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Revista da

Primeira Infância
ISSN: 2595-1114

Vol. 5 / No. 1 / Maio de 2021

Autismo e
Primeira Infância
Expediente
............Sumário
......... 5
A complexidade do TEA

14 8
CONECTA: unidade para crianças com
TEA e suas famílias

10
O respeitável autismo Instituto da Primeira Infância

14
A terapia ISA e a criança autista
08 Presidente: Sulivan Mota
Vice-presidente: João Amaral
Secretária: Joana Clemente
16 Coordenador Técnico-Científico:
O ambiente e eu: estratégias de autorregulação Álvaro Leite
Coordenador Técnico-Assistencial:
18 João Vicente Menescal
Sinais de autismo e a intervenção precoce Coordenador do Programa
Assistencial à Criança:
José Osivan Junior
20 Coordenadoras do Programa
Tá na hora de brincar Assistencial à Mulher:
Ana Beatriz Ferreira
24 Coordenador da Gestão de Projetos:
Alimentação e autismo João Victor Furtado
Coordenador do Acolhimento:
26 João Vicente Menescal
26 Compreendendo a comunicação no TEA Coordenadora do Conecta-Iprede:
Edda Araújo
28
Do luto à luta no autismo Revista da Primeira Infância
Editor: João Amaral
32 Jornalista Responsável: Luciano de Paiva (Mtb 073)
O autismo na escola Diretor Comercial: Luís Marcelo Benevides de Paiva
(85) 98847-6151 / 99625-0809
34 Publicidade: revistadoiprede@yahoo.com.br
Musicoterapia e TEA www.iprede.org.br/publicacoes/
Fotografia:
36 Andreza Esquerdo
O vínculo entre pais/cuidadores e filhos autistas Arte e Desenvolvimento:
Neuma Estúdio Gráfico- (85) 9.8717.8795
38 Tiragem: 5.000 exemplares
O cuidar da enfermagem da criança com TEA

40
Tira dúvidas do BPC

42
A família de crianças com TEA

44
40 O olhar do brincar no autismo

45
A bola é a minha paixão

Catalogação na fonte
Universidade Federal do Ceará - Biblioteca de Ciências da Saúde
IPREDE - Instituto da Primeira Infância / Fortaleza: Iprede UFC, v 5, nº 7 - Maio 2021 / Semestral
ISSN: 2595-1114
1.Saúde da Criança – Periódicos. II Iprede/UFC. CDD: 305.232
A revista Primeira Infância é uma publicação do Instituto da Primeira Infância, com supervisão direta de
sua diretoria. Tem circulação gratuita e dirigida, por mala direta, a autoridades e diversos outros segmentos da área da
saúde. Ela não representa um só real de despesas para o IPREDE. Todos os seus custos são cobertos por comerciais de
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por opiniões apresentadas nas matérias assinadas. É permitida a reprodução total ou parcial de conteúdo, entretanto
solicita-se a citação da fonte e o envio de um exemplar para a instituição.

3
Editorial

..............................................................

TRANSTORNO DO
ESPECTRO AUTISTA (TEA)
João Amaral

E
Pediatra e psicoterapeuta psicanalítico.
sse número da Revista da Primeira Infância (RPI) terá Professor e coordenador do Programa de
como tema central Autismo e Primeira Infância, como Pós-graduação em Saúde da Mulher e
da Criança da Universidade Federal do
parte do mês da conscientização do autismo Ceará (UFC). Vice-presidente do Instituto
recentemente comemorado em abril. O autismo é uma da Primeira Infância -IPREDE.
condição que se transformou em sinais conhecidos por
Transtorno do Espectro Autista (TEA) e que atualmente chama
muita atenção.
Em 1943 foi descrito pela primeira vez pelo médico
austríaco Leo Kanner. Passou por muitas transformações com
novos critérios diagnósticos. Como esperado, houve um
aumento no número de casos.
Esse aumento impulsionou novos estudos e,
principalmente um melhor diagnóstico e formas de
tratamento, o que teve impacto significativo na qualidade de
vidas dessas crianças com o diagnóstico precoce.
A Revista da Primeira Infância nesse número sobre
Autismo e Primeira Infância vem contribuir com esses
conhecimentos em vários aspectos, desde os critérios clínicos,
o papel do ambiente, o diagnóstico precoce, a alimentação, a
escola, a musicoterapia, a formação do vínculo, os aspectos
emocionais no luto, o cuidar na enfermagem até questões
práticas sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Para
finalizar, é contada uma história de vida de uma criança com
TEA, o que nos mostra o quanto é importante a atenção nesse
espectro.

Uma boa leitura!

4
Transtorno

A COMPLEXIDADE DO
TRANSTORNO DO
ESPECTRO AUTISTA
aqui devemos lembrar que essa dem da identificação e tratamento
biologia que todos possuímos pre- precoces, bem como do trabalho
cisa para sua expressão do ambien- articulado entre familiares, profis-
te facilitador. O ser humano se de- sionais e serviços sociais (saúde e
senvolve na relação com o ambien- educação).
te e, necessariamente, com outros O diagnóstico de TEA preco-
Álvaro Jorge Madeiro Leite humanos. Daí a importância atual ce é muito importante, pois possi-
Pediatra. Doutor em Pediatria. Professor dos fatores epigenéticos na expres- bilita o início do tratamento em um
Titular de Pediatria da Faculdade de são de nossa bagagem genética. período crucial para o neurodesen-
Medicina da Universidade Federal do Ceará Habilidades de interação volvimento (neuroplasticidade)
(UFC) e do Programa de Pós-graduação em
Saúde da Mulher e da Criança interpessoal, de comunicação ver- Quanto mais precoces as
(PPGSMC) da UFC. bal e não verbal, amplitude de inte- intervenções iniciarem, melhor o
resses, atividades e brincadeiras prognostico da criança; se iniciado
estão comprometidos nessa condi- antes dos 3 anos, é máxima a
ção. A consequência é a necessida- probabilidade na redução da gravi-

Q
ue doença é essa que há de de mediação e de intervenções dade dos sintomas clássicos do
menos de 10 anos se con- articuladas por equipes multidisci- TEA. Essas respostas positivas per-
verteu em transtorno iden- plinares refinadas por uma base sistem ao longo dos anos, reduzin-
tificado por uma variedade doutrinária: como se constitui a do o custo do tratamento ao longo
de espectros clínicos, que vem condição e a experiência humana na da vida.
apresentando uma curva ascen- vida com os outros em sua dimen- Num livro belíssimo, O filho
dente e traz implicações tão são familiar e social. antirromântico, a escritora ameri-
desafiadoras para o desenvol- Ilustrando essa complexida- cana Priscila Gilman nos conta a
vimento das crianças, para as fa- de com as palavras do psicólogo e profusão de sentimentos que mu-
mílias, os profissionais e os serviços escritor Andrew Solomon: daram sua vida quando da des-
de saúde, bem como para toda a ... “uns procuram a “cura” ou coberta que seu filho Benjamin era
sociedade e seus ideais de norma- a melhora das habilidades, outros portador de uma das tipologias do
tividade?! simplesmente procuram respeito e TEA que o levaria a ler compulsiva-
Mais: uma condição que afe- aceitação das suas características mente praticamente todos os seus
ta o desenvolvimento infantil e, únicas. livros de professora e aluna de
portanto, o desenvolvimento hu- Como Transtorno do Espec- doutorado antes dos 3 anos de
mano acarretando desafios práti- tro Autista (TEA) é considerado um idade (síndrome de hiperlexia ou da
cos de revisão de expectativas fa- transtorno do neurodesenvolvi- leitura precoce).
miliares e inclusão social. mento poligênico e multifatorial Priscila compõe seu texto
Na expectativa familiar: apresentando, dentre outras, as utilizando-se de poetas românticos
“Parece que o mundo vai seguintes características básicas: para ilustrar os caminhos tortuo-
acabar quando você percebe que ampla variabilidade clínica, bem sos, inesperados e magníficos do
seu filho tem um problema ou como da gravidade dos sintomas; amor, como podemos testemunhar
desafio tão grande pela frente” alterações na integração da senso- abaixo:
Na expectativa biomédica: rialidade. “Há um conforto na força do
Uma condição que afeta Esses aspectos implicam amor;
habilidades essenciais da condição em dúvidas persistentes sobre a Que torna suportável algo
humana, que do ponto de vista etiologia e sobre as mais eficazes que de outra maneira
biológico pode ser expressão de estratégias terapêuticas. Assim, o Sobrecarregaria o cérebro,
alterações no funcionamento do prognóstico persiste em aberto. A ou quebraria o coração”.
sistema nervoso central, caracteri- única certeza que se tem é de que William Wordsworth, poeta ro-
zado como neurotipicidade. Mas tratamento e prognóstico depen- mântico inglês do século XIX.

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TEA

CONECTA: UNIDADE PARA


CRIANÇAS COM TEA E
SUAS FAMÍLIAS

O
instituto da Primeira In- missão: contribuir para o desen-
fância - IPREDE desde volvimento de crianças de 0 a 12
2008, ampliou sua voca- anos, com Transtorno do Espectro
ção de cuidar da criança Autista – TEA e suas comorbidades,
desnutrida para o desenvolvimento por meio de intervenções quali-
Edda Araújo na primeira infância (DPI). Neste ficadas, produção e disseminação
Terapeuta Ocupacional.
Mestre em Psicologia pela Universidade de caminho, de inúmeros desafios e da informação aos pais, familiares,
Fortaleza (UNIFOR). Coordenadora do conquistas, em 2019, surge a Uni- colaboradores e sociedade em geral.
CONECTA-IPREDE e da Clínica habiliTO. dade de Assistência à Criança A missão do Conecta refe-
Autista - CONECTA, em resposta a rência as ações da equipe de pro-
carência de atendimentos às crian- fissionais que trabalha em uma
ças fortalezenses diagnosticadas atitude interdisciplinar. Portanto,
com Transtorno do Espectro do estamos construindo um eixo teóri-
Autismo - TEA. Uma constatação co comum a todas as especificida-
provocada pelo número de 7.000 des próprias a cada profissão, que
crianças em espera de atendimen- promova assistência às crianças
tos informados pela Secretaria de com TEA, e perpasse pela valoriza-
Saúde do Município. Tal fato, com- ção do singular, único, que as histó-
prova se tratar de um problema de rias de vida das crianças oferecem
saúde pública. Em reunião sobre a para se refletir a ação terapêutica.
temática realizada com participação O desafio é de reunir os
da diretoria do IPREDE e da diversos saberes que trazem os
Prefeitura, foi visto a importância nossos profissionais com suas
de criação do CONECTA; que pu- formações específicas, numa troca
desse suprir, com atendimento de de conhecimentos para entender a
João Vicente Menescal qualidade, uma parcela dessa popu- criança com TEA e a prática
Psicólogo. Mestre em Saúde da lação de crianças. terapeuta mais afeita a cada caso.
Mulher e da Criança pela Universidade
Federal do Ceará (UFC). Coordenador do Em outubro do mesmo ano, Ou seja, somos muitos profissionais
IPREDE. deu-se início aos atendimentos pelo trabalhando com um objetivo co-
Sistema Único de Saúde (SUS) na mum, de contribuir para o desen-
Unidade Conecta, das crianças com volvimento da criança e adolescente
TEA e seus familiares. com TEA, no respeito à diversidade
Em paralelo as negociações de suas características como
para a celebração do convênio, acon- pessoas.
teceram reuniões da coordenação Um princípio afeito ao eixo
técnica do Conecta, com profis- teórico do trabalho da equipe está
sionais convidados para realizar o na maneira em como a criança com
planejamento e metodologia de TEA forma seus vínculos afetivos
trabalho; todos com experiência e consigo, com a família, com a escola
qualificação para o exercício da e com os profissionais do Conecta. A
prática habilitativa e reabilitativa de escolha se deu em razão da impor-
crianças com TEA. Esta equipe tância deste na vida da pessoa com
pensou a adequação e estrutura dos TEA, como nos descreve Sinclair,
ambientes, fluxograma de atendi- adulto autista em sua autobio-
mento; escolheu os protocolos, grafia, “Eu construí uma ponte,
Sulivan Mota fichas e instrumentos; selecionou além de nenhum lugar, através do
Médico e professor de Pediatria da Faculdade
os profissionais para atuação na nada. E queria que existisse algo do
de Medicina da UFC. Presidente do Instituto Unidade. outro lado”. Empregar esforços no
da Primeira Infância – IPREDE. A Unidade Conecta tem por enriquecer dos vínculos afetivos das

8
TEA

crianças, constitui o primeiro passo os seus conhecimentos e trocas e ainda; sala e jardim de Integração
para as conquistas a serem significativas no processo terapêu- Sensorial, uma horta, uma casa
alcançadas. tico de crianças com TEA apoiando e modelo com todos os cômodos e
A própria diversidade do trabalhando seus familiares para caracterizações para vivências de
diagnóstico do TEA, por si só, já uma melhor resolução de interação autonomia da vida diária.
solicita uma prática multireferen- e comunicação social como princí- A cozinha da casa funciona
ciada que possa investigar, perce- pio norteador de suas intervenções. de forma terapêutica contando
ber e responder as suas especifici- A Unidade atende crianças, com o apoio da nutrição junto da
dades. Junto ao diagnóstico estão com idade de 0 a 12 anos, enca- equipe. O CONECTA possui três
as famílias que os fazem mais minhadas pelas Unidades Básicas lojinhas de compras e vendas de
singulares e, portanto, tão signifi- de Saúde (Postos de Saúde) com objetos para cuidados pessoais,
cativos no processo terapêutico suspeita de TEA. O primeiro profis- alimentação e vestuário. Junto aos
quanto às abordagens e referen- sional a recebê-las é o neuropedia- objetivos a serem trabalhados pela
ciais teóricos que conduzem cada tra que para a primeira triagem, equipe consideramos ainda esse
caso atendido. confirmando ou não o perfil das ambiente especifico dado ao fato
A família é uma parceira crianças a iniciarem tratamento na de crianças com TEA serem regular-
indispensável na nossa prática e por Unidade. Em caso positivo, sucede mente afetadas com dificuldades
isso criamos um espaço terapêu- a avaliação pelos profissionais: de seletividade alimentar e ou com-
tico para que ela seja fortalecida terapeuta ocupacional, fonoaudió- pulsão alimentar. A construção de
nesse processo de seguimento dos logo e psicólogo, para elaboração do habilidades sociais integra esse
filhos que, por vezes, tornam-se, seguimento terapêutico indicado espaço comum à equipe de profis-
para ela, muito difícil. Temos cons- para as crianças avaliadas. sionais.
ciência do valor de uma intervenção Ainda, antes do início das Atualmente está sendo
proposta e realizada junto com a intervenções, são realizadas as inaugurado a sala de Treinamento
família. A mediação favorável da entrevistas com o serviço social e Funcional onde terá ainda Yoga e
família junto com a equipe enfermagem objetivando para Meditação; sala de Informática;
estabelece um diferencial conhecer melhor as condições de sala de Robótica; sala de Games
significativo à aquisição de novas saúde e socioeconômicas da criança Interativos; sala de Arteterapia
habilidades por parte da criança e e sua família. Terminado as primei- com Teatro, Pinturas e Danças; sala
do adolescente. ras entrevistas e avaliações se dá o de Psicomotricidade; Espaço de
O CONECTA, além de espaço agendamento para início do trata- Convi-vência com lanchonete;
terapêutico, é também um encon- mento na Unidade. Cantinho do Sossego e outro de
tro de vários profissionais compro- A equipe é composta por Leitura.
metidos com a aprendizagem e Neurologistas pediátricos, Tera- Funcionamos pela manhã
qualificação continuada de suas peutas Ocupacionais, Psicólogos, através do SUS e a tarde o CONEC-
práticas. E para isso segue, junto ao Fonoaudiólogos, Musicoterapeu- TA está aberto para convênios e
IPREDE, com parcerias de várias tas, Assistente Social, Enfermeiro, particulares com preço social que
universidades e instituições de Pedagogo e Pediatras. Oferecemos atenda famílias em busca de trata-
ensino e pesquisa. Está sempre ambientes terapêuticos de prática mento de qualidade.
aberto para campo de práticas clínica em consultório para cada Venha nos fazer uma visita e
buscando aprimorar cada vez mais uma das profissões listadas acima conhecer nosso trabalho.

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Neurologia

O RESPEITÁVEL
AUTISMO


Transtorno do espectro autis- que nos motiva diariamente a
ta (TEA)” e “autismo” são trabalharmos em uma equipe
palavras cada vez mais fala- interdisciplinar, a fim de melhor
das nos meios científicos e assistir às famílias que contempla-
sociais. Essa condição neurológica, mos, além de nos comprometer-
orgânica, psicológica e social é cada mos em dar um atendimento de
vez mais estudada e intrigante para qualidade.
nossa medicina atual. As notícias Existe a possibilidade de
André Manganelli se multiplicaram, conteúdos nas outras doenças (comorbidades)
Médico. Residência em Neurologia redes sociais e publicações cien- associado a pessoas com TEA, já
Pediátrica pelo HCFMRP-USP. Mestre em tíficas se disseminaram ampla- descritas na literatura, são algu-
Neurologia e Neurociências Clínicas pelo
HCFMRP-USP. Neurologista infantil no mente. Em documentários, progra- mas destas: Transtorno do Deficit
CONECTA-IPREDE. mas televisivos, filmes, séries e até de Atenção e Hiperatividade
mesmo em rodas de conversas o (TDAH), Transtornos de linguagem,
autismo se tornou um assunto Transtornos de humor e/ou de
corriqueiro. ansiedade, Epilepsia, Déficit inte-
Atualmente, praticamente lectual e Distúrbios de sono. Estas
todas as pessoas sabem algo sobre comorbidades precisam ter seus
o tema ou conhecem alguém que diagnósticos bem claros e estabe-
tenha esta suspeita ou diagnóstico. lecidos para não ser um fator confu-
A busca e a necessidade por infor- ndidor no diagnóstico e assim atra-
mações a respeito do assunto exi- sar ou atrapalhar a melhor conduta
gem de nós, profissionais de saúde; tera-pêutica para essas pessoas.
sobretudo neuropediatras, uma A função do médico neuro-
responsabilidade social e ética em pediatra é também prestar assis-
contribuir com conteúdos sérios em tência clínica, tratar as intercor-
meio a tantas notas truncadas, rências médicas. E ainda auxiliar no
conhecimentos e interpretações planejamento terapêutico, no pro-
errôneos e oportunismos que des- gnóstico das crianças, na segunda
norteiam àqueles que procuram opinião junto a outros médicos, na
ajuda e orientação sobre o mundo composição de equipes interdisci-
do autismo. plinares, nas orientações aos pais e
O diagnóstico é clínico. familiares e quando for solicitado,
Isabel Norões Ainda hoje, nenhum exame com- na formulação de políticas públicas
Médica. Residência em Neurologia Infantil
plementar é suficiente para confir- relacionadas as pessoas com TEA
pelo HCFMRP-USP. Especialista em mar com precisão a condição do ou outras temáticas.
Neurofisiologia pelo HCFMRP-USP. autismo, pois a clínica é soberana. As muitas mudanças no
Neurologista infantil no CONECTA-IPREDE. Pautados pela experiência profis- decorrer da vida da criança com TEA
sional com fiel embasamento nas e na de sua família como um todo,
evidências científicas vigentes e principalmente após saber do dia-
principalmente no Manual Diag- gnóstico, a relutância muitas vezes
nóstico e Estatístico para Doenças em aceitar a condição, a falta de
Mentais – 5° edição (DSM-5); que apoio, o reconhecimento da neces-
nos guia nos critérios para a sidade de ter as terapias em sua
formação do pensamento diagnós- rotina semanal, é que percebemos
tico, são os recursos que temos a necessidade e a importância de
para darmos a correta elucidação caminhar junto a essas famílias,
clínica. Por isso, o atestado desta demonstrando empatia e acolhi-
condição médica é o grande desafio mento às suas demandas tão

10
Neurologia

diversas, dando vez às particulari-


dades também desses cuidadores
que são peças fundamentais em
todo o processo ao longo da vida
desses jovens.
A diversidade que há é o que
existe de mais belo nestas crianças.
Aprendemos com elas que não é o
autismo que as definem e sim elas
quem nos conduzem e apresentam
a definição da palavra espectro. Há
em cada uma o seu próprio signi-
ficado do que é ser autista. Ainda
que as dificuldades em perceber as
relações socioemocionais e em se
comunicar, além dos prejuízos no
processamento sensorial, sejam os
fatores comuns na maioria destes medicamentos prescritos são no na consulta e sempre relatar a ele
indivíduos, há a contribuição de intuito de contribuir para a melho- se outro medicamento foi iniciado
cada personalidade e suas carac- ria de algum dos sinais ou sintomas ou alterado por outro profissional,
terísticas distintas que fazem os presentes na pessoa com TEA ou com o objetivo do conhecimento da
autistas serem tão intrigantes, relacionado às suas comorbidades. família a quem damos assistência.
admiráveis e únicos. Toda classe de medicamento tem Faz-se indispensável a parceria do
Acreditamos que nas últi- um funcionamento e um metabo- médico com a família quanto a
mas oito décadas, desde o primeiro lismo próprio, uma forma e um responsabilidade do uso adequado
caso relatado dentro desta condi- tempo de eliminação do corpo e dos medicamentos.
ção clínica, a medicina já contribuiu interação com outros medicamen- Nossa preocupação é sem-
em muito para o conhecimento do tos. Por isso, se torna fundamental pre favorecer as pessoas (crianças e
cérebro autista, porém ainda há que todo e qualquer medicamento familiares) em acompanhamento
muitas lacunas a serem preenchi- seja prescrito e orientado pelo que possibilite a aquisição do seu
das e muito deste mundo para ser médico, que deve acompanhar os potencial. Para tanto promover o
explorado e esclarecido. efeitos benéficos ou colaterais alcance de sua funcionalidade e
O nome espectro é um ter- relatados e observados, ajustar as viver no bem-estar físico, mental e
mo cunhado primariamente na dosagens quando necessário e social de acordo com suas dife-
física como uma faixa possível retirar ou substituir a medicação renças. Trabalhar os vínculos fami-
entre dois pontos e extrapolado quando esta não promover o obje- liares mostrando o poder do amor
aqui para se referir também aos tivo desejado. nessa relação e trazendo os cuida-
graus de autismo, diferindo àque- O processo de indicação da dores e as famílias para a luz do
les com sinais e sintomas sutis e, medicação ideal para certa queixa entendimento cada vez mais claro
por vezes, imperceptíveis aos olhos clínica está associado diretamente sobre a leitura de vida real de nos-
das pessoas até os que apresentam com as informações fornecidas sas crianças fará com que nosso
graus de maior comprometimento pelos familiares e cuidadores, da trabalho em equipe alcance não só
com sinais mais exuberantes. forma mais clara possível, pois a transformações nelas, mas deseja-
Precisamos lembrar que ter prescrição é feita distinta e indivi- mos contribuir para mudanças no
autismo não significa necessaria- dualmente para cada paciente. Os meio em que elas vivem, pois
mente usar medicação, como mui- acompanhantes devem seguir as sabemos que só dessa forma fare-
tas pessoas podem pensar. Os orientações fornecidas pelo médico mos a real diferença em suas vidas.

AMAMENTAÇÃO É FUNDAMENTAL
PARA À VIDA

11
Terapia

VIVENDO SENSAÇÕES:
A TERAPIA ISA E A
CRIANÇA AUTISTA
sentido para nós, ou de pouco rial. Nem toda criança com disfun-
adiantariam e nos serviriam em ção de integração sensorial possui
nosso dia-a-dia. O processo que autismo, mas quase sempre uma
combina sensações diversificadas criança autista possui disfunção de
do ambiente ao nosso redor e tam- integração sensorial, fazendo com
bém sensações do nosso próprio que para elas, mesmo simples tare-
Brunna Uchoa corpo, que organiza todas as partes fas pareçam muito difíceis. Con-
Terapeuta Ocupacional do CONECTA- para que funcionem como um todo tudo, vale ressaltar que cada crian-
IPREDE e da Clínica habiliTO. Certificada
internacionalmente em Integração se dá o nome de integração sen- ça com dificuldades de integração
Sensorial de Ayres pela CLASSI. Mestranda sorial. sensorial apresenta sua própria
em Saúde da Mulher e da Criança pela O nosso cérebro é o principal configuração de sintomas, portan-
Universidade Federal do Ceará (UFC). envolvido nessa organização, loca- to, vivencia diferentes desafios no
lizando, classificando e ordenando seu cotidiano.
sensações, assim como um guarda A presença de diferenças
de trânsito organiza o movimento e sensoriais está tão evidente na vida

A
s sensações estão presen- direção dos carros. Quando as de crianças com autismo que se
tes em nossas vidas sensações fluem de uma maneira tornou um dos critérios para chegar
desde antes de nascer- integrada e organizada, o cérebro ao diagnóstico. O fato é que muitas
mos. O bebê vivencia usa essas informações para de- crianças com autismo e que têm
sensações mesmo dentro do útero senvolver percepções, comporta- dificuldades de integração senso-
materno quando sente os movi- mento adequado e aprendizagem. rial têm sua participação em ativi-
mentos do corpo da mãe, escuta No entanto, quando o fluxo das dades diárias afetadas. Assim,
seus batimentos cardíacos e sente sensações não é integrado e orga- atividades como: interação social,
o contato seguro do útero envolver nizado como deveria, a vida pode brincar, autocuidado como se vestir
todo seu corpo. O fato é que somos ser como um engarrafamento em ou escovar dentes, aprendizagem e
desde sempre seres sensoriais. Nós horário de pico. comportamentos adequados se
experimentamos a vida através dos A integração sensorial ocor- tornam verdadeiras batalhas para
nossos sentidos, afinal as vivências re de maneira automática na elas. De fato, a integração sensorial
das sensações estão em todos os maioria das pessoas e todas as é um processo invisível aos nossos
lugares, pois o mundo é um lugar crianças precisam desenvolvê-la olhos, mas quando não acontece de
sensorial. para interagir de maneira efetiva maneira efetiva, pode afetar a
As sensações são importan- com o mundo. Contudo, algumas qualidade de seus produtos: com-
tes fontes de informação para o crianças apresentam dificuldades portamento adaptativo e a apren-
nosso cérebro. Nós sabemos que os em seus processos de organização dizagem. A melhor maneira que
alimentos nutrem o nosso corpo à das sensações do próprio corpo e do pais e professores têm de observá-
medida que são digeridos e proces- ambiente ao redor. Essas crianças la é identificando possíveis dificul-
sados. Da mesma forma, as sensa- apresentam o que chamamos de dades de participação e de desem-
ções são como “nutrientes” para o disfunção de integração sensorial. penho da criança em atividades que
nosso cérebro, são elas que alimen- As dificuldades de integrar as compõem sua rotina. Nesses casos,
tam o conhecimento necessário informações sensoriais podem a avaliação de um terapeuta ocu-
para direcionar nosso corpo e ocorrer com qualquer criança, en- pacional treinado é recomendada
mente. tretanto, algumas crianças que para identificar o tipo de disfunção
O mundo está cheio de expe- possuem outras condições clínicas, sensorial e assim iniciar um pro-
riências para nossas sensações e como é o caso do Transtorno do grama de intervenção.
não é de se esperar que várias delas Espectro Autista (TEA), apresen- Anteriormente, menciona-
cheguem até nós. No entanto, tam uma maior prevalência de do acima, a integração sensorial é
essas sensações precisam fazer problemas com integração senso- um processo que organiza, unifica e

14
Terapia

para realizar a terapia de ISA terá


como objetivo central de sua prá-
tica promover ajustes na forma
com que a criança recebe as sensa-
ções e as interpreta para uso fun-
cional dessas sensações em ati-
vidades e ocupações significativas.
As sensações vividas usual-
mente não causam desconforto
para a maioria de nós e, no entanto,
para a criança autista e com dificul-
dades de integração sensorial é tida
como muito aversiva, invasiva e
desconfortável, e pode se tornar
aceitável e menos incomodada com
os ajustes provenientes dos estí-
mulos adequados da terapia de
Integração Sensorial de Ayres.
A criança com TEA vive em
um mundo frequentemente distor-
cido quanto às sensações, sentin-
do-se muitas vezes facilmente
sobrecarregada (hiperreativa), per-
didamente ausente (hiporreativa),
sem muitas referências de si e
muito menos do outro e do espaço
ao redor. Ao observarmos uma
criança lutando para realizar uma
simples tarefa de calçar sua sandá-
lia ou mesmo vivenciando uma
crise em uma festa de aniversário
muito barulhenta jamais podemos
imaginar que por trás de tudo isso
existe uma desorganização imensa
dá sentido às sensações do nosso base para aprendizagem, compor- do fluxo e intensidade das sensa-
corpo e do ambiente em que tamento organizado e estabilidade ções que chegam até o cérebro
vivemos. A Integração Sensorial de emocional. Assim, seus estudos dessa criança. Exatamente porque
Ayres (ISA) se refere à teoria e trouxeram grandes avanços na a maneira que as crianças com TEA
conceitos identificados pela tera- compreensão de tais dificuldades lidam com as sensações é pouco
peuta ocupacional americana Anna que até então não tinham causa conhecida, motivo que esse texto
Jean Ayres, que foi pioneira ao conhecida, e suas pesquisas pude- se faz necessário.
relacionar o processo de integração ram contribuir com avaliações Quando agora você estiver
sensorial às dificuldades apre- específicas para tal, além de esta- diante de uma criança apresentan-
sentadas por crianças com proble- belecer uma maneira de tratar do um comportamento inadequa-
mas de aprendizagem na década de essas dificuldades, ou seja, a Tera- do, procure pensar antes sobre o
60. pia de Integração Sensorial de que pode estar causando aquilo, e
Jean Ayres foi revolucionária Ayres (ISA). entender que mais que uma birra,
ao explicar como a combinação de Atualmente a terapia de ISA uma fuga ou oposição, a criança
interações entre os sistemas sen- é cientificamente reconhecida em pode estar tentando fazer um
soriais auditivo, visual, tátil, olfati- todo o mundo como eficaz no pedido de ajuda. A integração
vo, gustativo e mais dois outros tratamento de crianças com TEA e sensorial quando acontece da
sistemas menos conhecidos, vesti- outros diagnósticos. O profissional forma esperada é sinônimo de
bular e proprioceptivo, responsá- responsável por essa prática é o bem-estar, e talvez seja por isso
veis por sensações de movimento e terapeuta ocupacional, que se utili- que as crianças autistas que fazem
posição do corpo respectivamente, za dos princípios da teoria para terapia de ISA sejam tão devotadas
poderiam ser responsáveis pelo promover o engajamento do sujeito aos momentos dos atendimentos,
desenvolvimento de habilidades em atividades e ocupações. Quando pois é para elas mais que uma
complexas e extremamente impor- se trata de crianças com TEA, o terapia, é diversão, é um bálsamo
tantes para a estruturação de uma terapeuta ocupacional treinado diante de tanto ardor.

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Autorregulação

O AMBIENTE E EU:
ESTRATÉGIAS DE
AUTORREGULAÇÃO
PARA CRIANÇAS

A
autorregulação é a capa- familiares e com outras crianças. E
cidade de se manter orga- ainda causando prejuízo na apren-
nizado/bem para respon- dizagem dessas crianças pela difi-
der adequadamente às culdade de filtragem das informa-
exigências do ambiente. É uma ções sensoriais do ambiente impe-
Ana Beatriz Cavalcante habilidade usada para conseguir dindo a detecção de informações
Terapeuta Ocupacional com Certificação
Internacional em Integração Sensorial. compreender e conduzir os compor- importantes e o descarte das não
Especialista em Psicomotricidade pela tamentos, controlar impulsos e importantes.
Universidade Estadual do Ceará (UECE). pensamentos. A criança que está Alguns sinais de dificuldade
Trabalha na Clínica habiliTO.
autorregulada consegue estar na autorregularão são comporta-
pronta para agir de acordo com as mentos facilmente observáveis em
necessidades da situação para uma algumas crianças. Crianças que são
interação eficaz com o ambiente, mais agitadas, que apresentam
uma aprendizagem efetiva, assim uma movimentação maior que o
como participar efetivamente do esperado ou que são aparente-
seu cotidiano. mente mais sonolentas, e ainda,
Uma autorregulação eficien- que têm dificuldades de focar
te promove a resistência a distra- atenção em uma determinada ati-
ções, a persistência frente a dificul- vidade e então observam tudo, mas
dades, as respostas adaptativas e não se detém em nada. O compor-
flexíveis, o controle e manejo do tamento pode mudar de acordo
comportamento, das ações, das com a situação e ou com o ambien-
emoções e principalmente da moti- te. Existem também sinais de des-
vação interna para só então a regulação mais interna como o au-
criança atingir seu objetivo. E aí mento da frequência cardíaca, da
você consegue deter a atenção frequência respiratória, a mudança
dela, para brincar, realizar suas na coloração da pele, sudorese,
tarefas, estabelecer relações ade- sensação de estar quente, medo,
quadas com seus colegas se inte- dor de barriga, essas coisas que
grando e respondendo as questões podemos sentir de repente diante
Edda Araújo da escola. as situações novas, inesperadas e
Terapeuta Ocupacional. Existem alguns fatores que desafiadoras que são completa-
Mestre em Psicologia pela Universidade
de Fortaleza (UNIFOR). Coordenadora podem influenciar diretamente na mente comuns a cada um de nós.
do CONECTA-IPREDE e da Clínica habiliTO. autorregulação, nesse caso o diag- Uma autorregulação defici-
nóstico de Transtorno do Espectro tária numa criança pode causar
Autista - TEA com as suas especifi- impacto no seu cotidiano de forma
cidades como a inflexibilidade de a afetar o desempenho nas ativida-
comportamento, as dificuldades de des de vida diária, no brincar, na
comunicação e de interação social. participação social e o no desem-
E ainda temos a Disfunção de penho acadêmico na escola. Por-
Integração Sensorial que dificulta o tanto, muitas vezes uma criança
processamento de informações do com dificuldades de autorregular-
ambiente, não sendo possível se necessitará do auxílio de um
responder de forma adequada às adulto para alcançar um nível
necessidades do mesmo, impac- adequado de bem-estar consigo
tando negativamente nas relações mesma e promover sua partici-

16
Autorregulação

de controle. Temos de oferecer a


criança segurança, autocontrole
como referência ao lidar com as
crises. A rotina, a conversa anterior
sobre o que acontecerá é aliada de
evitação desses momentos. E no
caso de birras, comportamentos
desorganizados, você além de uma
atitude autocontrolada, também
precisa ficar atento para avaliar o
que desencadeou o descontrole da
criança. Ficar atento, pois tais
comportamentos podem se consti-
tuir numa chamada de atenção
para os pais mais distantes ou
mesmo um pedido de ajuda da
criança, e facilmente contornado se
soubermos evitar o gatilho que
dispara essas condutas.
É interessante ajudar a
criança a perceber como ela está e
como identificar as estratégias que
pode utilizar em diferentes
momentos. Uma ressalva quanto
ao uso de estratégias sensoriais:
nem todas as estratégias irão
funcionar para todas as crianças e
pação em seu cotidiano, utilizando- regulação do sistema nervoso e nem sempre uma estratégia que foi
se desse adulto como corregulador, apoiar o engajamento no dia a dia, eficaz anteriormente será efetiva
alguém como apoio. com suas necessidades baseadas em um momento posterior. Por
Para uma criança receber na Teoria de Integração Sensorial isso, você tem de estar atento ao
essa ajuda o adulto deverá estar de Ayres. O estado de alerta, que sua criança precisa e como ela
autorregulado, não será possível expresso pela a criança é o primeiro se comporta nos diferentes tipos
regular uma criança estando es- dos sinais que os profissionais de de ambiente. Nós respondemos de
tressado, ansioso ou nervoso. O saúde, atentos ao desenvolvimen- forma diferente de acordo ao local
adulto tem de, primeiramente, to infantil e seus comportamentos, onde estamos e nossas crianças
cuidar de si para só então tentar observam porque é onde tudo com TEA muito mais ainda. O
ajudar a sua criança. É como nas começa nas interações com o ambiente em que nos encon-
viagens de avião, as orientações ambiente de forma geral. tramos, pode, muitas vezes, serem
dadas pela aeromoça para no caso Uma estratégia inicial pode ditadores do nosso comporta-
de ocorrer algum problema é pri- ser a organização da rotina para que mento.
meiro você a fazer uso da máscara a criança consiga antecipar o seu Crianças com TEA têm com-
de respiração para depois ajudar a comportamento prevendo o que portamentos diferenciados e
sua criança. Quer dizer, se você não vem depois. A criança com Trans- necessidades também, e cabe a nós
consegue se controlar ou está alte- torno do Espectro Autista neces- profissionais e familiares/cuida-
rado com certeza, também não sita ter previsibilidade e antecipa- dores estarmos atentos as suas
conseguira ajudar a criança que ção em sua rotina para que consiga particularidades e necessidades
esteja necessitando de apoio. agir e responder adequadamente para realizarmos ofertas de apoio,
Existem fatores que in- às suas necessidades. Participar da ajuste do ambiente e atitude para
fluenciam e são influenciados pela realização das tarefas domésticas conseguirmos lidar com essas
autorregulação: o alerta, a atenção, também é uma estratégia interes- diferenças de forma eficaz. Caso
o afeto e a ação. O nível de alerta é sante, pelo uso de habilidades e você tenha alguma dúvida sobre a
uma excitabilidade neuronal, por- sistemas sensoriais envolvidos sua criança, sobre como ajudar a
tanto, fisiológica, própria do orga- além do fortalecimento do vínculo regulá-la, se a sua criança tem
nismo de cada criança. Quando ele com a família e da interação social. dificuldades de realizar atividades
está alterado são utilizadas estra- A criança com TEA precisa significativas do cotidiano procure
tégias sensoriais, pelos profis- que o seu cuidador se preocupe em um terapeuta ocupacional que
sionais da terapia ocupacional que estar bem antes de ajudá-la tenha conhecimentos específicos
atende a criança, para favorecer a quando, por vezes, ela esteja fora nesse assunto.

17
Bruxismo
Autismo

SINAIS DE AUTISMO
E INTERVENÇÃO
PRECOCE

O
nascimento de uma crian- bem. Quando ele não responde da
ça traz um contexto de forma esperada, ocorre o medo, a
mudanças, exigindo mui- dúvida e a busca pela compreensão
tas vezes uma adaptação do motivo.
na rotina vivida pela família. A A possibilidade de o bebê
vivência desse nascimento celebra esperado nascer com alguma
uma nova fase na vida dos pais, dificuldade é motivo de angústia
fazendo surgir sentimentos muitas para os pais/cuidadores, mas são
Ivana Carvalho vezes ainda não experimentados, esses geralmente os primeiros a
Psicóloga do CONECTA-IPREDE.
Pós-graduanda em curso de especialização gerando expectativas para a chega- perceberem quando algo não está
em Autismo pelo Centro Universitário da desse pequeno sujeito. A criança bem. Por vezes, essa suspeita os
Christus (UniChristus). é sonho acalentado pelo adulto, encoraja a buscar um profissional
desde criança, de se tornar mãe e para avaliar sua criança, porém
pai, mas algumas vezes, vem para algumas vezes se deparam com
realizar os sonhos frustrados dos orientações vagas. Estudos sobre a
pais, sonhos que eles deixaram pelo infância afirmam que o desenvol-
caminho. vimento nem sempre acontece
O sonho da Parentalidade igual, pois depende de diversos
(pai e mãe) é plantado na história fatores, como: hereditariedade,
infantil de cada um. Os pais, antes história familiar, ambiente domés-
do seu nascimento, falam, pensam, tico, dentre outros. Por esse moti-
e organizam o quarto, o berço ou a vo, é indicado que os pais conti-
rede no qual irão dormir. Conver- nuem observando, e procurando
sam sobre o nome, como será cui- especialistas para avaliar a condi-
dado, educado; ou seja, lhe é criado ção da criança.
um lugar na família. O bebê é Nas últimas décadas, devi-
reconhecido como um pequeno do aos avanços das pesquisas e
sujeito (pessoa) quando chamado estudos observacionais das crian-
pelo seu nome, reconhecido pelos ças no próprio ambiente familiar,
seus desejos e na conversa íntima pela facilidade tecnológica em
entre os pais e ele. Esta referência é filmar os filhos (as), parece haver
importante, pois lhe permite se um aumento ou uma melhor
saber no mundo. detecção dos transtornos ligados
Jessica Freire Sales Ponte A partir do nascimento os ao neurodesenvolvimento da crian-
Psicóloga. Mediadora no Instituto da ça. Entre os diversos transtornos do
Primeira Infância - IPREDE.
cuidados irão construir essa relação
Especialização em andamento: (criança/pais/mundo) que será neurodesenvolvimento temos o
Clínica Interdisciplinar em Estimulação mediada por diversos fatores. Por Autismo, caracterizado por difi-
Precoce pelo Centro Lydia Coriat. culdades já conhecidas. Sua origem
exemplo, quando o bebê está
aprendendo a falar e inicia a voca- pode acontecer nos primeiros anos
lização das primeiras palavrinhas, de vida ou nos primeiros meses de
os pais começam a pressupor que o vida? Porém, sua trajetória inicial
bebê está falando papai, mamãe, não segue uma regra, em algumas
água, antes do mesmo falar crianças, os sintomas são aparen-
literalmente. Essa antecipação é tes logo após os primeiros meses
importante e esse conhecimento se de vida, mas na maioria dos casos,
dará através da relação. Sendo no entanto, os sintomas só são
assim, quando os pais observam no identificados entre um e dois anos
bebê ou na criança alguma dife- de idade.
rença do esperado, algo não vai A lógica de um diagnóstico

18
Autismo

se podem utilizar tanto na inter-


venção quanto na estimulação
precoce. Assim como, os Indica-
dores de Risco para o Desenvolvi-
mento Infantil (IRDI), Protocolo
Preaut, Protea-R, Ados-II e Adir e
outros. Na prática nos detemos aos
sinais atípicos do desenvolvimento
da primeiríssima infância (0 a 3
anos), como segue.
No período de 0 a 18 meses
quando a criança apresenta poucas
respostas ao olhar da mãe/pai e
cuidadores; não expressa atitudes
afetivas mínimas; passivas e quie-
tas ou muito irritadas; pouca ex-
pressividade facial; não responde
quando chamam seu nome; não
estranham a ausência da mãe; não
compartilha interesses perceptivos
do ambiente e disfunções senso-
riais como sensibilidade a barulhos,
toque, tato, gustação. Estes são os
primeiros sinais de alerta para as
famílias. Já com 2 a 3 anos os sinais
podem variar: atraso na fala e o uso
do apontar com a mão de outra
pessoa; dificuldade em permanecer
precoce não se aplica quando se precoce possui um peso maior nas em momentos sociais, preferência
pensa numa ação preventiva, em atividades neuropsicomotoras e pelo isolamento e desorganização
bebês com fatores de risco para alcance de metas e a intervenção na presença de muitos objetos e
progredir em direção ao Autismo, e precoce na expressão do sujeito pessoas ou muitos sons.
sim em uma intervenção precoce criança e seus interesses e/ou Em relação ao brincar, se
baseada na clínica de sinais e sin- desejos. As duas divergem no interessa por parte do brinquedo
tomas. No caso é importante iniciar método de tratamento. Na inter- (às vezes, só as rodas do carrinho),
o tratamento o mais rápido possí- venção precoce, primeiro vem a gosta de enfileirar e/ou empilhar
vel, com o esclarecimento para os expressão do sujeito que precisa ser objetos; por vezes, desenvolve um
pais sobre o processo e de que o percebido como pequena pessoa interesse exagerado num único
filho (a) não possui um diagnóstico capaz, mesmo que, em um corpo brinquedo. Na creche, os profes-
fechado. O tratamento pode ocor- /bebê ainda imaturo e necessitan- sores observam: pouco interesse
rer por um terapeuta único com do dos cuidados dos pais. por historinhas, dificuldades de
apoio de outros profissionais ou por Os profissionais que tra- compreensão, na interação com ou-
equipe interdisciplinar formada na balham com Intervenção Precoce tras crianças, agitação ou isola-
maioria dos casos por: terapeutas valorizam a instalação da subjetivi- mento.
ocupacionais, fonoaudiólogos e dade (ser pessoa), onde se sustenta A precocidade do início da
psicólogos. A ideia de um terapeuta os vínculos afetivos e relações da intervenção em crianças com riscos
único para assistir a criança favo- criança, o desenvolvimento da cog- de Autismo desempenha papel im-
rece a construção do reconheci- nição, linguagem e psicomotor. Em portante, potencializando os efei-
mento de si mesmo, por parte do função disso, as crianças com risco tos positivos da mesma. É impor-
bebê, e seu envolvimento psicoa- na formação de sua subjetividade tante ressaltar que o atendimento
fetivo na sua família. necessitam dessa intervenção e as orientações feitas pelo profis--
O tratamento com bebês desde os primeiros meses ano de sional na intervenção precoce deve
e/ou crianças pequenas (menores vida, como prevenção para uma ser individualizado e atender de
de 3 anos) recebe por parte dos possível psicopatologia (diagnósti- forma particular a necessidade de
profissionais os nomes de estimu- co definido). cada criança, tendo sempre como
lação ou intervenção precoce. Al- O desafio se refere a detec- base os conhecimentos científicos
guns tratam os termos como sinô- ção das crianças que precisam respaldados, para o terapeuta úni-
nimos, mas outros colocam uma dessa intervenção, para tanto, co, no apoio do saber interdiscipli-
diferença entre eles. A estimulação existem alguns instrumentos, que nar de uma equipe de profissionais.

19
Brincar
Coronavírus

TÁ NA HORA DE
BRINCAR

O
brincar é um desafio para criança com o brincar promove a
pais e profissionais devido possibilidade de um desenvolvi-
a sua ampla variação de mento esperado, ou seja, harmo-
significados. Por vezes, se nioso e capaz de ser integrado a
Ivelise Santos Muniz Gurgel pensa que é tudo o que se faz em vida social e suas necessidades. E é
Terapeuta Ocupacional da Unidade de tempo livre; em outras circunstan- nessa harmonia que a infância
Assistência à Criança Autista – CONECTA- cias se pensa em lazer, recreação, acontece, cheia de faz de conta,
IPREDE. Especialista em Desenvolvimento atividade de diversão, jogo e fantasias e situações magicas
infantil pela Universidade Federal do
Ceará (UFC). brincadeira. Aqui consideraremos o multiplicando a capacidade de
brincar como uma atividade que se entender, se relacionar e criar
apresenta a partir de uma moti- atribuições típicas do dia a dia.
vação interna, da criança, onde ela Quando pensamos no
não se preocupa com a finalidade desenvolvimento atípico, diferente
de sua ação e sim como a processa, do esperado, buscamos compreen-
realiza, sente. Portanto, é movida der qual o lugar do brincar nestas
pelo seu prazer na ação de brincar. É situações. A partir do que foi dito
uma prática que conduz a um sobre a relevância do brincar no
mergulho em si, retirando-a da desenvolvimento infantil, crianças
realidade para alcançar o faz de com caraterísticas comportamen-
conta. E por isso é, também, uma tais diferentes podem ser brincan-
ação livre de regras que possibi- tes? Independente de quaisquer
litam um envolvimento ativo do dificuldades a criança brinca? Como
brincante consigo mesmo e com o não considerar o fato de que o
ambiente. brincar é tão fundamental como o
A maior e melhor caracterís- ar que se respira, logo, se a criança
tica do brincar estar em oferecer a diferente existe ela brinca. Ou seja,
infância um desdobramento de a oportunidade e o enriquecimento
conquistas do desenvolvimento das rotinas são indispensáveis para
infantil que abrange muitos dos o ser brincante. Independentemen-
Edda Araújo aspectos que nos definem. Agrega te de qualquer diagnóstico, situa-
Terapeuta Ocupacional. experiências enriquecedoras para a ção social, raça e credo a criança
Mestre em Psicologia pela Universidade
de Fortaleza (UNIFOR). Coordenadora inserção na cultura em que faz brinca.
do CONECTA-IPREDE e da Clínica habiliTO. parte, na conquista de autonomia e A criança com Transtorno do
na interação de fatores específicos Espectro Autista – TEA com suas
da sua rotina em casa, na escola e especificidades na relação com o
na participação social. Enfim, o outro, ambiente e sociedade; e na
brincar é para a criança, o que o ar é comunicação social também pode e
para a nossa sobrevivência. deve brincar. Precisamos compre-
A criança depende do brincar ender e adequar as ofertas do
para um desenvolvimento saudável brincar que possam permitir ex-
de habilidades e competências que ploração de objetos, conhecimento
viabilizam sua capacidade de ex- e desempenho funcional para
plorar e atender as suas expectati- apreender sobre a atividade de
vas de realização. No universo do brincar. Já é de conhecimento
brincante o envolvimento da acadêmico que a criança com TEA

20
Brincar

nós sermos únicos. As primeiras


relações serão facilitadoras ou não
da exploração da criança com o
outro e o ambiente. Ou seja, as
primeiras oportunidades permiti-
rão, ou não, o desenvolvimento
saudável de suas competências.
Quero mostrar que a família deve e
pode agir, influenciar e transformar
o brincar de seus filhos. Sentar no
chão, explorar, experimentar, ima-
ginar e criar meios poderá modificar
a realidade do desenvolvimento
infantil de uma criança.
Brincar é coisa séria, é uma
medicação sem contraindicações
que auxiliam, ajustam e transfor-
mam o desempenho da criança
independente da sua condição de
nascimento. Algumas crianças res-
pondem de forma mais fácil e ou-
tras requerem meios, estratégias e
ajustes de construção de um ser
brincante.
Você pode fazer seu am-
biente familiar ser atrativo para o
brincante:
O espaço para brincar, pode ser
em qualquer ambiente; junte
coisas coloridas, não cortantes ou
muito pequenas que tragam
aproveita melhor esta oferta se considerado outra característica, no risco, para juntos imaginarem o
tiver um apoio de um companheiro entanto, sua motivação em brincar que fazer. Dar oportunidade a
brincante (pai, mãe, irmãos e/ou deve ser mais importante. criança de fazer dessas coisas,
cuidador) mediando as brincadei- A hierarquia do brincar exis- novas coisas, no uso de sua
ras, ou seja, alguém que consiga te para que compreendamos como imaginação;
ajudar nesse processo que interme- acontece o desenrolar da conquista Faça junto com a criança: tintas,
deia o nível de comprometimento de desenvolvimento do brincante. massinha, gelatina colorida, ou
do TEA com a capacidade de Mas, é uma referência de compre- outros meios possíveis, para
brincar. ensão do que acontece e não um explorar, colorir e expressar as
A dificuldade da criança com enquadramento da criança que percepções do meio e das coisas
TEA em brincar está relacionado ao brinca. Quero dizer que a criança no ambiente familiar e social (as
nível de comprometimento dentro para brincar só precisa querer, ter receitas podem ser acessadas na
do espectro, junto a isso, a media- motivação e oportunidade para internet);
ção na medida certa. Portanto, as criar meios, limitados ou não, que Use do dia a dia o brincar de faz de
particularidades do TEA não o se ajuste ou não, mas que aconte- conta. Estimule a criança a fazer
impossibilitam de ser um brincan- çam em sua rotina diária, portanto de conta que é a mãe da boneca, é
te. Talvez, o termo que aponta a cabe a nós profissionais, familiares a professora, outro membro sig-
imaginação do faz de conta típico e/ou cuidadores ajustarmos meios nificante da família (tio, avô).
do brincar não alcance uma repre- e fins para que todas as crianças Eleja temas como passeios, fil-
sentação da imaginação esperada- brinquem. mes, revistas que possam ser do
como se encontra na criança com O ambiente familiar é o interesse perceptivo da sua
desenvolvimento típico. Todavia, espaço mais rico e contínuo na vida criança.
nenhuma imaginação percebida é de qualquer criança. O cuidar, ali-
igual a outra, ou seja, a criança com mentar, banhar, higienizar e por fim TUDO EM CASA, DA ROTINA
TEA não pode ter uma representa- o brincar preenche a vida de DA CRIANÇA, PODE SER UM TEMA
ção da imaginação diferenciada ou qualquer criança de 0 a 3 anos. E são PARA USAR A IMAGINAÇÃO E
mesmo limitada quando compara- essas relações, contatos e expe- BRINCAR. BRINQUEDOS SÃO ÓTI-
da a outros? O limite pode ser riências que fazem de cada um de MOS, MAS NÃO INSUBSTITUÍVEIS!

21
Fonoaudiologia

ALIMENTAÇÃO
E AUTISMO
numa experiência sensorial e deixem de ser algo prazeroso e de
motora, pois envolve todos os lazer interferindo diretamente nas
sentidos de forma coordenada questões afetivas/emocionais e
(visão, tato, olfato, paladar e au- sociais da criança e seus familiares.
dição, além da musculatura do
rosto) e de conhecimento, pois o
Najla dos Santos de Sousa bebê começa a ter noção de si. O mais importante no
Fonoaudióloga do CONECTA-IPREDE. Depois da mama, vem a papinha, as processo de terapia é a
frutas, os alimentos sólidos e
calma, a paciência, a

A
começar pelas tribos quando chega os quinze meses a
antigas até as megacida- criança come os alimentos de sua criatividade, a persistência,
des de hoje, a alimenta- família e comunidade. Algumas e a parceria entre família e
ção se constitui uma vezes ocorrem dificuldades nestas terapeutas a partir de um
parte importante do convívio social. transições alimentares por ques-
Sempre, homens, mulheres e crian- tões sociais, psicológicas e orgâni- trabalho interdisciplinar
ças se encontram nas refeições, cas. Algumas crianças com autismo como o proposto pela
para comer e conversar; sobretudo demonstram dificuldade nas tran- Unidade Conecta.
quando do domínio da aprendiza- sições alimentares e seletividade
gem de cozinhar os alimentos. O em relação a determinados tipos de
papel da alimentação para a forma- comida. Um dos motivos das difi-
ção da sociabilidade se mostra por Alimentação e autismo é culdades de alimentação da criança
ser uma fonte de prazer, de come- um tema muito delicado pois é uma autista está relacionado a trans-
moração, de confraternização, qua- das principais queixas apresenta- tornos de modulação sensorial e ou
se todas as festas e cele-brações das por pais e cuidadores em con- de discriminação sensorial, difi-
existem alimentos, algu-mas vezes sultórios médicos e clinicas espe- culdade da criança em regular o
especiais em determina-das datas. cializadas, sendo causa frequente grau, intensidade e natureza das
Esta agregação ao redor da comida de conflitos nas relações entre pai, respostas aos estímulos sensórias,
remete à dupla função do alimento: mãe, filhos e/ou cuidadores. O mo- aqueles que chegam ao corpo;
combustível para fazer funcionar o mento da refeição está carregado assim como, a dificuldade de
corpo e laços afetivos (vínculos) de significados e características discriminação do que chega pela:
entre as pes-soas, uma excelente pessoais nos quais incluem sele- visão, audição, paladar, tato, olfa-
fonte de energia para o corpo e a tividade alimentar, recusa alimen- to, vestibular e propriocepção. Os
alma. A alimentação pode ser tar, repertorio restrito de alimen- sistemas da audição, visão, olfato,
considerada uma fonte de força tos, ingesta de apenas um tipo de paladar e tato estão integrados
motora para a evolução humana, alimento ou compulsão alimentar. para favorecer a alimentação, no
tanto no passado como nos pró- Constitui um desafio para os pais/ entanto, quando esse proces-sa-
ximos séculos, pois o comer é um cuidadores, permeado de angustia, mento sensorial tem algum proble-
ato social e de lazer que vai além do pois, o comportamento da criança ma pode provocar um transtorno.
alimentar-se e do nutrir-se. fere a imagem de prazer dos ali- A criança com transtorno
O processo de alimentação mentos, leva ao medo da desnutri- alimentar não deixa de comer por
inicia-se com amamentação e ção ou deficiência dos micronu- birra, implicância ou falta de edu-
evolui de acordo com o desenvolvi- trientes (ferro, zinco, vitaminas e cação; ela o faz devido a uma prová-
mento da criança. Quando nasce o outros), assim como a obesidade vel desregulação sensorial. Desta
bebê sabe sugar, mas o amadureci- em determinados casos. Tudo isso forma não adianta deixar a criança
mento das estruturas orofaciais torna o ambiente familiar propicio sem comer no intuito dela sentir fo-
(musculatura do rosto) e gástricas ao estresse, conflitos e brigas fa- me, nem tão pouco forçar a alimen-
(digestão do alimento) constitui zendo assim com que as refeições tação, de outra forma, também não

24
Fonoaudiologia

deixar ela comer tudo que vê pela em um maior esforço para a masti- questões multifatoriais apresen-
frente. Os pais/cui-dadores preci- gação, problemas gastrointesti- tando fatores orgânicos, emocio-
sam de informações dos profissio- nais, alergias, entre outras. A crian- nais e sociais promovendo um dos
nais que atendem ao filho (a) e com ça, por várias vezes, não saber lidar grandes problemas na assistência
o tempo mudar seus hábitos e ou com o alimento em sua boca, preci- terapêutica da criança Autista. A
mediar o processamento sensorial sando da cooperação e compreen- alimentação mexe com a cabeça
no momento de alimentar a são dos pais/cuidadores, familiares dos pais quando seus filhos não se
criança. A melhor maneira é unir as e profissionais para executar a alimentam adequadamente e pode
orientações dos terapeutas com a mastigação, deglutição ou outra gerar um mal-estar significativo na
percepção deles sobre como a ação. Quando isto não ocorre au- regulação emocional dos filhos
criança gosta de participar da menta a possibilidade de padrões provocados por esse desequilíbrio
refeição junto com as informações de comportamento restritos, repe- familiar. O mais importante no
familiares sobre sua rotina titivos ou estereotipados por parte processo de terapia é a calma, a
alimentar. da criança e pode levar a uma paciência, a criatividade, a persis-
Outros fatores que contri- atitude de inflexibilidade ou insis- tência, e a parceria entre família e
buem para os distúrbios/trans- tência dos pais/cuidadores. Comp- terapeutas a partir de um trabalho
tornos alimentares estão rela- ortamentos que se reforçam, num interdisciplinar como o proposto
cionados a busca por prazer no ciclo sem aparente saída, daí a pela Unidade Conecta. Somos uma
momento de comer, atraso nas função da parceria com o profissio- equipe de profissionais que utili-
habilidades orais, flacidez da mus- nal. Manter essa mesmice impede zam da interação de seus saberes
culatura dos órgãos fonoarti- que a criança tenha uma melhor para viabilizar uma educação e ou
culatórios (músculos responsáveis aceitação dos alimentos. reeducação alimentar saudável e
pela articulação da boca, deglutição Pode-se observar que a ali- funcional no cotidiano das crianças
dos alimentos e fala) o que resulta mentação e o autismo nos trazem Autistas.

25
Fonoaudiologia

COMPREENDENDO
A COMUNICAÇÃO
NO TEA
gam as primeiras palavras e depois para expressar a vontade ou a escri-
as junções das palavras em frases e ta para anotar o nome do seu hotel,
conversas. Esse caminho da comu- desenhos que possam representar
nicação se dá com as experiências uma placa.... Resumindo, a comu-
Raquel Souza vividas pela criança com o meio e vai nicação humana é uma habilidade
Fonoaudióloga. Especialista em sendo refinada e fundamentada na fina e cheia de pequenos detalhes,
Fonoaudiologia Hospitalar e Capacitação linguagem e na fala. mas cheia de possibilidades.
em: PEC'S, Apraxia de Fala na Infância, A linguagem abrange um Esse exemplo é o que cha-
Comunicação Suplementar e Alternativa
pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). conjunto de habilidades, tais como mamos de comunicação funcional,
a elaboração do pensamento, as isto é, quando alguém consegue se
ideias, compreensão da mensagem fazer entender para o outro, inde-
e está diretamente relacionada pendentemente do tipo de comuni-
com a intenção comunicativa, ou cação usada, se é gesto, fala ou
seja, é a parte criativa que acontece escrita.
antes do verbalizar. Essa lingua- Nem sempre a comunicação

Q
uando nascemos descobri- gem se materializa em fala que é o acontece harmonicamente, pois há
mos aos poucos a comuni- ato concreto do movimento que diversas habilidades que mesmo
cação. Os bebês a iniciam fazemos para falar, quero dizer, é o em crianças típicas podem ocorrer
com o mundo externo comando que o cérebro envia para fora do caminho previsto. Em crian-
através do choro e do olhar. Já nessa os músculos se movimentarem e ças com transtorno do espectro
fase conseguem estabelecer uma produzirem os sons de forma se- autismo (TEA), essa “escada” do
relação de comunicação com recep- quenciada, organizada e sincroni- desenvolvimento da comunicação
ção e expressão como resultado de zada. A linguagem e a fala são acontece de forma diferente. Elas
um processo desenvolvido a partir dependentes e interligadas, funcio- têm em sua característica dificul-
da identificação inicial entre mãe e nam em conjunto. dades para se comunicar e com-
filho, que neste momento passa a A comunicação é o diálogo preender as diversas maneiras que
reconhecer se o choro é de fome, ou a soma que resulta da lingua- a usamos no meio social. Essa
sono ou cólica. Nesse processo as gem e da fala. Vamos entender dificuldade se transforma em
conquistas vão se apresentando como acontece a dinâmica da “atrasos” significativos no desen-
com o sorriso social, o reconheci- comunicação: volvimento da fala e linguagem.
mento da voz da mãe, sua localiza- É indispensável a presença As características comuns
ção auditiva interagindo cada vez de uma pessoa emissora/falante e que as crianças com TEA podem
mais com o meio e com os pais/ outra pessoa receptora/ouvinte apresentar são:
cuidadores. que irão transmitir uma mensa- Falta de interesse comuni-
Em torno dos seis meses gem. Exemplificando, imaginem ir cativo. Preferem ir diretamente
surgem os primeiros balbucios, à um país onde o idioma local é pegar o objeto desejado do que
(mãmã, pápá). Então, começa a desconhecido, e você sem recursos pedir para uma pessoa, muitas
experimentar os sons, os gritos, a tecnológicos (smartfone, computa- vezes “ignorando” a presença do
reação dos pais, a emissão das dor, etc.) para auxiliar. Imaginou outro. Ou simplesmente a utilizan-
primeiras sílabas, e nesse momen- que complicado seria? Mediante do como ferramenta de alcance
to podemos considerar que o bebê essa simulação, é possível haver para o objeto.
está falando. As conquistas moto- comunicação? Dificuldade na compreensão
ras que estão acontecendo promo- A resposta é: sim! Podemos do que uma pessoa diz quando
vendo controle postural e marcha usar outros recursos comunicati- solicitado para fazer uma ação,
facilitam o domínio da fala e che- vos, como por exemplo; os gestos essa criança não consegue compre-

26
Fonoaudiologia

para ela acontecer. E como vimos a


comunicação não é algo simples é
necessário a junção de várias habili-
dades para acontecer. Essa junção
de elementos nos proporcionam a
forma que temos para nos expres-
sar no mundo, seja ela por meio dos
gestos, expressões faciais, escrita
ou fala.
Considere a dinâmica da co-
municação e a comunicação funcio-
nal anteriormente citadas, a partir
dela é possível refletir o quanto o
comunicar vai além do falar. Reti-
rando as vendas podemos redire-
cionar nosso olhar para enxergar-
mos as possibilidades e ir além das
limitações. Muitas vezes temos a
urgência na fala propriamente dita,
porém, o mais importante é dar a
oportunidade ao outro,no caso aqui
a criança, de se expressar principal-
mente quando essa fala ainda não
é possível. Devemos considerar que
cada pessoa é um mundo singular
com suas capacidades e potenciais,
que deverão ter oportunidades,
vivencias enriquecedoras e facilita-
doras para melhor adquirir suas
competências.
O objetivo da abordagem
fonoaudiológica junto a criança
com TEA é propor possibilidades
comunicativas, explorando e esti-
ender o pedido. Prejuízo na lingua- sação de fala “robotizada”. mulando o desenvolvimento des-
gem expressiva, ou seja, aquilo que Mau uso da linguagem em sas habilidades; oferecer recursos,
usamos de forma não verbal (ges- situações sociais. Observamos nos estratégias, maneiras que possibi-
tos), verbal (fala) e escrita, e podem jovens e adultos com TEA, dificul- litem a comunicação acontecer.
usar o choro, ou outras atitudes dade por exemplo em compreender Quando digo comunicação, não me
menos sociais como forma de uma metáfora (sentido figurado refiro apenas a fala, mas sim
demonstrar seus desejos. para as palavras), são geralmente oferecer maneiras para o sujeito se
Quando nossas crianças diretos “sem filtro”. E também expressar, criando a possibilidade
apresentam fala, a mesma poderá apresentam dificuldade em come- de uma comunicação funcional. Há
conter ecolalias que são repetições çar e ou manter um diálogo. diversas formas de comunicações
de fala anteriormente ouvidas. O desenvolvimento da co- possíveis, o importante é estabe-
Alterações na melodia da fala (pro- municação no autismo é um grande lecer uma forma de ligação com o
sódia), ficando monótona e sem desafio, já que há prejuízos em outro, uma ponte, trilhar caminhos,
variação/entonação, dando a sen- diversas habilidades necessárias nos conectar!

27
Luto

DO LUTO À LUTA
NO AUTISMO

N
ascemos envoltos num familiar, no período da gravidez,
ambiente formado por naquele momento de espera, tenha
pessoas e coisas, onde idealizado uma criança com TEA e
precisamos habitar, no este é o conflito interno, vivenciado
qual, nos adaptamos a cada mo- por eles, quando da notícia do
mento. O desafio presente em diagnóstico. Uma criança com
todas as pessoas que fazem parte diagnóstico de Transtorno do
deste ambiente é viver o influenciar Espectro Autista (TEA) experimen-
Otaciana Araújo de Aguiar e ser influenciado por ele; construir tará, com maior singularidade, seu
Psicóloga do CONECTA-IPREDE e relações com os outros e os objetos processo de desenvolvimento
mediadora do Instituto da para enriquecer quem somos, e humano, junto com sua família.
Primeira Infância - IPREDE. este processo chamamos de desen- Muitas questões surgem, a
volvimento humano. Em cada pes- partir deste momento, como no
soa este desenvolvimento é único, cuidar, educar e o que esperar do
como as digitais de nossos dedos. suporte dos profissionais. Eles
O início desse processo de precisam de profissionais de saúde,
desenvolvimento começa desde a educação e assistência social,
gestação e segue na infância, onde sensíveis, pois é na família que
as primeiras trocas afetivas ocor- diariamente ocorre a expressão dos
rem entre o corpo do feto e o corpo comportamentos socialmente
da gestante. Daí a importância inapropriados, das estereotipias
daquela conversa, o toque na (movimentos repetitivos), das
barriga, as falas amorosas do pai e agressões e dos prejuízos significa-
dos familiares, a preparação para a tivos na comunicação e interação
chegada da criança. Quando a mu- da criança.
lher está envolta neste momento De acordo com a Organiza-
da gestação é tomada pela imagem ção Mundial da Saúde (OMS), a
idealizada da criança que irá nascer, qualidade de vida da pessoa está
uma preparação para o futuro relacionada à percepção que tem de
diálogo amoroso entre o bebê e sua seu lugar na vida, de suas relações
mãe. Após o parto, com a criança sociais, de seu sistema de valores e
em seu colo, a imagem se trans- o quandoou quanto? Este conjunto
forma pelas primeiras comunica- de coisas faz sentido na sociedade e
Vanessa Alves do Nascimento ções daquele pequeno ser. São cultura em que ela está inserida.
Assistente Social do CONECTA-IPREDE. profundas mudanças que ocorrem Quando o nosso foco se desloca
Pós-graduanda em Saúde Pública,
Política, Planejamento e Gestão pela Estácio. com a entrada da criança na família, para a pessoa e/ou a criança com
mesmo quando não é o primeiro TEA, o descompasso entre as
filho. formulações individuais, familiares
Algumas vezes os pais/ e coletivas ficam evidentes; este é o
mães/cuidadores começam a per- eixo da luta deles, das famílias,
ceber uma diferença no comporta- amigos e profissionais pelos os
mento da criança em relação às direitos da pessoa com TEA.
outras, ou aos irmãos, quando na Em nossa experiência de
mesma faixa de idade; parecem atendimento na Unidade de Assis-
diferentes, não respondem da mes- tência à Criança com TEA – Conecta
ma forma ou quando respondem do Instituto da Primeira Infância
não conseguem compreender a (IPREDE) tanto na psicologia como
resposta da criança. Podemos no serviço social; no exercício de
pensar que nenhum pai, mãe ou uma escuta sensível, temos muitas

28
Luto

zou muitos pais pela luta dos


direitos da criança com TEA, o fruto
de toda esta mobilização, foi à
conquista de legislações pertinen-
tes à realidade das pessoas com
TEA. Entre as diversas leis hoje
existentes, temos a Lei 12.764/
2012, conhecida como Lei Berenice
Piana que instituiu a Política
Nacional de Proteção aos Direitos
da Pessoa com TEA. Em um de seus
artigos disserta sobre a garantia de
vagas para criança com TEA em
qualquer escola, sob pena de multa
para os estabelecimentos que não
cumpram o disposto na lei. Entre-
tanto ainda existem muitas lacu-
nas na implementação da educação
inclusiva, na adequação dos méto-
dos de ensino e na formação dos
profissionais das escolas públicas
ou privadas no trato com as
crianças com TEA.
Desta maneira percebemos
nas falas dos pais/mães/ cuida-
dores o mesmo percurso, obser-
vado também por Kübler-Ross,
anteriormente citado, podemos até
dizer de uma aceitação ativa por
narrativas sobre o luto. Podemos incertezas, dúvidas de como será? parte deles e das próprias pessoas
tecer algumas reflexões sobre esse Que luta é essa? Pois irão encarar com TEA. O caminho do luto à luta
processo pelo qual as famílias uma série de situações, como aparece nas associações de pais,
passam ou ainda estão passando, e olhares impiedosos de recrimina- nas defesas dos direitos, na
o quanto faz eco na teoria de ção, onde muitos irão supor que o aprovação de leis e benefícios e em
Kübler-Ross sobre os cinco está- mau comportamento da sua crian- especial na literatura autobio-
gios vivenciados pelas pessoas en- ça é fruto de falta de pulso dos pais, gráfica de algumas pessoas com
lutadas: negação, raiva, barganha, por serem crianças mal-educadas. TEA. Este caminho e a ação de
depressão e aceitação. A cobrança social é impiedosa e caminhar sucedem em diversos
O momento do diagnóstico requer uma sustentação emocional momentos da vida familiar, profis-
para os pais se estende para além que, por vezes, não existe ou nesse sional e pública das pessoas
do consultório médico, a dificulda- momento de angustia não se envolvidas com o TEA. Tornar a
de em aceitar e lidar com a desco- suporta. sociedade um melhor lugar para
berta da criança com TEA pode dei- Uns dos maiores desafios crianças, adolescentes e adultos
xar marcas neles e nos familiares. dessas famílias é a inclusão educa- com TEA é tornar a sociedade
Verificamos em muitas famílias cional, tanto nas creches, como nas melhor para todas as pessoas.
acompanhadas no Conecta a escolas, o que os pais mais escutam E para tanto, faz-se neces-
superação dessa culpa após diálo- são falas tipo: “desculpe, lamento, sário que as famílias tenham
go, seguimento e confissão da infelizmente não tem vaga”, conhecimento de seus direitos para
mesma, possibilitando os pais se “aguarde, o nome da criança está que juntas possam caminhar rumo
reajustarem, abrandando a nega- na fila de espera”. Quando eles a uma sociedade mais justa e
ção e raiva em relação ao contexto informam o diagnóstico da criança, participativa na construção de uma
vivido. logo aparece a exigência de um representação social forte e acolhe-
Sabe-se que se trata de profissional especializado para dora de suas diferenças. A informa-
famílias que experimentam dores e realizar o acompanhamento escolar ção, o conhecimento deve direcio-
decepções em diversas fases da da criança ou as considerações nar as ações da busca pelo direito a
vida, desde o momento da notícia sobre o estabelecimento não está uma vida de relações e produções
do diagnóstico e durante o processo adequado para a tarefa. sociais independente de qual
de desenvolvimento de seus filhos. Esta situação e outras com o situação ou diagnóstico se venha a
Durante esse processo surgem as mesmo grau de dificuldade mobili- constatar.

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Educação

O AUTISMO NA
ESCOLA
tanto, precisamos primeiramente entre escola e família, tendo um
refletir sobre a importância destas olhar sensível, atento e compre-
crianças serem inseridas no ensino ensivo para desenvolver suas
regular e no atendimento educacio- habilidades de acordo com o que a
nal especializado (AEE) na rede criança é capaz de fazer e aprender,
pública de ensino. partindo sempre do contexto ao
Existe a necessidade de uma qual está inserida, com o seu
adaptação dessa prática pedagó- desenvolvimento e potencial, de
Samya Lima gica para interferir na aprendiza- acordo com sua idade e o seu
Pedagoga pela Universidade do Vale do gem dessas crianças, como definir interesse.
Acaraú (UVA). Psicóloga pela Universidade objetivos educacionais e avaliação A família é responsável por
de Fortaleza (UNIFOR) e
Neuropsicopedagoga pela UniAteneu. para verificar características espe- grande parte deste aprendizado
cíficas de cada dificuldade e forma também, bem como de estimular a
individual de aprender, pois suas socialização de seus filhos pro-
particularidades variam e conse- pondo momentos de interação com
quentemente o processo de apren- outras crianças em espaços abertos

A
atual dinâmica educacio- dizagem. Neste contexto buscar e terapêuticos, sendo importante
nal e o aumento dos ín- meios, estratégias, teorias e méto- planejar, conversar com antece-
dices dos transtornos de dos facilitadores para ajudá-los a dência para que não haja impre-
desenvolvimento impul- ter independência e qualidade de vistos. A antecipação do que irá
sionaram novas práticas educacio- vida é o que transforma a escola em acontecer faz a diferença entre
nais e novas intervenções terapêu- local de conquistas. uma experiência bem-sucedida de
ticas. Para o desenvolvimento Dentro da escola a interven- outra não.
escolar das crianças com trans- ção pedagógica parte do estudo de A criança com Transtorno do
tornos do desenvolvimento ou uma análise e relatórios de uma Espectro Autista - TEA apresenta
transtornos de aprendizagem, são equipe multidisciplinar sobre os como uma das suas características
necessárias relações entre as diagnósticos, o quanto antes defi- a resistência a mudanças, no
práticas educacionais e a com- nido, para uma melhor efetivação entanto, podemos usar a rotina a
preensão das dificuldades neuro- possível de realizar intervenções favor dela ao mudar o trajeto de
lógicas, psicológicas e sociais pedagógicas apropriadas que irão lugares que costumam frequentar
destas crianças, assim como tam- desenvolver os vários aspectos que com assiduidade, afinal rotina deve
bém pontuar elementos e estraté- fazem a aprendizagem pedagógica ser ensinada desde cedo, pois
gias que possam ajudar a família, a acontecer: o cognitivo, afetivo-so- ajudam as crianças a se organi-
escola e a criança a enfrentar os cial e psicomotor. Junto a tudo isso, zarem, seguir regras, e combinados
desafios. Dessa forma, a Pedagogia estão às diretrizes regulamentares no contexto escolar promovem
ao atuar junto com uma equipe que direcionam a escola para todos. participação social significativa
multidisciplinar e em parceria com a A escola inclusiva favorece para integrar alunos no dia a dia da
família, utilizam métodos avaliati- o bem-estar e desenvolve a adap- escola.
vos que possibilitam um melhor tação correta de métodos e neces- É necessário haver essa
desenvolvimento das intervenções sitam de profissionais qualificados parceria: escola e família para que a
nos aspectos social, cognitivo e com formação continuada, plane- criança se sinta segura neste
psicomotor. jamento de um sistema de educa- ambiente e utilize sua forma de se
As crianças autistas apre- ção flexível, intervenção adequada comunicar em atividades signifi-
sentam dificuldades peculiares no e participação ativa da família e cativas, respeitando o ritmo de
processo de aprendizagem, já que comunidade escolar para responder aprendizado de cada um, exploran-
há um déficit na comunicação, na as necessidades e diversidades de do suas potencialidades e elogian-
interação social em diversos con- cada criança. do sempre suas conquistas. Além
textos e a presença de comporta- Além disso, é imprescindível do mais os hábitos de casa podem
mentos repetitivos e restritos. Por- a manutenção do vínculo afetivo ajudar no processo de aprendi-

32
Educação

respeitando suas escolhas, sua


forma de se expressar sem agredir
sua vida escolar, preservando
assim sua integridade.
Os instrumentos utilizados
na nossa prática pedagógica para
buscar entender as dificuldades
das crianças em seguimento acon-
tecem a partir de Jogos que tem o
objetivo de verificar relações cogni-
tivas e conteúdos afetivo-emocio-
nais, assim como habilidades para a
aprendizagem. E esses jogos tam-
bém são facilitadores do desen-
volvimento de capacidades neces-
sárias a rotina da escola como a
leitura, aspecto relacionado à fun-
ção simbólica. Já o grafismo através
dos Desenhos e escrita, verifica
aspectos emocionais, motores e
cognitivos através da produção,
bem como os interesses da criança
pelo ambiente escolar, família e
grupo social.
Utilizamo-nos também de
referenciais teóricos para investi-
gar, seguir e favorecer a estrutura-
ção dos aspectos do desenvolvi-
mento do conhecimento humano
desde o mais simples na classifica-
ção de objetos até os mais com-
plexos como a compreensão do
pensamento abstrato. Logo, temos
zagem devido a repetição e asso- com objetivos diretos e precisos; uma prática efetiva que ofereça a
ciação do prazer doméstico com a brincadeiras que proporcionem o criança Autista oportunidade de
junção de símbolos e marcas brincar junto, começando com a estar em escola regular.Para tanto,
identificadoras de letras, números, participação dos membros da famí- adaptamos e criamos meios de
cores e ordem classificando o que é lia e cuidadores afetivamente iden- adequar currículo escolar a serem
do seu interesse perceptivo para tificados para facilita o brincar em possíveis de apreender em quais-
ajudar a apreender. grupo inclusivo e a socialização. quer que sejam as dificuldades
Sugerimos algumas práti- Criar rotinas e ordem na execução encontradas na escola. A Escola é e
cas que podem ser utilizadas com das atividades trazendo segurança deve ser pensada pelas famílias
crianças autistas, são elas: utilizar e organização na vida cotidiana, como parceiras de um longo pro-
uma linguagem simples e clara ao incentivar e envolvê-los em ativida- cesso de aprendizagem. ESCOLA É
interagir com elas em atividades des extracurriculares e artísticas, PARA TODOS.

33
Música

MUSICOTERAPIA E TEA

Q
uem nunca se deparou corpo da pessoa, no século XX,
cantarolando uma canção? ocorreu uma sistematização cienti-
Ela chega sem avisar e a fica dessa experiência. Essa verten-
gente para, escuta e pode te da utilização da música em
até começar a cantar. E quando o contexto clínico denomina-se mu-
ouvido percebe o som de um sicoterapia. Esta modalidade
tambor, logo os pés em sintonia, terapêutica utiliza a prática musical
acompanham com pequenas bati- e seus elementos, bem como
das no chão, outras vezes se usa as altura, intensidade, timbre e dura-
mãos, no estalar das palmas. E ção para estruturar melodia,
quantas pessoas escutam ou can- harmonia e ritmo e desenvolver as
tam músicas na faxina de casa ou experiências musicais, com finali-
Paula Franco de Almeida no momento do banho? Seja qual dades terapêuticas.
Pedagoga e musicista. Especialista em for a situação do cotidiano, a mú-
Musicoterapia e Pós-graduanda em Arte- sica está presente e faz parte da HISTÓRIA DA MUSICOTERAPIA
Educação pela Faculdade Padre Dourado e vida de todos os seres humanos, de
em Autismo pelo Centro Universitário
Christus (Unichristrus). Musicoterapeuta do tal modo que ela pode ser viven- A musicoterapia tem sua
CONECTA/IPREDE. ciada, experimentada e apreciada origem entre as duas grandes
por qualquer pessoa. guerras. Já na primeira guerra
A história não possui uma mundial foram contratados músi-
data precisa de surgimento da cos para distrair os egressos da
música, ela está envolta com as guerra que sofriam com problemas
primeiras manifestações culturais de saúde física e emocional. A
da humanidade. Ao longo do experiência musical teve bom re-
tempo, ela se expressa em diversas sultado provocando melhora nos
formas e maneiras, em todas as quadros clínicos dos doentes. No
culturas e em graus diversificados entanto, foi percebido pela equipe
de importância. Seja de maneira de saúde que o profissional preci-
social, cultural, espiritual, lazer sava além da formação musical
e/ou curativa, em todas essas também ser um terapeuta. Assim
expressões sucede a participação começaram os primeiros estudos
da música, há tantos séculos que se científicos e a constituição do saber
tornou íntima do homem. próprio da musicoterapia.
A música provoca o movi- No Brasil, os pioneiros a
mento necessário que influencia a trabalharem a música de forma
vida das pessoas diariamente. terapêutica foram educadores
Desde o período gestacional, pela musicais de crianças com deficiên-
Paulo Bruno Braga diferenciação em vários sistemas cia que, ao utilizarem a música nas
Terapeuta Ocupacional e musicista. sensoriais, primeiramente nos atividades, perceberam o quanto
Musicoterapeuta do CONECTA/IPREDE e
da Clínica habiliTO.
sentidos auditivo e tátil que se pode favorecia e enriquecia a participa-
escutar o ritmo da batida do cora- ção das crianças, provocando trans-
ção. Ele reverbera em todo o corpo formações significativas em seu
do feto e grava uma lembrança tão universo relacional. O relato dessas
forte, motivo pelo qual, as pessoas experiências propiciou no início da
não conseguem ficar paradas quan- década de 70 a criação do curso de
do assistem um grupo de percussão especialização em Musicoterapia
marcando a sua existência também no Paraná na antiga Faculdade de
na pele. Educação Musical do Paraná
Ciente do quanto à música é (FEMP). Em 2001, foi apresentado o
importante na expressão cultural projeto de lei original Nº 4827/
humana, em especial sua presença 2001, dispondo sobre a regulamen-
em rituais religiosos e de cura, pelo tação do exercício da profissão de
fato dela alterar a consciência e o musicoterapeuta. Também consta

34
Música

na Classificação Brasileira de Ocu- modificações momento a momen- com autismo já têm boa estrutu-
pações – CBO sob o número 2263- to; e a audição, é a capacidade de ração, e contribuem bastante para
05, e faz parte de procedimentos do captar e perceber os estímulos facilitar a comunicação com pes-
Sistema Único de Saúde (SUS) sonoros. soas com TEA, pois aumentam sua
dentro das Práticas Integrativas As improvisações musicais capacidade de se expressar, dimi-
Complementares; está inserida na são utilizadas como facilitadoras de nuem comportamentos como: iso-
política do Sistema Único de Assis- comunicação, nas quais se estimula lamento, hiperatividade, autoa-
tência Social (SUAS), além de estar também a expressão de emoções e gressividade, tensões emocionais,
presente em espaços privados e sentimentos. Vale dizer que algu- dentre outros.
diversas instituições pelo Brasil. mas abordagens da musicoterapia A musicoterapia consegue
(criativa, plurimodal, musico cen- estimular e melhorar os aspectos
MUSICOTERAPIA E SUAS trada) utilizam estas como nortea- que estão prejudicados nas pes-
PRÁTICAS dora para aplicação de sua prática. soas com TEA, em especial a rela-
Assim, a improvisação musical é ções interpessoais. Além disso, a
Assim, a musicoterapia sur- vista como um caminho facilitador musicoterapia promove: diminui-
ge na relação entre a prática de trocas e experiências musicais, ção das crises comportamentais,
musical e as ciências da saúde com na qual o musicoterapeuta e o estimula a criatividade, trabalha o
intenção de promover o bem-estar, paciente ou cliente constroem e foco e a atenção, aumenta as
seja no desenvolvimento, na habili- criam possibilidades musicais e habilidades sociais, aquisição de
tação ou na reabilitação física, criativas juntos. Para crianças, em liberdade expressiva, melhora a
mental e social do indivíduo. A especifico, crianças com Transtorno comunicação, incentiva a produção
musicoterapia propõe ao cliente ou do Espectro Autista (TEA) o recurso da fala e proporciona as crianças a
paciente um envolvimento num apresenta resultados compro- vivência de experiências musicais
processo musical criativo (fazer vados. que são muito prazerosas. A musi-
música), que seja significativo, do coterapia pode, também, agir sobre
qual o impulsiona a participar, sem MUSICOTERAPIA E os elementos que fazem a flexibili-
que seja necessário conhecimento CRIANÇAS COM TEA dade cognitiva, ou seja, alcançar de
prévio de música ou habilidade em forma direta e indiretamente uma
executar um instrumento musical. Na década de 1940, nos das conquistas mais nobres do
As experiências musicais, Estados Unidos, surgiram os pri- desenvolvimento que são as fun-
em ambiente terapêutico são meiros musicoterapeutas que ções executivas. Que são funções
estruturadas para dar forma às atendiam pessoas com autismo. que permitem a criação de estra-
vivências pessoais, conforme o Foi escrito em 1964, o primeiro tégias para a vida, que é uma gran-
percurso idealizado pelo musicote- artigo sobre Musicoterapia e Autis- de dificuldade para a pessoa com
rapeuta: através da criação, o mo, por Paul Nordoff, um dos cria- TEA.
musicoterapeuta favorece a criação dores da abordagem criativa da Em 2020 a Musicoterapia
real de uma ideia musical; na musicoterapia. E desde então, inú- foi reconhecida como um trata-
recriação, se utiliza uma música meras são as publicações de pes- mento baseado em evidência, ou
existente com algumas modifica- quisas sobre a eficácia da musico- seja, apresenta resultados signifi-
ções de letra, harmonia ou melodia; terapia no tratamento autismo. cativos e comprovados cientifica-
na improvisação, a criação da mú- No Brasil, os atendimentos mente como eficaz para atender as
sica é em tempo real, assumindo com Musicoterapia para pessoas pessoas com o diagnóstico de TEA.

35
Psicologia

O VÍNCULO E A INTERAÇÃO
ENTRE PAIS/CUIDADORES
E FILHOS AUTISTAS

O
humano é uma das espé- relacionadas a aprendizagem,
cies que apresenta maior memória, concentração, linguagem
condição de fragilidade ao e percepção. Assim, se afirma o
nascimento precisa, du- quanto a qualidade do vínculo entre
Ivana Carvalho
rante bom período de sua vida, ser a criança e seus pais/cuidadores é
Psicóloga do CONECTA/IPREDE. Pós-
graduanda em curso de especialização em cuidado por outro. Nenhum homem crucial na constituição do sujeito
Autismo (UniChristus). ou mulher se torna humano sem a criança, dito de outra forma, aquele
presença de outros, sem ter sido que diz quem somos, ao dizer “eu”,
alimentado, amado por uma pes- atender a seu nome e dizer o que
soa. Chama-se, em geral, esta deseja. A fragilização do vínculo, da
pessoa de mãe, aquela que ama e relação de afeto nos primeiros
cuida do seu bebê. Está ligação, contatos entre o bebê e sua mãe
união, laço entre o bebê e sua mãe pode provocar sérios riscos na
pode receber o nome de vínculo. formação do sujeito criança.
O vínculo entre o bebê e sua As crianças com o desenvol-
mãe é único pois ocorre entre uma imento atípico possuem um menor
pessoa ainda em formação tanto interesse na interação com os
em relação ao seu corpo (matura- cuidadores e o ambiente social,
ção orgânica) como a sua consciên- algumas vezes a partir do nasci-
cia e outra já adulta, já formada em mento. Nos bebês e crianças com
relação aos dois aspectos. Ele é autismo, a face humana possui
profundo e marcante, o primeiro e pouco interesse; observa-se distúr-
deixará seus traços no futuro da bios no desenvolvimento da aten-
Jessica Freire Sales Ponte criança. ção conjunta, vínculo e outros as-
Psicóloga. Mediadora no Instituto da O movimento da criança pectos da interação social. Elas
Primeira Infância - IPREDE. Especialização para sua mãe pode se chamar de podem não se engajar nos jogos
em andamento: Clínica Interdisciplinar em
Estimulação Precoce pelo afeto, se estabelece logo nos habituais de imitação da infância
Centro Lydia Coriat. primeiros dias de vida entre o bebê (esconde-esconde), gastam um
e seu cuidador. Compreende-se a tempo excessivo explorando o
necessidade da criança de se sentir ambiente inanimado, sem partilhar
segura e protegida, e isso é de com os pais ou familiares. As
grande importância para o desen- habilidades lúdicas, além da explo-
volvimento social, afetivo e cogniti- ração sensorial dos brinquedos,
vo da mesma. Verifica-se a qualida- podem estar completamente
de do vínculo em crianças típicas ausentes. Este conjunto de fatores
quando essas se sentem seguras geram nos pais/cuidadores angús-
na presença de seus pais/cuida- tias por não conseguirem interagir
dores. Algumas vezes tal situação com seu filho.
não se estabelece e pode gerar risco O vínculo dos pais/cuida-
no desenvolvimento da criança. dores com seus filhos autistas
Nas últimas décadas, com precisa se adaptar, favorecendo um
os avanços dos estudos da neuro- novo aprendizado para lidar com
ciência, psiquiatria, pediatria, psi- essa realidade. As necessidades em
cologia e psicanálise se destaca os torno da criança serão maiores, com
Otaciana Araújo de Aguiar estudos que apontam para impor- rearranjos na dinâmica familiar. O
Psicóloga do CONECTA-IPREDE e tância dos vínculos para a formação novo desenho do vínculo e das
mediadora do Instituto da do cérebro e o sujeito criança. Ele expressões afetivas dependerá das
Primeira Infância – IPREDE. também faz eco nas aquisições crenças e valores dos pais/cui-

36
Psicologia

to''. Outra brincadeira própria da


infância é o “faz de conta”, quando
a criança imita atividades do seu
cotidiano com boa dose de imagi-
nação: brincar de casinha, de co-
zinhar, de cuidados e demonstra-
ção de afeto com bonecos e bo-
necas, da encenação de histórias.
A criança que ainda não fala,
irá se expressar através de gestos e
sons, estabelecendo assim uma
comunicação, na brincadeira com o
adulto. Quando os pais/cuidadores
perceberem que essa comunicação
foi estabelecida, eles poderão soli-
citar que a criança expresse em
palavras o seu desejo, não se con-
tentando mais apenas com os
gestos.
Posto isto, os pais/cuida-
dores precisam cuidar de si, do
sentimento de culpa e depressão,
das situações de estresse tão pre-
sentes no amar, educar e cuidar de
dadores em relação ao autismo, ao crianças autistas, pois elas apre- um filho autista. Aqueles que acei-
tratamento, ao potencial do filho. A sentam mais dificuldades em se- tam suas dificuldades e desafios,
criança ter o diagnóstico e acom- rem sensíveis e responsivas aos dão o primeiro passo para um
panhamento terapêutico pode ser afetos das pessoas. Embora seja vínculo suficientemente bom, onde
fator positivo para o processo difícil e estressante para as famílias a criança irá se integrar e se desen-
adaptativo dos pais/cuidadores. A lidarem com estes momentos, é volver em suas experiências emo-
percepção do filho somente como muito importante a valorização das cionais, afetivas e vinculares. Os
autista e não como pessoa pode pequenas conquistas e a constru- pais/cuidadores quando conhecem
interferir de maneira negativa no ção de um ambiente familiar har- as formas de interação da criança,
vínculo e no desenvolvimento da monioso. favorecem assim uma tradução de
criança. O brincar constitui uma das seus gestos e de seus investimen-
O cenário muda quando da expressões do vínculo, ainda mais, tos e a conquista de novas habili-
criança autista, os pais/cuidadores quando os pais/cuidadores o fazem dades.
relatam que ela não chama para com a criança em trocas prazero- Torna-se possível o vínculo
brincar, não se interessa pelos sas. Assim a criança descobrirá o existente no contexto familiar, tão
objetos por muito tempo ou que ambiente ao seu redor, apresen- necessário como visto neste texto,
não percebe seu ambiente externo. tado pelo pai, mãe e familiares. Ela passe da esfera da família para a
Nesse sentido é interessante que aprenderá sobre seu corpo, suas formação de uma rede de apoio de
inicialmente o adulto (pais/cuida- preferencias, sua espontaneidade, pais, cuidadores e profissionais no
dores) observe a criança no brincar, sua criatividade, sua habilidade em viver com a criança autista.
por exemplo, quando ela segura um resolver problemas e sua explora- O mais importante é enten-
objeto mesmo que por ''pouco ção dos brinquedos. Mesmo quan- der que muitas vezes a criança
tempo'', o adulto pode se dirigir a do a criança brinca só, ela não está Autista pode não expressar sua
ela e falar, ''vi que você gostou só, pois aquele ato tem por pano de vinculação como esperamos ou
desse carrinho''. Fazer o som do fundo, a apresentação dos brinque- conhecemos, mas dentro das suas
carrinho para a criança ouvir. Senta dos e do brincar pelos pais/ possibilidades de comunicação
no chão e brinca com o carrinho, cuidadores. social, limitada, fazer uso de ati-
criando uma história para chamar Deste modo, quando uma tudes e ou condutas comporta-
sua atenção. Dessa forma se abre criança convida o adulto a brincar de mentais possíveis. Haja visto, que a
uma porta para o mundo da criança, ''esconde e achou'', por exemplo, ela subjetividade humana que pos-
atrai sua atenção, provoca sua fala instala ali um jogo de '' ver e ser sibilita afeto, vínculos com os ou-
em resposta às solicitações dos vista'', há troca de olhares e sorrisos tros, acontece independente de
pais e familiares. entre eles e a criança. Ela sente qualquer diagnóstico, só precisa-
Entende-se assim a neces- prazer no fato de estar sendo vista mos nos permitir perceber e
sidade de favorecer o vínculo das e felicitada com seu ''aparecimen- retribuir.

37
Enfermagem

O CUIDAR DA ENFERMAGEM
DA CRIANÇA COM TEA

O
cuidado integral ao ser respiratórias e dermatológicas,
humano é compreendido antes do início dos atendimentos
em sua saúde física, so- com a equipe multidisciplinar,
cial, biológica, psicológica visando assim reduzir a possibi-
e espiritual. Neste contexto, a con- lidade de contagio entre os pacien-
sulta de enfermagem permite tes e terapeutas.
desenvolver e potencializar o auto- Outra prática, bem comum,
cuidado do indivíduo ou da família. que envolve a atividade do enfer-
A saúde da criança é acompanhada meiro no Conecta é a realização de
através de um Programa de Pueri- Educação em Saúde. Tem como
cultura que incluem ações direcio- objetivo o cuidar coletivo, através
nadas ao crescimento, desenvol- desse método de trabalho em
José Osivan Junior vimento e prevenção de agravos à grupo são repassadas orientações
Enfermeiro, especialista em Promoção do criança. sobre: práticas de higiene e cui-
Desenvolvimento Infantil UFC. Coordenador O atendimento de enferma- dados pessoais, prevenção e con-
do ambulatório do Instituto da Primeira gem no Conecta - Unidade de trole de doenças, questões nutri-
Infância – IPREDE.
Assistência à Criança com Transtor- cionais, prevenção de acidentes
no do Espectro Autista (TEA) do domésticos e uso e controle de
Instituto da Primeira Infância - medicamentos.
IPREDE engloba alguns procedi- Uma das dúvidas frequen-
mentos, como a triagem inicial de tes dos pais, encontrada nesta
pacientes encaminhados pela atividade, está relacionada a ques-
atenção básica, classificação de tão da seletividade e ou compulsão
risco de doenças infecto contagio- alimentar das crianças. Esse qua-
sas,consulta de enfermagem e droé muito comum em pacientes
ações de Educação e Saúde para as autistas. Consiste na diminuição do
crianças e seus familiares. apetite, comer de forma impulsiva
Os pacientes que são enca- ou errada, recusa alimentar e desin-
minhados semanalmente pelas teresse pelo alimento. Pode ser
Unidades Básicas de Saúde passam transitória ou se estender por lon-
pela triagem inicial de enferma- gos períodos. Motivo das crianças
gem, onde se conhecerá de modo com TEA estarem mais vulneráveis
detalhado o histórico de antece- a desnutrição, disfunção gastroin-
dentes familiares, período gesta- testinal, baixa imunidade e até
cional, parto e pós-parto e questões obesidade (erro alimentar e/ou uso
de saúde da criança. Neste pri- de medicações que podem causar
meiro contato com a criança e a alterações endócrinas e metabó-
Bruna Shirley Lima Dantas família, o profissional favorece o licas). As orientações relacionadas
Enfermeira do Conecta-IPREDE. estabelecimento de vínculo posi- a questão alimentar das crianças se
tivo, repassando apoio e segurança. referem: informações sobre a pirâ-
Ainda na triagem o enfermeiro mide alimentar e apoio emocional
estará atento ao comportamento aos cuidadores, que por muitas
da criança na consulta, em especial vezes relatam sentimento de tris-
na sua forma de socialização, teza pelo padrão alimentar ineficaz
comunicação expressiva, como dos filhos. Em casos mais difíceis
brinca, presença de movimentos existe um trabalho em parceria com
repetitivos entre outros. os outros profissionais da equipe,
A classificação de risco para uma abordagem integrada.
ocorre para as crianças em trata- A correta utilização dos
mento e consiste na avaliação de medicamentos é outro assunto
possíveis agravos à saúde da abordado na Educação em Saúde
criança, como processos infecto- com orientações sobre os cuidados
contagiosos, febre, alterações com a medicação, tais como

38
Enfermagem

dosagem certa, horário, interação planejamento, implementação e no autocuidado para a higiene


medicamentosa, reações adversas avaliação do serviço de enfer- íntima associada à alteração cog-
e conservação. Algumas medica- magem. nitiva; dentição prejudicada asso-
ções necessitam de armazena- A coleta de dados é realiza- ciada à sensibilidade oral, caracte-
mento sobe refrigeração. Os anti- da durante a entrevista com os rizado por cáries dentais e excesso
psicóticos são uma classe de me- pais/cuidadores das crianças onde de placas. É muito importante que
dicamentos comuns no tratamento buscamos conhecer sobre rotina os pais/cuidadores estejam aten-
do autismo, tais medicações devem alimentar da criança, acompanha- tos e dispostos a seguir as reco-
ser utilizadas de forma criteriosa e mento do calendário vacinal, veri- mendações planejadas pelo enfer-
controladas. O enfermeiro informa ficação de peso e altura correspon- meiro, para tanto é preciso fazer
aos pais sobre os cuidados na ad- dente à faixa etária, desenvol- junto com os pais.
ministração dos antipsicóticos nos vimento neuropsicomotor, saúde As condutas pensadas em
filhos: a dosagem correta, o horário, bucal, padrões de higiene entre conjunto, possuem sempre, emba-
não finalizar o tratamento por con- outros. Durante a entrevista é pos- samento científico e compar-
ta própria, quadros de cefaleia, sível ainda observar a vulne- tilhadas com a equipe multidis-
aumento de apetite e o risco de rabilidade social enfrentada pela ciplinar do Conecta. Tendo em vista
queda. As quedas podem ocorrer criança e seu vínculo com o a melhora na qualidade de vida da
pois esse tipo de medicamento em cuidador. criança com TEA autismo e de sua
alguns casos podegerar uma hipo- As informações fornecidas família, bem como a evolução no
tensão postural (fraqueza muscu- pelo cuidador mais as obtidas seu desenvolvimento. Após a orien-
lar). Outro tema importante é a através do exame físico e os conhe- tação das famílias é realizado uma
interação medicamentosa, no caso cimentos afeitos a enfermagem é avaliação da intervenção proposta a
os antipsicóticos não devem ser atribuído um diagnóstico a criança fim de averiguar se as metas
administrados próximos a barbi- com TEA, relacionado a promoção traçadas foram alcançadas.
túricos. da saúde, nutrição, eliminação e Portanto, a participação do
Conforme o Conselho Fede- troca, percepção/cognição, papéis e enfermeiro como integrante da
ral de Enfermagem (COFEN) a relacionamento, segurança e equipe multidisciplinar no Conecta,
consulta de enfermagem segue proteção. Para cada diagnóstico de contempla uma visão ampla e
amparada pela Resolução n.º enfermagem estabelecido é holística da criança com TEA e sua
358/2009 no § 2º inciso quando planejado um cuidado especifico e família; na oferta de cuidados e
realizada em instituições pres- individual. habilidades que englobam os
tadoras de serviços ambulatoriais Os diagnósticos de enfer- desafios diários de suas atividades.
de saúde, domicílios, escolas, magem mais encontrados nos Tais cuidados são organizados e
associações comunitárias, entre atendimentos no Conecta estão aplicados de forma sistematizada
outras. A consulta de enfermagem relacionados à dinâmica alimentar respeitando a individualidade e a
se desenvolve em processo ineficaz da criança, caracterizado necessidade de cada criança e
constituído por cinco etapas, sendo pela ingestão frequente de ali- família, respeitando seus valores e
elas: coleta de dados, diagnóstico, mentos de baixa qualidade; déficit crenças.

39
Benefício

TIRA DÚVIDAS DO
BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA – (BPC)

A
qui estão selecionadas fazer o requerimento do INSS:
algumas das perguntas atendimento presencial numa
mais frequentes que Agência da Previdência Social;
muitos pais/mães/cuida- acesso pelo site ou aplicativo Meu
dores fazem para compreender o INSSou pela Central 135 do INSS; a
Benefício de Prestação Continuada ligação é gratuita. Observe que o
- BPC, regulamentado na Lei sistema vai confirmar seu cadas-
Orgânica de Assistência Social – tramento.
LOAS, Nº 8.742, de 7 de dezembro 5. Qual a renda da família para ter
de 1993. É um benefício assistencial direito ao benefício?
que algumas pessoas não sabem A família precisa ter uma
Fabiana Gomes de Castro como solicitá-lo. renda per capita (o dinheiro do mês
Assistente Social. Pós-graduanda em MBA 1. O que é o Benefício de Prestação dividido pelo número de pessoas da
em Gestão de Pessoas e Gestão Continuada (BPC)? família) inferior a R$ 275,00 (1/4 do
Empresarial pela Faculdade
Maurício de Nassau. O BPC é um benefício assis- salário mínimo) por pessoa. Quan-
tencial que consiste no pagamento do a família se enquadra neste caso
de um salário-mínimo (atualmente é considerada de baixa renda e o
no valor de R$ 1.100,00) mensal a requerente possui o direito ao BPC.
pessoas com deficiência ou com 6. Quando ocorre a solicitação do
idade igual e acima de 65 anos, com BPC, o INSS analisa a condição
doenças incapacitantes para o tra- socioeconômica da família ou
balho ou comprovem não possuir só do requerente?
meios de prover a própria existência O INSS vai cruzar as infor-
ou tê-la assegurada por sua família. mações prestadas no requerimento
2. Quais os documentos necessá- com outras, presentes nos cadas-
rios para realizar o pedido do tros de outro departamento. Ele
BPC? verifica se existe registro de bene-
É necessário o laudo médico fício previdenciário e de emprego/
recente (data inferior a um ano), renda do requerente ou de outras
indicando deficiência ou doenças pessoas da família. Quando as
incapacidade OU INCAPACITAN- informações estão contraditórias o
TES?; a inscrição no Cadastro Único INSS registra como pendência de
realizada no Centro de Referência atualização cadastral. A pendência
da Assistência Social (CRAS); com- deve ser resolvida em até 30 dias
provante de endereço atualizado; pelo requerente, caso passe o prazo
Vanessa Alves do Nascimento. Carteira de Identidade (RG); CPF; é necessário iniciar um novo
Assistente Social do Conecta. Pós- comprovante de renda dos reque- processo.
graduanda em Saúde Pública, Política, rentes (criança, adolescentes, adul- 7. Caso o pedido para concessão do
Planejamento e Gestão pela Estácio. tos e idosos) e das pessoas da benefício for negado, posso
família. Quando o requerente for pedi-lo via Ação Judicial?
menor de 18 anos, é necessário o Sim. Você deve procurar um
Termo de Tutela da pessoa respon- advogado na Defensoria Pública ou
sável pela a criança ou adolescente um de sua confiança, para entrar
junto ao INSS. com uma ação para rever a decisão
3. O que fazer quando não tem a do INSS.
inscrição no Cadastro Único? 8. O BPC pode ser recebido junto
O requerente que não pos- com outros benefícios do INSS?
sua o Cadastro Único deve fazê-lo Não. O BPC não pode ser
no CRAS da sua Regional. recebido com outro benefício pago
4. Como pedir o BPC no INSS? pelo INSS (como, por exemplo,
Há três formas de como seguro desemprego, aposentado

40
Benefício

mento do BPC, o beneficiário com


deficiência não será submetido à
nova avaliação no INSS, respeitan-
do o período de revisão (de 2 em 2
anos). No caso de contrato de
aprendizagem, a pessoa com de-
ficiência pode acumular com o
pagamento do BPC por até 2 anos.
16. Como o beneficiário do BPC
pede desconto na conta de luz
(Tarifa Social de Energia Elé-
trica)?
O beneficiário do BPC ou um
dos integrantes de sua família deve
procurar a companhia de energia
elétrica que atende a sua residência
e fornecer as seguintes informa-
ções: nome do beneficiário; número
do benefício (NB); CPF e documento
de identificação oficial com foto; e
Código da Unidade Consumidora. O
desconto só vale para conta de luz
residencial, seja ela própria ou
alugada.
17. O que é a revisão do BPC?
ria e/ou pensão). É a verificação a cada dois
13. Quanto tempo demora para anos, pelo Governo Federal, se o
9. É possível receber Bolsa Família receber o BPC?
e BPC ao mesmo tempo? beneficiário mantém os critérios
O valor estará liberado para para continuar recebendo o BPC.
Sim, mas para continuar saque, após 45 dias da concessão Para os beneficiários com deficiên-
recebendo o Bolsa Família, é do benefício. cia, é agendada nova avaliação
necessário que a família atenda ao 14. Como é pago o BPC? médica e social pelo INSS.
critério de renda deste Programa. O primeiro pagamento é 18. Se o requerente não tiver
10. Como é feita a avaliação mé- feito presencialmente na agencia documentos, ele pode dar
dica e social? bancária. Depois chega pelo Cor- entrada no BPC?
As avaliações são agenda- reio, o cartão magnético para retirar Sim, desde que a informa-
das pelo INSS e realizadas pela nos caixas eletrônicos as outras ção consiga ser confirmada pelo
Perícia Médica e Assistência Social mensalidades. O cartão é gratuito e INSS. Mesmo que isso ocorra, o
do órgão. o beneficiário não precisa comprar INSS pode pedir, a qualquer tempo,
11. Como saber se o BPC foi libe- nenhum serviço ou produto do os documentos originais.
rado? banco. É possível também receber o 19. Qual a diferença entre bloqueio
Essa informação pode ser pagamento do BPC por meio de e suspensão do BPC?
consultada por meio do site ou do conta corrente ou conta poupança. O bloqueio é um procedi-
aplicativo Meu INSS, ou ligar para a 15. Quem recebe o BPC pode exer- mento que tem a intenção de
Central 135. Além disso, o INSS cer atividade remunerada? notificar o beneficiário sobre a
envia uma carta ao requerente para Não. Caso o beneficiário necessidade de atualização de
informar se o benefício foi conce- comece a exercer alguma atividade informações. Ao entrar em contato
dido (liberado) ou indeferido. A remunerada, o BPC é suspenso. com o INSS, o beneficiário é noti-
correspondência avisa quando e em Findo o contrato de trabalho ou de ficado. A suspensão é feita quando
qual agência bancária a pessoa atividade remunerada é possível o beneficiário foi notificado e não
receberá o BPC, quando concedido. voltar a receber o benefício. Para fez aa atualizações.
12. Quando o BPC é indeferido? reativar o pagamento, o benefi- 20. O que é cessação do BPC?
Quando o requerente não ciário preenche o requerimento por É o cancelamento do benefí-
atendeu aos critérios para receber o meio do site ou aplicativo Meu INSS cio no INSS.
BPC; por motivo do falecimento ou telefona para a Central 135. Ele 21. Em caso de morte do beneficiá-
durante o processo ou pela falta deve comprovar o encerramento do rio, seus dependentes recebe-
atendidas as exigências de com- contrato de trabalho ou da ativi- rão pensão por morte?
parecimento ao INSS e/ou apre- dade que estava desenvolvendo. Não, pois o benefício ter-
sentação de documentos. Para o restabelecimento do paga- mina após a morte do beneficiário.

41
Família

A FAMÍLIA DE CRIANÇAS
COM TEA
de dedicação a fim de proporcionar seu filho melhore ou volte à
um ambiente familiar adequado normalidade em uma incessante
para seu desenvolvimento, a au- busca por uma milagrosa cura. Com
sência de conhecimento, a presença o enfrentamento desse período
de muitos estigmas e vulnerabili- doloroso de luto do filho “ideal”,
dades dos pais impossibilitando o juntamente à necessidade de
desenvolvimento de crianças com adaptar-se à nova realidade,
algum tipo de transtorno, especial- emergem as expectativas diante do
mente quando se refere-se ao filho “real”, isto é, com deficiência.
Transtorno do Espectro Autista Nessa perspectiva temores
(TEA). e resistências quanto à maneira
Francisca Charlenny O TEA se refere aos trans- que ocorrerá a comunicação de seu
Freitas de Oliveira tornos antes chamados de “autis- filho autista com os demais mem-
mo infantil precoce, autismo infan- bros da sociedade, pois temem as
Pedagoga. Mestranda em Saúde da Criança
e do Adolescente pela Universidade til, autismo de Kanner, autismo de reações que seu filho possa ter,
Estadual do Ceará (UECE). Especialista em alto funcionamento, autismo atípi- como: crise, grito, choro, agressões
Educação Especial e Educação a Distância. co, transtorno global do desenvol- verbais ou físicas e ainda agitação.
Professora de atendimento educacional vimento sem outra especificação, Os pais temem que esses compor-
especializado. Tutora a Distância e
componente da Gestão do Curso de transtorno desintegrativo da infân- tamentos, possam vir à exposição
Pedagogia/UAB/UECE. cia e transtorno de Asperger”. social e de vivenciar sentimentos de
Os indivíduos com TEA po- vergonha, tristeza. Demonstra-se
dem “apresentar uma gama de sin- que ansiedade ou alívio possam
tomas comportamentais, incluindo trazer prejuízos em suas relações a

A
família é a primeira também desatenção, impulsivida- vislumbrarem que os pais receiam
instituição onde assume de, agressividade, comportamen- como ocorrerá a comunicação do
funções primordiais e de tos autodestrutivos e particular- seu filho com o meio social.
grande influência no mente em crianças mais jovens, Os pais precisam redefinir
processo de desenvolvimento do bem como acessos de raiva”. papeis, quem se responsabilizará
ser humano. É nela que ocorre o O impacto gerado pela che- pelos cuidados ou se serão omissos
desenvolvimento de conhecimen- gada de uma criança com algum diante desta situação, temores e
tos sobre diferentes aspectos da tipo de transtorno na família pro- resistências quanto à maneira que
vida e aprendizados além de fazer voca forte desorganização na esta- ocorrerá o cuidado com o filho
as escolhas adequadas às distintas bilidade familiar, já que todas as autista tanto em casa com os
situações do cotidiano e isto tam- expectativas foram quebradas com demais membros da família como
bém se aplica às famílias das a perda do “bebê perfeito”, gerando também com os demais membros
pessoas com algum transtorno do um sentimento de culpa ou até da sociedade, pois temem as
desenvolvimento. Os Transtornos “castigo”. Para que o filho venha a reações que seu filho possa ter,
Globais do Desenvolvimento (TGDs) ser aceito e acolhido faz-se ne- como: crise, grito, choro, agressões
têm sido definidos como uma cessário que a família, de forma verbais ou físicas e ainda agitação.
síndrome, onde algumas áreas do geral, atravesse esse momento de Os pais temem que esses compor-
desenvolvimento são acometidas luto pelo filho idealizado. tamentos, possam vir à exposição
com severos comprometimentos A dificuldade que se apre- social e de vivenciar sentimentos de
invasivos, principalmente as que senta nesse processo não é fácil, vergonha, tristeza. Porém conside-
estão relacionadas a habilidades de porém necessária, oportunizando ramos que as famílias têm poten-
interação social recíproca, habili- aos pais um tempo indispensável cial para serem bem-sucedidas,
dades de comunicação, e presença para superar tal impacto. Em al- transpondo quaisquer desafios
de comportamentos, interesses e guns casos, as reações e comporta- e/ou obstáculos, tornando-se a
atividades estereotipadas. mentos iniciais são passageiras e rede de apoio no desenvolvimento
O que percebemos é que a estabilizadoras, no entanto, para do filho com TEA.
deficiência na criança gera novas outros podem perdurar por anos ou No contexto do autismo, a
demandas para os membros da tornarem-se duradouros”. Isso informação e o apoio são pontos
família, dentre elas, maior tempo porque ainda existe a crença de que cruciais para melhorar o convivo

42
e g a n do!
os c h
Estam rados para
o p r epa
familiar, lembrando que a adap- processo, podendo valorizar ou até Est a
r e e n d er?
tação à mudança é um processo
geral e contínuo, sendo construído
em conjunto pela família, com
mesmo depreciar o investimento
na relação familiar.
Dessa forma, é imprescin- se sur p
vistas a uma melhor qualidade de dível valorizar o papel da família
vida. visando a responsabilidade de
Nesse contexto, a família estimular as conexões afetivas dos
assume um papel primordial na filhos com TEA, pois essas apre-
educação do filho com TEA. É sentam mais dificuldades em
compreendida como a primeira serem sensíveis e responsivas aos
instância educativa, ou seja, “o afetos das pessoas de uma forma
núcleo central do desenvolvimento
Pizzas
que se sintam seguras e protegidas
global da criança”. Assim, a respon- para um desenvolvimento saudá-
sabilidade de oferecer estímulos vel. Desta forma, acreditamos no
adequados no cotidiano desse filho potencial e valor da família nesse
é bem maior, podendo assim, processo e que o mesmo seja
contribuir de forma efetiva no pro- amplamente discutido para que
cesso cognitivo, social, afetivo e possamos transformar a sociedade
emocional. Percebe-se que a forma em busca de uma inclusão plena
de relacionamento dos pais varia visando oferecer direitos, deveres,
conforme suas crenças e valores oportunidades, equidade e uma
que foram adquiridos ao longo do melhor qualidade de vida para
desenvolvimento humano, de todos sem qualquer tipo de O INGREDIENTE mais
forma a interferir em todo o discriminação.
IMPORTANTE é o
AMOR

zero85pizzas
Terapia Ocupacional

Maria Egisleny da Silva Camelo


Terapeuta Ocupacional. Especialista em
Gerontologia pela Faculdade Ateneu.
Residência Multiprofissional em Saúde
O OLHAR DO BRINCAR
Mental pela Universidade Federal do Ceará
(UFC). Terapeuta Ocupacional da equipe de
reabilitação do Instituto de Previdência do
NO AUTISMO
Município de Fortaleza - Programa IPM
Lar. Mestranda em Saúde da Mulher e da
Criança pela UFC.
para brincar faz-se necessário tal desempenho através das limita-
ato para um bom desempenho ções. No ato de brincar as crianças
neuropsicomotor. vão se divertir e fazer novas desco-

O
brincar é um fazer que As crianças necessitam de bertas a sua maneira e com suas
está presente no período uma rotina saudável e com muitas capacidades específicas.
da infância e por meio dele brincadeiras. É uma forma de livre As crianças com TEA são
a criança faz descobertas expressão de sentimentos, desaba- únicas e temos o papel fundamen-
e estimula seus sentidos. Nas fos, desejos e por meio do brincar os tal de reforçar as potencialidades
crianças com Transtorno do Espec- pais/cuidadores irão observar ao para novas descobertas ao longo do
tro Autista (TEA), quando a inte- longo do desenvolvimento infantil seu desenvolvimento e futuro, fa-
gração das informações sensoriais se a criança está realizando as zendo que cada um com suas espe-
não ocorre de forma adequada, os etapas de maneira satisfatória em cificidades tenham a oportunida-
mesmos podem vir a ter dificulda- se tratando do falar, deambular, de de vivenciar e criar novos laços de
des e limitações para dar uma gesticular, engatinhar, choro fácil, amor entre pais/cuidadores e so-
resposta adequada ao ambiente irritabilidade. No entanto, através ciedade, sensibilizando a população
como exemplo: crianças que pare- do ato de brincar na infância as a tratá-los com respeito e ofertar
cem desajeitadas em atividades mesmas irão simular fatos que serviços de qualidade que atendam
que requerem movimentos e ocorrem no cotidiano, revelar as suas necessidades básicas,
atividades da vida diária como situações vivenciadas que muitas priorizando a qualidade de vida e
vestir-se, alimentar-se ou segurar vezes não são saudáveis e sim novas formas de fazer, adaptar-se
objetos. tóxicas. e acolher.
As brincadeiras na infância O Terapeuta Ocupacional As crianças que têm a opor-
exigem planejamento motor onde faz uso do brincar para estimular as tunidade de brincar ao longo do
requer ideação, planejamento e crianças e tratar possíveis altera- desenvolvimento infantil irão tor-
execução, onde tarefas de imita- ções do seu desenvolvimento seja nar-se adultos mais resilientes e
ção, aprender gestos irão gerar motor, cognitivo, sensorial e psi- preparados para o enfretamento de
limitações e dificuldades. cossocial durante o tratamento de situações adversas. Em um futuro
O desenvolvimento infantil reabilitação. É por meio da ludici- próspero estarão preparados para
com bons resultados dependerá dade que podemos proporcionar incentivar e propagar o ato de brin-
dos estímulos adequados e o ato de um novo mundo de possibilidades, car reforçando a sua importância ao
brincar incluso na rotina dos pais / reforçando as capacidades adapta- relatarem os atos vivenciados e a
cuidadores, mesmo com a rotina tivas ao meio, estimulando funções diferença significativa para o
muito comprometida, pouco tempo que estão com déficit e maximizar o desenvolvimento infantil saudável.

44
Esporte

A BOLA É A MINHA
PAIXÃO
meses dedicados a ele, mas a cada tava um ato avassalador, deixando
lembrança, um novo despertar de Ícaro inquieto e agitado. Ele tinha
sensações. apenas 5 anos, tudo era muito novo
Aline Pereira Era aniversário do Théo, um e complexo. Todos ao redor com-
Enfermeira. Mestranda em Saúde da primo de Ícaro, quando pude pre- preendiam aquele momento e
Criança e do Adolescente pela Universidade senciar sua chegada. Sua entrada admiravam o amor e a enorme
Estadual do Ceará (UECE). Especialista em no sítio foi uma explosão de energia
Saúde da Família, em Gestão e Serviços de
dedicação de seus pais.
Saúde Técnica. Responsável pela Sala de e impulsos. Vê-lo entrar e aos Meu primo era um pai
Apoio da Mulher que Amamenta e Coleta poucos se ambientar, despertou acolhedor e carinhoso, que acon-
de Leite Humano da Regional IV do um olhar de admiração. chegava a necessidade do filho para
município de Fortaleza-Ceará. Ele não se envolveu logo, que o prazer dele se mantivesse
mas ao visualizar a bola, seu olhar preservado.
Q uem nunca sonhou em voar
como um pássaro?
Ícaro foi um sonho que veio
transcendeu uma vibração de
felicidade espontânea. Ele foi ao
encontro dela e por vários minutos,
Observava a troca de olha-
res e pequenas palavras, o tocar de
bola e o momento do gol eram
como um pássaro e penetrou na o momento era só dele. Sua mãe celebrados com um abraço. Abraços
vida de minha prima. Várias foram comentou que era o seu brincar, sua aconchegantes e por vezes, gritos
as tentativas e esperanças de uma hiper-focalização, não havia outro para comemorar o gol.
gestação e através de lindo voo, ele brincar que lhe proporcionasse A falha de comunicação se
pousou. nada igual. transformava de uma maneira
Seu rostinho representou a Sua interação social era discreta, pois eles sabiam o obje-
materialização de um amor, seu comprometida, mas não ofuscada tivo e o motivo de estarem ali.
olhar penetrou em sua alma e sua com a presença da sua tão estima- A vida passa por um novo
pele negra sensível foi envolta de da bola. Ao encontrar um parceiro, despertar, por um olhar diver-
um novo lar, assim foi descrito a esse tornou-se um companheiro sificado, movimentos complexos e
chegada de Ícaro. confiável e fiel. flexíveis. Ícaro, com seus alcances e
O lar estava preparado, mas A memória dessa parceira conquistas, era estimulado por
sua chegada fez o dia ser abrilhan- ficara por um longo período, pois vários profissionais, com a certeza
tado com um grande esplendor. A após meses sem um encontro, a de uma mãe que conhecia a capa-
notícia de sua chegada foi repleta parceria era tão espontânea e dire- cidade de ele ir cada vez mais além.
de alegria e de repente, a família cional. Naquele ambiente, agora O amor é uma entrega com
estava formada. existia apenas seu parceiro e sua impactos a curto, médio e longo
Como sua chegada foi para- bola imersos em ricas vivências. prazo, onde Ícaro vivenciara deste o
lela a de minha filha Maria Eduarda, Tudo a sua volta ficava em momento de sua chegada.
ele teve a oportunidade de receber segundo plano. As conversas, as Seu crescimento foi impul-
leite humano. O Leite Humano músicas, e as outras brincadeiras, sionado de um maior desenvolvi-
recebido foi através das minhas que aconteciam simultaneamente, mento na linguagem e na interação
doações ao Banco de Leite Humano foram insuficientes para redirecio- social. Agora, não era apenas a
da Maternidade Escola. nar sua atenção. bola, mas também sua autorregu-
O desmame representou Chegando o momento de lação e sua autodeterminação para
uma diversidade de sentimentos e cantar parabéns, era preciso incen- atividades cada vez mais comple-
emoções, como felicidade, carinho, tivar a interação social com as xas, iniciara aulas de stand up
amor, inspiração. outras crianças. Porém, seu corpo paddle. Foi um ano maravilhoso,
Era gratificante ajudar Már- foi impactado com a dificuldade de dedicado a esse esporte que para
cia e proporcionar um alimento interromper sua brincadeira. ele integrava uma outra brinca-
saudável ao meu sobrinho. Foram A interação social represen- deira.

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