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“Dizer às pessoas o que pensamos sobre


seu desempenho não as ajuda a prosperar
e a sobressair. Na verdade, dizer-lhes
o que achamos que devem fazer para
melhorar dificulta seu aprendizado.”
— A FALÁCIA DO FEEDBACK, PÁGINA 50

Ilustrações MATT CHASE


Harvard Business Review
Março 2019 49
Marcus Ashley
Buckingham Goodall
é vice-presidente
GESTÃO DE é chefe de pesquisa de
pessoas e desempenho do sênior da
PESSOAS Instituto de Pesquisa ADP Cisco Systems

Durante anos os gestores foram


encorajados a elogiar e criticar
construtivamente quase todas as
atividades de seus funcionários.
Mas há melhores formas de
ajudá-los a progredir e se superar.
a falácia do feedback
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Março 2019 Ilustrações de PAUL GARLAND
Em resumo
O DESAFIO
Atualmente os gestores
são bombardeados
com solicitações de
feedback — constante,
direta e criticamente.
Mas expor as pessoas
ao nosso julgamento
sobre seu desempenho
e sobre como podem
melhorar não é a forma
ideal de ajudá-las a
se superar, e na
verdade pode inibir
seu desenvolvimento.

A REALIDADE
Pesquisas mostram
que, primeiro, não
somos avaliadores
tão confiáveis do
desempenho alheio
como acreditamos
ser. Segundo, a crítica
inibe a capacidade
de aprendizado do
cérebro. E, terceiro,
a excelência é
idiossincrática, não
pode ser definida
previamente, e não é

O debate sobre feedback profissional não


antônimo de erro.
Os gestores não podem
“corrigir” a forma como

é novo. Desde pelos menos meados do século


as pessoas alcançam
a excelência.

A SOLUÇÃO
Os gestores precisam
ajudar os membros
passado a questão sobre como promover o
das equipes a ver o
que está funcionando,
interrompê-los com
aprimoramento dos funcionários gerou muita
um “Sim! Perfeito!”
e compartilhar a
percepção que você
polêmica e pesquisas. Mais recentemente a
tem do que eles
fazem bem. discussão adquiriu nova dimensão.
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Março 2019
O experimento em andamento sobre “transparência radical”
da Bridgewater Associates e a cultura da Netflix — que o Wall
Street Journal descreveu recentemente como “encorajando
feedback severo” e submetendo os empregados a “intensas e
constrangedoras” devolutivas 360s em tempo real —, são so- GESTÃO DE
mente dois exemplos de que a forma mais eficaz de melhorar PESSOAS
o desempenho nas empresas é o feedback rigoroso, frequen-
te, sincero, generalizado e quase sempre crítico.
Uma pergunta se repete sempre: como devemos fornecer “em que condições você está”. Se eles não o fizerem, você
e receber feedback? Quanto e com que frequência, e que nunca saberá, e isso seria ruim.
novos aplicativos utilizar? E, dada a grande agitação sobre A segunda teoria é que o processo de aprendizagem é co-
as abordagens da Bridgewater e da Netflix, até que ponto mo encher um recipiente vazio: faltam-lhe certas habilidades
devemos ser rigorosos e absolutamente sinceros? No entan- e você precisa adquiri-las, por isso seus colegas deveriam lhe
to, por trás dessas questões existe outra que não estamos ensinar. Esta é nossa teoria de aprendizado. Se você trabalha
considerando, mas é crucial. A procura por formas de ofe- em vendas, como poderá fechar um negócio se não aprender
recer e receber feedback pressupõe que o feedback é sempre a habilidade de “espelhar e corresponder” a uma perspectiva
útil. Mas o único motivo de o utilizarmos é ajudar as pes- de negócio? Se você for professor, como poderá melhorar se
soas a melhorar seu desempenho. E quando analisamos isso não aprender e praticar os passos da última técnica de ensino
— perguntando como podemos ajudar cada um a progredir em equipe ou o formato das “salas de aula invertidas”? A ver-
e se superar? —, descobrimos que as repostas nos levam a dade é que você não pode e que precisa de feedback para de-
uma direção diferente. senvolver as habilidades que não tem.
Para ser claro, a instrução — dizer às pessoas que passos E a terceira teoria é que a excelência é um conceito uni-
seguir ou qual conhecimento factual está faltando — pode versal, analisável, descritível e, uma vez definido, pode ser
ser realmente útil: é por isso que nos valemos de checklists transferido de pessoa para pessoa, independentemente de
na cabine das aeronaves e, ultimamente, nas salas de cirur- quem são elas. Portanto, com feedback sobre o que significa
gia. Existe de fato uma forma certa e segura de o enfermeiro excelência, você pode descobrir se está aquém desse ideal,
aplicar injeção, e se você como enfermeiro novato pular um e então se empenhar para remediar suas deficiências. Esta é
dos passos, ou desconhecer as reais condições do paciente, nossa teoria da excelência. Se você for gestor, seu chefe deve
então alguém deveria lhe dizer essas coisas. Mas as ocasiões lhe mostrar o modelo de conduta de todo aquele que exer-
em que as ações — ou o conhecimento necessário — para de- ce tal cargo e lhe explicar como manter-se afinado com esse
sempenhar minimamente determinadas atividades podem modelo. Se você aspira ao comando, sua empresa deve usar a
ser objetivamente predefinidas são raras, e hoje cada vez ferramenta de feedback 360 graus para avaliá-lo em relação a
mais raras. O que queremos dizer com “feedback” é muito competências de liderança predefinidas e sugerir vários cur-
diferente. Feedback significa informar às pessoas o que pen- sos ou experiências que lhe permitirão adquirir as competên-
samos sobre seu desempenho e como elas poderiam melho- cias que você não tem.
rar — quer estejam fazendo uma apresentação eficiente, lide- O que essas três teorias têm em comum é o egocentrismo:
rando uma equipe ou criando uma estratégia. E sobre isso a elas consideram nossa própria experiência e o que temos cer-
pesquisa é clara: informar-lhes o que pensamos sobre seu de- teza do que é a inexperiência de nossos colegas como fatos
sempenho não as ajuda a progredir e se superar, e dizer-lhes consumados. Elas assumem que o meu jeito é necessaria-
o que achamos que deveriam fazer para melhorar na verdade mente o seu jeito.
inibe o aprendizado. Pesquisas revelam que nenhuma dessas teorias é verda-
Corroborando a convicção atual de que feedback é um deira. Quanto mais dependermos delas, e quanto mais tecno-
bem genuíno, existem três teorias que nós do mundo em- logia basearmos nelas, menos aprendizado e produtividade
presarial aceitamos como verdadeiras. A primeira afirma que obteremos dos outros. Para entender o caminho a percorrer
os outros têm mais consciência de nossos pontos fracos e, para efetivamente melhorar o desempenho, é preciso anali-
portanto, estão em melhores condições de nos ajudar. Cabe sar as três teorias individualmente e em detalhes.
a eles nos mostrar o que não conseguimos ver por nós mes-
mos. Podemos chamá-la de nossa teoria da fonte da verdade.
Você não percebe que sua roupa está rasgada, que sua apre- A fonte da verdade
sentação está maçante, ou que sua voz é irritante. Portanto, O primeiro problema com o feedback é que os seres humanos
cabe a seus colegas lhe dizer o mais claramente possível são avaliadores não confiáveis de outros seres humanos. Nos

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GESTÃO DE
PESSOAS

últimos 40 anos especialistas em psicometria mostraram em Somar todas as avaliações imprecisas da cor da rosa — “cin-
vários estudos sucessivos que as pessoas não têm objetivi- za”, “cinza mais escuro”, “cinza esbranquiçado”, “castanho
dade suficiente para manter na mente definições estáveis de cor de lama”, e assim por diante — e tirar a média nos afasta-
qualidades abstratas como perspicácia para os negócios e as- ria ainda mais, tanto de entender qualquer coisa confiável so-
sertividade e para avaliar com exatidão essas características bre as experiências pessoais do indivíduo sobre a rosa como
nas pessoas. Nossas avaliações são profundamente afetadas da verdade sobre o exato tom de vermelho da rosa.
por nossa própria compreensão do que estamos avaliando O que a pesquisa revela é que somos daltônicos quando se
no outro, por nosso próprio senso do que significa bom pa- trata de atributos abstratos, como pensamento estratégico, po-
ra determinada competência, por nosso rigor ou beneplácito tencial e sagacidade política. Nossa incapacidade de avaliar os
como avaliadores, por nosso próprio viés inerente e incons- outros nesses atributos é previsível e explicável — ela é siste-
ciente. Esse fenômeno é chamado de efeito idiossincrático do mática. Não podemos remover o erro adicionando mais input
avaliador, e ele é grande (mais de metade das avaliações que de dados e tirando a média. Isso, na verdade, aumenta ainda
fazemos de outra pessoa reflete nossas características, não mais o erro.
dela) e resiliente (nenhum treinamento pode diminuí-lo). Mas o pior é que, embora a ciência tenha provado há mui-
Em outras palavras, a pesquisa mostra que feedback é mais to tempo que somos daltônicos no mundo dos negócios,
distorção que verdade. presumimos que temos visão perfeita. Bem no fundo, não
É por isso que, apesar de todo o treinamento disponível acreditamos que afinal podemos cometer tantos erros. Acre-
sobre como receber feedback, o trabalho é tão difícil: quem ditamos que somos avaliadores confiáveis dos outros. Acre-
recebe feedback precisa embrenhar-se nessa floresta de ditamos que somos uma fonte de verdade, mas não somos.
distorções e procurar as características que reconhece Somos uma fonte de erro.
como suas. Quando um instrumento de feedback pesquisa oito cole-
E como o feedback que você oferece aos outros reflete gas sobre sua visão para os negócios, seu escore de 3,79 re-
sempre mais você que eles, isso leva a um erro sistemático presenta muito mais uma distorção que se o instrumento
que é amplificado quando as avaliações são consideradas em pesquisasse somente uma pessoa sobre você — todo o valor
conjunto. Só existem dois tipos de erro que afetam as medi- 3,79 é ruído, não há nenhum sinal. Isto posto, (a) estamos co-
das: o erro aleatório, que pode ser reduzido fazendo-se uma meçando a ver mais esse tipo de feedback baseado em dados,
média de várias medidas, e o erro sistemático, que não pode (b) esses dados sobre você provavelmente serão guardados
ser reduzido. Infelizmente, parece que todos nós saímos das por sua empresa por muito tempo e (c) eles serão usados pa-
aulas de matemática do colégio nos lembrando do primeiro ra definir salários, promoções, treinamentos e realocá-lo ou
tipo, mas não do último. Criamos todas as nossas ferramentas despedi-lo. Você deveria se preocupar por que eles são funda-
de feedback de desempenho e liderança como se os erros de mentalmente errados.
avaliação fossem aleatórios — não são. Eles são sistemáticos. O único domínio em que os seres humanos são uma fonte
Pense no daltonismo. Se pedirmos a uma pessoa daltôni- de verdade incontestável é o de seus próprios sentimentos e
ca que avalie o vermelho de determinada rosa, não podemos experiências. Os médicos sabem muito bem disso. No exame
confiar em seu feedback — sabemos que ela é incapaz de per- pós-operatório, perguntam “numa escala de um a dez, em
ceber a cor, quanto mais “avaliar” o tom de vermelho. O erro que dez é o valor mais alto, em quanto você avalia sua dor?”.
que ela comete não é aleatório. Ele é previsível e explicável, Se você disser “cinco”, o médico poderá então prescrever to-
e decorre de uma falha de seu sistema de medidas. Portan- dos os tipos de tratamento, mas o que ele provavelmente não
to, ele é sistemático. Se então decidirmos solicitar a mais sete fará é questioná-lo sobre o seu “cinco”. Independentemen-
pessoas daltônicas que classifiquem o vermelho de nossa ro- te de quantas cirurgias ele já tenha feito, não faz sentido ele
sa, seus erros serão igualmente sistemáticos, e fazer uma mé- lhe dizer que o seu “cinco” está errado e que, na verdade, ho-
dia de suas avaliações não nos ajudará muito mais para deter- je sua dor é “três”. Não faz sentido tentar analisar o que você
minar a verdadeira cor da rosa. Na verdade, é pior que isso. quer dizer com “cinco”, e se quaisquer diferenças culturais

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Seu cérebro reage ao feedback crítico como se reagisse a uma ameaça
e inibe sua atividade. Focar as pessoas nas próprias deficiências não
facilita o aprendizado, só o prejudica.
podem indicar que seu “cinco” não é, de fato, um verdadeiro esses padrões diferem de uma pessoa para outra. De acor-
“cinco”. Não faz sentido elaborar critérios de calibração com do com a neurociência, o crescimento de neurônios e cone-
outros médicos para ter certeza de que seu “cinco” é igual ao xões sinápticas é maior onde já existe grande quantidade de
“cinco” de outros pacientes do hospital. Mas ele pode confiar neurônios e conexões sinápticas. Em outras palavras, cada
que você é o melhor avaliador de sua própria dor, e que tudo cérebro cresce mais onde já é mais forte. Como descreveu de
o que ele sabe com certeza é que quando você classificar sua forma memorável Joseph LeDoux, professor de neurociência
dor com um valor mais baixo é porque estará se sentindo me- da New York University, “as conexões adicionadas lembram
lhor. A avaliação é sua, não dele. mais novos brotos num galho do que novos galhos”. Por essa
Da mesma forma que seu médico não sabe a verdade so- lente, aprender é construir, pouco a pouco, sobre os padrões
bre sua dor, não sabemos a verdade sobre nossos colegas, pe- únicos que já se encontram dentro de você. O que, por sua
lo menos não de forma objetiva. Você pode ter ouvido falar vez, significa que o aprendizado deve começar pela procura e
que os funcionários hoje — principalmente os millennials — entendimento desses padrões — os próprios padrões, não os
querem saber como estão situados. Ocasionalmente, é pos- dos outros.
sível que membros de sua equipe lhe peçam que você lhes Em segundo lugar, chamar a atenção para nossos pon-
diga, objetivamente, em que posição eles se encontram. Vo- tos positivos catalisa o aprendizado, e chamar a atenção pa-
cê pode pensar que é seu dever tentar responder a perguntas ra nossos pontos fracos o inibe. A neurociência mostra o que
desse tipo. Mas não pode — nenhum de nós pode. Tudo o que acontece conosco quando outras pessoas focam no que es-
podemos fazer — e não é muito — é compartilhar nossos pró- tá funcionando para nós, em vez de corrigir o que não está.
prios sentimentos, experiências e reações. Por isso, podemos Num experimento com estudantes, os cientistas os dividiram
dizer a alguém se sua voz é irritante para nós, se ele é persua- em dois grupos. A um grupo ofereceram coaching positivo:
sivo para nós, se sua apresentação é maçante para nós. Talvez perguntaram aos estudantes quais eram seus sonhos e como
não sejamos capazes de lhe dizer onde ele se situa, mas pode- pretendiam realizá-los. Ao outro grupo fizeram perguntas so-
mos lhe dizer como ele se situa conosco. Essas são as nossas bre os deveres de casa, o que achavam que estavam fazen-
verdades, não as dele. Essa é uma afirmação mais modesta, do de errado e o que precisava ser corrigido. Enquanto essas
mas pelo menos é precisa. conversas se desenrolavam, os cientistas submeteram os
alunos a um exame de ressonância magnética funcional para

Como aprendemos descobrir que partes do cérebro eram mais ativadas ao reagir
a esses diferentes tipos de atividade.
Outra de nossas teorias coletivas é que o feedback contém in- No cérebro dos alunos aos quais se perguntou o que pre-
formação útil e que essa informação é o ingrediente mági- cisavam corrigir, o sistema nervoso simpático se tornou mais
co capaz de acelerar o aprendizado. Mais uma vez a pesquisa brilhante. Esse é o sistema “lutar ou fugir”, que silencia ou-
aponta na direção oposta. O aprendizado trata mais de reco- tras regiões cerebrais e permite focar somente na informa-
nhecer, reforçar e redefinir o que já existe e menos de somar ção mais importante para a sobrevivência. O cérebro reage
alguma coisa que não existe. Há duas razões para isso. a feedback crítico como se reagisse a uma ameaça e inibe sua
A primeira é que, neurologicamente, as áreas cerebrais de atividade. A forte emoção negativa produzida pela crítica
maior crescimento são as de maior habilidade (nossos pontos “inibe o acesso a circuitos neurais existentes e invoca uma
positivos são nossas áreas de desenvolvimento). O cérebro incapacidade cognitiva, emocional e perceptiva”, observa
continua a se desenvolver durante toda a vida, mas cada cé- Richard Boyatzis, professor de psicologia e administração,
rebro cresce de uma forma. Devido à nossa herança genéti- ao resumir as descobertas científicas.
ca e a peculiaridades do ambiente no início de nossa infância, Focar nas deficiências ou gaps das pessoas não facilita o
as conexões cerebrais são intrinsecamente únicas. Algumas aprendizado. Mas as prejudica.
partes do cérebro têm adensamento muito mais intenso de Nos alunos que focaram em seus sonhos e como reali-
conexões sinápticas, enquanto outras são menos densas, e zá-los, o sistema nervoso simpático não foi ativado. A parte

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PESSOAS

do cérebro que se tornou mais brilhante foi o sistema nervoso E se assistir a Sarah Silverman talvez ache que engraçado é
parassimpático, às vezes chamado de sistema de “repouso e ser mordaz, direto e grosseiro de forma incongruentemente
digestão”. Boyatzis resume: “Em adultos o sistema nervoso indiferente. Nesse momento você pode começar a perceber
parassimpático estimula a neurogênese (isto é, o crescimento a verdade, isto é, “a graça” é inerente à pessoa.
de novos neurônios), sensação de bem-estar, melhor funcio- Assista a um jogo da NBA, e talvez pense “é verdade, a
namento do sistema imunológico e abertura cognitiva, emo- maioria deles é alta e atlética, mas olhe, não só cada jogador
cional e perceptiva”. tem uma função diferente na equipe, mas até os jogadores
Descobertas como essas nos mostram que, primeiro, es- com a mesma função na mesma equipe parecem se compor-
se aprendizado ocorre quando percebemos que poderíamos tar de forma diferente”. Examine uma jogada tão específica e
fazer alguma coisa melhor adicionando novas nuances ou limitada, como o lance livre permitido depois das faltas, e en-
expandindo nossa própria compreensão. O aprendizado se tenderá que não só os dois maiores arremessadores de lances
apoia em nossa percepção do que estamos fazendo bem, e livres da história têm estilos completamente diferentes, mas
não do que estamos fazendo mal, e certamente não no julga- um deles, Rick Barry — o melhor até o dia em que se aposen-
mento de outra pessoa sobre o que estamos fazendo mal. Se- tou (procure informar-se sobre ele) —, nunca fez arremesso
gundo, o que aprendemos, principalmente quando alguém livre acima dos ombros.
observa o que está funcionando dentro de nós e nos pede que A excelência parece estar inexorável e maravilhosamente
o cultivemos inteligentemente. Com frequência nos dizem entretecida em qualquer pessoa que a demonstre. A versão
que a chave do aprendizado é sair da zona de conforto, mas que cada um cria de excelência é forjada de forma única e ex-
esses resultados contradizem a velha história: se nos afastam pressa a individualidade da pessoa. O que significa que, pa-
muito de nossa zona de conforto, o cérebro para de se fixar ra cada um de nós, ela é simples — no sentido de ser natural,
em qualquer outra coisa que não seja sobreviver à experiên- fluida — e a expressão inteligente de nossas melhores quali-
cia. Está claro que aprendemos mais em nossa zona de con- dades. Ela pode ser cultivada, mas não imposta.
forto, pois é onde nossos circuitos neurais se concentram. É A excelência não é tampouco o contrário de fracasso. Mas
quando estamos mais abertos às possibilidades, mais criati- em praticamente todos os aspectos do esforço humano, as
vos, perceptivos e produtivos. É quando o feedback nos deve pessoas assumem que é sim, e que se elas estudarem o que
ser oferecido — em nossos momentos de fluência mental. leva ao funcionamento patológico e fizerem o inverso — ou
substituírem o que elas acreditam estar faltando —, poderão

Excelência criar uma atitude ideal. Essa suposição está errada. Estude
as doenças e aprenderá muito sobre doenças e pouco sobre
Passamos a maior parte de nossa vida profissional perseguin- saúde. Erradicar a depressão não o aproximará da felicidade.
do a excelência e acreditando que é fácil defini-la, mas a parte O divórcio nada diz sobre a questão da felicidade conjugal.
realmente mais difícil é codificar como nós, e todos os mem- Em entrevistas com funcionários que deixaram a empresa,
bros de nossa equipe, poderíamos atingi-la. Nós a entende- eles nada mencionam sobre os motivos de os demais perma-
mos errado: é praticamente impossível definir a excelência necerem. Se você estudar o fracasso, aprenderá muito sobre
em qualquer esforço e, no entanto, é relativamente fácil para fracasso, mas nada sobre excelência. A excelência tem seu
cada um de nós atingi-la. próprio padrão.
A excelência é idiossincrática. Pense numa pessoa engra- E o problema é ainda maior. A superação e o fracasso têm
çada, capaz de fazer os outros rir. Se você assistir a clipes an- muito em comum. Por isso, se você estudar líderes ineficien-
tigos de Steve Martin, pode pensar que nele a excelência sig- tes e observar que o ego deles é enorme e argumentar que
nifica dedilhar um banjo, balançar os joelhos e choramingar bons líderes não deveriam ter ego tão grande, você deixará as
“eu sou um cara descontrolado e maluco!”. Mas, se assistir a pessoas confusas. Por quê? Porque quando você avalia a per-
Jerry Seinfeld, poderá concluir que excelência significa falar sonalidade de líderes extremamente eficientes, descobre que
sobre nada em tom ligeiramente aborrecido e exasperado. eles têm ego monumental. Aconselhar alguém a diminuir o

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A FORMA CORRETA DE AJUDAR
SEUS COLEGAS A SE SUPERAR
Se você quer discutir a excelência, aqui estão alguns
exemplos de linguagem a ser testados.

EM VEZ DE TENTE vendedores revelam que eles de fato tomam a rejeição em ní-
vel extremamente pessoal.
Posso lhe oferecer algum Acontece que encontramos líderes eficientes que colo-
Esta foi minha reação. cam o ego a serviço de outros, não de si mesmos, e vendedo-
feedback?
res eficientes que tomam a rejeição em nível pessoal porque
Aqui estão três coisas que estão pessoalmente comprometidos com a venda — mas a
funcionaram para mim. O questão é que você nunca descobrirá isso estudando desem-
Bom trabalho! que passou pela sua cabeça penho ineficiente.
quando você executou esta Como a excelência é idiossincrática e não pode ser apren-
tarefa? dida pelo estudo dos erros, nunca poderemos ajudar as pes-
soas a ser bem-sucedidas mantendo seu desempenho preso
É isso o que você deveria fazer. É isso o que eu faria. a um modelo de excelência pré-fabricado e dizendo-lhes que
preencham os gaps. Essa abordagem só fará com que elas
Aqui está o que funcionou sempre se adaptem ao desempenho. Aponte os erros grama-
Eis uma lista do que você
melhor para mim, e eis o ticais de um texto e peça ao autor que os corrija, e não terá
precisa melhorar.
porquê. uma peça literária que atraia o leitor, embora o texto fique
gramaticalmente correto. Mostre a um novo professor quan-
Isto realmente não funciona.
Quando você fez x, do seus alunos perderam o interesse e diga-lhe o que fazer
eu senti y ou eu não entendi. para corrigir esta falha. Agora, ainda que você possa ter um
professor cujos alunos não dormem em sala de aula, você não
Você precisa melhorar suas Foi exatamente aqui onde eu terá um cujos alunos necessariamente aprendem mais.
habilidades de comunicação. me perdi.

Você precisa ser mais


Quando você não diz nada,
eu me preocupo por não
Como ajudar as pessoas a
reativo. estarmos falando a mesma
língua.
atingir a excelência
Se continuarmos a gastar nosso tempo identificando o
fracasso à medida que o vemos e a oferecer às pessoas
Você não tem pensamento Estou me esforçando para
feedback sobre como evitá-lo, estaremos desprezando a
estratégico. entender seu plano.
questão da adequação. Para entrar na discussão da excelên-
cia precisamos de algumas novas técnicas.
Com que você sente que
Procure resultados. A excelência não é um resultado, por
Você deveria fazer x está tendo dificuldade, e
(em resposta a um pedido de que você fez no passado isso observe quando uma perspectiva descamba para uma
conselho). que funcionou, em situação conversa de vendedor, um projeto que segue sem percalços,
semelhante? ou um cliente nervoso que de repente se acalma. Procure o
membro da equipe responsável por esse resultado e diga: “Is-
so! Perfeito!”. Ao fazê-lo, você interrompe o fluxo do trabalho
por um momento e obriga seu colega a focar novamente no
tamanho do para ser um bom líder é um equívoco. Da mesma que ele acabou de fazer que realmente funcionou.
forma, se você estudar maus vendedores, descobrirá que eles Conta-se uma história sobre como Tom Landry, o lendá-
tomam a rejeição no nível pessoal; se depois você disser a um rio treinador do Dallas Cowboys, deu a volta por cima com
vendedor promissor que evite essa conduta, seu conselho se- sua equipe em dificuldades. Enquanto outras equipes ava-
rá falso. Por quê? Porque estudos rigorosos sobre os melhores liavam ataques errados e bolas perdidas, Landry analisava

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Se você perceber que alguém está fazendo
alguma coisa que realmente funciona,
interrompa-a e disseque o assunto.
detalhadamente videoteipes de jogos passados e criava para Por outro lado, se você for membro da equipe, sempre
cada jogador um resumo dos melhores momentos em que ele que o líder o surpreender fazendo alguma coisa certa, pe-
tinha feito alguma jogada de forma fácil, natural e eficiente. ça-lhe que faça uma pausa e descreva a reação dele em re-
Landry imaginava que enquanto o número de formas erradas lação a você. Se ele disser “bom trabalho!”, pergunte “que
de armar jogadas era infinito, o número de maneiras certas, parte? O que em sua opinião funcionou bem?”. Novamen-
para qualquer jogador em particular, não era. Era previsível, e te, a questão não é alimentar o elogio. A questão é explorar a
a melhor forma de descobrir era analisar as jogadas que aque- natureza da excelência, e isso é certamente um objetivo me-
le jogador tinha executado com maestria. “De agora em dian- lhor para toda a energia que atualmente está sendo aponta-
te”, ele disse a cada membro da equipe, “só veremos o replay da como “transparência radical” e coisas do gênero. Estamos
de suas jogadas magistrais.” tão próximos de nosso próprio desempenho que é difícil criar
Ele estava fazendo isso para que os membros da equipe uma perspectiva e enxergar seus padrões e componentes.
se sentissem melhor sobre si mesmos, porque ele sabia do Peça a ajuda de seu líder para tornar o inconsciente conscien-
poder do elogio. Mas Landry não estava interessado só em te — de modo a entendê-lo, aprimorá-lo e, o mais importante,
elogiar, mas também em aprender. Seu instinto lhe dizia que fazê-lo de novo.
cada jogador melhoraria o desempenho se pudesse ver, em Nunca perca de vista sua interrupção de mais alta
câmera lenta, sua versão pessoal de excelência. prioridade. Em computação, uma interrupção de alta prio-
Você pode fazer o mesmo. Sempre que um membro de sua ridade ocorre quando algum item exige atenção imediata do
equipe executar uma tarefa que você aprovou, que balançou processador do computador, e a máquina para as operações
seu mundo, mesmo que somente um pouco, pare um minuto normais joga um item urgente para o começo da fila de pro-
e destaque-a. Ao ajudar a pessoa a reconhecer o que a excelên- cessamento. Como os processadores de computador, os líde-
cia significa para ela — dizendo “Isso! Perfeito!” —, você lhe res de equipes têm várias situações que exigem atenção e os
oferece a chance de ganhar insights. Você está reforçando obrigam a agir. A maioria delas são problemas. Se você perce-
um padrão que já está dentro dela, para que ela possa reconhe- ber que alguma coisa está saindo dos trilhos — uma chama-
cê-lo, ancorá-lo, recriá-lo e redefini-lo. Isso é aprendizado. da telefônica mal atendida, uma reunião perdida, um proje-
Reproduza suas reações instintivas. Ao contrário de to que deu errado —, o instinto vai interferir para parar tudo
Landry, você não poderá gravar um videoteipe de seu pes- para dizer a alguém o que ele fez errado e o que precisa fazer
soal. Mas aprenda a mostrar a eles suas próprias reações pes- para corrigir. Esse instinto não é absolutamente equivocado:
soais. O importante é não dizer à pessoa como seu desempe- se um membro da equipe faz besteira, você precisa lidar com
nho foi bom ou quanto ela é boa no que faz. Embora o sim- isso. Mas lembre-se de que quando você intervém, está sim-
ples elogio não seja ruim, você não é nenhuma autoridade plesmente remediando — e que esse paliativo não só inibe o
sobre o que é objetivamente um bom desempenho, e ela sabe aprendizado, mas também não leva a pessoa a se aproximar
disso instintivamente. Em vez disso, descreva sua sensação da excelência. Como vimos, para fazer com que os membros
quando aquele momento de superação chamou sua atenção. de sua equipe se superem é preciso que você adote um foco
Não há nada mais aceitável e mais confiável que compartilhar diferente. Se você perceber que alguém está fazendo algu-
o que você aprovou no comportamento dela e como você se ma coisa que realmente funciona, interrompa-a e disseque
sentiu. Utilize frases como “foi assim que isso repercutiu em o assunto com ela — essa não é apenas uma interrupção de
mim”, ou “foi isso o que me fez pensar”, ou até “você viu o alta prioridade, é sua interrupção de alta prioridade. À me-
que fez lá?”. Essas são suas reações — são suas verdades —, e dida que você mostra um replay de cada pequeno momen-
quando você as baseia em detalhes específicos, você não as to de superação para o membro da equipe, você facilitará a
julga nem classifica. Você simplesmente vocaliza para ela a entrada dele no estado mental “descanse e digira”. A forma
“marca” única que ela acabou de deixar no mundo, de acordo como ele compreende e sente o que a excelência significa se
com sua visão. E justamente por não ser um julgamento ou tornará mais viva, seu cérebro se tornará mais receptivo a
uma avaliação, é também mais sincero e mais poderoso. novas informações e criará conexões com outros inputs que

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PESSOAS

se encontram em outras regiões do cérebro, e ele aprenderá, de imediato?”. Perguntas desse tipo levam a respostas con-
crescerá e se tornará melhor. cretas. Elas podem ajudar seu colega a encontrar seu verda-
Explore o presente, o passado e o futuro. Quando as deiro self, fazendo coisas reais num futuro de curto prazo.
pessoas se aproximam de você e pedem feedback sobre de-
sempenho delas ou sobre o que elas precisam para corrigir COMO OFERECER FEEDBACK é atualmente um dos tópicos de
para conseguir uma promoção, tente isto: maior interesse no mundo dos negócios. Os argumentos para
Comece com o presente. Se um membro da equipe o abor- a sinceridade absoluta, sem rodeios, e transparência gene-
da com um problema, é porque ele está com um problema ralizada têm um ar de superioridade, quase que como para
nesse momento. Ele está se sentindo fraco ou desafiado, e pre- indicar que somente os melhores e mais corajosos podem
cisa de ajuda. Mas, melhor que atacar o problema, peça enfrentar essas verdades com autoconfiança imperturbável,
a seu colega que relate três coisas que estão funcionando que aqueles que recuam diante da ideia de trabalhar num cli-
bem para ele exatamente nesse momento. Essas coisas podem ma de contínua avaliação estão condenados à mediocridade
estar relacionadas ao problema em si, ou serem de e que, como líderes, nossa capacidade de olhar para nossos
natureza completamente diferente. Elas podem ser impor- colegas diretamente no olho e expor suas falhas sem piscar é
tantes, ou triviais. Simplesmente faça a pergunta e você esta- uma medida de nossa integridade.
rá estimulando nele a oxitocina — às vezes, chamada “droga Mas, na melhor das hipóteses, a obsessão por feedback só
do amor”, mas neste contexto pode ser entendida como a serve para corrigir erros — nos raros casos em que os passos
“droga da criatividade”. Fazê-lo pensar em coisas específicas certos são conhecidos e podem ser avaliados objetivamen-
que estão indo bem alterará a química de seu cérebro, permi- te. E, na pior, ela é tóxica, porque o que queremos de nosso
tindo que ele esteja aberto a novas soluções e novas formas pessoal — e de nós mesmos — não é, para a maioria, uma ade-
de pensar e agir. são organizada a um procedimento previamente combinado
A seguir, volte ao passado. Pergunte-lhe “quando você ou, no caso em questão, a capacidade de apontar os defeitos
teve um problema como este no passado, o que fez para re- uns dos outros. São essas pessoas que contribuem com seus
solver que deu certo?”. Boa parte do que acontece em nossa talentos únicos para um bem comum, quando esse bem está
vida segue padrões, por isso é bastante provável que ele já te- em constante evolução, quando estamos, pelas razões certas,
nha deparado com esse problema pelo menos algumas vezes inventando à medida que avançamos. O feedback não oferece
antes. Numa dessas ocasiões ele provavelmente encontrou nada para isso.
alguma saída, alguma atitude, insight ou conexão que permi- Nós, seres humanos, não nos saímos bem quando alguém
tiu que ele saísse da enrascada. Faça com que ele pense nisso cujas intenções não são claras avalia nosso desempenho,
e analise racionalmente: o que ele realmente sentiu e fez, e o se somos “realmente” bons, e o que precisamos fazer para
que aconteceu depois. nos corrigir. Atingimos a excelência somente quando as
Finalmente, vá para o futuro. Pergunte ao membro de sua pessoas que nos conhecem e que se importam conosco nos
equipe “o que você já sabe que precisa fazer? O que você já dizem o que elas observaram e o que sentem, e, em particu-
sabe que funciona nesta situação?”. Mas, de qualquer forma, lar, quando notam alguma coisa dentro de nós que realmente
ofereça uma ou duas de suas próprias experiências para ver funciona.
se elas o ajudam a entender as dele. Mas aja sob a suposição HBR Reprint R1903C–P Para pedidos, página 9
de que ele já sabe a solução — você está somente ajudando-o
a identificá-la.
MARCUS BUCKINGHAM é chefe de pesquisa de pessoas e
A ênfase aqui não deve ser nos porquês — “Por que is- desempenho do Instituto de Pesquisa ADP. ASHLEY GOODALL,
so não funciona?”, “Por que acha que você poderia fazer is- é vice-presidente sênior de liderança e inteligência de equipe da
so?”—, porque isso leva vocês dois a um mundo nebuloso de Cisco Systems. Juntos escreveram o livro, a ser lançado em breve,
conjecturas e conceitos. Em vez disso, foque nos quês — “que Nine lies about work: a freethinking leader’s guide to the real world
você quer que realmente aconteça”, “que você poderia fazer (Harvard Business Review Press).

60 Harvard Business Review


Março 2019

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