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E L E T R O C A R D I O G R A F I A E M A D U LT O S

PARTE I

NORMALIDADE
ELETROCARDIOGRÁFICA
CAPÍTULO 1 E L E T R O C A R D I O G R A F I A E M A D U LT O S

CONCEITOS
FUNDAMENTAIS

ELETROCARDIOGRAFIA E a partir de uma determinada derivação (linha


ELETROCARDIOGRAMA que une pontos de captação de potenciais elétri-
A eletrocardiografia convencional estuda os fenô- cos).
menos elétricos gerados pelo coração por meio
de traçados obtidos por aparelhos denominados
eletrocardiógrafos. Na verdade, a soma das cé- DERIVAÇÕES DO
lulas miocárdicas produz um campo elétrico ELETROCARDIOGRAMA
dentro de um sistema condutor de eletricidade, As correntes elétricas geradas pelo coração, sen-
o corpo humano, com limite na superfície cor- do grandezas com magnitude, sentido e dire-
poral, cujos sinais serão captados e passados ção, podem ser representadas por vetores. As-
ao eletrocardiógrafo como diferenças de poten- sim, correntes advindas da atividade elétrica
cial elétrico e não como medida direta da ativi- do somatório das células atriais ou ventricula-
dade elétrica cardíaca, o que só poderia ser con- res, direitas ou esquerdas, poderão ser represen-
seguido se o eletrodo entrasse em contato di- tadas por seus respectivos vetores. Esses veto-
reto com o tecido cardíaco gerador da corrente res, resultantes da despolarização e da repola-
elétrica. Assim sendo, as voltagens das ondas rização das células cardíacas, dirigem-se para
obtidas no eletrocardiograma serão, apenas, as linhas que ligam os pontos de captação de
uma aproximação daquelas realmente geradas potenciais elétricos, denominadas linhas de de-
pelo coração. O eletrocardiograma é, pois, a ins- rivação ou, simplesmente, derivações. Recebidos
crição gráfica dos potenciais elétricos gerados nessas derivações, os vetores permitirão a ins-
pelo tecido cardíaco. crição das deflexões positivas, negativas e iso-
difásicas, ou isoelétricas, no ECG.
Por convenção, registram-se deflexões posi-
INSCRIÇÃO DO ELETROCARDIOGRAMA tivas (para cima da linha de base considerada
O eletrocardiograma (ECG) é inscrito pela apli- como isoelétrica) quando um dos eletrodos,
cação de vários eletrodos metálicos sobre a su- admitido como explorador, está orientado para
perfície do corpo, conectando-os a um voltíme- as áreas que se comportam como positivas em
tro muito sensível de um aparelho registrador, relação às que se encontram voltadas para o
o eletrocardiógrafo. As conexões são tais que outro eletrodo (eletrodo indiferente). O vetor re-
uma deflexão para cima indica potencial positivo e sultante tem, por convenção, sua farpa dirigida para
uma deflexão para baixo indica potencial negativo. a região da superfície do corpo que tem potencial posi-
As deflexões individuais representam, seqüen- tivo em relação à região para a qual estiver voltada a
cialmente, a soma dos potenciais elétricos dos cauda (negativa) do referido vetor. Entre essas duas
vários locais anatômicos durante o ciclo cardíaco. regiões, situa-se uma estreita faixa de poten-
Observe, na Figura 1.1, as ondas, os intervalos ciais transicionais de valor nulo e que, por isso,
e os segmentos do eletrocardiograma, captados recebe o nome de “plano zero” (veja a Figura
22 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

SEGMENTO SEGMENTO

P-R S-T
T
P
J U

P T
INTERVALO
Q INTERVALO
P-R S-T
S
QRS INTERVALO

Q-T
! Figura 1.1
Ondas, intervalos e segmentos do ECG.

1.2). Despolarização e repolarização, atividades


do ciclo cardíaco sisto-diastólico, são estudadas
adiante na eletrofisiologia.
Estão assim distribuídas as 12 derivações
usuais do eletrocardiograma:
z Seis periféricas ou de extremidades, sen-
do três bipolares (I, II,III) e três unipolares
(aVR, aVL, aVF);
z Seis precordiais unipolares (V1 a V6).

As três derivações periféricas bipolares, I, II e


III, são as denominadas derivações-padrão, selecio-
nadas por Willen Einthoven para registrar dife-
renças de potencial no plano frontal, quais sejam:
! Figura 1.2
z Derivação I = diferença de potencial en-
Vetor resultante de um determinado fenômeno elétrico
tre braços E e D; do coração. Zonas de positividade e de negatividade
z Derivação II = diferença de potencial en- separadas pelo plano de potenciais isodifásicos (plano
tre a perna E e o braço D; zero). O vetor aqui ilustrado tem a orientação espacial
z Derivação III = diferença de potencial semelhante à do vetor de QRS normal (entre 0o e +90o),
entre a perna E e o braço E. como veremos adiante.
Eletrocardiografia em adultos 23

A relação entre as três derivações bipolares


periféricas é expressa pela equação de Ein- -
thoven: +0
II = I + III -
+
Essa equação é baseada na segunda Lei de
BD
- I + BE
Kirchoff, a qual diz ser igual a zero a soma de - ---------------+++++++++

--

-
-

--
--
todas as diferenças de potencial de um circuito

--
--

--
fechado. Se Einthoven tivesse revertido a pola-

--

--
--
ridade da derivação II, passando-a para braço

--
--

--
D – perna E, os três eixos das derivações bipo- - -

--

--
-+
lares resultariam em um circuito fechado e I +

+
+0 +0

+
II
II + III seria igual a zero. Entretanto, como

III
- -

+
+

+
Einthoven fez a alteração na polaridade no eixo
+ +

+
+

+
da derivação II, a equação tornou-se:

+
+
+
I – II + III = O ou seja, II = I + III

Observe, na Figura 1.3, a disposição das três


+PE+
derivações bipolares periféricas I, II e III. Cada ! Figura 1.3
uma tem seu campo elétrico positivo e negativo. Derivações I, II e III. A corrente elétrica percorrendo
A polaridade das derivações é construída, arbi- as direções, conforme indicado pelas setas, produz de-
trariamente, no eletrocardiógrafo, e as corren- flexões positivas para cada uma das três derivações;
tes elétricas do paciente têm a direção das fle- BD = braço direito; BE = braço esquerdo; PE = per-
chas com suas cabeças representando suas po- na esquerda.
laridades, dirigindo-se para os eletrodos posi-
tivos e inscrevendo deflexões positivas nos gal-
vanômetros (leia-se ECGs). Adiante, serão me-
(A cada instante do ciclo cardíaco, a soma dos
lhor abordados os vetores elétricos do coração
potenciais do braço D, do braço E e da perna E
quando do estudo da influência das forças elé-
deve ser igual a zero.)
tricas sobre as derivações periféricas, incluin-
Podemos ainda expressar, matematicamen-
do as derivações unipolares aVL, aVR e aVF.
te, as relações entre as derivações periféricas
As derivações unipolares periféricas, VR, VL
bipolares (I, II e III) e as derivações unipolares
e VF foram introduzidas por Wilson em 1932.
periféricas (aVR, aVL e aVF) da seguinte for-
Nessas derivações, os eletrodos captam os po-
ma:
tenciais elétricos existentes nos pontos de cone-
xão com os membros (VR no braço D, VL no I = aVL + aVR;
braço E e VF na perna E) (R de right, L de left, F II = aVF – aVR;
de foot), estando todos conectados a uma cen- III = aVF – aVL.
tral terminal de potencial zero. Como tais deri-
vações fornecem deflexões muito pequenas, Na Figura 1.4, os três pontos nos membros
Goldberger introduziu uma modificação que (os dois braços e a perna E) são positivos, e os
aumenta em 50% as voltagens das deflexões, vetores que para eles se dirigem inscreverão de-
passando-as a aVR, aVL e aVF, sendo a letra a flexões positivas no ECG.
designativo de “aumentado”. As derivações unipolares periféricas medem,
Ainda, de acordo com a Lei de Kirchoff, as pois, a voltagem cardíaca de um ponto em rela-
relações entre as três derivações unipolares pe- ção a outro central de potencial zero, logo:
riféricas podem ser representadas pela seguinte
z aVR inscreve potenciais do braço D;
equação matemática:
z aVL inscreve potenciais do braço E;
aVR + aVL + aVF = 0 z aVF inscreve potenciais da perna E.
24 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

Derivações unipolares periféricas BD


- I + BE
aVR, aVL, aVF - -

aVR aVL
II III
-150º + + -30º

+ +
PE

! Figura 1.5
Triângulo de Einthoven. Note as posições convencio-
nadas dos pólos positivos de cada derivação.

+
aVF e os deslocarmos para o centro, paralelamente
+90º às suas posições primitivas, como na Figura 1.7,
! Figura 1.4 obteremos também uma figura triaxial.
Nas derivações unipolares periféricas (aVR, aVL e Se acoplarmos a esses três eixos os três eixos
aVF), somente um pólo, o positivo, está conectado a de aVR, aVL e aVF, formaremos um sistema
cada extremidade (braço D, braço E, perna E).O pólo hexaxial com suas respectivas polaridades e an-
negativo está conectado à central terminal, de poten- gulações, como podemos ver na seqüência A,
cial, aproximadamente, zero. A união das extremidades B, C, D da Figura 1.8.
ao centro forma uma figura triaxial. Na Figura 1.9, reproduzimos o sistema he-
xaxial para que de observem as relações de an-
gulação entre as seis derivações e suas respecti-
TRIÂNGULO DE EINTHOVEN E vas polaridades.
SISTEMA HEXAXIAL Veja que:
Por convenção de Einthoven, o pólo negativo z a derivação I é perpendicular à aVF;
do galvanômetro está ligado ao braço D, e o pólo z a derivação II é perpendicular à aVL;
positivo, ligado ao braço E, para formar a deriva- z a derivação III é perpendicular à aVR.
ção I; o pólo negativo do galvanômetro está li-
gado ao braço D, e o pólo positivo está ligado à Note, também, os pólos positivos das seis de-
perna E, para formar a derivação II; o pólo ne- rivações e seus campos eletropositivos (setas
gativo do galvanômetro está ligado ao braço E, cheias) e eletronegativos (linhas de derivação
e o polo positivo, à perna E, para formar a deri- intersectadas). Os ângulos entre as linhas de
vação III (observe, novamente, a Figura 1.3). derivação são de 30º. Todas as seis derivações
A união das extremidades do braço D, do braço estão situadas no plano vertical, que é visto de
E e da perna E forma um triângulo equilátero de- frente, por isso, chamado de plano frontal. Nes-
nominado Triângulo de Einthoven (Figura 1.5). sas linhas de derivação, projetam-se os vetores
Como visto acima, no sistema de Wilson cardíacos, resultado da atividade elétrica do co-
(aVR, aVL, aVF), o pólo positivo de aVR está ração. A projeção de um vetor no plano frontal
no braço D, o pólo positivo de aVL, no braço E, dará origem a seis projeções diferentes, uma
e o pólo positivo de aVF, na perna E, respectiva- sobre cada linha de derivação. Assim, o registro
mente a –150o, –30o e +90o (veja a Figura 1.4). das seis derivações do plano frontal (I, II, III,
A união das extremidades dessas derivações ao aVR, aVL, aVF) estuda apenas a projeção de um
centro forma uma figura triaxial. Se usarmos mesmo e único fenômeno elétrico. Daí a possi-
os lados do Triângulo de Einthoven (Figura 1.6) bilidade de calcularmos, pelas projeções obti-
Eletrocardiografia em adultos 25

A I

II III

II III

B II III

! Figura 1.6 I +
Derivações I, II e III.

+ +

I
+
C R L
+ +

II III
+
F

! Figura 1.7
D
o
–90
o
Deslocamento das linhas de derivação para o centro, –120
o
–60
F
formando um sistema de três eixos. II III
o
–150
o
–30
R -

das, a sua orientação (do fenômeno elétrico, ±180


o
I + 0
o

do vetor) nesse plano (veja a Figura 1.10).


Ainda, as derivações I, II e III são denomina- L -
+150
o
+30o
das de D1, D2 e D3, respectivamente. As deriva-
+ +
ções unipolares precordiais, ou do plano hori- +
+120o +60o
zontal, como veremos adiante, são designadas +90
o

pela letra V (do inglês voltage, que significa for-


ça eletromotora, diferença de potencial, expres- ! Figura 1.8
sa em volts). Em D, o sistema hexaxial de derivações I, II, III, aVR,
aVL, aVF.
26 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

–90o
ser representada por uma seta. Como as forças
–120o –60o elétricas têm magnitude e direção, elas são
aVF
II (–) III quantidades vetoriais e podem ser representa-
(–) (–) das por setas. Na representação vetorial, o com-
–150o –30o
aVR aVL primento da seta indica a magnitude da força
(+) (+) elétrica, e a “cabeça”, ou “farpa” da seta, indica
I I
a polaridade da mesma.
±180o 0o
(–) (+) Por convenção, a “cabeça” da seta indica po-
sitividade elétrica. Quando a “cabeça” de um vetor
aVL aVR
(–) (–) se dirige para um determinado eletrodo (por exten-
o o
+150 III II +30 são, a uma determinada derivação), inscrever-se-á na
(+) (+)
aVF derivação uma deflexão positiva. Na derivação que
(+)
+120o +60o corresponder à cauda do vetor, inscrever-se-á uma de-
o
+90 flexão negativa.
Quando um vetor, representando uma força
! Figura 1.9
elétrica, se dirige perpendicularmente ao eixo
Sistema hexaxial de derivações periféricas do plano
frontal: três bipolares (I, II e III) e três unipolares de uma derivação, inscrever-se-á menor (ou ne-
(aVR, aVL e aVF). nhuma) deflexão em tal derivação no ECG. Por
outro lado, se o vetor se dirige paralelamente
ao eixo de uma derivação, increver-se-á maior
deflexão em tal derivação no ECG.
aVR aVL Observe em conjunto as Figuras 1.11 e 1.12,
-I+
as quais servem para ilustrar as projeções dos
vetores perpendicular e paralelamente às linhas
de derivação, exemplificando a projeção sobre
a derivação I.

EIXO MÉDIO DE QRS


II -
-I

(EIXO ELÉTRICO DO CORAÇÃO)


I+

+I

Um vetor muito estudado é o que representa


as forças elétricas resultantes da despolarização
(ou ativação) ventricular, ao tempo da sístole.
É o vetor do denominado complexo QRS (esse
aVF
complexo é abordado posteriormente). Assim,
observando no ECG a morfologia do complexo
! Figura 1.10 QRS nas diversas derivações, a derivação que tiver
Triângulo de Einthoven mostrando as projeções de um o QRS mais isodifásico (amplitudes iguais acima e
vetor cardíaco sobre as linhas das derivações-padrão abaixo da linha de base), será a derivação à qual o
(I, II e III); podemos imaginar, na mesma figura, as
eixo médio de QRS será perpendicular. Esse eixo mé-
outras três projeções sobre as derivações unipolares
aVR, aVL e aVF.
dio de QRS traduz a posição do vetor médio da
despolarização cardíaca, ou eixo elétrico do co-
ração.
Portanto, podemos determinar a direção das
INFLUÊNCIA DAS FORÇAS ELÉTRICAS forças elétricas, representadas por vetores, no
(REPRESENTADAS PELOS SEUS plano frontal, utilizando o sistema hexaxial das
VETORES) SOBRE AS DERIVAÇÕES seis derivações periféricas (I, II, III, aVR, aVL,
PERIFÉRICAS aVF). Da mesma maneira que exemplificamos
Qualquer força que tenha magnitude e direção com o eixo de QRS, poderíamos ter usado o eixo
pode ser considerada um vetor e, por isso, pode da onda P ou o eixo da onda T.
Eletrocardiografia em adultos 27

SOMBRAS

CILINDROS

FOCOS DE LUZ

! Figura 1.11
À esquerda, a pequena projeção da sombra do cilindro perpendicularmente à tela e, à direita, a sombra maior da
projeção do cilindro paralelamente à tela.

A - + DERIVAÇÃO I
Resposta:
Buscamos a derivação onde o complexo
QRS está mais isodifásico (deflexões positi-
va e negativa de mesmas amplitudes, ou o
mais iguais possível). Vemos que está em
B - +
DERIVAÇÃO I I. Logo, se QRS está isodifásico em I, seu
eixo estará perpendicular a essa derivação.
Assim, tal eixo poderia estar a –90o ou a
- +
+90o. Porém, como o QRS está positivo
C DERIVAÇÃO I
(maior deflexão para cima da linha de base)
! Figura 1.12 em aVF, sendo o campo de aVF positivo a
Em A, o vetor se dirige perpendicularmente ao eixo da +90o, o eixo elétrico do complexo QRS esta-
derivação I, e nenhuma deflexão é inscrita; em B, o rá a +90o.
vetor representativo das forças elétricas está em uma
posição intermediária entre A e C, inscrevendo deflexão 2| Observemos a série de cinco ECGs A, B, C,
positiva no ECG; em C, o vetor é paralelo ao eixo da D, E, da Figura 1.14, e entendamos as res-
derivação, inscrevendo uma deflexão ainda mais po- pectivas posições dos eixos dos complexos
sitiva no ECG.
QRS, ou seja, em A +60o, em B –30o, em C
–70o, em D +135o e em E –135o. Para facili-
tar, reproduzimos, novamente, o sistema
EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO hexaxial, Figura 1.15.
1| Observe as deflexões de um ECG, Figura
1.13, nas derivações I, II, III, aVR, aVL e Resposta:
aVF, à direita, e explique por que o eixo do Tomemos como exemplo o entendimento
complexo QRS, seta grossa do sistema he- do traçado C. A derivação aVR tem o com-
xaxial, está a +90o. plexo QRS mais isodifásico de todos, logo,
28 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

aVF I aVR
II III

aVR aVL
+ +

I + II aVL

+ +
III aVF
+

! Figura 1.13

o eixo de QRS deverá estar perpendicular à mesmo raciocínio para os demais traçados.
aVR, ou seja, a –60o ou +120o. Porém, ob- Uma boa norma é começar enquadrando a
servando o QRS em I e aVF, notamos que o posição do eixo de QRS em um dos diversos
seu eixo está no quadrante superior esquer- quadrantes por meio da morfologia do com-
do (já que + em I e – em aVF), logo, tal plexo QRS em I e aVF, como ilustrado na
eixo estará a –60o e não a +120o. Entretan- Figura 1.16.
to, buscando maior precisão, veremos que
o QRS é um pouco mais positivo do que 3| Observemos a Figura 1.17. Vemos à esquer-
negativo em aVR, o que faz trazer o eixo de da um eixo de QRS, posicionado entre +45o
QRS um pouco mais para o lado do pólo e +55o, correspondente ao ECG que está à
positivo de aVR, caindo em –70o. Usar o direita. Porém, nenhum dos complexos

1 2 3 R L F

A +60o

B –30o

C –70o

D +135o

E –135
o

" Figura 1.14


Eletrocardiografia em adultos 29

–90o I I
o o
–120 –60
aVF
II (-) III
(-) (-)
–150o –30o a
d F
aVR aVL F
(+) (+)

I I
±180o 0o
(-) (+)

aVL aVR
(-) (-)
+150 o
III II +30o I
(+) (+)
aVF
(+)
o
+120o +60
I
+90 o
I

! Figura 1.15
Sistema hexaxial. F
F
c b F
QRS é isodifásico, o que nos impossibilita
encontrar uma derivação à qual o eixo elé-
trico do QRS seja perpendicular. Como
comprovar que o eixo elétrico de QRS está ! Figura 1.16
mesmo entre +45o e +55o?

Resposta: No exemplo da Figura 1.17, a derivação


Em outros casos como esse, poderemos não com o complexo QRS de maior positividade
encontrar em nenhuma das seis derivações, é a derivação II, logo, o eixo de QRS deverá
do plano frontal um complexo QRS que seja estar em cima da linha da derivação II (pa-
isodifásico. Ficamos, assim, sem saber à ralelo a essa derivação), ou seja, sobre os
qual derivação o eixo elétrico do complexo +60o. Porém, como o QRS é, também, um
QRS será perpendicular. Vamos atrás, en- pouco positivo em aVL, seu vetor deverá di-
tão, da derivação com QRS de maior posi- rigir-se um pouco para o lado do campo de
tividade, pois o eixo elétrico de QRS, como positividade de aVL, entre os +30o e +60o,
já vimos, deverá estar paralelo à derivação. devendo situar-se, aproximadamente, en-

aVF
II III
I aVR
aVR aVL
+ +

I + II aVL

30o

III aVF
+ +
+ 60o

! Figura 1.17
30 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

tre os +45o e +55o. Se usarmos toda a po- DADOS IMPORTANTES SOBRE AS


tencialidade do sistema hexaxial, podere- DERIVAÇÕES E AS PROJEÇÕES
mos encontrar a posição vetorial do eixo VETORIAIS NO PLANO FRONTAL
elétrico de QRS no plano frontal com uma z A soma de aVR + aVL + aVF = zero;
aproximação de até 5o.
z A soma dos vetores I + III é igual a II, ou
seja: II = I + III;
4| Onde se situa o eixo médio de QRS nas Fi-
guras 1.18 e 1.19? z Matematicamente:
I = aVL + aVR;
Resposta: II = aVF – aVR;
No ECG da Figura 1.18, o vetor de QRS está III = aVF – aVL;
a +90o no plano frontal, pois o QRS é iso-
z Se um vetor for perpendicular a uma deri-
difásico em I, o que torna seu eixo perpendi-
vação bipolar (I, II, III), será paralelo a
cular à derivação I (+90o ou –90o). Porém,
uma derivação unipolar (aVR, aVL, aVF);
como o QRS é positivo em aVF, seu eixo
deve cair no campo de positividade de aVF, z Se a projeção de um vetor sobre uma li-
logo, a +90o. No ECG da Figura 1.19, o vetor nha de derivação for igual a zero (áreas
de QRS está a +60o no plano frontal, pois o acima e abaixo da linha de base iguais –
QRS é isodifásico em aVL, o que torna seu isodifásico), tal vetor será perpendicular
eixo perpendicular à derivação aVL (+60o a essa linha e terá igual tamanho nas ou-
ou –120o). Porém, como o QRS é positivo tras duas derivações do mesmo grupo
em aVF, seu eixo deve cair no campo de (grupo das bipolares ou das unipolares).
positividade de aVF, logo, a +60o. Na Figura 1.18, o QRS é isodifásico em I,

–90o
–120o –60o

o
–150 –30o
(aVR) (aVL)

D1 aVR
0o
±180o (I)

+150o +30o

+120o +60o
(III) +90o (II)
(aVL)
D2 aVL

D3 aVF

! Figura 1.18
Eletrocardiografia em adultos 31

o
–90
–120o –60
o

o
–150 –30º
D1 aVR (aVR) (aVL)

o 0o
±180 (I)

+150
o
+30o

+120o +60o
(III) +90o (II)
D2 aVL (aVL)

D3 aVF

! Figura 1.19

logo, os complexos QRS terão o mesmo


tamanho em II e III. Na Figura 1.19, o QRS X

é isodifásico em aVL, logo, os complexos


QRS terão o mesmo tamanho em aVR e
X
aVF. Quando se registram no ECG defle-
xões de amplitudes positivas iguais às ne-
A B
gativas em um mesmo complexo QRS, ISODIFÁSICO DIFÁSICO +
não dizemos que é QRS isoelétrico, mas,
! Figura 1.20
sim, isodifásico. Importante é a soma algé-
Em A, complexo isodifásico com projeções iguais, de
brica das áreas acima e abaixo da linha mesmas áreas, acima e abaixo da linha de base; em B,
de base, áreas obtidas pela magnitude e complexo difásico, com área maior acima da linha de
pelo tempo de duração das deflexões aci- base, fruto da maior duração da onda positiva e, portan-
ma e abaixo da linha de base inscritas. Nos to, positivo.
traçados da Figura 1.20, observamos: em
A, projeção de complexo isodifásico, pois
as áreas são iguais acima e abaixo da linha z Como vimos na Figura 1.16, o quadrante
de base no complexo mostrado; em B, no- inferior esquerdo, entre 0o e +90o, recebe
tamos complexo difásico, com projeção a grande maioria dos eixos de QRS em co-
predominantemente positiva sobre a linha rações normais, daí ser o quadrante dos ei-
de base (a área é maior para cima da linha xos normais, enquanto o quadrante supe-
de base, fruto do maior tempo de duração rior direito, entre + ou –180o e +270o ou
da onda positiva); logo, é um complexo –90o, que corresponde aos maiores des-
difásico positivo. vios de eixo de QRS para a direita acima
32 Parte I Normalidade eletrocardiográfica

de +180o, ou os maiores desvios de eixo


- -

–6 o
0
de QRS para a esquerda além dos –90o, é

–1
denominado quadrante dos eixos inde-

20
o
terminados.
Observe, na Figura 1.21, em A, o quadran-
te dos eixos normais (EN), entre 0o e +90o;
2
em B, o quadrante dos eixos desviados pa- 3 1 o
0
- +I
ra a esquerda (DE), entre 0o e –90o; em C o
±180 4 6
5
o quadrante dos eixos desviados para a
direita (DD), entre +90 e +180o e, em D,
o quadrante dos eixos indeterminados,
entre +180o e +270o.

20 o

+6
+1

0
o
z A magnitude da força elétrica do eixo mé-
+ +
dio de QRS pode ser medida usando o sis- III II
tema triaxial com os eixos centralizados
de I, II e III a partir do triângulo de Ein- ! Figura 1.22
thoven, como vimos anteriormente.
Tomamos os três eixos, façamo-los pas-
sar pelo centro elétrico do coração e os di-
vidimos, arbitrariamente, em porções DERIVAÇÃO I
iguais de milímetros, como na Figura 1.22. R1
Note-se, obteremos seis ângulos de 60o ca-
da. A seguir, observemos os complexos
QRS das derivações I e III do ECG obtido
na Figura 1.23. Na derivação I, a soma de
+4 mm
R1 e S1 é igual a +2,5 mm, isto é, +4 mm
com –1,5 mm. Marcamos esses +2,5 mm
no eixo positivo de I, como vemos na Figu-
ra 1.24. A mesma coisa fazemos com o
–1,5

S1

DERIVAÇÃO III
–90, +270o
R3

DE

D B +4,1
o
±180

C A
–2,0
DD EN

Q3
+90o

! Figura 1.21 ! Figura 1.23


Eletrocardiografia em adultos 33

complexo QRS de III. Na derivação III, a perpendiculares obtidas, no caso, passan-


soma de R3 e Q3 é igual a +2,1 mm, isto do pelos +58o (Figura 1.24).
é, +4,1 com –2,0. Marcamos esses +2,1 Note que a magnitude do vetor obtido está
mm sobre o eixo positivo de III, como ve- em torno de cinco unidades das que foram
mos na Figura 1.24. A partir dos dois pon- arbitradas sobre os eixos de I e III, corres-
tos marcados, em I e III, traçamos perpen- pondendo ao comprimento do vetor em
diculares aos respectivos eixos. pauta.
O eixo médio de QRS dirige-se sobre a li- Da mesma forma que escolhemos as deri-
nha que une o centro elétrico do coração vações I e III, poderíamos escolher quais-
e o ponto de interseção das duas linhas quer duas outras derivações entre I, II e III.

0 +2,5
! –0
,1
+2
º
20

+58º
+1

II
III

! Figura 1.24

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