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A MULHER NA MAÇONARIA

A pergunta inicial era: COMO A MULHER ENTRA PARA A MAÇONARIA? Minha

dissertação de Mestrado na UFES foi sobre este tema que muito tem sido discutido e, às

vezes, até controvertido na Ordem Maçônica. A mulher entra sim para a Maçonaria.

Entra e participa de várias formas, desde seu permitir o ingresso do esposo ou

companheiro na Instituição, como também nas atividades paramaçônicas e nos

Departamentos Femininos. Nessa pesquisa acadêmica me dediquei às questões de

gênero, muito debatidas nestes últimos dias, por várias instituições, inclusive Igreja

Católica. Queria saber também sobre as relações de poder ali existentes e ainda as

desigualdades entre homens e mulheres, uma vez que estas não podem participar das

reuniões ritualísticas. Numa pesquisa qualitativa e com perguntas abertas, foram

entrevistadas vinte três pessoas, maçons, esposas de maçons e pessoas ligadas à

Maçonaria, em especial à Grande Loja Maçônica do Estado do Espírito Santo. A análise

do discurso foi o instrumental utilizado como aparato metodológico e os resultados

foram surpreendentes. Sempre quando se vai para uma pesquisa, por mais que o

pesquisador tenta se isolar e não criar expectativa nenhuma para não interferir ou

influenciar sua análise, sempre há uma pré-esperança que o resultado seria este ou

aquele, mas neste caso as surpresas foram ainda maiores. Havia a ideia de que na

maçonaria existia discriminação de gênero e a pessoa da mulher estaria subjugada nos

moldes de um patriarcalismo disfarçado, numa corrente masculinizada que não daria

espaço à mulher em momento nenhum. Esperava-se que a não permissão das mulheres

nas reuniões ritualísticas fosse, em algum momento da pesquisa, o ponto central das

discussões, tanto por parte dos homens (maçons) como também das mulheres (esposas e

sobrinhas). Contudo isso não se confirmou de fato. Tanto as mulheres quanto os maçons
pouco queriam discutir sobre isso. Embora não quisessem discutir, existia uma

sobrecarga de informações, que tanto homens quanto mulheres queriam falar a respeito

das ações maçônicas, das realizações, da unidade da família, dos objetivos da maçonaria

e das famílias. Havia uma vontade grande de manifestação. Este fato me intrigou como

pesquisador. Pensava eu: mas não querem saber o que está acontecendo? Não

consideram segregação? A mulher não se sente diminuída perante esta divisão sexual?

Não estaria a maçonaria confirmando um ato severo de discriminação social com base

no gênero? Todas estas minhas dúvidas e mais algumas outras eu pude externar para os

pesquisados, tanto a homens quanto a mulheres. Somente no fechar da pesquisa, nas

conclusões que se pode montar de fato o quebra-cabeça que ali se estabelecia. A

primeira lição foi para o próprio pesquisador (eu). Foi necessário rever que a pesquisa

tem voz própria e não se deve esperar que os resultados sejam conforme os conceitos

dos autores ou a visão do pesquisador. Não se trata de deixar a pesquisa ao acaso,

abandonando as disciplinas e rigores científicos, mas ir para além disso, deixar que a

pesquisa desenvolva-se por si mesma e que os fatos falem por eles mesmos com seus

acontecimentos e rupturas, livremente.

Outro ponto encontrado é que nem tudo se resume em divisão sexual ou segregação de

gênero na maçonaria, lembrando ainda que sexo é homem e mulher (macho e fêmea –

conceito biológico) e gênero é masculino e feminino (conceito cultural), e essas duas

entidades não podem se confundir nem no meio acadêmico e nem na sociedade como

um todo. A pesquisa mostrou como os seres estão se moldando no tempo quanto às

questões de sexo e gênero na maçonaria. O pensamento focaultiano de marcas e

registros mostraram que na maçonaria o ser humano não é diferente no que tange a

pluralidade de personalidades e que um ser humano nunca será igual a outro, embora a

maçonaria tente ser uma das instituições mais conservadoras e primaz no


comportamento humano, ela não consegue congelar ou estabelecer um comportamento

único e imutável, as subjetividades se mostraram fortemente presentes dando corpo ao

pluralismo e à individuação dos sujeitos ali presentes. Os resultados mostraram que a

produção de Mulheres na Maçonaria passa por várias performances, por várias

constituições, por várias subjetividades, e seria possível destacar uma individualidade

para cada entrevistada(o), e tantas mais seriam encontradas quantas entrevistas fossem

feitas. Isto trouxe a reflexão de que no ambiente pesquisado não existe esse ou aquele

procedimento, que na maçonaria existe encontro harmônico de interesses, pode-se dizer

que o rizoma que se deflagra em tudo isso é muito maior, ou seja, há influências e traços

de patriarcado, de submissão, mas há também interesses maiores e convergentes e

concentrados entorno de objetivos comuns, tais como a agregação familiar, os interesses

de um bom convívio social, crescimento e desenvolvimento familiar e econômico,

social e por que não acrescentar espiritual, porém cada posicionamento sempre diferente

um do outro e performatizado.

As categorias “mulheres”, na Maçonaria, são constituídas de forma equilibrada com

poucas resistências devido ao direcionamento que é dado às mesmas, cuja direção é

aceita, valorizada e até mesmo buscada pelas mulheres uma vez que tal direcionamento

visa o equilíbrio familiar, dando grande ênfase ao núcleo familiar sem questionar quais

são os meios para que esse equilíbrio seja alcançado. Assim a família assume o centro

das relações desprezando, de forma até despreocupada o sexismo, a dominação e o

patriarcado que por vezes podem ser vislumbrados na Instituição.

Os processos subjetivos de “mulheres” passam pelas relações de forças, poder e

resistências constituindo os modos de ser e de agir dessas várias categorias. As

subjetividades estão performatizadas pelo conjunto da obra, pela soma das partes,

homens, mulheres, família, filhos, interesses econômicos, sociais, espirituais e materiais


atuam constantemente sobre esses seres e os fazem criar e recriar o ambiente tornando-o

pluralizado, autossuficiente e ao mesmo tempo forte como instituição peculiar

constituinte de seres humanos atuantes na sociedade.

Os discursos mostraram que há posicionamentos difusos, a mulher não tem espaço para

as reuniões ritualísticas, mas isso se tornou, para elas e para eles um detalhe pouco

importante e não dimensionador das subjetividades presentes nas entrevistas. As

relações maçônicas se mostraram para além disso e esse discurso ficou pequeno em

relação a tantas outras conquistas e expectativas que a maçonaria desenvolve no ser

humano e na família. Família que é o principal objetivo das mulheres. Ter sua prole

protegida e guardada se revela como principal objetivo também dos homens (maçons),

logo discutir sexo e gênero para a família maçônica perdeu-se o sentido. O maçom quer

mais, a mulher do maçom também. Eles querem uma família forte, saudável,

equilibrada socialmente, desenvolvida economicamente e atuante na sociedade. Então

para que discutir sexo e gênero se os objetivos maçônicos estão para muito mais que

isso? Outras significâncias tomaram o sentido principal na maçonaria. Discutir gênero é

detalhe pequeno dentre tantos outros substancialmente importantes para o ser humano.

Percebeu-se que as pessoas entrevistadas não se mostraram preocupadas com esses

aspectos biológicos ou culturais, embora os mesmos estivessem o tempo todo presentes,

eles não assumem o centro da discussão por parte dos entrevistados. Não é relevante. Os

discursos e comportamentos mostraram que o equilíbrio familiar, pessoal, emocional, as

realizações pessoais e filantrópicas foram mais importante que a discussão sobre sexos e

gêneros.

O ambiente maçônico produz um invólucro contextualizado com seus princípios, meios

e fins adequados a si mesmo, sem preterir explicar ou influir sobre outros aspectos

senão o bem estar familiar, a integridade humana, o desenvolvimento moral, social e


intelectual de seus adeptos, afastando-se de outras discussões que não a sua própria

doutrina e pensamento. A produção de “Mulheres” na Maçonaria, a partir dos discursos

analisados, está intimamente ligada aos próprios anseios da instituição, sem

preocupação de fronteiras ou raças, sexo ou gênero.

Porém, esta não preocupação não indica silêncio passivo ou aceitação ignorante, mas

reflete uma forma de ação, um modo de agir, intersubjetivo, pensado, planejado, que vai

ao alcance dos interesses do seu próprio público, da própria redoma, climatizada,

estilizada e performatizada.

Esse procedimento reflete uma submissão ou sujeição?

Do ponto de vista das ativistas feministas poder-se-ia dizer que sim, do ponto de vista

da ciência também, pois refletem comportamentos aparentemente dominadores e ou

segregados, mas do ponto de vista dos participantes (entrevistados) não, porque os

objetivos e sustentáculos destes comportamentos não entram em discussão nessas

diferenças sexuais e culturais. Nesse modelo está implícito um modelo de ser mulher: o

modelo maçônico. Os modos de ser e de agir, individualmente e coletivamente dos

membros da organização pesquisada e a mulher, seja ela compreendida pelo biológico,

com suas marcas e genealogias, seja pelo cultural com suas performances, elas se

mostraram constituídas num estágio acima destas preocupações da naturalização sexual

ou genérica. Os discursos apontaram o ser humano como alvo a ser pensado e

construído, independente do sexo e gênero. Para a maçonaria a Mulher é um ser

humano, capaz, produtor, útil e importante no processo maçônico. E o importante é o

valor desse SER, sua contribuição e ativa participação, direta ou indiretamente na

Instituição Maçônica. Às Mulheres nossos sinceros respeitos e considerações.

Irmão José Roberto Basílio de Souza – M.´. I.´. Membro da ARLS Mestre Álvaro

nº 97.

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