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MESTRADO EM FONOAUDIOLOGIA
São Paulo
2016
ii
São Paulo
2016
iii
BANCA EXAMINADORA:
de São Paulo.
Instituição de Fomento:
AGRADECIMENTOS
(Rubem Alves)
reconhecimento.
Agradeço:
medidas socioeducativas.
paciência. Obrigada por dar cor às minhas palavras e por me apresentar a uma
Ao Nelson Filice, por ser uma influência desde o meu primeiro ano de
neste trabalho.
defesa.
vezes, segurar em minha mão quando eu achei que não fosse conseguir.
por acolher minhas preocupações e ideias, por ouvir atentamente cada palavra
Aos meus pais, Ezequiel e Val, pelo incentivo e investimento nos meus
Gabriel por ouvirem minhas aspirações e me fazerem acreditar que este sonho
seria possível.
motivações com esta pesquisa, por me ajudar a ter um olhar mais maduro e
Àquele que faz os meus pés como os das corças e me leva a lugares
altos. À pessoa mais importante da minha vida, meu Deus, meu abrigo, meu
cuidador e protetor. Àquele que logo voltará a fim de restaurar todas as coisas.
RESUMO
relação aos seus modos de falar, atribuindo valor negativo ao uso de gírias e
ABSTRACT
SUMÁRIO
Resumo .............................................................................................................. xi
Introdução .......................................................................................................... 1
Objetivo ............................................................................................................ 23
Método ............................................................................................................. 24
3. Casuística ............................................................................... 29
Conclusão ........................................................................................................ 60
xv
Anexos ........................................................................................................... 71
............................................................................................................. 73
LISTA DE TABELAS
Tabela 4: Orientação p. 36
Tabela 5: Memória p. 36
Tabela 7: Evocação p. 38
LISTA DE IMAGENS
INTRODUÇÃO
O relato a seguir faz parte de uma pesquisa conduzida por Luiz Eduardo
139), ela se refere a jovens brasileiros com passagens pela “vida do crime”. O
autora]
fosse julgado nos termos do Decreto nº 53.427 (SÃO PAULO, 2008), ele
vez que cometeu ato de alta periculosidade. Ainda que a Reforma Psiquiátrica
situação de risco por uso de drogas (São Paulo, 2011, p. 18). A crítica a este
francesas, foi criado o Groupe d’Information sur les Prisons (GIP). O trabalho
REVISÃO DA LITERATURA
Temos uma lei especial para toda a infância e juventude brasileira e não
instituição e a sociedade.
2005).
Rufino (2001, p.10) indaga sobre a realidade por trás dos julgamentos
menos favorecidas?
9
patriarcalismo.
10
fazem parte desse segmento. Grande parte dos que não são brancos,
compõem o que Souza (2009) denomina de ralé brasileira: uma classe social
que nem vista como classe é, e que ocupa o imaginário social ora como
ralé e são considerados criminosos ou vítimas, ainda não são vistos pela
qual teria que dar informações e mesmo prestar esclarecimentos acerca das
como aquilo que descreve um processo pelo qual problemas não médicos
sociais.
certos casos:
367).
imagem do jovem negro e pobre é emblemática nesse sentido, ele é visto, com
e VICENTIN, 2015).
Vicentin (op. cit.) e não por acaso, a revolta e a transgressão aparecem para
– da sociedade (MAGRO, 2002), mesmo que uma parte deles possa ser
vezes, sintaxe peculiares – não devem ser entendidos como “erros” em face
relações entre eles e na sociedade. Por isso mesmo, entrar em contato com os
determinam as infrações.
correntes aqui, por isso a opção foi tomar apenas uma dessas possibilidades
língua é, de fato, muito diferente de seus usos (na fala e na escrita) por sujeitos
são criados e/ou variam no tempo e em função das muitas situações em que
fonoaudiológica da linguagem, uma vez que é por meio delas que se torna
liberdade assistida, sob medida socioeducativa em meio aberto. Como foi dito
pesquisados sobre suas relações comunicativas, pela fala e/ou pela escrita. De
OBJETIVO
MÉTODO
1. A instituição da pesquisa
(FELTRAN, 2008).
Parque Santa Madalena – zona Leste da cidade de São Paulo. Esse CEDECA
foi criado, oficialmente, em 1991, fruto de quase duas décadas de atuação das
em relação:
pelos adolescentes.
CEDECA-Madalena em 2015.
(58,66%).
Total em
Variáveis /mês (dp) %*
31/12
Situação escolar
empregatício (16,00%).
29
2. Natureza da pesquisa
3. Casuística
menores de idade.
Madalena até que não houvesse variação significativa nas respostas. Nas
15 e 18 anos.
Madalena
4. Coleta de dados
complementares:
I. Adolescentes:
[ANEXO 5]
linguagem oral.
[ANEXO 6]
II. Profissionais:
assinados.
34
RESULTADOS E DISCUSSÃO
sociais e subjetivas desses sujeitos para a sociedade, a não ser como ameaça
Jorge Amado na década de 30 é persistente até hoje, por isso é possível dizer
Deus e Pirulito.
35
(ANEXO 6)
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 29
Volta Seca 25
Professor 23
Gato 14
Boa-Vida 24
Sem-pernas 24
João Grande 24
Querido-de-Deus 27
Pirulito 24
Analfabetos ≤ 15 pontos
36
Tabela 4 - Orientação
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 9
Volta Seca 9
Professor 7
Gato 7
Boa-Vida 8
Sem-pernas 7
João Grande 7
Querido-de-Deus 7
Pirulito 9
Tabela 5 - Memória
Avalia: a atenção e a memória imediata (de curto prazo ou primária), que tem
Pontuação máxima: 3
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 3
Volta Seca 3
Professor 3
37
Gato 1
Boa-Vida 3
Sem-pernas 3
João Grande 3
Querido-de-Deus 3
Pirulito 3
Pontuação máxima: 5
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 5
Volta Seca 5
Professor 2
Gato 0
Boa-Vida 5
Sem-pernas 4
João Grande 5
Querido-de-Deus 5
Pirulito 0
Tabela 7 - Evocação
meses.
Pontuação máxima: 3
38
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 3
Volta Seca 1
Professor 3
Gato 0
Boa-Vida 0
Sem-pernas 3
João Grande 2
Querido-de-Deus 3
Pirulito 3
Pontuação máxima: 8
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 8
Volta Seca 7
Professor 7
Gato 5
Boa-Vida 7
39
Sem-pernas 6
João Grande 7
Querido-de-Deus 8
Pirulito 8
construtiva.
Pontuação máxima: 1
Adolescente Pontuação
Pedro Bala 1
Volta Seca 0
Professor 1
Gato 1
Boa-Vida 1
Sem-pernas 1
João Grande 0
Querido-de-Deus 1
Pirulito 1
a entrevista realizadas com ele não sugerem qualquer tipo de transtorno, mas
educacional. A rigor, não houve nenhum aspecto que chamasse atenção para
40
sociais. Algo marcante naquele relato é que o garoto em questão atribuiu seu
pouca ou nenhuma participação na vida do filho e/ou são muito instáveis nos
severas e abusos físicos por parte dos genitores (ASSIS e SOUZA, 1999;
importante:
mim. Ele fala: “porque você não gosta dele?” Ela fala:
refúgio. Ao menos em parte, parece ser uma das motivações para planejar o
O mesmo parece não acontecer com Boa-Vida, que fala da mãe como
(...) Nós estamos brigados até hoje, mas nós nos falamos
dimensão estruturante, seja como o contrário... Isso pouco tem a ver com a
situação econômica: Professor não pertence a uma família nuclear com boas
relação com sua mãe, por isso parece naturalizá-la e, de certa forma,
Boa-Vida pertence a uma família com pouco a lhe oferecer (não somente em
44
desse tipo.
vai além da relação com os profissionais, ainda que, muitas vezes, eles
Gato como sujeito e cidadão. Sem intenção, mantêm Gato como incapaz de
posição superior a dele. Contudo, não se pode reduzir esta relação desigual
É Gato mesmo quem diz: “Se passar pelo professor e não falar ‘licença
senhor’, ‘licença senhora’, era arriscado você tomar uns tapas. Eu só podia
CASA. Mais ainda, disseram coisas tais como: “os piores momentos da minha
diversidade social. Gallo e Williams (2008) afirmam que o maior problema que
para lidarem com as diferenças. Sawaya (2002) diz que a percepção dos
o negativo, não logram promover um bom aproveitamento escolar por parte dos
estudantes.
destacam o diálogo como um meio utilizado pela escola para acolhê-los. Essa
conduta fez com que suas opiniões a respeito da escola fossem positivas e
(Professor)
professor. (Gato)
assemelha à Fundação CASA, não por fazer uso de violência física, mas por
Pedro-Bala, que não deseja frequentar a escola regular, mas gostaria de fazer
para a escola. Daqui uns dois ou três anos eu paro de ir. Estou no nono ano, aí
algum distúrbio, mas para atender outro tipo de demanda: “só quero que você
ajude a gente a se comunicar mais com as pessoas.” Ele quer apoio para
48
comunicar-se melhor, Gato não possui alterações de linguagem oral, como foi
signos precisam ser pensados a partir dos enunciados, que são singulares,
de seus discursos, que variam de acordo com os usos e as relações nas quais
saúde. Talvez seja isso que peça escuta e elaboração também por parte dos
profissionais da saúde.
(Professor)
Só falo gíria com traficante. Com o resto dos trabalhadores eu não falo
não. Com traficante eu falo, porque ele já sabe que quando você fala gíria,
você é malandro.
periféricos.
próprias singularidades:
preconceito. (Professor)
sociais. Talvez seja por isso que, ao ouvir a fala de nossos “capitães de areia”,
medidas socioeducativas em meio aberto. Esta opção foi feita a fim de explorar
este tema sob a perspectiva dos profissionais que estão em contato direto com
adolescentes.
também com um outro medo: não poder fazer qualquer diferença em face da
CASA:
Aliás, não é incomum que façam parte de uma mesma realidade, como disse a
comunidade. Para mim é mais fácil, pelas gírias e coisas que trazem”. Na
mesma linha, o Funcionário 2 relata: “o que converso com ele é mais natural,
Então, eles sabem que também não sou besta, que entendo das coisas da
comunidade.”
fato, socioeducativo, tem que prestar contas ao poder Judiciário, nos termos
Judiciário: “Comigo eles não falam palavrão porque acho que eles sabem para
quem eles falam.” O “para quem eles falam” não remete apenas ao funcionário,
57
mas ao que ele representa, considerando que tem como dever informar ao Juiz
amigo. Onde ele poderia falar tudo que fazia, que eu não
faria nada. Como por exemplo, quando fui fazer uma visita
se comunicar com eles, mas não por conta da fala, a dificuldade é acessar e
59
lidar com os sentidos – às vezes falta de sentido – que histórias de vida, tão
desconfiança.
em entender o que falam, mas não é a fala que não se compreende, é o que
CONCLUSÃO
que isso não resolve tudo, mas também não é pouco, faz diferença.
61
fazer. Na melhor das hipóteses haverá bons trabalhos pontuais, mas ainda
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
2002.
2000.
Press; 2007.
CRUZ, R.R. En La calle outra vez. Las Bandas: identidad urbana y usos
Paulo, Malheiros.
65
25, 2006.
1020-1027, 2012.
uma ação coletiva das periferias de São Paulo. Lua Nova, v. 79, p.
201-233, 2010.
2014.
66
2001.
1,p. 47-58,Mar.2014 .
disadvantage: implications for the early years and beyond. Int J Lang
75, 2002.
DOI: 10.1007/s00127-013-0695-x.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-37722009000200009.
edição 00292, p. 10
n. 1, 2001 .
https://www.youtube.com/ watch?v=wp1d1hHd5Zo
language abilities in juvenile offenders. Psychology, crime and law; 11:3, 239-
253, 2005.
69
284, 2008.
(2010): 61-69.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob orientação do Prof. Dr. Luiz
Estou ciente de que todos os procedimentos aos quais serei submetido não
É meu direito desistir da pesquisa a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer
Comunicação - Rua Monte Alegre, 984, Perdizes – São Paulo (SP – Brasil);
Nome:
RG:
Pesquisadora Orientador
Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C na Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –
cometica@pucsp.br
80
Eu, ______________________________________________,
Universidade Católica de São Paulo, sob orientação do Prof. Dr. Luiz Augusto
de Paula Souza.
Estou ciente de que todos os procedimentos aos quais serei submetido não
É meu direito desistir da pesquisa a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer
Comunicação - Rua Monte Alegre, 984, Perdizes – São Paulo (SP – Brasil);
Nome:
RG:
Pesquisadora Orientador
Reitor Bandeira de Mello, sala 63-C na Rua Ministro Godói, 969 – Perdizes –
cometica@pucsp.br
83
Data de nascimento:
Data da entrevista:
2. Você entende tudo o que as pessoas falam com você? Tanto na família, na escola, no
5. Você usa muitas gírias? Algum jeito de falar que só um grupo entenda?
6. Como é conversar com pessoas diferentes de você? Como por exemplo, pessoas mais
velhas.
7. Como é a conversa com seus amigos ou em algum grupo que você se sinta parte?
8. Você acha que é bem compreendido? Com quem você se sente bem?
10. Você acha que sua comunicação te ajudara a atingir seus objetivos no futuro?
Direcionar as perguntas para situações comunicativas com a família, escola, amigos, instituição
Pedro Bala
Minha tia. Eu converso mais com a minha tia que com a minha mãe. Ela
morava perto, agora ela mora no interior. Ela me levava no médico, essas
coisas. Ela pergunta das meninas: “aquela menina ali? O que você acha? É
bonita? Achei-a muito bonita, não sei o que”. Ela fala que eu não posso “pegar”
(sic) qualquer uma, e nem ficar com um monte, se não acabo ficando com
nenhuma. Eu acho que ela está certa nesse ditado dela. Ela está há alguns
meses no interior, mas vem direto. Ela me liga também. Ou manda mensagem
pelo facebook.
Ainda não. Já tive. Uma só. Eu tive uma Biz. Era dourada com laranja, Você
capacete.
É. Só às vezes. Só quando rouba muita moto. Aí, fica cheio de policiais aqui.
I-Mas você não tem medo de te roubarem? Se bem que biz nem é visada.
Ah, não. Se fosse uma moto alta, grande, eu teria medo. Mas Biz? Não. Os
policiais vão na moto mesmo, rápido. A não ser que tenha uma menina na
garupa.
Tem uns que falam. Uma vez ainda perguntaram se eu tinha passagem e
falaram que eu tinha saído da páscoa. Sendo que eu era menor de idade.
com a cachorra da minha tia, e estava andando sem documento também. Ele
88
falou assim: “não, você tem passagem. Você saiu na saidinha. Fala a verdade?
I- O que é “foda” (sic) é que me contaram que eles incriminam, não é? Como
assim: “olha a viatura”. Não sei como que os caras ouviram do outro lado, fora
do carro. Porque estávamos com o som alto. Aí, o policial foi atrás da gente e
nos levou pra um lugar e tudo. Ele pegou o RG de todo mundo, menos o meu,
pois estava sem RG. Ele falou assim: “Mas então, a gente quer saber quem
falou”. Aí, ninguém falou nada. Os caras começaram a olhar um pro outro.
Então, nós começamos a olhar um pro outro. Aí, os caras falaram assim:
“Então tem cem ‘pino’ (sic) de farinha na viatura, de quem que é?” Aí eu falei:
“Eu ainda sou menor de idade, os caras que são maiores de idade vão segurar
tinha ligado para o parente de um menino que estava conosco. E bem na hora
89
parentes do moleque chegaram. Aí, eles: “De quem que é esse carro aí?” Era a
irmã do menino. Bem na hora. Mas, tomamos um tapa na orelha ainda. Ele nos
soltou e falou: “se nós virmos vocês de novo…” Aí, fomos para um lugar que
eles nos acharam. Descemos em uma rua, caímos em outra, andamos em uma
I- Sobre gíria, que gíria você fala? To vendo que você não fala tanta gíria. Ou
Depende do lugar e da pessoa. Gíria tem um monte. Eu não sei nem o que
falar. “Coxinha” (sic) é polícia, “garibaldo” (sic) é menina feia. São esses nomes
Quando estou com amigos, primos. Com outros parentes nem tanto.
I- Você passou pela fundação? Lá tem um jeito de falar próprio? Teve coisa
I- Tipo o que?
Ah, na Fundação CASA tem uma “visãozinha” (sic). Visãozinha assim de umas
I- E os internos?
90
Tem uns que falam de BO, têm uns que falam de homicídio, outros falam que
tem uma “fita” (sic), outros falam que tem um negócio para ganhar dinheiro.
Falam um monte de coisa lá. Todo mundo conversa com todo mundo. Sempre
tem um “ramelãozinho” (sic), né? Um menino que só “dá pé” (sic), umas coisas
nada a ver. “Cagueta” (sic), pega a mulher do outro aqui fora, “rateou” (sic).
Essas coisas.
Eu entrei na escola por obrigação. Se não fosse obrigado, eu nem iria para a
escola.
M- Daqui uns dois anos. Dois ou três anos. Estou no nono, aí depois eu faço
supletivo, faço um curso, quem sabe uma faculdade. Curso tem um monte.
coisas.
Ainda tá cedo pra pensar. Meu objetivo é só ir para escola. Eu fico o dia inteiro
na escola. De manhã, para vir pra cá, eu acordo umas nove horas, tomo café
Não, porque nós estamos conversando, né? Ideia vai, ideia vai. Quando tenho
que responder muitas perguntas aí eu fico meio assim. Já não sei se vou saber
doidas. Toda semana falam a mesma coisa pra você e você fica quase louco.
Perguntam um negócio e te dão uma semana pra você responder e você não
sabe o que é. Falam uma palavra que você nunca ouviu na sua vida e mandam
você decifrar. Toda semana! Aí você fica louco. Falam assim, uns negócios da
sua vida aí vão lá e falam essa palavra: “Quero que você me responda essa
E Você não sabe o que é a palavra, e falam para você descobrir sozinho.
Tem um monte! Tem uns que olham pra sua cara e falam assim: “Nossa você
não tem cara de criminoso. Sua cara é gorda! Você não passa fome. Olha a
cara daquele outro menino ali. Ele é só o osso. Ele é morador de rua. Ele sim
precisa roubar.” Eu ouvi muita coisa assim. Ela fala: “O que você está fazendo
FRASE do MEEM
92
“Saúde para minha família é tudo que eu mais quero.” Porque eu coloquei no
status. Porque não importa ter dinheiro ou essas coisas. Saúde é o que
importa. Eu só tenho minha mãe. Não tenho uma boa família assim.
Não é seu jeito de falar. Em geral, você tem que mudar pra chegar aos seus
objetivos. Como você vai chegar num lugar que só tem rico parecendo um
Não, senhora.
Não, é jeito de falar mesmo. Veio da FEBEM. Era uma forma de respeito.
Batiam e brigavam. Mas é só uma questão de tempo até parar de falar assim.
Volta Seca
I- E quando acontece alguma coisa? Você conta para os seus amigos? Eles te
ajudam?
Eu conto. E eles ficam sabendo porque moram perto também. À noite minha
Normal.
Quando é pra mim eu escrevo. Mandar uma carta para alguém. Mando para os
moleques que estão presos. É normal. Pergunto como que eles estão. Eu
mando para um primo meu que estava lá. Quando eu estava na Fundação eu
I- Tem alguma pessoa que não seja do grupo de amigos que você conversa?
Gosto de fazer uns negócios na rua lá, normal. Das coisas da rua que tem pra
fazer...
I- Sei mesmo. Tem festa, bebida, essas coisas. É disso que você ta falando?
É isso mesmo. A senhora sabe que não tem nada pra fazer, né? A senhora tá
morando onde?
É então. A senhora não pega a avenida, mas pega assim e vai reto. A
fundação você vai ver assim. Uns muros altos, tudo fechado.
Que, o baile é aqui, oh. Do outro lado ali. A senhora que não é daqui não deve
saber.
I- Ah, disso eu sei, que tem o baile. Que juntam umas três mil pessoas.
97
baile depois da meia noite, e volto para casa seis, sete horas da manhã.
I- Aguenta?
I- Na ressaca…
I- Então, você pretende trabalhar em firma. E o jeito que você fala é tranquilo
I- Você sabe?
FRASE do MEEM
Não sei. Pode olhar? Qualquer uma? Vou colocar qualquer coisa, senhora. Eu
senhora.
I- Tenho 26.
I- E eu posso dormir o dia inteiro? Tenho que cuidar das coisas da casa
Professor
Ah, gosto de conversar mais com meu pessoal. Com meus pais, minhas irmãs.
Família. Família pra mim é tudo. Se tiver com algum problema, pode conversar
que me conhece há pouco tempo, não vai ter como a pessoa te ajudar, sabe?
tudo. Ninguém pode vir e falar: “ó seu filho era santinho e tal”. Eles sabem dos
meus pontos fracos e dos pontos fortes. Isso dá segurança. Sentir seguro é
poder contar com a pessoa. Contar que ela pode te dar um conselho, te ajudar.
chorar. Dava aquele aperto no peito. Fui guardando as coisas, fiquei tranquilo.
I- E com os amigos?
rua os caras falam das meninas, de balada. E os caras que eu ando só falam
são os trabalhadores.
acabar essa medida, dois anos já. Não aguento mais. Toda semana, toda
quinta.
Para mim é normal. E a pessoa que se envolve no crime não pensa em roubo o
tempo todo. Pensa em mudar, arrumar um serviço mais pra frente. Os amigos
falam sobre isso, falam que quando tiver apertado, né? Falam que “tirou
cadeia” (sic), tem uns que já foram presos, e não querem mais isso. Aí sai e
não arruma trabalho. Aí tem uns que saem para roubar. Depois que fica maior
de idade é outra coisa, é CDP. Cadeia é pior que Fundação CASA. Tudo na
fundação é melhor que cadeia. Por exemplo, a comida. Na cadeia tem comida
estragada, só nas visitas que não. Tem jumbo, pode entrar com doce, bala, tipo
101
sentado no pátio. Não pode olhar para o lado, nem conversar, se não apanha.
outro.
Tira a amizade, só resta estudar. Lá tem escola. Normal. Dão uns papeis para
ficar fazendo uns textos, umas questões. Professor não é mesma coisa da
conversar com ninguém. Se passar pelo professor e não falar ‘’licença senhor’’,
‘’licença senhora’’, tava arriscado você tomar umas tapas. Ficava para trás, só
com a mão pra trás. Não tinha olho no olho. Os caras eram ruins. A família fez
muita falta. Quando eu saí, desceram algumas lágrimas do meu olho. Só quem
passou por isso sabe. Lá é forte. Eu me libertei já, está passando o ódio.
peguei amizade, ela me trata bem. Eu a chamei de senhora e ela falou para
chamar de professora. Ela disse: “quero te ajudar, foram quase dois anos. Mas
102
você tem que fazer por onde também. Se tiver alguma pergunta, se quiser eu
Mais preconceito, né? Falam que você usa drogas. Inventam uma imagem
totalmente diferente. Na rua mesmo, depois que eu fui preso tiveram uns
vizinhos que viraram a cara para mim. Gente que conheço desde quando
nasci, pois moro lá há 17 anos. Os amigos do meu pai, da minha mãe. Meu pai
me defendeu. Que nem minha tia. Minha tia é assistente social lá do posto, ela
ia em casa. Depois disso, ela não vai mais. Ela mudou. Mudou de posto pra
Porque meu pai vai direto à casa dela. Ela fala pro meu pai: “chama suas
filhas”. Mas, não fala pra me chamar. É minha tia! Fico constrangido. Meu tio é
normal. Meu tio e ela brigam por causa de mim. Ele fala: “porque você não
gosta dele?” Ela fala: “acho que ele é muito bravo, muito agressivo.” Nunca fiz
nada com ela. Sempre que eu to na rua e faço alguma coisa ela vai lá
“caguetar” (sic) para o meu pai e para minha mãe. Aí fica naquelas, né? Ela
acha que eu tenho raiva dela porque ela faz isso. Eu acho que ela tem medo
de mim porque eu sei que ela faz isso. Deve ser isso.
I- Você acha que porque você entrou na fundação rola uma imagem de
bandido?
Rola. É o preconceito. Tem muita gíria. Tem um jeito de lá. Licença senhor,
licença, senhora. Obrigado, Senhor, obrigado, senhora. Até pra você peidar
você tem que pedir licença. É verdade. Não pode peidar. Você tá sentado e
103
tem que pedir licença: “Licença aí, senhor, licença pro gás (sic)”. Tem que falar
“licença pro gás” (sic). Aí você sai, vai ao cantinho, “peida” (sic) e depois volta.
Não é mole, não. Na fundação eu falava mais com as psicólogas, que eram
minhas técnicas. Elas perguntavam minha vida inteira. Elas que faziam meu
relatório. Elas falavam que iam falar o melhor para o juiz, para me ajudar. Até
nos estudos, eu nunca tinha repetido. Era o único momento que eu conseguia
negócios de sonho eu sei lá. Ainda não parei pra sonhar. Penso em ser um
I- E você conversa com pessoas diferentes de você? Você fala do mesmo jeito
São formas diferentes. Eu tento não falar gíria. Tem pessoas que não
entendem, acham feio. Eu não acho feio. Tento adequar. Até com o juiz eu
tento, mas mesmo assim saem algumas gírias. Fiquei tranquilo. Estou focado,
FRASE DO MEEM
104
“Feche a boca”
Vou deixar a mensagem do preconceito. Que eu também sofro com isso. Sou
contra preconceito, seja ele qual for. De droga, de sexo. Hoje eu estava vindo e
ver. Sei lá, deve ser a minha cara. É preconceito. Meu pai fala que sou
Preconceito não pode. Mas você está passando na rua, aí um ‘’veado’’ (sic)
Gato
I- Eu falei que sou Fono, antes de começar a entrevista, e você me falou que
O gago é meu primo. Ele fala meio assim [imitou como um fanho: saca ao invés
de faca e fica zi zi zi] Ele tem doze anos. O pai dele não sabe de fono não.
I- Eu falo então da comunicação. Queria saber mais sobre isso na sua vida.
I- Vocês são intelectuais, então. Todo mundo que eu pergunto isso diz que fala
moram perto. Eu moro numa fazenda. Aqui perto, pra baixo. Tem porco,
galinha, pato, tem cavalo. Mas eu não faço as coisas não. Quem cuida é meu
Moro com meu cunhado, minha mãe, meu padrasto e meus irmãos.
A escola é legal, né? Tem ensino bom, tem amigos que você conhece.
são bem atenciosos. Porque o que eu não sei eu pergunto, e eles respondem.
I- E sobre o que você pergunta? Geralmente a gente pergunta mais do que nos
perguntava.
respondem.
106
I- Que legal! Parece boa sua escola. Tem tanta gente que reclama que o
Não explica para quem não tem atenção. Na sala tem que prestar atenção no
I- Outra coisa que eu quero saber: gíria. Você fala muita gíria? Comigo você
não está falando nenhuma gíria. Geralmente você fala com seus amigos?
I- Por que você fala com seus amigos e comigo você não fala gíria?
I- Ah, então quer dizer que quem fala gíria é mal educado? Se eu falasse gíria
I- Palavrão, então, se eu falasse ‘’foda’’ aqui ia ser a pessoa mais mal educada
desse mundo?
Lógico.
Porque eles falam comigo e eu respondo do jeito que eu sei a gíria. Mas é
assim: quando eu falo com uma pessoa educada que não fala gíria aí eu falo a
Também.
I- É. Nunca tinha pensado nisso. Porque quando eu estou com meus amigos
Lógico.
I- Que gíria vocês falam? Fala uma gíria legal, aí. Eu aprendi uma legal que to
É um “juriti” (sic). Sabe o que é juriti? Quando a pessoa não sabe de nada. Um
I- Cu de burro?
É. A pessoa que não sabe de nada. Não sabe nem o que está acontecendo.
108
I- É mesmo. Tem muito juriti por aí. Você já conheceu muitos juritis nessa vida?
É a pessoa que vai lá. É assim: nós fazemos uma rodinha e quando um não
tem, nós fortalecemos. Uma rodinha de amigo. Nós inteiramos. Fazemos uma
Dá uns 10, 11, 14 meninos. Isso quando um não tem. É isso que fazem, para
vinho, suave. Catuaba, vodka com gelo de coco. Eu bebo aquelas bebidas que
pegam fogo. Tem uma que você coloca no copo e você ascende. Aí sacode, aí
toma de novo e pega fogo. Eu tomei dez doses assim seguidas. Eu aguento.
No meu aniversário eu tomei sete ou oito Icecola. Tequila, batida, cariri com
mel, menta com 51. Caipirinha de maracujá, limão, kiwi, morango. Bebo na rua.
Com os amigos. De vez em quando tem música. Nós bebemos na rua mesmo.
I- Você passou pela fundação? Como era o jeito que você conversava lá?
Passei. Tinha vários “jatobás” (sic), “mente blindada” (sic). A maioria era
malandro.
Fiz.
Era suave, normal. Era normal, Eram mulheres. Tinham uns meninos que
davam problema. Mas comigo era de boa. Fiquei oito meses lá. A juíza falou
que eu ia sair com seis, mas fiquei oito meses. Foi de boa, tranquilo. Tirando
I- Saiu revoltado?
Ficar oito meses lá? Quem gosta? Só uma vez por semana recebia visita.
Quando tinha visita. Saía para quadra e era só terra, não tinha nem chuteira.
Meu futuro ainda vai ser longo. Arrumar um emprego, arrumar uma mulher “da
hora” (sic). Larissa está nos meus planos. Uma menina responsável, que não
Ah, do jeito que eu falo com as pessoas agora, aí vai. Na gíria, não.
I- E você entende tudo que falam com você? Na escola, aqui, na fundação
você entendia?
Entendo, ué.
FRASE do MEEM
111
“Deus é fiel”
I - Com você, Deus nunca falhou? Os oito meses que você ficou na fundação
foram os piores da sua vida, ou teve coisa pior? Você pode me contar?
Teve, sim. Quando eu fiquei parado no tempo, sem ninguém para conversar,
sem nada, sem ninguém. Dos meus sete a oito anos. E eu não falava com as
alegre.
Comecei a falar mais com as pessoas. Aí mudou. Esse tempo foi pior que os
Não, só quero que você ajude a gente se comunicar mais com as pessoas.
atendimento todo?
I- Já, inclusive até no xaveco. E você já encontrou alguma pessoa mais velha
Eu não. Tava com vergonha no começo. Não sei o porquê, porque muda o jeito
Boa Vida
Com meus amigos. São muitos. Mais de trinta. O mais próximo é essa menina
ficava olhando um para o outro. Aí ela não tomou atitude e eu fui lá e comecei
Sou nada. Tenho vergonha. Ela é um pouquinho bonita. É gente fina. A gente
Sim. Gosto de conversar com a Larissa. A gente fica fofocando da vida dos
Não. A gente se fala, mas a gente briga muito também. Nós dois já brigamos
de faca. Pareceu uma luta de espada: um puxou o facão daqui o outro puxou a
facão dali, aí entrou outro louco pra tentar separar: meu vizinho. Esta marca
pontinha da faca aqui. Eu joguei a faca, mas não pegou, ficou pendurada na
Do meu pai. Ele tá no Ceará. Ele é cearense. Eu já morei lá. Não gosto de lá
não.
Cangaceiro…
I- Ele é cangaceiro?
Porque quando ele tava lá era só dar 5 minutos para eu apanhar dele. Foi feio.
Pior que apanhar da minha mãe. Foi com de vara de pescar. Eu estava
pescando, aí deixei o peixe escapar, aí ele pegou a vara e foi direto nas costas.
Eu tinha cinco anos. Mas não doeu não. A facada da minha mãe também não.
I- Ah, então foi por isso que sua mãe te bateu. Ela estava sóbria?
Estava nada, ela estava na “brisa” (sic) dos comprimidos. O olho dela estava
tão pequeno que eu nem vi a pupila. Só sei que eu joguei a faca e não pegou.
Era pra ter pegado bem aqui do lado do olho. Era aqui que eu queria que
pegasse. Mas passou reto. E nem fizemos as pazes. Nós estamos brigados até
hoje, mas nós nos falamos de vez em quando. Quando a gente quer brigar, um
114
E já tivemos muitas brigas. Já tentei matar minha mãe e meu padrasto. Mas
não consegui. Coloquei veneno na comida, mas o bicho não morreu. Comeu e
não morreu. Ficou com febre, mas não morreu. Ele descobriu. Ele não fala
comigo porque tem medo. Tentei matá-lo porque não gosto dele. Ele xinga
Lá no Grimaldi, sozinha.
I-Não gosta? Está sendo uma tortura pra você conversarmos agora? O que
Nada.
É.
Na fundação era tranquilo porque não podia conversar. Tinha que ficar calado.
Se falasse, apanhava. ‘‘Ia pro couro” (sic). Na aula até que eu podia falar. Mas
eu gostava de ficar quieto. Ensinam a gente ficar quieto. Foi lá que eu aprendi
a ficar quieto, mas eu não era quieto não. Eu parecia um papagaio. Falava de
própria fala. Quando eu fui preso eu entreguei tudo que eu já fiz. Até o
idade, que agora estão presos. Fiquei 15 dias na fundação, parecia que tinha
tinha passado por aquilo. Apanhei muito. Os maiores de idade jogam a culpa
para os menores, mas eu não assumi a culpa por eles. Fui até a delegacia
falando que não tinha sido eu. Quando apanhei pela segunda vez, eu entreguei
todo mundo. Falei das “bucha” (sic) deles e das minhas. Eles dois estão
presos. Eu os visito na prisão. Não tenho medo deles. Apanhei da polícia como
que trazer um homem corajoso aqui. Foi feio. Eu achei que ia de boa sem
puxão de orelha, bica na bunda. Hoje eu não sinto mais nada, mas quando eu
banco.
Continuou. Sei onde todo mundo mora. Mesmo sendo muito ruins, ainda são
melhores que minha mãe. Vê num banco como eles são. Eles vão pra cima.
Armados mesmo. Ponto 40, ponto 50. Uma Glock nove milímetros. Mata
I- A pessoa nunca é 100% ruim né? Todo mundo tem seu lado bom e seu lado
ruim.
música sertaneja]
Gosto nada. Gosto só de funk e “proibidão” (sic). Tipo MC Kauan, Coringa. Não
anjo. Meu cabelo já teve todas as cores do arco-íris: roxo, azul, amarelo, rosa,
preto, laranja.
I- Você estuda?
Estão tentando me mandar pro Romeo. Mas eu não quero ir para lá. Só rola
drogas lá dentro. Se eu for pra lá eu não vou aguentar. Vou usar. Estou
tentando parar, aí me mandam pra uma escola pra eu usar? Mas os traficantes
do Romeo são meus amigos. Eu prefiro ir pro Haroldo mesmo. A diretora era
I-E Com esses amigos do Romeo? Você falou que tem bastantes amigos que
G- Dois anos.
resolver eu resolvia na hora da saída. Batia não, mas já ia com a ‘’peça” (sic)
G- Muitas vezes não. Aquele impeachment da Dilma. Não entendo, não sei o
ler, mas tenho que ler duas vezes pra entender. E eu não entendo gibi. Agora,
I- Entendi. Seu entendimento é de acordo com o que você lê, não é? E sobre o
assunto?
Não entendi nada. Eu já fui até atrás do prefeito. Para tentar saber. Não o
I- Outra coisa, você falou que quando pega um livro ou gibi e não entende.
Não. Tenho dificuldade em entender o que li, isso é desde pequeno. Cheguei a
inteligente.
I- Ah, mas se não tem uma pessoa inteligente por trás do celular, não daria
certo.
Não, mas tem texto inteligente. Se eu erro, já aparece uma palavra certa.
I- Mas saber escrever não tem a ver com acertar palavras. Você tem que
formar frases…
Deixa pensar com quantos anos eu aprendi ler e escrever... foi com dois anos,
por aí. Aprendi a ler com cinco anos. Foi com minha avó. Ela me ensinou. Ela
quando ela pegou o cinto, coloquei o livro assim e fui lendo. Aprendi na hora.
E sobre gíria?
119
Não falo gíria. Não gosto. Nem com a Larissa. Com mulher eu não falo gíria.
falo comigo mesmo, na minha escola e na rua. Só falo gíria com traficante.
Porque ele já sabe que quando você fala gíria, você é malandro.
I- Então, você sabe muito bem falar com quem você quer chegar? Com quem
Claro. Com a Larissa, Giovana, com minha mãe. Com minha mãe eu falo gíria.
Ela não. Foi meu vizinho. Que ela não tem “proceder” (sic) não. Ela não tem
Claro que tem. Eu não tenho proceder não. Não tenho proceder com ninguém.
I- Você tem sim. Está me tratando com respeito, falando o que pensa... Isso é
ter proceder, não é? Outra coisa: o que você pensa para o futuro?
Agora você me pegou. Tem muita coisa ainda. Já quis ser MC, já fiz música e
nem fez sucesso. Já toquei com o X [SI]. Você acha que eu não sei tocar? Na
120
Claro que não, só quando vou fumar um baseado. Só toco Natiruts. Já toquei
rap no violão só que não deu certo. Racionais, 13 D... Já tentei tocar funk no
violão, já tentei tocar tudo, mas nunca deu certo. Já lancei no YouTube. Uma
Já fui de tudo. Já fui rico, hoje sou pobre Já tive meus cinco minutos de fama.
Já fui traficante. Pior que já... Já tive um Prisma, já tive uma 150, já tive uma
casa. Já tive uma família inteira construída. Joguei tudo pro alto. Porque minha
outra avó falou assim: ‘’você escolhe ficar aqui ou escolhe as drogas’’. Aí quem
eu escolhi? Meu pai já tentou se matar por causa de mim. Lá mesmo no ceará.
Chegou a pegar a arma, apontar para cabeça, dar tiro, e a arma não atirar. E
meu pai tentou se matar porque estou seguindo o exemplo dele e da minha
mãe.
nem sabia onde eu estava. Nem sei como cheguei em casa. E eu continuo
I- E você acha que do jeito que você fala você vai conseguir atingir seus
objetivos no futuro?
Pior que não. Não quero saber de nada. Eu não faço investimento nisso. Em
vez de eu investir nisso eu invisto nas drogas. E parar de usar é muito difícil.
Claro que não! Eu guardo o dinheiro. Porque chega no fim do mês, minha mãe
não me dá dinheiro. E nem eu dou dinheiro para ela. Desde muito tempo é
assim.
I- Na conversa com a técnica você disse que já morou na rua. Por quanto
tempo?
Já. Por cinco dias só. Ficar na rua é passar fome, sentir frio, não ter nenhum
lugar para ficar. E eu estava sozinho, aí juntei num amigo. Fiquei com ele. Eu
entrava no mercado. Era fazer isso ou passar fome: um dos dois. E não ficava
I- Você tinha falado que antes da rua você estava em um abrigo. Por que você
fugiu de lá?
Vou contar desde a barriga da minha mãe. Prepara os ouvidos porque eu vou
ficar aqui dois anos contando minha história. Quando eu estava na barriga da
minha mãe ela usava todo tipo de droga: cocaína, crack, lança, farinha, tudo.
Por isso que eu nasci assim: já dependente químico. Assim que eu nasci, fiquei
internado dois meses porque faltava sangue pra mim. Aí eu fui crescendo.
Quando cheguei à fase dos quatro anos eu tive rubéola, que é aquela bolinha
que nasce na pele, e catapora. Isso mesmo. Quando eu fiquei com catapora
fiquei com febre na cama. Curei sozinho, minha mãe não cuidou nada. Quando
eu fiz cinco anos, meu pai foi embora. Ele falou assim para minha avó: ‘’mãe,
pega esse menino da favela porque ele não serve para isso não, ele tem que
ficar aqui’’e saiu. Aí, quando eu fiz nove anos, ganhei uma moto e um prisma.
Veio lá do Ceará. Aí chegou num caminhão cegonha. Lembro até hoje. Mas
voltou. Eu quis ficar na vida das drogas. Desde aquele dia, desde os nove
123
maconha. Eu usava na rua mesmo. Não tinha cigarro pra fumar, aí eu fui à
biqueira e falei: ‘’tem cigarro do verde aí?’’. Ele falou: ‘’tem’’. Eu falei: ‘‘me dá
um?’’. Ele falou: ‘‘tem que bolar, você sabe, não é?’’. Eu falei: ‘‘Como que faz
isso?’’. Aí tá. Aí quando fiz dez anos, foi minha primeira baforada no lança. Aí
aos onze anos fui para cocaína. Doze, já estava usando LSD na veia, pra
injetar com cocaína. Aí minha vida acabou e até hoje eu não tenho mais
Drogam nada. Aqui, ó. Tem até a marca da cocaína no celular bem aqui.
I- Mais alguma coisa? Nesse tempo, você já passou por dois abrigos, né? Não
Todo mundo usava. As pessoas preferem julgar a ajudar a outra. Tipo assim: a
sua rua tem “zé polvo” (sic)? Pessoal que fica de olho, fofocando da vida dos
124
meia noite estão todos com as janelinhas abertas. Aí você pega o rojão e só
no outro dia ele chega com o cabelo todo queimado e você fala assim: ‘’o que
foi isso?’’ Aí ele: ‘’então foi você que jogou o rojão em mim?’’ Todo mundo já
sabe e fala: ‘’Ê, Zé polvo! Tava Zé polvando” (sic). Lá em casa tem um estoque
Tem muita gente para julgar, mas ninguém para ajudar. Que nem outro dia...
coloca o copo de cachaça em cima, né? Que é o copão todo. As crianças vêm
jogar. Aí tem uma menina que falou para o pai do moleque: ‘‘Estão dando
bebida lá pro seu filho’’. Sendo que o copo tava parado, né? A gente nem tinha
falando assim: ‘’você está dando cachaça pro meu filho, é? Vagabundo’’. Aí,
Minha mãe, minha avó, minhas irmãs, meu pai, meu padrasto... Todo mundo.
Minha mãe fala que eu sou um “nóia” (sic) da vida. Eu falo: ‘’nóia’ (sic) era você
que usava pedra, eu não uso pedra’’. “Nóia” (sic) é quem usa pedra, não quem
usa maconha. Maconha é legalizada, vende na padaria já. Até na farmácia tem.
Claro que julgam. Falam para o juiz tudo que eu faço. Na Fundação me
julgavam. Mas eu ficava quieto. Eu não tinha direito de falar nada. O que eu
Não está. Se bem que, pior que está sim. Porque eu estou falando tudo que já
aconteceu comigo. Você agora pode estar pensando na sua cabeça: ‘‘esse
Vixi. Você ainda é adolescente. Tem uns 20. Você é adolescente ainda. Até os
20 ainda é. Porque dessa coisa que você é... Esse bicho ai mesmo:
fonoaudióloga.
I- E você acha que nunca fui então? Já fui, já fiz muita “cagada” (sic).
Só não fez mais que eu. Você já matou uma pessoa para ganhar cinco mil
reais? Viu? Mas ainda não aceitei. Cheirou cocaína já? Viu? Maconha você
I- Você se julga?
Eu não. Quem pode me julgar é Deus ou o Diabo. O diabo porque eu sei que
vou para o inferno. Todas as besteiras que eu já fiz. Não vou me redimir não.
desejo o mau para os outros. O que me faz mal tem que ser pago com mal.
Parte do MEEM:
I- Agora a parte das continhas. Pensa em dinheiro que é mais fácil. Você tem
Eu tenho vontade de entrar no exército. Para entrar no exército não pode ter
sido preso, não pode ter tatuagem. Eu tenho um coringa aqui. Para servir o
crime, para saber tudo. Quero ganhar dinheiro. Se eu quero ser do crime, eu
FRASE MEEM
“Romeu e Julieta, vamos lá.” Ser ou não ser, eis a questão. Você nunca
Não sou. Não sou egoísta. Eu não sou chato. Eu sou humilde e sou quieto.
Quieto em primeiro lugar. O que eu sou? Sou nada além de Deus. Deus é mais
que meu pai. Meu pai celestial. Olha que eu sou espírita e eu nem creio em
minha avó é a Maria Padilha, meu tio é o Exu. Exu diabo, sete facadas, Exu
mirim. Quando entrou santo em mim, nós fomos logo para o centro. Entrou o
beber e fumar. Deus continua sendo meu pai. E ele não tenta me tirar da
confusão não, ele não gosta de mim, tia. O Diabo agora deve ta rindo lá
Desenho
A Giovana.
A Vitória. Minha filha. Tem um ano. Não te falei. A mãe é uma doida do São
Mateus. Ela nem fez DNA ainda para saber se é minha. Ela não vai nem saber
meu nome. Quando eu vou fazer uma coisa errada eu logo penso: “tenho uma
menina pra criar”. Isso me segura. Já me segurou muitas vezes. Tipo, tenho
128
que brigar com alguém, aí você pensa que tem uma pessoa pra você criar. Aí
Que o crime não compensa. Porque uma hora você tem muito dinheiro, outra
hora você pode ir pra dentro do caixão. A morte pode chegar a qualquer hora.
Só penso que se Deus quiser fazer um mundo melhor, tem que parar com o
crime.
Sim. Olham com medo. Ninguém quer conversar comigo porque tem medo.
Até meus amigos me falaram isso. Todo mundo tem medo. Quando estou
passando perto de uma pessoa, uma mulher com a bolsa assim, aí a mulher
Não sou disso não, minha filha. Sou tranquilo, sou daqui mesmo. Se eu
quisesse roubar eu roubava coisa grande. Ia ser esse pessoal coreano, que
Sem-perna
Cara de espanto, tipo: 'sem noção', 'por que ele fez isso?', 'nossa que menino!'.
I- Você entende tudo que as pessoas falam com você? Tanto na escola,
Tipo, só nos acento, nas palavras que não sei ainda escrever, ainda no
português.
Pra ser sincero, com Deus, mano. Todos os momentos. Mas, de ser humano
professores. Quando estou bravo, gaguejo muito. Na minha rua tem um cara
que me chama de gago. Deve ser porque meu pai é gago, meu tio também e
entendem?
Nem em todo lugar eu falo do jeito que falo, em casa eu falo normal. Com a
namorada eu falo diferente, mais educado. Na rua já falo usando gírias. Com
certas pessoas, sou arrogante, já boto os pingos nos 'Is'. Com certas pessoas
já falo nas gíria, com quem conheço. Mas, não sou de falar gíria assim. Com
minha mãe falo gíria. Quando vou numa entrevista de emprego já sou bem
diferente: já vou treinando no ônibus, mas antes ficava todo nervoso. Acho ruim
falar gíria. Por exemplo: "zú é zuado; masseio é mentiroso; mano; irmãozinho;
Eu tento ser o mais educado possível. Diferenciar meu modo de falar. Ao invés
É assim: seu “cuzão do carai” (sic.) (risos). Tem hora que nós estamos
Não me sinto bem com todos. Porque amigo nós temos, mas nós não sabemos
I- Você acha que a sua comunicação vai te ajudar a atingir seus objetivos para
o futuro?
Acho que não. O jeito que eu falo na gíria não vai me levar a lugar nenhum. É
Que apesar do jeito que a gente fala, anda e se veste, isso não quer dizer
nada. Nós todos somos iguais. A gente não é mau elemento. Quem não é de
estar com a gente do dia-a-dia fica até com medo de falar com a gente. Fica
Que é pura verdade! Preso nós somos esquecidos, ninguém lembra da gente
lá dentro, quando a gente morre todo mundo lembra de nós. Foi um preso que
Eu acho que é fazer a diferença só, no mundo. Eu gosto dessa frase e é muito
João Grande
I- Você entende tudo que as pessoas falam com você? Tanto na escola,
entendem?
Muitas não. Eu sei a ocasião que eu posso usar gírias. Como quando estou
Normal.
Normal também. A mesma coisa em todos os lugares. Sou uma pessoa só.
I- Você acha que a sua comunicação vai te ajudar a atingir seus objetivos pro
futuro?
Claro que vai. Porque to mostrando quem realmente sou. Não sendo uma
pessoa falsa, sem demagogia. Se eu sou uma pessoa com você, sendo outra
Abacaxi ao vinho
Querido-de-Deus
Não
I- Você entende tudo que as pessoas falam com você? Tanto na escola,
Não entendo muito não. Tipo assim, você tá explicando e você tem que
ignorante.
entendem?
falam gíria.
eles falam muito e isso me cansa. Minha relação com a família não é muito
boa. Converso, às vezes com meu pai, dificilmente. Brigamos muito, porque ele
tem uma mulher e a gente não se dá bem. Ela é muito ruim. Minha mãe foi
I- Você acha que a sua comunicação vai te ajudar a atingir seus objetivos para
o futuro?
Sim, eu acho.
135
Saudade dos velhos tempos dos velhos momentos que se foram com o tempo.
Pirulito
Não. Porque só ando com pessoas que falam gíria. Então, não é estranho.
I- Você entende tudo que as pessoas falam com você? Tanto na escola,
Entendo, normalmente
entendem?
Falo do mesmo jeito que falo na rua. Na gíria, na mesma forma. Não muda
nada.
Entende bem. Não, mas não me sinto bem com eles porque eles conversam
amigos falam disso desde criança. Já na minha família eu falo sobre tudo.
I- Você acha que a sua comunicação vai te ajudar a atingir seus objetivos para
o futuro?
Não porque eu uso muita gíria e tem lugar que não entra gíria. Não sei explicar
isso.
Profissional 1
Tem uma questão com alguns adolescentes que é pensar nos dois anos de
internação fora do território e quando ele volta está tudo muito diferente: alguns
diálogo. São muito objetivos, falando ‘é’, ‘não’, ‘tá suave’. Mas, tem uma coisa
que é fazer o atendimento aqui nesse espaço. Isso deixa os meninos assim:
‘Ela precisa ouvir isso’. Quando você sai para alguma atividade externa com
várias coisas. Só que quando está dentro da sala do atendimento é desse jeito.
coisa. Então, acho que tem a questão do espaço: pensar em uma sala de
atendimento. Que tem a ver com a relação dele com o atendimento, que é para
cumprir a medida. Então, quando você sai para fazer o atendimento é outro
espaço. Para isso, a gente pensa em sair com os meninos, quando você está
construindo o vínculo. Porque eles vêm muito com a visão da Fundação CASA.
Mas, como você vai dar algumas informações quando o adolescente está
138
relação às medidas, então isso acaba sendo repetitivo e você fica com uma
visão daquele adolescente. Fora, tanto você quanto ele conseguem pensar em
outra maneira a respeito das coisas. Você muda sua visão sobre ele.
Profissional 2
essa ideia de que não sou polícia, ou como o pessoal da Fundação CASA.
trabalho. Que não está aqui para prejudicar esse garoto. Depois, com os
técnicos: dele entender que a equipe está do lado dele. Quando fui para UBS,
para fazer as oficinas lá, mudou também. Tinha que pensar como integrar a
mim, a UBS, o CEDECA em todo esse espaço. Porque era um lugar estranho
para eles. Não tinham o costume de frequentar lá. Antes, eu fazia a construção
que os meninos queriam. Me pediram para fazer pipa e fizemos por bastante
tempo. Após o processo de mostrar quem eu sou, que você consegue ter uma
Por mais que a oficina tenha o objetivo do menino construir algo, está para
além disso. Está para que o menino consegue discutir em cima disso. Então,
tem a liberdade de não focar só na atividade. Com o diálogo que eu tenho com
converso com ele é mais natural, de trazer um pouco de mim, do que penso.
139
Onde eu moro é outra coisa, que é no samba na laje. Eles ficam: ‘Ah, você
mora lá?’ Porque sabem que também não sou besta. Eu entendo das coisas
[da comunidade]. Nunca tive um olhar diferente para eles, desde quando entrei
Nunca olhei como menor infrator, delinquente. Alguns eu até falo: ‘você tem
que entender que é algo que você fez e não o que você é’. O meu olhar
sempre foi dessa forma. Nunca julguei, apontei. Sempre tento entender qual é
Profissional 3
têm uma linguagem própria deles, de grupo. Que eles utilizam nas ruas e em
são poucas palavras. Eles reduzem muito as falas em poucas palavras. Fico
dificuldade, mas eu procuro não falar como eles. Acho que não vai acrescentar
explicam sem problema. Acho que assim tem uma aproximação, porque ao
do que estão fazendo, se estão indo para escola, para o funk, para praça,
mesmo o contexto familiar também trazem. Eles falam da forma deles, mas não
deixam de falar. Comigo eles não falam palavrão porque acho que eles sabem
para quem eles falam. Também, eles falam muito aquilo que a gente quer
a maioria fala que não. Aí, eu começo a puxar a quantidade, os problemas que
isso gera.[...] O que choca é pensar que eles continuam, que lá fora é muito
mais intenso. Aqui a gente está só uma vez por semana. Às vezes, mora em
uma situação de precariedade é tão grande que não tem como imaginar como
sobreviver a isso. Isso desanima, pois é difícil reverter isso. Para alguns eu falo
que o tempo de vida nesta vida é menor. Quando morre algum deles a gente
fica mais agressiva assim, de perguntar se é isso que ele quer. Mas, é mais um
desabafo meu do que ele processar essa informação. Talvez, em algum tempo
Profissional 4
mais fácil, pelas gírias, coisas que trazem, como nomes de ruas. Eles não
sabem que sou da comunidade por me verem na rua ou por conhecerem minha
para buscar outras coisas. Para outros, pode ser como estar perdida por aqui.
Mas, acho que a maioria não, porque muitos eu conheço desde a infância e
Profissional 5
Para mim, a linguagem muda em diferentes lugares, por mais que o idioma é o
ter a vivência de rua, já que a adolescência inova a língua. Então, você tem
que ser um pesquisador do próprio idioma. No meu caso, que andei de skate,
diversidade. Os espaços para isso são com os próprios adolescentes, por meio
educador [quando dá aulas], minha forma de expressão precisa ser muito mais
formal, para atingir mais pessoas. Então, atrelado ao conteúdo que tenho que
passar, utilizo uma forma mais formal. No contato direto, eles vão trazer qual é
a melhor forma de me expressar para conversar com eles. Pois, de acordo com
tenho que entender qual é a melhor forma de me comunicar com ele. Isso abre
portas. Tanto que em alguns espaços as pessoas me escolhem por saber falar
com o magistrado até o cara que está na rua. Isso é interessante e às vezes
pesa. Pois, você sempre é a voz nos lugares. Falar como igual não é me tornar
igual. A questão é que nunca vou falar igual, pois a língua é algo fluido. Tem
142
que soar natural. O que me qualifica estar na rua é estar na rua, que faz parte
momentos em que as gírias são diferentes, eu vou até o meu limite. Se não,
outro patamar em relação a eles. Você nunca pode nivelar por baixo para ser
igual. A busca de se comunicar seria tornar aquela ação comum. Se não, você
linguagem é muito mais fluida. Na oficina, quando se tem uma ação comum, te
efeitos das drogas no cérebro e como fazer para prevenir tais efeitos. Então, eu
poderia aplicar esse conhecimento técnico e sair da posição de juiz para uma
como um suposto amigo. Onde ele pode falar tudo que faz que eu não faria
nada. Como em um dia que eu fui fazer uma visita e o adolescente me contou
fingia para a mãe que ia buscar emprego. Isso me deixou em crise, porque eu
não sabia como lidar com isso. Não posso aceitar, mas também não quero
denunciar. O que eu fiz, nesse caso, foi conversar sobre o projeto de vida:
fazer ele imaginar no futuro e em qual projeto que ele tem para chegar ao seu
objetivo. Eu não tinha outra saída alem da reflexão. Uma vez passei por uma
situação polêmica com um cara que era do tráfico e não queria sair dessa
143
situação. Fiz uma reflexão com ele sobre o quanto ele ganha e onde quer
chegar. Calculamos o quanto ele ganhava no tráfico e disse que se ele gosta
de vender drogas, ele vende qualquer coisa. O problema disso foi que a equipe
disse que eu estava gestando o dinheiro do trafico. Pois, se ele contasse para
adolescente, criar um vínculo, e depois saber o que fazer com essa informação
que você escuta. Isso mudou minha forma de lidar com alguns adolescentes,
isso, saí da função de técnico e fui para a área da cultura. Cheguei ao meu
limite.