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A sorte da

Amazônia, seus
povos e seus rios
voadores

Documento de conjuntura de propostas de


resoluções da Emancipação Ecossocialista para a
Conferência da Amazônia em Belém, 2023
A sorte da Amazônia, seus povos e seus rios voadores*

* Análise de conjuntura e proposta de resoluções da Emancipação Ecossocialista


para a Conferência da Amazônia organizada pelo Partido Socialismo e Liberdade
(PSOL) em Belém, em maio de 2023.

O Psol decidiu realizar uma Conferência tratando da Amazônia. É um


desafio grandioso. A Amazônia condiciona a qualidade de vida de todo o
Planeta, guardando o enigma da possibilidade de existência da espécie
humana. E da qualidade de vida de todo o Planeta.
A Conferência da Amazônia, portanto, é uma oportunidade para
firmar a seriedade e a grandeza da nossa luta contra o que nos ameaça a
todas/os/es, especialmente “explorados e oprimidos”, e avançarmos nas
possibilidades de construção de outro projeto, para além do sistema
dominante. De adotarmos as medidas já emergenciais, e fortalecer o
projeto capaz de enfrentar as contradições políticas de nossa era. Este
projeto é o Ecossocialismo. Sem ele, o que está colocado hoje, a
destruição da Amazônia, será uma amostra da ameaça à qualidade de vida
do Planeta.
A Conferência precisa traçar estratégias para a luta frente à
intensidade que assume a disputa geopolítica mundial contida nos
projetos imperialistas. Impregnar essas estratégias do sentido de urgência
que esta crise nos coloca e ajudar na construção das alternativas
ecológicas, balizar nossas ações táticas, dar nitidez ao conceito da
ideologia Ecossocialista, quem são nossos possíveis aliados e se estamos
efetivamente lutando por outra dinâmica geopolítica com outros
pressupostos e compromisso ecológico.
As classes dominantes buscam enfrentar a crise do sistema
intensificando a exploração do ambiente natural e do trabalho. E, ao
seguir este curso, aproximam o Planeta do que as análises do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas - órgão das Nações Unidas
para o clima (IPCC), informam como limite: Ou muda o modo de produzir,
e suas consequências, ou, entre muitas espécies, a humanidade também
poderá desaparecer.

O tesouro e as nossas responsabilidades

O ciclo amazônico foi constituído na relação de milhões de anos num


metabolismo biológico, geológico, hídrico e ambiental. As culturas
humanas que se desenvolveram o fizeram integradas àquele ambiente
natural, num ciclo de influência planetário.
É considerada a região de maior biodiversidade, um conjunto de
ecossistemas, com a maior floresta e a maior bacia hidrográfica do
Mundo. A fauna com mais de 30 milhões de espécies, a flora bastante
composta em mosaico com os agrossistemas construídos ao longo de
milênios pelas populações humanas.
Além do Brasil, está também na Bolívia, Colômbia, Equador, Guianas,
Peru, Suriname e Venezuela. Nos últimos 50 foi devorada em cerca de
17% de seu bioma.
A Amazônia impulsiona vento e água por todo o Planeta. A floresta,
ao transpirar água, cria as chuvas de que ela e diversas regiões
necessitam. Os ciclos da água no Brasil dependem da Amazônia,
fenômeno em desequilíbrio causado pelas políticas de exploração
econômica da floresta, afetando os “Rios Voadores” (1), prejudicando os
ciclos de chuvas em toda região do chamado “Quadrilátero da Sorte”2.

Quadrilátero da Sorte

Passando por cima da Amazônia, os ventos do Atlântico carregam a


umidade suspensa no ar em forma de vapor para o oeste do continente,
até bater nos mais de 6.000 metros de altura da Cordilheira do Andes. Ali,
assume a direção sudeste e acelera a velocidade parecendo um rio
atmosférico que provoca os ciclos de chuvas no centro sul do Brasil.
Isto ocorre na altura da longitude 30º, onde também se situam os
desertos do Namibe, no sudoeste da África; o do Kalahari, no sul da África;
o deserto do Outback, na Austrália; e, a oeste do Andes, o deserto do
Atacama, onde não chove por dezenas de anos.
Os fluxos carregados de vapores de água formados ao leste da
Cordilheira dos Andes dão origem ao “quadrilátero da sorte”, uma região
da América do Sul que se estende de Cuiabá, ao norte, até Buenos Aires,
ao Sul, e São Paulo, a leste, e os Andes, a Oeste. No centro desta área há
as cataratas do Iguaçu.
É neste Quadrilátero (2), onde vive a maior densidade populacional
da América do Sul, que é produzida 70% da riqueza sul-americana.
Por que não é um deserto? Um processo climático designada Célula
de Hadley (3), também chamada de Célula Tropical, faz o ar circular em
direção à Linha do Equador em baixas altitudes e retorna para a direção
dos trópicos em elevadas altitudes, com o domínio de ventos alísios e
contra-alísios. Por isto, os desertos estão nesta região, menos no
Quadrilátero da Sorte. Ali, há abundância de água produzida pela
Floresta, com sua bacia hidrológica e seus afluentes que, somadas às suas
características físicas e ambientais explicam, este dinamismo.
Um registro a ser configurado cientificamente é a relação entre este
Quadrilátero, banhado pelos Rios Voadores, e os Aquíferos existentes,
entre eles, o de maior reserva de água doce do Planeta, o Guarani.

A importância Amazônica

A Amazônia desde a chegada dos europeus ao continente americano


faz parte dos interesses políticos dos projetos coloniais.
Ao longo dos tempos, a Amazônia revelou riquezas a serem
exploradas, colaborando, em épocas diferentes, para o desenvolvimento
dos projetos de colonização e de industrialização que estruturaram o
sistema capitalista no Brasil.
Com o processo incessante e descontrolado da produção capitalista,
as reservas florestais assumiram papel fundamental na preservação da
qualidade de vida no Mundo. E, sendo a Amazônia, a maior floresta
tropical do Planeta, ela significa um tesouro de grande valor econômico,
biológico e militar. Das questões relevantes do regime internacional de
mudanças climáticas, como o uso da energia, o aquecimento global e a
eficiência energética, inter-relacionando economia, meio ambiente e
política internacional, nos marcos da Convenção Quadro das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas, assinada em 1994, a fim de alcançar
certo grau de ordem, previsibilidade e cooperação no campo das
mudanças climáticas, a Amazônia tem papel cada vez mais decisivo e
contraditório, com as pretensões dos projetos políticos e econômicos
voltados para apropriarem-se de sua riqueza, seja destruindo-a, seja a
mantendo de pé.
Nestes tempos de acirramento da disputa geopolítica global, com a
crise estrutural do domínio (imperialismo) estadunidense, em conflito com
a expansão da alternativa chinesa/russa, a disputa da Amazônia é também
a luta entre as possibilidades da preservação ambiental do Continente e
do Mundo. Mas as medidas de preservação até o momento apresentadas
não mostraram a capacidade para enfrentar a estrutura econômica
internacional que está ligada ao desmatamento e à degradação da maior
floresta tropical do planeta.
A exploração econômica da Amazônia opera por meio da
criminalidade organizada, dentro e fora do Estado brasileiro, fazendo
parte desta funcionalidade a não definição de políticas reais de proteção,
ampliadas pela falta de dados para a compreensão sistemática do
fenômeno.
Sem estes dados, a devastação continua, sob a normalização da
impossibilidade de se tomar medidas para apoiar uma resposta
interinstitucional estratégica e eficiente ao problema, tanto nacional como
regionalmente.
Os governos de maneira geral foram cúmplices desta situação. As
atividades econômicas ilícitas como a extração ilegal de madeira,
mineração ilegal, grilagem de terras públicas e agropecuária com passivo
ambiental, sobretudo de desmatamento ilegal, se mantiveram, tendo
havido incentivo aberto no governo Bolsonaro. E, neste início do governo
Lula, entraram numa corrida desenfreada de tirar o que for possível, mas
também de mostrar força frente ao novo governo.

A maior ameaça ecológica é política


Os sistemas e regimes políticos dominantes não alteram sua cultura
de uso dos elementos da natureza de forma intensiva e predatória sem
um choque social e revolucionário.
Esta situação está explícita no descumprimento registrado pelos
organismos internacionais. As cimeiras realizadas, tendo como marco, a
Conferência do Clima em 1992, no Rio de Janeiro, e os acordos firmados
nas diversas COPs, por exemplo, não são cumpridas. Nenhuma meta
estabelecida foi respeitada. Os cuidados com os elementos da qualidade
de vida do Planeta simplesmente ignorados.
Os mesmos setores que seguem intensificando a exploração
oferecem o ecocapitalismo como alternativa política, divulgando a falsa
possibilidade de se realizar uma economia verde capitalista. Não é por
acaso que algumas frações do capital, que investem na chamada transição
energética, trabalham ativamente para garantir o monopólio da extração
dos novos metais necessários à saída dos fósseis: lítio, grafeno, nióbio,
molibdênio e tantas outras substâncias.
A degradação ambiental faz parte desta cadeia econômica
internacional na perspectiva dos combustíveis fósseis, e continuará a ser
uma realidade mesmo que se concretize a tão propalada transição.
Alguns setores, percebendo os limites de suas ações, propõem
políticas compensatórias e protecionistas, mas também se beneficiam dos
que financiam diretamente o modo predatório de exploração da natureza
e do trabalho.
As opções políticas para superarmos a atual situação de ampliação da
degradação ambiental, portanto, precisam apontar para a superação do
sistema capitalista. Saber delimitar o que é isto, as medidas para superar a
cultura do consumismo e do desperdício, da diferença de classe, de
gênero, raça e sexo, carecem de precisão estratégica e programática.

A escala decrescente

No cenário geral de degradação planetário, o modo de vida


hegemônico torna tudo mercadoria. Diversos elementos estão se
aproximando do esgotamento e saturação. Transformados em meios de
extração e apropriação de mais valia, e/ou em mecanismos para
valorização de seus ativos financeiros, o sistema esgota os recursos
naturais, seja na exploração da terra, pelo que se transformou em
monocultura extensiva, através da mineração (predatória de todos os
metais), o uso da energia do carvão e do petróleo e no controle do que
ainda é água potável. Nenhum destes recursos é renovável.
O uso da energia baseada no carvão, no petróleo e queima das
reservas florestais, tendo como referência o início da revolução industrial,
já aumentou a temperatura em 1,1°C. E esta queima é a responsável pelos
eventos climáticos extremos que estão ocorrendo com frequência
crescente em todo planeta. Para evitar que estas mudanças climáticas
reduzam, e continue piorando, o IPCC estabeleceu compromissos de que o
aumento da temperatura deve ser revertida e não ultrapassar os 1,5ºC até
o final do século XXI (4).
Entretanto, a luta política está dominada pela perspectiva capitalista,
orientada pelos valores que aprofundam a degradação do trabalho, do
clima e são a causa da piora da situação social e ambiental mundial, com
aumento da fome, da miséria, da seca e sede, do nível dos oceanos, do
envenenamento das águas, atingindo principalmente os mais pobres.

Resistir

Os grupos sociais que vivem da interação com a floresta, e opõem


resistência ativa às contínuas e renovadas ofensivas do capital, registram
índices alarmantes de vítimas.
Neste momento, no Brasil, todos os biomas, com suas comunidades e
povos, suas cidades e áreas tradicionais, com culturas e natureza diversas,
se encontram sob a mesma ameaça. Junto ao Cerrado, o avanço do
agronegócio atinge uma amplitude que restringe, inclusive, a
complexidade econômica, mantendo suas populações em relação de
profunda dependência. Naquele bioma encontram-se os maiores
reservatórios de água doce. Nele também a monocultura da soja avança
sobre os territórios indígenas, gerando conflitos no interior de suas
culturas. No Rio Grande do Sul, único estado em que o bioma Pampa
acontece no Brasil, já há diagnósticos que indicam para um ponto de não
retorno de sua degradação. Em que pese a interdependência entre eles,
destaca-se a dependência de todos com relação à Amazônia. Em todos
eles a resistência popular busca criar formas de constituir autonomia.
Neste cenário geral, os dados do IPCC mostram que o modo de
produção e acumulação de valor se faz com a transformação desenfreada
da natureza, não havendo freio possível. E, o registro desta hegemonia da
cultura liberal, sob o neoliberalismo, é o conjunto de eco regiões e biomas
brasileiros estar todo ferido e fragmentado.

Cenário de luta

É neste cenário geral, de importância incalculável para a disputa


política planetária em curso, que definiremos nossas propostas para a
Amazônia e a Vida no Planeta, a partir desta Conferência.
O estágio da luta nos mostra que não conseguiremos superar esta
situação política apenas com medidas ecológicas corretivas do sistema
capitalista. Neste momento, os grandes grupos econômicos petrolíferos,
ao mesmo tempo que avançam na proposta de continuidade de
exploração petrolífera, inclusive na foz do rio Amazonas, investem na
divulgação de políticas de energia limpa e verde para o mundo.
O que tem se apresentado como transição energética, é apenas a
exploração da natureza e do trabalho capitalista, vestida de verde e
humanista. Por isto, e devido sua importância, a Amazônia, como o resto
do planeta, exige que o projeto de transição seja desde já radical na
superação da exploração do meio ambiente e da vida pelo capitalismo.

A Conferência e os projetos políticos

É neste estágio de desenvolvimento do capitalismo que se insere a


luta que precisamos desenvolver no processo da construção de um
projeto em busca do equilíbrio climático e proteção social mundial da
Amazônia. Mas que também seja o resgate do ideário das possibilidades
humanas de tomar a história em suas mãos.
O setor mais liberal do capitalismo sempre mantém como “carta na
manga” a ameaça geral de aderir às políticas neofascistas caso se
mantenha o fracasso econômico de sustentar suas propostas de poder
incorporando as massas de explorados.
Esta alternativa tem ganhado força e sido praticada no Brasil no
último governo, os neoliberais foram cúmplices dos agentes econômicos
nacionais e estrangeiros, dispostos a derramar mercúrio nos rios, revirar a
terra em busca do último pedaço de mineral raro, arrancar até a última
árvore valiosa, destruir a floresta à fogo para abrir espaços para as
monoculturas e a pecuária.
O neofascismo aplicou e justificou sua proposta de
“desenvolvimento” para poucos, e degradação ambiental para muitos.
Fome, seca, doenças e morte principalmente para os povos das florestas.
Não tiveram dúvida entre proteger os ciclos de reprodução biológica ou
construção de hidrelétricas, entre investir para superar as dificuldades de
sobrevivência material ou entregar estes povos para as organizações
econômicas da bandidagem nacional e internacional.
Se vamos ser a favor ou contra – e tomar medidas correspondentes –
renovar a licença de Belo Monte, não é apenas uma questão de impacto
econômico, mas uma decisão que afeta as possibilidades de mudanças
naquela forma de produzir energia, para quem, para quê, decisão que
também é moral e ética.
Na disputa de poder intraclasse, e de classe, as posições
ecocapitalistas e derivativas, formulam propostas
neodesenvolvimentistas, para fazer a disputa das consciências dos povos,
enquanto o neofascismo assume seus propósitos de máxima e urgente
submissão do conjunto da vida à necessidade de super lucros.

A possibilidade do futuro comum dos povos

O Brasil e a defesa da Amazônia se encontram no centro desta


disputa, de profundas repercussões geopolíticas. A começar pela
possibilidade de resgate das experiências de construção de um futuro
comum dos povos que vivem na América Latina, no caso da Amazônia, em
especial, América do Sul. A importância da floresta, já indicada acima, se
sobressai quando tomamos em consideração a imensa diversidade de
povos, portanto, de cosmovisões, que ela abriga. Vê-la como um todo
articulado, para além das fronteiras políticas, ainda que as respeitassem,
exige novas abordagens das relações internacionais e um novo
internacionalismo, capaz de nos irmanar na busca de um horizonte
comum. Passa por apostar na aproximação com os setores mais
radicalizados na resistência na região, superando os limites impostos pelos
interesses institucionais daqueles grupos políticos que se distanciam das
bases populares.
O nosso compromisso, portanto, tem a dimensão do projeto de
proteção do Planeta e toda sua natureza, que só pode ser preservada se
estiver orientada para reequilibrar a vida em sua dimensão planetária.

Os conflitos de projetos

Por estas características estruturais para o funcionamento da vida no


Planeta, os projetos políticos em disputa se relacionam diretamente com a
Amazônia.
Os projetos em conflito se fortaleceram em contradição com a
necessidade de existência do equilíbrio ambiental. Não estiveram, no
período do socialismo real, ou do capitalismo liberal, comprometidos com
a preservação ambiental. Clima, ambiente, vida foram transformados em
mercadoria.
A crise capitalista não oferece espaço para políticas mitigatórias.
Qualquer resposta que limite seu processo produtivo, nos diversos setores
econômicos, vai se chocar com seus interesses econômicos e políticos.
Parte significativa das medidas que tomarmos na Conferência
tendem a ser defensivas, no sentido do necessário acúmulo de forças
ideológicas e organizativas, para alcançarmos outra situação geral. E,
mesmo propostas mitigatórias, ainda dentro do sistema, serão combatidas
porque a crise mais geral do sistema empurrou as contradições para o
limite das possibilidades, levando à ampliação dos confrontos e guerras
entre nações, e os conflitos sociais para confrontos radicais. E faz parte
desta contradição, o capitalismo não conseguir viver sem ultrapassar os
limites de preservação do meio ambiente e dos direitos humanos mais
básicos.
Quaisquer medidas que adotarmos para conter e reverter a
destruição amazônica, respeitando seus povos e toda sua cultura milenar,
terá que enfrentar o neoliberalismo sem fortalecer o neofascismo,
fortalecendo o projeto que organize o povo em outro projeto, o
Ecossocialista.
Mas estas políticas para a defesa do meio ambiente, da Amazônia,
não podem perder de vista a superação do sistema, a radicalidade
necessária para superar a gravidade da situação que já estamos.
As possibilidades de conflito com o governo federal eleito em 2022
são flagrantes, negociando ou rompendo, não há alternativa.

O que precisamos enfrentar agora

Como há a fragmentação ideológica e de caracterização de projetos


políticos, neste momento, o mais importante é adotarmos políticas que
signifiquem os objetivos de reverter o atual quadro de destruição da
floresta e sua bacia hidrográfica.
O MapBiomas (Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do
Observatório do Clima), aponta que as principais causas do desequilíbrio
do sistema amazônico é a sua ocupação desenfreada pela produção
agrícola, pecuária e mineraria.
Por sua vez, políticas fiscais como as que incidem sobre a Zona Franca
de Manaus, têm representado perdas em termos de arrecadação
econômica para o país e, principalmente, o fortalecimento de
transnacionais cujas práticas são hiperpredatórias do ambiente natural,
como AMBEV e Coca-Cola. Somando-se o contínuo investimento em
mineração, latifúndios de monocultivos e a lógica que impera sobre a
Zona Franca, fica explícito que o vetor de desenvolvimento aplicado à
região foi da extração com concentração de ganhos, sem compromisso
com uma perspectiva de sustentação no longo prazo. Tal quadro exige
atenção para as necessidades concretas das populações urbanizadas da
região, com relação a qualquer proposta de transição que venha ser
construída (sempre e necessariamente com seu engajamento).
Este processo faz parte dos interesses geopolíticos dos projetos em
disputa no Planeta. Devemos pressionar o governo federal para adotar
posição de autonomia e independência, assumindo a responsabilidade
pela preservação da Floresta de forma explícita, ampla e firme.
Diante da urgência das lutas e dos cenários aqui colocados, a nossa
militância leva à Conferência da Amazônia e ao partido as seguintes
resoluções:

1. Propor e defender junto aos governos federal e estaduais da região o


desenvolvimento conjunto de programa que vise fortalecer a estrutura de
fiscalização, preparando e custeando as populações para o controle das
regiões onde estão localizadas;
2. No mesmo sentido, propor a constituição programa de capacitação e
custeio de brigadas populares emergenciais para fiscalização do
desmatamento, grilagem, mineração e queimadas, com as devidas
medidas de apoio tecnológico, com acompanhamento e proteção para as
mesmas;
3. Com vistas a re-ocupar rapidamente as áreas de onde sejam retirados
os garimpos e madeireiros clandestinos, associar a proteção ambiental ao
desenvolvimento de atividades econômicas, contribuindo assim para a
criação de medidas de fortalecimento e proteção das comunidades locais;
4. Defender a criação de estrutura de controle social interestadual, de
caráter deliberativo, sobre políticas federais cujos impactos interfiram na
capacidade da floresta se reproduzir no curto, médio e longo prazos,
assim como, sobre povos que tenham suas formas de sociabilidade
ameaçadas por tais políticas.
5. Que os acordos climáticos e socioambientais em vigor e as metas neles
estabelecidas entre governos e/ou empresas nacionais ou estrangeiras,
sejam respeitados nos marcos dos compromissos assumidos no âmbito
dos fóruns internacionais.
6. Sejam buscados ativamente acordos focados nas relações com os
países, nações e povos abrangidos pela Amazônia, cuja ênfase seja na
aplicação de medidas para a sustentabilidade social e do clima, superando
a atual dinâmica de exploração econômica hoje dominante na região.
7. Exigir que os governos dos países que vêm incidindo em alguma medida
sob o Fundo Amazônia, especialmente da Europa e os Estados Unidos,
realizem ações de combate a biopirataria e à pirataria de madeiras e
minérios da financiada por grupos econômicos de e em seus países.
8. Desvincular as políticas de proteção em segurança, saúde, educação e
ajuda econômica às populações da região da floresta, da dependência de
Fundos ou financiamentos estrangeiros. Não no sentido de recusar ajuda
econômica ou científica, mas submetendo-a a diretrizes políticas de um
país soberano, defendendo o fortalecimento das nações e povos da
floresta e da soberania dos povos da região amazônica, e de um Planeta
ecologicamente equilibrado.
9. Exigir transparência sobre os acordos que estão sendo negociados,
especialmente os que estão em andamento com a União Europeia, BRICS
e em separado com os Estados Unidos ou a China.
10. Reformular a estruturação do modelo atual de produção agrícola, com
direção a um programa de transição de saída de dependência das
commodities, no atual contexto das relações econômicas com a China,
EUA e União Européia, fazendo com que tais relações avancem no sentido
de que o Brasil seja beneficiado com a incorporação de inovações
tecnológicas em favor da preservação da Floresta.
11. Criar estrutura política e social voltada para combater a articulação
econômica internacional de grupos empresariais e financeiros que
formam estrutura ilegal de exploração dos recursos naturais e sociais da
região Amazônica de forma criminosa, utilizando diversos meios,
fronteiras, com apoio de grupos políticos e financeiros nacionais e
internacionais.
12. exigir que as forças de segurança e militares do Brasil proteja as
fronteiras do país e da região, e combatam o tráfico humano, minerário,
madeireiro e de fauna.
13. Alterar a estrutura da produção mineral no Brasil, propondo a
reversão das legislações e regramentos que beneficiam a exportação de
minério bruto mediante isenção fiscal; tornando a Agência Nacional de
Mineração uma fiscalizadora da mineração (inclusive requerimentos
minerais) em áreas legalmente protegidas (Terras Indígenas, Unidades de
Conservação, Reservas legais, etc); responsabilizando, por meio da
participação popular, as multinacionais (Vale, Hydro e outras) pelos danos
causados pela mineração de larga escala, sobretudo no Pará e Minas
Gerais; reivindicando a aplicação rígida das diretrizes do Plano Nacional de
Mineração 2030.

14. Na luta contra os megaempreendimentos, sobretudo os de energia


hidráulica, questionar o direcionamento da energia produzida (Energia
para quem e para o que?); estabelecer comissões de memória e reparação
histórica dos atingidos-as por barragens (ex: Itaipú, Tucuruí, Belo Monte,
Lageado, Manso, Sinop e tantas outras) que promova a reparação material
e imaterial das populações atingidas, com profunda discussão sobre a
ocupação de terras em torno de reservatórios; para os empreendimentos
ainda não construídos, revisar e atualizar os levantamentos de inventário
de energia da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), excluindo
empreendimentos que afetem Povos e Comunidades Tradicionais, Povos
Indígenas e agricultura familiar; distribuir os ganhos pela produção de
energia entre as comunidades urbanas e rurais por critério de impacto das
populações e comunidades, lutando pela retomada da Eletrobrás.

15. Adotar uma política de moratória do desmatamento legal e ilegal,


responsabilizando criminalmente os degradadores de vegetações nativas
em extensões superiores à 100ha; descapitalizando os degradadores por
meio da destruição e desmobilização de maquinário de dano ambiental;
expropriando propriedades rurais que realizaram desmates acima de
100ha e não cumpriram compensações e fortalecendo a política
atualmente contida no código florestal, criando uma comissão nacional e
popular que desmobilize os regramentos estaduais que enfraquecem o
código florestal, SNUC e outras legislações ambientais vitais;

16. Construir diálogos nos espaços institucionais, e nos espaços em que


está presente, pela implementação de um amplo debate por um novo
modelo de educação. Que transforme cultural e filosoficamente a forma
de atuar e pensar de trabalhadores e trabalhadoras. Valorizando a
organização e atuação social coletiva e não individual, e uma economia de
cuidado com o ser, e com a natureza, em contraponto ao individualismo e
competição, estimulados pela cultura liberal. Partindo do princípio de uma
educação ambiental que não seja focada apenas em mudanças
individuais, mas estruturais, para garantir a permanência humana no
planeta.

17. Combater, em âmbito institucional, e no dia-a-dia, a cultura e a


educação neofascista, que radicaliza a visão cultural liberal e, para além
de usar o ambiente natural como mercadoria, propaga como ideologia a
noção de irrelevância do ambiente e da vida de outros seres e das
populações que vivem da e na Floresta. E ainda usa a “meritocracia”
liberal, como bandeira para sua filosofia de vida e de sociedade.

18. Lutar pela implementação de programa de expansão do ensino em


toda região norte e nos estados da Amazônia legal, investindo em
pesquisa e inovação, garantia da criação de novas universidades, centros
de pesquisa, escolas e escolas técnicas. Incluindo estruturas para os locais
mais afastados, mas também nas grandes cidades como Belém, Manaus e
Altamira. Esse programa deve passar pela educação básica e fundamental
e e passar principalmente por formação e pesquisas que visem
desenvolver estudos para a diversidade ecológica e biológica da floresta,
sistemas de sócio economia diversificado e de policultura, e formação em
técnicos em agroecologia, permacultura e todas formas ecológicas de
pensar a sociedade, valorizando a ancestralidades, e as relações de
produção e convívio mais harmoniosas com o ecossistema.

EECOS - Emancipação Ecossocialista. Ecossocialismo ou Extinção!

Maio de 2023
Observações e notas

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1 – Rios Voadores são nuvens trazidas pelos ventos que passam sobre a
Amazônia e, ao se chocarem com o lado oeste dos Andes, ganham
velocidade e se espalham pelo “Quadrilátero da Sorte”.

2 – “Quadrilátero da Sorte” - Região da América latina, que vai de Cuiabá


ao sul por Buenos Aires, ao leste por São Paulo e ao oeste pelos Andes.
Onde vive a maior densidade populacional da América do Sul e é
produzida 70% da riqueza sul-americana. Água que abastecem nossas
torneiras, chuveiros, piscinas, riachos, sangas. E precisa de proteção.

3 - Célula de Hadley ou célula Tropical ocorre nas zonas de latitudes


baixas, ou seja, nas regiões localizadas predominante nas latitudes
equatoriais e tropicais intimamente relacionada aos ventos alísios, às
zonas tropicais úmidas, desertos subtropicais e correntes de jato

4 - Mas estima-se que as atividades humanas tenham causado cerca de


1,0°C de aquecimento global5 acima dos níveis pré-industriais, com uma
variação provável de 0,8°C a 1,2°C. É provável que o aquecimento global
atinja 1,5°C entre 2030 e 2052, caso continue a aumentar no ritmo atual.

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