMARÃES, 2012, p. 21). O decreto de
lei 547, de 18 de abril de 1969, autorizou o funcionamento de cursos
profissionais superiores de curta duração para a docência, o que
provocou diminuição da qualidade na formação profissional de
professores (GUIMARÃES, 2012, p. 24). O decreto 869, de 12 de
dezembro de 1969 obrigou a inclusão de Educação Moral e Cívica
(EMC) em todos os níveis da educação brasileira (básica, superior e
pós-graduação), que passou a ser ministrada em Estudo dos Problemas
Brasileiros – EPB. Além de se tornar conteúdo obrigatório das demais
disciplinas (GUIMARÃES, 2012, p. 26). A Lei 5.692 de 11 de agosto
de 1971 tornou obrigatório o 1º grau e transformou o segundo em
profissionalizante, esvaziando a formação geral dos currículos. As
duras críticas a essa lei forçaram o MEC a alterá-la, o que aconteceu
com a promulgação da lei 7044 de outubro de 1982, principalmente no
tocante ao 2º grau. O acesso à escola aumentou, mas as distorções
continuaram presentes (GUIMARÃES, 2012, p. 22). Tais medidas
diminuíram a carga horária de história e geografia, em favor das
disciplinas Organização Social e Política do Brasil – OSPB –, e
Educação Moral e Cívica – EMC (GUIMARÃES, 2012, p. 27). A
docência em História, durante a ditadura militar, transformou-se num
instrumento pró interesses dos militares:
184
educação escolar básica, que forma crianças e
jovens, esteve submetido à lógica política do
governo (GUIMARÃES, 2012, p. 30).
185
entre os que executam, os produtores e os
consumidores de saberes, os pesquisadores e os
professores, a teoria e a prática. (SILVA &
GUIMARÃES, 2012, p. 29)
186
Assim, é possível perguntar: estes sentidos estão
presentes no ensino de história? Acredito que
podem estar. É material por seus aspectos
administrativos e técnicos de organização
institucional de espaços e tempos; funcional, pois
permite ao mesmo tempo a cristalização da
lembrança e sua transmissão; simbólico, porque
permite a atribuição de sentidos e ressignificação
de práticas e representações (MONTEIRO, 2007,
p. 14).
188
aprendizagem, sustentado em estruturas dialógicas” (KNAUSS, 2012,
p. 33). O referido autor defende a utilização das fontes em sala de aula.
Consideramos que o bem cultural, uma vez que trabalhamos com a
educação patrimonial, deve ser apresentado ao aluno como documento,
de acordo com a indução do conhecimento histórico. “Importante
ressaltar que é o aluno que lê o mundo e não o professor, que fica com
a função de orientador e animador, é o aluno que vivencia a percepção,
a intuição, a crítica e a criação” (KNAUSS, 2012, p. 42).
Paulo Pires de Queiroz debate a necessidade de articulação
entre teoria e prática; e, formação acadêmica e o contexto escolar. Diz-
nos que:
... ensinar história requer um diálogo permanente
com diferentes saberes produzidos em diferentes
níveis e espaços. Requer questionamento sobre a
natureza, a origem e o lugar ocupado por esses
diferentes saberes que norteiam e asseguram sua
prática em sala de aula (QUEIROZ, 2012, 105).
189
criativa. De acordo com essas concepções, a
pesquisa ganha centralidade no ensino. De uma
perspectiva política, o professor é considerado um
sujeito problematizador. Entre nós, vários
conceitos têm sido utilizados, tais como: professor
pesquisador, professor reflexivo, professor crítico
(SILVA & GUIMARÃES, 2012, p. 36).
191
estável, o ponto central, tanto dos que trabalham com as elites, quanto
daqueles que se voltam para o estudo dos excluídos, é a busca pela
garantia, ao máximo, de veracidade e objetividade. No que tange à
procura pela contraprova e exclusão de distorções em outras fontes, há
a criação de instrumentos que, se não eliminam a subjetividade, pelo
menos a controlam. A segunda abordagem privilegia as relações entre
memória e história tanto no estudo da elite política, quanto nas camadas
excluídas. Sendo que defende que o sentido do método de pesquisa não
se fecha na questão de identificar possíveis mentiras e distorções de
testemunhos, mas busca aproveitá-los como possibilidades outras de
pesquisa, quando capazes de levar o pesquisador a outros meandros da
memória que levam a pessoas a distorcer ou falsear a realidade
(FERREIRA, 2002, p. 326-327).
Marieta Ferreira defende que a história oral, não como
disciplina, mas como método de pesquisa, que produz uma fonte
especial, tem se revelado um bom instrumento para compreender
estratégias de ação e representação de grupos ou indivíduos nas
diferentes sociedades (FERRERIA, 2012, p. 330).
Utilizamos a história oral também quando inquirimos os alunos
com as seguintes perguntas: 1- Como o ensino de História pode lhe
ajudar em sua vida prática? 2- O que você entende por Patrimônio
Cultural? 3- O que podemos considerar como Patrimônio Cultural de
Mosqueiro?
192
- O ensino de História é muito importante nas questões políticas
(Tiago – 301);
193
- O coreto da Vila (4 pessoas);
- O Círio (2 pessoas);
- O modo de vida das pessoas, como o dos pescadores (Fernando
301);
- O Carimbó (2 pessoas);
- O trem que havia (Luís Henrique 301)
195
seus respectivos valores nacionais. Nessa perspectiva, a busca pela
proteção dos bens culturais nacionais esteve atrelada à valorização do
belo, do artístico, do suntuoso (FUNARI & PELEGRINI, 2006, p.15).
Em solo pátrio, na sigla do principal órgão federal, que cuida do tema
em questão, ainda, permanece a denominação Patrimônio Histórico
(IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional), a qual
se tornou usual. Entretanto, refere-se a apenas uma parte dos bens
culturais que integram o Patrimônio Cultural brasileiro, entendidos
como o resultado da cultura humana no Brasil, que podemos dividir em
Patrimônio Cultural Natural, Imaterial e Material. O primeiro grupo
corresponde aos elementos da natureza que são apropriados pela cultura
humana. O segundo diz respeito aos bens chamados “intangíveis”, ou
aquilo que se relaciona com o saber e ao saber fazer. Enquanto que os
bens materiais são tangíveis, palpáveis, como obras de arte, prédios,
sítios arqueológicos (LEMOS, 2010, p. 7-11).
Em cima daquilo que os alunos identificaram como
patrimônio,5 selecionamos os bens culturais relacionados à economia
196
da borracha em Belém, da virada do século XIX para o XX e
construímos um roteiro pedagógico, histórico, cultural, traçado da Praia
do Murubira, passando pela orla de Mosqueiro, até chegar ao bairro do
Maracajá, onde está situada a escola. Itinerário no qual existem chalés
de época, praias, prédios públicos e equipamentos urbanos – entendidos
como lugares de memória por nós (NORA, 1993). Com a rota
planejada, cuidamos da logística com os órgãos e agentes públicos:
SEMOB, Polícia Militar, Guarda Municipal, Agência Distrital, que
foram responsáveis pela proteção dos alunos no trajeto e pelo
fornecimento de água mineral. O circuito foi percorrido por meio de
passeio ciclístico, com a participação do técnico da escola, Arnaldo
Azevedo, e seu respectivo acompanhamento pedagógico da atividade,
dos professores de Educação Física, Gilderson Trindade, que repassou
aos alunos orientações em relação à preparação física, de Geografia
(Aldo Rodrigues) e História (o autor deste texto), além da colaboração
da direção da escola (Arneide de Carvalho) que preparou o almoço na
escola, servido quando chegamos. Durante o percurso realizamos várias
paradas para historicizar os bens culturais em questão e relacioná-los ao
debate da urbanização e preocupação com a preservação do meio
ambiente e da herança cultural, com as contribuições contundentes do
professor de Geografia.
Noutro momento, já em sala de aula, cuidamos da explanação
sobre o tema Economia da Borracha no Pará6 e sua relação com a
197
história de Mosqueiro, assim como apresentamos conceitos referentes
ao Patrimônio Cultural. A partir de então solicitamos aos jovens a
produção de um relatório da aula de campo, no qual eles apresentaram
o que aprenderam, seguindo as orientações passadas pelo Guia Básico
de Educação Patrimonial (HORTA; GRUNBERG & MONTEIRO,
1999), produzido pelo IPHAN: observação do bem cultural, pelos
sentidos; registro, por descrição, fotografias, desenhos, etc.;
exploração, por meios de pesquisa em documentos diversas; e,
apropriação, por meio de poesia, dramatização, filme, texto, etc. O que
podemos relacionar com o “processo indutivo de conhecimento
histórico” (KNAUSS, 2012).
“Me arrisquei a compor uma poesia”, comentou a Débora da
301 – “Chalés Eternos”:
Suas marcas na história/ Deixaram para sempre/
Através de sua arquitetura convenceram muita
gente/ Mostraram seu valor/ E todo o seu amor/
Conquistaram corações/ Pelas suas construções/
De ferro importado/ Juntamente ao seu modelo/
Transformaram o vilarejo/ Na bucólica
198
Mosqueiro/ Chalés que embelezam/ A orla do
arquipélago/ Mostram aos moradores/ O quanto
Mosqueiro é belo.7
199
ultrapassadas e ricamente reconstruídas nas rotinas, no cotidiano das
ruas. Os educandos tiveram a oportunidade de por em prática o conjunto
de conhecimento sobre história (...) discutido nas atividades teóricas”.
(LEAL, 2011, p. 143).
Referências
200
GUIMARÃES, Selva. Didática e ensino de história. 13ª Edição revista
e ampliada. Papirus Editora. Campinas, 2012.
201
NIKITIUK, Sônia (org.). Repensando o ensino de História. 8. Ed. São
Paulo: Cortez, 2012.
202
ANACRONISMO: AGENTE FACILITADOR OU OBSTÁCULO
À PRÁTICA DOCENTE?
203
Entretanto, o questionamento que fica é: será que a utilização do
anacronismo deve ser evitada a todo custo no processo de construção
do conhecimento?
Segundo o historiador Hilário Franco Junior, a demasiada
crítica ao anacronismo envolvido na produção historiográfica é o
problema a ser combatido, considerando que na verdade a prática então
“demonizada” por Febvre, o anacronismo, é na verdade utilizada como
ferramenta essencial para compreensão das temporalidades históricas
tão diversas entre si, deixando claro que “Se anacronismo é uma
deformação cronológica, uma mistura de épocas, escrever história é
sempre um exercício de anacronia [...]” (FRANCO JUNIOR, 2009, p.
13).
É importante que se faça uma análise acerca da transposição
didática, quando da realização da prática do anacronismo e aplicação
da mesma no processo de desenvolvimento da prática docente, haja
vista que tal prática é muitas vezes utilizada como importante recurso
no processo educacional.
De acordo com Yves Chevallard,
Como didáticos nós devemos procurar
compreender não só a resposta do aluno à
pergunta e a resposta do professor para a atitude
do aluno, mas também o que o professor, na
ocasião, irá declarar tanto sobre o comportamento
do aluno como da sua própria conduta em face
dele. Não somos livres para descartar os meandros
inerentes ao mundo da didática. Ao contrário do
físico, que se contenta em explicar como e porque
as pedras caem, ficamos com o ônus de explicar
como as pessoas explicam a queda de pedras
(CHEVALLARD, 1998).
204
que o conhecimento científico seja disponibilizado visando atender seu
público alvo de forma a facilitar sua compreensão. É nesse âmbito que
se dá o processo de transposição didática, em uma lógica a partir da
qual diante de uma relação de ensino-aprendizado, os conhecimentos
científicos precisem ser adaptados para uma forma de “conhecimento
ensinável”, visando o estabelecimento de um contrato didático
socialmente legítimo (CHEVALLARD, 1998).
Por outro lado, André Chervel estabelece críticas ao processo
conhecido como transposição didática, ao considerar que, ao contrário
das ideias de Chevallard, o processo conhecido como transposição
didática não se mostra como o caminho mais viável a ser seguido, a
partir da lógica na qual o ambiente escolar também se apresenta como
local onde o conhecimento é construído, não se limitando simplesmente
a reproduzir de forma adaptada conhecimentos científicos previamente
constituídos visando estabelecer um “conteúdo escolar”, não se
resumindo a meras vulgarizações ou adaptações dos conteúdos de
ensino e posteriormente apresentados pelos professores aos atores
envolvidos no processo de ensino-aprendizado. Em “História das
disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa”,
publicado na década de 1990, o autor, propõe que, ao pesquisador da
área educacional, cabe realizar uma análise pautada sobre três questões
primordiais:
[...] O primeiro é o de sua gênese. Como a escola,
sendo a partir daí desqualificada toda outra
instância, começa a agir para produzi-las? O
segundo refere-se à sua função. Se a escola se
limitasse a ‘vulgarizar’ as ciências ou a adaptar à
juventude as práticas dos adultos, a transparência
dos conteúdos e a evidência de seus objetivos
seriam totais. Já que ela ensina suas próprias
produções, não se pode senão se questionar sobre
suas finalidades: elas servem para quê? Por que a
escola foi levada a tomar tais iniciativas? Em quê
205
determinada disciplina responde à expectativa dos
pais, dos poderes públicos, dos que decidem?”
206
qual ele é responsável por formar não somente os indivíduos, mas
também uma cultura que vem, por sua vez, penetrar, moldar, modificar
um modelo cultural da sociedade global (CHERVEL, 1990, p. 184 ).
Tendo discutido previamente a questão da transposição
didática, segue o debate sobre o papel da História na reflexão didática,
sob a ótica de Klaus Bergmann, que em seu texto “A História na
Reflexão Didática” inicia expressando que
Uma reflexão é histórico-didática na medida em
que investiga seu objeto sob o ponto de vista da
prática na vida real, isto é, na medida em que, no
que se refere ao ensino e à aprendizagem, se
preocupa com o conteúdo que é realmente
transmitido, com o que podia e com o que devia
ser transmitido [...] (BERGMANN, 1989/1990, p.
29).
207
formas de mediação intencional e de representação e/ou exposição de
História, sobretudo do ensino da História, além de buscar
explicitar os pressupostos, condições e metas da
aprendizagem na disciplina específica de História,
os conteúdos a serem transmitidos, os métodos e
as categorias e a possibilidade da estruturação dos
conteúdos a partir das categorias e a possibilidade
da estruturação dos conteúdos a serem
transmitidos, os métodos e as categorias, e a
possibilidade da estruturação dos conteúdos a
partir das categorias didaticamente escolhidas na
Ciência Histórica e analisa também as técnicas e
materiais de ensino e as várias possibilidades da
representação da História, seja no ensino ou nos
ambientes fora da escola (BERGMANN,
1989/1990, p. 31).
209
da psicanálise, passam a buscar novas formas de atuação e legitimação
para a existência do dito saber histórico, indo na contramão dos
modelos anteriores que visavam o desenvolvimento de uma espécie de
monumentalização do passado como uma espécie de antiquariato,
conservando valores de outras épocas, aliadas a um nacionalismo
agressivo, militante e militarista, segundo ressaltava o filósofo alemão
Friedrich Nietzsche ainda nos últimos instantes do século XIX.
Segundo Durval Muniz de Albuquerque Júnior, somente depois
das ideias proferidas pelos historiadores dos Annales é que se tem um
novo modelo de história feita a partir e para o presente. Através das
problematizações que são formuladas a partir das preocupações, das
condições históricas do presente ao qual se submetem os
questionamentos, ao qual se estuda, analisa e ensina. O conhecimento
histórico produzido com essa ótica, possibilita que se proponham novas
abordagens sobre a temporalidade e as temáticas que se investigam à
medida que as próprias transformações assim requeiram.
De acordo com o autor,
[...] O passado, portanto, é elaborado, pensado e
tratado na sua relação diferencial com o presente;
ele existe nessa escavação que se faz a partir do
contemporâneo buscando a construção das
fronteiras que separam as duas temporalidades.
Uma das funções sociais da história é construir o
passado, dotando a sociedade de uma visão do
tempo que vá além daquilo que se define e se
pensa como presente. A história serve para que
possamos realizar, no plano do conhecimento, do
pensamento, do imaginário, da memória, aquilo
que não podemos fazer no plano do
conhecimento, do pensamento, do imaginário, da
memória, aquilo que não podemos fazer no plano
da realidade e da empiria: sair do presente,
ausentar-nos desta temporalidade que nos cerca,
olhar este tempo de fora e ter com ele uma relação
210
de distanciamento, de estranhamento, ter, dele,
uma visão perspectiva [...] (ALBUQUERQUE,
2012, p. 30).
211
Referências
212
“POR UM ENSINO DE HISTÓRIA LIBERTADOR E
DEMOCRÁTICO....”
de ser ministradas desde início de 2015. As PCCs referentes aos demais níveis
da educação básica, permanecem no desenho curricular do curso de
Licenciatura em História.
216
compreensão textual. De modo semelhante, ao pensar na elaboração de
jogos, vídeos, entre outros produtos, o historiador/professor com certa
prática em turmas de do Ensino Fundamental I, acionaria a essa
experiência e reflexões pertinentes, para desenvolver seu trabalho.
Nesse sentido, Fernando de Souza Paiva registra
Com a problemática desencadeada em torno do
debate sobre o modus e o locus da formação de
professores da educação infantil e séries iniciais
do Ensino Fundamental, nada é mais perceptível
do que a certeza de que formar o professor é
estratégico, por atravessar todos os setores da
sociedade e por conter, em seu âmago, a questão
do projeto de sociedade que se almeja para o país,
pois o professor molda gerações. Essa temática
abrange, também, questões importantes: como,
onde, quem, para quê e para quem se educa?
Portanto, há uma necessidade premente de se
reconhecer efetivamente, em todos os âmbitos, a
educação como ciência - desejo antigo de Anísio
Teixeira - e a formação de professores como
mediadora desta ciência, buscando um
entendimento em torno da formação do professor.
Do contrário, os professores continuarão a ser
banalizados e tidos como cidadãos e profissionais
de segunda categoria, digladiando-se em uma
arena onde outros atores também disputam espaço
(PAIVA, 2006, p.11).
220
No tocante aos currículos, deu-se a opção (por
parte do governo) em focalizar os cursos
presenciais de licenciatura em Pedagogia, porque
respondem pela formação de professores do 1º ao
5º ano do ensino fundamental e da educação
infantil, e, licenciaturas de Língua Portuguesa,
Matemática e Ciências Biológicas, porque seus
licenciados respondem pelo maior conjunto de
aulas no ensino fundamental. Procedeu-se a um
mapeamento de propostas curriculares desses
cursos, tendo em conta os diversos tipos de
instituições de ensino superior que os ofereciam.
Como as Diretrizes Curriculares nacionais para
esses cursos são amplas, e a estruturação do
currículo fica a cargo de cada instituição,
procurou-se obter um panorama do que está sendo
proposto como formação nas instituições de
ensino superior, identificando ênfases que lhes
estão sendo atribuídas, semelhanças, diferenças,
pertinências e adequação às demandas
profissionais.
10
Considerações finais
227
compreensão do cotidiano de professores e alunos do 2º ao 5º ano na
escola. Destacaram a importância da realização das práticas em escolas
de realidades tão distintas e, consequentemente, do enriquecimento
advindo de experiências empíricas e acadêmicas que certamente
somarão no processo de formação de cada um.
Ao salientar a contribuição das práticas em seu processo de
formação acadêmica, a maioria dos graduandos envolvidos nas práticas,
enfatizou a importância de refletir sobre tudo que conseguiram observar
e participar nas escolas com vistas à proposição de projetos futuros, que
contribuíssem para um ensino de história mais democrático,
participativo e, portanto, libertador. Expressaram sua gratidão para com
o alunado, funcionários em geral e docentes das escolas, sobretudo das
públicas estaduais e municipais, por colaborarem com o trabalho
desenvolvido nas PCCs. Uma estudante chegou a dedicar seu relatório
“a todos os funcionários e alunos da EEEFM ‘Augusto Olímpio’”.
À guisa de concluir, reafirmamos nossa convicção sobre a
importância do conhecimento histórico para os estudantes dos anos
iniciais do ensino fundamental. Seria muitíssimo importante que as
licenciaturas em história volvessem sua atenção para este “lugar
distante” da educação básica. Por sinal, não é demais relembra que a
educação básica tem passado por mudanças significativas e
preocupantes também, haja vista a reforma do ensino médio,
recentemente aprovada e imposta à sociedade.
Outrossim a História, componente curricular (tradicional) na
educação básica, também tem passado por mudanças, por força da
produção historiográfica e de políticas públicas. Então, pensar o papel
da história na educação básica reveste-se de sentido e importância, uma
vez que no processo de construção de nossa cidadania é fundamental
desenvolver uma leitura de mundo propiciadora de respeito ao outro, ao
diferente e um dos modos de se fazer isso, é através dos estudos sobre
o tempo histórico, que nortearão a compreensão acerca da historicidade
da vida em sociedade. Essa poderia ser uma das marcas indeléveis dos
estudos históricos ao longo da educação básica, principalmente nos
228
primeiros ciclos do ensino fundamental. O desenvolvimento da
sensibilidade voltada para esse fim lançaria reflexos nas produções
literárias, lúdicas, didáticas enfim, que têm como alvo esses estudantes.
Afinal, o ensino de história é um direito de toda a sociedade. O exercício
desse direito precisa estar na perspectiva daquele que se propõe a ser
um professor de história, um historiador. Nesse sentido, recorro às
palavras de Durval Muniz de Albuquerque (2012, p. 38)
(...) A história teria, assim, mais essa função
social, a de nos fazer aprender a narrar, a contar
histórias, a enredar fatos, atividades
humanizadoras por excelência. Aprender a contar
histórias, aprender a reunir palavras em frases e,
com elas, criar sentidos para um outro é um passo
decisivo em nosso processo de humanização; por
isso todas as comunidades humanas contam
histórias, narram eventos para suas crianças. O
ensino de história, nos anos iniciais da formação
de qualquer pessoa, tem também essa função do
aprendizado da arte de contar, da arte de narrar.
Além disso, pode-se aprender com a história a
produzir beleza com a narrativa, a criar deleite e
prazer estético com o uso das palavras e dos
eventos do passado (...)
229
Referências
230
www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/textos_fcc/arquivos/1463/arquiv
oAnexado.pdf. Acesso em 20 nov 2012.
PRIORE, Mary Del (org). História das Crianças no Brasil. São Paulo:
Contexto, 1999.
231
SANTOS, Maria Auxiliadora Moreira dos; GARCIA, Tânia Maria F.
Braga IN “A formação da consciência histórica de alunos e professores
e o cotidiano em aulas de história” IN Cad. Cedes, Campinas, v. 25,
n.67, pp. 297-308, set/dez, 2005. Disponível em:
<http://www.cedes.unicamp.br> SILVA, Marcos Antônio da &
FONSECA, Selva Guimarães. Ensino de História hoje: errâncias,
conquistas e perdas. In: Revista Brasileira de História [on line]. 2010,
vol. 30, n 60, pp. 14-33.
232
ENTRE A DOCÊNCIA E A INVESTIGAÇÃO: A FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DE HISTÓRIA NA UFPA - CAMPUS DE
ANANINDEUA
Entre o final dos anos de 1980 e início dos anos 1990, com fim
da ditadura militar e o processo de abertura democrática, sintetizada
principalmente pela promulgação da nova Constituição de 1988,
acentuou-se a discussão no seio da universidade brasileira acerca do
papel social da educação e mais especificamente da disciplina de
História, no que Rudá Ricci (2003) chamou de formação para
cidadania. Esse cenário de ebulição de ideias e de debates sobre os
rumos da educação brasileira culminou com a publicação, em 20 de
dezembro de 1996, da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a
LDB.
Na entrada do novo milênio, com um governo eleito
democraticamente, a discussão acerca do papel da educação e o
processo de inclusão social, pela via educacional, ganha força na pauta
de reformas do ensino. De acordo com Claudivan Guimarães (2015, p.
110), trata-se de um momento em que a necessidade de formar
professores capazes de atender a essa demanda reprimida entra na
ordem do dia, bem como a discussão sobre um currículo que atendesse
a essa nova realidade e que formasse um profissional mais afeiçoado às
questões pedagógicas.
233
Como resultado dessa nova realidade, no ano de 2002, o
Ministério da Educação e Cultura (MEC), lançou através do Conselho
Nacional de Educação (CNE), a Resolução CNE/CP 1 de 18 de
fevereiro de 2002 e a Resolução CNE/CP 2 de 19 de fevereiro de 2002,
ambas em consonância com a LDB. A Resolução CNE/CP 1 instituiu
diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da
educação básica, em nível superior, nos cursos de licenciatura de
graduação plena. Este documento constitui em um conjunto de
princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na
organização institucional e curricular de cada estabelecimento de
ensino de licenciatura (BRASIL, 2002a).
Entre as determinações apontadas nas resoluções CNE/CP 1 e
2 destaca-se a instituição da duração mínima dos cursos de licenciatura,
de graduação plena para formação de professores da educação básica
em 2.800 (duas mil e oitocentas) horas e ainda determina que a
articulação entre teoria e prática se dê da seguinte forma: 400
(quatrocentas) horas de prática como componente curricular,
vivenciadas ao longo do curso; 400 (quatrocentas) horas de estágio
curricular supervisionado a partir do início da segunda metade do curso;
1.800 (mil e oitocentas) horas de aulas para os conteúdos curriculares
de natureza científico-cultural e 200 (duzentas) horas para outras
formas de atividades acadêmico-científico-culturais (BRASIL 2002a e
2002b).
Dessa forma, os cursos de licenciatura foram divididos em
1.800 (mil e oitocentas) horas de disciplinas teóricas e 1.000 (mil) horas
de prática, sendo que, a prática e o estágio foram separados, onde cada
um deve ser composto por 400 (quatrocentas) horas e ainda 200
(duzentas) horas que podem ser compostas por seminários,
participações em congressos, projetos de ensino, monitorias, etc.,
quaisquer atividades acadêmicas, contanto que não fossem em forma de
disciplinas cursadas.
A ideia central dessa discussão estava, justamente, em formar
um professor capaz de responder à nova realidade social, atento as
234
condições da escola pública e envolvidos nas demandas por uma
formação mais crítica da sociedade. A proposta era atender um número
maior de alunos, grande parte deles oriundo das camadas populares, que
na sua formação não tinham o mesmo grau de nível educacional dos
alunos oriundos das camadas médias que, até então, eram os que
acessavam a escola. Desse modo, era fundamental que se formasse um
professor que soubesse lidar com essa nova realidade. Ou seja, um
professor que nos dizeres de Déa Ribeiro Fenelon (2008) tivesse uma
vivência mais forte com a prática profissional e com a realidade social,
política e cultural da comunidade onde ele iria atuar. Para essa autora,
esse contato com a realidade social, dos novos alunos, deveria ocorrer
durante a formação do “novo” profissional da educação, constituindo
como elemento diferencial.
Isso posto, diante desse quadro das diversas licenciaturas da
instituição, o Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão –
CONSEPE, da Universidade Federal do Pará (UFPA), através da
Resolução nº 3.633, de 18 de fevereiro de 2008, que regulamentou o
ensino de graduação, procurou estabelecer as diretrizes apresentadas
pelo CNE vinculadas a carga horária mínima para os cursos de
formação de professores, as definições de atividades teóricas e práticas,
as ações de estágio e a participação de seminários e congressos, como
atividades acadêmicas curriculares (BRASIL, 2008).
Mediante as mudanças na estruturação das licenciaturas,
determinadas pelo MEC e buscando seguir o que foi instituído pelo
CONSEPE, foi autorizado a criação do Curso de Licenciatura em
História, conforme Portaria SERES/MEC n. 938 de 01 de dezembro de
2015. Neste sentido, a proposta deste texto é analisar a atual estrutura
curricular deste Curso de Licenciatura em História do Campus
Universitário de Ananindeua (CANAN), da UFPA, principalmente
quanto aos fundamentos epistemológicos, éticos e didático-pedagógico,
os objetivos apresentados, perfil do egresso e os procedimentos
metodológicos adotados, considerando os aspectos de formação
profissional a que o curso se propõe.
235
Importante destacar que se trata de uma graduação que teve sua
proposta discutida, considerando um conjunto de legislação instituídas
entre os anos de 1990 e 2000, em que se destaca: a Resolução nº 3.186,
de 16 de dezembro de 2004, que institui as Diretrizes Curriculares para
os Cursos de Graduação; a Lei n. 9.795, de 27 abril de 1999, que dispõe
sobre a educação ambiental, assim como institui a Política Nacional de
Educação Ambiental; o Parecer n. 492, de 3 de abril de 2001, que
estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de
Graduação, no capítulo em História; a Resolução nº 13, de 13 de março
de 2002, que estabelece as Diretrizes Curriculares para o Curso de
História; Parecer nº 8, de 31 de janeiro de 2007, que dispõe sobre carga
horária mínima e procedimentos relativos à integralização e duração
dos cursos de graduação, bacharelados, na modalidade presencial;
Resolução nº 2, de 27 de agosto de 2004, que adia o prazo previsto no
art. 15 da Resolução CNE/CP 1/2002, que institui Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação
Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena;
Lei n. 11. 788, de 25 de setembro de 2008, que dispõe sobre o estágio
de estudantes e altera a redação do art. 428 da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT); Portaria n. 3.284, de 7 de novembro de 2003, que
dispõe sobre requisitos de acessibilidade de pessoas com deficiência
(PCD), para instruir os processos de autorização e de reconhecimento
de cursos, e de credenciamento de instituições; e a Resolução nº 1, de
17 de junho de 2004, que estabelece as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
236
extensão. O entendimento é que o curso deve formar profissional com
autonomia, criticidade, capacidade de lidar com a diversidade cultural,
de posicionar-se diante das situações sociais e políticas, e em condições
de desenvolver escolhas conscientes sobre a maneira como vai
desenvolver seu trabalho ao lidar com o conhecimento histórico. É o
que Lúcia Maria Moysés (1994, p. 3) destaca como profissionais
politicamente comprometido, considerando que conhece e utiliza
adequadamente os recursos capazes de propiciar uma aprendizagem
real e plena de sentido. Compreende o docente crítico e bem informado,
em condições de analisar e atuar no mundo em que vive. Estas
características de formação seriam possíveis somente em profissionais
capazes de articular a pesquisa, ensino e extensão, de forma a construir
um conhecimento que dialogue de forma objetiva e sintomática com as
demandas da sociedade.
Do ponto de vista da concepção de educação, o curso visa
proporcionar condições de exequibilidade para o pleno exercício da
liberdade no processo de ensino-aprendizagem, assim como o convívio
com o pluralismo de ideias e o consequente apreço pela tolerância.
Neste aspecto, se estabelece o que Paulo Freire (1996, p. 93) chamaria
de "autoridade coerentemente democrática", para destacar que a
disciplina, como conjunto de conteúdos e estratégias de ensino,
verdadeiramente não existiria na estagnação, no silêncio dos
silenciados, e sim na dúvida, na inquietação, daí a importância da
liberdade e da defesa da pluralidade de ideias. Diante desta observação
poderíamos destacar que a proposta do curso privilegia as dimensões da
construção do conhecimento para além da realidade escolar ou
acadêmica, estabelecendo articulações entre o processo de ensino-
aprendizagem com a realidade extraescolar, vinculando a educação
formal com o universo do trabalho e das práticas sociais, tendo a
liberdade e tolerância como princípios orientadores desta formação.
Como fundamento para atuação do profissional de História,
privilegiou-se a formação para o domínio do conhecimento histórico e
as práticas essenciais para a produção historiográfica e sua difusão. O
237
que implica no desenvolvimento da capacidade de reflexão analítica e
crítica, a partir de posturas de diálogos e construção de conhecimentos
em conjunto com outras áreas disciplinares. Neste aspecto, o objetivo
do curso se pauta em formar professores de História para atuar na
Educação Básica (ensinos Fundamental e Médio) e em espaços não-
formais de ensino.
Do ponto de vista da atuação profissional, o curso apresenta
como proposta a formação que permita exercer sua atividade em
diferentes setores da sociedade que articulam a construção de
conhecimentos sobre a dimensão temporal, como escolas, museus e
centros de memórias e documentação. Selva Guimarães Fonseca e
Regina Couto (2008, p. 124), advertem da necessidade de pensar em
conteúdos multidisciplinares e interdisciplinares, assumindo o desafio
de quebrar a lógica disciplinar, sem perder de vista que se deve pensar
em espaços interculturais que possam dar outros significados as
dimensões da teoria e da prática – bem como o ensino alicerçado à
pesquisa – e pensar que as transgressões metodológicas são passos
significativos e desconcertantes, que se deve considerar, no sentido de
ampliar os horizontes de atuação do profissional de História. O que se
está defendendo, e que pode ser vislumbrado na proposta do curso, é
uma atuação de forma privilegiada no espaço escolar, sem perder de
vistas outras dimensões. Nesse caso, se coloca a responsabilidade ao
docente que media e viabiliza a construção do conhecimento histórico
escolar, que mobiliza elementos teórico-metodológicos e didático-
pedagógicos para planejar e fundamentar as bases das escolhas
curriculares, o mesmo grau de compromisso no que se refere pensar o
espaço do ensino para além da sala de aula.
Como observado anteriormente, além de trabalhar diretamente
na sala de aula, o profissional formado no curso de História do Campus
de Ananindeua, pode atuar com competência em outros espaços de
ensino, guarda e preservação de memória. Deve estar apto a elaborar e
analisar materiais didáticos, como livros, textos, vídeos, programas
computacionais e ambientes virtuais de aprendizagem. Tem ainda
238
condições de realizar pesquisas em Ensino de História, coordenar e
supervisionar equipes de trabalho. Em sua atuação, deve primar pelo
desenvolvimento do educando, incluindo sua formação ética, a
construção de sua autonomia intelectual e de seu pensamento crítico.
Sua habilidade ao exercício docente, pressupõe transitar entre o saber
histórico acadêmico e o saber histórico escolar, além das práticas
essenciais de sua produção e difusão no contexto escolar.
Diante de uma atuação profissional caracterizada por uma
postura crítica e autonomia intelectual, assim como problematizadora
dos processos de significação da própria área do conhecimento, seja em
termos historiográficos, da cultura escolar ou da cultura histórica de
modo geral, o professor de História deve atentar que sua atuação no
magistério deve ser concebida como uma dimensão que ultrapassa a
mera tarefa pedagógica de transmitir o conhecimento, como adverte
Paulo Knauss (2001). Trata-se, neste aspecto, de enfatizar que o
conhecimento histórico deve ser orientado no sentido de indagar a
relação dos sujeitos com os seus objetos de conhecimento, provocando
seu posicionamento, questionando as formas de existência humana e
promovendo a redefinição dos posicionamentos de sujeitos no mundo
em que vivem. A partir disso, é preciso considerar que a produção do
saber histórico se evidencia como instrumento de leitura do mundo e
não mera disciplina (KNAUSS, 2001, p. 28).
A atividade da docência, considerando as observações
anteriores, como lembram Luiz Gonzaga Caleffe e Herivelton Moreira
(2006, p. 16-17), exige interação com a sociedade em toda a sua
estrutura organizacional, a fim de poder promover junto com seus
interlocutores a análise da realidade histórica e dela buscar
conhecimentos e experiências para avaliação e aprimoramento do
próprio ensino. Nesse sentido, acrescenta as autoras, o professor pode
realizar pesquisas que possam conduzir no contexto da prática
profissional imediata, com o objetivo de melhorar sua prática
pedagógica, desenvolver novas estratégias de ensino e buscar soluções
para os problemas que afetam a aprendizagem do aluno, ajudando os
239
gestores da educação a entender melhor o contexto em que ocorrem o
ensino e a aprendizagem.
Ainda sobre a questão, respaldando as reflexões anteriores,
deve-se atentar que o modo de formar professores de História, como
expressa a Resolução nº 13, de 13 de março de 2002, que estabelece as
Diretrizes Curriculares para os cursos de História, as quais devem ser
acompanhadas de ações que valorizem o papel de pesquisador, o que
possibilita, neste aspecto, diminuir as distâncias existentes entre as
práticas e os saberes históricos produzidos e debatidos no espaço da
Universidade e aqueles ensinados nas escolas de Ensino Fundamental e
Médio. Sem cair em reducionismo, estaríamos tratando aqui da ideia de
um professor-pesquisador, o que segundo José Carlos Libâneo (2002),
representaria adotar uma epistemologia da prática. No caso, trata-se de
uma crítica à dicotomia entre teoria e prática, que está presente nos
cursos de licenciatura, uma questão que a formação de professores, no
caso da graduação em História do Campus de Ananindeua da UFPA,
procura superar. Nesse sentido, a preocupação em formar o professor
com conhecimento em fazer pesquisa é essencial para que ele possa
deixar de ser um reprodutor das práticas convencionais que são
internalizadas pela força da tradição e passe a ser produtor de
conhecimento e autor de sua ação educativa.
Do ponto de vista dos procedimentos metodológicos e
considerando a ideia de formar professores-pesquisadores, o curso
focaliza a aprendizagem do aluno de maneira libertadora, crítica e
criativa, uma vez que a intenção não é formar profissionais que são
meramente receptores de conhecimento, mas que reflita e que se
perceba como produtor de conhecimento. O que se pretende é contribuir
para que os alunos sejam coparticipantes no processo de ensino
aprendizagem, para que eles façam parte de uma relação tríade: aluno,
professor e o conhecimento. É o que poderíamos chamar de professor-
mediador. Para Libâneo (1994, p. 47), uma das características mais
importante da atividade profissional do professor é a mediação entre o
aluno e a sociedade, entre as condições de origem do aluno e sua
240
destinação social na sociedade, papel que cumpre provendo as
condições e os meios (conhecimento, métodos, organização, de ensino)
que assegura o encontro do aluno com os materiais de estudo. Para isso
planeja, desenvolve suas aulas e avalia o processo de ensino,
contribuindo assim, a partir de elementos didático-pedagógicos,
teóricos e metodológicos da ciência de referência e dos fundamentos da
educação, para que o aluno construa com autonomia o conhecimento.
Diante deste procedimento, como expressa o Projeto
Pedagógico do Curso de História (PPC) do Campus de
Ananindeua/UFPA, é fundamental que o docente saiba articular e
mobilizar os saberes históricos aos temas transversais para que o aluno
se perceba sujeito de sua formação e que possa refletir sobre a sua
realidade e o seu papel social, ou seja, pensar a educação para a
emancipação. Para isso, faz-se necessário trabalhar de forma
interdisciplinar, ou seja, proporcionar a integração dos conteúdos de
uma disciplina com outras áreas de conhecimento, relacionando teoria
e prática, integrando os conhecimentos que fazem parte da realidade
dos alunos com a teoria, para que estes possam ter uma melhor
compreensão dos processos de construção de sentidos e do mundo
(BRASIL, 2017, p. 11).
Pensar sobre experiência de formação docente implica também
em refletir sobre a percepção de prática reflexiva, que surge como um
modo possível dos professores interrogarem as suas práticas de ensino.
De acordo com Isolina Oliveira e Lurdes Serrazina (1998, p. 29), a
reflexão fornece oportunidades para voltar atrás e rever acontecimentos
e práticas. A expressão "prática reflexiva" aparece muitas vezes
associada à investigação sobre as práticas. Uma prática reflexiva
confere poder aos professores e proporciona oportunidades para o seu
desenvolvimento. A insatisfação sentida por muitos educadores com
sua preparação profissional, que não contempla determinados aspectos
da prática, tem conduzido a movimentos de reflexão e de
desenvolvimento do pensamento sobre as experiências docentes.
241
Para que as orientações anteriores se efetivem, como defende o
PPC, as atividades curriculares primam pela inclusão dos temas
transversais nos debates e nas ações educativas previstas para o curso,
em que articulam aos componentes curriculares do Núcleo de
Aprofundamento e Diversificação de Estudos às noções e debates
relativos à educação e direitos humanos, às políticas de educação
ambiental, à educação e as relações étnico-raciais e da cultura afro-
brasileira e indígenas. Ressalta-se que além dessas questões serem
tratadas de forma transversal ao currículo, o Curso de História oferta
alguns desses temas transversais em forma de disciplinas para que o
discente possa articular e mobilizar esses saberes num movimento
interdisciplinar e voltado para o respeito à diversidade nas suas
diferentes manifestações (BRASIL, 2017, p. 11).
Além do princípio libertador, crítico e criativo da
interdisciplinaridade, do diálogo, da relação teoria e prática, outro
princípio metodológico importante e que já apontamos de forma mais
objetiva é a pesquisa, pois através dela os alunos serão incentivados a
ir em busca de novos conhecimentos, a criar, estudar conceitos e
fundamentos pedagógicos que os possibilitem intervir na realidade.
Para facilitar a aplicação e desenvolvimento do que se produz e do que
está em produção na formação docente, do ponto de vista da pesquisa,
a promoção de ações extensionistas é fundamental. Não se trata de mera
prestação de serviços à comunidade, mas como componente essencial
de formação dos alunos, em que eles possam elaborar e executar
projetos educacionais em diversas instituições de ensino (BRASIL,
2017, p. 11). Para além dessa vivência docente no espaço escolar, as
atividades curriculares do campo educacional suscitam uma melhor
compreensão sobre o papel do educador, como também lhe dá suporte
para exercer atividades relativas à gestão educacional dos sistemas
educativos de ensino.
Com a adoção das ações anteriores, busca-se novos objetos que
não sejam os heróis do passado e não necessariamente o jogo frio da
luta entre indivíduos e grupos sociais pelo domínio do poder político e
242
das estruturas econômicas. Objetiva-se então, com a proximidade com
a realidade, recuperar o sujeito em sua cotidianidade do contexto social
onde está inserido. Pretende-se valorizar o presente, os desafios
humanos atuais, as preocupações mais urgentes da humanidade. A
centralidade nos desafios atuais dá outra perspectiva ao estudo do
passado, reconhecido agora como memória histórica e patrimônio
cultural resgatando numa nova abordagem, como tarefa da
emancipação humana (RIBEIRO & MARQUÊS, 2001, p. 22).
Para contribuir com a formação dos alunos, outro componente
metodológico importante é a adoção de pluralismos de espaços e
estratégias de ensino, como evidenciamos anteriormente. Isto se
justifica por possibilitar e incentivar os alunos a participarem de eventos
culturais, científicos, acadêmicos, bem como o envolvimento com
projetos educacionais que englobem as comunidades próximas à
universidade, trabalho com monitoria nas escolas de Educação Básica
e na participação em grupos de pesquisa que debatam sobre os
processos de ensino-aprendizagem e sociabilização, bem como
elaborem ações voltadas para a formação continuada dos docentes
(BRASIL, 2017, p. 11).
Quanto às estratégias metodológicas, além da aula expositiva
dialogada, os professores podem propor aos alunos trabalhos
individuais e em grupo, que contem com a proposição e execução de
projetos educacionais e incluam o uso de novas tecnologias da
informação e da comunicação; seminários e outras atividades e
estratégias didático-pedagógicas a critério do professor, a fim de
incentivar os alunos a participarem ativamente do processo de ensino
aprendizagem, assim como ações combinadas com as escolas de
educação básica para proporcionar aos graduandos a experiência
docente em diferentes áreas do campo educacional. Relacionado a isso,
os princípios avaliativos são essenciais para o processo de
aprendizagem dos alunos, mas a avaliação não pode ser entendida como
mero instrumento de constatação de resultados, pelo contrário,
defendemos uma avaliação que seja formativa, ou seja, a avaliação do
243
que o aluno realmente aprendeu e do que precisa aprender, explorando
múltiplas estratégias e instrumentos de avaliativos, tais como: provas,
seminários, trabalhos individuais e em grupos, pesquisa, entre outros,
haja vista que dessa forma é possível avaliar os alunos de diversos
ângulos. Além disso, é necessário avaliar a participação dos discentes
em múltiplas dimensões da vida acadêmica, como por exemplo, em
eventos científicos, culturais e monitoria, entre outros (BRASIL, 2017,
p. 12).
Entre a formação docente e a investigação, o Curso de História
da UFPA, Campus de Ananindeua, nos aponta um caminho que
perpassa pela elaboração de um currículo que tenha a dimensão da
compreensão de um passado muito mais próximo da demanda e
realidade apresentada pelo tempo presente.
(Continua)
244
Fonte: BRASIL, 2017, p. 57.
Outras considerações
245
desigualdade social, escassez de recursos e um sistema educacional
fragilizado. Diante disso, é necessário que se forme um novo
intelectual, um novo perfil de egresso, um intelectual moderno,
diretamente produtivo, com capacidade para atuar com eficácia prática
e política, que se dedique a fazer crítica ao arcaico princípio educativo
e se predisponha a trazer inovações no que tange à metodologia de
ensino.
O que observamos nos antigos currículos são remendos pouco
eficazes na consecução daquilo que se realmente almeja na formação
do profissional e de sua desenvoltura na prática do ensino, como
também no campo de produção acadêmica. Deparamo-nos com alunos
de graduação que tem verdadeiro pavor de enfrentar a sala de aula.
Quando não, com concluintes do curso que não tem a mínima
capacidade de redigir um trabalho ou projeto acadêmico. São meros
reprodutores de ideias prontas, sem pensamento crítico ou inovador,
mas, sobretudo, que não atinam para o verdadeiro sentido do que seria
educação e a profissão de educador. São estas características formativas
que a Licenciatura do Campus de Ananindeua/UFPA procura superar.
Apontamos aqui, um curso construído da necessidade de se
trazer para o âmbito da educação a discussão e problematização de
questões deste novo milênio, quais sejam a intensificação e aplicação
da discussão de temas que envolva os direitos humanos, questões de
gênero, ou seja, temas atuais que precisam ser abordados nas escolas e
delineiam o perfil da realidade social. Destarte, o profissional de
licenciatura deve estar preparado para lidar e compreender tais vertentes
do campo social, havendo assim uma vinculação entre a educação, o
trabalho e as práticas sociais.
Nos parece que é nas demandas sociais da contemporaneidade
e na necessidade de superação das dificuldades pelo conhecimento da
trajetória histórica da sociedade, que o curso em tela se sustenta.
246
Referências
247
______. Ministério da Educação. Portaria nº 2.253, 18 de outubro de
2001. Autoriza a inclusão de disciplinas não presenciais em cursos
superiores reconhecidos. Diário Oficial [da] República Federativa do
Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 2001.
248
______. Ministério da Educação. Resolução nº 2, de 27 de agosto de
2004. Adia o prazo previsto no art. 15 da Resolução CNE/CP 1/2002,
que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de
licenciatura, de graduação plena. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 2007.
249
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à
prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
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251
Esta obra foi produzida via impressão digital por demanda.
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