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Abstract: This research performs a qualitative analysis of the webcomic “Arlindo”, trying
to understand how the narrative acts in the construction of the LGBTQIA+ characters of
the work. For this, content analysis is used. Data collection takes place by crossing the
1
Rafaela Bernardazzi Torrens Leite. IFRN, Doutorado, Brasil, rafaela.bernardazzi@ifrn.edu.br.
2
Alison Vinícius da Silva Barbosa. IFRN, Ensino Fundamental, Brasil, vinicius.barbosa@escolar.ifrn.edu.br.
analysis of the webcomic's visual content and the social media content of Luísa de Souza,
author of the work. Another point of reference for the research is the relationship
between the creation of the webcomic's content and the target audience and how this
relates to the characteristics of the characters.
INTRODUÇÃO
3
Fonte: Pesquisas Produção e Vendas e Conteúdo Digital do Setor Editorial Brasileiro. (2022, 17 de
maio). Sindicato Nacional de Editores de Livros. https://snel.org.br/pesquisas-producao-e-vendas-e-
conteudo-digital-do-setor-editorial-brasileiro-de-2021-revelam-dados-do-crescimento-do-setor/
acesso a diversas webcomics como Alienaldo de Gabriel Infante (2020), Chapeuzinho de
Aureliano (2021) e Arlindo (2021) de Luíza de Souza, tendo em vista que esta mídia social
facilita a interação entre os leitores e os criadores de conteúdo.
O sucesso da webcomic Arlindo deu origem aos “arlinders”, nome dado aos fãs e
leitores da história de Luíza de Souza. Devido à fidelidade da história com os fãs, Arlindo
se tornou recorde de arrecadação da categoria “HQ’s” na plataforma Catarse, além de
ultrapassar a meta em dinheiro estabelecida em mais de 350% com 4410 apoiadores,
sendo que para 46% destes,4 foi sua primeira compra na plataforma. A obra também
recebeu 5 indicações nas categorias de: “melhor álbum”, “melhor colorista”, “melhor
quadrinista”, “melhor quadrinho” e “melhor roteirista” no CCXP Awards de 20225, o que
aponta uma qualidade técnica do produto lançado e a relevância da temática debatida
pela autora na webcomic.
Eu me comprometi a contar a história desse menino porque a história
dele é a história de muitos meninos e meninas espalhados pelo Brasil. Eu
sinto que é meu dever como voz que é ouvida pelas pessoas, mas que
tem um espaço e um palco ali, e é importante que essas histórias sejam
contadas para as pessoas perceberem que quando elas falam essas
coisas, tem uma criança ouvindo e ela vai provavelmente lembrar disso
pro resto da vida (Souza, 2021a).
4
Souza, L. Luíza de Souza: depoimento [dez. 2021b]. Entrevistadores: A. Barbosa e R. Bernardazzi. Natal, RN.
Entrevista concedida ao Projeto Representatividade LGBT nos Quadrinhos: Uma Análise da Webcomic
Potiguar Arlindo.
5
Ribeiro, P. H. (2022). CCXP Awards 2022 | Conheça os finalistas de todas as categorias da premiação.
Omelete. Disponível em: https://www.omelete.com.br/ccxp/indicados-ccxp-awards. Acesso em 23 jun.
2022.
PLANEJAMENTO VISUAL
O quadrinistra brasileiro Vitor Cafaggi (2020) defende que muitas vezes essa
atração pode surgir de uma estranheza visual que o leitor vai ter com o seu personagem,
como uma diferença física nele. No caso de Arlindo, isso seria perceptível pela coloração
amarelada na pele de todos os personagens da webcomic. Outro fator que auxilia no
design do protagonista são os diversos formatos presentes em sua composição que, além
de causar estranhamento, auxiliam a passar informações sobre ele sem serem ditas
explicitamente e, novamente, Cafaggi (2020) denota que este método pode ser feito de
um jeito mais direto e até de um jeito mais subliminar.
Identificamos, na figura 1, que diversos círculos fazem parte da composição do
personagem principal da obra Arlindo, com o objetivo de tornar o personagem mais
amigável visualmente, assim como diversos outros personagens da cultura pop, como a
Hello Kitty (do seriado Hello Kitty) e o Pikachu (da franquia Pokémon). A força do
personagem está ligada aos seus traços de personalidade amável e seu pensamento, por
isso sua cabeça é grande se comparada ao seu corpo, que por sua vez, é magro e esguio.
Segundo o designer potiguar Beto Leite: “existe uma tensão, um equilíbrio frágil no
pescoço fino [...], o que transparece uma fragilidade no personagem” (2021, online6).
Seus olhos são grandes para fazer jus a sua grande curiosidade e suas orelhas
também possuem o tamanho avantajado, pois é uma consequência não só da sua
curiosidade, mas devido ao conceito original fundador do mesmo, as conversas que
crianças e adolescentes ouvem constantemente sobre indivíduos LGBTQIA +. Arlindo
possui a cabeça quadrada para identificarmos que o mesmo possui conflitos pessoais
internos, mas as pontas dessa forma são arredondadas para fugir de elementos que
6
Leite, R. [betoleite] (2021). TRUQUE - Aula 5 [Video TRUQUE - Aula 5]. Youtube.
https://www.youtube.com/watch?v=XtvxfLHeAJg
fizessem analogia a agressividade, como aspectos pontiagudos, além de gerar uma
estranheza, como citado anteriormente, especialmente se for levado em consideração
que os demais personagens da história possuem cabeças em um formato mais “comum”.
PLANEJAMENTO TEXTUAL
REPRESENTATIVIDADE
A identificação e representatividade positiva se tornaram fatores cruciais na
webcomic, de acordo com a autora: “Eu fiz esse livro porque era o que eu queria ter tido,
acho que de todas as coisas que eu fiz na vida, isso é o que mais me tem” (Souza, 2021b).
Esse sentimento é crucial para a construção de uma narrativa em história em quadrinhos.
A representatividade positiva na história é ainda mais acentuada se for levado em
consideração que, pelo quarto ano seguido, o Brasil é o país que mais mata pessoas da
comunidade LGBTQIA + do mundo7, mesmo com a determinação pelo Supremo Tribunal
Federal (STF), que estabelece como crimes a discriminação por orientação sexual e
identidade de gênero.8 Só na região nordeste, local onde se passa Arlindo, a chance de
uma pessoa da comunidade ser assassinada é três vezes maior que a da região sul, mesmo
com a densidade demográfica desta região sendo maior9.
Em Arlindo, o universo em que se passa a história está rodeado de figuras
LGBTfóbicas que utilizam diferentes tipos de preconceito e violência para diminuir, atingir,
repudiar e causar dano em indivíduos LGBTQIA +. Cafaggi (2020) aponta a importância do
conflito dentro da história porque é desta maneira que os leitores vão se identificar com o
personagem principal, dando força para eles superarem os seus desafios. Nesse caso, o
conflito do protagonista são justamente essas atitudes preconceituosas que o atingem,
fazendo-o crer que há problema em ser quem ele é. O conflito principal do protagonista
não é o processo de se descobrir como indivíduo LGBTQIA+, mas como as diversas
relações sociais dele irão reagir com essa informação, sejam essas relações familiares,
românticas ou de amizade.
Conforme a história se passa e conhecemos melhor os personagens, Arlindo passa
por um processo de evolução e amadurecimento ao notar, a partir de falas anteriores de
seus amigos e familiares, que não há nada de errado em se identificar como uma pessoa
LGBTQIA+. Este processo de evolução está presente não só em Arlindo, como também
nestes outros personagens que ele se relacionou, como cita Luíza de Souza, autora da
7
Fonte: Bohrer, L. (2022, 12 de maio). Brasil é o que mais mata pessoas LGBTQIA+ pelo quarto ano
consecutivo. Rede Brasil Atual. https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2022/05/brasil-e-o-pais-que-
mais-mata-pessoas-lgbtqia-no-mundo-pelo-quarto-ano-consecutivo/
8
Fonte: Coelho, G. (2019, 13 de junho). Supremo aprova equiparação de homofobia a crime de
racismo. Conjur. https://www.conjur.com.br/2019-jun-13/stf-reconhece-criminalizacao-homofobia-lei-
racismo
9
Fonte: Cardoso, P. (2021, 14 de setembro). Brasil é o país que mais mata pessoas da comunidade
LGBTQIA+ no mundo. Agências de notícias das favelas. https://www.anf.org.br/brasil-e-o-pais-que-mais-
mata-pessoas-da-comunidade-lgbtqia-no-mundo/
história: “Do mesmo jeito que ele recebe essa força das outras pessoas, as outras pessoas
recebem essa força dele, eu acho que é uma retroalimentação que acaba funcionando
muito bem na história” (Souza, 2021b).
Os amigos do protagonista também são LGBTQIA +, possuindo compreensão das
dificuldades que todos passam por fazerem parte da comunidade. Todos eles
apresentaram questões diferentes desse universo, trazendo mais representatividade
como, por exemplo, o controle parental abusivo e vigilância constante. Destaca-se o fato
de todos estarem no grupo dos “excluídos” no ambiente escolar, já que, devido aos
estereótipos relacionados à sexualidade deles, todos se tornam vítimas de bullying
escolar. As amizades conseguem manter os indivíduos mentalmente estáveis e, de acordo
com Borsa (2012), são a fonte de felicidade e de bem-estar subjetivo, já que dão suporte
social, divisão de experiências, interesses, sentimentos e emoções. É válido ressaltar que
todas as amizades se sentiram confortáveis em contar sobre suas verdadeiras orientações
sexuais para o personagem principal, demonstrando alto nível de confiança e amizade
com ele.
Por fim, a mãe do protagonista, “Dona Nalva”, é o exemplo de boa figura familiar,
impedindo a criação de um pior cenário para o seu filho (como o desenvolvimento de
depressão, ansiedade e etc.), representando um contraste se colocada em comparação
com “Seu Arlindo”, pai do personagem principal. De acordo com a autora da webcomic, a
personagem é a mais realista da história, por existir várias mulheres como ela, que vão
vivendo tanto em função de ser mãe, se afogando na sobrecarga do trabalho e de cuidar
dos outros que acabam esquecendo-se de se enxergar (Souza, 2021a). A partir do
momento que ela desconfia sobre a orientação sexual do filho, a progenitora tenta abrir
espaço para uma conversa com o protagonista, tentando confortá-lo e se colocando em
uma posição vulnerável, criticando a si mesma como mãe, para que o seu filho possa
confiar nela. A personagem também se dispõe a abandonar o conforto de sua casa para
defender o Arlindo, reforçando o exemplo positivo de figura na vida do garoto e,
consequentemente, se torna um exemplo de relacionamento saudável e confiável para os
leitores.
Na webcomic criada por Luíza de Souza, é possível identificar três principais tipos
diferentes desse preconceito, sendo estes a: homofobia internalizada, homofobia social e
a homofobia familiar. Através desses diferentes tipos, cada um com suas específicas
características, são representados distintos manifestos de violência, sendo a principais
formas encontradas do reprodutor desses discursos para atingir o indivíduo LGBTQIA + em
questão. Na obra, as principais categorias de violência identificadas foram: física, verbal e
psicológica.
O preconceito social, mais presente na narrativa, se dá pela aversão do afeto entre
indivíduos da comunidade LGBTQIA + em ambientes públicos e suas formas de expressão
social, além do medo do julgamento popular e o da descoberta de indivíduos presentes no
contexto familiar. A homofobia familiar se identifica como a categoria onde o preconceito
é realizado por um ou mais componentes do grupo familiar do indivíduo que recebe essa
ação, sendo bastante associada com a violência psicológica pelo fato da família ser um
ambiente de segurança e identificação, abrindo um leque de possibilidades para o
preconceito devido a proximidade entre os indivíduos. A homofobia internalizada seria o
preconceito do sujeito pertencente à comunidade LGBTQIA + a si mesmo, ocorrendo
devido à combinação dos padrões heteronormativos do corpo social e as múltiplas
violências distintas presentes no cotidiano da pessoa em questão.
Na figura 3, observa-se o percentual das violências e homofobias citadas
anteriormente na webcomic, desde citações de ocorrências até a prática destas. Já a figura
4, nota-se como estes preconceitos são perceptíveis desde pequenas ações e gestos dos
personagens a diálogos ditos por estes.
FIGURA 3 - PORCENTAGEM DE VIOLÊNCIAS E HOMOFOBIAS APRESENTADAS EM ARLINDO
USO DE HASHTAGS
O ano de 2020 foi o ápice de popularidade da webcomic, grande parte por causa
do isolamento social decorrente da pandemia do COVID-19, onde o uso da internet
aumentou entre 40% e 50%, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel)10, o que possibilitou que mais usuários encontrassem Arlindo. Outro fator que
10
Fonte: Lavado, T. (2020, 11 de junho). Com maior uso da internet durante pandemia, número de
reclamações aumenta; especialistas apontam problemas mais
auxiliou na popularidade da história foi o uso de hashtags, sendo estas “arlindo”,
“#arlindosoueu”, “#leiaarlindo”, “#arlindoperdeuobv”, “#cinearlinder” e “#arlindosona”,
cada uma com diferentes propostas, porém com o mesmo objetivo: divulgar a história
para mais leitores.
Na figura 5, é possível perceber o nível de interação contínua com essa ferramenta,
criando vínculos sociais entre os leitores ao mesmo tempo que tornava Arlindo um
assunto comentado frequentemente.
Com isso, o alcance foi expandido consideravelmente, permitindo que pessoas que
não conheciam a história poder apreciá-la, pois além da própria autora utilizar esse
recurso, os próprios leitores poderiam utilizá-lo para compartilhar a história. O uso de
múltiplas hashtags para diferentes tópicos relacionados a webcomic também auxiliou,
tendo em vista que os leitores não se confundiriam. Um exemplo disso foi a
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dessa pesquisa foi possível observar como a webcomic Arlindo é um
importante produto de representatividade com alcance ente o público jovem,
principalmente no ambiente digital. Agora, no século XXI, a representação LGBTQIA+ nas
mídias ainda é consideravelmente baixa e, espera-se a criação de novas narrativas
futuramente, trazendo figuras marcantes e positivas na vida de diversas pessoas.
O estudo de histórias em quadrinhos e, especialmente, webcomics abre espaço
para uma ampla área de conhecimento acadêmico e científico. Este texto, assim como
outros, abre espaço para a interpretação significativa da importância da combinação
imagética e textual para leitores brasileiros. O estudo específico em obras nacionais, como
Arlindo merece maior destaque, pois, evidencia-se grande foco em obras norte-
americanas.
A webcomic Arlindo traz mensagens de afirmação e representatividade positivas
até a sua última página, e a última frase “Tá tudo bem. E quando não tá é porque ainda vai
ficar” (Souza, 2021a, p. 183), é algo que se encaixa em múltiplas temáticas, porém o
significado sempre prevalece: esperança.
REFERÊNCIAS
Borsa, J. C. (2013). O papel da amizade ao longo do ciclo vital. Psico-USF, 18(1), 161–162.
https://www.scielo.br/j/pusf/a/zDD9DDxVP3CbSdXdZVnJTvF/?lang=pt
Cardoso, P. (2021, 14 de setembro). Brasil é o país que mais mata pessoas da comunidade
LGBTQIA+ no mundo. Agências de notícias das favelas. https://www.anf.org.br/brasil-
e-o-pais-que-mais-mata-pessoas-da-comunidade-lgbtqia-no-mundo/
Eisner, W. (1989). Quadrinhos e Arte Sequêncial. São Paulo: Livraria Martins Fontes
Editora Ltda.
Lavado, T. (2020, 11 de junho). Com maior uso da internet durante pandemia, número de
reclamações aumenta; especialistas apontam problemas mais
comuns. G1. https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2020/06/11/com-
maior-uso-da-internet-durante-pandemia-numero-de-reclamacoes-aumenta-
especialistas-apontam-problemas-mais-comuns.ghtml
Leite, R. [betoleite] (2021). TRUQUE - Aula 5 [Video TRUQUE - Aula 5]. Youtube.
https://www.youtube.com/watch?v=XtvxfLHeAJg
Pizarro, M. R. (2015). "Quem tem Medo do Escuro?” A criação da identidade visual para
personagens animados [TCC, Universidade de
Brasília]. https://bdm.unb.br/bitstream/10483/12184/1/2015_MarianaRezendePizarr
o.pdf