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Nota Prévia

Esta é a sebenta final de DIREITO ADMINISTRATIVO, disponibilizados

pela Comissão de Curso dos alunos do 2o ano da licenciatura em Direito da Faculdade


de Direito da Universidade do Porto, para o mandato de 2022/2023.

Foi elaborada pela aluna Francisca Ribeiro, tendo por base as aulas e documentos

disponibilizados pela docente Juliana Coutinho. Salienta-se que estes apontamentos são

apenas complementos de estudo, não sendo dispensada, por isso, a leitura das obras

obrigatórias e a presença nas aulas.

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Índice

Formas de Atividade Administrativa ............................. Erro! Marcador não definido.


1. Atos Jurídicos ........................................................ Erro! Marcador não definido.

2. Atos Não Jurídicos ................................................ Erro! Marcador não definido.

Regulamentos ................................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº1 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº2 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Marcha do Procedimento Regulamentar Comum previsto no CPAErro! Marcador


não definido.
1. Fase Preparatória ................................................... Erro! Marcador não definido.

i. Fase de Iniciativa ............................................... Erro! Marcador não definido.

ii. Fase de Instrução ............................................... Erro! Marcador não definido.

iii. Fase de Participação....................................... Erro! Marcador não definido.

iv. Fase da Elaboração do Projeto Final do Regulamento Administrativo ...... Erro!


Marcador não definido.

2. Fase Constitutiva ................................................... Erro! Marcador não definido.

3. Fase Integrativa de Eficácia .................................. Erro! Marcador não definido.

Mecanismos de Reação ................................................ Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº3 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº3 (continuação) ...................................... Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº4 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº5 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Atos Administrativos...................................................... Erro! Marcador não definido.


Interpretação do Conceito do Artigo 148º .................... Erro! Marcador não definido.

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Caso Prático nº6 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Procedimento Administrativo de um Ato Administrativo PrimárioErro! Marcador


não definido.
1. Fase Preparatória ................................................... Erro! Marcador não definido.

a. Fase da Iniciativa ............................................... Erro! Marcador não definido.

b. Fase de Instrução ............................................... Erro! Marcador não definido.

c. Fase da Audiência dos Interessados................... Erro! Marcador não definido.

d. Fase de Preparação Direta da Decisão ............... Erro! Marcador não definido.

2. Fase Constitutiva ou Decisória.............................. Erro! Marcador não definido.

3. Fase Integrativa de Eficácia .................................. Erro! Marcador não definido.

Vícios do Ato Administrativo e Respetivas Consequências JurídicasErro! Marcador


não definido.

Caso Prático nº7 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº7 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº8 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº9 ............................................................. Erro! Marcador não definido.

Considerações Especiais: ............................................... Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº10 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Tipos de Garantias Administrativas Previstas no CPA .. Erro! Marcador não definido.


1. Regime Geral ........................................................ Erro! Marcador não definido.

Efeitos sobre os Prazos de Acesso aos Tribunais Administrativos:Erro! Marcador


não definido.

Efeitos sobre o Ato Jurídico Impugnado: ..................... Erro! Marcador não definido.

2. Regime Especial .................................................... Erro! Marcador não definido.

Vantagens das Garantias Administrativas Face às Garantias Contenciosas .......... Erro!


Marcador não definido.

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Caso Prático nº11 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº12 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Análise do Acórdão de 8 de abril de 2022 – Processo 2504/19.2 BEPRT ............. Erro!


Marcador não definido.

Caso Prático nº13 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº14 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Entidades Públicas por Atos de


Gestão Pública – Lei 67/2007 ........................................ Erro! Marcador não definido.
i. Função Administrativa .......................................... Erro! Marcador não definido.

ii. Função Jurisdicional.............................................. Erro! Marcador não definido.

iii. Função Político-Legislativa ............................... Erro! Marcador não definido.

Caso Prático nº15 ........................................................... Erro! Marcador não definido.

Acórdão STA – Processo 0477/11, de 13 de março de 2012Erro! Marcador não


definido.

Acórdão TCAN – Processo 02430/09.3BEPRT, de 18 de novembro de 2016 ....... Erro!


Marcador não definido.

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Aula 16.02

Formas de Atividade Administrativa


No que toca às formas de atividade administrativa, existe uma distinção fundamental entre
atos jurídicos e atos não jurídicos. Esta distinção prende-se com os efeitos, uma vez
que nos atos não jurídicos há lugar à expressão de uma vontade da Administração Pública,
mas a ela não está associada a produção de qualquer efeito jurídico, seja internamente ou
no âmbito de uma relação jurídica administrativa. Quando falamos em atos, falamos
quase sempre, mas não necessariamente, de operações materiais e atos informais.

1. Atos Jurídicos
Os atos jurídicos são operações de ciência, que têm efeitos internos, e que até podem
ter repercussão externa. É um exemplo de ato jurídico o parecer, que pode ter relevância
externa quando é vinculativo, pois repercute-se determinando o ato administrativo a ser
praticado (a relevância externa permite aos interessados não terem de esperar pela
decisão, que já sabem qual é, para reagir).

NOTA: em regra, os pareceres são obrigatórios, mas não vinculativos – artigos 91º e 92º
do CPA –, a menos que exista uma norma especial.

Assim, existem atos jurídicos que produzem efeitos externos, sendo que estes podem ser
atos jurídicos sujeitos a um regime de Direito privado ou sujeitos a um regime de
Direito Administrativo. Em qualquer uma destas formas, existe um ponto em comum: o
procedimento que o antecede é sempre de Direito Administrativo, mesmo que o ato
jurídico seja sujeito a um regime substantivo de Direito privado.

Por exemplo, o contrato de arrendamento, disciplinado pelo CC, elaborado por um


município, corresponde a um ato jurídico de Direito privado, mas o procedimento que o
antecede é de Direito Administrativo, pois refere-se à atividade administrativa.

A atividade administrativa é totalmente procedimentalizada, mesmo que se venham


a praticar atos de Direito privado. O legislador tem esta distinção em consideração no
ETAF, onde existem normas que o referem especificamente.

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Quando os atos jurídicos que produzem efeitos externos estão sujeitos a normas de Direito
Administrativo, temos atos jurídico-públicos, ou uma atividade administrativa
jurídico-pública, e dentro dela encaixamos três categorias essenciais de atuação:

i. Regulamentos
ii. Atos Administrativos
iii. Contratos Administrativos

Estas três categorias não correspondem aos únicos atos com efeitos jurídico-públicos da
Administração Pública, mas correspondem aos principais tipos de atos.

2. Atos Não Jurídicos


Nos atos não jurídicos, temos as operações materiais e os atos informais:

• Operações Materiais – fundam-se sempre em atos jurídicos prévios, que


funcionam como habilitação de determinada operação material. São condutas
voluntárias e materiais, que procuram modificar, extinguir ou constituir uma
determinada realidade fáctica, como obras de demolição, obras de construção,
remoção de um automóvel estacionado indevidamente, abate de animais doentes,
etc.

O facto de serem operações materiais não significa que a operação material em si


mesma não esteja sujeita aos Princípios Gerais de Direito Administrativo – artigo
2º, nº3 do CPA. Contudo, não existe um regime geral das operações materiais,
aquilo que existe é um conjunto de normas que se aplicam a estes e a outros.

É preciso ter cuidado com as operações materiais porque, apesar de não


produzirem efeitos jurídicos, podem acabar por ter relevância jurídica,
dependendo das circunstâncias concretas.

• Atos Informais – não produzem efeitos jurídicos, assentando na adoção de


medidas de cooperação e colaboração, com vista à produção de consensos.
Não têm efeitos vinculativos associados nem lhe podem ser atribuídos efeitos
vinculativos a posteriori, em nome do princípio da boa fé.

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Por exemplo, para fazer um ajuste numa estrada com vista no seu alargamento, o
município pede a um proprietário de um terreno que ceda meio metro desse
terreno, prometendo-lhe a construção de um muro em troca, num prazo de 6 meses
– esta abordagem não tem efeitos vinculativos, mas o que acontece se, depois de
decorrido o prazo dos 6 meses, ainda não tiver sido construído o muro? Neste caso
em que o município não constrói o muro e age de má fé para com o proprietário
do terreno, pode considerar-se na violação do princípio da boa fé (que corresponde
a um princípio geral de Direito Administrativo).

Regulamentos
Os regulamentos são normas gerais e abstratas, emanadas no exercício da função
administrativa por órgãos da Administração Pública, entendido em sentido orgânico
e funcional, no exercício de uma competência regulamentar.

Esta competência regulamentar tem uma configuração distinta consoante os


regulamentos tenham uma eficácia interna ou eficácia externa.

Para que um ato jurídico da Administração Pública se configure como tal, a lei exige que
produza efeitos jurídicos externos. Por sua vez, um contrato administrativo, por
natureza, produz efeitos jurídicos externos. Contudo, nos regulamentos administrativos
podem:

• Ter efeitos internos que se esgotam no seio da pessoa coletiva à qual são
imputáveis, por exemplo, regulamentos que disciplinam organização e
funcionamento dos órgãos de determinada pessoa coletiva – também designados
como regimentos.
• Ser internos, mas ter relevância externa, como, por exemplo, circulares
interpretativas – são regulamentos internos emanados por superior hierárquico
dirigidos aos seus subalternos onde se esclarece a interpretação a dar a normas
legais.
• Serem regulamentos externos que se projetam nas relações jurídicas
administrativas.

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Assim, a produção de efeitos jurídicos externos, nos regulamentos, não é critério de
distinção. A distinção é relevante porque, nos regulamentos externos, pode existir reação
perante os Tribunais Administrativos, ao contrário do que acontece nos regulamentos
internos.

No que diz respeito às normas regulamentares com eficácia interna, a feitura destas
normas não pressupõe uma norma legal que habilite especificamente uma
determinada pessoa coletiva e os seus órgãos a elaborarem normas com eficácia
interna, que se prendam com a organização e funcionamento da pessoa coletiva, e que se
esgotam no seu seio. A competência não se presume, mas aqui entende-se que o poder
regulamentar relativamente a isto é um poder inerente, que resulta da possibilidade da sua
auto-organização.

Já no que diz respeito às normas internas, mas com eficácia externa, e às normas com
eficácia externa, o exercício da competência regulamentar pode fundar-se em normas
de:

• Convenções internacionais e atos da União Europeia

• Diretamente na CRP – regulamentos do Governo (artigo 199º, alínea g)), tendo,


necessariamente, a forma de decreto regulamentar, de modo a estarem sujeitos a
promulgação pelo PR – artigo 134º, alínea b); e regulamentos das Autarquias
Locais (artigo 241º), desde que a matéria não esteja sujeita a reserva de lei.

• Outros regulamentos – de acordo com critérios de hierarquia de


regulamentos, que assentam no órgão que o emite, âmbito territorial das
atribuições do órgão que emite, a forma do próprio regulamento. Por exemplo,
uma resolução do Conselho de Ministros deve obedecer a um decreto
regulamentar.

• Normas legais

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Deste modo, no que diz respeito à relação dos regulamentos com a lei, estes devem
obedecer ao principio da legalidade, que se desdobra no:

• Princípio da preferência da lei – um regulamento não pode contrariar, derrogar,


revogar, modificar ou suspender normas legais, sob pena de ilegalidade. Quando
se fala em principio de preferência de lei, fala-se na obrigatoriedade dos
regulamentos estarem em conformidade com normas legais, quer de Direito
público, quer de Direito privado.
• Princípio da reserva de lei – a matéria tem de ser tratada por lei, estando
reservada a esta forma. Isto não significa que não possa existir um regulamento
nesta matéria, apenas que a primeira disciplina tem de ser feita por lei, apenas
sobre essa lei pode existir um regulamento.
• Princípio da precedência da lei – o exercício do poder regulamentar deve
fundar-se numa norma legal de habilitação previa, em princípio, podendo
também existir normas que habilitem diretamente.

Podemos distinguir vários tipos de regulamentos:

• Regulamentos de Execução – procuram, única e exclusivamente, interpretar a


lei, suprir lacunas e garantir uma aplicação uniforme da lei. O elemento de
inovação introduzido pelo regulamento, face ao que já está na lei, é zero.

• Regulamentos Complementares – o legislador deixa propositadamente um


espaço na disciplina de determinado aspeto (que não é lacuna porque, nesta
situação, é intencional). Neste caso, não pode ser matéria de reserva de lei.

• Regulamentos Integrativos ou Regulamentos de Desenvolvimento – introduzem


exceções ao regime geral previsto na lei. Também aqui é importante que o
domínio de exceção não seja sujeito a reserva de lei.

• Regulamentos Independentes – são regulamentos que ou se fundam diretamente


na CRP (o que só é possível para o Governo e AL com fundamento nas
disposições já referidas), ou numa norma legal de habilitação prévia, que nada

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mais faz do que indiciar a matéria a regulamentar e quem tem competência para a
fazer – a disciplina introduzida é uma disciplina totalmente inovadora.
Quando se fala em discricionariedade, podemos considerar também a emanação
de regulamentos, sendo que os regulamentos independentes são uma manifestação
desta pela sua componente inovadora.

• Regulamentos Autónomos – provenientes de órgãos que integram pessoas


coletivas que fazem parte da administração autónoma.
Podemos ter regulamentos autónomos independentes, como um regulamento de
uma AL fundado na CRP, sendo independente porque se funda na lei e autónomo
porque provém da administração autónoma.

Quanto à eficácia dos regulamentos, a distinção é relevante pelo artigo 135º do CPA,
que não especifica o que é um regulamento, refere sim o que é um regulamento para
efeitos de aplicação do CPA – não significa que não seja aplicado de todo o CPA, mas
em que medida é feita essa aplicação.

a. Regulamentos Internos – em primeiro lugar, são aplicáveis as normas que se referem


à atividade administrativa, sem especificarem a atividade que está em causa, ou seja,
os princípios gerais da atividade administrativa.

b. Regulamentos Externos – o CPA é aplicável no seu todo, isto é, são aplicáveis as


normas que disciplinam a atividade administrativa como um todo e as normas que
se referem aos regulamentos.

Mas o que acontece às normas que se aplicam aos regulamentos? Aplicam-se


também a estas? À partida, os artigos 97º e seguintes e 135º e seguintes do CPA só
se aplicam a normas regulamentares com eficácia externa, não são aplicáveis às
internas, com duas exceções:

a) Procedimento regulamentar – toda a atividade administrativa tem de ser


devidamente procedimentalizada, de acordo com o artigo 267º, nº5 da CRP.

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Aplica-se, então, as normas que disciplinam o procedimento das normas com
eficácia externa.
b) Subordinação dos regulamentos internos ao principio da legalidade e
consequências associadas a uma desconformidade – prevista nos artigos
143º e 144º do CPA, onde está concretizado o principio da legalidade. Assim
como o dever de, de acordo com o artigo 144º, nº1, declaração de ilegalidade
dos regulamentos ilegais, de modo que estes cessem a produção dos seus
efeitos.

Entende-se que estes artigos também se aplicam aos regulamentos com eficácia
interna, assim como o dever (artigo 144º, nº1), no entendimento da professora, de
declaração de ilegalidade dos regulamentos, ao contrário da interpretação meramente
literal deste artigo.

A questão neste artigo é o “pode”, que dá a ideia de que, se uma pessoa coletiva que
elaborou um certo regulamento se aperceber que ele é ilegal, pode não declarar a sua
ilegalidade e concordar com a sua manutenção na ordem jurídica, apesar de saberem que
é ilegal – esta é a interpretação que mais respeita a lei.

Isto é a relevância de distinção no que diz respeito ao CPA e, ainda em relação a este
código, é importante referir que os artigos 97º e seguintes, e 135º e seguintes aplicam-se

Mecanismos de reação contenciosa, junto dos tribunais administrativos: posso reagir


contra um regulamento de eficácia interna? Não, porque, no artigo 168º, nº5 da CRP, o
legislador prevê o mínimo de salvaguarda dos direitos do interessado relativamente aos
regulamentos administrativos, que o legislador ordinário prossegue. Contudo, a CRP fixa
um mínimo, mas não um máximo.

Só é possível reagir fora desta regra se o CPTA o permitisse, como faz com os atos
administrativos. Mas isto não foi feito para os regulamentos, pelo que não é possível
reagir contenciosamente juntos dos tribunais administrativos – os artigos 72º e seguintes
do CPTA aplicam-se a regulamentos com eficácia externa.

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Se quisermos reagir junto dos tribunais administrativos contra uma norma com
eficácia externa, o que podemos fazer?

1. Primeiro, temos de perceber que tipo de norma regulamentar de eficácia


externa temos. Assim, temos de distinguir:

a. Normas regulamentares de eficácia externa imediatamente operativas


– são normas regulamentares que não precisam de um ato jurídico, que
seria um ato jurídico de aplicação, para que produzam os efeitos jurídicos
externos a que tendem.
Por exemplo, uma norma regulamentar que estabeleça uma proibição,
como um sinal de trânsito proibido, não precisamos que esteja um polícia
a impedir-nos de passar o sinal, ele por si só a isso está associado.

b. Normas regulamentares com eficácia externa mediatamente


operativas – normas cuja produção de efeitos jurídicos externos depende
da prática de um ato administrativo.
Por exemplo, uma norma regulamentar que fixa uma proibição e uma
contraordenação associada ao incumprimento dessa proibição, com uma
coima de 50€ - é uma norma regulamentar de eficácia externa,
mediatamente operativa, porque é necessário que a contraordenação se
verifique e seja aplicada a coima de 50€.

Esta distinção é importante porque, em cada um dos casos, utilizamos diferentes tipos de
reação. Para isso, temos de atender ao disposto nos artigos 72º e seguintes do CPTA, em
especial, aos artigos 72º e 73º.

Assim, perante uma norma regulamentar com eficácia externa imediatamente


operativa, reagimos apresentando ou pedindo aos tribunais administrativos a
declaração a título principal da ilegalidade dessa norma regulamentar. A declaração
pode ter um de dois efeitos: ou ser de força obrigatória geral, ou pode ser com eficácia
circunscrita ao caso concreto.

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No caso de se tratar de uma norma regulamentar com eficácia externa mediatamente
operativa, reage-se contenciosamente contra o ato administrativo de aplicação, e só
a titulo acidental. O objeto principal do processo é o ato de aplicação, e a propósito deste
vai ser apreciada a ilegalidade ou a inconstitucionalidade da norma regulamentar com
eficácia externa que o ato aplica.

Assim, no primeiro caso, reagimos a título principal e, no segundo, a título incidental –


teremos aqui diferentes fundamentos.

Aula 23.02

A distinção entre regulamentos mediatamente e imediatamente operativos tem relevância


para a reação contenciosa – aqui interessa perceber o que o interessado pretende. É em
função disso que se determina os pedidos e, depois de se configurar o objeto, passa-se
para as alegações, concluindo-se, finalmente, o que se pretende.

Assim, estando perante uma norma regulamentar com eficácia externa, temos de perceber
se a norma é mediatamente ou imediatamente operativa.

NOTA: ver artigos 72º e 73º do CPTA, articulando o 72º, nº2 com o artigo 281º da CRP.

No que diz respeito à fiscalização sucessiva abstrata, olhamos para os artigos 281º e 282º
da CRP. O artigo 281º define que é possível pedir a fiscalização abstrata de qualquer
norma (conceito funcional de norma, que compreende todas as normas contidas em lei
em sentido formal e também em regulamentos administrativos).

Desta forma, este artigo diz que o TC tem competência para fiscalizar normas
regulamentares com eficácia externa, sejam elas mediata ou imediatamente operativas,
tendo em vista a declaração ou não, com força obrigatória geral, da ilegalidade ou
inconstitucionalidade das normas. Este artigo permite perceber como se articulam as
competências do TC com as competências dos Tribunais Administrativos.

O TC fiscaliza a legalidade das normas legais com força reforçada, ou seja, é uma
ilegalidade reforçada (artigo 112º, nº3 da CRP). Assim, neste tipo de fiscalização, o TC
fiscaliza regulamentos administrativos com normas de eficácia externa, apreciando a
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sua conformidade com a CRP e leis com valor reforçado, tendo em vista a declaração de
inconstitucionalidade ou ilegalidade com força geral. Esta consideração é fundamental
para percebermos o âmbito de controlo dos Tribunais Administrativos face ao Tribunal
Constitucional.

Assim, em que termos intervêm os Tribunais Administrativos?

Temos de fazer distinção entre normas regulamentares:

I. Imediatamente operativas – impugnação a titulo principal junto dos tribunais


administrativos. A questão da ilegalidade ou da inconstitucionalidade da norma
regulamentar com eficácia externa será decidida pelo tribunal na sentença a proferir.
É apresentado ao tribunal um de dois pedidos:

a. Pedido de declaração com força obrigatória geral – a possibilidade de


coincidência a nível de controlo (conflito positivo de competências) com o TC,
circunscrevem-se a estas. Assim, os tribunais administrativos podem apenas
fiscalizar a legalidade de normas com eficácia externa imediatamente operativa,
com força obrigatória geral, mas apenas uma ilegalidade simples e não
reforçada (esta será apreciada apenas pelo TC) – esta é a forma de
compatibilização entre as duas jurisdições. Assim, o TC não fiscaliza a
ilegalidade simples, apenas a reforçada e a inconstitucionalidade, quando esteja
em causa a declaração com força obrigatória geral.

NOTA: ilegalidade simples corresponde à verificação de conformidade de


normas operativas sem valor reforçado (artigo 112º, nº3 a contrario) ou
hierarquicamente superiores.

Este pedido está previsto no artigo 73º, nº1 do CPTA, sendo que os seus efeitos
se encontram no artigo 76º. Estes efeitos produzem-se desde o momento da
entrada em vigor da norma regulamentar, associados os efeitos
repristinatórios, sem prejuízo da salvaguarda de decisões transitadas em

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julgado, ou da possibilidade do tribunal poder limitar a produção dos efeitos à
aceitação da sentença.

b. Pedido de declaração circunscrito ao caso concreto – pede-se a declaração


da ilegalidade e da inconstitucionalidade com efeitos circunscritos ao caso
concreto, ou seja, os efeitos da declaração de ilegalidade ou
inconstitucionalidade produzem-se apenas a partir da prolação da sentença e
não têm força obrigatória geral. A ilegalidade simples não é apreciada nesta
sede.

Aqui, a norma deixa de produzir efeitos quanto à produção da sentença,


relativamente àquele caso concreto, com fundamento na
inconstitucionalidade ou ilegalidade reforçada da norma regulamentar. Os
parâmetros de controlo são a inconstitucionalidade ou ilegalidade reforçada (se
for simples, em termos de segurança jurídica, apresenta garantias diferentes e
tem de ser feito um pedido de declaração com força obrigatória geral), sendo
que nestes casos, não há recurso direto ao TC (artigo 281º CRP), mas existe
possibilidade de queixa junto do Provedor de Justiça (artigo 23º CRP).

Está previsto no artigo 73º, nº2 do CPTA.

II. Mediatamente operativas – são normas que dependem de um ato administrativo


de aplicação, pelo que a reação a título principal será contra este ato administrativo
de aplicação da norma. O ato de aplicação é o objeto principal e pode ser feito através
de dois pedidos:

a. Pedido de impugnação – o que se pede ao tribunal é que anule ou que declare


nulo o ato administrativo (declaração de nulidade ou anulação), pelo que o ato
deixará de produzir os seus efeitos jurídicos e práticos.

b. Pedido de condenação à prática de um ato devido – perante uma norma


regulamentar mediatamente operativa, o objeto principal do processo é a

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impugnação do ato administrativo ou a condenação de um ato legalmente
devido como reação. Assim, só reagimos a título incidental ou secundário.

Neste caso, a reação é a título incidental e é feita através de um pedido de


desaplicação da norma ao caso concreto, ou seja, pede-se que o tribunal
considere o ato administrativo de aplicação como ilegal e proceda à
desaplicação do ato ao caso concreto (artigo 73º, nº3 do CPTA), sendo que a
norma se mantém em vigor nos demais casos.

Contudo, podem existir limitações, uma vez que o tribunal aprecia a


inconstitucionalidade, a ilegalidade simples e a ilegalidade reforçada.

Em sede de fiscalização sucessiva concreta, o Tribunal Constitucional só intervém em


sede de recurso. Qualquer tribunal pode, oficiosamente, constatar a ilegalidade ou
inconstitucionalidade de uma norma; pode, a título incidental, decidir quanto à ilegalidade
ou inconstitucionalidade de uma norma relevante para o processo. O TC só intervém em
sede de recurso.

• Se aplicarmos o que resulta da CRP – existe uma fiscalização incidental e pode


existir fiscalização a título de recurso – em qual destes atos pode existir recurso
para o TC?

Nos atos mediatamente operativos, a título incidental. Contudo, tem-se também


entendido que se pode admitir o recurso para o TC nos casos de fiscalização de
normas imediatamente operativas, com efeitos circunscritos ao caso concreto.

• Cabendo recurso para os tribunais centrais administrativos e para o STA, tenho


de esgotar todos para recorrer ao TC ou posso recorrer diretamente?

A resposta está no artigo 72º da LTC. Independentemente do recurso para o TC ser


imediato ou implicar a exaustão dos recursos, esse recurso para o TC é possível quer

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na sequência de uma ação em que a norma regulamentar é apreciada a título
acidental e aplicada ou desaplicada ao caso concreto, com fundamento na
ilegalidade simples, ou a título principal, com efeitos com força obrigatória geral.

Caso Prático nº1


a) Regimento de um órgão colegial – regulamento administrativo interno, dirigido
à organização de uma pessoa coletiva, sendo que os efeitos que este produz se
esgotam dentro desta pessoa coletiva. Trata-se, assim, de uma norma geral e
abstrata, cujos efeitos são internos.

b) Regulamento municipal que procede à criação de uma taxa – regulamento


autónomo com eficácia externa imediatamente operativo. Por outro lado, em
relação à determinação da taxa a pagar no caso em concreto, é um ato
mediatamente operativo, pois necessita de um ato administrativo de liquidação.
Em relação a averiguar se é independente, integrativo, etc., depende da relação
com a norma habilitante (que pode ser da CRP ou de DUE, por exemplo) – neste
caso, é complementar, de execução e desenvolvimento.

c) Regulamento que disciplina a vida quotidiana de uma instituição de ensino


superior dirigido à prestação de serviços de formação especializada,
prevendo procedimentos internos de organização de cursos de formação
contínua e os regimes de avaliação dos estudantes inscritos – regulamento
(norma geral e abstrata emanada no exercício da atividade administrativa) que
contém normas com eficácia externa (as que definem a avaliação dos estudantes)
e interna (as que regulam a atividade), sendo através da avaliação destas que
percebemos se são imediatamente ou mediatamente operativas. Neste caso, em
relação às normas regulamentares com eficácia externa, terá de existir uma
habilitação prévia (não será um regulamento habilitado pela CRP), que confere
maior ou menor liberdade de regulamentação. Depois disto, verificamos que tipo
de regulamento é (independente, executivo, complementar, etc.). Tendo em conta
que este é um regulamento de uma universidade, é um regulamento autónomo
(artigo 76º CRP).

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d) Resolução do Conselho de Ministros pelo qual se procede à nomeação de
vários funcionários – um dos tipos possíveis de regulamento do Governo.
Contudo, neste caso, por estar em causa a nomeação de vários funcionários, é
materialmente um ato administrativo. Assim, a forma é de regulamento, mas
materialmente não é dotado da generalidade e abstração, que materialmente o
regulamento exige, ou seja, temos um invólucro de um regulamento e,
materialmente, temos um ato administrativo plural.
Aqui, este ato administrativo tem um conjunto de destinatários determinado e, à
partida, será um ato administrativo plural que, por questão de simplicidade, foi
incluído num único ato – no fundo, teríamos um feixe de atos administrativos.

e) Norma de uma postura municipal que prevê uma proibição de circulação


rodoviária – as posturas municipais são, por definição, regulamentos municipais
dirigidos à produção de efeitos jurídicos externos. Trata-se de uma norma
regulamentar com eficácia externa, com efeitos mediatamente operativos, que
constam de um regulamento autónomo que, por ser um regulamento do município,
pode fundar-se diretamente na CRP (artigo 241º), sem prejuízo de, neste domínio
particular, se fundar numa norma regulamentar hierarquicamente superior, numa
norma de DUE, numa norma internacional, etc.

f) Norma do estatuto disciplinar da Federação Portuguesa de Futebol que prevê


como infração disciplinar, à qual associa a sanção de não inscrição de atletas,
o não pagamento de salários aos jogadores – neste caso, é importante
definirmos a Federação Portuguesa de Futebol, que é uma pessoa coletiva privada,
de tipo associativo, constituída por iniciativa privada, que tem a especialidade de
prosseguir fins que são de interesse público, como a promoção da atividade
desportiva.
Nessa medida, federações desportivas beneficiam de um estatuto de utilidade
pública, que lhes confere deveres e direitos, e um estatuto especifico que lhes
possibilita o exercício de poderes públicos de autoridade, designadamente a
competência para emitir regulamentos que são regulamentos administrativos. Isto
é importante para perceber de que forma o CPA se aplica às federações
desportivas.

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Assim, este regulamento disciplinar é um regulamento administrativo, pelo que,
ao ser disciplinar, produz efeitos externos e as normas que preveem as infrações
disciplinares imediatamente operativas.

NOTA: a norma que define a aplicação da sanção é mediatamente operativa ≠ a que define a
sanção é imediatamente operativa.

Caso Prático nº2


Os regulamentos administrativos são sempre suscetíveis de impugnação
administrativa e contenciosa.

A afirmação é falsa, os regulamentos não são sempre suscetíveis a impugnação


administrativa e contenciosa. Mais precisamente, depende do tipo de norma regulamentar,
na medida em que depende se tem ou não efeitos externos. Importa ainda distinguir
consoante a eficácia externa seja mediatamente ou imediatamente operativa.

Do que resulta do CPTA e do ETAF, as normas com eficácia interna não são passiveis de
qualquer reação junto dos tribunais administrativos e fiscais. O legislador podia ter ido
mais longe, mas não o foi, pelo que fecha a possibilidade a regulamentos com eficácia
externa. O legislador fez este exercício relativamente a atos, mas não aos regulamentos.

No que diz respeito aos mecanismos de reação administrativa, falamos de reclamação e


recursos (artigos 184º e seguintes do CPA), sendo que eles podem ser também utilizados
contra normas regulamentares. São passíveis de o ser contra normas com eficácia externa
(artigos 147º e 135º CPA).

Contudo, alguma doutrina entende que, face à não previsão de mecanismos de reação
relativamente aos regulamentos internos, seria importante existir uma interpretação
generosa. Ana Raquel Moniz acaba por admitir que isto seria questionável, pois o artigo
135º fecha essa possibilidade.

Assim, existem dois planos – o que resulta da lei e corresponde à realidade, e o que a
doutrina entende que deveria ser.

20
Atualmente, as normas com eficácia interna não têm qualquer mecanismo de reação do
artigo 184º, mas podem ser declaradas ilegais pela própria Administração Pública.

NOTA: nesta matéria, ler Ana Raquel Moniz.

Aula 02.03

Marcha do Procedimento Regulamentar Comum previsto no


CPA
1. Fase Preparatória
a. Fase da iniciativa
b. Fase de instrução
c. Fase da participação
d. Fase da elaboração do projeto final do regulamento administrativo
2. Fase constitutiva
3. Fase integrativa de eficiência

O procedimento administrativo é muito importante, porque permite uma articulação


entre os diversos intervenientes no procedimento, tendo em vista a prática de um ato
jurídico.

Uma segunda função essencial desempenhada pelo procedimento relaciona-se com a


verdade procedimental, que convém que coincida co´[m a verdade material ou real,
ou seja, pretende-se que sejam levados ao procedimento os factos relevantes para o
decorrer do procedimento administrativo, e que seja essa a verdade que serve de
fundamento para o procedimento administrativo.

NOTA: é muito fácil manipular o procedimento, daí ser tão importante esta verdade procedimental. Por
exemplo, o artigo 26º, alínea a) do Código dos Contratos Públicos.

A fase de instrução, onde se tenta perceber qual a verdade procedimental e se tenta


garantir que ela corresponde à verdade real, é fundamental e é uma função que cabe
ao procedimento que antecede a prática de qualquer ato jurídico.

21
Uma outra função passa pela participação dos interessados no procedimento
administrativo que lhes diz respeito. A este direito da participação ainda se junta um
direito de participação popular, quando num procedimento estejam em causa direitos
difusos (como natureza, saúde, educação, etc.), que se traduz numa Lei de ação popular
(discute-se a legitimidade, ou seja, quem é ator popular, e quem e quando pode exercer o
seu direito de participação).

O procedimento administrativo é a principal característica do Direito


Administrativo e da atuação da Administração Pública. A autonomia privada não está
sujeita a um procedimento administrativo anterior, como acontece na autonomia pública,
que é totalmente procedimentalizada (artigo 267º, nº5 CRP – a procedimentalização é
uma exigência constitucional).

O procedimento está pensado para ser célere, se toda a gente fizer cumprir a sua função
e atuar da forma prevista. Contudo, o grande problema da atuação da Administração
Pública prende-se com a formação sobre o procedimento e na convivência de velhas
práticas difíceis de alterar, mesmo quando contrárias à legislação. Deste modo, não é um
problema de legislação, é um problema de cultura e de formação, que implica uma
mudança completa das estruturas.

De acordo com o artigo 1º, nº1 do CPA, o procedimento administrativo define-se como
“a sucessão ordenada de atos e formalidades relativos à formação, manifestação e
execução da vontade dos órgãos da Administração Pública”. No nº2 do mesmo artigo,
define-se processo administrativo “o conjunto de documentos devidamente ordenados
em que se traduzem os atos e formalidades que integram o procedimento administrativo”.

NOTA: ter atenção à distinção procedimento administrativo ≠ processo administrativo.

No que diz respeito aos regulamentos, o procedimento regulamentar está previsto nos
artigos 97º e seguintes do CPA.

1. Fase Preparatória

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i.Fase de Iniciativa
O procedimento regulamentar tem iniciativa oficiosa, ou seja, tem iniciativa do órgão
com competência regulamentar, independentemente da existência ou não de iniciativa
dos cidadãos nesse sentido (os cidadãos podem, por exemplo, apresentar uma petição
nesse sentido), nos termos do artigo 97º do CPA.

O inicio do regulamento é objeto de publicitação no site institucional da entidade


pública competente, ao abrigo do artigo 98º do CPA.

ii.Fase de Instrução
Esta fase de instrução dirige-se:

• À aquisição, composição e graduação dos interesses públicos e privados


coenvolvidos.
• À ponderação dos custos e benefícios das medidas projetadas.
• À elaboração do projeto de regulamento e da respetiva nota justificativa, que
deverá conter a fundamentação das opções tomadas – artigo 99.º do CPA.

As normas regulamentares podem ter efeitos internos ou externos, sendo que, quando têm
efeitos externos, podem depender de um ato. Estas normas não deixam de produzir efeitos
na esfera jurídica dos cidadãos, interesses esses que devem ser ponderados nesta fase de
instrução.

iii.Fase de Participação
A fase de participação do procedimento regulamentar pode ser feita a duas modalidades
distintas:

• Audiência dos interessados (artigo 100º CPA) – relaciona-se com o número de


interessados. Só faz sentido quando o regulamento produz efeitos imediatos na
esfera jurídica dos cidadãos, afetando os seus direitos ou interesses legalmente
protegidos – o prazo de audiência disposto deve ser razoável, mas não inferior a
30 dias.

23
• Consulta pública (artigo 101º CPA) – alternativa à audiência dos interessados,
quando o número de interessados tão elevado que a audiência se torne
incompatível, nos termos do artigo 100º, nº3, alínea c), ou quando a natureza da
matéria o justifique.

iv.Fase da Elaboração do Projeto Final do Regulamento Administrativo


No projeto final têm de ser equacionadas as participações dos cidadãos e dos interessados.

2. Fase Constitutiva
A fase constitutiva constitui uma fase de ponderação e aprovação. Pode caber ao mesmo
órgão que tem a competência regulamentar ou não, sendo que pode ser um órgão colegial
ou um órgão singular.

Quando são órgãos diferentes, o ato de confirmação do regulamento é configurado como


um ato administrativo e tem competência autónoma. Quando é o mesmo órgão a fazê-lo,
o ato de confirmação é um mero ato preparatório e instrumental, sem autonomia.

Os vícios que afetam o ato de aprovação, refletem-se no procedimento administrativo.


Não são vícios próprios do regulamento, mas vícios praticados no procedimento
regulamentar.

3. Fase Integrativa de Eficácia


Aprovado o regulamento, este está sujeito a publicação no Diário da República (DRE),
em 2ª série. A publicação não é um requisito de validade, é requisito de eficácia e
produção de efeitos. Os regulamentos entram em vigor na data neles estabelecida ou no
quinto dia após a sua publicação – artigo 140.º do CPA.

Os regulamentos não podem ter eficácia retroativa quando imponham deveres,


encargos, ónus, sujeições ou sanções, quando afetem interesses e direitos legalmente
protegidos dos seus interessados ou destinatários ou quando afetem a execução do seu
exercício. Para além disso, os seus efeitos não se podem reportar a uma data anterior
àquela a que reporta a lei habilitante – artigo 141º, nº2 do CPA.

24
Artigo 143º - estabelecem-se parâmetros de conformidade, ou seja, os regulamentos
devem estar em conformidade com a CRP, normas de Direito da União Europeia e Direito
Internacional, e com normas hierarquicamente superiores.

Artigo 138º - critérios de hierarquia, no que respeita aos regulamentos do Governo


entre os mesmos e à forma como se articulam os regulamentos do Governo e os
regulamentos das Autarquias Locais. A violação destas regras resulta em ilegalidade
simples.

Artigo 144º - define o regime da invalidade. Nos regulamentos não falamos de nulidade,
mas sim de ilegalidade (simples ou reforçada) e de inconstitucionalidade.

A invalidade pode ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado, mas existem
exceções: se se tratar de uma invalidade material, pode ser invocada a todo o tempo; se
for uma invalidade orgânica, pode ser, também, invocada a todo o tempo; se for uma
invalidade formal ou procedimental, temos de distinguir, de acordo com o artigo 144º:

a. Resulta de uma norma constitucional (regulamento inconstitucional) – pode ser


invocada a todo o tempo.
b. Resulta de carência absoluta de forma legal ou de preterição de consulta
pública exigida por lei – pode ser invocada a todo o tempo.
c. Nos restantes casos, a invalidade só pode ser invocada num prazo de seis meses.

NOTA: o artigo 74º do CPTA vai de encontro ao nº1 e ao nº2 do 144º do CPA (fazer remissão).

Quanto ao regime de invalidade, é importante mencionar o facto de, para a


Administração Pública, a declaração de invalidade de um regulamento estar
configurada como uma possibilidade. Daqui surgem duas questões diferentes:

i. Um interessado dirige-se à Administração Pública – o regulamento tem de ser


apreciado e declarada a invalidade ou não.
ii. Apercebendo-se a Administração Pública oficiosamente da invalidade do
regulamento, questiona-se se há um dever de declarar a sua invalidade ou se
apenas existe uma mera possibilidade (competência discricionária) – parece ser

25
este o sentido do nº1 do artigo 144º, mas não parece ser conforme àqueles que são
os desígnios da atividade administrativa e a ligação da atividade à legalidade
(apesar de ser o que se retira de uma interpretação literal da norma esse não é o
único elemento relevante em sede de interpretação) .

Mecanismos de Reação
Reclamação e recursos administrativos – artigos 184º e seguintes do CPA.

O artigo 147º diz que os recursos têm, à partida, caráter facultativo.

Ponto 1 do PowerPoint (slide 14) – temos aqui duas formas de reação (tribunais ou própria
Administração Pública), uma questão relevante é saber como estas formas se articulam.

Temos de fazer primeiro utilização dos recursos e reclamação administrativo e só apenas


depois recorrer aos tribunais administrativos? Em principio não, em princípio as
reclamações e recursos administrativos são facultativos (artigo 185º, nº2 do CPA e
artigo 147º do CPA, para os regulamentos). Sendo as reclamações e recursos
administrativos facultativos, posso fazer várias coisas:

• Apenas esquecer a reclamação e os recursos, partindo logo para os tribunais.


• Fazer, primeiro, uso da reclamação e recurso administrativo, ver o que é decidido
e, se o meu interesse ainda se mantiver, recorrer posteriormente aos tribunais.
• Fazer as duas coisas ao mesmo tempo, uma vez que o CPTA tem previstos
mecanismos de articulação.

Qual é a melhor alternativa? Recorrer aos tribunais nunca é a melhor alternativa, desde
logo por uma questão económica, temos necessariamente de constituir advogado (artigo
15º do CPTA) e pagar custas. Assim, a melhor coisa a fazer é apresentar reclamação e
recursos administrativos.

A primeira coisa a fazer, por questões de “bom senso”, será tentar falar diretamente com
as pessoas responsáveis, pois podemos ter a sorte de resolver a questão com um mero
telefonema ou reunião. Contudo, se esta hipótese não resultar, a melhor opção passa por
apresentar uma reclamação ou recurso administrativos, uma vez que é gratuito e faz
suspender os prazos, se existirem, de recorrer a tribunal enquanto o recurso está a ser
decidido. Este prazo está suspenso até existir uma decisão, ou terminar o prazo para

26
decidir – a partir do momento em que um destes se verifica, retoma a contagem do prazo
para acesso ao tribunal.

NOTA: quando um prazo se interrompe, o prazo começa a contar do 0. Se é suspenso, retoma a contagem
de onde parou.

Uma coisa é a suspensão dos prazos de acesso aos tribunais, outra coisa é a suspensão
dos efeitos da norma, ou seja, se optar por apresentar reclamação e recurso
administrativo, a norma continua a produzir os seus efeitos. Só não é assim se pedir a
suspensão de eficácia da norma à própria Administração Pública, ou se, oficiosamente, a
entidade administrativa entender que não é vantajoso que a norma continue a produzir os
seus efeitos e decida suspendê-los. Neste último caso, é possível recorrer aos tribunais
administrativos e fiscais, tentando uma providência cautelar de suspensão de produção
dos efeitos da norma, nos termos do artigo 130º do CPTA.

Outra vantagem, prende-se com o facto de, no caso de optar pelo uso da reclamação e
recursos administrativos, como é a Administração Pública a fazer a própria fiscalização,
não está limitada pelo princípio da separação de poderes – artigo 185º, nº3 do CPA.

Até agora referimo-nos aos regulamentos, mas também pode existir uma omissão ilegal
de norma regulamentar. Existe um dever de aprovar um regulamento (não há
discricionariedade quanto à existência do regulamento, pode existir quando ao conteúdo),
seja porque existe uma lei que o menciona expressamente, seja porque é necessário
para que outro regulamento ou lei se apliquem.

É necessário perceber se essa obrigação regulamentar existe ou não, e perceber a partir


de que momento é exigível (artigo 137º do CPA), isto é, a partir de que momento se pode
considerar que há uma omissão do regulamento.

Como reagir contenciosamente contra uma omissão legal de um regulamento


administrativo?

O artigo 77º do CPTA responde-nos a esta questão.

Condena-se a atividade administrativa à emissão de regulamento e dá-se um prazo para


esse cumprimento. Se a sentença for incumprida pela entidade administrativa, passa-se

27
para a fase de execução de sentenças, onde existe mecanismos, como a sanção pecuniária
compulsória, em que o tribunal condena o pagamento de uma quantia(quantia essa que
não é retirada do orçamento do órgão, mas sim do ordenado dos próprios titulares do
mesmo, sendo assim em geral muito eficiente), até que o regulamento seja emitido.

Pode existir responsabilidade civil, criminal e disciplinar associadas.

Caso Prático nº3


1. Norma do PDM que viola o disposto no Programa de Ordenamento do
Território:

Ambos são regulamentos administrativos, sendo que, nos programas urbanísticos e


programas de ornamento do território, existe uma hierarquia. Estes últimos, como se
referem ao plano territorial nacional, são hierarquicamente superiores aos urbanísticos,
que têm âmbito municipal. Qualquer desconformidade recorre numa ilegalidade simples.

Dependendo da violação, incorremos numa violação de norma material, formal (ou


procedimental), ou orgânica, sendo que tem relevância para prazos, nos termos do artigo
144º do CPA e 74º do CPTA.

2. Regulamento de avaliação dos discentes que não foi sujeito a consulta


pública:

A consulta pública constitui uma forma de participação do procedimento regulamentar e,


nos termos do artigo 71º do CPA, é uma exigência procedimental e formal, sendo que um
regulamento que não o respeite, está inquinado a uma ilegalidade formal, nos termos do
144º do CPA, logo não existe prazo (artigo 144º, nº2, parte final).

Aula 09.03

Caso Prático nº3 (continuação)

28
3. Regulamento municipal que define as zonas de estacionamento proibido sem
que do mesmo conste qualquer preâmbulo:

O preâmbulo de um regulamento tem especial relevância para que se perceba a sua


finalidade.

A importância do preâmbulo serve sobretudo para garantir a transparência das soluções


postas num qualquer regulamento, serve eventualmente para critério interpretativo – o
intérprete tenta perceber, apenas olhando para o preâmbulo, os objetivos a alcançar. Na
verdade, o preambulo em si só não tem qualquer valor percetivo próprio, ou seja, não tem
caracter vinculativo nem são normas.

A falta de preambulo não resulta em qualquer ilegalidade. Contudo, se a falta estiver


relacionada com o procedimento regulamentar, e houver lugar à consulta prévia e pública,
que será feita com base num processo sem nota justificativa, (a nota justificativa deve ser
complementada com as observações que foram levadas em sede de consulta prévia e
pública). À partida, havendo nota justificativa, haverá preambulo.

Não havendo preâmbulo, não haverá qualquer ilegalidade, mas não havendo nota
justificativa, considera-se que a consulta prévia e a consulta pública ficam prejudicadas e
são reduzidas a formalidades sem sentido. Portanto, se a falta de preâmbulo for
consequência disto, temos uma ilegalidade derivada de um vicio que ocorreu no
procedimento regulamentar que o antecede.

Idealmente, todos os regulamentos deveriam ter preâmbulo, para evitar situações de


desconformidade.

4. Regulamento municipal que não foi aprovado pelo órgão competente:

Os vícios que respeitam ao ato de aprovação são vícios relacionados com o procedimento
do regulamento administrativo, pelo que serão vícios derivados, sendo que temos aqui
uma invalidade orgânica. Relativamente a prazos, é possível invocar a todo o tempo,
quando está em causa uma ilegalidade orgânica, ao abrigo do artigo 144º, nº1 do CPA.

29
Caso Prático nº4
1. Contrato de arrendamento social sujeito ao regime da renda apoiada,
previsto na Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro:

Temos aqui um contrato de arrendamento, que é um contrato (negócio jurídico entre, pelo
menos, duas partes), em que uma das partes é um contraente público, cujo objeto social é
dirigido ao arrendamento e habitação social. A outra parte será o arrendatário que,
considerando as características deste contrato, será uma pessoa singular, que se encontra
e fez prova, no âmbito de uma situação concursal, de uma situação socioeconómica, que
preenche os requisitos e lhe permite o acesso à habitação social.

O ato de atribuição de habitação social é um ato administrativo, mas neste ato é celebrado
um contrato administrativo, que é um contrato de arrendamento social. O contrato de
arrendamento social é um contrato público de Direito Administrativo, que não é regido
pelo Código dos Contratos Públicos, uma vez que não está sujeito a concorrência, mas é
este o regime indicado, que se qualifica como um regime jurídico de Direito
Administrativo.

Concluindo, tratamos aqui de um contrato público de Direito Administrativo, pelo que o


regime da renda apoiada é regulado por normas de Direito Administrativo, pelo que corre
nos tribunais administrativos e a legislação aplicável é o CPTA.

2. Declaração que esclarece, após pedido do interessado, que “de acordo com os
registos o contribuinte não tem dívidas fiscais”:

Está aqui em causa um ato meramente declarativo, pois verifica uma determinada
situação, em que se declara e comunica ao interessado, sem que haja produção de efeitos
jurídicos externos, portanto não merece a declaração como ato administrativo, que, ao
abrigo do artigo 148º do CPA, exige a produção de efeitos jurídicos externos inovadores.

Assim, tem de existir uma extinção, modificação de uma relação jurídica ou alteração da
qualidade de uma situação ou de um bem. Neste caso, não se altera nada, não existe o
caráter regulador exigido, pelo que é um ato meramente declarativo.

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3. Nos termos do artigo 11.º do Código das Expropriações, “a entidade
interessada, antes de requerer a declaração de utilidade pública, deve
diligenciar no sentido de adquirir os bens por via de direito privado, salvo
nos casos previstos no artigo 15.º, e nas situações em que, jurídica ou
materialmente, não é possível a aquisição por essa via”:

A declaração de utilidade pública é um ato administrativo, pois faz referência a um


determinado bem que é expropriado e tem um fim de interesse público que justifica a
expropriação.

Não é no momento da declaração que o bem é expropriado, a declaração apenas identifica


o bem e dá a conhecer ao seu proprietário que irá ser privado desse bem, através do
pagamento de uma indemnização, que à partida será justa e razoável, que será acordada
de seguida.

O processo de expropriação funciona da seguinte forma:

1. Conforme consta na norma, tenta-se celebrar um contrato de compra e venda,


regido pelo Código Civil e sujeito a escritura pública. É um contrato público de
Direito privado, e não de Direito Administrativo, onde há um contraente público,
o adquirente, e um contraente privado, a pessoa que vende. Também podemos ter
um expropriado que seja uma pessoa coletiva pública. O regime substantivo deste
contrato é de Direito privado.

2. Se o contraente aceitar, celebra-se o contrato de compra e venda. Por outro lado,


se este não aceitar, a entidade pública pratica um ato administrativo de utilidade
pública, que dá inicio ao processo de expropriação. A partir do momento em que
se dá a publicação e o expropriado sabe que vai ser privado desse bem, existe a
expropriação e o proprietário adquire a condição de expropriado – a questão que
se coloca nesta fase é a de saber quando ele receberá a indemnização.

3. Por último, há uma fase em que se tenta, de forma amigável, chegar a um montante
de indemnização a pagar, onde pode ou não existir um consenso. Não havendo
consenso, segue-se para os tribunais comuns, que vão decidir qual a indemnização
a pagar a título de expropriação – são estes tribunais a fazê-lo, uma vez que é isso
que resulta do Código de Expropriações.

31
NOTA: ler o artigo 212º, nº3 CRP com o artigo 4º ETAF, que contém um elenco
exemplificativo.

4. Norma de uma postura municipal que prevê uma proibição de circulação


rodoviária:

Temos aqui uma norma de um regulamento autónomo, com eficácia externa e


mediatamente operativo.

5. A entidade concessionária da atividade de fiscalização das contraordenações


previstas no artigo 71.º do Código da Estrada, levantou um auto de
contraordenação por falta de pagamento da taxa de estacionamento devida:

O auto de contraordenação é um ato administrativo, porque preenche os critérios do artigo


148º do CPA.

Características deste ato:

• Quanto aos seus efeitos, é desfavorável;

• Quanto ao facto de produzir os seus efeitos na esfera do seu destinatário direto, é


um ato administrativo bipolar (se produzisse efeitos na esfera de terceiros, seria
um ato polivalente);

• Quanto ao conteúdo, é positivo.

A qualificação quanto ao conteúdo não se relaciona com o facto de os efeitos serem


desfavoráveis ou não, mas tem relevância quanto ao nível do pedido adequado:

a) Atos de conteúdo negativo – atos de indeferimento, por isso, se quiser reagir


contra eles nos TA, apresento um pedido de condenação (não me serve impugnar
um ato de indeferimento).
Nos atos de conteúdo negativo, existe uma recusa por parte do órgão competente
do efeito pretendido pelo interessado, que pretendia um certo efeito jurídico que
lhe foi negado, por isso é que este, se quiser recorrer aos tribunais, deve pedir-lhes
a condenação à prática do ato legalmente devido pela entidade administrativa.

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b) Atos de conteúdo positivos – independentemente do seu efeito favorável ou
desfavorável, constituem uma nova relação jurídica, modificam uma existente,
extinguem uma anterior, ou alteram uma qualidade ou estado de uma determinada
coisa ou bem (por exemplo, um auto de contraordenação, uma licença de
construção, um ato de despedimento). Isto está relacionado com o facto de se
alterar ou criar uma coisa, não está relacionado com os seus efeitos. Neste caso, o
pedido adequado é um pedido de impugnação, uma vez que o que se pretende é a
anulação desse ato – há um efeito que queremos que deixe de existir.

c) Atos de conteúdo ambivalente – em certa medida, têm efeitos positivos, mas há


um terceiro que tem como destinatário desse ato administrativo um interesse
pessoal.
Por exemplo, um ato de adjudicação, que é um ato positivo, mas pelo facto de
existirem terceiros com interesse concorrente, só impugnar o ato de adjudicação
não serve, pois este deixa de existir, mas não faz com que eu ocupe a posição de
beneficiário desse ato. Aquilo que eu pretendo é que o tribunal substitua o ato por
um outro ato de adjudicação, com o qual a proposta com que se celebra o contrato
é a minha.
É ambivalente porque atribui o efeito pretendido por aquele que está graduado em
primeiro lugar, recusando esse mesmo efeito aos demais candidatos com
interesses contrários ao que está em primeiro. O pedido adequado é o pedido de
condenação à prática do ato legalmente devido.

6. O delegante remeteu oficiosamente ao delegado, nos termos do artigo 41.º do


CPA, um requerimento que implica o exercício das competências que lhe
tinham sido delegadas:

O ato de remissão oficiosa para outro órgão não é um ato jurídico.

No artigo 41º do CPA, existe uma manifestação do princípio da colaboração entre a


Administração Pública e o interessado. Se o interessado enviar o requerimento a um órgão
que não o órgão que está a exercer a competência no momento, este artigo 41º prevê o

33
dever de quem recebe um requerimento e não tem o exercício da competência, o remeter
para quem a tenha.

Assim, não é um ato administrativo, pois não produz efeitos inovadores individuais e
concretos, mas pode classificar-se como um ato de caráter material e instrumental,
praticado pelo órgão que recebeu o requerimento, ao abrigo do princípio da colaboração
e da boa fé procedimental.

7. “Por falta de apresentação da declaração de aceitação do conteúdo do caderno


de encargos, considere-se a sociedade “Construções Silva, S.A.” excluída do
concurso público tendente à celebração de um contrato de empreitada de obras
públicas.”:

Temos aqui um ato administrativo, praticado no recurso de um procedimento


administrativo. O facto de assim o ser, não significa que é um ato administrativo que põe
termo ao procedimento, este ocorre pelo meio do procedimento.

Para além disso, o facto do ato não se localizar no termo do procedimento não é relevante
para os efeitos, apenas define de forma inovadora a posição subjetiva do concorrente
excluído. É bipolar, produz efeitos jurídicos desfavoráveis para o candidato excluído e
tem um conteúdo positivo.

Artigo 51º, nº3 CPTA – inclui duas situações:

i. É possível reagir contenciosamente contra atos praticados durante o


procedimento – é apenas uma possibilidade.

ii. Se o interessado quiser reagir contra o ato que põe termo ao seu procedimento,
tem de reagir contra o ato de exclusão.

O interessado excluído deixa de ser concorrente e interessado do ato de adjudicação, logo


não pode reclamar contra esse ato, se não tiver reclamado anteriormente do ato que o
excluiu. Assim, o interessado tem, necessariamente, de reclamar contra o ato que os
exclui, sendo que é isto que se retira deste artigo.

34
Artigo 51º, nº2 do CPTA – permite a reação de atos administrativos que não ponham
termos a um procedimento administrativo, pois a definitividade horizontal não é critério
da qualificação desse ato como administrativo.

8. Parecer vinculativo favorável da Agência Portuguesa do Ambiente à


construção em zona abrangida pelo Programa do Proteção da Orla Costeira:

O regime geral dos pareceres vinculativos está regulado nos artigos 91º e 92 do CPA e,
regra geral, são obrigatórios e não vinculativos. Este parecer vinculativo produz efeitos
jurídicos externos e tem relevância externa, na medida em que condiciona a decisão do
órgão que tem a competência decisória.

Os pareceres, para serem vinculativos, têm de resultar de uma norma especial, a regra é
que não são vinculativos, por isso a norma especial tem de o qualificar como tal. A partir
do momento em que é vinculativo e o órgão não o respeita, esse ato será um ato inquinado
por um vício invalidante, cuja consequência seria a anulabilidade.

Para efeitos do CPA, não são atos administrativos, mas o legislador trata como se fossem
para efeitos de acesso aos TA, no artigo 51º, nº2, alínea b) do CPTA.

A ideia do legislador é permitir aos interessados reagirem imediatamente, ao abrigo do


artigo 51º, nº3 do CPTA. O que está em causa é garantir uma tutela antecipada e
preventiva, enquanto não é praticado o ato administrativo que eles vinculam e, a partir
daí, deixa de existir uma justificação e passa o interessado a poder apenas reagir contra o
ato administrativo vinculado por aquele parecer praticado.

Todos os atos administrativos que merecem essa qualificação, para efeitos do artigo 148º
do CPA, são suscetíveis de ser alvo de reação contenciosa nos termos do CPA. Mas
acontece o contrário, quando existem atos jurídicos que não são atos para efeitos do artigo
148º, contra os quais não posso reagir contenciosamente, como se de atos administrativos
se tratassem, porque o legislador no CPTA os define como tal.

Assim, a noção de ato administrativo contra o qual eu posso reagir contenciosamente é


ligeiramente mais ampla, pois o legislador prevê situações como esta do parecer
vinculativo.

35
9. Remoção de uma autocaravana estacionada num terreno do domínio público
municipal:

É uma operação material, á partida, fundada num ato administrativo, que determina a
remoção dessa autocaravana.

Portanto, a operação de remoção da caravana é uma operação material, fundada num ato
prévio que será um ato administrativo que determina essa mesma remoção.

10. Notificação de um ato administrativo;

Temos aqui um ato instrumental. A notificação é um ato meramente comunicativo, que


procura dar conhecimento aos destinatários de um ato administrativo, esse próprio ato
administrativo. Todos os atos administrativos devem ser notificados, contudo, por vezes,
a notificação pode não ser requisito de eficácia do ato administrativo.

Todos os atos administrativos devem ser notificados, ao abrigo do artigo 114º do CPA:

• No nº1, temos um elenco meramente exemplificativo, e o principio é a


notificação de todos os atos administrativos, mesmo que estejam sujeitos a
publicação em DRE.
• No nº2, temos os elementos que devem constar da notificação do ato.
NOTA: fazer remissão do artigo 114º, nº2 para o artigo 60º do CPTA.

Artigo 112º do CPA – refere-se à forma como a notificação deve ser efetuada, sendo que
os meios mais frequentes são o meio eletrónico e a carta registada. A notificação por meio
eletrónico depende de uma manifestação prévia de vontade do interessado, que não tem
de ser expressa, mas pode ser implícita dessa vontade. As notificações por via pessoal
consistem em entrega em mão.

Artigo 113º do CPA – refere-se à perfeição das notificações, ou seja, a partir de quando
os notificados se consideram notificados. Esta questão é relevante, pois é importante
distinguir a data de expedição e a data em que ela chega à posse do interessado. A única
maneira de se resolver situações de má fé (por exemplo, eu vi que o email chegou à caixa

36
de entrada, mas não o vou abrir), é através de presunções, criadas pelo legislador, isto é,
presume-se que a pessoa está notificada, de acordo com os critérios estabelecidos neste
artigo.

A notificação não é requisito de eficácia, apesar de todos os atos deverem ser


notificados, com exceção dos elencados no artigo 160º do CPA, cuja notificação é
requisito de eficácia, ou seja, o ato só produz efeitos na esfera jurídica do interessado a
partir do momento em que é notificado, ou, no caso de incumprimento, pode ser
executado.

Quando o ato administrativo produz efeitos desfavoráveis, tem de ser sempre notificado,
e só é requisito de eficácia nestes casos – isto acontece porque também é a partir desse
momento que o lesado pode reagir contenciosamente ou administrativamente. Se o ato
produzir efeitos desfavoráveis, o interessado pode esperar pela notificação e só a partir
daí toma as diligências necessárias. Se o ato lesar de alguma forma o destinatário, ele tem
o interesse de reagir contenciosamente, cujos prazos só começam a contar a partir da
notificação.

11. Indeferimento de um pedido de atribuição de subsídio:

É um ato administrativo de conteúdo negativo, que recusa a satisfação de uma pretensão.


O pedido adequado junto dos tribunais administrativos é um pedido de condenação à
prática de um ato legalmente devido.

Artigo 51º, nº4 do CPTA – diz que o pedido adequado é o de condenação à prática do
ato legalmente devido, mas se houver algum engano, não há problema. Está aqui
subjacente o princípio pro accione, que corresponde a uma ideia de favorecimento da
justiça.

Aula 16.03

37
Questão 12 – Falta de decisão, no prazo previsto no n.º 1 do artigo 128.º do CPA, de
requerimento no qual se solicita a prorrogação do período de estágio:

Quando falamos em atividade da Administração Pública, falamos numa atividade


positiva, ou seja, na ação. Contudo, também existem questões de inércia, ou seja, quando
a Administração Pública está vinculada a atuar e não atua. A questão coloca-se quando
essa omissão é juridicamente relevante, quando existe uma vinculação da Administração
Pública quanto à atuação e à oportunidade dessa atuação, isto é, quando a Administração
Pública tem o dever de adotar determinada conduta e de o fazer num determinado prazo.

Quando se refere a um ato administrativo, o artigo 13º do CPA é o ponto de partida, cuja
ideia é: um procedimento administrativo de iniciativa externa (responsabilidade do
interessado), inicia-se sempre com a apresentação do requerimento, que, se tiver
determinadas características, daí decorre o dever, para o responsável do procedimento e
o órgão de competência acessória, de iniciar o procedimento administrativo, de modo a
que se decida sobre esse requerimento.

Também existem os procedimentos de iniciativa oficiosa, quando a própria


Administração Pública, independentemente da solicitação por parte dos interessados,
toma a iniciativa de iniciar um procedimento administrativo. Neste caso, não há impulso
externo, por isso não falamos em vinculação quanto ao poder de decidir como falamos
nos procedimentos de iniciativa externa, nos termos do artigo 102º.

O artigo 13º diz-nos que, se o requerimento:

• Não for um desabafo (demonstração de indignação, por exemplo), mas implicar


uma competência jurídico administrativa;
• For apresentado dentro do prazo (no caso de existir);
• For dirigido ao órgão competente (se não for, aplica-se o artigo 41º – dever de
colaboração);
• Não tiver sido apresentado pela mesma pessoa, com o mesmo objeto e os mesmos
fundamentos que um semelhante, anteriormente indeferido, há menos de 2 anos
(a não ser que tenha existido uma alteração dos pressupostos de facto, como uma
alteração legislativa, uma vez que não se pode considerar que os fundamentos
sejam os mesmos).

38
Verificados estes requisitos, o órgão com competência decisória está incumbido do dever
de decidir, num determinado prazo, definido no artigo 128º do CPA. No nº1 deste artigo,
estão definidos os prazos de procedimentos de iniciativa externa (corresponde a 60 dias
úteis, que pode ser prorrogável para 90), se não existir um prazo especial previsto.

Decorrendo este prazo de 60 dias úteis, se não houver decisão, como podemos interpretar
este silêncio administrativo?

Temos de o fazer à luz de duas considerações, presentes nos artigos 129º e 130º: há uma
norma especial que atribui ao procedimento administrativo um significado de silêncio
administrativo, ou seja, considera-se que o pedido foi deferido. Contudo, o artigo 13º
do CPA não é autossuficiente, remetendo para uma norma especial que atribui um
deferimento tácito, porém, se não existir essa norma especial, aplicamos o disposto no
artigo 129º, considerando o silêncio como uma omissão ilegal.

A partir do momento em que se forma o diferimento tácito, por efeito do silêncio em


articulação com uma norma, o órgão não fica proibido de exercer a competência (a
professora considera ser uma enorme fragilidade no sistema). Desta forma, o órgão pode
adotar um ato de deferimento ou indeferimento expresso, que afasta o deferimento tácito.

Quanto à omissão ilegal, reagimos apresentando um pedido de condenação à prática


de um ato legalmente devido. Face a uma situação de omissão (é preciso, primeiramente,
verificar os pressupostos todos e se existe, de facto, uma omissão ilegal), reagimos junto
dos Tribunais Administrativos, com um pedido de condenação à prática de um ato
legalmente devido.

NOTA: remissão do artigo 67º, nº1, alínea a) do CPTA, para os artigos 13º e 128º do CPA;
remissão da alínea c) do nº1 do artigo 67º do CPTA para o artigo 61º, nº4 do CPA.

39
Em qualquer uma destas situações, quando esta seja uma das atuações da Administração
Público, o pedido adequado é o de condenação à prática de um ato devido. Também
podemos reagir administrativamente, fazendo uso da reclamação e recursos
administrativos (introduzidos na revisão de 2015, artigo 184º, alínea b) do CPA).

Questão 13 – Regimento de um órgão colegial:

O regimento de um órgão colegial é um regulamento interno.

Questão 14 – Regulamento que disciplina a vida quotidiana de uma instituição de


ensino superior dirigido à prestação de serviços de formação especializada,
prevendo procedimento internos de organização de cursos de formação contínua e
os regimes de avaliação dos estudantes inscritos:

Regulamento autónomo com eficácia interna e externa.

Caso Prático nº5


Pergunta 1:

O vínculo do trabalhador é aqui relevante, uma vez que, sendo trabalhador de uma pessoa
coletiva pública, não significa que o contrato de trabalho seja um contrato celebrado ao
abrigo da Lei Geral das Funções Públicas, sendo que só quando é celebrado ao abrigo
desta lei é que corresponde a um contrato público de Direito Administrativo. Se o
contrato entre uma pessoa coletiva pública e um trabalhador for regido pelo Código de
Trabalho, trata-se de um contrato público de Direito Privado. Assim, o contrato de
trabalho de Direito privado rege-se pelo Código de Trabalho, ao passo que os contratos
de Direito Administrativo regem-se pela Lei Geral das Funções Públicas, o que leva a
regimes substantivos distintos.

Atendendo à relevância deste aspeto, o legislador introduziu, no artigo 4º do ETAF, uma


norma especificamente dirigida a situações como esta:

40
• Todos os litígios laborais que envolvam pessoas coletivas públicas, cujos
contratos de trabalho são de Direito Administrativo, são da competência dos
Tribunais Administrativos.
• Todos os litígios que envolvam pessoas coletivas públicas, cujos contratos de
trabalho são regidos pelo Código de Trabalho, são competência dos Tribunais
Comuns.

Assim, se o vínculo for privado, são responsáveis os Tribunais Comuns, se, por outro
lado, o vínculo for público, são responsáveis os Tribunais Administrativos.

Quando temos um ato administrativo que aplica uma sanção disciplinar (é antecedido
por um procedimento administrativo especial, regido pela Lei Geral do Trabalho em
Funções Públicas), o CPA aplica-se apenas subsidiariamente nos termos do artigo 2º,
nº5.

Assim, este é um ato desfavorável, que tem duas consequências muito importantes
associadas:

i. O destinatário tem interesse em reagir.

ii. O destinatário tem uma obrigação muito importante, a fundamentação.


A fundamentação tem uma dimensão de justificação do ato administrativo, e
aquilo que se faz é explicitar os pressupostos de Direito e de facto do ato, tendo,
depois, uma componente de motivação, sendo que aqui o que o órgão faz é
explicar o porquê de ter optado por determinada decisão em detrimento das
demais também admissíveis.
A fundamentação varia em função do tipo de ato e das circunstâncias do caso,
sendo que esta tem de ser clara e pensada para ser lida por alguém que pouco
entende do assunto (pretende-se que o seu destinatário, um cidadão médio,
consiga perceber o porquê da decisão). Contudo, a fundamentação é um requisito
formal, ou seja, posso ter um ato mal fundamentado, mas cujo conteúdo não possa
não ser aquele, como pode acontecer o inverso (ou seja, apresentar uma
fundamentação correta mas com base em pressupostos que não correspondem a

41
realidade) . Esta exigência de fundamentação resulta articulação dos artigos 268º,
nº3 da CRP e 152º do CPA.

Se o ato tiver conteúdo favorável ao destinatário, não existe o dever de fundamentar,


contudo, se existir o dever de fundamentação, como no caso do nº1, alínea a) do artigo
152º, e esta fundamentação não for feita, o ato está inquinado num vicio formal, cuja
consequência jurídica é a anulabilidade.

Porque o seu efeito é desfavorável, para além do ato ter de ser fundamentado, deve ser
notificado para produzir os efeitos jurídicos desfavoráveis a que pretende, nos termos do
artigo 160º do CPA. A notificação só é requisito de eficácia quando os efeitos sejam
desfavoráveis (sendo está outra obrigação que decorre do ato ter conteúdo desfavorável).

Para além disso, o ato pode ser:

i. Primário ou secundário – os atos administrativos podem incidir sobre o próprio


ato administrativo (primário) ou sobre outros atos administrativos (secundário).

ii. Bipolar ou multipolar – esta qualificação relaciona-se com a projeção dos efeitos
dos atos administrativos, uma vez que pode acontecer que o ato produza efeitos
não só na esfera jurídica do destinatário (bipolar), como também na esfera jurídica
de terceiros (multipolar).
(por exemplo, uma licença industrial concedida a uma fábrica de curtume de peles
numa zona residencial, que emite fumo, faz descargas em zona próxima, afetando
não só interesses públicos difusos, como o ambiente, mas também os residentes
da zona – é um ato que se pratica num contexto de uma relação jurídica poligonal,
porque existem outras pessoas afetadas por essa licença)

iii. Exequíveis ou não exequíveis – a partir do momento em que o ato produz os


efeitos a que tende, sendo o próprio ato suficiente para desencadear a produção
dos efeitos ou precisar de um outro ato complementar.

iv. Executórios ou não executórios – fazer uso do privilegio da execução prévia ou


não.

v. Singulares, coletivos, plurais ou gerais

a. Singulares – têm um único destinatário.

42
b. Coletivos – dirigem-se a um conjunto de pessoas devidamente unificado,
como, por exemplo, os membros de um órgão colegial.
c. Plurais – por questões económicas, são vários atos administrativos que
constam num único documento, uma vez que têm o mesmo conteúdo e têm
tantos destinatários quantos atos são, compilando, assim, num ato plural.
d. Gerais – têm os seus destinatários indeterminados no momento em que se
pratica o ato administrativo, mas sabemos quem são, porque o ato assim o
define, logo são determináveis.
(por exemplo, um ato administrativo que permite esplanadas aos
comerciantes da rua de Cedofeita – à primeira vista, não sabemos quem são,
mas conseguimos determiná-los)

Pergunta 1 (resposta):

Neste caso, temos um ato desfavorável de conteúdo positivo, pelo que o pedido adequado
é o de impugnação. É um ato impositivo porque aplica uma sanção ao trabalhador,
primário e bipolar.

Pergunta 2:

É um ato desfavorável com conteúdo negativo. É um ato de indeferimento expresso,


praticado num contexto de uma relação jurídica bipolar, que produz efeitos desfavoráveis,
impondo-se a sua fundamentação (de acordo com o artigo 152º, nº1, alínea a) CPA), sendo
que a notificação funciona como requisito de eficácia.

Pergunta 3:

É um ato desfavorável, de conteúdo positivo, que corresponde a um ato impositivo.

Têm enquadramento muito particular no artigo 176º, nº2 do CPA, que nos diz que, se o
ato de cobrança não for cumprido voluntariamente, é sempre possível a execução coerciva
desta obrigação pecuniária pela Administração Pública, remetendo para o artigo 179º.

43
Segue-se um processo de execução fiscal, ou seja, reencaminha-se a questão para
Autoridade Tributária, que inicia esse processo e pode levar, em face do incumprimento,
à penhora de bens do destinatário do ato administrativo.

Estes atos têm de ser notificados (artigo 160º) e fundamentados (artigo 152º, nº1, alínea
a)).

Pergunta 4:

Ato administrativo com efeitos jurídicos favoráveis ao destinatário, de conteúdo positivo,


praticado em contexto de uma relação administrativa bipolar. O facto de ser ilegal é
relevante para a hipótese de ser recorrível.

Para que seja possível recorrer aos tribunais, existe um conjunto de pressupostos que
têm de estar cumpridos:

1. Constituir patrocínio judiciário (advogado);


2. Pagar custas, calculadas em unidades de conta;
3. Perceber qual o tribunal competente:
a. Primeiro, é necessário perceber se são os Tribunais Comuns ou os
Tribunais Administrativos (é uma questão de jurisdição – 312º CRP e 4º
ETAF);
b. No caso de serem os Tribunais Administrativos, perceber qual destes é
competente:
i. Se são os de circulo, que decidem em primeira instância
ii. Se são os centrais administrativos, que só apreciam em segunda
instância;
iii. Se é o Supremo Tribunal Administrativo, que só aprecia questões
de Direito e, em casos excecionais, pode decidir em primeira
instância.
c. Depois disto, dentro dos tribunais de círculo e do STA, temos de ver
territorialmente.
4. Interesse processual em reagir , isto é, utilidade em repetir a decisão que me seja
favorável;

44
5. Legitimidade – peço a licença, ela foi-me negada, tenho legitimidade ativa para
avançar para a ação, porque sou titular de interesse direto e pessoal na demanda
(está relacionado com o interesse processual).

Neste caso, até tenho interesse direto na demanda, pelo que tenho legitimidade, contudo,
não tenho interesse em reagir porque a licença me foi concedida.

Todavia, quem reage contra este ato administrativo é o Ministério Público, que avança
com a ação contra este ato administrativo ilegal, precisamente porque ele é ilegal,
independentemente de ter efeitos favoráveis ou desfavoráveis, uma vez que para o MP o
único interesse relevante é a legalidade.

Nesta licença, a ilegalidade, muito embora não seja um pressuposto processual, é um


requisito de procedência de qualquer ação, portanto, deve ser considerado num
aconselhamento jurídico sobre determinada matéria.

Atos Administrativos

Para que um ato jurídico-público mereça a qualificação de ato administrativo exige-


se, nos termos do artigo 148º do CPA:

i) A produção de efeitos jurídicos reguladores;


ii) Que esses efeitos sejam externos;
iii) Com referência a uma situação individual e concreta (determinada ou
determinável).

Esta qualificação de uma determinada como ato administrativo é relevante porque este
está sujeito a um certo regime substantivo e processual.

No que se refere ao regime jurídico substantivo aplicável aos atos administrativos,


destaca-se:

45
1. A possibilidade de execução prévia: prevista nos artigos 176º, nº 1 do CPA; nos
artigos 6º e 8º, nº 2 do DL 4/2015, de 7 de janeiro; e no artigo 149º do CPA de
1991.

2. A consolidação, pelo decurso do tempo, de um ato administrativo, mesmo que


ilegal, desde que não seja nulo ou inexistente juridicamente, sem prejuízo dos
casos previstos no artigo 101º do CPTA.
Assim, o ato até pode ter um vício, visto que ele não se convalida, mas sim
consolida-se. A nulidade pode ser, em regra geral, invocada a todo o tempo, mas
podem existir exceções (artigo 101º). Desta forma, o ato consolida-se com o
decurso do tempo, quando ele é anulável ou em situações como a do artigo 101º.

3. O poder unilateral de anulação e de revogação dos atos administrativos


praticados (artigo 165º a 172º do CPA). Pode haver lugar à anulação e revogação.

Interpretação do Conceito do Artigo 148º


Temos de perceber se este conceito é coincidente com o conceito de ato administrativo
contenciosamente recorrível. A ideia é que todos os atos administrativos do artigo 148º
são recorríveis para efeitos de acesso aos Tribunais Administrativos. Contudo, o
legislador também permite que outros atos, que não são administrativos nos termos do art
do CPA, sejam classificados como atos administrativos para efeitos de recurso
contencioso.

Aula 30.03

Caso Prático nº6

O regime de acesso ao Direito permite a pessoas que estão numa situação


socioeconómica classificada pelo legislador como fragilizada, terem apoio pela
Segurança Social no que se refere ao pagamento das taxas de justiça e no acesso a
advogados e respetivos honorários. Estes apoios são diversificados, dependendo da
situação e dos rendimentos declarados do interessado, existindo uma fórmula de cálculo

46
desta ajuda prevista. Os pedidos de acesso ao Direito seguem um procedimento
administrativo especial previsto na Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais, ao qual se
aplica subsidiariamente o CPA, nomeadamente o artigo 2º, nº5.

Neste caso, temos uma situação de inércia por parte da Administração Pública. Ana
Leonor apresenta um requerimento, estando os requisitos do artigo 13º do CPA
preenchidos, logo existe um vinculação da Administração Pública, sendo que esta tem um
dever de atuar (artigo 102º do CPA).

Relativamente aos prazos, havendo uma norma especial, afasta-se a norma geral prevista
no CPA, sendo que, neste caso, a Administração Pública tem um prazo de 30 dias para
atuar. Este prazo não foi respeitado, pelo que estamos perante um silêncio. Deste modo,
nos termos do artigo 25º, nº2, o silêncio administrativo é interpretado como um
deferimento tácito do requerimento.

O artigo 25º da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais deve ser lido em articulação com
o artigo 130º do CPA.

O deferimento tácito, da forma como está configurado, não tem associada a preclusão da
competência, sendo possível o exercício expresso posterior da competência por parte
do órgão, que pode praticar deferimento expresso (concordando com o deferimento
tácito formado), ou indeferimento expresso. Isto acontece porque, no deferimento tácito,
não são analisados os pressupostos da situação pela entidade competente, logo pode
tratar-se de uma situação sem qualquer cabimento, onde não se verificam os pressupostos
de facto do Direito, não se podendo, deste modo, manter aquela decisão de deferimento
tácito.

Assim, considera-se que, no pedido apresentado pela Ana Leonor, existe lugar ao
deferimento tácito. Se não existisse esta norma especial, tínhamos uma omissão ilegal e
tínhamos que tentar perceber quais os mecanismos a utilizar.

47
Procedimento Administrativo de um Ato Administrativo
Primário
Os atos primários são aqueles que incidem sobre uma ação especial e concreta, enquanto
os atos secundários são aqueles que incidem sobre um outro ato administrativo, como,
por exemplo, os presentes nos artigos 165º e seguintes do CPA.

Vamos analisar o procedimento dos atos administrativos primários, contudo, no CPA


existem vários procedimentos previstos. Todos esses procedimentos são gerais, ou seja,
aplicáveis no caso de não existir um procedimento especial (como, por exemplo, um
procedimento tributário, um procedimento disciplinar de trabalhadores da função pública,
etc.), aplicando-se o CPA subsidiariamente.

As fases do procedimento são:

1. Fase Preparatória
a. Fase Inicial
b. Fase Instrutória
c. Fase da Audiência dos Interessados
d. Fase da Preparação Direta da Decisão
2. Fase Constitutiva ou Decisória
3. Fase Integrativa de Eficácia ou Complementar

NOTA: esta organização pode ser apresentada de forma diferente pelos diferentes autores, mas é
uma questão irrelevante.

1. Fase Preparatória
a. Fase da Iniciativa
Quanto à iniciativa do procedimento, podemos ter uma de duas opções:

• Procedimento de iniciativa oficiosa – quando é iniciado oficiosamente pelo órgão


com competência decisória. Neste caso, deve existir uma notificação aos
interessados sobre o início do procedimento, ao abrigo do artigo 110º do CPA.

48
• Procedimento de hétero-iniciativa – quando é iniciado a pedido dos interessados
(artigo 68º, nº1 do CPA), através da apresentação de um requerimento inicial
(artigos 102º a 109º do CPA).

É com referência ao requerimento inicial que são identificados os sujeitos da


relação jurídica procedimental. Os interessados, de acordo com o artigo 68º, nº1,
ocupam uma posição determinada na relação jurídica procedimental, que se
desdobra num conjunto de direitos (artigos 11º, 12º, 82º a 85º, 121º a 124º e 131º
do CPA) e deveres (artigos 60º, 116º a 119º e 133º do CPA).

É com a aceitação do requerimento que se dá origem às demais fases de


tramitação do procedimento e que se institui o órgão com obrigação de decidir.

Existem prazos distintos consoante a iniciativa do procedimento. Se estiver em causa um


procedimento iniciado oficiosamente, o prazo é de 120 dias (artigo 128º, nº6 do CPA)
ou, no caso de ser um procedimento de hétero-iniciativa, o prazo corresponde a 60 dias
úteis prorrogáveis para 90 (artigo 128º, nº1 do CPA), contados a partir da data de
apresentação do requerimento.

Independentemente da iniciativa do procedimento, existe uma divisão de


responsabilidades quanto ao papel desempenhado pelos sujeitos no procedimento
administrativo. Existe um órgão ou funcionário responsável até um determinado ponto,
e, posteriormente, outro órgão com competência decisória.

i. Responsável pelo procedimento administrativo

As fases preparatórias são dirigidas a uma figura chamada responsável pelo


procedimento administrativo, que é normalmente um subalterno do órgão com
competência decisória, a quem é atribuída a competência de dirigir o procedimento nestas
fases.

Esta responsabilidade termina com a elaboração de um relatório, previsto no artigo


126º, onde dá conta de tudo o que se fez e aconteceu no procedimento administrativo até

49
ao momento, apresentando, por fim, uma proposta de decisão. Esse relatório é enviado ao
órgão com competência decisória.

ii. Órgão com competência decisória

Este órgão não tem contacto direto nem com os factos nem com os interessados, sendo
que as informações que tem relativamente ao que aconteceu ao longo do procedimento
são as resultantes do relatório elaborado pelo responsável.

Deste modo, a tendência é que o órgão com competência decisória concorde com a
proposta presente no relatório. Contudo, também pode acontecer o contrário, ou seja, o
órgão com competência decisória pode perceber que não foram tomadas todas as
diligências instrutórias necessárias para com o procedimento.

O que se impõe é que este órgão olhe para o relatório de forma crítica, de modo a
controlar a legalidade de tudo aquilo que foi feito pelo responsável e pela decisão que foi
proposta. Se encontrar alguma falha, comunica-a e, se existirem diligências instrutórias
que não foram realizadas, terão de o ser, ou diligências instrutórias que não foram
realizadas corretamente e terão de ser realizadas novamente.

A ideia de divisão de responsabilidades é semelhante à que existe no Direito Penal,


prendendo-se com a garantia de imparcialidade. Para que isto funcione, o órgão com
competência decisória não pode ter uma atitude acrítica.

Artigo 55º do CPA – o que está previsto é uma delegação obrigatória e não uma
delegação típica (salvo as exceções do nº2 do artigo 55º), ou seja, o legislador fixa, por
principio, a obrigatoriedade de delegação de tarefas num outro órgão que assume as
competências do procedimento administrativo. Não é uma delegação que siga o regime
dos artigos 44º e seguintes do CPA, é uma delegação atípica e conformada pelo legislador
no artigo 55º.

Aspetos vinculados a esta delegação de competências:

• O “se” da delegação: o órgão decisor deve delegar, salvo disposição legal,


regulamentar ou estatutária em contrário ou quando a isso obviarem as condições

50
de serviço ou outras razões ponderosas, invocadas fundamentadamente no
procedimento concreto ou em diretiva interna respeitante a certos procedimentos.
• A pessoa do delegado: a tarefa de direção do procedimento deve ser delegada
pelo órgão decisor no seu inferior hierárquico ou, no caso de órgão colegial, em
membro do órgão ou agente dele dependente.
• Os poderes a delegar: os poderes a delegar pelo órgão competente para a decisão
final são os que a lei faz corresponder à figura do responsável pelo procedimento
(artigo 55º, nº5; artigo 64º, nº3; artigo 66º, nº1; artigo 82º, nº1; artigo 92º, números
2 e 3; artigo 92º, nº6; artigo 100º, nº3; artigo 111º, nº2; artigo 117º, nº1; artigos
118º; artigos 122º a 124º; artigo 126º; artigo 128º, nº1 – CPA).

Existe um conjunto de princípios de qualquer procedimento administrativo que o


responsável pelo procedimento está obrigado a seguir, nomeadamente:

→ Princípio da adequação procedimental – artigo 56º do CPA


→ Princípio do inquisitório – artigos 58º e 115º do CPA
→ Princípio de celeridade – artigo 59º do CPA
→ Dever de boa administração – artigo 5º do CPA
→ Dever de cooperação – artigo 60º, nº1 do CPA
→ Dever de assegurar a participação dos interessados – artigos 12º e 121º a 124º do
CPA
→ Dever de informar – artigos 11º e 82 a 85º do CPA

b. Fase de Instrução
i. Diligências Probatórias

Esta fase é regida pelo princípio do inquisitório, previsto no artigo 58º do CPA, ou seja,
impõe-se à Administração Pública que adote uma postura ativa. A este artigo 58º juntamos
os artigos 115º e 116º, também do CPA, que definem o dever da Administração Pública
averiguar oficiosamente todos os factos cujo conhecimento seja relevante para a justa e
célere decisão do procedimento.

Para além disso, impõe-se aos interessados a sua participação e colaboração no


procedimento, sendo que estes devem concorrer para a economia de meios na realização

51
de diligências instrutórias e para a tomada de decisão em prazo razoável (artigo 60º, nº2
do CPA).

Nesta fase, o que se pede aos interessados é que levem para o procedimento todos os
factos e documentos que considerem relevantes, produzindo prova relativamente a
esses factos (artigo 116º, nº1), de qualquer uma das formas de prova admitidas no Direito:

a) Prova documental – prova em relação à qual a apreciação pela Administração


Pública é bastante limitada, sendo que, à partida, se dá por comprovado o facto
apresentado na prova documental, a não ser que se comprove que esse documento
é falso (efetuam-se diligências periciais nesse sentido).
b) Prova testemunhal – prova apreciada livremente pela Administração Pública, que
tem de ficar com a convicção e certeza de que a testemunha diz apenas a verdade.
c) Prova pericial – elaboram-se quesitos (questões), que são enviados pelo
responsável pelo procedimento para, à partida, três peritos (de modo a evitar
“empates” e garantir a imparcialidade), que elaboram um relatório pericial sobre
o qual a Administração Pública tende a apreciar e retirar as suas conclusões.

No caso dos interessados, regularmente notificados para prestar informações ou


apresentar provas, não cumpram a notificação, aplica-se o regime previsto no artigo 119º,
nº3 do CPA. No caso de desnecessidade de prova ou de alegação de factos públicos ou
notórios, aplica-se o artigo 115º, nº2 do CPA.

ii. Diligências Consultivas

As diligências consultivas são a solicitação de pareceres, que vêm enunciados nos artigos
91º e 92º do CPA.

NOTA: os artigos 91º e 92º foram alterados – atualizar no CPA.

Em regra geral, os pareceres são obrigatórios e não vinculativos, a não ser que sejam
classificados como tal por uma norma especial. O CPTA prevê a possibilidade de o
parecer vinculativo ser imediatamente impugnado (artigos 51º, nº2, alínea b) do CPTA +
artigo 51º, nº3 do CPTA).

52
c. Fase da Audiência dos Interessados
Nesta fase, o responsável pelo procedimento notifica os interessados para que estes se
pronunciem sobre tudo aquilo que foi feito até ao momento. É enviada uma
notificação escrita, dirigida aos interessados, onde consta uma descrição de tudo o que foi
feito e onde é dito qual será o sentido provável da decisão. Isto é muito relevante porque
a participação dos interessados tem de ser esclarecida e livre (artigo 122º do CPA), com
indicação da data e hora da audiência prévia, que pode ser escrita ou oral.

A audiência prévia é obrigatória, contudo, também existem situações em que a audiência


prévia pode ser dispensada, mas apenas nos casos elencados no artigo 124º do CPA,
sendo que esta dispensa tem de ser sempre justificada, permitindo-se, assim, o seu
controlo.

Colocam-se algumas questões: E se tem de existir audiência prévia, mas não houve e não
foi devidamente dispensada? Ou então, e se houve lugar a dispensa de audiência prévia,
mas não pelos termos do artigo 124º? Qual é o vicio que daqui resulta?

Entende-se que é um vício formal, cuja consequência jurídica, à partida, será a


anulabilidade (artigo 163º, nº1 do CPA). Só não será assim, em três situações:

i. Quando os interessados que não foram ouvidos sejam titulares de direitos


fundamentais, e o ato administrativo a praticar restrinja o seu conteúdo essencial.
Neste caso, a consequência jurídica é a nulidade, nos termos da alínea d), do nº2
do artigo 161º do CPA.
ii. Quando o procedimento administrativo em causa seja um procedimento
disciplinar, se o interessado não for ouvido, a consequência jurídica que afeta o
ato a ser praticado nesse procedimento é a nulidade, nos termos dos artigos 169º
da CRP e 162º, nº1, d) do CPA.
iii. Quando em causa esteja um procedimento contraordenacional, isto é, quando o
procedimento seja um procedimento dirigido à pratica de um ato administrativo
contraordenacional com aplicação de coima, tem a consequência associada de
nulidade, de acordo com o artigo 32º, nº10 da CRPA e 162º, nº2, d) do CPA:

53
O direito à audiência prévia não constitui por si só um direito fundamental (artigo 267º,
nº5), apenas pode ser considerado como tal em dois casos: no artigo 32º, nº10
(procedimentos de contraordenação) e no artigo 69º, nº3.

A estes dois casos junta-se um outro, onde o ato administrativo que vier a ser praticado
afeta direitos fundamentais, ou seja, uma posição jurídica que merece a salvaguarda de
um direito fundamental. Embora o direito de audiência prévia não constitua por si mesmo
um direito fundamental, a sua preterição configura uma posição jurídica classificada pela
CRP como direito fundamental, levando à nulidade.

Em qualquer um destes casos, cabe ao interessado fazer prova de que a audiência prévia
seria essencial, ou seja, que a decisão final do procedimento seria diferente se ela tivesse
sido cumprida.

Se a consequência jurídica da audiência prévia for a nulidade, não há possibilidade de se


aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo. O principio do
aproveitamento do ato administrativo, previsto no artigo 163º, nº5 do CPA, que nos diz
que quando o ato seja anulável (não há possível aplicar o princípio a atos cuja
consequência jurídica associada seja a nulidade), se chegarmos à conclusão que o seu
conteúdo e sentido seriam os mesmos sem o vício que faz com que seja anulável,
reconhece-se esse vício, mas não se anula esse ato administrativo.

d. Fase de Preparação Direta da Decisão


Pode haver lugar a diligências complementares nesta fase, de acordo com o artigo 125º
do CPA, sendo que, se daqui resultar uma alteração do sentido do ato a praticar, tem
de se realizar uma nova audiência prévia.

Esta fase termina com a elaboração, pelo responsável do procedimento que termina aqui
a sua intervenção, de um relatório a enviar para o órgão com competência decisória
(artigo 126º do CPA).

54
2. Fase Constitutiva ou Decisória
Quando o órgão recebe o relatório, verifica-o e, à partida, seguirá o conteúdo e sentido
proposto pelo responsável. Contudo, se não concordar com o mesmo, pode enviar o
relatório para trás e pedir para serem repetidas algumas coisas. No caso da competência
decisória pertencer a um órgão colegial, há que atender ao disposto nos artigos 21º a 35º
do CPA.

O procedimento termina com a prática de um ato administrativo ou com a celebração de


um contrato, de acordo com os artigos 127º e 128º do CPA e com o artigo 278º do Código
dos Contratos Públicos.

No que respeita à forma e elementos do ato administrativo, aplica-se o disposto nos


artigos 149º a 154º do CPA. Relativamente à forma, o ato administrativo deve:

• Apresentar forma escrita (artigo 150º);


• Conter um conjunto de menções obrigatórias que constam do artigo 151º (fazer
remissão para os artigos 152º e 153º).

Existem outras formas de se extinguir o procedimento administrativo:

• Formação de ato de deferimento tácito (artigo 130º do CPA);


• Incumprimento do dever de decisão (artigo 129º do CPA) – omissão ilegal;
• Desistência ou renúncia (artigo 131º do CPA);
• Deserção (artigo 132º do CPA) – procedimento parado por mais de 6 meses sem
que os interessados levem a cabo os seus deveres e sem que o procedimento possa
ser prosseguido sem o cumprimento destes deveres (como a entrega de um
documento que só o interessado possa entregar, por exemplo);
• Falta de pagamento de taxas ou despesas (artigo 133º do CPA) – à partida, existe
um princípio de gratuitidade do procedimento, a menos que exista uma taxa. Se
esta taxa não for paga, o procedimento termina, sem prejuízo dos interessados
fazerem prova de insuficiência económica que os impede de a pagar.
• Homologação do parecer, proposta ou informação (artigo 153º, nº1 do CPA) – o
órgão com competência decisória olha para um parecer (que não tem de ser

55
vinculativo) e entende que aquela seria a sua decisão, então apenas decide assinar
e homologa a decisão, não repetindo o ato.
• Arquivamento, nos procedimentos de iniciativa oficiosa (artigo 95º do CPA) –
conclui-se que não vale a pena fazer mais nada.

3. Fase Integrativa de Eficácia


O artigo 268º, nº3 da CPR consagra a garantia da notificação dos atos aos seus
respetivos destinatários.

A notificação é feita nos termos dos artigos 111º e 113º do CPA, atendendo aos elementos
do artigo 114º. Todos os atos têm de ser notificados e, alguns deles, para além da
notificação, exigem publicação em DRE (artigo 159º do CPA).

Regra geral, não é necessária a comunicação do ato administrativo para que este
produza os efeitos jurídicos a que tende junto dos seus destinatários. Os atos
administrativos não são, em princípio, recetícios (artigo 158º, nº1 do CPA). Contudo,
existem atos cuja notificação é requisito de eficácia, nomeadamente os atos previstos no
artigo 160º do CPA, que são atos com efeitos desfavoráveis.

Apesar de não ser necessária a comunicação dos atos administrativos para a produção dos
efeitos a que tendem, tal não impede que a mesma comunicação seja condição de
oponibilidade de efeitos desfavoráveis (artigo 188º, nº1 do CPA e artigo 59º, nº1 do
CPTA).

A eficácia pode ser deferida, ou seja, se o momento da prática é hoje, à partida, começará
a produzir os seus efeitos hoje também, ao abrigo do artigo 155º, salvo nos casos em que
a lei ou o próprio ato lhe atribuam eficácia retroativa (artigo 156º), diferida ou
condicionada.

No caso da eficácia ser diferida ou condicionada, de acordo com o artigo 157º:

• Quando estiver sujeito a aprovação ou referendo (artigo 157º, alínea a))


• Sujeição a visto do Tribunal de Contas (artigo 157º, alínea c))
• Quando os seus efeitos estiverem dependentes de condição ou termo suspensivos
(artigos 157º, alínea c) e 149º)

56
• Quando for necessária a aprovação da ata (artigos 157º, alínea c) e 34º, nº6)
• Quando a lei impuser publicação obrigatória (artigo 158º)
• Quando os atos administrativos devam ser notificados aos seus destinatários nos
termos dos artigos 160º e 114º, nº1 do CPA

Existe um conjunto de elementos que devem constar da notificação do ato


administrativo, de acordo com o artigo 60º do CPTA (em conjunto com o artigo 114º,
nº2 do CPA).

57
Vícios do Ato Administrativo e Respetivas Consequências
Jurídicas

58
59
60
Caso Prático nº7
1. Parecer da APA

Os pareceres são atos instrumentais, preparatórios e instrutivos, praticados na instrução


de um determinado procedimento administrativo a pedido, regra geral, pelo responsável
pelo procedimento administrativo. Estão previstos nos artigos 91º e 92º do CPA, sendo,
em regra geral, são obrigatórios e não vinculativos (artigo 91º, nº2). Neste caso, temos
um parecer de sentido negativo.

Aqui a lei faz depender a licença de um parecer positivo. Quando o legislador diz que a
concessão de licença em determinado caso depende de parecer favorável prévio, diz-nos
que se o parecer for negativo, não há licença, se for positivo, pode ou não haver licença.
Existe aqui uma vinculatividade muito particular, ou seja, nestes casos, só têm
vinculatividade os pareceres de sentido negativo, uma vez que não se pode, de qualquer
forma, conferir a licença.

2. Licença

Ato administrativo propriamente dito, de acordo com o artigo 148º do CPA. É um ato
autorizativo, sendo que existe uma querela doutrinal entre saber se é um ato permissivo
ou constitutivo.

Neste caso, a licença foi concedida, embora o parecer tivesse sido negativo.

3. PDM

É um plano que constitui um regulamento administrativo com eficácia externa. Algumas


normas têm eficácia mediatamente operativa, enquanto outras têm eficácia imediatamente
operativa.

Este PDM desrespeita o sentido negativo do parecer e respeita o regulamento, que, por
sua vez, viola o CC. Deste modo, o regulamento é ilegal, nos termos dos artigos 143º e
144º do CPA, sendo que é material.

61
NOTA: assim, a qualificação está feita. De seguida, temos de tentar perceber como esta
ilegalidade se repercute na licença e quais as consequências da violação do parecer. Por fim, ver
o que o vizinho pode fazer, uma vez que é um terceiro.

Aula 13.04

Caso Prático nº7

A Administração Pública tem de estar de acordo com o princípio da legalidade.

Artigo 143.º CPA – Encontramos aqui os parâmetros com os quais os regulamentos


administrativos têm de estar de acordo, nomeadamente outros regulamentos
hierarquicamente superiores, a CRP, normas legais e normas de direito internacional e
europeu. O facto de os regulamentos serem desconforme a qualquer um destes
parâmetrosacarreta a ilegalidade dessa norma regulamentar. Esta ilegalidade pode ser
formal,orgânica ou material consoante a norma violada.

Artigo 144.º CPA – Nos termos deste artigo, à ilegalidade material, formal e orgânica
estãoassociados prazos diferentes. No nosso caso, o regulamento administrativo viola
uma norma do CC, o artigo 1360.º, sendo, por isso, ilegal. Esta é uma ilegalidade
material, podendo ser invocada a todo o tempo.

A licença de construção é um ato administrativo de conteúdo positivo e favorável.


Nestecaso, a licença de construção é conforme o PDM (regulamento administrativo),
que é ilegal, e desconsidera um parecer desfavorável. Assim, há um conjunto de vícios
relativosà licença:

• A licença de construção está então inquinada por um vício material, uma


ilegalidade consequente, que se traduz numa anulabilidade consequente
porque esta é conforme ao regulamento ilegal. Assim, a licença acaba por sofrer
os efeitosda ilegalidade do regulamento.
• Rela?vamente ao parecer, este é desfavorável e mesmo assim a licença de
construção foi concedida, o que significa que este parecer não foi considerado
pelo órgão com competência decisória. Os pareceres desfavoráveis são de
carátervincula?vo, portanto a licença de construção está inquinada por um

62
vício formal cuja consequência jurídica seria, em princípio, a anulabilidade,
mas no caso das licenças de construção é aplicado outro regime, o RJUE, que
prevê um procedimento administra?vo especial para licenças de construção.
Assim, aconsequência poderia não ser a anulabilidade, mas sim a nulidade,
pelo facto de não ter respeitado o parecer desfavorável e ter emi?do a licença
na mesma.

Analisando o lado do vizinho e os mecanismos de reação contenciosa que este tem à


sua disposição contra a licença de construção, temos que falar num pedido de
impugnação, dado que temos um ato administrativo de conteúdo positivo (a licença de
construção), tendo em vista a declaração de nulidade do ato administrativo (a título
principal) e a anulação do ato administrativo (a título subsidiário). Este pedido seguirá
uma determinada tramitação prevista no CPTA. O pedido seria apresentado contra o
Município, que emitiu a licença de construção, mas os beneficiários da licença ocupam
aposição de contrainteressados, visto que o seu interesse é o mesmo do Município,
dado que estes não querem que a licença seja anulada. Os mesmos têm que ser ouvidos
no processo administrativo.

Pede-se sempre a título principal a consequência mais grave (neste caso a nulidade do
atoadministrativo), mas pede-se a título subsidiário a consequência menos gravosa que
satisfaz na mesma o meu interesse, caso não se entenda pela consideração desse vício
mais grave (neste caso a anulação do ato administrativo).

Temos também mecanismos de reação administrativa contra a licença de construção,


como reclamações, o recurso administrativo especial e o recurso hierárquico (artigos
134º eseguintes CPA). A obrigação (ou não) de fazer uso dos mesmos para depois
recorrer aos Tribunais Administrativos está presente no artigo 185.º/2 CPA (com
remissão para o artigo 3.ºdo DL 04/2015 que aprova o CPA em anexo). As reclamações
e recursos administrativos são, em princípio, facultativos, a menos que uma norma
especial identifique estesmecanismos como necessários. Este artigo 3.º do DL efetua
uma explicação dos critérios deinterpretação destas normas especiais. Ao destinatário
do ato administrativo (o cidadão médio) não se exige que conheça estas normas
especiais aplicáveis ao ato administrativode que é destinatário, de forma a concluir que
o recurso ou reclamação são obrigatórios ou não (artigo 114.º/2/c) do CPA.
63
Caso Prático nº8

O INFARMED é um instituto público, fazendo parte da administração indireta.

A licença relativa à abertura de uma farmácia social é um ato administrativo de


conteúdopositivo, é uma autorização constitutiva.
O ato de indeferimento da licença é um ato administrativo de conteúdo negativo,
produzindo efeitos jurídicos desfavoráveis à pessoa do seu destinatário, pois era
pretendida a licença, mas ela foi recusada. Este ato de indeferimento precisa de ser
fundamentado de acordo com o artigo 152.º/1/a CPA. Em termos de reação contenciosa
contra este ato administrativo, temos o pedido de condenação à prática do ato devido,
dado o seu conteúdo negativo.

Em relação ao parecer, este é um ato jurídico instrumental e preparatório que se insere


na fase de instrução do procedimento administrativo, podendo ser solicitado pelo órgão
com competência decisória ou pelo responsável pelo procedimento administrativo, e é
dirigido a um órgão consultivo. Neste caso, o parecer foi solicitado pelo órgão com
competência decisória. A regra geral é que os parecer são obrigatórios, mas não são
vinculativos. Assim, é necessário perceber se o parecer do caso em questão é
vinculativo ou não, tendo de se considerar normas especiais que imponham esta
vinculatividade. Se uma norma especial qualificar o parecer como vinculativo (artigo
51.º CPTA), se não for seguido o ato administrativo ficará inquinado com um vício
formal cuja consequência é a anulabilidade (artigo 163.º/1 CPA). Se o parecer não for
vinculativo e não for seguido, daínão resulta nenhum vício invalidante. No entanto,
neste último caso é preciso explicar num ato administrativo porque é que o dever não
foi seguido (artigo 152.º/c CPA),constituindo isto um dever de fundamentação (artigo
152.º/1/c CPA), e se este dever não for cumprido temos um vício formal cuja
consequência é a anulabilidade (artigo 163.º/1 CPA).

Caso Prático nº9

1. Vício material, sendo a consequência jurídica a anulabilidade (ar?go 163.º/1 CPA).


Casoesse princípio seja cons?tucionalmente previsto, poderá o ato administra?vo ser

64
sancionado com nulidade (ar?go 161.º/1 CPA).

2. Vício material, mas é um vício rela?vo à violação de uma norma legal. A


Administração Pública não respeitou os pressupostos de que depende a atribuição
daquele subsídio, por isso violou aquilo que resultava diretamente da norma
atribuidora do subsídio. A consequência jurídica é a anulabilidade, nos termos do
ar?go 163.º/1 CPA, exceto se tal direito for consagrado pela CRP como direito fundamental
(art. 161.º/2/d CPA).

3. Vício material, sendo que a consequência jurídica depende da interpretação do art.


163.º/2/c CPA. A incerteza e a impossibilidade associam-se a este ar?go, logo, a sanção
será a nulidade (ar?go 161.º/2/c CPA). À par?da, a nulidade só é consequência jurídica
quando seja, em concreto, associada a um determinado vício, tem de exis?r uma
norma especial que a preveja.

Contudo, quanto à ilegalidade, já estamos perante outra consequência jurídica – a


anulabilidade (artigo 163.º/1 CPA). No artigo referido não se faz referência a esta
hipótese de ilegalidade.

4. Vício material, por desvio de poder, mas a consequência depende do ?po de fim


prosseguido: se o fim for de interesse público temos a anulabilidade, e se o fim for de
interesse privado temos a nulidade (ar?go 161.º/2/e 163 º /1 CPA).

5. Vício formal (preterição da audiência prévia), sendo a consequência, em regra geral,


aanulabilidade.

No entanto, se o direito à audiência prévia for configurado como um direito


fundamental (caso excecional), – como em processos de contraordenação (artigo
32.º/10 CRP e artigo 161.º/2/d CPA) e procedimentos disciplinares (artigo 269.º/3 CRP
e artigo 161.º/2/d CPA) – então a preterição desta audiência prévia terá como
consequência jurídica a nulidade. Esta lógica excecional também se aplica num
procedimento administrativo em que o ato administrativo que irá ser elaborado afetará
um direito fundamental (casos de restrições de direitos fundamentais), sendo
fundamental realizar a audiência prévia e se isto não for respeitado a consequência
jurídica será a nulidade.

6. Depende se o parecer é vincula?vo ou não, e a regra geral é que os pareceres,

65
emborasejam obrigatórios, não são vincula?vos. Se for vincula?vo e for desrespeitado,
temos umvício formal cuja consequência jurídica é anulabilidade (ar?go 163.º/1 CPA).
Se não for vincula?vo e for desrespeitado, apenas recai sobre o órgão que não o seguiu
um dever defundamentação rela?vamente a esta desconsideração pelo parecer, pois
não há obrigaçãode o parecer ser seguido pelo órgão com competência decisória. A
violação deste dever de fundamentação representa um vício formal cuja
consequência jurídica será a anulabilidade.

7. Não existe um princípio geral de fundamentação dos atos administra?vos (ar?go


152.º CPA), esta fundamentação apenas é exigida quando a lei o determinar. Temos
um vício formal cuja consequência jurídica é a anulabilidade (ar?go 163.º/1 CPA).

8. Veja-se o ar?go 150.º CPA sobre o facto de o ato administra?vo ter um texto escrito.
O ar?go 151.º CPA determina as menções obrigatórias a colocar no ato administra?vo.
A exigência de assinatura e iden?ficação do autor resulta das alíneas a) e g) do ar?go
151.º CPA. O ar?go 155.º CPA é relevante para compreender as consequências jurídicas
rela?vasà falta destas menções obrigatórias, que devem estar presentes no texto do
ato administra?vo. A indicação do autor do ato é um requisito de existência (leitura
combinada do ar?go 151.º e 155.º CPA), sendo que a falta do mesmo se traduz num
vício de invalidade que acarreta a inexistência jurídica. A indicação do sen?do, objeto
e conteúdo é um requisito de existência (leitura combinada do ar?go 151.º e 155.º
CPA), e a sua falta traduz-se num vício invalidade que acarreta a inexistência jurídica.
A falta de assinatura traduz-se num vício invalidante que acarreta a anulabilidade
(ar?go 163.º/1 CPA).

9. Inexistência jurídica (ar?go 60.º/1 CPTA).


10. A forma legal de um ato administra?vo é, em princípio, escrita. Assim, a carência
daforma legal do ato administra?vo é um vício de forma, o que ocasiona uma sanção
de nulidade (ar?go 161.º/1/g CPA)

11. O nosso sistema cons?tucional admite os estados de exceção, que têm associado
umprincípio de legalidade especial, embora restri?vo. O legislador admite a prá?ca de
atos administra?vos não precedidos de procedimento administra?vo em estado de
necessidade, ou seja, estes atos serão válidos. A falta deste procedimento não resulta

66
emnenhum tipo de vício. Fora deste estado de exceção, esta prá?ca consiste num vício
formal que tem como consequência jurídica a nulidade, nos termos do ar?go
161.º/2/l) CPA.

12. A no?ficação pode ser um requisito de eficácia, nos termos do ar?go 160.º CPA.
Quandoa mesma for requerida e não for cumprida temos um vício de ineficácia que
não é um vício invalidante.

13. Temos um vício orgânico, há uma incompetência absoluta (ar?go 161.º/2/b CPA).
Estaocorre dentro da função administra?va, um órgão de uma determinada pessoa
cole?va exerce uma competência de um órgão de uma pessoa cole?va diferente,
sendo a consequência jurídica a nulidade 161º/2/b.

A usurpação de poderes é diferente de incompetência, pois há violação do princípio da


separação de poderes.

14. Temos um vício orgânico, há uma incompetência rela?va porque o problema


ocorre entre órgãos da mesma pessoa cole?va e a consequência será a anulabilidade
(ar?go 163.º/1CPA).

15. Todos são vícios materiais. No erro ou dolo sobre pressupostos de facto a
consequência jurídica é a anulabilidade (ar?go 163.º/1 CPA) e na coação (que pode ser
esicaou moral) a consequência jurídica é a nulidade (ar?go 161.º/2/f CPA).

Considerações Especiais:

Artigo 163.º/5 CPA - Princípio do aproveitamento do ato administrativo: Quando


anulo um ato administrativo isso significa que vou ter que repetir o procedimento
administrativo e praticar um outro ato que vai substituir o ato que eu anulei. Neste
momento de consideração, chego à conclusão que o ato que vier a ser praticado terá o
mesmo conteúdoe sentido do ato que eu estou a anular, será um ato igual que apenas
não terá o vício invalidante. Ao abrigo deste princípio, posso reconhecer que o ato é
anulável, mas não procedo à sua anulação. É de referir que o que está aqui em causa
não é a sanação do vício, apenas uma decisão de não anular o ato. O ato em causa vai
produzir todos os seusefeitos como se fosse um ato válido, mesmo os efeitos associados
à invalidade em causa.Este princípio apenas vale para atos anuláveis.
67
Artigo 164.º CPA - Este artigo refere-se já a atos nulos e anuláveis, e para os anuláveis
prevê a hipótese de retificação. Neste caso existe uma sanação do vício porque faço
comque o vício desapareça através da retificação.

Artigo 162.º/3 CPA - Os atos anuláveis produzem os efeitos jurídicos até ao momento
em que são anulados, e os nulos não. Nos atos nulos há uma destruição retroativa de
todos os efeitos. Há casos específicos em que os sujeitos beneficiam de atos nulos,
nomeadamentenas licenças de construção.
o Exemplo: Eu acatei a licença de construção que me foi concedida e comecei a
construir a casa porque na altura não se sabia que ela era nula. Mais tarde,
quandoa licença é declarada nula, aplica-se o disposto no artigo 162.º/3 CPA
(proteção do beneficiário de boa fé) a medidas de demolição das edificações
efetuadas ao abrigo desta licença de construção nula. Aqui depende se o sujeito
está de boa féou não. Se estiver de má fé, ou seja, se conhecer a nulidade do ato
e decidir acatar o ato administrativo na mesma, não merece esta proteção e
procede-se à demolição da casa, sendo que nem vai ter direito a uma
indemnização.

Relativamente à medida em que a ordem jurídica protege a confiança destes sujeitos,


quedesconheciam sem culpa que a licença que lhes foi concedida é afinal nula, o artigo
162.º/3CPA diz-nos que é possível reconhecer efeitos jurídicos aos efeitos práticos de
um ato administrativo nulo (verificados determinados requisitos sem ser necessário
alterar o plano de controlo que conduz à nulidade) e deixá-los estar, de forma a proteger
a confiança dos destinatários do ato nulo. Assim, não se ia demolir a casa do sujeito
que acatou a licença de construção de boa fé só porque mais tarde a mesma foi declarada
nula. Há que proteger estes sujeitos de boa fé, mesmo que agora tenham uma casa
construída ao abrigo de uma licença de construção nula. Aqui é preciso que se prove
que o sujeito está de boa fé. Se estiver de boa fé e mesmo assim a circunstância do caso
concreto conduzir à ordem de demolição, esta boa fé permite que este sujeito seja
indemnizado pelo Município.

68
Aula 20.04

A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) é Direito Administrativo


especial, disciplinando o vínculo entre funcionários públicos e a respetiva entidade
empregadora, ou seja, um vínculo laboral que escapa ao regime do contrato de trabalho.
Qualquer litígio que se refira a estes vínculos laborais é da competência dos Tribunais
Administrativos e, por outro lado, qualquer litígio referente a um vínculo privado de
trabalho, mesmo que a entidade empregadora seja pública, é de competência dos tribunais
comuns.

Esta lei cria problemas interpretativos relativamente ao artigo 185º, nº2 do CPA e ao artigo
3º do DL 4/2015, de 7 de janeiro, que aprova o CPA em anexo.

A questão que se coloca é se os mecanismos de reação administrativa e a sua utilização,


são recursos necessários para, posteriormente, se recorrer aos tribunais administrativos.
O artigo 185º, nº2 do CPA responde a esta questão, dizendo que a regra é que os
mecanismos de reação são facultativos, contudo, pode existir uma norma especial que
os qualifique como necessários e, neste caso, existe apenas uma hipótese ao invés de
três, sendo que a possibilidade de recorrer aos tribunais administrativos só existe se
utilizar os mecanismos de reação.

Nestas situações, não existe uma suspensão do prazo de acesso aos tribunais
administrativos, uma vez que o prazo ainda não está a decorrer, suspendendo-se os efeitos
do ato administrativo ou da norma, ao contrário da situação anterior.

Assim, o artigo 3º dá-nos um critério interpretativo, explicando como podemos concluir,


através de normas especiais, quando e como é que os recursos são necessários.

Caso Prático nº10


Existe, neste caso, um recurso necessário.

Olhando para a segunda parte do nº4 deste artigo 225º da LGTFP e para o artigo 3º, nº3
do DL 4/2015, existe um efeito revogatório associado a essa segunda parte do artigo 225º,
nº4.

O legislar diz-nos que, quando haja uma norma especial que qualifique um determinado
tipo de recurso como necessário, os efeitos associados à sua utilização são aqueles que

69
estão previstos neste artigo 3º, que são efeitos suspensivos do ato da norma regulamentar
sobre o qual se faz uso do recurso necessário. O legislador não pode, na norma especial,
prever de outra forma, pois colocaria em causa o princípio da tutela jurisdicional efetiva.
Assim, existem sempre efeitos suspensivos, que não podem, em caso algum, ser afastados
por uma norma especial e, caso aconteça, o artigo 3º resolve.

Assim, a 2ª parte do artigo 225º, nº4 está, desde 2015, revogada.

v Artigo 189º do CPA (efeitos sobre as normas) – diz-nos que, relativamente a


reclamações e recursos administrativos facultativos, não existem efeitos
suspensivos, mas nas reclamações e recursos necessários, existem. No nº2 deste
artigo, é referido que estes efeitos suspensivos podem ser requeridos ou a entidade
administrativa pode, oficiosamente, atribuí-los.

v Artigo 190º do CPA (efeitos sobre os prazos) – não tem haver com efeitos
produzidos pelo ato ou norma regulamentar sobre o qual se apresenta a
reclamação ou recurso, mas com a suspensão de prazos. No nº1, diz-nos que se
tiver um ato administrativo ou norma que esteja sujeita a um recurso
administrativo necessário, suspende o prazo (o que é necessário é o recurso
necessário).

v Remissão do nº3 do artigo 190º para o artigo 59º, nº4 e 5 do CPA. O nº4 do artigo
190º permite a opção de fazer as duas coisas ao mesmo tempo no recurso
facultativo – o recurso direto aos tribunais, o uso dos mecanismos ou uso dos
mecanismos e o recurso aos tribunais, simultaneamente, relativamente ao mesmo
ato (existem mecanismos de articulação no CTA, mas não vamos falar sobre eles).

Tipos de Garantias Administrativas Previstas no CPA

1. Reclamação – para o autor do ato/norma, ou da omissão ilegal (artigos 191º e


192º do CPA).

70
2. Recursos – para outro órgão que não o autor do ato/norma ou da omissão ilegal.
a. Hierárquico – para o mais elevado superior hierárquico do autor do ato/norma
ou da omissão ilegal (artigos 193º a 198º do CPA).

b. Administrativos especiais (artigo 199º do CPA):


• Recurso para órgão da mesma pessoa coletiva que exerça funções de
supervisão.
• Recurso para órgão colegial de atos ou omissões de qualquer dos seus
membros, comissões ou secções.
• Recurso para órgão de outra pessoa coletiva que exerça poderes de tutela
ou de superintendência.
• Recurso para o delegante ou subdelegante de atos do delegado ou
subdelegado, mediante disposição legal expressa.
NOTA: qualquer um destes recursos está dependente de disposição legal
expressa, ou seja, o artigo 199º, não é suficiente para habilitar o interessado a
fazer uso destes recursos, é necessário uma norma especial expressa. Existe,
contudo, uma nota que se refere ao delegante ou subdelegante, que entende que,
apesar de se exigir uma norma legal expressa nesse sentido, deve ser interpretada
de forma ab-rogante, porque existe uma situação de autonomia das normas entre
os artigos 199º e 149º.

O Código do Procedimento Administrativo prevê:

1. Um regime geral para a reclamação e para os recursos – artigos 184º a 190º.


2. A que acrescem regimes específicos:
a. Reclamação – artigos 191º e 192º
b. Recurso hierárquico – artigos 193º a 198º
c. Recursos administrativos especiais – artigo 199º

1. Regime Geral

A natureza das impugnações administrativas pode ser (artigo 185º, nº2 do CPA):

71
• Facultativa – quando a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de
impugnação ou de condenação à prática do ato devido não dependa da sua prévia
utilização.
• Necessária – quando a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de
impugnação ou de condenação à prática de ato devido dependa da prévia
utilização das garantias administrativas.

Em regra, as reclamações e os recursos administrativos são facultativos, salvo se a lei


os denominar como necessários.

A lei utiliza o critério interpretativo do artigo 3º do DL 4/2015, de 7 de janeiro, para


definir quando as reclamações e os recursos administrativos são necessários:

Artigo 3.º
Impugnações administrativas necessárias

1 – As impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei só


são necessárias quando previstas em lei que utilize uma das seguintes expressões:

a) A impugnação administrativa em causa é «necessária»;

b) Do ato em causa «existe sempre» reclamação ou recurso;

c) A utilização de impugnação administrativa «suspende» ou «tem efeito suspensivo» dos


efeitos do ato impugnado.

2 – O prazo mínimo para a utilização de impugnações administrativas necessárias é de 10 dias,


passando a ser esse o prazo a observar quando seja previsto prazo inferior na legislação existente à
data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

3 – As impugnações administrativas necessárias previstas na legislação existente à data da


entrada em vigor do presente decreto-lei têm sempre efeitos suspensivos da eficácia do ato
impugnado.

4 – São revogadas as disposições incompatíveis com o disposto nos números 2 e 3.

72
Qual é o objeto dos mecanismos de reação administrativa, ou seja, quando posso utilizá-
los?

A resposta a esta questão é dada pelo artigo 184º, nº1 do CPA:

• Atos administrativos – artigo 148º do CPA


• Omissões ilegais – artigos 13º e 129º do CPA
• Normas regulamentares com eficácia externa – artigos 135º e 147º do CPA

As reclamações e os recursos administrativos podem ter por fundamento, de acordo com


o artigo 185º, nº3 do CPA, a ilegalidade ou a inconveniência. Contudo, o artigo 199º,
nº3 apresenta-nos uma exceção, isto é, neste caso, o recurso tutelar só pode ter por
fundamento a inconveniência ou a inoportunidade nos casos em que a lei estabeleça uma
tutela de mérito.

Efeitos sobre os Prazos de Acesso aos Tribunais Administrativos:


Os efeitos sobre os prazos estão previstos no artigo 190º do CPA. Quanto às reclamações
sobre os recursos administrativos necessários:

• A reclamação de atos ou omissões sujeitos a recurso administrativo necessário


suspende o prazo da sua interposição – artigo 190º, nº1.
• Nos restantes casos, a reclamação não suspende o prazo de interposição dos
recursos administrativos – artigo 190º, nº2.

Quanto às impugnações administrativas (facultativas) sobre a propositura da ação


judicial:

• A utilização dos meios impugnatórios administrativos contra atos administrativos


suspende o prazo de propositura de ações nos Tribunais Administrativos e
Fiscais, só retomando o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a
impugnação administrativa, ou com o decurso do respetivo prazo legal – artigo
190º, nº3 º artigo 59º, números 4 e 5 do CPA.

73
Efeitos sobre o Ato Jurídico Impugnado:
Os efeitos sobre o ato jurídico impugnado estão referidos no artigo 189º do CPA.

Quanto às impugnações necessárias, suspendem-se os respetivos efeitos, de acordo


com o nº1 do artigo 189º.

Quanto às impugnações administrativas facultativas:

• Não têm efeito suspensivo, com exceção dos casos em que o autor do ato ou o
órgão competente para conhecer do recurso, oficiosamente ou a pedido do
interessado (neste último caso, a decisão tem de ser tomada no prazo de três dias),
considere que a sua execução imediata cause prejuízos irreparáveis ou de difícil
reparação ao destinatário, e a suspensão não cause prejuízos para o interesse
público – números 2 e 3 do artigo 189º.
• A possibilidade de ser decidida pela Administração a suspensão de eficácia do ato
não prejudica o pedido de suspensão de eficácia perante os tribunais
administrativos – artigo 189º, nº5.

Para além disto, existe uma outra possibilidade: o facto de fazer uso de uma reclamação
ou recurso facultativo não acarreta efeitos suspensivos do ato contra o qual foi feita a
impugnação e, desta forma, existe uma de duas opções: ou peço à Administração para que
esses efeitos não se produzam, ou ela, oficiosamente, entende que é esse o caminho mais
correto. Se nada disto acontecer, posso recorrer aos tribunais administrativos,
apresentando uma providência cautelar, pedindo a suspensão dos efeitos.

E quanto aos regulamentos?

No nº3 do artigo 147º, está disposto que “à impugnação administrativa de regulamentos


é aplicável o disposto nos artigos 189º e 190º para a impugnação facultativa de atos
administrativos”, ou seja, pode fazer-se uso dos mesmos mecanismos, desde que os
regulamentos tenham eficácia externa.

2. Regime Especial

74
O regime previsto no CPA para a reclamação e recursos administrativos é geral, existindo
um especial, regulado pelos artigos 267º e seguintes do Código dos Contratos Públicos.
Neste regime especial, o CPA aplica-se apenas subsidiariamente.

Artigo 267º
Direito aplicável

1 – As impugnações administrativas das decisões relativas à formação dos contratos públicos


regem-se pelo disposto no presente título e, subsidiariamente, pelo disposto no Código do
Procedimento Administrativo.

2 – Os prazos previstos no presente título contam-se nos termos do disposto no artigo 87º do
Código do Procedimento Administrativo e não lhes é aplicável, em caso algum, o artigo 88º do
mesmo código.

Artigo 268º
Natureza

As impugnações administrativas são facultativas.

Artigo 269º
Decisões impugnáveis

1 – São suscetíveis de impugnação administrativa quaisquer decisões administrativas ou outras


àquelas equiparadas proferidas no âmbito de um procedimento de formação de um contrato
público.

2 – As peças do procedimento são também suscetíveis de impugnação administrativa.

Artigo 270º
Prazo de impugnação

75
Sem prejuízo do disposto no nº3 do artigo 138º e no nº3 do artigo 177º, as impugnações
administrativas de quaisquer decisões administrativas ou de outras àquelas equiparadas relativas
à formação de um contrato público devem ser apresentadas no prazo de cinco dias a contar da
respetiva notificação.

Artigo 271º
Apresentação da impugnação

1 – O interessado deve expor, na reclamação ou no requerimento de interposição do recurso,


todos os fundamentos da impugnação, podendo juntar os documentos que considere
convenientes.

2 – O recurso administrativo das deliberações do júri deve ser interposto para o órgão
competente, por lei ou por delegação, para a decisão de contratar.

Artigo 272º
Efeitos da impugnação

1 – A apresentação de quaisquer impugnações administrativas não suspende a realização das


operações subsequentes do procedimento em causa.

2 – Enquanto as impugnações administrativas não forem decididas ou não tiver decorrido o prazo
para a respetiva decisão, não se pode proceder:

a) À decisão de qualificação;

b) Ao início da fase de negociação;

c) À decisão de adjudicação.

Artigo 273º
Audiência dos contrainteressados

Quando a impugnação administrativa tiver por objecto a decisão de qualificação, a decisão de


adjudicação ou a rejeição de impugnação administrativa de qualquer dessas decisões, o órgão
competente para dela conhecer deve, nos dois dias seguintes à respetiva apresentação, notificar

76
os candidatos ou os concorrentes para, querendo, se pronunciarem no prazo de cinco dias, sobre
o pedido e os seus fundamentos.

Artigo 274º
Decisão

1 – As impugnações administrativas são decididas no prazo de cinco dias a contar da data da sua
apresentação, equivalendo o silêncio à rejeição das mesmas.

2 – Quando haja lugar a audiência dos contrainteressados nos termos do disposto no artigo
anterior, o prazo para a decisão da impugnação administrativa conta-se do termo do prazo fixado
para aquela audiência.

Vantagens das Garantias Administrativas Face às Garantias Contenciosas


• A suspensão dos prazos de interposição de ação junto dos tribunais
administrativos, nos termos dos artigos 190º, nº3 do CPA e do artigo 59º, números
4 e 5 do CPTA, e no caso de impugnação administrativa necessária, a suspensão
de eficácia do ato, ao abrigo do artigo 189º, nº1 do CPA.

• O caráter não preclusivo das garantias administrativas relativamente à tutela


jurisdicional.

• A apreciação da legalidade e do mérito (artigo 185º, nº3 do CPA e artigo 3º, nº1
do CPTA): os regimes de revogação e da anulação administrativas (artigos 165º e
seguintes do CPA).

• A desnecessidade de patrocínio jurídico e do pagamento das custas judiciais.

• Simplicidade, informalidade, celeridade e quase gratuitidade.

77
Caso Prático nº11
1. Quem tem legitimidade para fazer uso da reclamação e dos recursos
administrativos?

Os titulares de direitos subjetivos ou interessados legalmente protegidos, e as pessoas e


entidades mencionadas no artigo 68º, números 2 a 4 do CPA, ao abrigo do artigo 186º.

2. Os prazos previstos nos artigos 184.º e seguintes do CPA contam-se em dias


úteis ou de forma contínua?

Artigo 87º – se o prazo for de até 6 meses, contam-se os dias úteis e, se o prazo for superior
a 6 meses, contam-se os dias corridos.

3. Qual é o prazo para fazer uso de uma reclamação?

15 dias úteis, de acordo com o artigo 191º, nº3.

4. E do recurso hierárquico?

30 dias úteis, ao abrigo do artigo 193º, nº2.

NOTA: fazer remissão do artigo 193º, nº2, parte final do CPA para o artigo 58º do CPTA.

5. Na sequência de um recurso hierárquico contra uma omissão ilegal, pode o


superior hierárquico praticar o ato omisso, substituindo-se ao subalterno, ou
apenas pode ordenar ao subalterno a prática do ato em falta?

Sim, de acordo com o artigo 197º, nº4, se a competência não for exclusiva. No caso da
competência ser exclusiva, só pode ordenar à prática do ato ilegalmente omitido.

O recurso hierárquico é dirigido ao superior hierárquico, mas esse recurso hierárquico é


entregue ao autor do ato, para que este se possa pronunciar. O autor do ato deve reenviar
o requerimento em conjunto com a sua pronuncia sobre o mesmo, para que o superior

78
decida. No momento em que o autor do ato reconhecer que errou, a lei dá-lhe a
possibilidade de resolver o assunto, desde que o resolva em sentido favorável ao
interessado e, caso não seja, o recurso tem de seguir para o superior hierárquico.

6. Quais são os sentidos possíveis de decisão de uma reclamação ou recurso


apresentado contra um ato administrativo?

Reclamação, ao abrigo do artigo 192º, nº2 – “podendo confirmar, revogar, anular,


modificar ou substituir o ato reclamado, ou praticar o ato ilegalmente omitido.”

Do recurso, ao abrigo do artigo 197º, nº1 (decisão), pode “confirmar ou anular o ato
recorrido” e também pode “revogá-lo, modificá-lo ou substituí-lo”.

7. Considere que na sequência de um recurso hierárquico, é praticado um ato


que confirma o ato recorrido, mas inova quanto à fundamentação
apresentada. Trata-se de um ato confirmativo?

Não é um ato confirmativo. Para que um ato seja confirmativo, existem alguns critérios a
seguir: é necessário que haja um claro objeto de sentido de sujeitos e de fundamentação.
Desta forma, basta que a fundamentação seja diferente para que o ato praticado não seja
confirmativo.

A relevância desta questão prende-se com a reclamação e recurso administrativo, sendo


que, para recorrer adequadamente, é necessário perceber a natureza do ato. Se o sentido
for desfavorável, existe interesse em recorrer e é necessário identificar o ato, que será o
ato praticado originário, e não o ato confirmativo.

8. Imagine que na notificação de um ato administrativo não é mencionada a sua


sujeição a recurso hierárquico necessário e que, por isso, o interessado
recorre diretamente aos tribunais. Quid iuris?

Para o recurso hierárquico ser necessário, é necessário uma norma especial que o
qualifique como tal (artigo 185º, nº2) e, por ser necessário, estão lhe associados os efeitos
suspensivos do artigo 189º.

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Artigo 114º, nº2, alínea c) – deve identificar-se, na notificação, quando a reclamação ou
recurso sejam necessários. No nº4 deste artigo, dá-se a possibilidade de utilização a
posteriori, no prazo de 30 dias, do recurso ou da reclamação que é necessário e cujo lapso
não foi indicado como tal na notificação.

A ideia é não penalizar o interessado por erro da Administração Pública, admitindo que o
interessado é um homem médio, que não tem de ter conhecimento sobre estas questões.

Aula de Compensação – 26.04

Caso Prático nº12


NOTA: mecanismo de reação administrativa ≠ mecanismo de reação contenciosa, ter atenção
a isto no exame, ler bem as questões até ao fim e perceber o que é perguntado.

1. Deliberação da Câmara Municipal em incumprimento do quórum exigível


que decide celebrar um contrato de aquisição de serviços:

Uma deliberação pela qual se decide celebrar um contrato de aquisição de serviços,


juridicamente constitui uma decisão de contratar, que é um ato administrativo, que tem
a especificidade de pôr termo a um procedimento administrativo que o antecede e
que é dirigido a determinar aquela que é a melhor forma para prosseguir um determinado
fim de interesse público. Assim, este não se segue necessariamente à prática da decisão
de contratar.

Existe uma necessidade e um fim de interesse público que se procura satisfazer, e o


procedimento visa determinar a melhor forma de o fazer. Se a melhor forma for a
contratação de terceiros, pratica-se um ato administrativo que se traduz na decisão de
contratar, que identifica o tipo de contrato a celebrar, o seu conteúdo e o procedimento
pré-contratual a seguir.

Assim, a decisão de contratar constitui um ato administrativo, que põe termo a um


procedimento dirigido a tentar perceber qual a melhor solução para responder a um fim
de interesse público determinado, mas que, simultaneamente, abre um novo procedimento
administrativo, um procedimento pré-contratual, sujeito ao regime do Código dos
Contratos Públicos.

80
Neste caso, temos uma decisão de contratar, nos termos do artigo 36º do CCP, que foi
tomada com base num quórum com base ilegível. O vício, neste caso, é orgânico, cuja
consequência jurídica é a nulidade, ao abrigo do artigo 161º, nº2, alínea h) do CPA.

Existe aqui um aspeto fundamental que se prende com o facto de que os mecanismos de
reação administrativa que se referem a atos contratuais, estão sujeitos a um regime
especial previsto nos artigos 267º e seguintes do CCP. Não existindo uma norma aqui que
nos sirva, aplicamos o CPA subsidiariamente, nomeadamente, nos artigos 147º e
seguintes.

Se temos aqui uma deliberação da Câmara Municipal, e não tendo regulação prevista no
CCP, aplica-se o CPA subsidiariamente, e temos um prazo de 5 dias uteis, sendo que a
impugnação é facultativa.

A Câmara Municipal não está integrada numa estrutura hierárquica, uma vez que
entre o presidente da Câmara Municipal, a própria Câmara Municipal e a Assembleia
Municipal não existe qualquer relação de hierarquia, nem um órgão que desse ordens,
tomasse decisões e contra o qual se pode apresentar recursos disciplinares.

Desta forma, não pode ser utilizado o recurso hierárquico, podendo ir pela via da
reclamação. Poderíamos apresentar, também, um recurso tutelar, ou seja, um recurso
apresentado ao Governo pela Assembleia Municipal, pela Câmara Municipal ou pelo
Presidente da Câmara Municipal, mas o seu fundamento só pode ser um, a ilegalidade,
ao abrigo do artigo 199º, nº3 do CPA. Neste sentido, se assim não fosse, estaríamos a
permitir, nesta sede, uma tutela quanto à oportunidade, mérito e conveniência sobre as
Autarquias Locais, que é claramente vedada pela CRP.

Deste modo, seria possível, ao abrigo do artigo 185º, nº3, o fundamento da ilegalidade e
conveniência do ato praticado para as reclamações e para os recursos, sempre que a lei
não determine o contrário. Neste caso, como estamos perante uma tutela de mera
legalidade, não se pode permitir, por via deste artigo, aquilo que a CRP não permite (tutela
de mérito da Administração Autónoma). Assim, este recurso tutelar tem como
fundamento apenas a legalidade (artigo 199º, nº3, a contrario).

81
Utilizaríamos, então, a reclamação, à qual se aplicaria o disposto nos artigos 191º e 192º
do CPA, e um recurso tutelar (artigos 199º, nº1, alínea c) e 199º, nº3), com fundamento
única e exclusivamente na ilegalidade da decisão de contratar (o que se pedia para
fiscalizar era a concordância ou não da decisão de contratar com as normas e princípios
aplicáveis). Este recurso é da competência do Governo, sendo assegurada pela Inspeção
Geral das Finanças, nos termos da lei 27/96.

Contra esta deliberação da Câmara Municipal, os mecanismos a utilizar seriam a


reclamação ou recurso tutelar. Quer um quer outro, teriam caráter facultativo, ao
abrigo do artigo 268º do CCP, e teriam de ser apresentados no prazo de 5 dias, de acordo
com o artigo 270º do CCP. Para além disso, não teriam efeitos suspensivos nas operações
subsequentes, não se podendo proceder à decisão de qualificação, no início da fase de
negociação ou à decisão de adjudicação (artigo 272º do CCP).

2. Ato administrativo que recusa o pedido de um particular a uma prestação a


que tem direito por lei, praticado pelo delegado no exercício dos poderes de
delegação:

Temos aqui um vício material, de violação de lei em sentido estrito, com referência aos
pressupostos de Direito do ato administrativo praticado, ou seja, as normas que deviam
fundar e limitar o ato administrativo não foram respeitados pelo autor do ato (o seu
conteúdo e prescrição não foram seguidas), que é delegado no exercício dos poderes de
delegação, sendo que esta condição deve ser mencionada no ato administrativo, ao abrigo
do artigo 48º do CPA.

Assim, a falta de menção não constitui um vício invalidante, mas sim uma mera
irregularidade, sendo que o que se impõe é que os interessados não sejam prejudicados.

Não temos nenhuma informação sobre a matéria propriamente dita para percebermos os
regimes especiais aplicáveis como na alínea anterior, por isso vamos cingir-nos ao que
está no CPA.

82
A delegação de poderes tem lugar entre dois órgãos, ao abrigo dos artigos 44º e seguintes
do CPA, da mesma pessoa coletiva ou pessoas coletivas diferentes. Regra geral, entre os
dois existe uma relação de hierarquia, mas esta também pode não acontecer.

Quando a delegação de poderes é feita entre superior hierárquico e subalterno,


relativamente à competência que constitui objeto do ato de delegação, a relação de
hierarquia deixa de ser de hierarquia, e passa a ser uma relação de delegação, ou seja, o
superior hierárquico ocupa a posição de delegante. A relação de hierarquia possui um
conjunto de características que a relação de delegação não possui, ou seja, o delegante
não pode dar ordens, apenas instruções, e contra ele não pode ser instaurado um
procedimento disciplinar, por exemplo, ao abrigo do artigo 49º do CPA.

Assim, se o ato foi praticado no exercício de poderes de delegação e, mesmo que o


delegado tenha anteriormente sido subalterno, para este caso ele atua como delegado, por
isso não é possível a apresentação de recurso hierárquico dos atos que ele pratica. A
relação fica paralisada no que se refere às competências cujo exercício foi transferido.

Existe, então, a possibilidade de apresentar um recurso administrativo especial para o


delegante ou subdelegante, nos termos do artigo 199º, nº2, para além da reclamação,
prevista nos artigos 191º e 192º.

3. Prática de um ato administrativo que aplica uma sanção disciplinar, com


preterição da audiência prévia dos interessados:

A consequência jurídica aplicável é a nulidade, ao abrigo do artigo 162º, nº2, alínea d).
A configuração da audiência prévia como um direito fundamental, resulta do artigo 269º
da CRP, pelo que este ato é nulo.

Relativamente a este ato administrativo que aplica uma sanção disciplinar, temos de
perceber qual é o tipo de vinculo que resulta desta relação laboral à qual é aplicada a
sanção. As sanções disciplinares são aplicadas sempre numa relação laboral, ou seja,
numa relação jurídica de trabalho, onde, por um lado, temos o trabalhador e, no outro, a

83
entidade empregadora, e é pela forma como o trabalhador exerce as suas funções que lhe
é instaurado o procedimento disciplinar.

Assim, o vínculo é importante para percebermos qual é a legislação a seguir. Atendendo


ao contexto em que estamos, assumimos que este contrato de trabalho em funções
publicas, celebrado ao abrigo da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP),
portanto, um contrato público de Direito Administrativo. O CPA funciona aqui apenas em
termos subsidiários.

v Artigos 205º e seguintes à disciplinam o procedimento administrativo


disciplinar comum que deve anteceder a aplicação de qualquer sanção disciplinar
a trabalhadores públicos.
v Artigos 224º e seguintes à indicam as impugnações possíveis relativamente a
atos em procedimentos disciplinares.
v Artigo 225º à de forma clara, neste artigo, o legislador afasta a possibilidade de
reclamação, e possibilita a utilização do recurso hierárquico ou tutelar deste ato
administrativo que aplica uma sanção disciplinar.
v Artigo 225º, nº4 + artigo 3º do DL 4/2015 à o recurso hierárquico ou o recurso
tutelar são necessários. Não é necessário utilizar os dois, basta fazer uso de um
deles para que depois se possa recorrer aos Tribunais Administrativos.

Assim, considerando que, neste caso, temos de observar o disposto no regime especial da
Lei do Trabalho em Funções Públicas, não é possível fazer uso da reclamação, apenas é
possível apresentar recurso hierárquico ou tutelar, sendo que são necessários, nos
termos do artigo 225º, nº4 desta lei, a interpretar de acordo com o artigo 3º do DL 4/2015
que aprova CPA em anexo. O CPA aplica-se subsidiariamente, em tudo o que não esteja
previsto na LGTFP.

4. Ato de adjudicação dirigido à celebração de um contrato de empreitada, que


viola o critério de adjudicação:

84
O ato de adjudicação é um ato administrativo que põe termo ao procedimento pré-
contratual. Através deste ato, decide-se celebrar o contrato com a proposta graduada em
primeiro lugar.

O ato de adjudicação é praticado pela entidade adjudicante, entidade essa que se insere
numa previsão do artigo 2º do Código dos Contratos Públicos (CCP). O contrato de
empreitada é um contrato de direito público regido pelo CCP e a sua prestação está sujeita
a concorrência, logo o seu regime substantivo é o previsto no CCP.

Voltamos, assim, ao disposto nos artigos 267º e seguintes do CCP.

Quanto aos mecanismos de reação, podemos utilizar a reclamação e, dependendo do


órgão que desempenhe as funções de entidade adjudicante, o recurso hierárquico ou
algum dos recursos especiais previstos.

5. Omissão ilegal de ato administrativo para o qual tem competência exclusiva


o subalterno:

Quem não praticou o ato e devia ter pratico era o subalterno, por isso as possibilidade são
a reclamação ou recurso hierárquico.

Fazendo-se uso do recurso hierárquico, temos limitações, nos termos do artigo 197º, nº4
do CPA, pelo que não poderia o superior hierárquico substituir-se ao órgão omisso,
poderia apenas ordenar à sua prática, tendo em conta que se trata de uma competência
exclusiva do subalterno.

No caso da reclamação esta questão não se coloca, uma vez que é dirigida ao subalterno.

Análise do Acórdão de 8 de abril de 2022 – Processo 2504/19.2


BEPRT
Acórdão do Tribunal Central, de 8 de abril de 2022, processo 2504/19.2 BEPRT –
disponível no site do DGSI.

85
O que está aqui em causa?

O que está aqui em causa é um recurso que foi apresentado ao Tribunal Central
Administrativo do Norte, de uma decisão proferida em primeira instância pelo Tribunal
Administrativo do Porto, que considerou que não existia interesse para agir, daí a exceção
dilatória.

O município do Porto podia ter optado por fazê-lo diretamente, mas optou por criar uma
empresa municipal, sujeita a tutela de mérito e de legalidade por parte do município. Esta
empresa municipal recorreu aos Tribunais Administrativos, solicitando a resolução do
contrato de arrendamento, o despejo e a condenação a pagar a renda em dívida.

Este é um contrato de arrendamento sujeito a normas de Direito Administrativo. O


que sucede é que os arrendatários deixaram de pagar renda, sendo notificados para sair
da habitação, contudo, permaneceram na casa sem pagar as rendas, pelo que a empresa
municipal recorreu aos Tribunais Administrativos, de forma a munir-se de um título
administrativo que a permitisse despejar os arrendatários.

O Tribunal Administrativo do Porto entendeu (segundo a professora, bem) que a empresa


municipal que ocupa a posição de senhorio, tem a seu cargo poderes de autotutela
executiva, que lhe permitiam despejar coercivamente os arrendatários e exigir, também
coercivamente, o pagamento da dívida, pelo que não teria de recorrer aos tribunais
administrativos.

As empresas municipais são pessoas coletivas privadas, sujeitas a influência pública


dominante, ao abrigo da Lei 50/2012, nomeadamente o artigo 19º.

Face ao não cumprimento voluntário, esta pessoa coletiva podia fazer uso dos
mecanismos de reação coerciva?

A resposta é sim, o facto de ser uma pessoa coletiva privada não obsta, porque o que
está em causa é o exercício de poderes públicos de autoridade, pelo que se aplica o
CPA (que tem subjacente um critério orgânico e funcional). Assim, aplica-se o CPA a
todos os atos praticados que se prendam com este contrato.

O problema reside na interpretação do artigo 183º do CPA: nos termos do artigo 176º do
CPA (a interpretar de acordo com as outras normas já mencionadas), vigora entre nós o

86
privilégio da execução prévia, pelo que, à partida, pode executar-se coercivamente, sem
a necessidade de recorrer previamente aos tribunais (quando é necessário, tem de existir
uma norma especial, como a do artigo 183º).

Aqui, não esteva em causa apenas o despejo, sendo que, quanto a este, não existiam
grandes dúvidas. O que podia suscitar algumas questões, era quanto à cobrança coerciva
das rendas, através de um processo tributário – teria de ser pedido à Autoridade Tributária
para o fazer.

Em suma, temos um contrato de arrendamento, que corresponde a um contrato público


de Direito Administrativo, onde os arrendatários não procederam ao pagamento das
rendas, pelo que lhes foi ordenado o despejo e o pagamento das rendas devidas – praticou-
se um ato administrativo com este conteúdo. Contudo, este ato não foi voluntariamente
cumprido, e a questão que se coloca é se a empresa municipal pode executar
coercivamente este ato administrativo:

a) Na situação de despejo à sim


b) No pagamento das rendas à levanta-se a questão em virtude do disposto no
artigo 179º, nº1, uma vez que este menciona apenas pessoas coletivas públicas.
Neste caso, a empresa é uma pessoa coletiva privada.

Contudo, o que se sucede é que o artigo 179º, nº1 está inserido na parte IV do CPA e, de
acordo com o artigo 2º, nº1 deste código, esta parte aplica-se, também, à conduta de
qualquer entidade, independentemente da sua natureza, adotada no exercício de poderes
públicos ou regulada de modo específico por disposições de Direito Administrativo.
Assim, o artigo 179º, nº1 também se aplica a esta empresa municipal.

Assim, entendeu o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em primeira instância, que


a empresa não tinha de recorrer aos tribunais administrativos, tanto para o despejo como
para o pagamento, pois tinha poderes para o fazer. Se assim é, não existe necessidade em
agir, pelo que este tribunal deu por extinta esta ação, por exceção dilatória em falta de
interesse a agir.

87
Contudo, a empresa não concordou e apresentou recurso (o que, segundo a professora,
não faz muito sentido). O tribunal acaba por concordar com a decisão do tribunal em
primeira instância.

NOTA: este é um acórdão fundamental e devemos ter esta jurisprudência em consideração para o
estudo.

Aula 27.04

Caso Prático nº13


O auto de contraordenação é um ato administrativo. Características deste ato:

• Ato primário;

• Quanto aos seus efeitos, é desfavorável;

• Singular;

• Quanto ao facto de produzir os seus efeitos na esfera do seu destinatário direto, é


um ato administrativo bipolar (se produzisse efeitos na esfera de terceiros, seria
um ato polivalente);

• Quanto ao conteúdo, é positivo (constituem, modificam ou extinguem uma


relação jurídica, ou alteram uma qualidade ou estado de um determinado bem) à
o pedido adequado é o de impugnação.

Relativamente à notificação, prevista no artigo 114º, esta é um ato instrumental e


preparatório, de caráter comunicativo. Todos os atos administrativos devem ser
notificados (artigo 114º, nº1, alínea c)), mas a notificação só funciona como requisito de
eficácia em determinadas situações. Neste caso, a notificação funciona como requisito de
eficácia, uma vez que o ato tem efeitos desfavoráveis, ao abrigo do artigo 160º.

Neste caso prático, a notificação não menciona que o recurso era necessário, sendo que o
deveria fazer, de acordo com o artigo 114º, nº2. Assim sendo, a consequência jurídica
consta do artigo 114º, nº4, salvaguardando-se o destinatário do ato, uma vez que ele
desconhecia a necessidade, e o juiz, a partir do momento em que verifica que tal se deveu
88
a um lapso, suspende o processo no prazo de 30 dias, para que o interessado faça uso dos
mecanismos de impugnação administrativa necessários. Findo o recurso a esses
mecanismos, ou o processo judicial se extingue porque se tornou inútil, ou o processo
prossegue, tendo em consideração a decisão proferida.

O destinatário fica, desta forma, salvaguardado, porque desconhecia sem culpa,


utilizando-se sempre o critério do homem médio sem conhecimentos jurídicos e que age
de boa fé.

Temos ainda o problema da preterição da audiência prévia dos interessados, prevista nos
artigos 121º e seguintes do CPA. Desta forma, devia ter sido notificado para a exercer,
nos termos do artigo 122º, e, não tendo sido, existe um vício formal, que leva à nulidade
por se tratar de um ato contraordenacional (artigo 161º, nº2, alínea d) + artigo 32º, nº10
da CRP).

O Frederico, caso não quisesse proceder ao pagamento da coima, deveria fazer uso do
recurso administrativo necessário, que tem associado efeitos suspensivos (artigo 189º, nº1
– suspende os efeitos do ato contraordenacional). Considerando que o recurso era
necessário, o Frederico apenas poderia recorrer aos tribunais depois de decorrido o prazo
para a decisão ou depois de existir uma decisão sobre o mesmo recurso (artigo 198º,
números 3 e 4). Até lá, a possibilidade não existia, na medida em que o recurso era
necessário.

Caso Prático nº14


i. Regulamento administrativo, com eficácia externa e, à partida, imediatamente
operativa. É um regulamento autónomo, pois provem de um município.
Ao abrigo dos artigos 72º e seguintes do CPA, é possível recorrer diretamente aos
tribunais administrativos.

ii. Os pareceres estão regulados nos artigos 91º e 92 do CPA. Em regra, são
vinculativos e não obrigatórios. Quando um órgão com competência decisória não
segue um parecer vinculativo, deve fundamento, de acordo com o artigo 152º,
89
alínea c), sendo que daqui não resulta nenhum vício invalidante, apenas o dever
de fundamentar.
Os pareceres não vinculativos não são suscetíveis de recurso direto nos tribunais
administrativos.

Um parecer não vinculativo, à semelhança dos pareceres vinculativos, produzem


efeitos circunscritos no procedimento. São atos preparatórios e instrumentais, com
eficácia meramente interna. O legislador, quanto aos atos vinculativos, equiparou-
os a atos administrativos, de forma a permitir aos interessados o recurso
antecipado à justiça administrativa (artigos 51º, nº2, alínea b) e 51º, nº3, 1ª parte
do CPTA).

Assim, se fosse um parecer vinculativo, seria possível o recurso direto aos


tribunais administrativos, mas apenas até ao ato não ser praticado – é uma reação
antecipada. A partir do momento em que o ato é praticado, apenas se pode recorrer
do ato praticado, e já não do parecer.

Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Entidades


Públicas por Atos de Gestão Pública – Lei 67/2007

A Lei 67/2007 prevê o regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual do


Estado e demais entidades públicas, pelo exercício de atos de gestão pública, ou seja,
funções que são reguladas por normas de Direito Público. Esta lei tem o seu regime
organizado, considerando a função de que o dano é proveniente.

Assim, importa distinguir entre responsabilidade civil extracontratual por danos


decorrentes do exercício da função administrativa, função jurisdicional e função político-
legislativa.

i. Função Administrativa

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O exercício da função administrativa é da responsabilidade do Estado, de pessoas
coletivas públicas, de pessoas coletivas privadas sujeitas a influência pública
dominante ou, ainda, de concessionários, ao abrigo do artigo 1º, nº5 da Lei 67/2007.

NOTA: a Lei 67/2007 só é aplicável quando os danos decorrem de atos, ações ou omissões que
decorram de atos regidos por normas de Direito Administrativo.

Nesta função, a responsabilidade nem sempre é por factos ilícitos. Importa distinguir
entre:

1. Responsabilidade pelo risco (artigo 11º) – tem a especificidade relativamente ao


facto que origina o dano, que se prende com o facto da responsabilidade ser
originada por uma atividade especialmente perigosa (por exemplo, a condução
de uma ambulância em estado de emergência, buscas com armas de fogo, o
transporte de mercadorias inflamáveis ou perigosas).

2. Responsabilidade por factos lícitos (artigo 16º) – este artigo 16º tem uma
aplicação residual, aplicando-se apenas aos casos que não estão previstos em
legislação extravagante. Trata-se de uma conduta adotada pela Administração
Pública que é conforme ao Direito, mas desta resultam danos para os cidadãos,
que suportam encargos extraordinários resultantes dessa atividade e têm, por
isso, direito a indemnização (por exemplo, 3 terrenos seguidos, em que apenas no
meu, que é o do meio, não é permitida a construção, por se tratar de património
verde – não existe qualquer conduta ilícita da Administração, mas existe um dano
significativo que precisa de ser ressarcido).

3. Responsabilidade por factos ilícitos (artigos 7º a 10º) – têm de se verificar cinco


pressupostos de responsabilidade:

a. Um facto, que se pode traduzir numa ação ou omissão;


b. Ilícito – o que releva aqui é que uma norma ou um princípio de Direito
Administrativo seja violado (pode ser violação de Direito da União Europeia,
normas regulamentares, leis, normas de Direito Administrativo, etc.);
c. Culposo – a culpa é muito importante. Podemos falar em:
• Dolo (artigos 6º e 8º)

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• Negligencia leve (artigos 7º, números 1 e 2, e 10º)
• Negligencia grosseira (artigos 6º e 8º)

Se o agente tiver agido com dolo ou negligência grosseira, a


responsabilidade é solidária, podendo caber à entidade administrativa, ao
funcionário responsável, ou a ambos. Se a entidade administrativa proceder
ao pagamento, tem o dever de exigir o regresso do valor que pagou ao
trabalhador, a título de indemnização (direito de regresso).
Se tiver agido com negligência leve, existe responsabilidade exclusiva da
entidade administrativa, não havendo direito de regresso.

Se não conseguirmos encontrar o concreto agente responsável pelo facto que


causou o dano, temos outra modalidade de culpa, o funcionamento anormal
de serviços previsto no artigo 7º, neste caso há responsabilidade exclusiva,
ao abrigo do artigo 7º, números 3 e 4 (por exemplo, negligência hospitalar
de deixar um doente à espera durante muito tempo).

d. Dano – pode ser patrimonial ou não patrimonial, emergente, futuro, cessante,


etc.
e. Nexo de causalidade – é aferido em função da teoria da causalidade
adequada.

ii. Função Jurisdicional


Está regulada nos artigos 12º a 14º, e corresponde a uma responsabilidade do Estado,
uma vez que é a ele que compete o exercício da função jurisdicional.

Os fundamentos possíveis são:

• Violação do direito a uma decisão em prazo razoável, que corresponde a um


direito fundamental, ao abrigo do artigo 6º CEDH e do artigo 20º da CRP.

Para definirmos o que é um prazo razoável, temos de ter em consideração o tipo


de processo, a sua complexidade de Direito e de facto, o comportamento das
92
partes, etc. Se for concluído que o prazo razoável não foi cumprido, existe um
facto ilícito e culposo, do qual resulta um dano à responsabilidade por factos
ilícitos.

• Erro grosseiro ou manifesto, que pode ser de Direito ou de facto – situações


limite em que se pode concluir que este erro existiu por parte do tribunal (por
exemplo, a aplicação de uma norma que ainda não está em vigor, ou de uma norma
declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo Tribunal
Constitucional) à também constitui uma responsabilidade por factos ilícitos.

iii. Função Político-Legislativa


Está regulada nos artigos 2º e 15º, e corresponde a uma responsabilidade do Estado,
uma vez que é a ele que compete o exercício da função político-legislativa.

Os pressupostos que conhecemos do Direito Civil, mantém-se aqui: facto ilícito, culposo,
que provoque um dano, e que exista um nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Contudo, existe uma especificidade quanto ao dano, que, para relevar, tem de ser especial
e anormal, ou seja, tem de afetar a esfera jurídica de uma pessoa concreta e
determinada, o que dificulta a verificação, na prática, desta responsabilidade.

No entanto, apesar de os pressupostos serem os mesmos, a forma como se configuram é


distinta, de acordo com o artigo 2º.

Os tribunais competentes para apreciarem as ações de responsabilidade são os


tribunais administrativos, ao abrigo do artigo 4º, nº1, alíneas f), g) e h) do ETAF.

Aula 04.05

Quando falamos em responsabilidade do Estado, falamos no princípio da confiança, que


deve existir dos cidadãos perante o Estado de Direito Democrático e não apenas de uma
finalidade única de indemnização de danos causados ao lesado, portanto, acaba por ser
mais correto dizer responsabilidade patrimonial do que responsabilidade civil.

93
Caso Prático nº15
Quando existe uma relação hierarquia, ao superior hierárquico cabe dar ordens e
instruções em matéria de serviço, ao subalterno cabe cumprir essas ordens e instruções,
ou seja, no que respeita às competências previstas que cabem ao subalterno (não é pedir
para ir buscar um café ou um croissant, são competências de serviço).

Assim, quando o subalterno é confrontado com uma ordem ou instrução em matéria de


serviço, ele tem o dever de obedecer, sob pena de cometer uma infração ou ilícito
com relevância disciplinar, que dará origem a um procedimento disciplinar e,
eventualmente, à sanção adequada.

Existem casos em que o dever de obediência não existe, nomeadamente, os casos


previstos no artigo 271º da CRP. Desta forma, o dever de obediência cessa quando:

• A ordem ou instrução implica a prática de um crime


• Quando as ordens ou instruções não são em matéria de serviço

Contudo, algo distinto é quando o superior hierárquico dá uma ordem ou instrução em


matéria de serviço, que não constitui a prática de um crime, mas que seja ilegal, como
sucede nesta hipótese prática. Neste caso, não cessa o dever de obediência, mas o
subalterno pode exercer o direito de respeitosa representação (artigo 271º, números 2
e 3 da CRP). Este direito de respeitosa representação traduz-se no pedido por escrito de
que a ordem ou instrução seja confirmada por escrito, manifestando o subalterno, neste
pedido, a sua preocupação perante a ilegalidade da instrução ou ordem, antes de proceder
ao seu cumprimento.

Caso o ato venha a ser praticado pelo subalterno em execução de uma ordem ou instrução
ilegal, em relação ao qual exerceu o direito de respeitosa representação, e desse ato resulte
um dano, o subalterno não é responsável patrimonialmente relativamente a esse
dano, quem poderá ter será o superior hierárquico.

94
O lesado intenta uma ação contra uma entidade administrativa e contra o autor do ato,
que atuou na qualidade de subalterno, a pergunta que se coloca é: o subalterno que
exerceu o direito de respeitosa representação, poderá vir, no âmbito dessa ação de
responsabilidade civil extracontratual, a invocar isso, por forma a ser considerado pelo
tribunal como parte ilegítima, porque se limitou a cumprir uma ordem ou instrução dada
pelo superior hierárquico sobre a qual exerceu o direito?

Não, porque o direito tem uma eficácia limitada em relação à relação entre superior
hierárquico e subalterno, portanto não pode o lesado que nada tem que ver com esta
relação, ficar prejudicado pelo exercício por parte do subalterno pelo seu exercício do
direito de representação.

Isto resolve-se através de uma figura processual que se designa de incidente de


intervenção principal provocada. Este incidente corresponde a uma vicissitude no
processo, que permite a uma das partes chamar a outra, que deveria também ocupar aquela
posição, isto é, ele chama o superior hierárquico para a ação.

Deste modo, o pressuposto processual passa a ter, de um lado, o lesado, e do outro, a


entidade administrativa, o superior hierárquico e o subalterno.

No final, o tribunal vai apreciar tudo o que as partes levaram para a ação (todos os
ARGUMENTOS utilizados), e face ao argumento utilizado pelo subalterno de que atuou
exercendo o direto de respeitosa representação, verificando que estão verificados os
pressupostos da responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, faz uma de duas
coisas:

1. Condena em exclusivo o Estado ou entidade administrativa ao pagamento de


uma indemnização ao lesado, porque se considerou que o pressuposto culpa foi
preenchido por negligência leve, nos termos do artigo 7º, nº1 da Lei 67/2007.

2. Condena o Estado ou a entidade e o superior hierárquico ao pagamento de


uma indemnização ao lesado, por ambos responderem solidariamente pela
mesma, o que acontece se se concluir que o superior hierárquico agiu com dolo
ou negligência grosseira (artigo 8º).

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Neste caso, as entidades procedem ao pagamento da indemnização e exercem o
direito de recessão sobre o superior hierárquico – sendo a ação de
responsabilidade procedente, não será contra o subalterno que a ação de regresso
será intentada (este apenas continua no processo, sem ser chamado a responder).

Diferentemente, seria se o advogado do subalterno não invocasse o direito de respeitosa


representação e, portanto, a ação decorre sem que o superior hierárquico seja chamado ao
processo. Neste caso, o tribunal:

1. Condena exclusivamente o Estado ou a entidade ao pagamento de uma


indemnização ao lesado, pois considerou que o pressuposto culpa foi preenchido
por negligência leve.
2. Condena o Estado, a entidade e o subalterno ao pagamento de uma
indemnização ao lesado, por ambos responderem solidariamente pela mesma.

Na ação de regresso é que é chamado o superior hierárquico, alegando o exercício do


direito de respeitosa representação. No final da ação de regresso, será o superior
hierárquico a devolver o dinheiro à entidade administrativa, que tinha pago ao lesado.

No que diz respeito à competência dos tribunais administrativos, para julgar ações de
responsabilidade de entidades administrativas quando seja de aplicar a Lei 67/2007,
são sempre competentes os tribunais administrativos – artigo 4º,nº1, alíneas f), g), e h)
do ETAF.

Contudo, existe uma exceção, no que diz respeito à responsabilidade civil extracontratual
no exercício da função jurisdicional, quando se funde em erro judiciário, é competente o
tribunal da jurisdição do tribunal que cometeu o erro (por exemplo, se o erro judicial
tiver sido cometido pelo tribunal da jurisdição comum, a ação de responsabilidade deve
dar entrada nos tribunais comuns) –alínea a) do nº4, do artigo 4º do ETAF.

Se uma pessoa coletiva pública for responsável por atos praticados ao abrigo de normas
de Direito privado, não é aplicável a Lei 67/2007, é aplicável o Código Civil, mas como

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se trata de uma pessoa coletiva pública, são responsáveis os tribunais administrativos (que
vão aplicar normas de direito privado).

Acórdão STA – Processo 0477/11, de 13 de março de 2012


Criança que deu entrada num hospital, que integra o Serviço Nacional de Saúde – é importante
uma vez que, integrando o SNS, é-lhe aplicada a Lei 67/2007, independentemente de se tratar de
um hospital público ou privado. A jurisprudência tem entendido que, quando os atos médicos
sejam praticados num hospital ou unidade de saúde integrados no SNS, fazem-no no
exercício da atividade administrativa.

Qualquer tipo de tratamento ou exame de diagnóstico tem de estar descrito num relatório médico
(corresponde a um dever deontológico), sendo que este funciona como um importante elemento
de prova, tal como a prova pericial.

Quem tem de fazer prova dos pressupostos da responsabilidade é o lesado, sendo o relatório
um importante instrumento neste campo. Contudo, não existindo relatório, a jurisprudência tem
entendido que existe uma inversão do ónus da prova, isto é, é o médico que deveria ter elaborado
o relatório, e não o fez, que tem de fazer prova de que os pressupostos da responsabilidade não se
verificaram.

A criança apresentava dificuldades respiratórias e muita tosse, sendo que a médica que a observou
na primeira visita ao hospital, diagnosticou uma ligeira constipação, mandando a criança para
casa novamente. Contudo, os sintomas continuaram a piorar, e a mãe decidiu voltar ao hospital
no dia seguinte, tendo sido, novamente, mandada embora.

No terceiro dia consecutivo a encaminhar-se ao hospital, fez exames complementares de


diagnóstico e foi descoberto que tinha um tumor na garganta, que, tendo crescido de tal forma,
impedia a criança de respirar, o que provocou, na criança, um AVC e um conjunto de sequelas
graves.

Aquilo que se questionava era se o AVC poderia ter sido evitado no caso de a médica que o
observou no primeiro dia ordenasse imediatamente à elaboração dos exames complementares de
diagnóstico (a questão que se coloca não é a de que a médica deveria ter adivinhado o que a
criança tinha, apenas ordenasse, com maior antecedência, a criança a fazer os exames). Foi,
portanto, considerado que sim, existindo, aqui, um erro médico, sendo que a questão prende-se
com o montante de indemnização.

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Nesta ação, a juíza achou que os danos morais seriam quantificados em 80.000€, que é a
indemnização atribuída ao dano morte, confirmada pelos tribunais superiores. Este caso foi
relevante, uma vez que impulsionou os juízes a irem mais longe neste tipo de ações, e a testarem
os padrões dos valores de indemnização geralmente atribuídos.

Acórdão TCAN – Processo 02430/09.3BEPRT, de 18 de


novembro de 2016
Um menor foi atropelado por um comboio quando se encontrava sob vigilância da avó.

Duas crianças estavam a brincar perto de uma linha de comboio, tendo acabado por ir para cima
da mesma. Estando com música, não se aperceberam do comboio e, apesar da insistência do
maquinista em apitar e tentar travar, não conseguiu parar o comboio.

Neste caso, não podemos responsabilizar o maquinista ou a CP, uma vez que este fez tudo aquilo
que estava ao seu alcance. A responsabilidade cabe à REFER, que é a empresa responsável pela
vedação dos locais por onde passa a linha de comboio, de forma a impedir o acesso a esses locais.

Assim, temos aqui uma concorrência de responsabilidades:

• A avó, por omissão do dever de vigilância.


• A REFER, pela indevida vedação do local.

Neste caso, a indemnização aos pais foram divididas entre a avó e a REFER.

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