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As vanguardas europeias configuraram uma época marcada por

grandes movimentos artísticos e culturais iniciados na Europa a partir


do século XX. Serviram de inspiração em diversos segmentos das artes
plásticas (literatura, pintura, escultura, etc.).
Conceito de Vanguarda
Deriva do francês avant-garde) em sentido literal faz referência ao batalhão
militar que precede as tropas em ataque durante uma batalha. Daí deduz-se
que vanguarda é aquilo que "está à frente". portanto aquele que está à frente
do seu tempo em uma atitude poderia se intitular como pertencente a uma
vanguarda. Pressupõe, nesse contexto, ser um movimento pioneiro das Artes.
Os movimentos europeus de vanguarda eram aqueles que,
segundo seus próprios autores, guiavam a cultura de seus tempos,
estando de certa forma à frente deles. Muitos destes movimentos
acabaram por assumir um comportamento próximo ao dos partidos
políticos: possuíam militantes, lançavam manifestos e acreditavam que
a verdade encontrava-se com eles.
Nesse período, a Europa estava em clima de contentamento diante
dos progressos industriais, dos avanços tecnológicos, das descobertas
científicas e médicas, como: eletricidade, telefone, rádio, telégrafo,
vacina antirrábica, os tipos sanguíneos, cinema, RX, submarino,
produção do fósforo. Ao mesmo tempo, a disputa pelos mercados
financeiros (fornecedores e compradores) ocasionou a I Guerra
Mundial.
Surgiram inúmeras tendências na arte, principalmente manifestos
advindos do contraste social: de um lado a burguesia eufórica pela
emergente economia industrial e, de outro lado, a marginalização e
descontentamento da classe proletária e a intensificação do
desemprego (especialmente após a queda da bolsa de Nova Iorque em
1929).
O Brasil, por sua vez, passou de escravocrata para mão de obra
livre, da Monarquia para República.
Os movimentos culturais desse período, responsáveis por uma
série de manifestos, são: Futurismo, Expressionismo, Cubismo,
Dadaísmo, Surrealismo, chamados de vanguardas européias.
CUBISMO
É um movimento artístico que ocorreu entre 1907 e 1914, nas artes
plásticas, tendo como um dos principais fundadores Pablo Picasso O
Cubismo tratava as formas da natureza por meio de figuras
geométricas, representando todas as partes de um objeto no mesmo
plano. A representação do mundo passava a não ter nenhum
compromisso com a aparência real das coisas.
Esse novo estilo rompeu com os modelos estéticos que só
valorizavam a perfeição das formas. O cubismo adota como princípio o
questionamento da descrição clássica. Os artistas desejam, agora,
apresentar relações e não formas acabadas. Para enfatizar essas
relações, propõem diferentes pontos de vista a partir dos quais um
determinado objeto pode ser observado.
Esse movimento pode ser considerado o primeiro a se caracterizar
pela incorporação do imaginário urbano industrial em suas obras.
Abrangeu sobretudo as artes plásticas e influenciou a literatura.
Cubismo é a arte que permite uma visualização de forma
simultânea.
Pablo Picasso e Georges Braque, foram dois dos principais
artistas do cubismo.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO
CUBISMO
Valorização das formas geométricas e fragmentadas

Como o próprio nome do movimento sugere, o Cubismo tem como


principal característica o uso de formas da geometria como
componente de destaque nas obras.
O artista cubista busca a simplificação do mundo em suas pinturas
e, para isso, se apropria de cubos, cones, cilindros e outras formas
geométricas com linhas retas e simples.
Uso da colagem como técnica de reconstrução da imagem

O artista introduzia recortes de jornais, revistas e pedaços de


outros materiais (madeira, vidro, metal, etc) na pintura, mesclando
texturas e formas para a produção de seus trabalhos.
A intenção da colagem seria transportar a interação entre o
observador e a obra para além do campo visual, despertando também
sensações táteis nas pessoas.
Renúncia à perspectiva

A construção das imagens a partir da junção sobreposta desses


fragmentos transmite, para o artista, a sensação de estar a "esculpir" a
pintura. A partir disso surge o conceito de pintura escultórica, que
também define vários trabalhos do movimento cubista.
Predominância de cores monocromáticas e opacas

Alguns dos principais nomes do Cubismo Analítico, como Pablo


Picasso, por exemplo, caracterizavam as suas obras pelo uso de cores
escuras e monocromáticas, como o marrom, cinza, preto, verde, ocre e
bege. A palheta de cores era muito limitada, sendo que em alguns
trabalhos a diferença estava apenas entre as diferentes tonalidade de
uma mesma cor.
Obra como um exercício mental

O Cubismo não se limita a retratar a natureza da forma que se


apresenta na realidade, mas sim uma ideia abstrativa conceitual dos
objetos que nela estão inseridos. Por esse motivo, as obras cubistas
podem ser consideradas um "exercício mental" para o observador, que
precisa interpretar a imagem que se apresenta fragmentada e
sobrepostas por diferentes figuras da geometria.
Retratação do primitivo

É possível ver referências diretas às máscaras africanas e ao


conceito do primitivismo O quadro "Les demoiselles d'Avignon" (As
senhoras de Avignon), de Picasso, 1907 é conhecido como marco
inicial do Cubismo. Nele ficam evidentes as referências a máscaras
africanas, que inspiraram a fase inicial do cubismo.
Este quadro, em 1907, provoca comoção na cena artística
parisiense. O quadro revela um modo revolucionário de representar a
realidade, rompendo com os conceitos tradicionais da harmonia,
proporção, beleza e perspectiva.
Na tela, cinco mulheres nuas exibem corpos e rostos definidos
por formas geométricas. A deformação dá ao observador a impressão
de que foram talhadas a golpes de machado. Os braços são disformes,
os cotovelos pontiagudos, acentuando os ângulos. Corpos e cabeças
mostram simultaneamente o rosto e as costas, em uma impossibilidade
física. Com a obra, Picasso destrói o mito da beleza feminina, ao
mesmo tempo em que alude à diversidade étnica deixando evidente
nos rostos a inspiração das máscaras africanas.
A LITERATURA CUBISTA

O primeiro manifesto da literatura cubista, de autoria do poeta


francês Guillaume Apollinaire, só surge em 1913, bem depois das
primeiras exposições das obras de Picasso e Braque. É na poesia que
a literatura cubista ganha forma. Explorando a associação entre
ilogismo, simultaneidade, instantaneísmo e humor.
Os poetas cubistas buscam criar perspectivas e afirmar a
necessidade de manter as coisas em permanente relação.
No Brasil, a influência dessa vanguarda aparece na obra de
Oswald de Andrade. Alguns de seus poemas e passagens da prosa
surpreendem o leitor pelas estranhas associações que deslocam o
olhar para diversos aspectos da realidade, ao mesmo tempo.
HÍPICA

Saltos records
Cavalos da Penha
Correm jóqueis de Higienopólis
Os magnatas
As meninas
Ea orquestra toca
Chá
Na sala de cocktails.
ANDRADE, Oswald de. Poesia reunidas. Obras completas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974. v. 7, p.
129.

A composição do poema é claramente cubista. Para retratar o


ambiente de uma corrida de cavalos na hípica, o eu - lírico promove
uma “sobreposição” de imagens que deslocam o olhar do leitor da
pista., onde estão cavalos e jóqueis, para o público entretido pela
orquestra. O resultado é uma imagem multifacetada, composta de
fragmentos de diferentes planos da realidade.
FUTURISMO
Em 1909, a Europa é surpreendida pelo surgimento de uma nova
vanguarda o Futurismo Com propostas mais organizadas que o
Cubismo, o Futurismo é um movimento artístico e literário, que surgiu
oficialmente em 20 de fevereiro de 1909 com a publicação do Manifesto
Futurista divulgado através de seu líder, Filippo Tommaso Marinetti.
O Futurismo representou um movimento literário e artístico que
tinha como principal característica a valorização da tecnologia e
velocidade. Essa corrente faz parte das vanguardas artísticas
europeias que despontaram no início do século XX. Influenciou a
literatura, a pintura, a escultura, a música e outras vertentes das artes.
O termo "futurismo" deriva do latim futurus e significa "tempo que
há de vir", Para os futuristas, porém, ele passa a designar uma nova
forma de ação, uma lei de "higiene mental", um movimento que
pretende ser é antitradicional, renovador, otimista, heróico, dinâmico e
que se ergue sobre o passado.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO
FUTURISMO
Valorização da velocidade e dinamismo e
exaltação da tecnologia

Estava evidente no Futurismo a valorização da industrialização e


da tecnologia enquanto progresso técnico. Além disso, os parâmetros
se baseavam no futuro, na velocidade, na vida moderna.
Exaltação pelas formas do mundo moderno móveis, aviões, em um
eterno culto à velocidade, fascinação pelas novas tecnologias, visto
como uma força mística.
Ideia de dinamicidade

O uso de cores vivas e contrastes e a sobreposição das imagens


pretendia dar a ideia de dinâmica. Procura-se neste estilo expressar o
movimento atual, registrando a velocidade descrita pelas figuras em
movimento no espaço. O artista futurista não está interessado em pintar
um automóvel, mas captar a forma plástica a velocidade descrita por
ele no espaço
Ligação ideológica com o fascismo
Marcado por um nacionalismo agressivo, que levou muitos de seus
integrantes, especialmente Marinetti, a um entusiasmo com a guerra e
ao apoio categórico do fascismo e a glorificação da ideologia da guerra
e da velocidade proporcionada pelos avanços técnicos e militares.
Tendência à justificar a violência
através do militarismo
O fascínio pela violência pode ser interpretado como um desejo de
levar a humanidade a um ponto sem retorno. os futuristas exaltam" a
bofetada e o soco" como meio de despertar o público da passividade
em que se encontra.
O futurista espera provocar uma resposta no público. A violência
que destrói as certezas e os modelos obriga o leitor a reagir. O
processo de recepção da nova arte passa a ser, assim, mais dinâmico
e interativo.
"Nós queremos demolir os museus, as bibliotecas [...] Nós
cantaremos as grandes multidões excitadas pelo trabalho, pelo prazer,
e pelo tumulto; nós cantaremos a canção das marés de revolução"
significa eliminar a possibilidade de o passado ser retomado como
modelo, porque, com a destruição de seus símbolos e de sua
memória, ele não existirá mais como referência.
Reações na pintura e na escrita

Na pintura: uso de cores vibrantes e de contrastes; abstração e


desmaterialização dos objetos (influência cubista); sobreposição de
imagens e traços em busca de representar a ideia de movimento e
velocidade;
Na escrita: “liberdade para a palavra”; uso de onomatopeias, de
versos livres, de frases fragmentadas ou em lugares inesperados, para
passar a ideia de velocidade; vocabulário tecnológico; uso de
exclamações e interjeições para expressar energia. É recomendado
que os textos futuristas destruam a sintaxe, a pontuação.
Giácomo Balla, Poste de Iluminação, 1909.
A deslumbrante luz das grandes lâmpadas elétricas.

O fascínio pela eletricidade dava identidade à arte futurista.


Giácomo Balla, inspirado em um dos primeiros postes de iluminação
elétrica instalados em Roma, pintou esse quadro em que justapõe os
raios de luz descarregados em setas multicolores pela lâmpada.
Perdida em meio aos raios, a Lua parece girar ao redor da lâmpada,
sugerindo a submissão da natureza às forças da tecnologia.
O futurismo influenciou diversos artistas que depois fundaram
outros movimentos modernistas, como Oswald de Andrade e Anita
Malfatti, que tiveram contato com o Manifesto Futurista e com Marinetti
em viagens à Europa já em 1912. Após uma interrupção forçada pela
Grande Guerra, o contato foi retomado.
Foi certamente uma das influências da Semana de Arte Moderna
de 1922, e seus conceitos de desprezo o passado para criar o futuro e
não à cópia e veneração pela originalidade caiu como uma luva no
desejo dos jovens artistas de parar de copiar os modelos europeus e
criar uma arte brasileira.
EXPRESSIONISMO
Surgiu no final do século XIX e início do século XX, porém teve seu
início de fato em 1910 na Alemanha. A época de surgimento do
expressionismo foi marcada pelo desamparo e o medo da sociedade
que passara, recentemente, pelo processo de unificação da Alemanha,
mas que ainda era por este motivo atrasada industrialmente. Os
principais artistas deste período são: Edvard Munch, Ernst Kirchner,
Franz Marc e Vicent Van Goch.
Apresentando-se como reação à estética impressionista de
valorização sensorial. Contemporâneo do Cubismo e do Futurismo, a
base do Expressionismo é o resultado de um processo criativo que
supõe a perda do controle consciente durante a produção de sua obra
de arte. A realidade não deve mais ser percebida em planos distintos
(físico, psíquico, etc.), mas sim transformada em expressão.
A visão expressionista encontra suas fontes na defesa à expressão
do irracional, dos impulsos e das paixões individuais. No
expressionismo, não há uma preocupação em relação à objetividade da
expressão, mas sim, com a exteriorização da reflexão individual e
subjetiva dos artistas. É a arte do instinto, trata-se de uma pintura
dramática, subjetiva, “expressando” sentimentos humanos, o
sentimento do artista. Utilizando cores irreais, dá forma ao amor, ao
ciúme, ao medo, à solidão, à miséria humana, à prostituição.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO
EXPRESSIONISMO
Expressão dos sentimentos e das emoções,
valorizando a subjetividade do artista.

A fonte de inspiração de O Grito pode ser encontrada na vida


pessoal do próprio Munch. O seu estado de espírito está bem patente
nas linhas que escreveu no seu diário:
“Passeava com dois amigos ao pôr-do-sol – o céu ficou de súbito
vermelho-sangue – eu parei, exausto, e inclinei-me sobre a mureta– havia
sangue e línguas de fogo sobre o azul escuro do fjord e sobre a cidade – os
meus amigos continuaram, mas eu fiquei ali a tremer de ansiedade – e senti o
grito infinito da Natureza”.
Paleta cromática e agressiva, com cores
vibrantes e intensas.

Pinturas com traços fortes, resultados de movimentos agressivos


com o pincel. Através de uma paleta cromática e agressiva e do recurso
às temáticas da solidão e da miséria, o expressionismo é um reflexo da
angústia e ansiedade que dominavam os círculos artísticos e
intelectuais da Alemanha durante os anos anteriores à Primeira Guerra
Mundial (1914-1918)
Deformação da realidade, com ilusão
na representação do mundo tridimensional

Deformação da imagem visual e cores resplandecentes, vibrantes,


fundidas ou separadas. O pintor recusa o aprendizado técnico e pinta
conforme as exigências de sua sensibilidade. O pincel (ou a espátula)
vai e vem, fazendo e refazendo, empastando ou provocando
explosões... Por isso a preferência pelo patético, trágico e sombrio.
Retratação de temas como o da miséria,
da solidão, da angústia, do pessimismo, etc.

Os expressionistas tentaram captar o drama da existência, da


tentativa do homem de dominar a realidade, mas ser arrastado por ela.
o advento da Primeira Guerra Mundial trouxe à tona um cenário de
sofrimento, fome, recessão econômica e deterioração moral. Os
horrores desse longo conflito evidenciaram um mundo caótico, violento,
esfacelado e moribundo, dando ao período e aos sujeitos uma
sensação de constante aflição e desespero.
O movimento expressionista, bastante influenciado pela Primeira
Guerra Mundial, apresentam quadros que resultam de um lado obscuro
da humanidade, retratando faces marcadas pela angústia e pelo medo.
A mais conhecida tela expressionista é O grito, de Edvard Munch.
Vemos ao fundo um céu de (cores quentes), em oposição ao rio em
azul (cor fria) que sobe acima do horizonte, característica do
expressionismo (onde o que interessa para o artista é a expressão de
suas ideias e não um retrato da realidade). Vemos que a figura humana
também está em cores frias, azul, como a cor da angústia e da dor,
sem cabelo para demonstrar um estado de saúde precário.
Os elementos descritos estão tortos, como se reproduzindo o grito
dado pela figura, como se entortando com o berro, algo que reproduza
as ondas sonoras. Quase tudo está torto, menos a ponte e as duas
figuras que estão no canto esquerdo. Tudo que se abalou com o grito e
com a cena presenciada está torto, quem não se abalou (supostamente
seus amigos, como descrito acima) e a ponte, que é de concreto e não
é "natural" como os outros elementos, continua reto.
A dor do grito está presente não só no personagem, mas também
no fundo, o que destaca que a vida para quem sofre não é como as
outras pessoas a enxergam, é dolorosa também, a paisagem fica
dolorosa e talvez por essa característica do quadro é que nos
identificamos tanto com ele e podemos sentir a dor e o grito dado pelo
personagem. Nos introjetamos no quadro e passamos a ver o mundo
torto, disforme e isso nos afeta diretamente e participamos quase
interativamente da obra.
No Brasil, Cândido Portinari (1903-1962) destacou-se no estilo
expressionista. O artista representou intensamente em suas obras as mazelas
do povo nordestino. Além dele, Anita Malfatti (1889-1964), que na Alemanha
teve contato com artistas do Expressionismo, também foi fortemente
influenciada por essa corrente.
Temas como estes garantem aos textos expressionistas um forte caráter
negativista, fazendo com que muitas vezes a representação do mundo se faça
de forma grotesca e deformada, imagens distorcidas da realidade para traduzir
as vivências humanas.
O expressionismo na literatura é marcado por subjetividade do escritor,
análise minuciosa do subconsciente dos personagens e metáforas exageradas
ou grotescas. Em geral, a linguagem é direta, com frases curtas. O estilo é
abstrato, simbólico e associativo.
Uma passagem do romance Amar, verbo intransitivo, de Mário de
Andrade, flagra o impacto da Floresta da Tijuca na personagem
Fräulein Elza. Contemplando o espetáculo magnífico da natureza
brasileira, a alemã é tomada por sensações impressões que alteram o
modo como vê montanhas e árvores.

Vista do Rio de Janeiro, com a floresta da Tijuca, paisagem de Amar, verbo


intransitivo
“A luz delirava, apressada a um vago aviso de tarde. Era tal e tanta que
embaçava de ouro a amplidão. Se via tudo longe num halo que divinizava e
afastava as coisas mais. Lassitude. No quiriri tecido de ruidinhos abafados, a
cidade se movia pesada, lerda. O mar parara azul. [...]
Fräulein botara os braços cruzados no parapeito de pedra, fincara o mento
aí, nas carnes rijas. E se perdia. Os olhos dela pouco a pouco se fecharam,
cega duma vez. A razão pouco a pouco escapou. Desapareceu por fim,
escorraçada pela vida excessiva dos sentidos. Das partes profundas do ser lhe
vinham apelos vagos e decretos fracionados. Se misturavam animalidades e
invenções geniais.[...] Adquirira enfim uma alma vegetal.”
ANDRADE, Mário de. Amar, verbo intransitivo. 18.ed. Belo Horizonte: Vila Rica,
1992. P. 120 (fragmento)

Lassitude: cansaço, fadiga.


Quiriri: calada da noite.
Mento: queixo.
Escampou: limpou, tornou-se clara, serena.
DADAÍSMO
Em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial o romeno Tristan
Tzara espanta o mundo com mais uma vanguarda: o Dadaísmo, ou
Dadá, a mais radical e a menos compreensível de todas as
vanguardas. Dadá é uma palavra francesa que significa na linguagem
infantil "cavalo de pau". Esse nome escolhido não fazia sentido, assim
como a arte que perdera todo o sentido diante da irracionalidade da
guerra.
O lema era: "a destruição também é criação". Essa proposta de
arte era irreverente e espontânea, pautada na irracionalidade, na ironia,
na liberdade, no absurdo e no pessimismo. O intuito principal era de
chocar a burguesia da época e criticar a arte tradicionalista, a guerra e
o sistema. É nesse contexto que o poeta romeno Tristan Tzara
(1896-1963) cria o movimento Dadaísta, em meados da Primeira
Guerra Mundial
Marcel Duchamp foi um pintor e escultor francês famoso por seus
ready-mades, objetos que são escolhidos aleatoriamente e que, após
uma leve intervenção do artista, tornam-se obra de arte. É o caso de
Fonte, um urinol de louça que Duchamp enviou a uma mostra, em
1917, mas que foi rejeitado. O artista ficou conhecido também por
pintar bigodes na Mona Lisa, em clara demonstração de desprezo pela
arte acadêmica. Inventou mecanismos ópticos, fez curtas-metragens e
colagens.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO
DADAÍSMO
Rompimento com os modelos
tradicionais e clássicos

Os expressionistas tentaram captar o drama da existência, da


tentativa do homem de dominar a realidade, mas ser arrastado por ela.
o advento da Primeira Guerra Mundial trouxe à tona um cenário de
sofrimento, fome, recessão econômica e deterioração moral. Os
horrores desse longo conflito evidenciaram um mundo caótico, violento,
esfacelado e moribundo, dando ao período e aos sujeitos uma
sensação de constante aflição e desespero.
Defesa do absurdo, do ilógico e do irracional
Valorização da antiarte

O Dadaísmo vem para abolir de vez a lógica , a organização, o


olhar racional, dando à arte um caráter de espontaneidade total. A falta
de sentido já é anunciada no nome escolhido para a vanguarda.
Segundo o próprio Tzara: “Dadá não significa nada”.
Sua proposta é que a arte ficasse solta das amarras racionalistas e
fosse apenas o resultado do automatismo psíquico, selecionado e
combinando elementos por acaso. Sendo a negação total da cultura, o
Dadaísmo defende o absurdo, a incoerência, a desordem, o caos.
Desprezo do subjetivismo e
do convencionalismo

Enfatizou o ilógico e o absurdo. Sua principal estratégia era


mesmo denunciar e escandalizar. O principal problema de todas as
manifestações artísticas está, segundo os dadaístas, em almejar algo
impossível: explicar o ser humano. Em mais uma afirmação
retumbante, Tzara decreta: “A obra de arte não deve ser a beleza em si
mesma, porque a beleza está morta”.
Obras que têm como objetivo
escandalizar o público

Esforçando-se para expressar a negação de todos os valores


estéticos e artísticos correntes, os dadaístas usam, com frequência,
métodos intencionalmente incompreensíveis. Nas pinturas e esculturas,
por exemplo, aproveitam pedaços de materiais encontrados pelas ruas
ou objetos jogados fora. O fim do Dadaísmo como atividade de grupo
ocorreu por volta de 1921.
O movimento dadaísta se difundiu nas artes plásticas e também na
literatura. Os poetas dadaístas cultivavam a disposição aleatória das
palavras. Dessa forma, era notória a falta de lógica espontaneísmo e
irracionalidade, próprias do dadaísmo. Ocorria assim, a banalização
das rimas e da construção poética.
No último manifesto que divulgou, Tzara disse que o grande
segredo da poesia é que "o pensamento se faz na boca". Como uma
afirmação, ele procurou orientar melhor os seus seguidores dando uma
receita para fazer um poema dadaísta:
Pegue um jornal.
Pegue a tesoura.
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema.
Recorte o artigo.
Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e
meta-as num saco.
Agite suavemente.
Tire em seguida cada pedaço um após o outro.
Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco.
O poema se parecerá com você.
E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda
que incompreendido do público.
Tristan Tzara, Manifesto Dadaísta
O dadaísmo, assim como outras vanguardas artísticas europeias,
influenciou o movimento modernista que surgia no Brasil, sobretudo
após a Semana de Arte Moderna.
Na literatura, podemos notar essa influencia em algumas
manifestações dos escritores Mário de Andrade e Manuel Bandeira.
Um poema de Mário de Andrade, com influência dadaísta:
Ode ao burguês
Eu insulto o burgês! O burguês-níquel,
o burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco! (...)

Em Ode ao Burguês, Mário de Andrade atacou as elites


retrógradas. O poema caracteriza uma fase do Modernismo marcada
pelo empenho na destruição de um passado literário, político e cultural
que mantinha a sociedade brasileira atada a modelos e
comportamentos que vigoraram em fins do século XIX.
SURREALISMO
Movimento das artes plásticas e que também influenciou a
literatura, teatro, cinema e escultura foi iniciada na década de 20 por
André Breton, escritor francês. A publicação do Manifesto do
Surrealismo, assinado por André Breton em outubro de 1924, marcou
historicamente o nascimento do movimento. Originou-se em reação ao
racionalismo e ao materialismo da sociedade ocidental.
Visava, em última instância, à renovação total dos valores
artísticos, morais, políticos e filosóficos.
Inserido no contexto das vanguardas que viriam a definir o
Modernismo no período entre as duas Grandes Guerras Mundiais.
Reúne artistas anteriormente ligados ao Dadaísmo ganhando dimensão
internacional. Fortemente ligada às artes visuais, o Surrealismo é uma
vanguarda interessada em adquirir um maior conhecimento do ser
humano.
No manifesto, Andre Beton ensina como usar o automatismo para fazer
emergir o inconsciente.

Mandem trazer algo com que escrever, depois de haverem se estabelecido


em um lugar tão favorável quanto possível à concentração do espírito sobre si
mesmo. Ponham-se no estado mais passivo ou receptivo que puderem. Façam
abstração do seu gênio, de seus talentos e dos de todos os outros. Digam a si
mesmos que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a tudo.
Escrevam depressa, sem um assunto preconcebido, bastante depressa para
não conterem e não serem tentados a reler. A primeira frase virá sozinha (...)
BRETON, André. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda européia e modernismo brasileiro.
9. Ed. Petropólis: Vozes, 1986. P. 194. (Fragmento)
Nas duas primeiras décadas do século XX, as incertezas políticas
criaram um clima favorável para o desenvolvimento de uma arte que
criticava a cultura europeia e a frágil condição humana diante de um
mundo cada vez mais complexo. Entre seus mais marcantes expoentes
nas Artes Plásticas estão: Salvador Dali, Max Ernst, René Magritte ,
André Masson e Joan Miró.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO
SURREALISMO
Pintura com elementos surreais.
Formas baseadas na fantasia (sonho e inconsciente)
Seus seguidores pretendem, por meio da valorização da fantasia,
do sonho, do interesse pela loucura, liberar o inconsciente humano,
terreno fértil e ainda pouco explorado. A razão não é o melhor
instrumento para essas descobertas, porque ela ignora nosso universo
inconsciente. Explorando os limites do real, estudando a loucura, os
sonhos, os estados alucinatórios e outras manifestações do
inconsciente, os surrealistas produzem uma arte de impacto.
Influência da teoria da Psicanálise
(Sigmund Freud)

De acordo com Freud, o homem deve libertar sua mente da lógica


imposta pelos padrões comportamentais e morais estabelecidos pela
sociedade e dar vazão aos sonhos e as informações do inconsciente. O
comportamento consciente é, em grande parte, regido por desejos e
impulsos inconscientes que pouco ou nada têm haver com as leis da
lógica e da racionalidade. Os surrealistas veem a teoria de Freud como
sinal de que há muito a ser descoberto sobre o ser humano
Pensamento livre e liberdade espontânea

Os artistas surrealistas tinham como objetivo usar o potencial do


livre pensamento e de uma liberdade na criação da obra de arte como
fonte para a criação de imagens fantásticas. Desta forma, o
Surrealismo adaptou as técnicas de escrita automática dos poetas
surrealistas. O intuito era liberar a mente do controle consciente e
produzir um fluxo de ideias do subconsciente.
Dissociação entre imagens e
legendas e busca de um imaginário

Os surrealistas rejeitam a chamada ditadura da razão e valores


burgueses como pátria, família, religião, trabalho e honra. Humor,
sonho e a contra lógica são recursos a serem utilizados para libertar o
homem da existência utilitária. Segundo esta nova ordem, as ideias de
bom gosto e decoro devem ser subvertidas. Assim, eram vistos como
um meio de expressar a fusão dos sonhos e da realidade em um tipo
de realidade absoluta, uma "surrealidade".
A obra “A persistência da memória” de Salvador Dalí é uma das
mais representativas desse movimento. Os três relógios derretidos
juntamente a uma espécie de autorretrato do artista representam o
Surrealismo de Dalí diante da irrelevância da passagem do tempo que
dizia não perceber e que não tinha nenhum significado para ele.

A persistência da Memória (Salvador Dali -


1931)
No Brasil, o Surrealismo exerceu considerável influência sobre o
movimento Modernista. O escritor Oswald de Andrade foi um dos
maiores expoentes. Em seu Manifesto Antropófago, no romance
Serafim Ponte Grande e nas peças O Homem e o Cavalo e a Morta,
podemos notar elementos que se relacionam com as técnicas de
criação surrealista.
As ideias do surrealismo foram absorvidas na década de 1920 e
1930 pelo movimento modernista no Brasil. Podemos observar
características surrealistas na pintura da artista Tarsila do Amaral
observada na obra Abaporu.
Abaporu vem dos termos em tupi aba (homem), pora (gente) e ú
(comer), significando "homem que come gente". O nome é uma
referência à antropofagia modernista, que se propunha a deglutir a
cultura estrangeira e adaptá-la à realidade brasileira. Foi pintado em
óleo sobre tela em 1928 por Tarsila do Amaral para dar de presente de
aniversário ao escritor Oswald de Andrade, seu marido na época.
Tarsila de Amaral valorizou o trabalho braçal (pés e mão grandes) e
desvalorizou o trabalho mental (cabeça pequena) na obra, pois era o
trabalho braçal que tinha maior importância na época.
Aproximação do Terror

Dos braços do poeta


Pende a ópera do mundo
(Tempo, cirurgião do mundo):
O abismo bate palmas,
A noite aponta o revólver.
Ouço a multidão, o coro do universo,
O trote das estrelas
já nos subúrbios da caneta:
As rosas perderam a fala.
Entrega-se a morte a domicílio.
Dos braços...
Pende a ópera do mundo.
MENDES, Murilo. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. P. 431.

A sucessão de imagens apresentadas no poema não permite que o leitor


componha um quadro único, racional, em que possa perceber as relações
lógicas entre as sequências. A atmosfera criada lembra o espaço do sonho, em
que acontecimentos totalmente não relacionados se apresentam encadeados,
como se formassem uma sequência lógica.

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