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CAROLINA DE ARAGÃO ESCHER MARQUES

CONFLITOS ENTRE ALUNOS DE 11 E 12 ANOS:


CAUSAS, ESTRATÉGIAS E FINALIZAÇÕES

CAMPINAS
2015
i
iii
iv
v
RESUMO

Fundamentado na teoria piagetiana, este trabalho se constitui de um estudo qualitativo e


quantitativo que tem como objetivos identificar as causas, as estratégias empregadas e as
finalizações dos conflitos vividos entre os alunos de 11 e 12 anos, bem como investigar diferenças
nas formas como esses adolescentes resolvem os conflitos vividos e como julgam solucioná-los.
Tem, também, por objetivo comparar essas mesmas variáveis com os alunos de 8 e 9 anos,
participantes de um estudo anterior análogo. A amostra foi constituída por 62 alunos do sexto ano
do Ensino Fundamental II de duas escolas públicas do interior paulista, escolhidas por
conveniência. Os dados foram coletados por meio de sessões de observação da rotina escolar no
decorrer de um semestre letivo num total de 100 horas, sendo encerradas por saturação. Para avaliar
como os alunos julgavam resolver conflitos, foram apresentadas, por meio de entrevistas clínicas,
histórias contendo conflitos hipotéticos, elaboradas com base na identificação das principais causas
das desavenças entre os alunos. Os resultados das observações indicaram que as principais causas
que geraram conflitos nos alunos de 11 e 12 anos foram a provocação e a reação ao comportamento
perturbador. As estratégias de resolução mais frequentemente utilizadas foram as unilaterais e o
abandono foi a finalização mais comum para as desavenças observadas. Os alunos de 8 e 9 anos
apresentaram as mesmas categorias com relação às causas, estratégias e finalizações mais presentes
em seus conflitos. Quanto à comparação entre o juízo e a ação, os alunos de 11 e 12 anos
apresentaram, assim como os de 8 e 9 anos, estratégias de resolução de conflitos mais evoluídas
em termos de coordenação e tomada de perspectiva ao verbalizarem acerca dos conflitos
hipotéticos, do que ao agirem nos conflitos reais vivenciados. Apesar dos ganhos em maturidade
cognitiva, em compreensão interpessoal e no repertório de comportamentos, expressos
especialmente nos relatos frente aos conflitos hipotéticos, os níveis reais de estratégias mais
cooperativas não apresentaram uma evolução significativa quando comparados aos alunos de 8 e
9 anos (p=0.041), reiterando, assim, a importância de se disponibilizar mais oportunidades de
reorganizações reflexivas que almejem o desenvolvimento de competências sociais. A contribuição
do estudo foi, portanto, o detalhamento das evoluções da compreensão e da vivência dos conflitos
interpessoais, oferecendo subsídios para o planejamento de intervenções mais afinadas com as
necessidades próprias de cada faixa etária.

PALAVRAS-CHAVE: conflitos interpessoais, construtivismo, educação, adolescência,


estratégias de resolução de conflitos

vii
ABSTRACT
Characterized as a qualitative and quantitative study and grounded in Piaget's theory, this study
aimed to identify the causes, the strategies employed, the outcomes of conflicts experienced
between 11 and 12 year old students, as well as to compare if there are differences in the ways they
solve experienced conflicts and how they judge to fix them. This study also has as objective to
compare these same variables among students of 8 and 9 years old, participants from a previous
analogue study. The set consisted of 62 sixth grade students from two elementary public schools
in São Paulo State/Brazil, chosen at convenience. Data were collected during 25 days of
observation, accruing for a total of 100 hours, under various situations of school routine. To assess
how the students think resolve conflicts using the piagetian clinical method, stories were submitted,
containing hypothetical conflicts drawn from situations observed. The results of observations
indicated that the main reasons that led to conflicts among 11 and 12 year old students were teasing
and reaction to annoying behavior. Resolution strategies more frequently used were unilateral and
abandonment was the most common outcome for the observed disagreements. Students of 8 and 9
years old had the same categories for causes, strategies and outcomes in their conflicts. In
comparison between judgment and action, 11 and 12 year old students presented, as well as the 8
and 9 year old, more advanced solving strategies of conflicts in terms of coordination and decision
perspective to verbalize on hypothetical conflicts than to pursue the experienced real conflicts.
Despite the gains in cognitive maturity, interpersonal understanding and behavioral repertoire,
especially expressed in the reports from hypothetical conflicts, the actual levels of more
cooperative strategies showed no significant change when compared to students of 8 and 9 years
old (p=0.041). This reiterates the importance of providing more opportunities to help promote
reflective reorganizations that aim to develop social skills. The contribution of the study was,
therefore, to detail the development in the understanding and in the experience of interpersonal
conflicts, providing support for the planning of interventions more in line with the needs of each
age group.

KEYWORDS: interpersonal conflict, constructivism, education, adolescence, interpersonal


strategies.

ix
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 1
2. UM DESTAQUE PARA A ADOLESCÊNCIA .................................................................... 5
2.1 Significados e perspectiva histórica ...................................................................................... 9
2.2 As dimensões biológica e social .......................................................................................... 15
2.3 A relação com a família ....................................................................................................... 22
2.4 O desenvolvimento moral .................................................................................................... 24
3. COMPREENDENDO OS CONFLITOS INTERPESSOAIS .............................................. 29
3.1 As estratégias de resolução de conflito................................................................................ 37
3.2 O papel da escola ................................................................................................................. 43
3.3 A violência nas escolas ........................................................................................................ 51
3.4 Variáveis relevantes ............................................................................................................. 55
3.4.1 A dimensão do gênero .................................................................................................. 55
3.4.2 - A dimensão cultural e social ...................................................................................... 59
3.4.3 – A dimensão da idade ................................................................................................. 62
3.4.4 – A dimensão da família ............................................................................................... 67
3.4.5 – A dimensão da personalidade .................................................................................... 72
4. INVESTIGANDO A PROVOCAÇÃO ENTRE PARES..................................................... 75
5. MÉTODO ............................................................................................................................. 89
5.1 Contexto da pesquisa ........................................................................................................... 89
5.2 Problemas ............................................................................................................................ 90
5.3 Objetivos.............................................................................................................................. 90
5.4 Premissas ............................................................................................................................. 91
5.5 Participantes ........................................................................................................................ 91
5.6 Caracterização das escolas................................................................................................... 91
5.6.1 - O ambiente sociomoral............................................................................................... 93
5.7 Delineamento da Pesquisa e Procedimentos de Coleta de Dados .................................... 100
5.7.1 Observação sistemática ............................................................................................. 101
5.7.2 Entrevistas para investigação do juízo....................................................................... 105
5.8 Análise dos dados .............................................................................................................. 109
6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ................................................... 113
6.1 A observação dos conflitos ................................................................................................ 113
6.1.1 As causas dos conflitos interpessoais ......................................................................... 114
6.1.2 As estratégias de resolução de conflitos ..................................................................... 138
6.1.3 As finalizações dos episódios dos conflitos ............................................................... 156
6.2 Comparação entre Ação e Juízo ........................................................................................ 170
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 181
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 189
APÊNDICE A ......................................................................................................................... 209
APÊNDICE B ......................................................................................................................... 211
xi
ANEXO A .............................................................................................................................. 213
ANEXO B............................................................................................................................... 215

xii
Para Manuela e Vinícius, meus filhos tão amados, por serem a mais plena e imensurável fonte de
felicidade em minha vida...

“Avião sem asa, fogueira sem brasa, sou eu, assim sem vocês...”

Esse trabalho é dedicado a vocês.


xiii
AGRADECIMENTOS
A Lívia Maria Ferreira da Silva, que é minha “amiga-irmã-marida”. Entre alegrias e dissabores,
saberes e erros, medos e sonhos, o que nos define é o amor. Voltaire nos lembra que “todas as
riquezas do mundo não valem um bom amigo”. E eu tenho a melhor: autora do abraço mais
acalentador, protagonista do sorriso mais sincero. Aqui e em vários cantos desse mundo! De tanto
andar ao seu lado, sou uma pessoa infinitamente melhor. E que venham novas aventuras, novos
encantamentos... Sempre juntas, para sempre.

A Telma Pileggi Vinha, minha orientadora, pela confiança depositada e pelas infindáveis
oportunidades de aprendizagem regadas por tanto apreço, respeito e incentivo. A você, a minha
maior gratidão.

Ao professor Robert L. Selman, pela inestimável oportunidade consentida na Harvard Graduate


School of Education e, principalmente, pelos ensinamentos tão valiosos.

Aos meus pais, Plinio e Cecília, por serem os fãs “número 1” e pela retaguarda imprescindível
durante todos esses anos. Foram vocês os grandes responsáveis por me mostrar o valor insuperável
do estudo.

A minha tia, Ana Aragão, pelo amor que tem por mim. Só isso explicaria tamanho cuidado e afeto
durante toda a minha vida. Te amar “de janeiro a janeiro, até o mundo acabar” não será suficiente
para demonstrar o tamanho da admiração que tenho por você.

Aos meus irmãos, Thiago e Gabriela, preciosidades da minha vida, simplesmente por me fazerem
tão bem, sem pedir licença...

A minha amada sobrinha, Luiza, por ter transformado o meu mundo em um lugar muito mais azul
e mais feliz desde a sua chegada.

A minha avó, Zezé, que em sua infinita fé, não se esquece, nenhum dia sequer, de rogar pela minha
felicidade. Ao Vô João, pelo exemplo de perseverança e de amor à vida que alimenta a minha
alma.

Ao Ricardo, pelo estímulo que permitiu o sonhar.

Aos meus colegas de trabalho e de estudo, pela convivência de cumplicidade. Agradeço, a cada
um, de forma única e especial:
Adriana Ramos, pelo exemplo de ousadia;
Adriano Moro, pelo exemplo de seriedade;
Flávia Vivaldi, pelo exemplo de garra;
Juliana Calil, pelo exemplo de amizade;
Lara Lucatto, pelo exemplo de superação;
Mariana Wrege, pelo exemplo de ternura;
Sandra Dedeschi, pelo exemplo de coragem;
Sônia Vidigal, pelo exemplo de determinação;
xv
Thais Bozza, pelo exemplo de dedicação.

A Mariana Tavares, a “chaveirinho das confliteiras”, pelo exemplo de generosidade. Você soube,
como ninguém, acalmar meu coração nos momentos tempestuosos e renovar minha coragem
quando ela insistia em ir embora. É sempre um privilégio ter você como minha parceira!

A Luciene Regina Paulino Tognetta, pelo exemplo de devoção que me renova na esperança de
uma educação mais digna para nossas crianças e jovens. O meu carinho por você é do tamanho
“do medonho da Serafina, do rabo do Cospe-Fogo ou, então, da pata do elefante que estava no
peito do rato”. Enorme, não é?

A minha “grude-grude” Alice Silva Licciardi, pela grandeza em acolher a mim e aos meus filhos
como partes da sua família... Minha vida ficou incrivelmente mais divertida ao ser inundada por
seus inseparáveis vestidos (“titidos”), batons (“tatons”) e laços cor de rosa!

A querida Luciana Castrillon e aos seus filhos Joe, Lilly, Cecília e Evelyn, por serem os nossos
preciosos “anjos da guarda” em terras tão distantes... Aonde quer que eu vá, levo vocês no olhar...

A Paula Saretta, minha amiga de fé, minha irmã camarada, amiga de tantos caminhos, de tantas
jornadas... Simplesmente amo você - e o seu Gui - “até a lua, ida e volta”.

Às professoras Orly Zucatto Mantovani de Assis, Vanessa Fagionatto Vicentin, Elaine


Prodócimo e Alessandra de Morais Shimizu, pelas contribuições preciosas.

Ao João Victor Aquino Batista, a Lara Cristina Ferreira da Silva e a Maria Célia Nobile
Cassiani, pela ajuda inestimável com as transcrições das entrevistas.

Aos jovens participantes dessa pesquisa, por permitirem o meu olhar “bisbilhoteiro” em suas
desavenças cotidianas, muitas vezes tão sofridas... Sem a confiança e a disposição de vocês, essa
pesquisa jamais teria acontecido.

E, por fim, a CAPES, pelo financiamento indispensável.

xvi
“Há, em cada adolescente, um mundo encoberto, um
almirante e um sol de outubro”.
(Machado de Assis)

xvii
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura I: Porcentagens para as causas nos alunos de 11 e 12 anos .......................................... 118


Figura II: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflitos nos alunos de 11- 12. .. 141
Figura III: Porcentagens para as estratégias unilaterais nas idades de 8-9 e 11-12 ................ 150
Figura IV: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo para o
grupo total de 11 e 12 anos ......................................................................................................... 171
Figura V: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo para as
crianças de 3 a 6 anos ................................................................................................................. 176
Figura VI: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo para as
crianças de 8-9 anos e 11-12 anos .............................................................................................. 177

xix
LISTA DE QUADROS

Quadro I: Algumas características do domínio da amizade nos primeiros estágios evolutivos .. 21


Quadro II: Níveis de desenvolvimento ordenados de coordenação perspectiva social e sua
aplicação para tipos de estratégias de resolução de conflitos sociais ......................................... 39
Quadro III: Esquema de classificaçãopara as estratégias de negociação interpessoal ............... 41
Quadro IV: algumas estratégias interpessoais prototípicas codificadas em níveis de
desenvolvimento 0 – 3 em cada orientação. .................................................................................. 64
Quadro V: Categorias das causas de conflitos ........................................................................... 116
Quadro VI: Categorias das estratégias dos conflitos ................................................................. 139
Quadro VII: Finalizações dos episódios de conflitos .................................................................. 157

xxi
LISTA DE TABELAS

Tabela I: Comparação das variáveis categóricas DA, DF e PR entre as faixas etárias 8-9 e 11-
12 ................................................................................................................................................. 119
Tabela II: Comparação das variáveis categóricas DP, PR e RC entre os gêneros .................... 121
Tabela III: Comparação das variáveis categóricas CO, FI e UN entre as causas ..................... 124
Tabela IV: Comparação das variáveis categóricas AD, AF, AV, DI, DL, DP, EX e RC entre as
faixas etárias 8-9 e 11-12 ............................................................................................................ 126
Tabela V: Comparação da variável categórica CO entre as causas .......................................... 133
Tabela VI: Comparação das variáveis CO, FI e UN entre as faixas etárias 8-9 e 11-12...........150
Tabela VII: Comparação das variáveis categóricas CO, FI e UN entre as faixas etárias 3-4, 5-6,
8-9, 11-12......................................................................................................................................153
Tabela VIII: Comparação das variáveis categóricas DI, DL, DP, PR e RC entre as
finalizações...................................................................................................................................160
Tabela IX: Comparação da variável categórica finalização entre as estratégias.......................161
Tabela X: Comparação da variável categórica finalização entre os gêneros.............................164
Tabela XI: Camparação da variável categórica finalização entre as faixas etárias de 8-9 e 11-
12..................................................................................................................................................168

xxiii
1. INTRODUÇÃO

Apesar da frequente rigidez das normas, da diversidade dos controles e da severidade das
punições, a indisciplina, a violência e os conflitos ainda são temas frequentes nas conversas de
professores e, também, nos diversos meios de comunicação. Embora os problemas de convivência
tenham sempre existido em qualquer grupo escolar, vive-se, atualmente, certo grau de alarmismo
e de insegurança que não devem ser menosprezados.
Em uma cultura cada vez mais heterogênea, as relações humanas nas escolas são, também,
cada vez mais complexas, e os pequenos conflitos e desavenças entre os alunos surgem com maior
facilidade e frequência (VASCONCELOS, 2005; LEME, 2006; BIONDI, 2008). Essa situação,
contudo, não é, em essência, nem positiva, nem negativa, mas pode vir a ser uma oportunidade
para o enriquecimento e o desenvolvimento pessoal dos envolvidos. A maneira como os adultos
responsáveis lidam com tais conflitos pode favorecer ou não essa aprendizagem.
Pesquisas demonstram que há um desenvolvimento nas causas dos conflitos, nas
finalizações e nas estratégias de negociação empregadas pelas crianças e pelos jovens (SELMAN,
1980; LICCIARDI, 2010; VINHA e LICCIARDI, 2012; SILVA, 2015; OLIVEIRA, 2014).
Indicam, também, que os profissionais da escola, muitas vezes, desconhecem esse processo de
desenvolvimento e realizam intervenções que não são coerentes com tal enriquecimento, o que
acaba por dificultá-lo, senão impedi-lo (VINHA, 2003; TOGNETTA e VINHA, 2007; VICENTIN,
2009).
O presente trabalho investigativo busca contribuir para a formação de professores sobre o
tema, para que as escolas possam empregar melhores procedimentos de intervenção, baseadas em
fundamentos teóricos e metodologias mais construtivas que contribuam efetivamente para que os
alunos desenvolvam estratégias de resolução de conflitos mais justas, respeitosas e cooperativas
em suas convivências
Especificamente, os objetivos são: identificar, nos conflitos entre os alunos de 11 e 12 anos,
quais são os motivos mais frequentes geradores de desavenças, quais são as principais estratégias
de negociação interpessoal empregadas e quais são as finalizações dos conflitos. Pretende-se,
também, comparar se há diferenças entre as maneiras como os alunos de 11 e 12 anos julgam

1
resolver os conflitos e os modos como eles os resolvem na prática, bem como comparar as causas,
as estratégias, as finalizações e os juízos entre alunos de 8 e 9 anos com os de 11 e 12 anos.
Essa investigação, contudo, compartilha dos mesmos objetivos e recursos metodológicos
do trabalho já realizado por Licciardi (2010), - cuja pesquisa priorizou os conflitos interpessoais
entre as crianças de 3 e 4 anos e de 5 e 6 anos –, do trabalho da mesma autora com alunos de 8 e 9
anos (SILVA, 20151) e da pesquisa em andamento com os alunos de 13 e 14 anos (OLIVEIRA,
2014). Tais estudos, em conjunto, pertencem a um subgrupo2 do GEPEM (Grupo de Estudos em
Educação Moral) sobre conflitos interpessoais e favorecerão a compreensão da evolução das
características dos conflitos, configurando-se, por fim, em uma investigação maior, de caráter
comparativo.
Para satisfazer aos objetivos da atual pesquisa, 62 alunos de duas escolas públicas do
interior do estado de São Paulo foram observados em seus diversos momentos rotineiros da escola,
em um total de 100 horas de observação em dias letivos consecutivos. Os procedimentos adotados
para a coleta dos dados foram a observação sistemática e a entrevista clínica piagetiana. O critério
para a interrupção das observações foi o de saturação. Após a realização da fase da observação,
foram analisadas e categorizadas as causas, as estratégias e as finalizações dos conflitos entre os
alunos. As principais causas encontradas foram destacadas e, então, histórias hipotéticas, a partir
do que foi observado, foram elaboradas. Os 30% de alunos mais envolvidos nas situações de
conflito em cada escola foram entrevistados individualmente, visando compreender como
julgavam resolver os conflitos hipotéticos construídos.
Sem que se entre na velha discussão entre teoria e prática, mas acreditando-se que a teoria
na prática não é outra, pois são indissociáveis e constitutivas, esse estudo parte do princípio de que
é fundamental conhecer as vivências e os pensamentos dos jovens para fundamentar a prática de
profissionais que, de alguma forma, estão envolvidos com a promoção de seu desenvolvimento,
tornando esses educadores cada vez mais atuantes e eficazes em sua ação cotidiana. Para Göergen
(2007), os alunos passam grande parte de sua vida na escola, o que a torna uma grande
influenciadora na formação da sensibilidade, da maneira de pensar e de julgar, na forma de

1
Autora alterou seu sobrenome.
2
MARQUES, C. A. E.; OLIVEIRA, M. T. A.; SILVA, L. M. F.; VINHA, T. P. Causas, estratégias e finalizações de
conflitos de alunos de 3 a 14 anos. Relatório não publicado, 2014.
2
organizar seus conceitos e representações, de enraizar atitudes e comportamentos referentes a si e
aos outros.
O texto ora apresentado não esgota, contudo, a complexidade do assunto, nem tampouco
abarca todas as dimensões que envolvem o conflito interpessoal.
A parte teórica focaliza, de forma geral, a educação e a gestão de conflito entre pares, com
algumas discussões imprescindíveis: no Capítulo 1, abordamos a adolescência e suas
características e, no Capítulo 2, as estratégias de resolução de conflitos, o papel da escola, a
violência e, finalmente, outras variáveis contextuais e situacionais que, de alguma forma,
interferem na maneira como os indivíduos julgam e agem em situações de desacordos interpessoais.
No Capítulo 3 há, ainda, uma discussão sobre as provocações entre pares, posto que essas são as
evidências de conflito escolar mais relatadas pela literatura (AHO, 1998).
No Capítulo 4, é apresentado o método, incluindo o contexto da pesquisa, os problemas, os
objetivos, a premissa, as características das escolas, os procedimentos de coleta e de análise dos
dados.
Já no Capítulo 5, inicia-se a análise dos resultados encontrados por meio das sessões de
observações e das entrevistas realizadas. As causas, as estratégias e as finalizações dos conflitos
são analisadas, bem como são feitas as possíveis comparações entre os alunos de 8 e 9 anos com
os de 11 e 12 anos. Há, ainda, a comparação entre o juízo e a ação dos alunos.
Esse último capítulo, em particular, contou com as sugestões do Prof. Dr. Robert L. Selman,
que me recebeu durante o período do estágio de doutorado sanduíche na Harvard Graduate School
of Education (de agosto a novembro de 2014). Além do esclarecimento de dúvidas teóricas e da
discussão de alguns pontos da análise dos resultados com o Prof. Selman, tive, ainda, o privilégio
do acesso aos materiais disponibilizados pela biblioteca daquela Universidade e a alguns programas
educacionais específicos sobre o desenvolvimento de competência sociais em alunos de Educação
Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.
Por fim, segundo a perspectiva teórica piagetiana aqui adotada, vale ressaltar que é, sim,
função da escola contribuir para o desenvolvimento integral dos alunos, facilitando-lhes a aquisição
de novos conhecimentos ou valores, desenvolvendo sua inteligência e convertendo-os em adultos
autônomos, tanto no âmbito cognitivo, como no moral. Entre as habilidades envolvidas nessa
evolução moral, está justamente a capacidade de negociação e de conciliação diante das desavenças
interpessoais.
3
Também merece destaque, nesse momento, o estudo realizado pela Fundação Victor Civita
e pela Fundação Carlos Chagas em 2012, acerca dos desafios dos anos finais do Ensino
Fundamental3, que salienta a escassez de estudos no campo da Educação enfocando,
especificamente, esse período da vida escolar (de 11 a 14 anos) – que engloba, justamente, a faixa
etária selecionada pela presente pesquisa. Acrescenta-se a isso, a formação incompleta dos
professores especialistas que ministram aulas do 6° ao 9° ano. Os dados da pesquisa supracitada
sinalizam, ainda, que as discussões nos cursos de licenciatura são distantes das questões práticas,
de ordem pedagógica, afetiva e social, que afetam meninos e meninas nesse período escolar. Os
professores, quase sempre, se atêm mais aos conteúdos de suas disciplinas do que às
particularidades do desenvolvimento desses estudantes.
A relevância da discussão aqui proposta inclui, então, a possibilidade de contribuir com a
formação dos educadores desses adolescentes, para que as escolas sejam efetivamente espaços para
que a tolerância e o respeito nas relações interpessoais possam ser forjados. Acima de tudo,
acredita-se que uma sociedade mais justa e pacífica é um intento real e que a escola possui uma
grande influência nessa transformação por ser o espaço privilegiado em que os jovens podem
aprender a viver e a conviver.

3
Edição especial da Revista Nova Escola sobre a pesquisa da Fundação Victor Civita (FVC): Anos Finais do Ensino
Fundamental: Aproximando-se da Configuração Atual, realizada pela Fundação Carlos Chagas (FCC) e concluída
em julho de 2012.
4
2. UM DESTAQUE PARA A ADOLESCÊNCIA

“Possuo coragem grande, sinto-me sempre forte,


como se suportasse muita coisa; sinto-me tão livre e
jovem!... E continuo a tentar encontrar a maneira de
ser como desejo ser...”
(Anne Frank)

O mundo está mais jovem. O número de pessoas entre 14 e 21 anos nunca foi tão grande, de
acordo com relatório da Organização das Nações Unidas. São mais de um bilhão distribuídos pelos
cinco continentes (CLAUDON, 2009). Segundo as recentes estimativas populacionais, para o ano
de 2011, o Brasil contava com um contingente de 34,5 milhões de jovens, o que representa 18%
do total dos 192,3 milhões de habitantes (WALSELFISZ, 2013).
Os jovens também têm tido cada vez mais espaço na mídia, no meio educacional, no poder
público e no imaginário social, havendo, inclusive, um consenso em torno da imagem da juventude
como fonte de preocupação para a população. É notável como o aumento da criminalidade, em
geral, coincide com a diminuição da idade dos autores. Ocorrências de maus tratos, desrespeito,
intimidação e ameaças são frequentes e envolvem cada vez mais os adolescentes. (VICENTIN,
2009; CORTI e SOUZA, 2005; BARBER-MADDEN e SABER, 2009).
Um estudo da ANDI – Comunicação e Direitos4 confirma essa perspectiva. Quando se
analisam todas as matérias publicadas por 53 jornais diários das diversas regiões do País em 2009,
que mencionaram explicitamente os termos adolescente e adolescência, ou focaram as idades entre
12 e 17 anos, por exemplo, o tópico mais abordado foi a violência. Para essa faixa etária, o foco
nos atos violentos supera a atenção dada à educação que, historicamente, foi o assunto de maior
interesse da mídia ao abarcar questões relacionadas às crianças e adolescentes (UNICEF, 2011).
Vale esclarecer, entretanto, que, se é verdade que os jovens aparecem entre os mais frequentes
autores da violência, também é verdade que representam o grupo social mais afetado por ela.
Ao vislumbrar o mapa da violência no Brasil, especialmente sobre a juventude, discute-se que
os jovens brasileiros, principalmente os de 15 a 24 anos, são atualmente a parcela da sociedade
mais exposta à violência, quer como vítimas, quer como autores. Barber-Madden e Saber (2009),

4
www.andi.org.br
5
em um panorama sobre a situação do jovem no mundo, também resumem que a violência
perpetrada hoje é marcadamente cometida por jovens e contra os jovens. Aliás, os avanços da
violência homicida no Brasil das últimas décadas tiveram como motor a morte de jovens.
Um estudo5, com base em dados de 2012, produzido pela Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República em conjunto com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF),
o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (LAV-UERJ) estima que mais de 42 mil adolescentes (12 a 18 anos) poderão ser
assassinados nas cidades com mais de 100 mil habitantes entre 2013 e 2019.
Em 2002, a Organização Mundial da Saúde, em seu relatório mundial sobre violência e saúde,
definiu especificamente o termo violência como:
o uso da força física ou do poder real ou em ameaça diante de um conflito, contra si
próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha
qualquer possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de
desenvolvimento ou privação (IBGE, 20126, p.66).

Para Walselfisz (2013), a cultura da violência é muito forte no Brasil, a capacidade de


negociação dos conflitos é baixa e a violência é extremamente utilizada para a solução dos
problemas. Para o autor, a maioria dos homicídios não está relacionada à droga, mas, sim, a essa
cultura. São crimes banais e o Estado não cumpre seu papel de preservar os setores da sociedade
mais vulneráveis, que são: os jovens e as mulheres moradores de periferia dos grandes centros
urbanos.
Alguns outros índices ajudam a contextualizar ainda mais a vida da população jovem
brasileira. Segundo os dados do IBGE de 2012, nas regiões sul e sudeste do país, 13,3% e 12,9%,
respectivamente, das adolescentes mulheres se disseram vítimas de agressão física praticada por
alguém da família ao menos uma vez, nos 30 dias anteriores à pesquisa. O UNICEF (2011) aponta
que os adolescentes homens brasileiros estão mais sujeitos à exclusão no sistema educacional e à
violência. Já, as meninas, são especialmente vulneráveis à exploração e ao abuso sexual, ao
abandono da escola em razão de gravidez precoce e às doenças sexualmente transmissíveis.
Ademais, é crescente a repercussão da ideia de que as escolas também estão se tornando
territórios de frequentes manifestações de caráter violento.

5
http://oglobo.globo.com/brasil/mais-de-42-mil-adolescentes-podem-ser-assassinados-entre-2013-2019. Data de
acesso: 28/01/2015
6
Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) - 2012
6
Segundo o Gepem (2014), tais manifestações referem-se à imposição de um esquema de
domínio-submissão, incluindo danos à dignidade pessoal, emprego da força para causar dano e
atentado à integridade física-moral-psicológica. Podem, ainda, ser classificadas como: 1) violência
dura – ações reguladas pelo código penal -, 2) violência branda – ações que também atacam a lei,
mas com menor gravidade -, 3) agressão reativa – caracterizada mais pela impulsividade, ou pela
falta de controle das emoções, do que pela intenção de agredir -, e 4) bullying – esquema recorrente
de domínio-submissão entre pares.
Em 2012, os resultados do IBGE com alunos do 9° ano mostraram que, no país, a proporção
de estudantes que deixaram de ir à escola, nos 30 dias anteriores à pesquisa, por não se sentirem
seguros no caminho de casa para a escola ou da escola para casa, foi de 8,8%.
Já, os resultados de 2010 (relativos ao ano de 2009) da pesquisa sobre violência nas escolas
públicas do Estado de São Paulo do Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério do
Estado de São Paulo (UDEMO)7, apontam que em 84% das escolas pesquisadas ocorreu algum
tipo de violência em 2009. Especificamente, 86% dessas escolas vivenciaram brigas (agressão
física entre alunos), sendo que 44,2% delas presenciaram acima de 12 ocorrências no ano. Uma
pesquisa mais recente realizada pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São
Paulo (APEOESP) e pelo Instituto Data Popular (2013)8 com 1.400 docentes de escolas estaduais
de São Paulo também ratifica o mesmo cenário do estudo supracitado e revela que 57% dos
professores consideram as escolas em que atuam um espaço violento e que tanto os alunos (83%),
quanto os professores (44%), são vítimas da violência escolar.
No entanto, a violência dura na escola, como o homicídio, ou o abuso sexual, por exemplo, é
substancialmente rara e os índices são decrescentes. Alguns dados do Ministério da Educação
(MEC) de 2007 e de 20119 com mais de 400.000 professores de Língua Portuguesa e Matemática
que dão aulas para alunos de 5° e 9° anos do Ensino Fundamental confirmam essa conclusão. Em
2007, 2,3% dos professores afirmaram terem sido agredidos fisicamente por estudantes dentro de
colégios, contra 1,9% em 2011. Também em 2007, 1,14% relataram que viram alunos frequentarem
a escola portando arma de fogo e, em 2011, 0,85%. Por fim, em 2007, 5,17% dos professores

7
Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério do Estado de São Paulo. Pesquisa disponível no site:
www.udemo.org.br
8
http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/observatorio-da-violencia/caderno-violencia-nas-escolas-analise-da-
pesquisa/. Data de acesso: 20/01/14
9
http://www.qedu.org.br/
7
relataram que houve casos de alunos que entraram na escola com facas e canivetes, e, em 2011,
esse índice caiu para 4,04%.
O que realmente é habitual na reclamação dos educadores que trabalham com adolescentes
são as frequentes e recorrentes atitudes de desordem, desinteresse acadêmico, insulto, humilhação,
difamação, violação de equipamentos públicos e privados, assim como transgressão às regras do
espaço utilizado. Se existem menos “crimes de sangue”, existem mais pequenas violências
cotidianas e contínuas manifestações perturbadoras ou indisciplinadas (ABRAMOVAY e RUA,
2002; DEBARBIEUX, 2006; VICENTIN, 2009; GEPEM 2014).
Dentre essas manifestações perturbadoras ou indisciplinadas estão as incivilidades, também,
chamadas de microviolências ou pequenas agressões do cotidiano, que se repetem constantemente.
A incivilidade não contradiz a lei, nem o regimento interno do estabelecimento, mas as regras de
boa convivência e de boas maneiras. Rompe, assim, com o que pode estar sendo esperado como
boa conduta social e incomoda mais pela intensidade e frequência do que pela gravidade
(exemplos: andanças pela sala, importunações aos outros, cochichos, falta de pontualidade,
conversa à margem do que se está tratando em classe, entretenimento com objetos impróprios para
a atividade proposta e momento e outras atitudes, como levantar, jogar objetos, gargalhar, gritar,
demonstrar indiferença, interromper a aula, entre outros) (GARCIA, 2006; DEBARBIEUX, 2006;
GEPEM, 2014).
Entretanto, Vicentin (2009) relembra que as queixas não se restringem à área educacional, mas
também à familiar ou a qualquer outro espaço em que os jovens estão inseridos. Camacho (2001)
e Sposito (2001) ainda acrescentam que, embora a violência no mundo contemporâneo esteja
presente em toda a sociedade, nos mais diversos espaços, classes sociais, faixas etárias e épocas,
destaca-se o crescimento de práticas violentas entre os jovens de classes médias e altas nos seus
diferentes espaços de atuação: na família, na escola ou na rua.
Enquanto esse é o cenário de muitos adolescentes, outra cena cotidiana bastante frequente diz
respeito a jovens brasileiros que não se envolvem em conflitos aparentes, pois se submetem às
ideias dos outros, com reações de conformismo e apatia, empregando estratégias submissas na
resolução de seus conflitos (VICENTIN, 2009; CARINA, 2008; CARINA E MANTOVANI DE
ASSIS, 2011).

8
Essa diversidade, que evidencia o quão árdua é a compreensão do universo do adolescente, é
decorrente, em grande instância, do fato de que o conceito de adolescência incorpora uma ideia de
multiplicidade de transformações e de composições melhor esclarecidas a seguir.

2.1 Significados e perspectiva histórica

Veloso-Besio (2010) esclarece que a adolescência é um tempo de experimentação de


mudanças significativas na personalidade que envolve, essencialmente, a definição da identidade,
o desenvolvimento de um projeto de vida e as dificuldades nas tomadas de decisão a respeito da
vida escolar e das relações interpessoais. Osório (1989) destaca que a principal crise evolutiva da
adolescência é, sobretudo, a aquisição desse sentimento de identidade pessoal: o que eu penso que
sou, o que os outros pensam que sou e o que eu penso que os outros pensam que sou. Todas essas
mudanças, segundo Veloso-Besio (2010), podem gerar uma situação de angústia que leva a
comportamentos mais ou menos adaptáveis ou com maior ou menor vulnerabilidade, dependendo
da presença de habilidades psicossociais e de estratégias de enfrentamento para responder a tais
demandas.
Para aprofundar a compreensão do fenômeno da adolescência, fazem-se necessárias algumas
reflexões sobre o que é essa fase da vida que propicia experiências semelhantes às pessoas nelas
envolvidas, incluindo, também, uma retomada da construção histórica desse conceito.
Adolescência deriva do verbo latino adolecere, que significa crescer ou crescer até a
maturidade (MUUSS, 1976). A Organização Mundial de Saúde entende que a adolescência
constitui um processo ligado às transformações físicas e psíquicas do indivíduo e que vai dos 10
aos 19 anos de idade, abrangendo a pré-adolescência (10 a 14 anos) e a adolescência propriamente
dita (15 a 19 anos) (CORTI e SOUZA, 2005). Já no Estatuto da Criança e do Adolescente10, o
termo adolescência é definido como a fase que vai dos 11 aos 18 anos incompletos, sendo o período
imediatamente posterior à infância, delimitação aqui também aceita.
Palácios (1995) assinala, ainda, uma importante distinção conceitual entre dois termos:
puberdade e adolescência. A primeira é entendida como um fenômeno biológico, de mudanças

10
Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
9
hormonais que transformam o corpo infantil e, portanto, de maturação humana universal. Já, a
adolescência, é considerada como um período psicossociológico, não necessariamente universal,
mas com elementos caracterizadores específicos, assim como nas demais etapas do
desenvolvimento. Ao delinear o mecanismo para explicar o conhecimento e sua construção
gradativa ao longo da vida, Inhelder e Piaget (1976) apresentam como marca da adolescência a
integração dos indivíduos ao universo social adulto e retomam que esta integração pode coincidir
ou não com a puberdade. A puberdade aparece mais ou menos na mesma idade em todas as etnias
e em todas as sociedades, já a integração na sociedade dos adultos, ao contrário, varia
consideravelmente em diferentes ambientes sociais e em diversificadas culturas.
Precisamente, os autores apontam que essa integração pressupõe um indivíduo que,
diferentemente do que ocorre com a criança - que se sente subordinada -, começa a considerar-se
como semelhante aos adultos e julgá-los em um nível de igualdade e de reciprocidade. Ademais, o
adolescente começa a pensar no futuro, a ter um projeto de vida, procurando introduzir-se e
introduzir seu trabalho atual ou futuro na sociedade dos adultos. Por esse motivo, propõe-se,
também, a reformar a sociedade em que vive, buscando garantir, ao mesmo tempo, mais êxito que
seus antecessores. Em muitos casos, entretanto, percebe-se um programa de ação reformador com
uma ambição ingênua e, até mesmo, desmedida e inacessível. Aparece, em decorrência disso, uma
forma de egocentrismo de pensamento diferenciada da encontrada na criança, que é simplesmente
representativa, mas sem reflexão.
Além de um aspecto intelectual, Piaget (1964-2006) afirma que o egocentrismo na
adolescência envolve claramente uma questão afetiva: se as crianças possuem um sentimento de
inferioridade aos adultos e os imitam, o adolescente se sentirá como um igual, porém querendo
ultrapassá-los e surpreendê-los, transformando o mundo. É por isso, segundo o autor, que os planos
de vida dos adolescentes “por uma parte, estão cheios de sentimentos generosos, de projetos
altruístas ou de fervor místico, e, por outra, são inquietantes por sua megalomania e seu
egocentrismo consciente” (p. 102). O egocentrismo adolescente caracteriza-se, assim, para Flavell
(1981), por uma espécie de idealismo ingênuo ou de uma onipotência de pensamento, própria de
todo egocentrismo.
Inhelder e Piaget (1976, p. 256), acrescentam que o “egocentrismo é uma indiferenciação
que ignora a multiplicidade das perspectivas”. Woolfolk (2000), contudo, exemplifica que,
diferentemente das crianças pequenas egocêntricas, os adolescentes não negam que as outras
10
pessoas tenham percepções ou crenças diferentes, apenas se tornam muito centrados em suas
próprias ideias. Também refletem sobre o pensamento dos outros, mas com frequência pressupõem
que todos estão interessados em seus pensamentos, sentimentos e comportamentos, o que pode
levar à sensação, comum no início da adolescência, de se estar “sob os refletores”, ou seja, que
todos os estão observando e analisando. Coleman (2011) também chama a atenção para esse
fenômeno típico dos adolescentes de criar uma “audiência imaginária”. A premissa é a de que os
outros são tão críticos ou admiradores de sua pessoa quanto ele próprio o é. Então, os adolescentes
vivem constantemente construindo e reagindo a uma audiência imaginada por eles, o que explica
alguns comportamentos peculiares, tais como: o desejo por privacidade, a preocupação com as
roupas ou as horas gastas em frente ao espelho. Outro aspecto levantado pelo autor acerca do
egocentrismo adolescente é conhecido como “fábula pessoal”. Inclui fantasias de onipotência, de
imortalidade, além de interesses e sentimentos exagerados de ser alguém muito especial e único.
O adolescente passa, portanto, por uma fase em que atribui um poder ilimitado ao seu
pensamento, que é capaz de modificar a realidade em um futuro muito mais glorioso. De maneiras
variadas (por meio de teorias políticas ou sociais, literárias ou estéticas, científicas ou
pseudocientíficas, religiosas ou filosóficas, etc.), o adolescente tem suas ideias próprias, que
acredita terem sido criadas por ele, que o libertam da infância e lhe permitem colocar-se em um
nível de igualdade ao adulto. Essa integração ao mundo adulto é, necessariamente, complementar
à formação efetiva de uma personalidade (INHELDER e PIAGET, 1976).
No entanto, ao efetivamente empreender um trabalho, é que o adolescente se torna adulto e
se transforma de um idealizador em um realizador. A tendência em se reunir em grupos com seus
semelhantes também é de fundamental importância: “é principalmente nas discussões com os
colegas que o criador de teorias frequentemente descobre, pela crítica às teorias dos outros, a
fragilidade das suas” (INHELDER e PIAGET, 1976, p.257).
Como acontece em outras transições do ciclo vital, há elementos do passado que se conservam
e novos elementos que surgem ou que precisam ser construídos.
Em termos das conservações e construções das capacidades cognitivas, especificamente,
Palacios (1995) retoma que, para Piaget, por exemplo, a adolescência marca o ingresso ao
pensamento formal (por volta dos 11 e 12 anos), um novo e superior estilo de pensamento que se
caracteriza por estender, à esfera da abstração, a lógica que a criança já tinha desenvolvido para
dar razão aos fatos e acontecimentos concretos e observáveis. Segundo Piaget (1964-2006), as
11
conquistas próprias da adolescência asseguram ao pensamento e à afetividade um equilíbrio
superior ao que existia nas faixas etárias anteriores.
Para Piaget (1964-2006), o adolescente se distingue da criança, sobretudo, por meio de uma
reflexão que ultrapassa o presente, característica fundamental do caráter hipotético-dedutivo do
pensamento formal. Parra (1983) acrescenta que, enquanto a criança do período anterior se limita
apenas às operações concretas de classes, relações e números, o adolescente é capaz de levantar
hipóteses; pensar em termos proposicionais (permitindo unir, logicamente, proposições, algumas
só admissíveis como um exercício mental); isolar variáveis em um problema, mantendo iguais
todas as outras; analisar combinatoriamente essas variáveis, garantindo a comprovação de todas
elas e, por fim, raciocinar em termos de proporção.
Além do mais, o adolescente é o indivíduo que, embora diante de situações vividas e reais,
consegue considerar possibilidades, refletir sobre seus pensamentos (pensamento autorreflexivo),
ou seja, é o indivíduo que começa a construir sistemas ou teorias. O fato de que essas teorias sejam
limitadas, inadequadas e, principalmente, pouco originais não tem importância do ponto de vista
funcional, posto que tais sistemas permitem ao adolescente sua integração moral e intelectual na
sociedade dos adultos (PIAGET,1964-2006).
Inhelder e Piaget (1976) ainda ressaltam que tanto o aparecimento do pensamento formal,
quanto à idade da adolescência em geral, isto é, a integração do indivíduo na sociedade adulta,
dependem de fatores sociais e culturais. No entanto, vale destacar que, nessa perspectiva, a
sociedade não atua por simples influência externa sobre os indivíduos e que estes não são, nem
com relação ao ambiente social e nem com relação ao físico, meras tábulas rasas nas quais as
coerções produziriam conhecimentos já estruturados. Para que o meio social atue realmente sobre
os cérebros, é preciso que “estes estejam em condições de assimilar as contribuições desse meio, e
voltamos à necessidade de uma maturação suficiente dos instrumentos cerebrais individuais” (p.
251).
A despeito das definições, convenções e características normativas apresentadas, vale
ressaltar que a ideia do que hoje se concebe como adolescência, demorou a se constituir. Aliás,
aprofundar-se na discussão das mudanças do significado da adolescência ao longo dos tempos é
uma tarefa inevitável para quem objetiva compartilhar de seu cuidado.
Todas as sociedades, em diferentes períodos históricos, estabeleceram suas classificações e
distinções entre as fases da vida. Na Idade Média, por exemplo, segundo Grossman (2010), não
12
existia um acordo sobre a especificidade das crianças, e o crescimento era definido como aumento
quantitativo dos aspectos físicos e mentais.
O historiador francês Ariès (1981) aponta que, nesse período, as crianças eram consideradas
como mini-adultos e confundiam-se a eles tão logo fossem consideradas capazes de ter alguma
independência das figuras maternas, aproximadamente aos 7 anos de idade. A partir desse
momento, ingressavam imediatamente no mundo adulto, compartilhando das atividades sociais.
As evidentes especificidades da condição juvenil, entretanto, começaram a ser mais bem
delineadas no século XIX, evidenciando-se, ao longo desses anos, como uma fase de potenciais
riscos. Não existia, contudo, uma cultura adolescente, nem a adolescência era considerada como
uma fase particular do desenvolvimento. Tais traços foram consolidados apenas no século XX e
difundidos amplamente na sua segunda metade (PALACIOS, 1995; CORTI e SOUZA, 2005;
GROSSMAN, 2010).
Segundo Grossman (2010), o século XX construiu e consolidou a ideia da adolescência como
uma etapa da vida com características próprias, possuidora de um estatuto legal e social. Ariès
(1981) ainda aponta que somente neste período aparecem, pela primeira vez, expressões que
demarcam o adolescente moderno típico, ou seja, uma mistura de pureza (provisória), de força
física, de naturismo, de espontaneidade e de alegria de viver, características essas que fariam do
adolescente o herói do século XX.
O autor complementa que a consciência da juventude tornou-se um fenômeno geral e banal
após a Primeira Guerra Mundial, em que os combatentes de frente se opuseram em massa às velhas
gerações de retaguarda. Daí em diante, a adolescência se expandiria, impulsionando a infância para
trás e a maturidade para frente.
As sociedades contemporâneas, por sua vez, são fortemente caracterizadas pelo dinamismo e
pela transformação, o que provoca constantes alterações na percepção social da juventude e na
vivência dessa condição.
Vive-se, atualmente, uma condição de aceleração do tempo, de alargamento do espaço e de
movimentação humana sem precedentes. Outro atributo forte da sociedade contemporânea é a
descartabilidade associada à pressão pelo consumismo, que potencializa consideravelmente a
brevidade e a instabilidade dos vínculos e contatos sociais (JUSTO, 2005). Este autor exemplifica
uma influência bastante evidente dessa descartabilidade ao apresentar a configuração do “ficar” ou
do “pegar” entre os adolescentes: trata-se de um tipo de relacionamento afetivo bastante popular,
13
principalmente entre os jovens, e que obedece à mesma lógica social e histórica: é breve,
passageiro, imediatista, volátil e descompromissado.
Paralelamente, com a difusão social contemporânea do culto à aparência, à beleza e à
erotização, Salles (2005) aponta que o jovem tem-se tornado modelo para as diferentes faixas
etárias, havendo, inclusive, uma necessidade de conservação da juventude. Em outras palavras, as
crianças, cada vez mais cedo, começam a se autodefinir como pré-adolescentes e o envelhecimento,
por sua vez, tende a ser postergado a todo custo.
Em consonância com as características descritas, Couto (1999) traz algumas tendências dos
adolescentes do Mercosul, a partir de um estudo conduzido pela agência Comunicação e Marketing
com 460 pais, professores e adolescentes brasileiros e argentinos. Os jovens brasileiros, em
especial, apresentam grande poder nas decisões familiares, além de serem ferrenhos críticos acerca
da vida parental no que se refere, por exemplo, à qualidade de vida, realização pessoal, hábitos e
taxas de prazer. Como efeito, os jovens têm cada vez menos pressa em sair de casa (fenômeno da
casa-ninho), postergando o contato com o mundo adulto para depois dos 25 anos. Outra tendência
refere-se à contestação: eles não aceitam uma moral imposta e comportamentos padrões instituídos,
ou seja, querem ser os protagonistas da sua própria história. Em consonância com o egocentrismo
adolescente anunciado por Piaget, Couto (1999) também encontrou que o jovem brasileiro é
essencialmente voltado para si, soberbo com seu próprio “eu”. Seu lema inclui: a vida deve ser
vivida plenamente, e a felicidade está em aproveitar o presente e em respeitar-se, indicando um
forte componente hedonista. O prazer é o que vai definir, por exemplo, a escolha e o crescimento
profissional e pessoal.
Explorando um pouco mais o “fenômeno da casa-ninho” encontrado nos jovens brasileiros,
ressalta-se que, atualmente, principalmente nos países europeus, essa extensão da juventude está
bastante solidificada socialmente, inclusive com a criação de políticas públicas específicas
(PALACIOS, 1995; CORTI e SOUZA, 2005; SALLES, 2005).
Para Salles (2005), além do prolongamento da adolescência - principalmente nas camadas de
nível socioeconômico médio da população –, e do elevado nível de consumo já apontado, algumas
outras dimensões caracterizam a adolescência na sociedade atual, como o acesso ilimitado à
informação, além de uma cultura predominante de se evitar conflitos, de suavizar o que pode ser
penoso, o que vai ao encontro do forte componente hedonista também encontrado nas tendências
apresentadas por Couto (1999).
14
A própria concepção bastante difundida de que a adolescência favorece um aumento geral nos
conflitos com os genitores é questionada em um estudo longitudinal de Galambos e Almeida (1992)
com 80 famílias canadenses. Segundo os autores, os conflitos em domínios específicos podem
apresentar, inclusive, uma diminuição quando relacionados, por exemplo, a temas como: tarefas
domésticas (arrumar o quarto, por exemplo), aparência (que roupas usar) e falta de polidez (fazer
muito barulho em casa). O aumento de conflitos com os genitores ficou restrito à dimensão das
finanças (quantidade de dinheiro gasto).
Couto (1999) também aponta que houve uma renovação no conceito de casa e de família. Para
a autora, os conflitos internos foram reduzidos e a casa se tornou um espaço mais aconchegante
para o adolescente, principalmente com o uso das tecnologias modernas, enquanto que o mundo
externo encontra-se cada vez mais amedrontador devido à violência urbana. La Taille (2006) e
Tardeli et al. (2012) também reforçam a tendência de que os jovens percebem o espaço público
como cada vez mais ameaçador e agressivo, uma vez que consideram que no mundo há mais
adversários do que amigos.
Considerando todo esse dinamismo contemporâneo, o que se concebe é que as características
psicodinâmicas que configuram o processo da adolescência, tal como foi descrita, estão vinculadas
a fenômenos sociais e culturais recentes da história humana ocidental. Isso implica que não há
como negar que diferentes jovens apresentam histórias evolutivas e experiências muito distintas na
adolescência.
Contudo, segundo Osório (1989) e Fierros (1995), em qualquer sociedade, em algum sentido,
com alguma duração e com características socialmente determinadas, existe adolescência, ou seja,
existe um período, mais ou menos longo, de desenvolvimento psicossocial da pessoa em torno da
puberdade.

2.2 As dimensões biológica e social

Praticamente todas as partes do corpo são afetadas pelas mudanças que ocorrem durante esse
período que geralmente começa aos 9 ou 10 anos. Além do desenvolvimento do sistema reprodutor
e do aparecimento das características sexuais secundárias, há, também, outras alterações: no

15
funcionamento do coração, no sistema cardiovascular, no sistema respiratório, no tamanho e na
força de muitos músculos (COLEMAN, 2011).
Sabe-se, por exemplo, que a adolescência contempla intensas transformações cerebrais, que
faz com que o sujeito sinta necessidade de criar coisas novas e de aprender. Outras modificações
em regiões do córtex que estão relacionadas com o raciocínio e a memória oferecem aos
adolescentes uma enorme capacidade, por exemplo, de lidar com informações diversas (UNICEF,
2011).
A neurocientista Herculano-Housel (2009) acrescenta que a adolescência é um novo período
de transformações do cérebro, que começa com uma fase de muitas conexões entre os neurônios,
seguida de uma fase de eliminação das conexões que não são mais úteis. A perda de sensibilização
do sistema de recompensa colabora com os sinais mais característicos dessa fase: o tédio, a perda
de interesse pelas brincadeiras da infância, a impaciência, o gosto por riscos e a busca de novidades.
O hipotálamo comanda a produção de hormônios sexuais e torna-se sensível a eles, permitindo ao
cérebro descobrir o ato sexual. Principalmente no início da adolescência, há uma intensa mudança
na representação do corpo no cérebro. O córtex pré-frontal amadurece e passa a permitir o
raciocínio abstrato, melhora a memória e a concentração e começa a permitir o controle de
impulsos. O córtex órbito-frontal somente amadurece no final da adolescência e possivelmente
permite, só então, o raciocínio consequente, ou seja, aquele que leva à antecipação dos
arrependimentos. O circuito social, por sua vez, somente amadurece no final da adolescência,
dependendo da qualidade das experiências vividas. Esse circuito, por sua vez, permite que o
adolescente se torne uma pessoa plenamente sociável, empática, solidária, capaz de se colocar no
lugar dos outros e usar essa informação na hora de agir.
Como visto, o cérebro adolescente passa por um novo longo período de remodelagem e
aprendizado, cujo resultado ansiado é um sujeito, em tese, independente, responsável e bem
inserido socialmente.
Coleman (2011) também destaca que, durante a adolescência, há uma eliminação de sinapses
ou conexões neuronais desnecessárias. Contudo, muitas outras sinapses são construídas, sendo esse
processo um elemento essencial ao desenvolvimento cerebral e à melhora no processamento de
informações. Essa transformação ocorre em várias partes do cérebro, mas particularmente na
adolescência, atinge o córtex pré-frontal, a área do cérebro responsável pelo funcionamento
cognitivo. Há, também, um aumento da conectividade entre o córtex pré-frontal e outras partes do
16
cérebro, o que permite avanços na qualidade do pensamento e da razão. Outra grande mudança
refere-se ao sistema límbico e aos neurotransmissores dessa região do cérebro. O sistema límbico
é responsável pelo processamento de informações relacionadas às emoções e é justamente devido
a essas mudanças, que os adolescentes são geralmente excessivamente emotivos ou facilmente
afetados pelo stress. As mudanças no sistema límbico são responsáveis, também, pela necessidade
do adolescente pela busca de sensações novas e pela tendência às atividades de risco.
O autor também cita, a partir dos conhecimentos acerca do processamento de informações,
cinco áreas gerais que apresentam um aperfeiçoamento significativo durante esse estágio do
desenvolvimento: a atenção seletiva, a memória de trabalho, a velocidade do processamento
cerebral, as estratégias de organização e a meta-cognição (capacidade de pensar sobre o próprio
pensamento). No entanto, Moshman (2005) recusa uma visão biológica determinística de que os
genes influenciam diretamente o cérebro que, por sua vez, influencia diretamente o comportamento
individual. O autor reforça que a qualidade das mudanças cerebrais e da maturação biológica são,
em grande parte, resultados das experiências de ações e de reflexões.
Considerando, especificamente, a dimensão social da adolescência, Vicentin (2009); Gorrese
e Ruggieri (2012); Serrano e Guzman (2011) são alguns dos autores que demarcam alguns sinais
nas relações interpessoais vivenciadas: o foco prioritário de identificação na família durante a
infância passa, na adolescência, para o grupo de pares (e, depois, para o relacionamento amoroso)
e os agrupamentos deixam de acontecer com pessoas do mesmo sexo, passando a ser
prioritariamente mistos, principalmente como fruto da exacerbação da sexualidade.
Gorrese e Ruggieri (2012) ainda acrescentam que as relações de apego entre os pares na
adolescência mudam drasticamente daquelas vividas durante a infância em várias questões: há um
aumento da energia dispendida nas relações, uma potencialização da sexualidade e, por fim, um
aumento da capacidade mútua de proporcionar conforto ao outro nos relacionamentos. Coleman
(2011) também apresenta dois autores - Aboud (1999) e Cotterell (2007) -, que descrevem alguns
elementos chaves da função da amizade na adolescência, tais como: o companheirismo, a
intimidade, a disponibilidade, a lealdade, a confiança, a assistência e a segurança emocional.
Embora não haja um padrão específico que caracterize uma boa amizade, Poe e Johnston
(1993) apontam que as amizades mais próximas durante a adolescência frequentemente possuem
certos aspectos que as distinguem de outros tipos de relacionamento, como por exemplo, entre
colegas. Bons amigos gostam de estar juntos, falam e escutam um ao outro, respeitam-se
17
mutuamente, se apoiam, são leais, confiam e são honestos, se perdoam e, por fim, nutrem um
sentimento de amor que é diferente do amor familiar – porque os amigos se escolhem -, e diferente,
também, do amor romântico – porque o relacionamento não é baseado em uma intimidade sexual.
Embora as amizades diádicas ou binárias ainda existam, Papalia et al. (2009) apontam que as
“panelinhas” – grupos estruturados de amigos que fazem coisas juntos -, tornam-se cada vez mais
importantes. Um terceiro e mais amplo tipo de agrupamento presente na adolescência são as
turmas, que são baseadas não nas interações pessoais, mas na reputação, imagem ou identidade.
Ainda sobre a dinâmica das amizades na adolescência, Coleman (2011) assinala que é geralmente
no início da adolescência que as necessidades pessoais e as pressões sociais direcionam os jovens
a participar de pelo menos um grupo de amizade. O autor cita o estudo de Ryan em 2001, que
demonstra que 75% dos adolescentes de 13 anos pertencem a grupos de amigos, estando esse fator
altamente relacionado à qualidade da autoestima e ao desenvolvimento da identidade.
Além do pertencimento a um grupo, ser considerado popular é um valor de particular
importância na adolescência. Segundo Coleman (2011), os populares são aqueles que exercem
certa liderança e são admirados perante seus pares. Embora haja, logicamente, diferentes padrões,
o porte atlético para os meninos e a atratividade física para as meninas são aspectos frequentemente
relevantes ao se determinar uma popularidade. O autor acrescenta que é justamente no início da
adolescência que a influência e a conformidade às normas do grupo são mais fortes. A aceitação
ou a rejeição são preocupações comuns dos jovens nessa idade, o que os torna mais suscetíveis às
pressões grupais.
Fica evidente, assim, que na adolescência, o envolvimento com os pares ganha um papel
ímpar, servindo como base de apoio social e de proximidade afetiva. Oberle et al.(2010) realçam
que, especialmente na adolescência, existe uma intensificação do privilégio do lugar dos amigos,
que tem importância central no desenvolvimento tanto acadêmico, como no funcionamento social
e no bem-estar psicológico. Esse privilégio, contudo, segundo Papalia et al. (2009), é mais forte no
início da adolescência, atingindo seu apogeu entre doze e treze anos, aproximadamente.
Rappaport et al. (1982) e Osorio (1989) destacam, ainda, que o grupo de iguais – e não mais
os pais ou outros adultos relacionados a esses, como os professores e outros familiares em geral -
atua justamente como continente para as ansiedades existenciais do jovem. Ampliando, então, a
discussão para o campo da saúde psicológica, Campos e Marturano (2003) também sugerem que,
em uma ampla gama de pontos de vista, as relações interpessoais têm uma função fundamental na
18
etiologia, manutenção, prevenção e remediação de distúrbios socioemocionais. Os autores afirmam
que pessoas competentes no domínio interpessoal têm maior probabilidade de manter e mobilizar
redes de relacionamentos que lhes deem suporte nos momentos difíceis, propiciando, por exemplo,
trajetórias mais positivas na transição entre a meninice e a adolescência. Especificamente, o estudo
demonstrou associação entre competência interpessoal na meninice e melhor ajustamento global
na adolescência, nomeadamente em três domínios analisados: ajustamento comportamental,
desempenho acadêmico e autopercepção.
Gorrese e Ruggieri (2012) também ressaltam que, especificamente, durante o período que
engloba o final da infância e o início da adolescência, os sistemas de apego e as representações
sociais das pessoas e das relações interpessoais mudam drasticamente. O mundo social do
adolescente se expande e passa a incluir os pares, os parceiros amorosos e o grupo social,
configurando, portanto, uma progressiva diferenciação e diversificação do sistema comportamental
de apego. Para Selman, et. al. (1986) e Chung (2011), isso é devido ao elevado potencial de
intimidade com amigos em detrimento da com os pais durante esse período, especialmente entre
as meninas.
Uma pesquisa da UNESCO - “Cotidiano das Escolas: entre violências”, 2003/2004 -, retrata
o quanto os pares têm um lugar privilegiado na vida dos jovens (Ensino Fundamental II e Médio).
Do total de 9.744 alunos pesquisados, cerca de 45% deles, quando têm problemas, optam por trocar
confidências com um amigo na escola. Vale ainda destacar que quase um terço deles (28%) ainda
busca as amizades consolidadas fora do ambiente escolar.
Aliás, a intensidade, a importância e a quantidade de tempo gasta com amigos são,
provavelmente, maiores na adolescência do que em qualquer outra etapa da vida.
Selman (1980), referência no que se refere ao desenvolvimento humano e à Psicologia, ao
estudar a evolução da tomada de perspectiva (capacidade de compreender o ponto de vista de outra
pessoa e de se colocar no seu lugar) e da coordenação de perspectiva (integração dos pensamentos,
desejos e sentimentos do outro com os próprios, combinando os pontos de vista ou criando novas
possibilidades), buscou compreender quais as concepções das crianças e jovens sobre o indivíduo,
sobre as relações de amizade, sobre as relações entre pais e filhos e sobre as relações entre pares,
por considerar que estes domínios são críticos para um desenvolvimento social saudável.
O autor descreve a compreensão dos sujeitos a respeito desses domínios por meio do
conceito de estágios de desenvolvimento, ou seja, cada um desses domínios é concebido pelas
19
crianças e jovens segundo estágios evolutivos com uma sequência fixa de indivíduo para indivíduo,
de forma que as concepções se tornam mais elaboradas e complexas ao longo do desenvolvimento.
Segundo o autor, o sujeito parte de ideias físicas e egocêntricas para uma descentração e
coordenação de perspectivas cada vez mais amplas.
Esse movimento em direção a uma visão que considera e coordena outras perspectivas
possibilita, por sua vez, que o sujeito desenvolva seu senso de justiça e equidade, sua habilidade
de cooperar e sua habilidade de sentir compaixão, tolerância e respeito por si e pelos outros
(SCHULTZ, YEATES e SELMAN, 1989)
Neste momento do presente trabalho, em que se discute o lugar privilegiado dos pares na
vida dos adolescentes, interessa compreender, especificamente, o domínio da amizade.
A amizade, para Selman (1980), é constituída por temas que estão presentes em todos os
estágios de desenvolvimento (estágios 0 a 4), correspondendo a um conjunto de conceitos
estruturados, segundo uma lógica comum. São eles:
1. Formação: por quais motivos e como (mecanismos) as amizades são feitas; o amigo ideal.
2. Proximidade: tipos de amizade, amizade ideal, intimidade.
3. Confiança: fazer coisas para os amigos; reciprocidade.
4. Ciúmes: sentimentos sobre intrusões dentro de novas amizades ou em amizades já
estabelecidas.
5. Resolução de conflito: como os amigos resolvem seus problemas.
6. Terminação: como se rompem as amizades.
Quanto às idades, embora não sejam rígidas, a primeira infância (3 a 6 anos) é marcada
pelas concepções do estágio 0 (amizade como interação física momentânea); por volta dos seis
anos, as crianças, em média, possuem a concepção do estágio 1 (amizade como assistência de “mão
única”); aos oito anos, o estágio 2 (amizade como cooperação em tempo justo), aos doze, o estágio
3 (amizade como intimidade e compartilhamento mútuo) e, por volta dos quinze, o estágio 4
(amizade como múltiplas perspectivas).
O quadro I, a seguir, apresenta um resumo das principais características dos temas
supracitados nos quatro estágios:

20
Quadro I: Algumas características do domínio da amizade nos primeiros estágios evolutivos
Idade relativa Resumo das características principais
Estágio 0 3 a 6 anos Amizade como relação momentânea ou repetida e não tem efeito sobre
a subjetividade. Os conflitos são resolvidos com a aplicação da força
física.
Estágio 1 7 a 8 anos Amigos são aqueles que sabem aquilo que eu gosto, portanto é
unilateral. Já existe o elemento da subjetividade. Conflito também
resolvido de forma unilateral: um é a vítima e o outro não.
Estágio 2 8 a 11 anos Amizade é um encontro de gostos, portanto recíproco. Ainda existe um
foco nos interesses particulares. No conflito, as duas partes se engajam,
mas ainda tem um caráter bastante coercitivo.
Estágio 3 12 a 14 anos Amigos trabalham juntos para resolver problemas e são confidentes.
Amizade é mais estável e reflete intimidade e ajuda mútua.
Estágio 4 15 a 18 anos Amizade é caracterizada por maior proximidade emocional e
interdependência. Há menor possessividade na relação e a confiança e
suporte ao outro são elementos essenciais. Amizade pode permanecer
ao longo do tempo, apesar de eventuais separações.
Fonte: Selman (1980, p. 136)11

Os estágios que contemplam o período da adolescência, público alvo do presente estudo,


serão descritos com maior precisão e detalhes.
No estágio 3 (12 a 14 anos), o indivíduo é capaz de sustentar o relacionamento da amizade
abstratamente. Nessa fase, o foco é o relacionamento e não mais os indivíduos separadamente. A
principal função da amizade passa a ser vista como um suporte, com compartilhamentos mútuos
ao longo do tempo. Para isso, as partes se engajam no conhecimento do outro, dos seus traços e
personalidades e descobrem interesses comuns e características que se complementam.
Proximidade inclui confiança e intimidade, e estas são entendidas como conquistas e requerem
esforços de ambas as partes. Os amigos, diferentemente dos outros tipos de relações, desejam
compartilhar pensamentos e sentimentos íntimos. Existe um esforço mútuo na manutenção da
amizade; logo, existe, também, uma perspectiva particularmente possessiva: não se permite que
outras pessoas interfiram na relação. Já conseguem identificar os conflitos particulares que podem
fortalecer a relação se bem trabalhados e, para isso, conversam sobre as coisas. O rompimento de
uma relação de amizade acontece em razão de conflitos que desfaçam o vínculo de confiança.
No estágio 4 (15 a 18 anos), por sua vez, o sujeito entende que pode ter diferentes tipos de
relacionamentos, tais como amizades íntimas, relações de negócios, colegas casuais, etc. A relação
de amizade é vista como um sistema disponível a mudanças, flexibilidades e crescimentos. Tem-
se a ciência de que é possível conhecer melhor alguém, levando-se em consideração as companhias

11
Tradução nossa.
21
que mantém. De modo semelhante, fazer um amigo também inclui fases de conhecimento
recíproco, até chegar a um relacionamento de compromisso. “Bom” amigo, portanto, é um conceito
relativo e depende de uma afinidade entre as pessoas. A confiança é a habilidade de deixar ir, tanto
quanto de prender, respeitando as necessidades de dependência e de autonomia de cada um,
havendo, portanto, menos sentimento de possessão do que no estágio anterior. Os conflitos tendem
a ser entendidos e resolvidos por meio de tentativas mútuas de introspecção e autorreflexão. Um
novo conceito para o fim do relacionamento inclui a possibilidade das pessoas se engajarem em
outras amizades e negarem as antigas, devido à mudança de interesses.
Segundo Selman et al. (1986), o tipo de intimidade possível com os pares, em especial,
representa o contexto central do desenvolvimento social, isto é, a arena dentro da qual novas
estratégias mutuamente colaborativas podem facilmente ser testadas e aprimoradas em direção a
uma maior tomada e coordenação de perspectivas.
O avanço no grau de intimidade e de mutualidade entre amigos, entretanto, faz a fase da
adolescência se configurar como um momento de desafio e transformações para a dinâmica da
família em geral.

2.3 A relação com a família

Os adolescentes costumam apresentar menor intimidade com seus irmãos (são menos
influenciados e mais distantes) do que com seus pais ou amigos (PAPALIA et al., 2009). Stengel
(2011) cita que o afastamento dos papeis infantis para a construção de uma identidade adulta
implica um abandono, também, do tipo de relação estabelecida com os pais, o que provoca
modificações na dinâmica da família e uma readaptação e flexibilidade das regras e das formas
costumeiras de convivência. Uma das razões para tal readaptação é o fato de os filhos adolescentes
realizarem uma série de questionamentos dos valores, crenças e regras até então vigentes no
contexto familiar.
A necessidade de modificações na dinâmica da família inclui, também, outros elementos.
A partir de uma pesquisa qualitativa baseada na história de vida realizada com nove pais de
adolescentes de classe média, Stengel (2011) apresenta algumas queixas recorrentes e
generalizadas dos entrevistados acerca dos filhos adolescentes: a insegurança frente à perda do
22
controle – face à busca de autonomia dos jovens -, além do sofrimento frente ao afastamento dos
filhos. A fase da adolescência, portanto, traz sim um desafio a mais para a família, que se vê forçada
a rever as formas de convivência. A autora ressalta que uma das tarefas dessa fase da vida é,
justamente, a construção de uma identidade adulta para a qual o jovem precisa, em alguma
instância, abandonar seus papéis infantis, o que implica ter que abandonar, também, um tipo de
relação estabelecida com os pais.
Existe, portanto, um caráter um tanto difícil para os pais do adolescente. Longe de afirmar que
os jovens não necessitam mais dos cuidados dos pais, não há como negar que os controles não
funcionam como antigamente, ou seja, não respondem da mesma forma.
Corso e Corso (1999) discutem exatamente o luto dos pais com o fim da infância. Os pais
perdem o corpo caricioso da criança e também a condição de seres poderosos e amados. O autor
aponta que esse luto explica, inclusive, alguns comportamentos de desistência, uma vez que alguns
pais têm a sensação de que o tempo que tinham para educar seus filhos acabou. Contudo,
certamente, a importância dos pais não é interrompida. La Taille (2006), por exemplo, em uma
pesquisa com mais de cinco mil adolescentes de 14 a 18 anos, aponta que o jovem atribui mais
confiança a seus pais e amigos, considerando seus valores mais influenciados por aqueles que
fazem parte de seu âmbito privado. Na mesma direção, Tardeli et al. (2012) também constatam,
em uma pesquisa com 72 jovens do Ensino Médio, que, embora valorizem as amizades, os jovens
admitem que a família tem grande influência sobre a construção dos valores que carregam. O que
se rompe, portanto, para Corso e Corso (1999), é a relação de possessão dos pais, posto que a
adolescência, diferentemente da infância, tem como premissa, justamente, a consolidação de uma
distância em relação aos pais.
Essa discussão vai ao encontro dos resultados de Darling et al. (2008) em um estudo
longitudinal com 568 adolescentes chilenos (de 11 a 14 anos de idade). As crenças dos adolescentes
sobre legitimidade dos pais e a obrigação de obedecer tiveram comprovadamente uma diminuição
com a idade. O declínio mais acentuado ocorreu principalmente durante o início da adolescência,
especialmente no que diz respeito ao domínio pessoal do adolescente (gastar tempo com pessoas
que seus pais não aprovam, por exemplo). O início da adolescência é, portanto, o período durante
o qual a diferença entre as crenças dos adolescentes e as de seus pais sobre legitimidade é maior.
Apesar dessa trajetória normativa, o estudo também indicou algumas diferenças particulares: os
adolescentes que perceberam seus pais como maiores fornecedores de apoio e acompanhamento,
23
no início do estudo, endossaram mais a legitimidade parental e a sua própria obrigação em
obedecer, tanto contemporaneamente, como nos anos subsequentes.
Oberle et al. (2010) delimitam o termo adolescência precoce para se referir a esse período
crítico de desenvolvimento de crianças entre as idades de 9 e 14, marcado, essencialmente, por um
desejo de autonomia e um afastamento da influência dos pais em direção a um crescente foco nos
pares e na aceitação social.
Couto (1999), entretanto, contextualiza que, em uma cultura ocidental crescentemente
individualista, como a brasileira, outras correntes vêm cada vez mais tomando força: a da
autenticidade e da seletividade, ou seja, o adolescente tem uma noção mais clara do que vale ou
não a pena. A importância da turma pode até ser relativizada, por exemplo, em função de que fazer
algo só para pertencer ao grupo já não agrada mais da mesma forma.
São, contudo, nessas maneiras de interagir com o meio social, que acontece o desenvolvimento
moral.

2.4 O desenvolvimento moral

Em uma perspectiva piagetiana, “toda moral consiste em um sistema de regras e a essência


de toda moralidade deve ser buscada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras”
(PIAGET, 1932-1994, p. 1). O primeiro momento do desenvolvimento dessa moral é nomeado,
pelo autor, de anomia, que corresponde à ausência de regras e de leis e vai até aproximadamente
os dois anos de idade. As crianças, a partir dos três ou quatro anos, são naturalmente heterônomas,
ou seja, a fonte da obediência é exterior. A partir dos oito, nove anos, em média, os sujeitos têm a
possibilidade de desenvolver a autonomia moral, que é internamente orientada. Assinala, porém,
que a evolução de uma tendência para a outra dependerá de vários fatores, principalmente das
qualidades das relações sociais experienciadas. Assim, o desenvolvimento moral é bem sucedido
quando, com o tempo, o controle vai se tornando interno, uma obediência às normas que não
depende mais do olhar de outras pessoas. Na moral autônoma, o sujeito é capaz de se autogovernar
e tem a capacidade de decidir pelas normas que quer obedecer, considerando o benefício para o
maior número de envolvidos. Piaget (1930-1996, p. 3-4), no entanto, destaca que

24
existem entre as crianças, senão no geral, duas morais [...] Essas duas morais que se
combinam entre si mais ou menos intimamente, ao menos em nossas sociedades
civilizadas, são muito distintas durante a infância e reconciliam-se, mais tarde, no curso
da adolescência.

O autor também ressalta que será durante a convivência diária com o adulto, com seus pares,
com as situações escolares, com os problemas que enfrenta, e também experimentando e agindo,
que o sujeito irá construir seus valores e princípios. A moral surge do respeito que adquirimos às
regras, e esse começa no respeito que temos às pessoas que nos impõem tais regras.
O primeiro processo de socialização é naturalmente instituído pela ação dos pais e dos
adultos, em geral. Considera-se unilateral esse tipo de respeito - permeado por amor e medo - que
leva a criança a considerar obrigatórias as regras recebidas dos mais velhos por meio de um
sentimento de dever. Existe, contudo, um segundo processo possível de socialização, constituído
pela ação dos indivíduos uns sobre os outros quando a igualdade predomina sobre a autoridade,
dando lugar à cooperação (trocas equilibradas) e ao respeito mútuo. Essas relações entre os iguais
permitem o confronto de ideias e de interesses, o que provoca a necessidade de regulação mútua,
ou seja, a necessidade de considerar, negar ou afirmar outros pontos de vista, que não somente os
próprios. Espera-se, ainda, que, conforme a criança caminhe em direção à adolescência, haja,
evidentemente, um declínio do respeito unilateral (PIAGET, 1932-1994).
Na fase em que a criança começa a penetrar no universo das regras, princípios e valores
(despertar do senso moral), por volta dos quatro anos, além do amor e do medo, os sentimentos de
simpatia, indignação e confiança constituem as motivações do querer agir bem. De forma resumida,
o amor e o medo, como já explicitado, são responsáveis pela obediência voluntária heterônoma da
criança pequena. A simpatia, por sua vez, leva a criança a sensibilizar-se com o outro. A indignação
traduz para o sujeito uma preocupação com o que lhe é devido, por parte das outras pessoas e, por
fim, a confiança nutre no indivíduo o desejo de participar de uma comunidade moral. Os três
últimos sentimentos permanecem exercendo sua influência durante toda a vida moral, mas o medo
e o amor, com o avanço da autonomia, devem dar espaço para sentimentos coerentes com o respeito
mútuo, como a culpa e a vergonha, fontes de controle interno das condutas. A culpa incorre sobre
as ações e a vergonha sobre o valor moral atribuído a si (LA TAILLE, 2002).
Assim, o adolescente não mais legitima uma regra simplesmente por obediência à
autoridade e, em conjunto com o desenvolvimento cognitivo, passa a compreender que as regras

25
resultam dos princípios que as balizam. Ele também já não teme tanto a punição, mas muito mais
o medo de decair aos olhos dos outros e de si mesmo (VINHA, 2000).
O sentido de justiça também se afastará da autoridade adulta (obediência), havendo uma
aproximação ao conceito de igualdade (fazer ao outro o que ele me fez) e, mais tarde, à equidade
(situação particular de cada um é considerada). Da mesma forma, Piaget (1932-1994) assegura que
os atos dos outros passam a ser julgados não mais somente por suas consequências
(responsabilidade objetiva), mas pela intenção do sujeito (responsabilidade subjetiva), sendo os
piores atos aqueles que mais quebram os laços de solidariedade e confiança entre as pessoas.
Freitas (2011, p. 613) ainda destaca que, “como ensinou Piaget, não há moral sem educação
moral, uma vez que a moral se constitui nas relações interpessoais que a criança estabelece com os
adultos e com os seus pares”. Para Piaget (1964 - 2006), é prioritariamente na convivência com os
pares que a criança é motivada a refletir sobre maneiras distintas de reconhecer o ponto de vista do
outro e de aprender, aos poucos, como buscar soluções aceitáveis e justas para todas as partes
envolvidas, que não levem somente à satisfação de si.
Além disso, paralelamente a toda a elaboração intelectual de um pensamento formal, o
adolescente tem a sua afetividade submetida, graças à reciprocidade e à coordenação de valores, às
leis da cooperação (PIAGET, 1964 -2006). Mantovani de Assis e Vinha (2003) apontam que
justamente essa disposição de operar por reciprocidade e, assim, coordenar papéis (assumir a
perspectiva dos outros), configura-se como um pré-requisito essencial para a resolução de conflitos
interpessoais.
Em suma, este capítulo apresentou algumas ideias, desafios e vivências atuais em torno da
adolescência, além do percurso histórico de modificações sofridas. Trata-se de uma etapa
privilegiada do desenvolvimento humano, em que novas prioridades e maneiras de se relacionar
são instituídas. Contextualizando a realidade brasileira, os jovens aparecem entre os mais
frequentes autores da violência, assim como o grupo social mais afetado por ela. Na dimensão
cognitiva, a adolescência é marcada pelo suposto ingresso ao pensamento formal, o que impulsiona
um pensamento lógico, mais abstrato e reversível. O desenvolvimento da inteligência também
oferece, por sua vez, uma condição de socialização baseada cada vez mais nas leis da cooperação
e da reciprocidade. Essencialmente, essa condição de socialização caracteriza-se por um desejo de
autonomia e um afastamento da influência dos pais em direção a um crescente foco nos pares e na
aceitação social, trazendo, portanto, um desafio para a família, que se vê forçada a rever suas
26
formas de convivência. A relação possível com os pares, em especial, representa o contexto central
do desenvolvimento social e moral, em que novas estratégias mutuamente colaborativas podem ser
testadas e gradativamente aprimoradas. Segundo a perspectiva teórica assumida neste trabalho, é
prioritariamente na interação dinâmica entre o indivíduo e o meio, que os sujeitos poderão aprender
formas mais justas e equilibradas de resolver as desavenças nas relações interpessoais, assunto a
ser discutido com mais profundidade no próximo capítulo sobre conflitos.

27
3. COMPREENDENDO OS CONFLITOS INTERPESSOAIS

“Uma vez que as guerras começam na mente dos


homens, é na mente dos homens que as defesas da paz
devem ser construídas”.

(Preâmbulo do Ato Constitutivo da Unesco)

O termo conflito provém do latim conflictus, do verbo confligo, ere: chocar


(ROCHEBLAVE-SPENLÉ, 1974). Entende-se, também, como “a interação de duas partes que têm
propósitos incompatíveis” (BELMAR, 2005, p.111). O conflito, portanto, “é uma situação de
oposição consciente entre duas partes” (BELMAR, 2005, p. 111). Para Burguet (2005, p. 47),
“quando há incompatibilidade de interesses ou necessidades, surge o conflito”, sendo a oposição,
a essência de todo conflito (REDORTA, 2009). Laursen e Collins (1994) retomam que entre os
estudiosos da área, existe um consenso em torno da oposição comportamental evidente, como uma
característica central de definição.
Como descrito, a referência ao conflito, em termos amplos, pode sugerir um acordo
relativamente simples acerca de seu significado. Entretanto, ao precisar o conceito, evidencia-se a
presença de um constructo bastante complexo. Embora as definições apontadas expressem
condições de choque, oposição e disputa a algo, ou seja, relacionado ao exterior, Rocheblave-
Spenlé (1974) afirma que o conceito de conflito pode, também, ser empregado em situações
individuais e internas (encontro de sentimentos ou forças internas antagônicas). Na mesma direção,
a teoria piagetiana, compartilhada pela presente pesquisa, concebe o conflito como uma condição
intra e interpessoal. A primeira ocorre no interior do sujeito e, por isso, não é necessariamente
aparente. A segunda, por sua vez, ocorre entre os indivíduos sendo, portanto, mais perceptível, pois
advém da interação entre as pessoas envolvidas. A teoria salienta, contudo, que todo conflito
interpessoal gera, também, um desequilíbrio interno, ou em outros termos, um conflito intrapessoal
(VICENTIN, 2009).
A interação entre as pessoas, fruto do processo de socialização, abre espaço para os
conflitos, sendo considerado, portanto, como algo natural à dinâmica da vida cotidiana e inerente
à condição humana (BODINE e CRAWFORD, 1998; GUZMAN e ALBERT, 2006; MORGADO
e OLIVEIRA, 2009; REDORTA, 2009; LAURSEN E PURSELL, 2009; SERRANO e GUZMAN,
2011). Freitas (2011) também assinala que, da mesma forma que os conflitos interpessoais são
29
comuns no cotidiano de todos os seres que vivem em grupo, não menos incomuns são os momentos
de sentimentos contraditórios ou ambíguos, ou seja, não apenas os conflitos interpessoais, mas,
também, os intrapessoais fazem parte da condição humana. Leme (2011a, p. 162) acrescenta, aliás,
que o conflito faz parte de toda e qualquer relação interpessoal, pois,
embora as pessoas sejam iguais na condição de membros na mesma espécie, elas são
também diferentes em função da sua herança genética familiar mais específica,
principalmente, das suas diferentes experiências de vida, que levam à valorização de metas
e estratégias diversas para alcançá-las.

Coerentemente com essa perspectiva, a concepção piagetiana concebe os dois tipos de


conflitos como imprescindíveis ao desenvolvimento, visto que os conflitos vivenciados pelo sujeito
levam-no a buscar uma nova ordem interna, desencadeando um esforço de organização, uma
abertura para uma possível superação ou um novo equilíbrio (VINHA, 2000b; FREITAS, 2011).
Nessa perspectiva, os conflitos, de alguma forma, são compreendidos não como um choque
ou um tumulto indesejável, mas como uma oportunidade de crescimento, ou seja, podem ser
positivos e, inclusive, necessários para a construção de estruturas psicológicas mais evoluídas. Para
Bodine e Crawford (1998); Maya (2005) e Burguet (2005), graças ao conflito, os processos de
crescimento têm sua origem, daí a razão de se valorizá-lo positivamente: trata-se de uma ferramenta
de mudança, de desafio para desenvolver respostas novas e criativas. Belmar (2005) ainda o
compara a uma força natural que, quando controlada e em uma justa e equilibrada medida, pode
produzir energia e estimular a vida.
O que acontece, entretanto, é que o conflito, especialmente o interpessoal, é visto
habitualmente como algo que distancia as pessoas e, assim, preconiza-se a sua evitação ou
contenção. Tal perspectiva deve-se, segundo Leme (2011b), aos frequentes desfechos pouco
satisfatórios dos conflitos, cujas consequências mais comuns são não só o afastamento, mas
também o rompimento de relações interpessoais.
Para delimitar a complexidade desse campo de estudos, Redorta (2009) apresenta alguns
marcos de análise dos conflitos. O autor recorda algumas importantes contribuições que marcaram
a compreensão do fenômeno: para Freud, por exemplo, o foco foi o conflito entre o desejo e a
proibição (luta pelo dever) e os processos resultantes seriam os mecanismos de repressão e de
defesa. Darwin focaliza o conflito entre o sujeito e o meio (luta por existir), cujo processo resultante
é a diferenciação e a adaptação. Marx, por sua vez, prioriza o estudo dos conflitos entre classes
sociais (luta pela igualdade), sendo a estratificação social, a hierarquia e a comparação social, os
30
processos resultantes. Piaget retoma o conflito nas tomadas de decisões experienciais, cujo
processo resultante seria a resolução de dilemas e a aprendizagem.
Serrano e Guzmán (2011) acrescentam, ainda, uma perspectiva histórica do conflito e
apresentam uma evolução ao longo do tempo, desde uma visão judaico-cristã (antes e depois de
Cristo) - de caráter dualista e tradicional -, passando pelo positivismo (em torno do século XIX) -
com uma perspectiva objetiva -, até um enfoque construtivista, que aporta uma ótica positiva do
conflito, como potencializador de mudanças desejáveis. Segundo as autoras, entretanto, as visões
tradicional e objetiva influenciam notadamente a interpretação do conflito em nosso contexto
cultural atual, estando esse geralmente associado a termos negativos, como hostilidade, dor,
angústia, guerra e violência, ou mesmo, confundido com termos como: raiva, briga, competição,
agressão, influência e dominação, supondo-se que o melhor é mesmo suprimi-lo.
Essa associação entre conflito e tantos termos de caráter negativo tem desembocado,
entretanto, em uma intolerância cada vez maior pelo conflito, a ponto de ter que ser gerenciado a
qualquer preço, mesmo que temporariamente pacificado ou silenciado e não realmente resolvido.
Dymetman (2011) pontua que, sobretudo a partir da segunda metade do século XX, o projeto
moderno esteve fortemente engajado na pacificação. Esse anseio acompanhou a
contemporaneidade e levou a uma forte rejeição à unidade violência/conflito, considerada como
um fator de ameaça desintegradora e desestabilizadora e, portanto, tendo de ser resolvida e
controlada quase que automaticamente. Em última instância, tal perspectiva leva a uma ocultação
ou mascaramento do conflito, pois as partes são frequentemente coagidas, pressionadas ou até
mesmo ameaçadas, até contra seu desejo, a finalizá-lo. Isso certamente explica, ao menos em parte,
a forte sensação social de frustração e fracasso, além dos sintomas de impotência e depressão
resultantes do insucesso da tentativa de se “dar conta de viver de acordo com um script planejado,
tanto no nível individual, como no nível coletivo” (DYMETMAN, 2011, p. 35).
Acontece que, além de ser inevitável e inerente à condição humana, o conflito interpessoal
nem sempre implica hostilidade, dor, guerra e violência. Celich (2012), Serrano e Guzmán (2011),
Morgado e Oliveira (2009) e Leme (2011b) retomam que ele pode, inclusive, contribuir tanto para
a aproximação das pessoas, como para o desenvolvimento psicossocial dos envolvidos em qualquer
ciclo da vida, além de ajudar a fortalecer dimensões na relação que não haviam aflorado
anteriormente. É o conflito que permite a divergência de ideias e pensamentos, o que pode levar ao

31
reconhecimento mútuo e à estimulação de valores como a solidariedade e a tolerância. Redorta
(2007, p. 89) sintetiza: “necessitamos da interação, do conflito, para nos tornarmos humanos.”12
Há de se levar em conta, assim, a possibilidade de um desenlace do conflito por meio de
estratégias pacíficas. A violência, já amplamente apresentada e discutida no capítulo sobre a
adolescência, é, portanto, para Serrano e Guzmán (2011), uma forma obscura e inadequada de se
enfrentar os conflitos que denigre e danifica tanto o agressor como o agredido.
Apesar da evidência de desfechos vinculados ao desenvolvimento e ao enriquecimento
pessoal, Serrano e Guzman (2011) afirmam que os modos mais frequentes de se enfrentar um
conflito dizem respeito a condutas combativas ou evasivas. Embora cada cultura possua seus
padrões e modos de comportamentos que os sujeitos internalizam nos processos de socialização
primária e secundária, as autoras apresentam algumas tendências gerais de estilos de resolução de
conflito: o fugitivo (nega a existência do conflito ou foge dele, esperando que se resolva por si
mesmo); o acomodado (adapta-se, ao invés de lutar por seus interesses, apesar de estar descontente
com a situação em que vive); o competidor (quer impor a toda força sua vontade e usa todos os
meios para conseguir seu objetivo); o falso negociador (busca de forma velada seus próprios
interesses) e o integral (leva em consideração os interesses de todos os implicados e busca o
consenso e a solução que beneficie a maioria).
Contudo, Deluty (1979), estudioso pioneiro e referência no exame das formas de resolução
de conflitos por crianças e jovens, sintetiza que esses podem ser resolvidos de maneira violenta ou
pacífica, dependendo dos recursos cognitivos e afetivos dos protagonistas e dos contextos sociais
em que ocorrem. Para Leme (2011b, p. 162), “os recursos cognitivos e afetivos ampliam ou
restringem a interpretação da situação e o contexto sociocultural normatiza as condutas possíveis,
isto é, como se conduzir nas situações”.
Entre essas estratégias de resolução, a autora explicita que a violenta, que inclui a agressão,
está frequentemente associada ao desejo de controle ou de posse, além do desejo de fazer valer o
direito ou opinião de quem os emite, mas sem consideração pelos direitos, sentimentos e opiniões
do outro. A estratégia pacífica, por sua vez, pode ser de dois tipos: submissa e assertiva. A primeira
inclui esquiva ou fuga da situação e tem como objetivo o desfecho rápido que não envolva riscos,
podendo incluir, ainda, a busca de intervenção de um terceiro. Trata-se de um tipo de

12
Tradução nossa.
32
comportamento que contempla os direitos e sentimentos do outro, sem, porém, considerar os
próprios. Finalmente, o comportamento assertivo inclui a negociação e a conciliação, e seu objetivo
um desfecho favorável para todos os envolvidos. É o mais desejável, e, também, o mais evoluído,
devido às coordenações cognitivo-afetivas e às experiências via aprendizagem que exige: o sujeito
toma em consideração os próprios direitos, sentimentos e ideias, e os explicita, sem com isso lesar
os alheios. Vale ressaltar a possibilidade de se encontrar estratégias ambivalentes ou ambíguas, que
mesclam essas formas de reagir ao conflito (LEME, 2004 e 2011a).
Baseando-se no instrumento criado por Deluty (1979) e adaptado por Leme (2004), que
avalia simultânea e comparativamente os tipos de tendência de resolução de conflitos interpessoais,
Carina (2008) e Carina e Mantovani de Assis (2011) buscaram identificar as estratégias mais
utilizadas por adolescentes de 11 a 13 anos de uma escola pública, - ainda que a partir de dilemas
hipotéticos -, e confrontá-las às visões dos professores acerca das estratégias comumente utilizadas
pelos mesmos alunos. Os resultados mostraram que o estilo apontado pelos professores (agressivo)
não coincidiu com os utilizados pelos alunos e que as respostas mais encontradas entre os
adolescentes seriam as de estilos submissos ou próximos a elas, como, por exemplo, de estilos
mistos, em que as respostas submissas se encontravam também presentes. Com o objetivo de
contribuir para o avanço do conhecimento acerca da resolução de conflitos interpessoais, Vicentin
(2009b) também encontrou, em seu estudo com adolescentes de 12 a 16 anos de uma escola pública,
respostas predominantemente submissas, seguidas das agressivas. As meninas, contudo,
apresentaram uma proporção maior de respostas submissas quando comparadas aos meninos.
Apesar das ocorrências de maus tratos, desrespeito, intimidação e ameaças serem frequentes
e envolverem cada vez mais os adolescentes - como já relatado no capítulo anterior -, os resultados
dos dois estudos supracitados são compatíveis aos de Leme (2004), ao apontar que os alunos
brasileiros (comparados aos norte-americanos) apresentam maior tendência à submissão e menor
assertividade, sendo esta diferença mais acentuada entre alunos de escola pública, de séries mais
avançadas e do sexo feminino, embora haja um progressivo esvanecimento da diferença entre os
gêneros, na medida em que os meninos tornam-se cada vez mais semelhantes às meninas no
decorrer de seu desenvolvimento.
Tais tendências de resolução de conflitos são, para a autora, provavelmente aprendidas com
exemplos, como pais, professores e outros meios de influência, que podem agir como modelos ou

33
como esquemas de solução de problemas deste tipo, ou mesmo, podem estimular voluntária ou
involuntariamente atitudes mais submissas, por associá-las a comportamentos mais prossociais.
Embora a influência da família na resolução dos conflitos seja melhor explicitada a seguir,
vale citar, nesse momento, um estudo realizado por Leme et al. (2012) com 369 alunos de 6° e 7°
anos do Ensino Fundamental de escolas públicas e privadas. O estudo visou a verificar se existe
relação entre as estratégias de resolução de conflitos dos pré-adolescentes e a percepção que eles
têm das opiniões de seus pais sobre as estratégias. Verificou-se, pelos resultados obtidos, que as
estratégias de resolução dos alunos coincidem com o que percebem como aprovado por seus pais,
ou seja, a opinião percebida nos pais como sendo favorável e aprovável tem uma relação positiva
com a preponderância do uso de estratégias mais submissas pelos alunos.
Vicentin (2011) acrescenta, em particular, que a falta de recursos dos educadores para
resolver conflitos interpessoais de forma equilibrada contribui, também, para que os jovens
encontrem dificuldade em usar formas pacíficas e justas diante dos desentendimentos interpessoais.
Para exemplificar essa questão, é importante apresentar uma pesquisa realizada com 148
adolescentes frequentadores de uma escola com alto índice de conflitos entre os alunos. Aceves et
al. (2009) mostraram que as ações dos professores ao abordarem o conflito influenciam, por
exemplo, a probabilidade de os alunos reagirem agressivamente ou de buscarem ajuda da
autoridade escolar diante de um conflito interpessoal. Os dados sustentam a hipótese de que os
adolescentes que veem os professores como eficazes e justos na resolução de conflitos são mais
propensos a procurar a autoridade escolar diante de cenários de vitimização e são,
consequentemente, menos propensos a considerar a agressão física como uma resposta aceitável.
Tognetta e Vinha (2007) são enfáticas em afirmar que a concepção sobre os conflitos do
professor e, consequentemente, as intervenções decorrentes diante dos conflitos entre as crianças e
entre os jovens, apresentam consequências expressivas nas interações entre os alunos e na
construção dos valores e das regras, ou seja, em sua formação moral. Ainda sobre a influência dos
professores, La Russo e Selman (2011) assinalam que as respostas dos professores para os conflitos
entre pares e para os próprios conflitos com os alunos são características importantes para a
consolidação do clima de resolução de conflito da escola. Em um clima de resolução mais
acolhedor, os professores respondem de forma consistente e eficaz aos conflitos e problemas
sociais entre os alunos e, no caso de conflitos aluno-professor, ouvem e negociam, em vez de
intimidar ou impor o seu poder de forma unilateral. Em climas de resolução menos favoráveis, os
34
professores muitas vezes ignoram as desavenças e os comportamentos agressivos entre os alunos
ou simplesmente gritam ou punem os estudantes e, em termos de seus próprios conflitos com os
alunos, os professores muitas vezes são desrespeitosos e agressivos. Os autores citam pesquisas
(CASARJIAN, 2000; BRENDGEN et al., 2007) que constatam que o abuso psicológico e verbal
por parte de professores é associado a problemas de comportamento dos alunos, diminuição da
motivação e autoconceito acadêmico, bem como diminuição do rendimento escolar.
La Russo e Selman (2011) complementam, ainda, que, de acordo com a percepção de 323
estudantes de 6°, 7° e 8° anos de 12 diferentes escolas norte americanas, as escolas em que os
professores normalmente reagem aos conflitos entre os alunos utilizando o grito, mandando parar,
ameaçando, ou, o mais comum, não fazendo nada, exibem, com maior frequência, posições mais
rígidas e negativas dos alunos em relação à viabilidade de resolver conflitos sem o uso da agressão,
apresentando, inclusive uma resignação para a inevitabilidade da violência. Em contraste, quando
os professores respondem prontamente aos conflitos entre os alunos - geralmente ouvindo os lados
envolvidos e encorajando a comunicação -, os alunos apresentam posicionamentos mais flexíveis
sobre a utilidade de programas específicos de estratégias de resolução de conflitos na escola, maior
engajamento crítico nas análises de problemas sociais - como o assédio moral e o bullying -, e
maior envolvimento com os esforços da escola para promover estratégias mais maduras e não
violentas para resolver conflitos. Nesse contexto, os alunos relatam menos comportamentos de
risco relacionados com a violência, além de níveis muito baixos de violência em suas escolas.
Ademais, o estudo encontrou evidências de que tanto as estratégias de resolução de conflitos dos
alunos, como a forma como os conflitos são mediados pela escola, estão relacionados com o
envolvimento em vários comportamentos de risco no início da adolescência, tais como: abuso de
drogas, comportamentos relacionados à violência e atividades sexuais de risco, entre outros, o que
dá suporte à ênfase de que habilidades para administrar conflitos interpessoais, em particular, pode
servir com um fator protetivo na adolescência.
Na mesma linha de pesquisa, Ferráns e Selman (2014), ao analisarem os dados de
entrevistas de 23 alunos de 8° ano do Ensino Fundamental II, reforçam a ideia de que as diferenças
nas percepções do ambiente escolar como um todo têm efeitos sobre o comportamento dos alunos
frente aos conflitos interpessoais. Baseando-se nos estudos anteriores de Baumrinds (1973),
Hughes (2002) e Chaux (2012) acerca dos estilos parentais, os autores analisaram quatro diferentes
tipos de ambientes escolares: negligentes, permissivos, autoritários e coesos. De uma forma geral,
35
em ambientes negligentes, os professores não estabelecem relacionamentos muito afetivos com os
alunos, além de não criarem um senso de estrutura e de organização na rotina diária. Em ambientes
permissivos, os professores podem até possuir boas relações com seus alunos, mas não instituem
regras claras e consistentes para a segurança de todos. Já em ambientes autoritários, os professores
se concentram na manutenção rigorosa da ordem e, por fim, em ambientes coesos, os professores
nutrem bons relacionamentos com os alunos, ao mesmo tempo em que organizam regras que são
claras e aplicadas de forma consistente.
Especificamente quanto aos conflitos interpessoais, os resultados sugerem que quando os
adolescentes percebem que os professores não tomam medidas para lidar com comportamentos
agressivos entre os estudantes (ambiente negligente), a prevalência de agressão entre pares é alta.
Em tais contextos, os alunos desenvolvem um sentimento de que situações hostis e desrespeitosas
são comuns e inevitáveis. Os adolescentes também alegam que, quando os professores tentam
manter a ordem usando uma abordagem punitiva (ambiente autoritário), os alunos mantêm o mau
comportamento quando os adultos não estão por perto, ou quando eles não podem ser vistos. Em
outras palavras, enquanto uma abordagem punitiva efetivamente reduz a violência em ambientes
supervisionados, não forma os alunos com as habilidades necessárias para resolverem conflitos
quando estão por conta própria. Os participantes relataram, contudo, que quando os professores
não apenas tomam medidas consistentes para combater as manifestações de agressão entre pares,
mas também as fazem de forma a promover a consciência social dos alunos, as escolas exibem uma
baixa prevalência de comportamentos agressivos entre os estudantes. Adolescentes em ambientes
escolares coesos costumam descrever seus professores como sendo carinhosos e ativamente
envolvidos na vida dos estudantes, o que incentiva os alunos a se sentirem mais responsáveis por
suas ações. Nas entrevistas, os alunos desse estudo sugerem que as regras, por exemplo, não devem
se concentrar na punição do mau comportamento mas, em vez disso, devem manter os alunos
responsáveis por suas ações e conscientes das causas de seus comportamentos. Sugerem, também,
que os professores criem um senso de comunidade na escola, ajudando os alunos a desenvolverem
relações positivas entre si. Especificamente, os adolescentes recomendam que as escolas façam um
esforço para implementar discussões abertas em sala de aula sobre problemas de convivência, além
do uso das mídias educacionais para promover a consciência social e o desenvolvimento
socioemocional, enfatizando, especificamente, a resolução de conflitos e a tomada de perspectiva.
Levando-se, ainda, em consideração, que os ambientes escolares coesos têm consistentemente
36
promovido resultados desejáveis, tal estudo reitera a ideia de que investir tempo e recursos
significativos na promoção e desenvolvimento de relações positivas entre professor e aluno é
extremamente benéfico para o desenvolvimento dos alunos.
A teoria de Selman, aliás, melhor descrita a seguir, está imbuída da intenção de promover
a competência psicossocial como um modo de reduzir riscos para a saúde e promover o
desenvolvimento de crianças e jovens.

3.1 As estratégias de resolução de conflito

Sob uma perspectiva desenvolvimentista, Selman define por competência psicossocial, -


cujo centro é a capacidade de tomar e coordenar perspectiva13 -, o entendimento social, o repertório
de habilidades sociais, tais como o conjunto de estratégias de negociação interpessoal desenvolvido
pelo sujeito e, também, a consciência do significado pessoal (SELMAN, 1980; SELMAN e
SCHULTZ, 1990).
Especialmente neste capítulo que trata dos conflitos interpessoais, vale explicitar que,
segundo o autor, para avaliar como um indivíduo resolve um conflito interpessoal, é necessário
considerar alguns aspectos:
1 – O nível de tomada e coordenação de perspectivas (aspecto desenvolvimental);
2 – Como o indivíduo enfrenta o desequilíbrio afetivo gerado a partir do conflito
interpessoal; que varia desde maneiras impulsivas até a responsabilidade pelos próprios atos.
3 – A motivação do conflito, que pode ser material - por exemplo, obter um objeto ou espaço
(níveis de desenvolvimento inferiores) -, mas também pode estar focalizada na preservação do
relacionamento (níveis mais altos de desenvolvimento);
4 - O significado pessoal do emprego de uma ou outra estratégia de resolução de conflito,
que está relacionado ao modo como o indivíduo interpreta o contexto social, familiar e cultural e
ao valor que ele atribui ao relacionamento, bem como a sua continuidade no tempo. Por exemplo,
nos níveis inferiores o sujeito compreende que utilizar uma estratégia agressiva é divertido ou é o

13
Conceitos já definidos no capítulo anterior. Inclui a capacidade de um indivíduo de compreender as ideias e os
sentimentos alheios (tomada de perspectiva) e a consideração simultânea de ambos os pontos de vista numa negociação
(coordenação de perspectiva). Tais capacidades desenvolvem-se em níveis evolutivos e são balizadas no
desenvolvimento cognitivo.
37
único meio de sobreviver em um local violento e, nos níveis mais evoluídos, em que há maior
integração e coordenação de perspectivas, o indivíduo percebe que estratégias agressivas podem
causar mais problemas e que, para se manter seguro, é necessário parecer calmo e atento
(SELMAN, 2002). O significado pessoal pode ser definido, especificamente, em relação à conexão
entre algum padrão de comportamento e a história de vida pessoal e interpessoal (experiência de
vida, valores culturais, tendência temperamental, etnicidade, cultura dos pares, dinâmica familiar,
contexto escolar, etc., além do autoconceito e do relacionamento com os outros). Isso quer dizer
que a “personalização”, e não apenas a “informação em si”, é considerada como um importante
catalisador para determinada estratégia utilizada (SHULTZ, YEATES e SELMAN, 1989).
As estratégias de resolução de conflitos, por sua vez, podem ser definidas como os meios
empregados pelos pares para alcançar seus objetivos e atender suas necessidades quando estes
entram em conflito com a outra parte na interação para, assim, restabelecerem o equilíbrio perdido
pela oposição (YEATES et al., 1990).
O emprego de estratégias de resolução de conflitos mais elaboradas (de impulsivas e
unilaterais para estratégias mais cooperativas e colaborativas) implica um crescente
desenvolvimento de niveis ordenados de tomada e coordenação de perspectiva social. A habilidade
para diferenciar e coordenar as perspectivas de si e dos outros, cognitivamente e emocionalmente,
forma a base da comunicação social, bem como da ação (DRAY et al., 2009).
Tais capacidades, por sua vez, tornam-se mais sofisticadas e diferenciadas com a idade e
com a maturidade e progridem de concepções egocêntricas e subjetivas, para mecanismos de
reciprocidade e mutualidade, conforme exemplificado no quadro II a seguir (LARUSSO e
SELMAN, 2011, p. 2)14:

14
Tradução nossa.
38
Quadro II: Níveis de desenvolvimento ordenados de coordenação perspectiva social e sua
aplicação para tipos de estratégias de resolução de conflitos sociais
Níveis de coordenação de perspectiva Estratégias de resolução de conflitos
social sociais
(competências emergentes; (são favorecidas, mas não determinadas
largamente desenvolvimental) pelos níveis de desenvolvimento)
0 Egocêntrico Impulsivo
1 Subjetiva Unilateral
2 Recíproco Cooperativo
3 Mútuo Colaborativo

O primeiro nível de coordenação de perspectiva social foi denominado de nível 0, ou de


tomada de perspectiva egocêntrica. Neste nível, o sujeito não estabelece qualquer diferenciação
entre pontos de vista e considera como verdade ou como única a interpretação do fato. No nível 1
(tomada de perspectiva subjetiva), o sujeito considera a diferença das ideias entre as pessoas porque
elas possuem informações diversas sobre a mesma situação social. Ainda não consegue se colocar
no lugar dos outros para julgar suas ações e nem considerar a perspectiva dos demais a fim de
julgar os atos que ele próprio cometeu. Já o nível 2 (tomada de perspectiva recíproca), indica que
os indivíduos compreendem que as opiniões podem divergir porque as pessoas têm propósitos e
valores diferentes. O grande marco de desenvolvimento deste nível é a capacidade de o sujeito
avaliar seu comportamento sob outra perspectiva, do ponto de vista daquele com quem interage.
Além do mais, a pessoa é capaz de antecipar as ideias e sentimentos do outro. A vantagem do nível
3 (tomada de perspectiva mútua) é que o sujeito compreende a existência de múltiplas perspectivas
e, numa situação diádica, distingue, inclusive, o ponto de vista de um terceiro sobre a mesma
situação (SELMAN e BYRNE, 1974).
Já o primeiro nível das estratégias de resolução de conflitos interpessoais (impulsivo)
envolve, principalmente, comportamentos impetuosos e físicos para se conseguir o que quer ou
para se evitar algum dano. São estratégias baseadas no nível 0 de tomada e coordenação de
perspectiva, que não diferencia perspectivas subjetivas ou distingue entre ações e sentimentos.
Estratégias desse nível usam a força irrefletida para alcançar um objetivo, ou a obediência
irrefletida, ou mesmo o abandono para proteger a si mesmo. As estratégias no próximo nível
(unilateral) consistem, principalmente, de tentativas unilaterais de controle ou de acalmar a outra
pessoa. Dependem do nível 1 de tomada e coordenação de perspectiva, que diferencia perspectivas
subjetivas, mas não permite serem consideradas simultaneamente. Assim, as estratégias envolvem
ordens como uma maneira de afirmar o poder, o controle e a satisfação a si mesmo, ou mesmo a
39
submissão ao poder, controle e desejos da outra pessoa. Estratégias do nível cooperativo, por sua
vez, envolvem tentativas para satisfazer as necessidades dos participantes de forma recíproca, por
meio de negociações, intercâmbios e acordos. Contam com o nível 2 de tomada e coordenação de
perspectiva, que não apenas diferencia as perspectivas subjetivas, mas também permite que sejam
consideradas simultaneamente. Usam conscientemente de influência psicológica para mudar a
mente da outra pessoa, ou de conformidade psicológica para proteger os próprios interesses. Por
fim, as estratégias do mais alto nível (colaborativo) abarcam tentativas de cooperação, no sentido
de mudar tanto os próprios desejos, como os da outra pessoa, a fim de desenvolver objetivos
mútuos. Essas estratégias amparam-se no nível 3 de tomada e coordenação de perspectiva, que
permitem a coordenação de si, da perspectiva do outro em termos da relação entre eles, ou a partir
do ponto de vista de uma terceira pessoa. Neste nível, faz-se uso da autorreflexão e da reflexão
compartilhada para facilitar o processo de diálogo que leva ao compromisso e à construção de
resoluções mutuamente satisfatórias. Demonstra-se preocupação com a continuidade do
relacionamento, bem como o entendimento de que soluções para os problemas imediatos têm uma
influência nessa continuidade (YEATES et al.,1990).
Conforme demonstrado no quadro II, a capacidade de uma criança para coordenar múltiplos
pontos de vista em experiências sociais compartilhadas pode promover o desenvolvimento da
compreensão interpessoal e de habilidades de gerenciamento relacionais (DRAY et al., 2009). A
sequência de desenvolvimento dos níveis de perspectiva social, portanto, está na base da gama de
estratégias utilizadas pelas crianças para resolver os conflitos interpessoais. A escolha da estratégia
de ação pode, portanto, ser considerada manifestação de uma estrutura subjacente de pensamento
sobre as relações sociais (ABRAHAMI et al., 1981).
A natureza do desenvolvimento de estratégias de negociação interpessoal pode, ainda, ser
justaposta a outra dimensão de variação. Ao descrever essa dimensão, a teoria cunha os termos:
“orientação de transformação do outro” e “orientação de transformação do eu”. Em cada nível, as
estratégias podem ter, então, duas direções: ou o indivíduo tenta modificar o próprio
comportamento ou as ideias e sentimentos do outro. No nível mais evoluído, há uma fusão dessas
duas orientações, conforme demonstrado no quadro III a seguir (YATES et al., 1990, p.573)15:

15
Tradução nossa.
40
Quadro III: Esquema de classificação para as estratégias de negociação interpessoal
Nível de Orientação Interpessoal
Desenvolvimento Transformação do eu Transformação do outro
0: impulsivo Lamentar; fugir, esconder. Lutar, agarrar, bater.
1: unilateral Obedecer, ceder, esperar por ajuda. Comandar; intimidar, ordenar.
2: cooperativo Perguntar por razões; permutar. Dar desculpas; persuadir; ir primeiro.
3: colaborativo Colaborar, refletindo as necessidades mútuas e a natureza da
relação.

A classificação demonstra como as estratégias parecem muito diferentes em termos de ação


ostensiva, justamente porque dizem respeito a orientações interpessoais opostas. No entanto,
refletem níveis semelhantes de sofisticação de desenvolvimento em termos de tomada e
coordenação de perspectiva.
Ao longo do tempo, enquanto as crianças aprendem gradativamente a ver os pontos de vista
das outras pessoas e integrá-los aos próprios, elas são mais propensas a apresentar uma
compreensão aprofundada acerca de outras pessoas - seus pensamentos, sentimentos e motivações
– e, como resultado, são mais capazes de gerenciar os relacionamentos em suas vidas (DRAY et
al., 2009). No nível 0, por exemplo, constata-se uma incapacidade de a criança compreender a
perspectiva alheia, enquanto que, no nível 3, o adolescente já é capaz de coordenar essas
perspectivas.
Existe, portanto, uma relação entre o emprego de determinada estratégia e as idades dos
sujeitos, porque a maneira como este lida com as desavenças é também expressão do estágio de
desenvolvimento. As estratégias de nível 0 são características das crianças de 3 a 6 anos; as de
nível 1, de 7 a 9; de nível 2, de 10 a 13 e as de nível 3, de 11 anos em diante. Essas idades são
aproximadas e não significa, por exemplo, que um adolescente que já utilize as estratégias de nível
3, sempre o faça, uma vez que essa utilização depende, também, do contexto ou do método utilizado
pela outra parte para resolver o conflito. Assim, a melhor solução para o problema de um dado
domínio comportamental pode depender das particularidades do contexto em que ele ocorre, ou
seja, nem sempre alguém capaz de agir em um nível mais alto o fará em todas as vezes, porque em
algumas situações, é mais adaptativo e apropriado atuar de maneira menos evoluída. Outro ponto
que não pode deixar de ser enfatizado é que essa classificação, criada tão somente para ser aplicada
às estratégias, não deve ser empregada para rotular as pessoas, dadas as variações de contexto já
assinaladas (SELMAN e SCHULTZ, 1990).
41
Assim como na visão de Piaget (1932-1994), a teoria de Selman também se concentra na
importância da interação social para o crescimento de cada indivíduo, distanciando-se cada vez
mais do egocentrismo em direção à reciprocidade. Sem desconsiderar a força dos modelos, Piaget
e Selman valorizam o aprendizado que pode ocorrer por meio do conflito conceitual, ou seja, a
consciência do sujeito de que as evidências externas entram em desacordo com sua compreensão
do fato, ou ainda, a percepção da inconsistência ou inadequação de seu sistema de crenças ou
valores. Moshman (2005) salienta, ainda, a importância especial das interações sociais simétricas
(indivíduos que são – e que se percebem -, comparáveis em termos de conhecimento, autoridade
e/ou poder) em possibilitar tais conflitos conceituais, promovendo o avanço na reflexão da própria
perspectiva e na coordenação de múltiplos pontos de vista. Como sintetiza Vinha (2000b), diante
de um conflito, busca-se uma nova equilibração, ou seja, o sujeito é motivado a refletir sobre
maneiras distintas de reconhecer o ponto de vista do outro e de aprender, aos poucos, como buscar,
por exemplo, soluções mais evoluídas e, portanto, aceitáveis para todas as partes envolvidas.
Sastre e Moreno (2002) também concebem as situações de conflito como oportunidades de
aprendizagem e desenvolvimento e reiteram que, para se resolver um conflito de maneira
satisfatória, é preciso uma descentração do próprio ponto de vista para considerar simultaneamente
algumas conjunturas diferentes e, às vezes, até contrárias. Para as autoras, as atitudes que tomamos,
portanto, diante de conflitos, são um reflexo de complexos processos mentais nos quais a razão e
as emoções estão estreitamente vinculadas. Em outras palavras, uma adequada resolução de
conflitos, que implique um bem estar a todos os envolvidos, requer competências cognitivas e
afetivas específicas.
Gonçalves e Sposito (2002) também ressaltam que condutas não violentas na resolução de
conflitos abarcam um elemento instrutivo, destinado ao campo cognitivo, e abrangem, também, as
relações humanas, que se destinam ao campo afetivo. Esses dois elementos incidem sobre o
comportamento propriamente dito.
La Taille (2002), Mantovani de Assis e Vinha (2003), Leme (2004) e Tognetta (2009) são
alguns dos autores que assumem a possibilidade de a pessoa, inclusive, apresentar condições
cognitivas para resolver um conflito de forma construtiva e assertiva, mas não fazê-lo em função
de vieses afetivos, ou vice-versa. Ainda sobre o envolvimento dos afetos, Leme (2011a) retoma
que o conflito é um tipo de situação que surge na interação entre duas ou mais pessoas e que suscita
um impasse que precisa ser resolvido. Este, por sua vez, desperta frequentemente algum tipo de
42
sentimento, como frustração, raiva ou indignação, que pode levar a reações de resolução tanto
favoráveis ao conflito - como o diálogo e a negociação -, quanto responsáveis pelo afastamento –
como a coação e o confronto violento.
Considerando todos esses recursos cognitivos e afetivos, além das implicações decorrentes
dessa indissociabilidade, não é lógico, portanto, pensar que é possível superar dificuldades no
enfrentamento das situações de conflitos sem nenhuma aprendizagem prévia.
Aliás, considerando alguns trágicos e crescentes índices envolvendo jovens implicados em
conflitos interpessoais que culminam, inclusive, em tragédias fatais, Ramos e Mizne (2011)
reiteram a urgente necessidade de se educar os jovens para se relacionarem, para conhecerem
alternativas de resolução de conflitos que ultrapassem o confronto violento com o outro. La Russo
e Selman (2011) também citam um estudo de Shanklin et al. (2007), que evidencia que mais da
metade dos conflitos envolvendo alunos do Ensino Fundamental nos Estados Unidos acabam
tornando-se violentos. No Brasil, temos, ainda, a tendência à pouca assertividade e à alta submissão
apresentada por alguns jovens (VICENTIN, 2009b; LEME, 2004), o que reforça ainda mais a
urgente necessidade de preparar os alunos para a participação e a convivência na sociedade.
Contudo, as evidências exemplificadas anteriormente, são a prova dos resultados negativos
de métodos meramente expositivos de ensino que frequentemente descrevem pautas de
comportamento sobre como se deve atuar para resolver determinados problemas interpessoais
(SASTRE e MORENO, 2002).
A resolução dos conflitos por meio do diálogo, de forma justa e equilibrada, requer,
especialmente, competência para discutir e avaliar diferentes soluções e perspectivas, além do
reconhecimento da necessidade de aspirações que regulamentam a conduta positiva dos indivíduos.
É preciso, portanto, ao contrário de imposições e doutrinações, um meio favorável que facilite o
desenvolvimento integral, ou seja, que conheça como ele acontece em um sujeito essencialmente
ativo e que contribua para estimulá-lo, proporcionando circunstâncias que o favoreçam.

3.2 O papel da escola

Considera-se que um dos espaços de convívio coletivo mais favorável para que a criança e
o adolescente aprendam a resolver conflitos, a fim de construir valores morais e éticos, é a escola.
43
Trata-se de uma instituição que tem como finalidade, segundo os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) de 1996, promover o desenvolvimento dos estudantes de forma plena,
considerando, para tanto, os aspectos da cidadania, a dignidade, o direito à informação, o acesso
aos bens culturais produzidos pela humanidade, a socialização e o atendimento visando à
sobrevivência e ao desenvolvimento da identidade do aluno.
Anser et al. (2003), Abramovay, Lima e Varella (2003), Fernandez (2005) e Cardia (2006)
também ressaltam a função do processo formal de ensino em viabilizar - por meio da promoção de
relações de troca e de esforços partilhados -, a construção de normas, de condutas sociais e de
relacionamentos pautados em valores morais e éticos, visando ao desenvolvimento de um senso
crítico e de uma segurança que levará a uma participação ativa e transformadora nas várias
instâncias da vida social.
Ademais, vale ressaltar que, no Brasil, o acesso à escola é de 97,4% para a população de 6
a 14 anos e de 87,7% na faixa etária de 15 e 19 anos de idade, independentemente da classe de
rendimento mensal (PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICÍLIOS 2011, 2012,
apud IBGE, 2012), o que reforça a ideia de a escola ser um importante lócus de promoção de
desenvolvimento.
Vicentin (2009), Cardia (2006), Morgado e Oliveira (2009), Leme (2004) e Fernandez
(2005) reforçam que é essencialmente nesse espaço de convivência que a relação entre os iguais,
as trocas e os confrontos de ideias e desejos são mais oportunizados. A escola é um organismo
vivo, dotado de movimento e relações que reúnem um grande número de crianças e jovens com
diferentes origens, por várias horas do dia, em situações que propiciam o surgimento de conflitos
diversos que, com a permissão e mediação construtiva do educador, podem levar à regulação
mútua, à reciprocidade e consequentemente à aprendizagem de resolução de conflitos de forma
mais cooperativa e pacífica.
Fernandez (2005) e Vicentin (2009) resumem, então, que a concepção que a escola adota
em relação ao conflito - como perturbação da ordem estabelecida ou como situações abordáveis
que são parte do próprio processo educativo -, assim como o olhar atento à estreita inter-relação
dos aspectos cognitivos e afetivos, são condições essenciais para a formação de alunos que
resolvem conflitos de maneira justa e não violenta. Vinha (2003) e Tognetta e Vinha (2007)
mostram em suas pesquisas, que, em geral, os educadores concebem os conflitos interpessoais
como negativos ao bom andamento das relações entre os alunos. Tal concepção evidencia-se
44
devido aos esforços que são geralmente apontados em três direções: ou tenta-se evitar o conflito
(vigiam, ameaçam, criam regras etc.), ou tenta-se resolvê-lo de forma rápida (culpabilizam,
admoestam, incentivam a delação, etc.), ou, ainda ignora-se (quando o conflito acontece entre os
pares). São, de qualquer forma, mecanismos de controle que contribuem para formar jovens
heterônomos, com dificuldade para emitir opiniões, tomar decisões, expressar sentimentos e
coordenar perspectivas em ações efetivas.
Tradicionalmente, sem considerar a crescente complexidade do contexto escolar, fica claro,
portanto, que os modelos de atuação diante dos conflitos não oferecem muitas novas alternativas e
seguem, em geral, um esquema arcaico que contempla os seguintes passos: incidente seguido de
repreensão e punição. Também é comum, principalmente diante de um conflito entre os pares,
algumas concepções costumeiras que reclinam em: diminuir a importância do problema, negar a
existência dele ou tentar se responsabilizar pela resolução (FERNANDEZ, 2005; SERRANO e
GUZMÁN, 2011), em um movimento muito coerente com o modelo contemporâneo de
intolerância e rejeição à unidade conflito-violência já descritos por Dymetman (2011).
Não raro, as punições também se dão pela exclusão do aluno agressor via suspensões às
aulas que, quando muito frequentes, comprometem, inclusive, seu desempenho escolar, chegando,
muitas vezes, até a inviabilizar sua permanência na escola (LEME, 2011b). Embora em uma
realidade bastante distinta da escola ocidental, Yen e Wang (2009) retratam alguns sérios prejuízos
encontrados em 8.494 adolescentes taiwanenses, como resultado das experiências do uso da
suspensão como modelo de sanção pela escola. Os resultados indicaram que, comparados a alunos
que nunca foram suspensos, os que já haviam passado por essa situação vivenciaram numerosas
situações adversas em variados graus, tais como: maiores chances de apresentar depressão, baixa
autoestima, insônia, consumo de álcool e drogas, menor satisfação com seus colegas de classe,
menor envolvimento com a escola e pior rendimento acadêmico, entre outros.
Uma pesquisa conduzida pelo Centro de Empreendedorismo Social – CETS e
Administração em Terceiro Setor ligado à Fundação Instituto de Administração -FIA- investigou
alunos do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental nas cinco regiões do Brasil. Os resultados
confirmam o que já foi apresentado e refletem a adoção frequente, pela escola, das tradicionais
medidas de coação ao aluno: a suspensão (culpabilização do aluno) e a conversa com pais
(culpabilização da família) (VIDIGAL e VICENTIN, 2012). O paradigma do comportamento na
escola fica, então, marcado, segundo Oliveira (2011), pela reação à violência com violência,
45
manifestada na iniciativa mais recorrente: o encaminhamento ao coordenador, ao diretor, aos pais,
ao psicólogo, ao policial. Em uma situação limite, não raras vezes, a decisão é a transferência do
aluno ou mesmo o convite à sua retirada da escola.
Abramovay e Rua (2002) também apresentam que, em geral, as escolas lidam com os
conflitos e com os diversos tipos de violências por meio de normas que destacam as advertências,
as suspensões e as transferências/suspensões, dependendo da gravidade da questão. Stelko-Pereira
e Padovani (2008) e Oliveira (2011) ressaltam o incentivo - muitas vezes velado -, por parte da
escola, à transferência e/ou à expulsão do aluno que apresenta comportamentos considerados
agressivos ou indisciplinares, contrariando, inclusive, preceitos legais que estipulam o direito de
permanência do aluno na escola (pressupostos da educação inclusiva dispostos pelo Ministério da
Educação em 2001 e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente16, que afirmam “igualdade de
condições para o acesso a permanência na escola” e “direito de ser respeitado por seus
educadores”). Entre as potenciais consequências da transferência/expulsão, os autores descrevem
o incremento de dificuldades de ordem social, emocional e acadêmica, o que confirma o insucesso
de tais práticas no que se refere aos domínios acadêmicos e pessoais do desenvolvimento,
atingindo, principalmente, os alunos que ficam fora da escola por meses à procura de vaga, muitas
vezes, negada em outras escolas (OLIVEIRA, 2011). Especificamente, Stelko-Pereira e Padovani
(2008, p. 5) destacam que
para a escola, a transferência de alunos pode causar alívio e a falsa noção de que se atua
contra a violência. Contudo, os estudos revelam que a transferência e expulsão de alunos
trazem uma série de consequências danosas para o aluno, para a família e para a sociedade,
como por exemplo, risco de aumento de fracasso e evasão escolar, distanciamento de
atividades e grupos prossociais, além de favorecer o envolvimento em atividades ilícitas.

Abramovay e Rua (2002) e Oliveira (2011) também ressaltam que a externalização do


problema pela escola é muitas vezes oportuna do ponto de vista político e institucional, na medida
em que essa lógica retira do sistema de ensino sua parcela de responsabilidade sobre o processo de
produção e enfrentamento do conflito, estando esse movimento, de certa forma, fortemente
relacionado ao modelo de gestão adotada pela instituição.

16
Lei nº. 8.069/90, capítulo IV, artigo 53, parágrafo primeiro.
46
A pesquisa “Violência nas escolas: o olhar dos professores”17 realizada pela Apeoesp e pelo
Instituto Data Popular (2013), reforça essa ideia ao apresentar que, para os professores de escolas
estaduais paulistas, a principal causa da violência nas escolas é a falta de respeito, de valores e de
educação por parte dos alunos (74%), seguida da educação em casa (49%) e da desestruturação
familiar (47%). Loureiro e Queiroz (2005) também encontraram resultados similares em uma
pesquisa acerca das concepções de violência da equipe pedagógica, dos auxiliares de disciplina e
de um grupo de estudantes de uma escola particular no estado do Espírito Santo. A maioria dos
entrevistados vê as causas da violência na escola como relacionadas primeiramente à família
desestruturada e ao ambiente em que o aluno ou a escola está inserido, o que também indica uma
perspectiva pouco crítica das dinâmicas tecidas dentro da escola.
Fernandez (2005), no entanto, assinala que a escola que considerar que a origem do
problema está fora dela – na família, nos amigos, ou no ambiente social em geral -, procurará
soluções diferentes daquela que, sem ignorar as influências desses ambientes educativos, é capaz
de identificar, no próprio ambiente escolar, elementos que também expliquem o fenômeno.
Fica, portanto, evidente que, na prática, a escola não tem sido um espaço que efetivamente
crie condições para que os alunos aprendam a resolver conflitos de forma pacífica e colaborativa
e, assim, tenham condições de evoluir afetiva e moralmente.
De acordo com Adalbjarnardottir e Selman (1997), todos os educadores possuem a
demanda em favor da promoção do desenvolvimento sociomoral dos estudantes como uma parte
regular de seu papel profissional. Para Fernandez (2005), aliás, os conflitos fluem com violência
quando, de alguma forma, falham os instrumentos mediadores que permitiriam um confronto mais
pacífico.
Cubas (2006) e Morgado e Oliveira (2009) acrescentam que não se trata de eliminar o
conflito nas escolas – até porque ele deve ser visto como legítimo, aceitável e necessário -, mas
sim de regulá-lo pelo uso da palavra (de preferência de forma assertiva e justa) e não pela violência.
Charlot (2002) também reforça essa perspectiva ao defender que o problema não é fazer
desaparecer da escola o conflito, mas saber quais são as formas de expressão legítimas ou
aceitáveis, ou seja, regular o conflito e a agressividade pela palavra e não pela violência.

17
http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/observatorio-da-violencia/caderno-violencia-nas-escolas-analise-da-
pesquisa/ Data de acesso: 14/10/2013
47
Coerentemente com essa visão, Leme (2011a) ressalta que, além dos métodos discursivos
e doutrinadores de boa conduta, o impedimento de toda e qualquer oposição entre as pessoas
também não ajuda na superação das dificuldades. Isso porque,
sem a experiência em negociar, em refletir sobre sentimentos, direitos e deveres de todos, a
maturação não exercerá qualquer mudança no futuro, pois a habilidade de coordenar aos
poucos as informações não terá sido colocada em prática e desenvolvida (p. 164).

Acontece que, ainda que os conflitos sejam inerentes ao cotidiano da escola, encontra-se,
em geral, um despreparo dos educadores, que acabam agindo de maneira intuitiva e improvisada,
orientando suas intervenções principalmente no senso comum (ADALBJARNARDOTTIR e
SELMAN, 1997; VINHA, 2000b; MANTOVANI DE ASSIS e VINHA, 2003; VICENTIN, 2009).
Essa intervenção pouco construtiva é particularmente séria quando se trata das crianças menores
que, segundo Leme (2011b), têm menos recursos cognitivos para lidar com o conflito de modo
satisfatório, tanto em razão da menor experiência com esse tipo de situação, como pelo nível de
maturidade, o que restringe sua capacidade em coordenar várias informações ao mesmo tempo.
Tal discussão remete à importância do modo como o educador deve atuar na sala de aula,
evidenciando que as dificuldades, hoje comuns, são resultantes do despreparo e da formação inicial
e continuada não favoráveis. Debarbieux (2006) assinala que a falta de preparação dos profissionais
da educação é algo mundialmente constatada. No caso do Brasil, em específico, quase nada é feito
para habilitar os profissionais da educação no trabalho com os conflitos cotidianos (CUBAS, 2006),
o que acaba impedindo, muitas vezes, a importante tarefa do educador na promoção de
competências e habilidades interpessoais nos alunos (ADALBJARNARDOTTIR e SELMAN,
1997).
Camacho (2001), em um estudo sobre a vida escolar de adolescentes e as práticas de
violência entre pares, conclui que a falha de formação acarreta, à maioria dos profissionais da
escola, o desconhecimento da complexidade de questões como a indisciplina, os conflitos entre os
alunos, a violência, os preconceitos ou as discriminações. Leme (2011a) defende que, ao priorizar
a promoção do desenvolvimento cognitivo, a escola muitas vezes se esquece da dimensão afetiva.
A consequência, portanto, segundo Camacho (2001), é a formação de jovens que se mostram
desprovidos das ideias de alteridade, de espaço democrático, de diálogo, de convencimento e de
persuasão.

48
Outro agravante refere-se às condições de trabalho nas escolas. Entre os dias 22 de março
e 16 de maio de 2012, a UDEMO18 realizou uma pesquisa, via site, sobre a situação das escolas
públicas do Estado de São Paulo, com relação ao Professor/Coordenador. Participaram da pesquisa
322 escolas. O resultado mostrou que quase metade das escolas da rede não conta com esse
profissional; há ainda várias escolas que deveriam ter mais de um professor/coordenador e não o
têm. O problema é mais grave na Capital e Grande São Paulo e no período diurno.
Outra pesquisa, realizada no ano de 2010, pela mesma instituição, assinala que mais da
metade das escolas do estado têm professores afastados por doença e que não estão sendo
substituídos. Segundo a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo19, somente no primeiro
semestre de 2013, 4,8 mil turmas ficaram sem aula de alguma disciplina. Na prática, 4 em cada 5
escolas têm turma sem professor, o que representa 80% da rede estadual.
Esse triste cenário torna-se ainda mais preocupante ao se considerar que a qualidade da
escola é uma variável extremamente importante para prevenir ou pactuar com a violência. Para
Fernandez (2005); Debarbieux (2006) e Cubas (2006) não se trata, contudo, de culpabilizar os
agentes da escola, mas de identificar o seu espaço de responsabilidade real. Os autores são enfáticos
ao proferir que o clima escolar que prevalece nas escolas prediz, por exemplo, o sucesso ou não
dos programas de prevenção à violência.
O clima escolar, por sua vez, refere-se às qualidades de vida e de comunicação percebidas
pelos membros de uma escola. Pode-se considerar que o clima de uma escola corresponde a sua
atmosfera, a valores, atitudes e sentimentos partilhados pelos atores, assim como às relações sociais
e com o conhecimento. O clima é uma variável subjetiva relacionada com a percepção que os
membros da organização têm de como eles são tratados e os papéis na relação com os outros
(THIÉBAUD, 2005). Ademais, o sentimento de pertencimento, de identidade pessoal dentro
sistema, tanto para professores como para alunos, forma o clima e é prioritário para o
desenvolvimento de uma prática educativa de qualidade (DEBARBIEUX, 2006).
Especificamente, a democratização da gestão dentro das escolas, as relações positivas entre
professores e alunos (potencializando a cooperação, o respeito mútuo, a reflexão e a participação
dos alunos), as medidas que vinculem a escola com a comunidade, o fomento ao trabalho em grupo

18
Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo
19
http://www.radioagencianp.com.br/11834-estado-de-sao-paulo-tem-deficit-de-49-mil-professores-na-rede-publica
Data de acesso: 14/10/2013
49
(aprender a confiar, ajudar e a compartilhar), o desenvolvimento de atividades que prezem pela
criatividade e expressão de alunos e professores, o planejamento de ações e o monitoramento dos
resultados, além da formação de professores e alunos para lidar com os conflitos de forma mais
solidária, também são práticas que vêm sendo associadas ao uso de estratégias de resolução de
conflitos mais pacíficas e elaboradas (GONÇALVES e SPOSITO, 2002; GLADDEN, 2002;
RUOTTI, 2006a e 2006c; SERRANO e GUZMÁN, 2011; VINHA e MANTOVANI DE ASSIS,
2007). Coleman (2011) ainda acrescenta algumas outras ações específicas que respeitam as
necessidades de desenvolvimento dos adolescentes, público alvo da presente pesquisa: aumento
gradativo de responsabilidade e autonomia aos alunos, relações mais igualitárias entre adultos e
jovens, possibilidades de escolhas individuais em relação à aprendizagem acadêmica e regras e
atividades que tenham uma real necessidade.
Quanto às intervenções baseadas em punições, Martínez-Otero e Miranda (2010) enfatizam
que elas devem ceder espaço a atuações em que se busca a reflexão, a implicação das partes, o
acordo, a responsabilidade e o desenvolvimento pessoal e social. Cardia (1997); Abramovay
(2003); Ruiz (2005); Fernandez (2005); Debarbieux (2006); Ruotti (2006b e 2006c) e Leme
(2011b) são alguns dos autores que também sinalizam que a violência na escola tem todas as
possibilidades de aparecer em um clima escolar em que as normas são arbitrárias, elaboradas à
margem da participação dos alunos, inconsistentes, pouco claras e injustas em suas aplicações.
Quando não é claro aos implicados, por exemplo, em que momento o cumprimento das normas é
obrigatório ou não, perde-se uma especificação do limite da liberdade individual, ou seja, até onde
deve reduzir-se a liberdade de cada um em nome do respeito aos direitos dos demais. Para
Abramovay (2003, p. 85),
escolas bem organizadas, bem cuidadas, com regras claras de comportamento, com
segurança no seu exterior, com um clima de entendimento, valorização dos alunos e dos
professores, diálogo, cultivo de vínculos com a comunidade, sentimento de pertencimento
e poder de negociação entre os diferentes atores, podem mudar a situação.

A autora ainda retoma que a violência também tem consequências que afetam
negativamente a qualidade de ensino e a aprendizagem, incluindo, por exemplo, grande
rotatividade de professores, dificuldade de concentração nos estudos, perda da vontade de ir à
escola, sensação de nervosismo e revolta, sentimentos de medo e insegurança, danos físicos,
incluindo tanto os alunos, como o corpo técnico-pedagógico. Debarbieux (2006) reforça a
importância dos efeitos sociais nos alunos da recorrência das violências menores ou da pequena
50
delinquência repetitiva: o fechar-se sobre si próprio, por angústia, por decepção das autoridades; a
perda de sentido e de confiança em si e nos outros e o sentimento de abandono e insegurança.
Ademais, “o sentimento de impotência aumenta com a repetição de incidentes não tratados” (p.
104), assim como o sentimento de impunidade por parte dos agressores. No entanto, a violência
faz parte de um quadro institucional e social, que, por sua vez, está sujeito a mudanças. A violência
é sociohistoricamente construída e, logo, pode ser também desconstruída (BODINE e
CRAWFORD, 1998; ABRAMOVAY, 2003 e DEBARBIEUX, 2006;), tanto com estratégias que
vêm de fora, como com aquelas que fazem parte do contexto escolar.

3.3 A violência nas escolas

Apesar de não ser no ambiente escolar que ocorrem os eventos mais violentos e letais da
sociedade, ainda assim, a violência é um elemento preocupante, tanto pelas sequelas e sofrimentos
reais que infligem aos participantes e testemunhas ou pelo rompimento com o ideário da escola
como espaço de conhecimento, de formação e de socialização (ABRAMOVAY et al., 2003;
DEBARBIEUX, 2006; RUOTTI, 2006b).
O ambiente escolar foi revestido, por muito tempo, por uma aura aparente de segurança,
livre da violência habitualmente encontrada em outros espaços da sociedade. No entanto, em todo
o mundo ocidental moderno – embora as pesquisas estatísticas acerca dos índices sejam suspeitas
no que tange ao exagero epidêmico – (FERNANDEZ, 2005 e DEBARBIEUX, 2006), a violência
nas escolas não é um fenômeno incomum, principalmente quando se trata de
microviolências/incivilidades: delitos periféricos, pequenas infrações e agressões contra as
pessoas, esses sim, mais constantes no cotidiano da escola.
Ruotti (2006b) também destaca que a forma como certos dados de pesquisa é veiculada e
traduzida pela imprensa, - principalmente no que se refere a escolas públicas e de periferia -, cria
uma imagem na qual seria impossível qualquer ação educativa, tamanha insegurança e
periculosidade. No entanto, ao contrário do que se objetiva difundir, a violência criminosa, embora
atinja algumas escolas com maior intensidade, não se constitui como regra. Como anteriormente
mencionado, as manifestações de violência na escola são, predominantemente, de natureza não

51
criminosa (intimidações, desrespeitos, entre outros), que indicam problemas na própria dinâmica
escolar e na falta de ações que favoreçam gestões negociadas de conflitos.
Cardia (1997) e Ruotti (2006b), em pesquisas com alunos adolescentes de escolas públicas,
constataram que, segundo os alunos, há mais violência fora da escola, no bairro, no trajeto, no
ônibus ou no portão, do que dentro dela. Debarbieux (2006) é também enfático ao demonstrar que
os alunos são menos vítimas das agressões mais graves na escola (homicídios, violação) e
claramente mais vítimas, na escola, de outros tipos de agressão, como: assédios, roubos, extorsões
e agressões verbais. A definição de violência na escola, portanto, escapa a uma perspectiva única,
pois o que está em jogo não é um comportamento isolado ou excepcional, mas, sim, a sua repetição
e a sua associação e é nessa recorrência que habita não toda a violência na escola, mas a sua
violência cotidiana, a sua realidade corriqueira. A violência na escola configura-se, sobretudo,
como acumulação, desgaste e opressão, e é assim que deve ser compreendida e combatida.
Sposito (2001) acresce essa perspectiva ao analisar pesquisas sobre violência escolar no
Brasil. Para a autora, as incivilidades por parte dos alunos sinalizariam, sim, as dificuldades da
escola em criar possibilidades para que tais condutas possam ser geridas no âmbito da convivência
democrática, mas configuram-se, sobretudo, como um conjunto de insatisfações manifestadas
diante da própria experiência escolar, experiência essa que, segundo Charlot (2002, p. 435),
configura-se como uma violência da escola: “uma violência institucional, simbólica, que os
próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os tratam.”
Na medida em que as regras são impostas e controladoras e as punições são, na maioria das
vezes, estipuladas de forma arbitrária, a escola pode ser sim um lócus privilegiado do exercício
dessa violência institucional. Abramovay e Rua (2002), no relatório sobre a violência na escola da
UNESCO, exemplificam algumas falas recorrentes de estudantes acerca da violência por parte da
escola - exercida pelo uso de símbolos de poder -, que se manifesta por meio de vários atos:
“pressionar a partir do poder de conferir notas, ignorar os alunos com seus problemas, tratá-los
mal, recorrer a agressões verbais e expô-los ao ridículo quando não compreendem algum conteúdo”
(p. 80). A violência se expressa, também, visivelmente, quando os professores afastam-se da
cultura juvenil, quando os alunos são vistos como inimigos, quando existe uma instabilidade da
equipe docente, ou quando as relações de confiança entre adulto e aluno são praticamente
inexistentes.

52
Especificamente sobre a realidade dos alunos da faixa etária estudada pela presente
pesquisa, o estudo exploratório realizado pela Fundação Carlos Chagas20 em 2012 ressalta a
necessidade de formar melhor o professor especialista desse segmento para melhorar uma imagem
negativa que os professores possuem dos alunos. Os professores, participantes da pesquisa,
confessam certa decepção com os jovens de 11 a 14 anos. Para eles, tais alunos não conseguem se
comportar com o mínimo de maturidade, não demonstram interesse pela aquisição de
conhecimento e, muito menos, valorizam a figura do professor. Tal crença, entretanto, desmotiva,
afasta e prejudica muito a construção de relações de confiança e respeito entre adulto e aluno.
O estudo ainda retoma que no Ensino Fundamental II, a relação de respeito e de confiança
é condicionada, especialmente, à admiração do aluno pela forma do professor ensinar, pelo seu
compromisso com os estudantes, pelo cuidado com as aulas e pela correção cuidadosa do que cada
aluno produz. Para que tal condição de investimento realmente aconteça, é necessária uma
formação ao professor que ofereça, entre outras coisas, ferramentas para que ele conheça as
peculiaridades da adolescência: quem é e o que pensa o adolescente. É urgente a necessidade de se
desenvolver uma visão do estudante pautada nas necessidades específicas da faixa etária.
Partindo para uma dimensão da violência institucional tão séria quanto e, talvez, ainda mais
prejudicial, Stelko-Pereira et al. (2011) apresentam um estudo pioneiro no Brasil na investigação
de agressão física por funcionários/educadores (professores, inspetores, merendeiras, porteiros e
faxineiros) no contexto escolar. Foram participantes 396 estudantes do Ensino Fundamental II de
duas escolas públicas do interior do estado de São Paulo. No total, 21 alunos foram agredidos
fisicamente por funcionários, apesar da legislação específica no país, incluindo o recente projeto
de Lei n.º 7672/2010, que prevê “o direito da criança e do adolescente de não ser submetido a
nenhuma forma de punição corporal, moderada ou imoderada, sob a alegação de quaisquer
propósitos, ainda que pedagógicos” (p.3). Complementando essa discussão, Debarbieux (2006),
em seus estudos sobre as ações contra a violência na escola, afirma que “a punição física não é
apenas uma simples tradição, mas uma escolha educativa. E é uma má escolha” (p. 203). O autor
conclui que é nas escolas nas quais o castigo é mais praticado, que a violência dos alunos se
desenvolve mais.

20
Edição especial da Revista Nova Escola sobre a pesquisa da Fundação Victor Civita (FVC): Anos Finais do
Ensino Fundamental: Aproximando-se da Configuração Atual, realizada pela Fundação Carlos Chagas (FCC) e
concluída em julho de 2012.
53
Por fim, um estudo intitulado “Violencia escolar: el maltrato entre iguales en la Educacion
Secundaria Obligatoria 1999-2006”, com 300 centros escolares da Espanha, retrata algumas das
principais magnitudes dos conflitos e da violência na escola. Os dados mostraram que os
professores acreditam não terem responsabilidade pelos conflitos que acontecem na escola,
atribuindo a causa principal, prioritariamente, à alta permissividade que existe nas famílias
(87,3%). Também chama atenção para o fato de que, tanto os professores (68,4%), quanto os pais
(53,6%), consideram que os conflitos que surgem na escola são resolvidos de maneira justa. Mais
da metade dos alunos não têm a mesma opinião. Entretanto, 64,1% dos professores afirmam que
se deveria atuar com mais dureza com aqueles alunos que causam problema na escola (SERRANO
e GUZMÁN, 2011).
Pesquisas nacionais também indicam que para “melhorar” o problema da violência e
conflitos da escola, os educadores sugerem maior controle, punições e rigor (MALTA CAMPOS,
2008; UDEMO, 2009). Especificamente, 83% defenderam medidas mais duras em relação ao
comportamento dos alunos, 67,4% disseram que deveria chegar a haver expulsão de alunos, 47%
propuseram a contratação de mais funcionários como inspetores e psicólogos, 52% defendem o
policiamento intensivo e permanente e 55% sugerem a implantação de projetos de conscientização
e valorização da escola envolvendo pais, alunos e comunidade em geral.
Contrariando a perspectiva desses professores, investigações recentes demonstram uma
série de iniciativas que contribuem para a redução da violência nos centros escolares e que
caminham, justamente, no sentido contrário da terceirização, da culpabilização e da punição dura
e arbitrária (CUBAS, 2006; RUOTTI, 2006c; MORGADO E OLIVEIRA, 2009). Porém,
independentemente de qual tipo de intervenção se priorize, para que um trabalho eficaz se
concretize, há um pré-requisito que, quando não atendido, danifica o sucesso de qualquer
empreitada: a não negação dos conflitos.
Para Cubas (2006) e Ruotti (2006c), somente ao se assumir que os conflitos, em maiores
ou menores proporções, estão presentes na escola, que parte considerável é produzida pelas
relações estabelecidas no próprio ambiente escolar, que seu enfrentamento faz parte do cotidiano e
envolve o comprometimento de toda a comunidade, é que será possível se adotar medidas para
trabalhar com os acontecimentos de maneira democrática e eficaz. Como sintetiza Fernandez e
Pérez (2005, p.79),

54
elementos afetivos (os sentimentos, os medos, as rejeições, as inibições, etc.) e os elementos
sociais (comunicação, falar e escutar, o respeito e a valorização do colega, as relações
interpessoais, a tomada de decisões, a responsabilidade de condutas, etc.) podem e deveriam
ter um lugar curricular e serem abordados desde o trabalho de classe, para favorecer o
desenvolvimento sociopessoal e os níveis de convivência.

No entanto, aspectos curriculares que contemplem o desenvolvimento sociopessoal


requerem um remanejamento metodológico, pois o compartilhamento, a ajuda entre os colegas e
os trabalhos em grupo, por exemplo, exigem maior nível de relacionamento interpessoal, o que
inclui propostas metodológicas mais ativas e criativas que, em muitos casos, atrasam os conteúdos
conceituais, porém abrem outros caminhos para se aprender (FERNANDEZ, 2005).
Além da discussão realizada até o momento acerca da relevância específica da instituição
educativa como formadora privilegiada dos domínios afetivos, morais e sociais, pesquisas recentes
nacionais e internacionais, envolvendo crianças e adolescentes, têm trazido algumas contribuições
acerca de outras variáveis contextuais e fatores situacionais que, de alguma forma, interferem na
maneira como os adolescentes julgam suas relações e como nelas agem, incluindo as situações de
desacordos interpessoais.

3.4 Variáveis relevantes

A resolução de conflitos é um processo complexo, não só porque envolve o processo de


interpretação e avaliação da situação, mas porque é dependente do contexto e das condições gerais
em que ocorrem. Especificamente, apresentaremos agora a influência do gênero, da cultura, da
idade, da família e da personalidade, como variáveis importantes demarcadas pela literatura da
área.

3.4.1 A dimensão do gênero

As diferenças entre gêneros são amplamente sinalizadas pela literatura como relevantes na
compreensão da convivência e dos conflitos. Na verdade, Rose e Smith (2009) assinalam que há
muito trabalho teórico relacionado ao desenvolvimento das diferenças entre os gêneros, porém há
poucos que focam, em particular, o domínio da relação entre pares. Entretanto, os conhecimentos

55
mais gerais sobre as especificidades de cada gênero (quanto à estrutura – número de amigos,
tamanho dos grupos, etc. - e quanto ao conteúdo – jogos competitivos, brincadeiras turbulentas,
etc.) podem ajudar na compreensão dos relacionamentos estabelecidos entre os pares.
Em linhas gerais, Rose e Smith (2009) assinalam que as crianças tendem a interagir,
primariamente, com pares do mesmo sexo, formando díades de amizades. Os grupos dos meninos,
por sua vez, são maiores do que os das meninas. Na verdade, a rede de amigos dos meninos tende
a ser mais densa ou mais interconectada do que a rede das meninas, ou seja, os meninos interagem
simultaneamente com vários amigos em grupos maiores. As diferenças entre os gêneros também
estão presentes na forma como as crianças passam o tempo com seus pares. Os meninos se ocupam
mais com brincadeiras turbulentas durante a infância (brincadeiras de bater, agarrar, empurrar, mas
sem intenção de machucar). Eles também são mais engajados em atividades competitivas, como
esportes. Outras atividades são mais comuns nas meninas, em particular, as conversas e as
revelações íntimas. De fato, as diferenças entre os gêneros com relação à intimidade com os pares
aumentam ainda mais com a adolescência. Finalmente, os meninos, consistentemente, utilizam
mais da agressão física, enquanto as meninas apresentam mais uma agressão denominada
relacional (baseada em exclusão ou na ameaça de acabar com a amizade, por exemplo), sendo que
essas diferenças também são potencializadas na adolescência. As meninas também são mais
sensíveis quanto às agressões indiretas e relacionais, ficando magoadas por mais tempo com tais
incidentes do que os meninos.
Guimarães e Pasian (2006), ao analisarem a experiência e a expressão da raiva em 120
adolescentes de 15 a 19 anos, indicaram algumas diferenças e similaridades entre os gêneros:
enquanto as meninas demonstraram agir de forma a utilizar estratégias mais passivas e/ou procurar
suporte social (amigos, família) ao lidar com conflitos, os meninos demonstraram agir de maneira
a utilizar estratégias de enfrentamento mais racionais ou materiais. Além disso, o estudo apontou
que a agressão direta e a indireta, assim como o retraimento, pareceram mais típicos nas reações
masculinas, enquanto a tendência prossocial seria mais comum entre as meninas. No mesmo
caminho, Hubbard (2001) encontrou em seu estudo sobre a expressão de emoções nas relações
entre pares, que os meninos tenderam a apresentar mais expressões de raiva por meio de expressões
faciais, entonação de voz e comportamentos não-verbais em situações planejadas de jogos de
competição.

56
Em uma amostra composta por 3.097 alunos brasileiros (8 a 16 anos) de escolas públicas e
privadas, Leme (2004) também encontrou diferenças atribuíveis ao gênero: as meninas se mostram
menos agressivas e mais submissas do que os meninos. Vale ressaltar que há uma progressiva
diminuição da diferença entre os gêneros com o avançar da idade: os meninos tornam-se mais
semelhantes às meninas, o que indica a existência de uma trajetória em direção à conformidade
social, pelo aumento na tendência à submissão com o tempo.
Crick e Grotpeter (1995) e Benenson et al. (2006) citam que os meninos, em grupo, são
mais agressivos do que as meninas (agressões físicas e verbais) em qualquer idade. Os primeiros
autores buscaram, então, compreender as formas de agressão mais apresentadas pelas meninas, já
que estas se apresentam na literatura como propensas a estabelecer relações mais próximas e
íntimas. Os dados coletados com 491 crianças do 3° ao 6° ano demonstraram que a agressividade
nas meninas está realmente mais voltada a comportamentos direcionados a causar danos na
qualidade da amizade (excluir do grupo, ferir ou controlar sentimentos alheios, espalhar rumores,
rejeitar, ignorar, prejudicar os outros através da manipulação proposital, etc.). Os autores ainda
salientam que existe uma escassez de pesquisas sobre a agressividade das meninas, o que pode ser
explicada, em parte, devido à complexidade e sutileza das condutas envolvidas, características que
as tornam mais difíceis de investigar. Benenson et al. (2006) também apontam que observações em
ambientes naturais possuem a desvantagem de não ser possível detectar muitas formas sutis de
agressão.
Esses dados vão ao encontro do estudo feito por Sinclair (2003), cujos resultados também
revelam que as meninas preferem relações diádicas, com maior compartilhamento da intimidade e,
portanto, envolvidas com sentimentos mais intensos. O estudo foi realizado com 366 sujeitos de
6, 10 e 15 anos de idade. Entretanto, vale destacar que, diferentemente do que foi relatado
anteriormente, neste estudo tanto as meninas, quanto os meninos, endossaram a agressão aparente
(utilização de estratégias físicas e impulsivas), embora a frequência maior ainda permaneça no sexo
masculino. Benenson et al. (2006), a partir de um estudo com 366 crianças e jovens de 6 a 15 anos,
acrescentam, ainda, que as meninas são mais agressivas (ações hostis) justamente nas relações
diádicas de longa data. Os meninos, por sua vez, não demostraram diferentes níveis de agressão
diante do tipo de relacionamento (grupo ou díade).
As evidências encontradas por Gorrese e Ruggieri (2012) em uma revisão de 117 estudos
sobre a diferença entre gêneros e idades na relação com pares, realmente demonstraram que
57
meninas e meninos exibem diferentes padrões de comportamento em seus relacionamentos. As
amizades entre as meninas são tipicamente mais profundas e mais interdependentes do que entre
os meninos. Além do mais, as meninas revelam uma maior necessidade de apego e maior
habilidade para manter relações íntimas, já os meninos, ao contrário, tendem a dar mais ênfase a
companheiros com quem podem, por exemplo, dividir interesses ou atividades comuns (esportes,
por exemplo) e tendem a ser mais cooperativos. Leme (2011b) destaca, entretanto, a necessidade
de se considerar o quanto as práticas de socialização relativas à forma de se comportar diferem em
relação a cada sexo. Os meninos, por exemplo, possuem, em geral, maior liberdade para expressar
agressividade, enquanto que as meninas são mais tolhidas quando se comportam de forma não
submissa.
Por fim, Chung et al. (2011) ainda sugerem que as mulheres tendem a experimentar maior
angústia. O estudo com 578 adolescentes do 9° ano buscou relacionar eventos de conflito vividos
em um determinado dia e os estados emocionais subsequentes. As adolescentes do sexo feminino,
por exemplo, são mais propensas a relatar tristeza ou chateação depois do conflito com os colegas
(os sentimentos perduram). Coerentemente, os dados revelaram que nos dias em que as
adolescentes se desentenderam com os pais ou outros membros da família, por exemplo, elas
experimentaram mais conflitos com seus pares do que os meninos. Esse resultado fornece suporte
adicional para a maior reatividade emocional aos eventos estressantes interpessoais entre as
meninas do que entre os meninos. Em consonância, Coleman (2011) também cita que as meninas
são mais afetadas pelo stress do que os meninos. Geralmente elas veem os contratempos como
mais ameaçadores e são mais propensas a esperar o pior em situações estressantes. Por esse motivo,
elas são mais dependentes de seus pais e de suas amizades íntimas para assistência, além de serem
mais sensíveis às expectativas dos outros. O autor ainda cita o estudo de Schonert-Reichl e Muller
(1996), que demonstra que as meninas são muito mais propensas a procurar ajuda com outras
pessoas em situações conflitivas do que os meninos.
Em síntese, sem desconsiderar que qualquer tipo de fenômeno ou comportamento deve ser
contextualizado culturalmente e socialmente, os estudos de gênero supracitados indicam que as
meninas apresentam, em geral, uma tendência mais prossocial para lidar com os conflitos,
utilizando estratégias mais passivas e submissas e procurando o suporte social como forma de
ajuda. Além disso, preferem relações mais íntimas, interdependentes e diádicas, sendo esses
vínculos permeados por sentimentos intensos. Apresentam, também, maior necessidade de apego
58
em suas relações e, consequentemente, maior angústia psicológica, que perdura e se conserva
mesmo após o conflito. Embora tanto os meninos como as meninas endossem a agressão aparente,
com estratégias físicas e impulsivas, no gênero feminino a agressão é mais sutil e direcionada a
causar danos na qualidade da amizade, enquanto no gênero masculino, a agressão direta é mais
evidente, com maior presença de agressões físicas e verbais, além de mais estratégias de
enfrentamento. Os meninos, geralmente, são também mais cooperativos entre si e preferem
companheiros com quem podem dividir interesses e atividades em comum. Há, contudo, a
existência de um percurso em direção à conformidade social, anunciado pelo aumento na tendência
à submissão com a idade, o que aproxima, portanto, o padrão de comportamento dos meninos com
o das meninas.

3.4.2 - A dimensão cultural e social

Além da diferença entre gêneros, o ambiente econômico, social e cultural também parece
influenciar a avaliação e as escolhas das estratégias de resolução de conflitos interpessoais.
A cultura, bem como, o nível socioeconômico em que o sujeito se socializa, desempenham
um papel fundamental (embora não determinísticos), neste aprendizado da resolução de problemas
interpessoais, uma vez que os diferentes sistemas de valores expressam distintos ideais de vida e
constituem, assim, o universo simbólico que dá significado às interações sociais de um dado grupo
cultural ou social (LEME, 2004).
A autora vislumbra, em seu estudo enfocando o juízo, uma tendência a maior assertividade
e agressividade em meios mais afluentes e maior submissão nos menos privilegiados.
Especificamente, com relação à escola, a autora encontra que há uma maior presença de estilos de
estratégias submissas em instituições públicas, por exemplo, do que nas privadas.
Outra importante fonte de variabilidade é a cultura. Compartilhamos do conceito de cultura
proposto por Stenberg (2004, p. 325), que a compreende como “um conjunto de atitudes, valores,
crenças e comportamentos partilhados por um grupo de pessoas, comunicados por uma geração
para a próxima, via linguagem e alguns outros meios de comunicação”. Assim sendo, pessoas em
diferentes culturas têm diferentes interpretações de si, dos outros e das relações interpessoais. Essas
interpretações, segundo Markus e Kitayama (1991), podem influenciar a própria natureza da

59
experiência individual, incluindo processos psicológicos como a cognição, a emoção, a motivação,
entre outros.
Muitas culturas asiáticas, por exemplo, enfatizam a assistência aos outros e a
interdependência harmoniosa. Já, a cultura norte-americana, não valoriza uma conexão tão evidente
entre os indivíduos. Nela, os indivíduos procuram manter a sua independência (MARKUS e
KITAYAMA, 1991). A sociedade norte-americana, fortemente individualista, abraça a
independência e enfatiza a autoexpressão, a singularidade pessoal e a autossuficiência. Em
contraste, juntamente com outras culturas da Ásia Oriental, a sociedade chinesa, por exemplo, mais
coletivista, coloca uma ênfase menor na interdependência, ressaltando a solidariedade do grupo, a
hierarquia social e a humildade pessoal (WANG e LEICHTMAN, 2000). Buscando evidenciar as
diferentes formas de organizar e interpretar o mundo nessas duas culturas, Wang e Leichtman
(2000) realizaram um estudo comparativo entre as características de crianças chinesas e norte
americanas (6 anos de idade). Comparadas às americanas, as crianças chinesas apresentaram maior
orientação para o engajamento social, maior preocupação com o código e a correção moral, maior
preocupação com a autoridade, orientação menos autônoma, menos evidências de agressões
verbais e físicas e mais expressões de emoções.
Ainda com relação à comparação entre crianças norte americanas e asiáticas, Wanless et al.
(2013) encontraram, em um estudo com 814 crianças de 3 a 6 anos que, embora as meninas
apresentem maior controle individual de comportamento do que os meninos nos Estado Unidos,
tal diferença entre os gêneros não foi registrada em crianças asiáticas.
As diferentes culturas, assim, fornecem normas para as comunicações e comportamentos
nas relações e, portanto, também influenciam em situações de conflitos interpessoais.
French et al. (2005) também são categóricos em afirmar que o comportamento diante de
um conflito é, sem dúvida, incorporado dentro de um contexto cultural. Leme (2011b) exemplifica
que diferentes tendências e preferências de resolução de conflitos são fortemente influenciadas pelo
tipo de cultura predominante: coletivista (árabes, orientais e latinos, por exemplo) ou individualista
(Canadá, Estados Unidos, vários países europeus). As amostras coletivistas diferem das
individualistas no uso de estratégias de minimização do conflito. Embora não se constitua um grupo
homogêneo, pertencer a uma cultura coletivista, por exemplo, promove um sentimento forte de
identidade grupal, o que favorece estratégias de esquiva de conflito para a preservação da harmonia
do grupo.
60
A mesma variação de aspectos acontece na comparação entre dois outros países: a parte
central da Itália e o Canadá (SCHNEIDER et al., 2000). Primeiramente, os italianos, mais
coletivistas, são amplamente envolvidos com suas famílias estendidas. A cultura canadense, por
sua vez, assemelha-se a dos Estados Unidos: os amigos, nesse caso, são mais essenciais para a
companhia e apoio social, portanto, os indivíduos podem evitar conflitos que levem à perda de
amigos. No entanto, fortes laços com parentes não se opõem e podem até facilitar relacionamentos
de alta qualidade com outras pessoas. O contexto cultural pode também determinar as
oportunidades das crianças de tornarem-se conscientes das necessidades dos outros, o que é
fundamental para a resolução de conflitos. Os italianos têm o costume de envolver as crianças no
que tem sido muitas vezes chamado de discussões ou debates sobre os assuntos familiares. Esses
debates, por sua vez, podem ajudar as crianças a resolver situações que poderiam levar a um
conflito mais sério com seus amigos. A partir dessas considerações, os autores observaram crianças
italianas e canadenses de 8 e 9 anos de idade durante situações provocadas de competição e disputa
entre amigos e não amigos. O padrão geral dos resultados indica que os italianos foram mais hábeis
em evitar conflito, apresentando maior eficiência, por exemplo, em decidir como dividir um ovo
de chocolate. Já os canadenses mostraram-se mais competitivos e mais suscetíveis a romper com
as regras, o que pode refletir a forte competitividade presente nessa sociedade.
Na mesma direção, um estudo realizado por French et al. (2005) também revelam diferenças
nos conflitos entre crianças indonésias e norte-americanas (9 a 11 anos). Segundo os autores, para
os grupos culturais norte-americanos, os conflitos devem ser resolvidos de forma direta. Os
indonésios, por sua vez, preferem minimizar ou evitar os conflitos, a fim da manutenção da
harmonia. Os resultados encontrados no estudo foram consistentes com a existência de certo roteiro
cultural na Indonésia para se lidar com o conflito por meio da evitação. De forma geral, as crianças
indonésias realmente foram mais submissas e abandonaram o conflito mais frequentemente do que
as crianças norte-americanas, enquanto que essas últimas usaram mais a estratégia da negociação.
Especificamente, com relação aos adolescentes, Coleman (2011) retoma que em uma
cultura coletivista, é esperado que os comportamentos e aspirações dos jovens sejam mais
direcionados à reputação e ao sucesso da família e da comunidade como um todo, enquanto que
em uma cultura individualista, os jovens são mais encorajados a alcançar seus objetivos pessoais e
a tomar suas próprias decisões, acima dos desejos e necessidades familiares.

61
Os jovens brasileiros, por sua vez, foram alvo dos estudos de Van Horn e Marques (2000).
Os pesquisadores objetivaram investigar a extensão da influência dos valores culturais nas
percepções acerca dos relacionamentos íntimos. Em consonância com um estudo similar prévio
com adolescentes norte-americanos, foram participantes dessa pesquisa 260 jovens brasileiros com
as seguintes idades: 11 e 12, 15-16 e 19-20 anos. Os resultados indicaram que, de uma forma geral,
as relações próximas dos adolescentes brasileiros tanto com adultos, como com pares, são
caracterizadas por maior número de conflitos do que as dos adolescentes norte-americanos.
Ademais, os adolescentes brasileiros apresentam maior grau de envolvimento e sentimentos mais
intensos em seus relacionamentos, coerente com os valores de suas famílias coletivistas.
Bronfenbrenner (1996) ressalta, no entanto, que, diferentemente do que se costuma proferir
no senso comum, existe uma impossibilidade de se atribuir somente à socialização familiar as
diferenças culturais como as anteriormente identificadas. Para o autor, a socialização ocorre tanto
no micro nível da família, da escola e do contexto da vizinhança, como em um nível mais macro,
que inclui a cultura, a sociedade e o tempo histórico, bem como nas muitas camadas de influência
entre essas instâncias.
Em síntese, os estudos indicam que, de forma geral, as culturas consideradas
individualistas, enfatizam a manutenção da independência e da autossuficiência. Para tanto, são
mais competitivos e suscetíveis a romper com regras. Já em uma cultura mais coletivista, existe
maior preocupação com a harmonia do grupo, por isso são frequentes as estratégias de minimização
ou de evitação do conflito, em uma orientação menos autônoma. Diferenças entre os gêneros, no
que se refere, por exemplo, ao autocontrole do comportamento também sofrem influências da
cultura. O engajamento social em uma cultura coletivista é maior, assim como a assistência aos
outros. Ademais, as culturas coletivistas também têm o costume de expressar mais as emoções e
apresentar maior grau de envolvimento e de sentimentos íntimos nas relações interpessoais.

3.4.3 – A dimensão da idade

A idade, considerando um desenvolvimento típico, é outra variável importante quando se


analisa as características dos conflitos interpessoais.
Para Leme (2011b), o funcionamento psicológico mais avançado pode favorecer a
emergência de estratégias mais sofisticadas, como a consideração ao direito ao outro, não só ao
62
próprio. Esse processamento é favorecido, ainda, pela maturação, que inclui o aumento da
capacidade de memória (permite maior coordenação de informações) e pela amplitude de
experiências adquiridas (permite maior elenco de alternativas de estratégias que superem a luta ou
a fuga). Leme (2004) ressalta, ainda, como já descrito, a existência de um percurso em direção à
conformidade social, anunciado pelo aumento na tendência à submissão com a idade.
Licciardi (2010) - baseando-se nos estudos de Selman (1980; 1990) -, ao investigar as
causas, as estratégias e as resoluções de conflitos entre crianças de 3 a 6 anos, também constatou
distinções em razão da idade: as crianças mais velhas apresentaram um aumento significativo dos
conflitos motivados pelo controle social. Com relação às estratégias de negociação empregadas, o
grupo de crianças mais jovens utilizou-se significativamente mais de estratégias físicas e
impulsivas (ações carentes de reflexão, marcadas pela impulsividade e pela desconsideração ao
sentimento e desejos do outro), do que as crianças mais velhas que, por sua vez, se utilizaram de
mais estratégias impositivas (predominantemente verbais, visando ao controle do outro pelo uso
do poder e não pela negociação). Segundo a autora, esse percurso em direção a um tipo de estratégia
menos física e reativa parece indicar evolução na concepção dos conflitos em direção ao domínio
social. As crianças também começam a considerar, aos poucos, ainda que de forma rudimentar, os
aspectos subjetivos dos envolvidos nas situações de desavenças.
Na mesma direção dos resultados supracitados, Laursen e Pursell (2009), sintetizando
alguns achados acerca das mudanças desenvolvimentais nos conflitos entre pares (HAY e ROSS,
1982; SHANTZ, 1987; HARTUP e LAURSEN, 1993), apontam que as disputas entre as crianças
menores são quase que exclusivamente focalizadas nos objetos. As desavenças sobre o controle do
objeto declinam no meio da infância, enquanto que o comportamento de controle social aumenta.
Na adolescência, a maioria das disputas entre pares envolvem questões interpessoais. A agressão
física como estratégia diante dos conflitos declina já no início da infância e é superada
progressivamente pelas agressões verbais e relacionais.
Com relação especificamente à adolescência, faixa etária focalizada pela presente pesquisa,
La Russo e Selman (2011) retomam que o início da adolescência é comumente marcado por um
momento em que os indivíduos estão começando a pensar de forma mais abstrata, a considerar
múltiplas perspectivas sociais, a questionar cada vez mais as normas dos adultos e a fazer ou querer
tomar decisões mais autônomas. Em razão disso, os autores citam um estudo (DODGE et al., 2006)

63
que afirma que os primeiros anos da adolescência são tipicamente marcados por conflitos
interpessoais maiores e cada vez mais complexos.
Como visto anteriormente, Selman, baseando-se no estudo com crianças e jovens norte-
americanos, postula que os mais altos níveis de sofisticação nas estratégias de resolução de
conflitos são refletidos em tentativas de coordenar, simultaneamente, as perspectivas de partes em
conflito, por meio de atividades como negociação e compromisso, conforme sintetizado no quadro
IV a seguir (SELMAN e SCHULTZ, 1990, p. 73)21:

Quadro IV: algumas estratégias interpessoais prototípicas codificadas em níveis de


desenvolvimento 0 – 3 em cada orientação.
Orientação de transformação do Orientação de transformação do
outro eu
Nível 0 – indiferenciado/ Verbalmente afasta desejos Toma atitude impulsiva.
egocêntrico expressos do outro. Usa retraimento afetivo automático.
Pega impulsivamente. Responde com obediência autômata.
Repele o outro com força física.
Nível 1 – diferenciado/ subjetivo Ordena que os outros façam o que Faz iniciativas fracas e hesitantes.
se quer. Prontamente desiste em favor do
Faz ameaças de força. outro.
Emprega “justiça unilateral” (justo Atua como vítima.
é aquilo que o indivíduo deseja) Apela para fonte de poder
percebido.
Nível 2 – autorreflexivo/ Usa persuasão amigável. Afirma os próprios desejos, mas os
recíproco Busca de aliados para apoio das tornam secundários em relação aos
próprias ideias. do outro.
Busca de meios para impressionar Segue, mas oferece resposta para a
o outro (demonstração de talentos, liderança do outro.
conhecimentos etc.). Confronta com marcada
desigualdade.
Nível 3 – terceira pessoa/ mútuo Antecipa e integra possíveis reações do outro às sugestões do eu.
Equilibra o foco da negociação sobre a relação e sobre os descontração.
Negocia considerando a continuidade da relação.

Embora o quadro IV retrate um panorama evolutivo, a influência do contexto também


interfere muito nesse desenvolvimento e nos componentes dos relacionamentos e dos conflitos.
Para Laursen e Collins (1994), as características dos relacionamentos são poderosas
influenciadoras do comportamento diante do conflito, contrariamente às expectativas
convencionais que se referem a mudanças drásticas no comportamento conflitivo do adolescente
em razão da idade ou da maturação. Alguns temas específicos também tendem a evocar certos

21
Tradução nossa.
64
comportamentos e sentimentos durante os conflitos (LAURSEN e PURSELL, 2009). Quando os
adolescentes, por exemplo, descrevem desavenças relacionadas à violação das normas de amizade
estabelecidas, reportam sentir mais raiva e apresentam mínimas estratégias de negociação. Para os
autores, o conflito, então, passa a ser mais bem compreendido ao se considerar, também, todo o
contexto da relação.
Como já apontado, as perspectivas cognitivo-desenvolvimentistas preveem conflitos mais
frequentes nos adolescentes, bem como uma progressiva evolução na forma de resolução de
conflitos, coincidindo com uma reorganização das capacidades mentais (SELMAN, 1980;
SELMAN e SCHULTZ, 1990). Sem negar essa evolução progressiva, Laursen e Collins (1994),
no entanto, focalizam que diferenças consistentes emergem quando os tipos de relacionamentos
dos adolescentes e as configurações dos conflitos são considerados. A variação no comportamento
conflitivo do adolescente é especialmente esperada, portanto, em razão do tipo da relação, com
diferenças entre os pais, irmãos e seus pares no que se refere à incidência, ao resultado e às
discordâncias.
As evidências disponíveis indicam que os adolescentes se comportam de forma bastante
diferente em conflitos com colegas próximos, por exemplo, do que em todos os outros
relacionamentos. Comparados aos não amigos, Laursen e Pursell (2009) afirmam que os conflitos
entre amigos envolvem menos raiva, menos insistência, resultados mais justos e imparciais e mais
interações sociais pós-conflito.
Nesse contexto, Laursen et al. (2001) realizaram uma meta-análise a fim de descrever a
resolução de conflitos entre pares desde a infância até o início da idade adulta, estabelecendo
relações entre as diferentes idades em razões dos tipos de relacionamentos e procedimentos de
avaliação. Segundo os autores, a chave para enriquecer programas destinados a promover a gestão
de conflitos de forma mais construtiva é justamente a melhor compreensão dos fatores que
normatizam algumas tendências de desenvolvimento. Para o estudo, foram delimitadas 3
estratégias prevalentes de resolução: a negociação (descreve compromisso, refletindo concessões
de ambas as partes), a coerção (processo pelo qual uma das partes se submete ou se rende às
exigências do outro) e o afastamento (interrupção de um conflito sem chegar a uma solução).
De forma geral, os pares resolvem os conflitos mais frequentemente com a negociação do
que com a coerção ou com o afastamento. Também é mais frequente a resolução com a coerção do
que com o afastamento. A importância relativa da coerção diminui com a idade, assim como a
65
negociação e o afastamento aumentam. As crianças (2 a 10 anos) tendem a resolver disputas com
coerção e abster-se do afastamento. Os adolescentes (11 a 18 anos), por sua vez, favorecem a
negociação e praticam o afastamento e a coerção em partes iguais. Já os jovens adultos (19 a 25
anos) evidenciam elevados níveis de negociação e baixos níveis de coerção. Esses resultados
reforçam as sugestões de que a coerção dá lugar à negociação, descrevendo, ainda, avanços
incrementais na utilização do desprendimento durante períodos sucessivos de idade.
O tipo de relacionamento entre pares (conhecidos, amigos, parceiros amorosos ou irmãos)
também é uma variável importante quando se consideram as estratégias de resolução de conflito
de acordo com a idade. As crianças, por exemplo, resolvem conflitos com conhecidos (incluindo
companheiros de quarto e colegas não especificados como amigos) mais frequentemente com a
coerção do que com negociações ou afastamento; já com os amigos, as crianças resolvem os
conflitos mais frequentemente com negociação e coerção do que com o afastamento. No entanto,
poucos estudos de relacionamento entre irmãos são disponíveis para determinar alguns padrões de
resolução de conflitos na infância.
Os adolescentes, por sua vez, resolvem os conflitos com conhecidos mais frequentemente
com a negociação do que com a coerção ou com o afastamento. Com os amigos e parceiros
amorosos, a estratégia mais usada também é a negociação e depois a coerção ou o afastamento. Já
com os irmãos, os adolescentes resolvem os conflitos mais frequentemente com o afastamento do
que com a negociação. Os jovens adultos, por sua vez, resolvem os conflitos com conhecidos mais
frequentemente com a negociação do que com a coerção ou com o afastamento. Com os amigos,
parceiros amorosos e irmãos usam mais frequentemente a negociação do que a coerção ou o
afastamento.
Em síntese, tomados em conjunto, os dados demonstram um aumento progressivo na
negociação, acompanhado por um declínio na coerção em todos os relacionamentos.
Especificamente, conhecidos, amigos e parceiros românticos resolvem conflitos mais
frequentemente com negociação do que com a coerção ou o afastamento e mais frequentemente
com a coerção do que com o afastamento. Irmãos resolvem conflitos mais frequentemente com
coerção do que com o afastamento e a prevalência da negociação não difere da coerção ou do
afastamento. Assim, a negociação é prevalente em todos os relacionamentos com os pares, exceto
aqueles com os irmãos (no caso dos adolescentes). Há mais negociação entre os parceiros
românticos do que entre os amigos e mais negociação entre amigos do que entre os conhecidos.
66
Esses dados, por sua vez, vão ao encontro da perspectiva teórica do presente trabalho
(PIAGET, 1932-1994 e SELMAN, 1980), cuja proposição sugere que o relacionamento com os
pares altera o entendimento da criança do mundo social e, consequentemente, de si mesma, o que
indica que a resolução de conflitos é um produto da maturidade cognitiva e social. O argumento é
o de que o relacionamento entre os pares proporciona às crianças oportunidades para aprimorar
suas habilidades de resolução de conflitos que não estão disponíveis em outros tipos de
relacionamento em que existe uma hierarquia de poder. O desenvolvimento cognitivo, dessa forma,
impõe avanços na compreensão social, o que permite uma crescente descentração, ou seja, um
crescente autointeresse em compreender as motivações do parceiro e do relacionamento. Assim,
os ganhos sociais e cognitivos encorajam uma preferência por resoluções cada vez mais negociadas
que estimulam o domínio de competências mais construtivas.
Descobertas envolvendo os procedimentos de investigação de conflito confirmaram, ainda,
diferenças entre a resolução de conflitos hipotéticos e reais (os conflitos reais descrevem a
resolução de divergências reais e os hipotéticos descrevem resoluções propostas por vinhetas ou
acontecimentos imaginários) (LAURSEN et al., 2001). Os resultados com adolescentes indicam
que a coerção é favorecida em conflitos reais, e a negociação prevalece em desacordos hipotéticos,
diferentemente do que foi encontrado por Licciardi (2010) com as crianças de 3 a 6 anos: ao
comparar as estratégias empregadas pelas crianças nos conflitos vividos por elas e aquelas
apresentadas nas entrevistas, verificou-se que as mais evoluídas aparecem em maior quantidade na
ação, havendo, portanto, uma precocidade da ação em relação ao juízo nessa faixa etária.
Apesar do reconhecimento de que a coerção é mais forte nas relações entre os menores, é
indispensável reconhecer que a resolução de conflitos entre pares se contrasta com a resolução de
conflitos entre pais e filhos, em que a coerção predomina e a negociação é atípica entre as partes
pela própria dimensão de poder instituída na relação, como será aprofundado a seguir.

3.4.4 – A dimensão da família

A literatura é unânime ao apontar que a dinâmica da relação entre os adolescentes e suas


famílias fornece um importante contexto para a compreensão do seu desenvolvimento psicossocial.
Jutengren e Palmèrus (2006) fizeram uma pesquisa com 120 adolescentes suecos com idade
média de 14 anos, que indicaram por meio de um questionário, como percebiam seus pais diante
67
de potenciais situações que envolviam conflito entre pais e filhos. Os resultados indicam que os
adolescentes que percebem seus pais como sendo geralmente autoritativos (relação baseada em
afeto e respeito mútuo) são mais competentes na dimensão psicossocial do que os que percebem
seus pais como sendo autoritários (aplicação das regras e vontades por meio do poder) ou
indulgentes (evitação do confronto), posto que se envolvem com maior frequência em padrões de
comunicação em que são desafiados a afirmar e defender sua posição e opinião. Tal comunicação
pode aumentar sua habilidade social e cognitiva, o que, por sua vez, aumenta também, sua
capacidade de resolver conflitos de forma mais evoluída. Coerentemente, Laursen e Collins (1994)
também retomam estudos (COOPER e AYERS-LOPEZ, 1985; COOPER, 1988), que demonstram
que adolescentes de famílias que se envolvem de forma aberta e construtiva em desacordos são
mais capazes de resolver conflitos de forma produtiva com pares do que aqueles cujos pais
resolvem as desavenças unilateralmente.
Reppold et al. (2005), em uma revisão teórica sobre o assunto, também apontam que a
dinâmica familiar, ao contrário de exercer um papel protetivo, muitas vezes intensifica a
vulnerabilidade emocional dos filhos e estabelece um modelo de interação inadequado que tende a
ser reproduzido no futuro. Os autores trazem indicações de estudos (OLIVEIRA e ASSIS, 1999;
STEINBERG, 2000; KODATO e SILVA, 2000) que afirmam que a manifestação infanto-juvenil
de comportamentos antissociais geralmente ocorre em famílias que apresentam pouca interação
familiar e um alto índice de negligência (pais pouco responsivos e pouco exigentes). A baixa
competência social e o alto índice de agressividade dos filhos são coerentes com o modelo que
caracteriza o estilo parental de negligência: pais pouco afetivos, centrados em si, alheios às
dificuldades e sentimentos dos filhos e que se esquivam da tarefa de socialização parental. Ao
contrário, os filhos que percebem seus pais como tendo um estilo autoritativo, ou seja, pais com
alto índice de responsividade e exigência (monitoram o comportamento, reconhecem as
individualidades e estabelecem vínculo de amor e confiança), tendem a apresentar os menores
índices de comportamentos agressivos e outras condutas antissociais, além de apresentarem melhor
desenvoltura social.
Outros estudos específicos com adolescentes reforçam que aqueles criados sob disciplina
autoritativa demonstram consistentemente mais comportamentos seguros e menos
comportamentos de risco, incluindo o desenvolvimento acadêmico e o ajuste psicossocial,
comparados àqueles vindos de famílias com outros estilos parentais (NEWMAN et al., 2008).
68
Coleman (2011), por sua vez, apresenta o estudo de Durbin et al. (1993), o qual demonstra que o
estilo parental tem influência na escolha do tipo da amizade. Adolescentes de pais autoritativos,
por exemplo, são os que mais escolhem amigos engajados nas atividades da escola e da comunidade
e os de pais negligentes costumam escolher amigos que são indiferentes aos valores relacionados
ao bem comum.
Inserindo-se nesse contexto teórico, Custódio e Cruz (2008) apresentam um estudo em
Portugal sobre a relação entre as representações das crianças acerca das figuras parentais e a sua
competência social. A amostra foi constituída por 59 crianças tendo, em média, 8 anos e 10
professoras dos estudantes participantes, como avaliadoras da sua competência social. As
representações das crianças foram estudadas com base em entrevistas semiestruturadas que
pretenderam estimular, a partir de inícios de histórias, a elaboração das narrativas pelas crianças.
Os conteúdos das histórias versavam sobre episódios de conflito muito próximos das interações
cotidianas habituais entre pais e filhos. Os resultados indicaram que as crianças que percebem os
pais como “rejeitantes” (insensibilidade ao estado físico ou aos desejos da criança) são avaliadas
pelas professoras como menos detentoras de comportamentos de autocontrole e de assertividade;
com mais problemas, tais como ansiedade, tristeza, solidão e baixa autoestima e menos
competência em termos acadêmicos. Entre os comportamentos disciplinares, a punição física é a
mais associada a resultados negativos nas crianças: são menos competentes em termos de
habilidades sociais (autocontrole, cooperação e assertividade) e maiores dificuldades emocionais.
A representação dos comportamentos disciplinares com enfoque verbal, instrutivo e explicativo
(comportamentos parentais que incluem o uso de explicações que visam enunciar um princípio de
ação ou um comportamento alternativo a utilizar em situações futuras), pelo contrário, aparecem
associados positivamente ao desenvolvimento da criança. Em particular, a utilização de
explicações pelos pais para ilustrar um argumento aparece associada ao comportamento assertivo
(prossocial) e parece funcionar como um modelo de assertividade para as crianças.
A Universidade de Manitoba e o Hospital Infantil de Eastern Ontario22, ao analisar 36 mil
pessoas durante 20 anos, também concluíram que nenhuma punição física tem efeito positivo e que
a maior parte tem efeitos negativos, havendo, inclusive, uma ligação direta entre as formas de
punição e problemas na vida adulta, como depressão, ansiedade e vícios. Ferguson et al. (2009),

22
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/36164-palmada-inutil.shtml. Data de acesso: 05/12/2013
69
entretanto, em um estudo que incluiu 603 crianças norte-americanas de 10 a 16 anos, assinalaram
alguns fatores de risco consistentes para a violência juvenil e agressão: humor depressivo do jovem,
influência de colegas delinquentes e abuso psicológico dos pais. Os dados indicam que o abuso
psicológico por parte dos pais é geralmente mais danoso do que, por exemplo, a punição física.
Ainda enfocando a dinâmica familiar, Wolke e Samara (2004) realizaram um estudo sobre
a influência dos conflitos familiares no comportamento agressivo dos filhos. Os autores
descobriram que a agressão entre irmãos, em parte, também influencia a intensidade dos conflitos
ocorridos na escola, o que evidencia a necessidade de mais programas que envolvam todos os
membros da família com a escola. Esses programas de intervenção devem trabalhar em
consonância com os pais, para que aprendam maneiras apropriadas para mediar os conflitos entre
seus filhos para que possam resolver seus próprios conflitos de forma assertiva e não violenta.
Reichert e Wagner (2007), ao analisarem a relação existente entre os estilos disciplinares
adotados especificamente pela mãe e as diferentes dimensões da autonomia desenvolvida pelos
filhos, sugerem que, ainda que a mãe não permaneça, atualmente, um número de horas maior do
que o pai junto aos filhos, ela continua sendo a pessoa que se encarrega, mais do que o pai, da
dimensão da educação. Participaram da pesquisa 168 jovens, entre 14 e 15 anos, estudantes de uma
escola particular da grande Porto Alegre. Os resultados encontrados por meio de um questionário
de autonomia e de uma escala de estilos parentais apresentaram que, na medida em que a mãe se
mostra controladora, sem disponibilizar afeto, os jovens demonstram mais dificuldade em
encontrar formas para realizar suas metas. Portanto, nesse caso, o estilo materno autoritário tende
a inibir o desenvolvimento da autonomia funcional, que inclui a utilização de estratégias pelo
exame do autorrespeito e do autocontrole e a capacidade de tomar decisões e tratar os próprios
assuntos sem a ajuda dos pais.
Focalizando agora a função paterna, os resultados do estudo de Updegraff et al. (2001)
também indicam que, assim como acontece com crianças pequenas, pais de adolescentes também
têm um papel importante nos relacionamentos interpessoais de seus filhos e filhas. Por meio de
visitas domiciliares e entrevistas sistemáticas por telefone com 187 famílias, a pesquisa revelou
que, embora o pai seja menos envolvido nos relacionamentos dos filhos do que as mães, o nível de
envolvimento de ambos é positivamente relacionado às qualidades das experiências de amizades
entre os adolescentes. Em um estudo posterior, Updegraff et al. (2002) analisaram quais
características familiares podem marcar o desenvolvimento de amizades positivas no começo da
70
adolescência, um período em que, como já considerado, o estabelecimento de relações próximas
com outro jovem é crucial para um desenvolvimento psicossocial saudável. Os resultados
mostraram-se significantes, particularmente, no que se refere à relação entre o pai e o filho homem:
uma comunicação aberta e o sentimento de aceitação pela figura paterna foram associados a uma
maior intimidade na relação dos meninos com seus melhores amigos, o que remete à consideração
sobre a relevância da figura paterna no processo de socialização, especialmente dos meninos.
Mounts (2011) também investiga como pais e mães, igualmente, podem facilitar o
desenvolvimento de habilidades sociais durante o início da adolescência. Por meio de um estudo
longitudinal com 75 alunos do 7° ano, a investigação examinou a relação entre a gestão dos pais
nos relacionamentos dos filhos com seus pares e as habilidades sociais dos filhos. Os resultados
demonstraram que a orientação dos pais na vida dos filhos está associada a maiores índices de
habilidades sociais, como a assertividade. Entretanto, quando os pais se envolvem em quantidades
excessivas nessa administração, podem minar habilidades importantes que são necessárias para o
sucesso na interação social (baixos níveis de assertividade e de responsabilidade), pois
desconsideram a necessidade de autonomia dos adolescentes na interação com seus pares.
Ainda sobre o papel protetor das famílias, Katz et al. (2008) apresentam, em um estudo
longitudinal com 130 crianças (8 a 10 anos) e suas respectivas mães, que a capacidade emocional
dos pais (CE), incluindo suas habilidades em gerenciar seus filhos durante momentos
emocionalmente perturbadores, pode servir como fator de proteção contra alguns efeitos negativos
da violência entre pares. Por exemplo, os resultados mostraram que os pais que conseguem ver a
emoção negativa de seu filho como uma oportunidade de intimidade ou de ensino, ou seja, que
respeitam e nomeiam as emoções de seus filhos e resolvem os problemas com as crianças,
acalmando-as e discutindo metas e estratégias para lidar com a situação (maior CE), apresentaram
filhos com melhor desempenho acadêmico, maior imunidade contra doenças, maior capacidade de
regular suas emoções e, o que para esse estudo tem uma grande relevância, as crianças
apresentaram menor interação desconexa com seus pares, menos comunicação e emoção negativas
e brincadeiras de maior qualidade com os pares.
Além disso, os autores indicam que o nível de CE nos pais apresenta influência,
especificamente, na forma como as crianças reagem em momentos de provocação por pares. Níveis
mais elevados de CE aumentam a probabilidade de que as crianças usem como resposta o humor,
que é uma estratégia muito mais eficiente para desviar uma situação de provocação. Concluindo, o
71
estudo indica que crianças que usam o riso como estratégia podem ser mais capazes de regular suas
emoções no contexto de uma rede provocativa.
Leme et al. (2012) ressalta, entretanto, que a relação entre práticas educativas e a conduta
dos filhos é bastante complexa, sofrendo a influência de muitas outras variáveis que devem ser
consideradas, como: cultura, contexto socioeconômico em que ocorre a educação, o domínio a que
se refere (moral, pessoal, convencional ou de segurança), aspirações da família para os filhos e
características destes, como por exemplo, desenvolvimento psicológico, idade, temperamento e
sexo.
Em síntese, os estudos sobre família indicam que os filhos de pais autoritativos, ou seja,
que monitoram o comportamento, reconhecem as individualidades e estabelecem vínculos de amor,
confiança e respeito mútuo, apresentam uma maior competência na dimensão psicossocial geral.
Isso inclui, principalmente, uma capacidade de resolver conflitos de forma mais evoluída, maior
desenvoltura social, maior assertividade, maior autocontrole, maior segurança e maior índice de
autonomia. De forma especial, os conflitos familiares violentos e o uso da punição física ou do
abuso psicológico como forma de coerção estão fortemente associados à presença de
comportamentos agressivos nos filhos, menor habilidade social, entre outras ocorrências de risco à
saúde psicológica.

3.4.5 – A dimensão da personalidade

Assim como fatores situacionais podem influenciar nas estratégias de resolução de conflito,
aspectos da personalidade também aparecem como algo a ser avaliado, embora ainda seja uma
variável pouco explorada pela literatura.
Sem pretensões de maiores aprofundamentos sobre esse complexo tema, o termo
personalidade é, nesse estudo, compreendido como intimamente relacionado com o temperamento,
referindo-se ao padrão distinto e único de pensar, sentir e se comportar, que determina como se
responde a diferentes situações e contextos (CASPI, 1998).
A relação entre o tipo de personalidade aos 6 anos de idade e o uso da violência interpessoal
aos 12 anos (comportamento agressivo dirigido ao outro, resultando em lesões que necessitem de
cuidados médicos ou bandagens) foi investigada por Atkins (2006). Os 731 participantes foram
classificados em um dos três tipos de personalidade aos 6 anos: pouco controlado, resiliente e muito
72
controlado. Indivíduos com personalidade resiliente são sociáveis e capazes de regular as suas
emoções de forma eficaz. Em contraste, os indivíduos caracterizados como pouco controlados
tendem a ser impulsivos e têm dificuldade em manter interações sociais bem-sucedidas devido à
externalização excessiva do comportamento, como a hiperatividade. Já, os muito controlados, são
propensos a desordens, tais como ansiedade e tendem a ser tímidos e retraídos, o que contribui para
os problemas nas interações sociais. Os resultados indicaram que as crianças caracterizadas como
pouco controladas, aos 6 anos de idade, eram mais propensas a apresentar um comportamento
violento grave aos 12 anos de idade, mais do que seus pares resilientes e mais controlados.
Outro estudo norte-americano com crianças de quinto e sexto anos demonstrou que a
capacidade de ser amigável está positivamente relacionada ao uso de estratégias mais construtivas
e a uma menor utilização de estratégias negativas nas resoluções de conflitos. No entanto, as
crianças com características de personalidade não amigáveis, repetem com mais frequência as
estratégias coercitivas e destrutivas, utilizando, inclusive, mais afirmações de poder e agressões
verbais e apresentando mais dificuldades na autorregulação de sentimentos de raiva e frustração,
por exemplo (JANSEN-CAMPBELL, 2003).
Gleason et al. (2009) também investigaram a associação entre crianças com características
empáticas e o ajustamento nas relações entre os pares, especificamente com relação à aceitação,
número de amigos, qualidade das interações e vitimização. Participaram da pesquisa 116 alunos
norte-americanos de 10 a 14 anos. Não se encontrou relação entre a expressão da empatia e o
número de amigos ou a aceitação pelo grupo de pares. Os resultados revelaram, entretanto, que,
independentemente do gênero, os alunos que estão mais aptos a inferir com precisão os
pensamentos e sentimentos dos outros, têm maior probabilidade de desenvolver melhores relações
interpessoais.
Em um estudo similar, Oberle et al. (2010) vislumbraram diferenças entre a aceitação pelos
pares por meninos e por meninas no início da adolescência, considerando algumas características
pessoais. Em uma investigação com 99 alunos canadenses de 9 a 11 anos, os autores encontraram
que as meninas aceitam mais positivamente as colegas com alto nível de empatia (responder às
necessidades emocionais dos outros de forma congruente e afetiva) e de otimismo (atitude otimista
em relação à vida e ao futuro). Já para os meninos no início da adolescência, é considerado
indesejável expressar emocionalmente empatia ou apresentar altos índices de ansiedade.

73
Em síntese, as pesquisas demonstradas indicam algumas características de personalidade
que podem influenciar desde o uso da violência, empregada como estratégia de resolução de
conflito, como a aceitação pelos pares, o número de amigos e a qualidade das interações. Embora
distante de qualquer encerramento sobre o tema, ao final deste capítulo, é possível considerar que
as investigações sobre os conflitos interpessoais e sobre todas as suas dimensões e variáveis são
fundamentais para o planejamento de intervenções que promovam uma evolução pessoal e,
consequentemente, interpessoal. Vicentin (2009) posiciona, ainda, que se na infância o trabalho
com conflitos interpessoais é importante, na adolescência é imprescindível, pois, lamentavelmente,
constata-se que os maiores envolvidos em situações de violência são os jovens ainda em idade
escolar. Os dados aqui já descritos, que apresentam a violência na faixa etária da adolescência,
comprovam a falta de recursos dos estudantes para lidar com conflitos interpessoais orientados pela
justiça por equidade e de forma cooperativa. A variabilidade de fatores que influenciam as
complexas dimensões das resoluções dos conflitos não significa, entretanto, para Leme (2011b),
que não seja possível intervir no sentido de socializar os jovens para uma resolução de seus
conflitos mais satisfatória, construindo, consequentemente, uma sociedade mais justa e pacífica.
Considerando, por fim, que as provocações entre os pares são ocorrências extremamente
frequentes na escola, principalmente no início da adolescência, faixa etária correspondente a dos
participantes da presente pesquisa (AHO, 1998; KELTNER et al, 2001; ROSS, 2003) e que há uma
lacuna de investigações nacionais que se interessam especificamente sobre a provocação, vale,
neste momento, uma compreensão mais aprofundada das características desse fenômeno
específico, assim como das suas consequências para as relações e para a vida das pessoas
envolvidas.

74
4. INVESTIGANDO A PROVOCAÇÃO ENTRE PARES

“Decepcionar pode ser um prazer”.


(Gilles Deuleuse)

A provocação entre as pessoas é frequente nas relações interpessoais de forma geral. Poucos
indivíduos não provocaram ou, vez ou outra, foram provocados por um amigo, um familiar, ou
mesmo pelo parceiro romântico. Especificamente, a provocação na infância e na adolescência é
uma forma de interação social universal. Ross (2003) destaca alguns estudos (KUTNER, 1981;
TOWNE, 1982; GAFNEY, 1986) que demonstram que o mesmo padrão de provocação observado
em crianças da cidade de Filadélfia (EUA), por exemplo, foi também encontrado em crianças
aborígenes de Kaluli (Nova Zelândia), assim como em crianças da Irlanda e do Brasil.
A provocação, contudo, pode ser conceituada, segundo Keltner et al. (2001), como uma
comunicação entre um provocador e um alvo, que combina intencionalidade de hostilizar, com
humor ou brincadeira. Inclui uma ampla diversidade de comportamentos tais como: insultos,
imitações, questionamentos repetidos, fingimento de espanto, zombarias, perturbações, exageradas
repreensões por uma ofensa, entre outros. Também pode ter um caráter de sedução e flerte,
principalmente quando existe um interesse sexual implícito (ROSS, 2003).
Ademais, segundo Keltner et al. (2001) e Ross (2003), o comentário visando atingir um
alvo é, geralmente, referente a algo de relevância para o atingido, como por exemplo, um atributo
indesejável ou um comportamento específico. O ato, portanto, deve ser destinado a um alvo para
ser considerado como provocação. Existem diversas histórias engraçadas ou piadas que não são
direcionadas a um alvo e existem, também, diversas configurações de brincadeiras direcionadas a
uma pessoa, mas que não se referem a algo relevante para ela e, assim, também não podem ser
consideradas como provocações. Diferentemente da provocação, a brincadeira reflete um
relacionamento mais equilibrado em termos de poder e pode se relacionar a outras pessoas além
do alvo e a questões mais impessoais.
Outra característica da provocação inclui um componente “off-record”, ou seja, não são
comentários literais, mas sim, com um tom de brincadeira ou de insinuação. A provocação sugere,
assim, interpretações não literais da ação. Vale ressaltar que a provocação pode, ainda, ter

75
resultados prossociais ou antissociais. Provocações com mínimos níveis de marcas de “off-record”
são percebidas como mais agressivas (antissociais) e provocações acompanhadas de numerosas
marcas de “off-record” são percebidas como mais engraçadas (prossociais). Comentários mais
significativos (de algo relevante, que provoca alguma reação) para o alvo são também percebidos
como mais ofensivos (KELTNER et al., 2001, ROSS, 2003).
Os autores também assinalam que as provocações podem, ainda, ser físicas (cutucar,
imitações físicas, etc.) ou verbais (apelidos, comentários depreciativos, etc.). Em muitos casos, a
ação inicial tem uma intenção agressiva, porém algumas provocações envolvem, primeiramente,
uma abertura positiva, que se torna negativa quando repudiada pelo alvo.
Além de trazerem essa definição precisa, Keltner et al. (2001) realizaram uma revisão dos
estudos acerca da provocação e relataram algumas conclusões: observações de interações
espontâneas sugerem que a provocação ocorre geralmente por meio de dois tipos de interrupções
nas interações sociais: violações de norma e conflitos interpessoais.
Um indivíduo, geralmente, provoca outro que tenha desobedecido alguma norma social,
como, por exemplo, em resposta à violação das normas de comunicação: declarações vazias,
redundâncias, enunciados prolixos ou excessivamente formais, entre outros. Outro exemplo refere-
se à seguinte situação: nas idades em que brincar com pares do mesmo gênero é a norma,
especialmente os meninos são frequentemente provocados se interagem repetidamente com alguém
do gênero oposto. Com as meninas adolescentes, são comuns provocações referentes a violações
das regras relativas ao contato físico ou vestimentas, por exemplo. Katz, Selman e Mason (2008),
ao analisar as respostas de alunos de terceiro e quarto anos do Ensino Fundamental I, destacam que
muitos estudantes culpam o alvo pela provocação recebida, ou seja, o comportamento (mais
irritante ou socialmente desajeitado) ou a aparência não normativa do outro acabam justificando a
ação provocativa. Ross (2003) acrescenta que, especialmente os adolescentes, reagem de forma
mais cruel aos pares com atributos negativos aparentemente controláveis, como a obesidade, do
que com aqueles com condições incontroláveis, como por exemplo, a paralisia cerebral ou alguma
outra deficiência explícita. O autor ainda acrescenta que a timidez acentuada pode gerar, nos pares,
um sentimento de indiferença em relação ao sentimento do outro, o que cria uma certa relação
lógica para a rejeição ou para a provocação.
Quanto ao segundo tipo citado de interrupção nas interações sociais, Keltner et al. (2001)
assinalam que a provocação também tem sido compreendida como uma forma indireta e lúdica de
76
negociação de conflito, ou seja, geralmente acontece em resposta a um conflito interpessoal ou, até
mesmo, como resposta a um conflito potencial, permitindo que os indivíduos negociem supostos
problemas, antes de acontecerem efetivamente. Particularmente, os autores assinalam a presença
frequente de provocação no contexto de flerte e a relativa ausência em certas situações específicas,
como em emergências – traumas físicos, acidentes, funerais, etc.
Embora não haja uma documentação sistemática acerca do desenvolvimento da
provocação, os autores apresentam uma síntese que indica que o início da adolescência (entre 11 e
13 anos) é marcado por uma maior capacidade de generalização e compreensão de formas mais
lúdicas da provocação, justamente porque a compreensão das marcas off-records depende de certas
habilidades específicas, como a de dominar uma comunicação não literal e a de reconhecer
múltiplas ou contraditórias intenções e emoções em uma mesma expressão. Portanto, os
adolescentes começam a provocar, usando conteúdos mais lúdicos ou insinuativos a partir dessa
idade, assim como tendem a interpretar a provocação como menos prejudicial ou aversiva. O
contexto da provocação também interfere no seu grau de hostilidade. Embora não haja estudos
conclusivos que envolvam um maior controle de variáveis, os autores inferem uma relação direta
entre o poder social do provocador e a hostilidade da provocação. A familiaridade entre provocador
e alvo também parece estar correlacionada a um aumento da hostilidade na provocação. Quanto às
diferenças entre os gêneros, sugere-se, com base em avaliações empíricas, que os homens
provocam mais do que as mulheres e que as suas provocações possuem, também, uma postura mais
hostil.
No entanto, é justamente o caráter do humor ou da brincadeira que distingue
conceitualmente - e, também na vivência -, a provocação da ridicularização, ou do bullying, por
exemplo. Baseando-se nesse pressuposto da ambiguidade, Ross (2003) reitera a necessária
diferenciação entre a provocação pura e a provocação como ação secundária a outros componentes
do bullying. Diferentemente do que acontece nesse, a provocação pura pode ter um caráter de
diversão e de brincadeira, podendo ser, inclusive construtiva em algumas situações, como por
exemplo: ao enviar mensagens úteis ao alvo ou como um sinal de aceitação social. Shapiro et al.
(1991); Young et al. (1998); Hoover e Olson (2000); Keltner et al. (2001); Ross (2003) e Tragesser
e Lippman (2005) ressaltam que, a provocação comunica, simultaneamente, uma agressão e uma
mensagem prossocial, contendo, portanto, um comunicado humorístico que é ambíguo em seu
efeito negativo ou positivo. Nem o humor puro, nem a agressão pura, podem ser identificados como
77
provocação, mas quando esses componentes são combinados de certa maneira e direcionados a um
alvo, o resultado é a provocação, como fica evidente nos exemplos a seguir: “você se penteou no
escuro hoje?”; “foi sua mãe quem escolheu sua roupa?”. Para Young et al. (1998), a provocação é
paradoxal: critica e elogia, ataca e aproxima, humilha e expressa afeto, ou seja, sua interpretação é
altamente variável.
Ross (2003) aponta que geralmente não é muito acerca do que é falado, ou como é falado,
mas quem fala que determina se um tipo específico de provocação é mais ou menos ofensivo.
Existem também algumas sugestões do contexto, como a entonação e o ritmo monótono da voz,
expressões faciais de exagerado pesar ou alerta, ou piscadelas e sorrisos em situações
aparentemente inapropriadas. Certas características do conteúdo da provocação também podem
influenciar sua receptividade: se a provocação contém comentários negativos que o alvo sabe que
são evidentemente falsos, ela torna-se menos ofensiva. Um exemplo claro do caráter ambíguo da
provocação é oferecido por Hoover e Olson (2000, p. 2)23:
muito frequentemente, um estudante pode dizer para um amigo: seu cabelo está horrível
essa manhã. O que assegura o caráter da provocação é que o comentário é seguido por um
sorriso, ou os dois parceiros acordaram, de certa forma, em seu relacionamento, que esse
tipo de declaração é aceitável. Ademais, uma suposição não declarada seja que o cabelo
do provocado é atraente ou o estado de atratividade não é importante para o provocado.

De qualquer forma, a provocação é preocupante por estar relacionada a possíveis reações


emocionais negativas e consequências indesejáveis para o bem estar psicossocial. Gleason et al.
(2000), em um estudo com 164 universitários norte-americanos (média de 20 anos) sobre os
impactos em longo prazo da provocação, encontraram que se for frequente na infância prediz,
significativamente, para a vítima, baixa autoestima e insatisfação com a imagem corporal tanto em
homens como em mulheres. A frequência, por exemplo, de ser provocado acerca do peso e da
altura durante a infância, está positivamente correlacionada com a insatisfação corporal na idade
adulta. Entretanto, os homens parecem ser menos sensíveis à provocação global. Especificamente,
a autoestima das mulheres é significativamente afetada por provocações acerca da aparência e da
competência, enquanto que para os homens, ataques à competência (habilidades gerais) são mais
relevantes para sua autoestima.
Como citado, a provocação acerca da aparência física (tipo de provocação mais comum) na
infância parece ter uma forte influência principalmente na forma como as mulheres adultas e

23
Tradução nossa.
78
adolescentes percebem seus corpos. Em um estudo com 431 crianças de 7 a 10 anos, Konstanski e
Gullone (2007) indicaram que especialmente as que estão acima ou abaixo do peso padrão para a
idade vivenciam frequentemente a provocação. Essa experiência produz um impacto negativo na
imagem corporal, especialmente para as meninas e meninos que estão acima do peso. Em especial,
os meninos abaixo do peso também sofrem negativamente com essa experiência, justamente pela
exigência social e cultural para serem fortes e musculosos.
Shapiro (1991); Landau et al. (2001) e Katz et al. (2008) também ressaltam que as situações
de provocação de pares têm sido identificadas pelos professores como sendo as que possuem maior
probabilidade de causar dificuldades sociais para as crianças em geral, justamente porque eliciam
uma gama de reações emocionais. Além disso, as provocações por pares são ocorrências
extremamente frequentes na escola (AHO, 1998; KATZ, SELMAN E MASON, 2008), e a forma
como as crianças respondem a essas provocações, principalmente na presença dos pares, pode ter
consequências importantes para a sua posição social no grupo. Isso significa que a resposta de uma
criança a provocações condiciona o quão simpático e popular ela pode parecer aos olhos de seus
pares.
Scambler et al. (1998) e Leary e Katz (2005) acrescentam que a reação emocional ideal do
alvo para lidar com uma provocação na meia infância é parecer imperturbável ou não afetado pelos
comentários provocativos. Os autores apresentam em seus estudos que comportamentos hostis
/desafiadores são respostas não adaptativas (respostas indesejáveis), enquanto que o riso e a
indiferença (ignorar) foram considerados como respostas adaptativas (respostas desejáveis) frente
a provocação dos pares.
Landau et al. (2001) e Leary e Katz (2005) ainda apontam que as crianças não gostam de
admitir que se sentem chateadas ou angustiadas quando provocadas por um colega, pois esse tipo
de reação é visto como indesejável pelos pares. Underwood et al. (1999) acrescentam que, de modo
geral, as crianças mais velhas são ainda menos expressivas de emoções negativas quando
provocadas (incluindo expressões faciais, respostas verbais e gestuais). Em seu estudo com 382
crianças de 8 a 12 anos, as crianças mais velhas responderam à provocação com mais expressões
faciais neutras e menos surpresa. Elas também raramente usaram quaisquer gestos, positivos ou
negativos e ficaram mais em silêncio quando provocadas. As meninas, por sua vez, foram menos
propensas a responder à provocação com comentários negativos e a demonstrar sentimentos de
raiva do que os meninos.
79
Tal como acontece com as crianças que expressam insatisfação, Leary e Katz (2005)
apontam que as que se comportam de modo estranho quando provocadas (dizem coisas sem sentido
ou demonstram comportamentos socialmente inapropriados para a idade), acabam por evidenciar
abertamente que a provocação parece ter um efeito desorganizador sobre elas, o que gera ainda
mais situações de provocação. Os autores perguntaram a crianças (de 8 a 10 anos) o que as fazia
provocar, e 18%, aproximadamente, relataram que provocavam porque o comportamento do alvo
era impróprio ou estranho para a idade. Katz et al. (2008, p. 5) exemplificam da seguinte forma um
comportamento estranho ou sem sentido: “uma criança disse, de repente: você gosta de bonecas
Barbie? Eu gosto de Barbie. Não. Eu odeio bonecas Barbie, elas são tão estúpidas.” Os autores
ainda explicam que o comportamento estranho interfere negativamente nas relações entre colegas,
pois crianças que o apresentam são geralmente vistas como chatas ou estranhas pelos
companheiros. Ross (2003) reafirma tal pressuposto ao apresentar que, do ponto de vista do
provocador, a provocação é mais bem sucedida quando a reação do alvo demonstra, de alguma
forma, imediata e visível perturbação.
Leary e Katz (2005) acrescentam que as crianças consideradas mais agressivas são,
também, as mais propensas a responder à provocação com insatisfação ou com comportamento
estranho, o que sugere que as crianças agressivas são menos hábeis em negociação de situações
interpessoais difíceis, como a provocação, do que seus pares não agressivos. Essa falta de
habilidade pode ser melhor compreendida a partir dos estudos de Dodge e Crick (1994, apud
Coleman, 2011), os quais encontraram que os sujeitos não populares agressivos são mais propícios
a considerar que a intenção do comportamento do outro é deliberadamente agressiva, mesmo
quando essa efetivamente não possui esse propósito. Essa característica é conhecida como “viés
de atribuição hostil24” e ocupa um papel central no comportamento da pessoa agressiva que é
rejeitada ou provocada por seus pares.
O humor, especificamente, tem sido teoricamente reconhecido como uma forma de
adaptação à tensão decorrente de uma situação de incômodo e, no contexto da provocação, o humor
tem o benefício adicional de demonstrar que o provocado se mantém imperturbável pelo
provocador, o que pode conduzir a uma redução na provocação e a um aumento da aceitação dos
pares (KATZ et al., 2008). Contrariando os estudos acima mencionados, Martin, et al. (2003) e

24
Tradução nossa.
80
Conoley et al. (2007), por meio de pesquisas com simulações, ressaltam que o conselho costumeiro
de ignorar a provocação não é muito útil, assim como o humor de caráter mais agressivo (uso de
sarcasmo, ridicularização ou chacota). O uso de um humor não hostil e tolerante (affiliative humor)
parece uma promessa mais eficaz para responder à provocação, segundo esses autores. Esse tipo
de humor refere-se, especificamente, à tendência de contar piadas ou participar de brincadeiras
espirituosas espontâneas, a fim de diminuir a tensão interpessoal e facilitar o relacionamento.
Em um estudo com 120 estudantes de graduação, Conoley et al. (2007) concluíram que o
uso de um affiliative humor por parte do provocado pode, inclusive, diminuir a probabilidade de
uma ação futura agressiva do provocador. O provocador torna-se mais amigável e menos agressivo
com o alvo após a provocação, o que lhe aumenta a chance de que a próxima interação seja mais
agradável para o alvo.
Tragesser e Lippman (2005) acrescentam que há poucos estudos acerca do lado negativo
do humor. Geralmente, os estudos existentes dão suporte à crença popular dos benefícios
indiscriminados do humor na vida das pessoas. Contudo, existem diferentes tipos de humor, o que
leva a crer que tanto ele pode servir a propósitos prossociais, como também pode ter um caráter de
competição por status, de busca por superioridade ou outros motivos mais agressivos.
Com relação à diferença de reações, mas agora entre os gêneros, Katz et al. (2008)
acrescentam que, em seus estudos sobre a infância, os meninos foram mais propensos a apresentar
um comportamento hostil/desafiador, e as meninas mais propensas a ignorar os comentários
provocativos. Especificamente com relação ao humor, os meninos demonstraram maior tendência
em responder a provocações com riso do que as meninas.
Jones e Newman (2005), por sua vez, trouxeram contribuições acerca das provocações
durante o início da adolescência (11 e 13 anos de idade). Em sua pesquisa com 342 estudantes, os
autores fornecem evidências sobre a relevância do gênero, do tipo de relacionamento (amigos ou
colegas) e do tema (competência acadêmica ou aparência física) para a interpretação do episódio
de provocação e, consequentemente, para as decorrentes reações negativas ou positivas dos alvos.
O padrão de resultados sugere que os adolescentes levam em conta o contexto relacional ao
interpretar comentários provocativos. A provocação de amigos (frequentam a mesma escola e
ficam próximos) tende a ser interpretada de maneira mais benevolente do que o concedido à
provocação de colegas (frequentam a mesma escola, mas não ficam juntos). Diferenças de gênero
também foram evidentes na interpretação da provocação. As meninas relatam emoções mais
81
negativas em resposta a provocação do que os meninos. Embora não tenham sido identificadas
diferenças de gênero na frequência relatada de provocação na pesquisa, os autores afirmam que
estudos de observação indicam que a provocação é mais frequente entre os adolescentes meninos
mais novos. Já com relação às provocações à competência acadêmica ou à aparência física,
novamente os resultados indicam que as provocações que envolvem a aparência física e, em
especial, o peso, geraram os efeitos e humores mais negativos em geral. Nem o tipo de
relacionamento, nem o gênero ou mesmo a idade minimizaram o impacto da provocação em
relação ao peso, o que demonstra, claramente, a força dos valores culturais vigentes.
Agliata et al. (2007) também sugerem que a provocação, especialmente acerca da aparência
física, é uma experiência comum na adolescência e com consequências bastante negativas. Os
autores citam estudos (SHAPIRO, et al.,1991; SCAMBLER et al., 1998) que examinaram o
conteúdo da provocação entre os jovens adolescentes e relataram que 66% dos incidentes de
provocação consistem em referências à aparência física, seguido pela competência geral. Os
resultados da pesquisa de Agliata et al. (2007) com 137 meninas de 11 a 15 anos de idade indicaram
que as adolescentes lembraram mais facilmente das provocações relacionadas à aparência do que
as relacionadas à competência, por exemplo. Slater e Tiggemann (2011), ao estudar as diferenças
do gênero na participação em esportes com adolescentes de 12 a 16 anos, também afirmam que,
especialmente as meninas, são provocadas com relação à aparência do corpo ou por serem
descoordenadas na atividade física. Apontam, também, a existência de piadas relativas ao peso das
meninas, o que as faz ter menos prazer com as atividades esportivas do que os meninos.
Underwood (2004), por sua vez, afirma que, na adolescência, intensifica-se a exploração
do mundo do outro sexo, porém em frequentes interações caracterizadas como borderwork (forma
de interação sexual que confirma as fronteiras e assimetria entre os grupos de meninos e meninas,
como a provocação, a perseguição, entre outras). Tholander (2002) confirma que as provocações
são, em sua maioria, dirigidas ao sexo oposto na adolescência, porém analisa que a provocação
pode assumir várias funções que ultrapassam a ideia de marcação de fronteiras entre o feminino e
o masculino. Uma dessas funções é o de recusar o papel social tradicional atribuído aos gêneros,
por exemplo, quando as meninas provocam os meninos que se exibem para elas. De qualquer
forma, o pesquisador discorda da posição de que a provocação borderwork aumenta a distância
entre meninos e meninas. Ele entende que, a longo prazo, pode ajudar a aproximar porque leva o
outro a perceber que suas ações são indesejadas.
82
A provocação heterossexual, portanto, já presente no final da infância, se intensifica e se
ramifica na adolescência. Uma dessas ramificações refere-se à provocação que serve para iniciar
uma interação heterossexual. Muitas dessas provocações são caracterizadas por uma junção de
ludicidade e ambiguidade, que permite que o adolescente expresse que gosta da pessoa do sexo
oposto, sem ser responsabilizado por esse tipo sentimento. Em uma segunda ramificação, a
provocação se torna um pouco mais ofensiva, muitas vezes com foco em padrões sexuais, como a
homossexualidade. Este foco, contudo, funciona como um modo de o provocador lidar com seus
próprios medos sexuais, atribuindo-os aos outros, particularmente aos alvos com menos prestígio,
como os mais isolados do grupo (ROSS, 2003).
Ainda com relação à adolescência, Agliata et al. (2007) apontam em seu estudo que a
adolescência tem sido identificada pela literatura (SHAPIRO et al., 1991) como o período no qual
os indivíduos são mais propensos a vivenciar provocações. Laursen (1995), por sua vez, afirma
que além da provocação, o comportamento perturbador25 - como cantar distraído durante a aula,
por exemplo -, também é uma causa frequente de conflitos entre adolescentes. Contudo,
diferentemente do que ocorre com a provocação, a intenção de irritar não existe no comportamento
perturbador.
Segundo Keltner et al. (2001) e Ross (2003), a provocação na adolescência é
prioritariamente verbal e aumenta drasticamente nessa fase da vida (principalmente no início da
adolescência) devido às mudanças cognitivas que dão base à melhor apreciação e compreensão do
humor e da ironia. Há um aumento, principalmente na habilidade de provocações mais sutis, porém
mais dolorosas. Os adolescentes são, geralmente, mais adeptos a provocações relacionadas a
aspectos de maior vulnerabilidade ao alvo. Além disso, a preocupação com a aceitação e as
mudanças sociais no caráter das amizades e nos grupos de pares, fazem da provocação algo
especialmente frequente e suscetível de acontecer nesse período, tornando-se, portanto, uma parte
essencial da cultura adolescente.
Considerando essa relevância e frequência no cenário adolescente, Barnett et al. (2004)
examinaram as percepções de 332 estudantes (de 10 a 12 anos) e de seus professores, acerca das
provocações antissociais (que intimidam e hostilizam) e prossociais (que refletem e incentivam
positivamente as relações interpessoais). De forma ampla, os resultados demonstraram que os

25
Em inglês: annoying behavior
83
alunos são capazes de discriminar entre provocação antissocial e prossocial, além de apresentarem
uma maior tendência a serem prossociais, tanto pela percepção de professores, como pelos pares.
Os alunos também indicaram que geralmente experimentam e observam a provocação prossocial
com mais frequência do que a antissocial, tanto na escola, como em casa, embora os meninos
tenham apresentado maior tendência a provocar de forma hostil e antissocial, principalmente em
interações com o gênero oposto. Aliás, Barnett et al. (2004) e Conoley et al. (2007) assinalam uma
maior inclinação nos meninos para ser tanto provocadores antissociais como prossociais.
Assim, apesar da provocação antissocial compreensivelmente ter recebido considerável
atenção na literatura, Barnett et al. (2004) assinalam que a provocação prossocial pode ser mais
prevalente na vida de muitos jovens. Os autores ainda ressaltam que mais atenção deve ser dada à
provocação prossocial, como um componente das relações interpessoais saudáveis que tem de ser
reconhecida e, em algumas circunstâncias, inclusive, encorajada. Alberts et al. (1996), em um
estudo com 242 estudantes universitários, também confirmam que os provocados tendem a
considerar mais a dimensão do humor na intenção do provocador, ou seja, interpretam mais a
provocação como uma brincadeira. Mesmo assim, os participantes reportaram mais reações neutras
à provocação do que reações negativas ou positivas. Young et al. (1998), entretanto, correlacionam
a provocação prossocial com respostas mais positivas no alvo, enquanto que a provocação
antissocial está correlacionada com respostas mais negativas.
Ainda sobre as dimensões prossociais e antissociais da provocação, Young et al. (1998), ao
analisarem 60 casais adultos heterossexuais com pelo menos 6 meses de relacionamento, encontrou
que parceiros românticos satisfeitos se provocam de forma mais prossocial, embora as mulheres
percebam a provocação de forma mais aversiva quando são alvos do que os homens.
No entanto, apesar de muitas vezes a provocação ocorrer com a melhor das intenções,
Shapiro et al. (1991); Young et al. (1998); Tragesser e Lippman (2005) e Kruger et al. (2006)
salientam que essas intenções tendem a ser menos claras e positivas para o alvo. Como
consequência, os provocados geralmente saem da provocação com uma avaliação mais negativa
da experiência do que o provocador. Shapiro et al. (1991), em um estudo com alunos de todas as
séries, apresentam que 97% dos alunos de terceiros e quintos anos admitiram sentimentos
negativos, como raiva e vergonha, diante de uma provocação. Embora somente 22% dos alunos do
oitavo ano tenham assumido algum efeito negativo - o que vai ao encontro dos dados encontrados
por Underwood et al. (1999) acerca das crianças mais velhas -, nenhum deles conseguiu descrever
84
algo positivo em ser provocado. Já, Kruger et al. (2006), ressalta que, embora muitas vezes a
provocação seja vista como inocente e engraçada para o provocador, os alvos interpretam as
intenções da provocação como menos positivas e mais maliciosas do que os provocadores,
principalmente quando se referem à aparência física ou aos relacionamentos. As boas intenções do
provocador nem sempre atenuam o conteúdo negativo da provocação para o alvo.
Ainda sobre a interpretação do alvo acerca da intenção do provocador, Alberts et al. (1996)
e Hoover e Olson (2000) acrescentam que o contexto da provocação, os conhecimentos prévios do
alvo, as informações não verbais presentes e suas próprias predisposições internas sobre
provocação ou sobre humor, por exemplo, influenciam as percepções acerca da intenção do
provocador. Isso significa que o alvo, ao interpretar a provocação recebida, tende a considerar mais
seus próprios estados internos, percepções e processos cognitivos, do que o conteúdo verbal
específico da provocação.
Para Tragesser e Lippman (2005), a provocação é muito mais um meio de alcançar certa
superioridade sobre o outro do que de estabelecimento de solidariedade ou intimidade entre as
pessoas. O estudo contou com a participação de 119 alunos de graduação de Psicologia, com idades
entre 18 e 46 anos. Simulações de provocações entre amigos incitaram nos participantes, que se
colocaram como alvos no experimento, percepções de dominação e de competitividade, falta de
respeito e de apoio no que se refere ao provocador. A provocação também suscitou sentimentos
negativos, tais como: irritação, perda de intimidade, sentimento de diminuição e de desrespeito, o
que indica que a provocação tem mais um caráter de busca por status e superioridade diante do
outro, sendo, portanto, um comportamento essencialmente de competição. Esses resultados
corroboram os de Shapiro et al. (1991) com alunos de terceiro, quinto e sextos anos: as crianças,
consideradas pelo grupo como sendo populares eram as mais propícias a provocar, e as crianças
não populares (tímidas ou gordas) eram as mais propícias a serem alvos de provocação, o que
sugere, claramente, o caráter relacionado à posição social na provocação. Alberts et al. (1996, p.
2) citam uma frase de Freud que retrata claramente o aspecto negativo descrito: “a provocação é
bastante adequada para fazer nosso inimigo parecer pequeno, inferior, desprezível e cômico...”.
Outra dimensão da provocação ainda não discutida foi analisada por Ray et al. (1999): as
crianças observadoras ou avaliadoras da provocação. O estudo contou com 137 alunos de 8 a 11
anos. De modo geral, parece que assistir a uma provocação entre pares é uma experiência negativa
em geral, independentemente da relação interpessoal entre o observador e o alvo da provocação.
85
No entanto, crianças que não eram próximas ou íntimas da vítima (relação neutra) ou que não
tinham afinidade com ela (relação negativa), afirmaram que passaram a gostar mais da vítima após
a ocorrência da provocação do que antes, por se identificarem com a vítima ou se sensibilizarem
com a dificuldade vivida por ela. Landau et al. (2001) contrapõem essa ideia ao afirmarem que as
vítimas de provocação se tornam, em geral, muito mais desvalorizadas perante os pares que
observam: “eu não ligo se o que fazem a magoa... porque é a Julia!”
Quanto à sensibilidade dos professores diante do impacto das situações de provocação,
Landau et al. (2001), em um estudo envolvendo 185 alunos (terceiro, quinto e sexto anos) e 154
professores ainda em formação, concluem que os professores, geralmente, falham na avaliação do
impacto e no grau da angústia de um aluno alvo de provocação. Segundo os autores, muitas crianças
que são provocadas procuram, inicialmente, a figura do professor em busca de conselho ou de ajuda
para lidar melhor com os episódios de provocação ou para que eles deixem de acontecer.
Entretanto, os professores não se mostraram suficientemente sensíveis ao real sofrimento do aluno,
o que os leva a não validar a experiência emocional da vítima frente ao constrangimento vivido na
presença dos pares. A consequência direta, infelizmente, é a perda da confiança, com o
desencorajamento do relato de episódios futuros. Aho (1998), na mesma direção, encontrou em seu
estudo longitudinal com 219 alunos (desde 6 até 13 anos e desde 16 até 19 anos), que os pares são
extremamente conscientes em reconhecer quem são os frequentes provocadores e provocados, o
que já não acontece com os professores. Contudo, o autor evidencia o papel importante do professor
no que se refere ao clima de aceitação, de segurança psicológica e de respeito da classe. O
comportamento do professor frente aos atos de provocação e a relação entre o professor e o alvo
são importantes para o desenvolvimento de habilidades sociais em seus relacionamentos
interpessoais.
La Russo e Selman (2011) retomam que, especialmente, os estudantes a partir do Ensino
Fundamental II possuem menos apoio dos professores no que se refere aos seus conflitos
interpessoais de forma geral, tendo, muitas vezes, que confiar em suas próprias habilidades e nas
habilidades/orientações de seus pares, principalmente nas escolas com maiores concentrações de
jovens socioeconomicamente desfavorecidos. Ross (2003) ainda ressalta que o professor tem muita
responsabilidade em como os alunos veem a si mesmos e em como os outros no grupo veem
determinado aluno. O poder dos professores é enorme: eles podem tanto fazer com que

86
determinado aluno seja um membro valioso dentro do grupo, como podem colocá-lo à parte de
uma forma negativa, possivelmente, causando duradouros danos psicológicos.
Em síntese, a provocação refere-se a uma comunicação entre provocador e alvo, que
combina, simultaneamente, intencionalidade de hostilizar, com humor, sendo, portanto, ambígua.
Pode, ainda, apresentar resultados prossociais ou antissociais, dependendo do teor da insinuação
feita. Os estudos demonstram diferenças no tipo de provocação e no grau de hostilidade
dependendo da idade, do gênero, da relação entre os envolvidos e do contexto em que é vivenciado.
A provocação acerca da aparência física é a mais comum e tem um forte impacto na saúde
psicológica, principalmente nas mulheres. A resposta que o sujeito apresenta diante da provocação,
por sua vez, afeta sua popularidade entre os pares e pode gerar ainda mais situações de provocação.
O humor, especialmente o menos hostil e o mais tolerante, aparece nas pesquisas relatadas como a
resposta mais eficaz e protetiva à provocação. Vale também ressaltar que as situações de
provocação de pares possuem grande probabilidade de causar dificuldades sociais para os alunos,
entretanto, os professores geralmente não se mostram suficientemente sensíveis à experiência
emocional da vítima.
Aliás, Licciardi (2010), ao analisar os conflitos entre crianças de 3 a 6 anos de idade,
também apresenta que as intervenções dos docentes nos conflitos entre os alunos eram pobres
quantitativa e qualitativamente, visando tão somente à manutenção da ordem e pouco contribuindo,
ou até mesmo dificultando, a evolução das crianças com relação à coordenação de perspectiva
social e às estratégias de negociação interpessoal mais cooperativas.
De forma geral, os resultados apresentados pela autora indicaram que os principais motivos
que geraram conflitos nas crianças de 3 a 6 anos foram disputas por objeto, provocação e exclusão,
e que as estratégias de negociação empregadas em situações de conflitos interpessoais foram
predominantemente físicas e impulsivas. Com relação aos resultados do emprego dessas
estratégias, encontrou-se que a maior parte dos conflitos foram simplesmente abandonados ou
resolvidos de forma unilateral. Ao comparar as estratégias empregadas pelas crianças nos conflitos
vividos por elas com as verbalizadas por meio de histórias fictícias, concluiu-se que as mais
evoluídas aparecem em maior quantidade na ação.
Diante de todo quadro teórico e do panorama agora apresentado, algumas indagações
emergiram na direção da continuidade ao já estudado sobre o tema:

87
- Quais são as principais causas, estratégias empregadas e finalizações dos conflitos vividos
especificamente entre os alunos de 11 e 12 anos?
- Há diferenças nas maneiras como os alunos de 11 e 12 anos resolvem os conflitos vividos
e como julgam solucioná-los?
- Há diferenças entre os alunos de 8 e 9 anos e os de 11 e 12 anos quanto às causas,
estratégias, finalizações e julgamentos dos conflitos?

88
5. MÉTODO

5.1 Contexto da pesquisa

Cada vez mais, são notáveis os repetidos focos conflitivos e de violência que se produzem
nos centros educativos envolvendo, principalmente, os jovens. Essa situação, contudo, não é, em
essência, nem positiva, nem negativa, mas pode vir a ser uma oportunidade para o enriquecimento
e o desenvolvimento pessoal dos envolvidos, dependendo da maneira como os conflitos são
encarados pelos adultos responsáveis.
Considerando a escassez de pesquisas que buscaram compreender como esse fenômeno se
apresenta empiricamente (ROSS, 2003, LAURSEN e PURSELL, 2009), principalmente em alunos
brasileiros e concebendo que outros estudos (BODINE e CRAWFORD, 1998; LA RUSSO e
SELMAN, 2011) atestam que programas de intervenção geram efeitos positivos, justifica-se o
presente estudo pela necessidade de se conhecer melhor o fenômeno para oferecer formação de
qualidade e atualizada sobre o tema. As escolas, assim, poderão planejar melhores procedimentos
de intervenção, por meio de ferramentas teóricas e metodologias mais construtivas que contribuam
efetivamente para os alunos desenvolverem estratégias mais assertivas na resolução de conflitos,
mais respeitosas, justas e cooperativas.
Em decorrência dessa necessidade, investigaremos, especificamente, nos conflitos entre os
alunos de 11 e 12 anos, quais são os motivos mais frequentes geradores de desavenças, quais são
as principais estratégias de negociação interpessoal empregadas e quais são as finalizações dos
conflitos vividos. Pretende-se, também, comparar se há diferenças entre as maneiras como julgam
resolver os conflitos e os modos como os resolvem na prática, bem como comparar as causas, as
estratégias, as finalizações e os juízos entre os alunos de 8 e 9 anos com os de 11 e 12 anos. Esse
estudo, entretanto, compartilha dos mesmos objetivos e recursos metodológicos do trabalho já
realizado por Licciardi (2010), cuja investigação priorizou os conflitos interpessoais entre as
crianças de 3 e 4 anos e de 5 e 6 anos, do trabalho da mesma autora, porém com alunos de 8 e 9
anos (SILVA, 2015) e da pesquisa em andamento com alunos de 13 e 14 anos (OLIVEIRA, 2014).

89
A análise está fundamentada nos estudos de Piaget (1932-1994) sobre o desenvolvimento
moral na criança e nos estudos de Selman (1980; 1990) a respeito das estratégias de negociação
interpessoal. Acredita-se que o caráter inovador esteja justamente na metodologia utilizada e no
aspecto comparativo do trabalho. Pesquisadores como Laursen e Pursell (2009) apontam para a
indisponibilidade de estudos que tracem a incidência e a dinâmica dos conflitos entre pares desde
a infância até a adolescência. Katz et al. (2008) também indicam uma carência, em geral, de
investigações observacionais que examinem comportamentos sociais específicos de crianças e
jovens em contextos naturais de interação. No lugar de aplicar questionários ou outros instrumentos
de avaliação nos alunos, ou mesmo de observá-los em situação de laboratório, a partir de criteriosas
condições controladas, optou-se por acompanhá-los em seus diversos momentos rotineiros da
escola, ao longo de vários dias letivos consecutivos, o que trouxe um caráter mais espontâneo e,
portanto, mais próximo da realidade, às variadas e complexas evidências de desavenças
vivenciadas.

5.2 Problemas

Quais são as principais causas, estratégias empregadas e finalizações dos conflitos vividos
entre os alunos de 11 e 12 anos?
Há diferenças nas maneiras como esses alunos resolvem os conflitos vividos e como julgam
solucioná-los?
Há diferenças entre os alunos de 8 e 9 anos e os de 11 e 12 anos quanto às causas, estratégias,
finalizações e julgamentos dos conflitos?

5.3 Objetivos

Identificar quais são as causas dos conflitos entre os alunos de 11 e 12 anos;


Identificar quais são as estratégias empregadas para resolução de conflitos entre os alunos
de 11 e 12 anos;
Identificar quais são as finalizações dos conflitos entre os alunos de 11 e 12 anos;
90
Comparar se há diferenças entre as maneiras como os alunos de 11 e 12 anos julgam resolver
os conflitos e os modos como eles os resolvem na prática;
Comparar as causas, as estratégias e as finalizações entre os alunos de 8 e 9 anos com os de
11 e 12 anos, assim como a maneira que julgam resolver as desavenças.

5.4 Premissas

As premissas principais que permeiam a presente pesquisa são as de que serão encontradas
diferenças nas estratégias de resolução de conflitos entre as faixas etárias anteriores já estudadas –
3 e 4 anos, 5 e 6 anos (LICCIARDI, 2010) e 8 e 9 anos (SILVA, 2015) -, na direção de estratégias
mais cooperativas, o que reflete, segundo Selman (1980), em tentativas cada vez mais sofisticadas
de coordenar simultaneamente as perspectivas das partes em conflito por meio de estratégias como
a negociação e o compromisso. Provavelmente serão encontradas diferenças entre as formas como
os alunos resolvem os conflitos hipotéticos e a maneira como efetivamente agem quando
envolvidos em situações de conflitos no cotidiano. É de se esperar que as estratégias reais sejam
mais evoluídas (LICCIARDI, 2010).

5.5 Participantes

Participaram deste estudo 62 alunos de 11 e 12 anos, do 6° ano do Ensino Fundamental II,


de 2 escolas públicas localizadas em cidades do interior do estado de São Paulo, escolhidas segundo
o critério de conveniência, sendo 30 estudantes da escola 1 (14 meninas e 16 meninos) e 32 da
escola 2 (15 meninas e 17 meninos). As duas salas de aula observadas foram sugeridas pelas
equipes gestoras das escolas, a partir da maior incidência de conflitos entre os alunos.

5.6 Caracterização das escolas

A escola 1 é estadual e fica situada em um bairro afastado do centro da cidade. O bairro


não tem asfalto e fica à beira de um rio que possui uma pequena represa. É composto,
essencialmente, por chácaras e casas de veraneio que empregam a maioria dos pais e que abrigam,
91
também, grande parte das famílias dos alunos. Funciona em turnos matutino e vespertino (sexto ao
nono ano), além do noturno (primeiro ao terceiro ano do Ensino Médio). Possui, em média, 600
alunos ao todo.
As salas de aula dessa unidade de ensino são amplas, arejadas, bem iluminadas, limpas,
com carteiras e lousas em boas condições de uso. O prédio abriga as salas de aula, a sala de
informática, a cozinha, a cantina, os banheiros, a secretaria, a sala de armazenamento de materiais,
bem como a sala destinada aos professores e outra, aos gestores. Não existe biblioteca. Há uma
ampla área externa, que inclui um pátio com varanda, cujas mesas e bancos são utilizados para a
alimentação dos alunos. Há, ainda, outro pátio com um extenso gramado, várias árvores e uma
quadra coberta destinada, prioritariamente, às aulas de Educação Física. Estima-se que as famílias
dos alunos são provenientes de uma classe econômica baixa. A maioria usa o transporte público
disponibilizado (ônibus) para ter acesso à escola.
Em razão da baixa frequência de conflitos presenciada entre as meninas nessa instituição,
decidimos realizar as observações também em outra escola, com características semelhantes,
porém em outra cidade, para que pudéssemos melhor investigar e compreender o fenômeno.
A escola 2 é municipal e fica situada em um bairro urbano, mas também afastado do centro
da cidade. O bairro é essencialmente residencial, porém conta com alguns comércios de pequeno
porte, como salões de beleza e pequenos mercados. Funciona em turno matutino (primeiro ao
quinto ano), vespertino (sexto ao nono ano) e noturno (EJA). Possui uma média de 450 alunos ao
todo.
As salas de aula dessa unidade de ensino também são bem iluminadas, limpas, com carteiras
e lousas em boas condições de uso. As salas, porém, são pequenas e com pouca ventilação. O
prédio abriga as salas de aula, a biblioteca, a sala de informática, a sala de vídeo, a cozinha, o
refeitório, os banheiros, a secretaria, a sala de recursos (para alunos com necessidades especiais),
bem como a sala destinada aos professores e outra, à equipe gestora. Há uma ampla área externa
(assim como na escola 1), com um extenso gramado, um bosque com árvores, uma piscina vazia
desativada, um parque com brinquedos de madeira, além de um campo de futebol e uma quadra
não coberta destinados, prioritariamente, às aulas de Educação Física. Estima-se que as famílias
dos alunos também são provenientes de uma classe econômica baixa. Os alunos, em sua maioria,
moram próximo à escola e se dirigem até ela a pé.

92
5.6.1 - O ambiente sociomoral26

Apesar de não ser o objetivo do presente estudo correlacionar as características do ambiente


sociomoral da classe com as características dos conflitos vividos pelos alunos, acreditamos ser
importante tecer algumas considerações sobre o assunto para melhor caracterizar nossos sujeitos.
Além disso, diversos estudos (BAGAT, 1986; DEVRIES e ZAN, 1995; VINYAMATA, 1999;
VINHA, 2003; TOGNETTA, 2003, LAURSEN e PURSELL, 2009) atestam que esta é uma
variável que interfere no emprego de estratégias para resolver conflitos.
Segundo De Vries e Zan (1998, p.17), o ambiente sociomoral é “toda a rede de relações
interpessoais que forma a experiência escolar da criança. Essa experiência inclui o relacionamento
da criança com o professor, com as outras crianças, com os estudos e com as regras”.
Há tipos de ambientes escolares, indo de mais coercitivo ou autocrático para mais
cooperativo. Um ambiente autocrático é aquele em que o professor centraliza as decisões, impõe
as regras e a resolução de conflitos, utiliza-se de linguagem valorativa, pune as infrações e
compreende o conhecimento como algo que é transmitido por alguém que o detém. Já no ambiente
democrático, as relações são baseadas no respeito mútuo, a convivência entre os pares é favorecida
e encorajada, já que, segundo Piaget (1965-1973), a cooperação é de suma importância para o
desenvolvimento das estruturas lógicas, das noções de justiça e do sentimento de solidariedade. As
regras são construídas junto com os alunos, levando em consideração as necessidades, os conflitos
são encarados como oportunidade de aprendizagem de regras e valores, o conhecimento é
concebido como algo a ser construído e reconstruído, em um processo em que o professor busca
favorecer desequilíbrios cognitivos, preocupando-se com a construção de novas estruturas de
pensamento.
Apesar das diferenças já explicitadas na caracterização das escolas, as duas classes de 6°
ano observadas apresentavam um ambiente sociomoral bastante similar. De modo geral, em todas
as aulas, as decisões eram centradas na figura dos professores. Nas salas, havia um mapa de classe
delimitando o local do assento de cada aluno. O professor tutor da turma (professor de alguma
disciplina, mas que é responsável por todos os problemas referentes à turma) controlava a
disposição dos alunos, que poderia ser eventualmente alterada por outros professores no decorrer

26
O ambiente sociomoral está incluído no clima escolar. Optamos, contudo, por usar o primeiro termo, pois o clima
deriva da percepção dos sujeitos (aspecto não focalizado pela presente pesquisa).
93
do ano letivo. As carteiras eram enfileiradas individualmente. Os professores iniciavam as aulas
controlando a presença dos alunos por meio da chamada. Cada aula tinha duração de 50 minutos
e, em alguns dias da semana, algumas disciplinas dobravam seu horário com a mesma turma. O
controle do comportamento dos alunos em sala de aula era feito, essencialmente, por meio de
censuras, punições e ameaças, muitas vezes não cumpridas (por exemplo: dar ou tirar pontos,
colocar para fora da sala de aula, chamar os pais ou enviar bilhetes para a família, colocar mais
cópia na lousa, proibir a participação no passeio ou no recreio, etc.). Os alunos podiam, também,
ter os nomes anotados no diário do professor, bem como podiam ser encaminhados para a equipe
gestora, dependendo da gravidade avaliada. Muitos conflitos entre os alunos eram simplesmente
negligenciados pelos professores. Embora, de uma forma geral, os professores fossem bastante
autoritários, havia uma grande disparidade nas práticas escolhidas: alguns professores eram mais
afetivos, tinham uma relação de maior proximidade com os alunos (principalmente os de Educação
Física), davam atenção individual e favoreciam as participações em aula, enquanto a maioria se
mostrava mais distante e coercitiva, com comentários tais como: “eu não estou aqui para vocês
gostarem de mim e nem eu de vocês!”. Os alunos agiam de forma distinta diante das diferentes
posturas dos professores. As regras não eram claras e tampouco construídas com os alunos com
base nos problemas vivenciados. O trabalho em grupo e as propostas cooperativas, tão importantes
para o desenvolvimento da autonomia, eram quase inexistentes.
As duas escolas ofereciam refeição aos alunos, que era servida no horário do intervalo. Os
alunos podiam escolher a quantidade e as opções de alimentos servidos. Enquanto alguns alunos
jogavam futebol nas quadras, os demais ficavam andando ou sentados em algum espaço pelo pátio.
Alguns funcionários ficavam observando os alunos durante todo o intervalo. Quando ocorria um
conflito mais violento, a direção ou a coordenação eram acionadas.
Os alunos da escola 1, especificamente, possuíam, para cada disciplina, apostilas oferecidas
pelo Governo do Estado, que eram levadas na mochila diariamente, de acordo com a grade horária
especificada. Os livros didáticos complementares eram coletivos e ficavam na escola, sob o
controle dos professores. Não havia livro para todos os alunos. As apostilas eram usadas,
frequentemente, em todas as disciplinas e de modo sequencial. Em geral, os professores liam com
os alunos o conteúdo dos textos, faziam alguns esclarecimentos e delimitavam um tempo para a
realização individual dos exercícios da apostila. Posteriormente, havia a correção das atividades
propostas, com a leitura, pelos alunos, de suas respostas. Os livros eram usados esporadicamente
94
por alguns professores, como suporte às atividades propostas pelas apostilas. Havia muita atividade
de cópia em lousa, principalmente pelos professores substitutos. As professoras de Português e de
Matemática estavam de licença-saúde e foram substituídas em todos os dias de observação por
outras duas profissionais. Vale ressaltar a indiferença dessas duas professoras substitutas: uma
prática comum que possuíam era a de entrar na sala, passar um texto/exercício na lousa para os
alunos copiarem, porém sem cumprimentá-los, sem sorrir e sem nenhuma explicação sobre o
conteúdo, ou ainda, passar o texto na lousa para cópia e, depois, ficar em sua mesa conectada à
internet no computador particular. Os alunos, nessas situações, demoravam muito tempo para
sentar em seus lugares e parar de conversar.
Os dois professores homens da turma exerciam a autoridade de forma bastante diferenciada
e eram mais respeitados do que as professoras mulheres que, em geral, falavam e gritavam muito,
o que ocasionava maior dispersão e ociosidade por parte os alunos.
Vídeos e outras atividades diversificadas em grupo eram usados raramente. Mesmo quando
esses recursos eram utilizados, os professores, geralmente, passavam o tempo todo controlando o
comportamento dos alunos para ficarem quietos e ocupados com o trabalho a ser realizado.
Ressalta-se que não havia qualquer tipo de comentário do professor ou debate entre os alunos após
assistirem ao filme, nem tampouco propunha-se uma relação com os conteúdos vistos
anteriormente. Mesmo quando a atividade tinha um objetivo interessante (montar um cartaz sobre
as eleições municipais ou montar um cartão postal demonstrando grandes obras do mundo
moderno), os professores não conseguiam organizar a classe e o tempo adequadamente (os grupos
nunca conseguiam iniciar e terminar a atividade no mesmo dia). Também não passavam nos grupos
para orientar e tirar dúvidas. Eles saíam para beber água ou para ir ao banheiro, o que desestimulava
os alunos, que brigavam, corriam pela classe, conversavam, porém poucos se envolviam na
atividade proposta. Como essas atividades grupais eram raras e com pouca organização e apoio do
professor, os alunos apresentavam muita dificuldade para trabalhar em grupo. Gritos e ameaças
eram frequentemente ouvidos nessas ocasiões, assim como situações de humilhação ou de falta de
sensibilidade por parte dos professores. Também não havia consideração ou valorização pelos
conhecimentos prévios dos alunos ou por suas condições de vida/cultura, conforme fica evidente
nos diálogos a seguir:

95
a) Os alunos estão cantando uma música de funk enquanto a professora passa a matéria
na lousa para cópia.
Professora: Essas músicas que vocês ficam cantando não servem pra nada na vida...
Aluno: Serve sim, professora, meu pai também canta...
Professora: O que o seu pai é, Wagner27?
Aluno: É jardineiro.
Professora: E você quer ser jardineiro quando crescer?
Aluno: Eu quero!
Professora: Você acha que essa é uma boa profissão? Tem um bom salário?
Aluno: Eu acho, Pro... Meu pai é um bom jardineiro e sustenta todo mundo lá em
casa...
Professora: Pois eu acho que não. Por isso é melhor você prestar mais atenção e
aprender as coisas que a escola te ensina.
Aluno não responde a abaixa a cabeça.

b) Professora: Quem aqui acredita que é Deus quem faz as pessoas ficarem doentes?
Todos os alunos levantam as mãos.
Professora: Se as pessoas vivem em ótimas condições de higiene, com todos os
cuidados, boa alimentação, ela fica doente?
Alunos: Se Deus quiser, sim!
Professora: De jeito nenhum. Não é Deus, por favor, gente!
Alunos: É sim. Se Deus quiser, ele mata a gente do nada!
Professora: Gente, eu estou falando de doença e não de morte, faça o favor! (faz uma
cara de desprezo e continua a aula).

Os alunos não usavam uniformes. Cada aluno era responsável por limpar sua carteira e o
chão próximo a ela ao final do dia. Na sala havia um detergente, uma esponja e uma vassoura, que
eram compartilhados entre todos. Talvez pela diferença de quantidade entre alunos e alunas, as
meninas pouco participavam das aulas e raramente davam suas opiniões nas discussões
oportunizadas. Alguns professores com quem conversamos, levantaram ainda a hipótese da não
participação das meninas estar também relacionada com a cultura própria da região, em que as
mulheres eram muito submissas. Os alunos que tinham o nome anotado no diário do professor
sofriam sanções, tais como não participar dos passeios/eventos da escola. Muitos alunos não tinham
conhecimento do motivo do seu impedimento. A escola contava com um Professor Mediador
Escolar e Comunitário (PMEC). Segundo a Secretaria Estadual de Educação, trata-se de:28
um educador de proximidade dedicado à promoção da proteção escolar. Ele soma esforços
à equipe gestora e a toda a equipe docente para lidar com as questões que se manifestam
no ambiente escolar e produzem reflexos na convivência que se estabelece dentro da

27
Os nomes dos alunos foram alterados para garantir a não identificação.
28
www.rededosaber.sp.gov.br
96
escola, contemplando as relações interpessoais de todas as pessoas que a frequentam:
alunos, professores, funcionários e pais.

A mediadora dessa escola, no entanto, tinha a função de conversar com os alunos que eram
impedidos de permanecer na sala de aula, dar bronca nos que não traziam material, intimar as
famílias para comparecerem à escola (para exigir providências em relação ao aluno) e cuidar de
questões burocráticas, tais como lista de alunos para organização de passeios ou bilhetes
informativos para a reunião de pais. As ações da mediadora com os alunos, por nós presenciadas,
foram sempre pautadas em sanções que não tinham nenhuma relação com o ato cometido pelo
aluno e em uma linguagem impositiva e hostil.
Na escola 2, os alunos chamavam as professoras apenas de “Dona”. A diretora verbalizou
que isso acontecia por uma questão de “respeito”, já deixando explícita a crença de que a relação
entre professor e aluno deveria ser de pouca proximidade. Só havia um professor homem, o de
Educação Física, e era ele o único a ser chamado pelo próprio nome. Sua relação com os alunos
era de maior acolhimento e intimidade. Não havia apostilas e os livros didáticos oferecidos pelo
Município eram particulares, mas ficavam guardados no armário da sala, sob o controle dos
professores, que tinham a chave do cadeado. Os alunos somente levavam os livros para casa quando
havia tarefas ou em dias anteriores às avaliações. Em geral, os professores também tinham o
costume de ler com os alunos o conteúdo dos textos e fazer alguns poucos esclarecimentos,
geralmente repetindo o que já estava escrito, mas com outras palavras. Depois, delimitavam um
tempo para a realização individual e a posterior correção das atividades propostas na lousa. A
prática de dar aula sentada também era comum para algumas professoras. Vídeos e outras
atividades diversificadas em grupo eram usados raramente. Era evidente o tédio e o desinteresse
dos alunos devido à forma como os conteúdos eram trabalhados.
Os alunos usavam camisetas de uniforme e não podiam entrar na escola sem elas. As
meninas eram mais participativas durante as aulas e mais vaidosas do que na escola 1, o que
comprova a hipótese cultural já descrita: embora também afastada do centro da cidade, a escola 2
situava-se em um bairro muito mais urbanizado do que a escola 1 e a própria equipe gestora
informou que as mulheres da comunidade eram bastante ativas. Os conflitos entre as meninas
também eram menos velados (se batiam, falavam alto, chamavam a professora). O comportamento
dos meninos era muito parecido nas duas escolas. Os alunos que tinham o nome anotado no diário
do professor por mais de uma vez sofriam sanções, tais como, ter os pais chamados na escola ou
97
ter que conversar com a diretora. Cada professor tinha seu próprio diário e usava um critério pessoal
de avaliação para a anotação nele, que incluía: conversar em sala, mascar chicletes, usar o celular,
não fazer a lição de casa, brigar em sala, entre outros. Presenciamos apenas uma tentativa da
professora de Educação Física substituta em mediar os conflitos. Apesar da intenção em ouvir as
partes envolvidas e em não tomar partido na desavença, a professora expôs os envolvidos diante
da classe e acabou, por fim, tomando para si a resolução do conflito, obrigando os alunos a se
desculparem. As outras professoras, entretanto, em momentos de conflitos, já impunham a solução,
ameaçavam, censuravam ou demonstravam ironia e desrespeito diante dos comportamentos dos
alunos, como exemplificado no diálogo a seguir:

Professora: Renato, é sua vez de ler o parágrafo.


Renato: Eu não quero ler, Dona.
Alguns alunos riem da voz alta e grossa de Renato.
Renato: Para gente!
Professora (irônica): Você não fala nunca, é o mais tímido, mas eu já vi tudo: você se
faz de morto para morder a bunda do coveiro! Vou chamar outro aluno para ler, mas
só dessa vez, viu?
Renato abaixa a cabeça sem sorrir e não responde.
A classe toda dá risada.

As ameaças para controlar o comportamento eram frequentes, porém os alunos não mais as
validavam em razão da não efetivação. Como as ameaças raramente eram cumpridas, as práticas
docentes podiam ser claramente caracterizadas como volúveis ou flutuantes, ou seja, sem
consistência: os professores oscilavam em seus comportamentos e ora recriminavam determinado
comportamento, ora simplesmente o ignoravam, conforme exemplificado a seguir:

Professora (gritando): Não quero ver nenhum celular. Ivan, tire o celular da perna e
guarde na mochila, senão vou levar na diretoria.
Ivan tira da perna e finge que coloca o celular na mochila.
Professora continua a dar aula e quando vê que o celular está de novo em sua perna,
não fala mais nada, ignora.

Com base nas situações descritas, inferimos que as duas escolas, apesar de suas
especificidades, parecem igualmente se configurar como um ambiente de caráter autocrático. As
instituições, de uma forma geral, não concebem que as propostas em grupo, cooperativas e
diversificadas poderiam ser procedimentos valiosos para favorecer a construção do conhecimento
98
e o desenvolvimento dos alunos em direção à almejada autonomia. Mesmo considerando as
diferenças de posturas presenciadas, a carga de afetividade e de envolvimento dos professores com
os alunos era mínima. As sanções expiatórias, as ameaças, a linguagem hostil e as regras impostas
(tantas vezes injustas) eram frequentes na rotina cotidiana e faziam desse espaço de convivência,
muitas vezes, um local fatigoso e ofensivo, como demonstrado na fala de uma aluna que foi
proibida de ir ao passeio da escola sem saber, ao menos, a razão: (chorando) “Deixa pra lá, eu já
estou no sexto ano, falta pouco para o Conselho Tutelar não me obrigar a vir mais pra esse lugar
injusto e daí eu vou ficar livre”.
O ambiente sociomoral cooperativo, por sua vez, é considerado, em uma perspectiva
construtivista, o mais apropriado e tem como sentido prioritário que o respeito recíproco seja
praticado: os alunos respeitam o professor, o professor respeita os alunos, e os alunos respeitam
uns aos outros. A atmosfera de respeito, portanto, é um contexto necessário e essencial para a
promoção do desenvolvimento moral. Especificamente, o respeito à dignidade de qualquer ser
humano é fundamental num ambiente sociomoral cooperativo. As atividades, por sua vez, apelam
para o interesse do aluno, encorajando-o em direção à experimentação e promovendo uma
perspectiva de cooperação no mundo social. No entanto, é necessário, também, que nesse ambiente
haja um sentimento de justiça, reconhecido pela legitimidade e equidade na aplicação das regras e
sanções (DEVRIES e ZAN, 2010). É evidente, na fala anterior descrita, a sensibilidade dos alunos
a situações de injustiça.
A escola deveria, assim, organizar-se como um ambiente mais cooperativo, formando
cidadãos capazes de discutir suas opiniões, criticar, expor e, principalmente, colocar-se no lugar do
outro, o que é essencial para uma resolução de conflitos mais pacífica. Nas escolas observadas,
contudo, os interesses e necessidades dos alunos raramente eram considerados. O centro de todo o
processo de ensino-aprendizagem era a figura do professor. Considerando algumas diretrizes que
ajudam os alunos no desenvolvimento das operações formais descritas por Woolfolk (2000), pode-
se inferir que os professores dessas escolas raramente ofereciam aos alunos a oportunidade de
explorar perguntas hipotéticas, de resolver problemas e raciocinar cientificamente e, por fim,
raramente ensinavam conceitos amplos no lugar de fatos apenas, usando materiais e ideias
relevantes para as suas vidas.
Especificamente, com relação à resolução de conflitos, embora a perspectiva construtivista
não seja a única a trabalhar com o tema, o que a diferencia é justamente o paradigma de aceitar o
99
conflito – e a sua resolução – como parte do currículo (DEVRIES e ZAN, 2010). Ajudar o aluno,
de forma eficaz e justa, na resolução de seus problemas sociais, influencia-o positivamente e
propicia seu desenvolvimento no que tange ao reconhecimento e à reconciliação de diferentes
pontos de vista. É preciso, primeiramente, evitar as resoluções tão frequentes que funcionam em
curto prazo, como as recompensas, os gritos, as ameaças, as agressões, as humilhações e punições,
pois geralmente incitam a revolta e a agressão, além de reforçarem uma moral dependente do
controle externo. Para Vinha (2010), ao intervir em situações de conflitos, os educadores devem
ter como meta: a resolução por meio do diálogo, a compreensão da necessidade de existência das
regras na relação entre as pessoas, a tomada de decisões, a responsabilidade, o respeito mútuo, o
autoconhecimento, a coordenação de diferentes pontos de vista e, finalmente, o favorecimento da
autonomia.

5.7 Delineamento da Pesquisa e Procedimentos de Coleta de Dados

O delineamento refere-se ao plano elaborado pelo pesquisador para atingir seus objetivos.
A nossa pesquisa está inscrita em um projeto maior de delineamento transversal, ou seja, estudamos
os alunos em diferentes grupos de idade (3 e 4; 5 e 6; 8 e 9; 11 e 12; 13 e 14) porque em teorias da
área de Psicologia do Desenvolvimento, a idade é considerada um importante determinante de
mudança. O delineamento transversal permite, portanto, que mudanças relacionadas com a idade
sejam medidas.
Especificamente, a presente pesquisa insere-se em um estudo descritivo, importante para o
conhecimento de determinada realidade que, no caso, são as características dos conflitos entre
alunos de 11 e 12 anos. Ademais, caracteriza-se por registrar os fenômenos com o mínimo de
interferência possível (BREAKWELL et al. 2010).
Embora existam autores que apontem a pesquisa quantitativa como radicalmente
antagônica à qualitativa (Bogdan e Biklen, 1994), na atualidade, a maioria assume serem
alternativas passíveis de convivência mútua e complementar, o que é sugerido pelos dados do
presente estudo. Minayo e Sanches (1993) acrescem que o estudo quantitativo pode gerar questões
para serem aprofundadas qualitativamente, e vice-versa. Os autores apresentam, aliás, que
se a relação entre quantitativo e qualitativo, entre objetividade e subjetividade não se reduz
a um continuum, ela não pode ser pensada como oposição contraditória. Pelo contrário, é
de se desejar que as relações sociais possam ser analisadas em seus aspectos mais

100
“ecológicos” e “concretos” e aprofundadas em seus significados mais essenciais
(MINAYO e SANCHES, 1993, p. 247).

Nossa pesquisa utilizou uma combinação de métodos quantitativos e qualitativos. Morse


(1991, apud Neves, 1996) propõe o emprego da expressão “triangulação simultânea” para o uso
concomitante de métodos quantitativos e qualitativos. O autor, ainda, destaca que, geralmente, uma
das abordagens tem prioridade. No nosso caso, foi a qualitativa, em que buscamos investigar o
conflito interpessoal em um dos contextos naturais, a escola, descrevendo como nossos sujeitos
vivenciaram o fenômeno. O estudo quantitativo, porém, enriqueceu a descrição dos participantes
da amostra, bem como contribuiu para compararmos as categorias criadas e as faixas etárias.
Os procedimentos adotados para a coleta dos dados foram: a observação sistemática e a
entrevista clínica piagetiana.

5.7.1 Observação sistemática

A observação é sistemática pelo fato de ser planejada e conduzida de acordo com um


objetivo anteriormente definido. A definição do objetivo nos ajudou a selecionar, entre as inúmeras
possibilidades, aquelas que nos transmitiam informações relevantes. Em nosso caso, o
procedimento teve por escopo identificar os motivos pelos quais os sujeitos se engajam em
situações de conflitos, as estratégias empregadas para solucioná-los e as finalizações decorrentes.
As observações sistemáticas são, ainda, realizadas em condições explicitamente
especificadas. Especificar as condições significa estabelecer: onde (em que local e situação a
observação será realizada); quando (em que momentos); quem (quais serão os participantes a serem
observados); o que (que comportamentos ou circunstâncias devem ser observados) e como (qual a
técnica de observação e registro utilizada) (DOMENICO e CASSETARI, 2002; DANNA e
MATOS, 2006).
As observações dos conflitos ocorreram no último bimestre de 2012, em pelo menos três
dias consecutivos por semana, durante todo o período de aula dos alunos e em todos os contextos
de interação (entrada e saída dos alunos, sala de aula, intervalo, pátio, etc.). Foram observados os
alunos de 6° ano que tinham entre 11 e 12 anos de idade. Os alunos mais velhos que frequentavam
a mesma série foram excluídos das observações.

101
Antes, porém, de iniciarmos a coleta dos dados, pedimos a autorização das direções das
escolas (Apêndice A), e participamos da reunião bimestral de pais a fim de esclarecermos os
objetivos e procedimentos da pesquisa para, então, coletar individualmente o termo de
consentimento livre e esclarecido referente a cada aluno (Apêndice B)29. Realizamos, também, uma
observação piloto, a fim de verificarmos qual seria o melhor meio para coletar dados sobre os
conflitos vivenciados pelos alunos.
O estudo piloto é, em geral, extremamente útil para testar os métodos, os materiais, o
equipamento, etc., antes de executar o próprio estudo em sua completude, sendo realizado com um
grupo menor de participantes que tenham características semelhantes às dos participantes do estudo
principal (BREAKWELL et al. 2010). Para isso, permanecemos por uma semana em outra escola
pública de Ensino Fundamental II, observando as interações entre os alunos da mesma série nas
diversas situações da rotina escolar. Esse estudo piloto contou com a participação de outra
pesquisadora que já havia realizado um estudo semelhante e que auxiliou no planejamento, na
observação e na análise das informações coletadas. Pode-se, por fim, concluir que era necessário:
frequentar a escola em dias seguidos para acompanhar o desenrolar dos conflitos e frequentar vários
dias durante a semana para que os alunos se acostumassem com nossa presença na rotina. Também
era preciso combinar a observação com uma conversa informal subsequente para esclarecimento
dos detalhes dos conflitos, quando necessário.
A conversa subsequente a alguns conflitos ajudou a colocar o foco sobre eventos ou sobre
detalhes importantes que não haviam sido percebidos anteriormente. Essas conversas aconteciam
quando o envolvido estava só e, em geral, as perguntas feitas eram respondidas com boa vontade.
Demonstrávamos interesse, mas sem fornecer conselhos ou julgamentos. Para evitar
constrangimento e exposição desnecessária dos alunos, essas conversas não foram áudio-gravadas.
Contudo, foram realizados registros escritos em seguida à observação e aos esclarecimentos
necessários. Elaboramos, para isso, um protocolo contendo os seguintes itens: sujeitos, descrição
do conflito, motivo, estratégias empregadas pelos alunos, local, finalização e intervenção do adulto.
Ao todo, foram oficialmente 25 dias de observação (17 dias na escola 1 e oito dias na escola
2), contabilizando um total de 100 horas. O critério para a interrupção das observações foi o de
saturação, o que explica a diferença nos dias de observação nas duas escolas. A saturação designa

29
A pesquisa foi autorizada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Unicamp - número 134352/2012 (ANEXO A)

102
o momento em que “o acréscimo de dados e informações em uma pesquisa não altera a
compreensão do fenômeno estudado. É um critério que permite estabelecer a validade de um
conjunto de observações” (THIRY-CHERQUES, 1999, p. 21). Vale ressaltar que a escolha por
uma segunda escola se deu, como dito, em razão da baixa frequência de conflitos presenciada entre
as meninas na escola 1.
A observação sistemática realizada foi, portanto, de caráter naturalista (descreve
comportamentos em situações naturais – cotidiano dos alunos na escola) e estruturada (descreve
tipos específicos de comportamentos – os conflitos entre os alunos). O cuidado com a observação
naturalista de participantes em seus ambientes cotidianos deve ser o de respeitar a privacidade e o
bem-estar psicológico. Já o observador foi caracterizado como um “observador como participante”,
ou seja, alguém que se integra ao grupo com a intenção expressa de observar. Contudo, seu papel
incluiu um relativo destacamento em relação ao grupo estudado, tendo seu posicionamento objetivo
e empático enfatizado. O observador é livre para formular questões e, como integra apenas
parcialmente o mundo dos membros do grupo, precisa ter cuidado quanto à necessidade de manter
um grau de imparcialidade relativa às alianças e facções internas do grupo (BREAKWELL et al.,
2010).
Quanto aos cuidados, buscamos seguir o que Fagundes (2002) recomenda para a eficiência
na observação de comportamentos. Para o autor, é importante certo tempo de ambientação do
observador à situação, antes que se iniciem os registros propriamente ditos. Isso permite que o
observador se familiarize com o contexto e as pessoas, bem como, e principalmente, que os sujeitos
se acostumem com a presença do pesquisador. No nosso caso, o primeiro dia de observação foi
creditado a essa ambientação nas duas escolas. O observador deve, ainda, permanecer a uma
distância do sujeito que permita visualização e audição adequadas dos comportamentos desejados,
mas que não interfira no desempenho dele, ou tire sua espontaneidade. Manter-se em uma atitude
discreta e procurar não interferir na situação também são recomendações importantes para que não
haja modificação excessiva da naturalidade ou espontaneidade do sujeito em seu desempenho.
Isso não significa, entretanto, que tivemos que ser frias ou distantes dos alunos, até porque
percebemos, já no estudo piloto realizado, que a criação de um vínculo afetivo era importante tanto
para a espontaneidade, como para a confiança nos esclarecimentos dos conflitos. Apenas tentamos
não influenciar o comportamento além do exigido pelos objetivos da observação, ou além do que
nos foi permitido fazer no local. Era comum a curiosidade dos alunos acerca do que estávamos
103
escrevendo no caderno, e a resposta incluía uma explicação breve, mas verdadeira: “estamos
fazendo um trabalho da faculdade para entender como se comportam os alunos de 6° ano”. Isso os
satisfazia e logo o interesse deixava de existir. Outra dúvida frequente dos alunos referia-se à
possível exposição daquele material à direção da escola. Respondíamos, então, que nenhuma
pessoa da escola teria acesso aos registros.
Vale descrever que o tamanho e a disposição do espaço físico, muitas vezes, limitaram as
observações, dificultando, por exemplo, principalmente no espaço da sala de aula, ficar mais
próximo de alguns alunos em conflito, ou mesmo ser discreto. Essa, aliás, foi uma limitação do
método presenciada: a impossibilidade de mudança de local da observação na sala de aula, em
razão dos lugares marcados dos alunos, o que não nos possibilitou observar adequadamente, por
exemplo, os conflitos mais velados. Os conflitos que não ficaram claros foram descartados.
Ademais, as desavenças dos alunos que se situavam mais próximos, foram mais bem descritos e
explorados. Outro aspecto que merece destaque refere-se ao acompanhamento, nos dias
subsequentes, dos conflitos que perduravam. Em geral, buscávamos focalizar a atenção nos
comportamentos dos envolvidos, ficar mais próximos fisicamente, além de realizar conversas para
ter informações acerca do desenrolar dos acontecimentos.
A amostragem por evento e a descrição narrativa foram, especificamente, o método de
observação e registro do comportamento escolhidos. De acordo com Bentzen (2012, p. 140) “a
amostragem por evento simplesmente aproveita a ocorrência generalizada de eventos, definindo
quais eventos específicos são de interesse e esperando até que eles ocorram no ambiente de
observação”. Nós, então, nos posicionávamos no cenário de observação, onde os alunos pudessem
ser vistos e escutados, e esperávamos as evidências dos conflitos interpessoais aparecerem.
Registrávamos, assim, toda a sequência do comportamento, usando uma descrição narrativa, ou
seja, do começo ao fim, em tantos detalhes quanto possível.
Para garantir a validade e confiabilidade dos dados coletados, foi utilizado um juiz de
observação, também pesquisador da área, que esteve presente em cerca de 10% das sessões nas
escolas e conduziu relatos independentes dos mesmos momentos e contextos, para serem
comparados posteriormente. Quando comparamos os registros observacionais, os índices de
concordância foram de 100%. Segundo Fagundes (2002), índices de concordância acima de 70%
demonstram que os registros se mostram confiáveis.

104
5.7.2 Entrevistas para investigação do juízo

As entrevistas foram realizadas com o objetivo de comparar se há diferenças entre as


maneiras como os alunos de 11 e 12 anos julgam resolver os conflitos e os modos como eles os
resolvem na prática.
Após a realização da fase da observação, analisamos e categorizamos as causas, as
estratégias e as finalizações dos 134 conflitos entre os alunos registrados. Constatamos que a ação
provocativa, a reação ao comportamento perturbador e a disputa por poder foram as causas mais
frequentes. Elaboramos, então, histórias contendo situações de conflitos cujas causas envolviam as
categorias citadas.
Em uma segunda pesquisa piloto, essas situações foram apresentadas primeiramente a oito
alunos provenientes de outra escola, porém da mesma série e com as mesmas idades. Os alunos
foram convidados, ainda, a expressar quaisquer dúvidas ou indagações que tivessem em relação à
entrevista. Esse estudo teve por objetivo, portanto, verificar a compreensão das histórias pelos
adolescentes, para modificá-las, quando necessário, além de verificar se elas nos permitiriam
realmente identificar as estratégias que as crianças julgam utilizar para resolver conflitos
hipotéticos baseados na realidade. Vale destacar que, assim como no primeiro, esse estudo piloto
contou com a participação de outra pesquisadora que nos auxiliou no planejamento, na observação
e na análise das informações coletadas. Essa pesquisadora, aliás, foi a mesma que atuou, também,
como juíz de observação, conforme já descrito anteriormente.
Todas as entrevistas realizadas na presente pesquisa foram áudio-gravadas. As transcrições
completas das gravações oferecem um registro confiável ao qual o pesquisador retorna na medida
em que desenvolve suas hipóteses (SILVERMAN, 1994).
Em nosso caso, não foi preciso fazer nenhuma adequação às histórias planejadas e nem
tampouco na condução da entrevista, a não ser quanto à necessidade de um microfone para tornar
mais audível as respostas dos alunos.
Quanto ao tipo de entrevista, utilizamos a entrevista clínica piagetiana que, por sua vez,
visou à compreensão de como os estudantes julgavam resolver os conflitos hipotéticos construídos
com base na identificação das principais causas dos conflitos vividos por eles. Os alunos foram
selecionados para a entrevista, levando-se em conta a frequência de envolvimento em situações de
conflitos interpessoais (em cada escola, foram selecionados os 30% de alunos mais envolvidos em
105
conflitos). Ao todo, realizamos dezoito entrevistas (com nove meninos e nove meninas), com uma
média de 20 minutos cada, totalizando, aproximadamente, 360 horas de gravação. Infelizmente, 4
dessas entrevistas tiveram que ser excluídas devido a problemas técnicos com o equipamento, o
que acabou por inviabilizar a audição das falas.
A entrevista clínica constitui-se de um método de pesquisa psicogenética (Piaget, 1947-
2005), que tem como objetivo principal captar a lógica do sujeito, suas crenças e formas de pensar.
É clínico, pois busca ir além da resposta estereotipada, buscando compreender o raciocínio do
sujeito, o ponto de vista da análise. A entrevista consiste em um diálogo aberto e, por meio dela,
procura-se seguir as ideias do entrevistado e suas explicações sobre um determinado tema. O
entrevistador intervém sistematicamente e conduz suas perguntas a fim de tentar esclarecer o que
é verbalizado. Logo, existem perguntas que são comuns a todos os envolvidos na pesquisa, mas
essas são complementadas de acordo com as respostas fornecidas. Assim, as respostas orientam o
curso do interrogatório, mas há sempre um retorno aos temas essenciais estabelecidos inicialmente.
O importante, para Queiroz e Lima (2010), não é alcançar as respostas certas, mas sim, as
espontâneas - que o sujeito possa e queira justificar -, e as desencadeadas - decorrentes de boas
perguntas. As autoras reforçam que o bom entrevistador precisa reunir também algumas qualidades
importantes: saber observar, deixar o sujeito falar, não interromper nem lhe desviar a atenção e, ao
mesmo tempo, saber procurar o que deseja. Piaget (1926-1982), contudo, faz advertências sobre
algumas possíveis reações do sujeito, para as quais o pesquisador deve atentar e abandonar. São
elas: o não importar-se (indiferença da criança ao responder sem vontade); a fabulação (a criança
inventa uma história na qual ela mesma não acredita, apenas para responder alguma coisa ou por
prazer com a mera verbalização); a crença sugerida (entrevistador sugere a resposta da criança em
suas interrogações) e, por fim, a resposta socialmente desejável (a resposta da criança fica
distorcida de um modo que se torne socialmente esperável).
As entrevistas foram todas realizadas individualmente durante o primeiro bimestre letivo
de 2013, em locais em que pudéssemos garantir a privacidade e o sigilo da conversa (sala de
informática, biblioteca e pátio da escola vazio). Em razão das diferenças observadas no que se
refere ao gênero dos envolvidos nos conflitos, consideramos interessante que, tanto a versão
masculina, como a feminina das histórias contadas, apresentasse conflitos intersexuais, ou seja, na
masculina, as personagens eram meninos e, na feminina, as personagens eram meninas, mas, nas
duas versões, havia conflitos entre personagens de ambos os sexos. Como os conflitos envolvendo
106
a disputa foram expressivamente menos frequentes nas observações do que a provocação e a reação
ao comportamento perturbador, optamos por apresentar aos alunos somente a situação intersexual
dessa categoria. Os alunos, de forma geral, demonstraram facilidade de compreensão das histórias
narradas e se mostraram interessados durante toda condução da entrevista.
A seguir, apresentamos cada uma dessas histórias:

Ação Provocativa (intersexual)


Murilo e Helena estudam na mesma classe, e Murilo senta-se logo atrás dela. Um dia, enquanto
todos faziam a lição, Murilo puxa levemente o rabo de cavalo da Helena, sem a professora perceber.
Helena fala para ele: “Pare!!”. Murilo ri e assim que a Helena se vira para frente ele puxa
novamente o rabo de cavalo dela, sem muita força.
Por que Murilo ficava puxando o cabelo de Helena?
O que a Helena deve fazer? Por que?
Como a Helena estava se sentindo quando o Murilo ficava puxando o cabelo dela?
Acontece esse tipo de coisa na sua classe? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

Ação provocativa (feminina)


Marina e Camila são amigas e estudam no sexto ano. Bruna e Laís estão na mesma sala, mas não
são da mesma turma de amigas que Marina e Camila. Durante o intervalo, Marina e Camila estão
sentadas em um banco do pátio conversando, quando Bruna e Laís passam por elas dando risada e
encarando.
Por que você acha que a Bruna e Laís passaram pelas duas dando risada e encarando?
O que elas devem fazer?
Como Marina e Camila se sentiram?
O que irá acontecer se elas...?
Acontece esse tipo de coisa na sua escola? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

Ação provocativa (masculina)


Mateus e Rafael estudam juntos no sexto ano e brincam de lutar na sala, durante o intervalo entre
as aulas. Lucas, que é da mesma classe, olha a brincadeira dos dois e diz alto: "olha, dois
namoradinhos se agarrando!" e sai dando risada.
Por que Lucas falou “olha, dois namoradinhos se agarrando” para Mateus e Rafael?
O que eles devem fazer?
Como Mateus e Rafael se sentiram?
O que irá acontecer se eles...?
Acontece este tipo de coisa na sua escola? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

107
Reação ao comportamento perturbador (intersexual)
Durante a aula de História, Alice está concentrada fazendo uma atividade do livro. Enquanto isso,
Gabriel, que se senta atrás de Alice, fica se balançando na cadeira pra frente e pra trás, e o
movimento provoca um ruído. Alice fala: "pare de balançar, você não se toca, poxa?!”.
Por que Alice fala que ele não se toca? Mas o Gabriel estava balançando para atrapalhar
a Alice?
O que Gabriel deve fazer? Por que?
Como Gabriel se sentiu quando Alice falou que ele não se toca? Por que?
O que irá acontecer se Gabriel fizer...? Por que?
O que Alice irá sentir se Gabriel fizer...? Acontece este tipo de coisa na sua classe? Dê
exemplo. E o que é feito quando...? O que você acha disso?

Reação ao comportamento perturbador (feminino)


Manuela é muito amiga de Luiza. Um dia, Manuela veio para a escola usando uma camiseta velha
para os amigos escreverem. Luiza, então, escreve nas costas da camiseta: “Diego, eu te amo! Ass.
Luiza”. Quando Manuela lê o que Luiza escreveu, diz: “ô, minha camiseta não é muro pra você
ficar pichando e se declarando não, viu Luiza! Saia de perto de mim agora!”
Por que Manuela manda Luiza sair de perto? Mas a Luiza escreveu para provocar a
Manuela?
O que Luiza deve fazer? Por que?
Como Luiza se sentiu quando Manuela a mandou sair de perto? Por que?
O que irá acontecer se Luiza fizer...? Por que?
O que Manuela irá sentir se Luiza fizer...?
Acontece esse tipo de coisa na sua classe? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

Reação ao comportamento perturbador (masculino)


Júlio estuda no sexto ano e tem um colega chamado Marcelo. Às vezes, eles se sentam um ao lado
do outro para fazer alguma lição juntos. Um dia, na aula de Inglês, a professora pediu que eles
fizessem uma tarefa do livro didático. Os dois começaram a fazer juntos. Enquanto realizava a
atividade, Marcelo cantava baixinho. Júlio se irritou e disse para Marcelo: “Quer calar essa boca?
Parece um tonto!”
Por que Júlio mandou o Marcelo calar a boca? Mas o Marcelo estava cantando para
atrapalhar o Júlio?
O que Marcelo deve fazer? Por que?
Como Marcelo se sentiu quando Júlio o mandou calar a boca e o chamou de tonto? Por
que?
O que irá acontecer se Marcelo fizer...? Por que?
O que Júlio irá sentir se Marcelo fizer...?
Acontece este tipo de coisa na sua classe? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

108
Disputa por poder (intersexual)
Os alunos estão divididos em grupos para fazer uma atividade na aula de matemática. Isabela, que
está no mesmo grupo de Tomaz, fala: "Tomaz, me deixa fazer o desenho! Eu sou boa nisso! "Ele
responde: "não mesmo, agora é a minha vez! Sai pra lá, que eu vou fazer do meu jeito!"
Por que eles discutiram?
O que Isabela deve fazer? Por que?
O que Isabela sentiu quando Tomaz não deixou Isabela fazer o desenho?
O que vai acontecer quando Isabela fizer...?
O que Tomaz irá sentir quando Isabela fizer...?
Acontece esse tipo de coisa na sua classe? Dê exemplo. E o que é feito quando...? O
que você acha disso?

As perguntas relativas aos sentimentos dos personagens buscaram avaliar a capacidade de


tomada de perspectiva dos alunos, isto é, se eles conseguiam inferir os estados afetivos dos
envolvidos no conflito e as consequências das estratégias utilizadas para a subjetividade alheia. A
questão considerando a dimensão do dever buscou acessar não o que o sujeito faria, mas o que ele
avaliava ser “o mais correto” a se fazer, pois, segundo Selman (1980), ao coletar o dado dessa
maneira, temos maiores chances de obtermos a resposta mais complexa que o indivíduo é capaz de
formular.

5.8 Análise dos dados

Os 134 conflitos observados foram registrados em uma planilha Excel. Cada episódio foi,
então, analisado quanto à sua causa, às estratégias empregadas e às finalizações da interação.
Três juízes independentes analisaram qualitativamente os conflitos e as categorizações (um
dos juízes era o mesmo da observação e da entrevista). As discordâncias foram resolvidas após
discussão, resultando em 100% de acordo. Com base nos protocolos de registros dos conflitos que
ocorreram nas sessões de observação, cada um foi analisado, buscando-se conhecer suas causas,
ou seja, as ações e motivos que levaram à desavença. Esses mesmos procedimentos foram
utilizados para as estratégias de resolução empregadas e para as finalizações dos conflitos. A
análise dos conflitos teve por base algumas categorias já existentes na literatura, como a disputa, a
provocação e a agressão, por exemplo. Entretanto, foi necessário criar outras para abarcar alguns
comportamentos observados que não se enquadravam nos estudos presentes na revisão de
literatura.

109
Após a análise de cada conflito e a categorização das causas, das estratégias e das
finalizações, esses dados foram quantificados, utilizando-se, para tanto, uma metodologia
estatística adequada.
Para descrever o perfil da amostra segundo as variáveis em estudo foram feitas tabelas de
frequência das variáveis categóricas (sexo, faixa etária, causas, estratégias e finalizações dos
conflitos), com valores de frequência absoluta (n) e percentual (%). Já para analisar a relação entre
causas, estratégias e finalizações, foi utilizado o teste exato de Fisher, na presença de valores
esperados menores que 5. Esses testes também foram usados na comparação com gênero e faixa
etária. O nível de significância adotado para os testes estatísticos foi de 5%, ou seja, P<0.05.
Os dados coletados pelas entrevistas para investigação do juízo, por sua vez, foram
analisados pelo método de análise de conteúdo. Freitas e Janissek (2000) assinalam que esse
método implica categorizar os dados (classificar elementos constitutivos do conjunto, reagrupando-
os segundo um critério previamente definido), fazendo recortes das verbalizações dos sujeitos. Esse
procedimento pode ser usado para compreender em profundidade cada expressão de um grupo ou
pessoa envolvida na pesquisa, tornando possível analisar as entrelinhas das opiniões das pessoas,
não se restringindo ao que é expresso diretamente por palavras, mas pode-se pensar no que está
subentendido no discurso de um respondente.
O objetivo da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições
de produção com o respaldo de indicadores. O processo inferencial a partir de índices (palavras)
ou indicadores ocorre pela dedução por meio da leitura e compreensão das mensagens. Para os
autores,
pode ser comparado a um trabalho de um arqueólogo: ele trabalha sobre os traços dos
documentos que ele pode encontrar ou suscitar, traços estes que são a manifestação de
estados, dados, características ou fenômenos. Existe alguma coisa a descobrir sobre eles,
e o analista pode manipular esses dados por inferência de conhecimentos sobre o emissor
da mensagem ou pelo conhecimento do assunto estudado de forma a obter resultados
significativos a partir dos dados (FREITAS e JANISSEK, 2000. p. 38)

Minayo (2000) também complementa que a análise de conteúdo ultrapassa a leitura de


primeiro plano, ou seja, os significados manifestos do enunciado, relacionando estruturas
semânticas (significantes) com estruturas sociológicas (significados). Ela articula, sempre, a
superfície dos textos descrita e analisada com os fatores que determinam suas características:
variáveis psicossociais, contexto cultural e processo de produção da mensagem. O autor ainda
aponta que, mesmo que de formas diversas e contraditórias, a análise de conteúdo visa ultrapassar
110
o nível do senso comum e do subjetivismo na interpretação e alcançar uma vigilância crítica do
material de comunicação.
Toda a análise de conteúdo se inicia, ainda, pela definição do universo estudado,
delimitando e definindo claramente o que estará e o que não estará envolvido. Em nosso caso, serão
todos os elementos do discurso que se refiram aos meios empregados pelas crianças para resolver
os conflitos presentes nas histórias. Estando o universo corretamente definido, inicia-se sua
categorização, que significa determinar as dimensões que serão analisadas (FREITAS e
JANISSEK, 2000).
Os autores, ainda, citam alguns critérios importantes delimitados por Weber (1990) e
Bardin (1996): as categorias devem ser exaustivas (percorrer todo o texto), exclusivas (os mesmos
elementos não podem pertencem a várias categorias), objetivas (características claras de modo a
permitir seu uso por distintos analistas em um mesmo texto) e pertinentes (em relação com os
objetivos e com o conteúdo tratado). A análise de conteúdo deve, por fim, permitir o aparecimento
de variáveis e fatores que se ignoravam no início dos trabalhos.
A quantificação é a última etapa da análise de conteúdo, cujo objetivo é permitir o
relacionamento das características dos discursos combinadas ao universo estudado. Novamente,
foram feitas tabelas de frequência, agora das categorias de juízo, com valores de frequência
absoluta (n) e percentual (%). Realizamos o estudo quantitativo com o intuito de comparar as
respostas emitidas pelos alunos na resolução das situações hipotéticas, porém, próximas ao real,
com as estratégias efetivamente empregadas.
Na próxima parte do trabalho serão apresentadas as discussões envolvendo,
especificamente, as causas dos conflitos observados, as estratégias empregadas, as finalizações e,
por fim, a comparação entre o juízo e a ação dos alunos.

111
6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

A fim de satisfazer aos objetivos da pesquisa, a apresentação e análise dos resultados estão
divididos em três momentos. Primeiramente, analisaremos as observações dos conflitos, em três
dimensões: as causas que desencadearam o conflito, as estratégias de resolução empregadas e as
finalizações dos conflitos. Por fim, analisaremos as estratégias de negociação interpessoal
verbalizadas por meio das entrevistas e faremos, então, a comparação entre os juízos emitidos nas
entrevistas e as ações constatadas por meio das observações.
Vale, ainda ressaltar, que os quadros que serão apresentados (causas, estratégias e finalizações
dos episódios de conflitos) tiveram início no estudo realizado por Licciardi (2010), com as crianças
de 3 a 6 anos. Contudo, como há outras pesquisas com os mesmos objetivos e recursos
metodológicos, mas cujos participantes são alunos em idades diferentes - como anteriormente
mencionado -, optou-se por apresentar os mesmos quadros com as causas, estratégias e finalizações
identificadas em todos os estudos - 3 a 6, 8 e 9, 11 e 12 e 13 e 14 anos (MARQUES, C. A. E.;
OLIVEIRA, M. T. A.; SILVA, L. M. F.; VINHA, T. P., 2014).

6.1 A observação dos conflitos

Na primeira escola foram encontrados 70 conflitos: 23 entre os meninos (32,8%), 8 entre


as meninas (11,4%) e 39 intersexuais (55,7%). Diante da pequena quantidade de conflitos
observados entre as meninas, julgou-se necessário observar mais de uma escola, justamente para
assegurar que se tratava não somente do ambiente escolar, ou de cultura própria daquela população,
mas também, de algo referente às características das interações entre meninos e meninas. Após as
observações nas duas escolas, foram registrados um total de 134 episódios de conflitos30, sendo 36
entre os meninos (27,2%), 13 entre as meninas (10,4%) e 85 intersexuais (62,4%).

30
Episódio é um acontecimento que se insere em um conjunto de outros similares. Às vezes, mesmo que o episódio
de conflito finalize, o conflito permanece, ou seja, o desequilíbrio gerado pela oposição permanece. Consideramos
que o episódio de conflito foi finalizado quando cessou-se a interação entre as partes envolvidas.
113
Essa discrepância entre os gêneros tem sido amplamente sinalizada pela literatura como
relevante na compreensão da convivência e dos conflitos vivenciados. As meninas, em geral,
apresentam uma tendência mais prossocial nos relacionamentos, utilizam estratégias mais passivas
(GUIMARÃES E PASIAN, 2006), são menos agressivas e mais submissas (LEME, 2004) e
preferem relações diádicas, com maior compartilhamento de intimidade (SINCLAIR, 2003;
UNDERWOOD, 2004). Chung et al. (2011) ainda sugerem que as adolescentes são mais propensas
a relatar tristeza ou chateação depois do conflito com os colegas (os sentimentos perduram). Essa
tendência mais prossocial e passiva pode explicar o menor número de conflitos presenciados entre
as meninas, simplesmente porque elas podem mesmo se envolver menos em conflitos. No entanto,
a menor agressividade aparente e a maior intimidade em relações mais restritas podem, também,
ter impedido que as observações registrassem os conflitos por elas vivenciados. Como já referido,
essa foi uma limitação da própria técnica de observação. Beneson et al. (2006) ressaltam que as
observações em ambientes naturais - como as aqui realizadas -, possuem a desvantagem de não
possibilitar a detecção de muitas formas sutis de agressão. Assim, os conflitos mais velados, ou os
que aconteciam longe da presença da observadora (que, na sala de aula, ficava localizada no fundo
em razão dos mapas de classe pré-determinados), podem ter sido realmente menos identificados, o
que também pode explicar tal discrepância entre os gêneros. O conflito descrito a seguir ajuda a
exemplificar essa discussão:

Alice pede para sentar junto com a Clara e com a Lorena (estão fazendo a
atividade em dupla). Clara fala: "pode vir." Elas formam um trio com as
carteiras. Durante a conversa, Clara fala (bem baixo, quase inaudível): "a
Lorena é minha melhor amiga, Alice". Alice fala: "eu também tenho outra
melhor amiga..." (demonstra ter ficado meio sem graça). As três param de falar
e continuam a copiar a lição da lousa.

Nesse diálogo há um conflito mais velado, em que não há alteração no tom de voz e nem
outros comportamentos explícitos de oposição. A fala das meninas acontece com muita discrição, o
que dificulta a identificação e o detalhamento das características da desavença, constatação essa,
melhor analisada a seguir.

6.1.1 As causas dos conflitos interpessoais

114
Na perspectiva piagetiana, os conflitos interpessoais ocorrem quando há um desequilíbrio
nas interações sociais, percebido por comportamentos externos de oposição ou por manifestações
sutis da afetividade, tais como, expressões, tom de voz ou gestos.
As causas geradoras de conflitos, por sua vez, são múltiplas e, em nosso caso, puderam ser
identificadas por meio da análise minuciosa de todo o contexto do conflito observado. A
dificuldade em vislumbrar o motivo da desavença se deu, muitas vezes, pela impossibilidade de
acompanhamento do início do conflito. Na maior parte das vezes, só conseguíamos perceber as
evidências de um conflito quando o tom de voz se modificava, quando o teor das palavras se
tornava agressivo, quando havia uma mudança explícita de comportamento, ou quando havia
agressão física, por exemplo.
Dessa forma, geralmente conseguíamos identificar o conflito e daí observá-lo
cuidadosamente, quando se tornava evidente o caráter de oposição ou quando as estratégias de
resolução já estavam sendo executadas. Nos conflitos mais velados, característicos principalmente
entre as meninas, na maior parte das vezes, era a mudança no padrão de interação (afastavam as
carteiras umas das outras, paravam de se falar, ou não andavam mais juntas no intervalo) que nos
revelava que algo havia acontecido e merecia maior exploração. Dessa forma, as causas foram
melhor explicitadas pelas conversas realizadas após o término do evento conflitivo. Esperávamos,
muitas vezes, os ânimos se acalmarem e perguntávamos, aos envolvidos, separadamente, o que
havia gerado a discordância, tomando sempre o cuidado da discrição e de não transparecer nenhum
tipo de posicionamento ou julgamento por uma das partes. Quando havia a evidência de algum tipo
de contradição nas falas, outros alunos que estavam próximos ou que assistiram ao conflito também
eram entrevistados para um melhor esclarecimento. Ao final, mesmo com essas intervenções
descritas, dois conflitos observados não puderam ter suas causas identificadas e foram, então,
excluídos.
Serrano e Guzman (2011) afirmam que as causas dos conflitos, ou seja, os motivos que
levam aos desacordos interpessoais, podem ser agrupados em duas amplas categorias: causas
pessoais (oposição de valores, disputa de poder, rumores, falta de respeito, desconfiança, invasão
de intimidade, entre outros) e causas sociais (processos de mudança social, a própria diversidade
cultural, pontos de vista diferentes em grupos, falta de comunicação, imposição de critérios a
pessoas ou grupos, declarações públicas que causam tensão, entre outros).

115
Entretanto, buscando maior minuciosidade na análise, foram elaboradas categorias mais
específicas aos conflitos presenciados, baseadas, principalmente, no trabalho realizado por
Licciardi (2010) com as crianças de 3 a 6 anos, na pesquisa dessa mesma autora com os alunos de
8 e 9 anos (SILVA, 2015) e na pesquisa com os alunos de 13 e 14 anos (OLIVEIRA, 2014).
De forma resumida, o quadro V, a seguir, apresenta as categorias, suas descrições e os
exemplos que foram retirados dos protocolos de observação dessas pesquisas. Dessa forma, como
há, também, o objetivo maior de identificar essas causas nas diferentes idades, todas as 18
categorias observadas foram incorporadas e uniformizadas, o que explica porque algumas podem
não aparecer nos resultados da presente pesquisa. Destaca-se que as categorias disputa (DAWE,
1934), provocação (KELTNER, 2001), reação ao comportamento perturbador (LAURSEN, 1995),
fofoca, exclusão, ciúmes (SINCLAIR, 2003; NOAKES e RINALDI, 2006), responsabilidade
objetiva (PIAGET, 1932), delação (MENIN, 1996) foram baseadas na literatura sobre o assunto.
As demais foram criadas a partir da observação das interações entre os alunos.

Quadro V: Categorias das causas de conflitos

Categorias Descrição

Responsabilização acerca da violação de uma regra institucional ou


1- Acusação duvidosa (AD) de boa convivência, sem ter presenciado ou ter certeza.
Ex: afirmar que um colega lhe furtou algo.

Comportamentos que envolvem algum tipo de ação física contra o


2- Agressão física (AF) outro ou ameaça de agressão.
Ex.: bater, chutar, empurrar, arranhar, beliscar.

Manifestação verbal que insulta ou magoa o outro.


3- Agressão verbal (AV)
Ex.: chamar o outro de burro, de idiota.

4- Delação (DL) Denúncia ou revelação à autoridade da desobediência de um colega a


uma regra ou à solicitação do adulto.
Ex: contar para o professor que o colega violou uma regra da escola.

5- Deslealdade (DS) Traição ou falta de consideração a alguém.


Ex: não estar ao lado do amigo em uma situação de conflito; contar
um segredo.

Divergência de opinião acerca de como se dá o funcionamento do


6- Discordância das regras do jogo
jogo.
(DI)
Ex.: discutir a pontuação de um jogo coletivo.

116
Concorrência pela atenção ou companhia do melhor amigo, uma vez
que na concepção das crianças não se pode ser o melhor amigo de
7- Disputa de amigos (DA)
duas pessoas.
Ex.: o melhor amigo vai brincar com outro colega
8- Disputa física (DF)
Concorrência pela posse de lugares ou de objetos específicos.
Ex.: desejar o mesmo lugar no banco do refeitório

Concorrência por ter razão, por mandar, dirigir ou controlar o outro.


9- Disputa por poder/status (DP)
Ex.: discutir sobre quem assumirá a liderança da equipe.

Ação de privar, afastar, eliminar ou ignorar a participação do outro


das relações ou das atividades.
Ex.: impedir que um colega participe de uma brincadeira ou dizer que
10- Exclusão (EX)
não irá brincar com ele se não atendê-lo; excluir o outro da amizade
ou ameaçá-lo de fazê-lo (“ficar de mal”, dizer que não será mais
amigo).

Despeito por ver alguém possuir algo que também se deseja.


11- Inveja (IN)
Ex: desejar ter o cabelo igual ao do outro.

Comportamentos físicos ou verbais que misturam conteúdo de


hostilidade e humor.
12- Provocação (PR)
Ex: cutucar, imitar, colocar apelidos, fazer comentários
depreciativos.

Reação diante de um ato cometido sem a intenção de desagradar, mas


que acaba gerando irritação, insatisfação, incômodo ou
13- Reação ao
aborrecimento no outro, que não elege a intenção do autor da ação
comportamento perturbador (RC)
como central em seu julgamento ou forma de agir.
Ex: fazer um comentário ou ter um comportamento que desagrada
alguém.

Ações sem intenção de provocar ou machucar, mas que geram


conflitos, uma vez que a outra parte não percebe/considera a real
14- Responsabilidade objetiva (RO) intenção do iniciador. O que está em jogo aqui é que se a suposta
vítima considerasse a real intenção, o conflito não aconteceria.
Ocorre com crianças em fase de realismo moral.
Ex.: esbarrar na carteira do colega, tropeçar e cair sobre o outro.

Comportamentos de ignorar o pedido insistente de uma das partes.


15- Súplica ignorada (SI) Ex.: negar ou demonstrar indiferença diante de pedidos repetidos do
colega para que a criança se sente ao seu lado ou para irem juntas ao
banheiro.

Desobediência a uma regra da brincadeira ou do jogo.


16- Trapaça (TR)
Ex.: criança que pega a bola com a mão no jogo de futebol.

117
Desobediência a uma norma imposta, regra acordada ou a uma
17- Violação de regra (VR)
demanda do adulto (ordem, orientação, recomendação ou pedido).
Ex: executar sem autorização uma tarefa demandada pela professora
a outro aluno.

Falta de interesse, indiferença, atitude desdenhosa, distante ou fria.


18- Menosprezo (ME) Ex: responder de forma monossilábica a algo que alguém conta
entusiasmado.
Fonte: MARQUES, C. A. E.; OLIVEIRA, M. T. A.; SILVA, L. M. F.; VINHA, T. P. (2014)

Para melhor compreensão da presente pesquisa, no gráfico, a seguir, as categorias


específicas dos alunos de 11 e 12 anos estão organizadas de acordo com a porcentagem de
ocorrência. As categorias que mais causaram conflitos foram a provocação (45,24%) e a reação ao
comportamento perturbador (27,78%), como ilustra o gráfico abaixo:

Figura I: Porcentagens para as causas nos alunos de 11 e 12 anos

CAUSAS
45,24%

27,78%

5,56% 6,54%
3,17% 2,38% 2,38% 2,38%

Como anteriormente mencionado, a categoria de maior ocorrência (45,24%) foi a


provocação. Aho (1998); Agliata et al. (2007) e Keltner et al. (2001) também ressaltam a extrema
frequência das provocações por pares na escola, principalmente no período em torno da
adolescência, como é o caso dos participantes observados (11 e 12 anos). Esse índice é confirmado,
ainda, pela realização da análise estatística relacionando causa e idade (Teste Exato de Fischer): a
118
frequência de provocações (PR) nos alunos de 11 e 12 anos (45,24%) é significativamente maior
do que nas crianças de 8 e 9 anos (40,16%), conforme fica explícito na tabela I a seguir. Os grifos
e os destaques em negrito sinalizam que a diferença entre os valores é significativa31:

Tabela I: Comparação das variáveis categóricas DA, DF e PR entre as faixas etárias 8-9
e 11-12
Causa Idade
Frequency,
Col Pct , 8-9 ,11-12 ,
---------+--------+--------+
DA , 7 , 0 ,
, 5.74 , 0.00 ,
---------+--------+--------+
DF , 10 , 3 ,
, 8.20 , 2.38 ,
---------+--------+--------+
PR , 49 , 57 ,
, 40.16 , 45.24 ,
---------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.036

O conflito que se segue exemplifica esse tipo de comportamento:

Sara está andando e conversando comigo pelo corredor da escola e Gustavo


passa e puxa sua mochila das costas, que cai no chão. Ele vai embora dando
risada. Sara diz, brava: "Idiota!" Depois se vira para mim e fala: "Você viu,
dona, como ele é um idiota”?

Como fica evidente no evento descrito, trata-se de uma provocação física (puxar a mochila),
claramente caracterizada, por parte do provocador, pela dupla postura hostil (derrubar a mochila
no meio do corredor) e de humor (ele sai dando risada), conforme definido pela literatura
(KELTNER et al., 2001; HOOVER e OLSON, 2000; SHAPIRO et al., 1991; TRAGESSER e
LIPPMAN, 2005; YOUNG et al.,1998; ROSS, 2003). Entretanto, considerando-se a reação de
Sara, essa situação também demonstra o lado não social da provocação, ou seja, a provocação pode
dar vazão a possíveis reações emocionais negativas e consequências muitas vezes indesejáveis ao

31
As tabelas inseridas no texto foram retiradas do relatório completo da análise estatística (ANEXO B) e foram
recortadas para simplificar a leitura.
119
alvo. Aliás, independentemente da intenção do provocador, vários autores são categóricos em
afirmar que os provocados geralmente saem da provocação com uma avaliação mais negativa da
experiência do que o provocador (SHAPIRO et al., 1991; YOUNG et al., 1998; TRAGESSER e
LIPPMAN, 2005; KRUGER et al., 2006), o que realmente aconteceu na situação de Sara e Gustavo
e nas outras observadas. Com exceção das provocações como jogos intersexuais – melhor
analisadas a seguir -, todas as outras experiências de conflitos registradas, cujas causas eram a
provocação, tinham a característica de serem antissociais, ou seja, refletiam certo grau de
intimidação e hostilidade (BARNETT et al., 2004). Embora tenhamos até observado provocações
de caráter mais prossocial entre os alunos - que refletem e incentivam positivamente as relações
interpessoais -, estas não se configuraram em conflitos explícitos entre os envolvidos e, dessa
forma, obviamente, não foram focalizadas em nossas observações.
Embora o exemplo citado retrate uma provocação física, 66,6% das provocações
observadas foram verbais, ou seja, referiam-se a situações como: colocar apelidos, falar de forma
sarcástica, rir do colega, fazer comentários depreciativos a algum comportamento ou atributo, entre
outras, como exemplificado a seguir:

(Lorena chora baixo em sua carteira). Fred: "Lorena chorona!" (ao passar pela
carteira dela). Lorena fala alto: "Eu vou bater nesse Fred". Fred se aproxima
novamente e diz próximo ao ouvido dela: "Lorena chorona!" Ela: "Eu vou pegar
esse Fred!" Ele volta para sua carteira.

Esse dado vai ao encontro do que a literatura discorre acerca da influência do


desenvolvimento no tipo de provocação cometida. Devido às mudanças cognitivas que refletem
uma crescente capacidade de abstração e generalização (INHELDER e PIAGET,1976), há uma
maior competência, também, na apreciação e compreensão do humor, da insinuação e da ironia
durante o início da adolescência, o que a caracteriza como prioritariamente verbal nesse período
(KETNER et al., 2001, ROSS, 2003). Ademais, Licciardi (2010) também apresenta, em seu estudo,
a tendência de que, quanto mais velha a criança, mais os conflitos se dirigem ao controle do
ambiente social em detrimento do físico.
Quanto às diferenças entre os gêneros, é preciso destacar que 96,1% dos conflitos gerados
por provocação tiveram como autores os meninos, sendo 76% desses, dirigidos às meninas. Ketner
et al. (2001) também sugerem, com base em avaliações empíricas, que há uma diferença entre os

120
gêneros no que se refere à provocação, sendo os homens, em qualquer idade, realmente mais
provocadores do que as mulheres. Barnett et al. (2004) e Conoley et al. (2007) assinalam, ainda,
que os meninos têm maior inclinação a ser tanto provocadores antissociais como prossociais do
que as meninas. Aliás, de forma geral, as meninas são consideradas mais maduras do que os
meninos tanto fisicamente, quanto psicologicamente durante a pré-adolescência (VUCHINICK et
al., 1996).
Já, entre as provocações iniciadas por meninas (3,9% do total), a maioria (71,4%) também
era direcionada aos meninos. De forma geral, considerando todos os tipos de conflitos de
provocação observados, vale ressaltar novamente que 56,41% referiam-se a provocações
intersexuais (sendo esse um resultado significativo na análise estatística comparativa entre gêneros,
conforme visto na tabela II ), o que vai ao encontro do que a literatura sobre adolescência também
indica (LAURSEN e COLLINS, 1994, UNDERWOOD, 2004; THOLANDER, 2002, ROSS,
2003): a partir da adolescência, os conflitos entre amigos do mesmo sexo tendem a declinar e inicia-
se a exploração do mundo do sexo oposto, com frequentes interações classificadas como
borderwork: provocações, perseguições, entre outras.

Tabela II: Comparação das variáveis categóricas DP, PR e RC entre os gêneros


Causa Sexo
Frequency,
Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX,
---------+--------+--------+--------+
DP , 1 , 2 , 4 ,
, 2.94 , 15.38 , 5.13 ,
---------+--------+--------+--------+
PR , 12 , 1 , 44 ,
, 35.29 , 7.69 , 56.41 ,
---------+--------+--------+--------+
RC , 13 , 4 , 17 ,
, 38.24 , 30.77 , 21.79 ,
---------+--------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001

Essa grande frequência dos conflitos intersexuais trouxe à tona, ainda, uma característica
específica da provocação ainda não presente nas pesquisas com as idades anteriores, por nós
classificados como jogos intersexuais. Exatamente, 15,7% das provocações observadas foram
consideradas como tendo esse teor de flerte embutido, como bem exemplificado a seguir:

121
Luca fica cutucando com o dedo as nádegas de Clara e ela grita: "Para!"! Ele
cutuca o ombro dela e ela levanta e o empurra. A professora olha e o Luca fala
sorrindo: "Olha ela professora"! Marcos fala: "É ele que fica abusando da
Clara". A professora não fala nada. Logo depois, Luca se aproxima da Clara de
novo e fica cochichando em seu ouvido com a mão na boca para que eu não
ouça. Clara ri baixinho enquanto copia a sua lição. Marcos fica do lado ouvindo
e diz: "Bate nele, Clara!" Ela fala: "Não vale a pena". Ele continua a cochichar.
Ela fala sorrindo: "Cala a boca Luca!" Marcos continua a falar: "Bate nele".
Escuto ela dizer baixinho para o Luca: "Não fico andando pelada pela classe!"
Depois de um tempo ela fala: "Professora, manda o Luca parar, que ele tá
falando besteira pra mim". Ele sai de perto. Clara continua a copiar a lição.

Essa situação explicita claramente o caráter provocativo do conflito: mistura de um


conteúdo de hostilidade e de humor. Contudo, há uma intenção de sedução e um componente de
certo prazer nos dois alunos envolvidos, que o diferencia dos outros tipos de provocações
observados. No caso relatado, Clara é uma menina que se destaca na classe tanto pelas roupas
ousadas e pela maquiagem excessiva, como pelo próprio desenvolvimento físico avançado para a
idade, o que ajuda a contextualizar os comportamentos dos meninos em questão. Embora haja,
inclusive, um componente de bolinagem32, há, também, juntamente com o incômodo, um grau de
contentamento por parte de Clara, justamente pela ação de Luca reforçar uma imagem que ela
deseja ter de si. Ademais, coerentemente com uma situação típica de sedução, é interessante
perceber o que parece se configurar como certo sentimento de ciúme da relação entre Clara e Luca,
representado explicitamente pela postura de Marcos no conflito.
Keltner et al. (2001) são alguns dos autores que assinalam a presença frequente de
provocação no contexto de flerte, como se enquadra o caso supracitado. Particularmente na
adolescência, Vicentin (2009); Gorrese e Ruggieri (2012); Serrano e Guzman (2011) também
demarcam que, em razão da potencialização da sexualidade, o interesse pelo gênero oposto
aumenta significativamente, tanto que os agrupamentos dos adolescentes deixam, inclusive, de
acontecer com pessoas do mesmo gênero, passando a ser prioritariamente mistos. Embora
estejamos analisando especificamente o início da adolescência, já fica nítida a presença de uma
intenção inexistente nas provocações das idades anteriores, o que nos faz também supor que esse
comportamento tende a ser intensificado com o avançar do desenvolvimento.

32
Tocar e apalpar o corpo do outro ou fazer gestos com intenções libidinosas, principalmente em locais públicos.
122
Herculano-Housel (2009) acrescenta que é justamente durante esse período, o início da
adolescência, que as mudanças no hipotálamo fazem com que o cérebro, pela primeira vez, se
interesse pelo sexo. Essa dimensão maturacional, contudo, não pode estar desvinculada de uma
dimensão de contexto. Selman et al. (2014), aliás, são explícitos ao afirmar a importância da
integração de uma perspectiva contextual com a análise do desenvolvimento em qualquer tipo de
análise. No caso dos nossos participantes, essa coesão fica evidente nos jogos intersexuais
observados: a provocação como flerte era iniciada pelos meninos e direcionada, especialmente, às
meninas consideradas mais bonitas pelo grupo. As meninas mais tímidas ou as consideradas menos
atraentes eram provocadas de forma antissocial.
A segunda categoria de maior frequência (29%) foi a reação ao comportamento perturbador
(RC), por nós definida como uma reação diante de um ato cometido sem a intenção de desagradar,
mas que acaba gerando irritação, insatisfação, incômodo ou aborrecimento no outro, que pode ou
não levar em consideração as motivações do autor da ação. O que está em jogo não é a interpretação
da intenção, mas o ato que desagrada.
Diferentemente da categoria “responsabilidade objetiva” encontrada nas causa dos conflitos
das crianças de 3 a 6 anos (LICCIARDI, 2010), em que o indivíduo, ainda egocêntrico,
desconsidera a intencionalidade dos atos alheios na avaliação do dano (Piaget, 1932-1994), na
reação ao comportamento perturbador fica evidente que a questão não é a incapacidade de
considerar a intenção da ação do outro (a motivação do outro é periférica no julgamento), mas, sim,
que a ação cometida realmente gerou um incômodo, um desequilíbrio, como bem exemplificado a
seguir:

Renan: "Eric, você sabe o que é ‘she’? Que página do livro que é?" Eric
(gritando): "Renan, pare de perguntar, pergunte pra professora, saco!" Renan:
"É só uma dúvida, pô!" Professora: "Renan, o que você está perdido?" Eric: "Ele
só fica me perguntando a página, professora, me irritando!" Professora: "É a
página 27, pegue a apostila agora!" Renan obedece.

Como pode ser notado nesse evento, o fato de se sentir incomodado pela ação de Renan não
necessariamente causaria um conflito interpessoal, se Eric tivesse dito o que sentia e pensava de
forma mais assertiva e respeitosa e não de forma agressiva. A tendência de resolução mais assertiva
inclui a regulação dos impulsos, a tolerância, a negociação e a conciliação e tem como objetivo um
desfecho favorável para todos os envolvidos. É a mais desejável, e, também, a mais evoluída, posto
123
que o sujeito considera os próprios direitos, sentimentos e ideias e os explicita, sem com isso lesar
os alheios (LEME, 2011b). Acontece que, conforme as pesquisas indicam, a assertividade, como
tendência de resolução de conflito, é a menos presente nos adolescentes, que atuam muito mais de
forma submissa, seguido da agressiva (LEME, 2004; CARINA, 2008; VICENTIN, 2009b).
Segundo Deluty (1979), a tendência submissa é considerada pacífica (assim como a
assertiva) e ela geralmente nem chega a gerar um conflito interpessoal, pois o sujeito se esquiva da
situação. Pode-se supor, assim, que os conflitos observados tiveram como resposta ao desagrado
estratégias mais agressivas por parte do incomodado, pois são justamente essas que geram mais
desequilíbrio nas interações e, portanto, mais desavenças. Tal hipótese é confirmada ao se analisar
as estratégias dos alunos.
Embora o tema das estratégias seja melhor discutido posteriormente, ao analisar,
especificamente, as respostas frente à ação que gerou desagrado (RC), 80,7% dos alunos usaram
estratégias unilaterais (UN), que controlam o outro pelo uso da imposição e não da negociação,
não havendo, portanto, consideração pelos interesses e desejos deste (“Renan, pare de perguntar,
pergunte pra professora, saco!”) – resultado, inclusive, considerado significativo pela aplicação
do Teste Exato de Fisher:

Tabela III: Comparação das variáveis categóricas CO, FI e UN entre as causas


Estrateg Causa
Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,DF ,DI ,DL ,DP ,PR ,RC
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------
CO , 1 , 0 , 0 , 2 , 2 , 0 , 3 , 8 , 6
, 20.00 , 0.00 , 0.00 , 11.76 , 11.11 , 0.00 , 8.11 , 3.46 , 4.44
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------
FI , 0 , 1 , 1 , 3 , 3 , 0 , 3 , 63 , 20
, 0.00 , 25.00 , 12.50 , 17.65 , 16.67 , 0.00 , 8.11 , 27.27 , 14.81
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------
UN , 4 , 3 , 7 , 12 , 13 , 8 , 31 , 160 , 109
, 80.00 , 75.00 , 87.50 , 70.59 , 72.22 , 100.00 , 83.78 , 69.26 , 80.74
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.002

Em seguida, há o emprego das estratégias físicas e impulsivas (bater, empurrar, etc.)


(14,81%) e, por último, das cooperativas (argumentar, sugerir, reparar espontaneamente, etc.)
(4,44%%), que seriam consideradas as mais evoluídas nessa amostra e mais compatíveis com a
tendência assertiva, justamente por apresentar maior nível de coordenação e tomada de perspectiva

124
(SELMAN, 1980). O conflito descrito a seguir exemplifica a estratégia unilateral que foi a mais
utilizada pelos adolescentes frente à ação ao comportamento perturbador:

Professora fala que o Luca é “freguês da diretoria” e que vai mandá-lo de novo
se ele não parar de falar. Renan ouve isso e fala, dando risada: "Nossa!" (toda
a classe ri). Luca fala para Renan: "Você vai ver o que o freguês vai fazer na
sua cara!" Renan não responde e olha para frente. A professora não escuta a
conversa entre os dois.

Estudos subsequentes, com faixas etárias posteriores, poderão indicar se as respostas mais
agressivas ao comportamento perturbador se modificam em consonância com o que as normas
sociais de convivência preconizam, ou seja, em razão de um aprendizado social ou de um
desenvolvimento. De qualquer forma, comparando com os sujeitos de 8 e 9 anos, já se percebe uma
evolução em termos de contenção da impulsividade nas estratégias utilizadas diante do
comportamento perturbador. Embora as estratégias unilaterais (UN) sejam predominantes nas duas
faixas etárias (8-9 e 11-12), as crianças de 8 e 9 anos apresentam maior frequência de estratégias
físicas e impulsivas (FI) na reação ao comportamento perturbador (37,89%) do que os alunos de
11 e 12 anos (14,81%).
Leme (2004) indica a existência de uma trajetória em direção a uma maior conformidade
social, pelo aumento da tendência à submissão com o tempo. Segundo a autora, as tendências de
resolução de conflitos são provavelmente aprendidas com exemplos, como pais, professores e
outros meios de influência, que podem agir como modelos ou como esquemas de solução de
problemas desse tipo, ou mesmo, podem estimular voluntária ou involuntariamente atitudes mais
submissas, por associá-las a comportamentos considerados mais prossociais.
De qualquer forma, a categoria de reação ao comportamento perturbador demonstra,
claramente, uma evolução com relação à condição de perceber a intenção do outro, quando
comparada à categoria de responsabilidade objetiva presente nos conflitos observados em idades
anteriormente estudadas (LICCIARDI, 2010). Percebe-se que não é a falta de consideração da
intenção alheia e nem uma atribuição ou interpretação nociva aos atos alheios que provocam a
resposta agressiva, mas muito mais a condição de se sentir incomodado com o outro, o que também
pode ser compreendido, especialmente nessa faixa etária, como característico do egocentrismo
adolescente (INHELDER e PIAGET, 1976). Os adolescentes, em razão de seu próprio
desenvolvimento, não negam que outras pessoas tenham propósitos ou crenças diferentes das suas,
125
apenas se tornam muito mais centrados em suas próprias ideias e sentimentos, voltados para si,
para o respeito de si.
Coleman (2011) ainda aponta que devido às mudanças típicas no sistema límbico do
cérebro, os adolescentes tornam-se, geralmente, excessivamente afetados por situações de stress,
o que os torna, assim, mais intolerantes. Hernaez e Garcia (2013) acrescentam que, na adolescência,
qualquer perturbação passageira, seja pessoal ou social, tem uma repercussão psicológica maior do
que em outros momentos da vida.
Mesmo considerando as perspectivas específicas dessa fase do desenvolvimento, um dado
chama a atenção quando se compara estatisticamente a frequência das causas entre as faixas etárias:
não existe diferença significativa na quantidade de conflitos causados por reação ao
comportamento perturbador (RC) entre as crianças de 8 e 9 anos (27,8%) e as de 11 e 12 anos
(27,7%), conforme explicita a tabela IV:

Tabela IIV: Comparação das variáveis categóricas AD, AF, AV, DI, DL, DP, EX e RC entre as
faixas etárias 8-9 e 11-12
Causa Idade
Frequency,
Col Pct , 8-9 ,11-12 ,
---------+--------+--------+
AD , 1 , 2 ,
, 0.82 , 1.59 ,
---------+--------+--------+
AF , 1 , 2 ,
, 0.82 , 1.59 ,
---------+--------+--------+
AV , 1 , 3 ,
, 0.82 , 2.38 ,
---------+--------+--------+
DI , 0 , 4 ,
, 0.00 , 3.17 ,
---------+--------+--------+
DL , 3 , 3 ,
, 2.46 , 2.38 ,
---------+--------+--------+
DP , 5 , 7 ,
, 4.10 , 5.56 ,
---------+--------+--------+
EX , 4 , 1 ,
, 3.28 , 0.79 ,
---------+--------+--------+
RC , 34 , 35 ,
, 27.87 , 27.78 ,
---------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.036


126
A partir desse indicador, pode-se vislumbrar uma ampliação da discussão para uma
dimensão que inclui uma característica também própria da sociedade pós-moderna: tem-se um
indivíduo que, em geral, se caracteriza pela busca incessante do prazer, essencialmente voltado
para seus próprios desejos e necessidades emocionais. Para Bauman (1998), um dos sintomas
mais evidentes da contemporaneidade é a intolerância ao que se expressa como diferente, gerado
por esse contexto narcísico de satisfação.
A noção de tolerância, por sua vez, é apresentada por Freire (2004), como a ação de lidar
com o diferente por meio de atitudes não-violentas (não coercitivas, vingativas ou expiatórias) - e
nem permissivas –, na defesa de princípios. A autora encontra, em seu estudo psicogenético sobre
a tolerância, que os sujeitos de 9 e 12 anos, em função, ainda, do próprio desenvolvimento moral,
oscilam entre a tolerância e a intolerância em suas respostas diante de histórias de conflito fictícias,
embora os de 12, quando comparados aos de 9 anos, apresentem um maior número de respostas de
reciprocidade e de tolerância, o que pode justificar, em parte, o também crescente controle da
impulsividade com o avançar da idade (de 8 e 9 a 11 e 12 anos), anteriormente descrito.
Ademais, embora as reações de desagrado presenciadas na presente pesquisa ainda tenham
sido claramente marcadas por aspectos de intolerância ao outro (uso de estratégias unilaterais
bastante coercitivas, vingativas e expiatórias), fica evidente uma evolução na concepção de
conflito, cada vez mais distante de uma perspectiva física e momentânea.
Vale, ainda, destacar que, nas duas escolas, a maior parte das atitudes de desagrado era
disparada preferencialmente em direção aos alunos considerados excluídos dos grupos de amizade.
Pingoello (2012) apresenta algumas características dos alunos considerados excluídos, sendo elas
(em ordem decrescente de frequência): timidez, comportamento indisciplinar, rendimento escolar
abaixo da média, comportamento agressivo, faixa etária diferente dos demais alunos da sala,
rendimento escolar acima da média e comportamento ou forma de se vestir diferenciado. Nas salas
observadas, acrescentam-se, ao já descrito, os meninos que conviviam preferencialmente com as
meninas em detrimento à convivência com os meninos. Keltner et al. (2001) também encontra esse
mesmo dado, mas com relação à provocação (final da infância e início da adolescência):
especialmente os meninos são frequentemente provocados se interagem repetidamente com alguém
do gênero oposto.

127
Tal consideração leva à compreensão da baixa preocupação com a manutenção do
relacionamento presenciada nas relações, justamente pelo significado pessoal que é atribuído ao
valor do relacionamento (SELMAN, 2002).
A maioria das atitudes ao comportamento perturbador (65%) não aconteceu com relações
em que o agressor parecia pretender preservar (entre amigos). Pode-se, então, levantar a hipótese
de que tal atitude pode acontecer principalmente com relações que eles não se importam em manter
e, também, provavelmente, com relações estáveis, como as entre irmãos.
Rose e Asher (1999) relacionam que, geralmente, quando há a pretensão de se preservar o
relacionamento, há, também, a preferência pela escolha de estratégias mais assertivas, ao invés de
estratégias mais agressivas e hostis. Ficou nítida, nas observações, a não conservação de um rancor
por parte do agredido, assim como por parte do incomodado/agressor. Era comum verificar certo
constrangimento por parte do agredido logo após o acontecido, mas era também comum visualizar,
pouco tempo depois, os envolvidos conversando e interagindo, como se nenhum tipo de desagrado
tivesse acometido a relação. O relacionamento era mantido, sem aparentes marcas negativas, como
se houvesse uma certa naturalização de tal tipo de reação.
Aliás, o único conflito desse tipo em que houve um rompimento temporário da relação
aconteceu entre duas meninas amigas, conforme descrito a seguir:

Marina está sentada ao lado da Tatiana. De repente Marina fala alto: "Para de
encher meu saco, Tatiana!" Tatiana começa a rir sem graça. Marina repete:
"Para de encher!" Professora escuta e manda as duas separarem as carteiras.
Tatiana não fala nada. (...) Pergunto para Marina o que aconteceu e ela faz sinal
negativo com a cabeça. Pergunto se a Tatiana a irritou e ela responde que sim.
As duas ficam separadas e não conversam mais. Tatiana evita cruzar o olhar
com o meu. Na outra aula, Tatiana faz a atividade sozinha, enquanto a Marina
e a Alice sentam juntas. Marina e Alice ficam cochichando (aparentemente)
sobre a Tatiana, mas não consigo ouvir o que é. No intervalo, pergunto para a
Tatiana o motivo da briga e ela diz (sorrindo): "É que ela me perguntou se o
cantor Luan Santana tinha namorada e eu disse que sim e daí ela ficou brava e
começou a chorar!" Eu: “Você disse a verdade pra ela?" Ela: "Era verdade, ele
tem namorada sim!" Eu: "Então você está me dizendo que ela ficou brava porque
o Luan tem namorada?" Ela: "A Marina ama o Luan!" Eu: "E vocês não estão
mais se falando?" Ela: "Até agora não, mas à noite ela sempre me liga para
perguntar alguma coisa e daí fica tudo bem de novo". No dia seguinte, pergunto
para Marina se ela já fez as pazes com a Tatiana e ela diz: "Mais ou menos..."
Eu: "Por que mesmo vocês brigaram, Marina?" Ela: "Não foi nada, tia..." e olha
para o caderno, fingindo escrever alguma coisa. Depois de um tempo, Alice olha
128
para mim e diz: "Sabe por que a Marina brigou com a Tatiana, tia? Por que a
Tatiana disse que o Luan Santana já tem namorada e ela ama o Luan...". Marina
escuta e não fala nada.

Esse dado vai ao encontro do estudo feito por Sinclair (2003), cujos resultados apontam que
as meninas possuem maior compartilhamento da intimidade em suas relações, as quais, portanto,
são envolvidas por sentimentos mais intensos do que os que envolvem as relações entre os meninos.
Segundo Gorrese e Ruggieri (2012), as amizades entre as meninas são tipicamente mais profundas
e mais interdependentes do que entre os meninos, o que explicaria tamanho ressentimento da
Marina com a declaração da Tatiana, já que eram amigas bem próximas. Como já explicitado,
Chung et al. (2011) também sugerem, de forma comparativa, que as meninas tendem a conservar
mais os sentimentos de ressentimento após um conflito. Nos conflitos envolvendo a reação ao
comportamento perturbador entre os meninos (38,4%) e nos conflitos intersexuais (21,7%), não
foram encontradas a manutenção da desavença, independentemente do tipo e do grau de amizade
existente.
O sentimento interindividual de antipatia também pode colaborar na discussão acerca dos
alunos considerados excluídos. Tanto a antipatia, como a simpatia, referem-se, para Piaget (1962),
a sentimentos espontâneos que são característicos do segundo estágio na evolução da vida afetiva.
São espontâneos porque, de fato, podem aparecer, desaparecer e flutuar de diferentes formas. A
antipatia, especificamente, corresponde a uma não coincidência de valores, o que gera trocas não
prazerosas. Macedo (2002), contudo, apresenta que, para a teoria piagetiana, tanto a simpatia, como
a antipatia devem subordinar-se à vontade com o desenvolvimento. Dessa forma, a criança supera
uma relação pautada apenas na antipatia por pessoas, por exemplo, pelo desenvolvimento da
operação da vontade.
O ato de vontade, por sua vez, consiste, segundo Piaget (1962), em reverter uma situação,
ou seja, reforçar uma tendência fraca e domar um desejo inicialmente forte. Há, portanto, um
conflito de tendências. Se a tendência inicialmente fraca remove a tendência forte, pode-se, então,
falar de vontade: a vontade venceu o desejo. Para o autor, vontade é, então, comparável às
operações afetivas de coordenação e conservação de valores. Ter vontade é possuir uma escala
permanente de valores e a solução do conflito consiste em uma subordinação da situação vigente
aos valores permanentes. De maneira contrária, não ter vontade significa possuir somente valores
instáveis e momentâneos, não sendo capaz de sustentar-se em uma escala de valores.
129
A operação da vontade, entretanto, requer o desenvolvimento da coordenação entre meios
e fins, consideração de múltiplas perspectivas, respeito mútuo, tolerância a frustrações, além da
sensibilidade ao outro e a escola tem muito a contribuir nessa superação. Assim como foi observado
por Licciardi (2010) na Educação Infantil, também verificou-se que, infelizmente, a conduta dos
professores reforça a antipatia (e, portanto, a intolerância) entre os alunos quando há exposição
desnecessária do aluno, humilhação, penalização, comparação, imposição de soluções para os
conflitos (muitas vezes, injustas), ao invés de um investimento para que percebam e se sensibilizem
com as necessidades do outro.
Freire (2004) acrescenta que a tolerância e a cooperação - como capacidade de se colocar
no lugar do outro, principalmente do adversário -, são fatores fundamentais e necessários para
relações harmoniosas. A tolerância, tão necessária para se alcançar relações mais pacíficas,
depende muito da vivência de se colocar no lugar do outro, do respeito mútuo, da reciprocidade e
da cooperação. Contudo, a autora ressalta que, para se alcançar tais inspirações, há a necessidade
de serem proporcionadas situações que oportunizem à criança ou ao adolescente trocas de opiniões
e de pontos de vista e, nisso, as escolas observadas pouco investiam.
Da mesma forma, La Taille (2001) ainda defende que a aprendizagem das regras de polidez
- relacionadas a formas de agir convencionais que expressam, minimamente, respeito e
consideração pelo outro -, também desempenha algum papel no desenvolvimento moral, o que
depõe a favor de um cuidado especial para a prática da polidez, já durante a infância. Contudo,
diferentemente do que foi observado durante o estágio de doutorado sanduíche nas escolas públicas
de Massachussets/USA33, a polidez não fazia parte do currículo a ser trabalhado com os alunos
participantes de forma planejada e sistemática.
Por fim, vale retomar, a partir dos conflitos observados, que os alunos até identificam, mas
não consideram a intenção do outro como relevante em seus julgamentos. Contudo, considerar a
intenção do outro como central no julgamento poderia ser mais um aspecto que também favoreceria
o fortalecimento da autorregulação nos sujeitos.

33
Guidelines on Implementing Social and Emotional Learning Curriculo. Disponível em
http://www.doe.mass.edu/frameworks/. Data de acesso: 14/11/2014.
33
2013 Casel Guide – Effective Social and Emotional Learning Programs. Disponível em www.casel.org. Data de
acesso: 14/11/2014.

130
A terceira causa mais frequente nos conflitos refere-se à disputa por poder/status (5,5%).
Embora expressivamente menos frequente do que as duas causas anteriormente analisadas
(provocação e reação ao comportamento perturbador), a disputa, em geral, merece um destaque
quando comparada aos conflitos similares presenciados nas idades anteriores, justamente por sua
evolução ao longo do desenvolvimento.
Licciardi (2010) apresenta, em seu estudo, uma tendência crescente ao controle do ambiente
social em detrimento do físico. Embora haja um decréscimo estatístico significativo com relação
às crianças de 8 e 9 anos (8,20%), a concorrência pela posse de lugares ou de objetos específicos
(disputa física - DF) ainda é identificada nos alunos de 11 e 12 anos (2,38%), conforme já
demonstrado na tabela I.
O relato do conflito entre Alice e Luca exemplifica tal desavença:

Alice senta no lugar de Luca e ele se aproxima, põe sua mochila na cadeira e
fala: "Sai daí que o lugar é meu!" Ela: "Sai você, eu cheguei primeiro!" Ele:
"Mas é o meu lugar!". Luca a empurra. Ela grita: "Para, sai!" (ele senta no
canto, na mesma cadeira que ela). A professora olha para os dois e ele fala:
"Professora, ela está no meu lugar!" Alice responde: "Não é não, professora!"
Professora fala: "Aí é o lugar dele, Alice, vá para o seu lugar!" Alice fala:
"Saco!" e muda de lugar.

Assim como acontece com grande frequência com as crianças menores - 3 e 4 anos (46,8%)
e 5 e 6 anos (37,0%) (LICCIARDI, 2010) -, o que provavelmente, gerou o desequilíbrio
interpessoal no conflito relatado foi que, tanto Luca, quanto Alice, tinham interesse pelo mesmo
objeto. Nesse caso, não era possível compartilhá-lo, por isso se transformaram em adversários. O
que diferencia as faixas etárias, no entanto, é o predomínio nos mais velhos de estratégias mais
unilaterais (70,5%) (como por exemplo, o comando, “Para, sai!” e a terceirização, ao chamar a
professora). As estratégias físicas e impulsivas são as preferenciamente utilizadas pelos mais
novos, embora ainda estejam presentes nos adolescentes (por exemplo, no caso do empurrão de
Luca). Ademais, os maiores já parecem ter desenvolvido a conservação da propriedade, ou seja, a
capacidade de compreender que um objeto tem um proprietário e, portanto, quem o encontra
primeiro não tem o mesmo direito de tê-lo.
No caso citado, percebe-se que Alice até reconhece que a carteira pertence oficialmente a
Luca de acordo com o mapa de classe elaborado pela coordenadora da sala, mas como ele muda
espontaneamente de lugar em cada aula, ela se considerou no direito de ocupar o espaço que
131
anteriormente estava vazio e argumenta em favor disso ("sai você, eu cheguei primeiro!"). Luca,
por sua vez, não cede às demandas de Alice e insiste na posse do lugar ("mas é o meu lugar!"),
mesmo estando acostumado a se sentar em outros espaços.
Redorta (2009) ajuda na compreensão desse comportamento ao afirmar que os conflitos por
disputa de recursos que são escassos tendem a vincular-se a processos de competição e, portanto,
a derivar em processos de poder. De alguma maneira, para o autor, o conflito inicialmente gerado
por um recurso que é escasso, evolui rapidamente para um conflito de poder, o que facilmente é
identificado na atitude de Luca.
O autor cita, ainda, os estudos de Murray, em 1938, acerca da motivação humana para a
realização, associando-a a um processo competitivo, de autossatisfação e de poder. A motivação
de realização pode ser definida como a necessidade, própria do ser humano, de superar obstáculos,
chegar a um patamar mais alto, superar os demais. Algumas pessoas, entretanto, têm essa
motivação mais forte do que outras.
Outro aspecto que merece destaque na análise refere-se à insistência de Luca em ocupar
aquela carteira específica naquele momento, justamente onde Alice já se encontrava, como se a
impossibilidade de acesso à cadeira (escassez), tivesse gerado em Luca um desejo ainda maior de
possuí-la. Redorta (2009) assinala que, principalmente por volta dos 2 anos de idade e durante a
adolescência, o fenômeno de considerar como mais valioso aquilo que se apresenta como mais
inacessível, tem sua capacidade máxima de incidência, concedendo à conquista da posse um alto
poder motivador.
Conclui-se, portanto, que, mesmo durante a disputa pelo ambiente físico, existem,
subjacentes, claras questões psicológicas que se dirigem, em alguma medida, a uma concorrência
também referente a um controle do ambiente social (poder, superação). Vale destacar, como já
mencionado, a pouca incidência da disputa física em comparação às faixas etárias anteriores. Pode-
se supor que, de tanto vivenciarem tal desavença, eles já conseguem, em geral, resolver esses
conflitos rapidamente e, na maior parte das vezes, de forma boa para os envolvidos.
A discussão sobre a necessidade de controle do ambiente social ainda é mais aparente na
categoria da disputa por poder/status (5,56%), como exemplificado a seguir:

A professora de história pede um trabalho em grupo sobre eleições e o João fala:


"Eu serei o candidato!" Alice, que é do mesmo grupo, fala: "Não, eu que sou!"
Ele: "Eu falei primeiro, não vem não!" Ela fala: "Então eu sou a vice." Ele:
132
"Não, vice é o Breno, pode parar, Alice!" Ela fica quieta. No dia seguinte
pergunto para a Alice sobre o trabalho e ela diz que não foi nada, só ajudou a
fazer o cartaz. Perguntei o que ela achava disso e ela disse: "Ah, tanto faz..."

Claramente fica explícita, nesse conflito, a concorrência por uma posição de


reconhecimento ou de status entre João e Alice, que indica, portanto, uma luta por poder. Aliás,
Redorta (2009) assume que o processo competitivo por si só, já pode ser considerado como um
jogo de poder em direção a um prestígio. O prestígio, por sua vez, depende de muitos fatores,
porém um dos mais importantes é o êxito, o triunfo, a ideia que se impõe. O prestígio desaparece
sempre com o fracasso, por isso o uso da fala insistente e tão impositiva (comando) de João para
exercer pressão ou influência sobre Alice.
Vale ressaltar um aspecto importante sobre essa categoria, verificada na análise estatística:
a disputa de poder/status (DP), assim como a discordância das regras do jogo (DI) – melhor
explicitada a seguir -, foram as causas de conflito em que foram utilizadas, significativamente, mais
estratégias do tipo cooperativas (CO), consideradas as mais evoluídas nessa amostra por serem
menos centradas em si e mais argumentativas. A seguinte tabela V a seguir explicita tal resultado:

Tabela V: Comparação da variável categórica CO entre as causas


Estrat_CO Causa
Frequency,
Col Pct , AV ,DF ,DI ,DL ,DP ,PR ,RD
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 3 , 2 , 2 , 3 , 4 , 51 , 29 ,
, 100.00 , 66.67 , 50.00 , 100.00 , 57.14 , 89.47 , 82.86 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 0 , 1 , 2 , 0 , 3 , 6 , 6 ,
, 0.00 , 33.33 , 50.00 , 0.00 , 42.86 , 10.53 , 17.14 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.045

Analisando, então, o conteúdo desses conflitos, percebe-se que as disputas de poder


aconteceram, preferencialmente, nos trabalhos em grupos propostos pelos professores ou, também,
entre grupos rivais de meninas durante o recreio. Já, a discordância das regras do jogo aconteceu,
essencialmente, nas atividades coletivas das aulas de Educação Física. Foram nesses momentos de
convívio social, em que os alunos podiam operar juntos e argumentar em busca de soluções
aceitáveis à maioria, que as estratégias com maior coordenação e tomada de perspectiva ocorreram.
Tal descoberta reforça a importância de um contexto mais cooperativo (Piaget, 1932-1998) em que
133
os procedimentos pedagógicos que incluam a convivência entre os pares sejam efetivamente
valorizados e vivenciados como uma experiência importante para a promoção de desenvolvimento
e para a formação sociomoral do sujeito. Infelizmente, nas duas escolas observadas, tais práticas
eram raras e localizadas em algumas disciplinas específicas, como na de Educação Física, por
exemplo. Em congruência com as indicações de pesquisa que mensurou as atividades escolares no
Brasil (CARNOY, 2005), a utilização de métodos mecânicos e individuais - de memorização,
repetição e cópia -, prevalecia na maioria das aulas.
Especificamente, a categoria discordância das regras do jogo (3,17%) implica uma
divergência de opinião acerca de como se dá o funcionamento do jogo, ou seja, como demonstrado
a seguir, há uma divergência na interpretação das regras, sendo que cada envolvido busca defender
o seu ponto de vista:

Ricardo está jogando xadrez com Paula na aula de Educação Física e começa a
dizer que o jeito que a Paula joga não está certo. Ela: "Está sim, não é Sara?"
Sara: "Lógico que está!" Ricardo chama Leonardo, que está passando e ele fala
que também não conhece o jeito como as meninas estão jogando. Leonardo fala:
"Existe um outro jeito, mas eu jogo igual ao Ricardo." Sara pega, então, o
tabuleiro para ela e diz: "Então vai jogar eu e a Paula." Ricardo: "Mas eu que
ganhei! "Sara: "Dá aqui, vai!" Ricardo levanta, abandona a disputa e vai até os
meninos que estão jogando pingue-pongue. Sara e Paula decidem ir também e
Sara guarda o jogo de damas.

Mais uma vez, explicita-se a necessidade do êxito, de dominar por meio da imposição de
uma ideia, utilizando-se, inclusive, da busca por aliados (Leonardo e Sara), o que reforça a
dimensão da disputa de poder já discutida.
Já, nos conflitos que envolvem como causa a delação (2,38%), o denunciante só presencia
a desobediência a uma norma imposta, regra acordada ou a uma demanda do adulto (ordem,
orientação, recomendação ou pedido), mas não está envolvido nela. Diferentemente do que ocorre
nos conflitos gerados por violação de regra (0,79%), em que o desequilíbrio é gerado já que um
dos protagonistas infringe uma regra e acaba desagradando ou prejudicando o outro também
envolvido, como fica explícito no exemplo a seguir:

Ana fala para Ivan: "Você fica colocando foto da gente no facebook sem a gente
querer, por isso eu excluí você!" Ele: "Eu não tenho nenhuma foto sua, pode

134
ver..." Ela: "Minha irmã disse que tem sim". Ele: "Eu não tenho nada, sua x9!"
Ana não responde mais nada.

O que se percebe nesse tipo de conflito é que o prioritário é justamente a questão do prejuízo
que um dos envolvidos percebe sofrer, mais do que a violação da regra em si. O mesmo foco no
prejuízo próprio acontece na acusação duvidosa (1,59%), em que se responsabiliza alguém pela
violação de uma regra institucional ou de boa convivência, mas sem ter presenciado ou ter certeza
do ocorrido. Na delação, por sua vez, acontece exatamente o oposto: o delator fica preso ao não
cumprimento da regra, mas não sofre nenhum tipo de dano. Mesmo assim, denuncia o autor da
violação. A identificação de quem é o autor - e das relações estabelecidas -, aliás, ajuda na
compreensão da intenção do delator: se denuncia por uma obediência à regra ou à autoridade e isso
é mais forte do que a solidariedade entre os pares, ou se denuncia para irritar ou prejudicar um
infrator específico, como no caso a seguir:

Alice está mexendo escondido no celular durante a aula. Walter passa por ela,
olha e diz: "Professora, a Alice tá mexendo no celular da Tatiana!" Professora
(de sua mesa): "Alice!". Alice devolve o celular para a Tatiana. Tatiana fala
para Walter (muito brava): "Sai daqui, caramba, que chato, quando é você
ninguém fala nada!" Walter não responde e sai de perto.

Em todas essas situações (violação da regra, delação, acusação duvidosa e discordância das
regras do jogo), fica explícita a pouca capacidade de tomada de perspectiva dos alunos (capacidade
de compreender o ponto de vista de outra pessoa e de se colocar no seu lugar) e de coordenação de
perspectiva (integração dos pensamentos, desejos e sentimentos do outro com os próprios,
combinando os pontos de vista ou criando novas possibilidades) (SELMAN,1980). Ou o foco é no
dano/prejuízo sentido, ou, como no caso da delação à autoridade, simplesmente não há uma
preocupação com os sentimentos e com o que pode efetivamente acontecer de negativo com o
outro, como exemplificado a seguir:

Diogo está de pé, ao lado da carteira de Fred, segurando a sua folha da tarefa.
O professor manda Diogo sentar. João grita lá da frente da sala: "Ele tá
copiando do Fred, professor..." Diogo se vira e fala: "O que você tem a ver com
isso? Fica quieto!" João vira para frente e Diogo volta para seu lugar. O
professor não fala mais nada.

135
Já, os conflitos derivados de uma agressão verbal (2,38%), referem-se a alguma
manifestação que insulta ou magoa o outro. Assim como acontece com a agressão física, a agressão
verbal pode tanto se configurar como causa do conflito, como também uma estratégia de resolução,
dependendo da situação. Configura-se como causa quando são ações geradoras de desequilíbrio
numa interação que até então estava equilibrada. O excerto a seguir auxilia na compreensão dessa
diferenciação:

Professora está explicando a matéria na lousa e pergunta quanto é 5x1 para


Gustavo e ele diz que não sabe (está desatento). Cláudio e Wiliam viram para
ele e dizem de forma agressiva: "Burro"! Gustavo olha para eles sem graça e
responde: "Eu sei sim, é 5!" Wiliam: "E quanto é 4x5?" Gustavo: "É 12!" Wiliam
repete: "4x5?" Gustavo: "É 20! E 4x3, quanto é?" Wiliam: "É 12!" Professora:
"O que os dois estão brigando? Wiliam: "É ele que fica perguntando a tabuada!"
Professora: "Então já tá bom, né?" Conflito termina.

Como fica explícito no caso, a agressão verbal é a causa da desavença entre os meninos.
Trata-se de uma ação gratuita, ou seja, sem uma outra causa aparente que pudesse ser observada.
Porém, diferentemente da provocação, não existe um teor concomitante ou ambíguo de humor e de
agressão na verbalização dos meninos em direção a Gustavo, mas unicamente um componente de
insulto. Para Redorta (2009), os insultos ou agressões verbais constituem-se, basicamente, em uma
pretensão de ataque à autoestima do outro. O conflito, portanto, se dá em razão da necessidade de
proteção de algo que é um patrimônio íntimo do sujeito: o orgulho pessoal se sente ferido, o que
pode provocar, em muitos casos, reações bastante violentas.
Em consonância com o que ocorre com a provocação, devido às mudanças cognitivas e à
crescente capacidade de autorregulação dos afetos, percebe-se que, na adolescência, as agressões
passam a ser mais do tipo verbal do que físico, o que também está em conformidade com o que é
mais aceitável e legitimado socialmente. Aliás, quando comparado principalmente com as crianças
de 3 a 4 anos (LICCIARDI, 2010), fica evidente o declínio da agressão física gratuita como causa
(de 5,56% para 1,59%) em função do desenvolvimento. Além da diferença de frequência, esse tipo
de agressão começa a ter, também, um caráter de bolinagem, ou seja, refere-se a toques no corpo
do outro com caráter libidinoso e que provoca uma intensa insatisfação. A distinção entre o ato de
bolinagem como agressão e o jogo intersexual refere-se, justamente, à reação de completo
desprazer gerada no outro (no caso da agressão):

136
Alice passa pela carteira do Luca e ele passa a mão em suas nádegas. Ela vira
para trás e fala com cara de brava: "para!" Laís levanta da sua carteira, se
aproxima de Luca e diz: "se você fizer isso com ela de novo você vai apanhar!"
Luca ri. As duas voltam para seus lugares.

As categorias exclusão, deslealdade (um julga ser merecedor da lealdade do outro) e inveja
tiveram as menores frequências (0,79% cada) nos conflitos observados. Todas essas categorias,
contudo, referiam-se a conflitos envolvendo somente as meninas. Esses dados também coincidem
com o que a literatura trata sobre a diferença entre os gêneros na forma de se relacionar. Crick e
Grotpeter (1995) e Benenson et al. (2006) citam que a agressividade nas meninas está mais voltada
às questões relacionais, o que incluiria comportamentos voltados a causar danos na qualidade da
amizade (excluir do grupo, ferir ou controlar sentimentos, espalhar rumores, rejeitar, etc.), o que é
pertinente com essas categorias encontradas envolvendo somente as meninas.
Já, os incidentes envolvendo como causa a disputa de amigos, a trapaça, a responsabilidade
objetiva, o menosprezo e a súplica ignorada, - presentes nos conflitos das faixas etárias anteriores
-, não foram mais identificados nos alunos de 11 e 12 anos.
Em síntese, encontramos que os principais motivos geradores dos conflitos entre os
adolescentes são, em essência, a provocação (45,24%) e a reação ao comportamento perturbador
(27,78%). Comparado ao que foi concluído por Licciardi (2010), o conflito é concebido cada vez
mais como resultado da discordância entre as partes e não mais como mera interação física entre
duas pessoas. Os adolescentes já conseguem considerar os aspectos subjetivos envolvidos no
conflito, embora ainda fiquem muito presos a seus interesses e necessidades. Ao contrário das
crianças pequenas, também já concebem que duas pessoas que não estão fisicamente interagindo
podem vivenciar conflitos. Aliás, a crescente capacidade de abstração e generalização, além da
existência de um cérebro com maior processamento da linguagem, caracteriza os conflitos
vivenciados nesse período como prioritariamente verbais e em função de uma busca por
controle/poder sobre o outro. Também vale ressaltar o aparecimento da provocação com intenção
de flerte, que demarca a presença crescente do componente da sexualidade nas relações
intersexuais.
Por fim, essa sequência de apresentação dos resultados, a partir das categorias de maior
para menor incidência, será mantida nas demais dimensões dos conflitos que serão ainda
abordadas.
137
6.1.2 As estratégias de resolução de conflitos

As estratégias de resolução de conflitos podem ser definidas como as ações empregadas


pelos sujeitos para resolver o desequilíbrio que surge na relação, a partir da vivência de uma
situação particular de conflito social (SELMAN, et. al., 1986).
Em cada conflito observado nas escolas, buscamos identificar as estratégias utilizadas pelos
sujeitos envolvidos e agrupá-las nas categorias já elaboradas por Licciardi (2010), Silva (2015) e
Oliveira (2014) - física e impulsiva; unilateral; cooperativa -, a fim de possibilitar comparações
entre os padrões e modos de comportamento nas diferentes idades. Não foram criadas categorias
diferentes daquelas já elaboradas nos estudos com as idades anteriores. No entanto, novas formas
de comportamentos foram identificadas na faixa etária de 11 e 12 anos, aumentando, assim, o
repertório de ações, especialmente nas estratégias consideradas unilaterais.
Ao todo, foram identificadas 489 estratégias, incluindo todos os envolvidos nas desavenças.
Fica evidente, assim, que a quantidade de estratégias é superior ao número de conflitos observados
(134), posto que, em vários deles, foram utilizadas mais de uma forma de resolução.
Especificamente, em cada conflito analisado, pudemos verificar situações diversas, tais como: um
único sujeito envolvido no conflito apresentar estratégia de resolução, dois ou mais sujeitos
envolvidos apresentarem estratégia, ou, ainda, outros sujeitos interferirem em um conflito já
iniciado. Em nosso estudo tivemos, no máximo, 4 sujeitos envolvidos no mesmo conflito. Ademais,
tivemos situações em que um único sujeito apresentava mais de uma estratégia para resolver o
conflito, que foram, inclusive, classificadas, muitas vezes, em categorias distintas. Ao se comparar
os dados dos alunos de 11 e 12 anos, com os dos estudos com faixas etárias anteriores (3 e 4, 5 e
6, 8 e 9 anos), foram encontrados, pela primeira vez, conflitos entre grupos de alunos (rivalidade
entre grupos).
Diferentemente da dificuldade vivenciada em vislumbrar o motivo da desavença, as
estratégias utilizadas pelos alunos foram facilmente identificadas durante a observação e,
geralmente, eram suas execuções que evidenciavam a existência de um conflito. No entanto,
quando os conflitos se conservavam e duravam vários dias, as partes envolvidas eram ouvidas
separadamente para que fosse possível identificar as estratégias utilizadas em contextos em que
não estávamos presentes. Assim como aconteceu com as causas dos conflitos, quando havia a
138
evidência de algum tipo de contradição nas falas, outros alunos que estavam próximos ou que
assistiram à desavença também eram entrevistados para um melhor esclarecimento das estratégias
utilizadas.
As nomenclaturas, as descrições e as concepções de conflito das categorias se basearam nos
estudos de Selman (1980) e Selman e Shultz (1990) acerca dos tipos de estratégias de negociação
interpessoal e são apresentadas a seguir. O quadro apresenta, na coluna da esquerda, as
características do desenvolvimento com relação a concepção de conflito. Em seguida, a categoria
de estratégias predominantes decorrentes dessa concepção e desenvolvimento. A terceira coluna
conceitua a estratégia e traz exemplos da forma como pode ser manifestar.

Quadro VI: Categorias das estratégias dos conflitos

Categorias Descrição
Características do desenvolvimento
As estratégias empregadas parecem
indicar que o sujeito concebe o Estratégias físicas e/ou São ações físicas ou verbais, momentâneas
conflito como interação física e não impulsivas (FI) carentes de reflexão, marcadas pela
como uma discordância de opinião ou impulsividade.
interesses opostos. Não há
consideração da perspectiva alheia, Ex.: insulto (impulsivo), gritar, chorar,
nem tampouco dos efeitos chutar, bater, fugir, afastar-se, mudar de
psicológicos gerados nos envolvidos atividade, obedecer automaticamente, não
com o conflito. Os objetivos dos interagir.
sujeitos concentram-se mais no
controle do espaço físico do que na
manutenção do relacionamento.
As estratégias empregadas decorrem São ações predominantemente verbais,
da crença de que o conflito é Estratégias unilaterais visando ao controle do outro pelo uso do
essencialmente sentido por uma parte (UN) poder e não pela negociação. São
e causado por outra. Todavia, essa empregadas falas impositivas, expressão
compreensão parece aplicar-se impositiva, breves justificativas e
apenas a um dos envolvidos. A busca sugestões. A estratégia de reparação não
é pelo controle do espaço social, por corresponde a real intenção do sujeito.
meio da mudança do comportamento
do outro e não de seus sentimentos Ex.: comando, justificativa do motivo, ficar
ou pontos de vista. Além dos efeitos emburrado, recuo (diante de uma
físicos das estratégias, os intimidação), ameaça irônica, disputa
psicológicos ou subjetivos também verbal (reagir a algo de forma semelhante,
passam a ser importantes, porém devolvendo a ofensa ou a demanda
apenas para um dos envolvidos. A recebida), objeção (negação), insulto
mutualidade não é ainda considerada. (refletido), súplica, provocação,
O sujeito ainda não tem consciência aliciamento, chantagem, desdém, ameaça,
de que a ação de reparar envolve a desafio, retirada de afeto, subornos de

139
coordenação do ato (objetividade), afeição, terceirização do conflito (desejo
com a intenção (subjetividade). que o outro tome partido a seu favor e
resolva o conflito unilateralmente), ignorar
(fingimento de indiferença), dissimulação,
reparação pela possibilidade de regulação
externa, ironia, obediência submissa,
sedução, delação, represália (ação que
demonstra insatisfação), acusação.
As estratégias empregadas parecem São ações predominantemente verbais que
indicar que os sujeitos reconhecem Estratégias visam convencer o outro a acatar uma ideia
que as partes participam cooperativas (CO) para fazer o que se deseja ou a reparar um
psicologicamente no conflito e, por dano. Há uma preocupação em modificar
isso, buscam engajar-se no não apenas o comportamento do outro, mas
reestabelecimento do equilíbrio. também seus sentimentos ou interesses.
Além de considerar os efeitos Ex.: sugestão de revezamento da posse de
psicológicos das estratégias para os um objeto, sugestão de brincadeira ou de
envolvidos, a real intencionalidade outra pessoa para brincar, justificativa para
da outra parte é um elemento a ação baseada em uma regra ou orientação
importante a ser ponderado. Assim, a do adulto, argumentação, apelo para que o
resolução satisfatória pressupõe a outro se coloque em seu lugar, reparação
concordância mútua, embora ainda sincera (pedir desculpas, dizer que o ato
haja uma tentativa, ainda que fraca, danoso não se repetirá, dizer que foi sem
de defender o próprio ponto de vista. intenção), revide bem humorado, esquiva,
A resolução é recíproca, mas pontual, sedução (intenção de mudar o sentimento,
conflito por conflito. reconquistar, atrair de modo astucioso),
busca de aliados visando o convencimento,
render-se (cede, sujeita-se em nome de algo
maior), reivindicar (fazer valer a justiça,
reivindicando a regra), acatamento
(aceitação de ordem, regra ou sugestão,
como manifestação de respeito ou
consideração).
Fonte: MARQUES, C. A. E.; OLIVEIRA, M. T. A.; SILVA, L. M. F.; VINHA, T. P. (2014)

Embora as 3 categorias explicitem uma condição de busca de satisfação dos próprios


interesses – indicando, ainda, uma limitação na coordenação e tomada de perspectiva -, níveis de
evolução podem ser identificados. Ressalta-se, contudo, que as estratégias estão relacionadas ao
desenvolvimento, porém, no processo de construção, as estratégias se integram. Assim, crianças
mais velhas, adolescentes ou mesmo adultos podem empregar determinadas estratégias mais
elementares, mesmo tendo condições de usar outra mais evoluída. Todavia, o contrário não ocorre.
A criança é incapaz de empregar uma estratégia mais evoluída do que o seu desenvolvimento
permite. Destaca-se também, que, muitas vezes, o tipo de conflito ou a busca pela adaptação às

140
características do ambiente podem fazer com que o sujeito utilize com frequência estratégias menos
evoluídas do que teria condições.
As estratégias físicas e impulsivas (FI) são as menos elaboradas, justamente porque
demonstram maior dificuldade no controle de impulsos diante de situações conflituosas e maior
dificuldade na verbalização das ideias e sentimentos. Não há reflexão sobre a perspectiva do outro.
Nas estratégias unilaterais (UN), a impulsividade diminui e já se é capaz de uma demonstração
daquilo que se deseja, mesmo que seja por meio de demandas, insultos ou ironias, por exemplo.
No entanto, ainda há muita dificuldade em se considerar a perspectiva alheia e, assim, o sujeito
possui um nível elevado de desejo de controlar o outro. Já as estratégias cooperativas (CO) são as
mais evoluídas (comparadas às estratégias anteriores) por serem menos centradas em si, posto que
o sujeito, agora, já considera, em certa instância, a perspectiva alheia. Assim sendo, procura
convencer usando argumentos que demonstrem a necessidade do outro fazer o que ele deseja, por
meio da modificação de seus sentimentos ou interesses.
A figura seguinte apresenta as frequências totais de ocorrência de cada uma delas:

Figura II: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflitos nos alunos de 11- 12.

ESTRATÉGIAS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITO

75,46%

19,22%

5,32%

Física e impusiva Unilateral Cooperativa

Como pode ser observado na figura II, a categoria mais frequente foi a unilateral (75,46%),
seguida da física e impulsiva (19,22%) e, por último, a cooperativa (5,32%).
141
Como já brevemente explicitado, as estratégias unilaterais (UN) referem-se às
manifestações de caráter coercitivo, com o intuito de controle sobre o outro pelo uso do poder.
Deseja-se a submissão do outro aos interesses e necessidades impostos, sem consideração pelo
ponto de vista alheio.
Alguns comportamentos demonstrados pelos alunos de 11 e 12 anos explicitam claramente
essas características descritas, como, por exemplo: disputar verbalmente para impor sua vontade,
fazer chantagem, fazer ironia/sarcasmo, desafiar, buscar aliados nos pares, ficar emburrado,
desdenhar o que o outro fala ou faz, ameaçar, insultar, dissimular, provocar, dar um comando ou
terceirizar o conflito, desejando que um terceiro (normalmente a autoridade) tome partido a seu
favor e resolva o conflito de forma unilateral. Em nenhum desses exemplos são empregados
argumentos que demonstrem alguma tentativa efetiva de convencimento do outro. O
comportamento encontrado que estaria mais próximo de um possível convencimento são as
classificadas como justificativas. No entanto, as justificativas, que serão melhor exploradas a
seguir, ainda visam à mera mudança do comportamento do outro e não do seu sentimento (o que
indicaria um real convencimento).
Mesmo que seja por meio de justificativas, o caráter das estratégias unilaterais é o de
conseguir o que se quer por meio da imposição de um ponto de vista. O relato a seguir exemplifica
claramente essa análise:

Walter passa por Marina, tira o capuz do agasalho de sua cabeça e vai embora.
Ela grita: "Para, pô!" e levanta para falar com a professora: "Professora, o
Walter fica tirando o capuz da minha cabeça!" Professora: "Quem?" Marina:
"O Walter!" Professora olha fixamente para os dois e faz um sinal afirmativo
com a cabeça, mas não responde nada. Marina senta novamente em seu lugar.
Walter não se aproxima mais.

Nesse episódio, constata-se a presença da estratégia unilateral mais utilizada pelos alunos
para tentar resolver os conflitos: o comando (12%) - quando Marina ordena que Walter pare com
seu comportamento (“Para, pô!”). Pode-se supor que Marina, já antecipando que somente o seu
comando não conseguiria parar com a provocação de Walter (provavelmente baseada em
experiências anteriores), apela pela ajuda da autoridade, por interpretá-la como mais coercitiva para
o menino (terceirização – 6,5%). Aliás, analisando todos os conflitos envolvendo o comando como
primeira estratégia utilizada pelo sujeito, em 36,7% dos casos, uma única demanda não conseguiu
142
resolver o conflito, ou seja, o sujeito precisou recorrer a mais estratégias para controlar o
comportamento do outro, como: usar de estratégias físicas (44,4%), terceirizar (27,7%), usar mais
de um comando (22,2%), justificar (11,1%), ignorar (5,5%), desafiar (5,5%) ou insultar (5,5%).
Krasnor e Rubin (1983) também verificaram que a falha de uma estratégia geralmente incentiva o
sujeito a construir um novo meio para resolver o problema.
No caso do uso da terceirização, é evidente que o desejo de Marina era o de que a professora
interviesse no sentido de defendê-la, resolvendo unilateralmente o conflito, de preferência
sancionando Walter. A professora, nesse caso, lança um olhar repreensivo para a dupla, o que
interrompe o conflito.
Vale, também, ressaltar, que 53,8% das terceirizações dos conflitos para a autoridade foram
solicitadas pelas meninas (mesmo estando menos envolvidas no total de conflitos - 72,8% - do que
os meninos - 89,6%). Esse dado confirma os estudos apresentados por Guimarães e Pasian (2006)
e por Coleman (2011), os quais realmente afirmam que as meninas são mais propensas a procurar
suporte em outras pessoas do que os meninos em situações estressantes.
Analisando, agora, a intervenção do professor, nos conflitos em que a terceirização para a
autoridade foi solicitada por algum dos envolvidos, em 33,3% dos casos o professor simplesmente
ignorou o pedido, principalmente quando era solicitado por uma menina (66,6% dos casos
ignorados). Tal atitude é prejudicial, especialmente para as meninas, considerando que são elas as
mais afetadas emocionalmente por situações estressantes - como as que ocorrem durante as
desavenças interpessoais -, além de serem mais sensíveis às ações e às expectativas das figuras de
autoridade (COLEMAN, 2011). Provavelmente, o fato de os professores ignorarem mais as
solicitações feitas pelas meninas deva-se ao fato de as meninas demonstrarem estratégias mais
passivas ao lidar com os conflitos. Já, os meninos tendem a apresentar mais expressões de raiva
por meio de expressões faciais, entonação de voz e comportamentos não-verbais (GUIMARÃES
E PASIAN, 2006), o que acaba provocando mais transtornos e interrupções na condução da aula.
Nos casos em que houve algum tipo de intervenção pelo professor, essas foram pontuais, marcadas,
em essência, por falas impositivas de censura e repreensão (Professora ouve e diz: "Não vai dar
murro em ninguém!" (...) “Então vá lá na direção reclamar dele, Luca!"), ironias (Professora diz:
“Santa vítima você, né, Gustavo? Sempre inocente!”), ameaças flutuantes (Professora diz: “eu
vou começar a anotar o nome no diário, Marina, você vai ver (...)”. Marina continua sentada no
mesmo lugar, conversando com Alice, sem fazer a atividade. A professora olha novamente, mas
143
não fala mais nada.) e menosprezo pelo embate (Professora diz: “eu não vou ficar cuidando dos
doces dos outros, né, gente? Tenham dó! Abram a apostila na página 12!"), mas que acabavam
por solucionar unilateralmente o conflito, beneficiando apenas uma das partes envolvidas
(Professora diz: “aí é o lugar dele, Alice, vá para o seu lugar agora!").
A justificativa do motivo é a segunda estratégia unilateral mais utilizada pelos participantes
(10,2%). Considerando a capacidade de coordenação e de tomada de perspectiva do outro, pode-
se supor que a justificativa é a mais evoluída das estratégias unilaterais, justamente porque se trata
de uma tentativa menos coercitiva de conseguir o que se quer, utilizando-se de uma explicação ou
de um esclarecimento breve sobre as necessidades ou os motivos envolvidos. A justificativa é a
estratégia unilateral mais próxima da categoria cooperativa, porém ainda não se pode verificar
algum tipo de argumentação mais elaborado, que efetivamente altere os sentimentos do outro,
como exemplificado a seguir na fala de Fabiane:

Fabiane vira para trás, pega uma folha que está na mesa da Laís e começa a ler.
Laís arranca a folha da mão dela e diz: "Daqui essa folha!" Fabiane: "Eu só
estava olhando...". Laís: "Não era para olhar." Fabiane vira para frente e abaixa
a cabeça. Logo depois elas voltam a conversar.

Percebe-se, contudo, dois tipos de justificativas nas verbalizações dos participantes: um diz
respeito à tentativa de se explicar para minimizar, por exemplo, tanto uma reação ao
comportamento perturbador - como demonstrado no diálogo acima -, como uma acusação duvidosa
ou uma discordância das regras do jogo:

Professora de Português pede silêncio e Diego não para de falar. Ela, então,
diz: "vou segurar vocês mais 10 minutos antes de irem para o intervalo". Michel
fala: "tudo culpa do Diego e do Luca! E do Pedro também!" Pedro: "eu tô quieto
aqui!"

Renato joga a bola durante a queimada e queima Taís. Ela diz: "não valeu, não
valeu!" Ele: "por quê?" Ela: "porque o Cássio também foi queimado e não saiu!"
Ele: "mas ele não foi queimado..." Taís para de argumentar e vai para o fundo
da quadra.

144
O outro tipo refere-se a uma breve justificativa que serve para pontuar uma indignação ou
para protestar diante de algum ato considerado injusto, como fica explícito na fala de Tatiana para
Walter, já apresentada anteriormente:

Alice está mexendo escondido no celular durante a aula. Walter passa por ela,
olha e diz: "Professora, a Alice tá mexendo no celular da Tatiana!" Professora
(de sua mesa): "Alice!". Alice devolve o celular para a Tatiana. Tatiana fala
para Wagner (muito brava): "Sai daqui caramba, que chato, quando é você
ninguém fala nada!" Wagner não responde e sai de perto.

De qualquer forma, mesmo que ainda se trate de explicações breves e, até mesmo, muitas
vezes ingênuas, a presença da justificativa como a segunda estratégia mais utilizada pelos alunos
demonstra um crescente controle dos impulsos, da tomada e coordenação de perspectiva, além de
uma evolução, também, no próprio processamento da linguagem característico da adolescência
(HERCULANO-HOUSSEL, 2009), principalmente quando verifica-se que tal estratégia não era
característica de crianças de 8 e 9 anos. O maior conhecimento acerca de habilidades e de
estratégias mais apropriadas socialmente é citado por Laursen e Collins (1994) como algo que
também contribui para o desenvolvimento de estratégias de maior compromisso com o outro,
especialmente do meio da infância até o final da adolescência.
A disputa verbal, por sua vez, aparece em 9,2% das estratégias impositivas. Aqui, o conflito
é mantido pela insistente necessidade de retrucar a fala do outro, como se disputassem a quantidade
de ataques. Contudo, essa disputa também pode acontecer de duas formas distintas. O primeiro tipo
inclui uma reação à ofensa recebida, por meio de agressões semelhantes. Vale destacar a
criatividade das verbalizações e a rapidez de raciocínio exigida em um embate como esse. Ao
analisar especificamente esse tipo de estratégia utilizada, percebe-se que ela é utilizada sempre
pelas mesmas crianças, que são justamente aquelas que possuem as habilidades destacadas. A
motivação central está na competição – mais do que na ofensa em si -, e quem cede, se torna o
perdedor, como fica explícito nos dois exemplos a seguir:

Veridiana faz um comentário alto sobre a tarefa que estão fazendo e João fala:
"Não falo com carrapato, só com gente!" Ela: "Então não fala com a sua família,
né?" Ele: "Cala a boca". Ela: "Vem calar se você for homem." Ele: "Eu não
preciso disso." Ela fica pensando em uma resposta e Talita diz: "Fala assim...
(cochicha em seu ouvido). Veridiana começa a rir. João levanta e vai ao
banheiro.
145
Laís fala para Veridiana: "A coisa principal de um namoro é o amor e não a
beleza". Pedro escuta e diz: "Então seu namorado deve ser cego!" Laís responde:
"Cego é você que quebra os espelhos." Ele: "Você que quebrou meu espelho
quando foi lá em casa." Ela: "Eu nunca fui naquele chiqueiro que você mora."
Ele fica quieto e muda de lugar. Eles continuam se provocando (não consigo
ouvir o que falam). A aula é sobre hábitos de higiene. Laís diz (copiando do que
está escrito na apostila): "Tem que tomar banho todo dia, viu Pedro? Não pode
jogar lixo no chão, viu Pedro?" Ele: "Fica quieta, papuda!" Eles continuam a
provocação e outros alunos (Jonas e João), também passam a provocar a Laís.

No outro tipo de disputa verbal, observa-se que a meta é vencer o outro por meio de falas
impositivas sucessivas (“calma”, “calma nada”, “calma sim”), sem argumentação, até a submissão
de uma das partes. Novamente quem cede, ou seja, quem fala por último, é considerado o perdedor
da disputa.

Walter (está na última carteira) para Liz (está duas carteiras à frente): "dá
licença, ô, eu quero copiar!" Kátia (está ao lado): "calma!". Walter: "calma
nada!" Kátia: "calma sim!" Bianca (também ao lado): "eu vou chamar um pastor
para te acalmar! Walter: "não precisa não!" (dá risada). Ele volta a copiar a
lousa em silêncio.

Conforme é explicitado no relato, embora, nas estratégias unilaterais, haja maior elaboração
das verbalizações do que nas estratégias físicas e impulsivas, ainda não são empregados
argumentos que demonstrem um convencimento do outro. Na disputa verbal, é muito mais
relevante a insistência da fala impositiva (quantidade de repetição) do que a qualidade de seu
conteúdo propriamente dito.
A quarta estratégia unilateral é o ato de ignorar o conflito (7,1%). É classificado como uma
estratégia impositiva justamente porque não se trata de um comportamento guiado pela
impulsividade. O sujeito, de alguma forma, avalia a situação e julga intencionalmente que não
reagirá às ações alheias, ou por falta de outros recursos, ou por não achar que vale a pena estender
o desentendimento. Trata-se de uma estratégia orientada na direção da transformação do eu, ou
seja, o indivíduo tenta modificar seu próprio comportamento para alcançar seu objetivo (Yates et
al., 1990). Ignorar é uma forma de imposição, pois surpreende o outro, que espera algum tipo de
reação e de embate, transparecendo, assim, certa superioridade ou poder por parecer imperturbável
ou não afetado pelo comportamento alheio. Nessa mesma perspectiva, Leary e Katz (2005) e
146
Scambler et al. (1998) apresentam, em seus estudos específicos sobre provocação entre pares, que
comportamentos hostis /desafiadores são respostas indesejáveis, enquanto que o riso e a indiferença
(ignorar) foram considerados como respostas desejáveis frente à provocação dos pares.
Ademais, diferentemente da não interação - estratégia física e impulsiva presente nas
crianças de 3 a 6 anos (LICCIARDI, 2010) -, no ato de ignorar o sujeito compreende que o conflito
permanece, ainda que haja esse afastamento perceptual, como exemplificado a seguir:

Verônica e Laís viram suas carteiras e sentam-se em dupla para copiar a lição
da lousa. Alice pede para sentar junto e aproxima sua carteira, formando um
trio. Diego olha a cena e diz: "Maria vai com as outras!" Laís responde: "Cala
a sua boca, quem manda na minha vida sou eu e ela senta onde quiser!" Ele olha
para trás e diz mais uma vez sorrindo: "Maria vai com as outras". Laís não
responde mais e ele olha para frente, em direção à lousa.

Já, a quinta estratégia unilateral mais utilizada pelos alunos foi a ameaça (6,1%). O objetivo
principal de uma estratégia de ameaça é o bloqueio da ação do outro, sendo utilizada como uma
tentativa de se impor e fazer o outro ceder por medo. O medo, por sua vez, segundo Redorta
(2009), é um sentimento que se ativa pela percepção de um dano ou de um perigo real ou
imaginário, cuja natureza pode ser física ou psicológica e que leva a uma conduta evitativa. A
conduta evitativa é justificada por uma percepção aprendida de algo indesejável que vai se impor,
sendo, portanto, uma atitude defensiva que tem uma função de proteção. Nota-se, como no exemplo
a seguir, que nem sempre a ameaça é realmente executada, o que leva, também, ao aprendizado de
uma resposta desafiadora:

Joaquim, para mim: "Tia, você sabia que o Diego não sabe ler?" Diego se
aproxima e diz: "Cala a boca". Joaquim: "Eu sou melhor do que você". Diego
se aproxima e chuta a cadeira em que Joaquim está sentado, que fala: "Eu vou
te bater..." Diego: "Então vem!" (fala rindo). Joaquim não bate. Depois voltam
a conversar.

O relato ainda explicita o uso de mais de uma estratégia por parte de Diego para tentar
resolver o conflito. Depois do comando (“cala a boca”) não ter funcionado com Joaquim, Diego,
então, se utiliza de uma estratégia física e impulsiva (“chuta a carteira”) - que é mais primitiva -, e,
depois, novamente se utiliza de uma estratégia unilateral, que é o desafio ao outro (“então, vem!”)
– presente em 3,2% das estratégias utilizadas pelos participantes. No entanto, não há, em nenhum
147
comportamento explicitado, qualquer indício de consideração pelo sentimento alheio ou pelos
efeitos psicológicos gerados pelos seus atos.
Por fim, a diferença primordial entre a categoria unilateral e a física e impulsiva é
justamente a diminuição da impulsividade e da utilização de estratégias físicas. Ainda que na física
e impulsiva haja o emprego de emissões verbais, elas são extremamente impetuosas e visam
principalmente ao impedimento das ações do outro. Um exemplo claro dessa evolução é o emprego
dos insultos. De forma distinta da encontrada por Licciardi (2010, p. 122) com as crianças menores,
que se ofendiam preferencialmente de forma impulsiva (“As crianças brincam no parque de pegar
as folhas que caem das árvores. LUCA puxa as folhas da mão de LUC que grita: ─ Seu feio! LUCA
bate em LUC e os dois se afastam, sem nada dizer”), o insulto, agora, é utilizado de uma forma
mais refletida e intencional (4,8%), claramente direcionada a agredir a partir de uma característica,
comportamento ou estado específico do alvo, como exemplificado a seguir, no conflito em que
Marina chama Wagner de “fofoqueiro”:

Marina está lendo em voz alta o texto do livro em uma atividade em dupla (está
sentada com a Tatiana). Wagner, que está próximo, fala: "Professora, olha a
Marina fazendo barulho!" Marina finge não escutar e continua a ler. Ele avisa
de novo a professora, que manda a Marina separar a carteira da Tatiana e sentar
lá na frente da sala. Marina: "Mas eu não tô fazendo nada, professora, só tô
lendo..." Professora: " Eu vou anotar o nome no diário..." Marina: "Tudo culpa
desse fofoqueiro aí!" (aponta para o Wagner). Wagner ri.

A segunda categoria de estratégia de maior frequência foi a física e impulsiva (19,94%).


Como já descrito, essa categoria é caracterizada pela dificuldade de controle dos impulsos diante
de situações de frustração e de raiva, por exemplo, e pelo uso de manifestações físicas. Segundo
Yates et al. (1990), as estratégias desse nível usam a força irrefletida para alcançar um objetivo, ou
a obediência irrefletida, ou mesmo o abandono para proteger a si mesmo e são marcadas,
essencialmente, pelo egocentrismo.
Diferentemente do que acontece com as crianças de 3 a 6 anos (LICCIARDI, 2010), em
que há, também, ações orientadas para a transformação do eu - indivíduo tenta modificar o próprio
comportamento, utilizando, por exemplo, a não interação -, com os alunos de 11 e 12 anos as ações
físicas e impulsivas foram essencialmente orientadas para a transformação do outro (YATES et
al.,1990), que consistem em comportamentos tais como: dar tapas e socos, empurrar, chutar, chorar,
agarrar o outro, como exemplificado no conflito entre Tamara e Murilo:
148
Tamara está conversando comigo e Murilo vem por trás e tampa seus olhos. Ela
dá um grito, se vira, e começa a bater nele. Depois fala pra mim: "olha, dona,
viu o que ele fez comigo?" Começa a arrumar o cabelo e a maquiagem. Murilo
volta para seu lugar sem falar nada.

Selman e Schultz (1990) assinalam, ainda, que mesmo que um sujeito já consiga utilizar
estratégias mais evoluídas, ele pode, porventura, utilizar outras mais primitivas, uma vez que isso
depende, também, do contexto e do método utilizado pela outra parte para resolver o conflito, ou
seja, nem sempre alguém capaz de agir em um nível mais alto o fará em todas as vezes, até porque
em algumas situações é mais adaptativo e apropriado, inclusive, atuar de maneira menos evoluída.
Essa perspectiva ajuda, então, a compreender os dados encontrados com os alunos de 11 e 12 anos.
Considerando todos os adolescentes que utilizaram pelo menos uma estratégia física e impulsiva
para resolver o conflito, em 73% dos casos, os mesmos se utilizaram de outras estratégias
(unilaterais ou cooperativas) concomitantemente.
Os estudos de Selman (1980) indicam que as estratégias unilaterais são mais bem sucedidas
do que as anteriores (as impulsivas e físicas). Com uma concepção mais elaborada, os sujeitos já
compreendem que as estratégias físicas e impulsivas são menos eficazes para restabelecer o
equilíbrio na relação do que as impositivas - mesmo que estas também não proporcionem uma
estabilidade adequada -, mas, ainda, oscilam e testam a eficácia de estratégias mais primitivas para
buscar o controle de determinada situação.
Comparando-se os resultados com os encontrados por Licciardi (2010) com as crianças de
3 a 6 anos, percebe-se, claramente, o declínio significativo da utilização de estratégias físicas e
impulsivas - FI (71,04% com 3 e 4 anos de idade e 62,15% com 5 e 6 anos). Já, com relação à
pesquisa com os alunos de 8 e 9 anos, algumas evoluções significativas também puderam ser
constatadas a partir do estudo estatístico, conforme verificado a seguir:

149
Tabela VI: Comparação das variáveis CO, FI e UN entre as faixas etárias 8-9 e 11-12
Estrateg Idade
Frequency,
Col Pct ,8-9 ,11-12 ,
---------+--------+--------+
CO , 12 , 26 ,
, 3.77 , 5.32 ,
---------+--------+--------+
FI , 80 , 94 ,
, 25.16 , 19.22 ,
---------+--------+--------+
UN , 224 , 369 ,
, 70.44 , 75.46 ,
---------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.041

Pelos resultados, houve diferença significativa entre os grupos de idade para as estratégias
físicas e impulsivas (maior frequência nos alunos com 8 e 9 anos – 25,16%) e para as estratégias
do tipo unilaterais (maior frequência nos alunos com 11 e 12 anos – 75,46%), embora haja o
predomínio das estratégias unilaterais nos dois grupos de idade, conforme é explicitado na figura
III a seguir:

Figura III: Porcentagens para as estratégias unilaterais nas idades de 8-9 e 11-12

ESTRATÉGIAS UNILATERIAIS NAS DIFERENTES FAIXAS


ETÁRIAS
75,46%

70,44%

8 e 9 anos 11 e 12 anos

150
O aumento significativo das estratégias impositivas à medida que os sujeitos ficam mais
velhos indica uma crescente capacidade de regulação dos atos impulsivos e uma evolução da
concepção de conflitos. Não se pode, também, deixar de considerar a crescente adequação ao que
é mais esperado e aceito socialmente: bater em alguém é algo muito mais recriminado do que o uso
de um comando ou ordem, por exemplo. Desse modo, o objetivo das estratégias passa a ser cada
vez mais o controle do comportamento do outro por meio da imposição.
Embora não exista uma rigidez com relação à idade, seria esperado, segundo Selman e
Shultz (1990), que sujeitos mais velhos, de 10 a 13 anos, realmente apresentassem uma evolução
no emprego das estratégias com relação a sujeitos de 7 a 9 anos, justamente porque a maneira
predominante de como se lida com as desavenças expressa, também, o estágio de desenvolvimento.
Contudo, segundo os autores, os sujeitos de 10 a 13 anos já teriam condições de apresentar uma
maior consolidação das estratégias mais elaboradas (cooperativas), o que não foi confirmado em
nossa amostra.
A terceira categoria em termos de frequência, portanto, é a cooperativa (5,32%). Tais
estratégias são mais evoluídas do que as duas anteriores e envolvem tentativas para satisfazer as
necessidades por meio de negociações, intercâmbios e acordos. Os sujeitos usam conscientemente
de influência psicológica para mudar a mente do outro, ou de conformidade psicológica para
proteger os próprios interesses (YATES et al., 1990). A imposição presente na categoria anterior
diminui consideravelmente, no entanto, o objetivo das estratégias ainda refere-se, essencialmente,
ao atendimento das próprias expectativas. Um exemplo desse nível de estratégia pode ser verificado
no relato a seguir, quando Murilo, ao disputar com Tamara, utiliza-se de um revide bem humorado
como estratégia, provavelmente visando ao reequilíbrio da relação. Há uma preocupação clara em
modificar não apenas o comportamento do outro, mas, também, seus sentimentos ou interesses, por
meio de algum tipo de convencimento.

Atividade em grupo de Matemática - Tamara: "é para fazer em quatro o


trabalho, Murilo!" Murilo: "é em dupla, a gente escreve de dois!" Ela: "não é
não!" Murilo: "dona, é pra fazer de dupla ou em grupo?" (para a professora).
Professora: "em grupo, mas escreve nas duas folhas." Tamara: "viu?!" Murilo:
"vi nada, eu ouvi!", respondeu sorrindo. Ela: "eu tava certa!" Ele fica quieto.

151
Conforme afirma Abrahami et al. (1981), a escolha da estratégia de ação diante de um
conflito pode ser considerada manifestação de uma estrutura subjacente de pensamento sobre as
relações sociais. No caso, as estratégias cooperativas contam com o nível 2 de tomada e
coordenação de perspectiva proposto por Selman (1980), que não apenas diferencia as perspectivas
subjetivas, como permite que sejam consideradas simultaneamente. Trata-se, portanto, de
estruturas mais elaboradas que, segundo o autor, já poderiam estar consolidadas em sujeitos de 10
a 13 anos, por exemplo. Infelizmente, conforme já descrito, nos participantes da presente pesquisa
- 11 e 12 anos -, as estratégias baseadas nesse nível de tomada e coordenação de perspectiva foram
as menos utilizadas. Tal resultado pode ser compreendido a partir do que Selman et. al. (1986)
chama de “variação contextual”. Para os autores, o uso das estratégias interpessoais recém-
desenvolvidas pelo indivíduo (como as cooperativas, por exemplo) pode ser particularmente
sensível à qualidade da relação existente. Isso quer dizer que um nível sócio-cognitivo pode até
estar potencialmente disponível, mas não necessariamente será utilizado no comportamento real,
devido, muitas vezes, à própria história das relações envolvidas em um contexto particular.
Conforme, também, demonstrado na tabela 5, quando são comparados aos alunos de 8 e 9
anos com os de 11 e 12 anos, não se evidencia, ainda, um avanço significativo referente ao uso de
estratégias cooperativas para a resolução dos conflitos. Entretanto, quando se comparam as 4 faixas
etárias estudadas (3 e 4; 5 e 6; 8 e 9 e 11 e 12) (LICCIARDI, 2010 e SILVA, 2015), o estudo
estatístico aponta para uma diferença significativa das estratégias cooperativas nos alunos de 11 e
12 anos (as faixas de 3 e 4, de 5 e 6 e de 8 e 9 anos são significativamente inferiores à faixa de 11
e 12 anos), como vislumbrado na tabela VII a seguir:

152
Tabela VII: Comparação das variáveis categóricas CO, FI e UN entre as faixas etárias 3-4, 5-6,
8-9, 11-12

Estrateg. Idades
Frequency,
Col Pct 3-4 5-6 8-9 11-12
---------+--------+--------+--------+--------+
CO 0 3 12 26
0.00 1.04 3.77 5.32
---------+--------+--------+--------+--------+
FI 184 179 80 94
71.04 62.15 25.16 19.22
---------+--------+--------+--------+--------+
UN 73 106 224 369
28.19 36.81 70.44 75.46
---------+--------+--------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001

Embora exista uma limitação própria do método - afinal, não houve um acompanhamento
das mesmas crianças ao longo do tempo e, logicamente, não se pode desconsiderar as
particularidades dos contextos analisados -, pode-se verificar que as estratégias de negociação
interpessoal apresentam, em geral, um avanço significativo ao longo dos anos na capacidade de
compreensão e coordenação de perspectivas. Algumas outras diferenças importantes devem ser
consideradas no que diz respeito, principalmente, ao conteúdo das estratégias utilizadas. Nas
poucas estratégias cooperativas utilizadas pelos alunos de 8 e 9 anos, encontra-se, em essência, a
reparação sincera, ou seja, o pedido de desculpas sem a intromissão de alguma autoridade. Além
dessa estratégia citada, nos estudantes de 11 e 12 anos, por sua vez, foi encontrada uma gama maior
de comportamentos indicativos de estratégias cooperativas: sugestão de revezamento da posse de
um objeto, justificativa da ação baseada em uma regra ou orientação do adulto, argumentação,
apelo para que o outro se coloque em seu lugar, revide bem humorado, sedução (intenção de mudar
o sentimento, reconquistar, atrair de modo astucioso) e busca de aliados para convencer. Vale
ressaltar que, em consonância com a força dos grupos, própria da adolescência, foi encontrada,
pela primeira vez, a “busca de aliados entre os pares” (SELMAN e SHULTZ, 1990, p. 73) como
apoio para as próprias ideias, conforme fica explícito no exemplo do conflito durante o jogo de
damas, já anteriormente mencionado:

153
Ricardo está jogando dama com Paula na aula de Educação Física e começa a
dizer que o jeito que a Paula joga não está certo. Ela: "está sim, não é Sara?"
Sara: "lógico que está!" Ricardo chama Leonardo, que está passando e ele fala
que também não conhece o jeito como as meninas estão jogando. Leonardo fala:
"existe um outro jeito, mas eu jogo igual ao Ricardo." Sara pega, então, o
tabuleiro para ela e diz: "então vai jogar eu e a Paula." Ricardo: "mas eu que
ganhei! "Sara: "dá aqui, vai!" Ricardo levanta, abandona a disputa e vai até os
meninos que estão jogando pingue pongue. Sara e Paula decidem ir também e
Sara guarda o jogo de damas.

Ao analisar a continuidade dos relatos, percebe-se que algumas estratégias de resolução


utilizadas pelos sujeitos geram outros conflitos ou, ainda, aumentam o conflito já existente. A
separação dos conflitos em episódios, portanto, torna-se apenas uma questão didática para análise.
Em suma, verifica-se que as estratégias mais utilizadas pelos alunos de 11 e 12 anos foram
as unilaterais, que envolvem, principalmente, ordens como uma maneira de afirmar o poder, o
controle e a satisfação a si mesmo, ou a submissão ao poder, controle e desejos da outra pessoa.
Tais estratégias dependem do nível 1 de tomada e coordenação de perspectiva, que diferencia
perspectivas subjetivas, mas não permite que sejam consideradas de forma simultânea. Em seguida,
são utilizadas as estratégias físicas e impulsivas, que envolvem comportamentos impetuosos e
físicos para conseguir o que deseja ou para evitar algum dano. São estratégias baseadas no nível 0
de tomada e coordenação de perspectiva, que não diferencia perspectivas subjetivas ou distingue
ações de sentimentos. As estratégias menos utilizadas foram, por fim, as cooperativas, que
envolvem, ao invés da imposição, tentativas de satisfação das necessidades por meio de
negociações, intercâmbios e acordos. Contam com o nível 2 de tomada e coordenação de
perspectiva, que não apenas diferencia as perspectivas subjetivas, mas também permite que sejam
consideradas simultaneamente. Embora tenha sido encontrada uma evolução no desenvolvimento
quando comparado às idades anteriores, a baixa frequência das estratégias cooperativas
encontradas não se aproxima do que é proposto por Selman (1980) e Selman e Schultz (1990) a
respeito da utilização mais frequente de estratégias do nível 2 (mais cooperativas e autorreflexivas)
para sujeitos no início da adolescência, coincidindo com uma reorganização das capacidades
cognitivas. Laursen et al. (2001), em uma meta-análise de diversos estudos sobre conflitos entre
pares desde a infância até o início da idade adulta, também demarcam uma diminuição da
importância relativa da coerção com a idade, assim como um aumento da negociação. Segundo os

154
autores, de forma geral, os adolescentes (11 a 18 anos) favorecem a negociação em suas estratégias,
mais do que a coerção e o afastamento, por exemplo.
Sem desconsiderar tal panorama evolutivo, Laursen e Collins (1994) auxiliam na análise
dos resultados encontrados ao ressaltar as características dos relacionamentos como fortes
influenciadores do comportamento diante de um conflito.
Em seus estudos, Laursen e Collins (1994) não tiveram suas hipóteses apoiadas com relação
a grandes avanços no desenvolvimento em gestão de conflitos nos adolescentes. Apesar dos ganhos
em maturidade cognitiva e em compreensão interpessoal (expressa nos relatos frente a conflitos
hipotéticos), os níveis reais de estratégias mais evoluídas também permaneceram baixos em toda a
adolescência. Nesse modelo, o comportamento do adolescente variou mais em função do tipo de
relação em que surge um conflito, do que como uma função da faixa etária ou do nível de maturação
dos participantes do conflito. De qualquer forma, entretanto, os estudos indicam que, de forma
geral, a negociação é prevalente na adolescência em todos os tipos de relacionamentos entre pares,
exceto com os irmãos, o que também não vai ao encontro dos dados dos conflitos entre pares aqui
encontrados.
Selman (2002) ainda considera o significado pessoal do emprego de uma ou outra
estratégia, que inclui o modo como o indivíduo interpreta o contexto em que o conflito acontece,
bem como o valor atribuído ao relacionamento em questão. Tais variáveis, contudo, não puderam
ser melhor investigadas em função do método de observação empregado pelo presente estudo.
Redorta (2007) também é contundente ao afirmar que o contexto em que o conflito acontece tem
uma grande influência sobre o seu conteúdo: “matar alguém em tempos de paz (contexto pacífico,
portanto) é um crime, mas em tempos de guerra, pode ser um ato heroico” (p.102)34. Selman et al.
(1986) reforça ainda mais tal perspectiva ao relatar que os adolescentes não aplicam as habilidades
de resolução de problemas que já são capazes, por exemplo, nas interações com seus pais, quando
comparadas às interações com seus pares. O contexto, portanto, permite interpretar a comunicação
de uma forma específica e, portanto, incide sobre o significado.
Considerando, entretanto, a perspectiva teórica utilizada (Piaget, 1932-1994 e Selman,
1980), cuja preposição sugere que, essencialmente, é o relacionamento com os pares que
proporciona ao sujeito oportunidades para aprimorar suas capacidades de resolução de conflitos,

34
Tradução nossa.
155
reforça-se a suposição de que, nos ambientes em que esses indivíduos convivem, tal possibilidade
de interação não esteja suficientemente ajustada em direção à promoção dos avanços sociais
esperados.
Piaget (1932-1994), Selman (1980), Mantovani de Assis (1993) e Vinha (2000b) são alguns
dos autores que se concentram na importância fundamental da interação social para o
desenvolvimento de cada indivíduo em direção ao descentramento do próprio ponto de vista. Pode-
se supor, assim, a partir da caracterização das escolas, já relatada anteriormente no Método, que
poucas oportunidades de interação e de reflexão sobre maneiras distintas de reconhecer o ponto de
vista do outro são proporcionadas nesses espaços. Inhelder e Piaget (1976) são enfáticos em afirmar
que o atraso ou o não desenvolvimento de um sujeito pode ocorrer porque o meio não proporciona
adequadamente estímulos e situações ricas e desafiadoras que o favoreçam. Vale reforçar, aqui,
que nenhuma das escolas observadas possuía um ambiente mais cooperativo, em que as relações
entre os pares fossem favorecidas e encorajadas como promotoras de desenvolvimento.

6.1.3 As finalizações dos episódios dos conflitos

Antes de qualquer elucubração sobre o que seriam as finalizações, é preciso retomar o


conceito do que chamamos por episódio dos conflitos.
Episódio é um acontecimento que se insere em um conjunto de outros similares. Às vezes,
mesmo que o episódio de conflito finalize, o conflito permanece, ou seja, o desequilíbrio gerado
pela oposição permanece. Consideramos que o episódio de conflito foi finalizado quando cessou a
interação entre as partes envolvidas.
A finalização, por sua vez, é decorrente de uma ou mais estratégias utilizadas pelos
envolvidos. A finalização de um episódio de conflito considerada como positiva sugere que os
envolvidos ficaram satisfeitos com o resultado obtido, sendo essa satisfação percebida por meio
dos comportamentos apresentados ou por manifestações sutis de afetividade, tais como expressões
faciais, tom de voz ou gestos. Quando não claramente identificada por nós, procurávamos
conversar informalmente com os envolvidos separadamente, após o conflito.
Vale ressaltar que, com os sujeitos mais novos, o conflito não se conserva e, portanto, o
episódio é o próprio conflito (LICCIARDI, 2010). Com os adolescentes, por sua vez, percebe-se
que um único conflito pode conter vários episódios.

156
A classificação das finalizações foi baseada essencialmente nas categorias já utilizadas por
Licciardi (2010). Contudo, em função de novos modos de finalizações utilizados pelos alunos mais
velhos, adaptações foram realizadas (inclusão de novas categorias e alteração nas descrições),
principalmente a partir das categorias propostas por Vuchinich (1990), que especificou cinco
formas distintas de resolução de conflito: (a) submissão: ocorre quando uma das partes adere ou
cede às exigências do outro; (b) compromisso: reflete concessões de ambas as partes, geralmente
obtidos por meio de negociação; (c) impasse: implica uma mudança no tema do discurso ou foco
da atividade, de tal forma que a discordância é descartada sem uma resolução; (d) retirada: ocorre
quando um participante se recusa a continuar, talvez deixando o campo; e (e) intervenção de
terceiros: ocorre quando há a submissão a uma solução proposta por um indivíduo não envolvido.
Dos 134 episódios de conflitos observados, em 16 desses (11,9%) o conflito foi
interrompido pelo adulto (IN), impossibilitando o conhecimento de como seriam finalizados
naturalmente pelos próprios envolvidos. Esses conflitos, portanto, foram descartados da análise,
restando, assim, 118 ocorrências de finalizações. No quadro VII a seguir, são apresentadas as
categorias utilizadas, com suas respectivas descrições:

Quadro VII: Finalizações dos episódios de conflitos

Categorias Descrição
O impasse implica uma mudança no tema do discurso ou no foco
da atividade, de tal forma que a discordância é descartada sem
Abandono do conflito (AB) uma resolução. A retirada ocorre quando um participante se
recusa a continuar, talvez deixando o campo por esgotamento de
recursos.
O sujeito se submete ao outro, ou seja, uma das partes adere ou
Satisfação unilateral (SU) cede às exigências do outro. Há o predomínio da vontade de uma
das partes.
Satisfação bilateral simples (SBS)
O resultado das ações satisfaz os envolvidos.

O resultado que satisfaz os envolvidos reflete um compromisso,


Satisfação bilateral pelo compromisso
ou seja, concessões de ambas as partes, geralmente obtidas por
(SBC)
meio de negociação.
O resultado das ações não satisfaz os envolvidos, permanecendo
Insatisfação bilateral (IB) o desequilíbrio entre as partes. Embora o episódio finalize, o
conflito continua.
Fonte: MARQUES, C. A. E.; OLIVEIRA, M. T. A.; SILVA, L. M. F.; VINHA, T. P. (2014)

A figura IV seguinte apresenta a frequência das finalizações vivenciadas:


157
Figura IV - Porcentagens para as finalizações nos alunos de 11- 12

FINALIZAÇÕES

67,27%

19,09%

6,36% 4,35%
0,91%

Abandono Satisfação Satisfação bilateral Insatisfação Satisfação bilateral


unilateral simples bilateral com compromisso

A categoria mais frequente nos alunos de 11 e 12 anos foi a do abandono do conflito


(67,27%), caracterizada pela mudança de foco da discordância, de tal forma que ela é descartada
sem uma resolução, não havendo, portanto, um acordo de quem está certo ou errado. Em seguida,
encontra-se a categoria denominada de satisfação unilateral (19,09%), marcada, em essência, pela
submissão de uma das partes envolvidas à vontade ou às exigências da outra. A terceira categoria,
com 6,36% de frequência, foi a de satisfação bilateral simples, caracterizada pelo emprego de
estratégias que geram satisfação mútua entre as partes. Já, a quarta categoria, com 4,35% de
frequência, refere-se a um estado de insatisfação mútua. Nesse caso, o conflito não é finalizado, ou
seja, o desequilíbrio causado pela oposição entre as partes não consegue ser desfeito, embora o
episódio da desavença tenha se esvaído. A categoria menos frequente foi a de satisfação bilateral
com compromisso (0,91%), que implica em condescendências de ambas as partes para uma
concordância comum, geralmente obtida por meio de negociação. O movimento crítico dessa
negociação, segundo Vuchinich (1990) é a concessão. Uma concessão, por sua vez, propõe uma
posição de compromisso entre as posições opositoras existentes, embora a oposição ainda exista.
Não somente a negociação é requerida, mas os oponentes devem também estar dispostos a fazer e

158
a aceitar concessões que alteram as posições tomadas anteriormente. Trata-se de uma finalização
mais evoluída do que a de satisfação bilateral simples, em que a satisfação mútua se dá por
acatamento ou consideração/respeito ao outro, mas sem nenhum tipo de negociação para o
consenso.
O abandono do conflito (AB), presente na maioria das situações observadas, pode ser
exemplificado pelo relato (já anteriormente citado) a seguir:

Verônica e Laís viram suas carteiras e sentam-se em dupla para copiar a lição
da lousa. Alice pede para sentar junto e aproxima sua carteira, formando um
trio. Diego olha a cena e diz: "Maria vai com as outras!" Laís responde: "Cala
a sua boca, quem manda na minha vida sou eu e ela senta onde quiser!" Ele olha
para trás e diz mais uma vez sorrindo: "Maria vai com as outras". Laís não
responde mais e ele olha para frente, em direção à lousa.

No conflito apresentado, os alunos envolvem-se em um episódio de provocação. Laís


percebe que, como o intuito de Diego é o de irritar e, também, o de se divertir, deixa de se justificar
ou de se impor. Como não terá nenhum êxito ou benefício com tais estratégias, ela simplesmente
ignora ou desconsidera a fala de Diego. O episódio, então, é abandonado, uma vez que Diego perde
o interesse (motivação) e investe sua atenção em outra atividade. A provocação, simplesmente,
cessa. Não há ganhadores ou perdedores. Embora cada conflito provocativo seja único, podemos
perceber certa regularidade na finalização desse tipo de desavença: o abandono (AB) é,
significativamente, a finalização mais frequente nos conflitos causados por provocação (PR)
(81,25% foram abandonados), como demonstrado a seguir:

159
Tabela VIII: Comparação das variáveis categóricas DI, DL, DP, PR e RC entre as finalizações
Finalizacao Causa
Frequency,
Col Pct ,DI ,DL ,DP , PR ,RC ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+
AB , 2 , 2 , 1 , 39 , 21 ,
, 66.67 , 66.67 , 14.29 , 81.25 , 67.74 ,
---------+--------+--------+--------+--------+---+----
IB , 0 , 0 , 1 , 0 , 2 ,
, 0.00 , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 6.45 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------
SBC , 0 , 0 , 0 , 0 , 0 ,
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------
SBS , 1 , 0 , 1 , 2 , 1 ,
, 33.33 , 0.00 , 14.29 , 4.17 , 3.23 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------
SU , 0 , 1 , 3 , 7 , 7 ,
, 0.00 , 33.33 , 42.86 , 14.58 , 22.58 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.006

Vuchinich (1990) também apresenta que, independente da causa do conflito, tanto adultos,
como crianças, utilizam o abandono muito mais frequentemente do que os outros formatos de
finalização de conflito. O autor explica que, no abandono, nenhum dos envolvidos precisa lidar
com a submissão (que é indesejável, mesmo para os mais subordinados). Ademais, não precisam
fazer concessões ou delicadas negociações necessárias para uma posição de compromisso. Em
geral, o abandono é a forma mais “fácil” de acabar com um episódio de conflito, posto que não
requer o mesmo nível de coordenação, consenso ou autossacrifício exigidos em uma situação de
compromisso ou de dominação, por exemplo.
Considerando esse desprendimento, afetivo, inerente ao abandono e o fato de que as
relações entre as meninas tendem a ser mais estreitas e com maior intimidade e sensibilidade do
que entre os meninos, fica, portanto, coerente que o abandono do conflito esteja significativamente
mais presente nos conflitos que envolvem meninos (70,27% dos conflitos entre os meninos foram
abandonados).
Embora Vuchinick (1990) apresente o predomínio do abandono em qualquer faixa etária,
tal desprendimento do conflito pode ser priorizado especialmente pelos adolescentes em
decorrência de uma fragilidade intrínseca própria da faixa etária, conforme aponta Fierro (1995).
Fierro (1995) ainda assinala que o adolescente é especialmente caracterizado por um equilíbrio
160
afetivo delicado, que às vezes se transforma em desequilíbrio entre a dependência e a
independência, a autonomia e a heteronomia e entre a segurança e a insegurança em si mesmo.
A comparação estatística entre as finalizações e as estratégias utilizadas pelos sujeitos
também indicou uma predominância significativa do abandono nas estratégias físicas e impulsivas
(70,27% dos conflitos que envolviam estratégias físicas foram abandonados). Tal dado parece,
então, indicar que os conflitos com maior nível de coerção são mais propícios a serem
abandonados, o que não deixa de ser, de certa forma, inclusive adaptativo, no sentido do não
prolongamento desse tipo de desavença. Conforme aponta Vuchnick (1990), abandonar é mais
“fácil” em termos de autossacrifício do que a submissão ao outro.
Vale também ressaltar que 67,19% dos conflitos envolvendo estratégias unilaterais (que
também são em grande medida coercitivas) foram abandonados, conforme demonstra a tabela IX
a seguir:

Tabela IX: Comparação da variável categórica finalização entre as estratégias


Finalizacao Estrateg
Frequency,
Col Pct ,CO ,FI ,UN ,
---------+--------+--------+--------+
AB , 11 , 52 , 213 ,
, 42.31 , 70.27 , 67.19 ,
---------+--------+--------+--------+
IB , 2 , 1 , 16 ,
, 7.69 , 1.35 , 5.05 ,
---------+--------+--------+--------+
SBC , 1 , 0 , 0 ,
, 3.85 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+
SBS , 7 , 7 , 20 ,
, 26.92 , 9.46 , 6.31 ,
---------+--------+--------+--------+
SU , 5 , 14 , 67 ,
, 19.23 , 18.92 , 21.14 ,
---------+--------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.007

Dessas estratégias, tanto o comando, como a justificativa foram as que mais estiveram
relacionadas com o abandono como finalização. O comando, extremamente coercitivo, corrobora
com a análise já realizada acerca da relação entre coerção e abandono. Já, a justificativa do motivo,

161
que é a mais evoluída e, portanto, a menos coercitiva das estratégias unilaterais, pode suscitar uma
outra compreensão. Sendo a justificativa uma estratégia relativamente nova no repertório dos
alunos de 11 e 12 anos, ela ainda provoca certo desequilíbrio no oponente, que não possui recursos
suficientes para lidar com a nova estratégia, o que acaba levando a uma diminuição da motivação
pelo conflito.
Pode-se considerar, também, que o predomínio do abandono esteja, ainda, relacionado,
especialmente, à cultura mais coletivista na qual os participantes estão inseridos. O não
prolongamento da desavença é uma característica própria de uma cultura em que as pessoas se
importam com uma interdependência harmoniosa e no uso de estratégias de minimização do
conflito, o que favorece finalizações de esquiva de conflito para a preservação da harmonia
(FRENCH et. al., 2005 e LEME, 2011b).
A segunda finalização mais utilizada (19,09%) foi a satisfação unilateral (SU), evidente na
descrição a seguir:

Pedro chama Verônica de “vaca”, sem nenhum motivo aparente. Ela levanta e
dá um tapa nele. Pedro continua: "Toma, chata! Chata velha!" Ela: "Você devia
estar no hospício, porque você é um louco! Toma papudo!" Joaquim escuta a
conversa e lá de seu lugar diz: "Cala a boca papuda!" Verônica: "A conversa
não chegou no chiqueiro! Vem calar então!" Joaquim: "É covardia bater em
menina!" Ela: "Isso se você fosse homem suficiente." (Faz um sorriso vitorioso).
Ninguém mais responde nada e continuam a fazer a lição.

No conflito acima, os alunos Pedro e Verônica envolvem-se em uma disputa verbal.


Joaquim, por sua vez, pelo prazer em irritar Verônica, resolve investir na desavença. Fica evidente,
no caso, que o alvo específico (Verônica) interfere na decisão de Joaquim de se envolver na disputa.
Trata-se de uma menina que quase sempre é alvo de provocações, principalmente porque
demonstra certo desequilíbrio, reagindo de forma impetuosa e agressiva. No entanto, depois de
alguns embates com Verônica, Joaquim desiste do enfrentamento. A disputa verbal é o tipo de
estratégia que é finalizada justamente quando uma das partes cede à outra (por não conseguir se
impor da forma como deseja ou por falta de repertório para continuar a disputa) e, ao invés de
apelar para outro tipo de estratégia (física e impulsiva ou cooperativa), simplesmente se cala. No
caso anterior, a última fala de Verônica deixa Joaquim sem poder de resposta. A motivação central
está na competição – mais do que na ofensa em si -, e quem cede, se torna o perdedor. O “vencedor”
162
de uma disputa verbal é quem emite a última verbalização. Coerentemente com essa análise da
motivação por competição (envolvendo “ganhadores” e “perdedores”), a disputa por poder (DP)
foi também a causa de conflito que, significativamente, mais teve a satisfação unilateral (SU) como
finalização (42,86%), conforme já demonstrado na tabela IX.
Como a posição de “perdedor” é indesejada, em alguns casos, uma das partes apela para
estratégias mais incisivas, como o grito, o insulto, a ameaça ou mesmo uma estratégia física para
vencer. A outra parte, por sua vez, acaba se submetendo:

Diego está de pé na frente da lousa e Joaquim grita: "Senta". Diego: "Senta


você, você não manda em mim!" Joaquim: "Senta, eu tô mandando!" (grita mais
alto ainda) Diego senta e fala: "Joaquim bambi!" Joaquim: "O que você falou?"
Empurra Diego. Diego fica quieto e Joaquim volta para seu lugar e continua a
copiar a lição da lousa.

A submissão de um dos envolvidos marca a dominação do outro. Vuchinich (1990) aponta


que quem se submete perde e quem domina é o vencedor. A parte que se submete aceita a posição
requerida pela outra parte. Essa aceitação, por sua vez, desfaz a oposição do conflito e marca a
finalização do episódio. Quem se submete provavelmente não concorda com a posição do
adversário, mas aceita a dominação do outro naquela questão específica. O participante que
domina, por sua vez, aceita sua “vitória” e está livre para se envolver em outra interação.
Assim como ocorreu na categoria de abandono, os meninos foram, significativamente, os
que mais apresentaram a satisfação unilateral (SU) em suas finalizações (21,43%), o que, mais uma
vez, confirma a discussão de que as meninas apresentam-se mais evoluídas quanto à consideração
ao outro em uma oposição do que os meninos nessa faixa etária específica. A presença significativa
da finalização satisfação bilateral simples (SBS) (15,38%) nos conflitos entre as meninas também
se aproxima dessa análise diferencial entre os gêneros:

163
Tabela X: Comparação da variável categórica finalização entre os gêneros
Finalizacao Sexo
Frequency,
Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX,
---------+--------+--------+--------+
AB , 20 , 4 , 50 ,
, 71.43 , 30.77 , 73.53 ,
---------+--------+--------+--------+
IB , 0 , 3 , 2 ,
, 0.00 , 23.08 , 2.94 ,
---------+--------+--------+--------+
SBC , 0 , 1 , 0 ,
, 0.00 , 7.69 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+
SBS , 2 , 2 , 3 ,
, 7.14 , 15.38 , 4.41 ,
---------+--------+--------+--------+
SU , 6 , 1 , 13 ,
, 21.43 , 7.69 , 19.12 ,
---------+--------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001

A terceira finalização mais utilizada foi justamente a satisfação bilateral simples (SBS),
com 6,36% de frequência. Apesar de ainda não haver resquícios de uma maior negociação, há um
certo consenso envolvido e as partes se satisfazem com o desfecho do episódio:

Diego fica cantando com uma caneta na boca, próximo ao rosto da Verônica.
Ela pede para ele parar e bate com seu caderno na cabeça dele. Ele pega uma
folha que cai do caderno dela e ela fala: "Professora, olha o Diego aqui..." A
professora não faz nada. Verônica, então, explica para o Diego: "É a minha
prova, é importante, devolve, vai..." (em tom de sedução). Diego devolve. Ela
volta para seu lugar.

No exemplo descrito, Verônica usa, por fim, uma estratégia mais evoluída do que a física e
impulsiva ou a de imposição (comando e terceirização) e reivindica a propriedade da prova, como
uma forma de fazer valer a justiça. Ela usa, inclusive, um tom de sedução em sua reivindicação,
próprio dos jogos intersexuais presentes nas interações dessa faixa etária. Diego, por sua vez, acata
o pedido de Verônica, manifestando consideração pela reivindicação feita.
O acatamento de uma das partes - a partir de uma reivindicação ou de uma justificativa da
outra parte – foi, aliás, a estratégia mais utilizada para o alcance de tal satisfação bilateral. A

164
reparação sincera (pedido de desculpas decorrente de verdadeiro arrependimento) também aparece
como uma estratégia que leva a um consenso entre os envolvidos, uma vez que as duas partes
sofrem. Essa ideia da bilateralidade do conflito aqui presente (o efeito psicológico é mútuo) leva,
portanto, à necessidade de uma reparação sincera de ambos os envolvidos:

Quando conversei com a Gabriela sobre o acontecido entre ela e a Bia ontem,
ela diz: "Você viu, dona, agora tá tudo resolvido!" Eu: "Por que, como se
resolveu?" Ela: "Porque a Bia me pediu desculpas e eu pedi pra ela também."
Eu: "E voltou tudo ao normal, como era antes?" Ela: "Voltou, não como era
antes, né, mas voltou sim!" Eu: "E a Ana?" Ela: "A Bia só falou comigo e não
com a Ana, então eu não sei..."

Aliás, conforme demonstrado na tabela 7, os conflitos que tiveram como finalização a


satisfação bilateral simples possuíam, significativamente, mais estratégias do tipo cooperativas
(como o acatamento e a reparação sincera, por exemplo) do que física e impulsivas ou unilaterais,
o que leva à consideração de que realmente o uso de estratégias mais evoluídas em termos de
coordenação e tomada de perspectiva podem levar, também, a finalizações mais evoluídas em
termos de consenso e satisfação dos envolvidos.
A insatisfação bilateral é a quarta finalização mais encontrada (4,2%) e refere-se às
situações em que, embora haja uma finalização do episódio, nenhuma das partes se satisfaz com o
resultado obtido e, assim, o desequilíbrio causado pelo conflito ainda permanece, como é
exemplificado no relato anteriormente apresentado e retomado a seguir:

Marina está sentada ao lado da Tatiana. De repente Marina fala alto: "Para de
encher meu saco, Tatiana!" Tatiana começa a rir sem graça. Marina repete:
"Para de encher!" Professora escuta e manda as duas separarem as carteiras.
Tatiana não fala nada. (...) Pergunto para Marina o que aconteceu e ela faz sinal
negativo com a cabeça e depois diz que Tatiana a irritou. As duas ficam
separadas e não se conversam mais. Tatiana evita cruzar o olhar com o meu. Na
outra aula, Tatiana faz a atividade sozinha, enquanto a Marina e a Alice sentam
juntas. Marina e Alice ficam cochichando sobre a Tatiana, mas não consigo
ouvir o que é. No intervalo, pergunto para a Tatiana o motivo da briga e ela diz
(sorrindo): "É que ela me perguntou se o cantor Luan Santana tinha namorada
e eu disse que sim e daí ela ficou brava e começou a chorar!" Eu: “Você disse a
verdade pra ela?" Ela: "Era verdade, ele tem namorada sim!" Eu: "Então você
está me dizendo que ela ficou brava porque o Luan tem namorada?" Ela: "A
Marina ama o Luan!" Eu: "E vocês não estão mais se falando?" Ela: "Até agora
não, mas à noite ela sempre me liga para perguntar alguma coisa e daí fica tudo
bem de novo".
165
É interessante ressaltar que todos os episódios com esse tipo de desfecho tinham como
participantes as meninas, o que é condizente com a discussão já realizada sobre como os conflitos
se conservam muito mais entre as meninas do que entre os meninos e muito mais entre amigas
(relações de maior intimidade) do que entre apenas colegas de sala. O episódio termina, mas não o
conflito. Os sentimentos gerados pela oposição permanecem nas partes envolvidas e são expressos
em futuros episódios conflitivos complementares, até o desfecho final. Fierro (1995) explica que
os meninos colocam menos ênfase nos componentes afetivos da amizade, o que ajuda a
compreender as divergências encontradas entre os gêneros. As evidências encontradas por Gorrese
e Ruggieri (2012) também apontam que os meninos tendem a dar mais ênfase a companheiros com
quem podem, por exemplo, dividir atividades comuns (esportes, por exemplo).
A satisfação bilateral com compromisso (SBC) foi a finalização menos encontrada nas
interações entre os participantes (0,8%), o que é coerente com os tipos de estratégias também
utilizados, que favorecem muito mais a coerção e o afastamento, ao invés da negociação e da
conciliação. O relato a seguir exemplifica tal categoria:

Laís e Verônica brigaram porque Laís vai ao passeio da escola, mesmo sabendo
que Verônica foi proibida de ir pela coordenação da escola. Pergunto para Laís
se ela já fez as pazes com a Verônica e ela diz que sim, porque agora ela acha
que a Verônica vai ao passeio. Pergunto se elas conversaram e ela diz que sim
com a cabeça. Ela chama a Verônica para a conversa e diz: "Nós somos amigas
agora de novo, não somos?" Verônica: "Amigas de verdade... Não sei..." Laís:
"Amigas às vezes brigam, não é verdade?" Verônica faz sim com a cabeça.
Voltam a conversar de outros assuntos. Em outra aula, Laís muda de lugar e
senta-se atrás da Verônica e ficam conversando normalmente.

Nesse diálogo, Laís e Verônica conseguem finalmente colocar fim a um conflito iniciado há
vários dias e que teve como causa a divergência de expectativas entre amigas íntimas. As meninas,
por meio de estratégias mais evoluídas - de convencimento -, conseguem uma finalização que
contenta as duas partes. Embora a oposição de ideias ainda persista (com relação ao conceito de
amizade de cada uma), percebe-se claramente que existe um movimento de negociação, que
culmina em uma concessão. O conflito aparentemente é finalizado positivamente em função dos
comportamentos apresentados pelas duas (sentam-se juntas novamente, voltam a conversar e a dar
risadas).
166
Novamente se evidencia a influência do tipo de relação para o uso das estratégias e,
consequentemente, para o tipo de finalização conseguida. Laís e Verônica são amigas muito
próximas e, portanto, gerem seus conflitos com mais cautela para evitar um eventual rompimento.
Presume-se, assim, que características como a proximidade e a estabilidade do relacionamento já
interferem no comportamento diante do conflito entre os adolescentes. Laursen e Collins (1994)
apontam que, no relacionamento com os colegas mais próximos, os adolescentes geralmente
minimizam a frequência de discordâncias e utilizam mais do compromisso naquelas que surgem,
de modo a não prejudicar a qualidade do relacionamento. Já as relações com colegas de classe não
são caracterizados pela proximidade e, consequentemente, quando surgem conflitos, menor
frequência de compromissos e finalizações com menos satisfação bilateral são esperadas. Os
resultados da presente pesquisa também sugerem uma ênfase no uso do compromisso e do acordo
entre amigos, em vez da submissão, especialmente nas meninas.
Por fim, vale ressaltar algumas distinções marcantes entre o presente estudo e os estudos
análogos: com os alunos de 3 e 4 anos, os de 5 e 6 anos (LICCIARDI, 2010) e os de 8 e 9 anos
(SILVA, 2015). Percebe-se, claramente, que os episódios de conflitos tornam-se mais longos com
o avanço do desenvolvimento, inclusive com a utilização de um número maior de estratégias em
cada episódio. As estratégias, por sua vez, são cada vez mais variadas, embora haja, ainda, o
predomínio das de caráter impositivo.
Como já assinalado, os conflitos se conservam mais, ou seja, o desequilíbrio causado pela
oposição perdura, gerando, assim, múltiplos episódios relacionados a um mesmo conflito, que
acabam, inclusive, ultrapassando os muros da escola, especialmente entre as meninas:

Cheguei à escola e Isabel, Thais e Carolina vieram me falar que foram parar na
diretoria na quinta. Elas contaram que a Ana ficou chamando elas de 7
monstrinhos na quarta e que a Letícia as contou. Na quinta, a Ana e a Gabriela
foram contar para a professora Raquel o que estava acontecendo ("contou antes
de nós, a versão delas, né?") A professora Raquel, então, avisou a diretora, que
chamou todo mundo na diretoria ("ficou falando uma hora com a gente!") Elas
disseram que a diretora falou para a Ana, Gabriela e Lara: "O que vocês pensam
que são para chamar as pessoas de monstros? Se eu escutar mais xingamentos,
vocês serão suspensas!" Gabriela negou na hora qualquer envolvimento na
situação. Isabel disse que no final de semana, a Gabriela e a Ana ficaram
passando de propósito em frente à casa da Isabel e ficavam tomando chupe-
chupe. Isabel: "Quase que eu peguei um sorvete de massa para humilhar aquele
167
chupe-chupe." Isabel disse que avisou a mãe e que ela saiu pra rua e deu uma
bronca na Gabriela e na Ana, que acabaram pedindo desculpas.

Os grupos de um único sexo – e a comum hostilidade pelo sexo oposto - dão cada vez mais
lugar aos relacionamentos com grupos mistos, aumentando, assim, a quantidade dos conflitos
interssexuais.
Quanto à finalização dos conflitos em todas as idades, o abandono é a forma de resolução
mais utilizada. Especificamente, não há diferença significativa na comparação das finalizações
entre os alunos de 8-9 anos e 11-12 anos, conforme demonstrado a seguir:

Tabela XI: Camparação da variável categórica finalização entre as faixas etárias de 8-9
e 11-12
Finalizacao Idade
Frequency,
Col Pct ,8-9 ,11-12 ,
---------+--------+--------+
AB , 73 , 74 ,
, 66.36 , 67.27 ,
---------+--------+--------+
IB , 3 , 5 ,
, 2.73 , 4.55 ,
---------+--------+--------+
SBC , 0 , 1 ,
, 0.00 , 0.91 ,
---------+--------+--------+
SBS , 10 , 7 ,
, 9.09 , 6.36 ,
---------+--------+--------+
SU , 19 , 21 ,
, 17.27 , 19.09 ,
---------+--------+--------+

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.686

Outra caraterística importante diz respeito à extensão dos conflitos. Em função dos laços
mais estreitos com o grupo de companheiros próprios da adolescência, as desavenças deixam de
ser essencialmente formadas por uma díade (como acontecem com os menores) e passam a ser cada
vez mais grupais (entre várias pessoas de um mesmo grupo ou entre grupos rivais). Ademais, os
conflitos passam a incluir mais frequentemente a presença de outros participantes (“terceiros”),
que interferem em um episódio já iniciado, como é exemplificado a seguir:

168
Na hora de escolher um livro na aula de Português, Diego e Sara avisam a
professora que o Luca tomou o livro da mão do Renan. A professora pega o livro
das mãos do Luca e pede para os dois escolherem outros livros, ou então terão
que chegar a um acordo. Diego fala para a professora: "O Renan estava com o
livro na mão e o Luca começou a bagunçar tudo e tirou o livro dele, né Sara?
Sara confirma com a cabeça. A professora, então, entrega o livro para o Renan
e pede para o Luca escolher outro. Ao voltar para o fundo da sala para buscar
outro livro, Luca fala para Diego: "Seu filho da puta do caralho!" E dá um tapa
no Diego. Francine olha a cena e diz: "Já vai bater por causa de um livro,
Luca?!" Luca não responde. Diego volta para seu lugar.

No relato, Diego e Sara se envolvem na disputa entre Luca e Renan, defendendo Renan,
que no caso, era o alvo. Quando o conflito passa a envolver Luca e Diego, Francine interfere,
indignada, reinvindicando, no sentido de fazer valer a justiça. Analisando todos os episódios com
esse tipo de interferência, em 72% das vezes o terceiro atua defendendo uma das partes, utilizando,
preferencialmente, estratégias unilaterais de comando (20,8%) e de terceirização a algum adulto
(16,6%). Vuchinick et al. (1988) também apontam em seus estudos sobre conflitos familiares, que
os terceiros geralmente formam alianças com um dos lados contra o outro e que suas ações podem
tanto resolver, exacerbar ou não influenciar o resultado do conflito. Ademais, os autores
apresentam que o terceiro pode, ainda, entrar em um conflito como um intermediário ativo,
tentando distrair os oponentes de suas desavenças, ou, inclusive, usar sua eventual autoridade para
acabar com o conflito. Embora não tenha aparecido no presente estudo, o terceiro pode agir,
também, de acordo com Vuchinick et al. (1988), como um mediador sem nenhum poder especial
sobre uma das partes, ou, até mesmo, explorar a divisão criada pela disputa para obter algum tipo
de influência que normalmente não teria.
Verificando, agora, os envolvidos nos conflitos, percebe-se que esses terceiros (que eram
tanto meninos, como meninas) defendem preferencialmente seus amigos (61%), reforçando o
pressuposto de que o nível ou tipo do relacionamento interfere nas escolhas realizadas. As
evidências sobre as diferenças de contexto no comportamento conflitivo dos adolescentes sugere
que, embora a maturidade física, cognitiva e moral contribuam para os processos de conflito, elas
não são a única fonte de variabilidade.
Os colegas que estavam sendo injustiçados, os mais “frágeis” fisicamente ou aqueles
frequentemente excluídos (menos populares) também chamaram a atenção de seus pares e foram
169
defendidos em 27,7% dos casos de influência de terceiros, indicando, portanto, a presença de um
comportamento mais prossocial. Fierro (1995) apresenta que o comportamento prossocial refere-
se a um conjunto de ações que busca voluntariamente beneficiar o outro (por exemplo,
compartilhar, ajudar, consolar ou proteger outras pessoas). Piaget (1964-2006) ajuda a
compreender a evidência de tal comportamento (embora ainda incipiente no presente estudo), ao
afirmar que o egocentrismo na adolescência envolve se sentir como um igual aos adultos, porém,
querendo ultrapassá-los e surpreendê-los, transformando o mundo por meio de sentimentos
generosos e altruístas. Ademais, Fierro (1995) enfatiza que, em consonância com a dimensão
cognitiva, os raciocínios morais também evoluem com o tempo, tornando-se gradativamente menos
hedonistas e mais orientados pelas necessidades dos outros, com mais componentes empáticos,
bem como com mais referências à adoção de perspectivas.
Por fim, verifica-se, sem dúvidas, a crescente integração de vários domínios do
desenvolvimento, incluindo a regulação dos impulsos, o processamento cognitivo, a orientação
moral e as habilidades de negociação interpessoal. Esse desenvolvimento, contudo, não é insensível
às influências do meio social em que o sujeito se desenvolve, mas é fruto das contínuas interações
com esse meio, tanto no nível do raciocínio, como do comportamento moral, como será melhor
explorado a seguir.

6.2 Comparação entre Ação e Juízo

Para atender ao último objetivo da pesquisa, são analisadas, nesse momento, as estratégias
de negociação interpessoal verbalizadas pelos alunos por meio das entrevistas, para a comparação
entre os juízos emitidos e as ações constatadas durante as observações.
As entrevistas continham histórias fictícias envolvendo conflitos interpessoais, criadas a
partir das causas mais frequentes vivenciadas35. Para que os alunos não considerassem somente a
simples solução do conflito, mas, sim, o que seria o mais correto a ser feito pela personagem, a
questão inicial proposta era: “o que a personagem deve fazer”?
As respostas que se referiam a como a situação deveria ser resolvida foram analisadas de
acordo com as mesmas categorias utilizadas na ação: estratégias físicas e impulsivas (ações físicas
ou verbais, momentâneas, carentes de reflexão e marcadas pela impulsividade), estratégias

35
Histórias descritas na página 114.
170
unilaterais (ações predominantemente verbais, visando ao controle do outro pelo uso do poder e
não pela negociação) e estratégias cooperativas (ações predominantemente verbais que visam
convencer ao outro a acatar uma ideia para fazer o que se deseja ou a reparar um dano).
Embora as entrevistas tenham sido realizadas com alguns participantes (em cada escola
foram selecionados os 30% de alunos mais envolvidos em conflitos), é importante ressaltar que a
análise comparativa do juízo emitido e da ação observada versa sobre a amostra como um todo e
não sobre os alunos de forma individual.
A figura IV, a seguir, apresenta a comparação entre as frequências das categorias de
estratégias utilizadas na ação e as verbalizadas nas entrevistas nos alunos de 11 e 12 anos:

Figura IV: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo


para o grupo total de 11 e 12 anos
COMPARAÇÃO ENTRE AÇÃO E JUÍZO
75,46%

63,86%

33,73%

19,22%

5,32%
1,20%

Física e impulsiva Unilateral Cooperativa


AÇÃO JUÍZO

Na ação, conforme já apresentado, a categoria predominante das estratégias foi a unilateral


(75,46%), seguida da física e impulsiva (19,22%) e, por último, da cooperativa (5,32%).
No juízo, entretanto, essa ordem sofre algumas alterações: a categoria unilateral continua
sendo predominante (63,86%). Contudo, chama a atenção o fato de a segunda categoria mais
frequente no juízo ser a cooperativa (33,73%), seguida da física e impulsiva, com apenas 1,2% de
frequência.

171
No excerto seguinte, é apresentado um exemplo de um conflito de provocação, em que o
aluno sugere que a personagem utilize uma estratégia unilateral de terceirização à autoridade para
resolver a desavença:

Pesquisadora: Por que Murilo ficava puxando o cabelo de Helena?


Caio: Porque ele quer provocar a Helena.
Pesquisadora: Por que ele quer provocar a Helena?
Caio: Porque ele quer provocar ela e ela vai ficar conversando e aí a professora vai xingar
a menina.
Pesquisadora: O que a Helena deve fazer? Por quê?
Caio: Contar pra professora, porque às vezes pode machucar a cabeça, o cabelo.
Pesquisadora: E o que a professora vai fazer?
Caio: Vai dar mais lição pra ele, vai conversar com ele.

A terceirização foi, aliás, a estratégia unilateral mais frequente nas verbalizações dos
sujeitos (40,7%) e esteve presente em todas as respostas das histórias que envolviam, por exemplo,
a provocação intersexual. Embora a literatura reconheça que, especialmente, o uso do humor não
hostil pode conduzir a uma redução na provocação e a um aumento da aceitação dos pares (KATZ
et al., 2008; CONOLEY et al., 2007), fica evidente nas falas dos alunos que contar a alguma
autoridade (principalmente para a professora) é a forma mais eficaz para acabar com uma
provocação:

1) Marina: Ah, tem que chamar a professora porque, senão, ela vai ficar sofrendo isso o
dia inteiro, a vida inteira dela... Enquanto ela continuar perto dele.

2) Walter: Chama a professora para parar a provocação, senão não tem fim...

3) Tatiana: Se ela falar para eles pararem, eles não param.


Pesquisadora: Não param?
Tatiana: Não!
Pesquisadora: E aí, o que se faz?
Tatiana: Ela fala com a professora, daí a professora fala que era para eles pararem,
porque senão eles iam para diretoria. Daí eles param.

Quando perguntados sobre a atitude da autoridade, os alunos consideram, em sua maioria,


que algum tipo de punição será dado (ameaçar, chamar os pais, dar mais lição, mandar parar,
suspender, expulsar, xingar, separar os alunos), o que vai ao encontro do que realmente acontece

172
em suas vivências: há o predomínio de atitudes, por parte dos professores, que acabam por
solucionar unilateralmente o conflito, beneficiando uma das partes envolvidas.
Vale ressaltar que uma aluna, entretanto, apresenta outra perspectiva sobre alguns
sentimentos envolvidos na desavença e sobre o uso da terceirização como estratégia de resolução
diante da provocação, o que traz à tona, novamente, a forte presença da dimensão da sexualidade
– revelada por meio dos jogos intersexuais - nos conflitos envolvendo os adolescentes:

Pesquisadora: Como a Helena estava se sentindo quando o Murilo estava puxando o cabelo
dela?
Laís: Dependendo da menina, estava gostando.
Pesquisadora: Ah! É?
Laís: Eu acho. Porque, se ela não estivesse gostando, falava com a professora.
Pesquisadora: Mas, você acha que esse caso da Helena, ela estava gostando ou não?
Laís: Estava gostando!
Pesquisadora: Estava gostando ...
Laís: É! Porque ela gosta que os meninos mexem com ela.
Pesquisadora: Ah! Você acha que tem menina que gosta que os meninos mexem?
Laís: Eu não acho, eu tenho certeza!
Pesquisadora: Você tem certeza...
Laís: Eu conheço menina que deixa.
Pesquisadora: Por que você acha que as meninas gostam que os meninos mexem?
Laís: Porque elas gostam de se sentir poderosas.
Pesquisadora: O que é se sentir poderosa?
Laís: Se sentir bonita, achar que os meninos gostam muito delas.

Chama, ainda, a atenção, na análise das verbalizações dos sujeitos, o fato de a segunda
categoria mais frequente no juízo ser a cooperativa, apresentando uma porcentagem de 33,73%
(enquanto que na ação sua frequência é de somente 5,32%). A seguir, é apresentado um exemplo
de um conflito de disputa de poder, em que aparece a estratégia cooperativa mais relatada pelos
sujeitos (42,8%): o render-se. Trata-se de uma estratégia em que o sujeito cede ou sujeita-se ao
outro, porém em nome de algo maior:

Pesquisadora: Porque eles discutiram? O Tomás e a Isabela.


Verônica: Por causa que a Isabela queria fazer uma coisa e ele também. É que os meninos,
todos, não falando só desse, todos os meninos não gostam que as meninas fazem as coisas.
Pesquisadora: Ah! Não? Por quê?
Verônica: Por causa que eles acham que as meninas são muito detalhistas. Essas coisas,
detalhista.
Pesquisadora: E qual o problema de ser detalhista?
173
Verônica: Ah, eles não gostam que as meninas fazem as coisas.
Pesquisadora: O que a Isabela sentiu quando o Tomás não deixou ela fazer o desenho?
Verônica: Sentiu triste, pensando que ele não iria ... Não deixou ela desenhar.
Pesquisadora: O que a Isabela deve fazer?
Verônica: Ir para outro grupo.
Pesquisadora: Ir para outro grupo?
Verônica: É. Que tá precisando mais de ajuda do que aquele.
Pesquisadora: E você acha que no outro grupo ela vai conseguir desenhar?
Verônica: Sim.
Pesquisadora: O que vai acontecer quando a Isabela for para outro grupo?
Verônica: Hum ... [pensativa]. Ela vai conseguir fazer...Ah! Conseguir fazer o desenho que
ela quer. Por causa que tem grupos que tem pessoas que não sabem desenhar direito.
Pesquisadora: Entendi. Então, você acha que no outro grupo ela vai conseguir fazer o
desenho, porque tem outras pessoas que não sabem fazer.
Verônica: Sim.

No relato descrito, Verônica explicita que embora a personagem Isabela possa até ter ficado
triste, ela deve sujeitar-se a Tomás, não por obediência submissa ou por recuo (que seriam
estratégias unilaterais, pautadas em intimidação ou medo), mas porque concebe que os meninos,
em geral, não gostam do “detalhamento” das meninas nos trabalhos em grupo. Verônica julga que
o mais importante é a participação na atividade, então, considera que a personagem pode realizar
o desenho que deseja em outro grupo que realmente precise de sua ajuda (“Ela vai conseguir fazer
o desenho que ela quer. Por causa que tem grupos que tem pessoas que não sabem desenhar
direito”).
Além do render-se, vale exemplificar que, com relação às estratégias cooperativas, os
sujeitos, nas entrevistas, verbalizaram que as personagens das histórias deveriam utilizar, ainda, o
pedido de desculpas sincero, ou seja, que demonstre um arrependimento genuíno, sem a
intimidação de alguma figura de autoridade (“Ah, desculpa, Manuela, eu não sabia que não era
para escrever sobre namorado na sua camiseta, eu pensei que era para escrever qualquer coisa
que a gente quisesse! Foi mal, sério...”) ou deveriam tentar uma negociação (“Vamos fazer assim,
eu faço uma parte do trabalho e você faz a outra. A próxima você faz e eu faço essa parte junto...”).
Essas respostas foram encontradas principalmente nas histórias acerca da reação ao
comportamento perturbador, o que indica que, quando eles não estão diretamente envolvidos na
situação de desavença, conseguem refletir e considerar melhor a intenção do outro e, assim, com
isso, utilizar estratégias menos coercitivas.

174
Coerentemente com os achados de Crick e Dodge (1994) acerca da relação positiva entre a
atribuição de uma intencionalidade hostil e o uso da agressão, todas as vezes em que os alunos
participantes julgaram que a personagem tinha realmente a intenção de perturbar (“foi de
propósito”), eles sugeriram estratégias unilaterais para resolver o conflito, como, por exemplo, a
terceirização:

Pesquisadora: Você acha que a Luiza quis provocar a Manuela? Por quê?
Alice: Foi! Era para provocar. Porque ele deveria ser o ex namorado dela; alguma coisa
assim. Ex namorado, ex ficante... Aí ela tava namorando esse moleque, aí colocou na
camiseta dela.
Pesquisadora: Ah! Entendi... E o que a Luiza deve fazer?
Alice: Contar para a professora.
Pesquisadora: Por que você acha que ela deve contar para professora?
Alice: Porque a professora deve resolver.
Pesquisadora: E de que jeito a professora vai resolver?
Alice: Ai, fazendo ela lavar a roupa; mandar ela levar para casa dela para lavar.

Contudo, todas as vezes em que consideraram que a personagem não tinha a real intenção
de perturbar (“não fez de propósito, estava só distraído”), sugeriram estratégias mais cooperativas,
como a reparação sincera, por exemplo:

Pesquisadora: Por que Júlio mandou o Marcelo calar a boca?


Walter: Porque o Júlio estava querendo fazer a lição e o Marcelo não.
Pesquisadora: Mas o Marcelo estava cantando para atrapalhar o Júlio?
Walter: Acho que não. Não era de propósito.
Pesquisadora: Como Marcelo se sentiu quando Júlio mandou calar a boca e o chamou de
tonto?
Walter: Se tocou.
Pesquisadora: E o que Marcelo deve fazer? Por quê?
Walter: Deve pedir desculpa pro Júlio. Porque ele estava cantando e atrapalhando o Júlio
de verdade.

Tal análise confirma a perspectiva aqui defendida de que a habilidade para diferenciar e
coordenar as perspectivas de si e dos outros, cognitivamente e emocionalmente, forma a base da
comunicação social, bem como da ação (DRAY et al., 2009).
Como visto, diferentemente do que foi encontrado por Licciardi (2010) com as crianças de
3 a 6 anos (ver figura V a seguir), no juízo, os alunos de 11 e 12 anos demonstram, em geral,

175
respostas mais sofisticadas em termos de tomada e coordenação de perspectiva do que efetivamente
apresentaram na ação.

Figura V: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo


para as crianças de 3 a 6 anos

COMPARAÇÃO ENTRE AÇÃO E JUÍZO NAS CRIANÇAS


DE 3 A 6 ANOS
75,20%

63,30%

27,00%
23,30%

9,10%
1,60% 0,50% 0,00% 0,20% 0,00%

Físicas e Impositivas Transição Convencimento Não identificada


impulsivas

Ação Juízo

Embora as unilaterais continuem sendo as estratégias mais frequentes, tanto nos


comportamentos observados dos alunos de 11 e 12 anos, como no relato das entrevistas, o aumento
da frequência das estratégias cooperativas (mais evoluídas), somado à quase extinção das
estratégias físicas e impulsivas (menos evoluídas), leva à constatação de que os sujeitos conseguem
pensar em ações mais aprimoradas ao analisar as histórias contadas, do que conseguem
efetivamente agir em situações de conflitos nas quais estão envolvidos.
Coerentemente com o que foi encontrado, Laursen e Collins (1994), em uma revisão sobre
o conflito interpessoal na adolescência, também apresentam que, apesar dos ganhos em maturidade
cognitiva e em compreensão interpessoal expressos em conflitos hipotéticos, os níveis reais de
compromisso na ação permanecem baixos em toda a adolescência. Segundo os autores, a variação
no comportamento do adolescente é prevista mais em função dos diferentes tipos de
relacionamentos, do que em termos de faixa etária e do nível de maturação. Os autores citam outros
estudos, como os de Youniss e Smollar (1985); Stenberg e Dobson (1987) e Smetana (1989 e 1991),
176
os quais também constatam uma clara preferência pelo compromisso (mais evoluído) em situações
hipotéticas do que em situações semelhantes reais de desavença nos adolescentes. No geral,
verifica-se que os processos de resolução de conflitos em interações reais mudam lentamente na
adolescência, apesar das evidências de evolução em conflitos hipotéticos.
Apesar da constatação de que as estratégias mais evoluídas aparecem em maior proporção
no juízo do que na ação, não foram encontradas categorias distintas nas duas instâncias analisadas:
tanto nas situações de conflitos vividas, como nas respostas das entrevistas, encontramos as
estratégias do tipo física implusivas, unilaterais e cooperativas. Tal conclusão é a mesma do estudo
com as crianças de 8 e 9 anos (SILVA, 2015):

Figura VI: Porcentagens para as estratégias de resolução de conflito na ação e no juízo


para as crianças de 8-9 anos e 11-12 anos

COMPARAÇÃO ENTRE AÇÃO E JUÍZO


8-9 E 11-12 ANOS
75,46%
70,44%
65,79% 63,86%

30,26% 33,73%
25,16%
19,22%

3,77% 2,63% 5,32%


1,20%

ação juízo ação juízo


8 e 9 anos 11 e 12 anos
Física e Impulsiva Unilateral Cooperativa

A teoria piagetiana acerca das relações entre o fazer e o compreender é fundamental, nesse
momento, para a análise da ação e do juízo nas diferentes etapas do desenvolvimento. De acordo
com Piaget (1977, 1978), a passagem da forma prática do conhecimento (saber fazer) para o
pensamento (compreender) acontece em função da tomada de consciência, que é um “processo de
conceituação que reconstrói e depois ultrapassa, no plano da semiotização e da representação, o
que era adquirido no plano dos esquemas de ação" (PIAGET, 1977, p. 204). Para o autor, se nos
estágios iniciais do desenvolvimento, a ação apresenta-se mais adiantada do que o pensamento (o
conhecimento provém da ação), com o passar do tempo, verifica-se que a conceituação liberta-se

177
progressivamente dos limites das ações concretas. Inicialmente, a criança pequena age e consegue
êxito sem, no entanto, conseguir compreender as razões desse sucesso alcançado no plano da ação.
Daí suas estratégias na ação serem mais evoluídas em termos de compreensão interpessoal do que
no juízo (LICCIARDI, 2010). Progressivamente, entretanto, essa situação começa a se inverter. O
sujeito gradativamente se apropria dos mecanismos íntimos da ação a partir dos resultados dessa
própria ação. A compreensão conceitual passa a acontecer simultaneamente à ação para, depois,
ultrapassá-la, acabando, inclusive, por influenciá-la ou orientá-la. A pessoa, então, programa e
planeja a ação antes de executá-la.
Assim, com o avanço do processo de desenvolvimento, a necessidade da ação prévia é
progressivamente relativizada (BECKER, 1999). Como fica evidente nos dados encontrados por
Licciardi (2010), as crianças menores precisam intensamente de experiências práticas e ainda não
são capazes de tomar consciência dessas suas ações e nem tampouco, de elaborar conceitos sobre
as relações estabelecidas entre elas. A conceituação, por sua vez, avança por meio das progressivas
tomadas de consciência da ação e de seus mecanismos. O fato de o juízo estar mais evoluído do
que a ação nos sujeitos da presente pesquisa - e, também, nos alunos de 8 e 9 anos (SILVA, 2015)
-, é coerente, portanto, com o fato dos sujeitos, em função da própria evolução do desenvolvimento,
já conseguirem, minimamente, compreender a experiência empírica, coordenando, no plano do
pensamento, a estrutura da ação e sua lei de composição, ou seja, o porquê e o como das ações
anteriormente realizadas.
Fica, portanto, evidente, que há uma estrutura no modo como o sujeito pensa sobre as
relações sociais e essas concepções ficam mais complexas conforme o desenvolvimento avança.
Schultz, Yeates e Selman (1989) são explícitos ao afirmarem que a razão pela qual os sujeitos dão
determinada resposta às histórias propostas oferece uma maior compreensão acerca da sua
habilidade de tomar a perspectiva do outro. Essa compreensão, por sua vez, segundo os autores,
pode ajudar os professores a avaliar o progresso dos alunos na tomada de perspectiva social e na
habilidade de entender o ponto de vista do outro. Piaget (1977), ainda, ressalta a influência da
conceituação sobre a ação, posto que a ação passa gradativamente a ser corrigida e pode ser,
inclusive, melhorada em função da conceituação.
Contudo, é importante destacar que saber o porquê e o como fazer não necessariamente
implica uma ação correspondente. Ao considerar a ação do sujeito em uma situação real de conflito,
elementos de ordem contextual, relacional e emocional possuem forte influência, como já
178
anteriormente ressaltado. Schultz, Yates e Selman (1989), ao descreverem a importância do
significado pessoal, sinalizam que a “personalização”, e não apenas a “informação” em si, é
considerada como fator significativo para determinada estratégia a ser utilizada. Especialmente na
adolescência, vale retomar que o grau de intimidade e a natureza do relacionamento estabelecido
entre as partes envolvidas no conflito possuem grande influência no modo pelo qual os conflitos
são efetivamente vivenciados (LAURSEN e COLLINS, 1994).
Em síntese, analisando as diferentes faixas etárias - 3 e 4 anos, 5 e 6 anos, 8 e 9 anos e 11 e
12 anos - (LICCIARDI, 2010 e SILVA, 2015), constata-se, claramente, que a evolução da relação
entre a ação e o juízo segue a lei de construção de conhecimento afirmado por toda a teoria
piagetiana: primeiro é preciso experimentar para depois compreender. Há, portanto, um sucesso
precoce da ação em relação ao pensamento, identificado no fato de as crianças menores
apresentarem estratégias mais sofisticadas para resolver seus reais desequilíbrios interpessoais do
que para resolver os hipotéticos. Em função das sucessivas tomadas de consciência dessas
experimentações, os sujeitos vão elaborando conceitos sobre as relações que se estabelecem e, com
isso, gradativamente, passam a programar a ação antes de executá-la. Daí o fato de os alunos de 8
e 9 anos e de os de 11 e 12 anos já apresentarem alguns sinais de uma ultrapassagem do pensamento
em relação aos limites da ação (início da conceituação), claramente vislumbrados por meio do
aumento do número de estratégias cooperativas, somado pelo declínio das estratégias físicas e
impulsivas no juízo. O crescente desenvolvimento de níveis ordenados de tomada e coordenação
de perspectiva social (de concepções egocêntricas, para mecanismos de reciprocidade) também
favorecem - mas não determinam - o emprego de estratégias de resolução de conflitos mais
elaboradas (de impulsivas e unilaterais para estratégias mais cooperativas). Ademais, há que se
considerar que, especificamente na ação, diferenças nas características do relacionamento, assim
como as experiências subjetivas implicadas em todo o contexto do conflito também levam a
diferenças no comportamento.
Laursen e Collins (1994) apontam, contudo, que, sem desconsiderar as variáveis já
indicadas, estudos (Levya & Furth, 1986; Selman et al., 1986) relatam uma melhoria na
competência social em situações reais de resolução de conflito quando adolescentes são convidados
a indicar estratégias adequadas para responder a conflitos hipotéticos, reiterando, assim, a
importância de se disponibilizar oportunidades que ajudem na promoção de reoganizações

179
reflexivas quando se almeja o desenvolvimento sociomoral. Essa e outras possíveis implicações
serão melhor exploradas nas considerações finais a seguir:

180
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Jovens brigam em sala de aula com estilete e professor sai sem separá-las. Briga
aconteceu na unidade escolar Professor Pires de Castro em Teresina. Professor presencia
agressões, mas deixa a sala sem fazer nada”.36 Essa manchete, publicada em uma influente agência
de notícias da internet, era seguida por um vídeo amador, em que a cena descrita podia ser
visualizada com extrema clareza. Apesar do alarmismo – muitas vezes descomedido -, proclamado
pela mídia, tal cena realmente causa certo sobressalto por duas razões principais: o grau de
hostilidade exibida pelas adolescentes e a postura do professor diante da seriedade do conflito
presenciado dentro da sala de aula.
Partindo do panorama apresentado, algumas considerações importantes que sustentam o
presente estudo podem ser inicialmente traçadas. A primeira: a interdependência entre as pessoas
fomenta inevitáveis discordâncias, sendo, portanto, a escola, como importante agente socializador,
um palco privilegiado para suas ocorrências. A segunda: o professor possui um papel fundamental
no que se refere ao ambiente de aceitação, de segurança e de respeito vivenciado em uma classe.
A terceira: o conflito interpessoal, como oposição de necessidades, desejos ou demandas, não deve
ser considerado como algo positivo ou negativo por si só. São justamente as estratégias utilizadas
que transformam o conflito em algo devastador para as relações ou em um desafio construtivo, em
que há, inclusive, oportunidades de desenvolvimento. Aliás, compreender o conflito interpessoal
como possibilidade de aprendizagem é o pressuposto que baliza a presente pesquisa.
Como, então, lidar com os conflitos entre os alunos para que efetivamente progridam,
especialmente na habilidade de considerar e coordenar outros pontos de vista? Foi justamente essa
questão que nos impulsionou a explorar o fenômeno, considerando, especialmente, a realidade dos
sujeitos brasileiros. Como um microcosmo dos padrões gerais de interação interpessoal, o conflito
possui características distintas e significados específicos ao longo do desenvolvimento.
Assumimos, assim, que há uma estrutura no modo como a pessoa pensa sobre as relações sociais
e essas concepções ficam mais complexas conforme as crianças crescem, movendo-se de uma visão
egocêntrica do mundo para uma perspectiva mais social ou comunitária. Entender, portanto, como

36
http://g1.globo.com/pi/piaui/noticia/2014/11/jovens-brigam-em-sala-de-aula-com-estilete-e-professor-sai-sem-
separa-las.html. Data de acesso: 18/11/2014
181
se dá esse percurso de transformações desde a tenra infância até o início da adolescência, a fim de
fundamentar intervenções efetivas em prol do desenvolvimento de competências sociais, foi o que
balizou o planejamento de uma investigação maior, comparativa (3 a 6 anos, 8 e 9 anos, 11 e 12
anos, 13 e 14 anos), na qual o estudo aqui apresentado se insere.
Especificamente, tivemos como objetivos identificar, por meio de sessões de observação da
rotina escolar e de entrevistas individuais com os alunos de 11 e 12 anos, quais são os motivos mais
frequentes geradores de desavenças, quais são as principais estratégias de negociação interpessoal
empregadas e quais são as finalizações dos conflitos. Pretendeu-se, também, comparar se há
diferenças entre as maneiras como os alunos de 11 e 12 anos julgam resolver os conflitos e os
modos como eles os resolvem na prática, bem como comparar as causas, as estratégias, as
finalizações e os juízos entre alunos de 8 e 9 anos com os de 11 e 12 anos.
Mantém-se, contudo, a certeza de que alguns aspectos dos conflitos observados e dos relatos
das entrevistas ainda permanecem encobertos, apesar da intensa dedicação sobre os dados. As
possibilidades de análise, portanto, não se esgotaram, mas há um momento em que é preciso uma
interrupção para, inclusive, poder desfrutar das descobertas até aqui encontradas.
De um modo geral, encontramos que as principais causas geradoras dos conflitos entre os
adolescentes dessa faixa etária são, em essência, a provocação ao outro e a reação a algum
comportamento perturbador (categoria praticamente inexistente tanto na literatura nacional, como
na internacional). Os conflitos vivenciados nesse período são prioritariamente verbais, intersexuais
e marcados por uma busca por controle/poder sobre o outro. O aparecimento da provocação com
intenção de flerte demarca a influência crescente da sexualidade nas relações intersexuais
estabelecidas. Os adolescentes demonstram já serem capazes de considerar os aspectos mais
subjetivos envolvidos em um conflito, embora ainda fiquem muito centrados em seus próprios
interesses e necessidades, o que leva a certo grau de intolerância e impaciência ao outro.
Já, as estratégias de negociação interpessoal mais utilizadas foram as que envolvem,
principalmente, a coerção como uma maneira de afirmar o poder, o controle e a satisfação a si
mesmo, porém cada vez mais distantes de uma perspectiva física, impulsiva e momentânea.
Características como a proximidade e a estabilidade do relacionamento interferem fortemente no
comportamento diante do conflito entre os adolescentes. Em função do interesse na manutenção
do relacionamento, os conflitos entre amigos mais próximos, por exemplo, são marcados pelo
favorecimento de estratégias mais evoluídas de negociação, de reciprocidade e de compromisso,
182
principalmente nas relações entre as meninas. As meninas, aliás, como um todo, apresentaram
menor agressividade aparente em seus conflitos e maior intimidade em relações mais restritas do
que os meninos.
Com relação às finalizações do emprego dessas estratégias, encontramos que a maior parte
dos episódios de conflitos são, simplesmente, abandonados ou descartados pelos envolvidos,
especificamente aqueles marcados por um maior nível de coerção na relação. Considerando o grau
de intimidade e de sensibilidade próprio das relações que envolvem as meninas, o abandono do
conflito é mais presente nos conflitos em que os meninos estão presentes.
Ao comparar as estratégias empregadas pelos alunos, com as verbalizadas por meio de
histórias fictícias, concluímos, diferentemente do que era previsto, que eles conseguem pensar em
ações mais aprimoradas ao analisar as histórias contadas, do que conseguem efetivamente agir em
situações de conflitos nas quais estão envolvidos, indicando um avanço no processo de
desenvolvimento da conceituação e ressaltando, também, a força da influência de elementos de
ordem contextual, relacional e emocional presentes em uma situação real de conflito.
Vale destacar, ainda, algumas distinções marcantes entre a presente pesquisa e os estudos
anteriores com os alunos de 3 a 6 anos e com os alunos de 8 e 9 anos (LICCIARDI, 2010 e SILVA,
2015). De uma forma geral, percebemos que, embora a condição de busca de satisfação dos
próprios interesses esteja presente em todos os grupos etários estudados – indicando, ainda, uma
limitação na capacidade de coordenação e tomada de perspectiva -, claras conquistas puderam ser
identificadas. A busca pelo controle do espaço físico transforma-se, com o desenvolvimento, em
uma crescente motivação para o controle do espaço social (dominar por meio da imposição de uma
ideia). O egocentrismo, próprio das crianças menores, decai, influenciando, diretamente, o aumento
na competência de inferir a intenção da ação alheia. Há uma crescente integração de vários
domínios do desenvolvimento, incluindo a regulação dos impulsos, o processamento cognitivo e
linguístico, a orientação moral e as habilidades de negociação interpessoal. Os conflitos se
conservam por mais tempo – especialmente entre as meninas -, e as estratégias de resolução
utilizadas ficam mais variadas, embora o predomínio da coerção sobre o outro perdure. Embora
haja alterações quanto ao conteúdo e à forma de manifestação – cada vez mais verbais e com mais
marcas de insinuações e de humor -, a provocação, em especial, configura-se como uma das causas
de maior predominância entre os menores e, também, como a de maior frequência, tanto entre os
alunos de 8 e 9 anos, como entre os de 11 e 12 anos. Os relacionamentos com grupos mistos
183
(meninos e meninas) se intensificam entre os jovens, aumentando, assim, a quantidade dos conflitos
interssexuais, e, também, a quantidade de conflitos entre grupos rivais, já fortemente permeados,
na adolescência, pela dimensão da sexualidade. Ademais, os conflitos passam a incluir, mais
frequentemente, a presença de outros participantes (“terceiros”), que interferem em um episódio já
iniciado, para defender uma das partes envolvidas. Em todas as faixas etárias, a maior parte dos
conflitos são, simplesmente, abandonados. Contudo, percebemos uma relação positiva entre o
progresso dos alunos na tomada de perspectiva social com o avançar da idade (estratégias mais
cooperativas) e a finalização de conflito com maior nível de satisfação a todos os envolvidos. As
crianças de 3 a 6 anos apresentam estratégias mais evoluídas em termos de coordenação e tomada
de perspectiva na ação do que no juízo, ordem essa que se inverte já nas crianças de 8 e 9 anos,
confirmando a premissa da construção do conhecimento afirmado por toda a teoria piagetiana: com
o avançar do desenvolvimento, a conceituação liberta-se progressivamente dos limites das ações
concretas. As crescentes diferenças entre os gêneros nos relacionamentos entre pares também
merecem destaque. Embora não tenha sido tão evidente nas crianças de 3 a 6 anos, no estudo com
os alunos de 8 e 9 e com os de 11 e 12, os meninos apresentam significativamente maior
envolvimento nos episódios de conflitos observados, sendo esses, no entanto, mais momentâneos,
com agressões mais aparentes e com menor carga afetiva do que os vivenciados pelas meninas. A
literatura na área é vasta e tem documentado diferenças importantes entre os gêneros no que se
refere ao processo de socialização em geral. No entanto, novos estudos relacionando,
especificamente, as causas, as estratégias e as finalizações dos conflitos entre pares com o gênero
dos envolvidos são, ainda, necessários para maior aprofundamento sobre o tema. Por fim, embora
tenham sido encontrados traços de evolução no desenvolvimento quando comparado às idades
anteriores, a baixa frequência das estratégias cooperativas vislumbradas nos alunos de 11 e 12 anos
não se aproxima do que a literatura que baliza a presente pesquisa promulga. De forma geral, os
estudos indicam que os adolescentes favorecem a negociação e a cooperação em suas estratégias
de resolução de conflito, mais do que a coerção, por exemplo, o que não foi presenciado em nossos
participantes.
Todas essas considerações descritas, contudo, não são insensíveis às influências do meio
social. Sabemos que são, privilegiadamente, as interações simétricas e recíprocas que encorajam a
cooperação e que provêm a fundação para o desenvolvimento do respeito mútuo e da tolerância,
que, por fim, levam a práticas de maior equidade e de maior satisfação mútua. Os resultados
184
encontrados reforçam, assim, a suposição de que, nos ambientes em que esses indivíduos
convivem, tal possibilidade de interação não esteja suficientemente ajustada na direção da
promoção dos avanços esperados nas competências sociais.
Como, então, a presente pesquisa pode colaborar para esse ajustamento? Que oportunidades
podemos efetivamente proporcionar para que uma visão autocentrada do mundo mova-se para uma
dimensão que cada vez mais considera e coordena o ponto de vista do outro?
Em primeiro lugar, consideramos que não há transformação de uma realidade, se não
houver conhecimento sobre ela. O estudo, aqui apresentado, complementa uma descrição
minuciosa sobre como se dá a convivência entre os pares na escola nas diferentes etapas do
desenvolvimento. Tal conhecimento, por sua vez, ajuda a adequar as intervenções propostas a cada
faixa etária, para que se configurem como situações desafiadoras que realmente favoreçam os
desequilíbrios cognitivos necessários à construção de novas concepções.
O foco recai na importância da interação social para o desenvolvimento em direção à
descentração do próprio ponto de vista e na importância da reflexão sobre a ação para a elaboração
gradativa de conceitos que ajudem os sujeitos a exercitar o controle sobre si mesmos, planejando
suas ações antes da execução.
Especificamente direcionado à faixa etária de 11 e 12 anos, propomos, essencialmente, o
incremento do diálogo entre os alunos, do trabalho coletivo promotor de relações de cooperação,
bem como da transversalidade entre as diversas disciplinas ministradas, tendo como fundamento a
convivência como valor, e não o conflito. De forma específica, recomendamos espaços
institucionais planejados e sistematizados – distantes da mera transmissão de conhecimentos -, que
incentivem:
- o autoconhecimento e o conhecimento/integração grupal;
- a discussão com base em dilemas morais, em filmes, em conflitos interpessoais
hipotéticos, ou em outros materiais relacionados à resolução de conflitos e à coordenação de
perspectiva, bem como a reflexão acerca dos problemas de convivência, por meio das assembleias
e dos círculos restaurativos.
A provocação e a reação ao comportamento perturbador, como causas mais frequentes dos
conflitos encontrados nessa idade, devem permear o conteúdo das intervenções propostas, levando-
se em consideração, sempre, as nuances encontradas nas vivências dos conflitos entre os meninos
e as meninas e, também, entre os diferentes tipos de relacionamentos (amigos, colegas, parceiros
185
românticos). Formas de expressão verbal menos impositivas e mais argumentativas devem ser
exploradas entre os envolvidos nas desavenças, assim como o estímulo à busca de possibilidades
de resoluções de conflitos que não levem em consideração somente a satisfação dos próprios
interesses.
O clima escolar - como percepção, pelos membros de uma escola, das qualidades de vida e
de comunicação -, é outra variável relevante que tem efeito sobre o comportamento dos alunos
frente aos conflitos interpessoais. Particularmente para os adolescentes, o tédio decorrente do
trabalho precário com o conhecimento e o excesso de propostas individuais colaboram para o uso
de estratégias pouco evoluídas em termos de coordenação e tomada de perspectiva nas situações
de conflito. Já o investimento de tempo e de recursos significativos na construção coletiva das
regras de convivência, na execução de sanções que levem os alunos a se responsabilizar por suas
ações e na promoção de relações de confiança e de respeito entre professor e aluno, é extremamente
benéfico para a promoção da consciência social e do desenvolvimento socioemocional.
Alguns méritos, limitações e sugestões para futuros estudos devem, ainda, ser mencionados.
O uso combinado da técnica de observação sistemática dos comportamentos dos alunos em
situação natural e da proposta de entrevista utilizando casos de conflitos hipotéticos, além de trazer
grande confiabilidade aos dados encontrados, é um procedimento raro, tanto em pesquisas
nacionais, como internacionais acerca do relacionamento entre pares. Uma limitação do estudo,
contudo, diz respeito ao pequeno número de sujeitos que esse método permite investigar. Outra
limitação refere-se ao fato da comparação entre o juízo e a ação ter sido feita a partir do total de
respostas, não considerando, portanto, sujeito por sujeito. Outras análises comparativas, mais
aprofundadas, poderiam ter sido feitas se tivéssemos comparado o que determinado indivíduo
respondeu nos conflitos hipotéticos e qual foi seu padrão efetivo de respostas nos conflitos reais.
A partir dos resultados encontrados quanto à forte influência dos tipos de relacionamento entre os
pares nas estratégias utilizadas pelos adolescentes, vale a sugestão de pesquisas mais específicas
com essa faixa etária, diferenciando, por exemplo, as causas, as estratégias e as finalizações a partir
do grau de intimidade entre os envolvidos nos conflitos.
Por fim, a partir de todas as discussões aqui realizadas, parece razoável acreditar que, ao
invés de perpetuar os hábitos indevidos do passado ou os modelos impotentes do presente, é
possível aprender novas formas de pensar os conflitos interpessoais na escola. Aliás, uma vez que
as pessoas estão, de fato, e cada vez mais, interdependentes e significativamente interligadas, nunca
186
é tarde para tal mudança de paradigma, afinal, trata-se de uma transformação que tem uma grande
influência no desenvolvimento e na formação das nossas crianças e jovens. A reconstrução de
algumas práticas nas escolas – momento após momento, dia após dia, por todos os envolvidos -,
oferece esperança de que o futuro será caracterizado por uma melhora na experiência de ser
verdadeiramente humano. Para todos.

187
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207
APÊNDICE A
Modelos de autorizações – TCLE

CARTA DE AUTORIZAÇÃO DA ESCOLA

Eu,__________________________________________________, RG_______________,
diretor(a) da ______________________________________, DECLARO para fins de participação
em pesquisa, na condição de responsável pelo estabelecimento de ensino no qual a pesquisa será
realizada, que fui devidamente esclarecido do Projeto de Pesquisa intitulado: Investigando os
conflitos entre os adolescentes de 11 e 12 anos na escola desenvolvido pela pesquisadora Carolina
de Aragão Escher Marques, do Curso de Doutorado, da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),
sob a orientação da Profª Drª Telma Pileggi Vinha e que autorizo a sua realização.
A presente pesquisa tem por objetivos compreender quais são as estratégias que os adolescentes utilizam
para resolver seus conflitos; quais os motivos principais geradores de conflitos e se há diferença na forma
como o aluno julga resolver os conflitos e como ele efetivamente os resolve.
A pesquisa se justifica por se constatar um aumento dos conflitos e das situações de indisciplina em sala de
aula de uma forma geral, o que tem gerado certa insegurança por parte da escola sendo, portanto, necessário,
compreender melhor essa questão para que se possa planejar intervenções adequadas que contribuam para
os alunos construírem estratégias mais justas e cooperativas para a resolução dos conflitos.
Para o levantamento de dados, serão utilizadas sessões de observação dos adolescentes nas diversas
situações da rotina escolar, ao longo do segundo semestre letivo, alternando os horários nos dias de
observação. Além disso, os participantes serão entrevistados com o objetivo de verificar como eles julgam
resolver situações hipotéticas de conflitos.
A pesquisa terá início após a autorização dos responsáveis das crianças e depois do período de adaptação
escolar. Essa pesquisa não apresenta riscos previsíveis e será garantido o sigilo do nome e da imagem dos
participantes da pesquisa e a pesquisadora se compromete a prestar todos os esclarecimentos a que for
solicitada, em qualquer momento da pesquisa. Cabe ainda esclarecer que os participantes podem desistir da
mesma ao longo de sua realização, sem penalidade ou sofrimento de represália.
Não vai haver nenhuma forma de reembolso de dinheiro, visto que os participantes não terão qualquer gasto.

209
DECLARO, outrossim, que após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e ter entendido
o que nos foi explicado, consinto voluntariamente em participar dessa pesquisa e declaro, ainda, ter ficado
com uma cópia desse termo de consentimento.

__________________________________________________________________
Assinatura do(a) diretor(a) da escola

____/_____/_____

Pesquisador responsável: Carolina de Aragão Escher Marques


e-mail: carolinaaragao@hotmail.com

Comitê de Ética e Pesquisa


Faculdade de Ciências Médicas - Universidade Estadual de Campinas - Rua: Tessália Vieira de
Camargo, 126, Cidade Universitária "Zeferino Vaz" - Campinas - SP - Brasil - CEP: 13083 -887
– Cx. Postal: 6111
www.fcm.unicamp.br/pesquisa/etica.php
Fone: (19) 3521-8936

210
APÊNDICE B
Modelos de autorizações – TCLE

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,__________________________________________________, RG_______________,
responsável pelo menor ______________________________________, estudante da escola
_________________________________________, DECLARO para fins de participação em
pesquisa, na condição de responsável do menor, que fui devidamente esclarecido do Projeto de
Pesquisa intitulado: Investigando os conflitos entre os adolescentes de 11 e 12 anos na escola,
desenvolvido pela pesquisadora Carolina de Aragão Escher Marques, do Curso de Doutorado, da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), sob a orientação da Profª Drª Telma Pileggi Vinha e
que autorizo a participação do(a) meu(a) filho(a).
A presente pesquisa tem por objetivos compreender quais são as estratégias que os adolescentes utilizam
para resolver seus conflitos; quais os motivos principais geradores de conflitos e se há diferença na forma
como a criança julga resolver os conflitos e como ela efetivamente os resolve.
A pesquisa se justifica por se constatar um aumento dos conflitos e das situações de indisciplina em sala de
aula de uma forma geral, o que tem gerado certa insegurança por parte da escola sendo, portanto, necessário,
compreender melhor essa questão para que se possa planejar intervenções adequadas que contribuam para
os alunos construírem estratégias mais justas e cooperativas para a resolução dos conflitos.
Para o levantamento de dados, serão utilizadas sessões de observação dos adolescentes nas diversas
situações da rotina escolar, ao longo do segundo semestre letivo, alternando os horários nos dias de
observação. Além disso, os participantes serão entrevistados com o objetivo de verificar como eles julgam
resolver situações hipotéticas de conflitos.
A pesquisa terá início após a autorização dos responsáveis e depois do período de adaptação escolar. Essa
pesquisa não apresenta riscos previsíveis e será garantido o sigilo do nome e da imagem dos participantes
da pesquisa e a pesquisadora se compromete a prestar todos os esclarecimentos a que for solicitada, em
qualquer momento da pesquisa. Cabe ainda esclarecer que os participantes podem desistir da mesma ao
longo de sua realização, sem penalidade ou sofrimento de represália.
Não vai haver nenhuma forma de reembolso de dinheiro, visto que os participantes não terão
qualquer gasto.

211
DECLARO, outrossim, que após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e ter entendido
o que nos foi explicado, consinto voluntariamente em participar dessa pesquisa e declaro, ainda, ter ficado
com uma cópia desse termo de consentimento.

__________________________________________________________________
Assinatura do responsável

____/_____/_____

Pesquisador responsável: Carolina de Aragão Escher Marques


e-mail: carolinaaragao@hotmail.com

Comitê de Ética e Pesquisa


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Camargo, 126, Cidade Universitária "Zeferino Vaz" - Campinas - SP - Brasil - CEP: 13083 -887
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Fone: (19) 3521-8936

212
ANEXO A

Autorização CEP (Comitê de Ética em Pesquisa)

213
214
ANEXO B

Relatório da análise estatística

De: Helymar C. Machado – Estatístico – CONRE – SP 7696.


Para: Dra Telma Pileggi Vinha – FE/Unicamp.
Data: 11 de setembro de 2014.

Causas, estratégias e finalizações de


conflitos entre crianças e adolescentes.

Objetivos:

1. Descrever os conflitos no grupo de participantes de 11 a 12 anos (n=126 conflitos) com relação a causas,
estratégias e finalizações.

2. Descrever as categorias de resposta de juízo das crianças nas entrevistas.

3. Analisar a relação entre causas, estratégias e finalizações neste grupo etário.

4. Comparar as causas, estratégias e conflitos entre os gêneros e as faixas etárias.

5. Analisar a relação entre juízo (entrevistas) e ação (estratégias observadas).

Metodologia Estatística:

Para descrever o perfil da amostra segundo as variáveis em estudo foram feitas tabelas de frequência
das variáveis categóricas (sexo, idade, causas, estratégias e finalizações dos conflitos, categorias de
juízo), com valores de frequência absoluta (n) e percentual (%).

215
Para analisar a relação entre causas, estratégias e finalizações em cada grupo etário foram
utilizados o teste qui-quadrado de Pearson, e o teste exato de Fisher, na presença de valores esperados
menores que 5. Estes testes também foram usados na comparação com gênero e faixa etária.

O nível de significância adotado para os testes estatísticos será de 5%, ou seja, P<0.05.

Resultados:

Análise Descritiva Geral/Idade 11 a 12 Anos

 A tabela 1, a seguir, apresenta as tabelas de frequência das variáveis para caracterização da amostra de
11 a 12 anos (n=126) e das entrevistas (n=12).

Tabela 1. Análise descritiva das variáveis categóricas para idade 11 a 12 anos.


SEXO S1F Frequency Percent S3C Frequency Percent
---------------------------- ----------------------------
Sexo Frequency Percent NE 122 96.83 NE 125 99.21
--------------------------------- FI 2 1.59 CO 1 0.79
INTERSEX 78 62.40 UN 2 1.59
MASCULIN 34 27.20 SUJEITO 4
FEMININO 13 10.40 S1G Frequency Percent
Frequency Missing = 1 ---------------------------- S4 Frequency Percent
NE 124 98.41 ---------------------------
FI 1 0.79 NE 119 94.44
CAUSAS UN 1 0.79 UN 6 4.76
FI 1 0.79
Causa Frequency Percent S1H Frequency Percent
------------------------------ ---------------------------- SUJEITO 5
PR 57 45.24 NE 122 96.83
RD 35 27.78 UN 3 2.38 S5 Frequency Percent
DP 7 5.56 FI 1 0.79 ---------------------------
CO 5 3.97 NE 126 100.00
DI 4 3.17 SUJEITO 2
AV 3 2.38
DF 3 2.38 S2A Frequency Percent NÚMERO DE CONFLITOS COM ESTRATÉGIA DO TIPO FI
DL 3 2.38 ---------------------------- Estrat_FI Frequency Percent
AD 2 1.59 UN 82 65.08 ----------------------------------
AF 2 1.59 NE 27 21.43 NÃO 69 54.76
DS 2 1.59 FI 11 8.73 SIM 57 45.24
EX 1 0.79 CO 6 4.76
IN 1 0.79 NÚMERO DE CONFLITOS COM ESTRATÉGIA DO TIPO UN
VR 1 0.79 S2B Frequency Percent Estrat_UN Frequency Percent
---------------------------- ----------------------------------
NE 78 61.90 NÃO 6 4.76
ESTRATÉGIAS UN 34 26.98 SIM 120 95.24
FI 13 10.32
CO 1 0.79 NÚMERO DE CONFLITOS COM ESTRATÉGIA DO TIPO CO
SUJEITO 1 Estrat_CO Frequency Percent
S2C Frequency Percent ----------------------------------
S1A Frequency Percent ---------------------------- NÃO 103 81.75
---------------------------- NE 104 82.54 SIM 23 18.25
UN 92 73.02 UN 18 14.29
FI 30 23.81 CO 2 1.59 NÚMERO DE CONFLITOS COM ESTRATÉGIA DO TIPO NI
CO 3 2.38 FI 2 1.59 Estrat_NI Frequency Percent
NE 1 0.79 ----------------------------------
S2D Frequency Percent NÃO 126 100.00
S1B Frequency Percent ----------------------------
---------------------------- NE 121 96.03

216
UN 62 49.21 CO 2 1.59 FINALIZAÇÕES
NE 44 34.92 UN 2 1.59
FI 16 12.70 FI 1 0.79 Finalizacao Frequency Percent
CO 4 3.17 ------------------------------------
S2E Frequency Percent AB 74 58.73
S1C Frequency Percent ---------------------------- SU 21 16.67
---------------------------- NE 125 99.21 IN 16 12.70
NE 90 71.43 FI 1 0.79 SBS 7 5.56
UN 28 22.22 IB 5 3.97
FI 5 3.97 SUJEITO 3 NI 2 1.59
CO 3 2.38 SBC 1 0.79
S3A Frequency Percent
S1D Frequency Percent ----------------------------
---------------------------- NE 100 79.37 ENTREVISTAS/JUÍZO
NE 111 88.10 UN 24 19.05
FI 7 5.56 CO 2 1.59 Sexo Frequency Percent
UN 6 4.76 ---------------------------------
CO 2 1.59 S3B Frequency Percent MASCULIN 6 50.00
---------------------------- FEMININO 6 50.00
S1E Frequency Percent NE 120 95.24
---------------------------- UN 6 4.76 DI1 Frequency Percent
NE 120 95.24 ----------------------------
FI 3 2.38 CO 6 50.00
UN 3 2.38 UN 6 50.00

Tabela 1 (cont). Análise descritiva das variáveis categóricas para idade 11 a 12 anos.
DI2 Frequency Percent PR2 Frequency Percent PRI1 Frequency Percent
---------------------------- ---------------------------- -----------------------------
NE 12 100.00 NE 7 58.33 UN 12 100.00
UN 3 25.00
EX1 Frequency Percent CO 1 8.33 PRI2 Frequency Percent
---------------------------- UM 1 8.33 -----------------------------
UN 8 66.67 NE 12 100.00
CO 4 33.33
RD1 Frequency Percent RDI1 Frequency Percent
EX2 Frequency Percent ---------------------------- -----------------------------
---------------------------- CO 9 75.00 UN 7 58.33
NE 12 100.00 UN 3 25.00 CO 4 33.33
NI 1 8.33
PR1 Frequency Percent RD2 Frequency Percent
---------------------------- ---------------------------- RDI2 Frequency Percent
UN 10 83.33 NE 9 75.00 -----------------------------
CO 1 8.33 CO 2 16.67 NE 9 75.00
FI 1 8.33 UN 1 8.33 UN 2 16.67
CO 1 8.33

Análise Comparativa entre Faixas Etárias

 A tabela 2, a seguir, apresenta as comparações das variáveis entre as 2 faixas etárias (8-9 anos e 11-12
anos).

Tabela 2. Comparação das variáveis categóricas entre as faixas etárias.


Sexo Idade Causa Idade Estrat_UN Idade
Frequency, Frequency, Frequency,
Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
MASCULIN , 46 , 34 , 80 AD , 1 , 2 , 3 NÃO , 19 , 6 , 25
, 38.66 , 27.20 , , 0.82 , 1.59 , , 15.57 , 4.76 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
FEMININO , 17 , 13 , 30 AF , 1 , 2 , 3 SIM , 103 , 120 , 223
, 14.29 , 10.40 , , 0.82 , 1.59 , , 84.43 , 95.24 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
INTERSEX , 56 , 78 , 134 AV , 1 , 3 , 4 Total 122 126 248
, 47.06 , 62.40 , , 0.82 , 2.38 ,

217
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ TESTE QUI-QUADRADO: X2=7.99; GL=1; P=0.005
Total 119 125 244 DA , 7 , 0 , 7
, 5.74 , 0.00 ,
TESTE QUI-QUADRADO: X2=5.80; GL=2; P=0.055 ---------+--------+--------+ Finalizacao Idade
DF , 10 , 3 , 13 Frequency,
, 8.20 , 2.38 , Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total
Estrat_FI Idade ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
Frequency, DI , 0 , 4 , 4 AB , 73 , 74 , 147
Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total , 0.00 , 3.17 , , 59.84 , 58.73 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
NÃO , 71 , 69 , 140 DL , 3 , 3 , 6 IB , 3 , 5 , 8
, 58.20 , 54.76 , , 2.46 , 2.38 , , 2.46 , 3.97 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
SIM , 51 , 57 , 108 DP , 5 , 7 , 12 IN , 12 , 16 , 28
, 41.80 , 45.24 , , 4.10 , 5.56 , , 9.84 , 12.70 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
Total 122 126 248 EX , 4 , 1 , 5 NI , 5 , 2 , 7
, 3.28 , 0.79 , , 4.10 , 1.59 ,
TESTE QUI-QUADRADO: X2=0.30; GL=1; P=0.586 ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
PR , 49 , 57 , 106 SBC , 0 , 1 , 1
, 40.16 , 45.24 , , 0.00 , 0.79 ,
Estrat_CO Idade ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
Frequency, RD , 34 , 35 , 69 SBS , 10 , 7 , 17
Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total , 27.87 , 27.78 , , 8.20 , 5.56 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
NÃO , 110 , 103 , 213 OUTRAS , 7 , 9 , 16 SU , 19 , 21 , 40
, 90.16 , 81.75 , , 5.74 , 7.14 , , 15.57 , 16.67 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
SIM , 12 , 23 , 35 Total 122 126 248 Total 122 126 248
, 9.84 , 18.25 ,
---------+--------+--------+ TESTE EXATO DE FISHER: P=0.036 TESTE EXATO DE FISHER: P=0.740
Total 122 126 248

TESTE QUI-QUADRADO: X2=3.62; GL=1; P=0.057

 Pelos resultados, houve diferença significativa entre os grupos para: causa (maior frequência de
provocação, reação de desagrado, disputa física e disputa de amigo nos com 8-9 anos, e provocação,
reação de desagrado e outras nos com 11-12 anos), e estratégias do tipo unilaterais (maior frequência
nos com 11-12 anos).

Análise Comparativa entre Gêneros

 A tabela 3, a seguir, apresenta as comparações das variáveis entre os gêneros envolvidos no conflito.

Tabela 3. Comparação das variáveis categóricas entre gêneros.


Causa Sexo Estrat_FI Sexo Estrat_UN Sexo
Frequency, Frequency, Frequency,
Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
AD , 1 , 0 , 1 , 2 NÃO , 16 , 11 , 41 , 68 NÃO , 1 , 3 , 2 , 6
, 2.94 , 0.00 , 1.28 , , 47.06 , 84.62 , 52.56 , , 2.94 , 23.08 , 2.56 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
AF , 1 , 0 , 1 , 2 SIM , 18 , 2 , 37 , 57 SIM , 33 , 10 , 76 , 119
, 2.94 , 0.00 , 1.28 , , 52.94 , 15.38 , 47.44 , , 97.06 , 76.92 , 97.44 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
AV , 2 , 0 , 1 , 3 Total 34 13 78 125 Total 34 13 78 125
, 5.88 , 0.00 , 1.28 ,
---------+--------+--------+--------+ TESTE QUI-QUADRADO: X2=5.63; GL=2; P=0.060 TESTE EXATO DE FISHER: P=0.022
DF , 1 , 0 , 2 , 3
, 2.94 , 0.00 , 2.56 ,
---------+--------+--------+--------+ Estrat_CO Sexo Finalizacao Sexo
DI , 0 , 0 , 4 , 4 Frequency, Frequency,
, 0.00 , 0.00 , 5.13 , Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
DL , 2 , 0 , 1 , 3 NÃO , 31 , 9 , 62 , 102 AB , 20 , 4 , 50 , 74

218
, 5.88 , 0.00 , 1.28 , , 91.18 , 69.23 , 79.49 , , 58.82 , 30.77 , 64.10 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
DP , 1 , 2 , 4 , 7 SIM , 3 , 4 , 16 , 23 IB , 0 , 3 , 2 , 5
, 2.94 , 15.38 , 5.13 , , 8.82 , 30.77 , 20.51 , , 0.00 , 23.08 , 2.56 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
EX , 0 , 0 , 1 , 1 Total 34 13 78 125 IN , 6 , 0 , 10 , 16
, 0.00 , 0.00 , 1.28 , , 17.65 , 0.00 , 12.82 ,
---------+--------+--------+--------+ TESTE QUI-QUADRADO: X2=3.63; GL=2; P=0.163 ---------+--------+--------+--------+
PR , 12 , 1 , 44 , 57 NI , 0 , 2 , 0 , 2
, 35.29 , 7.69 , 56.41 , , 0.00 , 15.38 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
RD , 13 , 4 , 17 , 34 SBC , 0 , 1 , 0 , 1
, 38.24 , 30.77 , 21.79 , , 0.00 , 7.69 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
OUTRAS , 1 , 6 , 2 , 9 SBS , 2 , 2 , 3 , 7
, 2.94 , 46.15 , 2.56 , , 5.88 , 15.38 , 3.85 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
Total 34 13 78 125 SU , 6 , 1 , 13 , 20
, 17.65 , 7.69 , 16.67 ,
TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001 ---------+--------+--------+--------+
Total 34 13 78 125

TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001

 Pelos resultados, houve diferença significativa entre os grupos para: causa (maior frequência de reação
de desagrado e provocação nos do sexo masculino, de outras, reação de desagrado e disputa por poder
nos do sexo feminino, e de provocação e reação de desagrado nos intersexuais), estratégias do tipo
unilaterais (maior frequência no sexo masculino e intersexuais), e finalização (maior frequência de
abandono, IN e satisfação unilateral no sexo masculino, de abandono, insatisfação bilateral, satisfação
bilateral simples e não identificado no sexo feminino, e abandono, satisfação unilateral e IN nos
intersexuais).

Análise Comparativa entre Causas

 A tabela 4, a seguir, apresenta as comparações das variáveis entre as causas dos conflitos.

Tabela 4. Comparação das variáveis categóricas entre causas.


Estrat_FI Causa Estrat_FI Causa
Frequency, Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI , Col Pct ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 2 , 1 , 2 , 9 , 1 , 2 , NÃO , 3 , 5 , 1 , 22 , 21 , 69
, 100.00 , 50.00 , 66.67 , 100.00 , 33.33 , 50.00 , , 100.00 , 71.43 , 100.00 , 38.60 , 60.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 0 , 1 , 1 , 0 , 2 , 2 , SIM , 0 , 2 , 0 , 35 , 14 , 57
, 0.00 , 50.00 , 33.33 , 0.00 , 66.67 , 50.00 , , 0.00 , 28.57 , 0.00 , 61.40 , 40.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 Total 3 7 1 57 35 126
(Continued)

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.005

Estrat_CO Causa Estrat_CO Causa


Frequency, Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI , Col Pct ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 1 , 2 , 3 , 6 , 2 , 2 , NÃO , 3 , 4 , 0 , 51 , 29 , 103
, 50.00 , 100.00 , 100.00 , 66.67 , 66.67 , 50.00 , , 100.00 , 57.14 , 0.00 , 89.47 , 82.86 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 1 , 0 , 0 , 3 , 1 , 2 , SIM , 0 , 3 , 1 , 6 , 6 , 23
, 50.00 , 0.00 , 0.00 , 33.33 , 33.33 , 50.00 , , 0.00 , 42.86 , 100.00 , 10.53 , 17.14 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+

219
Total 2 2 3 9 3 4 Total 3 7 1 57 35 126
(Continued)

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.045

Estrat_UN Causa Estrat_UN Causa


Frequency, Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI , Col Pct ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 0 , 0 , 0 , 2 , 0 , 0 , NÃO , 0 , 1 , 1 , 2 , 0 , 6
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 22.22 , 0.00 , 0.00 , , 0.00 , 14.29 , 100.00 , 3.51 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 2 , 2 , 3 , 7 , 3 , 4 , SIM , 3 , 6 , 0 , 55 , 35 , 120
, 100.00 , 100.00 , 100.00 , 77.78 , 100.00 , 100.00 , , 100.00 , 85.71 , 0.00 , 96.49 , 100.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 Total 3 7 1 57 35 126
(Continued)

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.037

Finalizacao Causa Finalizacao Causa


Frequency, Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI , Col Pct ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
AB , 1 , 1 , 1 , 4 , 1 , 2 , AB , 2 , 1 , 1 , 39 , 21 , 74
, 50.00 , 50.00 , 33.33 , 44.44 , 33.33 , 50.00 , , 66.67 , 14.29 , 100.00 , 68.42 , 60.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
IB , 0 , 0 , 0 , 2 , 0 , 0 , IB , 0 , 1 , 0 , 0 , 2 , 5
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 22.22 , 0.00 , 0.00 , , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 0.00 , 5.71 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
IN , 0 , 0 , 1 , 0 , 1 , 1 , IN , 0 , 0 , 0 , 9 , 4 , 16
, 0.00 , 0.00 , 33.33 , 0.00 , 33.33 , 25.00 , , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 15.79 , 11.43 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
NI , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , NI , 0 , 1 , 0 , 0 , 0 , 2
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 0.00 , , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SBC , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , SBC , 0 , 0 , 0 , 0 , 0 , 1
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 0.00 , , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SBS , 1 , 0 , 0 , 1 , 0 , 1 , SBS , 0 , 1 , 0 , 2 , 1 , 7
, 50.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 25.00 , , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 3.51 , 2.86 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
SU , 0 , 1 , 1 , 0 , 1 , 0 , SU , 1 , 3 , 0 , 7 , 7 , 21
, 0.00 , 50.00 , 33.33 , 0.00 , 33.33 , 0.00 , , 33.33 , 42.86 , 0.00 , 12.28 , 20.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 Total 3 7 1 57 35 126
(Continued)

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.011

 Pelos resultados, houve diferença significativa entre os grupos para: estratégias do tipo físicas e
impulsivas (maior frequência nas causas disputa física, provocação, discordância de regras, agressão
física e reação de desagrado), estratégias do tipo unilaterais (menor frequência nas causas exclusão,
outras e disputa por poder), estratégias do tipo cooperativas (maior frequência nas causas exclusão,
discordância de regras, acusação duvidosa e disputa por poder), e finalização (maior frequência de
abandono e satisfação bilateral simples na causa acusação duvidosa; de abandono e satisfação unilateral
na causa agressão física; de abandono, IN e satisfação unilateral na causa agressão verbal; de abandono
e insatisfação bilateral na causa outras; de abandono, IN e satisfação unilateral na causa disputa física;
de abandono e insatisfação bilateral na causa outras; de abandono, satisfação bilateral simples e IN na
causa discordância de regras; de abandono na causa delação; de satisfação unilateral na causa disputa
por poder; de abandono na causa exclusão; de abandono na causa provocação; e de abandono na causa
reação de desagrado).

Análise Comparativa entre Estratégias

220
70 70

60 60

50 AB 50 AB
Finalizações (%)

Finalizações (%)
IB IB
40 40
IN IN
30 30
NI NI
20 SBC 20 SBC

10 SBS 10 SBS
SU SU
0 0
Não CO CO Não UN. UN.
Estratégias do tipo CO Estratégias do tipo UN.

Bibliografia:

 Conover, W. J. (1999), Practical Nonparametric Statistics. New York: John Wiley & Sons, 3rd ed.
 Fleiss, J. L. (1981), Statistical Methods for Rates and Proportions. New York: John Wiley & Sons, 2nd
ed.
 Siegel, S. & Castellan Jr., N. J. (2006), Estatística Não-Paramétrica para Ciências do Comportamento.
Porto Alegre: Artmed, 2ª edição.

Programa Computacional:

Para análise estatística foi utilizado o seguinte programa computacional:

 The SAS System for Windows (Statistical Analysis System), versão 9.2.
SAS Institute Inc, 2002-2008, Cary, NC, USA.

222
De: Helymar C. Machado – Estatístico – CONRE – SP 7696.
Para: Dra Telma Pileggi Vinha – FE/Unicamp.
Data: 19 de setembro de 2014.

Causas, estratégias e finalizações de


conflitos entre crianças e adolescentes.

Resultados (continuação – parte 2b):

Análise Descritiva Geral/Idade 11 a 12 Anos – Revisada

 A tabela 6, a seguir, apresenta as tabelas de frequência das variáveis revisadas para caracterização da
amostra de 11 a 12 anos.

Tabela 6. Análise descritiva das variáveis categóricas para idade 11 a 12 anos.


ESTRATÉGIAS FINALIZAÇÕES ENTREVISTAS/JUÍZO

Estrateg Frequency Percent Finalizacao Frequency Percent Estrat Frequency Percent


--------------------------------- ------------------------------------ -------------------------------
UN 369 75.46 AB 74 67.27 UN 53 63.86
FI 94 19.22 SU 21 19.09 CO 28 33.73
CO 26 5.32 SBS 7 6.36 FI 1 1.20
IB 5 4.55 NI 1 1.20
NI 2 1.82
SBC 1 0.91
Frequency Missing = 16

Análise Comparativa entre Faixas Etárias – Revisada

 A tabela 7, a seguir, apresenta as comparações das variáveis revisadas entre as 2 faixas etárias (8-9 anos
e 11-12 anos).

223
Tabela 7. Comparação das variáveis categóricas entre as faixas etárias.
Estrateg Idade Finalizacao Idade
Frequency, Frequency,
Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total Col Pct ,8-9 ,11-12 , Total
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
CO , 12 , 26 , 38 AB , 73 , 74 , 147
, 3.77 , 5.32 , , 66.36 , 67.27 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
FI , 80 , 94 , 174 IB , 3 , 5 , 8
, 25.16 , 19.22 , , 2.73 , 4.55 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
NI , 2 , 0 , 2 NI , 5 , 2 , 7
, 0.63 , 0.00 , , 4.55 , 1.82 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
UN , 224 , 369 , 593 SBC , 0 , 1 , 1
, 70.44 , 75.46 , , 0.00 , 0.91 ,
---------+--------+--------+ ---------+--------+--------+
Total 318 489 807 SBS , 10 , 7 , 17
, 9.09 , 6.36 ,
TESTE EXATO DE FISHER: P=0.041 ---------+--------+--------+
SU , 19 , 21 , 40
, 17.27 , 19.09 ,
---------+--------+--------+
Total 110 110 220

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.686

Análise Comparativa entre Gêneros – Revisada

 A tabela 8, a seguir, apresenta as comparações das variáveis revisadas entre os gêneros envolvidos no
conflito.

Tabela 8. Comparação das variáveis categóricas entre gêneros.


Estrateg Sexo Finalizacao Sexo
Frequency, Frequency,
Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total Col Pct ,MASCULIN,FEMININO,INTERSEX, Total
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
CO , 4 , 4 , 18 , 26 AB , 20 , 4 , 50 , 74
, 2.90 , 12.50 , 5.70 , , 71.43 , 30.77 , 73.53 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
FI , 27 , 4 , 63 , 94 IB , 0 , 3 , 2 , 5
, 19.57 , 12.50 , 19.94 , , 0.00 , 23.08 , 2.94 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
UN , 107 , 24 , 235 , 366 NI , 0 , 2 , 0 , 2
, 77.54 , 75.00 , 74.37 , , 0.00 , 15.38 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+ ---------+--------+--------+--------+
Total 138 32 316 486 SBC , 0 , 1 , 0 , 1
, 0.00 , 7.69 , 0.00 ,
TESTE EXATO DE FISHER: P=0.233 ---------+--------+--------+--------+
SBS , 2 , 2 , 3 , 7
, 7.14 , 15.38 , 4.41 ,
---------+--------+--------+--------+
SU , 6 , 1 , 13 , 20
, 21.43 , 7.69 , 19.12 ,
---------+--------+--------+--------+
Total 28 13 68 109

TESTE EXATO DE FISHER: P<0.001

224
Análise Comparativa entre Causas – Revisada

 A tabela 9, a seguir, apresenta as comparações das variáveis entre as causas dos conflitos.

Tabela 9. Comparação das variáveis categóricas entre causas.


Estrat_FI Causa
Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 2 , 1 , 2 , 9 , 1 , 2 , 3 , 5 , 1 , 22 , 21 , 69
, 100.00 , 50.00 , 66.67 , 100.00 , 33.33 , 50.00 , 100.00 , 71.43 , 100.00 , 38.60 , 60.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 0 , 1 , 1 , 0 , 2 , 2 , 0 , 2 , 0 , 35 , 14 , 57
, 0.00 , 50.00 , 33.33 , 0.00 , 66.67 , 50.00 , 0.00 , 28.57 , 0.00 , 61.40 , 40.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 3 7 1 57 35 126

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.005

Estrat_CO Causa
Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 1 , 2 , 3 , 6 , 2 , 2 , 3 , 4 , 0 , 51 , 29 , 103
, 50.00 , 100.00 , 100.00 , 66.67 , 66.67 , 50.00 , 100.00 , 57.14 , 0.00 , 89.47 , 82.86 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 1 , 0 , 0 , 3 , 1 , 2 , 0 , 3 , 1 , 6 , 6 , 23
, 50.00 , 0.00 , 0.00 , 33.33 , 33.33 , 50.00 , 0.00 , 42.86 , 100.00 , 10.53 , 17.14 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 3 7 1 57 35 126

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.045

Estrat_UN Causa
Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
NÃO , 0 , 0 , 0 , 2 , 0 , 0 , 0 , 1 , 1 , 2 , 0 , 6
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 22.22 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 14.29 , 100.00 , 3.51 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SIM , 2 , 2 , 3 , 7 , 3 , 4 , 3 , 6 , 0 , 55 , 35 , 120
, 100.00 , 100.00 , 100.00 , 77.78 , 100.00 , 100.00 , 100.00 , 85.71 , 0.00 , 96.49 , 100.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 3 9 3 4 3 7 1 57 35 126

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.037

Finalizacao Causa
Frequency,
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
AB , 1 , 1 , 1 , 4 , 1 , 2 , 2 , 1 , 1 , 39 , 21 , 74
, 50.00 , 50.00 , 50.00 , 44.44 , 50.00 , 66.67 , 66.67 , 14.29 , 100.00 , 81.25 , 67.74 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
IB , 0 , 0 , 0 , 2 , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , 2 , 5
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 22.22 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 0.00 , 6.45 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
NI , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , 0 , 2
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SBC , 0 , 0 , 0 , 1 , 0 , 0 , 0 , 0 , 0 , 0 , 0 , 1
, 0.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SBS , 1 , 0 , 0 , 1 , 0 , 1 , 0 , 1 , 0 , 2 , 1 , 7
, 50.00 , 0.00 , 0.00 , 11.11 , 0.00 , 33.33 , 0.00 , 14.29 , 0.00 , 4.17 , 3.23 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
SU , 0 , 1 , 1 , 0 , 1 , 0 , 1 , 3 , 0 , 7 , 7 , 21
, 0.00 , 50.00 , 50.00 , 0.00 , 50.00 , 0.00 , 33.33 , 42.86 , 0.00 , 14.58 , 22.58 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 2 2 2 9 2 3 3 7 1 48 31 110

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.006

Estrateg Causa
Frequency,

225
Col Pct ,AD ,AF ,AV ,OUTRAS ,DF ,DI ,DL ,DP ,EX ,PR ,RD , Total
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
CO , 1 , 0 , 0 , 3 , 2 , 2 , 0 , 3 , 1 , 8 , 6 , 26
, 20.00 , 0.00 , 0.00 , 12.00 , 11.76 , 11.11 , 0.00 , 8.11 , 100.00 , 3.46 , 4.44 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
FI , 0 , 1 , 1 , 0 , 3 , 3 , 0 , 3 , 0 , 63 , 20 , 94
, 0.00 , 25.00 , 12.50 , 0.00 , 17.65 , 16.67 , 0.00 , 8.11 , 0.00 , 27.27 , 14.81 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
UN , 4 , 3 , 7 , 22 , 12 , 13 , 8 , 31 , 0 , 160 , 109 , 369
, 80.00 , 75.00 , 87.50 , 88.00 , 70.59 , 72.22 , 100.00 , 83.78 , 0.00 , 69.26 , 80.74 ,
---------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+--------+
Total 5 4 8 25 17 18 8 37 1 231 135 489

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.002

Análise Comparativa entre Estratégias – Revisada

 A tabela 10, a seguir, apresenta as comparações das variáveis entre as estratégias usadas nos conflitos.

Tabela 10. Comparação das variáveis categóricas entre estratégias.


Finalizacao Estrateg
Frequency,
Col Pct ,CO ,FI ,UN , Total
---------+--------+--------+--------+
AB , 11 , 52 , 213 , 276
, 42.31 , 70.27 , 67.19 ,
---------+--------+--------+--------+
IB , 2 , 1 , 16 , 19
, 7.69 , 1.35 , 5.05 ,
---------+--------+--------+--------+
NI , 0 , 0 , 1 , 1
, 0.00 , 0.00 , 0.32 ,
---------+--------+--------+--------+
SBC , 1 , 0 , 0 , 1
, 3.85 , 0.00 , 0.00 ,
---------+--------+--------+--------+
SBS , 7 , 7 , 20 , 34
, 26.92 , 9.46 , 6.31 ,
---------+--------+--------+--------+
SU , 5 , 14 , 67 , 86
, 19.23 , 18.92 , 21.14 ,
---------+--------+--------+--------+
Total 26 74 317 417

TESTE EXATO DE FISHER: P=0.007

226

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