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pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida
2015
para além da unidade habitacional:
pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha] casa e da [minha] vida
Equipe:
Coordenação Geral: Luciana da Silva Andrade
Supervisão de Bolsistas:
Juliana Demartini e Rogério Cruz Oliveira
Bolsistas:
Ana Freitas; Ana Luiza Brandão; Guilherme Teixeira; Isadora Tenório; Isabela Rapizzo; Isabela
Couto; Isabelle Baroni; Lucas Pacobahyba; Marcelo Borges; Mayara Frazão; StéfanySilva; Victor
HuggoFernandes
Pesquisadores:
Daniella Burle, João Paulo Huguenin, Juliana Demartini, Marcela Abla, Rogério Cruz, Vyrna
Jacomo
Colaboradores:
André Orioli, Rafael Veríssimo, Juliana Canedo, Jacira Saavedra, Marat Troina
Consultores:
Maria Laís P. da Silva – sociologia, Eliana Bessa – sociologia, Lilian Fessler Vaz – espaços
culturais, Maria Paula Albernaz – projeto urbano, Rachel Coutinho – urbanismo, Paulo F.
Rodrigues – estrutura, Ana Lucia Britto - meio ambiente
Moradores:
Leandro, Paula,Cristina, Emília, Roseane, Walter, crianças que participaram da oficina de
maquetes e todos os outros que nos concederam entrevistas e responderam os questionários.
2
SUMÁRIO
Lista de imagens: figuras, tabelas e gráficos 4
Apresentação 6
PARTE PRINCIPAL 10
1. Preâmbulos 11
2. Análises 13
2.1. Política Habitacional e produção da metrópole 17
2.1.1. Desenho 20
2.2. Método: parte 1 22
2.3. Para [a crítica a] o projeto 23
2.3.1. Implantação: cidade aberta X condomínio 24
2.3.2. Impactos no cotidiano 33
PARTE PARALELA 74
1. Operacionalização da Pesquisa 75
2. Notas Metodológicas 85
3. Assessoria Técnica no Brasil: uma Cronologia Tentativa 93
Bibliografia 98
3
Lista de Figuras: Imagens, Tabelas e Gráficos
PARTE PRINCIPAL
Figura 01:Empreendimentos MCMV na Estrada dos Palmares.
Figura 02: Municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Marcados em
preto os quatro municípios objeto de aplicação de questionários pelo IPPUR e
PROURB. Mapa da Fundação CEPERJ.
Figura 03: Diferença entre características do desenho urbano de conjuntos
habitacionais de diferentes épocas, no município do Rio de Janeiro: a. Conjunto
Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho (1946) - Departamento de
Habitação Popular/DF; b. Conjunto Residencial Carmela Dutra (1947) - Fundação da
Casa Popular/campus de experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe,
c. Conjunto Residencial Operário de Realengo (1938) - Instituto de Aposentadoria e
Pensões dos Industriários/IAPI, conhecido como Moscouzinho; d. IAPI Bangu (1949)
(parte inferior da imagem) e Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara (1971)– BNH
(parte superior da imagem); e. Empreendimentos do PMCMV em Santa Cruz (2011).
Figura 04: Um exemplo do padrão urbanístico da periferia fluminense.No canto
superior esquerdo, um empreendimento do PMCMV que fragmenta
significativamente o tecido urbano.
Figura 05: Detalhe do padrão de loteamento ilustrado na figura anterior, com
destaque para a conexão entre os lotes e a rua.
Figura 06: Sequência analítica do padrão MCMV a partir dos quatro casos estudados
- a. Queimados; b. Belford Roxo; c. Triagem; d. Santa Cruz. Fonte: Ilustração da
apresentação do CiHabE realizada na reunião da RPCM em abril de 2014.
Figura 07: Conjunto habitacional localizado no bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste
do Rio de Janeiro. A implantação "em pente" permite o diálogo do edifício com a
rua e não há espaços residuais entre os blocos.
Figura 08: Complexo de condomínios do MCMV em Santa Cruz. A implantação não
dialoga com o entorno e cria vários espaços residuais.
Figura 09: Reconfiguração da implantação dos blocos desenvolvida sobre a mesma
área do complexo de condomínios de Santa Cruz. Os blocos passaram a dialogar
com o entorno e os espaços residuais foram substituídos por pátios com maior
potencialidade para o convívio social.
Figura 10: Percurso médio entre condomínios MCMV da Estrada dos Palmares até o
Centro do bairro de Santa Cruz (estação de trem).
Figura 11: Diferenças de percursos entre a configuração em condomínios e a cidade
aberta.
Figura 12: Sequência de imagens mostrando a transformação do entorno do MCMV
da Estrada dos Palmares, ao longo do tempo. a. 31/08/2009; b. 07/01/2010; c.
23/12/2011 e d. 18/11/2014.
4
Figura 13: Edificações comerciais não planejadas oficialmente, surgidas em ambos
os lados da Estrada dos Palmares. No lado oposto aos condomínios as construções
são mais consolidadas. No mesmo lado, são colocadas tendas que aos poucos se
consolidam.
Figura 14: Usos comerciais surgidos no interior dos apartamentos.
Figura 15: Desnível entre condomínios, que dificulta a integração futura entre eles.
Figura 16: Diversidade de famílias dos seis condomínios situados na Estrada dos
Palmares, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Figura 17: Gráfico do percentual de adequação das famílias.
Figura 18: Indicação da inflexibilidade do sistema construtivo.
Figura 19: Modificações realizadas por moradores em conjuntos habitacionais do
IAPI e do BNH, localizados no bairro de Padre Miguel, situado na Zona Oeste do Rio
de Janeiro.
Figura 20: Solução mais onerosa, por criar estrutura independente, de modo a
transformar as paredes existentes de alvenaria autoportante para alvenaria de
vedação. Para melhorar as condições de acessibilidade foram instalados elevadores,
sendo que, de modo a não aumentar excessivamente o valor dos custos
condominiais, três blocos foram conectados por uma passarela, de modo que todos
seus moradores pudessem ter acesso ao elevador.
Figura 21: Solução que considerou a possibilidade da estrutura ser mista, ou seja,
autoportante com reforço de armação na junção das paredes; possibilidade
reconhecida como pouco provável. a. planta original do bloco; b. alterações
propostas; c. solução em planta; d. fachada principal do bloco.
Figura 22: Solução que criou estrutura independente externa, mantendo a estrutura
autoportante. Por meio de passarela externa foi possível alterar as configurações
dos apartamentos, de modo a ajustá-los ao perfil das famílias.
Figura 23: Estudo de readequação dos condomínios. a. destacado no entorno. b.
aproximado: os blocos em vermelho são os existentes. Os blocos em azul são os
propostos.
Figura 24: Mapa de uso comercial ou de serviços no interior dos apartamentos. A
identificação foi realizada sobre as respostas aos questionários, de modo que traduz
apenas o uso comercial neles identificados.
Figura 25: a. Planta padrão dos blocos; b. Maquete eletrônica do bloco padrão.
Figura 26: a. Primeira versão do estudo de planta com circulações externas para
conectar cômodos, dando flexibilidade aos apartamentos, de modo a procurar
atender a diversidade de perfis de famílias. b. Maquete eletrônica, com
incorporação de terraço coletivo para redução do desconforto térmico nos
apartamentos do 4º pavimento e incorporação de sistema de coleta de água da
chuva.
Figura 27: Esquema dos estudos de redução das passarelas.
5
Figura 28: Perspectivas do estudo projetivo.
PARTE PARALELA
Figura 01: Modelo de ficha de avaliação.
Figura 02: Desenho da implantação dos empreendimentos.
Figura 03: Pranchas com síntese de uma das três propostas apresentadas na oficina.
Figura 04: Tabela de adequação das famílias.
Figura 05: Tabela de adequação das famílias (família ampliada)
Figura 06: Tabela de trabalho no domicílio.
6
Apresentação
Nestas páginas está relatada a pesquisa intitulada “Para além da Unidade
Habitacional: pela moradia e pela cidade no contexto da construção da [minha]
casa e da [minha]vida”, que visou analisar o Programa Minha Casa Minha Vida à
luz da “qualidade de projetos arquitetônicos e urbanísticos e qualidade
construtiva dos empreendimentos”, como definido no subitem “a”, do Tema 1
“Aspectos de desenho, implementação e avaliação do PMCMV”, definido no
Edital MCTI/CNPq/MCIDADES Nº 11/2012.
entendendo-se a cidade não apenas como produto das relações humanas, mas,
também, como um agente concorrente para o acesso aos direitos sociais,
através da oferta de habitação de qualidade inserida no contexto urbano,
pretendemos quantificar e qualificar os problemas arquitetônicos e urbanísticos
identificados no universo de conjuntos selecionados para esta pesquisa.
...
Isto será feito em três escalas: a da casa, a do conjunto e a do bairro. No que
diz respeito ao bairro, será analisada a qualidade física dos espaços públicos –
ruas e praças –, considerando as condições dos percursos e permanências dos
moradores para a realização de suas práticas cotidianas, tais como trabalhar,
estudar, ir às compras, realizar atividades físicas e de lazer, etc. Neste mesmo
sentido, será verificado em que medida a configuração espacial do conjunto
apresenta uma morfologia que permita sua integração com o bairro. Por sua
vez, no que diz respeito à casa, o programa arquitetônico das unidades
habitacionais será confrontado com o número de integrantes, o tipo de relação,
a faixa etária e as atividades desenvolvidas pelos moradores, [...]. Esta
abordagem pressupõe também a avaliação da adequação dos sistemas
construtivos utilizados às práticas socioespaciais dos moradores, bem como às
suas dinâmicas de transformação (Andrade [coord.], 2012: 09).
7
Ou seja, um dos nossos principais instrumentos de análise do Programa Minha
Casa Minha Vida foi o desenvolvimento de estudos projetuais que tentaram
encontrar meios de adequar os condomínios existentes à diversidade de
composições familiares, às necessidades e, até mesmo às potencialidades dos
moradores de um complexo de condomínios – contíguos e agrupados 1– situados
no extremo oeste do município do Rio de Janeiro, na Região Administrativa de
Santa Cruz. Tratam-se dos condomínios Almada, Aveiros, Coimbra, Cascais, Évora
e Estoril, situados na Estrada dos Palmares, no trecho ao norte da Avenida Brasil.
1
Em reunião da Rede Cidade e Moradia em 22 e 23 de agosto de 2013, foi discutido o uso dos
termos contiguidade e agrupamento para definir, respectivamente “empreendimentos de uma
mesma construtora que se localizam lado a lado ou face a face e que conformam um grande
empreendimento, que se encontra muitas vezes mascarado em várias pequenas operações” e
“frequência de empreendimentos MCMV em uma mesma porção do território”. Para designar um
grupo de condomínios contíguos e agrupados, usamos em nossa pesquisa, o termo "complexo de
condomínios".
2
A pesquisa foi desenvolvida em rede, com outras 11 equipes, que estão explicitadas no item 1, em
seguida. Aqui cabe antecipar que as equipes do Rio de Janeiro – a nossa, CiHabE/PROURB e
Observatório das Metrópoles/IPPUR, ambas da UFRJ, trabalharam em complementaridade.
8
bem inserido e outro periférico –, um em Queimados – periférico – e outro em
Belford Roxo – bem inserido3.
Figura 2: Municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Indicação (com seta)da localização dos
quatro empreendimentos nos municípios objeto de aplicação de questionários pelo Observatório das
Metrópoles/IPPUR-CiHabE/PROURB UFRJ. Indicação sobre mapa da Fundação CEPERJ.
3
No momento da concepção da pesquisa, a questão da localização melhor inserida foi pensada
como aquela mais próxima aos centros urbanos infraestruturados. No seu desenvolvimento, fomos
percebendo que esta proximidade é necessária, mas não suficiente para a boa inserção, como está
mostrado mais adiante.
9
A estruturação deste relatório foi feita em duas partes: uma principal e outra
paralela. A parte principal apresenta o conteúdo central da pesquisa. Na parte
paralela expomos de maneira mais detalhada questões relacionadas ao método
e à operacionalização da pesquisa.
A redação da parte principal deste relatório foi realizada por Luciana Andrade,
com revisão técnica de Maria Paula Albernaz. Na parte paralela estão indicados
os autores do textos que a constituem.
4
Tratou-se da Oficina “A Arquitetura, o Urbanismo e a Moradia Popular: o fazer projetual para além
do produto”, realizada pelo CiHabE/PROURB/UFRJ, em parceria com o Observatório das
Metrópoles/IPPUR/UFRJ. O evento ocorreu entre 08 e 12 dezembro de 2014, quando foram feitas
visitas de estudo nos dias 08 e 09 e, a partir do dia 10 se iniciaram uma série de debates que
envolveram conferência e palestra sobre cooperativas habitacionais uruguaias e cursos de
cooperativas, proferidas pelo professor e arquiteto Raúl Vallés, da FARQ UdelaR, além de palestras
de Jurema Constâncio, liderança da Coordenação Nacional da União de Moradia Popular - UMP-RJ -
e Alvaro Pedrotti, arquiteto, assessor técnico. O evento foi finalizado com uma entrevista realizada
com o Prof. Raúl Vallés, com perguntas realizadas pelos participantes da oficina.
10
PARTE PRINCIPAL
11
1. Preâmbulos
No contexto da Rede de Pesquisa Cidade e Moradia - RPCM, a pesquisa
desenvolvida pelo CiHabE/PROURB/UFRJ apresentou como peculiaridade a
intenção de aprofundar questões arquitetônico-urbanísticas nas escalas do
bairro, do empreendimento e das unidades habitacionais, trabalhando em
complementaridade com a pesquisa desenvolvida pelo Observatório das
Metrópoles/IPPUR/UFRJ.
5
Três delas foram em Brasília, na mesma ocasião das reuniões com o Ministério das Cidades e outras
três em São Paulo, sendo a última um seminário onde foram expostos os principais resultados das
pesquisas. Também ocorreu uma sétima reunião entre membros das equipes que estiveram
presentes no Encontro Nacional da ANPUR – ENANPUR –, ocorrido em Recife, em maio de 2013.
6
Tratam-se das Regiões Metropolitanas de Belém, Fortaleza, Natal, Belo Horizonte, Rio de Janeiro,
São Paulo, Campinas e Baixada Santista. Além destas regiões, também foram estudadas duas outras
que não se constituem como metropolitanas, como a de Santarém, no Pará e a de São Carlos, em
São Paulo.
12
sistematização do compartilhamento de dados, análises e resultados. A temática
dos eixos e seus conteúdos estão relacionados abaixo7.
7
Encontra-se em organização, um livro com os conteúdos sintéticos das pesquisas das diferentes
equipes. Um dos artigos, de autoria de Beatriz Rufino, expõe de maneira mais detalhada a
constituição e o conteúdo desses eixos.
13
A pesquisa por nós desenvolvida teve ênfase no eixo 3 e comporta
objetivamente os tópicos do eixo 4. Este foco mais direto com um dos eixos não
elimina o diálogo com tópicos dos outros eixos que aparecem de forma difusa ao
longo das análises e proposições. A temática sintetizada no eixo5 configura um
fundamento essencial da nossa pesquisa, pois ressalta a relação entre política
urbana e habitacional com o desenho urbano e arquitetônico.
Desse modo, o presente relatório não está organizado pelos eixos de discussão.
Ele está centrado na base que articula o eixo 5 ao 3 e todos os outros eixos são
acionados sempre que encontram repercussão nos temas tratados. Em outros
termos, “A Política Habitacional e a Produção das Cidades” é um tema que
define os fundamentos das nossas discussões sobre “O Desenho, o Projeto e a
Produção” do PMCMV. As questões relativas à “Inserção Urbana e a Segregação
Socioespacial” estão intimamente vinculadas à questão do desenho urbano e
vários tópicos relativos à “Arquitetura do Programa” e a “Demanda Habitacional
e a Oferta do Programa” aparecem relacionadas no conteúdo da pesquisa, de
modo não sistemático.
14
2. Análises
Conforme exposto no início da apresentação deste relatório, objetivamos
confrontar a organização da vida das famílias moradoras com realizações que
podem ser consideradas típicas do PMCMV. Esta comparação atravessou as
escalas do bairro – neste caso, focada mais diretamente no entorno imediato, do
conjunto e das unidades habitacionais.
Antecipam estes dois aspectos, o próprio desenho urbano, que vai dar aos
moradores, maiores ou menores condições de vivência cotidiana do espaço. Ou
seja, no contexto da inserção urbana, foco temático da Rede Cidade e Moradia,
nossa pesquisa se centrou no fato de que, mesmo quando bem inserido na
cidade, a configuração de um conjunto pode comprometer significativamente as
práticas cotidianas dos moradores, aumentando distâncias e impondo limitações
à produção e reprodução da vida.
8
Estamos nos referindo ao debate pós-moderno, que está retomado no próximo item.
15
urbanos e espaços públicos, tais como escolas, creches, postos de saúde,
espaços para manifestações culturais, praças etc.;
na solução de conjuntos habitacionais assemelhados a condomínios
fechados que esvaziam os conjuntos habitacionais da possibilidade de
construção de sentido de cidade; e
nas soluções das unidades habitacionais, que pressupõem um padrão
familiar semelhante em termos de números de integrantes e composição
para todas as famílias, ignorando a expressiva diversidade que já se
sobrepõe à familiar nuclear, além de homogeneizar as atividades
cotidianas dos moradores, pressupondo que a moradia é o espaço de
atividades meramente domésticas.
a. b.
c.
16
d.
e
Figura 03: Diferença entre características do desenho urbano de conjuntos habitacionais de diferentes
épocas, no município do Rio de Janeiro: a. Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho
(1946) - Departamento de Habitação Popular/DF; b. Conjunto Residencial Carmela Dutra (1947) -
Fundação da Casa Popular/campus de experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe, c.
Conjunto Residencial Operário de Realengo (1938) - Instituto de Aposentadoria e Pensões dos
Industriários/IAPI, conhecido como Moscouzinho; d. IAPI Bangu (1949) (parte inferior da imagem) e
Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara (1971)– BNH (parte superior da imagem); e. Empreendimentos
do PMCMV em Santa Cruz (2011). Fonte: Google Earth.
17
Ao longo da realização da pesquisa, ratificamos, como premissa, que “a dinâmica
de transformação da habitação é constante e esta deve ser flexível para
adequar-se às novas demandas” e que “a (...) configuração enquanto
condomínio fechado, (...) ao excluir o entorno impõe aos pobres uma espécie de
auto-exclusão(Andrade [coord.], 2012: 8).
Vale lembrar que o item compreende o Eixo 5 definido pela RPCM, aqui alterado
pela substituição do termo “cidade” por “metrópole” pelo entendimento que a
realidade fluminense não pode ser compreendida fora do contexto
metropolitano. Esta deliberação foi feita objetivamente porque estamos
tratando desta parcela do território, mas também porque a Região
Metropolitana do Rio de Janeiro representa em torno de pouco mais de 70% da
sua população9.
Uma primeira dificuldade se impôs: se cada vez é mais difícil e até inconcebível
trabalhar com um conceito ideal de cidade, muito mais é quando se trata de um
conjunto de cidades que forma uma metrópole. A percepção da inadequação da
idealização é tão evidente que nos coloca a questão de como nos posicionarmos
para o estabelecimento das categorias que orientaram nossas análises.
9
Ver Plano Estadual de Habitação (Governo do Estado do Rio de Janeiro, 2012).
18
direta, soma-se uma segunda constatação: a da violência do espaço urbano. A
metrópole, altamente segregada, concentra as maiores benfeitorias urbanas
numa parcela exígua do território metropolitano – notadamente a Zona Sul
carioca, a cidade de Niterói, partes pequenas do Centro, Zona Norte e Oeste da
capital e, parcelas ainda menores do centro de alguns de seus municípios. O
sistema de transportes é extremamente precário e a política focada no
automóvel individual piorou significativamente a mobilidade e a poluição
urbana. A infraestrutura de serviços urbanos, notadamente o esgotamento
sanitário, é de pior qualidade nos espaços periféricos e a distribuição de
equipamentos de educação, cultura e lazer é bastante desigual no espaço
metropolitano. Vale acrescentar que a segregação socioespacial contribui para a
dificuldade de construção de um capital cultural pela população moradora das
periferias10.
19
(1998). A concepção de direitos humanos:
O PMCMV surge justamente contrariando essa lógica, ainda que tenha sofrido
13
Aqui mesclamos os conceitos de Harvey (1980) e Soja (2000).
20
ajustes no sentido de se aproximar daquele fundamento político e das
demandas dos movimentos sociais. No que diz respeito ao desenho urbano, a
opção pelo condomínio reforça a perspectiva da construção daquilo que pode
ser considerado como “anticidade”.
2.1.1. Desenho:
14
O conceito de “rugosidade” foi usado no sentido desenvolvido por Santos (1994).
21
à realização pessoal, fora das forças de mercado e do poder do dinheiro,
e [de] trazer a ordem social para o interior de uma relação melhor de
trabalho, que contemple condições ambientais e ecológicas.”15 (Harvey,
2000: 195).
22
A atualidade, que já não pode mais ser abarcada pelo termo propagado por
Charles Jenks, coloca em cheque modelos que, entretanto, ainda são referência
para intervenções urbanísticas e habitacionais.
O que um olhar mais atento pode observar é que, talvez mais do que nunca, os
desenhos propostos para a construção e reconstrução das cidades
contemporâneas revelam os ideais de cidade nos quais há uma clara disputa do
espaço urbano pelos diferentes grupos sociais. Os projetos do PMCMV, salvo
raras exceções, querem a cidade segregada, onde os mais pobres ficam alijados
do acesso às benfeitorias urbanas.
Para finalizar esse subitem, cabe lembrar que a questão ambiental foi incluída de
maneira mais determinante aos parâmetros para pensar e projetar as cidades.
Atualmente é imprescindível considerar nos projetos as questões relacionadas
ao reaproveitamento da águas da chuva, á drenagem natural do solo, ao
impacto térmico e lumínico das edificações no entorno, ao aproveitamento da
ventilação natural etc.
23
Essa nossa orientação teórico-metodológica é sustentada pelo pensamento de
Carlos Nelson Ferreira dos Santos (1980 e 1981), atualizada por autores que
exploraram as cartografias de Deleuze e Guattari (1990), particularmente
Jacques (2001) e Passos et alli (2010). Para estes autores, a postura do
pesquisador deve evitar as preconcepções, cuidando para que, no processo da
pesquisa, não se tente encaixar a realidade nas teorias e conceitos. Eles
reafirmam a necessidade da pesquisa ser orientada por questões que
desnaturalizam - ou desconstroem -as verdades instituídas. Assim, o método
deve ser aberto para comportar as descobertas em campo.
Vale acrescentar que o fato de Santa Cruz ser numa localização distante do
Centro do Rio de Janeiro também foi um fator importante na nossa decisão, uma
vez que há a tendência desses lugares serem menos procurados para a
realização de pesquisas. Valladares e Medeiros (2000) apontaram, em análises
realizadas com base num extenso banco de dados sobre as pesquisas urbanas no
Rio de Janeiro, que os locais pesquisados tendiam a ser aqueles próximos às
áreas centrais e à localização dos institutos de pesquisa.
17
Na Parte Paralela deste relatório, apresentamos de forma mais detalhada a operacionalização da
pesquisa.
24
demandas observadas para a faixa 1não ocorrem em faixas superiores de renda.
Por sua vez, o caso do Conjunto Esperança, realizado no contexto do PMCMV
Entidades, não se apresentava ocupado até a finalização de nossa pesquisa.
Entretanto, este caso se mostra exemplar na medida em que a opção de
projeto– muito diferenciada dos demais - , compactuada entre lideranças da
UMP-RJ, grupo de moradores beneficiários e assessoria técnica - foi por casas
isoladas e por um tecido urbano aberto, o que traz consequências muito
distintas em termos de vida cotidiana para os residentes e integração à cidade .
18
Tratam-se, respectivamente, da Resolução Conjunta SMU/SMH nº 01 de 18 de maio de 2012 e do
Decreto nº 36.960/2013, conforme detalhado pelo relatório coordenado por Cardoso e Lago (2015)
e explicitado no mapa da página 390.
25
2.3.1. Implantação: cidade aberta X condomínio fechado
19
Nos referimos a todos os condomínios desta natureza, mesmo os de classe alta, não reduzindo a
expressão conjunto habitacional aos espaços de moradia produzidos como de interesse social.
26
a.
b.
Figura 04:
Um exemplo do padrão urbanístico da periferia fluminense.a.No canto superior esquerdo, um
empreendimento do PMCMV, que fragmenta significativamente o tecido urbano; b. as linhas
brancas acentuam o padrão urbanístico caracterizado por quadras e lotes. Fonte: Google Earth.
27
a.
b.
Figura 05:a. Detalhe do padrão de loteamento ilustrado na figura anterior, b. Com destaque
para a conexão entre os lotes e a rua. Fonte: Google Earth e CiHabE (2014).
a.
28
b.
c.
29
d.
Figura 06: Sequência analítica do padrão MCMV a partir dos quatro casos estudados.
a. Queimados; b. Belford Roxo; c. Triagem; d. Santa Cruz.
Fonte: Ilustração da apresentação do CiHabE realizada na reunião da RPCM em abril de 2014.
30
Cabe lembrar que esse último complexo de condomínios contíguos foi escolhido
pela localização bem inserida, o que mostra que este aspecto não é suficiente
para a integração física e também social. O fato de ser condomínio não impediu
que o tráfico de drogas se instalasse no local e a sua proximidade com uma
estação de metrô não se revelou funcional para os moradores. De acordo com a
avaliação da equipe do Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ, isto pode ter
ocorrido devido ao fato deste sistema de transporte não ter sido incorporado
ainda pelos moradores. É também possível que o modal não seja utilizado pelo
fato do preço da passagem de metrô ser mais caro do que a do ônibus.
Aqui há uma questão importante a ser ressaltada: a crença que o muro daria
mais segurança aos moradores. A fantasia da segurança pelo muro alto aparece
também nos loteamentos, onde moradores fecham a testada do lote com muros
altos com a finalidade tanto de aumentar a privacidade, quanto de proteger da
invasão de ladrões. Esta solução, entretanto, se mostra inócua e até inadequada,
uma vez que para a segurança, o controle social tende a ser mais eficaz do que
as barreiras físicas. Elementos vazados, como grades ou cobogós, permitem que
os eventos estranhos sejam percebidos na vizinhança, o que contribui para o
constrangimento de eventuais ataques.
No caso dos condomínios de Santa Cruz, há que se destacar tanto que furos têm
sido feitos nas grades pelos próprios moradores - como maneira de evitar os
longos deslocamentos impostos pela configuração dos condomínios,quanto
também é solicitada aos síndicos a construção de outras guaritas.Voltaremos a
essa questão mais adiante, mas a antecipamos aqui para ressaltar a
complexidade da questão.
31
Figura 07: Conjunto habitacional localizado no bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de
Janeiro. A implantação "em pente" permite o diálogo do edifício com a rua e não há espaços
residuais entre os blocos. Fonte: Google Earth.
Figura 08: Complexo de condomínios do MCMV em Santa Cruz. A implantação não dialoga com
o entorno e cria vários espaços residuais. Fonte: CiHabE 2013.
32
a.
b.
Figura 09: a. Maquete de estudo, com disposição dos blocos dos seis condomínios, em Santa Cruz,
conforme obra executada. b.Reconfiguração da maquete de estudo para uma implantação dos blocos
desenvolvida sobre a mesma área do complexo de condomínios. Os blocos passaram a dialogar com o
entorno e os espaços residuais foram substituídos por pátios com maior potencialidade para o convívio
social. Fonte: CiHabE (2014).
33
É interessante observar que o fato da disposição dos blocos não permitir
observar o entorno não significa, sequer, alguma preocupação com outro
parâmetro técnico, voltado para o conforto ambiental. Os blocos são dispostos
em qualquer orientação solar, o que representa a possibilidade de maximização
dos problemas térmicos e, consequentemente, de conservação de energia e
sustentabilidade ambiental. No caso da Estrada dos Palmares, em Santa Cruz,
observamos que grande número de blocos está voltado para o noroeste, o que
representa uma orientação com grande incidência de sol, o que no clima do Rio
de Janeiro significa um problema, particularmente no verão, quando as
temperaturas chegam a mais de 40ºC na sombra. A amplitude térmica não é
desprezível, uma vez que pode chegar a menos de 15ºC no inverno, o que
demanda estudos criteriosos para soluções arquitetônicas que pretendam
atender a parâmetros mínimos de conforto.
Uma aproximação com o caso vai nos mostrar de forma mais clara o que
representa para a vida dos moradores os problemas apontados nos desenhos
urbanos dos condomínios do PMCMV. A crítica abaixo se refere especificamente
à análise no complexo de condomínios de Santa Cruz, ainda que várias das
considerações aqui traçadas possam ser extrapoladas para vários outros casos.
34
uso de passarela.
Figura 10: Trajeto médio por ônibus entre condomínios MCMV da Estrada dos Palmares até o
Centro do bairro de Santa Cruz (estação de trem). Fonte: Google Maps.
35
a.
b.
36
c.
d.
37
supostamente são capacitadas para compreender a lógica do desenho urbano.
Ele cita exemplos das Universidades de Harvard, nos EUA, e da Escola de
Arquitetura, em Copenhague, Dinamarca.
a.
b.
38
c.
d.
Figura 12: Sequência de imagens mostrando a transformação do entorno do MCMV da Estrada dos
Palmares, ao longo do tempo. a. 31/08/2009; b. 07/01/2010; c. 23/12/2011 e d. 18/11/2014.
Fonte: Google Earth.
39
Figura 13: Espaços comerciais não planejados oficialmente, surgidos em ambos os lados da Estrada dos
Palmares. No lado oposto aos condomínios as construções são mais consolidadas. No mesmo lado, são
colocadas tendas que aos poucos se consolidam. Fonte: CiHabE (2013).
40
Apenas um pequeno número de lojas foi finalizado após a ocupação dos
conjuntos, sendo que o número não atende as necessidades da população, como
também a própria localização, que fica numa das extremidades do complexo de
condomínios. Todavia, mais do que isto, a questão do surgimento de
estabelecimentos comerciais não está associada apenas à necessidade de
consumo das famílias, mas também a geração de renda. E parte das atividades
precisa ser desenvolvida na própria moradia, particularmente nos casos em que
o trabalho doméstico é realizado paralelamente à atividade que gera recursos
financeiros para a família. O cuidado de crianças, idosos e ou pessoas doentes se
insere nessas situações.
41
Figura 14: Usos comerciais surgidos no interior dos apartamentos. Fonte: CiHabE (2013).
42
Figura 15: Desnível entre condomínios, que dificulta a integração futura entre eles.
Fonte: CiHabE (2013).
21
A percepção da dificuldade imposta pelo desenho urbano e pelo sistema construtivo nos levou
tecer as considerações desenvolvidas em Andrade, Demartini e Cruz (2014).
43
Figura 16: Diversidade de famílias dos seis condomínios situados na Estrada dos Palmares, em
Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Fonte: CiHabE (2014).
Figura 17: Gráfico do percentual de adequação das famílias. Fonte: CiHabE (2014).
44
Figura 18: Indicação da inflexibilidade do sistema construtivo. Fonte: CiHabE (2013).
22
Um artigo elaborado por Mello (2013) desenvolve este tema.
23
Conforme apontado na proposta para a realização dessa pesquisa "Estudos sobre as intervenções
promovidas pela população nas moradias e espaços públicos de conjuntoshabitacionais abordam
diferentes aspectos que vão da análise quantitativa e qualitativa de alterações nas dimensões,
45
padrão construtivo e tipologias das casas, ao levantamento e avaliação das transformações
realizadas nas áreas livres de uso coletivo, passando pela caracterização das diversas formas de
apropriação do ambiente construído. Dentre os trabalhos desenvolvidos no Brasil, como por
exemplo, os de Silva (1984), Ornstein (1992); Medvedovski (1994) e Souza (1994); destacamos as
pesquisas desenvolvidas por Carlos Nelson Ferreira dos Santos (1981), não apenas pelo seu caráter
pioneiro na crítica à produção padronizada da habitação popular, como também pela ênfase que
confere às dimensões simbólicas e não materiais da moradia. Outra característica fundamental do
trabalho deste autor – cujos primeiros textos datam do final da década de 60 é o reconhecimento, a
valorização e a incorporação das práticas sócio-espaciais dos moradores de assentamentos
populares no processo projetual da habitação. Ver também o documentário produzido em 2009 por
Julia Aguiar e Douglas Aguiar, intitulado “Dasgaragens”".
46
3. Estudo Arquitetônico-Urbanístico de Readequação 24
Neste item está explicitado o estudo projetivo de readequação do complexo de
condomínios contíguos e agrupados, situado na Estrada dos Palmares, em Santa
Cruz, Zona Oeste do Município do Rio de Janeiro. Este exercício projetual foi
realizado de modo a tentar apontar alternativas para as questões observadas em
campo e no resultado dos questionários aplicados. Cabe lembrar que não
trabalhamos com a intenção de apresentar uma solução, ainda que possa conter
indicações de como resolver alguns problemas identificados.O exercício de
realização de um estudo de requalificação da área foi feito no sentido de
aprofundar as análises. O enfrentamento efetivo das questões observadas passa
pela construção de políticas urbanas e habitacionais. Como já dito, o projeto
nesta pesquisa é tomado como instrumento para aprofundar nossas análises.
Por sua vez,Minha Casa, Nossa Cidade: innovating mass housing for social
change in Brazil, de Marc Angélil e Rainer Hehl (2014), vai no mesmo sentido de
reconhecimento da importância da lógica do que pode ser chamado como
arquitetura autônoma, analisando-a a partir da realidade brasileira.
47
que compreende várias morfologias e tempos históricos –, como também
destacaram a dimensão viva dos espaços urbanos e arquitetônicos, tendo alguns
realizado experiências concretas de intervenção.
Figura 19: Modificações realizadas por moradores em conjuntos habitacionais do IAPI e do BNH,
localizados no bairro de Padre Miguel, situado na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Acervo: CiHabE (2000).
48
De fato, a readequação autogerida dos espaços de moradia nos
empreendimentos realizados através da implementação de políticas públicas
para população de baixa renda é uma realidade no Brasil e a observação dos
contextos onde conjuntos habitacionais foram bastante modificados pelos
moradores também foi importante para definir nossas diretrizes de projeto.
49
Figura 20: Solução mais onerosa, por criar estrutura independente, de modo a transformar as paredes
existentes de alvenaria autoportante para alvenaria de vedação. Para melhorar as condições de
acessibilidade foram instalados elevadores, sendo que, de modo a não aumentar excessivamente o valor
dos custos condominiais, três blocos foram conectados por uma passarela, de modo que todos seus
moradores pudessem ter acesso ao elevador. Fonte: CiHabE (2013).
50
a.
b.
c.
d.
Figura 21: Solução que considerou a possibilidade da estrutura ser mista, ou seja, autoportante com
reforço de armação na junção das paredes; possibilidade reconhecida como pouco provável. a. planta
original do bloco; b. alterações propostas; c. solução em planta; d. fachada principal do bloco. Fonte:
CiHabE (2013).
51
Figura 22: Solução que criou estrutura independente externa, mantendo a estrutura autoportante. Por
meio de passarela externa foi possível alterar as configurações dos apartamentos, de modo a ajustá-los ao
perfil das famílias. Fonte: CiHabE (2013).
52
3.3. Estudo Projetivo
28
Não encontramos referências a este bairro no cadastro da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro.
A área onde está localizado o complexo de condomínios é parte do bairro de Santa Cruz. Ver:
http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/1314_bairros%20-%202014.JPG. Certamente a
identificação da área como um bairro se dá por esta estar apartada do centro de bairro, formando
um aglomerado com certa independência. Por sua vez, o nome atribuído é decorrente da existência
de uma ponte histórica nas proximidades (3km), construída pelos jesuítas no período colonial, que
atualmente não cumpre mais sua função, sendo um monumento tombado. Não empreendemos uma
pesquisa aprofundada sobre o bairro, uma vez que nosso foco era na discussão morfológica que
apresenta caráter mais geral entre os empreendimentos tipo do PMCMV. Para uma panorâmica
sobre o bairro deSanta Cruz, ver
http://pt.wikipedia.org/wiki/Santa_Cruz_%28bairro_do_Rio_de_Janeiro%29
53
demanda e a própria prática dos moradores. Conforme já destacado,
encontramos furos em diferentes pontos das cercas que limitam os
condomínios, realizados por alguns moradores - e usados por vários - para
tornar as distâncias mais curtas. Outros moradores demandam aos síndicos a
construção de guaritas nesses pontos, como nos foi relatado. Isto, entretanto é
reconhecido pelos síndicos como elementos a onerar o condomínio 29. A questão
gera conflitos, uma vez que a abertura nas cercas, formadas por alambrados,
representa o descontrole do espaço, fomentando o desejo de substituição das
grades por muros, na ilusão que o problema seria resolvido 30.
29
Em estudo realizado por Alcântara (2014) num condomínio do PMCMV no município de
Seropédica, a inviabilidade de viver em condomínio, por várias razões, resultou na queda das grades
e no abandono da guarita.
30
O trabalho final de graduação de Evelyn Correa (2014), intitulado "Mais que uma casa, uma vida.
Recomposição Urbana de Senador Camará" identificou que mesmo os muros são perfurados por moradores,
quando isto representa a redução de distâncias. No caso, os condomínios foram projetados com as entradas em
pontos que aumentam a distância para a estação de trem.
54
dos eventos urbanos na perspectiva de promover o conforto e a segurança
daqueles que vivenciam os espaços públicos 31.
31
Aqui nos referimos também a Kevin Lynch (1981).
55
a.
b.
56
3.3.2. Escala dos blocos + unidades habitacionais
Por sua vez, como apontado, a demanda dos moradores por espaços comerciais
não só promoveu o surgimento de atividades desta natureza no entorno do
empreendimento como também, em compartimentos das moradias. Não é
demais repetir que, muitas vezes, o trabalho realizado no interior da moradia é
de extrema importância para o morador para que se possa realizar
concomitantemente a atividade remunerada e de reprodução da vida, como o
cuidado com as crianças, doentes e idosos 32. Cabe acrescentar também que
determinadas atividades demandam o armazenamento do produto do trabalho
no interior da casa, por ser um bem de grande valor para o morador33.
32
Este aspecto nos foi ressaltado, em contexto que não o desta pesquisa, por Isabel Tostes, arquiteta
da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
33
Em conversa sobre ocupações de edifícios ociosos, Douglas Aguiar, professor da UFRGS, ressaltou
a inadequação da imposição de uma tipologia estritamente residencial especialmente para as
camadas populares, particularmente se referindo aos catadores de material reciclável, que tem no
produto de seu trabalho um valioso bem que não pode ser armazenado em qualquer lugar.
57
Figura 24: Mapa de uso comercial ou de serviços no interior dos apartamentos. A identificação foi realizada sobre as respostas aos questionários , de modo que traduz apenas
o uso comercial neles identificados. Fonte: CiHabE (2014).
Considerando o perfil e as necessidades das famílias, partimos para a
readequação dos blocos de apartamentos do conjunto.
a.
34
Os estudos desenvolvidos nesta escala foram concebidos na primeira oficina de projeto.
Posteriormente foram trabalhados pela equipe de bolsistas de iniciação científica e extensão, sob
coordenação dos pesquisadores Juliana Demartini e Rogério Cruz.
b.
Figura 25: a. Planta padrão dos blocos. b.Maquete eletrônica do bloco padrão. Fonte CiHabE (2013).
a.
60
b.
Figura 26: a. Primeira versão do estudo de planta com circulações externas para conectar cômodos, dando
flexibilidade aos apartamentos de modo a procurar atender a diversidade de perfis de famílias. b.Maquete
eletrônica, com incorporação de terraço coletivo para redução do desconforto térmico nos apartamentos
do 4º pavimento e incorporação de sistema de coleta de água da chuva. Fonte CiHabE (2013).
61
Figura 27: Esquema dos estudos de redução das passarelas. Fonte CiHabe (2014)
62
Figura 28: Perspectivas de uma das versões do estudo projetivo.
63
empreendimentos do PMCMV voltou-se para o aprofundamento da análise e
não tinha a intenção de apontar uma solução efetiva. A realização das
proposições urbanísticas e arquitetônicas suscitaram algumas reflexões
diretamente relacionadas ao projeto e além dele.
64
readequação com o espaço habitado e nos tempos demandados pelos
moradores35.
35
Como os estudos desenvolvidos não tinham um detalhamento que permitisse chegar a um
orçamento mais preciso, foi necessário trabalhar com várias estimativas, o que ampliou a margem
de imprecisão. Também não foram desenvolvidos projetos de drenagem e saneamento, pelas suas
particularidades. Além disto, como a perspectiva era de que a realização de um trabalho desta
natureza fosse desenvolvido num contexto de assessoria técnica pública, não foi considerado o BDI.
65
4. Esboço de uma Proposta
Não há dúvidas quanto à importância do porte e da escala de abrangência do
Programa Minha Casa Minha Vida. A existência de subsídios significativos para
atender a população das faixas mais baixas de renda é uma novidade na
política habitacional brasileira. Outros aspectos do programa podem ser
considerados bem sucedidos, dentre os quais se destaca a satisfação dos
moradores –a pesquisa da Rede de Pesquisas Cidade e Moradia– RPCM, neste
aspecto, ratificou pesquisa anterior realizada pelo IPEA, também encomen dada
pela Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades. Isto é um fato
que não pode ser desprezado, ainda que nossa rede ressalte a importância de
se trabalhar esta resposta associada a outras, o que relativiza a afirmação. É
significativo também considerar que a casa própria é um valor quase
inquestionável na sociedade brasileira, particularmente entre a população
remediada e mais pobre, por representar uma espécie de garantia de
segurança em períodos de instabilidade econômica da família ou do País. Não
por acaso, ao tomar conhecimento da política de locação habitacional na Itália,
o síndico de um dos condomínios concluiu por uma espécie de superioridade
brasileira quanto a esta questão: “estamos melhor que lá, não?”, perguntou
ele, revelando desconfiança de políticas de locação social 36.
36
Um casal de jornalistas italianos morou durante algum tempo no Condomínio Coimbra para
realizar uma reportagem.
66
No que tange a essas disciplinas, as realizações do PMCMV, tal como outros
programas, particularmente o da fase inicial do Banco Nacional de Habitação –
BNH –, possui pouquíssima diversidade funcional, bem como idealiza o perfil e
a organização das famílias, considerando-a simplesmente como a nuclear – pai,
mãe e um ou dois filhos. Entretanto, mais do que isto, representam também
um retrocesso por estar alheia à implantação de uma tipologia habitacional
que resulta em uma série de restrições aos moradores - entre as quais se
destacam aquelas relacionadas à realização dos percursos cotidianos - bem
como para a concretização de obras necessárias à adaptação da moradia ao
perfil das famílias e às suas necessidades cotidianas.
37
Ver, por exemplo, Andrade e Leitão (2006).
38
Como observou Rogério Cruz, um dos pesquisadores da equipe do CiHabE/PROURB/UFRJ.
67
Desse modo, a principal proposição resultante desta pesquisa é a de
formulação de uma política de readequação de conjuntos do PMCMV,
sustentada na ação de assessoria técnica continuada para orientar as
transformações no espaço urbano e das unidades habitacionais demandadas
pelos moradores.
A ideia de assessoria técnica continuada (ATC) vai além do que determina a Lei
Nº 11.888, de24 de dezembro de 2008, conhecida como Lei de Assistência
Técnica. Além da diferença conceitual entre os termos assessoria - que
pressupõe um equilíbrio entre quem assessora e quem é assessorado – e
assistência – que apresenta um caráter paternalista e/ou de superioridade da
técnica – o serviço aqui proposto é constituído por uma rede de profissionais
mais ampla do que o normalmente considerado para a AT, ou seja, arquitetos,
engenheiros, técnicos sociais (assistentes sociais, sociólogos e psicólogos) e
advogados. Na nossa proposta, os nós da rede comportariam outros
profissionais como médicos, pedagogos, professores e tantos outros
identificados como importantes em cada contexto. Mas, especialmente,a ATC
seria também integrada por trabalhadores da construção civil (pedreiros,
instaladores, bombeiros hidráulicos etc.) e outras atividades que possam ser
identificadas como relevantes para a (re)construção do espaço. Participaria
desta equipe um profissional especialmente capacitado para difundir e
implementar ações de assessoria técnica em suas comunidades.
68
urbanística, pois é necessário trabalhar com as próprias modificações que
inevitavelmente serão realizadas.
39
Para a discussão do que é urbanidade ver, entre outros Aguiar e Netto (2012).
69
Assim, a ideia é que a ATC atue na facilitação da solução de problemas
decorrentes da necessidade de readequação do espaço, na capacitação dos
moradores para uma melhor atuação como diferentes profissionais da
construção civil e na (re)construção de valores que promovam a relação
democrática com e do espaço urbano. O entendimento é que o espaço físico
pode ou não estimular práticas democráticas, sem, contudo, ser determinante
delas. Para que isto ocorra,é necessário a incorporação de valores das práticas
democráticas – liberdade, igualdade e, principalmente, fraternidade – nas
dinâmicas socioespaciais.
70
- (jovens) profissionais que atuam territorialmente em áreas de relevância para
a readequação dos conjuntos do PMCMV. Neste último caso, estaria(m)
voltado(s) ou para uma formação que os tornassem qualificados para uma
avaliação da necessidade de acionamento da assessoria técnica, ou para o seu
aperfeiçoamento profissional daqueles que já tenham alguma qualificação,
como bombeiros, eletricistas etc.
Outro perfil de aluno seria o técnico das prefeituras que lidam com a questão
habitacional. A prioridade dada à sua inclusão no curso volta-se à sua
capacitação 42. O foco seria no potencial facilitador de seu papel. Além do
41
A proposta é inspirada nas cooperativas habitacionais e de trabalho uruguaias.
42
Vale lembrar que não está sendo proposto um curso específico para cada perfil de aluno, mas sim
uma obrigatória mistura dos perfis na formação proposta.
71
aperfeiçoamento no entendimento do tema “moradia popular” ou “habitação
de interesse social”. O técnico deve ser estimulado e capacitado para
contribuir na solução criativa de problemas. Entre as metas de se privilegiar
esse perfil de aluno dos cursos está a sensibilização do profissional para a
complexidade da questão habitacional e para identificação de potencialidades
que podem ser estimuladas institucionalmente. Neste sentido, é importante o
treinamento para a formulação de propostas para obter recursos de diferentes
origens, particularmente os federais, que muitas vezes não são acessados por
falta de capacidade técnica dos municípios, conforme reclamado por vários
profissionais de organismos do governo Federal – Caixa e Ministério das
Cidades, especialmente 43. É um papel importante deste curso rever as bases da
própria graduação dos técnicos - que, via de regra, teve o viés hegemônico,
voltado para o mercado tradicional -, e contribuir para reduzir o caráter
burocrático que a atividade no setor público tende a impor.
43
Em várias reuniões de trabalho, em diferentes contextos, este tema é apontado.
44
Sobre o PAP ver Orioli (2015).
72
aprofundaram outras pesquisas da Rede Cidade e Moradia 45. Estes agentes
podem ser entraves para a implantação de qualquer iniciativa, ameaçando
inclusive a integridade física dos participantes. Outros agentes podem também
oferecer resistência, como igrejas ortodoxas, particularmente neopentecostais,
que se orientam por condutas morais que podem inviabilizar discussões sobre
a organização dos espaços, especialmente os domésticos.
Há uma potência muito grande no próprio fato de todo morador das periferias ser
um trabalhador da construção civil, pelo menos em potencial. Aqui nos referimos
objetivamente à experiência dos alunos do Abricó- Escritório Modelo de Arquitetura
e Urbanismo da UFRJ, que foi surpreendida pelo estranhamento de moradores de
uma favela carioca à sua pergunta quanto a quem trabalhava com a construção
civil. Ora, a resposta era óbvia na visão deles: todos; afinal todos realizavam pelo
menos um tipo de serviço nesta área. Um pouco de conhecimento sobre as
periferias e favelas brasileiras nos permite afirmar que este não é um caso isolado.
45
Na ocasião do fechamento desta proposta, o jornal carioca "Extra" iniciou uma série de
reportagens sobre este tema. Ver: http://extra.globo.com/casos-de-policia/todos-os-condominios-
do-minha-casa-minha-vida-no-rio-sao-alvos-do-crime-organizado-15663214.html
73
possa preocupar. Esta referência foi aqui acionada para corroborar a potência da
ação popular. A estética da favela e da autoconstrução apresenta força para
constituir o que talvez seja a expressão "altermodernidade", no sentido de Hardt e
Negri (2011: 116-117):
74
exterior. Com suas paredes de vidro, a requalificação do porto está nascendo já
precisando de requalificação47.
Essa aparente digressão tem relação com o PMCMV, uma vez que essa questão está
presente também nos seus condomínios. A diferença é quanto à qualidade dos
materiais e dos sistemas construtivos, mas não da qualidade da arquitetura e do
urbanismo, pois ambos desconsideram os contextos socioespaciais e a morfologia
dos entornos. É impressionante usarmos um sistema construtivo artesanal, como a
alvenaria autoportante, que, entretanto, tem qualidade e expressão compatível
com o que o pior da produção industrial do pós-guerra produziu. Insistir nesse tipo
de urbanização predatória é condenar as gerações futuras a conviver com
problemas socioambientais e urbanos ainda mais graves do que os que
experimentamos hoje.
A despeito do seu caráter ambicioso e até mesmo fantasista, essa proposta tem
âncoras em experiências que apresentam materialidade48. Se o já citado PAP teve
vida curta, a ação da ONG Soluções Urbanas tem atuado em melhorias
habitacionais há pelo menos oito anos. Há dois anos foi criado a Residência em
Arquitetura, Urbanismo e Engenharia da FA-UFBA, que é um curso lato sensu para
capacitar para a assistência técnica em habitação. A já explicitada experiência da
UFMG, particularmente a ação do PRAXIS49, também pode ser considerada
referência.
47
Este é apenas um dos seus problemas. Sobre a questão da arquitetura produzida ver Halfen (2014)
e sobre a questão da moradia nesta área ver Galiza (2015).
48
No final deste relatório, incluímos um texto que procurou compilar as experiências de assistência e
assessoria técnica no Brasil.
49
Grupo de pesquisas coordenado pela professora Denise Morado, que realiza atividades de
extensão assessorando ocupações urbanas entre outros grupos de moradias.
75
As experiências de produção em auto ou co-gestão em São Paulo do início dos anos
1990 gera frutos até hoje – alguns de qualidade muito elevada -, ainda que seu
caráter utópico original possa ter se perdido50. Em outros países da América Latina,
existem experiências importantes, dentre as quais se destacam as das cooperativas
uruguaias51.
Para finalizar este item, é imprescindível marcar que são necessários investimentos
públicos expressivos para a redistribuição das benfeitorias urbanas e do capital
cultural relativo às disciplinas foco desta proposta. Entretanto este é um projeto de
aplicação em longo prazo e de realização lenta, o que significa um desembolso
pequeno ao longo do tempo. Neste sentido é importante ressaltar que sua
realização também poderá contar com recursos dos próprios moradores, quando as
transformações não forem essenciais, entendendo que o que é essencial e
prioritário também deve ser objeto de debate entre técnicos e moradores.
76
normalmente são estratégicos para a organização produtiva e reprodutiva da
vida. Como já dito, Topalov (1998) nos alertou para o fato de que o
saneamento adquire mais valor no contexto dos interesses da burguesia 52.
52
Santos (1981) desenvolve uma rica narrativa, mostrando que esse valor não é absoluto como faz
parecer o discurso técnico.
77
Tudo isto é imposto por meio de uma chantagem, em nome da
utilidade. Oculta-se que a importância completa dessa utilidade é
posta a serviço da reedificação. O Capitalismo moderno leva a desistir
de toda a crítica pelo simples argumento de que é preciso ter um
teto, assim como a televisão passa sob o pretexto de que é preciso
receber informação e divertimento. E consegue apagar a evidência:
essa informação, esse divertimento e esse modo de habitat não são
feitos para as pessoas, mas são feitos sem elas, contra elas.
Internacional Situacionista
78
PARTE PARALELA
79
1. Operacionalização da pesquisa
Nosso projeto de pesquisa foi elaborado de maneira flexível para que o
processo de conhecimento da realidade existente no local de estudo pudesse
admitir alterações na estrutura das etapas e nos instrumentos metodológicos,
em decorrência de possíveis imprevistos. Dessa forma, a descrição da
operacionalização inicialmente proposta funcionou como um roteiro
preliminar, que foi alterado devido às demandas identificadas durante a
imersão nos campos teórico e empírico (Andrade [coord.], 2012).
Por tratar-se de uma pesquisa-intervenção, o As etapas operacionais da pesquisa tiveram início após a
conhecimento da realidade com a qual se conclusão de duas atividades fundamentais: compra de
trabalhará é determinante para a definição materiais necessários para o pleno desenvolvimento das
dos procedimentos e instrumentos a serem etapas; e seleção de bolsistas, que foi condicionada ao início
adotados. A descrição da operacionalização do ano letivo de 2013. Demandas identificadas durante a
que se segue é, então, um roteiro preliminar execução da proposta geraram a inclusão de outras etapas,
que será alterado em função das demandas conforme a descrição a seguir.
percebidas ao longo da execução da
proposta. Reuniões semanais:
As etapas principais para a operacionalização Foram realizadas reuniões semanais para discutir o
da pesquisa estão listadas abaixo: andamento das atividades de pesquisa, questões sobre
metodologia, apresentações de resultados parciais e
Revisão bibliográfica: esclarecimento de possíveis dúvidas.
Esta etapa se centrará em dois
temas: na revisão de pesquisas sobre Revisão da bibliografia no contexto dos Seminários
55
Texto redigido por Isadora Tenório, com complementação de Juliana Demartini e revisão
técnica de Luciana Andrade .
80
o cotidiano de moradores de Habitação e Cidade:
conjuntos habitacionais e em
métodos projetuais participativos. No Os seminários como atividade disciplinar, realizados no
primeiro caso se pretende ampliar o PROURB/UFRJ, no primeiro semestre de2013, tiveram
olhar sobre práticas sociais de modo enfoque na discussão de bibliografia com temas pertinentes
a aumentar a sensibilidade dos ao PMCMV. As discussões foram feitas a partir da leitura de
membros da equipe para as textos (livros, dissertações e teses) relacionados à política e à
possibilidades que serão encontradas produção habitacional, bem como aos aspectos arquitetônico-
no conjunto a ser selecionado para a urbanísticos ligados ao tema.
realização do projeto. A revisão de
métodos projetuais participativos Visita a diversos conjuntos habitacionais:
permitirão a atualização do
conhecimento sobre práticas desta Para iniciação dos bolsistas de iniciação científica e de
natureza, bem como o extensão na questão do projeto arquitetônico e urbanístico
aprofundamento do conhecimento da moradia popular, foram feitas algumas visitas a conjuntos
de métodos desenvolvidos em vários habitacionais do Rio de Janeiro, implantados em diferentes
momentos da crítica ao projeto décadas. Esta atividade viabilizou uma vivência panorâmica da
arquitetônico e urbanístico produção habitacional realizada na cidade, bem como da
53
autoritário . transformação ocorrida em seu aspecto formal e
− Para essa etapa é previsto programático, através da apropriação dos moradores ao longo
um evento – provavelmente dos anos.
uma mesa redonda – com Foram visitados os seguintes empreendimentos:
profissionais que atuam com Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o
projeto participativo, Pedregulho - Departamento de Habitação Popular/DF;
particularmente aqueles que Conjunto da Fundação da Casa Popular, Campus de
realizam assessoria técnica experimentação de sistemas construtivos, em Guadalupe.
aos movimentos sociais para IAP Realengo, conhecido como Moscouzinho;
a construção da moradia por IAPI Bangu;
autogestão. Este é um outro Conjunto Habitacional Dom Jaime Câmara - BNH.
momento de debate
conjunto com a equipe do Esta visita, não só viabilizou aproximação real da
Observatório das problemática, como também possibilitou à equipe uma
Metrópoles/IPPUR/UFRJ. pequena vivência em diferentes propostas arquitetônico-
urbanísticas de HIS. No Pedregulho e no Campus de
Estudos de caso: experimentação de sistemas construtivos, foi possível entrar
Esses estudos de caso serão nas unidades habitacionais e realizar entrevistas abertas com
desenvolvidos com o Observatório moradores. Esta atividade gerou também registros
das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. Como fotográficos, que foram utilizados durante o desenvolvimento
dito, as duas equipes articuladas da pesquisa.
53
Alguns dos autores listados são Alexander (1977), Santos (1981 e 1988), Portas (2004) e estudos
sobre a obra dos arquitetos Frei Otto e Lucien Kroll, que desenvolveram projetos residenciais
abertos à participação popular na Europa. O trabalho de Ferro (1982 e 2006) também é
importante para a construção de um sentido de participação mais efetivo e entendimento dos
entraves à a este processo na realização do projeto.
81
visam trabalhar em
complementaridade para desenvolver Confecção de fichas de avaliação de projetos de habitação
uma análise que abarque desde a social
compreensão da Região Para aprofundar os estudos sobre empreendimentos
Metropolitana, até a da casa. A habitacionais, foram elaboradas fichas de avaliação de
seleção dos casos serão definidos a projetos de habitação social, onde as informações foram
partir de critérios comuns, a saber: organizadas sistematicamente, através de critérios de análise
− Grau de inserção urbana estabelecidos em três escalas(cidade, conjunto e unidade
(maior ou menor); habitacional).
− Porte do empreendimento; O levantamento panorâmico inicial de projetos foi, além da
− Faixa de renda, com a seleção de dois projetos visitados, feito em revistas e sites
seleção de pelo menos um técnicos, reconhecidos no meio profissional. Após uma
empreendimento na faixa de triagem do material levantado, foram selecionadas propostas
0-3 salários mínimos de com conteúdo teórico e gráfico suficiente para o
renda familiar mensal; desenvolvimento das análises - focadas em aspectos
− Programa geral do MCMV / arquitetônicos e urbanísticos, como por exemplo, materiais e
Entidades técnicas construtivas, programa arquitetônico,
− Empreendimentos dimensionamento, organização do espaço doméstico, acessos
destinados a população e relação das edificações com o terreno e entorno.
reassentada de áreas de Para tornar as avaliações mais próximas da realidade, foi
risco, projetos de desenvolvida uma comparação entre as propostas de layout -
infraestrutura e urbanização de acordo com a representação das publicações e seguindo as
de assentamentos precários, dimensões dos móveis comumente adquiridos por moradores
quando houver ; de conjuntos habitacionais. Para isso, foi feito um
− Critérios adicionais levantamento do desenho e das medidas de mobiliário em
eventuais: tipo de empresa lojas populares e refeitas as propostas de layout, com base
ou entidade promotora, nas informações pesquisadas.
papel do poder público, tipo
de sistema construtivo, etc. Os projetos avaliados foram:
Casa Balão - Guadalupe, Rio de Janeiro/Brasil;
Nesta etapa, a avaliação das Pedregulho - São Cristóvão, Rio de Janeiro/Brasil;
características físico-espaciais dos HIS Expansível - Rocinha, Rio de Janeiro/Brasil;
conjuntos se dará por sua observação 1º Lugar Prêmio Caixa 2009 - Santa Cecília, São
geral, capturada por imagens, e pela Paulo/Brasil;
aplicação de questionários para a Real Parque - São Paulo/Brasil;
identificação por amostragem do Microchip - Axios/Grécia;
perfil das famílias. HIS Elemental - Paraisópolis, São Paulo/Brasil;
Box House - São Paulo/Brasil;
A partir de mapas e plantas Parque Novo Santo Amaro 5 – Guarapiranga, São
identificaremos a qualidade da Paulo/Brasil.
inserção do conjunto no bairro,
verificando a existência ou não de A partir da elaboração das fichas foram retiradas possíveis
vazios entre a malha urbana de um e contribuições para o projeto de readequação do conjunto do
de outro e, quando for o caso, o PMCMV, tais como:
82
porte e as características destes 1. Permitir maior adequação ao perfil dos moradores, através
vazios. A proximidade do conjunto de unidades para diferentes perfis de famílias e de
aos centros ou sub-centros de bairro utilização de diferentes tipologias;
também serão considerados no raio 2. Boa estruturação e variedade de usos dos espaços livres;
das atividades realizadas pelos 3. Integração à malha urbana;
moradores. 4. Utilização da topografia do terreno como partido;
5. Previsão de uso comercial interno e externo às unidades;
Isto dará a base para a caracterização 6. Acessibilidade integrada ao projeto dos condomínios;
dos espaços públicos e comunitários 7. Previsão de centro cultural / comunitário;
vividos pelos moradores. Por meio 8. Utilização de processo participativo;
da aplicação de questionários serão 9. Implantação levando em consideração aspectos de
identificados “pontos” do espaço conforto ambiental;
urbano usados pelos moradores: 10. Passarelas que criam situações de encontro entre os
além dos locais de trabalho, vizinhos;
procuraremos identificar, escolas, 11. Reaproveitamento da água das chuvas para irrigação das
creches, postos de saúde, hospitais, áreas verdes.
praças, locais de atividades sociais e
culturais, igrejas, núcleos de serviços Exemplo de Ficha de Avaliação de Projetos de Habitação
e comércio. Estes locais serão Social:
identificados em mapas, bem como
os percursos realizados pelos
moradores e seus meios de
locomoção – a pé, bicicleta,
carro/moto, ônibus/van ou a
combinação deles - serão também
levantados. Com fotografias e filmes,
aliados a registros escritos e croquis,
serão observados aspectos do espaço
urbano como: tipo e dimensões de
vias carroçáveis e passeios; existência
de elementos de
sombreamento/arborização;
iluminação pública; densidade do
espaço construído; permeabilidade
entre espaço público e privado; tipo
e intensidade do trânsito de veículos,
existência de faixa de pedestres e
sinais luminosos.
83
impactos sobre o tipo de espaço Sessões CiHabE de Cinema e Debate
gerado no exterior. A questão da Foram exibidos filmes e documentários acerca da questão
diversidade formal e funcional habitacional, entre eles: “Reidy – a construção da utopia” e
também é relevante, assim como a “Lucio Costa e a utopia moderna”. As sessões tiveram como
identificação se os espaços livres se objetivo principal reforçar a contextualização,
configuram como abertos ou problematização e debates realizados nas reuniões semanais.
residuais, ou seja, áreas livres que É importante mencionar que as sessões foram abertas ao
“sobraram” na implantação do público, para que outras pessoas, além dos membros da
edifício. equipe de pesquisa, pudessem fomentar as discussões sobre o
conteúdo exposto.
Por fim, para avaliação do espaço
doméstico serão identificadas Aplicação de questionários em diversos empreendimentos
famílias pelo número de integrantes; do PMCMV - RMRJ
suas idades e sexo; tipo de Para avaliação de empreendimentos PMCMV - Faixa 1,
parentesco/relação etc. As atividades implantados na Região Metropolitana do Rio de Janeiro,
cotidianas – de produção e foram aplicados questionários elaborados pelo IPPUR, com
reprodução - também serão nossa colaboração.
levantadas, de modo a caracterizar as Belford Roxo;
necessidades e também Santa Cruz;
potencialidades das famílias e de Queimados – Parque Valdariosa I, II e III;
transformação do espaço. Bairro Carioca.
84
definido para objeto de projeto de
readequação em função de sua
representatividade como conjunto
habitacional do PMCMV,
receptividade dos moradores entre
outros critérios.
85
físicas do conjunto nas três
escalas anteriormente
citadas. Nesta etapa, serão
integrados na equipe jovens
54
moradores do conjunto ,
que serão capacitados pela
equipe para participar da
elaboração e aplicação dos
questionários e entrevistas,
bem como para a realização
de observações de campo
para o conhecimento do
perfil e necessidades das
famílias.
Os procedimentos serão
similares aos desenvolvidos
no item anterior para as três
escalas de análise, sendo
que o objetivo será a
apreensão de um grupo
significativo e contíguo de
unidades habitacionais,
compreendendo um
universo representativo de
várias questões importantes
de serem consideradas num
projeto de reabilitação de
um conjunto desta natureza.
Além dos instrumentos
listados para o item
anterior, poderão ser ainda
realizadas entrevistas focais
para identificar
potencialidades da área e
dos grupos sociais
moradores, do mesmo modo
como poderão ser
desenvolvidas outras
estratégias que se
mostrarem pertinentes para
a apreensão da realidade em
questão.
54
Será realizado um processo de seleção dos jovens, com critérios definidos que envolverão a
inscrição na rede pública de ensino, o interesse no tema entre outros.
86
Plantas com a representação
gráfica dos problemas e
potencialidades do espaço
serão confeccionadas, assim
como outros recursos para a
espacialização dos
resultados levantados nesta
análise. É considerada a
possibilidade de confecção
de uma planta digital que
permita a visualização
instantânea dos dados e
aspectos observados,
inclusive aqueles registrados
em filmes.
8.1.3. 2. Desenvolvimento do
estudo preliminar de
readequação do conjunto:
O projeto de readequação
do conjunto será
desenvolvido no nível de
estudo preliminar, com
especificações que
permitam o
desenvolvimento de um
orçamento simples. Os
conceitos e o partido para a Fig. 03: a. e b. Pranchas com síntese de uma das três
sua realização serão propostas apresentadas na 1ª oficina de projeto.
decorrentes da pesquisa de
campo e do debate entre os Jornada de Iniciação Científica, Artística e Cultural (JICTAC) /
membros da equipe e, Congresso de Extensão - 2013
quando possível, moradores. Foram realizadas três apresentações na JIC que integraram a
Aqui vale destacar a série “Verdades e mitos sobre a qualidade na habitação
limitação de uma social”; “O que é realmente ruim nas moradias do PMCMV?”;
empreitada desta natureza, “Bastam projetos assinados?” e “Projetos assinados ou
uma vez que o exercício PMCMV?”. No Congresso de Extensão foi feita uma única
projetual pode gerar apresentação com o título “Por uma qualidade urbana e
expectativas nos moradores habitacional: avaliação arquitetônica e urbanística de
que não poderão ser empreendimentos do Programa Minha Casa Minha vida na
atendidas no contexto da Região Metropolitana do Rio de Janeiro”.A equipe recebeu
pesquisa. A própria seleção Menção Honrosa na JICTAC 2013 - UFRJ e também no 10º
da área levará em conta a Congresso de Extensão (2013) - UFRJ.
87
possibilidade de trabalho
conjunto, mas caso se Realização de oficina de maquete com moradores
constate uma efetiva Foi realizada uma oficina com moradores do Condomínio
impossibilidade de Coimbra (MCMV), em Santa Cruz (Estrada dos Palmares), com
realização de projeto o objetivo de coletar ideias para a concepção do projeto de
participativo como exercício, praça, em um terreno próximo ao empreendimento. Para o
a equipe se limitará a desenvolvimento da maquete dos empreendimentos e
responder às demandas entorno, foi esperada a participação de moradores de
reveladas nos questionários variadas faixas etárias, porém efetivamente os participantes
e entrevistas. Se, por um foram as crianças, a atividade foi ajustada para ter caráter
lado, isto comprometerá a mais lúdico. Mesmo assim, informações relevantes para o
perspectiva de projeto foram coletadas através deste instrumento
desenvolvimento e metodológico.
elaboração de métodos e
processos participativos 2ª Oficina de projeto MCMV
para a realização do projeto, A 2ª Oficina de projeto foi realizada em março de 2014 e
por outro lado, a simples contou com a participação de estudantes de graduação em
realização de um projeto Arquitetura e Urbanismo. O objetivo foi elaborar propostas de
para readequar o conjunto melhorias voltadas à escala urbana dos condomínios MCMV,
ao perfil das famílias já de Santa Cruz - RMRJ. Nesta oficina, os participantes,
permitirá um previamente divididos em seis grupos, trabalharam de forma
dimensionamento livre o mesmo tema, optando ou não por se aprofundar em
preliminar dos ônus que um tópico específico.
recairão sobre a população Antes das atividades práticas desta oficina, foi realizado um
moradora para promover a seminário que deu início ao debate sobre questões
melhoria das condições de relacionadas à escala urbana. Participaram deste seminário,
habitabilidade dos seus moradores dos condomínios de Santa Cruz, um pesquisador
espaços de vida. (sociólogo) da equipe do IPPUR/UFRJ e professores da
− O desenvolvimento FAU/UFRJ.
do projeto
envolverá Realização de maquete para subsidiar a oficina
momentos de Para a segunda oficina de projeto, foi realizada uma maquete
debates que física para servir de base para os participantes da oficina.
poderão ser Após as conclusões dos trabalhos das oficinas, a maquete foi
formalizados como utilizada para exercícios de reorganização do bloco e base
eventos – oficinas para o desenvolvimento do projeto. Posteriormente ela foi
ou seminário de entregue aos moradores.
apresentação e
discussão do Visitas à Campo, além da aplicação dos questionários
projeto. Membros Foram feitas outras visitas a campo, além daquelas feitas para
da equipe do a aplicação dos questionários e tomada de conhecimento do
Observatório das local. Foram realizados levantamentos dos usos no entorno,
Metrópoles/IPPUR/ como também visitas com o objetivo de levantar informações
UFRJ participarão para pensar o projeto. Os moradores demandaram projetos
88
destes momentos tanto para uma praça, em área com previsão para a
evento. construção de espaço comercial e escola, que não foram
construídos, quanto para um centro cultural, que abrigasse as
Orçamento estimativo para avaliação recém-formadas associações de moradores e de síndicos. Não
preliminar dos custos de foi possível atender à primeira demanda, mas nos foi possível
readequação desenvolver um estudo preliminar do Centro Cultural, que foi
inserido na versão final do projeto.
Após a conclusão do projeto de
readequação será feito um Desenvolvimento dos projetos
orçamento estimativo para Encontram-se em etapa de finalização os projetos de
dimensionar os custos de readequação dos blocos, em função dos blocos, em função
readequação do conjunto. das respostas dos questionários, e de readequação da
− Tal como na etapa anterior, implantação. Para finalizar a empiria da pesquisa, será
a finalização do orçamento realizado o orçamento estimativo da proposta de
será sucedida de uma readequação.
reunião para exposição das
avaliações preliminares. Jornada de Iniciação Científica, Artística e Cultural (JICTAC) /
Congresso de Extensão
As avaliações e análises serão desenvolvidas Em 2014 foi realizada uma única apresentação na JICTAC,
por praticamente todo o tempo de intitulada “Conexão de Saberes Arquitetônicos e Urbanísticos:
desenvolvimento do projeto de readequação conhecendo moradores para pensar a readequação de
arquitetônica e urbanística do conjunto empreendimentos do MCMV”. Por neste momento o projeto
selecionado. Reuniões quinzenais para o de pesquisa se confundir com o projeto de extensão, o
debate e registro das avaliações parciais serão mesmo trabalho foi apresentado no XI Congresso de
realizadas. Extensão, ressaltando as questões mais relacionadas ao
Durante os últimos meses de realização da diálogo com os moradores. A equipe de bolsistas recebeu
pesquisa será redigido o relatório que será Menção de Incentivo na JICTAC 2014– UFRJ.
convertido numa publicação. A publicação
terá um correspondente com os temas Oficina A Arquitetura, o Urbanismo e a Moradia Popular: o
desenvolvidos pela equipe do Observatório fazer projetual para além do produto
das Metrópoles/IPPUR/UFRJ. O objetivo da oficina foi levantar questões e discutir
proposições pertinentes à atividade do projeto de
arquitetura-urbanismo e a produção da moradia popular.
Como forma de aprofundar o debate pertinente ao projeto
arquitetônico-urbanístico, foi estabelecido um diálogo entre a
realidade brasileira atual de produção da moradia social,
representada pelo contexto carioca e gaúcho, e a experiência
uruguaia de realização de projetos com as cooperativas
habitacionais. Foram realizadas visitas de campo,à produções
autogestionárias e empreendimentos empresariais do MCMV,
além das palestras e debates. O evento foi feito em parceria com
o Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ.
Redação do relatório
89
A redação do relatório foi iniciada e finalizada como esta
síntese, que será desenvolvida como relatório completo até o
prazo final da pesquisa, que é dezembro deste ano. Artigos
também estão sendo desenvolvidos.
90
2. Notas Metodológicas56
Em trabalho realizado junto ao Observatório das Metrópoles/IPPUR/UFRJ,
foram entrevistadas 125 famílias dos seis condomínios MCMV, situados na
Estrada dos Palmares, no bairro Santa Cruz. Depois de realizados, os
questionários foram tabulados para que pudéssemos conhecer e entender o
retrato da realidade dos moradores proporcionado por este instrumento. Os
condomínios Almada, Aveiro, Cascais, Coimbra, Estoril e Évora totalizam 2712
unidades habitacionais, sendo 168 blocos com 2696 apartamentos e 16
habitações acessíveis.
Os questionários foram compostos por várias perguntas, dentre as quais foi de
interesse para a nossa pesquisa aquelas relacionadas ao perfil socioeconômico
das famílias e as referentes à habitação anterior e atual. Com a tabulação das
entrevistas obtivemos um banco de dados das pessoas e outro de domicílios.
A posição familiar de cada membro foi outro dado manipulado pelos bolsistas,
utilizado para classificar as famílias em 12 tipos, sendo eles: unipessoal, casal
sem filhos, monoparental com um filho, monoparental com dois filhos do
mesmo sexo, monoparental com dois filhos de sexos diferentes, monoparental
com mais de dois filhos do mesmo sexo, monoparental com mais de dois filhos
de sexos diferentes, biparental com um filho, biparental com dois filhos do
mesmo sexo, biparental com dois filhos de sexos diferentes, biparental com
mais de dois filhos do mesmo sexo e biparental com mais de dois filhos de
sexos diferentes.
56
Redação de Stéfany Silva, com revisão técnica de Luciana Andrade.
91
Monoparental quando existe apenas um responsável e seus dependentes e
biparental quando são dois responsáveis e seus dependentes.
A partir dessas classificações uma tabela foi montada para que pudéssemos
saber o percentual de cada tipo de família em cada condomínio, numa
amostragem de 125 famílias. A tabela “Tipologia Familiar” apresenta a
quantidade de entrevistados em cada categoria e sua porcentagem, obtida
através de uma regra de três simples.
Dessa maneira, em uma nova tabela, com o título de Adequação das Famílias,
agrupamos os tipos de famílias com a demanda por quartos para que
pudéssemos saber o percentual de cada tipo de apartamento. Depois de
encontrado o valor em porcentagem, extrapolamos para o universo total de
2712 famílias afim de obtermos um valor numérico dessa demanda.
92
Adequação das Famílias
Número de
Tipologia do Número de
Tipologia Familiar Porcentagem Apartamentos
apartamento Famílias
(extrapolação)
Conjugado Unipessoal 12,00% 15 324
Quarto e sala Casal sem filhos 12,80% 16 345
Monoparental
com 1 filho
Monoparental
com 2 filhos do
mesmo sexo
Monoparental
com mais de 2
2 Quartos filhos do mesmo 32,00% 40 863
sexo
Biparental com 1
filho
Biparental com 2
filhos do mesmo
sexo
Biparental com
mais de 2 filhos do
mesmo sexo
Monoparental
com 2 filhos de
sexos diferentes
Monoparental
com mais de 2
3 Quartos filhos de sexos 25,60% 32 690
diferentes
Biparental com 2
filhos de sexos
diferentes
Biparental com
mais de 2 filhos de
sexos diferentes
Figura 04: Tabela adequação das Famílias.
93
Adequação das Famílias (Família Ampliada)
Número de Unidades
Tipologia do apartamento Número de entrevistados Porcentagem habitacionais
(extrapolação)
Conjugado - 0% 0
Quarto e Sala - 0% 0
2 Quartos 4 3,20% 86
94
Trabalho no Domicílio
Empreendimento Código da Família Atividade Tipologia Familiar Forma de Acesso Quantidade Porcentagem
2 Manicure Unipessoal Reassentamento
Almada 2
3 Corta Cabelo Unipessoal Reassentamento 1,60%
Monoparental com mais
Vende sacolé, cloro e de 2 filhos de sexos Reassentamento
32 desinfetante diferentes
Aveiro 2 1,60%
Biparental com mais de
Vende picolé 2 filhos de sexos Reassentamento
34 diferentes
Biparental com mais de
Cascais 61 Lanches 2 filhos de sexos Sorteio 1 0,80%
diferentes
64 Vende moda íntima Unipessoal Reassentamento
Coimbra 73 Bar do Seu Pedro Biparental com 1 filho Sorteio 3 2,40%
82 Cabelereira Família Ampliada Reassentamento
Biparental com 2 filhos
Artesanato Sorteio
97 de sexos diferentes
Estoril 3 2,40%
98 Pizza Família Ampliada Sorteio
102 Vende doces e balas Família Ampliada Sorteio
Vende doces,
116 Família Ampliada Sorteio
refrigerante e cerveja
Évora Revendedora Avon e Biparental com 2 filhos 3 2,40%
120 Sorteio
Natura de sexos diferentes
Revendedora de
123 Família Ampliada Sorteio
Roupas e Semi Joias
Total 14 11,20%
Fig. 06: Tabela Trabalho no Domicílio
- Relação entre a forma de acesso e a Adequação
100,00%
80,00%
60,00%
40,00%
20,00%
0,00%
Almada Aveiro Cascais Coimbra Estoril Évora
Adequados Inadequados
97
3. Assessoria Técnica no Brasil: uma Cronologia Tentativa57
Talvez possamos estabelecer como marco do surgimento da assessoria técnica no
Brasil a década de 1960, com o inovador trabalho de urbanização em favelas do Rio
de Janeiro58, realizado pelo arquiteto e urbanista Carlos Nelson Ferreira dos Santos,
Gilda Blank e equipe – Escritório Quadra -, através da Companhia de
Desenvolvimento de Comunidades (CODESCO). Segundo Silva (2000) esta
companhia, criada para atuar no âmbito estadual de habitação popular no Rio de
Janeiro, dirigia suas ações exclusivamente à urbanização de favelas. Assim, Brás de
Pina foi a primeira experiência fomentada por um aparato político-institucional, de
modo que a sua viabilidade foi garantida pela alocação de recursos por parte do
governo estadual. Outra característica importante no processo de urbanização de
Brás de Pina foi a iniciativa pioneira do Quadra em definir estratégias que
promovessem a participação efetiva dos grupos sociais nas atividades de assessoria
técnica, inclusive na fase de planejamento das intervenções.
A maior parte da escassa literatura encontrada sobre este tema, no entanto, indica
a década de 1970 – no contexto do Movimento pela Reforma Urbana – como marco
histórico das primeiras discussões sobre a necessidade de serviços gratuitos de
assessoria técnica para o setor da habitação popular. Segundo um manual59 de
implantação de assistência técnica produzido pelo IAB em 2010, a primeira iniciativa
oficial foi o programa de Assistência Técnica à Moradia Econômica (ATME), criado
em 1976 pelo Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul (SAERGS), com o
patrocínio do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia 60 deste
mesmo estado (CREA/RS). O ATME foi inicialmente coordenado pelos arquitetos
Clovis Ilgenfritz da Silva, Newton Burmeister, Carlos Maximiliano Fayet e Claudio
Casaccia, e os advogados Manuel André da Rocha e Madalena Borges. É importante
ressaltar que Clovis Ilgenfritz da Silva foi o responsável pelo primeiro projeto de lei
para assistência técnica no Brasil (Instituto de Arquitetos do Brasil-xx, 2010).
57
Este item foi desenvolvido por Juliana Demartini, com revisão técnica de Luciana Andrade.
58
As experiências obtidas através deste trabalho foram transformadas em livro. Ver Santos (1981).
59
“Manual para a implantação da assistência técnica pública e gratuita a famílias de baixa renda
para projeto e construção de habitação de interesse social” (INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL,
2010).
60
É necessário esclarecer que os CREAs passaram a ser Conselhos Regionais de Engenharia e
Agronomia no final do ano de 2010, com a criação dos Conselhos de Arquitetura e Urbanismo
(CAUs), instaurados em janeiro de 2012, a partir da aprovação da Lei Nº 12.378/10 pelo Presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (BRASIL, 2010; CAU/BR, <http://www.caubr.gov.br>).
98
pelo Laboratório de Habitação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade
de Belas Artes de São Paulo (Lab-Hab FAU/USP), criado por um grupo de
professores em 1982. Bonduki (2014), um dos fundadores do Lab-Hab, aponta o
trabalho desenvolvido por este laboratório como uma das primeiras iniciativas de
assessoria técnica em apoio aos movimentos sociais, na luta por programas
alternativos às iniciativas do governo naquele momento, como por exemplo, a
autogestão e a urbanização de favelas.
No final da década de 1990 algumas capitais brasileiras, como Porto Alegre, Campo
Grande, São Paulo, Vitória e Belo Horizonte, por exemplo, aprovaram leis
municipais voltadas para a assessoria técnica em projetos e execução da habitação
de interesse social. Neste momento, a noção de arquitetura como direito do
cidadão e dever do Estado voltou a ganhar força no debate sobre a moradia
popular. A partir disso, algumas Faculdades de Arquitetura e Urbanismo começaram
a se mobilizar a favor da assessoria técnica, através de atividades de extensão
universitária. Outras duas importantes ações no âmbito acadêmico foram a inclusão
de temas/conteúdos relativos ao direito à cidade e à moradia digna às grades
curriculares, e a criação de Escritórios Modelo de Arquitetura e Urbanismo (EMAU),
através da Federação dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo (FENEA), com o
objetivo de assessorar famílias pobres nas questões construtivas, materiais e
simbólicas relativas às suas moradias (Instituto de Arquitetos do Brasil-xx, 2010).
O Ministério das Cidades, criado na primeira gestão do Presidente Luiz Inácio Lula
da Silva em 2003, foi concebido com objetivo de articular as políticas setoriais,
enfrentar a questão urbana, e promover condições favoráveis para a
implementação dos instrumentos de planejamento. Para isso foram criadas quatro
secretarias nacionais: Habitação, Saneamento, Mobilidade Urbana e Programas
61
LEI 10.257/01 – aprovada em julho de 2001 (BRASIL, 2001).
99
Urbanos. As Conferências das Cidades, lançadas por este ministério neste mesmo
ano, foram concebidas para instaurar a participação da sociedade nas orientações e
encaminhamentos para a construção das políticas urbana e habitacional (Andrade,
2011).
100
discussão do Projeto de Lei que deu origem à Lei da Assistência Técnica gratuita em
Arquitetura e Engenharia, aprovada em 2008 (SILVESTRE E CARDOSO, 2013).
A Lei 11.888/08 foi concebida para assegurar “às famílias de baixa renda assistência
técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse
social”. Conforme o § 1 do Art. 2 desta Lei, o direito à assistência técnica “abrange
todos os trabalhos de projeto, acompanhamento e execução da obra a cargo dos
profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia necessários para a
edificação, reforma, ampliação ou regularização fundiária da habitação”. Em
trâmite no Congresso Nacional desde 2001, sua elaboração se deu a partir de um
projeto de lei (Nº 6.981/2006), concebido pelo arquiteto urbanista e deputado
federal Zezéu Ribeiro, que teve como base outro projeto de lei desenvolvido
também por um arquiteto urbanista e deputado federal, Clóvis Ilgenfritz – um dos
criadores do ATME (Cunha et. al., 2007). A aprovação da Lei da Assistência Técnica
significou uma grande conquista no campo social da moradia popular (Andrade,
2011; Salazar, 2014).
Entretanto, ainda em 2009 o MCidades criou o Programa Minha Casa, Minha Vida,
com o objetivo de construir 3,4 milhões de unidades habitacionais a curto prazo em
todo o país. Para atingir esta ambiciosa meta o governo federal alocou R$ 34
bilhões, recurso nunca antes investidos em uma única vez em programas
habitacionais. “Realmente tratava-se de um feito inédito para o setor
habitacional”,segundo Andrade (2011 – P. 114). A guinada na política habitacional
alterou as perspectivas que vinham sendo traçadas anteriormente.
101
De acordo com o MCidades, nas diretrizes estabelecidas para o direcionamento dos
recursos e para a produção habitacional do PMCMV foram determinadas quatro
modalidades classificadas por diferentes limites de renda bruta familiar mensal:
Faixa 1, até R$ 1.600,00; Faixa 2, até R$ 3.100,00; Faixa 3, até R$ 5.000,00; e o
Programa Habitacional Popular – Minha Casa, Minha Vida-Entidades62 (PMCMV-E),
até R$ 1.395,00. Esta última modalidade, que recebe apenas 0,5% de todo o recurso
destinado ao PMCMV, é voltada ao financiamento habitacional de movimentos e
cooperativas habitacionais que, por sua vez, têm se apropriado deste recurso,
utilizando também o auxílio de instituições ou programas de assessoria técnica para
a concepção do projeto e acompanhamento da execução de seus
empreendimentos. Em relação a isso, Laisa Stroher63 diz:
62
De acordo com o MCidades, o Programa Habitacional Popular – Minha Casa Minha Vida -
Entidades (PMCMV-E) foi criado para atender as necessidades de habitação da população de baixa
renda em áreas urbanas, garantindo o acesso à moradia digna. O PMCMV-E funciona através da
concessão de financiamentos a beneficiários organizados de forma associativa por uma Entidade
Organizadora (EO), que podem ser Associações, Cooperativas, Sindicatos e outros, utilizando
recursos do Orçamento Geral da União (OGU), aportados ao Fundo de Desenvolvimento Social (FDS).
O programa pode ter ainda a recursos complementares de estados, do Distrito Federal e dos
municípios (DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 2009).
63
Diretora da Secretaria de Mobilização e Inserção Profissional da Federação Nacional dos
Arquitetos e Urbanistas (FNA) (SALAZAR et. al., 2014).
102
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