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em Interculturalidade e
Bilinguismo
Conteudista/s
Edleise Mendes (conteudista, 2023);
Eliana Sturza (conteudista, 2023);
Isis Berger (conteudista, 2023);
Luana Ferreira Rodrigues (conteudista, 2023).
Enap, 2023
Fundação Escola Nacional de Administração Pública
Diretoria de Desenvolvimento Profissional
SAIS - Área 2-A - 70610-900 — Brasília, DF
Sumário
Módulo 1: Fronteiras Linguísticas e Culturais....................................................... 7
Unidade 1: Línguas, Culturas, Fronteiras e suas Complexidades ..................... 7
1.1 Território, Territorialidade e Comunidades Linguísticas ...................................... 7
1.2 Fronteiras Linguísticas, Culturais, Econômicas e Simbólicas ............................... 9
1.2.1 Em Busca de Definições ....................................................................................... 10
1.2.2 Que Tal Pensar na Prática? ................................................................................... 14
Referências ............................................................................................................. 17
Seja bem-vindo e bem-vinda. Neste curso você irá explorar uma série de temas
ligados a uma docência plural. Aqui serão debatidos temas como as fronteiras
linguísticas e culturais, a interculturalidade e a educação linguística, assim como os
fenômenos linguísticos das fronteiras hispano-brasileiras, as políticas linguísticas-
educacionais e as práticas pedagógicas para contextos plurais.
Bons estudos!
Objetivo de aprendizagem
Comumente definido como uma grande extensão de terra, o território pode ser
visto desde distintas óticas das áreas do conhecimento que se debruçam sobre seu
estudo, em especial pela Geografia Política.Tendo em vista essa definição, é possível
pensar em quatro dimensões básicas que orientam as diferentes concepções sobre
o território, de acordo com Haesbaert (2016).
Política ou jurídico-política
Visão do território como um espaço delimitado e sob controle, sobre o qual
se exerce algum tipo de poder que pode ser o poder político do Estado ou
de outros agentes.
Econômica
Apresenta uma noção menos difundida, com foco no território como recurso
para as relações econômicas, tendo como base o conflito entre as classes
sociais e a relação entre capital e trabalho.
Natural(ista)
Como o nome indica, aqui a noção de território se baseia nas relações entre
natureza e sociedade.
Em busca de uma concepção mais ampla podemos unir essas dimensões e propor
uma definição mais integradora que vê o território como um espaço de poder
político significado simbólica e culturalmente pelos grupos que o habitam e que
configura uma importante fonte de recursos naturais e econômicos.
Esse território é marcado pelas territorialidades que ocupam esse espaço, uma
vez que a territorialidade se constrói a partir dos usos que as pessoas fazem do
espaço em que vivem, das relações econômicas e culturais que estabelecem, dando
significado a esse lugar.
Sobre os territórios linguísticos cabe a definição proposta por Berger (2015, p. 46):
As definições mais gerais dispostas nos dicionários trazem alguns termos em comum
quanto ao vocábulo “fronteira”:
Art. 20
Naturais
• marcos físicos: rios, montanhas, reservas, áreas protegidas;
• boas: oferecem boas condições de proteção do Estado;
• más: oferecem más condições para a proteção do Estado.
Artificiais
• demarcadas: fronteiras demarcadas por tratados, por exemplo.
Claude Rafesttin (1993), por sua vez, traz a noção de fronteira associada à uma zona
camuflada em linha, propondo a divisão entre fronteiras internas e externas.
Nas perspectivas apresentadas é possível observar que a busca por uma definição
de fronteira está atravessada por questões que remetem aos conceitos de Estado,
território, linhas e zonas de delimitação político-administrativa.
E, também:
Além disso:
Refletindo sobre as ideias de Viaut (2004), é possível pensar que as relações entre
língua e fronteira são indissolúveis e as fronteiras linguísticas nos territórios
fronteiriços se (re)constroem na interação social, na escolha dos repertórios
linguísticos daqueles que se movem em determinado espaço.
Videoaula: As Fronteiras
Esse exemplo vai ao encontro do que está sendo discutido quando é levado em
consideração que essas pessoas vivem em seus territórios de origem tensões e
conflitos que surgem das fronteiras simbólicas, culturais e étnicas que vão levar ao
deslocamento forçado de um contingente de pessoas.
E essa migração forçada vai levar à formação de outras fronteiras, que é o que
acontece nos casos dos campos de refugiados ao longo das fronteiras da União
Europeia, por exemplo.
O Brasil também tem recebido grupos de migrantes oriundos de distintos países, mas
cabe destacar a chegada dos haitianos e venezuelanos, em função do quantitativo.
Hoje, caminhando em um bairro da cidade de Manaus, por exemplo, é possível
perceber os distintos territórios linguísticos que se formaram com a presença desses
grupos de imigrantes.
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
CINTRA, J. P. O mapa das cortes e as fronteiras do Brasil. Revista Bol. Ciênc. Geod.,
Curitiba, v. 18, n. 3, p. 421-445. 2012. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/bcg/
article/view/29209/19006. Acesso em: 2 mar. 2023.
Objetivo de aprendizagem
Nesta unidade você vai ver um breve resumo que vai passar pelas principais políticas
territoriais que se relacionam ao atual estabelecimento das fronteiras geopolíticas brasileiras.
Ocupar o desconhecido território das Américas não foi uma tarefa simples para os
portugueses e espanhóis durante o período colonial. Entre as principais dificuldades
é possível elencar a dificuldade de acesso e penetração do território que desencadeou
uma carência populacional e a dificuldade de controle militar dos territórios e a
proteção contra outras invasões estrangeiras.
Veja os principais tratados que visaram pôr fim aos conflitos territoriais no período
colonial:
Mapa dos confins do Brasil com as terras da coroa de Espanha na américa meridional – “Mapa das Cortes” (1893).
Fonte: Confins (2019).
De acordo com Costa (1988, p. 27-30), antes do estabelecimento dos tratados mencionados,
uma das iniciativas estabelecidas pelos portugueses para garantir a ocupação territorial
no período colonial foi o sistema de colonização semiprivada que garantia:
Essas medidas visaram garantir o domínio territorial dos portugueses sobre a colônia,
mas apesar disso e dos tratados firmados, os limites dos territórios entre Portugal,
Espanha e França não foi um tema pacificado até a Proclamação da República,
quando se fizeram necessárias novas negociações, representadas pelo Barão do Rio
Branco, em questões relacionadas ao território de Palmas com a Guiana Francesa,
as fronteiras com a Bolívia (incluindo a anexação do Acre ao Brasil em 1903), Peru,
Colômbia e Venezuela.
Década de 1960
Década de 1980
A seguir, veja como as fronteiras brasileiras são geridas atualmente pelo Estado
brasileiro.
Na próxima figura, você pode observar a localização das cidades gêmeas e demais
municípios localizados na faixa de fronteira:
A definição dos arcos foi proposta após estudos realizados pelo Programa de
Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PPDFF), do Ministério da
Integração Nacional, com base no posicionamento geográfico, em aspectos culturais
e étnicos de formação da população e em indicadores socioeconômicos.
Videoaula: Os Arcos
Oiapoque-Tumucumaque
Considerada a maior em superfície da Faixa de Fronteira, possui 350 mil km2,
está localizada na fronteira entre o Brasil, as Guianas e o Suriname. Abrange
dezessete municípios nos Estados do Amapá, Pará, Roraima e Amazonas,
banhados pelos rios Oiapoque, Jarí e Trombetas: Caroebe, São João da
Baliza e São Luiz do Anauá, no Estado de Roraima; Oiapoque, Laranjal do
Jarí, Pedra Branca do Amapari, Serra do Navio, Ferreira Gomes, Pracuúba,
Calçoene, Amapá no Estado do Amapá; Alenquer, Almeirim, Faro, Oriximiná,
Óbidos no Estado do Pará; Urucará, Nhamundá, no Estado do Amazonas.
Alto Solimões
Nessa sub-região está localizada a tríplice fronteira do Trapézio Amazônico,
formada por Brasil, Colômbia e Peru. Compreende municípios localizados
no estado do Amazonas: Tabatinga, Benjamim Constant, Atalaia do Norte,
São Paulo de Olivença, Amaturá, Santo Antônio do Içá, Jutaí, Tonantins.
Alto Juruá
Se estende do sudoeste do Amazonas ao Estado do Acre, fazendo fronteira
com o Peru na zona-tampão do Parque Nacional da Serra do Divisor (AC).
Nessa sub-região se encontram os municípios de Envira, Guajará, Ipixuna,
no Estado do Amazonas; Cruzeiro do Sul, Feijó, Jordão, Mâncio Lima, Manoel
Urbano, Marechal Thaumaturgo, Porto Walter, Rodrigues Alves, Santa Rosa
do Purus e Tarauacá, no Estado do Acre.
Arco Central.
Fonte: BRASIL (2005).
Madeira-Mamoré
Conectando o Vale do Amazonas e do Acre ao Sudeste do país através
da BR 364 e da hidrovia do Rio Madeira, essa sub-região se limita com
a Bolívia e compreende municípios localizados no estado de Rondônia:
Campo Novo de Rondônia, Buritis, Guajará-Mirim (cidade-gêmea), Nova
Mamoré e Porto Velho.
Fronteira do Guaporé
De perfil mais rural e com atividades econômicas incentivadas pelo
antigo modelo de estrutura fundiária herdado da ditadura militar,
também compreende municípios localizados em Rondônia como
Costa Marques, Seringueiras, São Miguel do Guaporé, Alvorada, Nova
Brasilândia d’Oeste, Novo Horizonte do Oeste, Rolim de Moura, Alta
Floresta d’Oeste, São Francisco do Guaporé, Alto Alegre dos Parecis,
Corumbiara, Cerejeiras, Pimenteiras do Oeste e Cabixi.
Alto Paraguai
Com baixa densidade demográfica, essa sub-região faz fronteira com
a Bolívia e abrange os municípios de Araputanga, Barra do Bugre,
Curvelândia, Figueirópolis d’Oeste, Glória d’Oeste, Indiavaí, Jauru,
Lambari d’Oeste, Mirassol d’Oeste, Pontes e Lacerda, Porto Esperidião,
Porto Estrela, Reserva do Cabaçal, Rio Branco, Salto do Céu, São José dos
Quatro Marcos, Vale de São Domingos, Vila Bela da Santíssima Trindade
no Estado de Mato Grosso.
Pantanal
Fazendo fronteira com o Chaco boliviano e com o Paraguai, essa sub-
região se destaca pela diversidade natural. Compreende os municípios
Barão de Melgaço, Cáceres, Nossa Senhora do Livramento e Poconé,
Bodoquena
Se destacam duas atividades em seus domínios: a criação extensiva de
gado do Pantanal e o cultivo da soja. A sub-região engloba os municípios
de Bela Vista, Bodoquena, Bonito, Caracol, Guia Lopes da Laguna, Jardim
e Nioaque, no Estado de Mato Grosso do Sul.
Dourados
Compreende os municípios de Caarapó, Deodápolis, Dois Irmãos do
Buriti, Douradina, Dourados, Fátima do Sul, Glória de Dourados, Itaporã,
Jateí, Laguna Carapã, Maracajú, Novo Horizonte do Sul, Rio Brilhante,
Sidrolândia, Taquarussu e Vicentina no Mato Grosso do Sul.
Cone Sul-mato-grossense
Abrange os municípios de Amambaí, Antônio João, Aral Moreira,
Coronel Sapucaia, Eldorado, Iguatemi, Itaquiraí, Japorã, Juti, Mundo
Novo, Naviraí, Paranhos, Ponta Porã, Sete Quedas e Tacuru, localizados
no Mato Grosso do Sul.
Arco Sul.
Fonte: BRASIL (2005).
A apresentação detalhada dos arcos nessa unidade teve como objetivo mostrar
a extensão e a complexidade da fronteira quando se utilizam critérios para a
organização e o planejamento desse território que vão além do estabelecimento
de limites geopolíticos ou de defesa da soberania nacional.
Nesta unidade você viu um breve panorama das principais políticas territoriais
desde o período colonial com o objetivo de compreender como seu deu a atual
delimitação político-administrativa das fronteiras brasileiras.
Viu também a atual definição das fronteiras com os Arcos Sul, Central e Norte e
as principais políticas de gestão da fronteira promovidas pelo Estado.
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja
o conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
CONFINS. Mapas dos Confins, mapa das Cortes. Confins, n. 39, 2 mar. 2019.
Disponível em: https://journals.openedition.org/confins/19181?lang=pt. Acesso em:
3 mar. 2023.
PÊGO, B. et al. (Orgs.). Fronteiras do Brasil: uma avaliação do Arco Norte. Rio de
Janeiro: IPEA - MI, 2018.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de compreender o potencial das fronteiras
linguísticas e culturais enquanto recurso para o desenvolvimento social.
Neste momento você irá refletir sobre a visão da fronteira como um valioso recurso
para o desenvolvimento social e não apenas como um espaço que precisa de
controle e monitoramento permanente, visão que corrobora com a manutenção
de estereótipos e preconceitos negativos sobre a fronteira e tudo que é produzido
nesse espaço.
A fronteira sempre foi vista como um problema para a garantia do poder territorial
dos Estados. Desta forma, as políticas voltadas para esse espaço estiveram e estão
focadas na ocupação territorial e na militarização da faixa de fronteira, considerada
uma terra sem lei, onde se propagam atos ilícitos como o contrabando e o tráfico
de drogas.
Veja nas abas (RODRIGUES, 2021, p. 98) os principais acordos e tratados firmados
entre Brasil, Colômbia e Peru sobre as áreas de fronteira:
Você pode observar na imagem que as ações contempladas por esses acordos desde
a década de 70 tinham foco em atividades econômicas e de controle de atividades
criminosas, ou seja, voltadas para a fronteira como um espaço problemático.
Entre as iniciativas do governo federal brasileiro com esse mesmo viés podemos
citar o Programa Calha Norte, criado em 1985 no âmbito do Ministério da Defesa,
que tem como objetivo garantir a defesa nacional, maior presença do poder público
e a ocupação e fixação de habitantes na faixa de fronteira da região norte, como
foco na Amazônia setentrional.
Par começar, reflita sobre um conceito importante para desenvolver uma linha de
raciocínio sobre as regiões transfronteiriças (RTF):
No entanto, não se pode excluir o fato de que além de bens e serviços de consumo e
sua importância geoeconômica, a fronteira é um espaço de produção de patrimônios
culturais e simbólicos, tendo como eixo central as suas línguas.
EuroAirport Basel-Mulhouse-Freiburg
No âmbito europeu, cuja organização e gestão dos territórios de
fronteira se baseia em outros contextos diferentes da nossa realidade,
podemos citar o Euro-Aeroporto Basel-Mulhouse-Freiburg como
exemplo de utilização da fronteira como recurso para a economia local.
O aeroporto é operado por França e Suíça e beneficia também aqueles
que se deslocam à Freiburg, na Alemanha.
2007 - 2008
08/01/2009
2013
O campus binacional está localizado em uma área onde vivem povos originários
de distintas etnias como Karipuna, Galibi-Marworno, Palikur-Arukwayene, Galibi-Kalinã
ou Galibi do Oiapoque e Wajãpi com suas línguas das famílias Kheuol, Karib, Aruak e
Tupi-Guarani, em contato com o português e o francês, por isso a importância de
uma Licenciatura Indígena.
As iniciativas ainda são tímidas em nossas fronteiras, por isso é preciso uma revisão
da ideia de que a fronteira é um espaço que precisa de controle e limites.
Porém, você pode observar que todos buscam utilizar o território fronteiriço como
um espaço onde as diferenças e as semelhanças possam integrar um único objetivo:
a utilização dos patrimônios das fronteiras como um importante recurso para o
desenvolvimento dos grupos sociais que vivem nesse espaço.
Universidades bi/trinacionais.
Fonte: Freepik (2023).
Elaboração de leis.
Fonte: Freepik (2023).
Este exemplo mostra que as barreiras linguísticas e culturais não se limitam apenas às
fronteiras geográficas. Elas estão presentes em diversos aspectos da vida cotidiana,
como no mercado local administrado por um sírio, nas escolas com a presença de
estudantes venezuelanos e haitianos, e nos atendimentos médicos feitos por um
médico cubano.
Para finalizar, é importante que você reflita sobre como a fronteira pode ser utilizada
Nesta unidade você notou que o olhar foi direcionado para a fronteira como recurso
para o desenvolvimento social das comunidades, tendo como foco a educação e a
gestão das línguas nesse contexto. Assim, foram elencadas possíveis propostas de
intervenção sobre a fronteira que contribuem para o seu desenvolvimento, mas que
também podem posicioná-lo como centro de irradiação de modelos de gestão da
educação e das línguas.
Que bom que você chegou até aqui! Agora é hora de você testar seus conhecimentos.
Então, acesse o exercício avaliativo que está disponível no ambiente virtual. Bons
estudos!
GRUPO RETIS. Programa Calha Norte: verbas da vertente civil destinadas para os
municípios (2003-2007). Grupo Retis. Disponível em: http://www.retis.igeo.ufrj.br/
wp-content/uploads/Amazon-PCN-Vertente-Civil-03-07.jpg. Acesso em: 3 mar. 2023.
PÊGO, B. Et al. (Orgs.). Fronteiras do Brasil: uma avaliação do Arco Norte. Rio de
Janeiro: IPEA - MI, 2018.
2 Interculturalidade e Educação
Linguística Plural
No Módulo 2, você terá como tema central a “Interculturalidade e Educação Linguística
Plural”, abordando aspectos importantes para a formação de professores(as) de línguas
em uma perspectiva mais sensível à diversidade linguística e cultural dos contextos de
ensino bi/multilíngues e às pessoas envolvidas no processo de ensino-aprendizagem.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer os conceitos de língua, cultura,
repertório linguístico e interculturalidade, além de seus reflexos na construção de uma
educação linguística bilíngue e intercultural.
Questionamentos.
Fonte: Freepik (2023).
Língua é cultura.
Fonte: Freepik (2023).
Em uma educação linguística intercultural, não há lugar para uma “concepção de língua
limpa, sem rascunhos, sem sujeitos, sem história, sem política” (MUNIZ, 2016, p. 783).
Assim, é necessário pensar na língua a partir de uma nova chave, de modo que você
compreenda como atuar em contextos multilíngues e diversos, como são os espaços
educativos de fronteira, sejam elas físicas ou simbólicas. Para lhe ajudar nessa reflexão,
analise o quadro a seguir.
Assim, as ações pedagógicas devem ser voltadas para ensinar a estudantes não
a gramática fria e árida, mas modos de ser e de viver em português e nas outras
tantas línguas que fazem parte do seu repertório linguístico.
A cultura precisa ser entendida como uma rede, uma matriz geradora de sentidos,
como uma complexa rede de significados que são interpretados por elementos que
fazem parte da mesma realidade social, que a modificam e são modificados por ela.
Assim, ela é uma dimensão que não existe sem a realidade social que lhe serve
de ambiente. É a vida em sociedade e as relações dos indivíduos que moldam e
definem os fenômenos culturais, e não o contrário.
Faz-se necessário pensar em alguns aspectos para construir uma ideia de cultura
mais aberta, flexível e significativa para a compreensão dos espaços plurais nos quais
ensinamos e aprendemos.
Língua-cultura
Como aponta Blommaert (2010, p. 102), os contextos multilíngues não devem ser vistos
como espaços onde os sujeitos lançam mão de uma coleção de línguas, mas sim de
Multiculturalidade.
Fonte: Freepik (2023).
Multiculturalismo, Interculturalidade e
transculturalidade são a mesma coisa?
Reflexão.
Fonte: Freepik (2023).
Interculturalidade
Representa um modo de vida, uma intervenção no mundo, com o propósito
de construir espaços de diálogo, de convívio harmonioso e colaborativo,
marcado pelo respeito às diferenças.
Transculturalidade
Como o prefixo “trans” indica, representa a compreensão dos modos como as
culturas se relacionam entre si, num mundo marcado pela superdiversidade.
Significa que não há culturas singulares, mas entrecruzamentos e
interpenetrações constantes entre culturas, em contextos cada vez mais
híbridos e complexos.
Para enriquecer os seus estudos, veja duas videoaulas que falam de Mitos
sobre interculturalidade.
Interação
As ações de ensino-aprendizagem são centradas no sentido e nas
experiências das pessoas em interação. Cada pessoa é um elo importante
na construção do conhecimento, sempre partilhado e colaborativo.
Realidade
As práticas de linguagem realizam-se em situações reais de comunicação e
de interação, visando a construção de repertórios linguísticos, em espaços
multilíngues e multiculturais como são as fronteiras.
Práticas
A língua desenvolve-se a partir do desenvolvimento de práticas de leitura,
escrita, oralidade e análise linguística, sempre contextualizadas às situações
de ensino-aprendizagem e ao seu ambiente sociocultural
essa compreensão restringiria a sua ação como dimensão mais ampla das relações
humanas e das práticas de linguagem que desenvolvemos ao interagir com outros(as).
Em resumo, a interculturalidade:
A partir do que você estudou até aqui, é possível compreender que através do
diálogo entre línguas e culturas, no qual a troca e a análise de experiências, o
respeito às diferenças e a intersubjetividade tenham lugar, é possível construir
um espaço de um terceiro tipo, formado pela interseção das experiências de
professores e aprendizes.
Espaços híbridos.
Fonte: Freepik (2023).
Desejar esse outro lugar, no entanto, não significa deixar de lado as próprias
identidades, experiências e vontades de ir à luta, nem, tampouco, representa uma
escolha neutra, uma opção de “ficar em cima de muro”. Significa desejar um lugar
onde a minha existência e a do outro funcionem como instâncias em interação,
movidas pela busca mútua de compreensão.
Espaços de interlocução.
Fonte: Freepik (2023).
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
Ao final desta unidade, você será capaz reconhecer as características dos elementos
constitutivos da educação linguística intercultural e seus reflexos nas práticas educativas.
Como você pode ver, a experiência apresentada no vídeo mostra como os nossos
espaços educativos podem se transformar em ambientes de criatividade, de
partilha de conhecimentos, de diálogo intercultural, de experimentações culturais
e artísticas variadas.
Assim, precisamos pensar uma educação linguística outra, tão diversa quantos são
os contextos de seu desenvolvimento, sendo um campo de atuação e de luta, de
resistência e de renovação, e que interroga as epistemologias que não aceitam o
pensamento divergente e o reconhecimento de que a vivência das línguas e as
línguas se dá de modo conjunto, num roçar de experiências de vida e a partir de
deslocamentos constantes.
• a formação de professores(as);
• o desenvolvimento de currículos;
Para que você possa compreender melhor cada uma dessas dimensões
constitutivas, assista à videoaula a seguir.
Como visto, a ELI aqui está sendo compreendida como campo de ação e de
construção de saberes, práticas e epistemologias diversas, e não como processo
individual.
Por isso, ela tem como primeiro objetivo promover a paz, a equidade e a justiça
social, visto que é, sobretudo, um ato político de resistência e de luta contra todo
tipo de discriminação e de racismo, pois como nos diz Nascimento (2019, p. 19):
Assim, a ELI recusa todo tipo de explicação e de prática que não seja construída
na experiência, buscando incorporar no fazer teórico e pedagógico outras episte-
mologias, outras cosmogonias, outros modos de ensinar e aprender línguas, mais
sensíveis às pessoas e ao que elas significam no mundo.
Por sua natureza proativa e movente e por buscar construir uma pedagogia ou-
tra, a ELI nos obriga a rever nossas crenças e concepções sobre os significados de
língua/linguagem, de ensinar e aprender e dos papeis que assumem as pessoas
envolvidas no processo educativo, professores(as) e alunos(as), bem como outros
agentes que dele participam, direta ou indiretamente.
Todos os conteúdos e reflexões com que você entrou em contato até aqui têm
como pano de fundo a necessidade de que a formação, inicial e continuada,
de professores de línguas prepare-os para atuar em contextos de ensino-
aprendizagem complexos e marcados por diferenças linguísticas e culturais.
Os materiais e recursos didáticos, por sua vez, devem funcionar como fonte,
como ponto de partida para as experiências de ensinar e de aprender, e não o
único conteúdo que circula em sala de aula. A seleção dos “gatilhos” que disparam
experiências de interação deve privilegiar conteúdos autênticos, culturalmente
significativos, centrados nos interesses e necessidades dos aprendizes.
• socioculturais;
• cognitivos;
• afetivos; e
• psicológicos.
Faz parte desse modo de ser e de agir de professores e alunos abrir-se para a
aceitação do novo e praticar a humildade e a tolerância, ao mesmo tempo em
que agem como analistas e críticos das experiências que partilham para que
possam intervir, complementar e modificar o seu processo de aprendizagem
com autonomia, criatividade e responsabilidade.
A relevância da avaliação.
Fonte: Freepik (2023).
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
MENDES, Edleise. Por que ensinar língua como cultura? In: SANTOS, Percília. ORTIZ,
Maria Luisa. Língua e cultura em contexto de ensino de português para falantes de
outras línguas. Campinas: Pontes Editores, 2010. p. 53-77.
MENDES, Edleise. O português como língua de mediação cultural: por uma formação
intercultural de professores e alunos de PLE. In: Mendes, Edleise. (Org.) Diálogos
interculturais: ensino e formação em português língua estrangeira. Campinas:
Pontes, 2011. p. 139-158.
RIBEIRO, Djamila. Pequeno manual antirracista. São Paulo: Companhia das Letras,
2019.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de refletir criticamente sobre a experimentação
pedagógica a partir de situações de ensino-aprendizagem e da análise de materiais e
recursos didáticos.
Para iniciar os estudos desta unidade clique aqui e assista ao vídeo “Olhe para
além das fronteiras” e reflita um pouco sobre a experiência realizada.
Como você pode ver na experiência mostrada no vídeo, quando nos aproximamos
do que é diferente de nós, o primeiro impacto é sempre de estranheza, de
deslocamento e até um pouco de desconforto.
• de conduta;
• de classe;
• moral;
• físico;
• étnico;
Nesse sentido, todo encontro entre culturas e línguas representa uma espécie
de estranhamento, a princípio, mas que a depender de como são construídas as
relações e interações, pode se transformar em aprendizado mútuo.
Para ampliar a reflexão, durante o estudo dessa unidade, a proposta será pensar
sobre algumas experiências de deslocamento e de atuação de professores em
ambientes complexos e marcados pela diversidade linguística e cultural.
Isso significa que são feitos planejamentos de cursos com modelos pedagógicos e
materiais inovadores, mas que não consideram perguntas preliminares e básicas,
como as seguintes:
Primeiro Relato
“A Interculturalidade é vista e vivida no cotidiano social e escolar. E
verdadeiramente traz influência, interação, mudanças no linguajar e
perspectivas humanas do outro. Enquanto professora de Literatura e Língua
Portuguesa, vejo, na prática, como esta gera ações, reações, pensamentos,
neologismos, enriquecimento (por vezes nem tanto) pessoal e acadêmico.
Segundo Relato
“Não tenho experiência intercultural, mas gostaria muito de vivenciar essas
situações e obter experiências tão ricas que só quem vive nas fronteiras sabe
explicar. Temos que ter a consciência que somos iguais em direitos e diferentes
em cultura. Como seres plurais devemos respeitar e aceitar o outro.”
Terceiro Relato
“Nos últimos 30 anos, ministrei aulas numa região de fronteira terrestre, divisa
da Guiana Francesa com o Brasil, onde há tribos indígenas, comunidades
ribeirinhas e quilombolas, além de alunos com DV (deficiência visual) e
DA (deficiência auditiva), todos convivendo harmônica e respeitosamente
no mesmo ambiente. Víamos uma mescla das tradições, falares, saberes,
costumes em que um passava naturalmente ao outro, aprendendo e
ensinando. Verdadeiramente, uma troca cultural e de linguagem. E por
mais simples que fosse a escola, com recursos parcos, costumava-se
trabalhar, por lá... com a valorização do que eles possuem como próprio.
Para facilitar a compreensão dos alunos, o aprendizado é fazer com que
fossem valorizados, que criassem um vínculo de aprendizado que passe
pelo gostar de apreender e construir saber, com um sentido profundo de
pertencimento. Não se despreza a cátedra, mas se usa o informal como
apoio pedagógico para o fazer científico.”
Quarto Relato
“Há 25 anos atrás, quando lecionava em Itapecerica da Serra (SP),
experienciei o processo de escolarização de crianças da comunidade
cigana seminômades, de etnia Calon. Pude conhecer a identidade, os
costumes, a vestimenta e, principalmente, a língua ágrafa distinta dessa
comunidade: Shib Kalé ou Caló (mistura de Romanês ou Romani, Português
e Espanhol), o que diferencia o povo cigano do não cigano. Uma troca
incrível! Nessa troca, observei a cultura pouco, ou quase nada, entendida,
seja por preconceitos seja por medo, de um povo que chegou ao Brasil no
início do período colonial, mas só neste ano (2022) é que teve aprovado o
Estatuto dos Povos Ciganos.
Muitos anos depois, participei de uma pesquisa sobre a “Escravidão Urbana na
E essas duas experiências mostraram que, aqui em São Paulo, embora não
façamos fronteiras com nenhuma outra nação, somos uma verdadeira Torre
de Babel de diversidade linguística.”
Construção da interculturalidade.
Fonte: Freepik (2023).
Quinto Relato
“Moro na fronteira com a Bolivia em Corumbá, Mato Grosso do Sul, e é
muito visível a necessidade de se trabalhar com a interculturalidade no dia
a dia. Temos um fluxo muito grande de Bolivianos com que convivemos
diretamente em nossas ruas, presentes em feiras livres, em restaurantes
e, principalmente, no comércio. A cidade respira esse convívio. No último
Construção da interculturalidade.
Fonte: Freepik (2023).
A questão é: que tipo de proficiência o aluno adquiriu? Ou, melhor, que qualidade
de proficiência ele alcançou? Nesse tipo de avaliação, essas questões importam
menos. Felizmente, as discussões relativas à avaliação de aprendizagem no ensino/
aprendizagem de línguas têm focalizado a necessidade de se empreender mudanças,
não só nos modos e procedimentos de avaliação, mas também na postura de
professores e alunos e das instituições diante desse processo. O questionamento,
então, diz respeito ao tipo de conhecimento que desejamos que os nossos alunos
construam, ou seja,w o que desejamos que eles aprendam?
Pelo contrário, assim como avaliar é uma ação natural que realizamos a todo o
momento em nossas vidas, assim deve ser quando ensinamos e aprendemos línguas.
Para sistematizar o que está sendo discutido, veja o que significa avaliar em uma
perspectiva intercultural.
Pensando também nos aspectos que estão além da sala de aula, destaca-se a
importância de que sejam incluídas, nas práticas de formação de professores de
línguas, em estágio inicial ou em serviço, a reflexão sobre a avaliação. Isso não
se refere apenas à avaliação de proficiência, mas de todo o sistema envolvido no
processo mais amplo de ensinar e aprender línguas, incluindo-se aí as instituições
que o abrigam.
Que bom que você chegou até aqui! Agora é hora de você testar seus conhecimentos.
Então, acesse o exercício avaliativo que está disponível no ambiente virtual. Bons
estudos!
BHABHA, Homi K. Culture’s in-between. In: HALL, Stuart. DU GAY, Paul. Questions of
cultural identity. London: SAGE, 1996. p 53-59.
KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras,
2020.
MENDES, Edleise. Por que ensinar língua como cultura? In: SANTOS, Percília. ORTIZ,
Maria Luisa. Língua e cultura em contexto de ensino de português para falantes de
outras línguas. Campinas: Pontes Editores, 2010. p. 53-77.
MENDES, Edleise. O português como língua de mediação cultural: por uma formação
intercultural de professores e alunos de PLE. In: Mendes, Edleise. (Org.) Diálogos
interculturais: ensino e formação em português língua estrangeira. Campinas: Pontes
Editores, 2011. p. 139-158.
RIBEIRO, Djamila. Pequeno manual antirracista. São Paulo: Companhia das Letras,
2019.
Objetivo de aprendizagem
Estratégias de comunicação
nas fronteiras.
Fonte: Freepik (2023).
A pergunta que pode ser feita a partir da ideia de que nas fronteiras hispano-brasileiras
temos de um lado o português e de outro o espanhol é se de fato temos situações
de bilinguismo nas zonas de fronteiras. A probabilidade do bilinguismo resulta da
história de como as línguas se fizeram presentes nas comunidades fronteiriças, do
quanto os falantes têm uma proficiência e qual seu grau, bem como saber se as
línguas, no caso o português e o espanhol, têm a mesma representatividade para
vida social dos falantes.
É importante destacar que cada zona de fronteira tem sua característica geopolítica.
A sua dinâmica social está determinada por um conjunto de práticas sociais locais,
uma história de ocupação e de como se constitui o seu povoamento, as etnias que
contribuíram para conformação de cada sociedade fronteiriça e como se desenvolve
a economia da fronteira, fator que movimenta as trocas de moedas, de mercadorias,
de serviços, entre outros. As fronteiras linguísticas entre o português e o espanhol
na América do Sul não seguem sempre as linhas demarcatórias das fronteiras que
definem os limites geopolíticos entre os países. As populações se deslocam, cruzam
para o território vizinho, organizam seus núcleos familiares e mantêm suas línguas
familiares/maternas.
Nesta unidade, você vai conhecer mais das situações linguísticas nos contextos
de fronteira, destacando aquelas sobre as quais já há um conjunto de estudos e
2 o bilinguismo composto, em que duas palavras (uma de cada língua falada pelo
bilíngue) representariam um único conceito combinado;
O que estudos sobre bilinguismo concluem é que já não se pode esperar que
os sujeitos sejam bilíngues perfeitos, pois há muitos fatores atualmente que
são considerados no uso de duas línguas para definir se um sujeito é de fato
bilíngue. A ideia de bilíngue perfeito olha para a questão do bilinguismo de modo
unidimensional, sem considerar outros aspectos, como o psicológico, o cognitivo, o
social, o contextual e o cultural.
A autora reproduz o quadro de classificação proposto por Harmers, que nos apresenta
um panorama das múltiplas dimensões que definem os tipos de bilinguismo. Veja o
quadro reproduzido por Megale (2005, p. 6-7):
Para ilustrar, veja o seguinte mapa que descreve a presença de brasileiros na zona
norte do Uruguai, fronteira com extremo sul do Brasil, onde predomina o português
como a língua materna da população local.
Para compreender melhor como os falantes fronteiriços usam as línguas e o que elas
representam na construção das suas identidades, vamos assistir a um documentário
realizado na fronteira Brasil-Uruguai.
Agora, veja uma videoaula e reflita sobre o que você viu no documentário:
Outro aspecto a ser destacado é que o português é ensinado como segunda língua
desde anos iniciais nas escolas públicas da região norte do país. O português
é reconhecido como uma língua da região, portanto sua oferta é obrigatória nas
escolas primárias até 6º ano. As aulas de português são relacionadas aos temas das
disciplinas escolares, ou seja, não se ensina sobre a língua, mas ela está presente
no ensino de conteúdos que são previamente combinados com a professora de
espanhol. A partir do 6º ano, os alunos podem seguir estudando o português ou
outra língua no Centros de Línguas, de modo gratuito.
Nos exemplos, é possível ver a relevância do contexto de uso das duas línguas e
a importância dos espaços urbanos onde há maior movimento do comércio, dos
negócios, da compra e venda de mercadoria. Os vendedores das lojas, por exemplo,
se comunicam nas duas línguas e, muitas vezes, se utilizam também de uma mistura
de línguas, o que popularmente chamam de “Portunhol”.
Agora, veja também como o mesmo ocorre no Brasil, o que mostra a condição para
bilinguismo social, nas duas imagens abaixo:
Para entender o bilinguismo social, é preciso definir os dois tipos definidos por Appel
& Muskyen (1996).
Bilinguismo aditivo
Nele o falante acrescenta uma segunda língua ao seu repertório, favorecido
pelo fato de que há outra língua a sua disposição. Ambas, a primeira e a
segunda língua, têm o mesmo prestígio. Seria o caso das famílias nas
quais pais e filhos aprendem as duas línguas e as usam em todas as suas
habilidades.
Bilinguismo subtrativo
Se caracteriza em razão de que uma das línguas não tem o mesmo prestígio
que a outra. Este seria caso do português dos brasileiros que vivem na
fronteira argentina, em lugares nos quais o português falado pelos migrantes
não é um português padrão, ao que eles chamam de “brasilero”, assim como
muitos descendentes de brasileiros, que ainda vivem no norte uruguaio,
usam uma variedade de português brasileiro da região sul do Brasil.
Para ilustrar, o mapa a seguir descreve a presença do português ao longo das zonas
de fronteira em territórios dos países vizinhos.
“Nosotro aprendimo alemán por los padres, porque ellos son antes, vinieron de Europa
y ahí… y allá aprendimo el brasilero, el portugués, y hablo el castellano, todo medio
mezclado, porque estamo acá en la frontera. (Ralf Kramer, 71, Piñalito” (CERNO, 2019).
Este é o caso de Ciudad del Leste e de Foz do Iguaçu. A primeira por ser um polo
de comércio de free shops e a segunda pelo turismo. Além disso, ambas formam a
tríplice fronteira com a cidade argentina de Puerto Iguazú, cidade fronteiriça que atrai
muitos brasileiros e tem um comércio e turismo dirigido tanto ao público falante de
espanhol como o de falantes de português.
Fasold (1996), quando aborda sobre a origem histórica do plurilinguismo, inclui as zonas
de fronteira, reforça a ideia de que as fronteiras geopolíticas não coincidem com as
fronteiras linguísticas, destacando a função das fronteiras geopolíticas para os estados
nacionais. Cruzar de um lado a outro das fronteiras define a composição sociocultural
da fronteira.
ELIZAINCÍN, A.; BARRIOS, G.; BEHARES, L. Nos falemo brasilero. Dialectos Portugueses
en Uruguay. Montevideo: Amesur, 1987.
GRUPO RETIS. Zona de Fronteira: Tipos de Articulação entre cidades gêmeas (mapa).
Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2011. Disponível em: http://www.retis.igeo.
ufrj.br/wp-content/uploads/ZF-Cidades-Gemeas-2011.jpg. Acesso em: 7 mar. 2023.
RONA, J. P. El dialecto “fronterizo” del Norte del Uruguay. Montevideo: Adolfo Linardi
Editor, 1967.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o espaço multilíngue dos territórios
fronteiriços, por meio de exemplos presentes no repertório linguístico dos falantes.
Línguas de fronteira.
Fonte: Dicionário Compartilhado de Língua de Fronteira (2014).
Barra do Quaraí/Brasil.
Foto: Eliana Sturza.
São elas:
Alternância de códigos
Os falantes alternam as línguas. É uma estratégia muito utilizada, e acontece
quando cada falante usa a sua língua (nacional e/ou materna). A alternância
não impede o grau de compreensão e entendimento entre eles.
Empréstimos Linguísticos
O empréstimo linguístico pode ser de palavras, de expressão, do modo de
pronunciar. O mais frequente é o uso de um léxico tomado de empréstimo,
ou de uma palavra da outra língua cumprindo a função gramatical da outra.
Cidade de Uruguaiana/Brasil.
Foto: Emanuele Coutinho.
Se você tem curiosidade para saber mais sobre os tipos de alternância de códigos,
veja que há pelo menos três tipos:
Alternância intra-oracional
Ocorre com a introdução de uma palavra de outra língua no meio do
enunciado. Ou seja, uma palavra do espanhol no meio do enunciado em
português ou vice-versa. Isso ocorre muito com o inglês, quando introduzimos
um vocábulo do inglês no meio de um enunciado em português: vou fazer
o check in.
Alternância inter-oracional
Ocorre entre enunciados, alterna-se um enunciado em cada língua. O
falante vai alternando enunciados como se os separasse em fragmentos,
cada um deles em uma língua, embora faça isso de modo natural e intuitivo
e demonstre assim que tem domínio de ambas as línguas.
Por exemplo:
a) Pero aquí é una frontera e tudo o mundo fala eh… saben castellano mas
falam brasilero aqui. (Patricia Da Luz, 62, Itacaruaré)
(CERNO, 2019, p.146)
b) Cliente- Sí, ¿no tienes más chico? (um tempo depois) a ver cómo queda...
c) Camila- Só tem uma coisinha no bolso só (tempo depois). ¿Cómo quedó?
(GONÇALVES, 2013, p. 72)
No cartaz você pode ver uma lista de produtos oferecidos pelo restaurante
aos clientes brasileiros que cruzam a fronteira de Foz de Iguaçu - Puerto
Iguazú para fazer compras. Os nomes dos produtos estão em espanhol, mas
o destaque é para o cliente brasileiro e está em português. Ficam claras as
palavras “aqui”, “agora”, “pastel na hora”, “preços especiais”, por exemplo.
De acordo com Haugen (1950), citado por Appel & Muysken (1996), existem
dois processos básicos no empréstimo linguístico: importação e substituição.
Conheça-os a seguir:
Importação
Implica acrescentar o modelo de uma língua outra. Na fronteira Brasil –
Uruguai e Brasil – Argentina o uso da expressão “que sei eu”, emprestada
da expressão “qué sé yo”, do espanhol, usada para indicar falta de certeza do
que se está dizendo, como um “sei lá”.
Substituição
Implica mudar algo de uma outra língua na língua nativa. Uso de “remolacha”,
do espanhol, no lugar de “beterraba”, no português. Ou então, usar a palavra
“plancha” para “ferro de passar roupa”.
E se você tem curiosidade para saber mais sobre a mistura de línguas, continue
sua leitura.
Puerto Iguazú/Argentina
Foto: Eliana Sturza
Puerto Iguazú/Argentina
Foto: Eliana Sturza.
Nessas imagens você pode ver que se misturam línguas de tal modo que se produz
uma alteração na grafia da palavra “aceitonas”, que em espanhol seria “aceitunas” e
em português “azeitonas”, para assim se produzir uma terceira palavra.
Veja como os moradores sabem usar essas estratégias no relato feito por uma
moradora de uma comunidade de brasileiros na província de Misiones, Argentina.
Ela descreve como mistura as línguas e também como muda de língua conforme
a língua da pessoa com quem ela conversa. Refere-se à mescla como “portunhol”.
Este exemplo também reforça a importância das práticas linguísticas usadas nas
relações interpessoais entre os fronteiriços:
Cada região da fronteira do Brasil com os demais países sul-americanos tem modos
diferentes de nomear o jeito misturado de falar. Ou seja, os falantes dão um nome
para a língua misturada que usam nas suas relações cotidianas, do português com
o espanhol ou, também, do guarani com o espanhol, no caso do Paraguai.
Selinker (1991), um dos pesquisadores que pela primeira vez definiu a interlíngua
como parte de um processo de aprendizagem de uma segunda língua ou, como ele
se refere, uma língua objeto (LO), afirma que há comportamentos linguísticos em que
a produção de enunciados do aprendiz estaria composta por:
Cidade de Jaguarão/Brasil.
Fonte: Foto: Eliana Sturza.
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
2 Avil: isqueiro;
3 Aceitunas: azeitona;
14 Hamburguesa: hambúrguer;
18 Llamado: chamado;
25 Remolacha: beterrada.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade você será capaz de identificar a presença dos fenômenos linguísticos
nas expressões da cultura e da identidade dos fronteiriços.
Nesta unidade você irá conhecer a produção cultural da fronteira, dando ênfase
para textos literários que utilizam uma língua misturada como expressão da cultura
fronteiriça. Além disso, verá exemplos dessa produção para abordar a relação da
cultura local da fronteira e as identidades fronteiriças.
Assim como no Brasil há variedades linguísticas do português que são definidas pelo
recorte regional e social, também há nas fronteiras hispano-brasileiras variedades
do espanhol usadas no contexto da América Latina. Também existem outras línguas
presentes e circulando em diferentes âmbitos dos territórios fronteiriços.
O repertório linguístico dos fronteiriços pode conter mais de duas línguas, portanto,
justamente esse repertório ampliado com práticas linguísticas como portunhol ou
yaporá, além de muitas outras línguas que circulam nas fronteiras, torna os espaços
fronteiriços multilíngues.
Um boliviano não diz que fala espanhol, diz que fala castellano, assim como um
uruguaio. O boliviano ainda pode acrescentar outras línguas do seu repertório como
o quechua e/ou aymara. Um argentino diz que fala castelhano, mas também diz que
fala argentino. Um descendente de imigrante brasileiro no Uruguai pode dizer que
fala fronterizo, Portuñol ou brasilero, do mesmo modo que um brasileiro vivendo
na fronteira de Misiones (Argentina). Um paraguaio pode dizer que fala castelhano,
paraguaio, guarani ou yaporá.
Vale destacar algumas dessas produções com objetivo de pensar o papel das línguas
na articulação entre as expressões culturais e as identidades fronteiriças. Neste
caso, o foco estará nos autores que escrevem alternando o português e o espanhol
ou usando o Portunhol e o Portunhol Salvaje/Selvagem.
(Viento de Nadie)
(Noitunnu Norte)
Rosa (2015), define o Portunhol dessa fronteira e explica historicamente como essa
prática linguística se instituiu como língua dos fronteiriços na fronteira Brasil – Uruguai.
Veja agora dois fragmentos do livro “O Outro Lado. Noveleta Pueblera” (2018):
Fragmento I
José Jacinto vai seguido a Jaguar e Río Branco, e Melo e Treinta y Tres; já
esteve em Bagé e Santa Vitória do Palmar, e no Herval. Mas é homem
andariego que mais gosta de pueblos do que de cidades
Fragmento II
- Mire – podia ter dito – eu sou assim como me vê, meio uruguaio, mas não
sou do outro lado; nasci brasileiro e até sentei praça no Regimento
- Bueno...- foi só o que disse, quando pagou e saiu, depois de volcar o copo.
A seguir, veja o trecho de uma música do cantor riverense (Uruguai) Chito de Mello.
Para ele, os fronteiriços são rompidiomas, porque misturam as línguas, ou seja, são
falantes de Portunhol.
Diegues usa as línguas da fronteira na sua linguagem literária, no título de uma das
suas obras podemos identificar: espanhol e inglês.
U portunhol salvaje es la língua falada en la frontera do Brasil com u Paraguai por la gente
simples que increíblemente sobrevive de teimosia, brisa, amor al imposible, mandioca,
vento y carne de vaca. Es la lengua de las putas que de noite vendem seus sexos en la
linha de la fronteira. Brota como flor de la bosta de las vakas. Es una lengua bizarra,
transfronteriza, rupestre, feia, bella, diferente. Pero tiene una graça salvaje que impacta.
O fenômeno do uso do Portunhol como língua das expressões culturais é fato recente.
De ser um “estigma” para os falantes, o Portunhol tornou-se uma língua dos afetos, de
identificação com a origem dos seus falantes e de sua representação social, ou seja,
do que é ser fronteiriço, especialmente no contexto da fronteira Brasil – Uruguai. O
vínculo entre a língua e a identidade dos fronteiriços dessa região incentivou agentes
e coletivos culturais a reivindicar o Portunhol como patrimônio cultural.
A “língua dos afetos” está na relação do portunhol uruguaio com sua história, com
o ambiente familiar e, portanto, remete a uma população que se reconhece pela
língua. O portunhol uruguaio tem apelo afetivo por seu uso social e sua relação
com a cultura fronteiriça, de origem luso-brasileira, que quer se diferenciar de
outras regiões do país. Há visivelmente uma mudança cultural na sociedade
fronteiriça em busca de valorização do Portunhol.
Essa fronteira é singular, nela os que têm famílias compostas por brasileiros e
uruguaios têm uma dupla nacionalidade e são chamados popularmente de “doble
chapas”, uma referência ao uso, em uma determinada época, de duas placas nos
carros: uma brasileira e outra uruguaia. Cada fronteira tem sua complexidade cultural,
social e linguística. No arco central e norte há outras etnias e línguas que entram no
repertório linguístico dos fronteiriços.
Para ilustrar, veja o mapa publicado no verbete “Portuñol Riverense” da Wikipedia. Estes
registros contribuem para a divulgação e circulação do Portunhol como uma língua
vinculada à fronteira e um património cultural a ser valorizado, não negado.
Aqui uma breve lista com sugestões de outras produções culturais, de documentários
e grupos musicais. Entre eles:
• Fronterizos;
• Portuñol;
• Rompidioma.
Que bom que você chegou até aqui! Agora é a hora de você testar seus conhe-
cimentos. Para isso, acesse o exercício avaliativo disponível no ambiente virtual.
Bons estudos!
DIEGUES, Douglas. Um Flor na Solapa da Miséria (en Portuñol). Buenos Aires: Eloísa
cartonera, 2005.
DIEGUES, Douglas. Foto Douglas Diegues 2015. 2015. 1 fotografia. 624×911 pixels.
Disponível em: https://malhafinacartonera.wordpress.com/2016/02/17/a-resistencia-
das-cartoneras/. Acesso em: 7 mar. 2023.
ELIZAINCÍN, A.; BARRIOS, G.; BEHARES, L. Nos falemo brasilero. Dialectos Portugueses
en Uruguay. Montevideo: Amesur, 1987.
ROSA, Enrique (Org.) Jodido Bushinshe. Del hablar y del ser. Montevideo: Ed. Centros
MEC, 2015.
SCHLEE, Alcyr. O outro lado. Noveleta Pueblera. Porto Alegre: Ed. Ardotiempo, 2018.
Bons estudos!
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer o que são políticas linguístico-
educacionais e as formas de gestão de línguas em espaços escolares plurais, como os de
fronteira.
Também é possível afirmar que há países em que existem mais pessoas bilíngues
ou plurilíngues, com repertórios linguísticos mais plurais e que se comunicam
cotidianamente em mais de uma língua em diversas atividades cotidianas (trabalho,
estudo, comércio, viagens).
Que línguas você listou? Ao fazer esse exercício, é provável que venha à sua mente
primeiramente as línguas que você fala e compreende. Depois, tente listar aquelas
línguas que possuem alguma função social importante em nosso país, como a de
‘língua oficial’, ‘língua nacional’ ou ‘língua de instrução dos conteúdos escolares’.
É possível pensar também naquelas que fazem parte de nosso contexto social, que
as pessoas usam na comunidade ou no comércio, as línguas que possuem prestígio
internacional e que se destacam como línguas de produção científica, do turismo e
de trocas econômicas.
É possível que você liste também línguas que considere mais distantes de sua
realidade, ou línguas que considere como ‘exóticas’.
Após essa breve reflexão, é possível concluir que há mais línguas ao nosso redor e no
mundo, do que cotidianamente percebemos. Todas essas línguas, as que listamos
e todas as demais que possivelmente não cabem em nossa rápida contagem, são
importantes e fazem parte da enorme riqueza do planeta.
Por esse motivo, muitas crianças que falam em suas casas e em suas comunidades
línguas diferentes das línguas das atividades escolares estão em situação de grande
vulnerabilidade em relação ao sucesso nas diferentes etapas de escolarização. Esse
desequilíbrio promove desigualdades educacionais, econômicas e sociais.
Por essa razão, organizações internacionais e diversos países vêm propondo ações e
implementando esforços para valorização da pluralidade de línguas, compreendidas
como veículos de culturas, memórias coletivas e valores.
E no Brasil?
De acordo com especialistas, no Brasil existem cerca de 300 línguas, além da língua
portuguesa, que é a língua oficial, declarada na Constituição Federal de 1988 e da
Libras (Língua Brasileira de Sinais), que foi reconhecida e regulamentada como meio
legal de comunicação e expressão dos surdos do país no ano de 2002.
No Brasil, ao longo de seus mais de 500 anos de história, foram tomadas várias
decisões e ações que, infelizmente, resultaram na perda e esquecimento de muitas
línguas. Estamos falando de línguas de centenas de povos indígenas e de línguas de
imigrantes e seus descendentes.
É possível citar dois exemplos de intervenções sobre as línguas que marcam a história
linguística do país:
Exemplo 1
Um deles foi o documento intitulado Diretório dos Índios, de 1758, em que
Marquês de Pombal, um diplomata e estadista português, obrigava o uso da
língua portuguesa na colônia e proibia o uso e ensino das línguas indígenas.
Exemplo 2
O outro exemplo é o conceito de ‘crime idiomático’ instituído em 1939, durante
o período do Estado Novo, que criminalizava o uso de línguas estrangeiras
em território nacional. Essa foi uma decisão que fazia parte da campanha
de nacionalização para forçar a integração dos imigrantes estrangeiros no
Brasil, para impor entre eles a língua portuguesa e para reduzir as influências
estrangeiras no ideal de cultura brasileira.
• A decisão sobre quais línguas devem ser ensinadas e praticadas nas escolas
é uma política linguística. Nesse caso, é considerada uma política linguístico-
educacional, termo que exploraremos na sequência.
E as políticas linguístico-educacionais?
Elas se referem às decisões, ações e estratégias de gestão das línguas, voltadas para
os espaços de ensino-aprendizagem, em especial para os espaços de escolarização
formal. Elas são comumente adotadas por governos centrais, regionais ou locais.
Mas também podem ser adotadas por membros de comunidades escolares, que
deliberam sobre quais línguas devem ser ensinadas, sobre as suas formas de
aprendizagem e sobre aquelas que servirão de meios de instrução dos conteúdos
escolares.
Quando falamos em gestão, nos referimos a um conjunto de ações que tem como
propósito administrar e organizar algo, visando alcançar um objetivo. Portanto,
ao usar o termo ‘gestão’ de línguas na escola, está se falando sobre as diversas
estratégias e etapas de planejamento em relação às línguas no espaço escolar.
A seguir, veja algumas das decisões que estão implicadas no que se chama de ‘gestão
de línguas na escola’:
• A definição dos lugares das línguas nos currículos (língua materna; língua
estrangeria; língua adicional etc.);
Como é possível perceber, não se trata somente de tornar explicita a decisão sobre
as línguas na legislação. Uma série de estratégias e ações posteriores são necessárias
para colocar em prática uma determinação.
A partir de Berger (2015), podemos dizer que a gestão das línguas na escola se dá
em dois eixos integrados:
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
SCHIFFMAN, Harold. Language policy and linguistic culture. In: RICENTO, Thomas (ed.).
An introduction to language policy: theory and method. Malden: Blackwell, 2006. p.
111-125.
SHOHAMY, Elana. Language Policy: hidden agendas and new approaches. Nova York:
Routledge, 2006.
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de reconhecer diferentes modelos de educação bi/
multilíngue e identificar suas características.
Educação Bilíngue.
Fonte: Freepik (2023).
O termo Educação Bilíngue é bastante abrangente, o que significa dizer que não há
um único modelo, mas muitos deles. Eles variam dependendo do objetivo social
e educativo, da proposta de ensino-aprendizagem, do público alvo, do contexto
sociopolítico e educacional de implementação, da forma como os currículos são
organizados, do tempo de exposição que será destinado às línguas do programa,
dentre outros elementos.
Desde a década de 1920, pesquisas sobre esse tema vêm sendo realizadas, o que
explica o grande volume de publicações sobre o assunto. Há diversos pressupostos
teóricos que orientam os modelos e programas envolvendo o uso de duas ou
mais línguas como meios de instrução. Por essa razão, apresentaremos esse tema
No Brasil, por exemplo, você provavelmente já ouviu falar em Educação Bilíngue para
surdos, em Educação Escolar bilíngue e intercultural para os povos indígenas e em
Educação Bilíngue em língua inglesa em escolas privadas. São propostas bastante
distintas que se aplicam a públicos igualmente diferentes, cujas línguas a serem
aprendidas também possuem diferentes valores sociais.
Vejamos alguns dos possíveis objetivos que podem ser identificados em modelos de
Educação Bilíngue:
Bilinguismo Aditivo
Como a palavra indica, os programas que enfatizam o bilinguismo aditivo
têm como objetivo adicionar outra língua ao repertório linguístico dos
alunos no decorrer dos anos de permanência na escola. Podemos dizer
que, nesse caso, os alunos podem ser bi ou plurilíngues no sistema escolar,
tendo aprendido ou desenvolvido na escola mais de uma língua para se
comunicarem, em diferentes contextos sociais e com variados níveis de
proficiência, dependendo da forma como o programa é estruturado.
Como é possível supor, programas de Educação Bilíngue desse modelo são orientados
por uma perspectiva de língua como problema, ou seja, as línguas maternas dos
alunos são consideradas problemas a serem resolvidos pela escola, por meio de seu
paulatino apagamento e do ensino e difusão da língua majoritária da sociedade em
que se inserem.
Para refletir: No contexto dos Estados Unidos da América, a perspectiva ‘língua como
problema’ orientou a formação de Educação Bilíngue de transição, amplamente
difundido no país, com o objetivo de fazer com que imigrantes aprendessem o inglês
de modo efetivo. O bilinguismo estava associado a problemas de escolarização e
problemas sociais e era relacionado à educação dos mais pobres e incapacitados,
bem como de imigrantes não desejados no país.
Por isso, vários modelos de Educação Bilíngue desenvolvidos naquele país tinham
o objetivo de desenvolver nas crianças a fluência em inglês e não valorizavam a
experiência linguística prévia dos alunos. Por isso, a perspectiva de língua como
problema desencadeou um problema do ponto de vista do desenvolvimento e
fomento do multilinguismo, aspecto hoje presente na agenda da Unesco e em uma
diversidade de pesquisas acadêmicas.
É possível dizer que a perspectiva que orienta esses modelos é a de língua como
direito, uma vez que a língua que o aluno traz de seu convívio familiar é reconhecida
pela instituição escolar.
Modelo de transição
substituição das línguas maternas dos alunos pela língua da sociedade
majoritária e assimilação cultural;
Modelo de manutenção
manutenção das línguas maternas dos alunos e fortalecimento de sua
identidade linguística e cultural;
Modelo de enriquecimento
enriquecimento e desenvolvimento dos repertórios linguísticos dos alunos,
visando á pluralidade de línguas e culturas.
Isso leva os alunos a aprenderem a língua de modo indireto, por meio da exposição.
Além disso, como a língua faz parte do cenário sociolinguístico da região, a imersão
os leva a adquirirem a língua naturalmente em contexto real de uso.
Devido à percepção cada vez maior, a nível mundial, de que a pluralidade de línguas
é um importante patrimônio da humanidade e um recurso que deve contribuir para
a promoção de vivências harmoniosas entre diferentes povos, podemos ampliar a
noção de Educação Bilíngue para a de Educação Multilíngue, possibilitando maiores
oportunidades de conhecimentos e ampliando as oportunidades de trocas em mais
línguas.
Para Berger (2015), “os modelos centrados no ensino de uma língua nacional única,
que tratam as demais línguas somente sob o estatuto de línguas estrangeiras, são
considerados inadequados nesse novo milênio. O reconhecido multilinguismo
existente no âmbito dos países (ainda que tardio) e o intenso fluxo de pessoas, suas
línguas e culturas colocam, dentre os desafios da atualidade, a necessidade de se
pensar outras formas de encarar a presença e o lugar das línguas nas escolas e
outras formas de encarar o bi/multi/plurilinguismo, de modo que deixem de ser
tidos como um problema para os processos de ensino-aprendizagem e possam ser
encarados como potencialidade para a construção de sociedades plurais.”
Você chegou ao final desta Unidade de estudo. Caso ainda tenha dúvidas, reveja o
conteúdo e se aprofunde nos temas propostos. Até a próxima!
Objetivo de aprendizagem
Ao final desta unidade, você será capaz de analisar diferentes propostas de ações
pedagógicas e projetos de valorização do bi/multilinguismo na escola
Ao fazer isso, além de propiciar maior integração entre o que ocorre na vida cotidiana
e o que se passa na escola, as salas de aula também podem se tornar espaços
de reconhecimento e valorização da pluralidade. Como consequência, as escolas
podem ser espaços de fomento à convivência harmoniosa entre pessoas de línguas
e culturas diversas.
Muitos professores novos esperam ensinar os alunos da forma como eles mesmos
aprenderam, por isso pode ser um choque que alguns dos alunos ainda não sejam
proficientes na língua de ensino ou tenham um conhecimento cultural diferente
daquele presente no currículo e materiais didáticos que os professores devem usar.
O grande desafio das escolas localizadas nesses contextos está em propor formas de
gestão da pluralidade linguística nas práticas pedagógicas, que tenham como objetivo
valorizar a presença de alunos bilíngues e plurilíngues, respeitando e acolhendo
seus repertórios diversificados e compreendendo-os como potenciais recursos para
a construção de espaços plurais que visem o enriquecimento linguístico e cultural
de todos.
Muito conhecido pela sua sigla PEIF, o Programa Escolas Interculturais de Fronteira
teve seu início em 2005, a partir de um esforço bilateral, entre Brasil e Argentina, para
construir uma identidade regional bilíngue em português e espanhol, no âmbito do
Mercosul , respaldado em uma cultura de paz e de cooperação fronteiriça. A partir
do ano de 2006, as relações se estenderam a outros países fronteiriços, tendo um
perfil multilateral.
Cada um dos princípios apresentados é seguido de perguntas para que a reflexão esteja
no cerne do desenvolvimento de ações entre a equipe pedagógica:
Vejamos algumas questões que servem de base para reflexão entre a equipe pedagógica:
• Qual é o lugar que essas línguas ocupam nesses documentos (língua ma-
terna, língua estrangeira, língua adicional, língua da comunidade etc.)?
O Projeto Político Pedagógico de uma instituição de ensino deve ser o seu plano
global em que se definam as ações que se deseja implementar na educação e
seus objetivos em razão da realidade em que se situa e que se pretende construir.
Esse documento deve refletir a identidade da instituição e seu posicionamento em
relação à comunidade atendida. Por isso, em se tratando de escolas localizadas em
contextos plurais e de fronteira, o PPP deve incorporar reflexões quanto ao entorno
social e a forma de atender às demandas linguístico-educacionais na comunidade.
Que bom que você chegou até aqui! Agora é a hora de você testar seus conhecimentos.
Para isso, acesse o exercício avaliativo disponível no ambiente virtual. Bons estudos!
BERGER, Isis Ribeiro. Princípios para a gestão do plurilinguismo na escola: questões para
reflexão e proposição de ações. In: MORELLO, R.; MARTINS, M. F. Política Linguística
em contextos plurilíngues: desafios e perspectivas para a escola. Florianópolis:
Editora Garapuvu, 2016.
BERGER; Isis Ribeiro; KUERTEN, Miriam Regina Giongo. Mapeamento linguístico escolar
em um município da fronteira plurilíngue Brasil-Paraguai-Argentina: percepções e
práticas docentes. In: RIBEIRO; Simone Beatriz Cordeiro; BELONI, Wânia Cristiane.
Pesquisas em Políticas Linguísticas e Ensino de Línguas. São Carlos: Pedro e João
Editores, 2021. p. 87-108. D