Você está na página 1de 5

QUE É TRANSIÇÃO ECOLÓGICA?

Jayme Vita Roso


vitaroso@vitaroso.com.br

I
BUSCANDO UM SIGNIFICADO CLARO

1. Em voga essa expressão, usada para dar ideia de que é


imprescindível a ocorrência de uma atitude coerente, consciente, imediata e
ampla, para que ocorra algo para se preservar a vida, o planeta, enfim.

2. Mas o substantivo transição, segundo o Dicionário UNESP do


Português Contemporâneo tem o significado passagem ou mudança. E põe,
como usual é, usar-se para ser utilizado por um período temporal: tempo de
transição.

2.1. Em outras fontes como o Dicionário Etimológico da Língua


Portuguesa, simplesmente, “Transição, do lat., Transitione”. Transição não tem
o significado de transigir (v. intransitivo, terminar uma controvérsia com uma
transação).

3. O uso que está sendo feito do substantivo, seguido pelo qualificativo,


pode ser questionado. Trata-se de governança de uma mudança num tempo
de transição ecológica, como questionado na Encíclica “Laudato Si”, sobretudo.

Por quê?

Os melhores autores limitam-se ao explicitar que essa transição significa


que, quando a oferta quotidiana mundial de petróleo tenha atingido o pico,
“porque não se poder aumentar a quantidade de petróleo extraído, enquanto a
demanda quotidiana mundial vai superá-la, o aumento do petróleo será muito
pesado, o que se pode supor uma recessão mundial, com graves efeitos
desestabilizantes” (Leonardo Sawtati, Academia Alfonsiana, Roma).

1
O excelente artigo de Leonardo tece contundentes comentários acerca
da imprescindibilidade de uma boa governança para uma “transformação que
busque atingir os diversos âmbitos da vida e da economia” (ibid.).

II

UM HIATO: PREFIRO AMBIENTE AO SUBSTANTIVO ECOLOGIA,


AMBOS DA MESMA ESPÉCIE

4. A sisudez do falecido Papa Bento XVI muito o levou em vida a


desagradar ao populismo não diplomático que estendeu no seu pontificado.

É bom trazer neste breve escrito algumas de suas manifestações a


respeito do ambiente que prefiro à ecologia.

4.1. Demonstrando que, sem educação verdadeira, não se poderá


pensar em educar as novas gerações para preservar o ambiente.

Seguem:

4.1.1. De um pronunciamento de 23/02/2008: “A educação não é


somente obra ou trabalho dos educadores: é uma relação entre pessoas, na
qual, com o passar dos anos, entra em jogo a liberdade e a responsabilidade
daqueles que são educados” (BENEDETTO XVI. Pensieri di Fede per una Vita
Felice: Riflessioni, massime, esortazioni per la meditazione quotidiana. Milão:
Arnoldo Mondadori Editore S.p.A, 2012).

4.1.2. E, dias depois (01/03/2008), completa: “A educação constitui um


dos pontos principais da questão antropológica contemporânea”.

4.1.3. Ainda no mesmo ano e mês (07/02/2008): “Não basta mais uma
formação profissional sem formação do coração. E o coração não pode ser
formado sem ao menos o desafio da presença de Deus”. Porque a educação
não é e não pode ser jamais considerada como puramente utilitária. Visa,
sobretudo, formar a pessoa humana e preparar ele ou ela a viver a vida em sua
plenitude. Em poucas palavras: visa educar à sabedoria (17/09/2010).

2
5. Sempre Bento XVI, apontando para a verdadeira educação, disse: “Às
novas gerações é confiado o futuro do planeta no qual são evidentes os sinais
de um desenvolvimento que não sempre soube tutelar os delicados equilíbrios
da natureza. E antes que seja tarde é preciso adotar escolhas corajosas, que
sejam capazes de recriar uma forte aliança entre o homem e a terra”.

5.1. Para não fastidiar: “A degradação da natureza é estreitamente


conexa à cultura que modela a convivência humana (08/12/2009), porque “não
é difícil constatar que a degradação ambiental é comumente o resultado de
projetos políticos com visões equivocadas ou a perseguição de míopes
interesses econômicos (ibid.).

Encerro: se você quer cultivar a paz, cultive a criação (08/12/2009)”


(ibid.).

6. A pesquisa a que temos nos dedicado em publicações sérias e de


amplitude global nos levou ao ensaio escrito por 6 cientistas de diversas
instituições e de diferentes países. E o tema foi, se há direitos que preservam a
saúde dos solos. E eles concluem: “É essencial que aquilo que temos aqui seja
protegido e preservado. Drenar solos ricos em carbono, fazer colheitas de
carbono de turfeiras, ou destruir a biodiversidade do solo a fim de convertê-los
em maior maximização de renda em plantações para que estas possam gerar
lucro em curto-prazo, são autodestrutivas para a sociedade. Além disso, as
atividades que visam mitigar a mudança climática precisam reconhecer o papel
dos solos nos ciclos biogeoquímicos globais. Plantar árvores em pastagens
naturais e turfeiras, por exemplo, pode ser uma desvantagem indesejável para
a biodiversidade e as grandes quantidades de carbono no solo. Ação real é
urgentemente necessária para prevenir que vastas quantidades de solo fértil
desapareçam no fundo dos oceanos” (Science, vol. 379, n. 6627, 06/01/23, p.
34).

6.1. Prosseguindo, e os animais? E a sua sobrevivência? E a sua


extinção? Os animais, seguindo o que Martha Nussbaum, eminente filósofa e
professora de Direito, acrescentou à sua seleta bibliografia este título: Justice
for animals: our collective responsability (Nova Iorque: Simon & Schuster,
2023).

3
Do seu comentarista Dale Jamieson (Science, idem, p. 35): “A ideia
central é que uma injustiça possa vir a ocorrer quando o ‘esforço qualitativo’ de
um animal é inibido pelo ‘erro’ [humano] através de uma ação ou da
negligência de uma ação. Nussbaum argumenta em favor da superioridade de
sua teoria, em comparação com a de outros, e vai até o ponto de discutir o
dano de morte, conflitos trágicos, nossa responsabilidade para com os animais
em uma variedade de maneiras, conflitos de dever, e o papel da lei em se
atingir justiça pelos animais”.

E o degelo Ártico e Antártico, que necessita para que não ocorra com a
mesma intensidade?

7. Novamente, encontramos dois artigos de pesquisa nesta mesma


edição da Science (p. 29 e 78). Vamos dar continuação à contribuição que os
autores deram a tão delicado tema:

a) Dois professores que conviveram nas áreas glaciais (Islândia e


Canadá) escreveram: “Agindo agora será reduzida a perda dos glaciais –
muitos dos maiores glaciais do mundo ainda não desapareceram, mas com
uma pronta ação poderá se fazer a diferença”.

Para este tema os autores fizeram minuciosa pesquisa histórica na


Islândia e partir de 1890 e concluíram que pelo menos dois quilômetros
desapareceram.

Enfáticos, sustentam que o Acordo de Paris tem pouco contribuído para


isso e mais ainda que “a temperatura fique estabilizada em qualquer nível os
glaciais continuarão perdendo massa”.

Seguindo também as previsões, seja na Islândia seja na Antártida, os


níveis dos mares aumentarão e acontecerá um alarmante declínio da
biodiversidade.

Em suma, para os autores, esta década é crítica para se tornar uma


verdadeira catástrofe se atitudes sérias a respeito a questão climática não
forem tomadas.

b) Os glaciais e suas mudanças neste século: ainda da Science (ibid., p.


78/83): a contribuição de treze cientistas de seis nações produziram uma
4
impressionante demonstração das mudanças das regiões glaciais do mundo
inteiro: “Alasca, periferia do Ártico e do Subártico, o norte e o sul do Ártico,
Islândia, Ásia sudeste, Canadá e Estados Unidos oeste, sul da Ásia leste,
Escandinávia, norte da Ásia, Europa Central, Nova Zelândia, Cáucaso e
Oriente Médio”.

É incontestável o que está acontecendo e que ficou provado


cientificamente, através de comparações com projeções prévias, inclusive o
que não é comum como a importância das glaciais marítimas.

Os autores sumarizam e projetam: “Nossas projeções revelam uma


relação linear forte entre o aumento de temperatura global e perda de massa
glacial. Esta relação demonstra, a nível regional e global, que para cada
aumento de temperatura há consequências significativas para o degelo glacial
e, deste modo, o aumento do nível dos mares, mudando a hidrologia, ecologias
e perigos naturais. Baseado nos relatórios da COP26, a temperatura global
está estimada em aumentar 2,7ºC por ano, o que resultará em um célere
aumento do derretimento glacial e do nível dos oceanos” (ibid., p. 83).

Para concluir...

Estamos percebendo que as sociedades em geral estão vivendo sem


garantia jurídica. E o homem se esquece que o direito é condição do amor ao
próximo, também esquecido ou recusado ou rejeitado.

Cinicamente foram construídas diversas organizações internacionais que


não trazem a menor contribuição à humanidade.

A finalidade dessas organizações, se atuassem verdadeiramente e sem


outros fins, seria a arte da esperança.

Encerro as cortinas com a Encíclica de Bento XVI: “Deus é caridade: o


amor – caridade será sempre necessário também nas sociedades mais justas”,
e “Não há ordenamento jurídico justo que possa tornar supérfluo servir com
amor” (nº 28).

Você também pode gostar