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RESUMO
Narrativas Empoderadas evidenciam o protagonismo de grupos sociais, e nos pôsteres do
filme "Barbie" (2023), essa abordagem aparece ao se ressaltar as capacidades femininas.
Incentivando o público a se associar a essa narrativa, o site "Barbie - Gerador de Selfies"
produz pôsteres do filme usando imagens dos usuários. Observando o compartilhamento
no Instagram das imagens geradas, analisamos como usuários produziram narrativas
empoderadas de si. No estudo relacionamos narrativa e redes sociais (MOTTA, 2013;
BUTLER, 2015; MARTINO, 2016; BASTOS, 2020). Constatamos no material coletado,
que os usuários se empoderam ao narrar sobre identidade e conquistas profissionais.
INTRODUÇÃO
Em 1959 a empresária Ruth Handler criou a emblemática personagem “Barbie”,
materializada primeiro como boneca, essa atravessou gerações contribuindo com noções
e imaginários sobre feminilidade. A Barbie, nas últimas décadas, por causa da sua
representação feminina e imagem iconográfica, tem sido alvo de críticas fervorosos sobre
ela promover padrões de beleza inalcançáveis e representações estereotipadas de gênero.
E por influência dessas críticas, diferentes transformações narrativas e comerciais foram
ocorrendo ao longo do tempo, de modo a reposiciona-la frente às mudanças sociais.
Partindo deste ponto, podemos apresentar de forma sucinta, estudos que buscaram
relacionar a Barbie e empoderamento feminino. Encontramos pesquisas como a de Mary
Rogers (1999), que nos chama a atenção ao examinar a influência cultural da boneca
Barbie, explorando seu impacto na sociedade a partir das várias formas de representar o
feminino. Janaine Rolim (2020) indica que em embalagens de brinquedos da Barbie há
frases empoderadoras sobre o feminino, ao demarcar que a Barbie poder ser líder, tomar
decisões e perseguir seus sonhos. Luz e Fraga (2020) debatem o impacto da boneca Barbie
ao longo de cerca de sessenta anos, explorando como a Barbie foi adaptada às
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Trabalho apresentado no GP30 Tecnologias e Culturas Digitais, evento do 46º Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação, realizado de 4 a 8 de setembro de 2023.
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Doutorando em Mídia e Cotidiano pelo PPGMC/UFF e Mestre em Ciências Sociais pelo PPGCS/UFCG.
E-mail: aeltonjuniormelo@gmail.com
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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação
46º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – PUCMinas – 2023
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Com este contexto, em nossa perspectiva o filme “Barbie” (2023), dirigido e escrito
por Greta Gerwig3, tem como plano de fundo a ideia de narrativas empoderadas sobre o
feminino. Neste filme, a narrativa da personagem é ambientada em um mundo habitado
por diferentes bonecas Barbies, ou melhor, este mundo é comandado por mulheres no
poder, pois, elas são as profissionais que sustentam essa suposta sociedade (em clara
referência as diversas bonecas). A narrativa do filme se desencadeia quando a
protagonista começa a questionar sua existência, e buscando respostas irá de encontro ao
mundo real (mundo dos humanos), lugar este que é apresentado diferente do seu,
comandado por homens. Além disso, o filme faz questionamentos sobre o patriarcado,
aborda pautas feministas, entre outros temas de gênero. Mas, nosso estudo não é sobre o
filme em si, mas sobre algumas estratégias on-line de divulgação deste longa-metragem.
Para promover o filme diversas estratégias de marketing foram adotadas,
principalmente em sites de redes sociais (SRS): Facebook, Instagram, Twitter, TikTok
etc. Mas, destacamos aqui a rede social Instagram, ambiência em que houve intenso
engajamento do público com a obra, ato que se deu pelo compartilhando de imagens,
vídeos dos trailers e relatos de lembranças com os brinquedos e com a personagem Barbie.
Bastos (2020) ressalta que um dos sentidos mais comuns atribuídos a noção de
engajamento é o de “[...] narrativas e práticas dominantes [...] como aprofundamento e
frequência das reações e interações entre instituições e usuários da internet, mediadas por
sites de redes sociais (SRS)” (BASTOS, 2020, p. 19). O autor critica, no entanto, o
equívoco epistemológico de circunscrever a noção de engajamento apenas ao ambiente
online, argumentando que esse uso esvazia o sentido político que o termo
verdadeiramente carrega. Contudo, mesmo reconhecendo o grau de importância de sua
problematização, optaremos por manter o termo "engajamento" no sentido de "[...]
alinhamento ideológico entre instituições (principalmente empresas), suas marcas e seus
públicos" (BASTOS, 2020, p. 196).
Um dos pontos altos da promoção do longa e que gerou engajamento on-line, se deu
com a divulgação, na internet, de pôsteres que apresentavam os personagens e atores do
filme. Nestes pôsteres, frases enfatizam, de modo empoderador, as profissões ou
conquistas de cada personagem mulher: "Esta Barbie é tudo”, "Esta Barbie tem um
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Greta é frequentemente associada a um olhar feminista em suas obras, que trazem à tona questões de
gênero e empoderamento feminino.
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prêmio Nobel", "Esta Barbie é presidente" etc. (imagem 01). Frente a isso, observa-se que
há nestas peças a ocorrência do que estamos chamando de “narrativas empoderadas”,
pois, o que está sendo comunicado é uma exaltação às capacidades femininas das
personagens, que por sua vez, se constrói como uma pré-narrativa, antecipando um pouco
da narrativa do filme.
Fonte: Instagram
Tendo por base os pôsteres oficiais, outra ação de divulgação foi lançada para gerar
ainda mais engajamento em SRS, que foi o site “Barbie - Gerador de Selfies”4. Neste, o
uso de inteligência artificial (IA) possibilita que o usuário entre no universo do filme.
Fazendo o upload de uma fotografia, a IA recorta a imagem do sujeito e o coloca no lugar
da Barbie no pôster, além de ser possível escrever uma frase sobre si, aliás, o próprio site
sugere frases que exaltam as qualidades do sujeito.
Ao ser lançado em abril de 2023, o “Barbie - Gerador de Selfies” virou trend 5 em SRS,
de modo que marcas, anônimos e famosos, de diferentes países, entraram na onda de
produzirem seus pôsteres, ou seja, se engajando com a proposta da campanha do filme.
Tal fenômeno ocorreu principalmente no Instagram, uma vez que o formato da imagem
gerada é ideal para se publicar no espaço dos Stories desta rede, mas, a imagem também
foi largamente publicada no feed dos usuários – em diversas utilidades, como finalidades
comerciais e pessoais.
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O “Barbie - Gerador de Selfies”, está disponível em: https://www.barbieselfie.ai/br Acesso em:
14/07/2023
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Trend, em português, significa tendência. No contexto do Instagram, trend refere-se a conteúdos gerados
pelos usuários e que se propagam rapidamente, se tornando ações virais na plataforma. Trends podem ser
desafios, danças, sons e outros tipos de conteúdo que acabam ganhando destaque nos algoritmos da
plataforma.
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NARRATIVAS EMPODERADAS
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O conceito está sendo construído em minha pesquisa de doutoramento no Programa de Pós-Graduação
em Mídia e Cotidiano da Universidade Federal Fluminense (UFF).
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É importante contextualizar que Motta (2013) parte de uma perspectiva menos linguística e mais cultural
ou antropológica sobre o estudo de narrativas, sua proposta de estudo de narrativas recai mais nos processos
e contextos da comunicação, e menos sobre a narrativa enquanto obra fechada.
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O conceito está sendo construído em minha pesquisa de doutoramento no Programa de Pós-Graduação
em Mídia e Cotidiano da Universidade Federal Fluminense (UFF).
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pôsteres do filme “Barbie” (2023). Na parte superior da imagem temos a frase “This
Barbie is artesã e empreendedora”. Interpretamos, assim, que inspirada pelas mensagens
dos pôsteres originais, ao utilizar o gerador de selfies, a usuária quis destacar suas
qualidades enquanto empresaria. Tal sentido também é reforçado na fotografia dela, na
qual ela posa apresentando um dos produtos do seu ateliê, uma bolsa cor-de-rosa.
Imagem 02: Publicação da empresária Sandra Kelli no perfil do “Pixaim – Ateliê Criativo”.
Fonte: Instagram9
Se associando à “Barbie”, na legenda da publicação, ela irá narrar mais sobre si, se
mostrando como uma figura forte e multifacetada, capaz de desempenhar várias funções
como biologia, artesã, empreendedora, esposa, mãe e dona de casa.
Seu texto também destaca o esforço diário de equilibrar todas as suas
responsabilidades cotidianas, através da expressão "matar um leão por dia". Tal expressão
pode transmitir a noção de coragem e determinação. Além disso, ela enfatiza a
importância do cuidado próprio e da autoestima para enfrentar as tarefas diárias.
Observa-se que no conteúdo desta publicação a usuária, Sandra Kelli, buscou narrar a
si de uma forma positiva, progressista, e até tencionando algumas construções sociais
sobre o feminino, apesar de também reforçar a ideia tradicional de mulher dona de casa.
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Publicação disponível em: https://www.instagram.com/p/CqylxdcAFb-
/?igshid=MmU2YjMzNjRlOQ%3D%3D Acesso em: 04 de agosto de 2023.
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Fonte: Instagram10
Na legenda, buscando não se vincular à Barbie, ela escreve que não se identifica com
os valores associados a personagem-boneca. Ela dirá que esta promove padrões de beleza
inatingíveis, além de incentivar o consumismo, algo longe de sua visão de mulher
independente. E com isso ela escreve: “Diferente do que a maioria tem afirmado, EU
NÃO SOU A BARBIE. Ao menos aquela Barbie que, até hoje, todas nós conhecemos”.
De algum modo, ela não parece reconhecer os esforços da Mattel em desmitificar a
noção estereotipada em volta da Barbie. Além disso, a usuária enfatiza suas qualidades
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Publicação disponível em:
https://www.instagram.com/p/Cq1NY3nOhcB/?igshid=MmU2YjMzNjRlOQ%3D%3D Acesso em: 04 de
agosto de 2023.
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Fonte: Instagram 11
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Publicação disponível em:
https://www.instagram.com/p/Cq3WW6NJ3SA/?igshid=MmU2YjMzNjRlOQ%3D%3D Acesso em: 04
de agosto de 2023.
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CONCLUSÃO
Ao desenvolver esta pesquisa, percebemos que estávamos produzindo um ensaio sobre
o que compreendemos como “narrativas empoderadas”. Nestas narrativas há
representações progressistas de grupos marginalizados, como mulheres, negros,
LGBTQIAP+, entre outros. Essas narrativas vão além dos estereótipos, oferecendo visões
que colocam esses sujeitos ou grupos em posições de poder e destaque na narrativa
contada. E isso é algo que, acreditamos, contribuir para o desenvolvimento de sensos de
empoderamento pessoal, bem como valorização de identidades diversas.
Com a noção de narrativas empoderadas, tivemos como foco a ideia de
empoderamento feminino. Para feministas, como Sardenberg (2006), o empoderamento
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das mulheres é o caminho para que estas conquistem autonomia, e talvez, se libertarem
de algumas opressões socais, por exemplo, opressões de gênero e patriarcais.
Iniciamos o estudo com a observação de que nos pôsteres de divulgação do filme
"Barbie" (2023), haviam frases que expressavam "narrativas empoderadas" sobre o
feminino. Mas, foi quando vimos as publicações virais de imagens dos pôsteres geradas
pelo “Barbie – Gerador de Selfies”, por usuários da rede social Instagram, nos
questionamos se nelas havia a presença de narrativas empoderadas de si – nestas
publicações os usuários se apresentam de modo a exaltar suas capacidades se associando
ou se distanciando da personagem-boneca Barbie.
Com base no que debatemos com Martino (2016), Butler (2015) e Motta (2013) a
narrativa é um ato humano que contribui para a formação de identidades, além disso, as
narrativas situam o sujeito enunciador em um contexto social. E ao analisar três
publicações de mulheres no Instagram, notamos que elas se apresentaram em narrativas
de maneiras diversas, exaltando diferentes qualidades de si mesmas, expondo como elas
querem ser lidas e, de forma transversal, revelando um pouco sob quais circunstancias
ideologias elas enunciam.
Logo, ao narrar a si nas publicações, as usuárias deixaram rastros digitais sobre quem
são, ou melhor, sobre como querem serem lidas por outros (seus seguidores). Nesse
contexto, ao narrarem a si, elas encontram na ambiência do Instagram um espaço para
expressão, valorização de suas conquistas e defesa de suas identidades. Evidenciando
diferentes expressões de empoderamento feminino, vimos que algumas mulheres se
apropriaram da figura da Barbie para destacar suas qualidades, enquanto outras rejeitaram
essa associação, questionando os estereótipos de beleza e consumo associados à
personagem-boneca. E essas escolhas discursivas, demonstram que não houve um
engajamento total de concordância com a estratégia da campanha do filme "Barbie"
(2023), uma vez que houve discordâncias e questionamentos sobre a representação da
personagem-boneca.
Ao refletirmos sobre as publicações e a apropriação da figura da Barbie, surge um
questionamento crítico: até que ponto a imagem da Barbie, que historicamente promoveu
padrões inalcançáveis de beleza e consumo, pode ser realmente transformadora e
empoderadora para as mulheres, considerando a necessidade de valorizar a diversidade e
desconstruir estereótipos de gênero?
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REFERENCIAS:
BUTLER, Judith. Relatar a si mesmo - Crítica da violência ética. Autêntica, São Paulo,
SP, 2015.
DAHER, Mariana de Alcantara Calil. Now can we stop talking about my body?:
discurso publicitário e o processo de (re)construção identitária da boneca Barbie. 2017.
Dissertação (Letras) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo.
LUZ, Annelena Silva da. FRAGA, Larissa Caldeira de. Os Comerciais da Barbie e a
Formação do Imaginário da Mulher. Revista Temática, v. 16 n. 2, Fevereiro, João
Pessoa - PB, 2020.
MARTINO, Luis Mauro Sa. A potência da alteridade nas mídias digitais: uma
perspectiva de identidade e diferença. Lumina, v. 10, n. 2, 2016.
MOTTA, Luiz Gonzaga. Análise crítica da narrativa. Brasília: Editora UnB, 2013.
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