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Pesquisa: Aspectos Gerais do Art. 90 da Lei 8.

666/1993

Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter
competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação:

Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Aspectos Gerais

1. Doutrina:

1.1. Bem jurídico tutelado:

Direito penal das licitações - Cezar Roberto Bitencourt 1:

Além da objetividade jurídica genérica dos crimes licitatórios, qual seja,


preservar os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade,
da igualdade, da publicidade e da probidade administrativa, já destacamos que
cada tipo penal possui a sua própria objetividade. Há, na verdade, uma
multiplicidade de bens jurídicos protegidos no art. 90 da Lei n. 8.666/93,
destacando-se, sobremodo, a competitividade do certame, a despeito da grande
importância de tantos outros como a própria transparência dos atos públicos e a
probidade, moralidade e dignidade administrativa. Embora o bem jurídico tutelado
específico, no entanto, seja o caráter competitivo do procedimento licitatório, o
qual deve ser o mais amplo possível, permitindo que todos aqueles que satisfaçam
os requisitos legais possam, se o desejarem, participar do certame licitatório. A
finalidade perseguida pela incriminação das condutas descritas – frustrar ou
fraudar o caráter competitivo do procedimento licitatório – é, inegavelmente, a
concorrência legítima na competição licitatória, com preços justos, assegurando
uma participação honesta, aberta, legítima e saudável entre concorrentes, e, ao
mesmo tempo, preservando sempre a dignidade e moralidade administrativa.

Direito Penal Econômico - Luiz Regis Prado2:

Tutela-se o regular funcionamento da Administração Pública, especialmente


a lisura credibilidade das licitações, no que se refere à competitividade inerente ao
certame, imprescindível para a efetiva garantia do interesse público.

Direito penal econômico - Luciano Anderson de Souza e Marina Pinhão Coelho Araújo 3:

1 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal das Licitações. São Paulo: Saraiva, 2012. E-Book. p. 217/218.
2 FILHO, Marçal Justen. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos: Lei 8.666/1993. 17ª ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais. p. 1.407.
3 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal das Licitações. São Paulo: Saraiva, 2012. E-Book. p.191/192.
A doutrina costuma afirmar que os bens jurídicos a serem
resguardados pelo tipo são a moralidade administrativa e a regularidade do
procedimento licita tório, além de particular atenção do legislador para a
proteção do princípio da competitividade ínsito à licitação, em razão do
emprego da expressão caráter competitivo do procedimento licitatório.
Tutela-se, pois, o caráter competitivo do procedimento licitatório, que, por
expressa disposição constitucional, deve ser amplo de modo a permitir a
participação no certame licitatório daquele que satisfaça os requisitos
legais. O legislador, por isso, optou por criminalizar o comportamento
daquele que, por qualquer meio de ajuste, combinação, ou qualquer outro
expediente, frustre ou fraude o caráter competitivo do procedimento
licitatório.

1.2. Tipo objetivo:

Direito penal das licitações - Cezar Roberto Bitencourt 4:

Trata-se de um tipo penal de conteúdo variado (ou de ação múltipla), isto é,


ainda que o agente pratique, cumulativamente, todas as condutas descritas nos
verbos nucleares, praticará um mesmo crime.
As condutas incriminadas no art. 90 da Lei n. 8.666/93 são “frustrar” ou
“fraudar” o caráter competitivo do procedimento licitatório, as quais devem ser,
necessariamente, identificadas, isto é, descritas na inicial acusatória discorrendo
em que ambas consistem, individualmente. São, portanto, duas modalidades de
condutas incriminadas: a frustração e a fraude, cujo objeto material é o
procedimento licitatório frustrado (inviabilizado) ou fraudado. Vejamos, a seguir,
cada uma delas.
(a) Frustrar significa privar, iludir, inviabilizar a realização do procedimento
licitatório, mediante ajuste, combinação ou, como diz a lei, qualquer outro
expediente; ou, na erudita definição de Paulo José da Costa Jr., “frustrar, do latim
frustrare, é tornar inútil, fazer falhar, baldar, tornar sem efeito”. Dito em bom
português, “frustrar” é inviabilizar, inutilizar ou impedir tanto a realização do
“procedimento licitatório”, como também o seu “caráter competitivo”, ou seja,
frustrar implica no impedimento da licitação, esta não se realiza pura e
simplesmente. Não se pode olvidar que são duas coisas distintas, a realização do
“procedimento licitatório”, e o “caráter competitivo” deste; a frustração de
qualquer dos dois é suficiente para tipificar a primeira conduta que ora
examinamos. Neste dispositivo objetiva-se, fundamentalmente, preservar o caráter
competitivo do certame licitatório; no caso, mais que o próprio procedimento, a
relevância reside na sua natureza competitiva, de tal sorte que preservar ou realizar
o referido procedimento sem essa característica, viola o bem jurídico que se
pretende proteger, qual seja, a competitividade da concorrência pública (em
sentido lato). Por outro lado, frustrar o próprio procedimento leva consigo (na
frustração) também a competitividade, violando, por conseguinte, igualmente a

4 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal das Licitações. São Paulo: Saraiva, 2012. E-Book. p. 196/205.
proteção penal, por isso, a nossa afirmação de que a violação de qualquer dos dois
é suficiente para tipificar a primeira conduta do tipo sub examen.
(b) Fraudar, por outro lado, é usar ou utilizar manobra ardilosa, astuciosa, isto é,
realizada com emprego de artifício. Fraude, em outros termos, é a utilização de
artifício, de estratagema, de engodo ou ardil para vencer a vigilância da vítima ou
responsável pela vigilância. Não vemos, a rigor, nenhuma restrição quanto à
forma, meio ou espécie de fraude, bastando que seja idônea para desviar a atenção
ou simplesmente enganar o administrador público ou os concorrentes do
procedimento licitatório. Assim, caracteriza meio fraudulento qualquer artimanha
utilizada para enganar, mascarar ou alterar a forma procedimental ou o caráter
competitivo da licitação. (...)
Pois, curiosamente, a fraude no crime descrito no art. 90 da Lei n. 8.666/93 –
a despeito da unilateralidade característica do furto e da bilateralidade existente no
estelionato –, acreditamos que reúne um misto dessas duas modalidades de fraude:
assemelha-se à fraude do furto quando burla a vigilância do administrador público
ou dos demais concorrentes, visando desviar a atenção destes, mas também se
identifica com a do estelionato quando objetiva induzi-los a erro. A fraude neste
crime licitatório pode, na verdade, assumir ora uma, ora outra característica, ou,
inclusive, ambas ao mesmo tempo.
Enfim, a fraude e a frustração implicam, necessariamente, o engano e/ou o
erro do administrador público e dos demais concorrentes, visando, evidentemente,
a obtenção de alguma vantagem, normalmente econômica. (...)
“Fazer ajustes” ou “combinação”, venia concessa , não é a conduta
incriminada no dispositivo que ora examinamos, mas tão somente meios
declinados no tipo penal através dos quais o agente pode executar qualquer
das duas condutas antes referidas, além, como demonstraremos adiante, da
possibilidade de utilizar-se de qualquer outro expediente. Esses aspectos serão
objeto de análise no tópico seguinte. A ação tipificada não é, tampouco, obter
vantagem ilícita (para si ou para outrem), ao contrário da finalidade, de um
modo geral, dos crimes contra o patrimônio tipificados no Código Penal,
embora, não se possa negar, que o fim especial das condutas tipificadas seja,
de um modo geral, obter vantagem decorrente da adjudicação do objeto da
licitação. Na verdade, essa vantagem integra o elemento subjetivo especial do
injusto que, como tal, não precisa concretizar-se para a consumação do crime,
sendo suficiente que tenha sido o móvel da ação criminosa. Mas as ações
tipificadas são, repetindo, frustrar ou fraudar o caráter competitivo do
procedimento licitatório, claro, tendo como finalidade subjetiva a obtenção de
vantagem.
(...) as duas condutas incriminadas – frustrar e fraudar o caráter competitivo
do procedimento licitatório – podem ser praticadas por outros meios, tais como
artifício, ardil ou algum outro meio similar, onde a astúcia e a dissimulação do
agente possa se fazer presente para fraudar o caráter competitivo do procedimento
licitatório, pois o texto legal admite, como meio fraudatório, “qualquer outro
expediente”, logicamente, similar ao ajuste ou à combinação.
Por fim, é indispensável que resultem descritas na denúncia a existência e a
caracterização do meio fraudulento, qual seja, ajuste, combinação ou qualquer
outro expediente com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Além de descrever na denúncia
em que consiste a fraude ou frustração do caráter competitivo do objeto da
licitação, o Parquet deve demonstrar como e por que a frustração do caráter
competitivo da licitação pode verificar-se.
Embora seja desnecessária a efetiva obtenção da vantagem decorrente da
adjudicação do objeto da licitação, é necessário que se comprove,
materialmente, a ocorrência da frustração ou da fraude decorrente do meio
utilizado pelo agente. Em outros termos, é indispensável uma conexão causal,
isto é, uma relação de causa e efeito, entre a fraude praticada pelo agente e a
inviabilidade do certame licitatório.

Direito Penal Econômico - Luiz Regis Prado5:

A conduta delitiva vem a ser: “frustrar ou fraudar, mediante ajuste,


combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento
licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da
adjudicação do objeto da licitação”. Frustrar significa inutilizar, fazer falhar,
atrapalhar, impedir ou prejudicar. Fraudar é burlar, ludibriar, trapacear. Estas
ações são praticadas mediante ajuste (acordo, compromisso), combinação
(semelhante ao ajuste, pacto, arranjo) ou qualquer outro expediente, expressão que
possibilita interpretação extensiva analógica para abarcar qualquer outro modus
operandi capaz de impedir ou eliminar o caráter competitivo do certame (v.g. a
divulgação de informação falsa sobre o cancelamento ou adiamento do certame, o
que, indubitavelmente, prejudicaria os demais concorrentes) .

Direito penal econômico - Luciano Anderson de Souza e Marina Pinhão Coelho Araújo 6:

Frustrar o caráter competitivo é impedir que os interessados no certame


participem em condições de igualdade. Quando um procedimento licitatório tem
início, há a expectativa de que haverá a maior lisura por parte dos agentes públicos
e dos concorrentes, priorizando-se o melhor interesse da Administração. No
entanto, há situações em que alguns concorrentes combinam, entre si, manobras
para favorecer um determinado interessado em prejuízo dos demais. Da mesma
maneira, fraudar é enganar, induzir ao erro, como meio de obtenção de
vantagem. Nessa modalidade, o ajuste ocorre para que haja aparência de falsa
lisura na licitação e de fictício respeito à competitividade.
Pode-se dizer que frustrar e fraudar, para a finalidade do art. 90, possuem o
mesmo sentido: impedir a competitividade honesta entre os participantes do
certame. As manobras previstas são o ajuste, a combinação ou qualquer outro
expediente. O ajuste é a conduta posterior à elaboração da proposta, já que,
dolosamente, o conteúdo é manipulado para favorecer alguém. A combinação é o
comportamento prévio, anterior à elaboração da proposta, pelo qual o proponente
estipula condições que impeçam a competitividade. Por fim, o tipo faz referência

5 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal das Licitações. São Paulo: Saraiva, 2012. E-Book. p.210/212.
6 PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019. p. 410.
genérica a qualquer outro tipo de expediente que possa comprometer a
transparência do certame (como exemplo, a criação de pessoa jurídica com o fim
exclusivo de manipular o caráter competitivo do procedimento).
A conduta do agente pode resultar em vantagem decorrente da adjudicação
do objeto da licitação para si ou para outrem. Quer dizer, não é necessário que o
dolo seja dirigido à obtenção de vantagem própria na adjudicação.
(...)
A fraude à licitação depende da manipulação que impeça a participação de
outros concorrentes, em condição de igualdade, beneficiando o agente. Se a
manobra atribuída ao agente não for obstáculo à participação de outros
interessados, não se configura o crime. As condições exigidas no instrumento
convocatório devem ser restringidas a ponto de afastar outros interessados que
poderiam se habilitar caso a licitação não fosse direcionada. Se a falta de outros
concorrentes não ocorrer por direcionamento do edital ou por qualquer manobra
fraudulenta comprovada, não há crime.

1.3. Elemento Subjetivo:

Direito penal das licitações - Cezar Roberto Bitencourt 7:

O elemento subjetivo geral deste crime do art. 90 é o dolo, representado


pela vontade livre e consciente de frustrar ou fraudar, por qualquer meio
fraudulento (mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente), o
caráter competitivo de procedimento licitatório. Essa vontade consciente deve
abranger não apenas a ação como também o meio fraudulento, a natureza
competitiva do procedimento licitatório, além da vantagem decorrente da
adjudicação do objeto da licitação.
É necessário que o agente tenha consciência de que obtém uma vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação, pois sem essa consciência ou sem
a vantagem a conduta será atípica. Não há previsão de modalidade culposa desta
infração penal, consequentemente, ainda que os fatos tenham ocorrido, e inclusive
resultado vantagem, a ausência de dolo afasta a adequação típica, pela falta de
previsão da modalidade culposa.
Faz-se necessário, ainda, o elemento subjetivo especial do tipo,
constituído pelo especial fim de obter, para si ou para outrem, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Assim, a prática de
qualquer das condutas que frustre ou fraude o procedimento licitatório não
caracterizará este crime, sem visar a obtenção da vantagem mencionada. A
simples ação produtora da frustração ou da fraude da licitação ou, principalmente,
do caráter competitivo do procedimento licitatório não tipificará esta conduta.
Nesse sentido, o magistério de Paulo José da Costa Jr.: “Sem essa tendência
interna transcendente, e obtenção de uma vantagem econômica com a adjudicação,
não se perfaz o crime”.
No entanto, convém destacar, para que a conduta seja típica não é necessário
que a vantagem pretendida seja alcançada, sendo suficiente que exista, com fim

7 PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019. p. 412.
especial, na mente do sujeito ativo (...). Na verdade, como temos sustentado, “o
especial fim ou motivo de agir, embora amplie o aspecto subjetivo do tipo, não
integra o dolo nem com ele se confunde, uma vez que, como vimos, o dolo esgota-
se com a consciência e a vontade de realizar a ação com a finalidade de obter o
resultado delituoso, ou na assunção do risco de produzi-lo. O especial fim de agir
que integra determinadas definições de delitos condiciona ou fundamenta a
ilicitude do fato, constituindo, assim, elemento subjetivo do tipo de ilícito, de
forma autônoma e independente do dolo. A denominação correta, por isso, é
elemento subjetivo especial do tipo ou elemento subjetivo especial do injusto, que
se equivalem, porque pertencem, ao mesmo tempo, à ilicitude e ao tipo que a ela
corresponde.
A ausência desses elementos subjetivos especiais descaracteriza o tipo
subjetivo, independentemente da presença do dolo. Enquanto o dolo deve
materializar-se no fato típico, os elementos subjetivos especiais do tipo
especificam o dolo, sem necessidade de se concretizarem, sendo suficiente que
existam no psiquismo do autor, isto é, desde que a conduta tenha sido orientada
por essa finalidade específica”.
Enfim, as condutas de frustrar ou fraudar constantes do art. 90, sem o fim
especial, poderão, eventualmente, adequar-se à proibição inserta ou no art. 93 ou
no art. 95, dependendo das demais circunstâncias.

Direito Penal Econômico - Luiz Regis Prado8:

A tipicidade subjetiva vem representada pelo dolo, consubstanciado na


consciência e vontade de realização dos elementos objetivos do tipo, bem como
pelo elemento subjetivo do injusto, presente na expressão com o intuito de obter,
para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da
licitação. Trata-se de um especial fim de agir, diverso do dolo, essencial para a
conformação típica da referida conduta. A vantagem decorre da adjudicação do
objeto da licitação. A adjudicação do objeto licitatório é, por assim dizer, o ato de
confirmação do vencimento da proposta de um determinado concorrente. Por meio
da adjudicação, o objeto licitado (v.g., a prestação de um serviço) é cedido ao
vendedor (agora, adjudicatário). Não é, todavia, o ato de assinatura do contrato. A
vantagem almejada não precisa ser econômica, patrimonial, tampouco atingida
efetivamente. Na mesma linha, assevera-se que esse proveito ambicionado não se
confunde sequer com o ato de contratação. Certamente, a perspectiva da vantagem
advém da adjudicação (ato anterior à contratação), mas é perceptível por outros
sujeitos, distintos do contratante. Isso ocorre comumente com o acordo ou ajuste
entre os próprios concorrentes, com ou sem a participação do agente público,
visando a participação no lucro, prevalência em futura licitação etc.

1.4. Momento Consumativo:

Direito penal das licitações - Cezar Roberto Bitencourt 9:

8 PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019. p. 411/412.
9 PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico. 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019. p. 411.
Na modalidade de “frustrar”, à evidência, somente se consuma a infração com o
efetivo impedimento da realização do procedimento licitatório, pois o seu não
impedimento poderá, no máximo, configurar a figura tentada. Por outro lado, na
modalidade de “fraudar”, a situação não é muito diferente: a conduta fraudulenta
precisa resultar materializada em ato, fato ou documento que comprove sua
concretização. Não se pode confundir, para efeito de consumação, a materialização
da frustração ou da fraude com a efetiva obtenção da vantagem referida no
dispositivo legal, na medida que dita vantagem representa somente o fim especial
da ação, que, como tal, não precisa se concretizar, sendo suficiente que exista no
psiquismo do agente, isto é, que seja o móvel da ação. Na verdade, tampouco é
necessário à consumação que ocorra prejuízo econômico, o qual, se vier a existir,
representará somente o exaurimento do crime.

Tratando-se de crime material, com iter criminis claramente constatável, é


perfeitamente possível a ocorrência da figura tentada, que a casuística permitirá
sua comprovação. Contudo, convém ressaltar que o simples “ajuste” ou
“combinação”, por si só, são impuníveis, se o crime não for, pelo menos, iniciado
(art. 31 do CP). Para que exista tentativa punível é indispensável que haja, pelo
menos, o início da execução do iter criminis. Admitimos uma certa dificuldade
para distinguir simples atos preparatórios dos atos já executórios, especialmente
quando o legislador opta por utilizar esses verbos excepcionados no art. 31 do CP,
como ocorre nesta figura penal, a exemplo do que também acontece com a
previsão do art. 11 daquele diploma legal (induzimento, instigação, ou auxílio ao
suicídio).

Direito Penal Econômico - Luiz Regis Prado10:

O delito se consuma com a efetiva frustração ou fraude ao caráter


competitivo da licitação, ainda que não se verifique a obtenção de vantagem
decorrente da adjudicação. Isso ocorre com a realização do procedimento
licitatório cuja competitividade está fraudada ou frustrada por meio de ajuste,
combinação ou qualquer expediente utilizado para tal fim (crime de resultado). A
tentativa é admissível.

Direito penal econômico - Luciano Anderson de Souza e Marina Pinhão Coelho Araújo 11:

A consumação do crime depende do início do certame, ou seja, se forem


praticados atos fraudulentos prévios ao início do procedimento e esse não vier a
acontecer (por exemplo, porque houve impugnação judicial), vislumbra-se
meramente a tentativa [...].

10 SOUZA, Luciano Anderson de; ARAÚJO, Marina Pinhão Coelho. Direito Penal Econômico: Leis Penais Especiais. Vol. 2.
São Paulo: Thomas Reuters Brasil, 2020. p. 167.
11 SOUZA, Luciano Anderson de; ARAÚJO, Marina Pinhão Coelho. Direito Penal Econômico: Leis Penais Especiais. Vol. 2.
São Paulo: Thomas Reuters Brasil, 2020. p. 163.
Comentários à Lei 8.666 - Marçal Justen Filho12:

A primeira modalidade (frustrar) aperfeiçoa-se através da conduta que impede a


disputa no procedimento licitatório. Pode verificar-se inclusive quando o servidor
público introduz cláusulas no ato convocatório da licitação, destinadas a assegurar
a vitória de um determinado licitante. Mas também envolve qualquer outra
conduta praticada por algum sujeito privado (participante ou não da licitação) que
disponha de poderes jurídicos ou de condições materiais para impedir a
competição inerente à licitação. O tipo penal não se configura quando a conduta
conducente à frustração da competição traduz o exercício regular de um direito.
Assim, por exemplo, não se configurará o crime quando uma instituição bancária
se recusar a fornecer o financiamento necessário a uma empresa que deseje
participar da licitação.

A segunda modalidade (fraudar) envolve o ardil pelo qual o sujeito impede a


eficácia da competição.

A lei refere-se expressamente ao ajuste ou combinação. Normalmente, essa


hipótese concretiza-se quando diversos licitantes arranjam acordo para determinar
a vitória de um deles. Porém, são criminalmente reprováveis também acordos
“parciais”, nos quais os licitantes estabeleçam condições “paralelas” às previstas
no ato convocatório.

Não é necessário que haja frustração ou fraude que comprometa a eficácia total da
licitação. É suficiente que alguns dos aspectos do certame sejam atingidos.

O crime aperfeiçoa-se inclusive quando o acordo se destina a excluir da disputa


participantes potenciais e inexistir uma definição prévia sobre qual dos
concertantes será o vencedor. [...]

A invalidação do certame não exclui a configuração do crime.

2. Jurisprudência

2.1. STF

Ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.


ART. 90 DA LEI 8.666/1993. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ART. 288 DO CÓDIGO PENAL.
INÉPCIA DA INICIAL. FALTA DE INDICAÇÃO INDIVIDUALIZADA DAS CONDUTAS
DELITIVAS. NÃO OCORRÊNCIA. FRAUDE À LICITAÇÃO. CRIME FORMAL.
INVIABILIDADE DE ANÁLISE DE FATOS E PROVAS NA VIA DO HABEAS CORPUS.
PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA.
1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de que a extinção da ação penal, de
forma prematura, pela via do habeas corpus, somente se dá em hipóteses excepcionais, nas quais seja
12 SOUZA, Luciano Anderson de; ARAÚJO, Marina Pinhão Coelho. Direito Penal Econômico: Leis Penais Especiais. Vol. 2.
São Paulo: Thomas Reuters Brasil, 2020. p. 163/164 e 166.
patente (a) a atipicidade da conduta; (b) a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade
delitivas; ou (c) a presença de alguma causa extintiva da punibilidade.
2. A inicial acusatória narrou de forma individualizada e objetiva as condutas atribuídas ao paciente,
adequando-as, em tese, aos tipos descritos na peça acusatória.
3. O Plenário desta Corte já decidiu que o delito previsto no art. 90 da Lei 8.666/1993 é formal,
cuja consumação dá-se mediante o mero ajuste, combinação ou adoção de qualquer outro
expediente com o fim de fraudar ou frustrar o caráter competitivo da licitação, com o intuito de
obter vantagem, para si ou para outrem, decorrente da adjudicação do seu objeto, de modo que
a consumação do delito independe da homologação do procedimento licitatório.
4. Não há como avançar nas alegações postas na impetração acerca da ausência de indícios de autoria,
questão que demandaria o revolvimento de fatos e provas, o que é inviável em sede de habeas corpus.
Como se sabe, cabe às instâncias ordinárias proceder ao exame dos elementos probatórios colhidos
sob o crivo do contraditório e conferirem a definição jurídica adequada para os fatos que restaram
devidamente comprovados. Não convém, portanto, antecipar-se ao pronunciamento das instâncias
ordinárias, sob pena de distorção do modelo constitucional de competências.
5. Ordem denegada.
(HC 116680, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 18/12/2013, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-030 DIVULG 12-02-2014 PUBLIC 13-02-2014)

Trecho do voto:

3. Relativamente ao delito do art. 90 da Lei 8.666/1993, o Plenário do STF, ao


receber a denúncia no INQ 3.108/BA (Min. DIAS TOFFOLI, DJe de 22.03.2012),
assentou o entendimento no sentido de que se trata de crime formal, cuja
consumação dá-se mediante o mero ajuste, combinação ou adoção de
qualquer outro expediente com o fim de fraudar ou frustrar o caráter
competitivo da licitação, com o intuito de obter vantagem, para si ou para
outrem, decorrente da adjudicação do seu objeto, de modo que a consumação
do delito independe da homologação do procedimento licitatório. No mesmo
sentido: BALTAZAR, José Paulo. Crimes federais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado Editora, 2010, p. 509; NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e
processuais penais comentadas. volume I, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2013, p. 407), Assim, não há falar em atipicidade da conduta atribuída
ao acusado, pelo menos no exame de cognição restrita que é admitido na via do
habeas corpus.

x-x-x-x-x-x

Ementa PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. PARLAMENTAR FEDERAL.


DENÚNCIA OFERECIDA. ARTIGOS 89, CAPUT, E 90 DA LEI Nº 8.666/93 e ART. 1º, INCISOS
II E XIV, DO DL Nº 201/67. ARTIGO 41 DO CPP. INDÍCIOS DE AUTORIA E
MATERIALIDADE DELITIVA. CONFORMIDADE ENTRE OS FATOS DESCRITOS NA
EXORDIAL ACUSATÓRIA E O TIPO PREVISTO NO ART. 90 DA LEI Nº 8.666/93.
PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. PECULATO DE USO (ART. 1º, II, DO DL 201/67). AUSÊNCIA
DE ADEQUAÇÃO TÍPICA. CORREÇÃO DA CAPITULAÇÃO EMPREENDIDA NA
DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NEGATIVA DE EXECUÇÃO DE LEI (ART. 1º, XIV, DO DL
Nº 201/67). CONSUNÇÃO RECONHECIDA. MANIFESTA AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO
TÍPICA QUANTO AO CRIME DO ART. 89 DA LEI N° 8.666/93. RECEBIMENTO PARCIAL DA
DENÚNCIA.
1. A questão submetida ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato probatório
mínimo que autorize a deflagração da ação penal contra o denunciado, levando em consideração o
preenchimento dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não incidindo qualquer uma das
hipóteses do art. 395 do mesmo diploma legal.
2. A denúncia somente pode ser rejeitada quando a imputação se referir a fato atípico, certo e
delimitado, apreciável desde logo, sem necessidade de produção de qualquer meio de prova, eis que o
juízo acerca da correspondência do fato à norma jurídica é de cognição imediata, incidente, partindo-
se do pressuposto de sua veracidade, tal como se dá na peça acusatória.
3. As imputações feitas ao denunciado na denúncia, foram de, na condição de prefeito
municipal, haver fraudado licitações e se utilizado indevidamente em favor de terceiros de
valores do erário.
4. Encontram-se preenchidos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, havendo justa
causa para a deflagração da ação penal em relação ao crime previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93.
5. No peculato de uso, previsto no inciso II do art. 1º do DL nº 201/67, o sujeito ativo do crime
utiliza-se, ilicitamente, de bens, rendas ou serviços públicos, em seu proveito ou de terceiros, agente
público ou não. Não se pode falar em peculato de uso quando versar sobre dinheiro, ou seja, coisa
fungível. Se o funcionário usar dinheiro que tem sob sua guarda para seu próprio benefício, pratica o
delito de peculato.
6. Inviável, no caso, a alteração excepcional na classificação do fato descrito na denúncia, dada a
ausência de conformidade entre os fatos e os demais crimes previstos no Decreto-lei nº 201/67.
7. Se um crime é meio necessário ou fase normal de preparação ou de execução de outro crime,
encontrando-se, portanto, o fato previsto em uma lei inserido em outro de maior amplitude, permite-se
apenas uma única tipificação, por óbvio, a mais ampla e específica (por força do fenômeno da
consunção): no caso em exame, exatamente a do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93, não se
legitimando o processamento e o julgamento do denunciado por dois crimes distintos.
8. Não se cuida, na espécie, de imputação de crimes decorrentes da dispensa ou inexigibilidade
indevidas de licitação, mas de fraudes decorrentes da adoção de modalidade imprópria de certame
licitatório, não havendo, a esse respeito, a devida e necessária conformação e correlação entre os fatos
e o tipo penal que se diz violado.
9. Denúncia recebida em parte.
(Inq 3108, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/2011, ACÓRDÃO
ELETRÔNICO DJe-059 DIVULG 21-03-2012 PUBLIC 22-03-2012)

trecho do voto:
A doutrina sustenta que sua consumação dá-se com o mero ajuste,
combinação ou adoção do expediente no procedimento da licitação,
“independentemente da efetiva adjudicação ou obtenção da vantagem
econômica, sendo o crime formal, como resulta claro da leitura do tipo, ao
afirmar a tipicidade da conduta praticada ‘com intuito de obter’ a vantagem”
(Baltazar Jr., José Paulo, Crimes Federais. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010. p. 508).
[...]
Nessa conformidade, perfeitamente apta ao recebimento a exordial acusatória no
que toca a essa infração.
2.2. STJ:

Súmula 645 do STJ: O crime de fraude à licitação é formal, e sua consumação prescinde da
comprovação do prejuízo ou da obtenção de vantagem. (SÚMULA 645, TERCEIRA SEÇÃO, julgado
em 10/02/2021, DJe 17/02/2021)

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JURISPRUDÊNCIA EM TESES (STJ), EDIÇÃO N. 134: DOS CRIMES DA LEI DE


LICITAÇÃO - LEI N. 8.666/1993: 8) Em relação ao delito previsto no art. 90 da Lei n. 8.666/1993,
o termo inicial para contagem do prazo prescricional deve ser a data em que o contrato
administrativo foi efetivamente assinado.

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. FRAUDE À LICITAÇÃO


(ART. 90 DA LEI N. 8.666/1993). PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM ABSTRATO.
NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL PARA CONTAGEM. ASSINATURA DO
CONTRATO ADMINISTRATIVO. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que, em relação ao delito previsto no art.
90 da lei n. 8.666/1993, o termo inicial para contagem do prazo prescricional deve ser a data em
que o contrato administrativo foi efetivamente assinado. Nesse sentido: MS 15.036/DF, Rel.
Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/11/2010, DJe 22/11/2010; e HC
484.690/SC, deste Relator, QUINTA TURMA, julgado em 30/5/2019, DJe 4/6/2019.
2. No caso em exame, tendo sido o contrato administrativo assinado em 17/12/2010 e a denúncia
recebida em 10/12/2018, não transcorreu o prazo prescricional de 8 anos (art. 109, inciso IV, do
Código Penal).
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no RHC 136.462/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em
02/02/2021, DJe 08/02/2021)

Trecho do voto condutor (grifos originais):

Não obstante, permanece válido o segundo fundamento ancorado na decisão


monocrática, a respeito do termo inicial para a contagem do prazo
prescricional. Muito embora a defesa entenda que deva ser adotado a data da
publicação do edital licitatório, esta Corte Superior já expressou orientação no
sentido de que o momento de consumação do delito do art. 90 da Lei 8.666/93
ocorre com a assinatura do contrato administrativo. Na hipótese, tendo sido o
contrato administrativo assinado em 17/12/2010 e a denúncia recebida em
10/12/2018, não transcorreu o prazo prescricional de 8 anos (art. 109, inciso IV, do
Código Penal).
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PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


FRAUDE À LICITAÇÃO E PECULATO.
ATIPICIDADE. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO DELINEADO NOS AUTOS.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DO DOLO
ESPECÍFICO.
CRIME DE FRAUDE À LICITAÇÃO. DESNECESSIDADE NA HIPÓTESE DESSE ILÍCITO
PENAL. CRIME DE PECULATO. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVA DA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - Entender de modo contrário ao estabelecido pelo Tribunal a quo e absolvê-la da imputação pelos
crimes de fraude à licitação e peculato, como pretende a agravante, demandaria, necessariamente, o
revolvimento, no presente recurso, do material fático-probatório dos autos, providência inviável nesta
instância.
II - No tocante à desnecessidade de demonstração do dolo específico de causar dano ao erário e
do dano, o acórdão recorrido está em consonância com a orientação jurisprudencial desta Corte
no sentido de que o delito de fraude à licitação (art. 90 da Lei n. 8.666/1993) é formal, bastando
para se consumar a demonstração de que a competição foi frustrada, independentemente de
demonstração de recebimento de vantagem indevida pelo agente e comprovação de dano ao
erário (HC n. 341.341/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 30/10/2018).
III - Ademais, a tese relativa à ausência de descrição de dolo especifico se relaciona diretamente com
o mérito da acusação, demandando, para sua análise, revolvimento fático-probatório, providência
sabidamente incabível em razão do óbice da Súmula 7/STJ.
Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 1952718/MS, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 16/11/2021, DJe 25/11/2021)

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL EM HABEAS


CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MEDIDA EXCEPCIONAL. INÉPCIA DA
DENÚNCIA NÃO DEMONSTRADA. PRESCRIÇÃO QUANTO À IMPUTAÇÃO DO DELITO DE
FRAUDE À LICITAÇÃO. NÃO EVIDENCIADO, DE PLANO, O TRANSCURSO DE LAPSO
TEMPORAL SUFICIENTE PARA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. O entendimento pacífico desta Corte é de que o trancamento da ação penal pela via do habeas
corpus e do recurso em habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos
autos, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, que há imputação de
fato penalmente atípico, a inexistência de qualquer elemento indiciário demonstrativo de autoria e
materialidade do delito ou, ainda, a extinção da punibilidade.
2. No caso, a denúncia atende aos requisitos legais do art. 41 do Código de Processo Penal de forma
suficiente para a deflagração da ação penal, pois apresenta os elementos para a tipificação dos crimes
em tese, bem como os indícios de envolvimento da Recorrente com os fatos delituosos, sendo
assegurado o livre exercício do contraditório e da ampla defesa.
3. Foi indicada a existência de vínculo duradouro e, inclusive, anterior aos fatos ora imputados, entre
a Recorrente, o suposto líder do grupo criminoso (então Prefeito à época dos fatos) e os demais
Denunciados. Foram apontados, também, indícios de irregularidades na Concorrência Pública n.
006/2009, realizada na gestão do ex-Prefeito, dentre essas a inclusão de condições restritivas no edital
e vícios nas fases de julgamento e recursal, que teriam impedido o caráter competitivo do
procedimento licitatório, favorecendo a empresa, cujo quadro societário foi alterado uma semana após
a assinatura do contrato com a Prefeitura de Belém, mediante a inclusão da ora Recorrente como
sócia, sendo a referida empresa beneficiária de valores públicos durante os anos de 2009 a 2012. Por
fim, foi destacada a incomum multiplicação do patrimônio pessoal declarado pela Ré.
4. Apesar de a jurisprudência desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal entender
que os crimes previstos na Lei de Licitações são instantâneos de efeitos permanentes, que se
consumam em um momento definido, cada prorrogação contratual configura continuação da
prática delituosa, na medida em que a situação de dano prolonga-se enquanto durar a conduta
do Agente, como parece ser o caso, em que foi relatado na inicial acusatória a existência de "oito
aditivos durante a gestão de DUCIOMAR, sendo rescindido em 10/01/2014".
5. Como não foi proferida sentença, deve-se considerar, para efeitos de contagem do prazo
prescricional, a pena máxima in abstrato cominada para o crime do art. 90 da Lei n. 8.666/1993, qual
seja, 4 (quatro) anos de reclusão. Assim, embora os fatos tenham ocorrido a partir de fevereiro de
2009, não é possível afirmar o transcurso do prazo prescricional de 8 (oito) anos (art. 109, inciso IV,
do Código Penal) entre a data da assinatura do último aditivo contratual - realizado durante a gestão
do ex-Prefeito (2005 a 2012) - e a data do recebimento da denúncia (25/02/2019), ou entre esta e a
data de hoje, logo, a pretensão punitiva estatal não está fulminada pelo instituto da prescrição.
6. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no RHC 134.111/PA, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em
14/10/2021, DJe 19/10/2021)

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FRAUDE AO CERTAME LICITATÓRIO.


TIPICIDADE. DANO AO ERÁRIO. INEXIGIBILIDADE. 1. A orientação dominante desta Corte
Superior é no sentido de que o art. 90 da Lei n. 8.666/1993 estabelece um "crime em que o
resultado exigido pelo tipo penal não demanda a ocorrência de prejuízo econômico para o poder
público, haja vista que a prática delitiva se aperfeiçoa com a simples quebra do caráter
competitivo entre os licitantes interessados em contratar, ocasionada com a frustração ou com a
fraude no procedimento licitatório" (REsp n. 1.498.982/SC, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, 6ª
T., DJe 18/04/2016) CRIME DE PECULATO. AUTORIA E MATERIALIDADE. SÚMULA 7 DO
STJ.
1. O Tribunal local, após aprofundada análise dos elementos colhidos no curso da instrução criminal,
concluiu que restou provada a materialidade e a autoria que dão suporte à condenação do réu pelo
crime de peculato e, entender de modo diverso, no intuito de abrigar o pleito defensivo de absolvição
do acusado demandaria o revolvimento no material fático-probatório, providência exclusiva das
instâncias ordinárias e vedada a este Sodalício em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7
do STJ. LICITAÇÃO.
FRAUDE. PECULATO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE.
1. Firmou-se neste Sodalício que "Reconhecida a autonomia dos desígnios do paciente e a distinção
dos bens jurídicos tutelados pelas normas penais, evidencia-se, no caso, a inaplicabilidade do
princípio da consunção, dada a ocorrência isolada dos crimes, o que torna a inviável a absorção de um
delito pelo outro" (HC 415.900/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado
em 20/02/2018, DJe 26/02/2018).
DOSIMETRIA. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. CULPABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO
IDÔNEA.
1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que a pena-base pode ser exasperada pelo magistrado no
seu exercício discricionário juridicamente vinculado, mediante aferição negativa dos elementos
concretos dos autos a denotar maior reprovabilidade da conduta imputada.
2. A Corte estadual considerou desfavorável ao acusado para ambas as condutas imputadas, a vetorial
da culpabilidade, diante da destacada função exercida pelo agente na empreitada criminosa por ser
considerado um de seus principais artífices e beneficiários.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1728967/RN, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em
23/04/2019, DJe 07/05/2019)

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HABEAS CORPUS. CRIMES COMETIDOS EM LICITAÇÕES. ADITAMENTO. FATOS


NARRADOS NA DENÚNCIA. EXCLUSÃO DE CRIME DE RESPONSABILIDADE. FATOS
INCÓLUMES COMO FENÔMENOS DA REALIDADE. QUEBRA DO CARÁTER
COMPETITIVO DA LICITAÇÃO. PREJUÍZO ECONÔMICO AO ERÁRIO. DESNECESSIDADE.
1. Oferecida a denúncia e havendo posterior aditamento a ela, eventual exclusão de determinado
crime descrito inicialmente, antes do aditamento, não significa que devam ser desconsiderados todos
os fatos narrados na peça acusatória que lhe diziam respeito, haja vista permanecerem incólumes
como fenômenos da realidade. Tanto é que, em regra, o acusado se defende da descrição fática, e não
da capitulação jurídica contida na denúncia.
2. O objeto jurídico que se objetiva tutelar com o art. 90 da Lei n. 8.666/1993 é a lisura das
licitações e dos contratos com a Administração, notadamente a conduta ética e o respeito que
devem pautar o administrador em relação às pessoas que pretendem contratar com a
Administração, participando de procedimento licitatório livre de vícios que prejudiquem a
igualdade, aqui entendida sob o viés da moralidade e da isonomia administrativas.
3. Trata-se de crime em que o resultado exigido pelo tipo penal não demanda a ocorrência de
prejuízo econômico para o poder público, haja vista que a prática delitiva se aperfeiçoa com a
simples quebra do caráter competitivo entre os licitantes interessados em contratar, ocasionada
com a frustração ou com a fraude no procedimento licitatório.
4. Habeas corpus não conhecido."
(HC 352.984/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 30/06/2016, DJe 08/09/2016; nossos os
grifos.)

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PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO.


INADEQUAÇÃO. CRIME DE FRUSTRAÇÃO DO CARÁTER COMPETITIVO DE
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO MEDIANTE PRÉVIO AJUSTE (LEI N. 8.666/1993, ART. 90).
INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA. INEXISTÊNCIA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO
ART. 41 DO CPP. LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO PARA ADMISSIBILIDADE DA
DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...]
3. In concreto, a inicial acusatória preenche os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP, porquanto
descreve detalhadamente os elementos essenciais das condutas do réu de fraudar o caráter competitivo
do procedimento licitatório. Nos termos da denúncia, na condição de Presidente da Câmara dos
Vereadores, homologou e adjudicou o certame em favor de empresa, cujos proprietários eram os
mesmos das outras duas licitantes.
4. Hipótese em que a dinâmica dos fatos não permite concluir, de forma peremptória, pela inépcia da
denúncia, uma vez que os fatos ali narrados encontram-se devidamente explicitados e fundamentados,
possibilitando a ampla defesa do denunciado.
5. Ressalte-se que os indícios de autoria imputados ao paciente não implicam sua condenação
antecipada, o que indicaria inarredável ilegalidade. Muito pelo contrário, o órgão ministerial, diante
da materialidade do crime e dos indícios de autoria, ao promover a denúncia, mostrou-se cumpridor
do desiderato da obrigatoriedade da ação penal pública incondicionada.
6. A jurisprudência dos tribunais superiores admite o trancamento do inquérito policial ou de ação
penal, excepcionalmente, nas hipóteses em que se constata, sem o revolvimento de matéria fático-
probatória, a ausência de indícios de autoria e de prova da materialidade, a atipicidade da conduta ou a
extinção da punibilidade, o que não se observa neste caso.
7. O crime do art. 90 da Lei n. 8.666/1993 é formal, ou de consumação antecipada, bastando a
frustração do caráter competitivo do procedimento licitatório com o mero ajuste, combinação
ou outro expediente finalidade específica (elemento subjetivo do tipo) de obter vantagem
decorrente do objeto de adjudicação, para si ou para outrem. Despicienda, pois, a efetiva
obtenção da vantagem com a adjudicação do objeto licitado para futura e eventual contratação
ou o prejuízo à Administração Pública.
8. Habeas corpus não conhecido.
(HC 300.910/PE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 27/02/2018,
DJe 06/03/2018)

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FRAUDE À LICITAÇÃO. INÉPCIA DA


DENÚNCIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PROVA. PARTICIPAÇÃO DIRETA DO RÉU.
SÚMULA N. 7/STJ. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO. AGRAVANTE
GENÉRICA (ART. 61, II, G, CP). BIS IN IDEM. NÃO CONFIGURADO. AGRAVO
DESPROVIDO.
1. A alegação de inépcia da denúncia fica superada com a superveniente prolação da sentença
condenatória, na qual houve exaustivo juízo de mérito acerca dos fatos delituosos denunciados.
Precedentes.
2. A análise do tema relativo à ausência de indicação de prova da participação direta do réu na prática
do delito é inviável em recurso especial, por demandar o revolvimento do conjunto fático-probatório
dos autos, providência vedada na espécie ut Súmula n. 7/STJ.
3. Consoante orientação jurisprudencial desta Corte, o delito descrito no art. 90 da Lei n.
8.666/1993, é formal, bastando para se consumar a demonstração de que a competição foi
frustrada, independentemente de demostração de recebimento de vantagem indevida pelo
agente e comprovação de dano ao erário (HC 341.341/MG, Rel. Ministro JOEL ILAN
PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 30/10/2018).
4. É perfeitamente factível a incidência da agravante genérica prevista no art. 61, II, g, do Código
Penal no crime de fraude em licitação, porquanto foi violado dever inerente à função pública que o
recorrente exercia, circunstância que não integra o tipo previsto no art. 90 da Lei n. 8.666/1993 (REsp
1484415/DF, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2015,
DJe 22/02/2016).
5. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1793069/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em
10/09/2019, DJe 19/09/2019).

2.3. TRF-5:

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DO ART. 90 DA LEI 8.666/93. FRUSTRAÇÃO DO


CARÁTER COMPETITIVO DE LICITAÇÃO. FRAUDE À LICITAÇÃO. FORMA TENTADA.
NATUREZA FORMAL. PENALIDADE DE MULTA. SITUAÇÃO FINANCEIRA DO RÉU E
GRAU DE CULPABILIDADE. APELAÇÕES IMPROVIDAS.
1. Recursos de apelação interpostos em face de sentença que julgou procedente a pretensão acusatória
para condenar ambos os réus pelo crime previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93 (frustrar ou fraudar,
mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento
licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do
objeto da licitação), à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de detenção,
substituída por suas penas restritivas de direito, e multa, no valor de R$4.000,00 (quatro mil reais).
2. No caso presente, a conduta deflagrada para a fraude à licitação se deu com plena superação das
etapas de cogitação, preparação e execução, não tendo ocorrido a adjudicação em virtude de aferição
imediata do pregoeiro. É hipótese, portanto, de tentativa perfeita.
3. O conjunto probatório dos autos mostra-se harmônico e coeso, composto de elementos hábeis a
demonstrar a prática da conduta delitiva pelos acusados. As partes tiveram ciência dos documentos
colhidos no curso do procedimento inquisitivo, sendo-lhes oportunizado se manifestar sobre essa
documentação, conforme impõe o princípio do contraditório que, neste caso, é adiado para o período
posterior à sua juntada aos autos.
4. Dentre o farto conteúdo probatório presente nos autos, os seguintes fatos documentados no caderno
processual ressaltam a prática do crime previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93: a) o objeto social da
empresa LUAR ENGENHARIA E SERVIÇOS LTDA EPP, contempla, praticamente, todas as
modalidades de serviços com perspectiva de oferta a órgão público, incluindo, dentre outras, atuação
na construção civil, limpeza, impressão, alimentação, venda e locação de móveis e imóveis e até
mesmo organização de concurso público, abrangendo uma extensa gama de atividades; b) no contrato
social da empresa NORDESTE ASSESSORIA E CONSULTORIA DE MATERIAL DE
CONSTRUÇÕES verifica-se que se trata de EIRELE-ME, com objeto social significativamente
amplo e praticamente semelhante ao objeto social da LUAR ENGENHARIA E SERVIÇOS LTDA
EPP; c) a carta de proposta apresentada pela LUAR ENGENHARIA E SERVIÇOS LTDA EPP
aponta de forma expressa, como preposto, responsável pela assinatura do contrato, o esposo da dita
proprietária da NORDESTE ASSESSORIA E CONSULTORIA DE MATERIAL DE
CONSTRUÇÕES; d) nos autos, há cópia de procuração que conferiu amplos poderes para que a dita
proprietária da NORDESTE ASSESSORIA E CONSULTORIA DE MATERIAL DE
CONSTRUÇÕES pudesse representar a empresa LUAR ENGENHARIA E SERVIÇOS LTDA
perante estabelecimentos bancários e repartições públicas; e) os documentos relacionados à empresa
NORDESTE ASSESSORIA contêm em seu bojo o nome da empresa LUAR ENGENHARIA E
SERVIÇOS LTDA, o mesmo logradouro de sua sede, além de conter o mesmo endereço eletrônico; f)
proposta de preços apresentada pela LUAR ENGENHARIA E SERVIÇOS LTDA EPP, no Pregão
Eletrônico nº 16/2012 - correspondente apenas ao material a ser fornecido na correspondente licitação
-, compreende o valor de R$ 782.773,00 (setecentos e oitenta e dois mil, setecentos e setenta e três
reais).
5. Durante o contraditório promovido na fase judicial, os demandados não conseguiram infirmar as
provas presentes no Inquérito Policial, não havendo, desse modo, que se falar em insuficiência de
provas.
6. O convencimento do juiz adveio não só do conteúdo presente no Inquérito Policial, mas de todo o
conjunto probatório acostado e produzido conforme a legislação pertinente.
7. A conduta descrita no art. 90 da Lei n.º 8.666/93 tem como elemento subjetivo o dolo
específico consubstanciado, na finalidade do agente em obter vantagem para si ou para outrem
em decorrência da frustração ou fraude do caráter competitivo da licitação, não havendo que se
falar que o crime em comento possui natureza material. Trata-se de tipo penal formal, na
medida em que não se exige resultado naturalístico para a consumação, que corresponde ao
efetivo prejuízo para a Administração. O relevante para consumação desse tipo penal é eliminar
a competição ou promover uma ilusória competição entre os participantes da licitação, por
qualquer mecanismo.
8. Para a caracterização do delito é suficiente a prova de que houve favorecimento com potencial de
frustrar ou fraudar o caráter competitivo da licitação em benefício de terceiro ou do próprio agente,
restando comprovado, in casu, que as condutas dos réus tiveram o claro intuito de fraudar o
procedimento licitatório realizado pelo 1º Batalhão de Engenharia e Construção do Rio Grande do
Norte.
9. Na fixação da pena pecuniária dos delitos previstos na Lei de Licitações, deve o julgador observar o
teor do art. 99 da Lei nº 8.666/93, de forma a adotar valor percentual que corresponda à vantagem
efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. O juízo a quo atentou que a conduta foi
na modalidade tentada, na qual não se pode aquilatar o valor do prejuízo, razão pela qual ficou a
penalidade utilizando como parâmetros a situação financeira do réu, bem como o seu grau de
culpabilidade. Portanto, acertada a penalidade de multa fixada no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil
reais).
10. Deve ser mantida na íntegra a sentença que julgou procedente a pretensão acusatória para
condenar os réus como incursos nas penas do art. 90 da Lei nº 8.666/93 c/c o art. 14, parágrafo
único, do Código Penal.
11. Recursos de apelação improvidos.
(PROCESSO: 00000313320154058402, APELAÇÃO CRIMINAL, DESEMBARGADOR
FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 19/04/2018,
PUBLICAÇÃO: 03/05/2018)

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EMENTA PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE FRUSTRAÇÃO DE CARÁTER


COMPETITIVO DE LICITAÇÃO. CONDENAÇÃO. APELO DA DEFESA. INEXISTÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE FRUSTRAÇÃO, BEM COMO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO.
ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Trata-se de apelação criminal intentada pela defesa de LUCIANO DOS SANTOS SILVA em face
de sentença proferida pelo Juízo Federal da 8 Vara de Pernambuco, que cuidou de condená-lo pelo
cometimento do crime previsto no art. 90 da Lei de Licitações à pena privativa de liberdade de 02
anos de reclusão, além de multa.
2. Segundo a denúncia, o apelante, em 10/09/2013, de modo consciente e voluntário, tentara frustrar o
caráter competitivo de procedimento licitatório promovido pela Companhia de Desenvolvimento dos
Vales do São Francisco e Parnaíba - CODEVASF.
3. A conduta do apelante teria consistido, em suma, no seguinte: Na condição de proprietário da
empresa AUTOBYTE, o apelante teria exigido de Francisco Xavier Barbosa de Souza, representante
legal da empresa X MANUTENÇÃO EM MÁQUINAS LTDA.-ME, vantagem pecuniária na ordem
de 15% do valor global eventualmente adjudicado para que efetuasse a retirada de sua empresa
(AUTORYBE) da concorrência do Pregão Eletrônico n. 12/2013. Na tentativa de reforçar a fraude, o
apelante teria, ainda, enviado mensagem de texto (SMS) para o celular de Francisco indicando os
dados bancários para a realização do respectivo depósito.
4. Após a instrução processual penal, o juízo teria considerado presentes as provas de autoria e
materialidade delitivas, de modo proferira condenação.
5. Irresignada, a defesa apresentou apelo aduzindo, em suma, que: 1) o apelante não teria, de forma
alguma, frustrado o caráter competitivo do certame; 2) a licitação fora revogada em virtude de
indisponibilidade de recursos para a execução dos serviços, não tendo se falado em qualquer fraude,
quiçá perpetrada pelo apelante; 3) por fim, caso não reformada a sentença condenatória com a
absolvição, deveria, ao menos, a conduta ser classificada como a prevista no art. 93 da Lei de
Licitações (ID 4050000.27085113).
6. Rememorado em síntese, passemos a analisar o mérito.
7. Sem maiores delongas, verificamos, de pronto, que, para a configuração da materialidade delitiva,
imperioso se faz restar comprovado que determinado agente, de forma consciente e voluntária,
efetivamente frustrou o caráter competitivo de licitação.
8. Ocorre que, no caso em tela, tal frustração não restou comprovada, seja porque não foi a empresa
do apelante que ganhou o certame, seja mesmo porque, mais adiante, a própria licitação fora
revogada.
9. Dizendo de outro modo, não há provas efetivas de que o apelante, com sua conduta, tenha coibido,
impedido, enfim, frustrado o certame.
10. No máximo, estaríamos diante de uma tentativa a qual, todavia, esmaeceria diante da posterior
revogação da licitação, o que tornaria a tentativa, por assim dizer, inviável.
11. Por fim, não custa rememorar que não restou demonstrado dano e/ou prejuízo ao Erário, na
medida em que, como visto, a licitação fora revogada sem qualquer indicativo de pagamento
indevido, quiçá desvio de recursos. 12.Apelação provida para absolver o apelante.
(PROCESSO: 00004438620144058308, APELAÇÃO CRIMINAL, DESEMBARGADOR
FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 30/11/2021)

Voto vencido: “Em relação à (b) alegação de ausência de prejuízo, melhor sorte não socorre
ao apelante. Trata-se de crime formal,consoante se depreende da leitura do tipo, ao averbar
a tipicidade da conduta praticada com o intuito de obter a vantagem . Basta o ajuste, a
combinação ou a adoção do expediente no procedimento da licitação, independentemente
da efetiva adjudicação ou obtenção da vantagem econômica. Nesse sentido, precedente da
Egrégia 2ª Turma, in verbis: ‘25.Quanto ao prejuízo causado ao erário, o crime de fraude à
licitação é um crime de consumação antecipada, logo, não demanda a ocorrência de dano. O
crime do art. 90 da Lei n. 8.666/1993 é formal e prescinde da existência de prejuízo ao
erário, haja vista que o dano se revela pela simples quebra do caráter competitivo entre os
licitantes interessados em contratar, causada pela frustração ou pela fraude no
procedimento licitatório’ (TRF5, Segunda Turma, Relator Desembargador Leonardo
Carvalho, PJE 0000204-43.2008.4.05.8001, Data de julgamento: 22/06/2021)”.

Voto condutor: Sem maiores delongas, verificamos, de pronto, que, para a configuração da
materialidade delitiva, imperioso se faz restar comprovado que determinado agente, de
forma consciente e voluntária, efetivamente frustrou o caráter competitivo de licitação.
Ocorre que, no caso em tela, tal frustração não restou comprovada, seja porque não foi a
empresa do apelante que ganhou o certame, seja mesmo porque, mais adiante, a própria
licitação fora revogada. Dizendo de outro modo, não há provas efetivas de que o apelante,
com sua conduta, tenha coibido, impedido, enfim, frustrado o certame. No máximo,
estaríamos diante de uma tentativa a qual, todavia, esmaeceria diante da posterior
revogação da licitação, o que tornaria a tentativa, por assim dizer, inviável. Por fim, não
custa rememorar que não restou demonstrado dano e/ou prejuízo ao Erário, na medida em
que, como visto, a licitação fora revogada sem qualquer indicativo de pagamento indevido,
quiçá desvio de recursos.”

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