Você está na página 1de 11

Caos, Criatividade e Ambientes de Aprendizagem

Beatriz Regina Tavares Franciosi


PUCRS, bea@inf.pucrs.br

Marilú Fontoura de Medeiros


PUCRS, marilú@pucrs.br

Anamaria Lopes Colla


PUCRS, acolla@pucrs.br

Resumo – Nesse trabalho procuramos tematizar as seguintes perguntas: Existe diferença entre
ambientes e comunidades de aprendizagem? Como essas diferenças se instituem? Porque a
cooperação é tão importante no contexto de ambientes de aprendizagem? Como as tecnologias
podem ser mais eficientemente utilizadas no suporte aos ambientes de aprendizagem? Os
ambientes de aprendizagem necessitam de gerentes, orientadores ou mediadores? Qual o impacto
que as tecnologias de informação podem provocar no ambiente organizacional das instituições?
Em que medida as tecnologias de informação podem auxiliar gerentes, orientadores e mediadores
de ambientes de aprendizagem? Como planejar ambientes de aprendizagem? Como constituir
ambientes de aprendizagem? As reflexões apresentadas no texto, assim como outras questões
emergentes, constituem a síntese, mesmo que provisória, de uma série de diálogos estabelecidos
entre os autores assim como a fundamentação teórica da lógica rizomática de ambientes de
aprendizagem. Essa lógica é produto da conexão das lógicas do terceiro incluído e da
complexidade e sua compreensão pode ser facilitada segundo a ótica do caos. Esse trabalho
busca estimular outras pessoas a continuarem na busca de respostas para essas perguntas em
suas próprias mentes e com seus grupos de referência.

Palavras-chave: Ambientes de Aprendizagem; Mediação Tecnológica; Educação


a Distância.

Introdução
Quando conjuntos de dados são observados e um comportamento
óbvio/conhecido não pode ser identificado, esses dados são classificados como
caóticos. Em geral, esses dados projetam formas que possibilitam identificar um
atrator caótico (modelo de comportamento) e bifurcações (transformações radicais
de comportamento). Assim, se analisarmos o tempo segundo a ótica do caos, o
tempo é um múltiplo topológico sobre o qual fluem os eventos, em cuja superfície
a novidade constitui um atrator. O atrator puxa as coisas para si, mas não ao
longo de uma trajetória direta. Elas precisam seguir o curso do múltiplo topológico
do tempo; têm que entrar no labirinto, nos intrínsecos do vir-a-ser a fim de
alcançar o atrator.
O problema da flecha do tempo sempre fascinou nosso espírito. No nível
microfísico, ela caracteriza-se pela irreversibilidade do tempo. Por outro lado, o
nível macrofísico caracteriza-se pela reversibilidade do tempo, ou seja, um filme
rodado no sentido inverso produz as mesmas imagens que quando rodado no
sentido correto. Independente do nível micro/macrofísico considerado, a flecha do
tempo está associada à entropia e, portanto, ao crescimento da desordem.
Se considerarmos a flecha do tempo associada à variação da quantidade
de informação através dos tempos, constatamos uma alternância entre momentos
de alta e baixa entropia. Nos momentos em que o volume de inovação é alto, o
grau de entropia aumenta, a informação é degradada, a novidade se perde e há
uma tendência recidivista. Geralmente, esses momentos são seguidos por outros
onde o grau de entropia cai abruptamente e isso ocorre ao longo da esteira do
tempo até atingir um marco de estabilidade (ou marco zero). Então, a ordem se
restabelece, as coisas se estabilizam e grupamentos sociais emergem com
estados superiores de ordem devido à intensa sinergia necessária para superar
esses momentos. A superfície temporal fractal associada a essa flecha do tempo
define um múltiplo topológico que possibilita visualizar essa alternância de
momentos.
Ambientes de aprendizagem baseados em Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs) são naturalmente associados a uma estrutura organizacional
aberta em rede, onde o enfoque está na formação do ser humano enquanto
participante de grupos sociais. Neste ponto, a problematização fundamental que
se apresenta é a concepção da existência do outro, pois implica em mudanças do
próprio modo de funcionamento da subjetividade, já que inclui o questionamento
de uma certa concepção de mundo, de homem, de educação. A construção dessa
estrutura, assim como sua utilização, necessita de aportes bem específicos os
quais inclui o uso de uma superfície fractal temporal para auxiliar na compreensão
da alternância de momentos de alto e baixo grau de entropia. A alternância de
momentos é descrita por trajetórias cuja lógica é a lógica do terceiro incluído1, a
qual é capaz de promover a conciliação de opostos (Basarab, 1999). Para
compreender essa lógica é necessário admitir que existe mais de um nível de
Realidade, ou seja, os termos (A, não-A, T) são representados pelos ângulos de
um triângulo, onde um dos ângulos situa-se em um dos níveis de Realidade e os
outros dois em outros níveis de Realidade.
Segundo a lógica do terceiro incluído os opostos não são contraditórios; a
tensão entre os contraditórios promove uma Unidade mais ampla que os inclui.
Essa lógica não elimina a lógica clássica, ou seja, a lógica do terceiro excluído2
apenas limita sua validade, pois existem situações relativamente simples como,
por exemplo, o sentido permitido/proibido para circulação de veículos numa

1 A lógica do terceiro incluído baseia-se em três axiomas: (1) axioma da identidade: A é A; (2) axioma da
não-contradição: A não é não-A; (3) axioma do terceiro incluído: existe um terceiro termo T que é ao mesmo
tempo A e não-A.
2 A lógica do terceiro excluído baseia-se em três axiomas: (1) axioma da identidade: A é A; (2) axioma da
não-contradição: A não é não-A; (3) axioma do terceiro excluído: não existe um terceiro termo T que é ao
mesmo tempo A e não-A.
estrada que ninguém pensa em introduzir um terceiro sentido; e situações mais
complexas como, por exemplo, no campo social ou político no qual a lógica do
terceiro excluído age com uma verdadeira lógica de exclusão: direita ou esquerda,
homens ou mulheres, bem ou mal, certo ou errado. As limitações provenientes da
lógica clássica se originam da premissa de que o tempo é representado por um
vetor – flecha do tempo – onde os pontos representam sucessiva e
indefinidamente os momentos passados, presentes e futuros. O tempo torna-se
assim um simples parâmetro (da mesma maneira que uma posição no espaço)
que pode ser facilmente compreendido pelo pensamento e perfeitamente descrito
no plano matemático cartesiano. Essa simplificação ocorre à luz da hipótese de
existência de um único nível de Realidade e produz a impressão de que pares
antagônicos (A, não-A) são mutuamente exclusivos e, portanto, não podem existir.
O extraordinário da lógica do terceiro incluído é que tudo se esclarece
quando consideramos o papel do tempo, pois ela é capaz de promover a
conciliação dos opostos enquanto a lógica clássica é incapaz de fazê-lo. Os
opostos não são contraditórios; a tensão entre os contraditórios promove uma
Unidade mais ampla que os inclui.
Nesse texto, apresentamos o registro da trajetória percorrida pelos autores
na busca por ambientes de aprendizagem, que estimulem a participação e a
intervenção, ofereçam a possibilidade de ações independentes e cooperativas,
estimulem processos de pensamento, fomentem o pensar sobre o próprio
processo de aprendizagem, estimulem a resolução individual e coletiva de
problemas e, mais do que isso facilitem a aprendizagem para lidar com o
inusitado, com a instauração permanente de questões, pois mais do que
responder importa saber perguntar, levantar hipóteses, investigar e criar caminhos
que possibilitem o exercício de estratégias de convívio no mundo virtual. Esse
registro tem como cenário a superfície temporal fractal com seus múltiplos
topológicos associada à estrutura organizacional aberta em rede de ambientes
suportados pelo uso de tecnologias de informação e comunicação.

1. Existe diferença entre ambientes de aprendizagem e


comunidades de aprendizagem?
A aprendizagem é um processo social que pode ser experimentado de
diversas formas, intensidades e envolvimentos e se refere às qualidades das
intervenções cooperativas no processo de descoberta e transformação de
realidades. São processos que se instituem numa dinâmica configurada por
Deleuze e Guattari (1995), como “afetar e ser afetado”, “o deixar-se afetar”. Só
assim, pode-se operar com o outro, ter compaixão, no sentido de perceber e
entender o outro “com paixão” pelo outro e com o outro, estar com ele e sentir o
que o outro pode estar sentindo. Esse aspecto remete à noção de alteridade que
coloca em foco o efeito da existência do outro na intersubjetividade. Encontramos
em Rolnik (1992), a extrapolação do campo da física para dela extrair indicações
que possibilitam um entendimento de alteridade. O que constitui a alteridade,
propriamente dita, em nós e no outro é a condição de afetar e de sermos afetados
pelo outro – não só humano – tornamo-nos sujeitos e transformações irreversíveis
em nossa subjetividade. O encontro entre subjetividades tem por efeito perturbar a
ordem vigente nas subjetividades, provocando-lhes mudanças irreversíveis;
condição que se associa a de ser afetado nesse encontro, o que provoca o efeito
de desestabilizar, transformar também a própria ordem. Essa condição faz com
que a natureza de nosso ser seja fundamentalmente processual. A alteridade,
embora invisível, é real. O reconhecimento da alteridade implica uma dupla
abertura para o outro, uma mudança de perspectiva que mais do que uma simples
abertura intelectual, inclui tanto uma abertura para a alteridade como para a
natureza processual da realidade, objetiva e subjetiva e, passa a ser uma abertura
basilar da ordem dos afectos, manifestos em ambientes de aprendizagem.
O objetivo maior dos ambientes de aprendizagem é maximizar as
possibilidades de interação entre os participantes de um grupo a fim de que seja
possível o desenvolvimento de ações compartilhadas, onde todos são
simultaneamente professores-e-alunos.
Uma comunidade de aprendizagem é um caso particular de comunidades
virtuais (ou comunidades online). Essas comunidades são constituídas por grupos
de pessoas com interesses/necessidades em comum, pouca ou nenhuma
intenção de estabelecer uma rede social e que se comunicam através de
ferramentas de comunicação mediada por computador como, por exemplo, correio
eletrônico, www, lista de discussão.
As comunidades virtuais se distinguem entre si a partir de seus objetivos;
não possuem um espaço físico definido; oferecem acessibilidade permanente
através de um endereço na Internet; caracterizam-se por responsabilidade
compartilhada, existência de regras, participação permanente, garantia de
privacidade, postura ética; sua memória é a rede neural formada a partir das
memórias dos seus componentes e a permanência de seus membros está
diretamente associada à observância às regras dessa comunidade, assim como a
instauração de novas redes e regras. A estratégia para sua implantação pode
variar dramaticamente de acordo com fatores como idade, atitudes e sistema de
crenças, além de outros fatores gerados pelo próprio grupo ou pelos
acontecimentos que os envolvem. A forma como as comunidades virtuais se
constituem também é bastante variada, mas consiste basicamente da criação de
espaços próprios de identidades do grupo, promoção de lideranças, definição de
normas/código de conduta, incentivo a formação de subgrupos, negociação
visando resolver disputas internas. Como um rizoma, essas comunidades se
instauram, se multiplicam, involuem, criam devires inusitados, instauram novas
redes, propondo outros traçados até então não visitados ou conhecidos. A riqueza
da comunidade é dada pelo seu devir, sua vontade de potência como desafio e
deflagrador de antigos e novos acontecimentos nos ambientes de aprendizagem.

3. Porque a cooperação é tão importante no contexto de


ambientes de aprendizagem?
Para Maturana (1990), a cooperação é fundamental na maneira humana de
viver, pois é uma característica da vida cotidiana fundamentada na confiança e no
respeito mútuo. E nesse sentido, as relações de trabalho focadas nos seres
humanos são de fato, relações sociais, porque não negam o humano nas relações
de trabalho. Sempre que existe cooperação recuperamos o senso de participação
e responsabilidade, tomamos consciência de ser parte-e-todo, colaboramos para a
transformação de barreiras em pontes e de adversários em solidários.
Processos baseados na cooperação se caracterizam por objetivos comuns,
ações compartilhadas, benefícios para todos, e pressupõem contato, respeito
mútuo, confiança, liberdade, recreação, diálogo, paciência, entusiasmo e
continuidade, afetos que se tocam e se trocam. A base de sustentação desses
processos é formada pela convivência-consciência-transcendência. A convivência
refere-se à vivência compartilhada. Por sua vez, a consciência ao clima de
cumplicidade; incentivo a refletir sobre a vivência e sobre as possibilidades de
modificar comportamentos e relacionamentos, na perspectiva de melhorar a
participação, o prazer e a aprendizagem. Finalmente, a transcendência ajuda a
sustentar a disposição para dialogar, decidir em consenso, experimentar
mudanças e interagir no jogo das transformações desejadas. Não se exclui, nessa
abordagem o dissenso, o debate, o enfrentamento do conflito, desde que em
bases argumentativamente sustentadas (Habermas, 1996).

4. Como as tecnologias podem ser mais eficientemente utilizadas


no suporte aos ambientes de aprendizagem?
O uso integrado de Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs)
possibilita a utilização de recursos síncronos/assíncronos para veicular a
informação através da mídia impressa, escrita e falada. Por outro lado, a
utilização de TICs não garante a constituição de ambientes de aprendizagem. É
necessário dispor de um projeto de ambiente idealizado segundo uma lógica
dialógica que busca uma sinergia entre visão-e-ação, teoria-e-prática, sonho-e-
realidade, todo-e-parte, individual-e-coletivo, cada um-e-consigo mesmo. Inclui a
proposta de espaços que, também, extrapolem ações dicotomizadas, polarizadas;
no lugar instalam-se multiplicidades. A dimensão de ambientes de aprendizagem é
obtida quando o professor desempenha o papel de gerente/orientador/mediador e
isso se consolida no momento que os processos de comunicação se estabelecem,
pois instauram-se ações de multiplicidade, de co-autoria, de operar com o outro.
A existência de ambientes de aprendizagem mediados por TICs busca
ancoragem nos conceitos de groupware3, CSCW (Computer-Supprted

3 Software projetado para permitir que grupos, eletronicamente conectados, organizarem suas atividades. Essa
conexão pode ocorrer através da Intranet (operação provada de Internet de acesso restrito a uma organização e
cujos protocolos de comunicação são os mesmos da Internet), de uma Internet ou de uma Extranet (redes de
computadores com dispositivo de segurança/senha que possibilita a comunicação apenas entre os membros de
um grupo restrito). Esse software facilita a organização de encontros e a alocação de recursos; contatos
Cooperative Work)4 e CSCL5 (Computer-Supported Collaborative Learning). A
coordenação desses ambientes baseia-se na percepção de informações que
fluem entre os participantes e isso só ocorre quando um processo de comunicação
se estabelece através de uma plataforma de groupware (comunicação
síncrona/assíncrona mediada por computador). O conceito de CSCW é utilizado
para agregar ao ambiente a possibilidade de trabalho cooperativo, no qual a
informação gerada é coletada e apresentada para ao grupo através de
mecanismos de comunicação e cooperação – comunidade virtual. A possibilidade
de transposição do modelo de ambiente centrado em atividades (ambiente de
ensino) para modelo de ambiente centrado em processos (ambiente de
aprendizagem) ocorre através do uso do conceito de CSCL, baseado na teoria
sociocultural (Vygotsky); do reconstrutivismo6, construtivismo7 e da auto-regulação
da aprendizagem; da cognição e aprendizagem baseada em superação de
problemas, focando-se na aprendizagem de lidar com questionamentos, com o
engendramento de questões outras que nos façam avançar para outros
patamares, platôs; da flexibilidade cognitiva (Salomon); da cognição distribuída –
que vem a configurar, em sua multiplicidade, uma comunidade virtual de
aprendizagem.

5. Os ambientes de aprendizagem necessitam de gerentes,


orientadores ou mediadores?
Os ambientes de aprendizagem contêm em si, de uma forma emergente, as
figuras de gerente, mediador, orientador. Essas figuras se intercalam, dependendo
dos acontecimentos engendrados pelo próprio grupo ou pelas condições e modos
de sua existência. Entretanto, a organização de ambientes de aprendizagem
pressupõem um professor que cumpre, pelo menos como deflagrador, esses
papéis.
De uma forma mais estruturada, o professor é considerado mediador das
atividades livres ou espontâneas enquanto as atividades dirigidas ou focadas
requerem um orientador que intervém nas atividades, propondo desafios,
colocando dificuldades progressivas para promover o desenvolvimento e fixar a
aprendizagem.
Enquanto mediador das propostas paradigmáticas, a ação do professor é
transitiva, não reflexa (não se volta sobre si mesma), com vistas a possibilitar a
preparação do campo para a análise dos participantes do grupo e a interação com

através de correio eletrônico; distribuição de arquivos e proteção com senha de documentos que serão
compartilhados.
4 Rede de computadores planejada para suportar o trabalho em grupo, onde o foco das atenções está nas
estratégias de comunicação.
5 Redes de computadores planejadas para suportar o trabalho simultâneo de vários grupos, cada um dos quais
com objetivos bem definidos, e cujo foco das atenções está no que está sendo comunicado.
6 Monteiro( ), Ibanez Garcia ( ) afirmam...
7 ...
o grupo a fim de desencadear ações (tentativa para "garantir" a ação significativa
dos sujeitos) nas quais, também está imerso. Nessa transitividade, o papel de
sujeito transversaliza-se entre os participantes. Assim, sua ação visa: provocar,
dispor e interagir.

A ação do professor enquanto gerente/orientador/mediador de ambientes de


aprendizagem é baseada em um plano de gestão da informação e comunicação.
Essa gestão se instaura como um processo que privilegia dimensões
socioeducativas. Como tal pressupõe ações para além da informação, as quais
buscam a instauração de comunidades de aprendizagem como comunidade de
comunicação. Essas ações comunicativas instauram-se quando há a presença ou
construção de pressupostos de simetria de fala, de não coação na proposição de
argumentos racionalmente válidos, de uma disponibilidade para fazer-se entender
nesses grupos de iguais-diferenciados. Além disso, pressupõe a possibilidade de
tematizações, de negociação, renegociação e reinstalação de verdades dos fatos,
de autenticidade das expressões e de justiça das normas, como busca
permanente da legitimidade (Habermas, 1996).

6. Qual o impacto que as tecnologias de informação podem


provocar no ambiente organizacional das instituições?
A inclusão de tecnologias de informação no ambiente organizacional das
instituições remete a um novo paradigma - não só tecnológico. Nessa dimensão
múltipla, pressupõe o atentar à velocidade das mudanças e possibilitar a transição
do modelo de estrutura organizacional hierárquica fechada para aberta em rede.
O verdadeiro poder da tecnologia não está em fazer antigos processos
funcionarem melhor, mas em permitir que as organizações rompam com as
antigas regras e criem novas formas de trabalho. Essas novas formas de trabalho
remetem para o desenvolvimento de processos baseados na cooperação e cuja
base de sustentação é formada pela convivência-consciência-transcendência, ou
seja, vivência compartilhada-reflexão sobre as vivências-experimentar mudanças.
Isso ocorre através de uma estrutura organizacional aberta em rede onde é
possível perceber a alternância de momentos de alto e baixo grau de entropia, os
quais definem trajetórias que descrevem um múltiplo topológico fractal temporal. A
lógica associada a essas trajetórias é a lógica do terceiro incluído que é uma
lógica multivariante com três valores (A, não-A, T) e não contraditória. Essa lógica
remete à premissa de que existe mais do que um nível de Realidade onde é
possível a conciliação de opostos (A, não-A) através de um estado T que está
situado em um outro nível de Realidade e que constitui uma Unidade mais ampla
que os inclui. Essa lógica inclui a lógica clássica na qual os antagônicos não
podem ser conciliados, pois não é possível um estado T´, no mesmo nível de
Realidade que a dos opostos A e não-A, que realize essa conciliação. É algo do
tipo “isto e aquilo” no lugar de “isto ou aquilo”.
Assim, as Tecnologias da Informação alteram a abordagem do tempo, ou
seja, o tempo deixa de ser apenas um parâmetro é passa a ser um múltiplo
topológico através do qual fluem os eventos e em cuja superfície é possível
identificar atratores e bifurcações.
Os sistemas para gerenciamento de ambientes de aprendizagem
atualmente disponíveis combinam ferramentas de sistemas de informação com
ferramentas/serviços da Internet. Dessa forma, esses sistemas oferecem tanto
mecanismos de comunicação, quanto de coordenação e cooperação. Segundo
Franciosi (2002), “Os mecanismos de comunicação fornecem a ferramenta www
(hipertexto) e os serviços de correio eletrônico (e-mail), fórum e bate-papo (chat).
Os mecanismos de coordenação incluem espaço para avisos (mural), publicação
de tarefas, pré-testes com feedback imediato. Por sua vez, os mecanismos de
cooperação fornecem meios para a autoria coletiva, além de serviços como
Biblioteca Digital”. Os sistemas para gerenciamento de ambientes de
aprendizagem consideram diferentes níveis de usuário – administrador, instrutor,
professor, tutor, aluno – os quais têm visões diferenciadas do ambiente.

7. Como planejar ambientes de aprendizagem?


A modelagem do ambiente de ensino toma por base o plano de curso
tradicional, o mapa conceitual associado e a proposta de ensino. Franciosi (2002)
propõe um framework para modelagem de ambientes baseados no uso de mídias
integradas, no qual o hipertexto do ambiente de ensino é produzido (página web
que inclui ferramentas de comunicação mediadas por computador); os recursos
utilizados para constituição de comunidades são acoplados a esse ambiente
(modos de produção, relações de produção, situações de aprendizagem);
ambientes favoráveis ao estabelecimento de processos de cooperação são
delineados. Basicamente, os ambientes favoráveis ao estabelecimento de
processos de cooperação são delineados a partir de espaços de trabalho
coletivo/individual e de debates mediados pelo professor.
Propostas de ensino que enfatizam a aprendizagem remetem para uma
estrutura organizacional do tipo aberta em rede e, nesse caso, o ambiente
associado muda dinamicamente na medida em que o processo de comunicação
se estabelece, a cooperação se consolida e o equilíbrio entre a auto-regulação do
grupo e os objetivos do ensino são estabelecidos. Pela natureza dessa estrutura
organizacional, a modelagem de ambientes associada não pode ser vista como
um seqüenciamento de processo com início-meio-fim. Ela se caracteriza como um
ciclo de produção baseado na pré-produção::produção::pós-produção, segundo
uma lógica dialógica que busca uma sinergia entre cada parte-e-todas as partes e
na qual o mapa de navegação é construído pelo usuário em sua interação
dinâmica e fluída. Essa interação chega a um termo de criação, de devires, de
aprendizagem quando há troca intensa entre os autores e co-autores do processo
(Deleuze, 1995).
O suporte tecnológico desses ambientes inclui o uso de sistemas de
groupware orientadas ao CSCW, mas que no momento da avaliação da dimensão
de aprendizagem são orientadas ao CSCL.

8. Considerações finais
Nesse trabalho, falamos de um local que pressupõe a constituição de uma
cultura de utilização de TICs na realidade educacional brasileira. É desse lugar,
dessa plataforma, desse ângulo que falam os autores deste trabalho. É também
na linha defendida por Azevedo (2001) ao apresentar processos e pressupostos
na constituição de ambientes de aprendizagem de cursos na modalidade a
distância. Os mitos, preconceitos e as certezas tão arraigadas numa relação de
ensino presencial ficam tensionados quando se penetra no universo virtual que, o
qual possui outros regimes de sentido, potencializa práticas (e seus pressupostos)
que fazem parte do dia-a-dia da profissão docente face as problematizações e
campos de existência presentes na modalidade de educação a distância. Muito
mais que buscar soluções para problemas, importa-nos a criação de dilemas,
problematizações e práticas, acontecimentos que emergem no cotidiano
(Foucault, 2000; Cardoso, 2001).
A vivência dessa proposta têm-nos possibilitado considerar a idéia de
Maturana e Varela (1995), quando dizem: “aquilo que acontece em um sistema,
num dado momento, depende de sua estrutura nesse momento”. O enfrentamento
das contradições, das ambigüidades, das dúvidas, das certezas, expostas em nós
mesmos e as situações paradoxais com que nos deparamos, nas minúcias do
cotidiano, nos fazem experienciar um processo de auto-produção no qual somos,
ao mesmo tempo produtor e produto.
Mas, onde queremos chegar apresentando processos de apropriação
tecnológica, entendimentos sobre ambientes de aprendizagem, bases
organizacionais não usuais associadas a lógicas não convencionais, enfoques
distintos sobre cooperação? Bem, talvez a um espaço neutro de forças cósmicas
ou a uma dobra temporal onde co-habitem Gaia, Caos e Eros – enquanto
conceitos de terra, céu e espírito, respectivamente – possibilitando a reconciliação
entre ciência e espírito através da revolução de nossa visão sobre como as
Tecnologias de Informação e Comunicação podem contribuir para a revolução da
educação. Ou quem sabe, introduzir, assim como Henri Bergson (1992), o
conceito de evolução como criatividade, como criação em movimento
potencializado pelas Tecnologias de Informação e Comunicação. Não existe
resposta única para essa pergunta, pois à semelhança dos princípios quânticos,
segundo os quais o tempo é uma sucessão de resultados diferentes e maleáveis,
buscamos apenas lembrar a todos de que as possibilidades de uso de tecnologias
são, na verdade, determinadas por escolhas coletivas e que ao tomarmos juntos a
mesma decisão, muitos indivíduos ampliam seu efeito, aceleram seu resultado e
criam outras potências, sempre políticas, sempre carregadas de intenções, assim
como de limiares de tensões.
Referências
ABRAHAM, Ralph; MCKENNA, Terence; SHELDRAKE, Rupert Caos, Criatividade e o Retorno
ao Sagrado. São Paulo: Editora Pensamento Ltda, 1992.
ALMEIDA, Cláudia Zamboni de; VIEIRA, Martha Barcellos; LUCIANO, Naura Andrade Ambiente
Virtual de Aprendizagem: uma proposta para autonomia e cooperação na disciplina de informática.
In: Simpósio Brasileiro de Informática na Educação (SBIE), XII, Fortaleza, 2001. Anais.
AUDY, Jorge Nicolas Gestão da Informação. Porto Alegre: PUCRS/FACIN, 1997.
AZEVEDO, Wilson. Capacitação de recursos humanos para educação a Distância.
Palestra apresentada em encontro promovido por teleconferência pelo Conselho de Reitores de
Universidades Brasileiras (CRUB), novembro de 2001. Disponível em
http://www.aquifolium.com.br/educacional/artigos/crob.html. Acessado em: 20 de agosto de 2002.
BASARAB, Nicolescu Manifesto da Transdisciplinaridade. São Paulo: TRIOM, 1999.
BEHAR, Patrícia Alejandra: KIST, Silvia de Oliveira, BITTENCOURT, Juliano
ROODA-rede cOOperativa De Aprendizagem. Revista Informática na Educação Teoria Prática.
Porto Alegre: v.4, n.2, p.87 - 96, 2001.
BROTTO, Fábio Otuzi Jogos Cooperativos: os Jogo e o Esporte como um Exercício de
Convivência. São Paulo, Santos: Projeto Cooperação, 2001.
CARDOSO, Irene. Crítica do presente. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2001.
CHAVES, Maria Cecília dos Santos. Fatores importantes para desenvolvimento de cursos on-
line. http://sites.uol.com.br/cdchaves/fatores_desenvolvimento.htm Acesso em: 1998.
COELHO, Maria Inês de Matos. Educação a distância, comunicação mediada por computador e a
comunidade de aprendizagem: Explorando a prática para formação-ação de docentes. Trabalho
completo no WIE 2000-VI Workshop De Informática Na Escola, No Xx Congresso Nacional Da
Sociedade Brasileira De Computação, em Curitiba (PUC-Pr) de 17 a 21 de julho de 2000. (em
CD-ROM), 2000.
DELEUZE, Gilles Imagem-Tempo. Rio de Janeiro: Editora Brasiliense, 1990.
DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. O que é filosofia. Rio de Janeiro: Ed 34, 1995b.
DELEUZE, Gilles e PARNET, Claire. Diálogos. São Paulo: Escuta, 1998.
FOUCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade. Rio de Janeiro: Martins Fontes, 2000.
FRANCIOSI, Beatriz Regina Tavares; MEDEIROS, Marilú Fontoura de; VARGAS, Rubem;
PERNIGOTTI, Joyce; MARQUES, Juracy ; COLLA Anamaria Lopez Experiência de
Modelagem de Ambientes de Aprendizagem da PUCRS VIRTUAL In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE
INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO (SBIE), 5-8/novembro, São Leopoldo/RS, 2002.
HABERMAS, Jürgen. Facticidade e validade. Direito e democracia. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1996.
MATURANA, Humberto Emociones y Lenguaje en Educacion y Politica. Santiago: Hachete,
1990.
MATURANA, Humberto A Ontologia da Realidade. Belo Horizonte: UFMG, 2003.
MATOS COELHO, Maria Inês. Dilemas práticos do educador on-line: exploração do saber e
do fazer docentes. Disponível em: <http://netserv.em.com.br/teiaweb/dilemas.htm>. Acessado em
7/08/2002.
MEDEIROS, Marilú Fontoura de; HERRLEIN, Maria Bernadette Petersen. Conceituando
ambientes de aprendizagem. Porto Alegre, PUCRS VIRTUAL, 2003a.
PANITZ, Ted. A definition of collaborative vs cooperative learning. Disponível em:
<http://www.lgu.ac.uk/deliberatios/collab.learning/panitz2.html>. Acessado em: 1996
ROLNIK, Suely A Sombra das Cidades. São Paulo: Escuta, 1992.
SENGE, Peter M. A. Quinta Disciplina: arte, teoria e prática da organização de
aprendizagem. São Paulo: Best Seller, 1994.
TAVARES, Kátia .C.A. Discutindo a formação do professor on-line: de listas de habilidades
docentes ao desenvolvimento da reflexão crítica. Disponível em:
<http://www.educarecursosonline.pro.br/artigos/reflex.htm>. Acessado em: 27/1/2003
TIJIBOY, Ana Vilma; MAÇADA, Débora Laurinó; SANTAROSA, Lucila Maria Costi e FAGUNDES,
Léa da Cruz. Aprendizagem cooperativa em ambientes telemáticos. Revista de Informática na
Educação: teoria e prática. V.2, no 1, p. 19-28, Porto Alegre, maio, 1999,
VALENTINI, Carla B. Interações em um ambiente virtual de aprendizagem: análise de uma
experiência em graduação. Disponível em <http://www.cogeae.uol.com.br/rbpi/artigos/valentini.rtf>
Acessado em: 20 de janeiro de 2003.

Você também pode gostar