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a ST URCA Rr AA

2(091)
ALVARO DEMONTA

ORLA,
BAR PORA
UADRINHO]
Prefácio

Hs um tempo atrás, em 1958, encontrei com Álvaro de Moya pela primei-


ra vez em Nova Iorque... Fomos apresentados por André Leblanc, que esta-
va trabalhando comigo em vários projetos há muitos anos. Nossa simpa-
tia foi instantânea. Não apenas o inglês de Alvaro tinha um estilo muito
americano como seu humor e sua perspectiva eram igualmente universais. E
assim falamos sem parar horas a fio. Lembro de ter-me surpreendido com a
informação que ele me dava de que meu trabalho era muito bem aceito em
países latinos. Foi através dele que percebi o fato de que a essência das mi-
nhas histórias, minha visão sobre a condição humana, era aparentemente
compreendida na íntegra e podia transcender a barreira linguística. Seus co-
mentários síngelos, por fim, me ajudaram a entender por que eu sempre
sentira uma “afinidade” com os leitores latinos. Chegamos até a sonhar em
nos aventurarmos num projeto editorial brasileiro que (talvez sabiamente)
jamais se concretizou. Mesmo assim, meu trabalho continua sendo publica-
do no Brasil.
Mantivemos um contato íntimo, ainda que a longa distância, durante
os anos 50 e até estivemos juntos durante o Festival de Histórias em Quadri-
nhos realizado em Avaré, perto de São Paulo. Ele foi o canal através do qual
meu relacionamento com vários artistas brasileiros dos cozz:cs pôde se estrei-
tar e, ao mesmo tempo, conquistou meu profundo respeito por sua com-
preensão da literatura e da forma de arte que surgiu com os quadrinhos.
Agora, hoje, estamos chegando à “idade madura” da arte de desenhar
e escrever quadrinhos. Considero muito importante que alguém com a so-
fisticação e a experiência de Álvaro nesta área esteja se preparando para a ta-
refa de produzir uma História da História em Quadrinhos.
Para aqueles entre nós preocupados com uma qualidade sempre supe-
rior, que poderá conduzir a uma nova e excitante época no mundo dos qua-
drinhos, é fundamental obter um panorama claro de onde já estivemos.
Eu admiro o esforço e a contribuição de Álvaro.
Will Eisner
5 de novembro de 1986
A crise dos quadrinhos

Rr é preciso admitir que os quadrinhos estão em crise. Des-


de o início de 1974, com o surgimento da crise de energia, de petróleo e,
principalmente, do papel, os quadrinhos atravessam uma crise sem prece-
dentes, desde o advento da tevê.
O que é uma pena, pois os cozxics surgiram no fim do século passado,
no mesmo ano que o cinema. Mas, enquanto a invenção dos Lumiêre foi
saudada como a sétima arte desde o princípio, com Méliês, Griffith, Eisens-
tein e Chaplin, os quadrinhos foram ignorados. Houve uma campanha con-
tra, atribuindo às historietas a criminalidade infanto-juvenil. Diziam que as
crianças se desinteressavam dos estudos e da leitura. Chegou a haver um cli-
ma de perseguição e proibição. O Fahrenheit 451 dos gibis.
Às primeiras obras-primas dos quadrinhos e seus precursores foram con-
troversas e provocaram reações contrárias. Somente em 1929 o escritor Gil-
bert Seldes escreveu o primeiro e único artigo a favor dos quadrinhos, elo-
giando Krazy Kat, de Herrimann.
Foi só na década de 60 que os europeus descobriram os quadrinhos e
eles invadiram as universidades, os livros “sérios”, os museus e, em pouco
tempo, estava na moda revelar-se um velho fã de velhos personagens.
Os quadrinhos fantásticos, de ficção científica, de soap opera, passa-
ram a resolver problemas graves tidos como insolúveis pela Nasa, em Hous-
ton. À relação dos quadrinhos com as crianças e os adultos foi amplamente
estudada. E os primeiros trabalhos sectários sobre o tema se tornaram estu-
dos científicos, feitos para a Unesco, tentando utilizar a linguagem dos co-
macs para fins educacionais. Os cientistas chegaram a medir a retina das
crianças diante dos efeitos da onomatopéia para determinar quais quadros
provocavam maior reação e poderiam ser utilizados em livros didáticos. Ao
contrário dos que acusavam os quadrinhos de deixarem as crianças desleixa-
das, os comics provocavam uma reação imediata nos petizes. Essas pesquisas
provaram a utilidade da linguagem das historietas para fins de resposta
pronta do intelecto infanto-juvenil.
A bênção cultural européia aos coznics fez com que surgisse, com gran-
de atraso, uma cozic-mania, um culto internacional ao gênero, pois o peso
cultural da Europa autorizou o reconhecimento da importância desse meio
de comunicação internacional, que quebrava barreiras de línguas para im-
por uma linguagem universal.
Essa linguagem universal, durante quase um século, criou mitos mo-
dernos, personagens que ultrapassaram sua origem, sobrepujando barrei-
ras de línguas, religiões, costumes, universalizando desenhos, onomato-
péias, balõezinhos, cores, expressões idiomáticas e figurativas, narrativas ori-
ginais, raios e trovões, exclamações e interrogações.
Principalmente, tornaram nosso mundo menor, mais próximo e mais

ep
unido e, principalmente, mais humano e ridículo. Através do humor, do ri-

co
so, da aventura, do heroísmo, das boas ações, do bem contra o mal, da luta
pela justiça contra a injustiça, dos pequenos contra os fortes e poderosos, os
quadrinhos lutaram para construir um mundo melhor e mais justo social-
mente.
Que seja superada a crise de energia, do papel, da convivência com a te-
levisão, de democracia e de liberdade existente no mundo, num momento
em que os valores são postos em dúvida. Que os quadrinhos superem sua cri-
se e consigam continuar a satirizar e criticar nosso mundo e seu habitante A HISTÓRIA DA HISTÓRIA
mais criticável: o homem.

Álvaro de Moya EM QUADRINHOS

ca
End
M. VIEUX-BOIS
Rudolph Topffer

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Raj PM desiludidoIs,
o,
; € cai doente.

talento e de espírito!* Goethe lia aos poucos para ''não ter uma
indigestão de idéias.”' Tópffer criou também Festus, Jabot, Cré-
pin, Pencil e Albertus. a

11
TA dd MAN X
TOPFFER

reminiscências de sua infância e juventude, e Voyages en Zigzag, 1845, uma


Ilustrador e escritor descrição, com suas próprias ilustrações, de viagens pelas encostas das mon-
tanhas suíças. Seus contos, reunidos em 1841 numa antologia intitulada
— precursor dos quadrinhos — Nouvelles Gênevoises, lhe trouxeram muitas críticas favoráveis e prestígio pes-
soal.
elogiado por Goethe Sendo um literato de sucesso (em quem Xavier de Maistre via seu su-
cessor), dedicou-se a meia dúzia de histórias em imagens posteriormente
publicadas sob o título de Histoires en Estampes, em 1846-47. Esse trabalho
No ano de 1979 passou desapercebido que o artist foi feito nos intervalos de sua profissão de pedagogo, despretensiosamente.
a suíço Rudolph
Tópffer (1799-1846) completava 180 anos da data de Mas lhe valeram os elogios de Goethe. O ilustre escritor escreveu, com efeito,
seu nascimento. Não
obstante, é um dos mais importantes ilustradores que em Tópffer “*...é preciso admirar os motivos múltiplos que sabe expor
do mundo, tendo seu nome
ligado ao de Hogarth, Doré, Busch e Christophe, como um dos precu em poucas figuras... Ele humilha o inventor mais fértil em combinações e
da história em imagens, e tendo sido elogiado por Goeth rsores
e. podemos felicitar seu talento nato, alegre e sempre disposto”. Goethe amou
Em 1816, um rico armador inglês acompanhou o pinto um dos primeiros trabalhos, estes pequenos álbuns que ele lia de dez em dez
gang Adam Tópffer, o pai, na Inglaterra, onde encon r suíço Wolf-
trou e levou para a Suí- páginas, “para não ter uma indigestão de idéias”.
ça o gosto pelas gravuras. Com efeito, nos anos segui Tópffer, no seu Annonce de [Histoire de M. Jabor, em 1837, explicava
ntes publicou diversas
pranchas onde se podia ver camponeses e vilarejos numa que seu livrinho é de natureza mista. “Ele se compõe de uma série de dese-
cidadezinha qual-
quer, parados, observando uma loja de venda de estam nhos
autografados em traço. Cada um destes desenhos é acompanhado de
pas. Gerárd Blan-
chard escreve que esta cena, à exceção de alguns detalhes uma ou duas linhas de texto. Os desenhos, sem este texto, teriam um signifi-
folclóricos, poderia
se passar em Londres, Paris ou Genebra. cado obscuro, o texto, sem o desenho, nada significaria. O todo, junto, for-
| Oescritore artista suíço, de língua francesa, Rudolph ma uma espécie de romance, um livro que, falando diretamente aos olhos,
Tópffer, o filho
tinha dezoito anos na ocasião e ficou vivamente maravilh comme mmemmas mia
seexprime pela representação, não pela narrativa. Aqui, como um conceito
ado com as estam-
pas inglesas, especialmente as de William Hogarth fácil, os tratamentos de observação, o cômico, o espírito, residem mais no es-
(1697-1764), entre elas
Hartot 5 Progress. E Rudolph escreve: boço propriamente dito, do que na idéia que ocroguis desenvolve”.
No século passado, um homem de gênio, Hogar Ele explicava a gênese dos personagens como nascidos à sorte dos rabis-
th, grande artista
mas sobretudo grande moralista, publica diversas séries cos, no papel, para quebrar o tédio, na confusão das linhas, descobrindo
de gravuras forman-
do dramas completos...” Nota que, num discurso em uma cabeça, um personagem. (Da mesma forma que Victor Hugo utilizava
que se vê a fisionomia
€ Os gestos, estes importam mais do que o que é falado, a sorte para tirar de seu escrito suas figuras fantásticas.Já Honoré de Balzac
e acrescenta: “Por-
tanto, é próprio das estampas reunir, num alto nível, estas desenhava seus personagens, para depois descrevê-los literariamente.) Ele
diversas condições
de ação, de reduzir toda proposição em imagens de vida, vai mais longe, imaginando o nome, a idade, as preocupações, os pais, a fa-
do raciocínio em espetáculo animado, distinto, lumin
de transformar to-
oso: de reunir todos os mília e... “toda uma epopéia saída bem menos de uma idéia preconcebida
elementos com uma eloqiiência simples, grosseira, que deste tipo nascido de sua própria sorte”. Todos os heróis de Tópffer es-
mais apropriadamente
maravilhosa à natureza e ao lazer dos espíritos tão à procura de algo aparentemente simples, mas que acaba provocando ca-
brutos e sem cultura”
E Rudolph pretendia ser pintor, como seu pai, tástrofes: é o objeto amado porM. Vieuxbhois (1827), o cometa do Dr: Festus
VISÃO assim não o permitiram. Depois de estud mas seus problemas de
ar em Paris, lecionou em di- (1829), a liberdade de caçar borboletas de M. Cryptogame (1830), o nasci-
Em escolas em Genebra e era titular de retóri mento de M. Jabor (1831), um sistema educativo para as crianças de M. Crépim
ca na Academia de Belas-
(1837) ou um estado social para A/bert (1844). Tópffer, com uma lógica de-
Mi, mo o filho, ficara famoso como escritor com trabalhos fascinantes mente, encadeia em desenhos as causas e os efeitos, o que dá ao seu trabalho
O La Bibliotêque de Mon Oncle, 1832, eLe Presbytêre, um ritmo sôfrego, mecânico e impiedoso, que reduz os personagens a nada
1839-46, ambos
mais do que bonecos na vida cotidiana diante dos problemas comuns.
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13
o TR ralo ao a Vo

Em 1840, Tópffer publicou simultaneamente duas versões de seu Dy.


JUCA E CHICO
Festus. Depois de ter realizado com grande sucesso um trabalho em ima- Wilhelm Busch
gens, deu uma versão literária, uma espécie de tradução. Ele procurou o seu
equivalente literário do humor gráfico num processo que deve muito aos
humoristas ingleses, em particular a Lawrence Sternes (1713-1768), onde
imita as digressões de T'ristam Shandy. Ao lado do contista convencional de
Voyages en Zigzag e através de Surprenantes Absurdités, revelou-se um hu-
morista que se aventurou por caminhos em que Lewis Carroll (1832-1898)
será o mestre incontestável.
Rudolph Tópffer escreveu, em 1840, que lamentava, em Sainte-Beau-
ve, que desenhistas hábeis e fecundos como Daumier ou Gavarni, seus con-
temporâneos, não tivessem trabalhado em histórias em imagens: “Eles fize-
ram continuações, isto é, faces diferentes duma mesma idéia; são coisas de
pedaços em pedaços, não de coisas ligadas por um só pensamento”
Seriam os artistas mais jovens, de outra geração, como Cham, Stop,
Léonce Petit ou Gustave Doré (1823-1883), que ensaiariam a continuação,
baseados nos traços do genebrino, nos jornais-para-rir, ou nos álbuns que
publicavam os vendedores de estampas.
Os primeiros álbuns tópfferianos de Cham (1818-1879) são os mais
pessoais. O próprio Tópffer felicitou seu jovem discípulo e mesmo o autori-
zou, em 1845, a gravar o seu Cryptogame. Mas, apesar de todas as aplica-
ções, esta edição não passa de uma traição do original, de uma contrafação.
Os desenhos de literatos não tinham o prestígio que têm hoje. Grava-
dores profissionais, desrespeitosamente, coptavam desenhos de artistas para
ilustrar livros que imprimiam, trazendo desenhos de viagens de outros paí-
ses. Já existia no século XIX uma estandardização dos estilos como hoje, nos
quadrinhos, com seus códigos próprios. Uma ““constante”” de imagens in-
dustriais e de “imperativos comerciais”. Os limites da propriedade artística
eram sempre confundidos com o comércio de imagens populares. Não só os
gravadores, mas os próprios artistas de outros países, imitavam os seus ído-
los, tornando as imagens de Tópffer as imagens características de toda uma JUCA E CHICO/Max und Moritz (1865) de Wilhelm Busch. Tal como o suíço Tópffer e o
época. francês Colomb, um dos precursores dos quadrinhos. Tanto que Os Sobrinhos do Capitão, de
Dirks, em 1897, são um resultado direto desta criação do poeta, pintor e cartunista alemão
nascido em Wiedensahl (perto de Hannover) aos 15 de abril de 1832 e falecido em Mechtshau-
sen em 9 de janeiro de 1908. No Brasil, foi traduzido por Olavo Bilac e editado pela
Melhoramentos. Os dois garotos travessos e aprontadores foram criticados imediatamente
pelos pedagogos, como viriam a ser criticadas todas as posteriores criações dos quadrinhos
que mostravam crianças travessas. Mas as crianças-leitores consagraram os personagens
noir, amarelos, vermelhos, azuis, coloridos do mundo criativo dos comics.

14 15
PV AMA DASAAVA IHU RUI
WILHELM BUSCH

blicações de suas caricaturas no semanário Fhegenden Blitter, em 1859.


O mestre das histórias ilustradas de Continuou trabalhando para eles e para o Minchener Bilderbogen até
1871, mesmo quando retornou para sua cidade natal de Wiedensahl. As
humor primeiras histórias ilustradas de Busch, não muito diferentes dos quadrinhos
tipo pantomima de hoje, foram publicadas no Fhegenden Blister, em 1860.
O título dessa historieta era Die Maus oder die gestorte Nachtrube, Eine eu-
ropiische Zeitgeschichte (O Camundongo, ou Sonho Disturbado. Uma
WilhelmBusch, » poeta, História Européia dos Tempos). As histórias ilustradas de Busch, precursoras
Poeta, artista e humor Ofista, nasceu em 1 das modernas histórias em quadrinhos, foram posteriormente colecionadas
1832, em Wiedensahl (próximo de
Hannover, na Dana nos livros Schnaken und Schnurren e Kunterbunt.
com o suíço Tópffer
e o francê
ecitsonte dás quado ; E
Christophe, Busch é considerado um dos Curiosamente, a Alemanha não desenvolveu uma história dos cozaics,

os st o pescimo um po Gs Gs Co
sendo ultrapassada pelos Estados Unidos, França e Inglaterra, deixando,
portanto, de desenvolver seu pioneirismo nesse campo. No Brasil, Olavo Bi-
2, j avras derivado de seu sobr i lac traduziu para o português as legendas de Busch, cujos trabalhos foram
Colomb é a maneira francesa d enome (Christophe
;
Lure, Alta-Saxônia. Em 1880 cri e nominar Cristóvão Colombo
ombo). Nasceu no lançados no nosso país pela Melhoramentos.
; R i o ou
deram a primeira história em quadrinhos a
; Famille Fenouillara : A mais famosa criação de Busch, batizada por Bilac como Juca e Chico,
moderna. wutara, que alguns consi-
- Em Em 1 1930, abandonou o apareceu na Alemanha em 1865. Trata-se, é claro, de Max und Moritz, nos
desenho e abraçou a carreira acadêmi j
Atânica
o cadêmica, transfor: quais se basearam Katzenjammer Kids (Os Sobrinhos do Capitão), histo-
do laboratório da Sorbonne, Morreu em o erp
te rieta norte-americana criada por Rudolph Dirks, em 1897, e existente até
Col iamai a
hoje. Embora seja o maior sucesso de um artista de sucesso, Busch teve este
qualidade Dari) sb orurtpada
; , ros. e imádos O trabalho recusado pelo seu editor, que já havia publicado Br/lderpossen, Der
tos acelerados, técnicas de silhuetas. A Usava ângulos inusitad
acã li ca RE
Í
Eispeter Katze und Maus (já na tradição gato-e-rato) e outros. O editor pu-
do para seu tempo e é consid erado “a deco VSava os quadros. ao Estava avança-
greiês Do sela TARA um dos que mais contribuíram para osco- blicou a obra sem gostar dela e, por causa de sua moral, foi duramente criti-
cada pelos pedagogos. Não é de surpreender que, na década de 50, os co-
TópfkE , o
de nivelde e Busch aliavam suas qualidades literárias ao excelen- gics tenham sido alvo de críticas similares, à época em que seu predecessor já
esenho, ao senso de humor, à antevisão do due vitia a ser um dos tinha se tornado um autor clássico para as crianças do mundo todo.
veíeículos de maioÍ r sucesso no mundo das comunicações: os comics Busch dedicou-se à caricatura logo depois da revolução de 1848. Em
Busch era o primeiro de sete filhos de pais mercadores. Na idade
de no- 1833 e 1845, os álbuns de Tópffer foram publicados na Alemanha. Gustave
ve anos, foio! envienvado
i para seu tio, o pastor de Ebergótzen, que o educou
até Doré, que admirava profundamente Busch, estabeleceu o elo entre o mestre
suíço e o mestre da Bavária. As estampas inglesas também tinham muito su-
cesso no país das Paixões de Diirer, da Dança da Morte, de Holbein, e da
Nau dos Insensatos. Nos jornais “para rir”” eram publicados o Prepmayer,
ceu as
RR pi
de Schródter (1848) e as ilustrações de Struwwelpeter, desenhados por H.
de Rubens, Brouwer, Teniers Í e Frans Hals, que muito in Hofmann (1847), todas já muito populares. Nesse ambiente surge a obra de
suas pinturas, ; muitas das quaisquais sósó e
(e agora avaliadas em cerca de dez exibxib idas depoisoi de Busch, com uma linguagem em pantomima, numa sequência de imagens
milhões de dólares) a op em continuidade, tal como o cinema viria a tornar popular, com os movi-
Depois da Antuérpia, voltou para Wie
densahl, depois para Liithorst, e mentos vindos em seguência da esquerda para a direita, como em fotogra-
finalmente para a Academ;
membro da dardo vere émia de beMunique. Aqui, na Alemanha, tornou-se mas verticais da sétima arte.
im (clu de artistas), que o levou às primeiras pu- Em 1870, cansado de desenhar histórias ilustradas de humor todas as se-
manas, passou a viver como um ermitão em Wiedensahl, escrevendo e ilus-
16
ty
WILHELM BUSCH

trando livros, além de pintar. Mudou para Mechtshausen, até sua morte, em
9 de janeiro de 1908. Wolfgang Fuchs observa: ““A narrativa de Busch sobre-
AS COBRANÇAS
vive até hoje. Sua agudeza, a precisão da linha do desenho, e seu verso hu- Ângelo Agostini
motístico estão vivos”. O crítico de arte do jornal Le Figaro, no obituário do
artista, escreveu: “Wilhelm Busch foi um dos maiores inventores da síntese
cômica que já existiu... Muitos fazedores de desenhos “simplificados' se ins-
piraram nele. Infelizmente, não copiaram sua profundidade de observa-
ção.” Mas, melhor do que tudo, o desenho de Busch ilustra a opinião de
Baudelaire de que a caricatura eo riso são ““os signos satânicos do homem”.

No esperar ás portas o co- : EK' força ouvir descomposturas Nada recebeo, mas leva a promes-
'brador ser um-—Job. com o sorriso nos labios. sa de ver os cobres no fim do mez.

da
mo MM iniepai nara mms ES cagada ES. .
á
—Muito folgo de er E —Ainda o terrivel amanhã! que tremenda amo-
Amanhã
pressa... a sem
esp falta, Pas
sr. gun
cob araçÃd y a put pt GA cs vida para mim,i para meus çapatos, ee para o

As COBRANÇAS (1867) de Angelo Agostini. Este piemontês radicado no Brasil, E


juntamente co m o alemão
Busch e o suíço Tópffer, é um dos pioneiros. Depois, criou Nhô Quim e Zé Caipora!
Aqui, in O Cabrião, de S.Paulo. Foi dono de revista e colaborou n'O Tico-Tico.

18 19
ANGELO AGUS LUNI

ÂNGELO AGOSTINI
ginas duplas, começando em 25 de janeiro de 1895. Quando termina a re-
vista Dog» Quixote, trabalha na editora O Malho. Esta editora lança, no dia
Um italo-brasileiro 11 de outubro de 1905, a revista O Tico-Tico.
Ainda em O Malho, publica outra vez Zé Caspora até o número 75, no
pioneiro dos quadrinhos dia 15 de dezembro de 1906, quando suas histórias ilustradas desaparecem
para sempre.

Angelo Agostini nasceu em Vercelli, no Piemonte, Itália, em 1843, e


passou a infância e a adolescência em Paris, com uma avó francesa. Chegou
em São Paulo em 1859, com a mãe, uma viúva, cantora lírica em turnê. Co-
meçou a trabalhar como desenhista na revista Diabo Coxo em 1964 e, em
1866, ficou como colaborador da revista O Cabrião. Em 1867 fez suas pri-
meiras histórias ilustradas, como Às Cobranças.
No mesmo ano de 1867 mudou para o Rio de Janeiro, então capital do
Império. No ano seguinte, começou a ilustrar as revistas locais Vida Fluai-
nense e O Mosquito. No dia 1º de janeiro de 1876 fundou asua Revista Ilus-
trada, que dirigiu axé 1888. Neste ano, após obter a cidadania brasileira,
enamorou-se de uma aluna de desenho, Abigail. Engravidou-a. Angelo era
casado e tinha dois filhos. Um escândalo, à época. A fim de partir para a
França, vendeu sua Revista Ilustrada. Em Paris, nasceu sua outra filha, An-
gelina.
Agostini retornou ao Brasil em 1895 e trabalhou em Dog Quixote até
1898. Depois, colaborou em O Ma/ho, que editou a revista infantil O Tico-
Tico. Agostini criou o cabeçalho, com o nome ilustrado da revista. Morreu
em 1910.
No Rio, sua primeira historieta com personagem fixo surgiu na Vida
Fluminense, no dia 30 de janeiro de 1869. O título era: As Aventuras de
Nhô Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte.
Fez nove páginas duplas e depois deixou a revista. Dois anos após, o
brasileiro Cândido Aragones de Faria fez outras cinco páginas, imitando o
trabalho de Agostini.
No número 331 de sua Revista Ilustrada, Angelo Agostini iniciou As
Aventuras de Zé Caspora, criando outro personagem seriado, inicialmente
no dia 27 de janeiro de 1883, com o subtítulo ““Zé é Convidado a Jantar na
Casa da Baronesa de...””, sempre em duas páginas, mas com muitas inter-
e Publicou até o capítulo 35, quando teve de partir para a Europa em

De volta, na revista Dom Quixote, publica de novo as trinta e cinco pá-

21
20
O MENINO AMARELO
Richard F. Outcault

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TEN É DEN
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O MENINO AMARELO/Yellow Kid (1895) de Richard F. Outcault. Considerada a


primeira história em quadrinhos continuada com personagem semanal, aos domingos, em
cores, no Sunday New York Journal. Foi o motivo do início dos comics e do termo
Jornalismo amarelo (no Brasil, marrom), para designar a imprensa sensacionalista.

Za
RICHARD F. OUTCAULT

No prinápio, era o amarelo

Exatamente no dia 5 de maio de 1895, um domingo, no jornal World,


de Nova Iorque, surgiu o primeiro personagem fixo semanal, dando mar-
gem ao aparecimento das histórias em quadrinhos e, ao mesmo tempo, ao
termo “jornalismo amarelo” para a imprensa sensacionalista, por causa do
camisolão do Menino Amarelo.
Nesse dia histórico, o artista Richard Fenton Outcault desenhou dois
painéis (charges), um em cor, outro em preto e branco, sob o título Az 1he
Circus in Hogan 's Alley. Era um quadro a mais de crianças em favelas (be-
cos). Desta feita, porém, no meio da petizada, havia um garoto de cabeça
grande, orelhudo, de seis ou sete anos, com um camisolão sujo e, no quadro
a cores, seu roupão era azul. Nas semanas seguintes, apareceu careca, num
papel secundário, ou sequer surgia nos desenhos. A partir de 5 de janeiro de
1896, seu camisolão já é amarelo — dizem que a pedido do técnico de cores
— e toma o primeiro plano. O próprio público começou a chamá-lo de The
Yellow Kid, embora o autor jamais tivesse nomeado a figurinha. Por in-
fluência das charges políticas, seu camisolão tornou-se panfletário, portando
frases e críticas do momento. Eram mensagens irreverentes, ligando com o
outro painel desenhado. Sem balões.
O último desenho de Outcault no World surgiu no dia 17 de maio de
1896, quando se transferiu — tal como em Cidadão Kane — , com toda a re-
dação, para o jornal concorrente de Hearst, o Journal, de Nova Iorque.
George B. Luks continuou desenhando Hogan 's Alley, mantendo o garoto
amarelo no jornal de Pulitzer. Hearst, mais vivo, colocou o título do povão,
The Yellow Kid. na sua tira e encorajou Outcault a usar desenhos progresst-
vos na narrativa e introduzir o balãozinho. Sintetizando o que os outros at-
tistas já faziam no jornal colorido de Hearst, Outcault deu forma definitiva e
continuada ao fenômeno que outros artistas fizeram no passado, dando as-
sim nascimento aos cogaics.
Mas o artista não estava satisfeito. Apesar de ganhar dinheiro, ele e a es-
posa se ressentiam dos ataques de grupos conservadores de “boas famílias”,
que criticavam a imprensa sensacionalista praticada por Hearst e Pulitzer,

23
RICHARD F. OUTCAULT

OS SOBRINHOS DO CAPITÃO
chamando-a de “jornalismo amarelo””, exatamente por causa do camisolão
do menino pobre dos guetos nova-iorquinos. O caso na Justiça entre os dois
Rudolph Dirks
tycoons da imprensa, colocando em litígio os direitos do personagem, mais a
decisão ““salomônica”” da Corte dando razão aos dois foram a gota d'água. Agora, senhorita Mim, *
Outcault deixou o Menino e Hearst, passando a trabalhar como free-lancer. I itão ! Uma
Eni presente vamos dançar um
Pouco nós dois! )

“g
Tentou outras histórias, sem sucesso. O Menino continuava, com ou- Vibchete-Ua!,
tros artistas ou reprints. Uma das reedições seria a idéia do que viriam a ser,
no futuro, os gibis. a

e:
Só conheceria o sucesso com Buster Brown / Chiquinho, que, apesar de |
y

ter pior comportamento do que o Menino Amarelo, foi aceito por sua condi-

Lit
ção social melhor. As críticas eram por problemas sociais e não por motivos
didáticos ou educacionais. Puro preconceito.
Z

EEE
Desta feita, o autor se garantiu com os direitos autorais e, aliado a seu
filho, chegou a ter uma companhia em Chicago para explorar os negócios
decorrentes.
No verão de 1928 ficou doente em sua casa e durante dez semanas teve
; Ea
barriguinha... ER
isso!
Bilu-bilu- bilo... prorr R. sempre
Ele e”

Tia
complicações, até morrer no dia 25 de setembro do mesmo ano, com sessen- a em (assim!!!
ta e cinco anos de idade.
Deixou para a posteridade um mundo infinito de outros personagens, o na ah
-s :
o
q tê SA dk
amarelos, azuis, vermelhos (ou 4rowrns, marrons), negros, índios, pobres e
ricos, meninos, garotos, astronautas, bichinhos, cachorros (como Tige) e Gu a Kq e
mulheres, todos habitantes desse universo rico, imaginativo, colorido, infi-
nito que é o habizat das histórias em quadrinhos da Terra e cercanias.

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OS SOBRINHOS DO CAPITÃO/Katzenjammer Kids (1897) de Rudolph Dirks. Uma das


Primeiras decisões salomônicas da Justiça, deixou com o autor, The Captain and the Kids
distribuído pelo United Feature Syndicate e o titulo original desenhado por H.H. Knerr
(desenhos acima) com o King. Assim, os peraltas viraram 4. Ainda hoje a historieta existe.
desenhada pelo neto do criador!

24 25
CHIQUINHO
Richard F. Outcault

VAMOS VIATAR COM


PAPAI E MAMIE.

A TIME
KING FEATURE SYNDICATE/THE HEADECT PADDAD

ds) do
CHIQUINHO/Buster Brown (1902), de Richard F. Outcault. O personagem já tinha
aparecido em 1897, como figurante no Yellow Kid, trabalho anterior do mesmo criador.
Embora vestido como Lord Fauntleroy, era tão terrível como todos os outros garotos do ,
gênero. No Brasil, foi publicado em O Tico-Tico desde 1905, decalcado como Chiquinho,
que, durante muitos anos, se pensava ser brasileirinho. Buster parou em 1910 e Chiquinho
(desenhado por artistas nacionais) durou até a década de 50.

26
NÃ DIC NIASSA AAA

Chiquinho, aliás, Buster Brown

No dia 4 de maio de 1902, a seção em cores do New York Herald publi-


cava o segundo grande sucesso do artista Richard Fenton Outcault: Bzszer
Brown.
O garoto de dez anos, de uma família burguesa, parecia o típico ment-
no que ganhou um terninho de marinheiro no fim de ano, por bom com-
portamento. Mas não era o caso do terrível personagem em questão. Embora
suficientemente letrado para escrever as “Resoluções” no pé de página,
revelava-se um péssimo estudante, agredindo seus colegas e sendo punido
“ao velho estilo” pelos professores e professoras. Sempre acompanhado pe-
lo seu cão Tige, teve algumas aparições irregulares, em edições diárias do jor-
nal, no início de 1910, sempre como a praga de empregadas domésticas, en-.
tregadores, policiais, companheiros e pais, com explosivos, gatos furiosos,
tinta, carros quebrados, barcos afundados e uma infindável quantidade de
outras invenções, que Outcault parecia criar sem exaustão.
O grande sucesso do personagem irrequieto obrigou William Ran-
dolph Hearst, pela segunda vez, a contratá-lo de um jornal rival para o seu
New York World, a partir de 14 de janeiro de 1906. O Herald repetiu algu-
mas velhas páginas de Outcault e depois empregou uma miscelânea de artis-
tas para continuá-las em suas páginas, enquanto a Justiça decidia que o autor
poderia usar os personagens, mas não o nome, e o Herald poderia usar o no-
me e os personagens. Continuou no velho jornal até 1910. No jornal de
Hearst ficou até 15 de agosto de 1920. Buster, Tige, a menina Mary-Jane
continuaram a ser publicados em álbuns e livros, e conheceram o sucesso
através do merchandising de suas roupas e do até hoje usado sapato tipo Bus-
ter Brown. A companhia que produziu os sapatos até 1940 dava revistinhas
de brinde. Houve também versões teatrais, em rádio e filmes curtos, além de
toda uma série de brinquedos. Curiosamente, obteve mais sucesso em brin-
quedos com sua primeira criação, Yellow Kid, embora Buster Brown tenha
tido mais sucesso e carreira mais duradoura.
Richard Fenton Outcault nasceu em 1863, no dia 14 de janeiro, em
plena Guerra Civil, em Lancaster, Ohio. Considerado como um talento des-

27
NA DAS
NSRAACD
CHIQUINHO
de criança, foi bem educado pelos pais abonados. Casou-se no dia de Natal )
de 1890, com Mary Jane Martin (nome da companheira de Buster Brown). ções, no Boulevard des Capucines, em Paris, do grande sucesso do cinema-
Estabelecido em Long Island, começou como ilustrador free-lancer no The tógrafo Lumiêre, dando nascimento ao cinema no mundo contemporâneo.
Electrical World, mas logo descobriu seu talento para o humor e passou a Embora o primeiro título fosse Hogan's Alleye diversos s/u7ms apare-
publicar na primeira L7fe e em Judge, revistas satíricas. O jornal New York cessem com outros títulos, o personagem constante e dominante era o do
World criou um ambiente para cartunistas, atraindo Outcault, que criou Menino Amarelo, de seis ou sete anos. Seu camisolão ficou definitivamente
uma turminha de uma favela (s/u72s de Manhattan) batizada de Hogan 's amarelo na edição de 5 de janeiro de 1896.
Alley. Foi empregado do jornal desde 1894 e o personagem principal passou George B. Luks continuou a desenhar o Hogan's Alley no Herald
a primeiro plano, num episódio que se tornou uma lenda, pois dizem que o quando Outcault se foi com Hearst para o World, atravessando a barra dos
técnico em cores Robert Benday sugeriu que o artista incluísse um amarelo tribunais. O balãozinho começou a aparecer na página. O grande sucesso
no camisolão panfletário (herdado da tradição francesa de charge política) e popular do personagem não diminuiu o ressentimento do autor com as críti-
originou o apelido de Ye2//ow Kid (Garoto Amarelo) para o eterno sorridente cas conservadoras contra a imprensa sensacionalista, justamente por causa da
aprontador de apocalípticas confusões. Estava criado o primeiro personagem cor amarela do camisolão, que trazia frases humorísticas e reivindicatórias
contínuo, publicado todos os domingos nos enormes suplementos colori- (como hoje está na moda, só que apenas com intuitos publicitários). Desgos-
dos americanos (os trabalhos do alemão Wilhelm Busch eram esporádicos, toso, Outcault criou o seu seguinte grande sucesso: Buster Brown. No Brasil,
sendo considerado, com o suíço R. Tópffer, um precursor) e o termo pejora- Chiquinho.
tivo yellow journalism, para denominar a imprensa sensacionalista e popu- Em 1951, um grupo de desenhistas brasileiros realizou uma exposição
lar. O magnata da imprensa americana, Hearst, a esta altura já havia contra- de quadrinhos pioneira no mundo. Cansados de tanta campanha contra os
tado, como faria mais tarde com Buster Brown também, a criação pioneira quadrinhos, os jovens — acusados de comunistas pelos donos de editoras e
de Outcault para o seu suplemento colorido, enfrentando uma batalha judi- com a pecha de inocentes úteis da decadente cultura imperialista americana —
cial. À elite nova-iorquina e o sistema americano reagiram de forma conser- reagiram. E — ó insolência! — revelaram que o doce personagem dos so-
vadora em relação a dois filhos de sua própria classe: Outcault e o milionário, nhos infantis brasileiros, o Chiguinho, não passava de um decalque de Bzs-
culto e refinado Hearst, que inexplicavelmente tinha uma surpreendente zer Brown, de Outcault. Hermann Lima, no seu livro A História da Carica-
veia e tino para acertar no gosto popular, apelando para manchetes espeta- tura Brasileira, foi obrigado a reconhecer o fato. E uma edição histórica de O
culares, sintéticas e que caíam no gosto do povo. Hearst já era rico e desde- Tico-Tico, comemorando o cinguentenário da revista, em outubro de 1955,
nhava de seus pares de nobreza financeira, mas Outcault sofreu as campa- publica também que Chiguinho era um decalque. À cultura brasileira reco-
nhas tradicionais até estar suficientemente bem de dinheiro, quando desis- nhecia que o héroi nacional mais citado pelos que eram contra os quadrinhos
tiu do personagem e criou um novo tipo, outra vez para o Herala, em 1901; era alienígena.
chamava-se Poor L:/'Mose, refletindo o interesse do autor nas crianças negras Uma página central da publicação mostrava o personagem desenhado
de seu país. Criou para a revista Judge a série Shakespeare in Possumville e por Outcault, depois por Loureiro, A. Rocha, Alfredo Storni (criador de Zé
depois acertou na mosca com Buster Brown, repetindo a fuga do Herald pa- Macaco, Faustina e Baratinha), Paulo Affonso, Osvaldo Storni, filho de Al-
rao Worla, de Hearst, por dinheiro. Fundou a Outcault Advertising Com- fredo, e, finalmente, por Miguel Hochmann. Nessa edição histórica, viam-
pany of Chicago com seu filho e conseguiu ser respeitado em vida como ar- se os nomes de Herbert Moses, general Lott, Osvaldo Orico, Eneida, R. Ma-
tista nacional e viajar pelo mundo, até ficar doente, no verão de 1928, emor- galhãesJr., Eustórgio Wanderley, Tristão de Athayde, Lucia Benedetti, Al-
rer no dia 25 de setembro, com a idade de sessenta e cinco anos. varus de Oliveira, Josué Montello, Gustavo Barroso, Alvarus (Alvaro Co-
Yellow Kia, o herói da primeira verdadeira história em quadrinhos, trim) e até a repetição de um conto de Coelho Neto, que saíra no primeiro
apareceu em dois painéis, um em cores e outro, em preto e branco, na edição número da revista.
de domingo do New York World do dia 5 de maio de 1895. Curiosamente, Nessa edição aparece a história de Loureiro, o primeiro artista brasileiro
nesse mesmo ano, em que surgia o primeiro personagem de histórias em a recriar a obra americana. Conta que Luis Gomes Loureiro, aos dezoito
quadrinhos no mundo, se assistia, no mês de dezembro, oinício das proje- anos, começou a trabalhar, em 1907, para a revista. O semanário era dirigido
por Renato de Castro, que, entre outros encargos, se incumbia de decalcar
28 29
CHIQUINHO
Buster Brown e Tige que, tradlzidos, passaram a ser Chiquinho e Jagunço. UPSIDE DOWNS
Loureiro foi promovido aos decalques, mas, devido à guerra de 1914, a re-
messa do jornal americano ficou prejudicada. E Loureiro passou a criar as si-
Gustave Verbeck
tuações.
Antes, uma curiosidade descoberta pelos pesquisadores. Nesse entre-
tempo, os decalcadores, sem a página original de Outcault, copiaram o fa-
moso Little Nemo de McCay e, na figura do menino art nouveau, que sem-
pre acordava no último quadrinho caindo da cama, depois de uma página
onírica de grande beleza plástica, substituíram o irrequieto moleque vestido
de marinheiro. Uma 72é/ange dos meninos Buster Brown e Little Nemo re-
sultou na tradicional revista brasileira Chiguinho.. Cos vã bip
Loureiro acrescentou um personagem brasileiro — antevendo o es “ga
Lil'Mose de Outcault —, um crioulinho chamado Benjamim, e desenhou
uma carruagem enfeitada em que o herói desfilaria pelas ruas, em regozijo
pelo armistício, e esta vinha desenhada para ser recortada e montada na his- "pato
torteta. Foi, como se dizia, um sucesso de arromba. ada A, uns“mu

Infelizmente, nessa mesma década, desapareceu a revista mais impor-


tante desse período jornalístico nacional, de tiragem inicial surpreendente, Eles tentam pegar o pássaro gordo. Mas ele foge. Eles prosseguem, e
EST
de 27 mil exemplares, já no número 6, com distribuição para pontos longín- aum UIaA ojad ondas q SM Piás E “osesspd Ojad BJsIA9 os “SUNY9AOT pe]

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quos do país, impressão em cores, logo em oficinas próprias, que marcou ge- ma
1

rações de artistas importantes com personagens populares, liderados pelo A:


mts Ds
encantador, travesso e abrasileirado Chiquinho.
Demos um jeitinho até no Buster Brown... So ME + 7

s salva um garoto cabeludo. E Muffaroo ajuda-o atravessar 0 rio.

de ni baixo. Uma Iaiiardo ani repeti


“Leia a história, vire a página de cabeça para baixo e leia out id
Duas historietas numa só historieta.

30
SONHOS DE UM COMILÃO THE NEWLYWEDS AND THEIR ONLY CHID
Winsor McCay Geo McManus

FLG,MARVIELE
O PRESTAVA!

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EO CIMA BENÇÃO DS
APENAS PARÁ SUA ESPO-
SA COMO PARA à COMUNI-
DAVE ELE PRESTAVA;

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MAIS DE

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THE NEWLYWEDS AND THEIR ONLY CHILD (1904)
Geo. McManus.
A primeira criação de sucesso do autor,
antes de Pafúncio e Marocas.
SONHOS DE UM COMILAÃO/Dreams of a Rarebit Fiend (1904), de Winsor McCay. Era do Pulitzer, passou para o Hearst.
Sob o pseudônimo de Silas, a primeira incursão de McCay no mundo onírico que viria O começo da substituição das
a ser seu habitat — antes de Freud — em Little Nemo. Um surrealismo à Kafka. Aqui,
de um morto. Felizmente, apenas em pesadelo, provocado pelo
crianças travessas, pelas páginas domingueiras
a visão subjetiva
queijo. O pioneiro Edwin S. Porter fez dele um filme, uma obra-prima dos primórdios de famílias. Virou até sucesso musical.
do cinema. ;

22
55
LITILE NEMO IN SLUMBERLAND
Wainsor McCay

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LITTLE NEMO IN SLUMBERLAND (1905) de Winsor McCay. Um dos pontos mais altos da arte
dos quadrinhos. Todos os domingos, no último quadro, Nemo era acordado pela mãe, depois de
iluminar a página, em cores, com sonhos deslumbrantes em desenhos jamais igualados, num visual
esplendoroso e criativo. Depois de sua morte, o Museu de Arte Moderna, de New York, solicitou
ms à sua viúva, para compensar o silêncio da crítica de arte à sua época. Uma obra-prima do
esenho.
80 anos de uma obra-prima
dos quadrinhos

No dia 15 de outubro de 1905, num domingo, o jornal New York He-


rald publicava a primeira página em cores da obra-prima de Winsor McCay,
Little Nemo in Slumberland. A chave básica da historieta era muito simples:
todas as noites, o pequeno Nemo sonhava com Slumberland e todas as ma-
nhãs era acordado para a realidade.
No mundo dos sonhos surgiram os personagens fixos da série: Flip, o
pigmeu verde, o canibal Impy, o cachorro Slivers, o Dr. Pill, Morfeu, rei de
Slumberland, e sua filha, a Princesa.
Tratando-se de um mundo onírico, Winsor McCay criou as mais belas
páginas de surrealismo no mundo dos quadrinhos. Visualmente rico, espan-
toso, criativo, jamais repetitivo, sempre inovando na distribuição dos qua-
dros, verticais ou horizontais, usando amplamente as cores, antevendo o fu-
turo cinemascope, as lentes 7Omm, as grande angulares, os ângulos insóli-
tos, captando a vista do leitor com grandes quadros dominantes, a visão de
uma página szandard de jornal, com um impacto de imagens e cores sem pa-
ralelo nos outros meios de comunicação, Winsor McCay tinha próximo de si
- apenas Sigmund Freud e suas teorias sobre os sonhos.
A profundidade do inconsciente foi explorado visualmente, mas
McCay revelaria que procurava dentro de seus próprios sonhos a inspiração
gráfica para sua obra, o que, analisado pelo seu contemporâneo inventor da
psicanálise, significaria uma sublimação, para exorcizar seus próprios demô-
nios.
Muito tempo depois da morte de McCay, o Museu de Arte Moderna de
Nova lorque solicitou à sua viúva alguns originais para fazer parte do acervo
do Momma. Curiosamente, em sua época toda a arte criativa de McCay foi
ignorada pelos ditos críticos de arte.
Em 1906, o Chicago Tribune, para concorrer com a arte de Little Ne-
720, trouxe de volta da Alemanha o pintor e artista gráfico nova-iorquino
Lyonel Feininger, cujo prestígio era tão grande que chegou a ser professor na
famosa Bauhaus. Criou uma página dominical, separada no meio por duas
historieras. Uma delas, Kzn-der-Kizds, marcou tanto sua carreira artística,

35
WIINSUR MeCAY WINSOR McCAY

que morreu lamentando não ter concluído essa obra. Mas nem assim os cha- No campo das histórias em quadrinhos, como muitos outros artistas
mados críticos de arte da época mostraram entender a importância dos co-
mudou para trabalhar com William Randolph Hearst, fazendo Litte Nemo
aics.
sob o novo nome de The Land of Wonderful Dreams, que é publicado de 3
Winsor McCay nascera em Spring Lake, Michigan, no dia 26 de setem- de abril de 1911 até 26 de julho de 1914. Após dez anos de ausência, ressur-
bro de 1869. Jamais se graduou e somente tomou aulas de arte quando já es- giu no Herald, de 1924 até 1927. Vinte anos depois, em 1947, o filho de
tava em Chicago, aos dezessete anos, desenhando cartazes. Em 1891, mu-
Winsor — e inspirador de Lztt/e Nemo —, Robert, tentou redistribuir Lz24/e
dou para Cincinnati, onde desenhou e pintou murais para o Museu Vine Nemo pata os jornais e fracassou.
Street. Nessa cidade começou a colaborar com jornais. E, em 1903, criou sua Winsor já tinha morrido em 1934, no dia 26 de julho.
primeira historieta: Tales of the Jungle Imps. Somente em 1969, depois do surgimento dos estudos europeus sobre
No mesmo ano, foi a Nova Iorque para trabalhar na Herald Co., onde, quadrinhos como fotma de comunicação de massas, a editora Garzanti lan-
sob pseudônimo de'“Silas””, criou diversas histórias em quadrinhos, entre
o çou um belo álbum de capa dura, com as páginas imortais de L:z4/e Nemo.
elas, Dull Care, Poor Jake e, a melhor de todas, Dreams of Rarebit Fiend, Em 1972, a Nostalgia, dos Estados Unidos, lança o mesmo álbum, no origi-
em 1904, todas para o Evening. “ nalinglês.
Já para o Herald, assinando seu próprio nome, entre outras, criou Lzzz/e Numa carta a um seu contemporâneo (o artista Clare Briggs) escreveu,
Sammy Sneeze, Hungry Hennietta e Sisters'Litile, Sister's Beau. antes de morrer, dando seu epitáfio: “Simplesmente não posso parar de de-
Chegou a hora de Lzt4/e Nemo. Chegou a hora de um dos maiores mo- senhar””.
mentos dos quadrinhos: com uma luz comparável aos primeiros quadros da — Dizemos estudiosos que Winsor McCay não deixou discípulos. O mo-
Renascença, a graça do barroco misturada à 47f nouveau, com desenhos que | tivo é simples. Basta olhar as páginas de arte, verdadeiras obras-primas da
lembravam os palácios dos livros infantis, de perspectivas e paisagens de con- criatividade infinita, sob qualquer ângulo que se as estude, para concluir
tos de fadas, tudo comandado pelo nonsense do mundo irreal dos sonhos, que ninguém é suficientemente louco para tentar igualar ou ser comparado
cuja predomínio é a visão. a um trabalho único e ímpar no mundo onírico, surrealista, criativo e infini-
Ignorado pelos críticos da época, foi um sucesso de público imediato, to dos comics.
virando até um musical, com músicas compostas pelo prestigiado Victor
Herbert, em 1908. Cartões-postais com os personagens eram distribuídos
pelo Correio e o próprio McCay, um dos pioneiros e inovadores dos filmes de
animação, fez uma versão em desenho animado de 12t4/e Nemo. Em 1909,
começou a trabalhar também em animação, assinando um método por ele
inventado. Iniciou com How a Mosquito Operates, até lançar o seu persona-
gem de sucesso no veículo animado: Gertie, the Dinossaur. Este causou sen-
sação. O uso da proporção do Dinossauro, na tela do cinema, tinha impacto
e impressionava. Até hoje os movimentos animados do animal pré-histórico
causam reação.
Intercalou em suas atividades também a publicidade e a arte comercial,
além de percorrer o circuito de exibição fazendo shows e conferências parale-
los à apresentação de seus desenhos animados. Em Nova Iorque, certa vez,
chegou a apresentar um show, dividindo o palco com Houdini e
W.C.Fields.
Chegou a realizar um longa-metragem em animação, The Sinking of
the Lusitania, em 1917, em 1920 exibiu seu último trabalho nesta área, o
curta The Flying House.

36 37
AGRADECIDOS CHIQUINHO & MENINO AMARELO
J. Carlos Richard F. Outcault

E meu AMIGO
ESTE
CHQUINHO.

AGRADECIDOS
(1905)
de J. Carlos.
Um dos maiores
artistas brasileiros,
gênio absoluto.
Chegou até a
fazer a cenografia OLHE QUEM
ESTA' AQUI.
de Alô, Alô,
Carnaval. Colaborou
n'O Tico-Tico
desde o primeiro
número, com
criações originais
como Lamparina,
diferente dos outros
que decalcavam
material estrangeiro.
Depois de
Agostini,
redesenhou o título
da revistinha

CHIQUINHO & MENINO AMARELO/Buster Brown an'Yellow Kid (1907)


Fenton Outcault. Curiosa incursão do primeiro personagem dos quadrinhos, no
Seguinte do mesmo autor. Infelizmente, era um sonho, como nas histori
mestre, McCay. Um frisson nos leitores das páginas dominicais em cores.

American Exomi

38 39
O TICO-TICO O IRA ANA

de 1955, a filha de Bartolomeu dá uma das duas versões da escolha do título.


“Pensando meu pai num título apropriado para a revista infantil que ia fun-
dar, notou um tico-tico pousando num viveiro de pássaros existente no jar-
O nascimento da revista O Tico-Tico dim de nossa casa...” O sobrinho Oswaldo acrescenta que a casa era na rua
Paissandu.
O estudioso Herman Lima, em sua História da Caricatura no Brasil,
escreveu: “Vasco Lima, único sobrevivente dos seus colaboradores do lápis,
em entrevista ao Correio da Manhã, do Rio, em 8 de dezembro de 1955,
lembrava que o nome se devera a Manuel Bonfim, em virtude de se chama-
No dia 11 de outubro de 1905, a editora O Malho lançava a revista O rem, naquela época, às escolas de primeiras letras, escolas de tico-tico”". Já o
Tico-Tico, que viria a ser o marco inicial das publicações dedicadas às crianças logotipo desenhado por Angelo Agostini tinha um pássaro pousado no
no Brasil. meio de crianças nuas brincando. Por volta de 1908, o mesmo desenho foi
Um pouco antes, surgira a primeira revista no gênero, o Jornal da In- modernizado. Em 1917, novo logotipo, de Luís Peixoto. Jota Carlos refez o
fância, no dia 5 de fevereiro de 1898, edição graficamente pobre que durou título da revistinha e Luís Sá o desenhou, incluindo seus personagens na pu-
até o dia 5 de junho do mesmo ano, publicando, ao que tudo indica, vinte blicação.
edições. Seu editor era Luís H. Lins de Almeida e a revista era de propriedade No começo ninguém assinava e o expediente sequer era publicado.
da firma João Pino & Cia., impressa em papel acetinado e contendo oito pá- Mass desenhos, decalcados de material estrangeiro, continham a assinatura
ginas em formato 32x23cm, com uma xilografia na capa em desenho de Ar- dos ilustradores brasileiros, com exceção de Jota Carlos, que fazia criações
tur Lucas (Bambino) executada por Calixto (Kalixto Cordeiro). Vinhetas de suas originais. E de outros criadores, como o piemontês pioneiro das histórias
origem francesa, sem vínculo com o texto, eram assinadas por Marcelle e ilustradas no Brasil, Angelo Agostini, que viria a falacer logo em 1910, pou-
C.M. Uma das edições publicou o apólogo de Machado de Assis,A Agulha e co colaborando na revista infantil e encerrando sua profícua colaboração cul-
a Linha, e teve como colaboradores Ennes de Souza e Júlia Lopes. À revista tural e artística no nosso país.
custava cinco mil-réis. “O mais famoso personagem de O Tico-Tico era Chiquinho, decalque
Já O Tico-Tico saiu publicado em cores, calcado na revista francesa La de historieta norte-americana. Durante muitos anos foi considerado, erro-
Semaine de Suzette, personagem publicado sob o nome abrasileirado de Fe- neamente, como “típico quadrinho brasileiro”.
Vismina. A tiragem inicial era de 21 mil exemplares, no nº 6 passa para 27 | Aépocad'O Tico-Tico, Ruy Barbosa elogiava a publicação. Aqui tam-
mile no nº 11 atinge os 30 mil exemplares. O custo era de duzentos réis. A bém há versões conflitantes. O estudioso falecido Alvarus (Álvaro Cotrim)
edição continha dois tipos diferentes de papel e logo passou a ser impressa publica, na revista Cultura, ano 4, nº 15, de outubro-dezembro de 1974, à
em gráfica própria, resultado do esmagador sucesso da revista logo no início P. 87, o seguinte: “...o episódio atribuído a Ruy Barbosa, quando em pleno
do seu aparecimento. Apesar de ter revelado não pretender publicar anún- Senado , ão ser interpelado impertinentemente por um dos seus pares, onde
cios (reclames) para as crianças, mais tarde sucumbiu à publicidade. lera a citação que acabara de fazer, respondeu: Li n'O Tico-Tico!"
O jornalista Luís Bartolomeu de Souza e Silva, da S.A. O Malho, foi Na p. 298 do Anedotário Geral da Academia Brasileira, de Josué Mon-
seu fundador, acatando sugestão de Renato de Castro e tendo a colaboração tello, sobo título “Literatura Infantil”, consta que: “Um dia aludiu ele, em
do prof. Manuel Bonfim. A primeira edição teve de contar com uma reim- conversa com o seu amigo Constâncio Alves (na sua casa à rua São
pressão, dobrando a tiragem do primeiro número que, curiosamente, foi Clemente), a um conto, de que extraíra uma lição. E Constâncio curioso:
datado numa quinta-feira, quando na verdade era quarta. Somente na ree- Onde V. Exa. leu esse conto? Ruy não tardou a resposta: Creio que foi n'O
dição do primeiro número, em fac-símile, no cinguentenário, o dia da se- Tico-Tico”.
mana foi corrigido. À revista publicava duas seções com muito sucesso, ““Lições de Vovô”,
Ossobrinhos de Bartolomeu, Luís, Antônio e Oswaldo ficaram à frente e“Co
E ênci do Dr. Sabe- Tudo”.» Porém,
frespondência Poré a grande atração da revista
da S.A. Na edição fac-símile comemorativa dos cinquenta anos, em outubro a seu visual colorido.

40 41
O TICO-TICO O TICO-TICO

E Chiquinho. Com o fim da sua publicação nos Estados Unidos, Lou- “UM PASSARINHO
reiro foi incumbido de continuar os trabalhos. Depois, outro decalcador, A.
Rocha, o substituiu, até que o ótimo desenhista Alfredo Storni passou a ilus- Carlos Drummond de Andrade
traro Chiquinho, antes de passar a pena para Paulo Affonso. Curiosamente,
o filho de Alfredo, Osvaldo Storni (excelente artista), tomou a criatura, até Contaram-me de um sujeito que ia a todos os leilões, enterros e come-
que Miguel Hochman modernizou o terninho marinheiro fin-du-stêcie e morações de feriado nacional; e como lhe perguntassem por que era fre-
desenhou a última página de Chiguinho no número de dezembro de 1954. quentador assíduo de tais lugares e cerimônias, respondeu: Não tenho nada
Outros desenhistas, verdadeiros artistas, aproveitaram O Tico-Tico e com isso, não; vim por conta de minha infância.
seus inesquecíveis A/manaques para criações próprias. J. Carlos, um dos Ele se procurava sempre a si mesmo e se encontrava um pouco na ima-
maiores desenhistas nacionais, criador das famosas melindrosas, publicou na gem de pessoas e objetos antigos.
revistinha seus personagens Jujuba, Carrapicho, Goiabada e Lamparina, As pessoas (de reumatismo) que hoje festejam Chiguinho estão, na
uma crioulinha. realidade, festejando o Chiguinho que elas foram, há 50 ou 30 anos passa-
O imigrante Max Yantok, que conheceu pessoalmente Enrico Caruso e dos, quando O Tico-Tico era a única revista dedicada às crianças brasileiras e
Maximo Gorki, criou o maravilhoso Kaximbown. Leônidas Freire (Leo) pu- lhes dava tudo: histórias, adivinhações, prêmios de dez mil-réis, lições de
blicou sua famosa versão da História do Brasil ilustrada. Outro grande suces- coisas, páginas de armar e principalmente de aventuras — esse desdobra-
so era Zé Macaco e Faustina. Theo, famoso caricaturista, lançou Tinoco, o mento e multiplicação da personalidade que nos fazia sofrer na carne os
Caçador de Feras. Lino Borges criou Bolinha e Bolonha. Outro sucesso incrí- apertos de Robinson na ilha deserta ou os sustos de Gulliver no país dos gi-
vel foi Reco-Reco, Bolão e Azeitona, do excelente Luís Sá, que desenhou gantes.
também Peteleco. Anos depois, Max Yantok criou também Chico Mugue e O Tico-Tico era de fato a segunda vida dos meninos do começo do sé-
Barão de Rapapé. E Daniel tentou o seu trio: Rubiácera, Farofa e Ouro Bran- culo, o cenário maior em que nos inseríamos para fugir à condição escrava de
co. Outros desenhistas da revista foram Cícero Valladares, Heitor, Luís Gon- falsos marinheiros, trajados dominicalmente com o uniforme, porém sem o
zaga, Leopoldo, Therson Santos, Aloysio, Justinus, Regina, Darcy, Joaquim navio que nos subtraísse ao poderio dos pais, dos tios e da escola. E era tam-
Souza, o excelente ilustrador Percy Deane, o grande desenhista Messias de bém muito de escola disfarçada de brincadeira.
Mello, que teria sua melhor fase na Gazeta Infantil, Gazetinha e Gazeta Ju- Chiquinho, o sonso, foi uma revelação. Era produto americano —
vemnil. an obnoxious hitile wise-acre capable of mischief but he had a heart of gold
Outros ilustradores foram Vasco Lima, Gil (Carlos Lenoir), Helio See- —., mas ficou brasileiro por decalque das gravuras e aclimatação moral, com
linger e Quirino Campofiorito, além dos redatores Carlos Manhães e Eustór- auxílio de Benjamim, este, cria nacional autêntica, Juguinha, lançado pou-
gio Wanderley. co depois, não pegou, e sua irmã, Lili, foi incorporada ao time do Chigui-
Em 1907, começaram os famosos A/manaques d'O Tico-Tico. Tristão ho, como prima dele. Vieram Zé Macaco e seu aeroburro, a sufragista Faus-
de Athayde escreveu: “O Tico-Tico foi minha iniciação literária”. O jorna- tina, Baratinha, o esplêndido Dr. Kaximbown, o Capitão Farragon, que de-
lista Paulo Bittencourt, diretor do Correio da Manhã: “O Tico-Tico ilumina sembarcava do navio montado num jacaré, a quem prometera uma boa gor-
as nossas quartas-feiras”. O jornalista Anibal Martins Alonso: “Florescia o Jeta, e com um tesourão de alfaiate fazia picadinho de cobra à baiana. Os fi-
entusiasmo das crianças pela alfabetização”. Mas foi Carlos Drummond de . lhos dos primeiros leitores, por sua vez, conheceram Jujuba, Carrapicho,
Andrade quem saudou, numa crônica no Correio da Manhã, o cinguente- Goiabada eLamparina, que). Carlos, notável criador de tipos, acrescentou à
nário da revista. série primitiva. Essas figuras existiram de fato, na medida em que os guris
com elas se familiarizaram e viveram suas histórias. Em contraste com a irrea-
lidade do mundo político brasileiro, em que muitos homens públicos não
acreditam nem faziam acreditar nos princípios que diziam defender, nossos
Caricaturistas povoaram a vida infantil de companheiros que a saudade res-
suscita com a nitidez de seres reais.

42 43
O TICO-TICO FEININGER

O Tico-Tico é pai e avô de muita gente importante. Se uns alcançaram


importância, mas fizeram bobagens, O Tico-Tico não teve culpa. O Dr. Sa-
be-Tudo e o Vovô ensinaram sempre a maneira correta
à mesa e de servir à pátria. E, da remota infância, esse
de viver, de sentar-se
passarinho gentil voa Um pintor e artista gráfico e sua
até nós, trazendo no bico o melhor do que fomos
amigo!”
um dia. Obrigado,
obra no mundo dos quadrinhos

No dia 29 de abril de 1906, um domingo, uma página colorida do su-


plemento do Chicago Tribune trazia uma nova historieta, The Kin-Der-
Kids, assinado por “O Seu Tio Feininger”.
Era a volta aos Estados Unidos de um dos mais importantes pintores e
artistas gráficos norte-americanos, que estudara na Alemanha e viria a ser
professor na famosa Bauhaus, até ela ser fechada por Hitler: Lyonel Feinin-
ger.
Ele nascera em Nova lorque, no dia 17 de julho de 1871, seus pais eram
músicos profissionais e, em 1886, eles o mandaram para estudar música na
Alemanha. Lá, Lyonel mudou seus interesses para a arte e estudou em Ham-
burgo, na Berlin Art Academy e na Academia Colagrossi, em Paris. Em
1894, começou uma importante carreira como cartunista e ilustrador em re-
vistas americanas, alemãs e francesas.
Em 1906, James). Keeley, do jornal Chicago Tribune, chamou Feinin-
ger para criar doiscozaics: o lírico Wee Wilhe's Winkie's World e The Kin-
Der-Kids. O título desta foi visivelmente tirado por Keeley do sucesso Kar-
zenfammer Kids, mas a criação visual e escrita foi toda de Feininger.
A historieta retratava um grupo de crianças encabeçado por Daniel
Webster, um menino precoce ao lado do funéreo Sherlock Bones; Pie-
mouth, que nunca acertava e não fazia nada direito; Strenuous Teddy, o ga-
roto atleta do grupo que levantava pesos impossíveis; e Little Japansky, que
completava o grupo errante, pois tinha sido adotado como mascote da tur-
ma.
O argumento básico lidava com a odisséia do grupo, que embarcava
numa banheira, rio abaixo, para fugir da sinistra Tia Jim-Jam e da hipócrita
Prima Gussie. A perseguição envolvia uma volta ao mundo, onde as igrejas,
escadarias em espiral e ruas estranhas permitiam que os garotos encontras-
sem personagens pitorescos, como o fora-da-lei Pete Mysterious; Mr. Pills-
bury, o fabricante de pílulas e suas cinco filhas sem lar; e Kind-Hearted Pat,
o irlandês limpador de chaminés.
Infelizmente, os happenings da perseguição jamais chegaram à uma

44 45
FEININGER

conclusão, pois após uma disputa de direitos com os editores, o autor aban-
donou a odisséia, inacabada desde o dia 18 de novembro de 1906. Os distri-
MUTT
& JEFF
buidores sequer tentaram encontrar um substituto, coisa, aliás, impossível. Bud Fisher
Lyonel Feininger voltou para a Europa, seguindo uma carreira de su-
cesso como pintor e artista gráfico. Fez diversas exposições no seu país e no
velho continente. Quando os nazistas fecharam a escola de vanguarda Bau-
haus, onde era professor, em 1933, resolveu voltar para os Estados Unidos, o
que fez em 1937, onde lecionou no Mills College, em Oakland, e exibiu
suas pinturas.
Embora Feininger tivesse trabalhado como autor de quadrinhos por
menos de um ano, o crítico Ernst Scheyer, no seu livro Lyonel/ Feininger: Ca-
ricature and Fantasy, escreveu: “Os feitos de Feininger como cartunista apa-
recem como uma rocha-monumento nas planícies dos quadrinhos norte-
americanos”. Mas, na época, a crítica de arte, tanto americana quanto euro-
péia, ignorava a importância dos comics.
No fim de sua vida, Feininger, nostalgicamente, voltou às suas criações
para o mundo dos quadrinhos ao esculpir pequenas figuras dos K17-Der-
Kids para seus filhos e apresentou planos fantásticos para a “cidade no topo
do mundo”, tirada esta de Wee Wilhe Winkie's World.
Em diversas ocasiões, Lyonel Feininger — reivindicado como artista
norte-americano pelos americanos e germânico pelos alemães — externou
seu desejo de fazer uma conclusão para a odisséia dos Kin-Der-Kids. Morreu
em 13 de janeiro de 1956, sem contudo conseguir realizar esse sonhos. MUTT & JEFF (1907) de Bud Fisher. Até então,
as historietas vinham em
suplementos dominicais coloridos. Uma tentativa
diária foi feita em 1904 com A. Piker Clerk,
criação de Clare Briggs. Mas foi
tirada do jornal porque o patrão, Hearst,
achou-a vulgar. Fisher usou a idéia de uma tira diária, em
gag completa, cobrindo toda a parte superior da
página esportiva, com um tipo alto — Mutt —,
à sua semelhança, apostando
em cavalos, para ficar rico. Logo, resgatou
de um manicômio um baixinho que se dizia Jeffries
(o campeão de boxe).
Bud Fisher já faleceu e foi um dos
artistas mais bem pagos do mundo dos comics.
Mas Mutt continua quebrado até hoje, junto com Jeff.

46 47
BECASSINE LES PIEDS-NICKELÊS
Languerau e Pinchon Louis Forton

VACUM CLEA

INE, ToyAGE
A de PAR LE VIDE

No campo de batalha, Ribouldingue mete-se a puxar o Enquanto isso, Croquignol comanda a operação de
enorme aspirador enquanto Filochard empurra a gerin- seus dois camaradas ao avistar uma trincheira inimiga
gonça...

pets Rena rest Ape ss 1a Ea E qm yo a

Os dentes de leite de Bécassine começam a Seu pai amarra um barbante no dente e puxa,
== balançar: “É preciso arrancá-lo”, diz o papai e duma vez. Bécassine chora como se tivesse
ela se esconde, com medo da dor. sido sangrada viva.

ÀÀ manobra, camaradas!” foi o grito dueto os dote Que ra res a os né vi que estavam na
. , , a

girarem a dupla manivela da “vacum”-... trincheira. Os Pied Nickelés completaram com sucesso
a manobra.

Dedado
longe ne seus companheiros i arregalaram os olhos De volta ao acampamento, a singular viatura faz espir-
Ribouidi am O estranho objeto. Mas reconheceram rar os Prussianos, trazendo admiração pelo feito dos
i à : á De noite, a vovó/ retira dentadura.
à Bécassine, | ingue, Filochard e Croquignol. Pied Nickelés.
A vovó
preciso É gi pernnbelra oi surpresa: “Sofri tanto para tirar um dente e à 4
dente vovó tirou todos. Que corajosa:
sem LES PIEDS-NICKELÉS (1908) de Louis Forton. Criado para a revista francesa L'Epatant, com o
narigudo Croquignol, um olho só Filochard e o barbado Ribouldingue se auto-intitulando a Gang dos pés
BÉCASSINE (1908) de Languerau e Pinchon. Publicada na França, na revista] niguelados, formavam um trio de impostores, num humor selvagem, destruindo as instituições. Mesmo
depois da morte do autor, continuaram e juntamente com Mutt e Jeff e Os Sobrinhos do Capitão são as
Semaine de Suzette, retratava uma empregadinha camponesa. N'O Tico-Tico se chami historietas mais antigas, ainda seguindo a mesma fórmula.
Felismina. Em 1939, virou um filme.

48
BILBOLBOUL KRAZY KAT
Atíbho Mussino George Herriman

PE; M-GEM -BEM,


UMA PEQUENA
FOLHA DE
OUTONO,

i serpente Tãoà grande medo elelesente


se prepara
foda esuaseganda
À serpent
uito irada
Muito ir a baita
dá obotee abreo bocão que os braços caem no chão.

King Features Syndicate The Hearst Corporation


NUMA VEZ,
SACUDI UMA
22 ARVORE E AS
FOLHAS
mos CAIAM.

Frttilio
Com asas nos pés, repara, De um pretinho fica conserta seu filho
Bilbolbul num zás se some. branco, mas mamãe 'manco usando a
que é boa e bela cola “Amarela”.
Mo pda S/M,MAS
APOSTA CORRIDA ABLEPRI PARECE CARREGAR
COMAS ABELHAS / AD EAÇA
BILBOLBOUL (1908) de Atílio Mussino.
Publicado no Corrieri dei Piccoli,
sucesso junto com o trabalho de A. Rubino.
Tratava a África com os clichês do gênero,
mas impregnava de surrealismo as situações absurdas
e rompia com todas as regras da lógica.
A metáfora fazia torná-lo azul ou branco,
| ter asas nos pés, perder a cabeça
e mil loucuras avançadas para a época.
Ea]
O Corrieri começou depois d'O Tico-Tico brasileiro (1905), KRAZY
- o DN KAT
quadrinh acou(1913 ae Menini a Aclamado universa: lmente como a mais poética das criações nos
mas existe até hoje na Itália. S,
um tijolo no gato. V a «ma barra noutra tira do autor, com um cão e um gato, até que um ratinho atirou
trou l i . “ .
conseguiu conti
Continuar
a primeira gato-e-rato estrepolia, jamais superada. Quando
o autor morreu, ninguém
seu trabalho. Impossível tarefa.

50 51
PAFÚNCIO E MAROCAS
Geo McManus

VENHA AO MEU CLUB [EsEs NÃO SEÍ SE MAROCAS


I ENQUANTO ESPERA... FZ VAi APRECIAR

NÃO, OBRIGADO. PORQUE NÃO ELA ESTA”


NÃo Posso FICAR TELEFONA DEBAIXO DO CARROÍ
PARA JANTAR... A ELA ?
MAROCAS NÃO VAI
GOSTAR.

PAFUÚNCIO E MAROCAS/Bringing Up Father (1916) Geo. McManus. Começou como tira, |


em 1913, e depois se estabeleceu também como página domingueira. O ápice das “family strips”..
Quando a Monogram resolveu verter o sucesso para o cinema, o próprio autor interpretou O
marido, tal a semelhança do personagem com o criador. Existe até hoje, com outros desenhistas.

52
SNUFEY
Billy De Beck

JURO!

ANN
NUM PA PRA
VESEA
CRIATURA É UM
COBRADOR
OU NAO eve

SNUFFY/Barney Google & Snuffy


Smith (1916), de Billy De Beck. Na
página de esportes, o personagem
Barney surgiu e dominou. Nos
anos 20, um baixinho de cartola
sempre fazia sucesso. Em 1934, ele
apareceu numa floresta do Kentuc-
ky onde encontrou um caipira,
Snuffy Smith, que passou a liderar
-a tira. Em 42, De Beck morreu e
Fred Lasswell (acima) assumiu a
feitura, deixando Snuffy como titu-
lar e Barney, um visitante.

53
SNUFFY SNUFFY

sua cabeça por amor a seu amigo tocaram os corações dos leitores. E transfor-
maram Barney num milionário com cartola, luvas brancas e bengalas. -
Nova mudança. A “doce”” mulher some e ele parte à procura de uma
Barney Google virou Snuffy mew mamma. Seria uma crítica ao comportamento humano?
Uma nova esposa, mais adequada às suas posses. O que veio a ocorrer
com a esposa antiga, De Beck não explica, mas logo Barney está envolvido
numa tórrida /ove stor).
Veio o sucesso. Uma canção tomou conta das paradas musicais: Barney
Google with His Google Eyes. E já naquela época fez metalinguagem, colo-
cando o autor como personagem noutra historieta.
Em 1919, dia 19 de dezembro, o jornal de Nova lorque, American, Como numa premonição do autor, começaram a surgir outros perso-
publicou pela primeira vez a história em quadrinhosBamey Google, que vi- nagens nas suas tiras. Até emergir um caipira do Sul dos Estados Unidos:
ria a se tornar um clássico no gênero, parte do folclore americano. Snuffy Smith, sua esposa Lowizie e o sobrinho Jughaid. Estes se destacaram
Nesse dia, via-se um enorme pateta, olhando o sol pela janela do quar- tanto que otítulo da historieta mudou para Barney Google & Snufihy Smith.
to. “Que horas serão?”' Depois, vestido e reclamando com o porteiro do ho- Barney deixou de aparecer, surgindo esporadicamente, mudando as regras
tel: “Escute, quero mudar dequarto. Toda manhã, o sol me acorda às do jogo do sucesso nos quadrinhos. Virou Snuffy mesmo.
sete””. Polidamente, o porteiro responde: ““Se não está satisfeito, caia fora!"” Só há outro exemplo semelhante, com Brg Chief Wahoo, uma histo-
No quadrinho seguinte, está de volta ao quarto, resmungando para si mes- rieta cômica que se tornou de aventuras quando um personagem galã, re-
mo: “Vou mostrar a ele... Só preciso acordar às nove”. E pinta a janela de pórter, roubou atira: Steve Roper. Os desenhos se elitizaram, ficaram sérios.
preto. “Agora sim, dormi bem e sinto vontade de trabalhar esta manhã”” Depois, um aventureiro, amigo do repórter Mike Nomad, passou pela tira é
No último quadrinho, Barney abre a porta do escritório e o chefe grita: levou os leitores juntos. Embora o título ainda seja de Steve, as aventuras que
“Está despedido por não aparecer dois dias!” seguimos são as de Mike.
Barney Google sofreu mudanças radicais, virou Szuff) Smith e sobre- Barney passou então a se dedicar aos desenhos animados e filmes cur-
viveu a seu criador, Billy De Beck. tos. Billy De Beck faleceu em 1943, no auge da popularidade. Seu assisten-
No princípio, Barney era quase o dobro de um homem normal, depois te, Fred Laswell, assumiu a tira. Vive em Tampa, Flórida, e criou quadrinhos
encolheu, ficando a metade de um homem. Um baixinho. Logo que a espo- para cegos.
sa dominadora foi incluída, parecia que outro homem a esposara. Barney
encolhera fisicamente diante do matriarcado americano!
“Primeiro aprenda a desenhar — depois vá a uma boa escola de arte””,
brincava De Beck, depois de famoso.
No dia 17 de julho de 1922, encontramos Barney na calçada do Jóquei
Clube, falando consigo mesmo: “ Acho que vou ficar por aqui. Sinto que vai
cair algo do céu.” E, literalmente, um homem cai dos céus nos seus braços.
O dono do Jóquei, agradecido por ser salvo da queda, promete-lhe um pre-
sente. No quadro seguinte, ao telefone: ““Todos nossos problemas se foram,
doce mulher. Tenho um cavalo de corrida.” Nas mãos de Barney as rédeas
do cavalo-maravilha: Spark Plug.
Rival na vida 'real de Mar O'W'ar, rival da mula Maud nas tirinhas,
Spark Plug usava um manto amarelo, cobrindo-o. E, para surpresa geral, es-
se pangaré vence uma corrida. Os coraçõezinhos que dançavam em torno de

54 55
GASOLINE ALLEY
Frank King

QUEM TOCA A SE OCARRO DE BILL


Go ISTO QUE CAMPAINHA DA PORTA | ENCRENCOU, AZAR
TÃO CEDO ? m

ACONTECEU NO
DIA 14 DE FEVEREIRO
DE 1924. TiO WAKLT
, Eos SELEMBRA,

GASOLINE ALLE
E SE É ALGUMA
BRINCADEjRAE" É 2
gba
A (1919) de Frank King. Um
historieta criada para
emergente classe de
prietários de automóvei
8,

alterada no dia 14 de fevi


reiro de 1921, St. Val
ne's Day, quando um beb
recém-nascido foi deixadl
à porta do solteirão W
Aí, Skeesix passou a 8
primeiro personagem
quadrinhos a não se ma
imutável com o tempo (co
mo Os Sobrinhos do Cap
tão), mas crescer e pa
por todas as etapas de
criança e jovem da pequé
)
4j -
E AO
no burguesia. Mudou
desenhistas, mas conti!
nuou sua idéia básica de.
SETT Ra Poa. 08.
criação: o retrato da vi
NR porção, 941,

Chicago Tribune/New York News Syndicate comum. =

56
WINNIE WINKLE
Ta Martin Branner

qe

TAMOS DE ACORDO. || [arruR, voo] FUI EU Que VOU DEITAR DA.


os A FRRÍA,CRIANÇAS. ENSINAR A | COMECEI, BICOT. E PODEM f opa! 4:
, FAZER UM à | ME COBRIR 1
1 CHEGA DE BRIGA. | du NRO
dueço Descanse) aDE REA,
Pg

VÍ LA ADIANTE UM
DIVERTIDO, | BELO SACO
HEIN, BicoT DE AREIA.

KING FEATURES SYNDICATETHE HEARST CORPORATION


UMA HORA, SUS. ) DECASTIGO,
HEIN 2)
ERP ron
À Pa
x
+

WINNIE WINKLE (1920), de Martin Branner. A personagem


uma jovem era
estenógrafa que logo repartiu o estrelato com seu irmão adotivo Perry. Na França,
foi publicada sob o título de “Bicot, président de club”. Dessa historieta, Picasso
declarou: “Foi o meu Proust.”

BIBLIOTECA CENTRAL

e Sis |
GATO FELIA

O GATO FELIX
Pat Sulhvan
A poesia e a fantasia nos
quadrinhos e nos desenhos animados
/ Em fevereiro de 1933, falecia o australiano Pat Sullivan, que criara os
desenhos animados d'O Gato Félix, em 1917. Em 14 de agosto de 1923, o
King Feature Syndicate iniciou a publicação em quadrinhos, nas páginas
dominicais coloridas, do grande sucesso dos filmes de animação do gato que
teria sido inspirado em Rudyard Kipling: “the cat who could walk by him-
self.
Foi também O Gato Félix, de Sullivan, o primeiro desenho animado
sonoro e o primeiro filme de animação a ser apresentado em televisão na
emissão histórica da NBC, em 1930. .
O sucesso dos filmes foi tão grande que, na morte de seu criador, já ti-
nham sido produzidos mais de cem curta-metragens. Uma tira diária do
personagem começou em 9 de maio de 1927.
Pat Sullivan nascera em 1887 (ou 1888, segundo outras fontes), na
Austrália. Apesar de sua fama, pouco se sabe sobre o início dela. Sua carreira
como cartunista em seu país fracassou e mudou-se para a Inglaterra, em
1908. Em 1914, emigrou para os Estados Unidos. Lutou boxe e foi artista de
vaudeville, sem sucesso nos desenhos. Em 1914, criou Pa Perkins, e Samuel
Johnson logo depois. Em 1915, tentou o filme de animação, inaugurando
O GATO FÉLIX/FELIX THE CAT (1923) um estúdio próprio. Parece que Pa Perkins foi sua primeira tentativa. Pouco
“de Pat Sullivan. Este cartunista depois, em 1917, alcança o sucesso com o Gato e, no filme sonoro, lançou
australiano começara com os desenhos E canção cantarolada por todos: “Felix kept on walking. Kept on walking
animados em 1917. O King still”.
procurou-o e lançou também o sucesso em quadrinhos. .
- Pat morreu em 33 e um sobrinho Depois de sua morte, um sobrinho seu, também chamado Pat, conti-
também chamado Pat continuou o trabalho. nuou assinando os quadrinhos, mas há dúvidas sobre se tio e sobrinho real-
Muitos outros artistas assinaram as tiras. mente fizeram quadrinhos. Dizem que Bill Holman era um artista “fantas-
ao
Foi inspirado por Rudyard Kipling, ““cat who walks by himself"". ma”” das tiras de 1932 a 35, mas é mais provável que os desenhos em quadri-
Marcel Brion, da Academia Francesa nhos fossem de Otto Messmer, que começou a assinar os trabalhos em 1935 e
escreveu: “Felix não é um gato, ele é O Gato.” O fez até 1954, quando Joe Oriolo, que sempre trabalhou com muitos assis-
tentes, com sua Productions, o substituiu e realiza os desenhos animados,
hoje, para a televisão.
Maurice Horn observa que, tal como o clássico Krazy Kat, O Gato Félix

58
59
GAIO FELIA

(e hoje, o gato underground Fritz, de R. Crumb) é uma das grandes criações


do gênero. Sua solidão, senso de alienação, a obstinada luta contra o desti-
ANINHA, A PEQUENA ÓRFÃ
no, os elementos, a fome e o frio, e uma calorosa humanidade o marcam co- Harold Gray
mo um dos primeiros heróis do absurdo no mundo animal.
Entre o sonho e a fantasia, os melhores momentos do Gato nos quadri-
nhos eram assinados por Messmer, na terra de Mother Goose, numa civiliza-
ção mecanizada do futuro, nos planetas do sistema solar ou entre selvagens
da África, nos parâmetros do fantástico.
Messmer também usou de linguagem experimental nos quadrinhos,
talvez graças aos seus conhecimentos de animação: uma vez Félix usou o ba-
lãozinho do quadrinho como um balão para fugir de Marte e voltar para a
Terra. Outra vez, usou o ponto de exclamação sobre sua cabeça como uma
arma para se defender, transformando um recurso gráfico num bastão.
Sempre perdendo as chances pela má sorte, com sua amada Phyllis. Não es-
quecer que ele era um gato preto...
Muitas de suas aventuras foram reimpressas em Popular Comics e teve

York News Syndicate


The Chicago Tribune/New
também, nos anos 40 e 50, uma revista própria editada pela Toby.
A poesia e o lirismo de Felix the Cat sempre foram mais apreciados na
RA A a
“Ms U fa OF. Coirant INE dy Thu Comigo Tetieas

Europa do que nos Estados Unidos. Em 1954, o escritor da Academia Fran-


cesa, Matcel Brion, escreveu num famoso ensaio: “Félix não é um gato; ele é
o Gato. Ou, melhor dizendo, é um supergato, porque não se enquadra em
nenhuma das categorias no reino animal”
No Brasil, o Gato Félix foi sucesso na Gazetinha, no Suplemento Juve-
ailou nas inúmeras revistinhas e gibis publicados por editoras independen-
tes, sempre presente nas bancas de jornais.
E continua brilhando nas telas de televisão do mundo todo.
O poeta nacional Carlos Drummond de Andrade, quando fazia crítica
de cinema, utilizava os pseudônimos de Mickey e Gato Félix. Menos por seu
amor, sempre declarado, aos quadrinhos, do que uma citação aos filmes de
animação, e sua modéstia, “metendo a patinha” na crítica cinematográfica, des U 8 Po OE: Copreiçto MOL by Tho Ciómgo
qual um ratinho ou gatinho pequenino e matreiro....
ANINHA, A PEQUENA ÓRFÁ/Little
Orphan Annie (1924), de Harold Gray.
Soap Opera polêmica devido
às posições direitistas do autor.
O criador de Mad, Harvey Kurtzmann,
tanto satirizou a historieta e seus olhos sem olhos
que criou a sexy Little Annie Fanny,
para Playboy, com o milionário vendedor de
armas “Daddy'' Warbucks virando um sugardaddy (protetor).

60 61
ANNIE ANNIE

leza no texto e suas atitudes direitistas foram duramente criticadas. Curiosa-


mente; um diretor de cinema como John Huston, com idéias progressistas,
banido de Hollywood na caça às bruxas do macarthismo, assinou a direção
““ Annie — dos quadrinhos dessa versão cinematográfica, criação de um autor identificado com as idéias

para Hollywood, via Broadway...”


radicais de direita mais para outro John, o Wayne...
Aninha, a Pequena Orfã, era publicada no Brasil pelo Suplemento Ju-
venil. de Adolfo Aizen. No mundo todo, sempre esteve entre as cinco histó-
rias mais populares.
Harvey Kurtzmann, criador de Mad, sempre teve marcação contra a or-
Aninha, a Pequena Órfã dos quadrinhos, chegou a Hollywood, via fazinha. Nas paródias, o protetor de Aninha era '“Sugardaddy" (que, em
Broadway. Uma superprodução musical, dirigida por John Huston, foi o re- gíria americana, quer dizer o “coronel”, e a protegidinha, no último qua-
sultado comercial do grande sucesso do musical na Broadway. Os quadri- drinho, num str7p-tease revelador, mostrava-se uma mulher sexy, demons-
nhos surgiram no dia 5 de agosto de 1924, criados por Harold Gray. trando claramente por que tinha um protetor tão rico...
Gray nasceu em Kankakee, Illinois, em 20 de janeiro de 1894 e morreu Depois Kurtzmann se associou a Hefner e tentou uma revista, 17u7mp,
no dia 10 de maio de 1968. Interessado em desenho, trabalhou no departa- que fracassou, mas a ligação entre eles resultou na melhor paródia de Annie:
mento de arte do Chicago Tribune e depois passou a fazero letreiramento da a sexy Little Annie Fanny, mistura de Annie com a prostituta Fanny Hill, crí-
historieta The Gumps, do artista Sidney Smith, entre 1921 e 24. Foi então tica de costumes da sociedade atual americana. Logo após a morte de Gray, a
que se aproximou do famoso editor coronel). M. Patterson e sugeriu uma ti- distribuidora tentou outros desenhistas, que não conseguiam mantero mes-
ra chamada Little Orphan Otto. O editor achou o menino muito efemina- mo padrão visual e muito menos a qualidade do texto da historieta. Depois,
do, sugeriu mudar o sexo do personagem principal e seu nome foi inspirado com o insucesso das novas versões, a distribuidora Chicago Tribune-New
no poema de James Whitcomb Riley, “Little Orphan Annie”. Começou York News Syndicate voltou a redistribuir histórias antigas do próprio cria-
como tira diária e passou a ter um capítulo dominical em cores, a partir de 2 dor.
de novembro de 1924. - Como sucesso da peça musical na Broadway e reavivando-se a comer-
A personagem de cabelos ruivos encaracolados, tal como todos os ou- cialização do merchandising e do licensing da historieta, o Syndicate contra-
tros personagens da historieta, era desenhada com bolas brancas no lugar tou um excelente desenhista, Leonard Starr, que ilustrava com rara maestria
dos olhos. No princípio, seus únicos amigos eram o cachorro Sandy e sua bo- uma personagem de não muito sucesso, Ox Szage, e ele, depois de muita
neca Emily Marie. Na época em que a boneca saiu das tiras, surgiu ““Daddy”” pesquisa, recriou as histórias de Little Orphan Annie com a mesma atmosfe-
Warbucks. ra de Chinatown e claros-escuros contrastantes, num desenho muito supe-
Com a evolução de Warbucks, de um ricaço (sua esposa desapareceu rior ao do seu criador. A história conheceu um novo alento de sucesso.
rapidamente) para um soldado da aventura e da fortuna, um homem inter-
nacional de negócios, a tira começou a tomar forma, com um sentido espe-
cial. As histórias eram parábolas, contos moralistas, cheios de alegorias e ca-
racterizações.
Warbucks contava sempre com dois fiéis servidores orientais: Asp e
Punjab, assumindo poderes sobrenaturais. Estes homens apareciam sempre
na hora exata, distribuindo justiça arbitrária, rude e quietamente.
O trabalho visual de Harold Gray não é muito apreciado, mas seu texto
é cuidadoso e de alto nível literário. Começaram a surgir, então, críticas ao
seu conservadorismo, às suas posições políticas, à sua alegada propaganda.
Sua posição pessoal transparecia nas mensagens políticas inseridas com suti-

62 63
CAPITÃO CESAR CONNIE
Roy Crane * Frank Godwin

LisKa É E VEDA !ELA ESTA. | t QUE O 9SR. Ai 1 ESQUECI-ME DE DIZER A, - 3 QUE E',T DOUTOR 2
A MAIOR OLHANDO PARA VOCÊ... MA ; io CRONOS vocêÊê. VENHAM NO MEU AVIAO QUE E' QUE O SENHOR Si EE -VOCÊS VERAO NESSE
INSTANTE. ESTIVE E=
E SORRI...ELA PARECE PENSEI
ENSEI QUE MAGNÉTICO AO LABORATORIO VAI NOS MOSTRAR? BALHANOO
DANÇARINA QUE IAMOS
IAMOS QUE EU VOU MOSTRAR UMA : UM POUQUINHO
ESTAR DANÇANDO SO- E Coisa A E a q NESTAS ULTIMAS
DO ORIENTE, MENTE PARA VOCÊ! fo es SEMANAS.
VOCÊS. EGRIERR
MADIGAN! E
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F
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A'SAIDA DO GABINE-
TE DA PRESIDENTE.

SAGE
a PRNSTRNÇAD BE A) 7 was, BE ago devo
AQUI ESTA! OS HOMENS ESTAD CONS
VIA
TEMPO. PODEMOS ENGAREARN
DAQUI A |
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ENGRAÇADO
N
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MIL ANOS NRARTARA CARA»


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Ledoer Syndicate
NO SÉCULO XXX/Connie (1927) de Frank Godwin. Come-
çou como uma história burguesa, participou da Depressão e
seu auge foi quando ingressou numa expedição científica e
viajou no tempo futuro, em belos desenhos. A linda heroína,
d
casta e fria, é considerada a mais sexy dos quadrinhos por -
CAPITÃO CESAR/Wash Tubbs-Captain Easy (1924), de Roy Crane. Começou como humorismo
Washington Tubbs II, mas uma eventual aventura tornou a historieta uma das primeiras a intro q
Alain Resnais.
a aventura nos comics. Depois, em 1929, surgiu um aventureiro, Captain Easy, que tomou conta EM
tira e dos capítulos domingueiros. Anos depois, Crane criaria Buzz Sawyer (Jim Gordon, no Brasil).

64 65
JOE SOPAPO
Ham Fisher Hergê

JOE...DIGA ALGO AO MICROFONE.


emma! EIS O CAMPEÃO, QUERIA DIZER AOS Chefel.. Ele chegou!Ly nl
4 GENTE NOSSOS SOLVAVOS QUE; Quem qude queespommspl
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OBRIGADO!

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JOE SOPAPO/oe
(1928), de Ham Fis
O autor usava jov
inexperientes como. E
assistentes. Um deles.
AlCapp, depois de
famoso com Li'l Abn Você ta transferido
denunciou em campai pora a Pisco
virulenta a <a Central...
exploração de que for:
vítima. Fisher,

Hergé/Editions Casterman
tipo paranóico, |
humilhado nos tribu
suicidou-se. Uma tra
no mundo humorístic.
dos comics.

TINTIN (1929), de Hergé (Georges Remi). Grande sucesso


internacional e deflagrador da “escola belga" de quadrinhos,
influe nciando os franceses. Sempre acompanhado de seu cãozinho, Milou,
os detetives gêmeos Dupont e Dupond e outros.
Ê Publicado em revistas, livros, álbuns,
virou brinquedos e filmes de animação e até teatro.

66 67
HERGÉÊ HERGE
AA

Publicou vinte e dois volumes, traduzidos para cerca de trinta línguas,


inclusive no Brasil, pela Distribuidora Record. Seu último álbum foi publi-
cado em 1958. Fez dois filmes em longa metragem e diversos curtas. Decla-
O maior desenhista europeu, rou que Tintin viajou, na fantasia, pelo mundo todo e que ele ficava em ca-
sa, trabalhando. Depois, ficou “preguiçoso”, deixou Tintin parado e pas-
criador de Tintin sou ele a viajar pelo mundo. Onde quer que fosse, recebia prêmios interna-
cionais, como em Lucca, Itália, em 1973. Logo depois, encontrei-o em Ro-
ma, comprando remédios, na Piazza San Silvestro. Sempre com o humor e
doçura que o caracterizavam, disse que não era fácil manter o “charme” de
Morreu em 1983, no Hospital Saint Luc, em Bruxelas, com leucemia, mancar sempre: era aleijado de uma perna.
Georges Remi, que, com o pseudônimo (foneticamente tirado de suas ini- Tintin sempre era acompanhado do seu fiel fox terrier Milou. Além
ciais, R.G.) de Hergé, criou um dos mais famosos personagens do mundo destes, criou diversos personagens inesquecíveis na historieta, como os 1r-
dos quadrinhos: Tzntin. Nascido em 22 de maio de 1907, próximo a Bruxe- mãos gêmeos detetives Dupont e Dupond, o gênio do mal Rastapopoulos, o
las, cresceu nos subúrbios de Marolles, no setor operário, onde aproveitou o incurável conspirador General Alcazar e a cantora de ópera Bianca Castafio-
dialeto local para seus escritos futuros. re. O irascível Capitão Haddock surgiu pela primeira vez em 1941, e em
Em Nova Iorque, onde nos encontramos na primavera de 1972, num 1945 o Professor Calculus.
congresso de quadrinhos em que recebeu mais um de seus inúmeros prê- Criou outras histórias, mas Tintin é sua grande obra. A influência do
mios internacionais, declarou: “Quando criança, eu deveria me tornar um maior cartunista europeu é imensa e, graças a ele, o número de desenhistas
clérigo ou um fotógrafo, pois na Bélgica não existia o trabalho de de seu país floresceu tanto que é conhecida na Europa “a escola de
desenhista”. Este homem modesto e simples praticamente criou a profissão Bruxelas”, do renascimento dos quadrinhos europeus após a Segunda
na Bélgica, que passou a ser um dos mais prolíficos países na revelação de de- Guerra Mundial. Emprestou o nome de seu personagem para seu amigo Mi-
senhistas. No mundo dos quadrinhos, era considerado o mais importante chael Gregg lançar uma revista com diversos personagens belgas, ao lado de
desenhista europeu de todos os tempos. artistas como Hermann, Danny, numa revista chamada Tintin, mas que
Conforme revelou, começou a trabalhar como contador numa revista, não publicava novas histórias do personagem.
Le Vingtiême Siêcle, e, quando o editor decidiu lançar uma revista para os Durante os últimos anos, Hergé não permitia a realização de novas his-
escoteiros, passou a responsável pelo suplemento “Le Petit Vingtiême””, um tórias, nem de novos álbuns, tampouco de filmes, 7zerchandising e outras
jornal szandara, dobrado em quatro. Ilustrou um texto de outro, Totor, la comercializações, para desespero de seus associados, que queriam transfor-
Patrouilles des Hannetons, até dizer “Basta” para o escritor e criar seu pró- mar sua criação em objeto de consumo. Seja como criador de Tznt1n, ou co-
prio texto para um menino escoteiro de catorze anos, loirinho, Tzntin. O jor- mo personalidade, Hergé, Georges Rémi, pertence ao Olimpo dos criadores
nal era católico, anticomunista. Sua primeira história, Tintin au Pays des So- do mundo da fantasia e da aventura.
vzets, era uma obra contra o comunismo. Leu alguns livros sobre a Rússia, co-
letou ilustrações e escreveu e ilustrou seu primeiro trabalho criativo. O suces-
so levou-o ao Congo-Belga, numa história, evidentemente, colonialista. O
anúncio de uma terceira obra, a ser passada na China, teve a assessoria de um
padre que a visitara e alertou o jovem autor para cuidar melhor de conhecer o
país retratado. A partir daí, suas pesquisas de texto e visualização dos países
envolvidos nas aventuras de Tintin passaram a ser cuidadas e realistas. Tudo
começara em 1929. O sucesso levou à publicação de álbuns, coincidindo
com a mudança de direção na revista, o que o levou a ser publicado pela edi-
tora Casterman a partir de 1933 até seu fim.

68 69
r
Z
E
atindos éRirior para ramount. Surgiu o! ichandiso do apita
Segar assinava com um char (cigan), e focado | com seu no
Morreu em 38 dores
7 que
no revival dos comi
POPEYE
O marinheiro mais famoso do
mundo
Ele apareceu pela primeira vez numa quinta-feira, dia 17 de janeiro de
1929, no jornal de Nova Iorque Evening Standard, na tira Thimble Theatre,
publicada desde 1919. Bastou isso para o marinheiro de cara amassada assu-
mir o comando da historieta criada por Elzie Crisler Segar, surgindo como
um antecipador dos super-heróis com superpoderes. No caso dele, como to-
dos sabem, provêm do espinafre. |
Nascera em Chester, Illinois, onde cresceu trabalhando como opera-
dor de projeção num cinema e levou para o túmulo uma tatuagem no braço
com as letras MPO (grotion picture operator).
Seu personagem virou astro dos desenhos animados produzidos pelos
estúdios Fleischer, dos desenhos na televisão e de uma superprodução holly-
woodyana, dirigida por Robert Altman.
Logo depois do armistício da Primeira Guerra Mundial, Segar tentou
trabalhar como desenhista. Foi a Chicago, procurou Richard Fenton Out-
cault, que lhe conseguiu um emprego de ilustrador daquilo que ele, inúme-
ras vezes, projetara no cinema: Charhe Chaplin 's Comuc Capers. Dois anos
depois, o Syndicate suspendeu a tira. Desempregado, recém-casado, teve
que ir a Nova Iorque e conseguiu colocar Thinble Theatre. Começou com
Olive Oyl e Ham Gravy, depois surgiu Castor Oyl, Blizzard apareceu e su-
miu. Finalmente, Popeye.
Segar é sério a respeito de sua criação: “Popeye tem um passado triste. E
eu digo que o pathos é o melhor fundo para o humor. À tragédia e a comé-
dia estão intimamente ligadas: uma está a um passo da outra. Quando suce-
de algo cômico com um personagem sério como Popeye — é realmente en-
graçado. Se você dá a impressão aos leitores que está tentando fazê-los rir, es-
tá perdido!”
Depois, veio um personagem tirado da vida real, J. Wellington Wimpy
(Dudu, no Brasil, de San-Dudu-íche), árbitro desonesto de uma luta de bo-
xe em 9 de março de 1931, vaidoso, astuto, ladrão, embusteiro, egoísta,
adulador, covarde, folgazão. E, além de tudo, filante, pela sua voracidade
71
POPEYE POPEYXE

legendária, convertendo-se em marca de uma rede internacional de snacks, Sem contar as vendas de espinafre, cujos produtores dedicaram a Pope-
a Wzmpy's. ye uma estátua em Crystal City, Texas. Bem mais dos que os dois mil dólares
A avalanche de personagens continuou: Alice the Goon, superfeia. semanais ganhos pelo gênio de Elzie Segar, que não soube exigir o salário de
Eugene the Jeep. Este era tão estranho que, quando a Willys Overland criou doze desenhistas...
um carro para guerra, os soldados o apelidaram de Jeep.
O assistente de Segar — que assinava um charuto (cigar) fumegante
em trocadilho com seu nome —, Bud Sagendorf, casou-se com a filha de El-
zie. Quando morreu o sogro em 1938, o genro assumiu, sem, contudo,
assiná-lo. Afastou-se depois, deixando os trabalhos para Tom Simms e Bela
Zaboly. Este, imitando o criador, colocava uma abelha na assinatura.
O personagem Popeye, no texto de Segar, era incisivo, com frases rápi-
das. Quando o escroque Castor lhe oferece o serviço de doze homens, o herói
responde: “Está certo. Aceito o salário de doze homens.”
Popeye não transige na defesa de seus direitos. Ao mesmo tempo, reve-
la ter um coração do tamanho de uma baleia. Coração que pulsa mais forte
por Olive Oyl (Olívia Palito). Quando, no dia 1º de agosto de 1931, Popeye
recebeu cinco mil dólares e perdeu nos dados o dinheiro para comprar uma
casa para a noiva, respondeu com uma frase definitiva ao furioso ataque de
Olívia: “I Yam what I Yam an” that's all Yam!”
O estudioso Coulton Waugh exulta: “Aqui ele emerge em todo es-
plendor. Um 1 Y477 e ele teria sido esotérico; dois 1 Yam teriam feito dele
um fascista, não se importando com o que os outros pensam; três 1 Yam o
definem como um democrata, um herdeiro da fraqueza comum, cuja frui-
ção deve ser encontrada na união e no entendimento com os outros.”
Já para o cineasta Alain Resnais, “comer é um signo de humanidade,
por conseguinte, de debilidade”. Francis Lacassin, amigo de Resnais, desen-
cadeador do movimento europeu pró-coznics: *Um dos segredos das histó-
rias de Segar é verdadeiramente esta facilidade para se mover fora das con-
venções. Dizer brutalmente aos outros o que se pensa deles. Ser grosseiro
com as damas. Lutar. Tratar mal os pais. Devorar ruidosamente a sopa. Co-
mer com os dedos e as mãos. E, ao mesmo tempo, a abstração, a irrealidade
das histórias e das situações, junto com os bons ideais fundamentais, e com o
mundo mágico dos contos exóticos, dão às fábulas de Segar uma fascinação
estranha e irreal.”
Em 28 de agosto de 1938 aparece pela última vez a assinatura fume-
Erar(que se apagou) na página domingueira colorida de Popeye. Era pu-
blica a, então, em mais de seiscentos jornais diários, em vinte e cinco países.
Os direitos de televisão e cinema produziram, até a década de 60, mais de 60
milhões de dólares e, com os bonecos e merchandising, subiam a cerca de
200 milhões de dólares.

72 13
MICKEY MOUSE
Walt Disney
UTENSÍLIOS DE
COZINHA FARA
ESTA'NA HORA
DE MIAR +
UM DESPERTADOR Ei Wo Aa]
YVETTE FICARA” [PME
contente Jin
TARZAN
o Hal Foster
Tarzan se exercito no arco e flecha e, na cabana, Renova seu estoque de flechas apavorando os cani-
encontra o diário do pai, fotos e um medalhão. bais pelo poder invisível e diabólico.
y AT NNW
AR
United Feature Syndicate/ERB Inc.

o volta à tribo, narra suas proezas. Kerchok, roen- Tarzan enterra a faca no coração do enorme corpo. .
O-se de ódio, grita: — “Tarzan! Venha lutar! Lorde Greystoke
se torna o Rei dos Macacos!
e 1929) de Hai Foster. O-grande ilustrador que faria depois Príncipe Valente desenhou em tiras o
oo e E.R. Burroughs, mudando os quadrinhos, juntamente com Buck Rogers, de crianças travessas e
Ma a E dao a aventura, dando início à Década de Ouro dos Comics. Em 37, outro grande desenhista, Hogarth
ar o visual definitivo aos quadrinhos de Tarzan.
TARZAN E BUCK ROGERS

TARZAN E BUCK ROGERS substituído pelo seu assistente Richard Yager, e depois por Murphy Ander-
son e George Tuska, que continuaram ilustrando a história até ela ser prati-
camente esmagada pelos desenhos incomparáveis de Alex Raymond na
A aventura da Era Dourada “ soap-opera Flash Gordon.
Buck Rogers parou de ser publicado em 1967, deixando o espaço para
sempre, para tristeza de seus fãs.
Diferentemente de Tarzan, que continua sendo publicado.
Os direitos do homem-macaco são geridos pela poderosa ERC, Inc.,
em Tarzana, Califórnia, multinacional que lida com direitos autorais, ro-
Em 1929, dia 7 de janeiro, houve o lançamento coincidente de duas mances, quadrinhos, cinema, tevê, merchandising, animação, revistas, jor-
histórias em quadrinhos que iriam mudar radicalmente o caminho dos co- nais e rádios. O vice-presidente da firma, Robert M. Hodes, foi sumaria-
mucs: Buck Rogers e Tarzan. mente despedido do board of executives por excesso de gastos e processou a
Os quadrinhos eram predominantemente cômicos, daí o termo norte- empresa em quatro milhões de dólares.
americano, cozaics, com as travessuras dos meninos terríveis e das famílias Tudo começou com setgcentos dólares pagos pela revista A//-Story Ma-
pequeno-burguesas da periferia. gazine, em 1912, para o autor Edgar Rice Burroughs ceder os direitos de Tar-
Mas, em 1929, coincidentemente com o crack da Bolsa de Wall Street, zan ofthe Apes, depois de rejeitado por todas as editoras do país, por tersido
a aventura entrou soberana no mundo dos cozics, para inaugurar a Era publicada antes numa revista popular. Quando A. C. McClurg & Co. a pu-
Dourada, a década de 30. blicou em livro, tornou-se um desz-sel/er em 1914. Em 1918, chegou ao ci-
“Todos se haviam equivocado e a orgia mais curiosa e custosa da histó- nema, com Elmo Lincoln no papel-título. Na Segunda Guerra, Burroughs
ria estava concluída”, escreveu F. Scott Fitzgerald a respeito da queda da alistou-se como voluntário, trabalhando como correspondente de guerra em
Bolsa de Nova Iorque. A volta a Rousseau em Tarzan e a fuga (ou conquista) 1942 e, depois de diversos ataques do coração, morreu em 1950, sendo en-
para o espaço em Buck Rogers faziam parte do quadro social. terrado em Tarzana, conforme seu desejo, numa tumba sem inscrição.
Na verdade Buck Rogers nascera em agosto de 1928, quando uma das As reedições em livros de bolso, através de seis editoras, alcançaram a ti-
” revistas mensais mais importantes na introdução da ficção científica, Azma- ragem coletiva de 50 milhões de exemplares entre 1962 e 1968: tiragem total
zing Stories, publicou a novela Armageddon 2419. Ali, narrava a história de superior à das obras do autor nos quarenta anos precedentes.
um piloto da Primeira Grande Guerra que, vítima de uma estranha inalação No Brasil, os romances de Tarzan foram editados pela coleção Terra-
de gases, perde o sentido, como Rip Van Winkle, por... quinhentos anos! marear e também distribuídos gratuitamente aos colecionadores das figuri-
O editor John F. Dille teve a idéia de ilustrar a história contratando o nhas do café Jardim. Em quadrinhos, a primeira publicação das tiras se de-
desenhista Richard (Dick) W. Calkins, que lançou no jornal de Evansvílle, veu a Adolfo Aizen, no nº 31 do Suplemento Juvenil, repaginadas para o ta-
Counter Press, a versão ilustrada de Buck Rogers. manho tablóide. O sucesso foi tão grande que saiu em álbum, no formato
O escritor de science fiction Ray Bradbury revela que o som mais agra- original horizontal, de tiras.
dável de sua infância provinha do ruído, domingo pela manhã, do jornal À história americana dessa primeira adaptação de Tarzan em quadri-
atirado no jardim pelo jornaleiro-ciclista, trazendo as páginas coloridas de nhos é complicada. O ilustrador das capas dos livros, Allen St. John,
Buck Rogers. recusou-se a fazer uma versão ilustrada diariamente, em capítulos. Quem
A historieta tinha uma equipe de cinco escritores especialistas, inclusi- fez a figura do homem-macaco pela primeira vez na revista foi Norman
ve um meteorologista, prof. Selby Maxwell, mantendo o vivo tom pseudo- Bean, mas a versão em trinta mil palavras, para sessenta tiras quotidianas, foi
científico. Parar nas mãos de uma agência de publicidade em que trabalhava Harold R.
Calkins nascera em Grand Rapids, Michigan, e teve o ilustrador John Foster. Este fez os desenhos e foi um custo colocar a tira nos jornais relutan-
T. Cutcheon como paraninfo em sua graduação, que o desaconselhou de ser a Dependeria da correspondência dos leitores a continuação ou não da pu-
cartunista, pela dificuldade de alcançar o sucesso. Calkins morre em 1947, é Icação,

76 77
JARZAN E BUCK ROGERS

A volta das tiras ficou com um desenhista menor, Rex Maxon, pois Fos- BLONDIE
ter não quis continuar o trabalho excessivo. Tarzan tornou-se um sucesso
também nos quadrinhos e, quando uma página dominical em cores foi co- Chic Young
gitada, Foster aceitou voltar.
De 27 de setembro de 1931 até 1937, Foster assinou a página. Aí pas-
sou a fazer Príncipe Valente. E no dia 9 de maio de 1937, no último quadro
da página do homem-macaco, estava a nova assinatura: Hogarth.
SO: |
SOR
Burne Hogarth viria a ser o criador visual mais vigoroso do mundo sel-
vagem do Rei das Selvas. Homem de cultura, introduziu gradativamente a
=)
Ss PEN
influência clássica de Michelângelo, das anatomias de Vessalius e os esgares
dos filmes de Eisenstein, dando à página toda uma incrível visualização de
ação ininterrupta.
Depois passou a ilustrar livros e fez a versão desenhada do primeiro ro-
mance Tarzan ofthe Apes, em recriação gráfica e visual que é uma síntese de
toda a sua importante obra nos quadrinhos.

E CASARAM
NA SEXTA ?
VAMAIS SERÃO
FELITES, E

King Features Syndicate/The Hearst Corporation


E ONDIE (1930) de Chic Young. Ela pobre, ele rico. Casaram-se. A família dele os deser-
d u. Ficaram lutando pelo dia-a-dia, como pequeno-burgueses. Tal como Pafúncio e Maro-
cas, O grande sucesso das casa
“family strips”. ap
CASAR) Uma das historietas ago
mais lidas no mundo.

78 19
CHIC YOUNG
CHIC YOUNG
tipo de mulher: a que podia assumir a liderança do lar. Devia manter-se me-
nina e alegre, independente e moralista. Livre, mas esposa. Milhões de ame-
ricanos se identificaram com essa família.
A família classe média na Depressão Chic Young faleceu de uma embolia pulmonar numa quarta-feira, 14
de março de 1973, mas a realização da historieta continua em família, como
ri da família classe média filho Dean Young, e continua agradando todas as famílias.

nos quadrinhos
““A face da América começou a mudar no outono de 1929. Em setem-
bro, a Bolsa foi mal, recuperou-se, de novo foi mal. Em outubro se precipi-
tou. À terça-feira negra foi a catástrofe. Em novembro continuou a crise. As
cotizações foram mais baixas. O mercado altista estava morto”, escreveu F.
Scott Fitzgerald em 1931.
Frederick Allen, em Apenas Ontem, escreveu: “Talvez não tenha ha-
vido uma só pessoa no país cujo modo e concepção de vida não tenham sido
afetados por essa corrente e que não tenha sido ferida pelo inesperado e bru-
tal final de toda ilusão. Com o bem-estar esfumaçado, os americanos passa-
ram a viver num mundo que exigia uma nova escala de valores”.
A historieta B/ondie escolheu esta época para vir ao mundo. O jornal
de Nova Iorque, American, de 15 de setembro de 1930, publicou a primeira
tira desta que viria a ser uma das mais lidas, alcançando 60 milhões de leito-
res diários. »
Chic Young nasceu em 1901. Sua mãe era uma artista conhecida e
seu irmão viria a desenhar T7m e Tok (Tim Tyler's Luck). “Em nossa
família”, ele explica, ““pensávamos em termos de imagens e não palavras.
Minha mãe não queria que eu fosse desenhista como ela”.
Mas acabou no staff da NEA Service, desenhando. O ambiente era ale-
gre e uma vez recebeu um telefonema de Nova Iorque, do King Features
Syndicate, oferecendo-lhe dez mil dólares anuais. Recusou, pensando que
era brincadeira de seus colegas. Meses depois, despedido, foi ao King, em
Manhattan, e o chefe, J. D. Gortatowski, perguntou por que recusara uma
oferta alguns meses atrás e resolveu aceitar depois.
Depois de tantas tentativas, acertou a história de um milionário, Dag-
wood Bumstead, que, contra a vontade de sua família de ricaços, casa-se
com uma jovem que trabalha. É deserdado e passa a viver como milhões de
americanos da classe média em plena depressão. Enfrenta a situação com
humor e amor, para gaúdio dos leitores. Logo nasce um bebê que cativa ain-
da mais os fãs.
Entre tantas mudanças na década de 30, estava a que afetava um certo

80 81
DIRTY COMICS DICK TRACY
Chester Gould

HP POBRE PAPAI. ESPEROU CONFESSOU E


1

CRT PARA ALIVIARÀ ESTA MORTO.


CONSCIÊNCIA / ai

* DICK TRACY (1931),


de Chester Gould.
Refletindo a Lei Seca,
“Chicago, os gangsters,
Al Capone, Bonnie &
FoMeu atoa. estópIO “Jamais IMAGINARA QUE Clyde, Dillinger, os
| DE DESENHO ERA SERIA SUA PRISÃO Po CASO ESTA o quadrinhos
À OQUARTO DELE. POR 46 ANOS?? ENCERRADO. apresentaram seu
primeiro detetive,
OBRIGADO. MR com uma galeria
fera — criativa de violões.
WA Influenciou os
dr a e
im, e Jean-Luc Godara.
assa X-9, escrito por
Dashiell Hammett e
“desenhado por Alex
"Raymond, surgiu para
concorrer com este
sucesso, cujo
desenho
“era caricatural.

“ DIRTY COMICS (1930). Na década de 30, autores r


anônimos, em desenhos canhestros, lançaram revistas é]
clandestinas pornográficas em “8 páginas”, .
a 40 centavos, com sexo explícito
e exposição de órgãos sexuais. Eram os “gibis sujos”,
as ““bíblias”. O deboche, o senso de humor :
e a sátira acabaram influenciando a revista Mad, 5
na década de 50, e os underground comics, nos anos 60.

82 83
BETTY BOOP JANE POUCA-ROUPA
Max Fleischer Norman Pett

EM
| EEST
e .
ç
DA LITOMATO FILM! A
y ERA UM PROMISSOR

Kina Fegtures Sundicate The Hearst Corporation


BETTY BOOP (1931) de Max Fleischer.
Começou como desenho animado e, com a repercussão,
virou quadrinhos. Uma das pioneiras da introdução do sexo na área. JANE POUCA-ROUPA/Jane (1932), de Norman Pett. Tira diária inglesa, uma das primeiras a
introduzi ao
tir a nudez feminina (a modelo era a esposa do autor) e a malícia do sexo na página
“O rosto angelical era moldado da estrela de
Helen Kane (que processou o autor) E do jornal. O assistente de Pe tt, Hubbard (desenho acima) substituiu o criador. Depois,
ane a Filha de Jane. Mas Jane era insubstituível.
e o corpo (adivinhem!) de Mae West.

84 85
PINDUCA
Carl Anderson

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ANDERJOR ——

| EN “mudo, expressav
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“pela imagem.A
“tomima teatral.
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Cope. 193, King Festures Syndicate, inc, Workd cghas reserved


Gisa

86
BRUCUTU
Eo — Vince T. Hamlin

VOCÊ QUER FAZER DE j AGORA TIRE A


LOUCO PARA TODOS,MAS ( COROA DO REI GUZ
À E SAiA DO TRONO/

NOSSA! COMO
Conseguiu

87
DRURA A

r Dave
rieta até 1971, quando se aposentou e passou à criação para seu auxilia
Graue, que mantém o mesmo padrão literário e visual na história. Hamlin
fot um trabalhador modesto.
Do mundo das cavernas para
sempre
A galeria de tipos que criou é imensa. O seu dinossauro manso e fiel,
é seu companheiro inseparável. No reinado de Mu, é mais forte e
os quadrinhos, e vice-versa
Dinny,
Grão-
exerce a liderança que o inepto Rei, maltratado pela Rainha e pelo per-
em todos os
Vizir, não consegue. A eterna noiva de Brucutu — como
sonagens dos quadrinhos — é a belíssima e sensual morena Ulla.
No Brasil, suas histórias foram lançadas e sempre publicadas nas em-
O Globo e
Pablo Picasso declarou que uma de suas mágoas era jamais ter feito his- presas de Roberto Marinho. Começou nas tiras diárias do jornal
nas páginas do Globo Juvenil e do Gibi. Depois , també m em revistinhas
tórias em quadrinhos, mas teve uma fase influenciada pelas pinturas das ca- dio Ea
vernas. E, como todo mundo sabe, os quadrinhos retomaram a linguagem publicadas pela Rio Gráfica.
simples e universal das pinturas das cavernas. Em 1939, Hamlin cansou do mundo pré-histórico e introduziu dois
assis-
Os quadrinhos reencontraram as cavernas no dia 7 de agosto de 1933, personagens: o Professor, inventor de uma máquina do tempo, e seu
e logo depois o
com a criação de Vincent T. Hamlin, A//ey Oop, lançado sob o nome mui- tente maluco, Oscar. Brucutu e Ulla vieram para o século XX
bem
to criativo, no Brasil, de Brucutu. Dinossauro também viria. Graças a aventuras malucas, Hamlin usou
A tira diária era distribuída pela NEA (Newspaper Enterptise Associa- esta máquina de H. G. Wells, fazendo seu herói se encontrar com Cleópa-
e
tion) e, em 9 de setembro do ano seguinte, começou a ser publicada tam- tra. , lutar nas Cruzadas, tornar-se espadachim na pirataria do século XVII
bém em suplementos dominicais coloridos. até aparecer no mundo do western.
Vince T. Hamlin nasceu em 1900, em Perry, Iowa, e começou, como Alguns críticos estão reestudando os trabalhos de Vincent T. Hamlin e
tantos outros cartunistas, a fazer caricaturas de seus professores na escola. descobrindo que algumas de suas páginas dominicais em cores, desde 1936
Durante a Primeira Guerra Mundial, foi para o Exército, aos dezessete anos, até 1940, são modelos de /ay0ut inovador e uso moderno das cores.
e enviado com as Forças Expedicionárias para a França. Retornou em 1918, Durante a Segunda Guerra, atendendo ao apelo do presidente Roose-
terminou a escola e estudou jornalismo na Universidade de Missouri. Em velt, todos os personagens dos co7zics aderiram ao esforço de guerra e luta-
Des Moines, trabalhou como repórter para o Register and Tribune e depois ram contra o Eixo. Ficou famosa uma cena em que, no seu alistamento, Bru-
a
para o News. Nos anos 20, mudou-se para o Texas e trabalhou também co- cutu assombrou o mundo, pois uma radiografia de sua cabeça mostrava
mo fotógrafo e cartunista para os jornais de Fort Worth. Em 1927, foi tra- inexistência de cérebro. Era tudo branco.
balhar como /ayout 7man, cartazista e mapeador nos campos de petróleo. Talvez tudo estivesse dentro da cabeça de seu autor, modesto gênio.
Foi lá que teve a idéia de criar um personagem pré-histórico para os co- (“Um Deus dadivoso me forneceu ferramentas e eu apenas as uso"), sem-
gmics. Sua mente era fértil como os campos petrolíferos. Em 1929, fez os pri- pre abrindo mão de prêmios em benefício de outros artistas menores. Uma
meitros esboços, que apresentou ao departamento de arte do Register and lição de modéstia para todos os artistas do mundo, cultivadores do ego, em
Inrbune. O processo foi lento e difícil. “Primeiro fiz uma família moderna seus pequenos mundos. Não o mundo grandioso dos quadrinhos, que vem
nos dias das cavernas. Trabalhei um ano nisso, depois rasguei tudo. Outros desde as pinturas das cavernas até nossos heróis de hoje.
seis meses noutro homem das cavernas e então cheguei a Alley Oop”. (Co-
mo se vê, muitos anos antes de Hanna-Barbera e da tevê, Hamlin teve a idéia
dos Flinstones e não a achou suficientemente boa.)
De fato, Popeye se parece com Brucutu, principalmente pelos braços,
que têm os músculos no lugar errado, para indicar força excepcional. Além
do uso do machado de sílex, é claro.
Vendeu sua nova tira para o NEA Service e desenhou e escreveu a histo-

88 89
BRICK BRADFORD
Wulham Ritt e Clarence Gray

É ali, à direita. "| Primeiro vou tentar entrar pacificamente.


"| Eles reagirão e, ao meu sinal, seus homens
| abrem fogo.

Não é maravilhoso, Brick? O sonho | Estou Impacien-


da minha vida! Imagine as des- te pra começar
cobertas que faremos com este nossa experiên.
Sem aparelho. cia.
saber
que
a casa
estava
cercada,
Brick e
Kopak
vão
dar uma
última
olhada
na
esfera.

BRICK BRADFORD (1933), de William Ritt e Clarence Gray. Antecedeu Flash Gordon em cinco.
meses, como ficção científica. O texto de Ritt introduziu a viagem no tempo. E os desenhos de Gray,
principalmente nos capítulos coloridos de domingo, valorizaram a série, que chegou a ter aventuras.
clássicas. Como No Centro da Terra e Viagem ao Interior de uma Moeda.

90
FLASH GORDON
Alex Raymond

Mandem preparar
“58 õ

e Dale são conduzi


o pelotão! Vamos
E presença do monar-
fuzilar este homem!
Cã...

Que sucede à
cidade dos
homens-
-pássaros?
Choque de
LOLD

planetas?
Cataclismo?
PICdESE

Que
acontecerá a
Flash Gordon
1NC

e a Dale
ço y Arden?
dtc/

q sa º
SyVNdI

o
Features

O palácio oscila » Pois: as colunas | fa


(1
que
ing

O sustêm se desmoronam... ' E

| LASH GORDON (1934), de Alex Raymond. Para concorrer com Buck Rogers, o King Features
ançou uma ficção científica que sobrepujaria todas pelo desenho de Raymond, que deu um visual de
antecipação no design do futuro. Um Gustave Doré contemporâneo. Depois, nas mãos de outros
artistas menores, perdeu a supremacia.

91
JIM DAS SELVAS
Alex Raymond

IM DAS
SELVAS
Um naTIVO ]
APROVEITA-SE |
DE QUE TIM |
ESTA PNDEFESO
DESARMA....

a
EA al

A
« 4 po) $ do

RAYMOND mm Ps E aca
a
Rot
E
é
ae e

AMARRADOS . TIM E MIKE SÃO Os cativos SÃO INTRODUZIDOS NA MONTANHA,


OBRIGADOS A ACOMPANHAR OS ATRAVÉS DE UM TÚNEL...
INDIGENAS ATÉ À MONTANHA É, TIM NOSSA + ..
TUDO ESTA PERDIDO. TENHO
QUE DA PARA O VALE DE MI-Ki... SITUAÇÃO ESTÁ MN um PUNHAL ESCONDIDO NA BOTA A!
DIFICIL...
o

y E zo is =

r” DP 4 dg RAD Ra À o à EEE ed E
JIM DAS SELVAS/Jungie Jim (1934), de Alex Raymond. Para concorrer com Tarzan
Alex criou esta série de aventuras na Natureza. Completava a página dominical de Flash
Gordon. Ao mesmo tempo, fazia X-9 diariamente, para concorrer com Dick Tracy.

É
92 4
ú
AGENTE SECRETO X-9
Dashiell Hammet

n ' O BAIXINHO NÃO TEM ENQUANTO ISSO, EVELYN ESPERA,


REVISTE - OS: NADA... MAS ESTE AQUI IMPACIENTE, POR X- 9.
TEM UM REVOLVER !

DEEM-ME NOS
E SOMA
APENAS CINCO DAR BE AS À
MINUTOS & MAQUINAS
ISOLAREI PARAM!
ESTA TARTARU-
GA DO RESTO DO
MUNDO... NEM E8-
TÁTICA GLA IRA
TRANSMITIR!

AGENTE SECRETO X-9 - (Secret Agent X-9) de Alex Raymond. Um dos


últimos trabalhos escritos por Dashiell Hammet foi o roteiro das histórias
em quadrinhos do Agente Secreto X-9, de 22 de janeiro de 1934 a 16 de
novembro de 1935, cuja primeira história se chamava “O Caso Powers”
(The Top), publicado no Evening Journal, com belíssimos desenhos de Alex
Raymond.

99
DASHIELL HAMMETT LD ASFUELL HAMME4 1

lerRed Harvest, declarar que Hammett elevara o policial RR da e


grega. De fato, a tragédia grega nunca esteve tão próxima de po Rã de
Um escritor que elevou o policial expressão: a vítima, àfatalidade do crime, o castigo qe
final, o encaminhamento trágico para O desfecho em que o bem ea justiça
, à revelação

à altura da tragédia grega EE de o drama da família (em geral, me


devorada pelas entranhas do crime que ela mesma praticou. Uma a
que pode importar gângsteres para a cidadezin ha quepia É gp
Um dos últimos trabalhos escritos por Dashiell Hammett foi o roteiro gar o florescente sindicalismo local e matar os líderes operários. :pi iente
é corrompido com o lenocínio, os jogos, à cobiça pelo dr , a a
das histórias em quadrinhos do Agente Secreto X-9, de 22 de janeiro de
1934 a 16 de novembro de 1935, cuja primeira história se chamava ““O Caso trama envolve os próprios capitalistas mandantes, colocan lo em cheque a
Powers” (The Top), publicado no Evening Journal. com belíssimos dese- sua moral, as amantes, mães e filhos, a dissolução da família. Há a mesma
nhos de Alex Raymond. imoralidade no detetive particular que, colocado por acaso no rolo eae
A “The Top”, seguiram-se “The Mystery of the Silent Guns”, “The sor, com sua determinação destrói com violência e põe a nu a decadência da
Marxyn Case”, ““The Torch Car Case””, “The Iron Claw Gang (The Missing família corrompida pelo poder e pelo dinheiro. Os tiros, o sangue, as mor-
Philip Shaw)”, “The Egyptian Jewel Case” e “The Fixer””. tes, a frieza do policial detetive aparece como o braço justiceiro para punir a
todos. Desumanamente, pois é Zeus e Thanatos. As escadas RR
Raymond parou então de desenhar X-9, mas Hammett já interrompe-
ra seus roteiros no meio da história “The Iron Claw Case Gang”, no dia 6 de sões são o palco cênico do teatro grego, o anfiteatro onde as tragédias são
postas. O final abrupto da dissolução dos costumes e a morte e o clí-
junho de 1935. Raymond trabalhou sozinho no texto e, a partir de 23 de se- da emer-
max e o pré-final: o desmantelamento da ordem social e familiar
tembro de 1935, no início do episódio de “The Fixer””, Leslie Charteris co- E
meçou a escrever o roteiro, ele que era o criador de Simon Templar, O Santo. ciedade americana.
todos esses elementos foram recolhidos por Hammett de EN ne
O diálogo de “The Top”, sem dúvida o melhor episódio de X-9, era e os
solto, o roteiro tinha cortes eficazes e essenciais, e o tema desenvolvido (de cia pessoal como detetive da agência Pinkerton, na América da lei
anos de Bonnie & Clyde, de Dillinger, de Al Capone: uma espécie de repeti-
forfna confusa e aos borbotões, como característico em Hammett), era con-
vincente. ção urbana histórica e social dos bandoleiros dowestern, com seus vaqueiros,
O personagem principal, o elegante e inquietante Dexter, que usava
i banqueiros, xerifes e latifundiários do 7n1d- western da grande nação; a
muitos nomes, como o detetive particular X-9, era muito próximo da figura os gângsteres, a polícia corrupta, os mesmos banqueiros. Quer a se le
de Gary Cooper no filme policial City Streets, de 1931, dirigido por Roubem bra do final do filme Re/íguia Macabra (The Maltese Falcon): Do último Za
Mamoullan para a Paramount, com Silvia Sidney, escrito por Dashiel Ham- ke em que o detetive Sam Spade (Humphrey Bogart) entrega à polícia aFai
mett, mas possivelmente modificado por outros escritores. Nos quadri- lher por quem se apaixonara, Brigid (Mary Astor), e ela desce para as profun-
nhos, Hammet realizou um dos grandes momentos do policial nos cozaics, dezas, entrevista na porta-sanfona de um elevador?
só comparável a Red Barry e The Spirit. E, nos quadrinhos, em X-9, aos poucos revela-se que a fortuna do mag-
nata assassinado, Tarleton, fora usurpada ao próprio irmão semidemente,
Desde a primeira tira, quatro quadrinhos, com a figura elegante de X-
deixando a verdadeira herdeira, a sobrinha, em perigo de vida, pois somente
9, num robe, recebendo o chamado do magnata Tarleton Powers e sendo vi-
gtado por gângsteres, até a última tira, em que, de forma relâmpago, como o pai dela, louco e piromaníaco, conhecia a verdade. A dissolução das nro
lias estava também nos gibis. A vilã, Grace Cold, é a viúva-amante. Eve yn,
num filme classe B, a figura do Dominador é revelada em quadros-síntese e
a vilã se redime ao interceptar a bala endereçada ao herói, a ação é constante. a mocinha, tem a ingenuidade de Dale Arden. Cyprian, o assistente filipino ,
de Phil, tirado do conto “Dead Yellow Man” ; é assassinado. E, finalmente,
E as principais características de Hammett como escritor florescem, mistu-
rando o social aos dramas familiares, o que levou o escritor André Gide, ao Gregory Mall, aliás, Alfred Hall, amante da viúva, é a revelação final. Há o

94 95
DASHIELL HAMMETT DASHIELL HAMMETT
tiroteio e a entrada teatral do grupo policial, o coro grego a amparar o herói Hammet nascera em 27 de maio de 1894, em St. Mary's County, em
ferido, sangrando, no cumprimento do dever. Maryland. Aos catorze anos, deixou o Polytechnic Institute, de Baltimore.
Em Nova Iorque, há registros de que um jovem boêmio, envolvido Foi estivador e ferroviário, antes de entrar, em 19 14, na AgenaA de investiga-
com poetas, músicos, escritores e dramaturgos, herdou um hotel em pleno ções Pinkerton. Como investigador, teve importante papel ao aa à Justiça
coração de Manhattan de um parente longínquo. O excêntrico não teve dú- uma companhia californiana de comunicações e detetar um roubo numa fi-
vidas. Chamou todos os seus amigos para ocupar os quartos vagos do hotel, nanceira de Sonora. No fim da Primeira Guerra Mundial, contraiu uma tu-
com reticentes promessas de receber alguma coisa de um artigo ou conto berculose. Em 1920, casou-se com sua enfermeira, Anna Dolan, com quem
vendido, de direitos de uma peça teatral, ou de um romance editado no fu- em San Francisco, mas, em 1930, afastou-se
teve dois filhos. GE A
turo. ília e da cidade.
Nesse pardieiro intelectual — onde não se primava pela limpeza, nem a E Pinkerton, prendera a quadrilha de ““Gloomy Gus” Schaefer, que
todas as lâmpadas eram acesas e o aquecimento era precário no inverno — havia assaltado uma joalheria, mas feriu-se gravemente quando o teto de
conheceram-se dois ilustres hóspedes, o escritor já consagrado Dashiell um local ruiu, sob seu peso, durante as investigações.
Hammett e a candidata a dramaturga Lillian Hellman. Ela sequer tinha co- Já nessa época, depois de escrever poesias, passou os textos sobre a vio-
ragem de entregar seus escritos aa homem que admirava, colocando-os na Jência do submundo que conhecia, a mão-de-obra de baixos salários, os imi-
soleira da porta do quarto do alto e elegante autor, que corrigia tudo o que grantes clandestinos, o proibicionismo e os gângsteres, tudo na chamada es-
ela escrevia; Hollywood glamurizou esta cena em Ju/za, numa praia, com Ja- cola hard-boited, com descrição da violência de forma absolutamente inédi-
ne Fonda como Lilian e Jason Robards como Dash. ta. Destaque para o conto Corkscrew, onde narra o extermínio — provocado
O último romance inteiramente escrito por Hammett seria The Thin cinicamente pela Continental Op — de um bando de mexicanos que orga-
Man, que a Metro transformou numa série de sucesso com William Powell e nizava a imigração ilegal para os Estados Unidos. ;
Mirna Loy, com o cãozinho Asta. No Brasil, era conhecido como O Assobia- Depois de seu último romance, Hammett não conseguiu completar a
dor. Anos depois, com o nome de Hammett vetado, a mesma Metro faria novela Tulzp, que ficou inédita, pois começou a se dedicar à política. Voltou
uma série para a tevê com Peter Lawford, omitindo o nome do autor nos le- da Segunda Guerra, aos quarenta e oito anos, com um enfisema pie E
treiros. À tevê continua plagiando esse esquema. Vide Hart & Hart /Casal recomeçou a beber até chegar a um estado crônico de intoxicação etílica, do
20. qual conseguiu sair, em 1948, com o auxílio de Lilian Hellman.
Hammet escreveu cinco romances: Safra Vermelha e Sangue Malaito Nos anos pós-guerra, a pretexto de atividades antiamericanas, a Comis-
em 1929, O Falcão Maltês, em 1930,A Chave de Vidro em 1931 e The Thin são McCarthy elaborou uma lista negra de profissionais que, conseguente-
Man em 1934. Mas escrevera mais de oitenta histórias para as revistas popu- mente, se vitam muito prejudicados em seu trabalho. Entre outros, dela
lares conhecidas como pulp magazines, pois eram feitas de polpa de papel, constaram Ring Lardner Jr., John Howard Lawson, Dalton Trumbo, Larry
por medida de economia. Colaborou principalmente em B/ack Mask, onde Parks, Sterling Hayden, Edward Dmytryk, Adrian Scott, Katherine Hep-
viriam depois Gardner, Cain, McCoy e Chandler. burn, John Huston, Gene Kelly, Frederic March, Paul Muni, Paul Robeson,
Em 1931 foi feita a primeira versão de Maltese Falcon e, em 1941, Clifford Odets, Dorothy Parker, Edward G. Robinson, Howard Fast, Mi-
George Raft (aliás, Giorgio Ratti) recusou o papel de Sam Spade que consa- chael Gold, Waldo Salt, Franchot Tone, Orson Welles e John Garfield.
graria Bogart. Em 1935 a Metro tenta a primeira versão da The Glass Hammett era classificado com ““seis estrelas de Stalin””, superado apenas por
Key e
depois a Paramount fez sua versão. Em 1934, W. S. Van Dyke inicia a Charles Chaplin e Ben Hecht, com sete. ar
série
The Thin Man, que continuaria até 1947. John Garfield foi encontrado morto, nas mesmas circunstânci as O
que
Em 1943, a Warner lança uma versão da peça teatral de Lilian Hell- advogado do casal Rozemberg: afogado na banheira. Era um dos métodos
man, Watch on the Rhine, com roteiro de Dashiell Hammett. do FBI. A peça de Clifford Odets, The Big Knife, é sobre este tema. O ator).
| Em 951,oculto, refinado, elegante e discreto escritor foi condenado à Edward Bromberg se suicidou na Broadway. Diversos diretores, escritores e
prisão pelo macarthismo, por liderar um grupo de intelectuais
que anga-
riava fundos para defender o comitê central do Partido Comunista
na prisão.

96 97
ALLA ALLIAIÃ, À ALALVILVALS A À

produtores foram presos, impedidos de trabalhar e expulsos (como Joseph


Losey, Jules Dassin, John Berry) da América.
TERRY E OS PIRATAS
Quando Hammett saiu do cárcere, tendo recusado “name names” Milton Caniff
(como o fizeram Ginger Rogers, Adolphe Menjou e Robert Taylor), estava
combalido e seus últimos anos são nebulosos.
Lillian Hellman, com quem viveu trinta anos, o recolheu e ficou com
ele escondido em casa. Nem os amigos mais próximos tiveram acesso a ele
nesses anos todos. Dez anos, em que ele estaria em profunda depressão.
Hellman converteu-se ao catolicismo quando traduziu O Canto da Co-
tovia (The Lark), de Jean Anouilh, para a Broadway. Foi reintegrada à socie-
dade americana e, depois da morte de Dash, escreveu sobre a vida em co-
mum que tivera com ele.
Hammett morreu na mansão em que viviam, dois meses após a desco-
“AND THE PIRATES

os
berta de um tumor pulmonar. Ao que tudo indica, ele estaria completa-
mente louco e destruído, e Hellman poupou seu final trágico da curiosidade
pública.

Q ...VOCÊ VAI FICAR IRRITAPO COM TERRY E OS


BEM VOCÊ CONSEGUIU... A BUROCRACIA ... MAS SEJA PIRATAS . o
É UM OFICIAL DA FORÇA AEREA.... PACIENTE... 4 AGUIA SEMPRE
ESSAS ASAS PARECEM DE ESTEVE DE POSSE DABOLA DE GUERRA
(1934) de Milton Caniff.
NEON... MAS TEM COISAS QUE DESDE 1776 — LEVE COM HUMOR... Uma das histórias de
PRECISA LEMBRAR aventuras de maior
repercussão, seja
pela linguagem
cinematográfica
PIO GUIA W (influenciada por Ford
e Hitchcock) seja pelo
. RS y )

mk /.
na E
É desenho ou pelo texto.
Ao lado, trechos da

York News Syndicate


/Okay, FIM DO famosa página que foi |

The Chicago TribuneiNew


so inscrita nos anais do
LEMBRE SE QUE HA MUITOS OUTROS
SudeiTos No PAcíFico SUL ALASKA, Congresso Americano
INGIATERRA ASIA E CONTAM COM VOCÊ vos durante a Segunda ||
PARA VOLTAR BCASA “BOA NoiTE GAROTO. Guerra Mundial.

98 99
TERRY E OS PIRATAS TERRY E OS PIRATAS

talhamento visual era riquíssimo, usando modelos vivos para seus persona-
gens, que revelavam facetas inusitadas.
As aventuras de Terry era um garoto loiro que foi crescendo ao longo das aventuras, fu-
gindo ao padrão habitual de que os personagens de quadrinhos não cres-
Terry e os Piratas cem. Pat Ryan era seu companheiro e Burma era a mocinha, mas April Kane
era a namorada de Terry. Os vilões, além do Capitão Judas e do General
do mestre Caniff Klang, eram liderados por uma sensual Madame Dragão, que, na verdade,
se chamava Lai Coi San, o que significa Montanha de Saúde”: O escritor
John Steinbeck, Prêmio Nobel de Literatura, era o fá número um de Dragon
No dia 22 de outubro de 1934, atira diária Terry e os Piratas, de Milton Lady.
Caniff, distribuída pelo Tribune News Syndicate, começou a ser publicada Quando o Japão invadiu a China, Terry e seus amigos se engajaram na
e em 9 de dezembro iniciou-se um capítulo dominical, ligando a tira de sá- luta para expulsar o invasor. Em 7 de dezembro de 1941, após Pearl Harbor,
bado à de segunda-feira. Na época, combinando a circulação do Sunday Terry ingressou na Força Aérea e seu companheiro passou a ser Flip Corkin,
New York News com a do Sunday Chicago Tribune, a tiragem atingia qua- calcado no herói verdadeiro, Coronel Philip Cochran. Uma página domini-
tro milhões de exemplares. cal de Terry era tão bem escrita e definia tão bem o espírito determinado de
Essa historieta viria a revolucionar o mundo dos cozxics e revelar um dos busca da vitória, que foi incluída nos Anais do Congresso, numa segunda-
melhores dramaturgos norte-americanos, com um texto másculo e direto, feira, dia 18 de outubro de 1943.
deslumbrantes desenhos em preto e branco, nas tiras diárias, e um brilhante Depois de criar um “estilo Caniff” desenhado e escrito, ser saudado
uso de cores, nos domingos. Desenhando com a mão esquerda e escrevendo como um dos ilustradores mais importantes em todos os tempos do dese-
com a direita, Caniff influenciou toda uma geração de artistas em todo o nho a traço, em disputa judicial contra o seu distribuidor, assinou a última
mundo. Conforme o livro biográfico publicado sobre ele, era O Rembrandt tira no dia 29 de dezembro de 1946.
dos Comic Strips, tal a força do seu uso do branco e preto, cores e efeitos de O Syndicate contratou outro artista, George Wunder, para continuar o
luz. trabalho. Em desenho excessivamente achureado, continuou a ilustrar um
Desde o início, influenciado por Kipling e Robert Louis Stevenson no texto muito aquém do “estilo Caniff”, até desaparecer, no dia 25 de feve-
texto, usou a técnica cinematográfica e não perdia um só filme de Hitchcock. reiro de 1973, pela decadência de histórias fracas e personagens caricatos.
O uso de planos sempre foi seu forte. Chegou ao cúmulo de, numa tira, ao Milton Caniff, porém, criou, logo em seguida, outro personagem de
fazer um contre-plonget de dois soldados conversando na chuva, inverter a sucesso, Steve Canyon, que foi publicado em tira diária a partir do dia 13
diagonal das gotas de chuva, no corte de um quadrinho para outro. de janeiro de 1947. Sua primeira página dominical ficou famosa pela análise
Por outro lado, influenciou o cinema: a sequência inicial do filme de que Umberto Eco dedicou a ela.
Lewis Milestone, The General Died at Dawn, era toda inspirada na atmosfe- Milton Caniff nasceu em 1907 em Hillsobro, Ohio, desenhou Dickze
ra de Terry, cujo habitat era a China. Também Joseph Losey usou a força vi- Dare antes de Terry, e foi um dos fundadores da National Cartoonist So-
sual de Caniff em Modesty Blaise, principalmente na estética de seus vilões. ciety, em 1946, tendo sido seu presidente. Embora sua historieta Steve Ca-
Sua aproximação maior, porém, era com John Ford, especialmente nas pa- nyon seja mais desenhada pelos assistentes Ray Bailey e Dick Rockwell (so-
norâmicas. Quando teve a audácia de matar uma de suas personagens mais brinho de Norman Rockwell), ainda é escrita pelo mestre.
queridas, Raven Sheridan (causando uma comoção nacional), publicou
uma tira que era um quadro só, como uma panjohnfordiana, de Terry e Pat
diante de uma cova rasa nas montanhas orientais.
Seu realismo nos desenhos era tanto que chegou a fazer exposições no
Metropolitan Museum of Art, de Nová Iorque. Usava o National Geogra-
bhic Magazine, para suprir o fato de nunca ter estado na China. Mas seu de-

100 101
RÁDIO PATRULHA O REIZINHO
Eddie Sulhvan e Charhe Schmidy Ozto Soglow

, ([—OLHA, PATRICI
Pr” a ANOBRANDO O CARRO POLICIAL
vil BARATINHA, AZISL. - asst PATILICIE vAE COLOCA-LO
. ( — ENTRA, PALLANHO | ATRAVESSANDO A RUA, AF|M DE
a ASSINA, POSSA PARALIZAR A VELOCIDAD
MELHOR
DOS BANDIDOS coa /AAS o « q
ZE 7

King Features Syndicate/The Hearst Corporation

O. soCuow

RÁDIO PATRULHA/Radio Patrol (1934), de Eddie Sullivan e Charlie O REIZINHO/Little King (1934), de Otto Soglow. Começou comcartoon,
um reaproveitamento de uma tira de Boston, com um garoto (Pinky)
Schmidt. Era passou para sofisticada revista New Yorker e depois para o King Features, a
e um cachorro numa página dominical. Curiososamente, o Rei não tem nome. Virou desenhos
setter (Irish) com dois policiais irlandeses Pat e Sam, que depois foram
acrescidos de animados de sucesso com os trabalhos de Max Fleischer (o mesmo de Popeye e
uma jovem detetive, Molly, cuja nacionalidade era... irlandesa Betty Boop). Soglow, que se assemelhava ao seu personagem, continuou
.
fazendo cartoons também. Sempre com gags visuais.

102 103
RED BARRY MANDRAKE
Wall Gould Lee Falk e Phil Davis

ELES SÃO SEUS XERIFE! BOA PONTÁRIA, E -


ESPERO QUE TENHA QUE BELO DIA PARA CO-| | "LAMENTO INCOMODA-LO, MANDRARE,
MEÇGIRMOS AS NOSSAS | | MAS ESTOU A Braços Com um
LIM NECROTE - FERIAS, MANORAKE|” CASO COMPLICADO E
MAS ALGUEM ESTRAGA "VOU EM SEGUIDA!
A FESTA CHAMADA UR-
GENTE DO CHEFE DA
vs THE vs POLÍCIA, SENHOR! *
ERA DOM DEMAIS PA-
RA DURAR!” SUSPIRA
MARDA

BY LEE FALK & PHIL DAVIS

“e... ..

EAN OR um Ex Ed |

MAS, AQUI PRA NOS, FOI UMA E PENSANgO mE-|/O que E]


MANCAVA DEIXAR A CAPA E O
eis eis
LHOR.. VOCÊ FEZ que
std
)|
e PROPOSITO * JA OR ESTA
P BRAVO. MAS FAÇAMOS AS APRESENTA:
O SR. OSCAR, ADMINISTRADOR
MANDRAKE, O REI DOS MAGICOS!”
DO "DiAMANT E
:
como é QUE um SALTIMBANCO PODER AJUDAR-
“NOS” TROÇA O SR. Oscar.

King Features Syndicate/The Hearst Corporation


as <a
Ra)

RED BARRY (1934), de Will Gould. O desenhista participou do concurso


para X-9, que foi vencido por Alex Reymond. Mas seus desenhos chamaram a atenção | Ro)O jovem(= a
| e ele criou Red Barry, no estilo noir — Chinatown nos quadrinhos. ]
MANDRAKE (1934) de Lee Falk e Phil Davis. escritor Falk criou este persona-
| Infelizmente, mesmo tendo virado fita-em-série, a censura interna do $em, inspirado nos mágicos de circo de sua infância e na planta mágica Mandrágora. O
| desenho elegante de Phil Davis marcou a mítica figura. Teatrólogo, estudioso de mitologia
King Features levou ao cancelamento, seis anos depois.
| Hoje, tal como os cult-movies, Brega, Falk influenciou Fellini, que o chama de “mestre”. Já Alain Resnais filmou o
é um dos comics mais badalados do passado.
clássico “Ano Passado em Marienbad”' calcado nas imagens de Phil Davis.

104 105
MANDRAKE MANDRAKE

da Curtiss-Wright, indústria aeronáutica, ilustrando parcialmente o manual


do bombardeiro A-25. Na mesma época, sua esposa Marta (desenhista de

O mundo hipnotizado pelas modas) passou a colaborar com ele na historieta. Phil morreu de um ataque
do coração em 1964, no dia 16 de dezembro, e o artista Fred Fredericks pas-
sou a ilustrar as tiras e edições dominicais até hoje.
mágicas de Mandrake Lee Falk, que esteve no Brasil em 1970, numa exposição de quadrinhos
no MASP, organizada pela Escola Panamericana de Arte, sempre sentiu uma
compulsão para escrever. Depois de escrever e produzir para a emissora de
rádio local de Saint Louis, foi para Nova Iorque e vendeu o projeto de Man-
No dia 11 de junho de 1934, distribuído pelo King Features Syndicate, drake para o KFS. Dois anos depois, lançou pelo mesmo King o persona-
aparecia Mandrake , em tira diária, introduzido por um nobre africano. Em o
gem Fantasma.
fevereiro de 1935, começaram suas aventuras em cores nos suplementos do- Depois de famoso como um dos melhores, senão o melhor dos roteiris-
minicais dos jornais norte-americanos. tas de comics, escreveu diversas peças teatrais, sempre calcadas em lendas
Para o nome Mandrake, o autor Lee Falk se inspirou no livro A Man- gregas (que também influenciaram seus quadrinhos), como Erts, encenada
drágora, sobre a planta misteriosa, tema básico da trama de Maquiavel. A fi- em Paris em 1968 e relançada em 1973. Ruth Escobar tentou lançar uma pe-
gura era composta como uma síntese de todos os mágicos de vaudeville que ça sua em São Paulo, sem sucesso.
iluminaram a sua infância no Missouri, Saint Louis, onde nascera em 1905. No Brasil, foi lançado pelo Suplemento Juvenil no seu nº 101,em 10
Nestes anos de aventuras, Mandrake sempre foi assistido por seu fiel de agosto de 1935, passando depois para as publicações de Roberto Marinho.
companheiro, rei de uma distante tribo africana, Lothar, e pela Princesa Em nosso país também o termo “'mandrake”” é sinônimo de mágica. Nossos
Narda, que, de eterna noiva dos quadrinhos, passou a uma amizade colori- ministros econômicos, por exemplo, mandraquianamente transformaram
da no palácio de Xanadu (herdado de Kublai Khan ou Charles Foster o “milagre econômico” numa dívida de bilhões de dólares. Tirando mui-
Kane). tos coelhos da cartola, porém, em gesto hipnótico, que imobilizou 120 mi-
Num mundo em que as principais criações nos comics são de autoria de lhões de habitantes.
artistas gráficos, não deixa de ser notável que um escritor tenha adquirido Em São Paulo, Falk declarou numa entrevista que, ao se deparar com o
notoriedade com a criação não só de Mandrake, mas também, em 1936, de sucesso internacional de suas criações, lidas diariamente por cem milhões de
outra grande historieta de sucesso, Fantasma, desenhado, então, por Ray leitores em todo o mundo, sentiu-se confuso por escrever histórias que, to-
Moore. dos os dias, prendiam a atenção de crianças latino-americanas, potentados
Lee Falk é tratado por Federico Fellini como ''Mestre”” e é um velho so- árabes, trabalhadores dos kibutz em Israel, intelectuais europeus, africa-
nho do cineasta italiano realizar um filme com os personagens de seu escritor nos, asiáticos, raças, credos e costumes diferentes e conflitantes. Concluiu,
favorito. Chegou até a produzir fotos com Marcello Mastroianni, como o porém, que se os seus personagens tiveram sucesso por um ponto básico,
mágico, e Claudia Cardinale, como a Princesa Narda. Já Alain Resnais, é deveria continuar fiel a esse princípio.
mais influenciado pelo estilo gráfico do desenhista da historieta, Phil Davis, “E constatei”, declarou, “que milhões de pessoas — em todo o mun-
sendo que O Ano Passado em Martenhad é totalmente realizado com en- do —, diariamente, gostavam das mesmas coisas que eu gostava.”
quadramentos de Mandrake, auxiliado pela atriz Delphine Seirig, ela tam-
bém umá admiradora de handes dessinées, e pelo ator Sascha Pitoeff, esco-
lhido por sua semelhança visual com os personagens de Davis.
Phil Davis nasceu em 1906, na mesma cidade de Falk, e trabalhou co-
mo artista gráfico na companhia telefônica local. Em 1928, começou a traba-
lhar no jornal da cidade, o Dispatch. Em 1933, conheceu Falk e ilustrou a
criação mágica do escritor. Durante a guerra, trabalhou como diretor de arte

106 107
QUE bua DA MARIA CEBOLA"
OLHE A CHUVA,
FERDINANDO: ROR WSPIRÁ ÃO NOSSO MERO 2
ENHA PARA PARA OS QUE ANDA NÃO SABEM,
vamos Hi RIAR O MEMORÁVEL.

MARIA CEBAHA ERA FILHA DE UM DOS


PRIMEIROS HABITANTES DE SECO,
ELZEBIAS CEBOLA. ELA ERÁ A MENINA
MAIS CASEIRA DÁ REGBIÃO...**

4
DECLARO HOJE O DIA
Ba JÁ CEBOLA"!
ANDO EU ATIRAR : SAAM POGUE! ONTEM guMiA LEBRE
SORVENDO! MO SESUNDO VIVA... E AMANH, SA VEZ
TIRO, MARIA SAIRÁ EM DO FERDINANDO! - SERE/
FERSEGUIÇÃO DEEAR.VOCÊS;
TERÁ FELIZ PARA SEMPRE|!
QUEM ELA SEGURAR:
DE CASAR NO MESMO DIA!

Au RAR ane
S QUTRAS CELIAA o aa
ENTUSIASMADAS COM A IDEIA, PASSARAM,
y
A REALIZAR ESTA FESTA TODOS 08 ANOS."

FERDINANDO/Li'l Abner (1934), de A! Capp.


Considerado o Swift ou Sterne de nossos tempos.
Elogiado por Moravia, indicado para o Nobel de q
j
Literatura por Steinbeck, prefaciado por Chaplin, capa
da revista Time, entrevistado por Resnais, eis o grande
satírico contemporâneo.

108
Al Capp, o criador de L:º! Abner

Al Capp, o criador de L7'/ Abner (no Brasil, Ferdinando), é uma figura.


mais controversa do que sua criação. Vejamos algumas opiniões a seu respei-
to:
A revista Time: ““Capp preenche um lugar comparável ao de Gershwin
no jazz, ou ao de D. W. Griffith, no cinema”.
Charles Chaplin: “Para mim, pessoalmente, Al Capp, com seus deli-
ciosos personagens, abre novas visões de bufonaria com uma sátira inspira-
da.
John Steinbeck: “Penso que Capp talvez seja, possivelmente, o me-
lhor escritor do mundo hoje em dia. Tenho certeza que é o melhor satirista,
desde Lawrence Sterne. (...) Posso pensar em Cervantes e Rabelais, que con-
seguiram fazer isto antes de Capp!” E terminava seu texto de 1952 indican-
do Al Capp para o Prêmio Nobel de Literatura.
Alberto Moravia: “Sou leitor de L7'/ Abner desde 1934”.
A socióloga francesa Evelyne Sullerot não só escreveu, ““E tão difícil tra-
duzir o texto de L7'/ Abner ou de Príncipe Valente numa língua estrangeira,
como traduzir Finnegan 's Wake de James Joyce”, como colocou um trecho
de L7'/ Abner ao lado de um excerto de Joyce para provar a semelhança literá-
ria entre ambos, na criação de uma nova língua inglesa.
A irreverência de Capp era tão grande que desafiava a Constituição dos
Estados Unidos, grafando o nome do país de seus personagens com “Yew-
Nited States”...
E como ele reagia a isso? Com sua costumeira fórmula: ““De fato, indi-
caram meu nome para o Prêmio Nobel de Literatura, mas a maioria pensou
que se tratava de uma piada””. Foi igualmente crítico ao ser entrevistado e fil-
mado por Alain Resnais, em Nova Iorque. “Jamais vira um filme dele. Ne-
nhum da zouvelle vague. Sempre pensei que este tipo de filme fosse aquele
que começa com um rapaz e uma garota indo para a cama, e passando o resto
do longa metragem discutindo se devem ou não ir para a cama”.
Foi para o primeiro congresso do mundo dos quadrinhos, em Bordi-
ghera (depois tornou-se o famoso festival de Lucca, a Cannes dos quadrinhos),

109
FERDIUNAINLAS
FERDINANDO

e escreveu um artigo para a revista Lzfe ridicularizando aqueles que o idola- republicanos, Wall Street, os trustes, numa época em que pessoas ligadas ao
travam na Europa. Foi assim que os europeus começaram a engrossar as filei- cinema, à tevê e à literatura estavam indo para a cadeia, acusadas de idéias
ras dos que o consideravam um mau-caráter. uerdistas.
Alfred Gerald Caplin nasceu em New Haven, Connecticut, no dia 28 E Em Nova lorque, em 1958, perguntei-lhe como não tinha sido chama-
de setembro de 1909. Quando criança, numa peraltice, foi atropelado por doa depor perante o Comitê de Atividades Antiamericanas, com tudo o que
um bonde e perdeu uma perna. Durante a Segunda Guerra Mundial, ga- ele havia escrito em suas histórias.
nhou uma medalha, fazendo shows para os mutilados nos hospitais com de- “Não foi por falta de esforço de minha parte””, respondeu, no seu tom
senhos e frases como, ““sua perna artificial é melhor que a minha!” eternamente irônico. ; bi
Começou trabalhando na Associated Press e, ao incentivar um jovem Esses mesmos liberais, que se compraziam mais com suas críticas ao
desenhista canhoto, foi despedido e substituído pelo seu recomendado: Dogparchian way of hfe do que com sua veia saúrica, tiveram que mudar
Milton Caniff. suas opiniões quando Capp começou a adotar idéias direitistas. No período
Desempregado, foi persuadido por Ham Fisher, o criador de Joe Pa- final de sua vida, depois de criar problemas para a UPI, começou a apresen-
/ooka(Joe Sopapo, no Brasil), a trabalhar para ele e terum percentual nos di- tar um programa de tevê, onde recusou a presença de Jules Feiffer, dizendo
reitos sem assinar os desenhos. Tornou a historieta um sucesso, até descobrir tersido um erro de seu produtor. '“Pensei que era Julius La Rose””, ironizou.
que havia sido enganado. André Le Blanc, um desenhista brasileiro que podia trabalhar no estilo
Criou uma sátira das family strips, situando-a nas montanhas, com de Al Capp (três semanas trancado num estúdio em Massachusets e três
um linguajar /7//billies todo seu. O cãozinho foi substituído por uma por- meses de férias), dizia não aguentar a arenga direitista de Capp. “Está bem,
quinha, Salomé. A mãe, matriarca e briguenta, era o melhor punho da re- AI, nós já sabemos de tudo isso, mas vamos trabalhar, não estou para lava-
gião e o paí, um fraco. E a eterna noiva, como em todos os clichês dos cozaics. gem cerebral.” Acabou desistindo da mordomia.
A primeira tira foi publicada no dia 20 de agosto de 1934, aprovada pelo Finalmente, antes de morrer, Capp se envolveu noutro escândalo. Foi
United Feature Syndicate, da UPI, que teve problemas com ele, famoso por às barras dos tribunais, tal como Roman Polansky, acusado de sodomia por
seu apego ao dinheiro e por conseguir fazer prevalecer seus interesses. Che- uma estudante. Capp morreu em 6 de novembro de 1979, dois anos depois
gou a ser um dos desenhistas mais bem pagos do mundo, no auge do suces- de ter, deliberadamente, encerrado as aventuras de Ferdinando.
so. Foi quando, em julho de 1950, colocou o seu personagem como ““fantas-
ma” de um desenhista inescrupuloso de quadrinhos. A armadilha estava
montada.
Houve protestos generalizados, mas ele foi mais longe. Escreveu para Ferdinando
a prestigiosa revista literária Azlantic Monthly um artigo intitulado “T Re-
member Monster"”, dando nome aos bois. A segunda parte da história foi
narrada a Alain Resnais.
Sua historieta foi considerada pornográfica. Logo soube que se tratava Li) Abner surgiu numa tira diária distribuída pelo United Feature
Syndicate, no dia 20 de agosto de 1934, e uma página dominical começou a
de uma montagem de seus personagens fazendo sexo, em trabalho apócrifo.
ser publicada, em cores, no dia 24 de fevereiro de 1935. Foi sucesso imedia-
Fez uma denúncia e descobriu o autor da contrafação: Ham Fisher.
to.
Processou-o e perseguiu-o até conseguir anular sua historieta e expulsá-lo da
Nas primeiras tiras, assinava AIG. Cap, acrescentando o segundo “*p”
National Cartoonists Association, o que levou o criador de Joe Palooka ao no 25º episódio. Depois, em junho de 1964, passou a UPI para trás num no-
suicídio. Mas Capp foi impiedoso, não reconheceu sua parte de culpa, pro-
vo contrato com o New York News Syndicate.
vando que Fisher era paranóico e, portanto, um suicida potencial.
O sucesso dos personagens foi tão grande que Dave Fleischer (o mesmo
Capp era o enfant gaté das esquerdas durante o macarthismo. Em ple-
no período de caça às bruxas, criou o personagem “'Shmoo””, que era clara- de Popeye e Betty Boop) fez uma série de desenhos animados em cores, nos
anos 40, para a Columbia. No mesmo ano de 1940, a RKO fez um filme
mente o símbolo do socialismo-comunismo. Nessa história atacou o FBI, os
e
111
110
A AANA LIL NA AA NAL AA

menor, com um cast insignificante. À cidade de Dogpatch (Brejo Seco) se samenteiro, o Joe Cabeleira, a Dulçurosa Suíno, o azarado Joe Btsfplk, Por-
tornou um parque tipo Disneylândia, no Kentucky, com os personagens da colino Suíno, Marilyn Monster, ReacionárioJ. Repugnante, Orson Waggon,
historieta. Capp publicou re prints de suas histórias num livro prefaciado por os Scraggs, e até uma sátira dos quadrinhos, dentro dos quadrinhos.
John Steinbeck e Charles Chaplin. Em 1957, a Broadway montou uma su- Ferdinando é um leitor fanático de uma história em quadrinhos cha-
perprodução, um musical com coreografia de Michael Kidd, com astros co- mada Fearless Fosdick, que é uma caricatura do detetive Dick Tracy, de
mo Julie Newmar, Stubby Kaye e Jerry Lewis, nos papéis principais. Chester Gould. Na historieta, Al Capp se assina Lester Gooch. E uma ava-
“Na versão cinematográfica de 1958, fizeram uma proposta, através da lanche de crítica ao “policial” norte-americano, incorruptível, cumpridor
Paramount, para Marilyn Monroe fazer o papel de Daisy Mae (Violeta), mas do dever até as últimas circunstâncias. Sempre às voltas com um salário de-
o preço que ela pediu era muito alto e desistiram da estrela. gradante, uma eterna noiva, arquiinimigos, supervilões, em aventuras exa-
“Quando o filme foi um fracasso de bilheteria, pensamos que, talvez, geradas e suspense em over dose. Vitou e mexeu, está sendo expulso da polí-
tivesse valido a pena investir no pagamento de Marilyn Monroe e ter um su- cia, com o chefe arrancando seu distintivo e chutando-o escadas abaixo do
cesso no cinema””, declarou Capp, depois. distrito. “Devo interpretar este gesto como a minha demissão, chefe?””, per-
Uma bebida de sua historieta, Kickapoo Joy Juice, foi lançada. Bone- gunta o ingênuo cumpridor da lei. Até provar que sua obsessão em encon-
cos e brinquedos sempre tiveram um 7zerchandising forte com seus persona- trar O criminoso estava certa e o chefe de polícia, errado, o readmite. Porém,
gens e muitos anúncios foram feitos com sua arte. Na década de 50, dizia-se, com um salário de principiante. l sa
ganhava perto de um milhão de dólares anuais. Discos voadores, seres de outros planetas, críticas ao sistema presidiá-
O american way of life era constantemente satirizado nas suas historie- rio, à Sibéria (Lower Slobowia), todos os países entram no mundo crítico que
tas, muito antes da revista Mad, Todos os modismos, desde o Zooz Suite ao começa em Dogpatch (Brejo Seco) e só foi terminar com o fim da historieta,
sarong, as estrelas de cinema, os políticos, o hot dog, os filmes de sucesso, as dois anos antes da morte de seu autor. e
músicas e os músicos desde Sinatra até os Beatles, tudo era arrasado nas suas Nenhum outro meio de comunicação conseguiu retratar as misérias de
tiras e capítulos dominicais, que sempre foram publicados pelo jornal O G/o- nosso século como a saga desta história em quadrinhos e, tal como A/z2as
bo e nas revistas O G/obo Juvenil e Gibi, das empresas de Roberto Marinho, Mortas, de Nicolai Gogol, só será compreendida numa visão crítica da nossa
no Brasil. Particular destaque para uma bebida cujo yr g/e era cantado pelas sociedade que termine com um diálogo típico de suas historietas. Quando
Agony Sisters, tirado de um 72rk chamado Beethoven. Os acordes iniciais da havia uma multidão, alguém colocava diante dos olhos de todos uma situa-
Quinta eram transformados em... arrotos, pois o refrigerante se chamava ção óbvia e concluía:
Burp-Cola. Burp = arroto. E, numa tentativa do Gambá Solitário e sua tri- “Como qualquer idiota pode ver”.
bo de expulsar os invasores de suas terras, na ilha de Manhattan, provocaram E, invariavelmente, alguém, na multidão, respondia:
uma enorme explosão na fábrica do refrigerante: um imenso arroto, em vez “Eu estou vendo”.
do tradicional “Boom” das onomatopéias dos quadrinhos. BURP!
A família tradicional é composta do herói, um garotão tratado como
Henry Fonda, debilóide, '“100% sangue americano”, da mãe (Chulipa, no.
Brasil) e do pai (Lúcifer); e da porquinha. Os Yokum ou os Buscapé, no Bra-
sil. A eterna noiva Daisy Mae (Violeta) conseguiu fisgar o marido depois de
anos e anos de “Dias de Maria Cebola”, o dia em que as mulheres têm que
correr atrás dos homens para conseguir marido. Mas, eis a veia satírica de
Capp, de novo: todos os dias não são dias de maria cebola para as mulheres
solteiras?
Desde Mark Twain não surgia uma sátira tão arrasadora dos costumes
do homem, nos Estados Unidos. Sua veia cômica se refletia não apenas nas
situações, mas nas criações de personagens inesquecíveis, como Samuel Ca-

112 113
SUPLEMENTO JUVENIL SUPLEMENTO JUVENIL
Wallace Beery vivia: Pancho Villa no cinema. Woody Allen nasceria em
1935, mesmo ano de Brigitte Bardot. Em 1934, nascem Petula Clarke, Van
Cliburn e Sophia Loren. Oswald de Andrade escrevia para o teatro a peça O
Uma verdadeira revolução Homem e o Cavalo, proibida de ser encenada pela polícia no mesmo ano.
Procópio Ferreira já tinha, desde 1924, companhia própria. Mas Dulcina-O-
na imprensa brasileira dilon inauguram o teatro Rival, em 22 de março de 1934. Mario de Andrade
publica em São Paulo, nesse ano, o livro Belazarte. Jorge Amado lança seu
terceiro romance: Suor. Fernando Pessoa morreria no ano seguinte, 1935. A
Associação das Escolas de Samba foi fundada em 1934. Lamartine Babo do-
Como era o mundo em 1934...
minava o carnaval. Medeiros de Albuquerque morre nesse ano, no Rio.
O filme que dominou o mundo em 1934 foi Aconteceu Naquela Noi-
Scott Fitzgerald escreve Tender is the Night.
te (It Happened one Night), que ganhou o Oscar, bem como deu prêmios Em 1934, no dia 14 de março, uma quarta-feira, o jornal carioca A Na-
para seu diretor, Frank Capra, e aos atores Clark Gable e Claudette Colbert. ção trazia um encarte em tamanho tablóide, sob otítulo 5, uplemento Infan-
Nesse mesmo ano, a mesma Claudette Colbert estrelava Cleópatra, de Cecil
til, com capa desenhada porJ. Carlos. Durante quatorze semanas, as pessoas
B. De Mille. E King Vidor e Frank Borzage faziam filmes sociais: Nosso Pão compravam o exemplar, atiravam fora o jornal principal e ficavam, encanta-
Cotidiano (Our Daily Bread) e E Agora, Homenzinho? (What Now, Little dos, lendo o encarte. A partir da décima-quarta semana, adotando o título
Man?), respectivamente. Jean Vigo fazia uma obra-prima na França, Aza- Suplemento Juvenil, tornava-se independente, revolucionando a imprensa
ante, Ophuls filmava na Itália, enquanto Dziga Vertov cantava Lênin onde brasileira e influenciando de forma impressionante, nas décadas seguintes,
reinava Stalin. O Brasil realizava dois filmes: Favela dos Meus Amores, de o jornalismo, o rádio, as revistas, os livros, as editoras, o cinema, a cultura
Carmen Santos, e Cidade Mulher, de Humberto Mauro. brasileira e, principalmente, todas as gerações futuras.
Freud publicava seu derradeiro livro, Moses and Monotheism. Mas, O Brasil acabara de sair de três revoluções, duas frustradas, em 1924 e
quem ganhava o Prêmio Nobel de Literatura era o italiano Luigi Pirandello. 1932, outra vitoriosa, que colocara Getúlio no poder. Naqueles tempos
O prêmio Pulitzer para teatro foi de Sidney Kingsley, com Men in White, eram revoluções de verdade, não como golpes militares que se autodenomi-
enquanto outro italiano, Enrico Fermi, descobria a fissão do átomo, em elé- nam de revolucionários, mas não passam de instaurações de mais uma Bana-
trons. Franklin Roosevelt tirava os Estados Unidos da recessão e Getúlio Var- na Republic na América Latina, com seus generais, corrupção, dívidas exter-
gas enfrentava uma tentativa de revolução comunista no Brasil. O papa era nas, quintal das multinacionais em falsos programas nacionalistas e de ““so-
Pio XI. Hitler tomava o poder, após a morte de Hindenburg. E Mussolini berania nacional” ditados pelo FMI. São como furúnculos, custam para sair,
iria invadir a Etiópia no ano seguinte. No ano anterior, o dirigível Akron caí- mas, um dia, surge aqui ou acolá, uma democracia neste trágico continente.
ra em New Jersey, mesmo local onde cairia, em 1937, o dirigível Hinden- No painel mundial e caboclo de 1934, onde a maior campanha era
burg. Huey Long pintava como o ditador norte-americano até ser assassina- “Ou o Brasil mata a saúva, ou a saúva mata o Brasil" — provando que a saú-
do, em 1935. Nascem as quíntuplas Dionne no Canadá. Dillinger é fuzila- va não matou o Brasil, mas outros bichos estão por aí... —, é que surgiu a
do pelo FBI, numa tentativa de assalto a banco em Chicago. Frédêric e Irêne grande revolução na imprensa brasileira, cuja revista mais popular era Parati,
Joliot-Curie descobrem a radiatividade artificial. Madame Curie morreria importada da Argentina. Mas surgiu, para gáudio dessa geração e das poste-
nesse mesmo ano. A-FM tinha sido descoberta no ano anterior. Tobacco riores, o Suplemento Juvenil. a,
Road, versão teatral do romance de Erskine Caldwell, batia recordes de per- “Recém-chegado a São Paulo, num velho barracão, que iria ser sua.
manência na Broadway. Fred Perry ganhava em Wimbledon. A Itália foi morada por algum tempo, achou um jornalzinho impresso, a cores, em pa-
campeã mundial de futebol. Max Baer tornou-se o novo campeão mundial pel azul e branco, com uma imensidão de desenhos. Foi um deslumbra-
de peso pesado em boxe, vencendo o gigante Primo Carnera. A atriz Marie mento total. Nunca vira coisa igual! Leu e tornou a ler! Manuseou até quase
Dressler morre neste ano. Dreyfus no ano seguinte. Morre o compositor in- rasgar, encantado pela descoberta. (...) Neste ano de 1986, faz cinquenta e
glês $zr Edward Elgar, Lawrence da Arábia agitava no mundo do petróleo. dois anos que Adolfo Aizen fundou o Suplemento Juvenil. Tenho aqui na

114 115
SUPLEMENTO JUVENIL SUPLEMENTO JUVENIL
minha frente, o nº 380. Acabei de folheá-lo mais uma vez, com a mesma cinguentenário com um fac-símile. O Tico- Tico era uma revista nos moldes
emoção com que o fiz há quarenta e sete anos passados. Uma descoberta que franceses e ingleses. Re
mudou a minha vida”. Assim o produtor gráfico e especialista em quadri- Jáo Suplemento era ao molde dos suplementos dominicais coloridos
nhos (ganhou um concurso no $4p/emento) Reinaldo de Oliveira escreve na americanos, juntando tiras diárias em preto e branco e capítulos dominicais
revista Calafrio, sobre o fenômeno de 1934. em cores improvisadas, tipograficamente, no Rio. Essas cores imperfeitas,
O mesmo aconteceu com um grupo de garotos do Rio, principalmente porém, aliadas ao papel de má qualidade, provocaram uma gestalt insubsti-
do Colégio D. Pedro II, que procurou Adolfo, na redação, para informar tuível, pelas novas reedições em off-set, com papel de primeira. Por isso, um
que o Suplemento passou a ser a revista oficial deles e solicitar que o hebdo- “gibi” antigo vale tanto, mais que uma edição contemporânea, embora es
madário fizesse uma campanha pela paz e pelo desarmamento. Ao que tas sejam importantes para uma revisão das coleções, tal como as publicações
Adolfo ofereceu uma máquina para eles mesmos fazerem o texto, que o jor- queo próprio Aizen vem fazendo dentro da série Nostalgia, com os deslum-
nal publicaria. Surgiu o Clube dos Juvenilistas, que revelou, entre outros, brantes desenhos de Raymond, Caniff, Foster, Clarence Gray, e por que
Alfredo C. Machado, José Castellar, Pedro Anísio, Francisco Borelli Filho, não?, Monteiro Filho e Fernando Dias da Silva.
Raimundo Souza Dantas e Giuseppi Ghiaroni, garotos que se desenvolve- Em/1947, fechou o Suplemento e abriu a semente da EBAL, na co-edi-
ram no setor, até hoje. Além disso, teve como colaboradores Donatelo Grie- ção de Seleções Goloridas, com a Editorial Abril, de Buenos Aires, em dese-
co, Odylo Costa Filho, Renato Lima, Mario Jacy, Rodolfo Iltzche, Arcindo “nhos de f a co-edição é o ponto de partida da EBAL, no Rio, e da
Madeira, Miguel Hochman, J. Carlos, Jorge Amado, R. Magalhães Jr., Editora Abril, dos Civita, em São Paulo. Mas estes impérios se alicerçam não
Francisco de Assis Barbosa, Hélio do Soveral, Orlando Mattos, além dos de- somente no progresso, mas, principalmente, porque o Suplemento, nas dé-
senhistas Monteiro Filho, Mario Pacheco, Fernando Dias da Silva, Sálvio, cadas de 30 e 40, alimentou duas gerações de novos devoradores da impres-
Celso Barroso, Alcyro, Antonio Euzébio e muitos outros. são — escrita e visual —, fornecendo uma base de leitores para livros, revis-
O Suplemento revelou grandes artistas e escritores nacionais, focalizan- tas, jornais, ouvintes de rádio, cinemaníacos, telespectadores e profissionais
do sempre temas nacionalistas, além de ter lançado a moderna história em desses setores.
quadrinhos norte-americana no nosso país. No nº 3, encontramos Flash
Gordon, de Alex Raymond (com Jim das Selvas, de quebra); no nº 101,
Mandrake, de Falk e Phil Davis; no 131, Popeye; no 31, Tarzan, desenhado
por Hal Foster; no nº 138, Mickey, de Disney. Além do Agente Secreto X-9,
escrito por Dashiell Hammett.
O Suplemento logo se tornou bissemanal; em seguida passou a ser pu-
blicado às terças, quintas e sábados, alcançando uma marca de tiragem im-
batida durante décadas na imprensa brasileira: cerca de 360 mil exemplares
semanais. Aizen lança outras revistas, como O Lobinho, Mirim, Policial em
Revista, Contos Magazine, motivando Roberto Marinho a imitá-lo, lançan-
do O Globo Juvenil (para concorrer com o Suplemento), Gibi (rival do Mi-
rum), e Gibi Mensal, como o Mirim de sexta-feira, com histórias completas, ini-
Ei a febre doscogzic books (que, no Brasil, passaram a ser chamados de
gibi).
Adolfo Aizen revolucionara a imprensa brasileira, desde que esteve na
editora O Malho, que fizera a outra revista mais importante da imprensa in-
fanto-juvenil, O Tico-Tico.
O Tico-Tico termina na década de 50, pouco depois de comemorar seu

117
116
ROBERTO SOROCABA
Monteiro Fº

“CALMA!
TENHO UMA

MANOEL, MANDE
LEVAR JA AS

BORDO vou
NCONTRAR

Um dos mais versáteis artistas brasileiros.


Dono de um traço vigoroso, |
fez muitas capas antológicas para o
Suplemento Juvenil, álbuns e Edições Maravilhosas.
Infelizmente, com poucas incursões
nos quadrinhos, como aqui, no 1º número do Suplemento.
Terminou com um “G.D.”': Graças a Deus...

118
PROFESSOR NIMBUS
André Daix

PROFESSOR NIMBUS (1934), de André Daix. Primeira tira diária d ar


Era pantomima, sem diálogos, tal como Pinduca. Teve um hiato, causado pela Segu
velmente
Guerra Mundial. Depois, recomeçou, assinada — acima — por Darthel (prova
provincianos.
um pseudônimo), e feneceu nos anos 60, publicada apenas em jornais

119
PAULINO E ALBINA t TERERÊ

Belmonte R. B. Fuller
É

E UM ... >
É y Pp
DOIS... VÍ)
PAULINO E 1
ALBINA (1935)
de Belmonte. O
ad
grande chargista
brasileiro, além de
caricaturas, críticas
políticas, reclames
de cinema e
ilustrações de livros,
teve raras
incursões nos
quadrinhos. Aqui, / = Ê
na capa da segunda | REGA ad DºiniZi NUS
fase GENRE, » | OH,S ' pa
da Edição Infantil Ee ZA | detréloh rm;
d'A Gazeta, com as dp ÉS ATER
traquinagens de
um garoto branco,
com uma crioulinha.
Curiosamente,
sem assinatura. A Gazeta/Fundação Casper Líbero

TERERE/Oaky Doaks (1935), d : do com o fim


dos features do AP Syndicate, em 1961, esta criação ainda é das mais lembradas
pelos fãs das antigas historietas. Genuinamente engraçada, soberbamente dese-
nhada e muito bem escrita, mantinha o humor o tempo todo em continuação,
mesmo com gags diárias.

120 121
REI DA POLICIA MONTADA
Zane Grey

O Capitão Richard — Mãos ao alto,


da Polícia Montada quem está ahi?
inspecionava as ca-
banas geladas da
floresta. !

— Olá menino! Que


está fazendo ahi — Meu tio foi caçar l
— Não tenha medo.
completamente só? antes dé cahir o últi-
Em breve estarei de
mo temporal, e até
volta com boas notí-
agora, ainda não
cias para você.
voltou.

Y Ago RE

REI DA POLÍCIA MONTADA/King of Royal Mounted Police (1935). Versão da criação do famoso escritor de weste
Zane Grey. Lançada em suplementos dominicais em desenhos de Allen Dean, o qual passou para as tiras diá
Charles Flanders (assistente de Raymond, Lyman Young e desenhista de X-9, depois Lone Ranger), que ficou com
capítulos de domingo. Mais tarde, Jim Gary assinou até o fim da historieta em 1955. a

122
CUIO
Jesus Blasco

QUE TIPO ESTRANHO :


;

MAS E SIMPAÍKO...E
FERECE ESTAR PERDI»
DO EM TEIAS DE ARA-
ps?

AMA... JE EM LHE
FERGUNTASSE E
cedo!
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CUTO (1935), de Jesus Blasco. Nascido em Barcelona, é reconhecido como o maior autor
espanhol de quadrinhos. Realizou muitos personagens publicados em toda a Europa, mas
a segunda versão de Cuto, na revista Chicos, foi seu maior sucesso. Para a versão
feminina da revista Mis Chicas, criou Anita. Mestre do preto e branco com o uso do pincel.

123
RAY MOORE

4
FANTASMA

-
Lee Falk e Ray Moore
O criador visual de Fantasma

E MEUS DESCENDEN-ja
CONTINUA
Ray S. Moore foi o criador visual da história em quadrinhos O Fantas-
ma. Morreu no subúrbio de St. Louis (onde nascera o escritor Lee Falk, cria-
dor de Mandrake e Fantasma), aos setenta e oito anos, vítima de derrame ce-
rebral.
Depois do sucesso de Mandrake, desenhado por Phil Davis, o escritor
Lee Falk, nascido em 1905,no Missouri, iniciou a publicação da tira diária
HA: 4OO ANOS, O UNICO SO- The Phantom, no dia 17 de fevereiro de 1936, no New York American Jour-
nal, desenhada por Ray Moore. Em maio de 1939, O Fantasma começou a
DEPOIS DE VER SEU PAS ser publicado também em páginas dominicais coloridas.
SER MORTO PELOS PIRATAS... Moore teve uma carreira trágica: convocado para a Segunda Guerra
Mundial, foi gravemente ferido em 1942. Seu assistente, Wilson McCoy, as-
sumiu gradualmente o trabalho e, de 1947 até 1961, desenhou O Fantasma
sozinho, até morrer.
Tudo que aconteceu com Moore é nebuloso. Dizem que ele se recusou
a se submeter a uma delicada intervenção cirúrgica no seu sistema nervoso,

King Features Syndicate/The Hearst Corporation


que talvez permitisse sua recuperação e que continuasse a desenhar o perso-
nagem. Sem ela, estava impossibilitado de continuar a exercer seu trabalho.
Os desenhos de McCoy foram tomando feições cada vez mais caricatas e
seu traço, duro e grosso, tornou os contornos do Homem Mascarado grossei-
ros e sem conteúdo.Já Moore teria continuado com sua linha misteriosa, es-
POR TODO O ORIENTE,OS NATI- tilo film noir, cheio de sombras sugestivas, cenas noturnas, contornos suaves
VOS COMNVVERSAM EM VOZ BAIXA O FAATASMA, POIS ACREDITAM e mágicos. Seu desenho fluía e deixava espaço para a imaginação do leitor,
QUANDO FALAM DE... QUE ELE E MORTAL!
cheio de mistérios e nuances.
FANTASMA:The Phantom (1936), de Lee Falk e Ray Moore. Depois de Quando McCoy morreu, o King Feature Syndicate — distribuidor in-
Mandrake, o ''mestre"" de Fellini, Lee Falk, criou outro mito dos quadri- ternacional de Hearst — abriu um concurso e o mesmo Ray Moore se candi-
nhos: o Fantasma. Aqui, na tira repetida periodicamente, o juramento da datou a voltar a desenhar sua criação visual. Mas o próprio sindicato vetou
caveira. To be and to be. Iniciou com desenhos estilo noir de Ray Moore que,
seu retorno, para desespero dos fãs internacionais dos traços de Moore. Uma
por motivos de saúde, deixou o visual que jamais voltou a ser o mesmo. Um
dos pontos altos dos comics. leve insinuação de alcoolismo ou falta de ritmo profissional puseram o clássi-
co Moore fora do mundo dos quadrinhos para sempre.
Em 1962, Sy Barry — irmão de Dan Berry, atual desenhista de Flash

124 125
RAY MOORE

Gordon — tomou a seu encargo o trabalho que, tal como o estúdio de seu ir- PRÍNCIPE VALENTE
mão, é feito por um grupo de “fantasmas” (desenhistas assistentes que não
assinam o trabalho). Agora poderemos ver os belos desenhos de Ray Moo- Hal Foster
re apenas nas reedições.

King Features Syndicate/The Hearst Corporation


E NG «<Z +
— Este livro é a história do mundo. Nele, não encontra.
mos uma conquista pela força que tenha durado. Alexan-
dre e César conquistaram o mundo, mas onde estão ago-
ra tais conquistas? Que foi leito de Babilônia, da Pérsia
e de Cartago? Os frutos da conquista são somente o ódio A seguir
e o desgosto. Senhores: prometi usar a espada apenas A COVARDIA DE SLITH 4 h
na causa da liberdade e da justiça fipeTÉRTE moors 732 |
165 4:27:40. Coe 16 King Pr Sri. fo. Mt ns ret

k PRÍNCIPE VALENTE/Prince Valiant (1937) de Hal Foster. Obra prima de texto


e desenho. Pesquisa única no gênero. Foster deixou Tarzan e realizou, até perto de
sua morte, uma das mais honoráveis sagas de cavalaria, elevando o desenho dos
quadrinhos ao nível da melhor pintura clássica. Foi o primeiro quadrinho a virar
superprodução hollywoodiana, em vez de seriados e filmes classe B.

126 : 127
RAL FOSTER TIAL PAIS LER

propriedade de William Randolph Hearst, fazia propostas a Foster, que ofe-


receu sua nova criação, imediatamente aceita e nas condições do autor. Em
13 de fevereiro de 1937 saí a primeira prancha de Va/iant, ao mesmo tempo
Hal Foster, o ilustrador em que a United ainda publicava Tarzan com desenhos de Foster. À nova
história foi um sucesso, sendo imediatamente publicada em cem jornais,
de Principe Valente depois 189 jornais americanos, além de ser traduzida para o francês, italiano,
espanhol, alemão (Prinz Eisenherz) e português. No Brasil, foi editada por
Adolfo Aizen no Suplemento Juvenil, passando depois para o G/obo Juve-
núl, de Roberto Marinho. Seus trabalhos foram reeditados em álguns e gibis.
Em 1982, menos de um mês antes de completar noventa anos, morreu Hasting House publicou uma série de livros com texto original e ilustrações,
um dos maiores ilustradores do mundo (famoso por seus desenhos para o em sete volumes. Foi copiado, plagiado e até parodiado pela revista Mad:
Príncipe Valente), em Spring Hill, na Flórida, onde vívia. Prince Violent. Em 1953, pela primeira vez, Hollywood tirou as adaptações
Nasceu em 16 de agosto de 1892, em Halifax, Nova Escócia, no Cana- de quadrinhos dos seriados e filmes '“B”” e fez uma superprodução dirigida
dá. Em 1906, a família se instala em Winnipeg, onde adquire o amor pela por Henry Hathaway, com Robert Wagner no papel-título e Janet Leigh no
natureza. Chega a lutar boxe como profissional para ajudar a família, em cri- papel de Aleta. Era em cinemascope, em technicolor. Harold achou a versão
se financeira. Em 1915, casa-se com Helen Wells, com quem terá doisfilhos. cinematográfica pueril.
Trabalhou então como guia florestal e garimpeiro. De abril de 1944 a novembro de 1945, publicou uma tira de três qua-
Em 1921, andou mil milhas de bicicleta para começar a trabalhar em dros ao pé do Príncipe Valente, Medieval Casíle, que foi republicada em Ii-
Chicago como ilustrador publicitário de dia e estudar à noite. Nesta época, vro, em preto e branco e em cores.
os romances de Tarzan faziam muito sucesso e um agente de imprensa, Nee- Fez uma versão do romance de Franz Werfel, The Song of Bernardette,
be, assinou um contrato com o autor Burroughs para fazer uma versão em nem sequer citada nas enciclopédias que estudam seu trabalho, editada no
quadrinhos do herói rousseauísta. Naqueles tempos, os comics eram todos Brasil pelo Suplemento Juvenil.
humorísticos e o melhor ilustrador dos livros do Homem-Macaco,J. Allen Suas ilustrações belíssimas, visivelmente influenciadas pelo notável
St. John, recusou o convite para fazer uma versão em quadrinhos de sua cria- Matania, sua pesquisa de época, sua cultura, o conhecimento da história, da
ção visual. Foster foi convidado e aceitou. Atravessou a crise de 29 — confor- natureza e da psicologia, o apuro no uso dos planos, da relação texto e dese-
me testemunho seu — ilustrando Tarzan. Fez sessenta tiras diárias em preto nho (sem utilizar balõezinhos) fizeram dele não só um dos grandes dese-
e branco, de 7 de janeiro a 16 de março de 1929. Apesar do sucesso, não quis nhistas dos quadrinhos, mas também um dos maiores ilustradores da época
continuar e a United Feature Syndicate, da UPI, já detentora dos direitos de medieval de todos os tempos. Em 1971, John Cullen Murphy, sem assinar,
distribuição, continuou a série com um artista medíocre, Rex Maxon. começou a tomar seu lugar nos desenhos, ilustrando o scrzpz de Foster. Ele se
Quando pensaram em fazer uma série em páginas dominicais a cores, retirou, recebendo os maiores prêmios do mundo como ilustrador, mas isso
chamaram Foster de novo, que desta feita aceitou. Começou em setembro era irrelevante: os maiores prêmios do mundo não faziam jus a um dos
de 1931. Um roteirista vertia os romances de Burroughs, mas Foster tinha di- maiores desenhistas que o mundo já conheceu.
reito de alterar o texto. (Cortou um gorila de trezentos quilos nos cipós, por
exemplo). Influenciou o ilustrador seguinte de Tarzan, Hogarth, e também
Alex Raymond, desenhista de Flash Gordon e Jim das Selvas, que se admira-
vam mutuamente.
Mas Foster queria criar uma história sua e preparou Prince Valiant. A
United Feature recusou, querendo seguir a praxe de começar uma história
primeiro em tiras diárias e só depois acrescentar a página dominical em cores,
muito mais cara para os jornais. O King Feature Syndicate, concorrente, de

128 129
TARZAN +
Bume Hoganh |

A medida que ia crescendo, Tarzan ia


progredindo rapidamente, de modo
que, ao chegar aos dez anos, já se tor-
nara um excelente escalador de árvo-
res e podia fazer muitas coisas mara-
vilhosas que estavam além das possi-
bilidades dos irmãos e das irmãs.

De muitas manei-
ras se diferençava
deles, que seguida-
mente se maravi-
lhavam com a sua
superior esperteza;
mas, na força e no
tamanho, era-lhes
muito inferior,
pois, aos dez anos,
- Mas que menino! Desde a mais
os antropóides ti- tenra infância utilizara as mãos
nham atingido a para pular de galho em galho, à
idade adulta, che- moda de sua gigantesca mãe; e,
gando alguns a ter ao crescer, passava horas e mais
quase dois metros horas, todos os dias, saltando
de altura, ao passo velozmente pelos topos das ár-
que Tarzan era vores. Dava, mesmo, pulos de
mais de seis metros, através do
apenas um menino
espaço, em alturas estonteantes,
não totalmente de-
nas mais elevadas árvores da
senvolvido.
floresta, agarrando com preci-
são espantosa até mesmo um
galho que se balançasse furiosa-
mente à aproximação de uma
tempestade.

130
ZE MULAMBO
R. Van Buren

Naquela tarde — FF Ouviu isto, papai? »


Lucy!! Meu melhor par de e Vamos
E perder
É um
Não posso ir
sapatos... na verdade o ao baile com ótimo baile. Não pode
único que eu tinha... você, Zé aço Coçar
desapareceu!!! Roubaram :
9
meu vestido
de baile
esta manhã!
a A mM
“MM
[7

Que jeito posso dar? O desgraçado levou


também o meu par de sapatos. O único remédio
é dar parte à polícia
e esperar que ela agarre
estes malditos ladrões. É a
única solução!!

no
United Features Syndicate

ZÉ MULAMBO/Abbie an'Slats (1937), de R. van Buren. Criado por Capp, depois


escrito pelo seu irmão Elliot Caplin, ficou popular como retrato ucólico de uma
e que não existia mais, interiorana. O humor de Praxeds Porcalhão, pai da linda
ucy, quase rouba a historieta, com sofisticadas ilustrações de Raeburn van Buren.
Acabou em 1971.

131
SHEENA — A RAINHA DAS SELVAS

SHEENA
Walham Thomas
Dos quadrinhos para o cinema e de
Parece impossível, Van Dike. Como
novo do cinema para os quadrinhos
pensamos na existência de uma mulher De repente, cessam os sons peculiares
a dirigir uma orda desses terríveis sel- das selvas. Sucede-se um grito e um
vagens? Qualquer mulher não resistiria |) homem branco sai da mata a correr.
nem ao clima. Es
a isa mea Socorro! Sheena, a Rainha das Selvas, foi planejada em 1937, para a Editor
Socorro!
Press, por Will Eisner, que mais tarde viria a serum dos gênios dos comics, ao
criar The Spiriz.
Mas foi somente em setembro de 1938 que apareceu a personagem, no
primeiro número de Fiction 's House Jumbo, desenhada por Mort Meskin e
escrita por William Thomas (talvez um dos inúmeros pseudônimos de Eis-
ner). Essa história foi publicada no Suplemento Juvenil, de Adolfo Aizen.
Era uma tentativa, como muitas outras (J:77 das Selvas, inclusive), de
imitar o Tarzan de Burroughs. No cinema, Hugh Hudson fez Lord Greysto-
ke. A Columbia fez uma superprodução tendo no papel-título a
ex-Charhie's Angels (As Panteras da tevê), Tanya Roberts, estrelando.
Alcançando a porta da cabana, o ho- E, BEM NA BOCA DO MATAGAL, Os quadrinhos repercutiram de imediato, mas sua melhor fase foi nos
ESTÁ UMA FIGURA NUNCA VISTA
mem deixa-se cair de cansaço.
POR UM HOMEM BRANCO. Gb gibis e, após 167 edições, teve também dezoito publicações levando seu títu-
E. ES a
lo como chamada principal da revista. A partir da primavera de 1942, durou
até o inverno de 1953.
De todas as cópias de Tarzan, foi a mais bem-sucedida! Dizem que tu-
do isso se devia às chamadas “partes prurientes””. Sheena, para os padrões da
época, era audaz. Cutvilínea, com um minúsculo biquíni de leopardo, dei-
xava à mostra tudo o que era permitido. Isso, segundo as enciclopédias, não
passou desapercebido dos jovens garotos que atingiam a idade de interesse
sexual. A historieta se desenvolvia com sadismo, além do sexo e da aventura.
Apareceram imitadoras, como Nyoka e Jann of the Jungle. Mas Sheena
EDITORS PRESS SERVICE

dominava. Seu companheiro, Bob, fazia o papel usualmente feito pelas


mocinhas nas outras histórias: ser capturado e salvo, aqui pela mocinha.
A pus A popularidade de Sheena invadiu outros meios, como as revistas
E rege qtS é 4 aÃ
SHEENA (1937), de William Thomas. Na verdade, uma das inúmera pulp, e teve uma série de tevê, estrelada por Irish McCalla. À estrela da nova
criações, com pseudônimo, de 'Will Eisner antes de Spirit. Criada para versão para o cinema, a pantera Tanya Roberts, vinha da tevê. Curiosamen-
publicação em jornal (acima), teve enorme repercussão com jovens leitores te, a Marvel Comics lançou uma edição especial com o roteiro de Lorenzo
rapazes nos comic-books, graças às suas posições sugestivas, com Semple Jr., em adaptação para quadrinhos por Cary Burnett e desenhada
doses de sexo. sadismo e incentivo ao onanismo.
por Gray Morrow.

133
132
A GARRA CINZENTA BRONCO PILER
Francisco Armond e Renato Siva Fred Harman

FLAG/FLAG!
Z SOU EU, FLAG!
ACALMATE, QUEM VA! CHEGAR
FLAG/ DE VISITA:
BRONCO ?
PN So
BRONCO PILER
Red Ryder (1938)
“| de Fred Harman.
A mais popular
historieta no
ambiente
EO
hollywoodiano
NS O
EMQUANTO O F, TASM
AJFECHA ORICADO UMA
EAPEAbe: ShtNcio E crOSA! NÃo ME DEPRESSA.BRONCO!
ESTA" TARDE!
do western.
DISSERAM GUEM ENGENHEIRO ? DESPACHANTE.
Começou como
Val CHEGAR DE ESTAMOS DEVE SER ALGUMA
TREM PRA VISITAR, ADIANTADOS, e TEMPESTADE QUE capítulos
A GENTE! VEM ANVOU UMA
BR O Grorn deixa O APOSENL q No
AVALANEHE domingueiros,
TO, SEGUIDO DO TERRIVEL E E] com ''quadros'
GIGANTESCO BONECO DE A- recortáveis como
£O DOTADO DE INTELIGENCIA "B ilustrações, depois
também em tiras
diárias. O autor
vivia num rancho
e desdenhava do
ambiente real.
| Nos anos 60 deixou
AGORA vou a historieta
A CURIOSIDADE DESCOBRIR QUEM E | para se dedicar
MATOU Q GATO... A VISITA MSTERIOSA
“| à pintura.
Logo depois, a
série terminou.

Ê Ee agns CINZENTA (1937), de Francisco Armond e Renato Silva. Grande sucesso de A Gazeta
Pa peça segunda fase. Foi vendida para Editorial Sayrols, do México, e revendida para a G.
nça, Editions Dupuis. Durante muitos anos, os franceses julgavam ser uma historieta mexicana e
não brasileira.

134 135
O PATO DONAID |

Copr. 1950, Walt Disney Produtionsã


World Righ
O PATO DONALD/Donald Duck (1938) de Walt Disney. Depois de uma
desenho animado de » logo atingiu o status de estrela pela sua i
atrapalhadas. O King iniciou tiras diárias e capítulos domingueiros,
IL ; à Rca Ras a , y : : -
com
; . A 7 É cor pic
E

Surgiu também em revistas quea Western Printing parou de publicar, recenter

136
AZ oOLNt 1

O Tio Patinhas de Disney (00ps),


ou melhor, de Carl Barks...

A revista norte-americana T777e dedicou duas páginas na sua seção de


livros a um lançamento do escritor Carl Barks que trata de um capitalista
muito nosso conhecido, o Tio Patinhas. O livro é Uncle Scrooge Mc Duck, ,
His Life and Times, editado pela Celestial Arts, com 374 páginas em cores
deslumbrantes, ao preço de 159,95 dólares e o autor do livro é o criador do
próprio personagem de Disney.
Barks foi durante muito tempo o anônimo autor e desenhista das pági-
nas de Donald Duck na revista americana Walt Disney 's Comics and Stortes
(entre abril de 1943 até março de 1965) e criador do personagem Uncle
Scrooge Mc Duck (Tio Patinhas, no Brasil), conforme batizado pela Editora
Abril.!
Ele nasceu no Oregon, em 1901. Bem educado, exerceu os mais varia-
dos tipos de empregos, desde cowboy e metalúrgico até carpinteiro, decidin-
do fazer uso de seu reconhecido talento para o desenho trabalhando como
free-lancer. Seis anos depois assinou contrato como animador aprendiz nos
estúdios de Burbank, Califórnia, de Walt Disney, nos anos 30. Depois de
seis meses na animação de desenhos, foi para o departamento de roteiros,
onde fazia story boards com quadrinhos, desenvolvendo a narrativa para fil-
mes curtos de animação do estúdio. Teve a sorte de ser escolhido para desen-
volver a história de um filme em longa metragem com o personagem de Pa-
to Donald, a ser intitulado Donald Duck Finds Pirate Gold (ou apenas Pira-
te Gold). O projeto foi desativado depois do sucesso de Branca de Neve e os
Sete Anões e Pinóquio, o que mudou os planos do estúdio para adaptar tão-
somente histórias famosas já publicadas. O projeto para longa metragem de
Donald foi utilizado para uma edição especial de sessenta e quatro páginas
de um gibi publicado pela Dell Publishing Co., e não nas tiras diárias nor-
mais de Disney, distribuídas mundialmente pelo King Features Syndicate.
Foi desenhado por Barks e um artista do grupo Disney chamado Jack Han-
nah, cada um fazendo páginas alternadas. O gibi publicado em 1942 forum
sucesso. Mas Barks estava descontente (“Não me sentia livre””) e pediu de-
missão depois de seis anos. “Ta criar galinhas nas montanhas San Jacinto””,

137
ALINTA NAS À A oOLNt 1

explicou, quando a Dell (também conhecida como Western Publish


ing Co dioso italiano: “ao mesmo tempo debilitou a capacidade de uma produção
e K.K. Publications, das maiores do mundo) ofereceu-lhe um contrato pa- autônoma italiana que pudesse fazer concorrência com o material de predo-
ra escrever e desenhar histórias completas na revista Wa) Disney 's Comics mínio americano”.
and Stories. Até então, essa revista continha remontagem de material, Até Pier Luigi De Vita, o grande desenhista de Saturnino Farandola,
prin-
cipalmente de páginas dominicais em cores de suplementos colorid redesenha Topolino, substituindo o título por Tuffolino, pois o regime fas-
os dos
jornais, com todos os personagens de Disney. O editor decidiu encome cista queria uma limpeza nos cozz:cs americanos publicados na Itália de/
ndar
histórias longas e originais para a revista. Barks tomou conta das história Duce.
s e
começou a fazer aventuras completas de dez páginas, com seis quadros No pós-guerra, Angelo Bioletto começa a trabalhar os personagens
em
cada folha, mensalmente. Na mesma época, em 1943, Barks foi Disney, mas nestas novas edições italianas já surgem os primeiros trabalhos
convidado a
fazer outra edição especial com sessenta e quatro páginas, desta vez inteira-
de Barks, na Europa. E os italianos pensam que o material de Barks também
mente com seu trabalho. O título foi Donald Duck and the Mummy 's é fatto in Itália...
Ring.
Foi então que os patrões da Dell compreenderam que tinham nas mãos Quando, em 1949, o Topolino é apresentado em edição de bolso, as
um
talento para fazer dinheiro em suas mãos, dada a resposta dos leitores
. histórias são todas 7nade in USA. Só em 1951 ressurgem os artistas italianos
A Revista T77xe, no texto do crítico de cinema Jay Cocks, destaca: “Sem na revista, com Luciano Bottaro. Em 1953, começam Giovan Batista Carpi e
royalties, sem mordomias, e sem assinar o trabalho — nem uma linha se-
Giulio Chierchini. Depois, surgem Gatto e Asteriti e Pier Luigi De Vita, que
quer —, Barks desenhou e escreveu cerca de quinhentas histórias do Pato.
terá seu filho Massimo fazendo o mesmo trabalho. De 1967 em diante, o
Até que, em 1947, numa edição especial para o Natal, inspirado em Charles
material Disney feito na Itália começa a ser exportado para o mundo todo,
Dickens, criou o Tio Patinhas”.
inclusive para os Estados Unidos.
* | Claude Moliterni, na Encyclopédie de la Bande Dessinée, Paris, Edi- Essa idéia de utilizar fantasmas, que nasceu do termo norte-americano
tons Serg, escreve: “Em 1947 criou Oncle Picsou (Tio Patinhas); em 1948, 0 ghost, não é uma invenção capitalista, na linha da exploração do homem pe-
inventor Gyro Gearloose (Professor Pardal), o primo Gladstone Gan- lo homem. É muito antiga. Raphael De Sanzio tinha mais de cinquenta (!)
der/ Gontran le Chanceux (Primo Gastão), a pérfida Mágica de Epell (A “discípulos”. Era um gênio e tinha a capacidade de trabalhar e fazer obras-
Ma-
ga Patalógica), e, em 1951, The Beagle Boys/La Famille Rapetout (Os Ir- primas em ritmo industrial, o que motivou a história citada por Henry e Da-
mãos Metralha)”. na Lee Thomas em Grandes Pintores (Porto Alegre, Globo, 1950): “Certa
E curioso observar que, desde a década de 30, os italianos já vinham fa- vez, Michelângelo censurou-lhe o séquito de cinguenta discípulos. “Você vai
zendo tudo isso. Ou seja, desenvolveram, através da Mondadori,
revistas pelas ruas”, disse ele, “acompanhado de um séquito como um general”! Ra-
completas usando personagens de Disney, com a única diferença de que os phael, entretanto, respondeu prontamente: “E você vai sozinho como um
americanos usavam o tamanho tradicional dos gibis (comic books) e os italia- carrasco!”
nos inventaram a edição de bolso, como é feita no Brasil, pela Editora Abril, E, quanto mais trabalhava, maior quantidade de encomendas lhe apa-
desde 1950. Um grupo de artistas italianos se destacou nesse trabalho, que recia: uma constante corrente de pedidos, de afrescos, decorações de igrejas,
era chamado Topolino fatto in Casa, poisTopolino era o nome italiano de palácios e balneários, cenários teatrais, modelos de préstitos, desenhos para
Mickey e o título da revista de grande sucesso na Itália. Federico Pedrocchi, camafeus e gravuras, retratos, tapeçarias e Madonas. Tinha que ter uma
tragicamente desaparecido no fim da guerra, foi o primeiro ghost de Disney equipe...
na península, precedendo os americanos, conforme Gianni Bono, em Ap- Também Salvador Dali sempre utilizou “discípulos”. Seu famoso li-
Punti sul Fumetro Italiano del Dopoguerra (Gênova, Gli Amici Del Fumet- vro Dai, belíssima obra-prima em edição e impressão, foi trabalhado princi-
to, 1972). O desenho de Pedrocchi era calcado, como o de Barks,
nos contor- palmente pelos desenhos de Phillippe Druillet, autor dos quadrinhos De/i-
nos e posições da página dominical de Disney, desenhadas por Floyd rtus, com o personagem Lone Sloane.
Got-
fredson. Depois, Barks desenvolveu seu estilo próprio. Nino Pagot
também Al Capp, antes de criar sua historieta L7'/ Abner (Ferdinando, no Bra-
trabalhou numa versão em quadrinhos, feita na Itália, sobre
o sucesso de sil), foi desenhista-fantasma de Ham Fisher na historieta Joe Palooka (Joe
Branca de Neve e os Sete Anões, provocando a seguinte observação
do estu- Sopapo, no Brasil).

138 139
DISNEY DISNEY

Maurício de Souza, paí da Mônica e criador dos bonecos Cebolinha, Bi- depois da morte de Disney, em filmes de longa metragem, em desenhos ou
du, Pelezinho, Chico Bento, Astronauta e tantos outros, trabalha com uma com personagens vivos, documentários, programas de tevê, redes de televi-
enorme equipe. são, filmes educativos, discos, músicas, parques gigantescos, hotéis, turis-
A Editora Abril, desde que começou no Brasil, em 1950, trouxe um ar- mo, terrenos, propriedades, royalties, quadrinhos, merchandising, centavo
tista argentino, Destuet, para ensinar os brasileiros a copiarem Disney. Co- a centavo de direitos, copyrights, revistas, clubes, roupas, venda de origi-
meçou com o autor deste livro, Alvaro de Moya (que imitava perfeitamente nais, acetatos, fotografias, distribuição, orelhas de Mickey, lojas, estúdios,
Hal Foster, Milton Caniff, Al Capp e Alex Raymond também) e sempre la- investimentos, visuais, publicidade, produção, exportação, exploração e
mentou não saber se o velho Walt assinava os cheques da mesma forma. De- imperialismo. Mas, principalmente, através de ratos, gatos, camundongos,
pois, João Batista Queiroz e a equipe de Igayara, Isomar, o roteirista Alberto patos, cachorros, veadinhos, mulas, vacas, elefantinhos, lobos, porquinhos
Maduar, que, tal como os italianos, começaram também a exportar os traba- e a difusão do american way of fife.
lhos Disney 72ade in Brazil para diversos outros países do mundo, incluindo A verdadeira multidão (uma legião de fãs escrevia para Barks) pagava,
a Itália e os Estados Unidos. Toda a nova fase de Zé Carioca em revista foi segundo a revista TZme, até dois mil dólares por uma velha revista clássica
uma reivindicação e realização do grupo brasileiro, que convenceu Victor com as aventuras escritas e desenhadas por Carl Barks, em seu tempo áureo.
Civita. À partir daí o personagem criado por Disney — quando de sua visita Finalmente, da legião de fantasmas de Disney no mundo todo, um alcança-
ao Brasil durante a guerra, na política de boa-vizinhança — foi retomado va a notoriedade, surgindo da bruma do exército silencioso e invisível da
numa revista especialmente criada pelos Disneys caboclos. Assim como a re- imensa produção dos trabalhos Disney.
vista Margarida. Ao mesmo tempo, a Dell insistiu que ele pelo menos escrevesse alguns
Voltemos a Carl Barks. A primeira história em que surgiu Uncle Scroo- textos, o que fez até 1973, quando desistiu de vez desse trabalho. Aos oiten-
ge era uma revista de Donald Duck intitulada “Christmas on Bear Moun- ta € um anos, vive em uma casa-trailer em Temecula, Califórnia, no deserto,
tain”. Scrooge voltou, em março de 1952, numa revista com seu nome, de- sessenta milhas ao norte de San Diego, com sua esposa Garé, que o ajudava
pois de diversas aparições na revista do Pato. Sua primeira história como per- nos desenhos.
sonagem-título foi '“0x/y a Poor Old Duck”. Suas criações obtiveram um Recentemente, foi homenageado por alguns fãs, como George Lucas,
sucesso tão retumbante que os admiradores acabaram tirando-o da obscura Steve Spielberg e Lawrence Kasdan, no filme Os Caçadores da Arca Perdida,
situação a que Disney obrigava seus auxiliares. que os experts reconhecem como sendo a historieta “Seven Cities of
Mas não era uma história nova no império de Walt Disney. Na verda- Cibola”, de Barks. Seus quadrinhos pareciam pesquisados nas revistas Na-
de, as únicas criações de Disney, pessoalmente, foram Alice e o coelho Os- tional Geographic ou Scientific American, pela reconstituição perfeita de
vald, quando ainda era empregado de outra companhia de cinema. Quan- ambientes de aventuras.
do esta foi à bancarrota, tentou salvar seus personagens e não teve sucesso, “ Alguns artistas colocam seus personagens na China, mas desenham
nem judicialmente. Quando fez seus próprios estúdios, apareceu Mickey como se eles estivessem em Iowa.” E, insiste Barks, “'se você vai fazer uma
Mouse, a Walt Disney cartoon, drawn by Ub lwerks. Este Ub Iwerks era um história nos Andes, tem que parecer com os Andes”.
membro da equipe e o verdadeiro desenhista do famoso camundongo. De- Mas não é o que pensam dois escritores dos Andes, mais precisamente,
pois, aliciado por um concorrente, deixou Disney e tentou sua sorte num es- do Chile dos tempos de Allende, Ariel Dorfman e Armand Mattelart, em
túdio seu que jamais teve sucesso. Guardou mágoa de Disney até a velhice e, Para Lero Pato Donald (Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977 p. 60): “Não so-
logo depois de ter feito a famosa sequência dos pássaros no filme de Alfred mente Tio Patinhas lhe rouba o ouro, mas também faz o favor de extrair-lhe
Hitchcock, fez as pazes com o velho Walt, que o empregou para assegurar todo esse metal corrompido e facilitar o retorno à inocência primitiva. O Tio,
sua aposentadoria. Complexo de culpa, dizem as más-línguas... “ele conseguiu o que queria, e eu esta fabulosa lua. Oitocentos quilômetros
Quando Barks se retirou da Dell, pois nunca fora empregado de Dis- de espessura de ouro puro. Apesar disso, creio que ele ficou com a melhor
ney, usou apenas a base para criar outros personagens que, curiosamente, parte”. Deixa-se entregue ao pobre a celebração da vida simples e feliz. E o
passaram a ser todos de Disney. Sob o copyright da fabulosa empresa de ne-/ velho aforisma: os pobres não têm preocupações, a riqueza traz problemas.
gócios, esta fatura milhões de dólares em fantásticos lucros anuais, mesmo É preciso saquear os pobres, os subdesenvolvidos, sem sentimento de culpa

140 141
DISNEY

(...). O imperialismo se permite apresentar a si mesmo como vestal da liber- SUPER-HOMEM


tação dos povos oprimidos e o juiz imparcial de seus interesses”. Jerry Siegel e Joe Shuster
Carl Barks lançou seu livro numa luxuosa edição em cores em papel da
melhor qualidade, reimpressão das famosas histórias que o tornaram famoso
e romperam a cortina de ferro-dólar do submundo disneyano.
Antes, já fizera umas pinturas a óleo com o Tio Patinhas e chegou a
ACRIANA É SALVA
vendê-las por até seis mil e quatrocentos dólares sob encomenda. Mas parou D PERIGO PASSA ASSIM QUE A DAS CHAMAS &
E PENETRA
quando os estúdios Disney começaram a resmungar a respeito de seus zoya/- RA ATMOSFERA TERRESTRE.
CONFIADA A UM ORFANATO...

SANTO DEUS! RN
fes e direitos, copyrights, etc. UM BEB6.. VR
Agora, Barks pinta paisagens a óleo do western e declara: “Eu gostaria
de ser o Charles Russell de minha geração”. Jay Cocks termina seu artigo
afirmando: “É possível que daqui a muitos anos algum grande contador de
fábulas americano queira ser o Carl Barks de sua geração”.
Só esperamos que não haja um Disney da futura geração para explorá- MAS A FRICCÃO PROVOCA
UM INCÊNDIO QuE
lo de novo... AMEAÇA O MINUSCULO PASSAGEIRO,
“To Patinhas não deve ser mostrado como mau, nunca deve ser tão LA”, ELE SURPRENDE
realista a ponto dele ser comparado aos agiotas de hoje (...) com toda certe- PELA SUA EXCEPCIONAL
ESTRUTURA FISIOLOGICA .
za, ele procede da Escócia (...). Evitamos indicar seus negócios geografica E

mente, ele não é americano, já que Patópolis é um país imaginário". Do


“Manual Para Roteiristas Disney””. Xerox em português de material interno
da Editora Abril. Sem autor, sem tradutor, sem data de publicação.
EM ,.
Benericio
é PIAS
S
HUMANIDADE
o

E .

ASSIM
NASCE eee
ATINGINDO A MAIORIDADE Mi Ng
CLARK KENT DESCOBRE QUE E DEFENSOR DOS OPRÍMIDAOS, O eu
MAIS RAPIPO QUEUMTREM E QUE TUROU DEVOTAR GOA Exa
SUA PELE RESISTEÀ UM OBUS/ PERESA POS PERSCNUIPONE
SUPER-HOMEM/Superman (1938) de Jerry Siegel e Joe Shuster. Um dos maiores mitos
do mundo contemporâneo, igualando-se à mitologia grega. Objeto de estudos, críticas,
análises, pesquisas, livros, política, direitos autorais, cinema, rádio, debates epolêmicas,
apesar de ser uma fábrica kryptonita de superdólares, deixou quase na miséria seus
criadores na senilidade (eram estudantes quando descobriram o mito).

143
SUPER-HOMEM SUPER-HOMEM

El — tal como Noé — de fazer uma nave espacial e enviar seu filho para o
planeta Terra, numa tentativa de conseguir a sobrevivência de pelo menos
“É um quadrinho? É um desenho, um criptonita no cosmo.
O resto virou legenda, tal como as lendas gregas.
O rebento foi recolhido de sua cápsula, em Smallville, no coração do
animado? E uma televisão? Não. E Midwestern, pelos Kent, um casal sem filhos. O menino foi chamado de
um cheque de 25 milhões de dólares!” Clark e teve uma infância de descoberta de seus poderes especiais. Posterior-
mente, a família foi acrescida das aventuras de Superboy, sobre as vissicitu-
O Cyborg de seis milhões de dólares da televisão deve estar humilhado des do Superman quando menino. Depois, Supergir! (no Brasil, Supermo-
pela sua desvalorização, maior que o dólar no mercado internacional, com o ça), etc.
aparecimento do filme superprodução de Superman, que custou nada mais No princípio, não era o verbo, mas a desculpa. Os autores, escaldados
nada menos do que 25 milhões de dólares. com tantas recusas dos editores, temeram fazê-lo muito excepcional e procu-
Os habitantes de Metrópolis estão cada vez mais confusos. Olham para ravam explicar que uma pulga dava saltos muito maiores do que a sua forma
o céu e não sabe mais o que vêem. permitiria e uma formiga poderia carregar pesos desproporcionais ao seu ta-
manho. ;
“Um pássaro?”
“Um avião?” O Super-homem de então não era tão super assim. Dava saltos, corria
“Um quadrinho?” mais do que um trem, aparava uma bala com a mão ou o peito e era vulnerá-
“Um desenho animado?" vel. Hoje, voa a uma velocidade mais rápida do que a luz, já enfrentou bom-
“Uma televisão?” bas atômicas e é vítima apenas da emanação de criptonita, um metal de ra-
“Não. E um cheque de 25 milhões de dólares!” diação de seu planeta. A visão raio-X e o ouvido ultrassensível foram acres-
E tudo começou rendendo, por volta de 1941, a quantia de 50 mil dó- centados depois que se notou que os leitores engoliam qualquer coisa.
lares anuais para os dois criadores da criatura em quadrinhos, os estudantes O grande escritor e humorista Jules Feiffer (Pequenos Assassinatos e
Carnal Knowledge), explica: )
Jerry Siegel e Joe Shuster.
Em 1938, Cleveland, Ohio, Siegel imaginou o personagem e sugeriu “A nossa reação não foi: “que original”, mas sim: 'é evidente”. E neces-
ao seu amigo e colega de estudos Shuster que fizesse os desenhos de Super- sário sermos super para conseguirmos vencer neste pobre mundo”.
man. Fizeram diversas tiras e enviaram aos Syndicates — distribuidoras de O sociólogo romeno Mircea Eliade fala do homem moderno que, reco-
material de imprensa para editores de jornais que, por unanimidade, recu- nhecendo-se um fracassado e um limitado, sonha em se revelar, algum dia,
saram a tira como “fantástica demais”. um personagem excepcional, um herói. Tal como o tímido repórter do
Daily Planet, Clark Kent, que ama Lois Lane, mas perde em comparação
Os editores, porém, gostaram do trabalho e dos garogos e encomenda:
ram outras histórias, como $477 Bradley, Polícia Federal/ Sandy Kean, Ba com a admiração que ela tem pelo seu alterego, sua verdadeira personalida-
Reagan e outras, até que J.S. Liebowitz, um dos criadores das revistas men- de. Eis que o solerte repórter tem que desaparecer de cena nos momentos de
sais com histórias completas — até então os cozics eram publicados em tiras perigo, para trocar de roupa e resolver o impasse com a ação, dando a ela a
diárias nos jornais ou em suplementos dominicais coloridos —, fez uma pro- impressão de que o covarde foca fugiu.
va. As tiras foram remontadas para o formato cozzic book e a revista Action Nos países subdesenvolvidos os problemas são maiores. Como trocar
de roupa — não numa daquelas cabines telefônicas maravilhosas, com trata-
Comics, de junho de 1938, publicou tentativamente a primeira sequência
mento acústico e ar-condicionado dos Estados Unidos — em um devassado
Esse exemplar — de cujas cópias restam poucas no mundo —, que cus-
tava dez centavos, foi vendido depois a colecionadores por 1.074,00 dólares. “orelhão?”
Somente alguns números depois foi publicada a primeira história, que Continuemos com os superdesenvolvidos culturalmente. O famoso
narrava a próxima destruição do planeta Krypton e a decisão do cientista Jor- autor de Apocalípticos e Integrados, Umberto Eco, pontifica:

Mí4 145
SUPER-HOMEM SUPER-HOMEM

“O herói positivo deve encarnar, além de todo limite pensável, as exi- bons, da era dourada da Metro e especialista em trucagens, que o levaram a
gências de poder que o cidadão comum nutre e não pode satisfazer””. ganhar um Oscar de efeitos especiais, em 1944.
Alvarez Villar escreve: “Superman dá um salto de dezesseis séculos e A Columbia lançou um seriado baseado no grande sucesso para con-
Gor-
entronca com Héracles de Hesíodo e Ramayana de Valmiki"”. E conclui: correr com os filmes da Republic e Mascott. A direção era de Spencer
“Não se pode estudar, pois, a partir de uns frios postulados estilísticos ou pe- don Bennet e Thomas Carr. Kirk Alyn fazia o super-herói e Noel Nell o pa-
dagógicos, mas em função da história do Ocidente”. pel de Lois Lane. Devido ao sucesso dessa produção de 1948, foi feita uma
- Jão ministro de Comunicações — digo, de Propaganda — de Hitler, continuação, em 1950: Atom Man vs. Superman. Neste lançamento, utili-
enciumado com a concorrência do personagem em quadririhos (tal como os zaram a cobertura publicitária do rádio, das revistas e os espectadores-mirins
filmes em Hollywood e outros bonecos dos quadrinhos, recrutados por Roo- que tivessem assistido os catorze episódios ganhavam uma senha grátis para
sevelt), alistado na luta pela democracia contra a tirania, Goebbels vê o super- vero último capítulo, o 15º. Lyle Talbot fazia o supervilão, Lex Luthor, que
homem de Nietzsche, ariano, iiber alles, ameaçado pelo viajante precursor inventava um transmissor de matéria (como no filme The F/y) e um vibrador
da bomba V-2 de Von Braun. E não teve dúvidas — denunciou que o “S” sônico para destruir a cidade. Hoje, a verdadeira cidade de Metrópolis, nos
do peito da fantasia era uma cruz de Davi: Estados Unidos, tem como s/ogan: “a cidade de Superman". A biblioteca
“O Super-homem é um judeu!” - de Baltimore, em março de 1940, para incentivar a saída de livros na seção
A publicação dobrou de circulação, depois de alguns números. A revis- circulante, colocou no quadro ““os livros recomendados pelo Superman”,
ta Superman Quarterly Magazine surgiu em maio de 1939. Em um ano ti- com um sucesso sem precedentes nos jovens leitores.
nha alcançado a tiragem de 1.300.000 cópias. Tornou-se bimestral e a circu- No mesmo período em que o segundo seriado de cinema estava nas te-
lação foi para 1.400.000 exemplares. las, a televisão lançou também o seu Superman, com o ator George Reeves
Os jornais se arrependeram de recusar a história e o McClure Newspa- (que mais tarde, em 1959, se suicidou), e a Lippert aproveitou os capítulos
per Syndicate começou a distribuir novas tiras, em janeiro de 1939. Em dois 25 e 26 da série para lançar o filme de média metragem (58 minutos), Super-
anos era publicada em quarenta países, em jornais que cobriam uma circula- man and the Mole Man, em 1951. Lee Sholem assinou a direção.
ção diária de 20 milhões de leitores. Em 29 de março de 1966, o Alvin Theatre, de Nova Iorque, estreou
No dia 12 de fevereiro de 1940, o Super-homem voltou para seu ele- uma comédia musical, It's a Bird, It's a Plane, It's Superman, encenada por
mento: o ar. Um seriado radiofônico foi para o éter, pela rede da ABC, al- Harold Prince com libreto de David Newman e Robert Benton (o roteirista
cançando o índice 5.6, o maior já conseguido por uma série juvenil, três ve- de Bonnie & Clyde), canções de Lee Adams com música de Charles Stroure e
zes por semana. O produtor era George Lowther, auxiliado por Robert e Jes- coreografia de Betty Walberg. O papel-título era de Bob Holiday e Joan
sica Maxwell, co-roteiristas com B.P. Freeman e diretores da emissão com Hotchkiss era Lois Lane.
Allen Du Covny e Mitchell Grayson. Lowther era o narrador, junto com Antes, em 1942, George Lowther escreveu o primeiro romance literá-
Jackson Beck. Fitzmaurice e depois Clayton “Bud” Collyer fazia o duplo rio tendo o Homem de Aço como protagonista, em Nasce o Super-Homem,
papel-título e Joan Alexander fazia Lois Lane. editado em português.
- Em 26 de setembro de 1941, a Paramount lançou o primeiro desenho No Brasil, a revista Lobinho de nº 8, dezembro de 1940, publicava
animado, seguido por uma série de dezesseis cartoons até 30 de julho de uma aventura completa do Homem de Aço. O mesmo diretor, Adolfo Ai-
1943, todos em cores, e o capítulo intitulado ““The Eleventh Hour" foi ro- zen, depois publicou a revista Super-Homem em cores, na EBAL, desde no-
dado pelo sistema tridimensional stereoptical process. Foram exibidos como vembro de 1947.
complementos dos filmes da companhia, depois reprisados na televisão. Os A DC National Periodical Publications foi engolida pela poderosa
Studios Max Fleischer se ocuparam da produção, os mesmos que fizeram Warner Communications (que comprara a Warner Bros.), dos discos WEA,
Koko, the Clown, Bimbo, asexy Betty Boop e a versão dos quadrinhos cria- de Batman, de Frank Sinatra, de Muhamad Ali e dona até do N.Y. Cosmos,
dos por E.C. Segar, Popeye. Dave, irmão de Max, Seymour Kneytel e outros do Pelé. Ficou também com os direitos de Superman, acionou sua concor-
dirigiram a série, entre eles Arnold Gillespie, colaborador de Cedric Gib- rente, a Marvel Group Comics, e ganhou na Justiça os direitos do Capitão
Marvel, acusado de plágio. Mas a mesma Justiça por diversas vezes negou os

146 147
SUPER-HOMEM

processos dos verdadeiros autores da criatura de Krypton, Siegel e Shuster


deixando-os na miséria. Aos sessenta e um anos, Siegel, cego de umolho, vie
AUDAZ
via num pobre apartamento nova-iorquino, e Shuster ganhava 7 mil dólares Messias de Mello
por ano como aposentado do Correio, em Los Angeles. Mas os leitores, jor-
nais, estudiosos e outros artistas-desenhistas fizeram tanta pressão, que a
Warner Communications foi obrigada a lhes dar uma pensão anual de 20
mil dólares, mais assistência médica, sem, porém, reconhecer-lhes qualquer
direito autoral. Uma piedosa esmola, enfim...

CIMO DO MORRO, “AUDAZ” VITO-


RIOSO E INDOMAVEL, FAZ PARAR
SEUS MOTORES O MONSTRO, AGORA A
PASSOS DE GIGANTE, ARRAZA CANHOES
ALÍ COLOCADOS. O? PODEROSOS
RAMOS DO ELETROSCOPIO ENTRAM EM
AÇÃO E DESNORTEIAM AVIÕES
INIMIGOS

AUDAZ 938), de x [
prolíficos na produção de quadrinhos. Começou coe €
sedimentou-se n'A Gazeta, colaborando nas três fases da public
Gazetinha. Fez a História do Brasil, a humorística O Pão Duro,
Belmonte na Carta Enigmática e ilustrou Capitão Blood. Dono de um traço
forte, aqui aparece com Audaz, o Demolidor, com texto de Moura. |

148 149
BATMAN NAMOR
Bob Kane Bill Everett

na MAS NÃO sERA QUANDO


PQ TERMINAR COM Vocês”
CAVALHEIROS,»u

NAMOR/Submariner
(1939), de Bill
Everett vs.
TOCHA HUMA-
NA/Human '
Torch (1939)
de Carl Burgos.
A luta titânica
do Príncipe Subma-
rino;
inimigo da humani-
dade
contra o defensor
SEU ENERGUMENO! da superfície, Tocha
VOU... DoFI Humana, foi um
dos momentos
antológicos dos
gibis. Com
a adesão dos

cations
personagens à
luta contra o Eixo,
National Periodical Publications Warner Communi
os dois ficaram
* do mesmo lado e
perderam a
popularidade. Mas
ficou nos
anais. Tchan!!!

BATMAN (1939), de Bob Kane. Segui tro gigante, Superman, impondo O sucess
dos
herocomie-b
more ibi Ma o
pe históri as completas. Também desencadeou outra serie de super-
upla identidade. Assim como Super-homem dominava Meiropolis
Batman estava nos céus de
Roll Foram alvo deartadide Goth
s amde HOCity, até encont
l rar seu co mpanheiro
hei
- , de aventuras
num livro terrível , Seduction of the Inoce mossex iquiatra Fredericj Wertham, :
nte ualismo, pelo psiqui

150
GIBI GiBl

diariamente em tiras, em preto e branco. Somente em 1933-34 surgiram os


comuc-books em tamanho meio-tablóide, com histórias completas.
O que não está na enciclopédia No Brasil, essas revistinhas em quadrinhos passaram a ser chamadas
popularmente de ““gibis"”, por causa do lançamento da revista Gzhj, numa
está no Gibi quarta-feira, 12 de abril de 1939, com trinta e duas páginas, papel-jornal
meio-tablóide, algumas páginas de dobra em duas cores (vermelho e amare-
lo) e as outras em preto e branco. O preço era de trezentos réis e publicou, no
primeiro número, entre outras, Oscare sua Turma, Charhe Chan (desenha-
1939 do por Alfred Andriola), Bronco Piler, de Fred Harman, 17'/ Abner, de Al
Capp, Césare Tubinho, de Roy Crane, Barney Baxter, de Frank Miller, Bru-
Em março, a Alemanha toma a Tchecoslováquia, enquanto, em abril, cutu, de V.T. Hamlim, 04, Diana!, de Don Flowers, algumas em tiras diá-
Nova Iorque abre a Feira Mundial; em setembro, a Inglaterra e a França de- rias, outras em seus capítulos dominicais, e Os Filhos do Capitão Grant, de
claram guerra contra o nazismo, quando a Polônia é invadida pela Alema- Julies Verne, especialmente ilustrado por Miguel H. (Hochman) com Ietri-
nha e União Soviética: a Henkel usa para a invasão, pela primeira vez, aviões nhas dos balões em composição. O Gz: continuava o sucesso de outras revis-
a jato. Zwotykin, um russo radicado nos Estados Unidos (ele já havia desco- tas da época em tablóide, como O Globo Juvenil, da mesma editora de Ro-
berto o tubo eletrônico que deu nascimento à tevê), faz o microscópio eletrô- berto Marinho. Somente mais tarde, em 1940, é que começaria o G1b: Men-
nico, enquanto o Oscar é entregue ao filme E o Vento Levou; Disney faz o sal, com histórias completas, exatamente como os coznic-books.
desenho animado O Patinho Feio e Robert Donat ganha o Oscar como me- Mas as crianças e os jovens de então não se preocuparam com essas suti-
lhor ator em Adeus, Mr. Chips; Judy Garland canta Over the Rainbow em O lezas e passaram a chamar de “gibi” qualquer revistinha em quadrinho. A
Mágico de Oz e Spencer Tracy, no coração da África, como o repórter Stan- tentativa de reeditar G1hz, em 1973, falhou. Gzhz, segundo o dicionário Lel-
ley, estende a mão com a frase “Mr. Livinsgton, presumo”. A Itália ainda lo é um negro de traços grosseiros e rudes; e, de acordo com o Dicionário Es-
está inebriada com Mussolini e com o campeonato mundial de futebol, con- colar do MEC, de 1965, é um negrinho, moleque; e uma gibizada é uma
quistado no ano anterior. O rádio americano havia descoberto os programas molecada, negrada.
de perguntas e respostas ao mesmo tempo em que Orson Welles colocou em De fato, no logotipo original vemos um molequinho críoulo, prenun-
pânico o país com a invasão dos marcianos no ano anterior. Bob Kane cria ciando Pelé (que também não sabe donde veio seu nome), estático no canto
Batman, aguardando a vinda de Robin, em 40. Tobacco Road. de Erskine esquerdo do título da revista. Muita água correu entre o primeiro Gzhz, que
Caldwel, batia recordes de permanência na Broadway. Hemingway, na sua durou até 1950 (a edição mensal foi até 1963), e o que a Rio Gráfica Editora
máquina de escrever, narrava sua experiência na Guerra Cívil da Espanha, lançou em 1973, também numa quarta-feira. O velho Gzbizinho saía às
terminada em 1939, preparando Por Quem os Sinos Dobram?; F. Scott quartas e domingos.
Fitzgerald, no álcool, acelerava seu fim, em 1940. Os Estados Unidos ti- Naqueles tempos, os pais e professores eram radicalmente contrários à
nham um censo que revelaria uma população de 131.669.275 habitantes, leitura dos quadrinhos pelas crianças e jovens, que não tinham voz ativa.
sem tevê ainda. Na Alemanha, 125 morrem num desastre de trem, enquan- Agora, os jovens, desde o surgimento dos Beatles e dos movimentos estu-
to na Inglaterra um submarino afunda com noventa e nove pessoas. Einstein dantis de 1968, participam ativamente do mundo contemporâneo e repre-
transava a teoria da relatividade até 1952 (começou em 1905). Joe Louis era o sentam uma parcela importante da sociedade atual. E o termo gibi, curiosa-
campeão mundial de boxe. A Rádio Nacional estraçalhava o Río, em pleno mente, voltou com a frase “'não está no gibi”, como se o gibi fosse uma ver-
Estado Novo de Getúlio Vargas. dadeira enciclopédia.
Os quadrinhos, tal como os conhecemos hoje, começaram nos Estados
Unidos em 1895, nos suplementos dominicais coloridos, usando a dimensão
total do jornal (standard) ou em tablóides, passando em 1907 a sair também

152 153
CAPITÃO MARVEL
C. C Bal

ERretas
PRONTO] ASSIM FICARÃO ATÉ
A POLICIA CHEGAR. E O FIM
DO SEU PLANO DE
DOMINAR à MUN Dol

|, ACHO QUEh ISSO PROVA


|
SEA FAMÍLIA
SILVANA TENTAR
NÃO IMPORTA ONDE O
MAL APARECER,
DS | VOLTAR, ESTAREMOS / ay MARVEL
h SILVANA á am |, VIGILANTES. LUTARA' ATÉ
a an” É 4 Vs A VITORIA /
E AFAMÍLIA E É) [ES E
SILVANA N7 5

PF

CAPITÃO MARVEL/Captain Marvel (1939), de C.C.Beck. O termo “Shazam!'


va um trovão e transformava Billy Batson no Homem de Aço. Era a fase dos supe
nos gibis. Teve um dos melhores vilões: Dr. Silvana. Um longo e custoso processo
proprietários do Superman, por alegação de plágio, acabou absorvendo o persona
fundador da Marvel Comics Group pelo concorrente National Periodical Publicati
Coisas do direito autoral... E fm Mi am

154
ROBIN
E. Bob Kane

Sou Batman! Por que não cha- Batman conta que seus pais
Quero ajudá-lo a mar a Polícia? também foram vitimas de um
pegar os criminosos! criminoso...
Eles puseram ÁCIDO nas cor-
das do trapézio! Mas Meus pais também
não pode ir à Polícia! foram assassinados! Eis
Porque toda esta cidade é por que devotei minha
dominada por Chefão vida a exterminá-ios!
Zucco! Se contar o que
sabe, será morto! Ficará Eu
uns tempos em minha quero fazer o
mesmo! Leve-me
com você!

DETECTIVE COMICSNATIDNAL PERIODICAL PUBLICATIONS


man reluta, mas a À noite, dois vultos fazem um E, assim, Dick Grayson, asas

ressão do rosto do menino toca-o juramento... pelas mãos do Destino,


| profundamente.. se transforma no
fenóm «OQ Robin
Bem, somos vitimas E juramos lutar JURO! DM Trad Ni
de um destino idêntico! juntos contra o cri- ROBIN, O MENINO-
Está bem, vou torná-lo me é a corrupção... PRODIGIO!
meu auxiliar! Mas pre- e nunca nos afastar di
vino-o: levará uma vida do caminho da
perigosa! Justiça!
Não tenho
medo!

40) de Bob Kane. O criador de Batman, em 1939,


logo providenciou um menino-companheiro para seu herói, escrito
por Bill Finger. O milionário Bruce Wayne, ao tornar-se órfão,
dedica-se à luta contra o crime. Ao encontrar o menino Dick
Grayson, também órfão, transforma-o no Boy Wonder, também
mascarado. Enfrentaram grandes vilões, mas perderam para o psi-
quiatra Dr. Fred Wertham, que escreveu um livro acusando-os de
homossexualismo. A partir daí, tiveram aventuras separadas.

155
BRENDA STARR
Dale Messick

T NÃO OLHE AGORA, GENTE, MAS | ESTEEO MELHOR | OBRIGADO)


Ano QUE BRENDA ESTA TENVO DE BASIL. Po E
e PRE PARA ||
OCE. 1d

*- V982 Tune Company Syndeete hr


Au Pighig Ressrvos

( EspERO QUE O

Si SS
AVIÃO CONTINUE
QUEBRADO
FICAREMOS JUNTOS
tt PARA SEMPRE. BRENDA STARR (1940), de Dale
Messick. A autora mudou seu nome
(Dalia), pois não se acreditava que uma
mulher pudesse fazer quadrinhos, na-
queles tempos, numa área machista.
Hoje, uma equipe feminina faz os de-
senhos, mas os roteiros de Dale conti-
nuam caóticos, verdadeiros quebra-ca-
beças. A heroína repórter recusa pre-
tendentes, pois é vidrada no químico
Basil, eterno noivo.
O ESPIRITO
Wall Eisner

QUE A
MORTE DE DENNY COLT
TRANSTORNOU
A PoLíciaF

, DIZ |

[oenylllvivoS E FUi... MAS O


MAS EU Vi VOCÊ VENENO DE COBRA
ENTERRADO...
ERA UM ANESTESKCO..:
FINGi DEMORTO.

” FoRMIDAVELI VouN
AVISAR A IMPRENSA..«

O ESPÍRITO/Spirit (1940), de Will Eisner. Uma das maiores criações das histórias em
quadrinhos. Obra absolutamente genial. Está, para os comics, como Cidadão Kane para o
cinema. Obra antológica. Tomadas, fusões, cortes, ângulos insólitos, uso do som e das
sombras, em linguagem revolucionária visualmente. Apoiada em textos e situações que
lembravam Maupassant, Checov e O.Henry.

157
ZAZ- TRAZ

»
ECage É
Chartes Biro

E
a iia Fai adacaas
se aci E
ErAe RCA anda Damda
A]

ZAZ-TRAZ/Steel Sterling (1940), de Charles Biro. O Homem


de Aço (Steel) era realm
John Sterling, experimentador que adquiriu poderes de invulnerabilidade e vôo, é
acidentar num caldeirão de metal. Alcançou grande popularidade nos gibis e dez
desenhado por Irv Novick. Entre seus vilões, destacou-se o Barão Gestapo.

158
CAPITÃO MARVEL JR.
Mckaboy

UM HOMEM SACRO SAGRADO:


IMPORTANTE ONDE FO/
como De. A CARTA ?

TENHO QUE -
INVESTIGAR+.
WEM VAINOTAR
O ROUBO ,
| DACARTA!

UMBBROTO COMUM NHO - FL Amis PAD ad


SEMPORTHRA.... MAS A

FREDDY FREEMAN PRO- OS PODERES De:SHAZAM


S

NUNCIa O NOME DE PERMITEM VER O


SEU HEROL E CRUSA |U LADRÃOZINHO!
UM RELÂMPAGO
TRANS FORMANDO
O. NO.

Fawcett/Notional Periodical Publications

CAPITÃO MARVEL Jr. /Captain Marvel Jr ( [941 ) de McRaboy. A espantosa boia de


apitão Marvel pegou a editora Fawcett desprevenida. Só dois anos depois o escritor Otto
Binder conseguiu transformar o aleijado Fredy Freeman, um menino, num super-boy, ao
pronunciar o nome de seu herói. McRaboy, depois, desenhou Flash Gordon.

159
CAPITÃO AMÉRICA JIM GORDON
Jack Kirby e Joe Simon Roy Crane

TENHO QUE DETER MAS... ÃO BEM MEU VELHO


ENTENCO! AMIGO GORDON SUPONHO
CUSTÕDIA + QUE ESTA PCR
SE. PUSHINSKY! ge. DISSO!

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DAS: ABOAS «CARA. AO MENOS- MUITO E OBRIGADO PELA


b “AJOIN MORE THAN anos sas PESCARIAS JUNTOS... OBRIGADO
l DIA beta a
cores Sos; “e gro ES AA DOS

O King Fosturos Byndicato, Inc, 1963. Worid rights reserved.


E A PROPÓSITO SE ALGUMA
$ 10,000 RED-BLOOOED | UM EMPREGO NA CONTRA-ESPION; E RERCON! Eneas

SENTINELS LIBERTY! || UNS AMERICANS NA YOUNG


|
PROC URE
POR MAMA! MARINHA,E" SO
hn CHAMAR !
AND WEAR THE BADGE THAT PROVES THE SPIES ANO TRAITORS |
YOU ARE A LOYAL BELIEVER AMERICANISM *I WHO ATTEMPT TREASON
- e AGAINST OUR NATIONS!
e Simon and Jack Kirby, “Captain America.
Marvel Comics Group.
CAPITÃO A MÉRICA/Captain America(em) de
Jack Kirby e Joe Simon. Este personagem nasceu em
pleno esforço dos quadrinhos em prol dos Aliados na
II Guerra Mundial, em momento de ultrapatriotismo.
Seus vilões eram Nazis. Red Skull. Muitos desenhistas ' gd
assinaram a história € Stan Lee a reescreveu, mas não e do
do uso
JIM GORDON/Buz Sawyer (1943), de Roy Crane. O mestr
teve mais sucesso no pós-guerra, carregando um
“craftint””, uma retícula especial, depois de Captain Easy, lançaria durante
complexo de culpa pela morte de seu jovem
a Segunda Guerra um personagem ligado à Marinha, em aventuras com
companheiro Bucky.
fundo político radical e americanista, em belos desenhos,
texto excelente e linguagem típica dos quadrinhos.

160 161
JOHNNY HAZARD MARY MARVEL
Frank Robbins Jack Binder

snão! NÃo!
pg (CE AZ; Ro
JOHNNY HAZARD EVITA UM ATENTADO... CORUTA!
EU SABIA |
NÃO mM O TE;
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[TUAN HAZARD SALVOU MINHA PR QUINDO EU TERMINAR, MAIS TARDE, NA PRISÃO HOSPITAL...
VIDA... QUE TAL FICAR SALVANDO VA/ PRECISAR DE BANDAGEM QUER LER O
PARA SEMPRE 2 / GROANZ
DE VERDADE / JORNAL FALANDO
DENARY MARVEL
CAPTURANDO
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JOHNNY HAZARD (1944) de Frank Robbins. Este artista tinha substituído um dos ] MARY MARVEL (1945) de Jack Binder. A primeira costela do fenomenal sucesso do
mestres — Noel Sickles — na historieta Scorchy Smith e deixou-a para criar um: Capitão Marvel foi Mary Bromfield, irmã-gêmea de Billy Batson. Ao pronunciar a palavra
aventureiro americanista para o King. Ao azar, envolve-se em situações do Rio a Paris, mágica Shazam (S de Selena, H. de Hyppolita, A de Ariadne, Z de Zephyrus, a beleza de
da Groenlândia à China, sempre esbarrando em lindíssimas, incontáveis e sexies Aurora e a sabedoria de Minerva), virava super-heroína. Era escrita por Otto Binder
heroínas e vilãs. Visual de primeira em traços fortes e marcados, pinceladas de pintura. (irmão de Jack), que jamais a colocou num romance. E ela nunca revelou um mínimo de
atração sexual.

162 163
DRAGO
Bume Hogarth

SERA QUE
ME ENGANEI,
OU 1880
Cogr. 1946, &. T. Paul Corp.

DRAGO (1945), de Burne Hogarth. Logo que deixou Tarzan, criou uma página domi
em cores, que, infelizmente, durou apenas um ano. Um melodrama ambientado entre
gaúchos, dos pampas da Argentina, tinha tanto a ver com a América do Sul quant
Homem-Macaco com a África. Concebido como um musical, o estilo barroco do a to
reconstruiu a Natureza, novamente, numa chamada “fúria expressionista”.

164
Drago, o irmão mais
moço de Tarzan

No dia 4 de novembro de 1945, um domingo, o jornal New York Post


publicava a primeira página, em cores, de uma nova aventura em quadri-
nhos, Drago.
Ambientada na Argentina, fazia parte do plano, durante a Segunda
Guerra Mundial, de “boa vizinhança” dos Estados Unidos, isolado da Eu-
ropa pelo conflito. Aproximando a política norte-americana da América La-
tina, incluindo a vinda de Walt Disney e suas criações Zé Carioca e 3 Cabal-
Jeros, o filme Gilda, ambientado em Buenos Arres, etc.
O que se destacava na historieta Drago, entretanto, era o desenho des-
lumbrante de Burne Hogarth, o artista que se destacou mais na figuração
gráfica do homem-macaco, Tarzan. O ilustrador estava descontente com o
distribuidor da historieta, United Feature Syndicate, pelas restrições impos-
tas ao seu trabalho, principalmente pelo fato de não poder desenvolver seus
próprios scripts. Mas assim mesmo deu todo o realce à parte visual dos capí-
tulos dominicais de Tarzan. Deixou o desenho da criação de Burroughs, sen-
do substituído por Rubimor (Ruben Moreira) durante dois anos.
Infelizmente, Drago durou apenas um ano. Terminou em 10 de no-
vembro de 1946. O sindicato-distribuidor Robert Hall tinha outra historie-
ta, muito inferior, Bruce Gentry, também ambientada na América do Sul, e
decidiu terminar com uma delas. Escolheu, desacertadamente, terminar
com Drago, interrompendo uma experiência única nos co7zics.
O argumento de Drago era simplista. Puro melodrama. À ação era
constante, os acontecimentos se precipitavam. Os personagens eram mant-
queístas. Seus nomes, romanescos: o vilão nazista Barão Zodíaco, a vamp
Tosca, a mocinha Darby Ô Day, o sádico Stilletto, o fiel Tabasco, a vulcânica
Flamingo. E, para coroar, em certo momento da aventura, Drago — que
lembrava um irmão mais jovem do Tarzan de Hogarth, ou, mais simples-
mente, Tyrone Power — usava uma máscara tipo Zorro e, cavalgando Dia-
blo, se auto-intitulava A Pantera dos Pampas!!!
Embora ambientado no pampa argentino, a paisagem violenta e o cla-
ro-escuro do background dramático de Hogarth era o mesmo da selva africa-

165
AZIRIANIAS Ma Nai A a) a”

na de Tarzan: só existia na imaginação brilhante e no desenho fulgurante de usava alguns requadros diferentes, alternando quadrinhos com círculos, ou
Hogarth. deixando-os em aberto. Em momentos românticos ou de dança chegava a
Burne era um presente de Natal aos quadrinhos, pois nascera no dia 25 usar notas musicais. Aliás, Hogarth concebeu esta historieta, inovadora-
de dezembro de 1911, em Chicago. Estudou na Columbia University e na mente, como um musical. Chegou até a compor uma música, com letras
famosa Chicago Art Institute. Aos quinze anos já começou a trabalhar como suas, The Song of Drago the Gaucho, que não chegou às paradas de sucesso.
profissional. Em 1929 criou sua primeira historieta, Joy Hemmanhaw. Em Sua primeira página de Tarzan, ainda influenciada por Foster, saiu no
1935 foi contratado pelo McNaught Syndicate para ilustrar uma aventura de dia 9 de maio de 1937. Interrompeu seus belos desenhos da selva para fazer
piratas, Preces of 8, escrita pelo famoso autor Charles Driscoll. Drago. Em 1947, voltou a fazer Tarzan, depois de um acordo com a UPI,
Sua maior chance, porém, surgiu em 1936, quando Harold Foster permitindo uma das melhores fases dos quadrinhos do Rei das Selvas, com
anunciou sua decisão ao distribuidor United Feature Syndicate de deixar o histórias eminentemente visuais. Nesse mesmo período tentou uma histo-
desenho da página dominical de Tarzan, para criar Príncipe Valente para o rieta cômica de curta duração, Miracle Jones.
King Features Syndicate. Hogarth, com apenas uma simples página, foi o Nessa mesma profícua época, se associou a Silas Rhodes e abriu uma es-
escolhido. Sorte dos cognics. cola em Nova Iorque, onde já vivia, a School of Visual Arts, uma das mais
Assim como Johnny Weissmuller foi o melhor ator no cinema a personi- conceituadas dos Estados Unidos. Em 1970, deixou a escola para voltar a de-
ficar o hmem-macaco de Burroughs, Burne Hogarth foi o desenhista que senhar, pintar e escrever. Lançou três livros importantes na Watson-Guptill:
melhor captou o visual de Tarzan. A figura principal foi se desenvolvendo Dynamic Anatomy, Drawing the Human Head e Dynamic Figure Dra-
no traço de Hogarth, imediatamente liberto da influência marcante de Fos- wing, livros indispensáveis para estudantes de desenho e anatomia.
ter. E seus músculos, sua anatomia, seus movimentos, sua agilidade, saltos, Em 1950, tinha deixado definitivamente o “Rei das Selvas"”, que pas-
vôos e mergulhos, numa incessante busca de uma personalidade no escorço sou a ser desenhado por muitos outros artistas, esmagados pela lembrança
da figura humana, levou-o a ser cognominado o ““Michelângelo dos Co- do seu desenho incomparável. Mas, em 1972, em acordo coma editora Wat-
maics”, na Europa e América do Sul. Curiosamente, os movimentos dos ani- son-Guptill, lançou de novo um livro em cores, numa reinterpretação da
mais da floresta, gorilas, leões, leopardos e elefantes, todos se entrelaçavam primeira aventura de Tarzan, fiel ao livro original de Burroughs.
em sua anatomia musculosa com a do Rei das Selvas, numa simbiose huma- Nessa época, já fora saudado como um dos grandes artistas contempo-
no-animal em movimento darwiniano constante. Tudo em desenhos que tâneos, tendo até tido umalexposição consagradora no Museu do Louvre, em
ora destacavam um grande quadro dominante na página dominicial do ta- Paris. Esteve em São Paulo, em 1970, na exposição de quadrinhos organiza-
manhão de um jornal, em cores. No fundo, uma mata agreste, violenta, cla- da pela Escola Panamericana de Arte, no Museu de Arte de São Paulo, onde
ro-escuro contrastante, em constante movimento também, e ventania cons- declarou ser mais difícil atravessar a Avenida Paulista do que a selva de Tar-
tante, dobrando suas árvores, balançado os cipós, retorcendo seus troncos zan.
bárbaros, numa paisagem e perspectiva ameaçadora e aventureira. Nem no Em 1968, esteve em Buenos Aires, quando a Escola Panamericana Ar-
cinema, nem na animação, jamais a selva foi tão artisticamente reinterpreta- gentina organizou uma exposição de historietas no Museu Torcuato di Tella.
da como natureza viva, em recriação única e pessoal. Lá, desculpou-se muito por ter ambientado Drago na Argentina com com-
Hogarth, tal comó Milton Caniff (autor de Terry e Steve Canon), é ca- pleto desconhecimento da paisagem e dos costumes do verdadeiro pampa.
nhoto, desenhando cuidadosamente, detalhadamente, a lápis, e, depois, Não precisava. Sua concepção visual ultra-surrealista foi tão brilhante,
passando tinta nanquim com um pincel marcante, em traços firmes e gros- mudou tanto o desenho, tanto na anatomia quanto nas paisagens, que o
sos. mundo não é o mundo, no mundo dos quadrinhos maravilhosos de Burne
Tanto Tarzan como Drago foram publicados no Brasil pelo Sup/emen- Hogarth.
to Juvenil de Adolfo Aizen. A primeira na página central, dobrada, em co-
res, no tamanho standard de jornal, e a segunda em tamanho tablóide, tal
como nos Estados Unidos. Mas a proporção não alterou o visual total da pá-
gina, Tarzan e Drago causavam impacto gráfico à primeira vista. Em Drago

166 167
O TESOURO | OS DOIS AMIGOS
Jayme Cortez
Eduardo Teixeira Coelho j
à

F
] Nadaram durante alguns segundos sob a água, para
: voltarem à superfície fora do alcance do monstro...

biáçies o sli
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É :
Mas subitamente sentiram-se
NUMA CALMA MANHÃ DE
(g

Eu* AS,CERTA EM TODO


OS ! ÉPOCA, Rui,
O REINO
GUANNES
DAS ASTÚRI- | | TEMPOS DEPOIS, NA PRIMAVERA, COR
E ROSTABAL DE tomados de pavor...
MEDRANHOS ERAM OS FIDALGOS MAIS FAMINTOS DT Coma seg bed
E MAIS REMENDADOS. GUAS PASTAVAM, OS IRMÃOS DE MEDRANHOS...

Três enormes animais, em tudo semelhantes àquele de


PRN N A D” . ENCONTRARAM, NUMA que fugiam, vinham nadando também sob a água, em
ScoORTEZ—=>
E NE FRE DE FERRO. COMO SE ESTIVESSE |
direção a eles... sy
aà TEIA

NIE) * MUITO SEM GUARDADO NUMA TORRE, O COFRE CONSER-


E VAVA SUAS TRÊS CHAVES NAS TRÊS FECHADURAS. SÔBRE A TAMPA, POUCO Ni |
SÍVEL POR CAUSA DA FERRUGEM,
ESTAVA CHEIO DE MOEDAS DE OURO!
HAVIA UMA INSCRIÇÃO EM LETRAS ARABES.
ane
E DENTRO, ATÉ AS BORDA
OS DOIS AMIGOS (1946) de Jayme Cortez. Lisboeta naturalizado brasileiro,
O TESOURO (1946), de Eduardo Teixeira Coelho. Versão em quadri- começou na revista lusa O Mosquito, com Os 7 Terríveis, antes desta. Em 47, veio
nhos do conto de Eça de Queiroz, do ilustrador português Coelho, o ao Brasil e fez tiras para jornais: Caça aos Tubarões e O Guarany. Tornou-se o
poeta da linha, para. a revista O Mosquito, onde publicou muitos mestre das gerações de desenhistas do Brasil. Notabilizou-se com capas de gibis de
outros trabalhos. Durante a ditadura, emigrou para a França e depois terror. Estilo vistoso e versátil, ilustrou tudo.
para a Itália, onde vive até hoje, produzindo muito.

169
168
LAI NADO RONDA
À Lada JAM AVADS NOATIA À dados

Em 1966, foi pela primeira vez a Lucca, participando do mais famosc


congresso de Fumetti do mundo. Depois, esteve na Itália por diversas vezes,
participando ativamente da delegação brasileira, levando ilustrações suas e
A carreira de um luso-brasileiro: dos outros, e portando filmes brasileiros sobre quadrinhos. Depois, partici-
Jayme Cortez pou de várias manifestações internacionais em Buenos Aires, Córdoba, Pa-
ris, Nova Iorque, onde reviu artistas amigos e conheceu novos desenhistas do
mundo todo. No Brasil, colaborou em todas as manifestações sobre quadri-
nhos, tendo recebido o prêmio O Tico-Tico em Avaré.
Além de ter colaborado na Editora La Selva, inaugurou um sem-ná-
Em 1946, o emérito ilustrador luso Jayme Cortez Martins começou co- mero de editoras no bairro gráfico da Moóca, participando de revistas de to-
mo desenhista na sua cidade natal de Lisboa, onde nascera, em 1926, no dos os gêneros, inclusive de terror. Trabalhou na revista Crás, da Editora
Bairro Alto. Cortez não completou o secundário. Quando seu pai morreu, Abril, foi diretor de arte de um seu aluno de muito sucesso popular, Maurí-
mostrou seus desenhos a lápis para Eduardo Teixeira Coelho, que se tornou cio de Sousa) e trabalhou para a McCann Erickson Publicidade. Além de diri-
seu mestre ao contratá-lo imediatamente para a revistinha O Mosquito. Lá, gir filmes comerciais, trabalhar como ator em filmes malditos e, principal-
publicou seu maior sucesso na terrinha, Os 6 Terríveis, contendo reminiscên- mente, ter sido um dos líderes da nacionalização dos cartazes de filmes, por
cias de sua infância pobre. Desde o início, trabalhou tipos populares e nacio- sua profícua participação na feitura de posters para filmes brasileiros e es-
nais, usando modelos vivos, influenciado por Coelho. Os 2 Azrigos tam- trangeiros.
bém teve grande repercussão. Um dos seus trabalhos premiados na área dos quadrinhos foi Zodiako,
Anti-salazarista, Coelho iria trabalhar na França e, depois, Itália, onde publicada pela revista de Gênova, Itália, Sargento Kirk, e pela editora Por-
víve, seria premiado em Lucca, recebendo Cortez em visitas a Florença, seu tugal Press, de Roussado Pinto.
novo lar. Já Cortez veio para o Brasil, em 1947, e imediatamente ilustrou O Anualmente, tem participado como um dos cabeças dos trabalhos de
Guarany, de José de Alencar, em tiras diárias, para o Diário da Noite, depois edição dos ilustradores, nascida de uma exposição do Museu de Arte de São
de Caça aos Tubarões. Logo foi trabalhar com Messias de Mello, na Gazeta Paulo. Sempre descobrindo novos talentos nas gerações de artistas nacionais.
Juvenil. O Banco Itaú institutu um prêmio para o Concurso de Cartaz do Cine-
Cortez tornou-se o mestre de gerações de artistas brasileiros, influencia- ma Brasileiro que leva o seu nome, “Prêmio Jayme Cortez”. Não perdendo
dos pelo seu método honesto de trabalho, usando modelos vivos, desenhan- seu senso de humor luso, referindo-se a seu início difícil no Brasil quando te-
do animais diretamente no zoológico de Vila Maria (do falecido Agenor), ve de vender doces pelo interior do Estado de São Paulo, faz blague: “Nada
batalhando pela nacionalização dos quadrinhos, já que o problema era o mau ser titular do único prêmio “vivo” do mundo, para quem começou co-
mesmo que existia com os quadradinhos portugueses: a invasão dos coznics mo contrabandista de doces Maria-Mole...”
made in USA.
Em 1951, foi um dos organizadores da pioneira Primeira Exposição In-
ternacional de Quadrinhos, feito considerado pelos estudiosos europeus co-
mo uma antevisão de dez anos dos estudos sobre comunicação de massa e co-
MCs.
Desenhou muitas capas de revistas em quadrinhos. Participou de todos
os movimentos em prol do artista brasileiro, passando a ser considerado um
dos “nossos” maiores batalhadores.
Lançou três livros sobre desenho: A Técnica do Desenho, em 1965;
Mestres da Ilustração, no Museu de Arte de São Paulo, em 1970; eo Manual
Prático do Ilustrador, em 1972.

170 A:
LUCKY LUKE NICK HOLMES
Morris Alex Raymond

DOENDO-LHE OS INSULTOS COMAN-


GLER, PAGAN TOMA UMA DECISÃO PE-
RIGOSA... nd
ASS RAR VOU F42E-(O
TA DP DESEJAR NUNCA
| . TER ME ENCON-

4 | [HA“UIM DETALHE QUE TEMOS DE RESOLVER


LOL SEM MIM? | ANTES DE PORNOS O PLANO-MESTRE EM
PCOM TODO ESSE TRÂNSITO, 080 VAMOS EU CEEMAÇÃO * TEMOS DE APRSAR
Agnáio- “Nes PE UM quia INDIO d 4 O ÚNICO OUTRO CARA NO MUN-
» PARA CONSEGUIR sa Do CONHECEA FORM - é
TO) ARAVESSAR À RUA E CA DÊ HICKS:O PRÓPRIO () B
HICKS? És
Sa À PE ars É o

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OAPARTAMENTO DE HOW
AÓVA (OREQUE--

An! Aqui...

NICK HOLMES/Rip Kirby (1946), de Alex Raymond.


Na volta à vida civil, o criador de Flash Gordon lançou um detetive
LUCKY LUKE (1946) de Morris. Com pseudônimo, o artista belga moderno, no ambiente charmoso de Manhattan e no submundo do crime.
Maurice de Bevêre criou esta sátira humorística dos Westerns para a revista Revelou-se um mestre no branco e preto diário,
Spirou. Em 1955, o escritor René Goscinny (de Asterix), passou a fazer os com uso dos balõezinhos em enquadrações cinematográficas.
roteiros, incluindo os mitos do Oeste: Roy Bean, Jessie James, Billy the Sua morte prematura, em 1956, consolidou o seu mito como
Kid, Calamity Jane. Mudou de revista, passando para Pilote. Expandiu um dos maiores artistas do traço no desenho contemporâneo.
para álbuns de Dupuis na Bélgica, e Dargaud, na França. E foi filme de
longa-metragem, em animação. Virou até canção.

172
ALEX RAYMOND ALEX RAYMOND

de Edgar Rice Burroughs eram de dois mestres: Hal Foster e Burne Hogarth.
Esmagou os desenhos de Dick Calkins em Buck Rogers com um visual fan-
tástico em Flash Gordon. Seu ritmo, suas linhas, as composições, os traços, as
Alex Raymond, criador de mitos figuras em movimento, os cenários, as astronaves, as roupas, as cidades ima-
ginárias, o mundo do planeta Mongo, a antevisão de coisas que, muito tem-
po depois, aconteceram, fizeram dele um visionário que transformava em
“realidade sua fantasia sem limites e sem concorrência no mundo contempo-
râneo.
Não só ampliou o mundo de Jules Verne, como deu um visual deslum-
No dia 4 de março de 1946, depois de grande promoção na imprensa brante à sua historieta, antevendo o deszgn do futuro. A Força Aérea norte-
mundial, o King Features Syndicate lançava a tira diária R7p Kzrby (Nick americana solicitava ao King, por antecipação, as provas dos capítulos de fic-
Holmes, no Brasil), desenhada por um dos maiores artistas do mundo con- ção científica, pois Raymond conseguia tornar viável, através de suas li-
temporâneo: Alex Raymond. nhas, a aerodinâmica que viria a ser utilizada pelos aviões a jato e naves espa-
Raymond havia criado três histórias em quadrinhos de enorme sucesso! ciais de nosso tempo.
na década de 30, sendo um dos responsáveis pela chamada “década de ou-. Além disso, a NASA, em seu programa espacial, conseguiu resolver di-
ro” dos comics: Flash Gordon, Jim das Selvas e X-9. William Randolph. versos problemas graças às coleções de velhos quadrinhos dos cientistas, imo-
Hearst (vulgo, Cidadão Kane) dominava a imprensa norte-americana e cria- | bilizados por situações que pareciam insolúveis, mas que encontraram uma
ra os serviços de distribuição do King para dominar o mercado dos cozxics. | saída ao tornar realidade os desenhos de Alex Raymond.
Exportava para o mundo todo, como material de imprensa, mas não poderia Logo no início da carreira, desistiu — pouco depois de Hammett parar
permitir espaço aos concorrentes. de escrever — da tira diária de X-9, dedicando-se à página dominical em co-
Fez um concurso interno entre seus desenhistas e escritores, no próprio res de Flash eJim. Trabalhou muito como ilustrador de revistas,Colher"s, Es-
estúdio da distribuidora, e um jovem fantasma de outras historietas ganhou quire, Look, etc., publicidade, filmes (inclusive Capitão Blood, com Errol
o certame, entrando para a história do mundo da arte do desenho. Flynn e Daguia Cem Anos/ Things to Come) e depois desistiu, ficando só
Alexander Gillespie Raymond nascera em New Rochelle, Nova lor- nos quadrinhos.
que, no dia 2 de outubro de 1909 (embora ele dissesse que era em 1911), e A essa altura, já ultrapassara a influência dos artistas que admirava, co-
era umoffice-boy em Wall Street quando houve a crack da Bolsa, em 1929. mo Charles Dana Gibson, Matt Clark, Franklin Booth e John Lagata. Tor-
Desempregado, órfão de paí, lembrou-se do orgulho coruja do sr. Ray- nou-se o desenhista que mais influenciou as novas gerações. Sua elegância
mond, que decorava o escritório com os desenhos do filho. Voltou a estudar de estilo e fluência do traço alteraram para sempre o desenho de todas as
desenho e conseguiu ser assistente de um vizinho, Russ Westower (criador áreas, não só dos quadrinhos, como da ilustração, da publicidade, da moda,
de Tillie the Toiler), que o encaminhou aos irmãos Young: Chic, que fazia do design, do traço em todo o mundo. Seus quadros têm a mesma qualida-
Blondie, e Lyman, que fazia Ttm e Tom. Acabou ficando com este, fazendo de dos maiores artistas de todos os tempos.
as tiras diárias e as páginas dominicais desta historieta de aventuras, como ar- Deixou Flash Gordon para seu assistente Austin Briggs — e o persona-
tista-fantasma, com a assinatura do outro. gem nunca mais recuperou o nível artístico — em 1944 e foi para a guerra co-
Aí veio o concurso do King. Em janeiro de 1934, começaram as tiras mo fuzileiro naval. No porta-aviões US Gilbert Islands, comissionado co-
diárias do Agente Secreto X-9 e a página dominical, dividida em 3/4 com mo capitão, esteve em ação em Bornéu, nas batalhas de Okinawa, chegando
Flash Gordon e 1/3 com Jim das Selvas. Transformou-se imediatamente a Tóquio com a Terceira Frota. Seus desenhos e pinturas na Marinha foram
num iz. Os três personagens emplacaram. expostos na Galeria Nacional, em Washington.
Graças ao texto de Hammett e os desenhos de Raymond, X-9 concor- Ao retornar à vida civil, criou um personagem à sua imagem e seme-
reu com Dick Tracy, cujos desenhos eram caricaturais demais. Jizr das Selvas lhança: um major — havia sido promovido — dos fuzileiros navais, recém-
ficou em plano secundário em relação a Tarzan, pois os desenhos deste texto desmobilizado e que é um refinado... detetive e não artista.

175
174
ET
ALEX RAYMOND

Voltou às tiras diárias, com um preto-e-branco marcante, linhas deli- STEVE CANYON
mitantes e claros-escuros brilhantes. Nesse período, fértil em composição, Milton Camiff
ritmo e balanço, fez experiências que enriqueceram ainda mais a linguagem
do desenho. Com fases predominantemente claras, usando apenas linhas,
para mais tarde entrar noutra fase, em contrastantes pretos dominantes, e fi-
nalmente mudar para achureados, como um Gustave Doré redivivo.
O personagem tinha sido criado em conjunto com o editor do King, PARA O LADO DE ( VOCE VAI QUANDO
Ward Greene. Alex desenhou e escreveu as tiras até 1952, quando Fred Dic- MiSS CALHOUN core ELACHAMAR.
kinson passou a se encarregar dos roteiros. TEM QUE FALAR
O clima da tira era sofisticado. Seu personagem principal, usando mais PRIMEIRO COMIGO.
a cabeça que os músculos, tinha pouca ação. Fumava cachimbo, usava ócu-
los, gostava de café forte que seu mordomo, Desmond, ex-presidiário, lhe
fazia. Namorava um bela modelo loira, Honey Dorian, e vivia na alta bur-
guesia de Manhattan.
Às aventuras, sempre muito curtas, lidavam com gente rica, com ex-
presidiários, mulheres lindas e bem-vestidas, traficantes, drogados, suici-
das, órfãos, litígios familiares, viagens a lugares refinados, tudo começando
(tal como o mestre Hammett) com uma simples consulta de um cliente, até
ser enredado numa enorme conspiração, que envolvia muito mais do que
parecia a princípio, captando o interesse do leitor. O lado humano sempre
prevalecia, a ponto do detetive “trair” seu cliente rico e entregar a
netinha/o para a nora-viúva melodramaticamente, levando mais em conta
o futuro da criança do que a riqueza e a corrupção do capitalismo. O detetive —=/ 6/1] o =D Ce depois oficial,
perdia o dinheiro, mas ganhava os corações dos leitores.
No dia 6 de setembro de 1956, no auge da fama e do reconhecimento
artístico, ao experimentar a nova Porsche de seu vizinho Stan Drake (dese-
nhista de Juliet Jones), sofreu um acidente automobilístico fatal nas curvas “e norte-americanas,
perigosas da estrada de Clappboard, próximo a Westport, Connecticut. com desenhos
Muitos anos depois, confidencialmente, outro criador famoso de qua-
drinhos revelou que Alex, um homem de costumes religiosos e moderado, o
cinematográfica
que se costuma chamar de ““um exemplar chefe de família”, tinha justa- e texto de
mente se apaixonado por uma estudante da universidade vizinha, que for- primeira.
necta modelos para seus desenhos, e pretendia abandonar a esposa de tantos SA E E belas mulheres,
anos de casamento para viver com a jovem. Morreu, deixando apenas nos SA E 1 d NES como a vilã
Copper Calhoun.
desenhos, contida, a imagem forte de sua sensualidade em relação às mu- |
lheres mais lindas já vistas nos quadrinhos. Dale, Aura, Frígia, Honey,
Shangai Lil.

MILTON CANIFE/FIELD ENTERPRISES

1787
176
RUSTY RILEY
Frank Godwin

/QUE ESCURO! OLHE /


“QUE E “VERDADEIRO
es
O cavALO BRANCO
VER O CAVALO ar vem ele Y
FANTASMA. LOGO
o

BRANCO FANTASMA QUE


VIU... QUE À LUA BAIXAR...
O VELHO TAKE
HEY! QUE BARULH O 2 |
E ESSE

ENQUANTO ISSO NA FAZENYA .) 7 ALGUMA /


WOW /HPARECEU E DESA- SERPENTE, TEX!
FARECEU. NA COLINAS PATRÃO! OS CAVALOS
ESTÃO LOUCOS
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Cope 1959, Kong Festas yr
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RUSTY RILEY (1948) de Frank Godwin. Depois de Connie, o ilustrador faria esta tira
e capítulo domingueiro de um menino ffão numa fazenda de Kentucky, com roteiro de
Rod Reed (o mesmo de Cisco Kid), num elegante desenho, linhas em movimento e pura
elegância. Deixou a historieta em 1959 e poucas semanas depois faleceu.

178
POGO
Walt Kelly

UM INSULTO.

elly. Saído dos estúdios .


tentou em 1943 este p que relançou em 1948.. |
da Flórida,a fauna local com o senador McCarthy, Fid t
e Khruschev, em crítica social e filosófica do nosso mundo.Texto de
primeira, em balôezinhos curiosos, com letrinhas inusitadas(um
* tipo prolixo, por exemplo, tinha letras góticas!),e desenhos bonitos. Em 60,
ficou progressivamente doente até sua morte em 73. Em 75, a historieta morreu.
BIG BEN BOLT
John Cullen Murphy

| APAGUEM AS A ANTES D e q ACERTAR UM


LUZES... QUERO Mg:õ a | DORMIR, ACERTE ADVERSÁRIO...
x

| DORMI. A RES UMNO.


ex WE? é “mw! ADVERSÁRIO.
| A - MX SUBA AO
“2 RA RINGUE €

A
o
DP VENÇA. o E RA a
0

RAFAZ. BELO GOLPE,


ESTA ME VOU CHAMAR O CAPITÃO DO
| OU VINDO ? SOU dm NAVIO E TERMI—
| OTREINADOR.
E ice
o!
tatSA

BIG BEN BOLT (1949), de John Cullen Murphy. História de um campeão de box peso-
pesado, escrita pelo prolífico irmão de Al Capp, Elliot Caplin (Zé Mulambo, Juliet Jones,
Long Sam e Dr. Kildare), com desenhos de alto nível do ilustrador John Cullen Murphy,
que viria a substituir Hal Foster nos desenhos de Príncipe Valente, antes da morte do
mestre.

180
RECRUTA ZERO
Mort Walker

MALD] a AQUELE
ZERO!
é ZEROS
EU DISSEA ELE
PARA CAVAR
UM BURACO
DECENTE AQUI.
ENEM |
COMEÇOU!

“0-9

RECRUTA ZERO /Beetle


Bailey (1950), de Mort Wal-
ker. A última historieta a ter
aprovação pessoal de William
R. Hearst. E o velho não errou
de novo. Uma das três cria-
E ções de maior popularidade
na década. Começou no dia
do 27º aniversário do autor
que também criou Hi and
Lois, Mrs. Fitz's Flats, Sam's
Strip e Boner's Ark. Seus as-
sistentes e colaboradores fica-
ram famosos, como Dik
Browne (autor de Háãgar), e
criou o Museum of Cartoon
Art, em Connecticut, primeiro
museu do mundo dedicado
aos comics. .

181
MINDUIM

MINDUIM
Charles Schulz À
Minduim, o sucesso do fracasso

BEMÍLA VEM O VELHO O VELHO AMIGO


CHARLIE BROWNY CHARLIE BROWN... No dia 2 de outubro de 1950, Charlie Brown atravessou os quatro qua-
drinhos da primeira tira de Minduim (Peanuts) — nome imposto pela UPI e
até hoje não aceito por Charles Schulz — para conhecer seu primeiro vexa-
me: ser odiado pelos seus semelhantes. Mas apenas dentro da historieta,
porque fora dela é amado pelos leitores dos cozzics.
Uma tira diária, de segunda a sábado, e uma página dominical em co-
res, num total de 12.775 desenhos. Sem contar os livros, as revistinhas, os
cartões, as capas, as ilustrações, os invólucros e todo o /icensing e merchandi-
sing, pois, como se sabe, estes personagens são dos mais reproduzidos em to-
do o planeta Terra em termos de camisetas, bonecos, filmes de cinema e te-
levisão, papelaria, publicidade, sp04s, pontos de vendas, anúncios de ban-
VELHO AMIGO cos e sorvetes, postais, piadinhas, pocket-books, álbuns e mais de quinhen-
CHARLIE BROWN... tas possibilidades de comercialização.
A esse respeito, Schulz rebate as críticas, dizendo estranhar as pessoas o
acusarem de supercomercializar um produto que é, basicamente, um obje-
to comercial. É bom esclarecer que o autor é um dos raros artistas do gênero
que não trabalham com equipes de desenhistas e roteiristas. Faz tudo sozi-
nho. Acha que os quadrinhos são uma Grande Arte. Admira os estudos
atuais sobre o fenômeno dos cozxics, aprecia ser exibido em galerias de arte,
achando, porém, que.o princípio básico dos quadrinhos é o divertimento e
uma base comercial. O artesanato pode dar um toque pessoal a uma criação,
na sua opinião. Os estudiosos, entretanto, acreditam que sua não-presença
nos congressos para, obviamente, receber prêmios, deve-se ao fato de que
cada sessenta segundos perdidos pelo autor em entrevistas representam uma
perda de milhares de dólares por minuto. Pois que Schulz é, sem dúvida ne-
nhuma, o cartunista mais bem pago do mundo, em todos os tempos. Vive
em sua fazenda na Califórnia e não sai dali nem para tratar de negócios. Os
que querem negociar com ele para ali se dirigem.
Desde os seis anos sempre se julgou um predestinado ao sucesso. Mas
foi com suas falhas e lapsos como criança que criou os complexos de Charlie
Brown que fazem a catarse diária de milhões de crianças crescidas e comple-

182 183
MINDUIM MINDUIM

xadas. É o divã diário do psiquiatra mais barato para os leitores do mundo. norte-americana. “Enquanto um alegre vencedor é sem graça, existem cen-
Desde criança, incentivado pela professora, imitava Disney, Popeye, mas foi tenas de perdedores, que usam historinhas alegres para se consolarem””.
o traço de Roy Crane (em Wash Tubtbs) que mais influenciou sua simplici- Centenas, milhares, milhões de perdedores, no mundo todo, conso-
dade. De 1948 até 1950, vendeu alguns desenhos para a revista Saturday lam-se lendo, rindo e consumindo a criação de Mr. Charles Monroe Schulz.
Evening Post e começou a publicar na sua cidade natal, St. Paul, em Min-
neapolis, para o Pioneer Press, um cartum semanal intitulado L7'/ Folks,
usando o pseudônimo de Sparky. Schulz confessa que, uma vez por ano, tal como um produtor teatral,
Remetia constantemente seus trabalhos para os Syndicates (distribui- repete uma situação na sua tradicional historieta: Lucy segurando a bola de
dores de materiais de imprensa), até receber uma carta de Jim Freeman, editor rúgbi para Charhe Brown chutare, no último quadrinho, tirara bola, fazen-
da United Feature Syndicate (United Press International), de Nova Iorque, do-o chutar ar. Anualmente, acredita que será a última vez que conseguirá
que gostou de seus desenhos. recriara situação, mas todos os anos descobre uma nova fórmula de refazera
Entre o cartum (um desenho com uma piadinha) e a tirinha de quatro piada, graças a um velho fã: o presidente Ronald Reagan. Este confessa que
quadrinhos, a UPI escolheu a tira e nomeou a criação, mantendo o nome do acha esta a melhor situação da historieta. Com esse incentivo sádico, o autor
amigo de Schulz, Charlie Brown. O cãozinho Snoopy (que iria se chamar se repete nos últimos anos. Pois que, agora, O sadismo é presidencial.
Sniffy) surgiu junto com o personagem principal. Em 1951, surgiu Schroe-
der, também inspirado num amigo seu. Lucy e Linus apareceram em 1952.
Em 1955, recebeu seu primeiro prêmio Reuben. Só em 1970 surgiu Woods-
tock. Nesse período recebeu o reconhecimento pela sua criação, saindo na
capa da revista 777ne diversas vezes. Em 1969, Snoopy subiu ao espaço com
os astronautas, como símbolo.
Fatos vetídicos sempre serviram de base para sua criação. Alguém que
diz, diante da tevê, “Essa não é Anne Baxter, é Susan Hayward””, serve para
mostrar o lapso do Charlie Brown. Tudo porque a presença constante de An-
ne Baxter nos filmes, tarde da noite, na tevê americana, trazia más lembran-
ças para o autor...
Muita gente acha que sua historieta é influenciada por Sk1ppy,de Percy
Crosby. Mas a maioria escreve para saber de onde ele tira tanta idéia, diaria-
mente, para suas tiradas. Diz que, às vezes, a idéia vem logo de manhãzi-
nha, ao entrar no estúdio; outras vezes, demora para sair algo, então conver-
sa com a secretária, dá alguns telefonemas para ver se, na conversa, surge al-
guma idéia, que depois pode render alguns dias. Toma muito cuidado para
que o cãozinho — inspirado num 4eag/e que teve quando criança —
Snoopy não tome conta completamente da historieta, passando a primeiro
plano, suplantando o já bastante complexado Charlie Brown, que não su-
portaria ver um cachorrinho ser o titular de suas aventuras e desventuras...
Pois que o tema inicial de Peanuts era a crueldade existente entre as
crianças. Um cachorrinho fuçador, embora pensador, não pode aumentar
complexos infantis. Basta os das crianças-adultas malcrescidas.
Porque, como escreveu Schulz, estamos mais próximos dos perdedores
do que dos vencedores na vida. Principalmente na competitiva sociedade

184 185
OS CATECISMOS CISCO KID
Carlos Zéfiro José Luís Salinas

RIMIEIRO HOMEM Dto


Spror IMAR DA PORTA,

Carta Zétiro Carlos Ze lira ]

CARLOS FE MIRO
caoros esmo

O VIÚVO
ALEGRE SUAS ARMAS NO
CHÃO. DEVAGAR !

Os “CATECISMOS"' (1950) de Carlos Zéfiro. Nos anos 50 e 60, revistinhas


brasileiras pornográficas, vendidas clandestinamente, destacaram um autor que
jamais revelou ou revelará(?) o seu verdadeiro nome. Desenhos canhestros,
decalcados de outros meios, mas com roteiros que levantaram os tabus, os
comportamentos sexuais e machismos da época. Por volta de 1970, cessaram.
Muitas imitações e atuais reprints » hoje na permissividade. Mas nenhum
, como
CISCO KID (1951), de José Luís Salinas. O grande ilustrador argentinos oe
Zéfiro. em
um fecundo trabalho em seu país, foi contratado pelo King Feature ad
para uma tira diária baseada no famoso personag em de O.Henry, am :
sucesso no cinema e na TV. Os fracos roteiros de Rod Reed ai ça
brilho de um dos melhores desenhistas do mundo, premiado em Lucca.

186 187
CISCO KID

Um dos dois maiores desenhistas Os quadrinhos numa exposição


da Argentina: José Luís Salinas de arte: audácia brasileira

Na cidade de Buenos Aires, nasceu em 11 de fevereiro de 1908 um dos O número 16 (primeiro trimestre) da revista parisiense Phenix, de
dois maiores desenhistas argentinos, José Luís Salinas. Sua primeira historie- 1971, publica o seguinte: di
ta, Hlernan, o Corsário, surgiu em Patoruzi, em dezembro de 1936, embora “Quando de nossa passagem por São Paulo,Claude Moliterni fez uma
já trabalhasse em publicidade desde 1929. O outro maior autor argentino, conferência sobre o movimento a favor das histórias em quadrinhos e, apre-
Alberto Breccia, disse que Salinas, também premiado em Lucca, ““já co- sentando Dez Milhões de Imagens, afirmou que esta era a primeira exposi-
meçou bom num mister onde a produção diária de historietas é que traz o ção didática dedicada aos quadrinhos. Na sala, Reinaldo de Oliveira contes-
aperfeiçoamento”. tou, pretendendo que, em 1951, no dia 18 de junho, houve a primeira ex-
Ilustrou também os clássicos Capitão Tormenta, Miguel Strogoff, Os posição sobre quadrinhos no mundo. Na manhã seguinte, Oliveira deposi-
Três Mosqueteiros, A Costa de Marfim, O Último dos Moicanos, Ella-Aye- tou uma documentação importante na recepção do hotel. Efetivamente, es-
sha, O Pimpinela Escarlate, As Minas do Rei Salomão e Mowgli, o Livro das ta manifestação aconteceu. E, de acordo com a imprensa, foi uma exposição
Selvas. bastante importante. Portanto, rendamos a César o que é de César!
Seus desenhos eram detalhistas, com um esboço rápido a lápis e um be- De fato, São Paulo foi a primeira cidade do mundo a organizar uma ex-
lo acabamento com pincel. Era um especialista em uniformes militares de posição de cogzics exatamente como, muitos anos depois, os europeus e nor-
época. te-americanos realizaram. Foi um feito pioneiro de um grupo de jovens de-
Lembrava Hal Foster (criador de O Príncipe Valente), mas, parao King senhistas. Em Nova Iorque, abril de 1972, no First American International
Features Syndicate, era superior ao mestre. Tanto que foi contratado pela Congress of Comics, o autor Milton Caniff dirigiu-se aos europeus e, apon-
maior distribuidora de quadrinhos do mundo, para ilustrar os fracos roteiros tando Jayme Cortez e Alvaro de Moya, declarou que, muito antes dos euro-
de Rod Reed para a tira diária Cisco Kia, baseado no famoso personagem de peus, os brasileiros presentes lhe escreveram e fizeram uma exibição de co-
O. Heny. gmics, e, mais tarde, Moya o entrevistou em Nova Iorque. Foi, respectiva-
Cisco Kid começou em 15 de janeiro de 1951 e durou até agosto de mente, em 1951 e 1958, acrescentamos.
1968, tornando Salinas conhecido no mundo todo. Deixou os Estados Uni- Escrevêramos a Milton Caniff e outros autores americanos, para o King
dos. voltou para a Argentina, onde vivia cercado de cavalos que tão bem de- e outros sindicatos, solicitando material que foi oferecido ao Museu de Arte
senhava. Morreu deixando um filho desenhista de quadrinhos. de São Paulo e recusado como projeto de exposição ali. Dois amigos, Liba
Frydman e Maurício Kus nos conseguiram o Centro Cultura e Progresso, no
bairro judeu do Bom Retiro, e um dos autores norte-americanos nos confes-
sou que era a primeira vez que alguém lhe pedia originais para dependurar
numa exposição de arte. Compreendemos que éramos pioneiros, motivo
pelo qual nomeamos o evento, poimposamente, como Primeira Exposição
Internacional de Histórias em Quadrinhos.
No último dia da mostra, Lina Bo Bardi veio com seu marido, Pietro
Maria Bardi, para ver a nossa exposição. Em 1970, depois da bênção dos eu-

189
188
ropeus, o Museu de Arte de São Paulo fez uma apresentação, repetindo a psiquiatria aplicada nos personagens, a linguagem própria e a semelhança
mostra que Claude Moliterni fizera no Louvre. Mas o Brasil já estava presen- com o feuilleton, o uso das cores, o nacionalismo e o internacionalismo dos
te, com Cortez, Maurício e Moya, nos certames internacionais desde Lucca 2, comics, a onomatopéia, as novelas em desenhos e fotos, os cortes e fusões ci-
em 1966, como resultado da vinda da exposição de Bordighera para a Bie- nematográficos, os travellings, o uso de zoom, a utilização da luz, da ce-
nal, trazida por Sérgio Lima, Rubens Lucchetti e Alvaro de Moya. nografia e distorção da perspectiva: o expressionismo. Estudou também o
Leo Gilson Ribeiro, em artigo sobre Lima Barreto no Jornal da Tarde de humor, a captação de um público, ao mesmo tempo infanto-juvenil e de in-
9 de maio de 1981, crítica a Semana de Arte Moderna de 22: “Sem os “is- telectuais, citando Orson Welles, John Steinbeck, Chaplin. A força do meio
mos” importados tardiamente para cá pelos pândegos de 22”. em relação ao cinema, à literatura, imprensa, rádio e à nascente televisão. O
Colocando um pouco de ordem na casa, vamos esclarecer que a Sema- aspecto histórico, citando Doré, A. Diirer, William Hogarth, Busch. A arte
na de Arte Moderna era à imitação de um modismo parisiense, enquanto a gráfica, os autores acadêmicos, como Hal Foster, e os de vanguarda, como
nossa exposição se antecipou-a Paris em mais de dez anos. Will Eisner, e artistas do mundo todo, incluindo europeus. Os aspectos so-
Na década de 50, a campanha contra os quadrinhos atingia o auge. ciais e sociológicos. E até a própria campanha contra os quadrinhos.
Nos Estados Unidos o livro do dr. Wertham provocava estragos. O Código Os plágios foram denunciados: livros de Monteiro Lobato ilustrados
de Ética baniu as historietas de'terror, sexo, violência e guerra. As editoras re- com cópias de Flash Gordon e Príncipe Valente; edições atrasadas de Busch
cuaram. Era a época da “caça às bruxas” e do macarthismo. O cinema, a tevê, em relação à sua época; e o decalque de Buster Brown, como Chiquinho.
o rádio, a imprensa e os comics sofriam. Aqui no Brasil, os pais, professores, Nesses aspectos, a nossa exposição englobava tudo o que, anos depois,
padres, escolas, todos eram contra essa forma de “'preguiça mental das crian- os europeus estudariam com encômios.
ças”. Quem poderia defender os quadrinhos? Para concluir, o Boletim do Clube Português de Banda Desenhada, nº
Somente nós, “'um bando de moleques”” que queria fazer quadrinhos 23 (janeiro/ fevereiro/ março de 1980), de Lisboa, publica um artigo sob o tí-
nacionais e sabia da importância de sua linguagem. Estudávamos os cozaics, tulo “Borbulhas de Mau-Humor””: “Contra tudo o que a insistência parece
o cinema, a literatura, admirando os autores americanos, mas lutando por querer demonstrar, o interesse pela figuração narrativa não começou quan-
um lugar aosol para os quadrinhos brasileiros. Quem, naqueles tempos de so- do meia dúzia de intelectuais franceses, nos inícios dos anos 60, inventou a
brevivência difícil para jovens principiantes-profissionais-desenhistas, pode- expressão mal amanhada, tradução de coznic strip, mas já tinha sido objecto
ria defender quixotescamente os quadrinhos responsáveis pela delinguência de estudos anteriores, quer em artigos ou livros, de autores ingleses e ameri-
juvenil? canos, quer em exposições de cozrics, cabendo ao Brasil a iniciativa de ter
Nós, os heróis fracassados na luta pela legislação em favor da nacionali- apresentado, em São Paulo, em 1951, a primeira exposição de âmbito geral,
zação dos quadrinhos. O nosso entusiasmo juvenil pelas lutas sem objetivos numa data que antecede de longe o Salão de Bordighera (1965).
pecuniários — tal como os nossos ídolos de papel — nos valeu o desemprego “Na exposição brasileira, intervieram, como organizadores, Jayme
definitivo na área de produção ilustrada. Conseguimos, com nosso radicalis- Cortez Martins, Syllas Roberg, Reinaldo de Oliveira, Álvaro de Moya e Mi-
mo, desgostar a todos, indistintamente. Nunca mais pudemos trabalhar no guel Penteado. Foram expostos originais de Milton Caniff, Al Capp, Herri-
nosso mundo, o dos quadrinhos. Cada um foi para seu lado: televisão, im- mann, Alex Raymond, Hal Foster e muitos outros.”
prensa, gráficas, editoras, publicidade, onde fizemos carreira.
Mas deixamos um ambiente conturbado pela nossa passagem, abrimos
caminho para uma nova geração de desenhistas brasileiros. Nossa proposta
total só foi compreendida muitos anos depois, quando os europeus começa-
ram a estudar os quadrinhos como forma característica de expressão, sob o
ponto de vista das teorias de comunicações de massa. É quando se deu o reco-
nhecimento do esforço brasileiro. O que encantou os europeus, na nossa ex-
posição, foi a diversidade de enfoques dados à mostra.
A mostra estudou o aspecto estético, o desenho, o texto, a psicologia e a

191
190
MAD
Harvey Kurtzman

Aridi,
AR

ERA qr ads + e dad

Sh aÃ,

yscrit
MAD (1952) de Harvey Kurtiman. Revista norte-americana de sátira criada pelo.
desenhista Kurtzman com os ilustradores Bill Elder, Jack Davis e Wallace Wood (t
“crias” de Will Eisner). O grupo deixou a revista e tentou lançar outras de sua prop"
de e falhou. Numa delas, revelou R. Crumb. Depois, Kurtzman & Elder a
personagem Little Annie Fanny para à revista Playboy. Ridicularizaram Hollyy
TV, a publicidade, os quadrinhos e o american way of life.

192
REVISTA MAD

A história de uma loucura


americana...

Harvey Kurtzman e William M. Gaines. Do encontro desses dois ho-


mens nasceu uma das mais importantes revoluções na imprensa mundial e
um novo tipo de humor.
Gaiínes nasceu em 1922, dia 1º de março, em Nova Iorque, filho de
M.C. Gaínes, considerado o pai dos comic-books (gibis), revistas de quadri-
nhos com histórias completas. “Bill” Gaines herdou a companhia de seu
pai, E.C. Publications, em 1947.
Fez diversas tentativas de revistas focalizando histórias de amor, wes-
terns e livros de bichinhos de humor, sem sucesso. Em 1950, tentou histórias
de terror. O gênero floresceu e o editor, Al Feldstein, desenvolveu um estilo
E. C. numa linha de horror, ficção científica, guerra, crime e histórias de hu-
mor. Muito superior às outras revistas, os textos foram escritos pelo próprio
editor Feldstein, Johnny Craig e Harvey Kurtzman.
Kurtzman também nascera na cidade de Nova lorque, em 1924, no
dia 3 de outubro. Depois de estudar na High School of Music and Art, o pri-
meiro trabalho de sua autoria apareceu, em 1943, na editora Ace, nas revis-
tas Magno e Unknown Solaher, histórias de aventuras. Em 1945, produziu
uma tira de aviação, Black Venus, e desenhou The Black Bull para a editora
Prize. Também nesta época, Kurtzman criou Sz/ver Linings, uma bem-suce-
dida e rara tira diária para o suplemento dominical do jornal Herald Tribu-
ne. Mudou-se para a editora Timely, trabalhou com diversos grupos em
1945 e produziu humor e piadas, destacando-se Hey Look, piada de uma
página.
Finalmente, em 1950, mudou-se para E.C., especializando-se em tex-
tos de ficção científica, na chamada linha renovadora da editora. Em seis me-
ses, estava editando um livro de guerra e aventuras intitulado Two-Fisted
Tales. Frontline Combat seguiu-se imediatamente e Kurtzman escreveu e
desenhou a lápis quase todos os contos do livro. O desenhistas Gil Kane (que
foi um dos artistas de Batman) disse que “Kurtzman tem um sentido para
coisas humanas, um sentido de profundidade”. Kane acrescenta: “e um

193
REVISTA MAD REVISTA MAD
sentido pela futilidade da guerra que jamais havia ocorrido a ninguém mais fundo, coisas conhecidas da vida americana. O humor estava em segundo
até então no mundo dos quadrinhos”. plano, pronto para passar a liderar o que seria o movimento mais concreto do
Nesse tempo, a editora já contava com uma equipe de desenhistas fora
humor da sociedade americana dos anos 50, devolvendo à tevê, ao cinema, à
do'comum: Frank Frazetta, Al Williamson, George Evans, Reed Crandall, publicidade, ao american way of life, todo o seu ridículo.
Bernie Krigstein, Jack Davis, Will Elder, Wally Wood, John Severin e Gra- William M. Gaínes, Harvey Kurtzman, Jack Davis, Bill Elder e, em
ham Ingells. Vamos então destacar a biografia de dois dos mais importantes
menor escala, Wallace Wood, John Severin: está escalado o time com o des-
desse grupo: Davis e Elder.
tino de revolucionar a qualidade americana — somente igualada pelos ita-
Jack Davis nasceu em 1926, em Atlanta, Geórgia. Depois de estudar
lianos — de ridicularizar-se a si mesma, dizem, herdado do humor semita.
na universidade local, foi para o norte, em 1951, e participou do grande mo- Em novembro de 1952, saiu nas bancas o gibi Mad, que era uma insis-
mento da editora E.C., de 1950 a 1956. Na linha de desenho sério, fez histó-
tência de Kurtzman com o dono da editora Gaines, que autorizou a revista
rias de crime e ficção científica, mas foi nas edições de Feldstein, no horror e
como uma brincadeira entre eles, sem acreditar em continuidade, como
nas histórias de Kurtzman de guerra e western, que seu trabalho apareceu,
muitas outras tentativas. Imediatamente, transformou-se num fenômeno
antes de entrar para o humor. Mesmo essa sua veia aparecia nos textos de
americano. Joe Brancatelli observa que “'é impossível descrever adequada-
horror de Feldstein, talvez influenciado por Will Eisner, de The Spirit: seus
mente todas as inovações de Kurtzman aqui, mas dentre elas estão : sua in-
personagens pareciam tipos comuns, num contraste com o texto pesado,
trodução dos humoristas populares em revistas de quadrinhos; paródias de
mantendo um tipo de imagem de depravação. Muitos consideram seu tra-
todas as facetas do comportamento americano, como quadrinhos, cinema,
balho em Taint the Meat, It's the Humanity, uma história grotesca de um
televisão, revista e publicidade, descoberta dos talentos em humor de
açougueiro na Segunda Guerra Mundial, em tempos de racionamento. De-
Wood, Elder e Davis; e sua supervisão da transição de um típico gibi em co-
pois de matar seu próprio filho com carne envenenada, é cortado pela esposa ;
res para uma revista branco e preto”.
que o coloca em pedaços dispostos no açougue. Sob a direção de Harvey Além de influenciar toda uma geração, com um novo tipo de humor
Kurtzman, Davis produziu algumas histórias de guerra de perder o fôlego,
americano. Tratava-se de uma síntese do que a cultura norte-americana do
histórias de aventuras e westerns, mas dessa série a melhor é considerada
passado tinha preparado, com Mark Twain na literatura, Al Capp (Li'l Ab-
Betsy, no far-west, com ilustrações soberbas. Junto com Wally Wood e Bill
ner) e Will Eisner (The Spirit) nos quadrinhos, Spike Jones na música, e, tal-
Elder criou o estilo de desenho Mag. Um estilo de humor extremamente rea-
vez, Hellzapoppin e os irmãos Marx no cinema. Na televisão, despontava
lista e elaborado.
Zero Mostel e Sid Caesar, este com alguns textos de um principiante, Woody
William W. Elder nasceu em 1922, no dia 2 de setembro, no bairro do Rad
Allen.
Bronx, em Nova Iorque. Depois de estudos na High School of Music and
Mas o grande sonho de Kurtzman era fazer de Mad'a versão americana
Art e na Academy of Design, começou a carreira de desenhista de histórias
da revista inglesa Punch, tradicional e decadente publicação que nascera da
em quadrinhos em 1946, com o texto e o desenho de um traço cômico, Ru-
visita e influência da Comedia Dell" Arte e do teatro de bonecos italiano
Jus DeBree, para o livro da editora Orbit Toy Town. Em 1947, abriu um es-
Punchinello, daí o título Punch, em trocadilho com o soco inglês.
túdio de desenho com Charles Stern e Harvey Kurtzman e, depois de traba-
Kurtzman chegou a planificar como deveria ser o próximo passo da
lhar, entre 1948 e 1951, para os grupos Prize and Pines, juntou-se ao grupo
transformação de um típico gibi em cores para uma sofisticada revista em
E.C. em 1954.
preto e branco e cores: não se restringindo somente aos quadrinhos, mas
Nas histórias de horror, crime e sczence fiction, Elder parecia mais um usando o texto, o conto, a ilustração, a decomposição da imagem, tirando a
dos inúmeros pseudônimos de Will Eisner, tal a semelhança de seu traba- revista de seu formato de quadrinhos-sátira. Mas Gaines achava uma loucura
lho, próximo também do de John Severin, em cujo trabalho costumava pas-
(madness) mudar um enorme sucesso numa cópia de uma revista semifalida
sar tinta. Quando, em novembro de 1952, Kurtzman entrou na E.C., o tra-
inglesa, que nascera da idéia francesa da charge política com La Carcature.
balho de Elder ganhou forma e estilo, casando-se perfeitamente com o texto Kurtzman deixou Mad em 1955. Tinha descoberto a galinha dos ovos de ou-
de seu amigo. Estava nascendo o estilo Mad. O humor começou a apare- ro, mas quem ficou com a galinha, com os ovos eo outro, foi o dono da edito-
cer em respostas finas e subintenções. Sua cenografia começou a citar, em

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REVISTA MAD
REVISTA MAD
ra: Kurtzman era um simples empregado. Como outro ex-empregado,
Hugh M. Heffner. talentos, como Jay Lynch, Gilbert Shelton e, principalmente, Robert
Este ficara famoso ao se despedir da sofisticada revista Esquire ao exigir Crumb, que viriam a lançar, em 1968, uma nova revolução no mundo dos
cinquenta dólares de aumento e ver seu pedido recusado. Saiu e fundou a quadrinhos: os underground comics.
“revista Playboy, que planejou e lançou no verão de 1953, em uma tiragem Requadro: “Enquanto isso...” (Tal como nos quadrinhos.)
de 50 mil exemplares, com Marilyn Monroe na capa. O número dois já tinha Em
Enquanto isso, William M. Gaines não tinha sono dos melhores.
a data de janeiro de 1954. Chegando a 6 milhões de exemplares, fundando 1953, a bolha da E.C. estourou. Excessos violentos em suas edições e nas imi-
um império, quase afunda a sua revista de origem, Esquire. Curioso é que / tações de horror, crime e guerra, feito por eleou porseus imitadores, e come-
Heffner e Kurtzman se admiravam mutuamente, acompanhando um ao çou uma campanha contra os cogxics. O psiquiatra Frederic Wertham saiu
outro, pelas revistas, nas bancas. Os dois maiores sucessos editoriais da déca- dos seus sanatórios e camisas-de-força para denunciar, num livro candente,
da. “ Seduction of the Innocent, que os gibis eram a causa da delingiiência juve-
Em 1957, Heffner oferece a Kurtzman a chance de repetir seu feito: nil. Nada como desviar os olhos do povo de seus problemas para uma descul-
lançar uma nova revista em sociedade com o itrequieto criador de humor e pa qualquer, no caso, os quadrinhos. Gainesfoi convocadoa aparecer diante
desbancar Mad. A luxuosa e sofisticada revista T7772p, um dos mais belos do Comitê Kefauver contra o crime, virando astro de televisão, à revelia. Os
exemplares de revista de humor na história editorial americana, foi um su- distribuidores começaram a banir as revistas de crime e terror, e o império
cesso artístico e um tremendo fracasso financeiro. A editora Playboy não era entrou em colapso, em 1954, e, em 1956, a editora tinha apenas Mad. Gai-
ainda suficientemente forte para suportar um semelhante fracasso. Depois nes abriu a gaveta onde estavam os planos rejeitados de Kurtzman e lançou
de dois números históricos, a revista fechou. Heffner, entretanto, empres- uma revista preto-e-branco de quarenta e oito páginas e vinte e cinco centa-
tou a Kurtzman e seus dois amigos desenhistas dissidentes do Mad, Elder e vos de dólar. Foi um sucesso ainda maior do que a versão gibi, como já sabe-
Jack Davis — Wood ficara —, uma sala na filial de Nova Iorque da revista | mos, Feldstein tornou-se o editor de uma edição de dois milhões de exem-
Playboy pata eles tentarem uma revista mais modesta: Humbug, uma ex- plares. Gaines ficou apenas com essa revista, tornou-se financeira e economi-
pressão tirada de Charles Dickens. camente saudável de novo, vendendo a revista ao conglomerado Kinney,
Foi nessa época, em 1958, que os conheci. Almoçando sanduíche na mas continuou como autônomo, uma espécie de publisher. Virou biografia
redação, Elder e Davis se viravam ganhando dinheiro nas ilustrações, mas no livro de Lyle Stuart, Inc., em 1972. The Mad World of W'ilham M. Gar
Kurtzman amargava outro fracasso que duraria tão-somente onze números. nes.
Tanto Trump quanto Humbug se perdiam nas bancas no meio de tantas Kurtzman não conseguiu virar livro. Mas conseguiu um 4appy end
imitações baratas do sucesso de Mad. Kurtzman criara o s/ogar Humour in hollywoodiano também. Afinal, estamos na sociedade norte-americana.
“A” Jugular Vein para os inícios de Mad, mas agora a revista usava hat Seu relacionamento com Heffner permitiu oferecer uma nova criação
me, worry?, com a cara de um debilóide, a nova marca do sucesso. A nova para a revista, que iniciou a publicação, em outubro de 1962, de Little An-
revista Mad, tal como Kurtzman sonhara, era um sucesso ainda maior do nie Fanny, ilustrada por Bill Elder. Heffner aproveitou a base da revista e
que o velho gibi Mad. permitiu à dupla a realização de uma história em quadrinhos pela primeira
Kurtzman, judeu sem dinheiro como o comunista Michael Gold, so- vez, em impressão fu/l-color, conseguindo ser a primeira criação em quadri-
fria o fato de ter tido o sucesso nas mãos e tê-lo deixado escapar numa socie- nhos pintada e não desenhada, contando com o apoio ilustrativo de Jack Da-
dade que não perdoa os que deixam isso acontecer e endeusam, transfor- vis (é claro), Allan Yaffes e até Wallace Wood. Transformou-se no mais com-
mando em gênios, os que atingem o top, como Disney, Chaplin, Heffner, e plexo e marcante material nos comics produzido na América até então, per-
se solidificam em milhões de dólares. mitindo o surgimento, no futuro, dos trabalhos visualmente elaborados de
Amargurado, Kurtzman reconhece que o público pensava que aquele Richard Corben e Moebius em Heavy Metal. Cada quadro de Lsttle Annie
era o humor tipo Mad e não o humor tipo ““Kurtzman'””. Faz uma última Fanny era, na realidade, uma pintura em três dimensões! O trabalho de El-
tentativa, com uma revista de nome sintomático, Help!, que também fra- der ficou menos cômico e mais rico em cores brilhantes e contornos marcan-
cassa, mas, curiosamente, na seção “Public Gallery””, revela alguns jovens tes, entre o zechnicolor de Hollywood e o chrozma key da televisão em cores.
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Essas
REVISTA MAD

Seu trabalho foi publicado em álbuns de luxo e motivo de uma exposição de O CORAÇÃO DE JULIETA
arte no Brooklyn Museum, em 1974, num one-man show.
No texto o humor tipicamente corrosivo de Kurtzman continou pre- 8 Szan Drake
sente como sempre, lembrando os velhos e saudosos tempos dos inícios do
gibi Mad: de paródia dos quadrinhos de Príncipe Violento, Flesh Garden,
ou o comissário soviético Flash Gordonovich, agente de Kruschev, do Super-
duperman, do Melvin of the Apes (vulgo Tarzan), um Batman minúsculo, E UMA Vi- | || O QUARTO E ÓTIMO, N
do tamanho de um morcego verdadeiro, e de tantas sátiras aos seriados de te- É |smaskpresa, NEM AVISOU.| | JULIE, MAS ESTOU
vê, dos filmes de Hollywood, dos american tunes que inspiraram Tchai- a Á
E S
E “

kovsky, dizendo que o grande compositor romântico russo é que imitara as


canções americanas. E que o Sputnik era tirado do catálogo de Sears Roe-
buck, entre tantas outras sandices.
Também a personagem Little Annie Fanny, na verdade, uma Poliana
do sexo. Visualmente um misto de Marilyn Monroe com Brigitte Bardot. ACA | co,

Uma ingênua do sexo, que é desfrutada por todos, o tão falado ““objeto se-
es
xual"”, sonhado pelos machões. Um imenso seio (ou melhor, como diria Er à

Woody Allen, “costumam andar em pares por aí”), um imenso par de S DOS
a OD q
seios, tão ao gosto americano, cutvilínea coelhinha da revista portadora, Az-

e 1
nie Fanny acalmou Kurtzman de seu fracasso em não ser um novo Disney, o
ELE DECIDIU QUE
rei Midas, o descobridor de um novo veio de ouro no humor americano,
uma versão Wall Street do &rizish sense of humor, a arrasadora crítica do SAIR CM O s ' DO QUE DELA .MAS
american way of Afe. O humor Mada, o humor de Kurtzman. DART EV AMO É O MEU
VE du) NAMORADO, DELMONICO
ê E AGORA, JULIEP

Y
caturos Syndicate, Inc.,
ing Features Syndicate

- O CORAÇÃO DE JULIETA/The Heart of Juliet Jones (1953),


de Stan Drake. Escrita por Eliot Caplin, (irmão de Al Capp; escritor de Zé Mulambo),
com elegantes desenhos e domínio de técnica visual
- de Stan Drake. Uma soap opera romântica,
resultado é projeto de uma tira do gênero a-ser escrita
por] | (de E o Vento Levou), para o King,
morte acidental da famosa autora.

198 199
JEFF HAWKE
Szdney Jordan

" SALVOU MINHA


VIDA... OBRIGADA...

ador E Primeiro Cidadão da Era Espacial,


adentrando a | Durante 20 anos abriu os horizontes
leitores do Daily. + que protestaram em vão

200
ZÉ DO BONÊ A.C. IBM:
Reg Smythe Johnny Hart

V auTES CE comME-
ÁciHOo
DOM PROCU- GagtEMm.. TENHAM
RAR- MOS UM à BONDADE
cWUZEI-
ADVOGADO São SOC
Ros PELA visITA...

P RE me

à à ITA é
SE UMA ver oa

Ea
ZÉ DO BONÉ/Andy Capp (1957), de Reg Smythe. O jornal inglês Daily Mirror
lançou uma tira ácida de um tipo beberrão, mau marido, conquistador, anti- A.C./B.C. (1958) de Johnny Hart. Recusado por cinco maiores distribuidores de tiras,
trabalhador, com um humor corrosivo, explorando a própria esposa. O choque dos depois conheceu um grande sucesso, revolucionando e modernizando humor diário e
sexos nunca foi levado assim às últimas conseqiiências. A repercussão internacional domingueiro, influenciando novos personagens e desenhistas. Texto de alto nível, desenhos
simples e alto senso de comédia e humor. Escreve também O Feiticeiro (Wizard of Id),
foi tão grande — no Brasil, é uma das estrelas do Jornal da Tarde — que chegou a ser
ilustrado por Brant Parker.
publicado no Izvestia, na União Soviética.

203
202
BIDU
Maurício de Souza

204
SURFISTA PRATEADO
Stan Lee e Jobn Buscema

VW W/AZOIEMPOFI ONGO, W/ MEU DESTINONNDA Wa,7


SS ISOLADO WN E À GORTE CAPRICHOSA. Sé ENCON TRA À MINHA
NESTE Ro AN
SINGRETA CRISTA NN 2 1N)
V/A
/ j
FRENTE E OSURFISTA
PRATEADO AINDA
EU QUE
DAS ONDAS DO/NFINIT O IN é
A ESFERA SOLITARIA!

E SS

|
N
E| FIM
SAN NEN
SURFISTA PRATEADOSSilver Surfer (1961)
de Stan Lee e John Buscema. | RE
Quando Stan Lee — o Homero dos quadrinhos, cf. Alain Resnais
— recriou os super-heróis, lançou, com
os desenhos de Jack Kirby, Fantastic Four.
- Em 66, a versão prateada do filho de Deus, |
“ errática figura dos galáxias, Cristo da ficção científica,
emergiu para bíblia ou melhor- gibi próprio.
Que não durou muito. Como um cometa, aparece
em outras histórias até queo leitor esteja
pronto para sua volta definitiva. Como um Prometido.

205
BARBARELLA PERERE
Jean-Claude Forest Ziraldo

Sai | TININIM... GUENTA AL, | V VOU SAIR DE FININHO»


MADAME E É 7 El VOU DAR UMA TININIM: NO MEU REDO-
AMAVEL a ines : MOINHO. NINGUÉM Val
CONHEÇO MINHAS
FALHAS... ;
FA
( OBA! : 7 JA! VOCÊ!
VOU SALVAR NOTAR. VOCÊ ME ESPERA...
DUE EU TIVE UMA
MES ENLEVOS so
TEM ALGO DE
MECÂNICO ;
IDÉIA !
z

PODE FICAR TRANQUILO, E E PRA IR ADIANTANDO =


TININIM. VAI TODO O EXPEDIENTE, val MANDANDO
MUNDO VOLTAR O PESSOAL EMBORA, POIS
CORRENDO PODE SER DUE ACONTEÇA
PRA CASA... SDUALQDUER COISA...
MOROU
NOSSA!
“.. E NOS VAMOS
FAZER NOSSA
FESTA DE 4
SãO doÃO

PERERÊ (1959) de Ziraldo. A editora da revista Deixouasériee depois voltou aos quadrinhos em
O Cruzeiro, além de O Guri, lançou o persona- 1970, através da Abril, trabalhando em equipe,
gem brasileiro e seu mundo, do cartunista Ziraldo mas desistiu de novo, retornando aos cartuns po-
Alves Pinto, em texto e desenhos de primeira. líticos. Infelizmente para os quadrinhos.

207
ARZACH
Moebizs

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ARZACH (1963) de Moebius. Gir, o francês Seus desenhos, bastante avançados, conquis
Jean Giraud, criou belíssimos westerns. Seu me- ram Hollywood — Tron e Alien — e agora, num
lhor momento foi sob o pseudônimo de Moebius, ilha do Pacífico, desenha para o cinema e faz qu
ganhando prêmios na sua revista Metal Hurlant. drinhos de vanguarda.

208
MAFALDA
Quino

ZAVA
O SI!TODOS| || ZARA MANOS
ZAS 7E "LAVATE
LAS MANOS, QUÊ FIJACION
LAS LAVASTE | Ji PER
MAFALDA, NOS LAVATE À | || GTE YA? LOS DIAS LÁ | TOMAR ZA QUE YA ESTA CON PILATOS?
anta cole ) EE 2 IA! e
MISMA HISTORp ZA -CENA”

FRECONFORTA VER CÓMOE


POCO A POCO EL HOMBR
HA IDO LOGRANDO DAR
RIENDA SUELTA ASU /
LIBERTAD DE LIMITARSE. À

QUÉ MANIA! ;LO ÚNICO DECIME, MIGUELITO, NO, éQUÉ ME IMPORTA?


QUE SABEN HACER ES, :A VOS NO TE VO TENGO Mi PROPIO
PROHIBIR / INDIGNA ESTE CARTEL? PASTITO INTERIOR

MAFALDA (1964) de Quino. Tira de repercus- grar no mundo adulto. Preferindo a charge, ter-
são internacional feita pelo argentino Joaquin, minou a produção das tiras no auge de sua carrei-
Lavadio. Com um estilo gráfico simples, textos ra.
intelectuais de uma menina que se recusa a se inte-

209
QUINO QUINO
lo lembrando a obra de Dorfman e Mattelart, Para Ler o Pato Donala, em
que os autores chilenos do período Allende atacam Disney e a ideologia do
imperialismo americano, uma lavagem cerebral da infância do mundo to-
Asi es la cosa, Quino! do. Aqui, o autor argentino/marxista peronista,)em 110 páginas, tenta de-
monstrar que a menina latino-americana é uma defensora da ideologia pe-
queno-burguesa e, portanto, do imperialismo americano. O autor conclui:
“Nas páginas precedentes provamos que Mafalda possuí a ideologia que os
patrões ianques pretendem que possua. E neste sentido que deve ser irreme-
diavelmente sentenciada””. Um dos pontos nevrálgicos para o ataque irra-
Mafalda é uma tagarela. Fala pelos cotovelos. Tal como as brasileiras cional ao criador de Mafalda está no fato dela jamais ter citado Perón ou o pe-
bonecas Emília e Mônica, foi vacinada com uma agulha de vitrola. Suas críti- ronismo. Esta “cegueira” (sic) da menina crítica vem do fato dosejor Pablo
cas à sociedade de consumo, à televisão, às guerras, à política, à história e ao José Hernández se recusar a colocar a carapuça, cada vez que as ditaduras são
mundo pequeno-burguês são uma avalanche. Ela até fala sozinha, diante criticadas em Mafalda. Perón está aí.
do globo. Mas seu autor, Quino, Joaquin Salvador Lavadio para os íntimos, Não por esse motivo, mas por simples estafa, Quino abandonou sua
é de uma timidez incrível e precisaria de um saca-rolhas para se conseguir ex- personagem no mesmo ano de 1975 .2Conta a lenda que Quino desenhou
trair uma entrevista com o grande cartunista argentino. uma última tirinha, para acabar de vez com sua personagem, em que ela se
Com sorrisos tímidos, reticente, pausas enormes, relata como nasceu desnudava e mostrava ser um menino! Dizem também que o editor se recu-
sua criança-criação famosa internacionalmente. ““Corria o ano de 1962 e o sou a ser conivente com o haraquiri da famosa personagem. Se non é vero...
diretor de uma agência de publicidade, Norman Brisky, me pediu que eu Na verdade, os estudiosos de quadrinhos vêem o trabalho de Quino
criasse uma historieta para uma série de anúncios de uma firma de eletrodo- muito mais direto e sintético nos cartuns, e sua dificuldade em se expressar
mésticos: Mansfiel, com as primeiras letras lembrando o nome da firma. Ma. na linguagem dos quadrinhos demonstra uma certa prolixidade nos dese-
Mafalda. Os desenhos deveriam ter algo do Dagwood (o marido de B/ondhe) nhos e nos balõezinhos, o que prova sua verdadeira vocação artística, quan-
e de Peanuts (Minduim). A agência não aprovou e os desenhos foram enga- do decidiu voltar para as charges em um só quadro, sem personagem fixa,
vetados por mais de dois anos. Um dia, o extinto jornal Primera Plana pe- com pinceladas mais precisas e textos mais diretos, como um punch.
diu-me algo de diferente e eu apresentei Mafalda”. Quino revela que começava a esboçar a tira por volta das 16 horas e che-
Concebida com uma página semanal, começou em 29 de setembro de gava afobado às 21h55min na redação do jornal, que fechava a edição às 22
1964. Quando a revista fechou, passou a ser publicada em formato de tiras horas. Sempre trabalhou só, evitando montar um esquema industrialde de-
diárias em março de 1965, pelo jornal E/ Mundo, que fechou em dezembro zenas e centenas de desenhistas-fantasmas assinando seu trabalho;/Dessa
de 1967. Nesse ano, começou a ser publicada em formato de livros, reedi- forma, aproveitou-se da fama internacional para voltar ao seu meió de ex-
tando as tiras já publicadas em jornal, a partir do mês de junho, pelo editor pressão predileto. Continua a negar-se à possibilidade de voltar a fazer as ti-
Jorge Alvarez, de Buenos Aires. Esses livros foram publicados em seis dife- ras, embora continuem a ser editadas e reeditadas com sucesso em Portugal,
rentes línguas, alcançando enorme repercussão na Europa e América Latina. Finlândia, França, Dinamarca, Alemanha, Itália, etc.
Seu sucesso levou rapidamente a uma comercialização, com centenas de Em Portugal, os álbuns se chamavam Os Sarilhos de Mafalda e no Bra-
brinquedos, bonecos, brindes, 7zerchandising, etc. Em 1973, a Feira do Li- sil já foi publicada nas revistas Parota e Cláudia. E a editora Global publicou
vro de Frankfurt recebeu os seus primeiros desenhos animados para tevê, as obras de Quino com Mafalda, no Brasil.
que foram exibidos no Brasil na extinta rede Tupi. Foi premiado em Lucca, A turma da Mafalda, incluindo Felipe, o idealista sonhador, o peque-
Itália, no Salão de Fumetti, a Cannes dos quadrinhos. A firma milanesa Qui- no Guille, Susanita, a adulta menina obcecada — como sua mãe — por me-
pós, de Ravoní, distribuiu sua criação para toda a Europa. ninos e dinheiro; Manolito, o futuro homem de negócios, e outros, como
Em outubro de 1975, a editorial Precursora de Buenos Aires lançou uma personagem ironicamente chamada Libertad, com suas profundida-
Para lera Mafalda, de Pablo José Hernández, propositalmente com um títu- des psicológicas, julgando o mundo em que vivem. Até certo ponto, este

210 2
QUINO
distanciamento é até benéfico, pois dá uma visão total do trabalho de Quino
VALENTINA
e sua contemporaneidade, que assusta o autor, que preferia vê-la anacrôni- Guido Crepax
ca, dépassée, para fazê-la desaparecer de vez.
Aos quarenta e nove anos, o cartunista argentino, nascido em Mendo-
za, é um pessimista com a política. Mas sua personagem é a América Latina.
Com suas qualidades e defeitos. Por isso é perene. O constante questiona-
mento de Mafalda mostra sua recusa em ser integrada no mundo adulto que
condena. Por outro lado, sua precocidade permite compreender, melhor
que os mais velhos, o mundo presente. O autor parecia dividir com sua per-
sonagem a surpresa de contemplar um mundo caminhando para a au-
todestruição. O escritor espanhol, Luis Gasca, observa também que “este
trabalho espelha as contradições do homem pensador, quando confrontado
com indivíduos sem mente, meramente existenciais, através da mediação de
uma menina” POR FAVOR; TONY " PAMGÓSTIA! DEVE SER MA
pEEA ao q SUAVE MAS TAMBEM MAIS
As respostas de Quino a uma reportagem incluída no livro Quino: Dez NÃO! ... AQUELA ... TA' ENTEN-
OFERECIDA
CARA DE MARRE- DENDO?
Anos com Mafalda (Buenos Aires, Lumen, 1973) revelam: “sou um amar- CA EMPALHADA!
gurado, um pessimista. Sou alguém que dramatiza tudo, que pensa que as
coisas vão sair sempre mal, que espera a tragédia sempre...” Parece não só a
própria Mafalda, mas também o pai pequeno-burguês da menina, todos
enclausurados no apartamento da cidade.
Entre os que definiram Mafalda, esta enfant terrible, está a cantora es-
panhola, gênero protesto, Maysiel, que canta: ''Me parece una ninã muy re- (.A CHIBATA,,
AQUELA com- |
pipí, pero me encantam las cosas que dice... creo que es 'progre' y PRIDA! BOTAS
CANO LONGO
divertida” (sic). LUVAS...
Quino refere-se aos Beatles: “me arruinaram musicalmente... nunca
poderia escutar outra coisa”. Por isso Mafalda é uma fã ardorosa dos quatro
NÃO, ASSIM
cavaleiros de Sua Majestade Britânica. MUITO
Oscar Steinberg escreve que ““certos chistes de Mafalda provocam a im-
pressão de poderem ser “tomados a sério”, sem alterações, para que expres-
sem claramente a idéia do autor”. Isso no livro Las Historietas, de 1973, pu-
blicado pelo Centro Editor de America Latina. x
Julioo |
Porém, quem falou melhor foi o grande escritor latino-american BATE MALDITA,

Cortázar: “O que eu penso de Mafalda? O importante é o que ela pensa de |


MAIS MALVADA|.

mim” a
VALENTINA (1965) de Guido Crepax. O arqui- elaborados e rompimento da diagramação tradi-
teto milanês começou uma história — Neutron — cional, em linguagem revolucionária, seccionan-
que, imediatamente, foi liderada pela bela fêmea, do a narrativa.
com situações de sadomasoquismo em desenhos

213
212
ROBERI CRUMD

FRITZ THE CAT


R. Crumb
Fritz the Cat e seu estranho criador
TA nc
NO MUNDO DE ID SIM! MUITO BOM, OE iad rr
EXPERIÊNCIAS ESPERA
POR NOS, QUERIDAS ESTA SELVAGEM) UMA APROXIMAÇÃO N | / QUERIDA CINTHIA “APROX = song
CANHEIRA FO! TRANSFORMA DESPIDA DE PRECON- ||( MAÇÃO DESPIDA 21,50. VOCÊ | [ASORA TODO |
NUMA CA'PSULA ESPACIAL Certos PODE AOS ||| E UMA GAROTA SASAZ (Com) MUNDO JUNTO: Vinte anos atrás, na revista Help, de Harvey Kurtzman, surgiu um gato,
LEVAR AO CONHE-t OTIMO ..+ APROXIMAÇÃO. SA
CIMENTO MÚTUO. CHEGA MAIS + (aa) na historieta Fred the Teen-age Girl Pigeon, que, embora ainda não levasse
PoH,ERITZ4 o nome de Fritz, viria a ser o personagem mais famoso do maior desenhista
você 6 TÃO underground: Robert Crumb.
Crumb não se enquadrou jamais nos padrões estabelecidos. Sempre se
pautou pelo prazer de desenhar e não para fazer dinheiro. Quando já era fa-
moso, fez a capa do disco de Janis Joplin e criou um caso insolúvel para a gra-
vadora, pois jamais foi buscar o cheque, num impasse para os advogados e fun-
cionários da contabilidade. Mesmo no Brasil, jamais O Grilo mandou royal-
tes das edições piratas dos trabalhos de Crumb.
Ele nasceu na Filadélfia, em 30 de agosto de 1943. Autodidata, come-
çou a desenhar e editar gibis com seu irmão. Em 1964, casou, começou a via-
REALIZAÇÃO DOS NOSSOS, jar e colaborar em Help. A onda underground começou com ele, no Texas,
DESEJOS OCULTOS,.e ATRAVE S QUE EU ESTOU ME ILU- |
DAS QUAIS CHEGAREMOS A. MINANDO !UMM au SIM! quando Jack Jackson publicou GodNose, em 1963. Mas, na realidade, foi a
VERDADE! REALIZAÇÃO E ESTA” TUDO CLARO
AGORA !
revista Zap, nº O e nº 1, de Crumb, em 1967, que inundou o mundo de
IMPORTANTE +++ NAO
ACHA, CINTHIA? pornografia, sexo explícito, drogas e política. Todos os personagens ficaram
famosos: Angelfood McSpade, Mr. Natural, Lenore Golberg, Whiteman e
o gato que virou até desenho animado em longa metragem.
Partindo dos d4rty-comic books da década de 30, seu estilo lembrava
Segar (de Popeye), Wolverton, Barks (Tio Patinhas) e Herrimann (Krazy
Kat). O nº 4 da revista Zap trazia uma historieta de incesto, o que o levou às
barras dos tribunais e à condenação por obscenidade, em Nova Iorque.
Um dos artistas mais controvertidos de nossos tempos, iniciador do
SS
Dr
Car,
pd
7] I:
movimento, nos cozics, comparável aos anos de revolta da juventude de
a
1962, até as barricadas de Paris e as tomadas das universidades norte-ameri-
o LA

FRITZ THE CAT (1965) de R.Crumb. Fez duas -


aparições em revista de H.Kurtzmann, ex-criador
Es
um dos artífices do movimento de introdução do canas, em 1968. Esse público de americanos, contra a guerra do Vietnã, a ge-
de Mad. E ressurgiu, em 1968, no ápice das revistas sexo, das drogas e da política, nos anos 60, em tação Hair, de Aquarius, dos hippies, da flor contra o canhão, dos Beatles,
underground dos quais Crumb, juntamente com revistinhas beirando a pornografia, na contestação todos formaram um público consumidor de revistas que não passariam de
Gilbert Shelton, Moscoso, Rick Griffin e outros, foi do american way of life. cópias xerox nas suas áreas, em sucesso e fenômeno artístico e cultural, refle-
xo de uma era. Não da sociedade de consumo norte-americana, do american
way of life, mas da contestação aberta aos costumes de uma época de crise.

214 215
ame
ROBERT CRUMB

Tal fenômeno, muito imitado em todo o mundo, não teve a mesma reper- CORTO MALTESE
cussão que nos States, no coração dos Johnsons, dos Nixons, dos Jimmy Car- Hugo Pratt
ters, dos Reagans.
Presentemente, Robert Crumb vive segregado numa fazenda na Cali-
fórnia, tocando numa banda do velho estilo country...

FAR UMA RESPOSTA


É E » 5 VR DESSAS DE T!.. DE

FAIATARIA.

CORTO MALTESE (1970) de Hugo Pratt. Mes- co aventureiro em situações místicas, € belas mu-
tre italiano, homem do mundo, trabalhou na Ar- | lheres, em tom nostálgico e poético. Desenhos
gentina e no Brasil. Depois de muitas criaçõesem — com incrível economia de linhas, linguagem de ci-
dois continentes, criou um marinheiro, românti- nema.

217
216
HAGAR
D:k Browne

Ma
o
O 1984 King Features Syndicate, Inc. World rights reserved 5-6 DK BLOW 8

HAGAR (1973) de Dik Browne. Ao mesmo tem- mente jornais do mundo todo e fazendo um dos
ve

po que ilustra os textos de Mort Walker para Hi melhores, senão o melhor humor de nossos qua- 4

and Lois, consegue um dos mais esmagadores drinhos atuais.


triunfos dos anos 70, conquistando imediata-

218
HE-MAN
G. Forton e J. Shull

THE LAND SHAKES AS A


BRILLANT FIREBALL MARKS
THE DESTRUCTION OF

WHENEVER ADAM HOLDS 2»


THE SWORD ALOFT AND 2
INCANTS THE MYSTIC 4
OF GRAYSKULL NAME OF GRAYSKULL, HE ;
RECOUNTS THE BECOMES HE-MAN,
LEGEND OF A THE MOST POWERFUL Á: Cs

WONDROUS SWORD. MAN IN THE do

; UNIVERSE!

HE-MAN (1986) de G. Forton e J. Shull. Esmagador Hit internacional em


desenhos animados para televisão, conquistou o cinema e agora, distribuído
pelo McNaught Syndicate, começa uma carreira nos quadrinhos.

219
Antes do Suplemento, o jornal paulistaA Gazeta publicouÀ Gazeti-
APÊNDICE nha. Ela dutou até o anos 50, passando por diversas fases. 4 Gazeta incluiu,
desde 1933, Brick Bradford e Ted, o Caçador. Bamey Baxter chegou com
Os brasileiros seu avião em 1936. Mais tarde, Fantasma e Superman. A primeira aparição
do Fantasma constava como Uzma Alma do Outro Mundo. O Superhomem
surgiu no número 445, de 17 de dezembro de 1938.
O famoso ilustrador Belmonte fazia as cartas enigmáticas e algumas ca-
' pas, sem assinar o trabalho. Depois, Messias de Mello, que vinha de O Tico-
Tico, assumiu a feitura do sucesso das cartas enigmáticas e foi o artista que
A história da história em quadrinhos brasileira não pode ser organizada trabalhou nas três fases da revista, fazendo o Pão Duro, Capitão Blooa, Os
como nos outros países. Ela é marcada por altos e baixos, dependendo dasfa- Três Mosqueteiros, Bascomb e muitos outros, inclusive Audaz, O Demoli-
ses das revistas e jornais, de acordo com o progresso da imprensa e da impres- dor. Nino Borges fez Bolinha e Bolonha. A Garra Cinzenta, de Renato Sil-
va, com texto de Armond, foi o grande sucesso da revista, que iniciou suas
são.
A data oficial da primeira ilustração (cartoon ) brasileira foi estabelecida Edições Magestosas. Essa fase se interrompeu em 1940. A 18 de março de
como 14 de dezembro de 1837, sobo títuloA Campainha e o Cujo, feita por 1948 recomeçou em edições semanais, dirigida por Messias. Surgiram Jayme
Manuel Araujo Porto-Alegre (1806-1879). Cortez, Sammarco, Zaé Junior, Walter Ceneviva, Lindbergh Faria, Ney
Angelo Agostini começou a Revista Ilustrada em 1876. No mesmo ano Penteado, Claudio de Souza e outros. Aqui o título eraÀ Gazeta Juvenil.
que o italiano Agostini e o português Raphael Bordallo Pinheiro faziam suas Roberto Marinho criou O Globo Juvenil, depois a revista que empres-
ilustrações na pedra, o editor da I/ustração do Brasil, Vivaldi, assinou um tou seu nome a todas as revistas de quadrinhos brasileiros: Gzbi. Depois,
Globo Juvenil Mensal, Gibi Mensal e Biriba. Anos mais tarde, já como Rio
contrato para usar desenhos americanos para competir com os artistas locais. Gráfica Editora, lançou a versão em quadrinhos de Sírio do Pica-Pau Amare-
Outros importavam da França. /o, de Monteiro Lobato, via TV Globo.
Agostini (1843-1910) nasceu no Piemonte e morreu no Rio, como um O Correio Universal publicou no Rio Fantasma, Connie e o trabalho
dos precursores das histórias ilustradas. de um pintor, F. Acquarone, O Guarany, versão do romance de José de
Em 1872, o ilustrador português Raphael Bordallo Pinheiro (1846-
Alencar.
1905) escreveu e ilustrou um livreto, uma crítica satírica da visita à Europa do
A mesma novela foi feita em tiras diárias em 1947 para o jornal de S.
imperador dom Pedro II é foi impressa em Lisboa, em dezesseis episódios,
Paulo Diário da Noite, por Jayme Cortez, recém-chegado de Portugal, de-
com três edições sucessivas: Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro
Sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb pela Europa. pois de fazer as tiras de Caça aos Tubarões. Cortez fez quadrinhos, capas de
revistas, cartazes de filmes e, recentemente, ganhou o prêmio Caran
Jornal da Infância foi o precursor das revistas para crianças no país, lan-
d'Ache, em Lucca 20, edição de 1986, como Uma Vida Dedicada à Uustra-
cado no dia 2 de fevereiro de 1898, com um padrão gráfico pobre, e fechou
no mesmo ano, em junho. ção. Lá, expôs seus trabalhos Zodiako, Retrato do Mai, Coração de Mãe, Ser-
O primeiro número dO Tico-Tico surgiu no dia 11 de outubro de gio Amazonas, Dick Peter e outros quadrinhos.
1905. Além de material decalcado dos estrangeiros, tinha artistas locais cria- Voltando aos anos 40, O Gur começou exatamente em 1940 e durou
tivos e originais, como Max Yantok (1881), Alfredo Stornie, particularmen- até 1962. Publicou edições especiais em que se via, em quadrinhos, o Azxigo
da Onça, de Péricles, e o indiozinho Tupz, criado por Mario Fanucchi, para
te,J. Carlos (1884-1950).
símbolo da TV Tupi. Era Uma Vez durou até 1954. O católico Jornalzinho,
O Tico-Tico morreu no fim da década de 50.
de 1942 até 1970. Também de 40, Estrela. No mesmo ano, figurinhas do
O Suplemento Juvenil surgiu no dia 14 de março de 1934 e revelou
Café Jardim de Dick Peter, de Jerônymo Monteiro, sob o seudônimo de
desde o primeiro número o artista Monteiro Filho. Depois, vieram Fernando Ronnie Wells com lindos desenhos em cores de Sigismun: o Walpeteris. O
Dias da Silva, Celso Barroso, Antonio Euzebio, Alcyro Dutra e Salvio, entre
irmão de Sigis, Guilherme, seguiu a trilha profissional do mais velho. Em
outros. O Suplemento acabou em 1945...

221
220
1943, um programa de rádio, Capitão Atlas, Pericles do Amaral, vitou nhos nacionalistas com Pererê, de Ziraldo JA Editora Abril, em 1970, tentou
quadrinho no belo traço de Fernando Dias da Silva. Depois, outro radiofô- seu relançamento e falhou de novo. Bom demais... /
nico, O Vingador, também se quadrinizou, originando um plágio argenti- A Editora Abril, desde 1950, como na Itália, usou artistas nacionais pa-
no: Poncho Negro. ra fazer Disney. Destuet veio do estrangeiro treinar Alvaro de Moya e João
Em 1948, Sesinho e em 1947, Vida Infantil e Vida Juvenil, com bom Batista Queiroz. Depois, Kato e Yagayara, e os escritores Claudio de Souza,
papel e boa qualidade gráfica, revelaram José Geraldo e Joselito. Foram até Alberto Maduar e muitos outros.
1961 e 1959. Na Moóca, a tradição editora-gráfica continuou. Taika, Grauna, Jo-.
O ano de 1945 trouxe de volta Adolfo Aizen com sua editora EBAL. taesse, Saber, Edrel, Gep, Preludio, Triestri, Sublime e tantas outras. O |
Lançou muitos artistas brasileiros. Publicou quase todos os romances brasi- (mangã (quadrinhos japoneses) influenciou uma geração de nisseis em São
leiros em versões quadrinizadas. Ora Monteiro Filho, André Le Blanc, José Paulo a fazer belos desenhos e histórias de vanguarda visual. Chegaram até a
Geraldo, Gutemberg, Remon Llampayas, Álvaro de Moya, Ziraldo, Octací- fazer uma associação. E trazer ao Brasil o mestre japonês, Tesuka Osamu.
lo, Floriano Hermeto, Manoel Victor, Ivan Wasth Rodrigues, Antonio Eu- Osartistas brasileiros tinham poucas chances nessas décadas. A. Ericson
zebio, Marcelo Monteiro, Gil Coimbra, Nilo Cardoso, Roldolpho Iltszhe, (Carlos Thiré, ex-marido de Tonia Carrero, pai de Cecil Thiré), Isomar, Jor-
Max Yantok, Nico Rosso, José Menezes, Rodolpho Zalla, Eugenio Colone- ge Scudelari, Lyrio Aragão, Luis Saindemberg, Manoel Ferreira, Orlando
se, Roberto Portela e tantos outros artistas passaram pela casa que, sempre, Pizzi (Saci Pererê ), Zezo, Belmonte, Péricles, Ayres Borges, Augusto Barrei-
“como em todas iniciativas de Aizen, incentivou artistas brasileiros. Aizen foi ros, Helio Lemos, Icaro, Berco IUdler, Mario Pacheco, Mario Jacy, Olavo Pe-
premiado em Lucca, 1973. reira, Gil, Brandão, Abilio Correia, Alceu Pena, Anelio Latini Filho (que
Em agosto de 1951, as pequenas editoras e gráficas de São Paulo come- fez, em quatro anos, um longa metragem de animação sozinho: Sinfonia
çaram a editar revistas de terror, aproveitando-se da censura ao gênero, nos Amazônica), Mario e Renato Lima, Sergio Lima, Carlos Estevão, Diamanti-
Estados Unidos. Zalla,Colonese e Gedeone Malagola, (com roteiros e dese- no Silva, Fernando Ikoma, José Del Bo, Juarez Odilon, Lisenfeld, Osvaldo
nhos), Nico Rosso (ilustrando Zé do Caixão), João Batista Queiroz, Julio Talo, Paulo Fukue, Pedro Segui, Shiyozo Tokutake, Silvio Ramirez, Wal-
Shimamoto, Sergio Lima, Inácio Justo, Paulo Hamasaki, Aylton Thomas, bercy Camargo, Sergio Tastaldi, Franco Rosa, Rudolf Piper, Negreiros,
Flavio Colin, Getulio Delphin e José Lanzelotti (que desenhou Raymundo, Freddy Galan.
o Cangaceiro), além do prolífico roteirista Rubens F. Lucchetti. Tudo come- Em 1959, um grupo de artistas se reuniu para fazer uma gráfica com
çou com o editor La Selva e se projetou com Taika, Outubro, Continental, desenhistas brasileiros exclusivamente. Era Continental, depois Outubro,
Gep (de Miguel Penteado) e muitas outras. depois Gep. Miguel Penteado, Jayme Cortez, Claudio de Souza, José Siker-
O editor Salvador Bentivegna empregou o espanhol Manuel Huete pa- kis, Zezo, tantos outros no emprendimento. Publicou Capitão Sete, Contos
ra fazer Nambi, em 1953. Cortez fez Sergio Amazonas. Álvaro de Moya fez de Terror, Capitão Estrela, Cacareco, Fantasia, Histórias Macabras, Vigailam-
Pedro Pará. Algumas revistas de Orbis e Mão Negra e Aliança Juvenil e a te Rodoviário, Combate e a primeira tentativa frustrada de Maurício: Bidu,
em 1960.
produção de José Sidekerkis que trabalhavam com Rodolfo, Fabio Horta e
Antonio Rocha. Paulo Marti publicou Barbarella e tentou fazer uma bela Foi o primeiro gibi de Maurício de Souza, depois de suas tiras na Folha”
edição gráfica de Suplemento e falhou. Trazia X-Men, de Zalla. de S. Paulo. Criou um sistema de distribuição que tentou impor não só suas,
Nos anos 60, o governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, ten- criações como também Flavio Colin, Getulio Delphin e outros. Parou. Ficou |
tou um sindicato local, para distribuir nacionalmente quadrinhos pelo Bra- só com as suas e construiu um mini-império. A Abril lançou as revistas de.
sil e fracassou. Barbosa Lessa organizou o trabalho de Manoel Victor Filho, Maurício. As tiragens subiram, Disney caiu, o merchandising levou seus,
Getulio Delphin, Flavio Colin e outros. Em 1963, uma lei federal obriga a personagens a uma empatia popular, repetindo os feitos nacionais de Chi-
publicação de quadrinhos brasileiros. A lei, ora a lei... quinho, O Amigo da Onça e impondo seus tipos. a)
Um sucesso do rádio Jerônimo, foi ilustrado por Edmundo Rodrigues. Criou Monica, Cascão, Bidu, Franginha, Chico Bento, Astronauta, Ni-
As Associadas, através da Cruzeiro, lançaram o grande marco nos quadri- co Demo, Os Souza, Tina, (que mudou de uma menina feia para

222 223
tantos outros fizeram história. O Grilo, em São Paulo, introduziu R.
bonitinha), Horacio, e depois Pelezinho/e quem sabe, Xuxa. Ganhou o Crumb, Freak Brothers e outros de vanguarda no Brasil, mas findou.
“Yellow Kid em Lucca no ano de 1971) andising, A Abril publicou a revista de tentativas Crás, com artistas brasileiros e
Seu trabalho abriu caminho para outro especialista em merch parou. Publicou, em capítulos escritos por Reynaldo de Oliveira, a História
para TV.
Ely Barbosa. Que também faz bonecos tipo Muppets dos Quadrinhos no Brasil. Ruy Perotti criou Satanésto ali, Primmaggio fez
Chico Anísio e Os Trapalhões aproveitam o feed- back na TV para se
Sacarolha, Cortez lançou Zodiako. No Sul, Lima & Pinheiro Machado lan-
publicarem em revistinhas em quadrinhos. tual caram uma das mais instigantes criações brasileiras: Rango, de Edgar Vas-
Em 1983, outra lei obriga os jornais e revistas a publicar um percen ça ques. Basta dizer que uma historieta com as características desta brasileira, a
tênue presen
de quadros nacionais proporcionais aos estrangeiros. Uma sempre mexicana Los Agachados, de Ryus, tem prêmios internacionais. Depois, Ed-
nos jornais cariocas O Globo e Jornal do Brasil. À Folha de $. Paulo incluí gar Vasques criou uma versão em quadrinhos do sucesso literário do tam-
S. Paulo
incentivou artistas nacionais. E o Caderno 2 deO Estado de bém desenhista (As Cobras) Luis Fernando Veríssimo,O Analista de Bagé.
de São Paulo, continua com
brasileiros na sua página. O Jornal da Tarde, Em Minas, Novelli, Benjamim e Weisseman surgem com trabalhos
publi cado Zé Lati-
suas tiras estrangeiras de repercussão, embora tenham marcantes.
negro: Nico
nha, de Rivaldo e Maurício de Souza, numa incursão no humor Matcio Sidney, no Rio e em São Paulo, faz trabalhos para a imprensa e
Demo.) es- revistas, como a tita Cidada. Em tiras diárias, Pitliuk mostra um humor ju-
A Folha publicou durante anosa tira O Pato, de Cecília Alves Pinto, daico à Woody Allen. Franco de Rosa, depois de trabalhos em jornais, ilustra
Chego u a ser
posa de Zélio, irmão de Ziraldo, sob o pseudônimo de Ciça. para revistas, principalmente a Press Editorial. Esta forma uma base sólida
jornais pa-
publicada em jornais do exterior. Daniel Azulay preparou-se em editando revistinhas pornográficas e começa a publicar trabalhos importan-
imprensa, fez
ra saltar para a TV, num programa popular para crianças. Na tes, depois de se solidificar financeira e economicamente. Moretti & Nicollet-
e publi cou seus tra-
Capitão Cipó. Miguel Paiva viveu em Milão muitos anos ti fazem humor. Paiva e Munhoz atacam de cangaceiros humorísticos.
, com belos dese-
balhos em diversas revistas européias. Os irmãos Caruso Livros educativos tentam introduzir quadrinhos em preto e branco e
vários trabalhos em
nhos e domínio do traço, visual e criatividade, fizeram cores para usar a linguagem aceita pelas crianças e pelos jovens. Luciano Ra-
s, revista s, álbuns, em ati-
todas as áreas: revistas udi-grudh, fanzines, jornai mos, Negreiros e demais tentam as iniciativas. O prof. Francisco Araújo in-
desenhos em
vidade constante na política e quadrinhos. Jaguar sempre fez es revolu- clui os quadrinhos na Universidade de Brasília, pioneiramente. Depois, So-
criaçõ
O Pasquim, com Sig. Mais: Jal, Xalberto, Henfil, com suas nia Luyten (e Luis Antonio Cagnin) inserem editoração em quadrinhos na
a tira diária As
cionárias e críticas ao subdesenvolvimento, Veríssimo, com Escola de Comunicações e Artes, setor de jornalismo na Universidade de São
, Bruno Liberati,
“Cobras, Nani, Claudio Paiva, Munhoz, Hubert and Agner Paulo. Sergio Augusto, pioneiro, inicia uma seção diária sobre quadrinhos
Davilson e Luscar. no Jornal do Brasil, no Rio.
fizeram
Alguns artistas, como Miguel Paiva, tinham deixado o país e O Brasil participa e ganha prêmios internacionais nos congressos doco-
Metal Hur-
carreira no exterior,como Alain Voss e Sergio Macedo, na revista gmics no mundo todo...
revista, cola-
Jant, e Hector Sapia, que trabalhou para a revista Linus. Nesta ' Depois do aftouxamento da censura de vinte e dois anos de ditadura |
borou Jô de Oliveira. militar, começam a surgir livros sobre Carlos Zéfiro e reprints de seu traba-
icano,
Pequenos grupos, influenciados pelo underground norte-amer lho. Seus “catecismos” tinham sido vendidos clandestinamente, durante à
chamados
fizeram revistas de resistência durante a ditadura militar. Foram década de 50, agora são reeditados sem sua anuência, pois jamais se soube de
Porvir, no
de udi-grudi. Cópias de revistas estudantis, como Esperança no sua verdadeira identidade e mesmo se ainda está vivo.
a pionei ra O Balão,
Rio; Cragh, no Nordeste; e a mais importante de todas, Esse período permite o surgimento de diversas revistas de sexo explíci-
talentos de
nascida em 1972, na Universidade de São Paulo, que revelou os to, seguindo a trilha do cinema pornográfico nacional. Até Roberta Close
ar esse
Luis Gê, Laerte, Kiko e R. Borges. Depois, há uma tentativa de reedit ganhou um gibi, sem sua aprovação pessoal.
clima com a nova Quadreca, dos alunos de editor ação em quadr inhos .
Bira faz edições apoiadas pelos sindicatos, em charges-quadrinhos de
prisões, fez
Nos anos da ditadura, O Pasquim, sob grande censura e fundo político.
e
um trabalho de resistência. Ali, Millôr Fernandes, Ziraldo, Jaguar, Henfil

225
224
Rodolpho Zalla lança a revista Ca/afrio com desenhos seus, de Aloisio patamar mais alto. E a luta constante das novas gerações, provocativas, revela
de Castro, Flavio Colin, José Pimentel Neto, Mozart Couto (em belíssimos artistas em toda parte.
desenhos, como sempre), Francisco Perez, Jayme Cortez, Geraldo Cavalcan- O grupo Grafipar, de Curitiba, exporta para a Folha da Tarde, de São
te, Adelmo, Lyrio Aragão. Colonese faz a exuberante Mzrza, a Vampira. Paulo, Franco de Rosa, revelando também Claudio Seto e Roberto Kussu-
Freddy -Galan introduz o humor no terror. moto. Zenival desponta em Pernambuco, Watson Portela é de Curitiba,
Watson Portela e Mozart Couto têm edições especiais da Press para Ataíde Brás, de São Paulo, Roberto Câmara fica em Recife, Josmar é de São
acentuar seus trabalhos gráficos de alto nível. Paulo, Wilde Portela de Recife, Rodval Mathias de São Paulo, Hamar de
A Circo Editorial começa sua edições em quadrinhos. As Mz/ e Uma Curitiba, Mozart fica nas suas raízes, nos belos desenhos mineiros, e Henri-
Noites, de Paulo Caruso; Não Tenho Palavras, de Chico Caruso; Quadri-
que Magalhães desponta lá na Paraíba. Edgar Vasques fica firme no Rio
Grande do Sul, chê. ;
nhos em Fária, de Luis Gê; O Tamanho da Coisa, de Laerte; Abobrinhas da
As editoras, apesar do fechamento da Vecchi, dirigida por Octacilio
Brasilônia, de Glauco; Xilogravuras, de Grilo; e o grande A:z surgido nas ti-
d' Assunção, que fez o Mad in Brazil, Revista de Terror (e faz tiras para o Jor-
ras da Folha de S. Paulo, Angeli, com seu estouro, em Chiclete com Banana.
Tipos característicos em traço forte e pessoal, humor dark e resposta imediata,
nal do Brasil e a Folha de S. Paulo sob o pseudônimo de Ota, em Id4-Ozas),
outras editoras continuam mandando bala. A D'Art do Zalla, Noblet, e os *
dos leitores de todas as faixas etárias.
álbuns excepcionais da L&PM, da Martins Fontes, Brasiliense, Cedibra,
Uma tentativa de qualidade, com Inter Quadrinhos, de São Paulo (in-
terrompida com um incêndio), publicou, editado por Vilachã e Itagyba, os Press, Record, Salamandra (com Garfield), Codecri e mil fanzines. J
trabalhos de Adelmo, Voss, Cesar Lobo e Murilo, Flavio Colin e Dagomir
- Astiras diárias, incentivadas pela distribuição implantada por Ziraldo!
Marquezi, Guidacci e Chico Jr., Libero, Luis Gê, Miguel Paiva, Mozart Cou- na Funarte, florescem: As Mz/ e Uma Noites. de Paulo Caruso, Taurino, de
to, Priscila, os lindos desenhos de Cesar Lobo (do Rio), as revelação de Julio Santiago, Nono das Candongas, de Mariano, As Cobras, de Veríssimo, Ve-
Emilio Braz, os belíssimos traços de Claudio Seto, Ricardo Leite, Spacca, reda Tropical, de Nani, CAW, de Carla Wolf, A Caravela, de Nilson e Dy.
Franco de Rosa, Rodval Matias. Baixada de Luscar.
Brigitte, com o ótimo Salvador, Sylvio, Sep, Tutu, Charles Vicent, Geandré desenha álbuns pessoais, Alfredo Sirkis imagina Sz/icone XII,
Odilon, Ruy, Luciano Pessoa, Newton Foot e Fabio. Com destaque para Xalberto faz sozinho Contos de Nenhum Lugar e, com Sian, Íncaro.
Odilon e Salvador. O Jornal do Brasil começa por conta própria os 50% de quadrinhos na-
Beto Carrero aproveita sua repercussão no rádio e tenta os quadrinhos, cionais, antecipando-se a todos os jornais. O G/obo, do Rio, faz um concurso-
que revela uma segunda criação diária de Lor. À Folha da Tarde, de São Pau-
editados por Wagner Augusto, com desenhos de Colonese.
lo, cria uma tira política, $77 Ney, desenhada por Novaes. A Folha de S. Pau-
Na mesma linha de revistas buscando um espaço e impor os artistas na-
/o tem outro de repercussão: Geraldão, de Glauco, e Niguel Náusea, de Fer-
cionais, as publicações se multiplicam. Agague, editada por Ney Pereira da nando Gonsales. E Cagrarillo Brillo de Milton Trajano, escolhido em con-
Silva e Ruy Jobim Neto apresenta Flavio Calazone, Heleno, Nabil, Spacca, curso, é cancelado. Notícias Populares publica tiras nacionais de apelo popu-
Salvador, Silvio e Paulo Meneddes. Desenhos de Alex. E textos de W. Ver- lar, de Roger, Jair, Brito e outros.
gueiro. O impacto fica por conta do Caderno 2, do tradicional O Eszado de S.
A revista Quadrix é ligada à atuante Associação dos Quadrinistas e Ca- Paulo, incluindo Now Sem Rumo, de Lor, Condominio, de Laerte, Eva, de
ricaturistas. Editada por Worney Almeida de Souza, apóia as livrarias de Michele Iacocca, o excepcional Presidente Reis, de Luis Gê, em desenhos
Ademario de Matos, o Espaço do Emílio, Muito Prazer, Banc' Antiga e tan-
deslumbrantes e temática controversa, despertando ira e admiração dos lei-
tos pontos de vendas de quadrinhos para aficcionados. Fortuna, Jal, Marin- tores, interrompe sua publicação pela não-concordância do autor em dimi-
goni, Mikio, Marcatti, Elias, Jaime Leão (excelente capista) e outros estão nuir seu espaço. Na reestruturação da página, entra Graína, de Henfil, e
sempre presentes.
O alto nível dos desenhos brasileiros com Caulos, Borjalo, Hilde, Clau- (depois de anos de Folha de S. Paulo, pasmem!) Mônica, de Maurício.
dius, tantos artistas empurram os trabalhos figurativos nacionais para um Nessa seção do Caderno 2, saiu a série História em Quadrinhos, que
serve de base para este livro, escrita e selecionada por Álvaro de Moya. *

226 227
No congresso de Lucca 20, a revista Comic Art, uma das melhores do
mundo, editada em Roma, acerta a publicação da criação de Jayme Cortez Cronologia
(desenhos) e Alvaro de Moya (texto), da série de ficção científica Code. Co-
mo a Comic Art, de Rinaldo Traini, tal material irá para a França, Espanha e
Estados Unidos. Na esteira do prêmio de Cortez, ao lado de Will Eisner, au-
tor de The Spirit, “Duas Vidas Dedicadas ao Cartooning e à Ilustração. ””
A luta por um lugar ao sol, uma cultura brasileira, uma estética nacio-
nalista na mídia impressa continua, como uma saga dos quadrinhos, em sé-
rie infinita.
Todos nós almejamos um final feliz, como os happy end de Holly-
wood. 1734 — Publicação de Harloz's Progress de William Hogarth, na Inglaterra.
Contínua no próximo episódio. 1809 — Série de cartuns de Thomas Rowlandson, The Tour of Dr. Syntax.
Conseguirão os nossos heróis, bravos desenhistas brasileiros, impor a 1814 — Hokusai Manga, publicado no Japão.
Justiça e o Bem na cultura nacional? É o que veremos nos próximos anos! 1865 — Primeira distribuidora de material de imprensa norte-americana,
Não perca! A. N. Kellogg News.
Ez
1867 — Ally Sloper de Ch. Henry Roos, na Inglaterra.
1869 — 30 de janeiro, Nhô Quim, de Angelo Agostini, no Brasil.
1889 — La Famille Fenousllara, de Christophe, na França.
1890 — Comic Cuts e Chips, na Inglaterra.
1893 — Primeira página em cores: New York Recorder e Litile Bears de
Swinnerton, em San Francisco.
1900 — Schultze cria Foxy Grandpa e aparece Happy Holigan de Opper.
1902 — Primeiro quadrinho sueco, de Andersson (0.A.).
1903 — Clare Briggs lança 4. Piker Clerk.
1904 — Primeiro trabalho franco-canadense, Ladebauche, de Charlebois.
1905 — O Tico-Tico, no Brasil.
1906 — Kin der Kids de Feininger.
1909 — L'Espiêgle Li, de Valle e Vallet, na França.
1910 — Quadratino, de Rubino, na Itália.
1915 — Fontaine Fox com Toonervile Folks. E surge Rube Goldberg.
1916 — Arturo Lanteri, E/ Negro Raul, na Argentina.
1921 — Russ Westower cria Tzlhie the Touer.
1925 — Alain Saint-Ogan cria Z7g et Puce, na França.
1926 — No México, Cabrera cria Chupamirto.
1928 — Macaco, por K-Hito, na Espanha.
1929 — A Gazetinha, em São Paulo.
1931 — Patoruzu, de Quinterno, na Argentina.
1932 — Pete the Tramp, de C. D. Russell.
1933 — Zack Mosley lança Syzling Jack.
1934 — O Suplemento Juvenil, de Aizen, no Brasil.

228 229;
1935 — Palacio cria Don Fulgencio, na Argentina. 1971 — Stap Me! quadrinho inglês de Dennis Gifford. Wolff, de Esteban
1937 — Cesare Zavattini e G. Scolari, na Itália, Saturno contra a Terra. Maroto. .
1938 — Spirou, na Bélgica. 1972 — Zack, semanário alemão de quadrinhos.
1939 — Gita, no Brasil. 1973 — Hágar, de Dik Browne. Neverwhere, de Corben. Valentina (Baba
1940 — The Flash, escrito por Gardner Fox. Yaga) no cinema.
1941 — Bob Montana lança Archie, Green Arrow e Plastic Man nos comic- 1974 — Abre o Museum of Cartoon Art, em Connecticut, Estados Unidos.
books. Na Itália, Trino, de Altan.
1942 — Carl Barks começa a trabalhar para Disney. Un Tal Danien, de A. Breccia e Trillo.
1943 — Al Andriola inicia Kerry Drake. Yamagami cria Gaki Deka, no Japão.
1945 — Les Pionniers de /'Espérance, na França. Ebal começa no Brasil. Orion e Agar de Moliterni e Gigi.
1946 — Placide et Muzo, de Arnal, começa na França. 1975 — Guido Crepax ilustra Histoire d'O. Nos Estados Unidos aparece
1947 — Jayme Cortez emigra de Portugal para o Brasil. Vaughn Bode.
1948 — Rex Morgan, MD. Moebius surge na revista Metal Hlurlant (depois Heavy Metal, nos
1950 — Atacam os gibis de terror. Estados Unidos).
1951 — Dennis the Menace. 1976 — Maurício lança Pelezinho, inspirado na infância do atleta do século.
No Brasil, a 12 Exposição Internacional de Quadrinhos. Milo Manara explode com $cz7x7niotto.
1954 — Mort Walker e Dik Browne começam Hz and Lois. 1977 — O Fantasma se casa.
1955 — Dond:, de Edson and Hasen. E. Breccia e Trillo: A/var Mayor.
1957 — On Stage de Leonard Starr. Na Itália, Jacovici começa Cocco Bill. A. Breccia e Trillo: Nadie.
1959 — A revista Pilote, lançada na França. Asterix vem dentro. No Brasil, 1978 — Sally Forth, de Wallace Wood. Do mesmo autor: New Conics
começa Maurício. Now.
1960 — A revista Spirou inicia Les Schtroumpfs de Peyo. 1979 — Milo Manara premiado em Lucca.
1961 — Stan Lee e Jack Kirby editam Fantastic Four. Scantet Dream em tiras francesas, de Moliterni e Gigi.
1962 — Kurtzmann e Elder lançam Zzz4/e Annie Fanny em Playboy. Spider- Bobby London surge nos Estados Unidos.
man e Thor aparecem. Carlos Trillo e Horacio Altuna premiados na Argentina, em Córdo-
1963 — Modesty Blaise na Inglaterra. Gir (Jean Giraud) começa nos quadri- ba.
nhos. Blanche Ebibhanie, de Lob e Pichard, na França.
1964 — Tiffany Jones na Inglaterra, Kriminal na Itália. 1980 — Surge, na Espanha, Daniel Torres.
1965 — Bordighera começa os Congressos de Quadrinhos. No ano seguinte, , Piracicaba, Mon amour, de Moliterni e W. Fahrer, na França (com
Lucca. Alvaro Moya, como vilão).
1967 — Freak Brothers de Shelton. Livro de Druillet, Lone S/oame. 1981 — Axa, tira inglesa de Avenell e Romero.
1970 — No Brasil, o livro Shazam, de Alvaro de Moya. Pango, primeira revista em quadrinhos árabe-africana.
O Museu de Arte de São Paulo organiza exposição e congresso de 1982 — Martin Veyron lança o álbum Bemard Lermite.
quadrinhos. 1983 — Varenne: Berhin Strasse.
Broombilda, criada por Russell Myers. 1985 — Little Ego, de Vittorio Giardino, na Itália.
Doonesbury, de Trudeau. 1986 — He-Man, sucesso na TV, em quadrinhos nos jornais.
Friday Foster, de Longaron e Lawrence.
Começam os gibis de Conan.
Corto Maltese, de Hugo Pratt.

231
230
DEo
ao

a
BA
SIB/UFES

E
| A História da História em Quadrinhos, de Álvaro de
a Moya, é uma preciosa contribuição ao estudo e ao conheci-
mento dos autores e personagens que habitam o fascinante
mundo dos quadrinhos.

1 É uma leitura obrigatória pelo que tem de inform


e documentação visual, constituindo desde já DM darnenal
instrumento de consulta para o enorme contingente dos
apreciadores daH. 'Q. /
Os Editores
OA

À
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PRESA
Vip
Ex.
7

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