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R. J. Rushdoony
BOM DIA,
AMIGOS
Volume 1
Copyright © 2017, de Mark R. Rushdoony
Publicado originalmente em inglês sob o título
Good Morning, Friends – volume 1
pela Chalcedon / Roos House Books,
P.O. Box 158, Vallecito, Califórnia, 95251, EUA.
Todos os direitos em língua portuguesa reservados por
Editora Monergismo
SCRN 712/713, Bloco B, Loja 28 — Ed. Francisco Morato Brasília, DF, Brasil — CEP
70.760-620 www.editoramonergismo.com.br 1a edição, 2020
Todas as citações bíblicas foram extraídas da Versão Almeida Revista e Atualizada (ARA),
salvo indicação em contrário.
Conteúdo
1. Deus
2. O Deus de Abraão, Isaque e Jacó
3. A Trindade
4. A bondade de Deus
5. O seu Deus está morto?
6. Providência
7. A Palavra de Deus
8. Os decretos de Deus
9. Emanuel (Salmo 46)
10. O ofício profético de Cristo
11. O ofício sacerdotal de Cristo
12. O ofício real de Cristo
13. A Cruz
14. As perguntas mais fáceis
15. O poder da ressurreição
16. Criação e o Criador
17. À sua imagem
18. O fim principal do homem
19. Preservando a superfície
20. O apelo
21. A aliança
22. O desejo de morrer
23. Autoilusão (Tiago 1.14)
24. Atalhos
25. Pecado
26. Vocação eficaz
27. Santificação
28. Adoção
29. Marcas
30. O que é a fé?
31. Fé salvadora
32. Do arrependimento para a vida
33. O significado da pureza
34. O processo educacional de Deus
35. “Não se turbe o vosso coração”
36. “Que poderá fazer o justo?”
37. Responsabilidade
38. Obediência (Efésios 6)
39. “Mais bem-aventurado é”
40. “Espera com paciência nele”
41. O hábito da autojustificação
42. Quem é infalível?
43. “O Senhor dirige”
44. “Sacudido no crivo”
45. Aquele que andou em trevas
46. A chave de entendimento
47. Quando Deus pede
48. Não há vagas
Sobre o autor
1. Deus
15 de junho de 1954
Bom dia, amigos. Vez por outra, nossos filhos nos surpreendem com
uma pergunta simples, mas de escopo vasto, e nos deixam à
procura de respostas. Uma dessas perguntas é: “Quem é Deus?” ou
“o que é Deus?”. Como responderemos a essa pergunta, tanto a
nós mesmos quanto a nossos filhos? Afinal, o que é Deus? A
pergunta não é nova. Há muito tempo, no monte Horebe, um pastor
chamado Moisés recebeu a ordem de voltar ao Egito e libertar seu
povo do cativeiro. Moisés hesitou diante da ordem divina, dizendo
que o povo questionaria sua autoridade. “Que lhes direi?”,
questionou, “se me perguntarem seu nome, isto é, a definição do
Deus que me envia?” “Deus disse a Moisés: Eu sou o que sou.
Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: Eu Sou me enviou a
vós outros” (Êx 3.14). Como Deus definiu-se ou nomeou-se a
Moisés? Como o autoexistente e autossuficiente. Deus não apelou a
nada que conhecemos para declarar-se a si mesmo: Simplesmente
afirmou: Eu sou o que sou.
Mas, sob outro aspecto, Moisés teve seu desejo de ver a glória de
Deus supreendentemente atendido. O pedido foi simplesmente:
“Rogo-te que me mostres a tua glória”. E assim Deus retorquiu:
“Farei passar toda a minha bondade diante de ti e te proclamarei o
nome do Senhor; terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia e
me compadecerei de quem eu me compadecer” (Êx 33.19).
Moisés queria ver a glória de Deus, e Deus declarou que sua glória
não era sua majestade como tal, mas, antes, a sua bondade: “Farei
passar toda a minha bondade diante de ti”. A bondade de Deus é a
sua glória. A bondade de Deus não é a sua benevolência nem sua
disposição a ouvir nossas orações. Se Deus houvesse de dar-nos
tudo quanto pedimos, fosse um milhão de dólares ou um ambiente
transformado, afirmar-se-ia não a sua bondade, mas apenas a sua
indulgência. A bondade de Deus é a sua glória; no entanto, essa
bondade muitas vezes é desagradável do nosso ponto de vista, e é
desafiador às nossas almas aceitá-la quando envolve problemas,
tristeza e fardos.
E isso significa viver para ele, cuja única vontade é nossa paz, e o
único a quem pertence o poder, o domínio e a glória.
5. O seu Deus está morto?
7 de setembro de 1954
Bom dia, amigos. Todo ano, do Dia de Ação de Graças até o Natal,
a Sociedade Bíblica Americana promove um programa de leitura
bíblica diária, incentivando as pessoas a ler as Escrituras todos os
dias. Trata-se de um programa valiosíssimo. “Uma intenção vaga de
ler a Bíblia não leva a nada até que você realmente faça um início
diário”.
Nossa leitura bíblica de hoje é o salmo 46, o salmo que inspirou o
grande hino de Lutero “Castelo Forte é nosso Deus”. O salmo diz
assim: Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem-presente
nas tribulações. Portanto, não temeremos ainda que a terra se
transtorne e os montes se abalem no seio dos mares; ainda que as
águas tumultuem e espumejem e na sua fúria os montes se
estremeçam. Há um rio, cujas correntes alegram a cidade de Deus,
o santuário das moradas do Altíssimo. Deus está no meio dela;
jamais será abalada; Deus a ajudará desde antemanhã. Bramam
nações, reinos se abalam; ele faz ouvir a sua voz, e a terra se
dissolve. O Senhor dos Exércitos está conosco; o Deus de Jacó é o
nosso refúgio. Vinde, contemplai as obras do Senhor, que
assolações efetuou na terra. Ele põe termo à guerra até aos confins
do mundo, quebra o arco e despedaça a lança; queima os carros no
fogo. Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus; sou exaltado entre as
nações, sou exaltado na terra. O Senhor dos Exércitos está
conosco; o Deus de Jacó é o nosso refúgio. (Sl 46.1-11) A data e a
autoria deste salmo nos são desconhecidas, mas uma coisa se
destaca com toda clareza: O salmo foi escrito num período de crise
internacional, guerra e desastres naturais tremendos. Ouvimos que
“Bramam nações, reinos se abalam”. Terremotos assustadores
acrescentam-se a essas agitações políticas, para dar um quadro
geral de um mundo completamente instável. Os terremotos eram
tais que as montanhas se abalavam nos mares, e estes rugiam e
irrompiam num ímpeto de tempestade e tremores. As outras
montanhas pareciam como que arrastadas pelas enchentes ou
tremores contínuos. Não só o mundo do homem e as nações, mas
todo o fundamento sob os pés dos homens era instável. Os homens
chegavam a se perguntar se a vida continuaria ou se haveria algum
sobrevivente a tal combinação de desastres gigantescos.
O estado de ânimo deles estava talvez como o de muitas pessoas
hoje, que sentem que cada dia parece levar o mundo cada vez mais
fundo num horror gigantesco e deixar o chão cada vez menos
estável sob os pés do homem.
Mas, em meio a todos esses horrores, ouvimos a voz da fé anunciar
no salmo 46:
Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem-presente nas
tribulações. (v. 1)
Portanto, não temeremos ainda que a terra se transtorne e os
montes se abalem no seio dos mares. (v. 2)
O refrão do salmo dá a razão desta confiança: O Senhor dos
Exércitos está conosco. Deus está conosco, este é o brado
exultante. Este refrão nos dá em substância um dos nomes de
Jesus Cristo, a Segunda Pessoa da Trindade: este nome é
Emanuel, que quer dizer “Deus conosco”. Para o profeta Isaías e um
remanescente profundamente perturbado com a decadência moral
da nação, nada parecia mais solitário do que o seu grupo. Eles
estavam, assim sentiam, sozinhos num mar de maldade. Para eles,
Deus não só deu a promessa de enviar seu Filho, mas um nome
desse Filho que descreve o Deus trino em sua relação com seu
povo, Emanuel, Deus conosco. É esta fé que o salmo 46 declara e
celebra.
E esta mesma fé é nossa força e alegria, pois nosso Deus não é um
Deus distante, mas mais próximo de nós do que nós mesmos. Nós
nos sentimos sozinhos na privacidade da dor, do desejo e da
esperança de nosso coração, mas Deus vê mais em nós do que
vemos em nós mesmos, e ele nos ama, apesar de todo o nosso
pecado e de nossas faltas. Assim, no pleno sentido da palavra, ele é
de fato Emanuel, Deus conosco.
Em contraste com as enchentes do mundo, as torrentes
destruidoras, enfurecidas, o salmista fala de “um rio, cujas correntes
alegram a cidade de Deus” (v. 4). A cidade de Deus é sua igreja,
seu povo, e o rio silencioso que os alimenta e sustenta é a presença
de Deus entre seu povo. Este é o fato decisivo: não a desordem das
nações e da natureza, mas o Deus Altíssimo que governa e dirige o
curso da história. Deus não é um Deus distante, indiferente ao apelo
de seu povo e alheio a toda a história humana. Ele é Emanuel, Deus
conosco, e nos convoca e ordena que deixemos de afligir-nos. Ele
declara: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus; sou exaltado entre
as nações, sou exaltado na terra” (v. 10).
O Deus que falou essas palavras tinha apenas um punhado de
crentes judeus em todo o mundo daqueles dias, mas declarou
veementemente a conversão dos pagãos, e sua exaltação em todo
o mundo. Essas coisas estão se realizando agora. Sua promessa é
que se cumprirão em seu Reino eterno. Sua garantia é que cada
passo está sob seu governo providencial e que, em todo o caminho,
ele é nosso Emanuel, Deus conosco.
Podemos, portanto, cantar com alegria junto com o salmista: “O
Senhor dos Exércitos está conosco; o Deus de Jacó é o nosso
refúgio” (v. 11).
10. O ofício profético de Cristo
19 de outubro de 1954
Somos informados com toda clareza de que o homem foi feito para
um propósito e só pode ser compreendido à luz desse propósito,
que é a glória de Deus. O homem não é um fim em si mesmo, mas
um instrumento a ser usado para um propósito específico.
Há, entretanto, mais do que isso na promessa que nos foi dada
quando vivemos segundo nosso propósito criacional. Nosso fim
principal não é só glorificar a Deus, mas também gozá-lo para
sempre. Esta é a dimensão mais segura da fé cristã, uma das
maneiras mais rápidas de reconhecer a verdadeira vida no Senhor.
O homem que vive segundo o propósito para o qual foi criado
conhece a alegria da realização em Cristo e a vitória de sua
presença mesmo em meio à aparente derrota.
Bom dia, amigos. Para muita gente, não só a beleza, mas toda a
vida é só uma casca. Integridade, honestidade e caráter não são
mais que aparências, e a aceitabilidade de um homem há de ser
julgada à luz de sua adequação e seus hábitos sociais.
Bom dia, amigos. Nossa leitura bíblica de hoje é Isaías 55, o grande
apelo do profeta a que os homens deixem a frustração e a
insatisfação e encontrem descanso e refrigério na graça e na
misericórdia eternas de Deus.
Assim será a palavra que sair da minha boca: não voltará para
mim vazia, mas fará o que me apraz e prosperará naquilo para
que a designei. (v. 11)
21. A aliança
31 de agosto de 1954
Jesus Cristo fez isso pelos filhos da aliança. Como nosso irmão de
sangue, tendo assumido nossa natureza na encarnação, ele
cumpriu sua obrigação da aliança ao morrer por nós e compartilhar
conosco os frutos de sua vitória sobre a morte e o pecado. A todos
os que estão em aliança com ele pela fé, ele dá uma nova natureza
e uma nova vida.
O pecado deve ser pago, e a expiação será feita por Jesus Cristo ou
pagaremos por ela com nosso próprio impulso autoinfligido de
punição e morte.
Visto que somos tentados quando somos atraídos por nossa própria
cobiça, nossas tentações são um bom indício de nossa autoilusão.
As tentações de um homem, portanto, estão estreitamente
relacionadas com seus devaneios e são um passo a caminho de
sua realização. O pecado é ativo não só na realização, mas também
na concepção, no próprio autoengano.
Bom dia, amigos. Alguns anos atrás, uma mulher comentou comigo
que desperdiçou boa parte da vida à procura de atalhos para tudo.
Procurava atalhos para Deus, para a felicidade, para os desejos do
coração, para todas as coisas, e sempre terminava muito longe de
seus objetivos.
O que jamais podemos fazer, ele faz por nós. Ao dar-nos uma
segunda natureza, sua própria vida, ele nos dá um poder maior que
nós mesmos a fim de capacitar-nos para vencer a nós mesmos.
Nossa confiança como cristãos é esta: em Cristo temos uma vida
que é santa, justa e vitoriosa. Nossa segunda natureza agora é
Jesus Cristo e a vida eterna. Tendo isso como nossa herança,
podemos facilmente abrir mão daquela vida dolorosamente limitada
que era nossa vida em pecado. Quanto mais vemos a Cristo e
vivemos nele, mais fácil é morrer para nós mesmos a fim de entrar
de modo mais pleno naquela vida melhor.
Tudo isso suscita uma pergunta religiosa muito pertinente. Visto que
estamos constantemente em mudança, o que acontece se
mudarmos nossa fé? Afinal, se aqui como alhures estamos sujeitos
à mudança, então um homem, que hoje acredita ser uma pessoa
salva, pode esquecer sua fé amanhã e estar eternamente perdido.
Hoje, podemos deleitar-nos na leitura da Escritura, na oração e na
adoração, mas amanhã podemos odiar essas coisas. Se somos
criaturas mutáveis, então nossa fé pode mudar e deixar-nos sem
salvação.
Vocação eficaz quer dizer que Deus nos escolhe e chama, nos
justifica e adota, nos guia à santificação e nos recebe em seu
próprio ser. A mudança que se dá com a nossa regeneração não é
uma mudança humana, que em si mesma também está sujeita à
mudança: é um ato de Deus. Como disse o Senhor: Dar-vos-ei
coração novo e porei dentro de vós espírito novo; tirarei de vós o
coração de pedra e vos darei coração de carne. Porei dentro de vós
o meu Espírito e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os
meus juízos e os observeis. (Ez 36.26-27) Deste modo, nossa
salvação é Deus trabalhando em nós e através de nós. Como diz
Paulo: “porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o
realizar, segundo a sua boa vontade” (Fp 2.13).
[...] nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio
de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade. (Ef
1.5) [...] vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu
Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os
que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção
de filhos. (Gl 4.4-5) Mas, a todos quantos o receberam, deu-
lhes o poder de serem feitos filhos de Deus. (Jo 1.12)
Nenhuma compreensão madura do significado da salvação é
possível sem esta doutrina. O Dr. Gordon C. Clark definiu bem o
significado da adoção com uma ilustração simples. Se o governador
de um estado perdoa um criminoso culpado de crimes muito sérios,
seu ato de perdão de maneira alguma dá ao criminoso uma carta
branca para todas as atividades subsequentes. O homem, afinal,
ainda é capaz de atividades criminosas futuras e ainda está sujeito a
sentenças e julgamentos futuros. Tampouco ele dá um passo além e
recebe o criminoso em sua família como um filho adotado.
Mas, além disso, Deus nos recebe em sua família como filhos
adotivos, um privilégio que nunca pode ser revertido ou anulado,
que faz de nós herdeiros de toda a criação de Deus, cuidado
providencial e glória futura, e nos dá a glória de ser participantes da
natureza divina. A adoção nos dá um novo nome, o nome de Deus,
a fim de que nosso coração clame a ele, pelo Espírito, dizendo:
“Aba, Pai”. A adoção nos dá a proteção e o cuidado de filhos de um
pai onipotente e perfeito. A adoção nos dá, ademais, o privilégio da
disciplina e do castigo de um pai amoroso e sábio. Para alguns, isso
pode parecer um privilégio estranho, mas na verdade constitui um
dos privilégios centrais da filiação. À parte dele, sofremos em vão e
cruelmente sob as pancadas de homens e acontecimentos. Com
ele, temos a confiança de que todo o nosso sofrimento trabalha para
nosso bem e para nossa glória nele. A adoção, portanto, é a
plenitude de nossa salvação, a manifestação plena da liberdade
gloriosa de nossa salvação. Em suma, nas palavras dos teólogos de
Westminster (CMW R. 74): Adoção é um ato da livre graça de Deus,
em seu único Filho Jesus Cristo e por amor dele, pelo qual todos os
que são justificados são recebidos no número dos filhos de Deus,
trazem o seu nome, recebem o Espírito do Filho, estão sob o seu
cuidado e suas dispensações paternais, são admitidos a todas as
liberdades e todos os privilégios dos filhos de Deus, e feitos
herdeiros de todas as promessas e co-herdeiros com Cristo em
glória.
29. Marcas
7 de julho de 1953
“Os que confiam no Senhor são como o monte Sião, que não se
abala, firme para sempre. Como em redor de Jerusalém estão os
montes, assim o Senhor, em derredor do seu povo, desde agora e
para sempre” (Sl 125.1-2).
Segundo a Bíblia, nós, todos nós, portamos isso que nos marca
clara e facilmente a todos. Podemos olhar ao nosso redor e
reconhecer a vida e o caráter de outros homens e mulheres
prontamente: vemos o fingimento e a hipocrisia: vemo-los
enganarem-se a si mesmos sobre como são maravilhosos, e temos
pena de sua cegueira. A marca é demasiado clara para que a
negligenciemos. A pergunta, então, é esta: que marca portamos?
Será que ele conhece bem a você e a mim? Será que ele nos
chama pelo nome?
Olhemos para nossa vida e vejamos que marca é essa que está em
nós.
30. O que é a fé?
10 de agosto de 1954
A fé nos leva à união pessoal com Cristo, de modo que Cristo agora
vive em nós, e nós em Cristo. Diz Lutero:
Quando Daniel 7.9 fala do Ancião de Dias cujo cabelo é como “pura
lã”, ele nos diz que seu cabelo é branco ou grisalho, ou seja,
envelhecido. Mas a palavra usada para puro, aqui, significa livre,
inocente, absolvido, ideias que, em vez de estarem associadas com
a infância imaculada, como em inglês, aqui estão associadas a
idade e experiência imensas.
Mais uma vez, quando 1 Reis 5.11 fala de “vinte coros de azeite
[puro]”, isso significava vinte coros de azeite batido (em vez de
esmagado), sendo o azeite extraído pela batida.
Ele nos diz: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou
como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se
atemorize” (v. 27).
36. “Que poderá fazer o justo?”
26 de outubro de 1954
A segunda coisa que o justo pode fazer é isto: pode continuar a ser
justo. É essa a sua força e certeza de vitória. “Porque o Senhor é
justo, ele ama a justiça; os retos lhe contemplarão a face” (v. 7). A
perspectiva da fé é a da segurança e da certeza garantida. O
caráter difuso e mascarado do mal é difícil de apreender,
perturbador de ver, e muitas vezes leva-nos a visões pessimistas.
Somos tentados a concordar com os bons amigos de Davi, que
perguntavam “Que poderá fazer o justo?”.
Bom dia, amigos. Vez por outra, entro em discussões com pessoas
que afirmam que suas ações não fazem nenhuma diferença, que
são senhores de si e que podem fazer exatamente o que lhes der na
telha. Normalmente, essas pessoas temem que eu lhes diga o que
fazer, algo que não é da minha conta, e dão o melhor de si para
declarar sua completa independência de Deus e dos homens.
Paulo nos incita a esse tipo de força quando diz: “sede fortalecidos
no Senhor e na força do seu poder” (v. 10). Revestir-nos de a toda a
armadura de Deus quer dizer receber sua Palavra e obedecer a ele,
conhecer-lhe a salvação e andar no Santo Espírito.
Mas para tudo isso está aberta essa felicidade superior, a bem-
aventurança de dar em nome e na pessoa de Jesus Cristo. Mesmo
quando não temos nada mais para dar, ainda podemos dar-nos a
nós mesmos. Assim, a felicidade nunca é uma porta fechada para
nós: ela nunca depende de receber certas coisas. Depende, em vez
disso, de cumprir a vida de Cristo em nós, de dar enquanto
recebemos de Deus, com boa medida, calcada, sacudida e
transbordante.
Então o salmo promete algo mais. Seu refrão pode ser chamado de
a promessa de que os mansos “herdarão a terra” (Mt 5.5). Quem
são esses mansos bem-aventurados de quem nosso Senhor
também falou em suas bem-aventuranças? A palavra bíblica para
mansos significa dócil, subjugado. Somos os mansos bem-
aventurados quando somos subjugados por Deus, e nossa natureza
rebelde descansa no Senhor e espera pacientemente nele.
4. Fazer o bem.
Diante de tudo isso, o cristão deve ter uma resposta diferente. Não
precisamos justificar-nos a nós mesmos, porque fomos justificados
por Deus. Ser justificado por Deus quer dizer que aceitamos suas
acusações contra nós: reconhecemos que somos pecadores em
rebelião contra Deus. Depositamos nossa confiança não numa
justiça própria imaginada, mas na justiça de Deus.
Isso quer dizer que vivemos sem ilusões acerca de nós mesmos,
mas com fé em Deus. Significa desconfiar de nós e confiar em
Deus. Não vemos necessidade de dar desculpas: admitimos o fato
de nosso pecado e apontamos para nossa liberdade e justificação
em Jesus Cristo.
Essa atitude, claro, não é nova. A Bíblia fala da “lei dos medos e dos
persas, que se não pode revogar” (Dn 6.8), e dos “decretos feitos
em nome do rei [que] não se podem revogar” (Et 8.8). Era uma lei
infalível contra a qual não há apelo nem recurso. Essa atitude não
se limitava à antiguidade. As nações constantemente tendem a
divinizar sua lei e a considerarem-se intérpretes infalíveis da
vontade divina. O comunismo marxista torna a ditadura do
proletariado a expressão da obra divina na história, enquanto em
nossa América muitas pessoas afirmam de modo blasfemo que a
vontade do povo é a vontade de Deus e que a voz do povo é a voz
de Deus.
O homem precisa de uma autoridade final. Sem ela, ele não tem
padrão. E o homem não pode fazer de suas emoções a autoridade
final, porque elas tendem ao erro e à tolice. Tampouco pode fazer da
razão ou da vontade o árbitro da autoridade final, porque a razão e a
vontade do homem estão contaminadas e corrompidas pelo pecado.
Eles têm como sua órbita os limites estreitos do mundo restrito do
homem, que ele só pode ver por meio dos olhos do pecado. O
homem jamais pode produzir autoridade: todas as suas tentativas
de fazê-lo só destruíram a autoridade e suplantaram-na pela
obstinação.
Contudo, num sentido muito real, hoje somos o que o nosso ontem
fez conosco. Somos responsáveis e não podemos fugir da
responsabilidade de nossa situação e de nosso estado presente.
Todavia, quando levamos nossa reavaliação às últimas
consequências, algo ainda nos escapa. Não somos onipotentes, não
somos todo-poderosos, e todas as nossas tentativas de moldar
nossa vida deixa algo faltando.
Bom dia, amigos. Uma das coisas que temos de ter sempre em
mente, quando lemos a Escritura, é que devemos levar Deus a
sério. Se cremos apenas no que nos agrada, então tudo que
aceitamos é nossa própria palavra, porque estabelecemos como
verdade somente aquilo que nos é aceitável.
Há algo em nós que se rebela contra isso. Sentimos que, uma vez
que cremos no Senhor, deveríamos ser autorizados a portar certa
quantidade de luz, e alguns chegam a reivindicá-la. Todavia, quando
renunciamos a isso, somos capazes de andar em trevas. Não
podemos ver além do presente. O minuto seguinte, o dia seguinte, o
ano seguinte são inteiramente trevas para nós. Podemos ter uma fé
grande o bastante para mover as montanhas, mas ainda não
podemos ver além do presente nem fazer outra coisa senão andar
em trevas.
Andar em trevas significa isto: andar por fé. De outro lado, declarou
Isaías, tentar acender uma tocha contra as trevas é tentar andar por
vista. E isso não se pode fazer. Nenhum de nós é capaz de andar
por vista. Tanto a vida agora quanto o dia de amanhã são mistério
para nós. Reivindicar a visão, reivindicar que tenhamos uma tocha
que dissolva as trevas, é reivindicar algo que o homem não pode ter.
É uma reivindicação falsa que inevitavelmente leva ao sofrimento.
E é por isso, claro, que nos pedem que andemos nas trevas. Se não
fôssemos forçados a andar somente pela fé, não alcançaríamos a
mão de Deus em meio às trevas. Não pediríamos que ele nos
segurasse e conduzisse pela meia-noite do mundo.