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O ESTRUPO ENQUANTO CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

ALVES, Valquíria Francisca.


MAIA, Pâmela da Silva.
PADOVAN, Dayanne Silva dos Santos.

INTRODUÇÃO

Através da lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 foi alterado substancialmente o


capítulo I e II do Código Penal, trazendo como uma das novidades, a pauta do
crime de Atentado Violento ao Pudor, trazido anteriormente no antigo 214, do
Estatuto Repressivo e foi incorporado ao art. 213 do Código Penal, apontando a
distinção entre o Estupro e o Atentado Violento ao Pudor. No art. 213 do Código
Penal se traz a seguinte redação: Constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se
pratique outro ato libidinoso.

Infere-se da nova redação que a vítima de estupro deixa de


ser exclusivamente mulher para abranger qualquer pessoa, isto significa que a
rigor o homem poderá ser vítima de estupro.

No sistema anterior não se imaginava que o homem seria


constrangido por uma mulher para ter com ela conjunção, se isto ocorresse, o
que era pouco provável, a mulher responderia pelo crime de constrangimento
ilegal.

Hoje a mulher que constranger o homem a manter com ela


conjunção carnal o crime se adequará perfeitamente ao art. 213 do Código
Penal, pois o tipo penal descreve expressamente que a vítima será alguém.
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Especificamente, o tipo penal exige que alguém mediante


violência ou grave ameaça tenha conjunção ou pratique ou permita que com
ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

Note que ter conjunção carnal normal não é crime, o delito


estará caracterizado quando alguém mediante o emprego violência ou grave
ameaça obrigue a vítima a ter conjunção carnal ou praticar ou permita que com
ele se pratique ato libidinoso.

Constranger significa compelir, obrigar, forçar ou subjugar a


vítima a praticar o ato libidinoso ou a ter conjunção carnal. Não haverá o crime
se a conjunção carnal for consentida, salvo quando o consentimento for viciado
em razão da idade, enfermidade, doença mental ou qualquer forma de reduzir
a capacidade de resistência da vítima (art. 217-A, do CP).

Quanto a violência, o autor deverá utilizar-se de violência


física (vis absoluta), ameaça (vis compulsiva) coagindo moralmente a vítima.
Esta ameaça pode ser própria ou contra terceiro, na hipótese em que a mãe da
criança é coagida a ter conjunção carnal com o agente enquanto ele ameaça a
matar o filho da vítima caso ela não mantenha conjunção carnal com ele.

A contravenção de vias de fato e o crime de lesão leve serão


absorvidos, ou seja, o crime e a contravenção penal são meios necessários para
que o agente chegue a consumação do delito.

Como anteriormente mencionado, a falta de consentimento


é um elemento essencial para que ocorra o crime de estupro. Mas o contato
físico nem sempre é necessário para sua caracterização. Embora seja
consolidado o entendimento do STJ no sentido da necessidade de contato físico
para que ocorra o delito, pensamos que o fato deverá ser analisado caso a caso.
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Imaginemos que o autor constranja a vítima a masturbar-se enquanto ele


permanece exercendo atividade meramente contemplativa.

Note que não houve contato físico entre a vítima e o agente,


mas o crime foi consumado no instante em que o agente coagiu a vítima a
praticar atos de libidinagem sobre o seu próprio corpo. Assim podemos concluir
que a vítima poderá agir de forma ativa, passiva, ativa e passiva, isto significa
que o crime estará caracterizado quando o agente obriga a vítima a praticar
atos nele ou quando constrange a vítima a permita que nela se pratique e por
fim quando o agente obriga a vítima a praticar atos de libidinagem sobre o
corpo dela. A postura da vítima em síntese seria a de permitir que nela ou
sobre ela se pratique e por fim quando o agente a obriga a praticar nele o ato
libidinoso.

CONCLUSÃO

Quando estudamos o crime de estupro é preciso tomarmos


cuidado com a intervenção desmedida do direito de punir do Estado, pois
dependendo do caso poderíamos aplicar uma pena de 6 anos para quem
desejasse apenas brincar, humilhar ou sujeitar a vítima a um vexame qualquer.
Nesse sentido, o beijo não é necessariamente crime de estupro, isto significa
que nem sempre o ato libidinoso será um crime de relevância, podendo assim
caracterizar uma contravenção penal (importunação ofensivo ao pudor), um
crime de constrangimento ilegal ou até mesmo uma injúria real.

Com a atual redação o crime de estupro passou a ser


considerado crime comum, pois qualquer pessoa poderá ser vítima do delito,
assim tanto a mulher quanto o homem poderão ser sujeito passivo do crime
descrito no art. 213 do CP.
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Novamente, neste ponto necessitamos ter cuidado, pois


ainda prevalece a ainda que o crime de estupro praticado na forma de ter
conjunção carnal obrigatoriamente deve ser cometido na relação
heterossexual.

Explico. Não é possível que uma mulher seja autora de


estupro sendo vítima outra mulher, pois nesta hipótese estaríamos diante de
uma relação homossexual. Como fica então a situação da mulher de constrange
um homem a manter conjunção carnal com outra mulher?

Se considerarmos que o crime de estupro nesta modalidade


é crime de mão própria, não é possível atribuirmos à autoria do crime a mulher,
pois na modalidade de crime de mão própria a condição pessoal do autor é
indelegável ou intransferível.

Para evitar a impunidade, Raúl Zaffaroni lança mão da


autoria de determinação, preconiza o ilustre doutrinado que a mulher não é
punida como autora do crime de estupro, senão que se lhe aplica a pena do
estupro por haver cometido o delito de determinar o estupro. Tal raciocínio não
se afasta da ideia da coação moral irresistível, nos termos do art. 22 do CP.

Aproveitando-se do momento de autoria ou concurso de


agentes, é possível autoria, coautoria ou participação no crime de estupro,
desde que estejam presentes os requisitos do concurso de pessoas (pluralidade
de pessoas, relevância causal, liame subjetivo e identidade de infrações).

Com relação ao momento consumativo, o crime se perfaz


quando o agente introduzir total ou parcialmente o pênis na cavidade vaginal
da mulher ou praticar ou permitir que com ele se pratique qualquer ato
libidinoso.
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Neste ponto, é fundamental observarmos que existe quem


defende a impossibilidade da tentativa do crime de estupro, pois se não houver
a conjunção carnal haverá no mínimo a prática de atos libidinosos.

Realmente, esta discussão havia antes de adotarmos a teoria


finalista da ação. Hoje é impossível concluirmos pela inadmissibilidade da
tentativa de crime de estupro, basta pensarmos no sujeito que rasga a roupa da
vítima com a finalidade de ter conjunção carnal com ela, mas no instante que
iria introduzir o pênis na cavidade vaginal da vítima a polícia chega. De fato,
antes da conjunção carnal houve necessariamente um contato físico que
caracterizaria ato libidinoso, mas tais atos foram necessários para que o agente
pudesse consumar a conjunção carnal.

Já a respeito do elemento subjetivo, o tipo penal exige que o


agente atue dolosamente, isto significa que não há modalidade culposa do
crime. Mas atenção, o tipo penal não exige uma finalidade específica, basta que
o agente tenha conjunção carnal com a vítima ou pratique ato de libidinagem.
REFERÊNCIAS

1.2 Das Formas Qualificadas.

Antes da alteração promovida pela lei 12.015/09, o crime de


estupro qualificado necessitava da combinação com o art. 223 do Código Penal.
O dispositivo tornava qualificado o crime quando da violência resultasse lesão
grave e quando do fato ocorresse a morte da vítima.
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Agora contrariamente do que ocorria no revogado art. 223, o


legislador previu expressamente que o crime será qualificado quando da
conduta do agente resultar lesão corporal grave ou morte da vítima.

Assim, não importa se o agente atuou com emprego de


violência ou grave ameaça, a fim de levar a efeito o estupro, se, dessa conduta
resultar lesão corporal de natureza grave ou morte, deverá o agente responder
pelo crime qualificado.

Tomemos como exemplo a sugestão de Rogério Greco: A


título de raciocínio, imagine-se a hipótese em que o agente, querendo praticar
o estupro, ameace gravemente a vítima, mesmo sabendo de sua condição de
pessoa portadora de problemas cardíacos. Ao ouvir a ameaça e durante a
prática do ato sexual, ou seja, após o início do coito vagínico, a vítima tem um
infarto fulminante, vindo, consequentemente, a falecer. Nesse caso o agente
deverá responder pelo estupro qualificado pelo resultado morte.

Apenas tome cuidado que o crime de estupro qualificado


pela lesão grave ou morte é crime, essencialmente, preterdoloso, isto significa
que o resultado agravador (morte ou lesão grave) deve ser produzido a título de
culpa.

E mais, o resultado agravador deve ser no mínimo previsível,


sob pena de responsabilidade objetiva, nos termos do art. 19 do CP. Para
ilustrar, basta da violência ocorrer a lesão corporal grave que resulta o aborto,
sem que o autor do crime nem a vítima soubessem da eventual gravidez.
Embora a conduta do agente tenha produzido uma lesão corporal gravíssima,
ele não responderá pela qualificadora, pois o resultado agravador não foi no
mínimo previsto ou previsível.
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Outra questão relevante é saber se o resultado agravador


pode ser obtido a título de dolo ou tão somente a título de culpa.

Entendemos como a maioria dos doutrinadores, o crime de


estupro qualificado pelo resultado lesão grave ou morte é por essência um
crime preterdoloso, assim caso o agente pretenda produzir o resultado
agravador dolosamente, ele responderá por crime de estupro simples em
concurso material com crime de homicídio ou lesão corporal.

Assim, conforme salienta Noronha, o resultado que agrava


especialmente a pena for proveniente de caso fortuito ou força maior, o agente
não poderá ser responsabilizado pelas modalidades qualificadas, conforme
preconiza o art. 19 do CP.

Permanecendo no mundo das possibilidades, imaginemos


agora que o agente tenha dado início a execução do crime de estupro, mas
antes de manter conjunção carnal a vítima venha a falecer por alguma razão.
Na sugestão de Rogério Greco, suponhamos que o agente derrube a vítima
violentamente no chão, fazendo que esta bata a cabeça, por exemplo, em uma
pedra, produzindo-lhe a morte antes que seja praticada a conjunção. Nesse
caso, pergunta-se: Teríamos uma tentativa qualificada de estupro ou o estupro
poderia ser considerado consumado havendo morte da vítima, mesmo sem a
ocorrência da penetração?

Há duas correntes para o caso. Alguns doutrinadores


entendem que o agente responderia por crime de estupro qualificado pelo
resultado morte, não obstante o crime sexual ter permanecido na forma
tentada. Aplicando a questão a mesma interpretação do latrocínio consumado,
ou seja, havendo morte da vítima o crime estará consumado, mesmo que a
subtração permaneça na forma tentada.
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1.5 Das Ações Penais.

Antes da vigência da lei 12.015/09, o crime de estupro, a


rigor, e

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal Parte Especial, v III. Rio de Janeiro: Ed.
Impetus, 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. São Paulo: Ed. RT, 2011.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Especial, v 3. São Paulo: Ed


Saraiva, 2011.

GOMES, LUIZ FLÁVIO; CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal Especial, v. 3. São
Paulo: RT, 2010.

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