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Comunicação educadora com os participantes da Jornada de Agroecologia a

partir de instalações artístico-pedagógicas

Educational communication with the participants of the Journey of Agroecology


based on artistic-pedagogical installations

JANTALIA, Eduardo Kobylansky1; KELLERMAN, Renata2 ; MOTA, Gabriela Almeida


etc…
1
Universidade Federal do Paraná - Litoral, dujanta@gmail.com; 2 Instituição, email@provedor.com.br
(Arial fonte 10, centralizado)

Eixo temático: Construção do Conhecimento Agroecológico;

Resumo

Num contexto de retrocessos das legislações e fiscalização ambiental, com a


crescente liberação de novos agrotóxicos, com a financeirização do sistema
agroalimentar brasileiro levando a alta dos preços e pessoas a insegurança
alimentar, durante uma pandemia que vulnerabilizou milhões de pessoas
financeiramente, a continuidade da Jornada de Agroecologia no estado do Paraná
se coloca como movimento coletivo de resistência e contra hegemônico sobre
modos de vida predatórios ao meio ambiente e de injustiças sociais. Os projetos de
extensão vinculados ao curso de Tecnologia em Agroecologia da UFPR-Litoral, de
forma conjunta, somam-se nessa construção do evento com interações
artístico-pedagógicas num estande em meio a Feira da Biodiversidade e Alimentos
Agroecológicos, abordando temas da conjuntura atual citadas acima, de modo a
criar um ambiente educativo, reflexivo, participativo e conscientizador com a
multiplicidade do público da Jornada de Agroecologia ocorrida em Curitiba em 2022.

Palavras-Chave: Comunicação; Conscientização; Agrotóxicos; Segurança alimentar.


Keywords: Communication; Awareness; Pesticides; Food safety.

​Contexto

Nos últimos anos pode-se observar e vivenciar diversos retrocessos na área


ambiental, seja em questões relativas à legislação e fiscalização, assim como na
proteção das populações tradicionais e o cerceamento dos direitos à terra e território
pelos mecanismos de reforma agrária e demarcação. O que era prerrogativa do
estado brasileiro acabou por se tornar alvo de sua política de extermínio e visão
retrógrada, que é alheia a conjuntura atual das questões climáticas, pautada pela
ciência, assim como é alheia à questão agrária e os desdobramentos sociais,
econômicos e ambientais da concentração de terra e da priorização da produção de
commodities para exportação no lugar do cultivo de alimentos saudáveis, livres de
transgenia, agrotóxicos e fertilizantes químicos, que garantem soberania e
segurança alimentar e nutricional para sua população.

O período recente da pandemia de COVID-19 traduziu de forma ainda mais


clara a inviabilidade de depender de um sistema agrário agroexportador
financeirizado e altamente dependente de insumos químicos, a falta de políticas
aquisição e de distribuição de alimentos, junto com a inflação nos preços dos
mesmos, que foram diretamente impactados pela dolarização de toda a cadeia
produtiva desse sistema, acabou por limitar de forma ainda mais cruel o acesso à
alimentação básica das populações já vulneráveis e restringindo e precarizando a
alimentação de milhões de outros brasileiros que se encontraram em dificuldades
econômicas durante esse período e que ainda não se recuperaram. Segundo
Michelotti (2019), a predominância da especulação no mercado de commodities
agrícolas tem levado a um aumento sem precedentes dos preços, influenciando no
custo das matérias primas, construindo um círculo vicioso onde o capital
especulativo se aproveita das volatilidades conjunturais do sistema agroalimentar
para aumentar sua rentabilidade, não à toa, segundo estudo do Inquérito Nacional
sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil
(2022), apontou que 33,1 milhões de pessoas não tem garantia de alimentação
diária, ou seja, em situação de insegurança alimentar grave, o que representa um
acréscimo de 14 milhões de pessoas em relação a estudos anteriores, e que 58,7%
da população brasileira se encontra em algum grau de insegurança alimentar, seja
ela considerada leve, moderada ou grave.

Em relação ao uso de agrotóxicos, o estado brasileiro, por influência política


direta do agronegócio, tem sido permissivo ao longo dos anos na liberação de novas
formulações, situação que se agravou a partir dos dois primeiros anos de governo
Bolsonaro. Segundo Gurgel (2021), nos primeiros dois anos de governo foram
liberados 997 novos agrotóxicos, sendo esse número superior a um período anterior
três vezes maior (2010-1016), no qual foram liberados 815. Para além disso, outros
mecanismos foram utilizados de modo a flexibilizar ou facilitar o uso dessas
substâncias, ainda segundo Gurgel (2021), a “reavaliação toxicológica de
agrotóxicos, as mudanças nos procedimentos de avaliação de toxicidade, risco e
comunicação de risco, a liberação tácita de agrotóxicos, a flexibilização das regras
de pulverização aérea, a liberação do uso de agrotóxicos proibidos no Brasil em
casos de emergência fitossanitária, a revisão da Portaria de Potabilidade da Água e
a Autorização da queima de resíduos de agrotóxicos em fornos de cimenteiras”,
foram os caminhos utilizados para cumprir esse objetivo. No que diz respeito a
portaria de potabilidade da água, apenas 27 substâncias de agrotóxicos, num
universo de mais de 500, tem valor máximo permitido (VMP) definido, e são
monitorados em apenas 28,7% dos municípios, e em 21% destes houve ao menos
um resultado analítico acima do VMP (Rosa et al., 2020).

As temáticas até aqui levantadas, apesar das questões inerentes a elas terem
se agravado nos últimos anos, têm sido motivo de luta dos movimentos sociais do
campo, dos ambientalistas, dos povos tradicionais ao longo de décadas. É nesse
contexto combativo que a Jornada de Agroecologia foi constituída a partir de uma
coalizão política em 2001 em nome da “Terra Livre de Transgênicos e Sem
Agrotóxico”, contando a participação de mais de 600 camponeses e camponesas,
sujeitos sociais e políticos no ato de lançamento de seu Manifesto Político
(JORNADA DE AGROECOLOGIA, 2022). A Jornada ocorre desde 2002 em
diferentes cidades do estado do Paraná , entre elas Ponta Grossa, Francisco
Beltrão, Londrina, Maringá,Irati e Lapa, sendo ela a expressão do campesinato em
movimento, “sendo realizados segundo o contexto estratégico e conjuntural de cada
período, considerando ora a oportunidade de se dar em territórios hegemonizado
pelo agronegócio, e ora com marcante presença histórica do campesinato e
estimulando e orientando o contínuo intercâmbio das experiências
técnico-produtivas, de seus processos organizativos de produção,
agroindustrialização e comercialização coletivos, de realização de feiras municipais
e regionais de sementes crioulas e ampla agrobiodiversidade, de atividades
culturais, de formação e educação em agroecologia” (JORNADA DE
AGROECOLOGIA, 2022).“Este evento se concretiza com uma marcha pública como
ato de abertura, e segue com a Feira da Biodiversidade e Alimentos Agroecológicos,
conferências em plenária, oficinas de intercâmbio das experiências e seminários,
atividades culturais, e encerra com o ato político com autoridades governamentais e
parlamentares, entre outros. Neste ato político, entrega a Carta da Jornada de
Agroecologia, onde expressa sua posição estratégica e conjuntural e suas
reivindicações, que passam a ser objeto das ações coletivas no transcorrer de cada
ano (JORNADA DE AGROECOLOGIA, 2022).

Em um contexto de ataque ao meio ambiente e descrédito de movimentos


sociais do campo, os últimos três eventos foram realizados em Curitiba, capital
paranaense, com o objetivo promover o encontro de idéias e experiências dos
acampados, assentados, coletivos urbanos , indígenas e quilombolas e de outras
comunidades do campo , trazendo a agroecologia como ponto comum de debate e
convivência para o meio e público urbano. Sua 19° realização, em 2022, contou
com o apoio de 68 instituições e coletivos, entre eles a Universidade Federal do
Paraná, que cedeu um dos seus campi no centro da cidade para receber o evento.

Os estudantes dos projetos de extensão “Tecendo Saberes Socioambientais


com Educadorxs do Campo, das Águas e das Florestas” e “Tecnologias Sociais para
Promoção da Segurança e Soberania Alimentar” do curso de Tecnologia em
Agroecologia da UFPR- Litoral também estiveram presentes no evento para que, de
maneira educativa, reflexiva, participativa e conscientizadora, pudesse abordar os
temas caros a agroecologia, contribuindo com esse movimento coletivo da Jornada,
tendo uma tenda fixa dentro da Feira da Biodiversidade e Alimentos Agroecológicos.

Descrição da Experiência

Levando em consideração a conjuntura socioeconômica à época, de


encarecimento dos alimentos, de liberação desenfreada de agrotóxicos e da sua
consequente contaminação da água, que muitas das vezes passa despercebida pela
população, ficou decidido que esses três temas seriam abordados. Pensando nas
possibilidades de interação e troca com o público, a presença dos projetos de
extensão se deu a partir de instalações artístico-pedagógicas, método que permite
alcançar a multiplicidade de público do evento, facilitando a comunicação com
adolescentes, idosos, , primeiramente pelo envolvimento visual, de maneira
participativa-investigativa, sendo expostas em meio a Feira da Biodiversidade e
Alimentos Agroecológicos.
Foram confeccionados diversos cartazes abordando os três temas
escolhidos. Em relação ao uso de agrotóxico, foi feita a coleta de dados sobre os
agrotóxicos encontrados em testes em diferentes vegetais, sendo listado as
dezenas de nomes dos princípios ativos em cada um delas, uma unidade do
respectivo alimento foi colocado por cima dos cartazes com sua respectiva lista
abaixo, sendo expostos em frente à barraca do projeto na feira. De modo a abordar
o tema da contaminação da água, foi confeccionado diferentes garrafas d’água com
rótulos mostrando o nome do município e o número de agrotóxicos encontrados nos
testes de contaminação. Para abordar a questão do aumento dos preços dos
alimentos de maneira reflexiva, um cartaz grande foi colocado em pé num suporte
com a pergunta “O que você deixou de comer por falta de dinheiro?”, ao lado foi
pendurado um canetão para que cada pessoa pudesse escrever enquanto também
observava as demais respostas, além disso cartazes comparativos entre o valor da
cesta básica de 2018 versus 2022, quantas horas de trabalho baseadas no salário
mínimo eram necessárias nos respectivos anos para comprar-las e qual era o
porcentual que o valor das cestas representavam do salário mínimo, também foram
expostas no estande. Os estudantes acompanhavam a interação do público com as
instalações, o que por diversas vezes acabou por se tornar uma conversa reflexiva
sobre os temas, sendo possível a partir daí reafirmar a importância de produzir
alimentos agroecológicos. O estande ficou montado por três dias do evento, de
maneira que os estudantes pudessem participar do cronograma de oficinas e
palestras, eles revezaram a permanência no mesmo.

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Resultados
A maneira de se comunicar com o público foi acertada, a intervenção chamou
atenção de todas as idades e origens, sejam urbanas ou do campo, possibilitou a
discussão dos temas propostos, trocas de experiência, relatos pessoais e conseguiu
transmitir informações que muitas vezes passam despercebidas no dia a dia. A
questão dos agrotóxicos contaminantes na água foi o que mais gerou surpresa,
muitas pessoas não sabiam que sequer eles estavam presentes na água, quanto
mais a diversidade de substâncias encontradas. A quantidade e diversidade de
agrotóxicos encontrados nos vegetais também chamou muita atenção, apesar de
saberem que eles estavam presentes nos alimentos dos mercados, a maioria do
público se presente no estande se espantou com os nomes dos elementos químicos,
e com os diferentes tipos e formulações , podendo, por exemplo, chegar a mais de
50 agrotóxicos s por cultura, a exemplo do pimentão. A interação com o cartaz sobre
o preço dos alimentos gerou diversas conversas sobre como é perceptível a inflação
nos itens básicos de alimentação, as implicações da alta no dia a dia e possibilitou a
introdução do tema de como o agronegócio exportador influencia no preço do óleo,
carne, leite e grãos. A participação no evento cumpriu seu objetivo educativo,
reflexivo e participativo, além disso ajudou a divulgar o curso de tecnologia em
agroecologia e seus projetos de extensão no Setor Litoral da UFPR, localizado em
Matinhos - PR. Em futuras intervenções, existem possíveis complementos à essa
experiência, como a produção de materiais educativos sobre temáticas da
agroecologia que o público possa levar consigo e também a construção de
intervenções similares a essa nas adjacências do evento, chamando e divulgando o
cronograma da Jornada.

Referências bibliográficas

Rosa, A.C.S.; Gurgel, A.M.; Friedrich, K. Presença de agrotóxicos em água potável


no Brasil: Parecer técnico do GT de Agrotóxicos da Fiocruz para a Revisão do
Anexo XX da Portaria de Consolidação nº 05, de 28 de setembro de 2017 do
Ministério da Saúde, para o parâmetro “agrotóxicos”. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2020.

GURGEL, Aline Monte; GUEDES, Clenio Azevedo; FRIEDRICH, Karen.


Flexibilização da regulação de agrotóxicos enquanto oportunidade para a
(necro)política brasileira: avanços do agronegócio e retrocessos para a saúde e o
ambiente. Agronegócio em tempos de colapso planetário: abordagens críticas,
[s. l.], v. 57, p. 135-159, 2021. Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/made/article/view/79158. Acesso em: 4 maio 2023.

MICHELOTTI, F.; SIQUEIRA, H. Financeirização das commodities agrícolas e


economia do agronegócio no Brasil: notas sobre suas implicações para o aumento
dos conflitos pela terra. Semestre Económico, v. 22, n. 50, p. 87-106, 1 ene. 2019.

JORNADA DE AGROECOLOGIA, 2020; https://jornadadeagroecologia.org.br/


https://revistas.aba-agroecologia.org.br/cad/article/view/3393/2719
https://repositorio.usp.br/item/003085750
https://revistas.ufpr.br/made/article/view/79158 gurgel 2021
https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/32385/02agrotoxicos.pdf;jsessionid=8AA9
EB1EBFA965A1D17D871BEAFED4C8?sequence=2 agrotoxicos rosa 2020

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