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Um estudo sueco, publicado neste mês na revista médica BMJ (veja aqui:<

http://www.bmj.com/content/346/bmj.f228>) mostra, em resumo, que quanto mais alto o consumo de


cálcio, na dieta, maior a probabilidade de morte por todas as causas (até 40% a mais) e,
especificamente, por infarto (dobra o risco). A importância dessa informação deve-se à
tradicional indicação do Cálcio como herói para proteger-nos contra a osteoporose. Assim,
segundo essa informação, a gente fica com os ossos bem duros, porém morremos de
infarto.

Outra publicação importante saída agorinha, agorinha (veja aqui:


http://www.australianprescriber.com/magazine/36/1/5/8 ) fala, não do consumo, mas uso de suplementação de cálcio, prescrito ou não
por médicos. Neste
caso, os infartos aumentaram 25% e os derrames entre 10 e 20%,
comparativamente aos que não fizeram a tão heróica e inútil suplementação. A conclusão é
bem direta: uso de suplementação indiscriminada de cálcio, para prevenir fraturas, não é
mais apropriada. Essa suplementação só se aplica a casos específicos muito bem indicados
e, muito pouco freqüentes.

Osteoporose, no Brasil ensolarado, não tem a importância de países frios o hemisfério


norte, que elaboram trabalhos e formatam nosso pensamento.

Tanto que todas as crianças de Curitiba saem da maternidade tomando vitamina A e D, para
evitar raquitismo que, absolutamente não tem a mínima importância pra nós. Mas dizem
que aqui não tem Sol, como na Europa...

Tomando esse exemplo, faço um reflexão sobre a racionalidade que permeia essas
reposições equivocadas de nutrientes, com a ilusão preventiva.

É que a forma mecanicista que utilizamos para organizar nossa percepção das coisas e
acontecimentos do mundo às vezes nos prega peças. Claro que quando Galileu (sec XVI-XVII)
nos revelou que as coisas do mundo se ajustavam segundo uma relação geométrica, foi a
glória. Apresentou, então, uma regularidade estética, quase sempre eficaz e, por isso,
pretensiosamente universal, essa coisa de qualificar as coisas segundo suas características
quantificável.

E já que não é possível ver o mundo pura e diretamente, sem algum tipo de filtro conceitual,
aos poucos fomos nos dando conta de que essa lente conceitual escolhida naquela época,
pela Modernidade, foi exclusivamente a matematização do mundo. Colocando de lado,
entre parênteses, tudo que não fosse possível contar ou medir. Poderia ter sido outro filtro.
Mas foi esse e pronto. Meio pé-quebrado, hoje vemos, porque os significados das coisas
passaram a ser julgados como algo menor ou de nenhuma importância. Muito subjetivo pra
ter valor. Mas foi esse, o filtro adotado pra interfacear com as coisas do mundo e pronto.

Vamos ver onde a utilização dessa plataforma conceitual, que só pesa e mede, pode levar,
especificamente nas abstrações sobre saúde.
A Osteoporose, por exemplo, no hemisfério norte passou a ser uma preocupação
importante, do ponto de vista epidemiológico, como causa de sofrimento e morte. Como
aqui gostamos de ser mais elegantes do que tropicais, passamos a fazer parte desse coro,
mesmo sem a necessária fundamentação lógica: o envelhecimento da nossa população não
é prevalentemente acompanhado de fraturas, mas apenas de alteração na densitometria
óssea. Mas, o que foi disseminada é a crença de que vamos felizmente envelhecer e,
portanto, ter risco de fraturar. Decorrente disso, mecanicamente vamos tomar Calcio, já
que osso é feito de Calcio.

Na verdade, se o consumo de Cálcio fosse a peça mais importante desse complexo sistema,
a Escandinávia, com seu grande consumo de lacticínios, não seria a campeã de fraturas no
mundo.

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