Você está na página 1de 60

DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

Os crimes contra a dignidade sexual estão dispostos nos artigos 213 a 234
do Código Penal.
Eles têm como objeto jurídico a proteção da sexualidade tanto nas relações
de caráter pessoal (autodeterminação sexual), quanto nas relações de
caráter social (exercer a sexualidade e com outra pessoa), ou seja, a
liberdade que uma pessoa tem de dispor do próprio corpo, sua integridade
física, sua vida ou honra.
Com a alteração promovida pela Lei n.º 13.718/18, a ação penal dos
crimes contra a liberdade sexual passa a ser sempre pública incondicionada.
No entanto, por se tratar de disposição prejudicial ao réu, a nova regra não
poderá retroagir.
DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL
1) Estupro;
2) Violação sexual mediante fraude;
3) Importunação sexual (Lei 13.715/2018)
4) Assédio Sexual;
5) Registro não autorizado da intimidade
sexual (Incluído pela Lei nº 13.772, de 2018)
6) Estupro de vulnerável;
7) Corrupção de menores;
DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL
8) Satisfação de lascívia mediante presença de
criança ou adolescente;
9) Favorecimento da prostituição ou de outra forma
de exploração sexual de criança ou adolescente ou
de vulnerável.
10) Divulgação de cena de estupro ou de cena de
estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de
pornografia (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)
DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL
Estupro
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave
ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que
com ele se pratique outro ato libidinoso
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
O Código Penal apresentava duas condutas diferentes: o estupro
e o atendado violento ao pudor (crimes contra os costumes). Em
2009, entrou em vigor a Lei n. 12.015/2009, que unificou os
tipos penais no art. 213 e revogou o art. 214 do CP. Nesse caso,
não há abolitio criminis, mas continuidade normativo-típica, ou
seja, a conduta permanece criminosa, apenas subsumindo-se a
outro tipo penal diverso (art. 213 do Código Penal).
CONDUTA
Ato de libidinagem violento, coagido, obrigado, forçado,
buscando o agente constranger a vítima à conjunção carnal
(conjunção normal entre sexos opostos) ou praticar ou permitir
que com ele se pratique outro ato libidinoso (sexo anal, sexo
oral).
“Constranger” (núcleo do tipo - forçar, obrigar, coagir).
Constranger alguém, limitando sua liberdade, fazendo uso de
força ou coação, com finalidade de obter a conjunção
carnal ou outro ato libidinoso (violência física ou grave
ameaça).
A vítima perde a liberdade de escolha e se vê obrigada a se
submeter a ato sexual contra a sua vontade. O estupro é
semelhante ao crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP),
pois, nele, a vítima também é obrigada a fazer algo que a lei
não manda.
Contudo, no art. 213, o “fazer” diz respeito a ter relações
sexuais sem consentimento. Por força do princípio da
especialidade, havendo violência sexual, aplica-se o art. 213,
e não o art. 146.
Meios de execução: violência (vis corporalis, vis absoluta)
ou grave ameaça (vis compulsiva).
Violência: emprego efetivo de força física.
Ameaça: deve ser GRAVE.
Promessa de realização de mal grave, futuro e sério contra a
vítima ou pessoa que lhe é próxima (pais, irmãos etc)
Quando a ameaça é grave?
1ªC: Analisa-se de acordo com o homem médio.
2ªC: A individualidade da vítima deve ser considerada na
análise da gravidade ou não da ameaça. Prevalece.
“Conjunção carnal” Pênis/vagina Vagina/pênis
“Praticar ou permitir com que se pratique outro ato libidinoso”
Ato libidinoso é todo ato de cunho sexual capaz de gerar no sujeito a
satisfação de seus desejos sexuais.
Ex: penetração anal, sexo oral, masturbação, toques íntimos etc.
Essa expressão, “outros atos libidinosos”, abrange o BEIJO LASCIVO?

Lascívia é o prazer sexual, o prazer carnal, a luxúria.


Obs: luxúria não tem nada a ver com luxo, mas sim com sexo.

1ªC) Nelson Hungria: causa desconforto a quem olha.


2ªC) Para limitar a expressão, deve-se entender como atos de natureza
sexual que atentam de forma intolerável e relevante contra a dignidade
sexual da vítima.
Exige-se o CONTATO FÍSICO?
1ªC) O contato físico é dispensável. Parte da doutrina afirma que comete o
crime de estupro o sujeito que, para satisfazer a lascívia, determina que a
vítima explore o seu próprio corpo. Isto não é pacífico, porém é o que
prevalece.
Exemplo: obrigar a vítima a masturbar-se.
De acordo com a maioria da doutrina, para a prática do crime de estupro, não
é necessário que haja o contato físico entre o autor e a vítima do delito (é
possível “estupro virtual”)
Além disso, parte da doutrina afirma que comete o crime de estupro o sujeito
que, para satisfazer a lascívia, determina que a vítima explore o seu próprio
corpo. Isto não é pacífico, porém é o que prevalece.
2ªC) O contato físico entre os sujeitos é indispensável. O exemplo acima seria
crime de constrangimento ilegal.
O STJ inclusive já afirmou que, segundo a posição majoritária na doutrina, a
simples contemplação lasciva já configura o “ato libidinoso” descrito
nos arts. 213 e 217-A do Código Penal, sendo irrelevante, para a
consumação dos delitos, que haja contato físico entre ofensor e ofendido
(Inf. 587).
Em 2016, o STJ entendeu que o agente que aborda a vítima (adolescente
de 15 anos) de forma violenta e sorrateira com a intenção de satisfazer
sua lascívia, e pela ação de impingir-lhe, à força, um beijo, após ela ser
derrubada ao solo e mantida subjugada pelo agressor, que a imobilizou
pressionando o joelho sobre seu abdômen, comete o delito do art. 213, §
1º do CP.
Dessa forma, a jurisprudência do STJ vem, reiteradamente, decidindo
que deve ser considerado ato libidinoso diverso da conjunção carnal não
apenas os atos invasivos (quando há introdução do membro viril nas
cavidades oral ou anal da vítima), mas também outras condutas que
deixem claro o propósito lascivo do agente (Inf. 592).
SUJEITOS DO CRIME
a) Conjunção carnal: (sexos opostos, crime bipróprio – Rogério
Greco)
 Sujeito ativo: qualquer pessoa.
 Sujeito passivo: qualquer pessoa.
b) Atos libidinosos: (crime bicomum)
 Sujeito ativo: qualquer pessoa.
 Sujeito passivo: qualquer pessoa.
Se a prostituta, mesmo após o pagamento do “programa”,
decide não fazer sexo com o cliente, a sua vontade deverá ser
respeitada. Outro exemplo é o dos casados. Ainda que casada,
a pessoa não poderá ser obrigada a ter relações sexuais com
seu cônjuge. Portanto, o marido que obriga a esposa, mediante
violência ou grave ameaça, a fazer sexo, pratica o crime de
estupro.
Nas relações sexuais, o consentimento dos envolvidos deve
ser tido como condição absoluta, não existindo qualquer
possibilidade de que o ato ocorra, licitamente, sem a sua
existência.
TIPO SUBJETIVO
O crime é punido a título de DOLO, caracterizado pela
consciência e vontade de constranger a vítima violentamente a
praticar atos de libidinagem.
ATENÇÃO: o tipo penal não exige a satisfação da própria
lascívia, dispensa essa finalidade

OBJETO JURÍDICO E OBJETO MATERIAL


Bem jurídico: Liberdade sexual da vítima. Objeto material: A
própria vítima.
CONSUMAÇÃO e TENTATIVA
O estupro é crime material, consuma-se com a prática dos atos
de libidinagem, sendo perfeitamente possível a tentativa.
Não é necessária a satisfação sexual do agente para fins de
consumação.
A tentativa é possível quando o agente praticar somente os atos
executórios e NENHUM ato libidinoso.
QUALIFICADORAS
A pena do estupro será de oito a doze anos de reclusão, nos termos
do §1º, quando a vítima for maior de 14 e menor de 18 anos,
devendo-se incluir, por interpretação extensiva, a data do 14 º
aniversário do ofendido.
Se menor de 14 anos, o crime será o estupro de vulnerável (art. 217-
A), apenado com oito a quinze anos de reclusão.
A qualificadora mencionada também incidirá quando do estupro
resultar lesão corporal de natureza grave (nos termos dos §§ 1º e 2º
do art. 129 do CP).
Se da conduta resultar morte, a sanção será de doze a trinta anos
(art. 213, § 2º). Essas formas qualificadas pelo resultado constituem
crimes preterdolosos, em que deve existir dolo na ação ou omissão
resultante do estupro e culpa no evento agravador.
Ainda que não haja morte ou lesão grave, o estupro é
considerado crime hediondo (Lei 8.072/1990). Assim, o indivíduo
condenado pelo crime de estupro deverá iniciar o cumprimento de
pena em regime fechado, não terá a possibilidade de obtenção de
liberdade provisória com fiança, bem como terá um prazo maior
para obtenção do livramento condicional. Não é possível a
concessão de graça, anistia ou indulto.
No caso de estupro com resultado morte (art. 213, § 2º), além dos
efeitos regulares da hediondez, como a inafiançabilidade, a
insuscetibilidade de anistia, graça e indulto, o prazo superior para a
prisão temporária (30 dias, em vez de 5 dias), veda-se o livramento
condicional e a saída temporária; além disso, a progressão de
regime penitenciário se dará, caso primário, uma vez cumprido
cinquenta por cento da pena e, se reincidente, depois de executado
setenta por cento da pena.
É indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto,
por se tratar de crime que deixa vestígios (art. 158 CPP).
A confissão não supre o exame de corpo de delito.
A falta do exame pode ensejar nulidade da ação penal.
Se o estupro for cometido com a finalidade de transmitir HIV,
haverá concurso formal impróprio com tentativa de homicídio (se
a vítima a falecer antes do trânsito em julgado, o homicídio será
considerado consumado).
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
As causas de aumento de pena aplicáveis ao estupro são apenas aquelas contidas nos
arts. 226 e 234-A do CP:
a) aumenta-se a pena de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta,
tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou
por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela (art. 226, II);
b) aumenta-se a pena de um a dois terços, se o crime é praticado mediante concurso
de duas ou mais pessoas (“estupro coletivo”) – art. 226, IV, a;
c) aumenta-se a pena de um a dois terços, se o crime é cometido para controlar o
comportamento social ou sexual da vítima (“estupro corretivo”) – art. 226, IV, b;
d) aumenta-se de metade a dois terços se do crime resulta gravidez (art. 234-A, III);
e) aumenta-se a pena de um a dois terços se o agente transmite à vítima doença
sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, ou se a
vítima é idosa ou pessoa com deficiência (art. 234-A, IV).
Violação sexual mediante fraude
Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso
com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou
dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos
CONDUTA
Pune-se o estelionato sexual, caracterizado quando agente, SEM
emprego de violência ou grave ameaça, pratica atos de
libidinagem com a vítima, mediante fraude ou outro meio que
dificulte sua livre manifestação de vontade (esta última parte é
novidade trazida pela lei 12.015/09).
Meios de execução: fraude ou outro meio que dificulte sua livre
manifestação de vontade.
Exemplos clássicos de estelionato sexual: Irmãos gêmeos;
ginecologista; baile de máscaras.
PROBLEMA: Que outro meio seria esse que o novo tipo penal
menciona? A doutrina encontrou dois meios:
1)Embriaguez moderada: Se for completa a pessoa se torna
sem resistência, configurando estupro de vulnerável.
2)Temor reverencial: Não chega a ser grave ameaça, mas dá
sensação de medo na vítima.
A fraude (ou outro meio) utilizada na execução não pode anular
a capacidade de resistência da vítima, caso em que estará
configurado o delito de estupro de vulnerável (art. 217-A, §1º).
Assim, não pratica estelionato sexual, mas estupro de vulnerável,
o agente que usa psicotrópicos para vencer a resistência da
vítima e com ela manter a conjunção carnal.
É necessária ainda que a fraude seja capaz de iludir a vítima,
sendo necessário verificar o meio empregado e as condições do
ofendido.
Essa fraude utilizada não pode anular a capacidade de
resistência da vítima, pois, do contrário, estaria configurado o
estupro de vulnerável.
SUJEITOS DO CRIME
Esse crime é comum, podendo ser qualquer pessoa o sujeito ativo.
No entanto, se o sujeito ativo for ascendente, padrasto ou madrasta,
tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou
empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade
sobre ela, a pena será aumentada de 1/2 (metade).
OBS1: lembrando que a conjunção carnal é só para sexos opostos.
OBS2: se o sujeito ativo é uma das pessoas do Art. 226, II (relação
de subordinação) → Majora-se a pena da metade. Se ocorre a
situação do art. 226, I (concurso de agentes), aumenta-se de ¼.
OBS2: Não existe a qualificadora da idade da vítima prevista
para o art. 213 (vítima menor de 18 e maior de 14).
OBS3: perceber que não há aumento se o agente é
DESCENDENTE da vítima.
OBS4: Se a vítima tem menos de 14 anos → Art. 217-A: Estupro
de vulnerável.
TIPO SUBJETIVO
É o dolo, caracterizado pela vontade de praticar atos de
libidinagem mediante fraude ou outro meio.
A Lei 12.015/09 trouxe novidade no parágrafo único: Se o
estelionatário sexual tiver a finalidade específica de obter
vantagem econômica, aplicar-se-á também a pena de multa.
Exemplo: Falso pai de santo que exige dinheiro e sexo da vítima
para sessão de descarrego.
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Consuma-se com a prática dos atos de libidinagem.
Perfeitamente possível a tentativa.

Virgindade da vítima
Antes da Lei 12.015/2009, se a vítima da posse sexual
mediante fraude fosse virgem, incidia uma qualificadora. A nova
lei aboliu essa norma. Atualmente, a virgindade pode gerar, no
máximo, circunstância judicial desfavorável.
FORMA QUALIFICADA
Nos termos do parágrafo único do art. 215 do CP, “se o crime é
cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se
também multa”. Não é preciso que o sujeito obtenha referida
vantagem, sendo suficiente a intenção de fazê-lo.
Importunação sexual
Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato
libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de
terceiro:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui
crime mais grave
CONDUTA
Consiste em praticar (levar a efeito, fazer, realizar) ato
libidinoso contra alguém, ou seja, pressupõe uma pessoa
específica (é o que diferencia do ato obsceno) a quem deve se
dirigir o ato de autossatisfação.
Segundo Rogério Sanches, o preceito secundário do art. 215-A
contém subsidiariedade expressa: aplicam-se as penas da
importunação sexual se a conduta não caracteriza crime mais
grave. Por isso, a falta de anuência da vítima não pode consistir
em nenhuma forma de constrangimento, que aqui deve ser
compreendido no sentido próprio que lhe confere o tipo do
estupro – obrigar alguém à prática de ato de libidinagem –,
não no sentido usual, de mal-estar, de situação embaraçosa,
ínsita ao próprio tipo do art. 215-A e um de seus fundamentos.
Por exemplo, dentro de um ônibus, determinado homem faz
automasturbação e ejacula nas costas de uma passageira que está
sentada à sua frente. Esta conduta abominável, lamentavelmente, tem
ocorrido com certa frequência. O fato não podia ser enquadrado como
estupro (art. 213 do CP), considerando que não houve violência ou
grave ameaça. Também não podia ser classificado como violação sexual
mediante fraude (art. 215 do CP), tendo em vista que o ato libidinoso não
foi praticado com a vítima:
CONDUTA
O Professor Márcio Cavalcante cita ainda, como exemplo:
O art. 215-A do CP também serve para punir a conduta do
frotteurismo. O frotteurismo consiste em “tocar e esfregar-se em uma
pessoa sem seu consentimento. O comportamento geralmente ocorre
em locais com grande concentração de pessoas, dos quais o
indivíduo pode escapar mais facilmente de uma detenção (por ex.,
calçadas movimentadas ou veículos de transporte coletivo). Ele
esfrega seus genitais contra as coxas e nádegas ou acaricia com as
mãos a genitália ou os seios da vítima. Ao fazê-lo, o indivíduo
geralmente fantasia um relacionamento exclusivo e carinhos com a
vítima.” (http://www.psiquiatriageral.com.br/dsm4/sexual4.htm.).
No frotteurismo não há violência ou grave ameaça, razão pela qual
não se enquadra como estupro (art. 213 do CP), mas sim o delito do
art. 215-A do CP.
Segundo o Prof. Márcio Cavalcante (Dizer o direito), a depender das
peculiaridades do caso concreto, o fato pode até mesmo ser enquadrado
como estupro de vulnerável. Veja esta situação analisada pelo STJ (com
adaptações):
O homem convenceu uma criança de 10 anos a ir até o motel com ele.
Chegando lá, o agente pediu que a garota ficasse nua na sua frente, tendo
sido atendido. O simples fato de ver a menina nua já satisfez o sujeito que,
após alguns minutos olhando a criança, determinou que ela vestisse
novamente as roupas. Foram, então, embora do local sem que o agente
tenha tocado na garota. A criança acabou contando o que se passou a seus
pais e o sujeito foi denunciado pelo Ministério Público pela prática de
estupro de vulnerável.
O STJ manteve a imputação: A conduta de contemplar lascivamente, sem
contato físico, mediante pagamento, menor de 14 anos desnuda em motel pode
permitir a deflagração da ação penal para a apuração do delito de estupro de
vulnerável. STJ. 5ª Turma. RHC 70.976-MS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
julgado em 2/8/2016 (Info 587).
Trata-se de crime expressamente subsidiário, conforme se verifica no
preceito secundário, que ressalva sua não aplicação quando o ato
constituir crime mais grave. Nesse sentido, para que o crime se configure,
é necessário que o agente não tenha empregado, como meio executório,
violência contra a pessoa, grave ameaça, fraude ou se aproveite de meio
que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. Se
existir grave ameaça ou violência contra a pessoa, o agente responde
por estupro (CP, art. 213). Se empregar fraude ou recurso que dificulte ou
impeça a livre manifestação de vontade do ofendido, pratica violação
sexual mediante fraude (CP, art. 215).
SUJEITOS DO CRIME
É crime comum, ou seja, não exige nenhuma qualidade especial
do sujeito ativo (pode ser qualquer pessoa) e nem do sujeito
passivo, pode vitimar qualquer pessoa.
Se a vítima for pessoa menor de 14 anos, a conduta poderá
configurar o crime do art. 218-A do CP (Satisfação de lascívia
mediante presença de criança ou adolescente)
TIPO SUBJETIVO
É o dolo, consistente na vontade consciente de praticar o ato
libidinoso contra alguém. Além disso, o agente deve atuar com o
objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro (dolo
específico).
Não admite modalidade culposa
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Consuma-se o crime com a prática do ato libidinoso.
Rogério Sanches entende que: apesar de teoricamente possível,
na prática parece improvável a caracterização da tentativa,
pois, se o agente inicia a execução de qualquer ato libidinoso,
há de se reconhecer a consumação. Antes disso, ocorrem apenas
atos preparatórios.
André Estefam entende que a tentativa é admissível, pois o iter
criminis pode ser fracionado. Imagine, por exemplo, o
passageiro do coletivo que se aproxime da vítima, com o pênis
ereto, para com ele tocar lascivamente nas nádegas da
ofendida, mas seja impedido por outro passageiro, que o
denuncia, evitando o toque.
A Lei nº 13.718/2018, além de inserir o crime do art. 215-A ao CP,
também revogou o art. 61 do DL 3.688/41 (contravenção penal que era
chamada de importunação ofensiva ao pudor).
Houve abolitio criminis? Os indivíduos que estavam respondendo
ou já haviam sido condenados por importunação ofensiva ao
pudor foram beneficiados com a Lei nº 13.718/2018 e poderão
pedir o reconhecimento de abolito criminis? NÃO. A conduta
descrita no art. 61 do DL 3.688/41 passou a ser prevista no art.
215-A do Código Penal, ainda que com outra redação mais
abrangente.
Desse modo, não houve abolitio criminis, mas sim continuidade
normativo-típica.
Assédio sexual
Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter
vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente
da sua condição de superior hierárquico ou ascendência
inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.
CONDUTA
constranger, que significa compelir, coagir, obrigar, deixando-se
de fazer menção ao meio por intermédio do qual a ação se
pode dar (constrange-se alguém por meio de). Da mesma forma,
deixou de existir previsão no que tange àquilo a que a vítima
foi constrangida (constrange-se alguém a algo). A inexistência
de adjunto adverbial no primeiro caso e de objeto indireto ou
complemento reposicionado, no segundo, não pode ser
considerada somente uma lacuna gramatical. Eles teriam a
função de esclarecer de forma mais completa o dispositivo legal,
integrando o sentido latente do verbo constranger, o que se
adequaria ao princípio da taxatividade.
Assédio sexual é a insistência inoportuna de alguém em posição
privilegiada, que usa dessa vantagem para obter favores sexuais de um
subalterno. Esse é o conceito dos dicionários.
Assédio sexual X Assédio ambiental X Assédio moral
O assédio ambiental também tem finalidade sexual, porém não exige
relação de hierarquia ou ascendência entre agente e vítima. Não é
previsto no Brasil como crime. É definido como “um comportamento de
natureza sexual de qualquer tipo que tem como consequência produzir um
contexto laboral negativo – intimidatório, hostil, ofensivo ou humilhante –
para o trabalhador, impedindo-o de desenvolver seu trabalho em um
ambiente minimamente adequado”
O assédio moral, por sua vez, não tem finalidade sexual. Em resumo, é a
ridicularização, humilhação ou robotização da pessoa, realizada no
ambiente laboral. Não exige relação de hierarquia ou ascendência.
SUJEITOS DO CRIME
Trata-se de crime próprio, pois o sujeito ativo só pode ser o superior hierárquico ou
alguém que tenha uma ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou
função.
Se o sujeito ativo for ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer
outro título tem autoridade sobre ela, a pena será aumentada de 1/2 (metade).
Esse aumento não poderá ocorrer se a relação de cuidado decorre de emprego, eis
que se trata de elementar do tipo de assédio sexual.
Rogério Sanches questiona: é possível assédio sexual praticado pelo professor em face
do aluno, ou pelo bispo em face do sacerdote?
Nucci diz que superioridade hierárquica ocorra na relação de direito público,
enquanto a relação de ascendência decorre da relação de ordem privada.
Luiz Régis Prado discorda. Para o professor, haveria a relação de ascendência em
outras situações fora da relação laboral, como no caso do temor reverencial da vítima
com o ofensor, motivo pelo qual seria possível o assédio sexual, podendo haver entre
professor e aluno.
Voluntariedade
O crime de assédio sexual é praticado a título de dolo.
O dolo é a vontade de constranger a vítima, mas desde que haja o
elemento subjetivo especial em obter vantagem ou favorecimento
sexual.
Veja, não é necessário obter a vantagem ou o favorecimento sexual.
Capez questiona: é possível falar em assédio sexual do patrão que
constrange a empregada para ter relações sexuais com o seu filho?
Existe constrangimento ilegal, pois a vantagem ou favorecimento sexual
não necessariamente deve se dar em favor de quem coage, podendo o
coator fazer em benefício de outrem, sendo dispensado o conhecimento
do beneficiário.
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
O crime se perfaz com o constrangimento da vítima, ainda que
perpetrado por um único ato, independentemente da obtenção da
vontade visada. Trata-se de crime formal.
Mas há outra corrente, a qual exige que o crime seja habitual.
Conforme a hipótese, a tentativa é admissível. É o que se dá, por
exemplo, no caso em que o assédio tenha sido tentado por meio escrito,
chegando a correspondência, em face de extravio, nas mãos de terceira
pessoa
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
Aplica-se ao assédio sexual o disposto no art. 226 do CP, com exceção
de parte de seu inciso II, porque as hipóteses ali aventadas, por já
integrarem a figura típica (direta ou indiretamente), não podem,
novamente, ser objeto de valoração.
Uma das causas de agravação da pena reside na circunstância de o
agente ser ascendente, pai adotivo, padrasto, irmão, tutor, curador, ou
preceptor da vítima (inciso II). O motivo que embasa o aumento de pena
é o mesmo que justifica a elementar de prevalecimento da condição de
superior hierárquico ou ascendência. O próprio dispositivo penal, aliás,
também inclui, no mesmo inciso analisado, a hipótese de o agente ter, por
qualquer outro título, autoridade sobre a vítima.
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
Há que se perceber, aqui, que quaisquer destas hipóteses somente podem
ser objeto de análise se, concomitantemente, o assediador estiver em
condição de superioridade hierárquica ou ascendência em decorrência de
emprego, cargo ou função. Do contrário, não haverá fato típico.
Resta mencionar mais uma possibilidade trazida pelo inciso II: ser o
agente empregador da vítima, o que também já constitui uma das
hipóteses de assédio sexual, não podendo servir, portanto, como causa
especial de aumento de pena, ou estar-se-ia violando o princípio do non
bis in idem.
A Lei n. 12.015/2009, introduziu três exasperantes que podem ser
aplicadas ao crime de assédio sexual:
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
a)Aumento da pena em um terço, quando a vítima é menor de 18 anos (§
2º do art. 216-A).
Quando a vítima for menor de catorze anos, se ao assédio sexual, cuja
consumação se dá com o constrangimento, independentemente da prática
seguida do ato libidinoso, a realização do contato sexual, ainda que
voluntário, configurará estupro de vulnerável (CP, art. 217-A), o qual
absorverá o delito antecedente (princípio da consunção ou da absorção).
Registre-se que o legislador inseriu o § 2º no dispositivo, que não contém
outro parágrafo.
b)Aumento de metade a dois terços, se do crime resultar gravidez (art.
234-A, III).
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
c) De um a dois terços, se o agente transmite à vítima doença sexualmente
transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador, se a vítima é
idosa ou pessoa portadora de deficiência (art. 234-A, IV).
Registro não autorizado da intimidade sexual
Art. 216-B. Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio,
conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo
e privado sem autorização dos participantes:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em
fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir
pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo.
CONDUTA
Produzir, fotografar, filmar ou registrar o conteúdo com cena de nudez,
ato sexual ou libidinoso. Produzir cena significa dirigi-la, montá-la, de
maneira a indicar aos participantes a forma como agirão. Como se trata
de uma “produção” efetuada sem autorização destes, o comportamento
em questão diz respeito a uma ação sub-reptícia, na qual o participante
desconhece que está sendo “dirigido” para que o ato seja registrado.
Fotografar quer dizer colher a imagem com o uso de algum aparelho
analógico ou digital. Filmar significa capturar imagens com impressão de
movimento relativo à nudez alheia ou ao ato sexual ou libidinoso
praticado por terceiro.
CONDUTA
O ato de registrar, por fim, está colocado de maneira genérica, a fim de
abarcar qualquer outra forma de obter as imagens íntimas da vítima,
como, por exemplo, desenhando-as de maneira fidedigna, a ponto de
permitir sua identificação por terceiros no ato retratado. Note que a
mera contemplação lasciva não está incluída na disposição (ou seja, se o
agente, por exemplo, se esconder num cômodo do imóvel, de onde mira o
sujeito passivo se despindo, não há crime).
SUJEITOS DO CRIME
O registro não autorizado da intimidade sexual pode ser praticado por
qualquer pessoa (crime comum). Só pode ser sujeito passivo desse crime a
pessoa maior de 18 anos.
Quando se tratar de registro de cena de sexo explícito ou pornográfica
de criança ou adolescente, aplica-se o art. 240 do ECA, cuja pena é de
reclusão, de quatro a oito anos, e multa. De acordo com o estatuto,
compreende-se dentre as cenas de sexo explícito ou pornográfica
quaisquer situações que retratem o menor em atividades sexuais
explícitas, reais ou simuladas, ou exibam seus órgãos genitais para fins
primordialmente sexuais (art. 241-E).
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Consuma-se o crime com a captura (o registro) da imagem ou da cena de
nudez, do ato sexual ou libidinoso.
Admite-se a tentativa, caso o sujeito tente efetuar a gravação, mas não
consiga por circunstâncias alheias à sua vontade (por exemplo, porque
ocorre uma queda de energia no instante em que a vítima se despia,
impedindo a filmagem de sua nudez, ou acaba a bateria da câmera
antes de começar a prática do ato sexual ou libidinoso).
Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção carnalou praticar outro ato
libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas
no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não
tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por
qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
O tipo não exige violência ou grave ameaça, tampouco constrangimento.
Há uma presunção absoluta de violência, segundo o STJ. Ou seja,
basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato
libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua
eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento
amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime
(Inf. 568).
Segundo o STF, o agente que passa as mãos nas coxas e seios da vítima
menor de 14 anos, por dentro de sua roupa, pratica, em tese, o crime de
estupro de vulnerável, não importa que não tenha havido penetração
vaginal (Inf. 837).
O STJ também entende que a conduta de contemplar lascivamente, sem
contato físico, mediante pagamento, menor de 14 anos desnuda em motel
pode permitir a deflagração da ação penal para a apuração do delito de
estupro de vulnerável. Isso porque, segundo a posição majoritária na doutrina,
a simples contemplação lasciva já configura o “ato libidinoso” descrito nos arts.
213 e 217-A do Código Penal, sendo irrelevante, para a consumação dos
delitos, que haja contato físico entre ofensor e ofendido (Inf. 587).
O STJ entende que, em se tratando de crime sexual praticado contra menor de
14 anos, a experiência sexual anterior e a eventual homossexualidade do
ofendido não servem para justificar a diminuição da pena-base a título de
comportamento da vítima. A experiência sexual anterior e a eventual
homossexualidade do ofendido, assim como não desnaturam (descaracterizam)
o crime sexual praticado contra menor de 14 anos, não servem também para
justificar a diminuição da pena-base, à título de comportamento da vítima (Inf.
555, STJ).
CONSUMAÇÃO
O delito se consuma com a prática do ato de libidinagem, sendo
perfeitamente possível a tentativa quando, iniciada a execução, o ato
sexual visado não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do
agente.
Por tudo isso, o STJ entendeu que, se o agente levou a vítima (menina de
12 anos de idade) para o quarto, despindo-se e, enquanto retirava as
roupas da adolescente, passou as mãos em seu corpo, situação na qual a
garota vestiu-se rapidamente e fugiu do local, o crime restou
consumado.
Para que o crime seja considerado consumado, não é indispensável
que o ato libidinoso praticado seja invasivo (introdução do membro viril
nas cavidades da vítima). Logo, toques íntimos podem servir para
CONSUMAÇÃO
Nos crimes sexuais contra vulnerável, quando inexiste certidão de
nascimento atestando ser a vítima menor de 14 anos na data do fato
criminoso, o STJ tem admitido a verificação etária a partir de outros
elementos de prova presentes nos autos. Em suma, a certidão de
nascimento não é o único meio idôneo para se comprovar a idade da
vítima, podendo o juiz valer-se de outros elementos (Inf. 563, STJ).

§ 5º As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-


se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter
mantido relações sexuais anteriormente ao crime. (Incluído pela Lei nº
13.718, de 2018)
QUALIFICADORAS
§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza
grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4o Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Você também pode gostar