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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA SUPERIOR DE AGRICULTURA "LUIZ DE QUEIROZ"


DEPARTAMENTO DE AGROINDÚSTRIA, ALIMENTOS E NUTRIÇÃO

LAN-1444

PÓS-CAPTURA DO PESCADO - COMERCIALIZAÇÃO E ARMAZENAMENTO

CURSO DE GRADUAÇÃO

Profª Marília Oetterer

PIRACICABA, SP.
2

USP/ESALQ/LAN-1444
PÓS-CAPTURA DO PESCADO - COMERCIALIZAÇÃO E ARMAZENAMENTO

Profª Drª Marília Oetterer

1. Espécies e Entrepostos

A comercialização do pescado "in natura" é o objetivo deste estudo. Essa


comercialização é normalmente feita com o pescado na forma de fresco ou "in natura" pós
captura, para consumo imediato.
Do total da captura brasileira, cerca de 750 mil toneladas anuais, 80% são provenientes
da água do mar e destes, basicamente, 2/3 são comercializados "in natura". Os peixes de água
doce são 100% comercializados no estado de fresco. Assim, temos aproximadamente 500 mil
toneladas de pescado sendo comercializados anualmente no Brasil, dependendo sempre do uso
do gelo e de camaras frigoríficas.
O pescado é um produto altamente perecível, capturado por uma frota 70% artesanal e
que deve ser distribuido em um país tropical, de altas temperaturas. A infraestrutura de
distribuição fica prejudicada pela ausencia de uma rede de frio adequada em todo o país. A
precariedade da pesca permite o aparecimento dos intermediários ou atravessadores na
comercialização, que chegam a infracionar em até 300% o preço real do produto.
O esforço de pesca no Brasil se concentra nas espécies mais populares e que também
se destinam à industrialização como as sardinhas, os camarões e as lagostas, estes últimos
destinados à exportação.
O principal porto é o de Santos, SP, com tráfego de importação e exportação e que
recebe 80% da atividade do país.
Os armazéns para comercialização de peixes se localizam principalmente na região
sudeste.
O CEAGESP- Companhia de Entrepostos e Armazens Gerais do Estado de São Paulo é
o principal entreposto de pesca do pais. Ele se compõe de 17 frigoríficos distribuidos no Estado
de São Paulo. Do total da captura brasileira, 10% são comercializados no CEAGESP, sendo que
o volume diário de comercialização pode chegar a 200 mil Kg de pescado. Em São Paulo são
consumidos 70% do volume do CEAGESP.
O CEAGESP possui 4 câmaras frigoríficas com capacidade total de 350 toneladas. As
câmaras frigoríficas de armazenagem trabalham a temperaturas de -0,5 a -18ºC e as de
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congelamento a -38ºC. O entreposto oferece serviços de armazenamento dos peixes nas


câmaras, divulgação do preço do dia, fiscalização e fábrica de gelo (cerca de 1700 Kg diários de
gelo).
Consome-se no Brasil, particularmente em São Paulo, as seguintes espécies:
abrotea, anchova, anjo, atum, bagre, berbigão, betarra, bonito, cação, caçonete, camarão,
castanha, corvina, corimbatá, dourado, enguia, espada, merluza, gordo, lambari, linguado,
mandi, merluza, namorado, olhete, pacu, pescada, polvo, raia, sardinha, serra, tainha, tilápia,
traira, viola e xixarro.
O pescado de água doce comercializado no interior de São Paulo, é geralmente
proveniente de Mato Grosso como o pintado e dourado. Mandis, bagres e corimbatás são os
mais resistentes ao baixo DBO- demanda biológica de oxigênio na água.
Os peixes provenientes da piscicultura são carpas, tilápias, traíra, trairão, pacú,
corimbatá, entre outros, porém ainda não fazem parte das estatísticas de vendas. São utilizados
para pesca esportiva e produção de alevinos. As trutas são produzidas em fazendas especiais e
destinadas aos restaurantes e à exportação. As tilápias constituem a maior produção, em
volume, via piscicultura, praticada praticamente em todos os estados do país.

2. Manejo pós captura.

2.1 Operações preliminares.

O pescado capturado no mar chega ao "pier" para ser destinado ou à comercialização "in
natura" ou para ser industrializado.
Sempre o produto receberá a lavagem e seleção iniciais.
No caso da CIBRAZEM e do CEAGESP em Santos e São Paulo, respectivamente, e da
COMPESCA em Guarujá, existem esteiras de descarga que trabalham constantemente com
fluxos de água tratada com 5 mg/litro de hipoclorito.
Uma lavagem pode remover parte das bactérias do limo superficial, o que pode reduzir a
velocidade de deterioração. Os peixes lavados vão sendo recolhidos em caixas plásticas de
PVC, que não formam incrustações e são de fácil limpeza. As caixas vão sendo estocadas nas
câmaras frigoríficas com gelo.
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O camarão que se destina à indústria precisa ser lavado com jatos de água, pois na fase
adulta vive no fundo do mar, enterrando-se na areia e quando capturado traz resíduos de areia
e matéria orgânica que devem ser removidos para evitar a ação bacteriana.
No Brasil, normalmente, o pescado é comercializado inteiro, com algumas exceções, por
isso o cuidado com a manutenção do produto sob efeito do frio é imprescindível. O ideal seria a
evisceração e descabeçamento logo após a captura.
A evisceração elimina as bactérias e as enzimas digestivas, a lavagem subseqüente
deve eliminar os restos de sangue e de vísceras para que o efeito dessas operações seja
efetivo. O descabeçamento elimina boa parte da carga microbiana presente nas guelras.
Há países que trabalham com barcos fábricas, para peixes de maior tamanho e já os
trazem prontos para a descarga.
Os atuneiros e as traineiras brasileiras não estão equipados para este fim. Descabeça-se
cações, descabeça-se e eviscera-se lagostas destinadas à exportação (remoção do cefalotórax)
A primeira prática comum adotada no Brasil, foi a adição de metabissulfito de sódio em
pó em crustáceos a bordo dos barcos para evitar o escurecimento enzimático ou "black spot".
Hoje são utilizadas soluções de metabissulfito (NaHSO3) onde se mergulha o camarão, o que
evita problemas antigos de excesso de sulfito e "queima" em certos lotes. Quando se utiliza este
tratamento nos barcos, os camarões são descascados e eviscerados só após o desembarque.
Embora a rápida evisceração seja aconselhável, particularmente nos países tropicais, em
algumas embarcações pequenas o pescado não pode ser manipulado imediatamente após a
captura, haverá perda da qualidade, resultante do aumento da temperatura. No Brasil o que
agrava o problema da manipulação pós captura é a inexistência de rede de frio organizada e o
clima quente.

2.2 Uso do gelo

Ao sair da água o peixe viaja várias horas até a comercialização. O único meio de atrasar
a deterioração é usar um agente que freie as ações enzimáticas e evite as ações bacterianas
temporiamente. O frio é esse agente.
A estocagem a bordo com o uso do gelo pode ser feita a granel, sendo de 3:1 a
proporção peixe:gelo. Este sistema é usado para peixes pequenos e a espessura máxima das
camadas de peixes + gelo não deve ultrapassar 50 cm.
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Para peixes de maior valor comercial como a pescada, utilizada para elaboração de filés
congelados, armazena-se em prateleiras. Os peixes são colocados sobre um leito de gelo,
alternando caudas e cabeças, com a parte ventral para baixo, num total de duas ou tres
camadas de peixes intercaladas com gelo. A última camada deverá ser só de gelo. Serpentinas
o
que resfriam o ar, entre 1 e 2 C, nos porões onde estão as prateleiras, são ideais para a
manutenção da vida útil do gelo.
A estocagem em caixas é melhor pois evita pressões nos peixes. São caixas de 6 a 40
Kg, com dimensões padronizadas, para que possam ser empilhadas dentro dos porões, no cais
e na indústria. Essas caixas de plástico têm saídas para drenagem da água de fusão do gelo. As
camadas de peixes e gelo devem ser distribuídas sem deixar formar bolsões de ar; a última
camada deve ser de gelo.
Os tanques ou "containers" com água de mar refrigerada pelo gelo (C.S.W. - Chiled Sea
Water) ou em água do mar refrigerada por serpentinas (R.S.W. - Refrigerated Sea Water) são
as mais modernas formas de comercialização de pescado. Há homogeneização da estocagem e
da distribuição posterior, nos navios para exportação. Há mais homogeneidade no resfriamento,
menos deformação e ferimentos, além de menor contagem microbiana no pescado em relação
aos métodos tradicionais. Os "containers" podem ter dimensões de 100 a 2000 litros e ser feitos
de alumínio, cimento e fibra de vidro, com depósitos isolados por camadas de 5 cm de
poliuretano e reforçados externamente com uma camada de fibra de vidro. O gelo é colocado,
adicionado à agua do mar e agitado, segue o resfriamento do pescado sob agitação e a
estocagem no "container".
O uso do gelo em terra implica em se ter higiene no local de captura, como para o
pescado proveniente de pesca artesanal ou de tanques de piscicultura.
A origem da água, potável de preferência, o tamanho do gelo utilizado e a distribuição
dele, são fatores importantes a serem considerados.
O gelo vai atuar na redução da temperatura do pescado pelo contato direto, onde o calor
do pescado é transferido para o gelo e pela água de fusão do gelo, que ao derreter rouba calor
do pescado e do ar ambiente, ficando a água à mesma temperatura do gelo que a originou.
A indústria brasileira usa gelo em cubos e em escamas, o que é melhor. Os cubos
3
devem ter no máximo 1 cm em camadas intercaladas com o pescado, na proporção 1:1
o o
gelo:peixe. Na prática, com 1,5 Kg de peixes, a passagem de 20 C para 1 C será feita em 1h e
30 min.
o o
Para passar 1 Kg de água a 0 C em gelo também a 0 C, é necessário retirar-se 80 Kcal
(calor de solidificação). Se o pescado estiver em contato com o gelo parte do gelo passa à água
6

a 0oC, retirando do produto 80 Kcal por Kg de gelo fundido. A temperatura do pescado ficará
o o
tanto mais próxima de 0 C quanto mais frio estiver inicialmente e chegará a 0 C se houver
suficiente quantidade de gelo.

A quantidade teórica do gelo para resfriar um peso p de pescado será:

p × c × t
Kg de gelo = ------------------------
80

p = peso do pescado em Kg.


o
t = diferença entre a temperatura inicial do pescado e a final; C.
c = calor específico do pescado

o
O valor c é a quantidade de calor que deve ser retirada para reduzir em 1 C a
temperatura de 1Kg de produto. No caso de água e gelo este valor é de 1,0 e 0,5 Kcal,
o
respectivamente. O calor específico (Kcal / Kg C) para pescado varia de 0,72 para peixes
gordos como sardinha, manjuba e cavalinha; 0,80 para peixes semi gordos como corvina e
bonito.; 0,86 para peixes magros como cação, merluza e pescada ; e 0,86 para moluscos e
crustáceos (lagosta, camarão).

Exemplo: para resfriar 100 Kg de sardinhas:

o o
100 × 0,72 × (20 C - 0 C)
------------------------------------------------ = 18 Kg de gelo
80

Para resfriar 100 Kg de camarão:

o o
100 × 0,86 × (20 C - 0 C)
---------------------------------------------- = 21,5 Kg de gelo (relação teórica de
5:1)
7

80

O valor 80 ( Kcal), refere-se ao calor de solidificação, ou seja quantas calorias são


0 0
necessárias para a passagem de 1 kg de água a 0 C para 1 kg de gelo a 0 C.
Na prática, como nem todo gelo tem contacto com o pescado, recomenda-se a relação
de 3:1, peixe:gelo e em alguns casos 2:1.
O volume do gelo triturado ou em escamas vai depender do tamanho final dos pedaços.
3 3
A densidade de pedaços de 1 cm é de 0,618 ton/m . O gelo fino resfria mais rápido, no entanto
compacta-se facilmente dificultando o escoamento da água de fusão rica em microrganismos.
Se o gelo é fabricado em barras, os tanques com uma solução a baixa temperatura, de
o
-10 C deverá demorar 20 horas para congelar 25 Kg. Com solução constituida de NaCl
o
dissolvida em água, a temperatura pode chegar a - 21 C.
O gelo fabricado em escamas é proveniente de cilindros de paredes duplas, onde é
evaporado o refrigerante à pressão atmosférica. A água distribuida por aspersores na região
superior do cilindro, corre para baixo, na superfície externa formando uma camada de gelo que é
raspada.
A estocagem do pescado "in natura" para comercialização em peixarias e
supermercados deve ser feita em câmaras refrigeradas com uso de gelo e em vitrines com gelo
quando em exposição.

2.3 Estocagem do pescado no frio.

A estocagem sob refrigeração envolve o uso do gelo e da câmara fria quando se trata da
comercialização do pescado " in natura" . Já o uso de temperaturas de congelamento levam ao
produto designado pescado congelado e portanto é um produto industrializado que será
estudado com detalhes em disicplina optativa. Ver Tabela, a seguir.
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Tabela 1: ESTOCAGEM DO PESCADO NO FRIO

O
PRODUTO TEMPERATURA ( c) TEMPO DE VIDA ÚTIL

PEIXES COM GELO PARA


CONSUMO FRESCO +1a-1 10 A 12 DIAS
(na câmara)

FILÉS DE PEIXE PARA


CONSUMO FRESCO SEM +1a-1 2 DIAS
GELO (na câmara)

PEIXES GORDOS -15 a -18 4 MESES


CONGELADOS INTEIROS -25 a -30 6 a 8 MESES

PEIXES GORDOS CON-


GELADOS (GLAZEADOS) -15 a -18 6 a 8 MESES
COM ANTIOXIDANTE

PEIXES MAGROS
INTEIROS -15 a -18 6 a 8 MESES

PEIXES MAGROS EM
FILÉ -25 a -30 10 a 12 MESES

PEIXES SALGADOS (52%


H2O) -1a-2 4 a 6 MESES

TIRINHAS EMPANADAS E
PRÉ FRITAS -15 a -18 6 MESES

CAMARÕES CONGELADOS
(INDIVIDUAIS) -15 a -18 6 MESES
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FONTE: GUZMÁN, E. S. C. - Armazenamento de Gêneros e Produtos Alimentícios.

3. Fiscalização do pescado.

De acordo com o R.I.I.S.P.O.A., Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de


Produtos de Origem Animal, do Ministério da Agricultura, o pescado é "fresco", se dado ao
consumo sem ter sofrido qualquer processo de conservação, a não ser a ação do gelo. E
entende-se por "resfriado", o pescado devidamente acondicionado em gelo e mantido em
o o
temperaturas de -0,5 C a -2 C.
Assim, durante a comercialização, os armazéns, como o CEAGESP oferecem serviços
para que se consiga manter a qualidade do pescado pela manutenção dessas temperaturas. As
câmaras guardam o pescado resfriado, há fabricação do gelo, aluguel das câmaras, divulgação
do preço do dia tabelado pela SUNAB e a fiscalização do pescado comercializado.
O pescado no entreposto é fiscalizado por técnicos especializados do SIF (Sistema de
Inspeção Federal) e SERPA (Serviço de Inspeção de Produtos Animais).
As regras gerais de higiene nas instalações, equipamento e pessoal devem ser seguidas,
como o uso de gorros, aventais, botas, lavagem das mãos, uso de máscaras e pedilúvio em
todas as entradas que dão acesso à linha de produção para lavagem das solas em desinfetante.
Janelas dotadas de telas e portas de acesso com cortina de ar evitam moscas, bem como o uso
de lâmpadas ultravioletas.
A lavagem de toda a área de manipulação é feita com água clorada em dosagem
superior a 10 ppm (10 Kg de cloro para 10 milhões de litros de água em dosador).
O SIF inspeciona o local e o pescado. O estado de frescor é estimado principalmente por
observações sensoriais: aspecto e odor.

3.1 Características sensoriais

De acordo com o R.I.I.S.P.O.A. há uma série de características a serem observadas,


para peixes, crustáceos e moluscos segundo o artigo 442.
Um peixe "fresco" tem suas características bem definidas que vão se transformando
conforme vai se instalando a deterioração.
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Assim, nota-se que a superfície do peixe que inicialmente é brilhante, de tonalidade viva
e coberta por um muco transparente, vai se tornando pálida, sem brilho e a espessura do muco
aumenta. A carne firme e elástica, dificilmente separável dos ossos e que não elimina líquido
quando pressionada vai ficando de aparência leitosa, desbotando a cor natural e ficando
amarelada. Ao longo da espinha dorsal torna-se marrom avemelhada devido a irrigação dos
vasos sanguíneos com presença de gordura desprendida na cavidade abdominal.
As guelras de cor vermelha brilhante, sem mucosidade visível, com o tempo vão
empalidecendo, ficando rosa pálida e com muco espesso.
Os olhos que são transparentes, brilhantes e protuberantes, ficam avermelhados, se
turvam, murcham e afundam ficando com a córnea opaca.
Finalmente, a característica mais facilmente perceptível, o odor, que deve ser marinho
ou lacustre, à medida que a deterioração vai aumentando se torna característico e não mais
suportável (pútrido).
As ostras para comercialização devem estar vivas e a conchas não devem se abrir com
facilidade, a quantidade de líquido dentro da concha deve ser de no máximo 10%.
Pela análise sensorial percebe-se o "off flavor", presente principalmente em peixes de
água doce, pela capacidade destes organismos de absorverem substâncias químicas presentes
em seu ambiente.
Sabor de barro proveniente da geosmina ou 2 metilisoborneol. Essa substância foi
isolada dos metabólitos produzidos por actinomicetos. Algumas espécies de algas azuis-verdes
também produzem geosmina. A depuração em água corrente pode resolver e a defumação pode
mascarar o sabor.
Para os testes sensoriais, embala-se os peixes em folhas de alumínio, aquece-se a
o
200 C por 5 min e serve-se aos degustadores.

3.2 Características físico químicas

A avaliação do estado de frscor do pescado pode ser feita pelas analises físicas e
químicas que compõem o artigo 443 e se referem às substâncias que geralmente não existem
na carne do pescado fresco, mas surgem com o tempo de estocagem.

- Trimetilamina - que aparece por ação das enzimas no óxido de trimetilamina


presente em peixes de mar. Teor máximo permitido de 4 mg/100 g da carne.
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- Hipoxantina - que só aparece como resultado da autólise e da ação de


bactérias. Não há limites estabelecidos.

- Bases voláteis totais - que aumentam à medida que o pescado se deteriora.


Limite máximo permitido : 30 mg de N/100 g de pescado provenientes das bases.

- Amônea e gás sulfídrico na carne - pela reação de Eber; estes índices só


informam o estado mais avançado de deterioração.

- Indol - em crustáceos. Limite máximo permitido: 4 ug/100 g de carne.

- Valor do pH. Se superior a 6,8 internamente e 6,5 externamente na carne; esta


está imprópria.

3.3 Características microbiológicas

Os padrões microbiológicos são estabelecidos pelo I.C.M.S.F. (International Committee


on Microbiological Specifications for Foods), visando basicamente, assegurar o fornecimento de
alimentos que não ofereçam riscos à saúde pública, para garantir que eles tenham sido
processados dentro das condições sanitárias adequadas e que seu processamento tenha sido
efetivo contra os microrganismos.

1) Contagens totais: informam sobre o grau de manipulação que sofreram os


peixes e o grau de frescor.
a) enumeração de mesófilos aeróbicos, cujos métodos mais comuns são
o
"Standard Plate Count",o "Surface Plate" e o "Drop Plate". Geralmente crescem entre 10 a 37 C
6
e permite-se a contagem máxima de 10 em pescado de peixarias e feiras.
o
b) Enumeração de psicrófilos aeróbicos. Crescem de 0 a 7 C e não estão
estabelecidos os limites.

2) Análises de coliformes ; são indicadores de contaminação, como também o


são os enterococos. As bactérias coliformes mais importantes são a Escherichia coli e a
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Enterobacter aerogenes. A E.coli é indicadora de contaminação fecal e qualidade sanitária de


água e aparece associada à Salmonella e Shigella.
O procedimento de análise é feito pela contagem do NMP, número mais provável e
o
utilização de 3 métodos distintos. Os limites de temperatura vão de -2 a 50 C e contam o
2
máximo de 10 .

4. Deterioração físico- química e microbiológica do pescado.

Uma vez fora da água, o peixe saiu de um meio onde estava em perfeito equilíbrio
ecológico e passa a outro ambiente adverso ao seu "habitat" onde deverá ser transportado para
ser distribuído comercialmente. Aí começam os problemas de escoamento de um alimento de
alta perecibilidade.
Pelo fato de possuir proteína, é fonte excelente para o desenvolvimento microbiano. O
alto teor de umidade disponível na carne (cerca de 70%) propicia facilidade para atuação desses
microrganismos.
Um dos motivos pelo quais os peixes são altamente perecíveis é a estrutura coloidal da
sua proteína muscular com grande quantidade de substâncias extrativas nitrogenadas livres, os
produtos intermediários do metabolismo, os aminoácidos livres e o óxido de trimetilamina. Estas
substâncias extrativas livres são as principais responsáveis pelo sabor específico do peixe
fresco.
Ao sair da água geralmente o peixe é deixado refrigerado em contacto com o gelo e é
assim comercializado. Às vezes em locais próximos aos rios a comercialização é feita
"pescando" o peixe de tanques de cimento construídos pelos pescadores.
Após a captura o peixe pode ser considerado estéril. Porém é facilmente atacado por
microrganismos do solo, da água de lavagem e principalmente das mãos e equipamentos dos
pescadores.
Não só as bactérias e seus produtos de metabolismo são responsáveis pela deterioração
da carne, mas também as reações enzimáticas nos músculos e intestinos. Por isso. às vezes, é
preferível guardar o peixe inteiro no gelo do que eviscerá-lo e lavar em água onde há efluentes
de indústrias ou de rios poluídos, pois estaremos introduzindo mais agentes de deterioração e
possibilitando a ação de bactérias intestinais na carne, devido ao rompimento das vísceras na
operação de corte. Mas, se a água for limpa é preferível eviscerar, inclusive, para diminuir o
volume do peixes e evitar que o amassamento de uns sobre os outros rompam as vísceras.
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Se os peixes lutam para se libertarem da rede, ou morrem em agonia nos barcos


pesqueiros, vão se esgotando suas reservas de energia, (glicogênio), dando chance a uma
deterioração mais rápida e intensa.
O peixe morre e na sua carne se estabelecem os fenômenos "post mortem". Ocorre o
enrijecimento da carne e o aumento de acidez. Nessa fase não ocorre a deterioração. Portanto,
quanto mais tempo se prolongar o "rigor mortis", mais tempo se mantém o pescado em boa
qualidade.
Quanto mais glicogênio, mais tarde o "rigor mortis" irá se instalar (pode demorar cerca de
6 horas) e terminará mais tarde também, mantendo-se o peixe com boa qualidade por mais
tempo. Nessa fase o meio ácido é desfavorável ao desenvolvimento de microrganismos. Coloca-
se em gelo imediato nesta fase. O atum (espécie ativa) deteriora-se mais rápido que o linguado
(sedentário). A luta na captura também acelera a intalação do rigor.
Ao final do "rigor mortis" é então possível ocorrer a proteólise, ou seja, ação de enzimas
proteolíticas nas proteínas da carne com desprendimento de metabólitos voláteis de hidrólise
protéica como as bases nitrogenadas e a amônea; e o odor característico. Todo pescado é
comercializado "pós rigor".
Após iniciar a autólise, a deterioração é rápida; as bactérias encontram excelente
substrato, excretam enzimas e o processo fica catalizado. O crescimento bacteriano é facilitado
pelo uso de novas substâncias. Observa-se amolecimento da carne (barriga dilacerada),
manchas negras em camarões e barriga preta em lagostas.
O "black spot" é a autooxidação de melaninas do tipo fenol-amínico que provém do
desdobramento da proteína do camarão por ação bacteriana; a autooxidação ocorre na
presença da enzima tirosinase produzida no fígado do camarão situado no cefalotórax; após a
morte a enzima extravaza, desdobra a tirosina e aparecem as manchas negras.
O peixe possui normalmente bactérias na sua superfície, nas guelras e no intestino que
não são patogênicas para o peixe vivo, mas quando termina o "rigor mortis" e a acidez cai, essas
bactérias invadem os tecidos, inclusive de dentro para fora, nos peixes comercializados com
vísceras. As bactérias anaeróbicas decompõem o óxido de trimetilamina em amoníaco, solúvel
em água e que se distribui rapidamente por todo o tecido muscular.
É conveniente destacar a oxidação lipídica, o ranço como uma deterioração muito
comum dos peixes armazenados a baixas temperaturas e em presença de ar. Os peixes por
possuírem muitos ácidos graxos poliinsaturados sofrem a autooxidação dando derivados
carbonílicos.
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O peixe está deteriorado quando libera odor ruim; a lisina por exemplo é hidrolisada a
putrescina e aparecem os produtos voláteis da reação. As guelras escurecem, as escamas
desprendem, a carne amolece e perde a água ligada às proteínas e os olhos se tornam
côncavos e com manchas de sangue.
Observando os fenômenos externos de deterioração é possível evitar comprar o produto
ruim.
Para a venda do peixe "in natura" é necessário que ele esteja fresco. Este é o peixe
recém-capturado, sem qualquer tipo de conservação, a não ser a ação do gelo, que mostra suas
qualidades originais inalteradas. Mas geralmente o que se compra nos grandes centros é o peixe
recém descongelado.

5. Prováveis contaminantes do pescado.

Os peixes capturados em locais onde existam descargas de efluentes podem sair da


água já contaminados. Os mais graves contaminantes são os metais como o mercúrio e os
pesticidas principalmente os clorados (Aldrin, Dieldrin, Lindane, DDT e BHC).
A tolerância do organismo humano é de 0,5 a 1 mg/Kg de peso corporal de metil-mercúrio e de 3
a 5 mg de clorados/Kg de peso. Em mandis do Rio Piracicaba foram encontrados até 0,3 ug/Kg
de peso de DDT.
O controle ambiental e o combate à poluição são fatores determinantes para manutenção
dos alimentos dos rios e do mar na forma original, sem passarem a ser tóxicos por carregarem
os problemas do meio ambiente ao homem.
A presença de metais ocorre em meios que receberam efluentes de indústrias de papel e
de tratamentos de madeira, bem como de fixadores de cor de tecidos, entre outras. Os principais
contaminantes são o mercúrio, na forma de metil-mercúrio, o chumbo e o cádmio.
A competição pelo oxigênio, em águas que recebem efluentes ricos em carboidratos
como as indústrias de alimentos processadoras de mandioca, pode levar à mortandade de
peixes por asfixia. Neste caso o peixe não está contaminado, mas não pode ser consumido
porque permaneceu morto na água à temperatura ambiente por várias horas e portanto se
deteriora rapidamente apresentando alta carga bacteriana.
O caso da maré vermelha é um fenômeno natural de proliferação de algas unicelulares
que se multiplicam tão rapidamente que tornam mais densa a água e de cor avermelhada. Estes
microrganismos dinoflagelados do gênero Gonyaulax e Gymnodinium produzem toxina, a
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saxotoxina que mata os peixes. Este problema atinge quilometros de extensão em pouco tempo.
Algumas ostras e mariscos resistem e concentram estas toxinas, que uma vez ingeridas
paralisam os sistemas nervoso e respiratório de humanos. As ostras são ingeridas cruas e
portanto todas as toxinas estão presentes.
Envenenamentos provocados por ingestão de pescado cru podem ocorrer se causados
pela ação das toxinas produzidas por organismos marinhos unicelurares, os dinoflagelados. Os
peixes acumulam a ciguatoxina, especialmente os migratórios. O envenenemanto provoca
sintomas gastrointestinais como náusea, vômito e diarréia, além de formigamentos dos lábios e
dedos e calafrios, mas não é fatal. É difícil identificar o peixe ciguatóxico porque não há alteração
na cor e no aroma.
Outro tipo de problema que pode ocorrer é o envenenamento escombróide causado pela
ação de histamina e saurina que são produzidos por bactérias em salmões, bonitos, cavalas
atuns, etc., consumidos crus. Com refrigeração apropriada ou cozimento estas bactérias são
freadas e não mais produzem a histina que formará os níveis tóxicos de histamina e saurina.
Provocam urticária, náusea, vômito, diarréia. O uso de antihistamínicos resolve o problema.
As bactérias fecais, Streptococcus faecalis ou mesmo o Vibrio cholerae podem estar
presentes em pescado consumido cru como as ostras p

6. O destino do pescado pós captura.

Dentre as espécies capturadas no Brasil, são destinados à industrialização,


principalmente as sardinhas que vão para o enlatamento e os camarões para congelamento. Há
produção de sardinha prensada e merluza salgada e seca, porém de menor valor comercial.
Estas conservas são assunto discutido na Disciplina LCT 658.
O " by catch" se constitui de espécies que vem junto na rede durante a captura,
chamadas no Brasil de "mistura". Há peixes pequenos e de espécies com pouco valor comercial.
Eles são devolvidos ao mar e não se sabe se entram na cadeia alimentar marinha pois estão
mortos. Acontece, às vezes, da quantidade devolvida ser maior do que a capturada. O destino
do rejeito é o lixo, pois o acúmulo para produção de farinha leva a um aumento da carga
microbiana perigosa às linhas de processamento.
Pesquisas tem procurado dar um destino a esta captura paralela na forma de preparo do
chamado "minced fish" ou mesmo do chamado " surimi", no entanto não há nada
comercializado desta forma ainda no Brasil.
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Junto ao by catch o problema de material desperdiçado deve ser somado ao não


aproveitamento do resíduo que se acumula após o preparo do peixe para o consumo e mesmo
no " toilete" que ele sofre na industrialização.
O aproveitamento dos resíduos depende do custo dispendido para tal, podendo ser
utilizados para consumo humano ou animal o que diminui a poluição causada pelo descarte
deste material na rede pública e abaixa o custo dos insumos industriais.
O peso dos resíduos de camarões, por exemplo, pode chegar até 85% e pode ser feito o
aproveitamento do exoesqueleto elaborando as farinhas ou isolados de proteínas, a partir do
cefalotórax e a separação mecânica de carnes comestíveis para preparo do " minced".
Assim, mais de 20 milhões de toneladas de pescado no mundo, correspondem à parte
não aproveitável e deixam de servir à alimentação humana.
O aproveitamento de resíduo do processamento de sardinhas, ossos e pele em extração
do colágeno pode ser feito para obtenção de gelatina para uso em suplemento da alimentação
de aves ou como fertilizante e clarificante de bebidas. A matéria prima é triturada,
desengordurada e macerada em NaOH 0,5%; nova lavagem e maceração em HCl 0,5%;
lavagem, extração e filtração.
No preparo da silagem de pescado os resíduos sofrem adição de ácido fórmico,
carboidratos e culturas "starter" de bactérias produtoras de ácido lático ou enzimas proteolíticas.
O produto pode ser utilizado como ração para peixes, suínos, frangos e bovinos; o que é feito
nos países escandinavos, grandes produtores de pescado.

Referências bibliográficas.

OETTERER, M. Industrialização do pescado cultivado. Guaíba: Editora Agropecuária. 200p.


2002.

www.anvisa.gov.br.

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