Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
DOI: https://dx.doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2022.v31.n66.p133-149
RESUMO
O artigo objetiva contextualizar a criação e fortalecimento do movimento
de transformação epistemológica e pedagógica do Ensino Religioso, com a
finalidade de analisar as contribuições da Rede Nacional de Licenciaturas em
Ensino Religioso (RELER) para a decolonização religiosa da escola. Trata-se de
um estudo qualitativo, do tipo bibliográfico e documental. A coleta dos dados é
proveniente do estudo da literatura científica produzida por diferentes autores
de perspectiva decolonial, e de documentos que sustentam a proposta do Ensino
Religioso não confessional. Os resultados indicam que: a colonialidade subsiste
nos campos religioso e educativo; o Ensino Religoso confessional reproduz os
processos históricos de imposição e homogeneização religiosa; o movimento de
decolonização do Ensino Religoso alterou seus fundamentos epistemológicos
e pedagógicos para contribuir no processo de reconhecimento da diversidade
religiosa; a Rede Nacional de Licenciaturas em Ensino Religioso (RELER) vem
atuando com protagonismo no campo da formação de docentes para o Ensino
Religioso de perspectiva decolonial e, portanto, não confessional.
Palavras-chave: formação de professores; ensino religioso; decolonialidade.
ABSTRACT
NATIONAL NETWORK OF LICENTIATE DEGREES IN RELIGIOUS
EDUCATION AND THE SCHOOL RELIGIOUS DECOLONIZATION
MOVEMENT
The article aims to contextualize the creation and strengthening of the movement
for the epistemological and pedagogical transformation of Religious Education,
in order to analyze the contributions of the National Network of Licentiate
Degrees in Religious Education (RELER) to the religious decolonization of
schools. This is a qualitative study, bibliographic and documentary type. Data
∗
Doutor em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Docente da Universidade Comunitária da Região
de Chapecó (Unochapecó). E-mail: elcio.educ@gmail.com
∗∗
Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Docente da Universidade Comunitária da
Região de Chapecó (Unochapecó). E-mail: anderson.tedesco@unochapeco.edu.br
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 133
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
RESUMEN
RED NACIONAL DE GRADOS EN EDUCACIÓN RELIGIOSA Y EL
MOVIMIENTO DE DESCOLONIZACIÓN RELIGIOSA ESCOLAR
El artículo tiene como objetivo contextualizar la creación y fortalecimiento del
movimiento de transformación epistemológica y pedagógica de la Educación
Religiosa, con el objetivo de analizar los aportes de la Red Nacional de
Licenciaturas en Educación Religiosa (RELER) a la descolonización religiosa de
las escuelas. Se trata de un estudio cualitativo, de tipo bibliográfico y documental.
La recolección de datos proviene del estudio de la literatura científica producida
por diferentes autores desde una perspectiva decolonial, y documentos que
sustentan la propuesta de Educación Religiosa no confesional. Los resultados
indican que: la colonialidad subsiste en los campos religioso y educativo;
La Educación Religiosa confesional reproduce los procesos históricos de
imposición y homogeneización religiosa; el movimiento de descolonización de
la Educación Religiosa cambió sus fundamentos epistemológicos y pedagógicos
para contribuir al proceso de reconocimiento de la diversidad religiosa; La Red
Nacional de Licenciaturas en Educación Religiosa (RELER) viene desempeñando
un papel de liderazgo en el campo de la formación del profesorado de Educación
Religiosa desde una perspectiva decolonial y, por tanto, no confesional.
Palabras clave: formación docente; educación religiosa; decolonialidad.
1 Introdução
Historicamente, a escola brasileira foi ins- o educativo, por meio da atuação de diferentes
tituída sob a aliança estabelecida entre Esta- missionários e ordens religiosas. Neste contex-
do-Igreja, no âmbito do projeto colonizador to, os princípios da moral cristã e da doutrina
eurocristocêntrico iniciado no século XVI. Por católica entranharam-se ao ensino elementar,
respaldar o poder da Coroa, por meio do regi- cabendo aos professores ensinar tanto os con-
me do padroado,1 o catolicismo assegurou o teúdos sagrados quanto profanos. Assim, as
controle de vários campos sociais, dentre eles expressões “ensino da religião” ou “instrução
1 Por este acordo, as Coroas católicas detinham o direito religiosa” correspondiam à prática da evangeli-
de administrar os assuntos religiosos em seus domínios
ultramarinos, responsabilizando-se pelo financiamento e
zação, catequização e doutrinação em espaços
controle da atividade missionária. formais, como nas escolas, e não formais, como
134 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
nas missões, pastorais e campanhas diversas no âmbito das mentalidades e práticas sociais,
(CECCHETTI; SANTOS, 2016). e o amálgama político-religioso continuou a se
Durante todo o Brasil Império (1822-1889), reproduzir a despeito dos decretos e disposi-
o ensino da doutrina católica foi parte inte- tivos constitucionais. Por outra parte, a Igreja
grante do currículo clássico humanístico (LO- Católica logo tratou de reformar suas estruturas
RENZ; VECHIA, 2011). Contudo, especialmente visando adaptar o novo regime aos seus interes-
a partir de 1860, quando maçons, liberais e ses, sendo que, no conjunto de ações capitanea-
positivistas difundiram ideais republicanos e das pelo Episcopado brasileiro, a reintrodução
passaram a defender a separação dos poderes da instrução religiosa era o primeiro tópico da
civil e religioso, as sucessivas reformas de sua lista das prioridades (CURY, 1988).
ensino foram progressivamente ampliando os Tal feito se concretizou em 1934, quando a
estudos científicos nas escolas e faculdades, Igreja conseguiu a retirada do dispositivo que
em detrimento do ensino da religião, que foi instituiu o ensino leigo, reintroduzindo o Ensi-
condensado em “uma” dentre um conjunto de no Religioso na Constituição Federal, embora
disciplinas (CECCHETTI, 2016). Com isso, foi de matrícula facultativa (BRASIL, 1934). Foi
possível “liberar” os estudantes não católicos neste período que se cunhou o termo “Ensino
da obrigatoriedade de assistirem às aulas de Religioso” para designar a prática sistemática
instrução religiosa, que passaram a ser ofereci- do ensino confessional nos estabelecimentos
das em dias determinados da semana e sempre de ensino com o caráter de “disciplina” (CEC-
antes ou depois dos horários destinados às CHETTI, 2016).
disciplinas científicas (BRASIL, 1879). Desde então, o percurso dessa disciplina nas
A efervescência dos debates em prol da escolas públicas brasileiras é caracterizado por
separação Estado-Igreja, que demarcou as últi- alianças e disputas diversas, devido às diferen-
mas décadas do regime imperial, ganhou lugar tes finalidades e perspectivas defendidas pelos
no arcabouço jurídico nacional com a implan- distintos grupos em atuação, que resultaram
tação da República. O Governo Provisório logo em diversos dispositivos de regulamentação
tratou de instituir em seus primeiros decretos jurídica, em sua maioria ambíguos e contra-
a separação entre os poderes civil e religioso, a ditórios, o que contribuiu para a perpetuação
plena liberdade de cultos, o casamento civil e a dos embates até nossos dias. Muitos autores
secularização dos cemitérios (BRASIL, 1890a, já se dedicaram a analisar os desdobramentos
1890b, 1890c, 1890d). Sob a égide do Estado desta controversa, tais como Cury (1988, 1993,
laico, a primeira Constituição da República 2004), Cunha (2013, 2014), Figueiredo (1995,
declarou, no artigo 72, que seria “leigo” o en- 2007), Cecchetti e Santos (2016), Santos e Cec-
sino ministrado nos estabelecimentos públicos chetti (2021), entre outros.
(BRASIL, 1891). Fato é que, ao longo do tempo, o Ensino
Contudo, a laicização2 do Estado avançou Religioso confessional, sinônimo de aula de
mais em nível jurídico do que propriamente religião, produziu mais negação do que reco-
2 É importante precisar o sentido dado ao termo “laiciza- nhecimento da diversidade religiosa, justa-
ção” neste trabalho. Desde a origem do Cristianismo, o mente por subalternizar tanto as crenças dos
termo laicus passou a designar aquele que não era clérigo.
Contudo, registros de 1487 indicam que na língua france-
grupos não cristãos, quanto as pessoas ateias,
sa, laicus deu origem a laïque, com sentido de oposição a agnósticas ou sem religião.
“clero”. A partir do século XIX, laïque começou a indicar Por consequência, até o início da década de
um espaço que estava para além do controle religioso. Foi
aí que os termos como “laicidade”, “laicizar” e “laicização” 1990, era praticamente inexistente a preocu-
começaram a ser empregados, principalmente nos países pação pela formação de docentes para a diver-
de língua latina, onde a separação do poder político ocor-
reu em meio a uma disputa direta contra a Igreja Católica. sidade religiosa. Ancorados em argumentos
Para aprofundamento, consultar Cecchetti (2016). confessionais ou interconfessionais, os pro-
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 135
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
136 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
alimento, moradia, trabalho, saúde, educação, E muito embora haja a obrigatoriedade legal
segurança etc.), seja pela subalternização de para inclusão no currículo oficial das redes de
suas culturas e usurpação de suas memórias, ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e
seja pela “demonização” de suas crenças. Indígena, conforme estabelecido pelas Leis nº
A permanência de relações de colonialidade, 10.639/2003 (BRASIL, 2003) e 11.645/2008
segundo Quijano (2014, p. 783), é responsável (BRASIL, 2008), essas temáticas tendem a não
pelo ocultamento histórico e seletivo dos co- ser incorporadas de maneira satisfatória nos
nhecimentos, saberes cosmologias presentes projetos político-pedagógicos e nas práticas pe-
nas comunidades originárias, deixando mar- dagógicas da maioria das escolas (CARREIRA;
cas profundas que perduram e caracterizam ANDRADE, 2015; MARQUES; BILHÃO, 2020;
a “[...] expressão máxima do domínio cultural, SILVA FILHO, 2016). Isso porque, normalmente,
histórico e global do eurocentrismo”. Por esse as poucas ações efetivadas assumem um cará-
motivo, defende a ideia de que a colonização ter mais comemorativo em tom de efemérides
foi um projeto que determinou quais identida- do que propriamente de inclusão no rol dos
des e culturas poderiam permanecer ou não, conhecimentos curriculares, especialmente
legitimando o monoculturalismo criado pelo quando se trata das religiões de matriz indí-
colonizador como único modelo universal de gena e africana, que ainda são considerados
cultura, história e sociedade. temas interditos em grande parte das institui-
Na atualidade, subsistem estratégias e prá- ções educativas.
ticas de colonialidade em todos os setores da Isso indica que toda a riqueza cultural da
esfera pública, em especial no campo religioso, cosmovisão afro e indígena – a concepção cir-
gerando processos de discriminação e subal- cular do tempo, a reverência aos ancestrais,
ternização de culturas, crenças e identidades a existência coletiva, as expressões rítmicas,
distintas do padrão civilizatório eurocristo- artísticas e corporais, os ideais de solidarie-
cêntrico. Também em escolas e universidades, dade e partilha, a relação de cooperação com
currículos e práticas pedagógicas monocul- a natureza, as formas específicas de pensar,
turais têm contribuído para a (re)produção tratar e conviver com as diferenças, entre
de processos de inferiorização das culturas, tantos outros ensinamentos cultivados, pre-
histórias, literaturas, expressões artísticas e servados e transmitidos de geração em geração
religiosidades de origem indígena e africana. – é relegada a um não-lugar histórico, social,
Isso indica que, cotidianamente, estudantes científico e pedagógico. Isso evidencia que
identificados com as matrizes indígenas e a colonialidade segue ancorando práticas e
afro-brasileiras ainda enfrentam processos currículos monoculturais que desconsideram
de imposição cultural e religiosa, em razão de e excluem epistemes, saberes, ritmos, tempos
práticas educativas monoculturais, que descon- e formas de relacionamento que divergem do
sideram a legitimidade de suas cosmovisões, instituído, limitando e restringindo possibili-
crenças e saberes diversos. dades de construção de práticas pedagógicas
Nesse contexto, a disciplina de Ensino Reli- diferenciadas.
gioso, muitas vezes, se constitui em espaço e Desde uma perspectiva decolonial,3 po-
lugar para imposição de símbolos e práticas re- demos considerar que a produção desta
ligiosas dos grupos socialmente hegemônicos, não-existência está ancorada em um racismo
notadamente cristãs – católicas ou evangélicas 3 Aqui fazemos referência ao “giro decolonial”, movimento
social-intelectual latino-americano que, a partir dos anos
–, sendo que as demais religiões e religiosida- 1990, vem problematizando criticamente a dinâmica so-
des são vistas como “crendices” ou “folclore”, o ciopolítica colonial ainda presente nas sociedades con-
temporâneas por meio da seguinte tríade: colonialidade
que contribui para a discriminação e a exclusão do ser, colonialidade do poder e colonialidade do saber
(SANTOS; SANTOS; GRANDO, 2021). (CASTRO-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007; QUIJANO, 2011).
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 137
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
138 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 139
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
fins da educação pública, seria uma verdadei- PER reivindicou a superação do proselitismo
ra contradição oferecer Ensino Religioso de e a adoção de uma proposta inter-religiosa.
forma confessional ou interconfessional, sem A ação coletiva resultou na aprovação da Lei
preocupação alguma com o processo de reco- nº 9.475/1997, que alterou a concepção da
nhecimento da diversidade religiosa. disciplina:
Herança da histórica aliança entre Igreja-Es- Art. 33 - O ensino religioso, de matrícula facul-
tado, o caráter eminentemente confessional tativa, é parte integrante da formação básica
do Ensino Religioso somente começou a ser do cidadão, constitui disciplina dos horários
questionado a partir dos anos 1970, quando normais das escolas públicas do ensino funda-
coletivos de educadores, líderes religiosos e mental, assegurando o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quais-
pesquisadores de diferentes áreas buscaram quer formas de proselitismo (BRASIL, 1997,
superar o modelo catequético-doutrinário, grifo nosso).
tomando o ecumenismo como modelo refe-
rencial (FIGUEIREDO, 1995). Por conseguinte, A alteração da LDB foi determinante para
em algumas regiões do país, por cerca de duas a constituição de um outro modelo de Ensi-
décadas, o desenvolvimento de propostas cur- no Religioso, agora sem afrontar o princípio
riculares ecumênicas gerou novas reflexões que constitucional da laicidade. Isso porque, no
fizeram repensar a natureza epistemológica e sentido dado pela Lei, cabe a este componente
pedagógica do Ensino Religioso. Buscava-se disponibilizar conteúdos científicos acerca da
uma proposta que pudesse acolher integral- diversidade religiosa no currículo escolar, com
mente a diversidade religiosa brasileira e não a finalidade de promover e exercitar a liberda-
apenas as denominações cristãs. de de consciência e de crença (BRASIL, 1988).
Um dos resultados desse movimento resul- Portanto, se até meados da década de 1990,
tou na instalação, em 1995, do Fórum Nacional em decorrência da linha confessional e/ou
Permanente de Ensino Religioso (FONAPER).4 interconfessional adotada, a formação dos
Esta instituição, com o passar do tempo, docentes ocorria mediante cursos organizados
tornou-se um espaço de discussão e ponto pelas próprias instituições religiosas, tornava-
aglutinador de ideias e propostas de operacio- se urgente superar este quadro e oferecer uma
nalização de um Ensino Religioso que supere habilitação específica com este novo enfoque.
seu histórico enfoque confessional e prosélito.5 O conjunto de esforços empreendidos em
No entanto, contradizendo essas intenções, busca da consolidação desse modelo de Ensi-
a LDB nº 9.394 (BRASIL, 1996) originalmente no Religioso resultou na configuração de um
manteve o caráter confessional e interconfes- movimento em prol da decolonização religiosa
sional do Ensino Religioso. Insatisfeitos com da escola. Trata-se da tarefa de superar sua na-
essa medida, no início de 1997, uma forte tureza confessional para assegurar o respeito à
mobilização social capitaneada pelo FONA- diversidade religiosa no cotidiano escolar, por
meio do exercício do diálogo e do fomento de
4 O FONAPER é uma associação civil de direito privado, de
âmbito nacional, sem vínculo político-partidário, con-
relações interculturais e inter-religiosas. Ou
fessional e sindical, sem fins econômicos, que congrega, seja, na formulação proposta pelo FONAPER e
conforme seu Estatuto, pessoas jurídicas e pessoas natu- seus associados, o Ensino Religioso não mais
rais identificadas com o Ensino Religioso, constituindo-se
num organismo que trata de questões pertinentes a esta busca colonizar os imaginários e nem difundir
área de conhecimento, sem discriminação de qualquer uma única verdade, mas contribuir na convi-
natureza (FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DE ENSINO
RELIGIOSO, 1996). vência democrática entre pessoas e grupos
5 Sobre o legado do FONAPER na proposição de um Ensi- que assumem convicções religiosas diferentes.
no Religioso não confessional, consultar Pozzer e outros
(2010), Pozzer e outros (2015) e Maria, Pazza e Cecchetti
Não foi por acaso que, em meados de 2013,
(2019). quando se deram os primeiros movimentos em
140 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 141
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
142 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 143
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
144 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 145
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
intolerância religiosa e a disseminação de ima- São Paulo, 23 jan. 2021, p. 1. Disponível em:
gens negativas e discriminatórias continuam a https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/01/
confrontar os direitos humanos. bolsonarismo-e-ascensao-evangelica-sao-novas-
ameacas-ao-candomble-diz-sociologo.shtml.
A multiplicação das hostilidades, discursos Acesso em: 5 jan. 2022.
de ódio, práticas discriminatórias e intoleran-
BORGES, Cristina; BAPTISTA, Paulo Agostinho
tes no campo religioso, requer do Estado brasi-
Nogueira. Entender o passado e falar do presente:
leiro a criação de uma política pública capaz de aportes a um Ensino Religioso descolonizador e
gerar ações sistêmicas de longo alcance e dura- pós-colonial. Numen – revista de estudos e pes-
ção, que abarque a totalidade das instituições quisa da religião, Juiz de Fora, MG, v. 23, n. 2, p.
escolares de norte a sul do país. Tais políticas 21-38, jul./dez. 2020.
necessariamente precisam investir e apostar BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº
na função social do Ensino Religioso não con- 7.247, de 19 de abril de 1879. Reforma o ensino
fessional, subsidiando-o com programas para primario e secundario no municipio da Côrte e o
formação inicial de seus docentes, com incen- superior em todo o Imperio. Rio de Janeiro, 1879.
Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/
tivo e fomento para elaboração e distribuição
fed/decret/1824-1899/decreto-7247-19-abril-
de materiais didáticos e paradidáticos. 1879-547933-publicacaooriginal-62862-pe.html.
A concretização dos objetivos do Ensino Acesso em: 5 jan. 2022.
Religioso contidos no BNCC dependerá da for- BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 119-A,
mação de professores abertos à diversidade de 7 de janeiro de 1890. Prohibe a intervenção
cultural e religiosa, conscientes da complexa da autoridade federal e dos Estados federados em
dinâmica dos fenômenos religiosos e didati- materia religiosa, consagra a plena liberdade de
camente preparados para o tratamento das cultos, extingue o padroado e estabelece outras
providências. Rio de Janeiro, 1890a. Disponível
culturas e religiosidades em sala de aula a
em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/
partir de pressupostos éticos e científicos. Se decret/1824-1899/decreto-119-a-7-janeiro-1890-
a diversidade religiosa continuar a não ser 497484-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em:
reconhecida em seus saberes, valores, con- 29 jun. 2021.
cepções e práticas; e se as unidades escolares BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 181,
não modificarem ritos, ritmos e processos que de 24 de janeiro de 1890. Promulga a lei sobre o
privilegiam determinados sujeitos e grupos, casamento civil. Rio de Janeiro, 1890b. Disponível
ou não estimularem diálogos entre diferentes em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/
identidades religiosas e não religiosas, dificil- decret/1824-1899/decreto-181-24-janeiro-1890-
507282-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em:
mente o direito à liberdade de pensamento,
5 jan. 2022.
consciência, religião ou de qualquer convicção
será assegurado para todos. BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº 521,
de 26 de junho de 1890. Prohibe cerimonias
religiosas matrimoniaes antes de celebrado o
REFERÊNCIAS casamento civil, e estatue a sancção penal, processo
e julgamento applicaveis aos infractores. Rio de
AGUIAR, Márcia Angela da Silva; DOURADO, Luiz Janeiro, 1890c. Disponível em: http://www2.
Fernandes. BNCC e a formação de professores: camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/
concepções, tensões, atores e estratégias. Retratos decreto-521-26-junho-1890-504276-norma-pe.
da Escola, v. 13, n. 25, p. 33-37, jan./maio 2019. html. Acesso em: 5 jan. 2022.
Disponível em: https://retratosdaescola.emnuvens.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto nº
com.br/rde/article/view/990/pdf. Acesso em: 5
789, de 27 de setembro de 1890. Estabelece a
jan. 2022.
secularisação dos cemiterios. Rio de Janeiro, 1890d.
BALLOUSSIER, Anna Virgínia. Bolsonarismo Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/
e ascensão evangélica são novas ameaças ao fed/decret/1824-1899/decreto-789-27-setembro-
candomblé, diz sociólogo. Folha de S. Paulo, 1890-552270-publicacaooriginal-69398-pe.html.
146 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 147
Rede nacional das licenciaturas em ensino religioso e o movimento de decolonização religiosa da escola
escola pública: o curso histórico de uma polêmica Elcio; SIMONI, Josiani Crusaro (org.). Ensino re-
entre Igreja e Estado no Brasil. Educação em Re- ligioso não confessional: múltiplos olhares. São
vista, n. 17, p. 20-37, jun. 1993. Leopoldo, RS: Oikos, 2019. p. 13-27.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Ensino religioso MARQUES, Marta; BILHÃO, Isabel. A educação para
na escola pública: o retorno de uma polêmica as relações étnico-raciais na formação inicial em
recorrente. Revista Brasileira de Educação, Rio pedagogia: um estudo de caso. Pedagogia em Foco,
de Janeiro, n. 27, p. 183-213, set./dez. 2004. v. 15, n. 13, p. 43-61, jan./jun. 2020.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Ideologia e educação MARTINS, Thays. PL 490: entenda o que é o projeto
brasileira: católicos e liberais. 4. ed. São Paulo: que muda a demarcação de terras indígenas. Cor-
Cortez; Autores Associados, 1988. reio Brasiliense, Brasília, DF, 23 jun. 2021, p. 1.
Disponível em: https://www.correiobraziliense.
FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas.
com.br/politica/2021/06/4933154-pl-490-
Salvador: EDUFBA, 2008.
e n t e n d a - o - q u e - e - o - p ro j e t o - q u e - m u d a - a -
FIGUEIREDO, Anisia de Paulo. Ensino religioso: demarcacao-de-terras-indigenas.html. Acesso
tendências, conquistas, perspectivas. Petrópolis, em: 5 jan. 2022.
RJ: Vozes, 1995.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Texto referência para
FIGUEIREDO, Anísia de Paulo. Fuentes antropoló- a audiência pública sobre as Diretrizes Curriculares
gicas y sociológicas de la educación religiosa en Nacionais para o curso de graduação em Ciência(s)
el sistema escolar brasileño, en la perspectiva da(s) Religião(ões). Minuta de Parecer e Projeto
foucaultiana: la evolución de una disciplina entre de Resolução. Brasília, DF, 2018. Disponível em:
religión y área de conocimiento. https://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As ciências docman&view=download&alias=95661-texto-
das religiões. São Paulo: Paulus, 1999. referencia-dcn-ciencias-da-religiao&category_
slug=setembro-2018-pdf&Itemid=30192. Acesso
FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO em: 5 jan. 2022.
RELIGIOSO (FONAPER). Carta de princípios.
Florianópolis, 1996. Disponível em: http://www. OLIVEIRA, Lilian Blanck; CECCHETTI, Elcio.
fonaper.com.br/carta-principios.php. Acesso em: Diretrizes curriculares nacionais para a formação
5 jan. 2022. de professores de ensino religioso. In: POZZER,
Adecir; CECCHETTI, Elcio; OLIVEIRA, Lilian Blanck
FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO de; KLEIN, Remí (org.). Diversidade religiosa e
RELIGIOSO (FONAPER). Regimento da Rede Na- ensino religioso no Brasil: memórias, propostas
cional das Licenciaturas em Ensino Religioso. e desafios. São Leopoldo, RS: Nova Harmonia, 2010.
Florianópolis, 2012. p. 103-126.
GROSFOGUEL, Ramón. A estrutura do conhecimento OLIVEIRA, Lilian Blanck; RISKE-KOCH, Simone;
nas universidades ocidentalizadas: racismo/ WICKERT, Tarcísio Alfonso. Formação de docentes
sexismo epistêmico e os quatro genocídios/ e ensino religioso no Brasil. Tempos, espaços,
epistemicídios do longo século XVI. Revista Socie- lugares. Blumenau, SC: Edifurb, 2008.
dade e Estado, v. 31, n. 1, jan./abr. 2016. Disponível
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A
em: https://www.scielo.br/j/se/a/xpNFtGdzw4F
EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO).
3dpF6yZVVGgt/?lang=pt. Acesso em: 5 jan. 2022.
Declaração de Salamanca sobre princípios,
LORENZ, Karl VECHIA, Ariclê. O debate ciências política e práticas na área das necessidades
versus humanidades no século XIX: reflexões sobre educativas especiais. Salamanca, 1994. Disponível
o ensino de Ciências no Collegio de Pedro II. In: em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/
FERREIRA NETO, A.; GONÇALVES NETO, Wenceslau pf0000139394. Acesso em: 5 jan. 2022.
MIGUEL, Maria Elisabeth Blanck. Práticas escola-
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A
res e processos educativos: currículo, disciplinas
EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO).
e instituições escolares (século XIX e XX). Vitória:
Declaração mundial sobre educação para
Edufes, 2011. p. 115-152.
todos: satisfação das necessidades básicas
MARIA, Mara Rosane Costa; PAZZA, Neusa Maria de aprendizagem. Jomtien, 1990. Disponível
Vedana; CECCHETTI, Elcio. O FONAPER e o ensino em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/
religioso não confessional no Brasil. In: CECCHETTI, pf0000086291_por. Acesso em: 29 jun. 2021.
148 Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022
Elcio Cecchetti; Anderson Luiz Tedesco
POZZER, Adecir; CECCHETTI, Elcio; OLIVEIRA, shtml. Acesso em: 5 jan. 2022.
Lilian Blanck de; KLEIN, Remí. Diversidade re-
RISKE-KOCH, Simone; OLIVEIRA, Lilian Blanck;
ligiosa e ensino religioso no Brasil: memórias,
POZZER, Adecir (org.). Formação inicial em ensi-
propostas e desafios. São Leopoldo, RS: Nova
no religioso: experiências em cursos de ciência(s)
Harmonia, 2010.
da(s) religião(ões) no Brasil. Florianópolis: Saberes
POZZER, Adecir; PALHETA, Francisco; PIOVEZANAA, em Diálogo, 2017.
Leonel; HOLMES, Maria José Torres (org.). Ensino
SANTOS, Ademir Valdir dos; CECCHETTI, Elcio. “A
religioso na educação básica: fundamentos
grita endiabrada”: o ensino religioso no decurso
epistemológicos e curriculares. Florianópolis:
entre o Império e os primórdios da República. Re-
Saberes em Diálogo, 2015.
vista Pistis Praxis, Teologia e Pastoral, Curitiba,
QUIJANO, Aníbal. Colonialidad del poder, v. 13, n. 1, p. 537-552, jan./abr. 2021.
eurocentrismo y América Latina. In: LANDER,
SANTOS, Denilson Marques dos; SANTOS, Denise
Edgardo. La colonialidad del saber: eurocentrismo
Marques dos; GRANDO, Beleni Salete. Em nome
Y ciencias sociales – perspectivas latinoamericanas.
do pai: a (não) laicidade nas instituições e escolas
Buenos Aires: CICCUS/CLACSO, 2011. p. 219-264.
públicas. Conjectura: Filosofia e Educação, Caxias
QUIJANO, Aníbal. Colonialidad del poder do Sul, RS, v. 26, p. 13-35, 2021.
y clasificación social. In: CLÍMACO, DANILO
SILVA FILHO, José Alves da. O ensino de histó-
ASSIS (org.). Cuestiones y horizontes: de la
ria no Brasil e a lei 11.645/08: articulações e
dependencia histórico-estructural a la colonialidad/
entrecruzamentos das histórias e culturas africanas,
descolonialidad del poder. Buenos Aires: CLACSO,
afro-brasileiras e indígenas na educação básica.
2014. p. 285-330.
2016. 29 f. Relatório final (Iniciação Científica) –
RIOS, Alan. Religiões de matriz africana são Faculdade de Ciências da Educação e Saúde, Centro
alvos de 59% dos crimes de intolerância. Cor- Universitário de Brasília, Brasília, DF, 2016.
reio Brasiliense, Brasília, DF, 11 nov. 2019, p. 1.
Disponível em: https://www.correiobraziliense.
com.br/app/noticia/cidades/2019/11/11/
interna_cidadesdf,805394/religioes-de-matriz- Recebido em: 06/01/2022
africana-alvos-de-59-dos-crimes-de-intolerancia. Aprovado em: 11/03/2022
Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons.
Rev. FAEEBA – Ed. e Contemp., Salvador, v. 31, n. 66, p. 133-149, abr./jun. 2022 149