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TRADUÇÃO DESTE TRECHO DE ANTONIO ROMANE

NÃO EXISTE TRADUÇÃO EM PORTUGUÊS ATÉ ONDE SE SABE

TERCEIRA PARTE

METODOLOGIA
UM CASTELO NA ESPANHA

I
O PÁTIO DOS MILAGRES FREUDIANOS

“Foram as condições materiais que me levaram a


empreender o estudos das doenças nervosas.”
Freud, Autoapresentação (XVII, 63).

É evidente que a biografia de Freud impõe sua lei à sua


teoria, de sorte que não encontraremos – ao contrário do que
pretende fazer crer a lenda – um caminho longo e reto contínuo
em sua obra completa que conduziria de uma genealogia
simples, via autoanálise, à formulação definitiva de um corpus
homogêneo, isento de contradições, reviravoltas, ignorando
arrependimentos. O pensamento do psicanalista, como já
vimos, obedece aos tormentos da uma vida cotidiana, sofre a lei
da história, aquela de seu pequeno mundo e da história
universal. O pensamento de Freud não tem um continuum
científico porque ressente as variações existenciais de seu autor.
Durante mais de cinquenta anos, entre 1886 e 1939, Freud
escreveu muito, mais de seis mil páginas publicadas, afora sua
correspondências. No começo, muitos relatórios, depois
prefácios e posfácios, apoios a conferências e alocuções,
resenhas. Muitas vezes, textos breves, curtas análises ou artigos
reunidos para constituir obras. Ou mesmo lições — Lições de
introdução à psicanálise o u Novas lições de introdução à
psicanálise. Mais tarde, necrológios... O conjunto surge como
que um grande mosaico constituído de fragmentos
heterogêneos: os Estudos sobre a histeria, com Breuer, em seus
jovens anos, 1895, por exemplo, não têm grande coisa a ver com
a s Lições elementares de psicanálise, obra de síntese redigida
em 1938 durante seu exílio londrino, já com 82 anos de idade.
Esse pensamento em arquipélago, ou mesmo em
fragmentos, mudou muito. A partir de um certo número de
levantamentos judiciosos, pode-se fazer com que Freud diga
uma coisa e o seu contrário: elogio da hipnose, crítica da
hipnose. Ou, mais importante, o partidário da psicanálise
integrista pura e dura reclamará da extrema abstração
conceitual da Metapsicologia ou dos textos da A técnica
psicanalítica para justificar o caráter puramente verbal de sua
terapia, mas o leitor do Lições elementares, seu testamento
intelectual, seu legado teórico, se apoiará na hipótese formulada
por um velho homem de que um futuro em que a química
tornaria a psicanálise caduca (51) – ou, dito de outra forma:
entre a verdade ideal anistórica de uma pura doutrina
intelectual e o pragmatismo indexado sobre a dialética
progressista da história, o que escolher? Ou sua proposição
prospectiva pelo medicamento contra o verbo? O texto de Freud
pode legitimar os dois...
Uma leitura atenta da obra completa expõe à luz do dia
inúmeras contradições, incoerências, posições heterogêneas.
Deixemos para trás o caminho percorrido de cruzar a biografia e
a obra para, de agora em diante, cruzar os textos entre eles. Não
encontraremos aí, evidentemente, um fio de Ariadne
desenrolado em linha reta por um gênio e suas intuições as mais
geniais desde o primeiro momento de seu trabalho, mas
desacertos e errâncias. Os vinte volumes da obra completa
assemelham-se menos a um Palácio de Schönbrunn do que ao
palácio do carteiro Cheval, com suas louças em cacos, seus
fragmentos de garrafas, sua grossa alvenaria ...
Exemplo: em Autoapresentação, ele escreve que “quer
viver do tratamento das doenças dos nervos” (XVII. 63) – o que
confirma outra afirmação: “Foram as condições materiais que
me levaram a empreender o estudo das doenças nervosas.”
Posto para fora do laboratório de anatomia do cérebro por causa
de suas teorias sobre a histeria masculina, diz ele, e de seu uso
amador da hipnose, ele precisou encontrar uma solução. Então,
Freud economiza a pesquisa, a fisiologia, a anatomia, a
medicina, e inventa do que tratar sem o recurso da medicina
clássica: ele encontrará sem procurar – a não ser em seu
espírito... Desde então, da cocaína ao divã, passando pela
imposição das mãos, a eletroterapia, o magnetismo, a hipnose, o
método catártico, a associação livre, o trajeto freudiano parece o
labirinto de um Dédalo procurando escapar ao Minotauro da
pobreza e do anonimato.

Sigamos então Freud nesse labirinto terapêutico. Em 1884,


ele quer se rico e famoso. Leiamos uma confidência a Martha:
ele corre “atrás do dinheiro, atrás de uma situação e um nome”
(7 de janeiro de 1885). Seu nascimento toucado anunciava isso.
Sua mãe também havia previsto. Um poeta circense tinha
confirmado a coisa num café do Prater. Suas cartas a Fliess
volta e meia mostram o assunto: o futuro colega de Copérnico e
Darwin na história da humanidade encontrou Martha Bernays,
ele aspira à respeitabilidade burguesa, quer casar-se a fim de
instalar uma mulher feliz num ambiente agradável, pretende
uma penca de filhos, deseja fundar uma família suscetível de
alegrar sua mulher e realizar seu destino de dona de casa –
aquele de toda mulher neste planeta, segundo ele...
A medicina o enfada. A pesquisa não permite alçar-se de
um só lance ao cimo de uma reputação nacional, menos ainda
mundial. Para tanto, ele deve realizar uma descoberta digna
desse nome. O ensino na universidade traz um problema:
esperar sua vez no jogo das cadeiras da promoção, para um
homem com pressa, não é digno de um gênio que sabe não ter
nascido para isso. Seu trabalho num laboratório como jovem
requerente não permite vislumbrar uma elevação na hierarquia
antes da eleição dos mais antigos do que ele. No momento, ele
não ganha sua vida, ele toma emprestado, se endivida, depende
de um ou outro doador, Breuer, por exemplo, que ele
transforma em inimigo potencial – por causa justamente de sua
generosidade...
Nessa configuração de um moço Freud desejoso de
descobrir rapidamente como fazer parte da burguesia de Viena
e obcecado pelo achado que permitiria seu casamento, o jovem
médico despecuniado acredita encontrar a pedra filosofal com a
cocaína. Grande leitor, mas também grande encobridor de suas
leituras, Freud leu numa revista o artigo de um cirurgião militar que
fazia a panaceia dessa nova substância bastante ignorada à época:
servia-se cocaína ao soldados e a hierarquia militar constatava uma
melhora nas performances físicas e mentais das tropas! Freud escreve
à noiva: eis aí uma “chance que temos de aproveitar”... Numa outra
revista ele descobre outro texto, que empresta à cocaína o poder de
libertar-se da... morfina! O exército que fornece cocaína aos recrutas e
uma droga que não cria dependência, eis aí ainda dois novos e
prometedores horizontes!
Então, Freud busca o famoso pó, experimenta, consome muitas
vezes, regularmente. Estamos em 1884, mas ele ainda escreverá ao
amigo Fliess dez anos mais tarde, 12 de junho de 1895, para sermos
precisos, “preciso de muita cocaína”. Isto é, aí já são pelo menos dez
anos de cocainomania. Ele a propõe à noiva, prescreve-lhe doses e
conta, de Paris, onde está o noivo, que a cocaína age como um tônico
sexual e que ele vai provar isso quando estiverem juntos em Viena, ele
a consome para desinibir-se, antes de sair para as soirées mundanas
oferecidas por Charcot, soirées nas quais o jovem médico encontra
Tout-Paris.
Vários de seus comportamentos, se não tais e tais proposições
teóricas, alguns de seus entusiasmos seguidos de uma total renegação
daquilo que teria sido produzido num frenesi eufórico do efeito da
substância, uma parte dos humores sinusoidais, aquela famosa
“psiconeurose bastante grave” revelada pelo próprio Ernest Jones,
seus problemas de arritmia cardíaca, o arrefecimento de sua libido,
seus delírios paranóicos em relação àqueles que não aderem
totalmente às suas teses, seus múltiplos pânicos, seus problemas de
obstrução nasal, seus repetidos catarros, tudo isso, verossimilmente,
pode ter relação com aquele hábito contraído cedo em sua existência.
Minha hipótese é de que as séries de entusiasmos e de depressões
produziram efeitos teóricos em seu pensamento. Por exemplo, quando
da redação do Esboço de uma psicologia científica. Freud escreve a
Fliess em 20 de outubro de 1895: “Durante uma noite de trabalho na
semana passada, a carga de dor havia atingido esse grau que produz o
estado ótimo para minha atividade cerebral, as barreiras subitamente
se levantaram, os véus caíram, e pude penetrar tudo com o olhar,
desde o detalhe das neuroses até as condições da consciência. Tudo
parecia encaixar-se, as engrenagens se ajustavam, tinha a impressão
de que agora a coisa era realmente uma máquina e que ela funcionaria
a partir dela própria.” Depois, em 29 de novembro de 1895: “Não
compreendo mais o estado de espírito em que me encontrava quando
elucubrei a psicologia; não consigo conceber como é que pude
impingi-la a você.” Em outubro, o esboço estava genial, quatro
semanas mais tarde ainda não estava bom para ir a público. Foi em
junho desse ano que Freud falou em necessidade de cocaína...
Quando de suas experimentações, Freud constata que a cocaína
produz nele numa verdadeira euforia: sua melancolia de volatiza, suas
performances físicas e psíquicas se multiplicam, sua neurastenia e o
que seria chamado hoje em dia estado depressivo desaparecem. E
então, extrapolando seu caso para a generalidade – um método
destinado a tornar-se um hábito nele –, Freud afirma que ela cura as
afecções neuróticas, melhora os estados psíquicos desfalecentes, e isso
sem criar hábito, afirma ele peremptoriamente contra alguns que, mais
lúcidos, assinalam seu efeito aditivo... Ele encontrou a pedra filosofal
com a qual os problemas psiquiátricos se verão resolvidos. E se abre
numa carta a Martha: com aquela descoberta, ele fará fortuna – em
todos os sentidos do termo.
Mal disfarçando os artigos lidos, Freud apresenta a hipótese como
sua de que a cocaína serve para desembaraçar-se da dependência da
morfina. Na primavera de 1884 ele faz a experiência em seu amigo
Fleischl-Marxow intoxicado com a segunda substância por causa de
dores em consequência da amputação de um polegar infeccionado
causada por um corte no laboratório. O jovem e impaciente doutor faz
uma intervenção na Sociedade de Psiquiatria e, peremptório, afirma
que em vinte dias ela obteve excelentes resultados.
Em 1885, Freud dá a primeira versão das coisas num artigo
intitulado Sobre a cocaína. Ali podemos ler: “sem hesitação [sic], eu
aconselharia a administração de cocaína por injeção”. Depois, ele
confessa ter praticado esse método, o que teria tido por efeito a
melhora considerável no estado do paciente cuja dependência da
morfina desapareceu totalmente. Seguro de si, ele afiança que com a
cocaína será possível enfim tratar da depressão, da melancolia, da
histeria, da hipocondria...
Cinco anos mais tarde, numa segunda versão, aquela da
Interpretação do sonho (1900), Freud não diz nada do que havia dito.
Porque, entre as duas versões, seu amigo morreu da prescrição
freudiana de injeção subcutânea do produto... Freud pretende, agora,
que havia expressamente proibido a injeção e claramente prescrito a
ingestão; ela fala de seu “infeliz amigo que envenenou-se com a
cocaína [itálicos de Freud!]. Eu o aconselhei o uso por via interna,
oralmente, enquanto a morfina lhe era retirada; mas ele certa vez usou
injeções de cocaína”. E, mais longe, voltando ao assunto: “Como eu já
disse, jamais imaginei que se pudesse usar a droga por injeção”... A
confrontação das duas versões permite julgar a probidade do
personagem.
Ora, quando de sua intervenção na Sociedade de Psiquiatria e
depois, quando redige seu artigo, Freud sabe perfeitamente que o
estado de seu amigo piorou porque o havia visitado no hospital e pôde
constatar que a cocaína não o livrava da morfina, que ela não suprimia
as perturbações do paciente e, pior, que ela juntava uma segunda
dependência à primeira. No cotidiano, seu amigo sofria de convulsões,
de agitação, delírio, alucinações, confusão, desespero, de vontade de
suicídio: Freud constatou isso no quarto do próprio doente, seu amigo.
A prova? Cartas enviadas regulamente à sua mulher, nas quais ele a
mantém a par da degradação do doente – no dia 12 de maio de 1884,
ele escreve: “com Fleischl, as coisas vão tão mal que eu não posso me
gabar de nenhum sucesso”... Confidências a seus próximos e
observações espalhadas em correspondências diversas – compreende-
se, assim, que elas estejam inacessíveis aos pesquisadores críticos... –
confirmam essa constatação do fracasso e da lucidez de Freud sobre o
insucesso de sua terapia. Pouco importa, Freud tem necessidade de
transformar esse fiasco em sucesso: isso decorre de seu projeto
original (para falar numa linguagem sartriana da psicanálise
existencial) de ser um grande homem, pouco importam os meios.
Três anos mais tarde, tendo sido descoberta a fraude, Freud
destrói as provas: o artigo Sobre a cocaína desaparece da bibliografia
oficial, aquela que ele envia, por exemplo, às instituições
universitárias para ser admitido como professor de faculdade – um
desaparecimento que seus hagiógrafos, provavelmente esquecidos de
sua leitura de Psicopatologia da vida cotidiana, debitam isso a uma
distração em seu inconsciente! (Notemos que a referência a esse texto,
assinado por Freud, está estranhamente ausente das 1.500 páginas do
Dicionário das obras psicanalíticas de Paul Laurent Assoun,
publicadas em 2009, e que a publicação da edição dos 21 volumes das
Obras completas começa muito oportunamente com os textos de...
1886!)
Um psicanalista muito zeloso voa em socorro do mestre
explicando que o desaparecimento desse texto da bibliografia de
Freud procedeu de um desejo inconsciente motivado por um gesto de
amizade em direção ao seu amigo morto, porque o que Freud separava
nessa questão era menos a seringa que havia servido paras as injeções
do que um substituto ao falo... “Esquecendo-se” Sobre a cocaína na
bibliografia de suas Obras completas, Freud não teria querido, para
ser polido, sodomizar seu amigo – o que, no entanto, de uma certa
maneira...
Depois do fracasso da cocaína, Freud abre seu consultório
privado em 1886. Durante quatro anos, até 1890, ele pratica a
eletroterapia. A velha galvanoterapia, a franklinização, os choques
elétricos, o eletrochoque, o abalo voltaico, todo isso fazia parte da
arsenal terapêutico havia cem anos... Numa carta a Fliess, Freud
afirma que pratica “o tratamento galvânico” (24 de novembro de
1887). À época, era um tratamento em voga. Ele, que tem vontade de
galgar rapidamente os escalões universitários para conseguir um posto
de faculdade, pretende preparar uma publicação sobre o assunto. O
material custa caro, então um confrade propõe fornecer-lhe.
Em sua Contribuição à história do movimento psicanalítico,
Freud aborda essa questão mas, por provável temor ao ridículo,
transforma esse período pouco glorioso por seu cientificismo
vagabundo em “terapia fundada na física” (XII. 251) – o que é bem
mais nobre... Para integrar esse episódio digno do Professor Girassol à
lenda psicanalítica, Freud diz que logo percebeu, evidentemente, que
“os sucessos do tratamento elétrico nas perturbações nervosas eram
sucessos da sugestão” (ibid.) Hábil leitura retrospectiva...
Por que, então, essa lenda da “terapia elétrica” como reveladora
da eficácia sugestiva desemboca diretamente na clareira da hipnose
que logo conduzirá à psicanálise de 1896, ao passo que, em 1910,
parecendo pouco acreditar na eficácia desse método revolucionário,
Freud prescreve “uma cura por sonda (ou psicróforo)” para acalmar o
onanismo de um paciente? Com efeito, numa carta a Ludwig
Binswanger, um prático que busca casar psicanálise e fenomenologia,
que se descobre que, nessa época (nove de abril de 1910, ano da
publicação da Cinco lições sobre a psicanálise...) Freud acredita na
eficiência dessa extravagante medicina.
Por que extravagante? Porque essas curas são aparentadas das
loucuras terapêuticas, tidas como capazes de curar as loucuras
doentias... Porque as medicinas da loucura foram durante muito tempo
loucas é que provavelmente olharemos um dia as nossas com o
mesmo olhar divertido com que vemos os eméticos e sangrias de
Diafoirus! A técnica à qual Freud submete o paciente em 1910 não
deixa de espantar. Além do mais, ela permite duvidar da validade da
psicanálise: Freud escreveu O método psicanalítico de Freud em
1904, Sobre a psicoterapia em 1905, Perspectiva da terapêutica
analítica em 1910 e, no mesmo ano, A propósito da psicanálise dita
“selvagem” para detalhar o ritual da sessão, do divã, dos honorários,
da livre associação, mas o rumo que ele aponta para J.v.T. (iniciais do
paciente neurótico de Binswanger) é uma sonda na uretra com um
cateter oco pelo qual injetada água fria... Eis aí, então, em 1910, os
cuidados que o inventor da psicanálise teoricamente pronta indica a
um doente sofrendo de uma “depressão melancólica” cuja patologia
mais grave consiste em se masturbar constantemente!

Segundo a lenda dourada da psicanálise, a eletroterapia cedeu


lugar à hipnose: tendo constatado o forte poder de cura da sugestão na
terapia galvânica, Freud ruma a passos seguros na direção de sua
descoberta. Assim, a hipnose faz parte do momento necessário no
movimento pretensamente científico da descoberta da nova disciplina.
A hipnose, como se sabe, significa Jean-Martin Charcot e, depois,
Josef Breuer.
Os historiadores da medicina assinalam a existência de doenças
que brilham durante um certo tempo e então desaparecem. Claro,
algumas se encontram francamente erradicadas graças a algum
medicamento, a uma substância, mas a histeria, por exemplo,
desapareceu da nosologia contemporânea sem que a medicina tivesse
encontrado claramente um remédio ou uma profilaxia adequados. O
século XIX foi o tempo bendito da histeria e das histéricas, mas
ninguém hoje em dia usa esse conceito passado, aliás, para o
vocabulário corrente para designar tudo e não importa o quê – de uma
mulher inquieta por sua feminilidade exacerbada a uma extravagância
comportamental, passando por uma alteridade engraçada.
Para explicar o desaparecimento da palavra, historiadores da
medicina supõem que a coisa se encontra melhor definida: inúmeras
histéricas que tiveram os seus dias de teatralização na Salpêtrière
seriam hoje em dia claramente etiquetadas sob patologias tornadas
visíveis e identificáveis graças à existência de um material de
investigação aperfeiçoado que permite um diagnóstico preciso:
epilepsias neuronais, no caso, lesões microscópicas no encéfalo,
deficiências da matéria nervosa – e essas leituras científicas
invalidariam as leituras mágicas.
O grande teatro histérico exige espectadores, como testemunha a
presença de fotógrafos a fim de fixar para sempre uma sessão de
Charcot e fazer o retrato das convulsivas ou imortalizar no nitrato de
prata os corpos catalépticos ou catatônicos, aquela dos mundanos do
momento, a figura do mestre como atanor dessas pulsões plásticas.
Também pode ser visto ali o pintor André Brouillet realizar sua obra
destinada a tornar-se célebre, Uma lição de medicina com o dr.
Charcot na Salpêtrière (1887). O quadro tornou-se o ícone daquele
momento histórico na história da psiquiatria.
Entre 14 de outubro de 1885 e 28 de fevereiro de 1886, Freud foi
um desses espectadores fascinados por esse teatro de histéricas no
qual o professor Charcot oficiou de 1862 a 1893, isto é, por mais de
trinta anos, como um semideus decidindo sobre a vontade dos
pacientes por meio de gestos, encantações, um verbo, uma cenografia
de seu próprio corpo magnetizando a assembleia. Em julho de 1912,
Ludwig Binswanger escreve uma carta a Freud para observar a seu
correspondente que ele é presa de sua “enorme vontade de poder, mais
exatamente de domínio sobre os homens”. Prossegue: “Uma prova é
que você, a princípio, queria estudar direito e que os ministros
desempenham um grande papel em você. Isso me parece significativo.
Você é um mestre de nascença e ter orientado esse instinto de domínio
rumo ao domínio psíquico dos homens foi uma sublimação
excepcionalmente alcançada. Não é verdade que em toda sua obra
científica essa pulsão de domínio da humanidade é trabalhada? O
quanto essa pulsão está em relação com o seu complexo paternal
aparece, aliás, claramente na Interpretação do sonho” (4 de julho de
1912). O que responde Freud a essa declaração? Que está de acordo!
Dominar psiquicamente os homens e, mais tarde, dominar a
humanidade? Freud não vê objeções: ele aquiesce a esse bom
diagnóstico...
A hipnose é, então, a solução. Ser o equivalente de Charcot em
Viena? Eis aí a saída para essa interminável espera de uma reputação
que já tarda. De volta para a Áustria, Freud propõe ao mestre da
Salpêtrière a tradução de sua obra. Sem referir-se ao autor, ele redige
notas de pé de página. Quando surge o livro, Charcot lhe envia uma
carta de felicitações pelos seus anexos. Construindo sua lenda, Freud,
ao contrário do que realmente aconteceu, escreverá que Charcot levou
a mal aquela licença – o escultor de sua própria estátua continuou
então a afirmar que, se mestre houve, o discípulo não foi dócil, servil,
submisso, e que ele manifestara sua autonomia, sua independência
intelectual, seu espírito crítico.
Em fins de 1887, continuando a receitar a eletroterapia, Freud
coloca a hipnose no arsenal de seu consultório. A 28 de fevereiro de
1887, ele escreverá a Fliess: “Eu me pus na hipnose e cheguei a todo
tipo de sucessos, pequenos, mas notáveis.” Gostaríamos de saber o
que foram esses pequenos sucessos que, apesar de sua modéstia, são
marcantes! Em troca, pode-se saber que “Neste momento, tenho
estendida diante de mim uma dama sob hipnose e então posso,
tranquilamente, continuar a escrever”... Ver-se-á mais tarde o quanto
esse tipo de prática que Freud denomina “atenção flutuante” do
psicanalista permite na cura. Além disso, como se sabe, Freud às
vezes dormia durante as sessões pagas caro – mas, já que apenas os
inconscientes comunicam durante esse tipo de sessão, o psicanalista
não vê nisso matéria para reprovação.
No entanto, Freud não consegue fazer dormir seus pacientes
ainda que, como ele escreve a Fliess, o nome de Charcot continue a
encher seu gabinete (8 de fevereiro de 1888)! Como alguns clientes
resistem e o ridículo ameace cobrir o hipnotizador de cacholas que
não chegam a entrar no estado pretendido, apesar de todos os gestos,
palavras e encantações, e depois de terem passado por uma sessão em
moeda sonante mas hesitante, o psicanalista decide renunciar a esse
método. E, pelas boas razões da raposa de La Fontaine, com Freud
achando que as uvas estão realmente muito verdes, ele escreve em
Sobre a psicanálise que renuncia à hipnose por causa de seu caráter
“místico” (19)... A honra do cientista adepto dos passes sonambúlicos
está salva!

A cocaína de 1884 a 1885, a eletroterapia entre 1886 e 1890, a


balneoterapia ao mesmo tempo, mas durante curto período porque ela
não é suficientemente rentável – afinal “mandar alguém para um
estabelecimento de hidroterapia após uma única consulta não era uma
fonte de renda suficiente” (Autoapresentação, XVII, 63) –, a hipnose
de 1887 a 1892, o psicróforo até 1910 (!), cedem lugar à imposição
das mãos na fronte, uma mise en scène tomada emprestada de
Bernheim. O hipnotizador francês Hippolyte Bernheim trabalha em
Nancy. Charcot ensina que a hipnose só funciona com os histéricos –
e o futuro lhe dará razão... Por seu lado, Berheim afirma que tudo é
questão de sugestão, então todo mundo pode prestar-se a isso com
sucesso. Uma tese interessante para o Freud mau hipnotizador. Ele
visita o nanciano em 1889... Após Charcot, ele traduz seu rival e
oferece uma edição da principal obra do adversário de seu Deus
parisiense: Sobre a sugestão e suas aplicações na terapêutica. Melhor
dois ferros no fogo do que nenhum...
Em seus Estudos sobre a histeria, Freud relata sua prática da
imposição das mãos. Para tratar de uma histérica, ele preconiza então
uma... massagem do útero. Freud se contenta em teorizar, pois ele
convida um prático a efetuar o gesto e afirma triunfalmente a
propósito da saúde mental da paciente: “um de nossos ginecologistas
mais em evidência reparou seu útero com massagem, de tal forma que
ela ficou vários meses isenta de todos os males” (III, 95). Então, em
1893, Freud faz massagear úteros para recolocá-los em seu lugar e
suprimir os sintomas histéricos... Lembremos que todas as boas
enciclopédias relatam que o termo psicanálise data de 1896, mas a
passagem dedicada a esse caso já falava, em 1893, de uma paciente
“estirada no divã” (II. 98) – convenhamos que existe a possibilidade
de expressar, antes do termo, a coisa psicanalítica.
Relatando o caso de uma paciente, miss Lucy R., Freud explica
que, para ir além das resistências das pessoas deitadas em seu divã, ou
para enfrentar a situação de fracasso em que se encontra quando,
aproximando um dedo dos olhos do paciente, anuncia que ele vai
dormir... mas não dorme, então junta essa técnica do corpo, essa
passagem ao ato físico com contato e por único objetivo “obrigá-los a
comunicar” (II, 129).
Quando solicita ao paciente reticente informar sobre sua
patologia, ele age assim: “Colocava as mãos na fronte do doente ou
tomava sua cabeça entre minhas mãos e dizia ‘Isso virá à sua ideia
agora sob a pressão de minhas mãos. No momento em que eu parar a
pressão, você verá alguma coisa diante de si ou alguma coisa passará
por sua cabeça e você segura isso. É isso o que buscamos’”.
Resultado? Sucesso garantido – segundo Freud, claro.
Em 1909, no Sobre a psicanálise, Freud explica novamente um
procedimento como havia feito nos Estudos sobre a histeria,
notadamente no capítulo “Sobre a psicoterapia da histeria” (II, 293):
estender o paciente no divã, convidá-lo à descontração, dizer que no
momento em que relaxar a pressão das mãos surgirá uma lembrança.
Então, pelo surgimento de uma lembrança escondida, o paciente
registra o desaparecimento do sintoma e o psicanalista consegue uma
cura sistemática...
Assim, nenhuma necessidade de chegar a hipnotizar realmente,
uma performance na qual Freud realmente não excelia, como já
vimos: essa nova técnica que junta a mão na fronte à velha prática
hipnótica permite ao psicanalista não mais quebrar a cara já que a
impossibilidade de hipnotizar cai na conta, não da incapacidade do
analista ou de sua incompetência, mas na do paciente que manifesta
resistência! Freud não é capaz de fazer dormir seus pacientes? A culpa
cabe ao inconsciente do paciente que resiste, mas nunca a ele...
Depois dessa viagem pelo labirinto terapêutico de Freud, do
milagre da cocaína (1884) ao abandono do método hipnótico,
passando pela ultrapassagem do momento da imposição das mãos
(1888) que, Freud dixit, remedeia e sara, sem esquecer, no caso do
onanismo, das prescrições de intromissão de uma sonda uretral
(1910), com a qual se obtinha excelentes resultados, pode-se medir a
errância de Freud entre 28 a 54 anos de idade – isto é, um quarto de
século de consultas em seu gabinete...
Lemos com real estupefação esta frase extraída da Contribuição
para a história do movimento psicanalítico (1914), que mostra um
Freud modesto, escrevendo que em 1902, data do começo das
reuniões da Sociedade Psicológica às quartas-feiras, até junho de
1907, apresentada como a data da certeza teórica, em seu pensamento,
ele duvidava de si: “Eu mesmo não ousava expor uma técnica ainda
incompleta nem uma teoria que se mostrava em constante movimento
com a autoridade que teria verdadeiramente evitado aos outros de
tomar muitas vezes um falso caminho e finalmente perder-se” (XII,
268).
Evitemos ler Sobre a cocaína, os Ensaios sobre a histeria ou
mesmo Da psicanálise, mas apenas a correspondência na qual Freud
nunca duvidou da excelência do método no momento em que se
apegava a um ou a outro, para imaginar que ele nunca foi peremptório,
seguro de si, anunciando que dispunha da pedra filosofal para tratar e
curar as patologias mentais! Nenhum cuidado, durante esses dois
decênios, de insistir sobre o caráter “incompleto” de seu trabalho,
sobre o futuro instável de seu pensamento, sobre a natureza incerta e
sobre o “movimento constante” de sua doutrina e, pior, de suas
terapias.
Onde está o verdadeiro Freud? O vendedor de cocaína decretada
substância vale-tudo em 1885? Ou o promotor da eletroterapia de
1886-1887? Ou o prescritor de banhos e massagens durante a mesma
época? A menos que não se trate do mercador do sonho hipnótico de
1888? Ao qual se deveria juntar o de tocador de fronte? O que fazer
então do receitador de sonda uretral com jatos de água fria no pinto
em 1910?
A escrita da lenda, com a ajuda dos textos autobiográficos
Contribuição para a história do movimento psicanalítico (1914) e
Autoapresentação (1925), põe em boa ordem esse cafarnaum com a
ficção da descoberta linear, cada movimento errático sendo
apresentado como preparatório ao santo dos santos: a psicanálise
tornada ícone perfeito e intocável. Nessa configuração da reescrita da
história: exit o momento cocainômano; a eletroterapia ensina a Freud
que o efeito dessa terapia reside na sugestão; nenhuma palavra sobre o
recurso ao psicróforo – felizmente, as correspondências revelam, daí o
interesse dos turiferários em controlá-las, destruí-las ou proibir o
acesso; silêncio sobre a balneoterapia e outras tolices termais –
praticadas longamente por Freud em companhia de sua cunhada; e
ainda a imposição das mãos suprindo a incapacidade de hipnotizar,
mas essas falha o fazem descobrir a resistência, conceito maior da
psicanálise para explicar psicanaliticamente seus limites...
Um indivíduo que, em seu consultório, hoje em dia, quisesse
saber sobre eletricidade, magnetismo, cocaína, sonda uretral, hipnose,
haptonomia, termalismo, para tratar, curar, encontraria sem
dificuldade páginas e análises na obra completa de Freud (entre 1884
e 1910, o que não é de pouca amplitude cronológica, um quarto de
século, é bom lembrar...) para justificar essas práticas contraditórias,
heterogêneas, cuja eficácia em alguns casos só se explicaria por efeito
placebo – bem como para a psicanálise, como veremos.

Nesse pátio dos milagres da terapia freudiana, reservamos um


lugar para um texto ausente da edição das Obras completas. Essa
memória pode ser lida no quadro da publicação de uma
correspondência com Wilhelm Fliess, já que foi um manuscrito
enviado ao amigo sem perspectiva editorial. Esse Esboço de uma
psicologia científica data de 1895, e entra na errância freudiana, entre
o método de associação livre de 1892 e o psicróforo de 1910. Nós já
vimos como esse texto deve ter seu surgimento eufórico e sua rejeição
um mês depois, aos prováveis efeitos do grande consumo de cocaína
de seu autor.
No entanto, essas páginas merecem um olhar atento, porque o
neurologista que ruma para a terapia das doenças metais por desejar
ganhar sua vida bem e rapidamente, o oportunista desejoso de obter o
mesmo sucesso mundano e material que Charcot com a hipnose, o
teórico cheio de fumos da etiologia sexual das patologias mentais que
fala de histeria masculina e faz a instituição rir no seu nariz, esse
homem, então, não renunciou totalmente às tentações do performativo
autobiográfico constitutivo da base de seu método.
Com o Esboço de uma psicologia científica, Freud propõe, como
o título indica, uma psicologia cientifica, ao contrário da psicologia
literária que define sua obra, seu pensamento e sua démarche. Esse
texto ilustra bem a ambivalência de Freud (demonstrarei isso mais
adiante, em “Como voltar as costas ao corpo?”) e sua longa hesitação
entre a negação do corpo, o esquecimento do corpo, a posição que
triunfará, e o cuidado do corpo, posição reprimida.
E s s e Esboço (1895) e, quarenta e dois anos mais tarde, as
considerações sobre a química tornar caduca a psicanálise em A
análise com fim e a análise sem fim (1937), defendem uma mesma
posição. Como uma ponte acima do conjunto da obra, eles provam a
existência de um Freud científico, verdadeiramente científico, que não
disserta sobre tópicos atópicos, sobre metáforas e metonímias
reivindicadas como tais, mas que reflete sobre quantidades de energia
físicas, a economia das forças nervosas, as produções neuronais, as
vitalidades biológicas.
Estamos longe – e, no entanto, é o mesmo ano de 1895 – dos
Estudos sobre a histeria nos quais Freud, lembremo-nos, pregava a
ideia da hipnose com imposição das mãos para tratar e “curar” as
psicopatologias. Nesse texto impedido nas Obras completas e durante
muito tempo inacessível, trata-se de compreender os mecanismos de
recalque a partir dos neurônios. Claro que também aqui se encontra o
tropismo freudiano do peremptório, a afirmação gratuita colocada sem
provas, sem demonstração, sem trabalho de laboratório que valide
suas hipóteses, nessa verdade imposta sobre o modo assertivo da
existência de três tipos de neurônios caracterizados por três letras do
alfabeto grego, “fi”, “psi” e “mi”, ou, dito de outra forma, os
neurônios que recepcionam os estímulos, transmite-os e os fazem
afluir à consciência.
Esses distintos neurônios, ainda que tendo uma mesma estrutura,
mantêm relações econômicas, também ditas de gestão dos fluxos
nervosos: investimentos quantitativos, transferências de qualidades,
estímulos de energia, interações excitantes, conjunções de
quantidades, processos de recondução, descarga de tensões psíquicas e
outras modalidades de agenciamento. Estamos longe das hipóteses de
assassínio do pai e da horda primitiva, se não do complexo de Édipo,
arquétipos transmitidos por uma biologia imaterial das psiques.
Descobre-se aqui um Freud errante, ensaiando uma hipótese científica,
física, levado por ela, achando-a revolucionária antes, rapidamente, de
espantar-se por ter-se entusiasmado com o que não lhe parece mais de
nenhum interesse. Essa tentação científica não o abandonará nunca,
estará sempre subentendida em todas as suas análises
metapsicológicas.
Claro, a epistemologia de um Gaston Bachelard talvez tirasse
proveito desse Esboço ainda que para ilustrar os mecanismos de
obstáculo epistemológico científico: com sua quantidade de energia
chamada “Q” (em alemão não é possível trocadilho... 1), as aventuras
da energia psíquica (excitação, substituição, conversão, descarga)
suscetíveis de dar conta dos estados psíquicos, seu recurso ao
travestimento de formulações aparentemente científicas (três
neurônios batizados em grego, estados livres e ligados da qualidade,
processos primários e secundários, tendências do sistema nervoso para
o compromisso, regras biológicas da atenção e da diferença, índices de
qualidade, de realidade e de pensamento, etc.), Freud poderia muito
bem, reivindicando o vocabulário científico, encontrar-se numa pré-
ciência de característica literária...
Mas esse momento científico na economia do pensamento
freudiano mostra sua ambivalência: Freud, o filósofo outrora tentado
pela filosofia, mas decepcionado pela disciplina, torna-se turiferário
de má-fé de uma atividade considerada como incapaz de aportar, em
prazos razoáveis, fama e fortuna, seus objetivos monomaníacos; Freud
leitor e amador das hipóteses filosóficas recalcadas de Schopenhauer e
de Nietzsche sobre um a biologia metafísica do universo – ver
vontade no primeiro e vontade de poder do segundo; Freud recusando
toda visão global do mundo cara, segundo ele, aos filósofos, e
reivindicando a paciência experimental do cientista, mas propondo ele
próprio sua visão de mundo global e geral; Freud equiparando-se a
Copérnico e Darwin, e nem um pouco dos autores do Mundo como
vontade e representação e Assim fala Zaratustra, mas pensando como
filósofo mais do que como astrônomo ou naturalista; esse Freud,
então, manifesta com esse Esboço surgido de seu ser, empurrado pela

“Q”, em francês, pode soar como “cul”, ou seja, cu. (N. do T.)

força da cocaína, um desejo recalcado: partir da matéria do mundo
para compreendê-lo.
Mas durante toda sua carreira, ele recalcará essa matéria do
mundo para preferir a matéria de um outro mundo – aquele de seus
sonhos, de seus desejos e de seus fantasmas. A cocaína provavelmente
teve algum papel desinibidor. Esse manuscrito sem título enviado ao
seu amigo, perdido durante muito tempo, antes de ser encontrado na
correspondência, conheceu uma odisseia espantosa: vendido a um
livreiro pela viúva de Fliess, notado por Maria Bonaparte a quem
Freud pediu seu desaparecimento (por seu lado, ele havia destruído as
cartas recebidas de Fliess), ainda assim comprado por ela, depositado
no banco Rothschild depois da entrada dos nazistas em Viena, salvo
da Gestapo e depositado na delegação dinamarquesa, atravessou a
Mancha envolvido num tecido impermeável, o texto acabará por
surgir em 1950 em Londres – e seis anos mais tarde em Paris. Ouve-se
dessas páginas a voz que fala no Além do princípio do prazer, um
texto no qual o corpo reaparece um pouco, ainda que afogado no
oceano conceitual – mas esse oceano conceitual parece mais
consistente do que o oceano de brumas que envolve tantas outras de
suas obras.

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