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Pré-Modernismo
A fase de transição literária do século XX porque os recursos literários e culturais estavam
ainda a ser aproveitados. Temos testemunhas inovadoras (que nem sempre foram aceites
pela crítica e só mais tarde foram avaliadas e bem consideradas).
Os movimentos culturais e correntes literárias mais importantes do passado que eram
importantes no início do século 90: naturalismo (expressão do positivismo), realismo e
xsimbolismo. Autores dessa época produziam obras (“Cortiço”, “Ateneu”)
1888- abolição da escravidão pela filha do imperador Pedro II dando sequência ao golpe de
estado que tornou o império do Brasil uma república.
Contexto histórico
Fim do século XIX:
● início da “República do café-com-leite”, na qual os grandes proprietários rurais
exerciam enorme influência.
● urbanização ainda incipiente, dava sinais de crescimento na capital e em São Paulo.
● Conflito entre os “dois Brasis”: o tradicionalismo agrário, hegemónico vs as
ideologias progressistas, a urbanização, a imigração, o crescimento industrial e as
revoltas sociais que o questionam
- Guerra de Canudo (Bahia, 1896-1897)
- Revolta da Vacina (Rio de Janeiro, 1904)
- Revolta da Chibata (Rio de Janeiro, 1910)
- Sedição de Juazeiro (Ceará, 1911-1914)
- Revolta de Contestado (Santa Catarina, 1912-1916)
- As duas greves gerais de operários (São Paulo, 1917-1919)
● Ciclo da borracha desloca para o norte a riqueza do país
● Algumas regiões prosperavam em meio ao atraso irremediável de outras
● Revolta de Canudos, na Bahia; a série de conflitos no Ceará em torno do religioso
Padre Cícero; e o cangaço
● A capital, Rio de Janeiro, vivia os seus problemas sociais.
● Revolta da Vacina - uma rebelião popular contra a vacinação obrigatória
Estética
● Não se pode dizer que o pré modernismo constitui-se uma escola literária em si
● É, em verdade, um conjunto de manifestações do espírito de uma época, que
apresentava o novo, rompia com o velho, mas ainda não possuía um ramo certo ou
uma clara intenção estética
● O planeamento urbano do prefeito Pereira Passos. O Rio de Janeiro inspirado em
Paris.
● O final do século XIX e início do século XX é um tempo de prosperidade dos
livreiros, época do crescimento do mercado editorial no país
● Os autores dessa época são influenciados principalmente pelo realismo.
● Os escritores românticos, parnasianos e simbolistas ainda publicavam os seus
livros.
● Esses novos autores demonstram um grande interesse pela realidade nacional
● O dia a dia do país passa a ser tema das páginas dos livros, dando espaço à criação
de obras de clara preocupação social
● Os tipos marginalizados, as lutas inglórias e as mazelas do povo passam a ser os
temas da prosa pré-modernista.
● A aproximação com a realidade brasileira traz como consequência formal a busca
por uma linguagem mais simples, mais direta, coloquial, próxima da população.
● Os textos apresentam linguagem jornalística, aproximando-se, por vezes, mais da
realidade que de um estilo artístico propriamente dito.
Euclides da Cunha
● Positivista e republicano
● Cobriu como jornalista a Revolta de Canudos
● Carácter cientificista
● Descrição de Canudos: o homem, a terra e a luta
● Morreu assassinado na “Tragédia da Piedade”
Lima Barreto
● Vítima de preconceito racial
● Militante socialista
● Defende os direitos femininos
● Denúncia das desigualdades e preconceitos
● Ridicularização dos políticos e da classe média
● Descrição dos subúrbios e de personagens marginais do Rio de Janeiro
Monteiro Lobato
● Polémico colunista de jornal
● Moralista e conservador
● Nacionalista
● Crítico do atraso do país
● Defensor do progresso material e cultural do povo
● Estilo literário sem grandes inovações
● Inaugura a literatura infantil nacional
● Crítico da arte modernista
● Autêntico influencer deste tempo, teve inúmeros papéis na vida social da região de
São Paulo
● Da Engenharia à Literatura
Em São José do Rio Pardo (SP), Euclides da Cunha é incumbido a reconstruir uma ponte.
Segue a sua carreira de chefe do Distrito de Obras Públicas em São Paulo entre 1901 e
meados de 1903. Em cinco anos escreve, “nos raros intervalos de folga de uma carreira
fatigante”, “Os Sertões: campanha de Canudos”, publicando-a em 1902.
Em agosto de 1904, Euclides foi nomeado chefe da comissão mista brasileiro-peruana de
reconhecimento do Alto Purus, com o objetivo de cooperar para a demarcação de limites
entre o Brasil e o Peru. Esta experiência resultou em sua obra póstuma À Margem da
História, onde denunciou a exploração dos seringueiros na floresta.
Visando a uma vida mais estável, o que se mostrava impossível na carreira de engenheiro,
Euclides prestou concurso para assumir a cadeira de Lógica do Colégio Pedro II. Desse
concurso sai vencedor.
Foi eleito a 21 de setembro de 1903 para a cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras e
recebido a 18 de dezembro de 1906 pelo académico Silvio Romero.
● António Conselheiro
Figura que, para as povoações da bacia do Rio de São Francisco é um profeta, um ponto
de referência numa região negligenciada pelo poder central. O conflito é o resultado das
condições geográficas e do elemento humano presente na região: em outubro de 1896
ocorre o episódio que desencadeia a Guerra de Canudos.
António Conselheiro havia encomendado uma remessa de madeira, vinda de Juazeiro, para
a construção da igreja nova, mas a madeira não foi entregue, apesar de ter sido paga.
Os grandes fazendeiros da região, unindo-se à Igreja, iniciaram um forte grupo de pressão
junto à República recém-instaurada, pedindo que fossem tomadas providências contra
António Conselheiro e seus seguidores. Criaram-se rumores de que Canudos se armava
para atacar cidades vizinhas e partir em direção à capital para depor o governo republicano
e reinstalar a Monarquia.
Apesar de não haver nenhuma prova para estes rumores, o Exército foi mandado para
Canudos.
● Epílogo
Três expedições militares contra Canudos saíram derrotadas o que apavorou a opinião
pública, que acabou por exigir a destruição do arraial, dando legitimidade ao massacre de
até vinte mil sertanejos. Além disso, estima-se que cinco mil militares tenham morrido. A
guerra terminou com a destruição total de Canudos, a degola de muitos prisioneiros de
guerra e o incêndio de todas as casas do arraial.
● Os Sertões
Euclides da Cunha é jornalista de A Província de São Paulo. Em causa subsiste um
preconceito para com um tipo de povo que até o conflito era considerado uma sub-raça: o
povo do sertão. O eixo forte é o entre o Rio e São Paulo, até ao norte (nordeste atual do
país), antigo centro político da colónia.
Enquanto enviado do jornal, Euclides apercebe-se da existência, não apenas de um Brasil
Litorâneo (Rio e São Paulo até o nordeste), mas também de um Brasil ignoto, o do Sertão,
da caatinga, das secas. O primeiro olhar (imagiologia) é o de um letrado positivista
(determinismo). A influência determinista condiciona a redação do texto literário. Tendo
como o meio “A terra”, o lado antropológico “o Homem”, e o contexto “a luta”, Euclides da
Cunha reconhece a fraqueza logística dos sertanejos mas reconhece-lhes a valentia e a
bravura.
- A Terra
A Terra abre com uma descrição do planalto brasileiro. É uma descrição exaustiva do
território, da flora e de aspetos climáticos. A região é historicamente caracterizada por
latifúndios improdutivos, secas cíclicas e desemprego crónico, passando, por isso, por uma
grave crise económica e social.
- O Homem
Euclides da Cunha fala da formação racial do sertanejo e dos males da mestiçagem. “De
sorte que o mestiço - traço de união entre as raças, breve existência individual em que se
comprimem esforços seculares - é, quase sempre, um desequilibrado." (Cap. II, “um
parêntesis irritante”)
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços
neurastênicos o litoral. A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o
contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempenho, a estrutura corretíssima das
organizações atléticas. É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete
no aspeto a fealdade típica dos fracos.” (Cap.III).
O autor estabelece uma comparação antitética entre o vaqueiro sertanejo e o gaúcho. Este
é mostrado em correrias a cavalo pela planície, com as suas roupas garridas (“traje de
festa”), o seu gosto explícito pela vida, tendo o trabalho como diversão. Aventureiro,
valente, desconhece a miséria e a luta contra a terra árida. O sertanejo, no entanto, apesar
de todas as adversidades (e por isso) é mais tenaz e resistente do que o gaúcho, o jagunço
é mais perigoso, mais forte, mais duro”. Está acostumado a confrontos obscuros e longos,
sem a teatralidade heróica dos gaúchos. “Calcula friamente o pugilato”. É capaz de recuar e
esperar o seu inimigo “oculto no sombreado das tocaias, dominado por um ódio
inextinguível…”, ao contrário do gaúcho.
- A luta
A primeira expedição - cem homens, comandados pelo tenente Pires Peneira, são
surpreendidos e derrotados pelos jagunços no povoado de Uauá.
A segunda expedição - quinhentos homens, comandados pelo major Febrônio de Brito e
organizados em colunas maciças, são emboscados pelos jagunços em terrenos
acidentados, no Morro do Cambaio e em Tabuleirinhos.
A terceira expedição - mil e trezentos homens, comandados pelo coronel Moreira César,
armados com canhões sem planos definidos, partiram em fevereiro de 1897, atacando de
frente, do Morro da Favela, o arraial de Canudos.
A quarta expedição contou com cinco mil homens, comandados pelos generais Artur Oscar,
João da Silva Barbosa e Cláudio Savaget, são enviados pelo sul.
Em agosto de 1897, oito mil homens deslocam-se para a região, comandados pelo próprio
ministro da Guerra, o marechal Carlos Bittencourt.
São cortadas as saídas de canudos, o abastecimento de água é interrompido. Um tiro de
canhão atinge a torre da igreja. À espera da salvação eterna, os sertanejos não se
renderam, e muitos foram degolados após o assalto final.
“Os combatentes contemplavam-nos entristecidos. Surpreendiam-se; comoviam-se. O
arraial, in extremis, punha-lhes adiante, naquele armistício transitório, uma legião
desarmada, mutilada, faminta e claudicante, num assalto mais duro que o das trincheiras
em fogo. Custava-lhes admitir que toda aquela gente inútil e frágil saísse tão
numerosa ainda dos casebres bombardeados durante três meses.
Contemplando-lhes os rostos baços, os arcabouços esmirrados e sujos, cujos
molambos em tiras não encobriam lanhos, escaras e escalavros - a vitória tão
longamente apetecida decaía de súbito. Envergonhava. Era, com efeito,
contraproducente compensação a tão luxuosos gastos de combates, de reveses e de
milhares de vidas, o apresamento daquela caqueirada humana - do mesmo passo
angulhenta e sinistra, entre trágica e imunda, passando-lhes pelos olhos, num longo enxurro
de carcaças e molambos…” (cap. V Prisioneiros).
● O Cadáver do Conselheiro
Antes, no amanhecer daquele dia, comissão adrede escolhida descobrira o cadáver de
António Conselheiro.
Jazia num dos casebres anexos à latada, e foi encontrado graças à indicação de um
prisioneiro. Removida breve camada de terra, apareceu no triste sudário de um lençol
imundo, em que mãos piedosas haviam desparzido algumas flores, murchas, e repousando
sobre uma esteira velha, de tábua, o corpo do “famigerado e bárbaro” agitador. Envolto no
velho hábito azul de brim americano, mãos cruzadas ao peito, rosto tumefato, e esquálido,
olhos fundos cheios de terra - mal o reconheceram os que mais de perto o haviam tratado
durante a vida.
Desenterraram-no cuidadosamente. Dádiva preciosa - único prémio, únicos despojos
oprimos de tal guerra! - fazias-me mister os máximos resguardos para que não se
desarticulasse ou deformasse, reduzindo-se a uma massa angulhenta de tecidos
decompostos.
Fotografaram-no depois. E lavrou-se uma ata rigorosa firmando a sua identidade: importava
que o país se convencesse bem de que estava, afinal, extinto aquele terribilíssimo
antagonista.
Restituíram-no à cova. Porém, pensaram depois em guardar a sua cabeça, tantas vezes
maldita em como fora malbaratar o tempo exumando-o de novo, uma faca jeitosamente
brandida, naquela mesma atitude, cortou-lha; e a face horrenda, empastada de escaras e
de sânie, apareceu ainda mais uma vez ante aqueles triunfadores…
Trouxeram depois para o litoral, onde deliravam multidões em festa, aquele crânio.
Que a ciência dissesse a última palavra. Ali estavam, no relevo de circunvoluções
expressivas, as linhas essenciais de crime e da loucura…
● Comentário
Aquela campanha lembra um refluxo para o passado. E foi, na significação integral da
palavra, um crime. Denunciemo-lo.
● Canaã
Estruturado em torno dos eventos referentes à colonização alemã no atual Sudeste do
Brasil, Graça Aranha construiu em Canaã um romance de tese.
Revela ainda um compromisso com os temas e a estética configurados pelo Realismo e
pelo Naturalismo, correntes literárias que começavam a perder a sua presença hegemónica
nos inícios do século XX.
Em 1890, nomeado juiz municipal para o Porto do Cachoeiro, no estado de Espírito Santo,
Graça Aranha conheceu in loco a região que serviria de cenário e possibilitaria
transformar-se em inspiração para a concepção e a realização do seu romance.
Já nas primeiras linhas, o autor apresenta o protagonista e o espaço em que se desenrolará
a narração.
Foca o fenómeno da colonização alemã no estado de Espírito Santo na bacia do Rio Doce,
na região de Porto do Cachoeiro (atual Santa Leopoldina) e Queimado.
● Personagens principais
Milkau e von Lentz, dois jovens colonos alemães de extração social e de ideologias
diferentes: Milkau é visionário e confiante: quer viver no Brasil a sua vida, enquanto von
Lentz é de ascendência nobre e olha com saudade para os hábitos da Europa central.
“Milkau cavalgava molemente o cansado cavalo que alugara para ir do Queimado à cidade
do Porto do Cachoeiro, no Espírito Santo. Os seus olhos de imigrante pasciam na doce
redondeza do panorama. Nessa região a terra exprime uma harmonia perfeita no conjunto
das coisas”.
Enquanto Milkau acredita na humanidade e pensa encontrar no Brasil a sua própria Canaã,
“a terra prometida”, von Lentz acha a civilização germânica superior, ficando orgulhoso da
capacidade dos colonos alemães em dominar os mestiços. Para ele, a mistura gera uma
cultura inferior, uma civilização de mulatos que serão sempre escravos e viverão na
desordem moral e social.
Milkau afirma que aquilo que procurava era uma vida simples em meio à gente simples,
matando o ódio e esquecendo a dor.
Milkau, esse alterego do narrador identifica-se com o sentimento nacionalista e defende
com simpatia a propalada afabilidade brasileira; as digressões filosóficas de Milkau são
endossadas pelo romancista, que não deixa de apontar as falhas e os erros na abertura dos
caminhos para a independência económica e espiritual do Brasil.
Maria Perutz, filha de emigrantes alemães, que trabalha para a família Kraus, é seduzida
pelo filho do patrão. Após muitas vicissitudes, dá à luz um bebé no mato do cafezal, onde a
criança é devorada por porcos. Maria, acusado de matar o seu filho, é presa e resgatada
por Milkau, que foge com ela para a sua Canaã, a terra prometida, em busca da liberdade.
“E agora eles se precipitavam numa campina suavemente esclarecida pela noite
maravilhosa e límpida. Corriam, corriam… atrás de si, ouvia ela a voz de Milkau, vibrando
como a modulação de um hino… - Adiante… Adiante… não pares. Eu vejo. Canaã! Canaã!”
Uma abordagem estilística do texto de Canaã mostraria que, em dois momentos, Graça
Aranha transpõe as frágeis fronteiras da prosa e se deixa levar pelo livre fluxo da poesia: o
primeiro, quando Maria, em fuga pela mata, adormece e é envolta por centenas de
vaga-lumes. É uma descrição que, pela fosforescência das metáforas visuais, pintalgadas
pelo pincel do autor, lembra o estilo simbolista de coloridos efeitos sensoriais.
Temas como opressão feminina, imperialismo germânico, militarismo, corrupção dos
administradores públicos, ostracismo, conflito de adaptação à nova terra são tratados nesse
romance.
No debate ideológico entre Milkau e Lentz, o carácter e o nível de civilização dos dois povos
(o alemão e o brasileiro) são também enfocados e dissecados pelo romancista de Canaã.
Rebelando-se contra a submissão cultural ao estrangeiro, mais tarde a teoria antropofágica
do Modernismo abrirá caminho para a construção de novas posições ideológicas relativas à
compreensão e à interpretação da identidade brasileira.
● Canaã e Os Sertões
Publicados em 1902, Canaã e Os Sertões de Euclides da Cunha guardam alguma
semelhança no empenho dos seus autores em retratar não apenas ficcionalmente, mas de
modo documental, acontecimentos que revelam com nitidez o retrato do chamado Brasil
profundo. Graça Aranha e Euclides da Cunha escrevem como testemunhas oculares dos
fatos por eles narrados; o primeiro enriqueceu ficcionalmente a sua prosa com o sopro
criativo da imaginação, em que a realidade social e histórica, aliada à fantasia, constrói um
híbrido universo narrativo.
Como juiz municipal de Cachoeiro, Graça Aranha magnífica a realidade por ele vivida com o
seu talento de novelista, quando soube denunciar, em alguns dos seus personagens, os
desvios de conduta, os procedimentos incivilizados e os abusos das autoridades no
revoltante trato com os colonos. Canaã apresenta memoráveis descrições da natureza
brasileira ainda em estado quase selvagem.
Trata-se de um poeta poderoso que deve ser mensurado por um critério estético
extremamente aberto que possa reconhecer, além do "mau gosto" de um vocabulário
rebuscado e científico, a dimensão cósmica e a angústia moral da sua poesia. Dimensão
cósmica: Augusto dos Anjos centrava todas as energias do universo que se teriam
encaminhado para a construção desse mistério constituído pelo EU. O materialismo
evolucionista de Ernst Haeckel [biólogo, naturalista, filósofo, médico, professor e artista
alemão que ajudou a popularizar o trabalho de Charles Darwin e um dos grandes expoentes
do cientificismo positivista).
Comentários aos sonetos “Ao meu primeiro filho nascido morto com 7 meses
incompletos” e “O lamento das coisas”
Quanto à situação cultural, a mera inserção do poeta quer no parnasianismo, quer no
simbolismo, revela-se inadequada: Augusto dos Anjos é um romântico Lato Sensu, como
romântico é todo naturalista que busca dramaticamente o infinito na matéria e romântica e
fatal insatisfação por não o achar. Como Baudelaire, canta a miséria da carne em
putrefação, sem a mesma convicção estética amadurecida do poeta francês, nem por outro
lado, complacência satanista.
Para o poeta do Eu, as forças da matéria que pulsam em todos os seres e em particular no
homem conduzem ao Mal e ao Nadam através de uma destruição implacável. E ele é o
espetados em agonia desse processo degenerescente cujo símbolo é o verme.
● Enredo
Ambiente: Rio de Janeiro, no ano de 1893 (Revolta da Armada)
Policarpo Quaresma é funcionário público patriota (Ufanismo) e trabalha no arsenal.
Comprou a patente major: é o Major Quaresma mas é subsecretário do Arsenal de Guerra.
Mora com D. Adelaide, irmã dele.
Devido ao seu fatalismo patriótico é incompreendido e até ridicularizado. Pretende
demonstrar que a primazia do Brasil reside na cultura, pretende aprender a tocar o violão
(atividade social dos marginais) e as modinhas com o professor Ricardo Coração dos
Outros, descobrindo que quase todas as modinhas brasileiras eram importadas, portanto
troca o violão para aprendizagem dos instrumentos nativos.
Nos preparativos para a festa do vizinho General Albernaz, recebe a visita do compadre
dele Vicente Coleoni e da afilhada Olga.
Policarpo é considerado um excêntrico: envia uma carta ao Parlamento para a adoção da
língua tupi-Guarani em lugar do português, pois a língua indígena é bem brasileira. Um seu
ofício redigido em tupi-Guarani vai para o ministro da guerra. Policarpo é demitido,
aposentado e enviado para o hospício.
Policarpo Quaresma convence-se de que é preciso salvar o Brasil, não pela cultura mas sim
pela agricultura. Por isso compra a Chácara Sossego no interior, com a convicção da terra
do Brasil ser a melhor do mundo. Policarpo escreve um tratado sobre agricultura, no entanto
o projeto vai à falência por causa de três inimigos:
1. o clientelismo político
2. a inconsistência do sistema agrário brasileiro
3. as saúvas e as térmites que dão cabo das plantações de milho e feijão
● Considerações
A mudança que se opera em Policarpo - da alienação ufanista à consciência real do país -
constitui o cerne da narrativa. A sua visão final leva-o a analisar corrosivamente as
mitologias dos grupos dirigentes e as mistificações de que fora vítima. Quando compreende
o papado da ideologia no processo histórico, precisa de morrer.
O sistema tem as suas defesas, sabe como extirpar os hereges e Lima Barreto não dá
esperanças ao anti-herói que criou mas ao término do relato, a jovem Olga apresenta uma
perspetiva de futuro. A afilhada do burocrata sabe que, apesar de tudo, a História não para.
Pela primeira vez na ficção brasileira, uma mulher entende o fluir social.
No Rio de Janeiro do início do século XX, Lima Barreto produziu uma literatura inteiramente
desvinculada do padrão e do gosto vigentes. De forma consciente, o escritor abandona os
delírios
gregos e os deuses olímpicos dos literatos da época para revelar sobretudo a tristeza dos
subúrbios e sua gente humilde: funcionários públicos aposentados, jornalistas pobretões,
tocadores de violão, meninas sonhadoras, etc.
Além disso, e como negação da época impregna sua obra de uma justa preocupação com
os fatos históricos e com os costumes sociais, tornando-se uma espécie de cronista
apaixonado da antiga capital federal, seguindo a linha aberta
por Manuel Antônio de Almeida, sessenta anos antes.
Poucos aceitaram esses contos e romances, os quais, sem qualquer idealização, desvelam
a vida cotidiana das classes
populares e mostram simpatia pelos personagens mais sofridos. Isso o diferencia, por
exemplo, de Aluísio de Azevedo, que também enfoca as massas urbanas, mas procurando
a patologia
social. Ao contrário do autor de O Cortiço, Lima Barreto demonstra grande ternura pelos
desvalidos e humilhados, fugindo do sentimentalismo populista.
— Berlim
Anita procurou uma formação fora do país. Com a ajuda do tio, Jorge Krug, conseguiu
mudar-se para Alemanha em 1910, em Berlim. Na capital alemã, ela testemunha o
amadurecimento do expressionismo: viu inúmeras exposições marcantes de artistas que
queriam desafiar a hegemonia do impressionismo francês, buscando um novo estilo e
estética universalizante e, ao mesmo tempo, local, verdadeira e geneticamente alemã.
Longe de Paris, Malfatti seria a primeira dos artistas brasileiros - e a única antes da Primeira
Guerra Mundial - a absorver essa nova corrente artística. Anita desiste dos estudos formais
e procura formas expressivas diferentes do academicismo.
Primeiro, estudou com Fritz Burger que na época a introduziu aos estudos de cor, de
harmonia, de misturas - deixando os problemas do desenho de lado. Apesar de sua
produção inicial ainda ser muito tradicional, as pinceladas de Anita já se tornam mais soltas
e manchadas, vibrantes, como se vê em A Floresta, de 1912.
À procura da aproximação ao expressionismo, a artista passou a estudar com Lovis Corinth,
um dos mais importantes nomes do expressionismo alemão. Procedente de Munique para
Berlim, Corinth era, desde 1911, o presidente da Secessão Berlinense. O mestre sofrera um
acidente vascular cerebral no final daquele ano, o que afetou profundamente a sua
produção. De acordo com a autora Marta Rossetti Batista, a pintura de Corinth passa a ser
"vibrante e vigorosa, mais livre, de pinceladas rápidas e urgentes".
— Nova Iorque
A mostra paulistana teve pouca repercussão, com alguns artigos apenas, que apontavam
uma arte adiantada, ou até um descompasso com a pintura feminina.
Mais uma vez, o tio Jorge Krug ajudou Anita a viajar para os EUA. Em 1915, Malfatti estava
em Nova York. Naquele verão de 1915, ela ouviu falar de Homer Boss, artista conceituado à
época, que havia fundado uma escola própria, a Independent School of Art. Ele e seus
alunos e amigos visitam a costa do Maine para pintar ao ar livre as cenas litorâneas e as
paisagens montanhosas. Anita junta-se ao grupo, alocado na pequena ilha de Monhegan,
pintando ao sol e sob a chuva, livre e naturalmente. Nesse local ela produz algumas de
suas obras mais importantes, incluindo A Ventania e O Farol, além de O Rochedo. Nas
palavras do diário da própria artista: "era a festa da forma e era a festa da cor".
A convivência com Boss deu-lhe, ainda, a oportunidade de conhecer outros nomes
importantes, com destaque para Marcel
Duchamp! Aos 28 anos o francês já era celebridade em Nova lorque, depois do escândalo
em torno da sua pintura "Nu descendent un escalier". E nesse período também que Anita
pinta as obras "Nu cubista", "Cabeça Verde" , e uma das mais importantes obras de sua
carreira, "Uma Estudante. Anita identifica-se com os seus sujeitos retratados, colocando a si
nas angulações e enquadramentos estranhos, nas deformidades. - uma expressão
psicológica e simbólica para o sofrimento humano.
— São Paulo
Em meados de 1916 a artista voltou ao Brasil, mas até sua família não aprova o estilo de
Anita - até o tio que bancou as viagens e os estudos, demonstrou-se desapontado. Ela
sabia que as críticas não tinham fundamento e ficava triste com a falta de compreensão de
seu trabalho. Mas, ao mesmo tempo, a cena paulistana começava a mostrar sinais de
inquietação. Em 1915 Oswald de Andrade já havia escrito o apelo "Em prol de uma pintura
nacional". A Revista do Brasil seria fundada em São Paulo em 1916, com o objetivo de
formar uma consciência nacionalista.
Em 1916, a artista pintou “Tropical”, celebrando a nação brasileira, as suas mulheres e a
sua natureza.
Anita participou de uma espécie de concurso promovido por Monteiro Lobato, uma
investigação sobre o Saci, pintando uma tela de mesmo nome sobre o tema. Em outubro de
1917 os trabalhos foram apresentados num salão na Libero Badaró. Mas Lobato não gosta
do resultado e escreve que a artista "pinta no estilo dos ismos, e que não poderia criticar
porque não entendia esses géneros.
Foi nessa ocasião, entretanto, que Anita chamou a atenção de outros artistas, como Di
Cavalcanti. Eles foram até a casa de Anita para ver as obras "aberrantes" que ela
praticamente escondia e ficaram extremamente entusiasmados pela nova arte da pintora,
estimulando-a a fazer uma exposição no final de 1917. Anita selecionou obras produzidas
depois de 1914, ou seja, no seu período nos Estados Unidos, e as mais recentes, feitas no
Brasil. Eram 53 obras no total, na Exposição de pintura moderna
Anita Malfatti", além de alguns trabalhos de colegas americanos, para evidenciar que ela
não era a única a pintar daquela forma!
Ela já incorporava procedimentos básicos da arte moderna: a relação dinâmica e tensa
entre a figura e fundo; a pincelada livre que valoriza os detalhes da superfície; os tons fortes
e não convencionais; as sugestões de luz; e uma liberdade de composição.
— Exposição Malfatti
A exposição teve bastante destaque, com o Estado de São Paulo a escrever que havia
muita concorrência de visitação na mostra, com muitas famílias conhecidas assinando o
livro de registro e a artista sendo chamada de fenômeno. Outros artistas e pessoas do meio
que mais tarde integrariam o grupo idealizador da Semana de 22 também elogiaram o
trabalho: Guilherme de Almeida, Di Cavalcanti, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e até
Tarsila visitaram a mostra. A última escreveria em carta futura que um bom pintor
considerado avançado para o meio, chamado
Wasth Rodrigues, lamentava não saber pintar como Anita!
Os ventos mudaram de direção quando Monteiro Lobato escreveu uma peça crítica para o
Estado de São Paulo, em 20 de dezembro de 1917, com o título "A propósito da exposição
Malfatti", com uma posição bem virulenta em relação às obras. Lobato dizia que as telas
vendidas foram devolvidas, algumas quase foram destruídas a bengaladas.
● Reações
- Oswald de Andrade: "Anita Malfatti é um temperamento nervoso e uma
intelectualidade apurada, ao serviço do seu século*. (1918)
- Mário de Andrade: "Anita é dos mais inquietos, dos mais elevados e sérios
temperamentos artísticos do nosso dia brasileiro. (1926)
Anita ficou profundamente magoada com esse episódio, mas como estopim, a crítica de
Lobato ensejou jovens escritores e poetas a reunirem-se ao redor da artista, como Mário de
Andrade, Oswald de Andrade e Menotti del Picchia, escrevendo respostas em outros
trabalhos defendendo Malfatti e desconsiderando Lobato, desqualificado como crítico de
arte. "Não posso falar pelos meus companheiros de então, indica Mário de Andrade, "mas
eu, pessoalmente, devo a revelação do novo e a convicção da revolta a ela e à força de
seus quadros*. Em sentido semelhante, Di Cavalcanti escreve: "A exposição de Anita foi a
revelação de algo mais novo do que o impressionismo".
Surpresa pela repercussão, Anita continuou a contar com o apoio de Di Cavalcanti, de Yan
de Almeida Prado, e dos dois Andrade, sendo que Mário visitou a mostra diversas vezes,
afirmando: "Parece absurdo, mas aqueles quadros foram a revelação. E ilhados na
enchente do escândalo que tomara a cidade, nos, três ou quatro, delirávamos em êxtase
diante de quadros que se chamavam O Homem Amarelo, A Mulher de Cabelos Verdes".
Monteiro Lobato
● Biografia
Nasceu em 1882 em Taubaté (São Paulo). Em 1904, é bacharel em direito e em 1907, é
nomeado promotor público.
Casou com Maria Pureza da Natividade de Souza e Castro (“Purezinha”) em 1908.
Em colaboração com vários periódicos, começa, no ano de 1910, atividades empresariais
(caminhos de ferro) e jornalísticos. Um ano depois, torna-se herdeiro da Fazenda Buquira
do avô Visconde de Tremembé. Assim, abandona os tribunais para gerir a propriedade
fundiária e abre um externado em Taubaté.
Em 1912, colabora com O Estado de São Paulo. No Estadinho (edição vespertinado jornal)
pública o artigo "Velha Praga”.
Vendeu a fazenda Buquira em 1916 e saiu de São Paulo.
Em 1917 publicou um artigo “Paranóia ou Mistificação" n’O Estado de São Paulo contra a
exposição de Anita Malfatti.
Um ano depois compra a Revista do Brasil e começa a sua atividade de editor e escritor.
Foi duas vezes candidato à Academia Brasileira de Letras, em 1921 e 1926,
respetivamente, mas em ambas foi reprovado.
Em 1927 é nomeado adido comercial nos Estados Unidos pelo presidente Washington Luís
e forneceu apoio à candidatura de Júlio Prestes a novo presidente do Brasil (SP).
Em 1931 regressa a São Paulo, defesa de uma nova mineração do país (ferro, petróleo) e
construção de estradas para escoar os produtos. Criação de várias empresas de exploração
do petróleo. Conflito com companhias estrangeiras e poderosos, apoiados pelo governo
Vargas. Em 1928 dá-se a fundação da União Jornalística Brasileira (agência noticiosa).
Em 1939, o seu filho Guilherme morre, e em 1942 foi condenado a seis meses de prisão,
indulto de Getúlio Vargas redução da pena a três meses.
Em 1942, morre o seu filho Edgar.
Um ano depois, dá-se a fundação da Editora Brasiliense que negoceia a publicação da obra
completa do autor.
Monteiro Lobato aproxima-se aos ideias comunistas e torna-se diretor da associação
cultural Brasil-URSS.
No ano de 1946, foi transferido para Buenos Aires, tornando-se sócio da Editora Brasiliense.
Regressa ao Brasil um ano depois e, em 1948, sobre de dois acidentes vasculares fatais.
Morre em São Paulo a 4 de julho.
● Urupês
É o nome de um cogumelo (Pycnoporus sanguineus )= Orelha de pau.
Urupês, obra publicada originalmente em 1918, reúne ao todo 14 contos de Monteiro
Lobato. Segundo o prefácio da 2a. Edição do livro, esta obra surgiu do artigo "Velha praga",
publicado originalmente no jornal O Estado de São Paulo.
Residente no Vale do Paraiba, em São Paulo, região muito arcaica, era visto pelas pessoas
como preguiçoso e alcoólatra. A questão da saúde transparece no enredo quando um
médico, ao cruzar o seu caminho, passa diante de sua tosca residência e se assusta com
tanta pobreza. Notando sua coloração amarela e a intensa magreza, decide examinar o
caboclo.
O paciente queixa-se de muita fadiga e dores corporais. O doutor então diagnostica a
presença de uma enfermidade tecnicamente conhecida como ancilostomose, o famoso
amarelão. Ele orienta
Jeca a usar sapatos e a tomar os remédios necessários, pois os vermes que provocam este
distúrbio orgânico introduzem-se no corpo através da pele dos pés e das pernas.
A vida de Jeca muda radicalmente. Ele trata-se, volta a trabalhar, reduz a bebida, a sua
pequena plantação prospera e o trabalhador torna-se um homem honrado pelas outras
pessoas. A família Tatu agora só anda calçada e, portanto, saudável. E assim que Monteiro
Lobato denuncia a precária situação do trabalhador rural, ele revela que medidas simples
poderiam transformar este cenário sombrio. Jeca Tatu torna-se o símbolo do brasileiro que
vive no campo.
- A língua em Urupês
Além do surgimento de uma das personagens mais icónicas da literatura brasileira (Jeca
Tatu), Urupês trouxe uma série de inovações e sua importância se estende até os dias
atuais. Uma delas diz respeito à linguagem empregada no livro. Monteiro Lobato estava
preocupado em reproduzir nos seus textos a riqueza da fala brasileira da zona rural, com
seus coloquialismos e neologismos tipicamente orais.
De acordo com a crítica literária, o recurso da oralidade foi a maior ousadia do escritor em
Urupês, pois nessa época o uso do português coloquial em obras era visto como "inferior" e
sem valor literário. Dessa forma, pode-se dizer que Urupês é uma obra que de certa forma
antecede as convenções estilísticas propostas pelos modernistas da Semana de 22.
● Cidades Mortas
Publicado em 1919, pela Revista do Brasil, este segundo livro de Lobato levava o subtítulo "
Contos e Impressões " e reunia trabalhos bastante antigos, alguns do tempo de estudante
de Lobato. Em edições subsequentes, novo textos acrescentaram-se à obra. O título do
livro é tomado de um texto de 1906. Numa espécie de crônica ou ensaio, num tom entre
irônico e saudosista, Lobato delineia o espaço de sua obra: o norte paulista do vale do
Paraiba, "onde tudo foi e nada é: Não se conjugam verbos no presente. Tudo é pretérito.
"(...) cidades moribundas arrastam um viver decrépito.
Gasto em chorar na mesquinhez de hoje as saudosas grandezas de dantes". É , portanto
num cenário de decadência representado por ruas ermas, casarões em ruínas e armazéns
vazios, em que o livro introduz o leitor, fazendo-o acompanhar de um ponto de vista irônico
por figuras igualmente decadentes de homens e de mulheres.
- polémica antiromântica
“No concerto de nossos romancistas, onde Alencar é o Piano querido das moças e Macedo
a Sensaboria relambória dum flautim piegas, Bernardo é a sanfona. Lê-lo é ir para o mato,
para a roça- mas uma roça adjetivada por menina de caudalosos, as matas virentes, os
pincaros altíssimos, os sabiás sonoros, as rolinhas meigas. Bernardo descreve a natureza
como qualificativos surrados do mau contador. Não existe nele o vinco enérgico de
impressão pessoal. Vinte vergéis que descreva são vinte perfeitas invariáveis amenidades.
Nossas desajeitadíssimas caipiras são sempre lindas morenas cor de jambo. Bernardo
falsifica o nosso mato. Onde toda gente vê carrapatos, pernilongos espinhos, Bernardo
aponta doçuras, insetos maviosos, flores olentes. Bernardo mente.”
'A vida em Oblivion'
● Os propagandistas:
Menotti Del Picchia, diretor do Correio Paulistano e colaborador da Gazeta da Tarde.
Oswald de Andrade, colaborador do Jornal do Comércio e fundador da revista Papel e
Tinta.
● Um futurismo brasileiro?
Desde o início do ano os dois intelectuais proclamavam nas páginas dos respetivos jornais
a existência e a força de um novo movimento que buscava a inspiração criativa do
movimento criado pelo Filippo Tommaso Marinetti, o Futurismo (1909).
● Problemas
O problema é que nem todos se identificavam com o ideário de Marinetti, como Mário de
Andrade, contra o tom exaltado dos seus manifestos, contra a destruição dos vestígios do
passado, de uma total rutura com a tradição, a pregar um novo evangélico das máquinas e
da velocidade, nos anos a seguir, tornar-se-ia apoiante do fascismo italiano.
● 27 de maio de 1921
Oswald de Andrade publica no Jornal do Comércio o artigo “O meu poeta futurista”.
“É longo como um círio e evoca para as minhas meditações um cálice do Graal suspenso
aos lábios ávidos da "girl" babilônica que é esta cidade de mil portas. Chama-se ... Não
posso lhes contar o nome. Proibiu-o o casto, o bom, o tímido, contar-lhe-ei a figura e a arte.
(...) Esse lívido e longo Parsifal bem educado é conhecido pelo seu saber crítico...
Segue um excerto do poema "Tu" , que será parte da
Pauliceia desvairada, publicada no ano seguinte.
Oswald comenta : "Acharam estranho o ritmo, nova a forma, arrojada a frase? Graças a
Deus! [...]Bendito esse futurismo paulista, que surge companheiro de jornada dos que
aqui gastam os nervos e o coração na luta brutal, na luta americana, bandeirantemente!
● O Escândalo
O artigo de Oswald de Andrade envolve Mário de Andrade em grande escândalo: de
intelectual anônimo, o nome do poeta toma conta de São Paulo, enquanto cabotino, vilão
maluco, objeto de zombarias...
Também a sua profissão de professor do Conservatório Dramático e Musical de São Paulo
será afetada pela rotulagem de "futurista" atribuída ao jovem poeta. (futurista = anarquista =
perigoso revolucionário). Vários pais dos seus alunos, ou alunas, retiraram os seus filhos
dos cuidados de um tão perigoso mestre!
Até as relações familiares de Mário de Andrade sofreram pela disputas sobre os versos
publicados.
● Paródia polémica
No Jornal do Comércio, onde Oswald de Andrade escrevera, parece um soneto, de autoria
anónima, a gozar com o “autor futurista”.
Poema Futuro Condicional
● Futurista?!
Artigo de resposta a Mário de Andrade, publicado a 6 de junho de 1921 no Jornal do
Comércio. Nele, Mário afirma ser próximo do
"poeta desconhecido" e que o artigo de Oswald merece "resposta e refutação".
Define a "via sacra" que o amigo está a percorrer, a procura de uma escola poética que
corresponda a sua arte, já não é o
Parnasianismo, nem o "gás asfixiante do Simbolismo, nem o
Futurismo.
Define Paulicéia desvairada "um livro íntimo, um livro de vida, um poema absolutamente
lírico [...] úmido de lágrimas, áspero de insulto, luminoso de alma, gargalhante de ironia [...]
Uma obra enfim livre....”.
Mário afirma que o seu amigo poeta "Reformador, revolucionário, iconoclasta, não o será
jamais" e que "Repudia o futurismo funambulesco das Europas, assim como o futurismo
vago do Brasil".
Palestrina teria julgado Bach louco, e assim Bach teria julgado Beethoven, e assim
Beethoven teria julgado Wagner.
Estamos portanto a janela de um glorioso asilo, enquanto declaramos, sem hesitação, que o
contraponto e a fuga, ainda considerado como o ramo mais importante da educação
musical. não passam de ruínas pertencentes à história da polifonia, especificamente
daquele período que vai desde os flamengos até G.S. Bach”.
Oswald cita Walt Whitman e Friedrich Nietzsche e afirma que o poeta desconhecido, autor
da Paulicéia "pecou de passadismo " por não acompanhar o exemplo de tão grandes
personalidades.
Propõe versos de poetas fiéis ao idealizado Futurismo Brasileiro : Guilherme de Almeida,
Agenor Barbosa, Menotti Del Picchia.
Modernismo
Cronologia literária da primeira geração do modernismo brasileiro
1. Paulicéia Desvairada (1922)
2. Memórias sentimentais de João Miramar (1923)
3. O ritmo dissoluto (1924)
4. A Escrava que não é Isaura (1925)
5. Pau-Brasil (1925)
6. Meu e Raça (1925)
7. Chuva de Pedra (1925)
8. Losango cáqui (1926)
9. Toda a América (1926)
10. Vamos caçar papagaios (1926)
11. O estrangeiro (1926)
12. Pathé Baby (1926)
13. “Amar, verbo intransitivo” e “O Clã do jabuti” (1927)
14. A estrela de absinto (1927)
15. Brás, Bexiga e Barra Funda (1927)
16. Estudos (1ª série - 1927)
17. Macunaíma (1928)
18. Martim Cererê (1928)
19. Laranja da China (1928)
20. Alguma poesia (1930)
21. Cobra Norato (1931)
Pau-Brasil
Cancioneiro de Oswald de Andrade
● O Livro (paratexto)
Note-se a ousadia em substituir o lema “Ordem e Progresso” com o título da obra. O
Pau-Brasil foi o primeiro produto de exportação do Brasil Colonial. Oswald de Andrade
pretende realizar um produto artístico de exportação.
● Aspeto modernista e paródico
Na parte interna do livro destaca-se o subtítulo acoplado aos nomes do autor, do autor do
prefácio e da autora das imagens, palavras em desalinho mas metrificadas: palavras-versos
de letras em 12 linhas, a evocar a redondilha. Há referência também às academias
barrocas mineiras que exploravam estas formas gráficas peculiares.
● Cancioneiro
Nome atribuído a coletâneas de poemas de vários autores de lírica medieval (por exemplo,
o Cancioneiro da Ajuda de poesia galaico-portuguesa coligido nos séculos XIII e XIV).
Oswald cria um conjunto de pequenos relatos por várias vozes. A língua utilizada será a
língua portuguesa falada por brasileiros. O elemento épico (natural na descrição literária de
um país) é minado pelos elementos de comicidade e ironia que não escondem o aspeto
trágico de algumas histórias que aparecem na obra.
- Invocação (Escapulário)
Invocação de Camões às Tágides: “E vos, Tágides minhas, pois criado Tendes em mi um
novo engenho ardente…”
O Escapulário, um dos poucos poemas com métrica (paródia do “Pai Nosso”):
No Pão de Açúcar
De Cada Dia
Dai-nos Senhor
A Poesia de Cada Dia
A poesia é dádiva divina e alimento fulcral do poeta.
- Falação
Poema em prosa cuja fonte é o Manifesto da Poesia Pau Brasil.
N1 História do Brasil
- imitação de textos do tempo do achamento e colonização do Brasil:
a) Pêro Vaz de Caminha, em “primeiro chá” vem citado o episódio de Diogo Dias a
dançar com os indígenas
b) Gândavo
c) Claude d’Abbeville (1612 - França Equinocial - Maranhão)
d) Frei Vicente do Salvador (Historiador)
e) Fernão Dias Pais Leme (Bandeirante)
f) Frei Manuel Calado do Salvador (relatou a invasão holandesa no Pernambuco)
g) J. M. P. S. da cidade do Porto (autor do panfleto “As regras gerais”, de 1816) dá uma
descrição do sotaque caipira
h) Infante D. Pedro (D. Pedro IV de Portugal/ D. Pedro I do Brasil)
É a voz dos europeus a explorarem o Brasil.
N2 Poemas da Colonização
Reproduz as vozes dos habitantes do Brasil, inclusive a do poeta.
Criação de uma épica pelo avesso, considerando:
a) o poder da classe dominante e os seus abusos
b) o trabalho escravo
c) os castigos corporais
d) indivíduos a viverem em condição sub-humana
(“Medo da senhora”, “Levante” e “Azorrague”)
- Delineia-se o Brasil imperial, em consonância com a Casagrande, e a crueza das
vidas marginalizadas no campo e na cidade.
- Uso deu-ma língua “impura” nos vocábulos, na sintaxe e prosódia, nos ajustes
fonológicos patentes no texto poético.
- Aspeto irónico, subversor “relicário” “senhor feudal”.
N3 São Martinho
Nome de poderosa fazenda da República Velha cuja prosperidade a credencia como
metonímia de São Paulo, o poema apinha-se a outras peças do livro a fim de decantar o
progresso paulista.
Uma narrativa sobre o desenvolvimento de uma “civilização” original, que culmina com o
progresso impulsionado pela economia cafeeira e com um futuro urbano e industrial
promissor, como se lê em “Prosperidade”.
A vida rural paulista, a riqueza promovida pelo cultivo do café (“O café é ouro silencioso”) e
a formação de uma nova burguesia.
Exaltação da velocidade e do simultaneísmo da vida urbana de São Paulo “Versos de Dona
Carrie”.
Exaltação da industrialização “Metalúrgica”.
N4 RP1
RP1 era a abreviatura de Rápido Paulista 1, comboio que percorria o trajeto entre São
Paulo e o Rio de Janeiro. Da cidade de Aparecida até à capital, o autor retrata um país em
que é ressaltado não apenas pela azáfama humana das cidades em expansão, mas
também pela diversidade cultural reunida sob um único céu acolhedor.
N5 Carnaval
Oswald destaca os ritos e os ritmos das danças populares que no Brasil adquiriram carácter
próprio: o maxixe e o samba cariocas, em “Nossa Senhora dos Cordões” e “Na Avenida”.
Exploram em “instantâneos” fotográficos o espaço, os movimentos das danças, a alegria
efémera, a festa e o seu carácter profanador.
N7 Postes da Light
Verdadeira crónica da cidade de São Paulo no princípio do século XX, entre andanças ainda
do mundo rural em “Pobre alimária” e “Procissão” e da modernidade em “Escola Berlites”.
Nos vinte e dois poemas de “Postes da Light” a antítese entre rural e urbano resolve-se no
interior de cada poema, de modo que elementos desiguais combinam-se sob o mesmo
recurso de justaposição, como em “Atelier”.
A língua dos brasileiros em “Pronominais”.
Os triunfos no futebol do Clube Athletico Paulistano, que derrotou muitas equipas numa
digressão à Europa em 1925, só perdeu contra a equipa de Sète, em França, em “A Europa
curvou-se ante o Brasil”.
N9 Loyde Brasileiro
É o nome de uma companhia de navegação estadual brasileira (Lloyd Brasileiro).
Relata a viagem marítima da Europa para o Brasil.
Aqui, toda a inclinação crítica e satírica do poeta se renova na oposição ao paradigma
romântico de representação do país, o que se manifesta já em “Canto de regresso à pátria”,
talvez uma das mais famosas paródias da “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias.
Temática:
Morte, solidão, saudade, doença, metafísica, arte, amor, infância, poesia, erotismo, paixão,
modernismo…
As três fases poéticas de Manuel Bandeira
1. Primeira fase
- parnasianismo - simbolismo - modernismo
- A Cinza das Horas (1917); Carnaval (1919); O Ritmo Dissoluto (1924) - modernismo
2. Segunda fase
- plenitude modernista
- Libertinagem (1930) - Estrela da manhã (1936)
3. Terceira fase
- maturidade/estabilidade criadora
- Lita dos cinqüent’anos (1940); Belo belo (1948); Mafuá do Malungo (1948); Opus 10
(1952); Estrela da tarde (1958); Estrela da Vida Inteira (1966)
“Carnaval” (1919)
● Aspetos formais: forte influência simbolista, afastamento do parnasianismo
● Formas métricas fixas
● Carácter irónico e impressionista
● Aspetos temáticos: recusa do parnasianismo, defesa de maior liberdade formal, uso
metafórico de símbolos, enaltecimento da música.
“Libertinagem” (1930)
“Libertinagem é um livro de cristalização. Não da poesia de Manuel Bandeira […] mas da
psicologia dele (Mário de Andrade)”.
Aspetos formais: libertação dos modelos tradicionais; versos brancos; coloquialismo;
prosaísmo; versos livres.
Aspetos temáticos: cenas e imagens a retratar o Brasil; lirismo amoroso; aspetos
biográficos; liberdade alucinante.
● Considerações
“Macunaíma” é uma obra inserida nas propostas da Semana de Arte Moderna de 1922.
Mário de Andrade, assim como outros modernistas, busca resgatar a imagem do Brasil,
sendo, portanto, uma obra com carácter nacionalista.
Esse nacionalismo não é dado da mesma forma que o nacionalismo dos escritores do
romantismo, que usavam a figura idealizada do índio. Em Macunaíma, o nacionalismo tem
um carácter crítico e a figura do indígena aparece causando uma reflexão sobre o que é ser
brasileiro.
Pretendia-se criar uma literatura brasileira, resgatando a brasilidade através das lendas e
folclores de raiz latino-americana (principalmente indígenas), e moderna. O carácter
“moderno” da obra se dá principalmente através do aspeto formal do texto, com uma
linguagem coloquial, que foge da norma culta e de qualquer erudição vazia.
Outro ponto a destacar é que o estranhamento causado pela leitura de “Macunaíma” muitas
vezes se deve ao distanciamento que temos das lendas e folclores latino-americanos.
Obra inovadora pela escolha do tema, pela construção do protagonista, um herói às
avessas que provoca uma ruptura com a imagem idealizada do indígena do Romantismo
brasileiro: Peri do Guarani de José de Alencar (o nativo enquanto homem honrado, ideal
antepassado dos habitantes do Brasil).
Novidade pelo uso de fontes não académicas (folclore/tradições e histórias tribais).
Novidade no uso de uma língua coloquial que desafia o leitor.
● Uma Rapsódia
Qual é o género literário de Macunaíma? A obra foge a uma classificação. Romance que
conta a vivência do sujeito (homem moderno?
Rapsódia? Macunaíma é um herói épico?
A obra é um conjunto de pequenas narrativas de cariz lendário-mitológico que compõem
uma grande narrativa marcada pela oralidade, que expressa histórias mitológicas.
Macunaíma é uma obra considerada satírica, considerando o protagonista um indivíduo
que, de indigena passa a morador branco da cidade, mas enquanto indígena contrapõe-se
à representação idealizada feita por José de Alencar (O Guarani, romance): os “índios
submissos” aos europeus que não correspondem ao perfil de Macunaíma.
Macunaíma é o protagonista da obra, um herói que contraria os estereótipos respeitantes
aos heróis tradicionais: nasce nas margens do Uraricoera , rio da Amazônia, tem dois
irmãos Maanape e Jiguê, ele é o caçula.
Umas orações caraterísticas da personagem é "Ai que preguiça!", ele gosta de "Brincar" =
ter relações sexuais com as mulheres.
Macunaíma envolve-se com Sofará, a esposa do Jiguê.
Macunaíma não é bom nem é mau: manhoso (cheio de artimanhas), esperto, tem
qualidades supranaturais, tal como os heróis épicos, os deuses épicos, pois ele passa por
diversas metamorfoses, como quando se banha na poça deixada pela pegada de Sumé.
● Capítulo 1: Macunaíma
Macunaíma nasceu negro e feio. Foi parido pela índia tapanhumas no Uraricoera. Ele
permaneceu seis anos sem falar, por pura preguiça. Desde pequeno já vivia na
malandragem e era louco por dinheiro e pelas mulheres. Os sonhos do protagonista tinham
sempre um teor imoral. Ele vivia distante dos princípios morais.
Ao completar seis anos, o herói ganhou água em um chocalho e a partir daí passou a falar
sem problemas. Ele tinha dois irmãos: o idoso Maanape, feiticeiro, e Jiguê, homem vigoroso
que vivia na companhia de Sofará. Um dia, a mãe de Macunaima não quis acompanhar o
filho em um passeio e pediu que a nora fosse em seu lugar. Na mata, o protagonista
transformou-se em um belo príncipe e brincou com ela. Depois disso, bastava ele
choramingar que a cunhada o acompanhava na caminhada.
Macunaíma inventou de fazer uma armadilha oculta para apanhar uma anta. Assim, ele
obteve a caca antes de Jiguê, mas este, no momento de dividir a carne, reservou apenas
tripas ao herói. Este
ficou furioso e quis vingar-se. No dia seguinte, o irmão dele flagrou Macunaíma com Sofará
no mato. Bateu no herói e devolveu a companheira para a família dela.
● Capítulo 2: Maioridade
Jiguê arranja outra mulher, Iriqui. Assim que a carne de anta foi devorada, a tribo ficou
faminta. Maanape decidiu caçar um boto, mas o pai do animal, Maraguigana, enfureceu-se
e enviou uma enchente para dar fim ao milharal.
Macunaíma teve uma ideia. Ele iludiu sua mãe, pediu que ela cerrasse os olhos e, quando
ela os abriu de novo, os dois estavam na outra margem do rio, rodeados de alimentos
fartos.
Mas a índia quis levar uma parte da refeição para os outros filhos. O protagonista ficou com
raiva e transportou-os mais uma vez para a velha casa. Voltaram a sofrer fome.
Para castigar o herói, a mãe deixou-o sozinho no meio do mato. Após uma semana sem
rumo, ele encontrou o Curupira. Ele deu-lhe um pedaço da própria perna para comer e
depois passou a caçar o herói, sempre guiando-se pela sua carne, ingerida por Macunaíma;
essa carne respondia aos apelos do Curupira e denunciava a localização do protagonista.
Macunaíma libertou-se do monstro ingerindo lama e vomitando a carne.
Logo em seguida, Macunaíma encontrou a Vó Cotia, que fabricava farinha. Ela deu-lhe de
comer, mas ao saber do que ele havia aprontado com a família, derramou caldo
envenenado de aipim (mandioca) no corpo dele e assim Macunaíma cresceu. Apenas a
cabeça não foi atingida pela substância, permanecendo em estado infantil.
Macunaíma voltou para a tribo e passou a brincar com Iriqui. Jiguê descobriu tudo, mas
perante o novo corpo do irmão, agora vigoroso, decidiu não criar problemas. Macunaíma
ameaça vingar-se da mãe. Sem querer, ele ao caçar mata uma veada que tinha acabado de
dar à luz; ao aproximar-se, vê a própria mãe morta. Ele e os irmãos, após muito sofrer,
enterraram o corpo sob uma pedra no Pai da Tocandeira. Os irmãos e Iriqui decidiram sair
mundo afora.
● Capítulo 3: Ci, a Mãe do Mato
Na nova jornada, os quatro se deparam com Ci, Mãe do
Mato. Macunaíma logo quis brincar com ela, mas a icamiaba despertou e confrontou o
herói. Após levar a pior, ele recorreu aos irmãos, os quais deram um golpe na cabeça dela.
Macunaíma brincou com ela enquanto a mesma estava inconsciente. Ele tornou-se o novo
Imperador do Mato-Virgem. Seis meses passaram e Ci deu à luz um filho de pele vermelha.
Uma noite, Macunaíma embebedou-se e não olhou pela sua esposa. A Cobra Preta chegou
e sugou o leite do único seio ativo de Ci. O bebê mamou no mesmo peito e morreu
envenenado.
Após o sepultamento do bebé, Ci retirou de seu colar um muiraquitã célebre e presenteou
Macunaíma com essa pedra. Depois ela ascendeu aos céus por meio de uma corda - a Mãe
do Mato converteu-se em estrela, a Beta do Centauro. Na cova do filho brotou o guaraná.
● Capítulo 5: Piaimã
Antes de ir para São Paulo, Macunaíma deixa a sua consciência na ilha de Marapatá. Ele
toma banho numa água mágica e a sua pele fica branca, os olhos azuis e os cabelos loiros.
Jiguê também decidiu banhar-se na piscina natural, mas como o irmão já tomou banho nela,
o máximo que ele consegue é obter a cor do bronze. Maanape fica com o restinho da água
e só molha a palma das mãos e dos pés. Eles pretendem sustentar-se com o cacau, mas
ele não vale como moeda de troca em São Paulo.
Macunaíma teme ter que arranjar um emprego. Na primeira noite nessa cidade, o herói
dorme com três prostitutas brancas. A princípio, o herói fica desnorteado, principalmente ao
conhecer as máquinas, que ele confunde com os ruídos dos animais na floresta. Ele e os
irmãos hospedaram-se numa pensão. Jiguê é convertido em telefone e faz uma ligação
para os cabarés, pedindo lagostas francesas.
O herói que Pietro Pietra é o gigante Piaimã, que come as pessoas e vive com a Caapora.
Na primeira vez em que eles se encontram, o titã mata Macunaíma com uma flechas e
fatia-o em partes pequenas. Maanape, auxiliado por uma formiga e um carrapato, consegue
trazer o protagonista de volta à vida. Depois de ingerir guaraná, o herói fortalece-se. Ele
prepara-se para desfilar o gigante e obtém uma arma, muitas balas e uísque.
● Capítulo 7: Macumba
Para derrotar o gigante, Macunaíma vai para o Rio de Janeiro e procura um terreno de Exu,
comandado por Tita Ciata, negra velha ancestral e mãe-de-santo. Uma meretriz dá
passividade a Exu e o protagonista é escolhido como filho dessa entidade. Macunaíma
pede a oportunidade de vingar-se do gigante. O ente espiritual concede-lhe a realização
desse desejo e o corpo da prostituta passa por inúmeros sofrimentos e martírios;
simultaneamente, Piaimã é submetido à mesma tortura. Aí Macunaíma prova cachaça pela
primeira vez.
● Epílogo
Um dia, um homem passou pelo Uraricoera, agora uma terra desabitada.
Uma voz chegou aos seus ouvidos. Tratava-se do aruaí (papagaio) para quem Macunaíma
contara sua história.
A ave reproduziu toda essa saga para o viajante e depois partiu para Lisboa. O ouvinte era
o escritor Mário de Andrade, que retratou essas aventuras neste livro.
Carlos Drummond de Andrade
“Estado da arte” do modernismo brasileiro em 1930
- revisão crítica do passado histórico-cultural
- visão crítica e irónica da existência humana
- análise do ser humano e das suas angústias
- preocupação filosófica e religiosa
- vontade de compreender o relacionamento entre o indivíduo e a sociedade
- retomada de formas poéticas da tradição
Um processo criativo clubista leva o “eu” lírico a mostrar as suas sete faces:
1. Face Gauche: a de um outsider
2. Face libidinosa: a dos homens “que correm atrás das mulheres”
3. Face seria: a do homem do bigode
4. Face intelectual: a dos óculos do homem do bigode
5. Face religiosa: a da invocação a Deus
6. Face sentimental: a do coração maior que o mundo
7. Face lírica: a da comoção
Aspetos ligados ao modernismo: uso do prisma do cubismo na redação do poema, versos
livres e brancos, uso da paródia.
Elementos parodiados: a Bíblia (primeira e quinta estrofes), o parnasianismo (a rima de
Raimundo, o parnasiano Raimundo Correia) e o discurso romântico (sétima estrofe). O
poema tenta definir o seu “eu” lírico.
“Quadrilha”
Visão irónica do amor. Título metafórico, pois o amor é desencontro e interesse (sexual e
financeiro).
“Poesia”
“Política Literária”
Ironia sobre as disputas literárias na vista social. Não se trata de metalinguagem, pois o “eu”
lírico não escreve sobre a criação poética.
“Sentimental”
Drummond surrealista (no poema Registro Civil e as suas imagens incómodas). A mulher é
vista como geradora de ilusões e contribui para o pessimismo para com a vida. “Registro
civil” diz de uma que engole os seus namorados.
“Hino Nacional”
A começar pelo próprio título, alude claramente ao hino nacional brasileiro, à diferença que,
enquanto este fica apenas no discurso acrítico e meramente laudatório (as crianças são
forçadas a cantar sem serem convidadas pelo professor a fazerem uma reflexão acerca da
letra da música), aquele esforça-se para, através dos questionamentos lançados, trazer
alguma luz à ideia do Brasil.
António Cândido: a literatura brasileira, bem como as latino-americanas, diferentemente das
europeias, é eivada desse “empenho”, desse comprometimento com a construção de uma
nação.
Afrânio Coutinho: no modernismo existe o “problema da valorização da realidade brasileira”.
“Sentimento do Mundo”
Temas: poesia social; impotência; impasse.
Angústia do “eu” lírico perante a eclosão do segundo conflito mundial, evidenciado no último
verso: as trevas da noite que iniciam o dia.
Aspetos formais: versos livres/ o uso da repetição evidencia o discurso poético.
“Mãos dadas”
O poema celebra a solidariedade utópica e festiva entre seres humanos. O poeta rejeita a
influência do mundo moderno na sua obra, preferindo focar no coletivo e na solidariedade
em detrimento do individualismo. Em “Mãos Dadas”, Drummond afirma que não será um
poeta que romantiza um mundo ultrapassado, nem tampouco um que projeta um futuro
idealizado. Por outras palavras, ele não é arcaico nem inventivo.
“José”, 1942
“José”
O poema apresenta uma perspetiva pessimista do quotidiano, cujo tema central é a solidão
humana e a sensação de falta de lugar no mundo. A obra revela uma angústia profunda
pela vida, caracterizada por questionamentos e impasses.
“O Lutador”
Métrica: redondilha menor.
Na primeira estrofe aparecem versos de cinco sílabas poéticas com acentos na segunda e
quinta. A seguir, cria-se uma narrativa, a evocar um conto mantendo um “eu” lírico.
Na segunda estrofe continuam as tentativas infrutíferas de parte do poeta em subjugar a
palavra.
Na terceira estrofe o “eu” lírico assume características descritivas, próximas do
Parnasianismo.
Na quarta estrofe as palavras ganham forma, corpo e a lide poética torna-se um combate de
cariz erótico.
Na quinta estrofe o “eu” lírico assume uma postura idealista “clássica”, uso da fala do
quotidiano.
Na sexta estrofe o “eu” lírico entra em devaneio e vislumbra o seu triunfo sobre a palavra,
percebendo que afinal tudo não passa de uma mera ilusão.
Metalinguagem.
A repetição de vocábulos, além de completar o número de sílabas dos versos, traduz um
sentido de exasperação, como se o poeta se irritasse e ao mesmo tempo sentisse um
superior prazer em se atirar à luta.
- o passado
Como um Presente — projeção do passado
- o amor
O Mito
Caso do Vestido
- o quotidiano
A Morte do Leiteiro
Caso do vestido
- paródia
Nova Canção do Exílio
Poesia “Objectual”
O poeta promove uma radicalização das estruturas que sempre caracterizaram a sua
escrita, incorporando agora uma exploração dos elementos materiais da palavra, além da
sua preferência pelo prosaico, irónico, contra a retórica e a lírica académica.
A geração de 30
Contexto histórico:
A segunda fase do modernismo no Brasil emergiu num período de grande instabilidade.
Após a crise económica de 1929 em Nova York, muitos países enfrentaram uma crise que
afetou não apenas a economia, mas também a sociedade e a política. Como resultado,
governos totalitários e ditatoriais surgiram na Europa, culminando com o início da Segunda
Guerra Mundial
(1939-1945). No Brasil, além do aumento do desemprego e da falência das fábricas, a
Revolução de 30 representou um golpe de estado que depôs o presidente da República,
Washington Luis, e impediu a posse do presidente eleito, Júlio Prestes, pondo fim à política
do café com leite e às oligarquias de Minas Gerais e São Paulo. Com a ascensão de Getúlio
Vargas ao poder, a ditadura também se aproximou com o Estado Novo (1937-1945).
Zé Carioca
O personagem Zé Carioca foi criado com a finalidade de ajudar a promover a política de
boa vizinhança. Essa política buscava evitar que filmes que expusessem instituições e
costumes norte-americanos malvistos, como a discriminação racial, fossem distribuídos na
América Latina e ofendessem os brios dos latino-americanos. Para esse fim, foram banidos
das produções de Hollywood os bandidos mexicanos, por exemplo. Além disso, foi criada a
estratégia de produzir personagens que fomentassem a solidariedade continental, como o já
citado Zé Carioca, personagem dos Estúdios Disney criado nessa época. O filme Alô,
Amigos, que apresentou o Pato Donald, enfatizou a política de boa vizinhança. O OCIAA,
ao longo de sua existência, contou com a colaboração ativa do DIP, tanto na condução de
projetos conjuntos quanto como órgão de apoio à sua ação no Brasil.
Poesia de 30
O movimento modernista no Brasil, surgido em 1922 com a Semana de Arte Moderna, foi
marcado por uma ruptura artística que privilegiava o radicalismo e o excesso. A primeira
geração modernista durou até 1930 e, na segunda fase, os autores abandonaram a postura
destrutiva em busca de maior racionalidade e questionamento. A poesia de 30,
característica dessa segunda fase, abarcou uma ampla gama de temáticas, incluindo as
sociais, históricas, culturais, filosóficas, religiosas e cotidianas. A liberdade formal foi uma
das principais características desse período, com poetas utilizando versos livres e brancos,
sem métrica e rima, sem, no entanto, abandonar formas fixas como o soneto.
Características:
- liberdade formal
- experimentação estética
- uso de versos brancos e livres
- universalismo
- ironia e humor
- regionalismo e coloquialismo
- rejeição ao academicismo
“Viagem”, 1939
Principais obras:
- XIV Alexandrinos (1914);
- O Mundo do Menino Impossível (1925);
- Poemas (1927); Novos Poemas (1929);
- Poemas Escolhidos (1932);
- Tempo e Eternidade (1935) - em colaboração com Murilo Mendes;
- A Túnica Inconsútil (1938);
- Poemas Negros (1947);
- Livro de Sonetos (1949);
- Obra Poética (1950) - inclui produção anterior, juntamente com Anunciação e
Encontro de Mira-Celi;
- Invenção de Orfeu (1952);
- Castro Alves - Vidinha (1952).
O processo criativo de Jorge de Lima foi pontuado pela exploração das fontes da memória e
do inconsciente. Na sua fase inicial, o poeta concentrou-se no catolicismo sincrético,
sertanejo e devocional, onde o sentimento do sagrado se mistura com o gosto da terra, do
povo e dos vínculos sociais concretos. O processo de composição mais comum é o
rapsódico, semelhante às sequências invocativas de Walt Whitman, onde os versos alinham
nomes ou expressões nominais que sugerem o embalo da evocação. Em Poemas, Novos
Poemas e Poemas Escolhidos, Jorge de Lima utilizou essa técnica para compor um vitral do
Nordeste que seria o tema do painel social de Lins do Rego. Como o narrador de Menino de
Engenho, a sua primeira e mais forte motivação foi a memória da sua infância. Por trás do
mosaico colorido e ingénuo, o poeta reconheceu as raízes da sua emotividade, que
coincidiam com as de tantos meninos brancos do Nordeste, como a convivência com o
negro, portador de marcas profundas na conduta mítica e nos hábitos vitais e lúdicos. Os
Poemas Negros, que incorporam vozes e ritmos da linguagem afro-nordestina, fornecem
pistas para uma decifração mais completa da religiosidade mística e terrena de Tempo e
Eternidade.
No entanto, a carga afetiva sublimada em prece não é o único ponto de união entre a
poesia negra e a poesia bíblico-cristã de Jorge de Lima. Ambas partilham um sopro de
fraternidade e uma assunção das dores dos oprimidos, um socialismo inerente a toda
interpretação radical do Evangelho. Nos Poemas Negros, há momentos de ênfase na
tensão entre escravo e senhor, agravada pela oposição entre negro e branco.
Retomando a ordem cronológica da produção artística do autor, escolha do tema "Tempo e
Eternidade" levou Jorge de Lima a explorar novos recursos rítmicos, e a novos conjuntos
simbólicos, como as Escrituras, especialmente os Salmos e o Cântico dos Cânticos, além
de material litúrgico. Essa mudança também envolveu uma transição do texto-painel para o
texto-atmosfera, substituindo o pitoresco pelo musical e deslocando o eixo literário do
regionalismo rapsódico para a montagem surreal. Não foi coincidência que o poeta tenha
experimentado o romance surrealista, a pintura de inspiração onírica e a fotomontagem
voltada para o realismo mágico.
Embora nem sempre a poesia dessa fase católica tenha atingido um nível satisfatório de
expressividade e rigor construtivo, o poeta foi reconhecido por sua qualidade lírica da
imaginação, segundo Mário de Andrade. Por isso, é importante distinguir com atenção a
camada concreta e variamente melódica que medeia a grandeza do poeta, da camada
doutrinária que não se resolve em imagem e música.
A Túnica Inconsútil, um dos momentos mais importantes da poesia mística brasileira, é
considerada pelo próprio autor como "um poema único". A leitura desse poema nos leva a
uma imagem processional dos homens e das eras que, saindo "das profundezas do pecado
original", caminham em direção à salvação em Cristo, reconhecendo na poesia a voz e a
lanterna, símbolos da palavra verdadeira. Figuras aladas de Chagall, clowns de Rouault e
ânimos flamantes de Péguy compõem o quadro imagético desse livro, que é
deliberadamente alegórico, tal como o seu próprio título.
Características:
● "Predileção pelo rigor formal, expresso na busca pelo equilíbrio rítmico e métrico;
● Temas ligados ao Nordeste e às tradições afrodescendentes;
● Temas ligados à religiosidade católica;
● Aspetos surrealistas e simbólicos;
● Uso de metáforas e alegorias;
● Vocabulário sofisticado;
● Presença de paradoxos;
● Tendência à universalidade e à intemporalidade."
● Contexto histórico
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo foi ameaçado pela possibilidade de uma
guerra nuclear, iniciando assim a
Guerra fria, que polarizou o mundo em países capitalistas e socialistas, liderados pelos
Estados Unidos e União Soviética, respetivamente.
No Brasil, em 1954, Getúlio Vargas (1882-1954) cometeu suicídio e em 1956, Juscelino
kubitschek (1902-1976) assumiu a presidência e empreendeu uma política de
desemvolvimento econômico, tendo como uma de suas principais realizações a construção
da nova capital brasileira, Brasilia.
Na cultura, as estrelas do rádio eram idolatradas pelos brasileiros e brasileiras, além da
chegada da televisão em 1950 e a produção de filmes pelas produtoras Atlântida e Vera
Cruz. Filmes de Holywood também exerciam grande influência no país.
Esse contexto estimulou o crescimento do consumismo, com o materialismo e o
individualismo fazendo parte da cultura nacional. A poesia passou a ser mais material ou
objetificada enquanto na prosa e poesia, houve a busca por interação com o leitor ou leitora.
No entanto, o caráter experimental das obras literárias não era uma característica
valorizada em produtos culturais facilmente consumíveis, o que levou à valorização de
produtos de entretenimento a partir da década de 1950 Nesse sentido, as obras da terceira
geração acabaram sendo uma forma de resistência à cultura descartável e de consumo
rápido.
● Características da poesia de 45
- valorização da estrutura do poema
- crise sociopolítica
- texto engajado
- carácter realista
- linguagem objetiva
- uso de palavras do quotidiano
- oposição ao sentimentalismo
- metalinguagem
● Poesia da geração de 45
- Morte e vida serena (1955), de João Cabral de Melo Neto
- A ave (1956), de Waldemir Dias-Pino
- Lavra lavra (1962), de Mário Chamie
- Linguaviagem (1967), de Augusto de Campos
- Exercício findo (1968), de Décio Pignatari
- Júbilo, memória, noviciado da paixão (1974), de Hilda Hilst
- Poema Sujo (1976), de Ferreira Gullar
● Prosa da geração de 45
- Ciranda de pedra (1954), de Lígia Fagundes Telles
- Grande sertão: veredas (1956), de João Guimarães Rosa
- A hora dos ruminantes (1966), de José J. Veiga
- Fluxo-floema (1970), de Hilda Hilst
- O pirotécnico Zacarias (1974), de Murilo Rubião
- A hora da estrela (1977), de Clarice Lispector
Principais autores
● João Cabral de Melo Neto (1920-1999): conhecido como "poeta engenheiro", João
se destacou na prosa e na poesia pelo rigor estético apresentado nas suas obras:
Pedra do Sono (1942), O Engenheiro (1945) e Morte e Vida Severina (1955).
● Clarice Lispector (1920-1977): se destacou na prosa e na poesia com um caráter
lírico e intimista: Perto do coração selvagem (1947), A Cidade sitiada (1949), A
Paixão segundo GH (1964), A Hora da Estrela (1977).
● João Guimarães Rosa (1908-1967): foi um dos maiores poetas do Brasil, sendo que
a maioria de suas obras são ambientadas no sertão. Destacam-se Sagarana (1946),
Corpo de baile (1956), Grande Sertão: veredas (1956), Primeiras estórias (1962).
● Ariano Suassuna (1927-2014): Defensor da cultura popular brasileira, Suassuna
escreveu romances, peças de teatro e poesias dos quais se destacam: Os homens
de barro (1949), Auto de João da Cruz (1950), O Rico Avarento (1954) e O Auto da
Compadecida (1955).
● Lygia Fagundes Telles (1918-2022): escreveu romances, contos e poesias sendo
uma de suas marcas a exploração psicológica das personagens em sua obra:
Ciranda de pedra (1954), Verão no aquário" (1964), Antes do baile verde (1970), As
Meninas (1973).
● Jagunços
A violência é inerente à sociedade humana, incluindo a sociedade brasileira. António
Candido analisa a figura do jagunço desde Cláudio Manuel da Costa até Guimarães Rosa.
O jagunço deveria representar um bandido que se opõe à ordem estabelecida, mas na
realidade, é uma extensão de um poderoso (mandão) reconhecido pela própria ordem
estabelecida, que em essência é baseada em arbitrariedade. O próprio Estado pode ser
visto como um ator particular nesse contexto.
● Escrita rosiana
A obra de Guimarães Rosa tem sido amplamente estudada pela crítica literária, abrangendo
uma variedade de enfoques. No entanto, é percetível que alguns aspetos da sua obra têm
recebido maior atenção e análise por parte da crítica, como as questões metafísicas,
religiosas e filosóficas presentes em seus textos. Esses temas têm sido objeto de estudo e
discussão, refletindo a importância atribuída pelo corpo crítico à profundidade filosófica e
espiritual que permeia a escrita de Guimarães Rosa. É nesse contexto que a fortuna crítica
se concentra em explorar e interpretar essas dimensões metafísicas e existenciais
presentes na sua obra.
A construção das histórias de Guimarães Rosa e sua visão de mundo eram fundamentadas
em três fontes principais. A primeira era a experiência empírica, resultante de sua vivência
direta na região e no país. A segunda consistia em referências míticas e universais,
provenientes de sua leitura da literatura clássica e moderna. A terceira baseava-se em
fontes nacionais, tanto na tradição literária brasileira quanto nos estudos contemporâneos
de interpretação do Brasil, que estavam em plena efervescência na época.
Essa combinação de fontes proporcionava a Guimarães Rosa uma ampla gama de
inspiração e conhecimento, permitindo-lhe compor histórias ricas em perspetivas e
reflexões. A sua vivência direta da realidade brasileira, aliada à influência de mitos
universais e à compreensão das tradições literárias do país, contribuía para a originalidade
e a profundidade de sua obra.
Assim, Guimarães Rosa era capaz de tecer narrativas que capturavam a complexidade e a
diversidade da experiência brasileira, ao mesmo tempo em que dialogavam com temas
universais e com o legado literário tanto nacional quanto internacional. A sua abordagem
múltipla e fundamentada em diversas fontes conferia à sua escrita uma riqueza única,
estabelecendo-o como um dos grandes escritores da literatura brasileira.
● O sertão rosiano
Trazer o Sertão à tona é uma reformulação euclidiana ( a terra, o homem, a luta).
O Sertão rosiano é uma extensa e indefinida região que engloba o norte de Minas Gerais, a
partir de Cordisburgo ou Curvelo, estendendo-se até os chamados "Gerais", o território de
Brasilia e uma parte da Bahia. É uma área sem limites precisos, onde as pastagens se
estendem sem cercas, um espaço vasto e despovoado, propício para a criação de um
mundo mítico. Nesse contexto, o mundo urbano desaparece e a influência política perde
força diante da imensidão do sertão. O sertão é um laboratório de humanidade fora do
ambiente urbano.
Esse universo sertanejo retratado nas obras de Guimarães Rosa (como em Sagarana,
Corpo de baile, Grande Sertão: Veredas) tem suas raizes na narrativa regionalista, que teve
seu inicio com autores como Bernardo Guimarães e Simões Lopes Neto (Gaúcho), mas
ganhou força com o movimento modernista e a geração de 1930, representada por
escritores como Raquel/Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos, Jorge Amado e José Lins do
Rego. Guimarães Rosa, partindo desse contexto do romance regionalista, transcende o
mundo regional e afirma categoricamente que "o sertão é o mundo". De certa forma, ele
amplia as fronteiras do sertão, tornando-o uma dimensão transregional onde até mesmo os
grandes escritores como Goethe e Dostoiévski se tornam sertanejos.
- personagens
Severino, retirante.
Seu José, mestre carpina.
Ciganas.
Rezadeira.
Severino Lavrador.
● Enredo
São 18 trechos que compõem a obra:
1. O retirante Severino é metonímia de todos os brasileiros oprimidos, obrigados a
emigrarem por serem oprimidos do ponto de vista social.
2. No segundo trecho aparece o diálogo entre o Severino retirante e os carregadores
do corpo de Severino lavrador.
3. O terceiro trecho mostra a peregrinação do retirante Severino, a passar por vilas,
representadas como se fossem contas de um terço, sendo a estrada a sua linha, nas
proximidades do rio Capibaribe que chega a secar.
4. No quarto trecho, o retirante Severino encontra mais um funeral em que um homem
parodia as excelências do finado cantadas na cerimónia fúnebre.
5. No quinto trecho, o retirante Severino pensa em para a sua viagem e anda à procura
de um trabalho para sobreviver.
6. Severino retirante dialoga com a mulher à janela (rezadora de profissão), à procura
de emprego.
7. O retirante severina chega à zona da mata, rica em vegetação e água.
8. Severino retirante assiste ao enterro de um trabalhador.
9. O retirante Severino decide “apressar os passos” e continuar até chegar ao Recife.
10. Chegada ao Recife do retirante Severino/ conversa com dois coveiros
11. O retirante Severino aproxima-se do rio Capibaribe
12. Aproxima-se do retirante Severino o Seu José mestre carpina, morador de um
mocambo das margens do rio.
13. Uma mulher aparece na porta de uma casa e conta o que vai acontecer (natividade)
14. Chegada de homens e mulheres vizinhos (evocação de presépio)
15. Oferta de brindes para o recém-nascido
16. Entre os vizinhos, falam duas ciganas
17. Fala o povo que veio presentear o bebé
18. Seu José carpina fala a Severino, enaltecendo a força da vida