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Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Ciências Agrárias


Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas
Disciplina: Agroecologia (PGA1020-000)
Professores: : Ilyas Siddique & Jucinei Comin
Aluna: Marina Clasen Baumann

Relatório sobre o Workshop de Agricultura Sintrópica com Ernst Götsch, em


Casimiro de Abreu -RJ (12 a 15 de maio de 2017)

1.Caracterização da região visitada

O local escolhido para a realização do Workshop de Agricultura Sintrópica foi a


Fazenda Ecológica São Sebastião, em Casimiro de Abreu, município da Baixada
Litorânea do estado do Rio de Janeiro. A Baixada Litorânea localiza-se em uma
região de clima ameno, com temperatura média anual de 24° C. A atividade turística
tem um importante papel para o desenvolvimento dos municípios da Baixada
Litorânea Fluminense, principalmente pelos atrativos geográficos da região, como
suas praias, e a exuberante vegetação de Mata Atlântica, ainda preservada em algumas
áreas. O município de Casimiro de Abreu possui território com 35% de cobertura de
Mata Atlântica, além de duas bacias hidrográficas importantíssimas para o
abastecimento de água de toda a região. Casimiro de Abreu também abriga duas
Reservas Biológicas Federais, a Reserva Biológica do Poço das Antas e a da União,
habitat natural do mico-leão-dourado, espécie endêmica e ameaçada de extinção
(Prefeitura de Casimiro de Abreu, 2017; CEPERJ, 2017).
Nas atividades práticas do curso, dentre as espécies utilizadas, foram plantadas
arbóreas nativas da Mata Atlântica de ocorrência na região Sudeste e Nordeste do
Brasil, como a leguminosa Araribá (Centrolobium tomentosum Guill. ex Benth.), a
mirtácea Cambucá (Plinia edulis (Vell.) Sobrale) e Jequitibás (Cariniana Casar.).
Além de culturas anuais e perenes adaptadas a climas mais quentes e úmidos, como
na Baixada Fluminense, a exemplo do Cacau, Açaí, Capim-mombaça e Feijão-de-
porco. Entretanto, conforme Götsch, a Agricultura Sintrópica não pode ser encarada
como uma receita, sendo empregadas as mesmas espécies em todos os lugares. Deve-
se, em vez disso, assimilar a lógica do sistema de sucessão florestal, para, a partir daí,
escolher as espécies mais adequadas a cada tipo climático (informação verbal).

2. Definições

2.1. Agroecologia

De acordo com Altieri (2002) a agroecologia é uma disciplina científica que fornece
os princípios ecológicos básicos para estudar, desenhar e manejar agroecossistemas
que sejam produtivos e conservadores dos recursos naturais e que também sejam
culturalmente sensíveis, socialmente justos e economicamente viáveis.
A estratégia da agroecologia é preventiva e não imediatista (ao contrário da
agricultura convencional): busca fechar ciclos, a auto-regulação de pragas e doenças,
o amortecimento de fluxos hídricos (drenagem e retenção eficiente de águas), a
mitigação de extremos microclimáticos, além da conservação in situ da
agrobiodiversidade. Tais princípios estão sempre em equilíbrio, de modo que não há a
sobrevalorização de um em detrimento de outro (informação verbal).
Assim, a agroecologia tem como objetivo criar agroecossistemas que funcionem
como unidades ecológicas, onde os componentes bióticos e abióticos são
interdependentes, de forma que seu funcionamento está relacionado com o fluxo de
energia e com a ciclagem de nutrientes entre suas partes vivas e não vivas.
Diferentemente dos sistemas agrícolas industriais, convencionais, os sistemas
agroecológicos tendem à complexidade. Dessa forma, caracterizam-se por uma
elevada diversidade e alto nível de complexidade, ao contrário das monoculturas. Os
sistemas agroecológicos tendem ao incremento sistemático de recursos como
nutrientes, energia e biodiversidade, o que os torna independentes em relação a
insumos externos tais como fertilizantes/pesticidas/herbicidas. Assim, consistem em
uma solução à crise da agricultura moderna, ao reduzir a dependência vigente em
relação aos onerosos insumos industrializados, além de abrandar os impactos ao meio
ambiente. A aplicação dos princípios da ecologia à produção agrária tende a reverter
os principais danos ambientais do processo predatório vigente de produção:
degradação da terra pela erosão e compactação do solo, redução da matéria orgânica e
da biodiversidade, esgotamento de recursos hídricos, erosão genética dos cultivares,
explosão demográfica e resistência de pragas, dentre outros. Em contraste à
insustentabilidade do modelo produtivo da Revolução Verde, a Agroecologia, através
de uma abordagem sistêmica, busca em seus agroecossistemas o equilíbrio entre os
diferentes âmbitos da sustentabilidade: Ecológico, Sócio-econômico, Cultural,
Político e Ético. Ao priorizar o desenvolvimento de sistemas de produção agrária
integrados e com baixa dependência de insumos externos, nos quais as interações
ecológicas substituem os insumos, mantém-se a fertilidade do solo, a produtividade e
a saúde das culturas. Os principais fatores da agricultura "moderna" que fazem
persistir a crise sócio-ambiental no campo são: a monocultura em larga escala, a
dependência excessiva de maquinário, o endividamento do produtor rural devido aos
altos custos de insumos e maquinário, o controle dos insumos pela indústria agrícola,
bem como a destruição da biodiversidade. Por sua vez, a Agroecologia propõe o
aumento da eficiência energética de seus agroecossistemas, de modo a reduzir a
dependência externa de tecnologia e insumos. Por exemplo, ao tratar o solo como um
organismo vivo e dinâmico, de forma a nutri-lo, e não reduzir o sistema ao vegetal de
interesse, é possível aumentar a oferta e a qualidade biológica dos alimentos, bem
como reduzir seu custo de produção (Fig. 1). A Agroecologia supera o enfoque do
fator limitante, o qual se reduz ao tratamento de sintomas em vez de priorizar a causa
do desequilíbrio ecológico (ALTIERI, 2002; BONILLA, 1992).

Fig. 1. Palhada de capim protegendo o solo, em canteiros consorciados e com diferentes


níveis de ocupação de nichos.

2.2. Agricultura orgânica X Agroecologia

A principal diferença entre a produção orgânica e a agroecológica está na


complexidade e no grau de aprimoramento dos princípios ecológicos seguidos.
Enquanto a agricultura orgânica se reduz à presença ou ausência de agrotóxicos e
fertilizantes químicos, a produção agroecológica se preocupa com questões mais
profundas, de cunho sócio-ambiental, além da saúde humana. A agricultura
agroecológica se caracteriza principalmente por uma produção contínua, regional e
variada, além de buscar o contato direto entre produtor e consumidor. Tem como meta
a segurança alimentar e nutricional, aliada à conservação da natureza. Ou seja, segue
um gradiente de aprimoramento contínuo.
A agricultura orgânica, muitas vezes, baseia-se no discurso simplório da substituição
de insumos, o qual vem ao encontro dos interesses da agricultura industrial. Assim,
não há qualquer movimento no sentido de enfrentar a questão crucial dos modelos
baseados em monoculturas. A simples substituição de insumos não é o suficiente para
conter a erosão da base produtiva agrícola, causada por práticas insustentáveis. Além
disso, não aproveita a integração da diversidade de plantas e animais, que aumenta as
interações complexas e efeitos sinérgicos. Também não é uma solução ao
endividamento dos agricultores de diversas regiões do mundo, pelos preços
exorbitantes dos equipamentos agrícolas e dos insumos, que, embora menos
agressivos, são mais caros. Diferentemente da agricultura orgânica, a agroecologia
visa o abandono da estrutura da monocultura, além de um planejamento integrado dos
agroecossistemas, reduzindo sua vulnerabilidade. Além disso, a agroecologia permite
a recuperação de solos e de sistemas degradados (ALTIERI, 2002).

2.3. Sistemas Agroflorestais

De acordo com o ICRAF (Centro Internacional de Investigação Agroflorestal), um


Sistema agroflorestal consiste em um sistema sustentável de manejo do solo e das
plantas que procura aumentar a produção de forma contínua, combinando a produção
de árvores (frutíferas e outras) com espécies agrícolas e/ou animais, simultaneamente
ou sequencialmente, na mesma área, utilizando práticas de manejo compatíveis com a
cultura da população local. A maioria do sistemas agroflorestais busca a otimização
das interações entre os componentes arbóreos, agrícolas e animais, a fim de obter uma
produção satisfatória com baixo uso de insumos. Ao utilizar os ecossistemas naturais
como modelos e ao aplicar suas características ecológicas aos sistemas produtivos, é
esperado que se mantenha a produtividade a longo prazo sem degradar a terra
(ALTIERI, 2002).
Tal sistema permite colheitas desde o primeiro ano de sua implantação, assim o
agricultor obtém rendimentos proveniente de culturas anuais, hortaliças e frutíferas de
ciclo curto, enquanto aguarda a maturação das espécies florestais e das frutíferas de
ciclo mais longo (Fig. 2). Assim, há um incremento na renda e um melhor
aproveitamento da mão-de-obra familiar, já que há um maior número de itens
disponíveis para comercialização em diferentes épocas do ano e ao longo do tempo
(ARMANDO et al., 2002).
O emprego de sistemas agroflorestais como meio de subsistência e fonte de renda
para os agricultores familiares, atores fundamentais no abastecimento de alimentos do
mercado interno, torna-se uma alternativa bastante interessante, já que reúne
vantagens econômicas e ambientais. Os agricultores familiares, embora representem
uma significativa parcela na produção nacional, carecem de sistemas de produção
condizentes à sua capacidade de investimento, ao tamanho de suas propriedades e ao
tipo de mão-de-obra empregada (ARMANDO et al., 2002).
Dessa forma, a agrofloresta ou Sistema Agroflorestal (SAF), ao utilizar
sustentavelmente os recursos naturais e depender de forma bem menos intensa de
insumos externos, consiste em uma ferramenta de empoderamento social, além de
possibilitar a soberania e segurança alimentar e nutricional, tanto para agricultores
como para consumidores.

Fig. 2. Eucaliptos plantados em consórcio com frutíferas e mandioca, a fim de fornecer


suprimento constante de matéria orgânica, através de sua poda frequente.

2.4. Agricultura sintrópica

O termo "sintropia", ao contrário de entropia (do grego: en [de dentro] + tropē


[transformação]), significa algo que segue do simples em direção à complexificação,
opõe-se à perda energética e à desorganização. Ou seja, refere-se a um sistema que
visa a concentração e otimização de energia (ANDRADE et al., 2017).
A Agricultura sintrópica, termo cunhado por Ernst Götsch, consiste em um sistema de
uso da terra, voltado tanto para a produção sustentável de alimentos diversos quanto
para a recuperação do solo. Tal prática foi associada ao conceito de agrofloresta, já
que Götsch incorpora árvores em seus projetos, por ser um elemento sempre presente
nos trópicos. Pesquisadores do tema, como Joaquim Milz, Fabiana Peneireiro, Patrícia
Vaz e Henrique Souza, usam o conceito de agrofloresta sucessional para caracterizar o
referido sistema (ANDRADE et al., 2017).
A recuperação de áreas degradadas através da inclusão humana é uma das funções da
Agricultura sintrópica. Abraça o conceito de Land sharing, o qual, ao aliar
conservação e produtividade, é gerador de multifuncionalidades econômicas, sociais e
ambientais. Como resultado dessa prática agrícola, são estabelecidas áreas altamente
produtivas, tanto em quantidade e variedade quanto em qualidade nutricional. Além
disso, a riqueza biológica proporcionada, aliada à mínima utilização de insumos
externos, leva à oferta de serviços ecossistêmicos, como a formação e recuperação de
solo, regulação do microclima e aporte de água para o sistema (ANDRADE et al.,
2017).
Sua prática baseia-se na observação de elementos como: a ecofisiologia das plantas
(taxa de fotossíntese, biomassa, necessidade hídrica, etc); seu estrato (baixo, médio,
alto ou emergente); e seu momento de entrada no processo de sucessão ecológica
(pioneira, secundária ou climácica). Assim, o plantio segue a lógica da sucessão
natural. Trata-se de uma agricultura baseada em processos e não em insumos.
A incorporação, no espaço e no tempo, de cada indivíduo no sistema está relacionada
às funções básicas que cumpre no processo de sucessão natural. Götsch identifica 3
sistemas principais, subsequentes, no processo de sucessão, em um crescente de
quantidade e qualidade de vida consolidada: Placenta (ou Sistema dos
Colonizadores), Acumulação e Abundância. O sistema de Placenta representa o
primeiro estágio (a partir do "tempo zero"), quando ainda não há a ocorrência
significativa de animais. Seus elementos têm como meta a ocupação do solo,
promovendo condições para o estabelecimento de formas de vida mais complexas. Na
sequência, o sistema de Acumulação é caracterizado pala complexificação e
acumulação de quantidade e diversidade de vida vegetal, animal, fúngica e bacteriana,
a fim de atingir o "ótimo" de produção primária. As plantas estabelecidas apresentam
uma alta relação C/N. Além disso, há a presença dos primeiros animais
"otimizadores", como os polinizadores (insetos e morcegos) e dispersores de sementes
(pássaros). Por último, no sistema de Abundância, há a manutenção do "ótimo"
alcançado, em qualidade e quantidade de vida. As plantas, nesse sistema, se
caracterizam por uma relação C/N cada vez menor. Em relação aos animais, há um
aumento gradativo em seu tamanho e número, estando presentes animais de grande
porte4.
No workshop de Agricultura sintrópica, foi iniciado o plantio em uma área vazia, de
solo relativamente degradado. Antes da semeadura, é investido um tempo
considerável no preparo adequado dos canteiros (Fig. 3), sendo cobertos e elevados
com matéria orgânica (Fig. 4) proveniente da poda de árvores (Fig. 5) e
processamento em triturador (Fig. 6).
Quanto à escolha das espécies a serem plantadas, são selecionadas como pioneiras
principalmente herbáceas de folhas largas, a fim de exercer a função de placenta no
sistema inicial. As verduras são os primeiros elementos a despontar no sistema:
rúcula, alface e tomate. Tais cultivares são enquadrados no grupo funcional "placenta
I", por apresentarem um ciclo mais curto de vida (de 1 a 4 meses). Em seguida,
desenvolvem-se as raízes (batata-doce e mandioca), no grupo funcional "placenta II",
apresentando um ciclo de vida de 5 meses a 1 ano e meio. A batata-doce e a mandioca
foram selecionadas nesse estágio, devido a sua capacidade de recuperação do solo,
promovendo sua descompactação. Além disso, planta-se nos canteiros feijão-de-
porco, como elemento fixador de nitrogênio. Simultaneamente à semeadura das
verduras, semeia-se na mesma leira o capim (mombaça ou tanzânia, por sua elevada
taxa de fotossíntese e produção primária). Tal elemento savânico atua como
complemento para o estrato baixo do sistema inicial, poupando trabalho de capina
seletiva, já que inibe a ocupação do estrato por outras plantas oportunistas; e
promovendo economia de água, já que mantém a umidade no solo (Fig. 7). Mais
tarde, o capim será podado para servir de cobertura (palhada). Findados os ciclos das
plantas que atuaram como placenta, as bananeiras passam a ocupar o estrato médio.
Futuramente, as árvores plantadas, que ainda ocupam o estrato baixo, ocuparão os
estratos médio, alto e emergente.

Fig. 3. Preparo dos canteiros para plantio: terra "afofada" com enxada, incorporação de
raízes superficiais ao canteiro, laterais cobertas com matéria vegetal triturada ou palhada e
"berços" preparados com a mesma matéria orgânica para receber as sementes.

Fig.4. Processo de cobertura dos canteiros com matéria vegetal triturada e palhada de
capim.

Fig. 5. A poda constante de árvores, um dos princípios mais importantes da Agricultura


sintrópica, gera matéria orgânica, que é incorporada ao solo, mantendo-o sempre saudável.

Fig. 6. O triturador é uma das poucas máquinas utilizadas no sistema de Agricultura


sintrópica. Tal equipamento é fundamental para um aproveitamento mais eficiente da
matéria orgânica pelas plantas, já que particulariza os galhos podados.
Fig. 7. Ocupação diferencial dos estratos: capim mombaça com hortaliças, mandioca e
frutíferas. Na cobertura do solo: poda de capim.

O discurso de Götsch baseia-se principalmente em suas observações de anos de


experimentação em campo (entretanto sem o emprego de uma metodologia
científica), em evidências anedóticas, e nas constatações do agricultor e
microbiologista japonês Masanobu Fukuoka. Dessa forma, a Agricultura sintrópica
está fortemente embasada na Agricultura natural, descrita por Fukuoka na década de
70. Em sua Agricultura natural, ociosa ou do "nada fazer", Fukuoka traz à tona o
mecanismo da sucessão natural e a importância da cobertura do solo na prática
agrícola. Assim, propõe um mecanismo de autofertilização e de autocultivo. No
Japão, Fukuoka cultivava arroz e gramíneas de frio seguindo essa lógica, utilizando o
mesmo campo por muitos anos sem reduzir a fertilidade do solo. Em meio às plantas
de arroz já crescidas, Fukuoka realizava a semeadura manual de sementes de trevo.
Pouco tempo depois, fazia a semeadura de centeio e cevada no arrozal. Quando o
arroz estava pronto para ser colhido, ele fazia a ceifa, a debulha e espalhava a palha
pelo campo. A essa altura, o trevo já estava bem desenvolvido, ajudando a sufocar
ervas daninhas e a fixar nitrogênio no solo. Através do emaranhado de trevo e palha, o
centeio e a cevada surgiam. Pouco antes de fazer a ceifa da cevada e do centeio, o
processo era repetido, semeando o arroz para dar início ao seu crescimento protegido.
Assim, no mecanismo de Fukuoka, a palha e o trevo fazem seu trabalho, substituindo
a necessidade de carpir e fertilizar o solo que os sistemas convencionais demandam
(FUKUOKA, 1975).
Inspirado em Fukuoka, Götsch recria uma "Agricultura natural" adaptada aos
trópicos. Nesse sentido, a Agricultura sintrópica parece ser uma fusão entre a
Agricultura natural de Fukuoka e os sistemas agroflorestais agroecológicos. Em vez
da revolução de uma palha de arroz, Götsch usa a palha do capim como diferencial.
Todavia, não há qualquer discussão, no meio da agricultura sintrópica, sobre a
viabilidade legal de sua prática no Brasil. Também não há qualquer esforço, entre seus
atores, no sentido de pressionar uma possível mudança na legislação, a fim de tornar
viável a prática desse sistema com espécies nativas. Quando questionado sobre
entraves legais, Götsch recomenda a substituição de espécies nativas por exóticas na
prática da agricultura sintrópica, a fim de evitar problemas com o IBAMA, ao cortar e
podar as árvores. O que não é uma solução razoável em termos ecológicos, devido ao
potencial invasor de algumas espécies exóticas de utilidade econômica, e à falta de
estudos em relação ao impacto da introdução dessas espécies exóticas nos diferentes
biomas brasileiros.
Dessa forma, a fim de evitar conflitos com a insuficiente legislação ambiental
brasileira, os sistemas sintrópicos implantados têm como enfoque apenas a produção
de verduras e frutíferas. A principal fonte de matéria orgânica para o solo, nessa forma
de agricultura sintrópica, são as podas constantes e o corte de eucaliptos plantados
junto às culturas, mesmo diante de diversos estudos constatando efeitos alelopáticos
do eucalipto sobre outras plantas, além de intensa atividade antifúngica conforme
testado por Bajwa (2005).
A exploração madeireira no sistema sintrópico, por mais consciente e sustentável que
seja a proposta, ao praticar o constante reflorestamento de espécies nativas, ainda não
é uma opção real, já que a supressão de uma árvore nativa pode configurar crime
ambiental. Enquanto permanecerem legisladores desprovidos de qualquer
conhecimento ecológico, os sistemas agroflorestais, bem como os conhecimentos
ecológicos tradicionais, continuarão criminalizados. Nesse cenário, prosperam
impunes as monoculturas de Pinus e Eucalyptus.

3. Conversão X Transição

São inúmeros os fatores que motivam a transição agroecológica: crise ambiental,


energética, alimentar e sócio-política-ambiental.
De acordo com Gliessman & Rosemeyer (2010), a conversão para uma agricultura
sustentável envolve uma série de princípios, processos e práticas, as quais orientam a
transição agroecológica, até a eventual conversão. Tais autores propuseram diferentes
níveis a serem seguidos rumo à conversão agroecológica. Primeiramente, sugerem o
aumento da eficiência das práticas agrícolas, com o aumento da eficiência do
maquinário utilizado, e redução do uso de pesticidas e herbicidas, condicionado a
necessidades urgentes em vez da prática de aplicações preventivas. Em seguida, é
aconselhada a substituição de insumos e de práticas convencionais por alternativas,
como o sistema "empurre-puxe" (baseado no plantio, junto às culturas de interesse, de
plantas repelentes e atrativas, simultaneamente), plantio de espécies fixadoras de
nitrogênio, cultivos de cobertura, emprego de controle biológico de pragas, dentre
outros. O passo seguinte, a partir do qual a agricultura passa a adotar uma estratégia
preventiva, em vez de imediatista, é o redesenho do agroecossistema. Para isso, é
necessário, principalmente, o planejamento hidrológico da paisagem, o aumento da
diversidade funcional no plantio, e a ocupação mais eficiente de nichos, de forma que
as plantas cultivadas ocupem todos os nichos disponíveis, sem condições para a
entrada de espontâneas competidoras. O passo seguinte, consiste em estabelecer
vínculos diretos entre produtores e consumidores, principalmente através de feiras de
produtores e/ou propostas de CSAs (Agricultura sustentada pela Comunidade) ou
seja, redes alimentares alternativas.

Referências Bibliográficas

ALTIERI, Miguel. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável.


Guaíba: Editora Agropecuária, 2002. 592 p.

ANDRADE, Dayana; GÖTSCH, Ernst; PASINI, Felipe. Sintropia: Universo de


Conceitos. AGENDA GÖTSCH. Disponível em: <http://agendagotsch.com/pt/
syntropy >. Acesso em: 10 de junho de 2017.

ARMANDO, Marcio Silveira et al. Agrofloresta para Agricultura Familiar. Circular


Técnica Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Brasília, v. 1, n. 16, p.1-11,
dez. 2002. Disponível em: <http://www.agrisustentavel.com/doc/agrofloresta.pdf>.
Acesso em: 23 maio 2017.

BAJWA, Rukhsana. Antifungal activity of allelopathic plant extracts VI: In vitro


control of fungalpathogens by aqueous leaf extracts of Eucalyptus. Journal of
mycology & phytopathology, 3: 7-12, 2005.

BONILLA, José. A. Fundamentos da agricultura ecológica: sobrevivência e


qualidade de vida. São Paulo: Nobel, 1992. 259 p.
Centro de Estatísticas, Estudos e Pesquisas do Estado do Rio de Janeiro (CEPERJ).
Estado do Rio de Janeiro e Regiões de Governo. Disponível em <http://
www.ceperj.rj.gov.br/ceep/info_territorios/divis_regional.html>. Acesso em 20 de
maio de 2017.

FUKUOKA, Masanobu. A revolução de uma palha - Uma introdução à agricultura


selvagem. Editora: Via Optima. 2001. 208p.

GLIESSMAN, Stephen R.; ROSEMEYER, Martha. The conversion to sustainable


agriculture: principles, processes, and practices. CRC Press, Taylor & Francis Group.
2010. 352p.

Prefeitura de Casimiro de Abreu. Casimiro de Abreu: Visão Geral. Disponível em


<http://www.casimirodeabreu.rj.gov.br/home/visao-geral>. Acesso em 20 de maio de
2017.

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