Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Todo o conteúdo deste livro está licenciado sob uma Licença de Atribuição Creative
Commons. Atribuição-Não-Comercial-NãoDerivativos 4.0 Internacional (CC BY-NC-ND 4.0).
O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos
autores, inclusive não representam necessariamente a posição oficial da Atena Editora. Permitido o download da
obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la
de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.
Todos os manuscritos foram previamente submetidos à avaliação cega pelos pares, membros do Conselho Editorial
desta Editora, tendo sido aprovados para a publicação com base em critérios de neutralidade e imparcialidade
acadêmica.
A Atena Editora é comprometida em garantir a integridade editorial em todas as etapas do processo de publicação,
evitando plágio, dados ou resultados fraudulentos e impedindo que interesses financeiros comprometam os padrões
éticos da publicação. Situações suspeitas de má conduta científica serão investigadas sob o mais alto padrão de
rigor acadêmico e ético.
Conselho Editorial
Ciências Biológicas e da Saúde
Profª Drª Aline Silva da Fonte Santa Rosa de Oliveira – Hospital Federal de Bonsucesso
Profª Drª Ana Beatriz Duarte Vieira – Universidade de Brasília
Profª Drª Ana Paula Peron – Universidade Tecnológica Federal do Paraná
Prof. Dr. André Ribeiro da Silva – Universidade de Brasília
Profª Drª Anelise Levay Murari – Universidade Federal de Pelotas
Prof. Dr. Benedito Rodrigues da Silva Neto – Universidade Federal de Goiás
Prof. Dr. Cirênio de Almeida Barbosa – Universidade Federal de Ouro Preto
Profª Drª Daniela Reis Joaquim de Freitas – Universidade Federal do Piauí
Profª Drª Débora Luana Ribeiro Pessoa – Universidade Federal do Maranhão
Prof. Dr. Douglas Siqueira de Almeida Chaves – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Prof. Dr. Edson da Silva – Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri
Profª Drª Elizabeth Cordeiro Fernandes – Faculdade Integrada Medicina
Profª Drª Eleuza Rodrigues Machado – Faculdade Anhanguera de Brasília
Profª Drª Elane Schwinden Prudêncio – Universidade Federal de Santa Catarina
Profª Drª Eysler Gonçalves Maia Brasil – Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
Prof. Dr. Ferlando Lima Santos – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
Profª Drª Fernanda Miguel de Andrade – Universidade Federal de Pernambuco
Prof. Dr. Fernando Mendes – Instituto Politécnico de Coimbra – Escola Superior de Saúde de Coimbra
Profª Drª Gabriela Vieira do Amaral – Universidade de Vassouras
Prof. Dr. Gianfábio Pimentel Franco – Universidade Federal de Santa Maria
Prof. Dr. Helio Franklin Rodrigues de Almeida – Universidade Federal de Rondônia
Profª Drª Iara Lúcia Tescarollo – Universidade São Francisco
Prof. Dr. Igor Luiz Vieira de Lima Santos – Universidade Federal de Campina Grande
Prof. Dr. Jefferson Thiago Souza – Universidade Estadual do Ceará
Prof. Dr. Jesus Rodrigues Lemos – Universidade Federal do Piauí
Prof. Dr. Jônatas de França Barros – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Prof. Dr. José Aderval Aragão – Universidade Federal de Sergipe
Prof. Dr. José Max Barbosa de Oliveira Junior – Universidade Federal do Oeste do Pará
Profª Drª Juliana Santana de Curcio – Universidade Federal de Goiás
Profª Drª Lívia do Carmo Silva – Universidade Federal de Goiás
Prof. Dr. Luís Paulo Souza e Souza – Universidade Federal do Amazonas
Profª Drª Magnólia de Araújo Campos – Universidade Federal de Campina Grande
Prof. Dr. Marcus Fernando da Silva Praxedes – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
Profª Drª Maria Tatiane Gonçalves Sá – Universidade do Estado do Pará
Prof. Dr. Maurilio Antonio Varavallo – Universidade Federal do Tocantins
Profª Drª Mylena Andréa Oliveira Torres – Universidade Ceuma
Profª Drª Natiéli Piovesan – Instituto Federacl do Rio Grande do Norte
Prof. Dr. Paulo Inada – Universidade Estadual de Maringá
Prof. Dr. Rafael Henrique Silva – Hospital Universitário da Universidade Federal da Grande Dourados
Profª Drª Regiane Luz Carvalho – Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino
Profª Drª Renata Mendes de Freitas – Universidade Federal de Juiz de Fora
Profª Drª Sheyla Mara Silva de Oliveira – Universidade do Estado do Pará
Profª Drª Suely Lopes de Azevedo – Universidade Federal Fluminense
Profª Drª Vanessa da Fontoura Custódio Monteiro – Universidade do Vale do Sapucaí
Profª Drª Vanessa Lima Gonçalves – Universidade Estadual de Ponta Grossa
Profª Drª Vanessa Bordin Viera – Universidade Federal de Campina Grande
Profª Drª Welma Emidio da Silva – Universidade Federal Rural de Pernambuco
Tratado de neurologia clínica e cirúrgica
Formato: PDF
Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-258-0134-6
DOI: https://doi.org/10.22533/at.ed.346221304
Atena Editora
Ponta Grossa – Paraná – Brasil
Telefone: +55 (42) 3323-5493
www.atenaeditora.com.br
contato@atenaeditora.com.br
DECLARAÇÃO DOS AUTORES
Os autores desta obra: 1. Atestam não possuir qualquer interesse comercial que constitua um conflito de interesses
em relação ao artigo científico publicado; 2. Declaram que participaram ativamente da construção dos respectivos
manuscritos, preferencialmente na: a) Concepção do estudo, e/ou aquisição de dados, e/ou análise e interpretação
de dados; b) Elaboração do artigo ou revisão com vistas a tornar o material intelectualmente relevante; c) Aprovação
final do manuscrito para submissão.; 3. Certificam que os artigos científicos publicados estão completamente isentos
de dados e/ou resultados fraudulentos; 4. Confirmam a citação e a referência correta de todos os dados e de
interpretações de dados de outras pesquisas; 5. Reconhecem terem informado todas as fontes de financiamento
recebidas para a consecução da pesquisa; 6. Autorizam a edição da obra, que incluem os registros de ficha
catalográfica, ISBN, DOI e demais indexadores, projeto visual e criação de capa, diagramação de miolo, assim como
lançamento e divulgação da mesma conforme critérios da Atena Editora.
DECLARAÇÃO DA EDITORA
A Atena Editora declara, para os devidos fins de direito, que: 1. A presente publicação constitui apenas transferência
temporária dos direitos autorais, direito sobre a publicação, inclusive não constitui responsabilidade solidária na
criação dos manuscritos publicados, nos termos previstos na Lei sobre direitos autorais (Lei 9610/98), no art. 184
do Código Penal e no art. 927 do Código Civil; 2. Autoriza e incentiva os autores a assinarem contratos com
repositórios institucionais, com fins exclusivos de divulgação da obra, desde que com o devido reconhecimento de
autoria e edição e sem qualquer finalidade comercial; 3. Todos os e-book são open access, desta forma não os
comercializa em seu site, sites parceiros, plataformas de e-commerce, ou qualquer outro meio virtual ou físico,
portanto, está isenta de repasses de direitos autorais aos autores; 4. Todos os membros do conselho editorial são
doutores e vinculados a instituições de ensino superior públicas, conforme recomendação da CAPES para obtenção
do Qualis livro; 5. Não cede, comercializa ou autoriza a utilização dos nomes e e-mails dos autores, bem como
nenhum outro dado dos mesmos, para qualquer finalidade que não o escopo da divulgação desta obra.
EDITORES
Dr. André Giacomelli Leal
Dr. Paulo Henrique Pires de Aguiar
Dr. Ricardo Ramina
COLABORADORES
Dr Flávio Leitão Filho
Dr. Roberto Alexandre Dezena
Dr. Samuel Simis
Dr. Murilo Sousa de Meneses
Dr. José Marcus Rotta
COLABORADORES ACADÊMICOS
Cindy Caetano da Silva
Emilly Marien Dias da Silva de Souza
Júlia Lins Gemir
Kamila Blaka
Lauanda Raíssa Reis Gamboge
Pedro Henrique Simm Pires de Aguiar
Pedro Schmidt dos Reis Matos Figueiredo
Rafael Peron Carapeba
Thomás Rocha Campos
Vinicios Ribas dos Santos
APRESENTAÇÃO
Após três anos de trabalho, o Tratado de Neurologia Clínica e Cirúrgica da Academia Brasileira
de Neurocirurgia – ABNc está pronto. Uma obra importante, que reuniu os melhores neurocirurgiões e
neurologistas brasileiros, em prol do crescimento e desenvolvimento da nossa querida Academia.
Com 62 capítulos sobre diversos tópicos em Neurologia clínica e cirúrgica, cuidadosamente escritos
por especialistas em suas devidas áreas, contém 15 seções, cobrindo os seguintes temas: história da
Neurologia, neuroanatomia básica, semiologia e exames complementares, doenças vasculares, doenças
desmielinizantes, doenças dos nervos periféricos e neuromusculares, distúrbios do movimento, cefaleia
e epilepsia, demências e distúrbios cognitivos, neoplasias, dor e espasticidade, transtorno do sono,
neurointensivismo, doenças neurológicas na infância e outros.
Este livro é um espelho que reflete a todos a grande potência que o Brasil é em Neurologia e
Neurocirurgia.
Este Tratado de Neurologia Clínica e Cirúrgica surge num importante momento das áreas da
neurociência. Elaborar o diagnóstico neurológico correto sempre representou para o médico um desafio
intelectual desde os primórdios das ciências neurológicas modernas no século XVII e, para o paciente,
preocupação e ansiedade sobre o curso de sua enfermidade. No passado, a neurologia clínica era uma
ciência de doenças interessantes, porém muitas vezes intratáveis, praticada pelo fascínio especial da
“estética do diagnóstico”. A neurologia cirúrgica, por sua vez, ainda embrionária no início do século passado,
foi por muitas décadas frustrada, exibindo um altíssimo índice de mortalidade e morbidade, incompatível
com uma medicina que cura e alivia as enfermidades. Felizmente, essa situação mudou fundamentalmente
nas últimas décadas. As ciências neurológicas estão se tornando cada vez mais atraentes, ao ver o
tratamento como o ponto central da verdadeira tarefa médica, e sua eficiência terapêutica. Exemplos
incluem as doenças vasculares do sistema nervoso, as neoplasias benignas e malignas do sistema nervoso,
as doenças dos nervos periféricos, o tratamento de epilepsia, dos distúrbios do movimento, da demência
e distúrbios cognitivos, da dor e da espasticidade, bem como do sono, sem mencionar os avanços no
neurointensivismo.
Neste contexto, o presente Tratado de Neurologia Clínica e Cirúrgica surge como uma obra
imprescindível para o conhecimento do estado da arte das múltiplas áreas da neurociência. Escrito por
especialistas de excelência científica e profissional, este livro toma corpo numa ordem de grandes capítulos
sobre quadros clínicos e sintomas relacionados a problemas, guiando o leitor a encontrar rapidamente o
caminho para a seleção terapêutica específica. Os capítulos são divididos em seções de conhecimentos
gerais em história da neurologia, neuroanatomia básica, e semiologia e exames complementares. Estes são
seguidos de capítulos sobre quadros clínicos e doenças do sistema nervoso.
Apesar do grande número de autores contribuintes deste livro, souberam os Editores realizar um
trabalho exemplar ao conseguir dar a este Tratado uma estrutura uniforme e didática sobre o patomecanismo
e os princípios terapêuticos em discussão dos estudos de terapia mais importantes da atualidade.
Enfim, estamos perante uma obra que não deve faltar na biblioteca daqueles interessados no estudo
das áreas médicas e cirúrgicas neurológicas, e de todos os demais que desejam um livro de terapia
neurológica que funcione como ferramenta concreta de auxílio nas consultas do dia-a-dia.
CAPÍTULO 1..................................................................................................................................1
HISTÓRIA DA NEUROLOGIA
Hélio A. Ghizoni Teive
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213041
PARTE 2 - NEUROANATOMIA BÁSICA
CAPÍTULO 2................................................................................................................................12
NEUROANATOMIA DOS SULCOS E GIROS CEREBRAIS
Vanessa Milanese Holanda Zimpel
Natally Santiago
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213042
CAPÍTULO 3................................................................................................................................20
NEUROANATOMIA FUNCIONAL DO CÓRTEX CEREBRAL
Hugo Leonardo Doria-Netto
Raphael Vicente Alves
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213043
CAPÍTULO 4................................................................................................................................49
ANATOMIA DA MEDULA ESPINHAL
Luiz Roberto Aguiar
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213044
PARTE 3 - SEMIOLOGIA E EXAMES COMPLEMENTARES
CAPÍTULO 5................................................................................................................................55
SEMIOLOGIA NEUROLÓGICA
Alexandre Souza Bossoni
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213045
CAPÍTULO 6................................................................................................................................77
ELETRONEUROMIOGRAFIA
Maria Tereza de Moraes Souza Nascimento
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213046
CAPÍTULO 7................................................................................................................................87
INTERPRETAÇÃO DO EXAME DO LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO
Helio Rodrigues Gomes
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213047
SUMÁRIO
CAPÍTULO 8................................................................................................................................95
DOPPLER TRANSCRANIANO
Rafaela Almeida Alquéres
Victor Marinho Silva
Pamela Torquato de Aquino
Marcelo de Lima Oliveira
Edson Bor Seng Shu
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213048
CAPÍTULO 9..............................................................................................................................104
ECODOPPLER VASCULAR DE VASOS CERVICAIS
Cindy Caetano da Silva
Daniel Wallbach Peruffo
Samir Ale Bark
Viviane Aline Buffon
Robertson Alfredo Bodanese Pacheco
Sérgio Souza Alves Junior
https://doi.org/10.22533/at.ed.3462213049
CAPÍTULO 11............................................................................................................................126
POTENCIAIS EVOCADOS
Adauri Bueno de Camargo
Vanessa Albuquerque Paschoal Aviz Bastos
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130411
CAPÍTULO 12............................................................................................................................137
LINGUAGEM – DISTÚRBIOS DA FALA
André Simis
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130412
CAPÍTULO 13............................................................................................................................144
ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO ISQUÊMICO
Alexandre Luiz Longo
SUMÁRIO
Maria Francisca Moro Longo
Carla Heloisa Cabral Moro
Dara Lucas de Albuquerque
Pedro S. C. Magalhães
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130413
CAPÍTULO 14............................................................................................................................169
EMBOLIA PARADOXAL
Vanessa Rizelio
Kristel Larisa Back Merida
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130414
CAPÍTULO 15............................................................................................................................181
TRATAMENTO DE ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO AGUDO
André Giacomelli Leal
Jorge Luis Novak Filho
Sarah Scheuer Texeira
Camila Lorenzini Tessaro
Pedro Henrique Araújo da Silva
Matheus Kahakura Franco Pedro
Murilo Sousa de Meneses
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130415
CAPÍTULO 16............................................................................................................................194
VASCULITES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Leandro José Haas
Bernardo Przysiezny
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130416
CAPÍTULO 17............................................................................................................................208
VASOCONSTRIÇÃO ARTERIAL CEREBRAL REVERSÍVEL
Gisela Tinone
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130417
CAPÍTULO 18............................................................................................................................210
DISSECÇÃO ARTERIAL CERVICAL EXTRACRANIANA
Rafael Brito Santos
Albedy Moreira Bastos
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130418
CAPÍTULO 19............................................................................................................................223
TROMBOSE DOS SEIOS VENOSOS
Alexandre Bossoni
SUMÁRIO
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130419
CAPÍTULO 20............................................................................................................................233
ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO HEMORRÁGICO HIPERTENSIVO
Renata Faria Simm
Alexandre Pingarilho
Giovanna Zambo Galafassi
Fernanda Lopes Rocha Cobucci
Paulo Henrique Pires de Aguiar
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130420
CAPÍTULO 21............................................................................................................................237
HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA
Vitor Nagai Yamaki
Guilherme Marconi Guimarães Martins Holanda
Eberval Gadelha Figueiredo
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130421
CAPÍTULO 22............................................................................................................................248
ANEURISMAS INTRACRANIANOS
Matheus Kahakura Franco Pedro
André Giacomelli Leal
Murilo Sousa de Meneses
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130422
CAPÍTULO 23............................................................................................................................260
MALFORMAÇÕES ARTERIOVENOSAS CEREBRAIS
Marco Antonio Stefani
Apio Claudio Martins Antunes
Lucas Scotta Cabral
Eduarda Tanus Stefani
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130423
CAPÍTULO 24............................................................................................................................273
DOENÇAS INFLAMATÓRIAS DESMIELINIZANTES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Henry Koiti Sato
Matheus Pedro Wasem
Hanaiê Cavalli
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130424
SUMÁRIO
CAPÍTULO 25............................................................................................................................284
ESCLEROSE MÚLTIPLA
Douglas Kazutoshi Sato
Cássia Elisa Marin
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130425
CAPÍTULO 26............................................................................................................................304
NEUROMIELITE ÓPTICA
Mario Teruo Sato
Duana Bicudo
Henry Koiti Sato
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130426
CAPÍTULO 27............................................................................................................................327
EXAME FÍSICO DO PLEXO BRAQUIAL
Francisco Flávio Leitão de Carvalho Filho
Raquel Queiroz Sousa Lima
Francisco Flávio Leitão de Carvalho
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130427
CAPÍTULO 28............................................................................................................................346
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Frederico Mennucci de Haidar Jorge
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130428
CAPÍTULO 29............................................................................................................................359
SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ
Eduardo Estephan
Vinicius Hardoim
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130429
CAPÍTULO 30............................................................................................................................368
MIASTENIA GRAVIS
Camila Speltz Perussolo
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130430
CAPÍTULO 31............................................................................................................................386
MIOPATIAS
Leonardo Valente Camargo
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130431
SUMÁRIO
PARTE 7 - DISTÚRBIOS DO MOVIMENTO
CAPÍTULO 32............................................................................................................................402
DOENÇA DE PARKINSON
Hélio A. Ghizoni Teive
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130432
CAPÍTULO 33............................................................................................................................417
COREIA, TREMOR E OUTROS MOVIMENTOS ANORMAIS
Jacy Bezerra Parmera
Thiago Guimarães
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130433
CAPÍTULO 34............................................................................................................................440
DISTONIA
Natasha Consul Sgarioni
Beatriz A Anjos Godke Veiga
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130434
CAPÍTULO 35............................................................................................................................452
TRATAMENTO CIRÚRGICO DA DISTONIA
Paulo Roberto Franceschini
Bernardo Assumpção de Mônaco
Paulo Henrique Pires de Aguiar
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130435
CAPÍTULO 36............................................................................................................................473
CEFALEIAS
Paulo Sergio Faro Santos
Pedro André Kowacs
Olga Francis Pita Chagas
Marco Antonio Nihi
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130436
CAPÍTULO 37............................................................................................................................500
EPILEPSIA
Elaine Keiko Fujisao
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130437
SUMÁRIO
PARTE 9 - DEMÊNCIA E DISTÚRBIOS COGNITIVOS
CAPÍTULO 38............................................................................................................................509
DEMÊNCIAS
Fábio Henrique de Gobbi Porto
Alessandra Shenandoa Heluani
Guilherme Kenzzo Akamine
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130438
CAPÍTULO 39............................................................................................................................524
DOENÇA DE ALZHEIMER
Raphael Ribeiro Spera
Bruno Diógenes Iepsen
Tarcila Marinho Cippiciani
Renato Anghinah
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130439
CAPÍTULO 40............................................................................................................................536
HIDROCEFALIA DE PRESSÃO NORMAL
Amanda Batista Machado
Marcela Ferreira Cordellini
Hamzah Smaili
Sonival Cândido Hunevicz
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130440
PARTE 10 - NEOPLASIAS DO SISTEMA NERVOSO
CAPÍTULO 41............................................................................................................................548
VISÃO GERAL DAS NEOPLASIAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Carlos Alexandre Martins Zicarelli
Daniel Cliquet
Isabela Caiado Caixeta Vencio
Paulo Henrique Pires de Aguiar
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130441
CAPÍTULO 42............................................................................................................................563
NEOPLASIAS PRIMÁRIAS DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Erasmo Barros da Silva Jr
Ricardo Ramina
Gustavo Simiano Jung
Afonso Aragão
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130442
SUMÁRIO
CAPÍTULO 43............................................................................................................................575
TUMORES DE BASE DO CRÂNIO
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Pedro Henrique Simm Pires de Aguiar
Giovanna Zambo Galafassi
Roberto Alexandre Dezena
Saleem Abdulrauf
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130443
CAPÍTULO 44............................................................................................................................587
TUMORES INTRARRAQUIANOS
Paulo de Carvalho Jr.
Arya Nabavi
Paulo de Carvalho
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130444
CAPÍTULO 45............................................................................................................................609
CLASSIFICAÇÃO PATOLÓGICA DOS TUMORES DO SNC E DAS DOENÇAS NEUROLÓGICAS
Ligia Maria Barbosa Coutinho
Arlete Hilbig
Francine Hehn Oliveira
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130445
CAPÍTULO 46............................................................................................................................636
DOR
Pedro Antônio Pierro Neto
Giovanna Galafassi
Pedro Henrique Simm Pires de Aguiar
Paulo Henrique Pires de Aguiar
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130446
CAPÍTULO 47............................................................................................................................653
ESPASTICIDADE
Bernardo Assumpção de Monaco
Paulo Roberto Franceschini
Manoel Jacobsen Teixeira
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130447
CAPÍTULO 48............................................................................................................................666
NEUROMODULAÇÃO
Marcel Simis
SUMÁRIO
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130448
CAPÍTULO 49............................................................................................................................673
DISTÚRBIOS DO SONO
Leonardo Condé
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130449
PARTE 13 -PRINCÍPIOS EM NEUROINTENSIVISMO
CAPÍTULO 50............................................................................................................................686
NEUROINTENSIVISMO
Ana Maria Mendes Ferreira
Jakeline Silva Santos
Alysson Alves Marim
Tiago Domingos Teixeira Rincon
Kaio Henrique Viana Gomes
Guilherme Perez de Oliveira
Eduardo de Sousa Martins e Silva
Tamires Hortêncio Alvarenga
Gabriella Gomes Lopes Prata
João Pedro de Oliveira Jr.
Fernando Henrique dos Reis Sousa
Thiago Silva Paresoto
Luiz Fernando Alves Pereira
Gustavo Branquinho Alberto
Lívia Grimaldi Abud Fujita
Roberto Alexandre Dezena
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130450
CAPÍTULO 51............................................................................................................................701
HIPERTENSÃO INTRACRANIANA
Gustavo Sousa Noleto
João Gustavo Rocha Peixoto Santos
Wellingson Silva Paiva
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130451
CAPÍTULO 52............................................................................................................................713
TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO
Robson Luis Oliveira de Amorim
Daniel Buzaglo Gonçalves
Bruna Guimarães Dutra
SUMÁRIO
Henrique Martins
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130452
CAPÍTULO 53............................................................................................................................729
TRAUMATISMO RAQUIMEDULAR
Jerônimo Buzetti Milano
Heloísa de Fátima Sare
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130453
CAPÍTULO 54............................................................................................................................739
COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS ASSOCIADAS ÀS INTOXICAÇÕES EXÓGENAS E AOS
DISTÚRBIOS METABÓLICOS
André E. A. Franzoi
Gustavo C. Ribas
Isabelle P. Bandeira
Letícia C. Breis
Marco A. M. Schlindwein
Marcus V. M. Gonçalves
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130454
CAPÍTULO 55............................................................................................................................765
TRATAMENTO CIRÚRGICO DO INFARTO ISQUÊMICO MALIGNO DA ARTÉRIA CEREBRAL
MÉDIA. INDICAÇÕES E LIMITAÇÕES DA CRANIOTOMIA DESCOMPRESSIVA
Ápio Antunes
Rafael Winter
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Marco Stefani
Mariana Tanus Stefani
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130455
CAPÍTULO 56............................................................................................................................775
TRAUMATISMO CRÂNIO-ENCEFÁLICO GRAVE. PAPEL DA CRANIOTOMIA DESCOMPRESSIVA
Ápio Claudio Martins Antunes
Marco Antonio Stefani
Rafael Winter
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Mariana Tanus Stefani
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130456
CAPÍTULO 57............................................................................................................................784
INFECÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Danielle de Lara
João Guilherme Brasil Valim
SUMÁRIO
Sheila Wayszceyk
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130457
CAPÍTULO 58............................................................................................................................798
SEMIOLOGIA NEUROLÓGICA PEDIÁTRICA
Matheus Franco Andrade Oliveira
Juliana Silva de Almeida Magalhães
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130458
CAPÍTULO 59............................................................................................................................807
HIDROCEFALIA NA INFÂNCIA
Tatiana Protzenko
Antônio Bellas
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130459
CAPÍTULO 60............................................................................................................................817
PARALISIA CEREBRAL INFANTIL
Simone Amorim
Juliana Barbosa Goulardins
Juliana Cristina Fernandes Bilhar
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130460
PARTE 15 - OUTROS
CAPÍTULO 61............................................................................................................................838
A NEUROPSICOLOGIA NOS TRATAMENTOS NEUROCIRÚRGICOS
Samanta Fabricio Blattes da Rocha
Rachel Schlindwein-Zanini
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130461
CAPÍTULO 62............................................................................................................................853
APLICAÇÕES CLÍNICAS DE MODELOS DE MANUFATURA ADITIVA EM NEUROCIRURGIA
André Giacomelli Leal
Lorena Maria Dering
Matheus Kahakura Franco Pedro
Beatriz Luci Fernandes
Mauren Abreu de Souza
Percy Nohama
https://doi.org/10.22533/at.ed.34622130462
SOBRE OS EDITORES............................................................................................................867
SUMÁRIO
PARTE 1
HISTÓRIA DA NEUROLOGIA E CONSIDERAÇÕES GERAIS
ttps://doi.org/10.22533/at.ed.00000000000
CAPÍTULO 1
HISTÓRIA DA NEUROLOGIA
Capítulo 1 1
os seus estudos pioneiros sobre o nervo olfatório, córtex frontal; o tcheco Jan Evangelista Purkynê ou
além de estudos sobre os nervos periféricos e da Purkinje na grafia inglesa e germânica (1787-1869)
medula espinhal, entre outros, produzindo desta com os seus desenhos de neurônios, particularmente
forma, grandes contribuições científicas na área da região cerebelar; o alemão Theodor Schwann
da neurociência 9-11
. Por outro lado, tem-se que (1810-1882), que criou a chamada “teoria celular” e
ressaltar de forma notável as contribuições da que descreveu em 1839 a bainha de mielina; o italiano
escola francesa de Neurologia, no desenvolvimento Camilo Golgi (1843-1926), pela criação do método
desta especialidade médica, em particular com de coloração com o nitrato de prata, que permitiu a
os estudos magistrais do professor Jean-Martin outros cientistas, como o espanhol Santiago Ramón
Charcot (1825-1893) 12-14
. Há exatos 138 anos, y Cajal (1852-1934) estudar vários elementos
no ano de 1882, foi criada em Paris, França, no do sistema nervoso1. A propósito, a contribuição
famoso hospital La Salpêtrière, a primeira cátedra de Ramón e Cajal à Neurologia é imensa, com a
de doenças do sistema nervoso, que foi ocupada de definição da famosa doutrina neuronal, que o levou
forma brilhante pelo Professor Jean-Martin Charcot a ganhar o prêmio Nobel de 1906, juntamente com o
até seu falecimento, de forma prematura, no ano de professor Camilo Golgi de Pavia, Itália1. Acrescente-
189312-17. se a esses nomes a de Sir Charles Scott Sherrington
(1857-1952), da mesma forma vencedor do prêmio
Nobel, neurofisiologista inglês, que criou o conceito
NEUROLOGIA: O INÍCIO de sinapse1.
De uma forma geral, considera-se que a
Neurologia se iniciou com os estudos de Thomas
Willis (1621-1675) e seus colegas em Oxford, no A CONTRIBUIÇÃO DO PROFESSOR
JEAN-MARTIN CHARCOT E DA ESCOLA
Reino Unido, sendo Willis alcunhado, segundo
FRANCESA DE NEUROLOGIA
Feindel, como o fundador da Neurologia1,7,8.
De uma forma geral, pode-se dizer que a
Willis foi professor de Filosofia Natural definição da Neurologia clínica como verdadeira
da Universidade de Oxford e publicou livros de especialidade médica ocorreu, sem sombra
anatomia comparada, fisiologia e patologia do de dúvidas, no ano de 1882, quando foi criada
encéfalo e dos nervos. No seu famoso livro, a cátedra de doenças do sistema nervoso, no
intitulado “Cerebri Anatome” de 1964, Willis cunhou Hospital de la Salpêtrière, em Paris, na França, cujo
o termo “Neurologia” como significado de “doctrine primeiro professor foi o grande mestre Jean-Martin
(or teaching) of the nerves” 1,7,8
. Charcot1,7,12-16,18,19.
As contribuições de Thomas Willis à Neurologia Jean-Martin Charcot (1825-1893) (Figura
foram inúmeras, mas pode-se resumir os estudos 1) nasceu em Paris, em 29 de novembro de 1825,
de neuroanatomia, com a descrição do famoso filho de um construtor de carruagens, e faleceu em
círculo ou polígono de Willis, de neurofisiologia e 16 de agosto de 1893, aos 68 anos, já consagrado
com descrições monumentais de doenças como mundialmente como o pai da Neurologia, na
a epilepsia do lobo temporal, miastenia gravis e província de Morvan, no interior da França12-14.
outras 1,7,8
.
Capítulo 1 2
sociedade francesa12-14.
um grande asilo, com uma população de cerca Tornaram-se nesta época mundialmente
de 5000 pacientes de todas as idades, a princípio famosas, e repletas de assistentes de todas as
predominantemente mulheres, geralmente partes do mundo, as aulas do professor Charcot com
portadores de doenças crônicas, incuráveis, de discussão de casos clínicos, feitas de improviso, às
todos os tipos, particularmente do sistema nervoso. terças-feiras, no Hospital La Salpêtrière, conhecidas
Charcot descrevia aquele hospital como o “grande como “Leçons du mardi à La Salpêtrière”. Nesta
asilo da miséria humana”14. Apenas a título de época, Charcot era conhecido como o “César da
curiosidade, este hospital continua extremamente Salpêtrière”, em face do seu temperamento austero,
ativo, abrigando um grande serviço de Neurologia, reservado, quase taciturno, bem como da sua
e sendo considerado atualmente o maior hospital autoridade férrea e da sua liderança entre os seus
público geral de Paris. pares12-15,21.
Entre as influências que Charcot teve na Babinski, Guinon, Souques e Meige. Com relação
sua formação acadêmica, devem-se citar as de aos inúmeros médicos e neurologistas estrangeiros
Duchenne de Boulogne (que ele considerava o seu que estagiaram sob sua supervisão, deve-se
grande mestre em Neurologia), do professor Rayer lembrar dos nomes de Bechterew, Darkschewitch,
(que o ajudou sobremaneira na carreira médica), de Kojewnikow, Marinesco, Sachs e Sigmund Freud12-14.
E.F. Vulpian (íntimo amigo e colaborador científico) Charcot foi o responsável pela definição de
e também do neurologista inglês J.H. Jackson, vários sinais semiológicos em Neurologia, sendo os
por quem Charcot tinha grande admiração 12-14
. mais importantes: 1) a caracterização dos diferentes
A ascensão científica de Charcot na França, tipos de distúrbios urinários de causa neurológica; 2)
posteriormente em toda a Europa e finalmente em a artropatia de causa neurogênica (conhecida como
todo o mundo, coincidiu com uma época de grande “articulação de Charcot”); 3) a síndrome piramidal; 4)
progresso econômico, político e sócio-cultural da a semiologia do corno anterior; 5) a prosopagnosia;
Capítulo 1 3
e 6) os sinais clínicos da doença de Parkinson12-14,19. as quais foram posteriormente publicadas na
“Iconographie Photographique de la Salpêtrière”.
Em relação à descrição de doenças
Este procedimento antecedeu em muitos anos a
neurológicas, pode-se citar, de forma resumida, as
filmagem de pacientes com distúrbios do movimento,
seguintes contribuições magistrais de Charcot: 1) a
que atualmente permite melhor análise e estudo
descrição da esclerose lateral amiotrófica (conhecida
dos diferentes tipos de movimentos anormais12-14,27.
como doença de Charcot); 2) a esclerose múltipla
Dentre os inúmeros discípulos de Charcot, Pierre
(definida por Charcot e Vulpian como esclerose em
Marie (1853-1940) (Figura 2A) foi, sem sombra
placas); 3) a artropatia tabética; 4) a doença de
de dúvida, o discípulo mais combativo e atuante
Charcot-Marie-Tooth; 5) a claudicação intermitente,
de Charcot, com expressivas contribuições à
de origem arterial; 6) os estudos de localização
Neurologia mundial, dentre elas a descrição da
cerebral e de doenças da medula espinhal (com a
ataxia cerebelar hereditária, a ataxia cerebelar
sistematização dos tratos e fascículos da medula
idiopática de início tardio, conhecida como doença
espinhal); 7) a patogênese da hemorragia cerebral
de Marie-Foix-Alajouanine; e, a acromegalia, além
(através da descrição dos microaneurismas
da coparticipação na descrição da síndrome de
de Charcot-Bouchard); 8) os estudos sobre
Charcot-Marie-Tooth28. Joseph Babinski (1857-1932)
afasias, sífilis, paralisia facial, epilepsia (em
(Figura 2B) é o descobridor do sinal neurológico mais
particular a clássica descrição dos automatismos
famoso em todo o mundo, o sinal de Babinski, mas
deambulatórios); e finalmente, 9) os estudos sobre
tem outras notáveis contribuições à Neurologia, com
a histeria (histero epilepsia) e hipnose12-14,19. Estas
destaque para os seus trabalhos sobre a semiologia
últimas contribuições de Charcot foram alvo de muita
neurológica, em particular a síndrome cerebelar, além
discussão e críticas entre seus contemporâneos,
dos estudos sobre histeria29,30. Outro discípulo e fiel
motivando inúmeras polêmicas envolvendo seu
escudeiro do professor Charcot foi Georges Gilles
nome, inclusive colocando sob suspeita o caráter
de la Tourette (1857-1904) (Figura 2C), que ficou
científico dos seus estudos na época. A utilização
mundialmente famoso após a descrição da síndrome
do método de hipnose no tratamento de pacientes
que carrega o seu nome, a síndrome dos tiques e
histéricos foi definida por seu colaborador e
comorbidades neuropsiquiátricas, conhecida como
discípulo, Pierre Marie, como um “leve ponto fraco”
síndrome de Tourette25,31. Jules-Joseph Dejerine
do grande mestre12-14,17,22.
(1849-1917) (Figura 3) foi um dos sucessores da
Com relação aos distúrbios do movimento, cátedra de Charcot, mesmo sem ter tido a sua
Charcot teve participação decisiva na descrição formação acadêmica no hospital de la Salpêtrière.
de várias enfermidades, tanto hipocinéticas, como Dejerine tem inúmeras contribuições à Neurologia
a doença de Parkinson, como hipercinéticas, como mundial, sendo considerado um dos maiores
por exemplo, os tiques e a síndrome de Tourette, neurologistas de todos os tempos18,32,33. Há que se
além de contribuir com opiniões e ideias em destacar seus estudos sobre neuropatias periféricas,
outras afecções como as ataxias locomotoras (em plexopatia braquial, miopatias, a descrição da atrofia
especial a ataxia de Friedreich), as coreias (de olivo-ponto-cerebelar, a síndrome talâmica, além
Huntington e de Sydenham) e as síndromes agora dos estudos sobre alexia e afasia18,32-34. Contudo,
definidas sob o nome “startle – síndromes do susto sem sombra de dúvidas, na Neurologia francesa
exagerado” (franceses saltitantes do Maine, Latah, e mundial o nome de Charcot é o mais notável, e
Myriachti)12-14,19,20,23-26. provavelmente ele fez mais contribuições para a
Deve-se ressaltar também que Charcot iniciou nosologia médica (medicina interna e Neurologia) do
em seu serviço a documentação fotográfica dos que qualquer outro indivíduo na história da medicina
pacientes com várias enfermidades neurológicas, em geral1,12-14,18,35.
Capítulo 1 4
NEUROLOGIA NO MUNDO
Vários países europeus, como a Itália,
Espanha, Portugal e Rússia, entre outros, assim
como o Japão, na Ásia, tiveram também importantes
contribuições à Neurologia, em diferentes épocas e
em diversas áreas. Contudo, nesta revisão histórica,
daremos ênfase apenas às escolas britânica, alemã
Figura 2: A. Pierre Marie (1853-1940); B. Joseph Babinski
(1857-1932) e C. Georges Gilles de la Tourette (1857- e, finalmente, a da América do Norte (EUA)1,2.
1904).
Fonte: Acervo do autor. A contribuição da escola britânica de
Neurologia
Característica única dos primórdios da
Neurologia inglesa é sua relativa independência
do meio acadêmico formal. Neste sentido, os
pioneiros ingleses não tiveram cargo de “Professor”.
Isto se aplica a Thomas Sydenham (1624-1689)
que, educado em Oxford, teve prática privada em
Londres. Sua maior contribuição neurológica é a
descrição da coreia reumática, conhecida também
como de Sydenham, em 16871,37. Vale ressaltar
Figura 3: Jules Dejerine (1849-1917). que sua importância na história da medicina é mais
Fonte: Acervo do autor. relacionada à introdução do método científico. Ele
circulava no meio do iluminismo inglês liderado pelo
médico e filósofo John Locke (1632-1704)37. John
Hughlings Jackson (1835-1911) (Figura 4A), criador
da Neurologia científica e pai da Neurologia inglesa,
também nunca foi professor, mas sim médico do
London Hospital e, posteriormente, do National
Hospital for Paralysis and Epilepsy. Este mudou
de nome para National Hospital for Neurology and
Neurosurgery, Queen Square. A contribuição de
Jackson é mais lembrada na área de epilepsia, com
descrição de vários aspectos, incluindo a somatotopia
Figura 4: A. John H. Jackson (1835-1911) e B. William
Gowers (1845-1915). cortical e a marcha jacksoniana. Entretanto, ele
de outros neurologistas, em particular o nome de da Neurologia britânica é Sir William Richard Gowers
Capítulo 1 5
acadêmica. Gowers era observador meticuloso, Disease and Movement Disorders Society24. Por fim,
fazendo anotações cuidadosas de suas avaliações temos que destacar o nome do professor Andrew J.
que tornaram possível escrever seu “A Manual of Lees (1947), pesquisador de destaque na área de
Diseases of the Nervous System” 1,39,40,41
. Este tratado, distúrbios do movimento, em particular, na doença de
cuja edição inicial é de 1886 ainda se encontra no Parkinson, onde é considerado o pesquisador com
prelo, sendo conhecido pelos jovens neurologistas maior número de citações nesta área. O professor
ingleses como “The Bible”. A contribuição de Gowers Lees teve grande influência no desenvolvimento da
estende-se a várias áreas da Neurologia, tendo área dos distúrbios do movimento no Brasil45,46.
descrito o peculiar modo de portadores de miopatias
se levantarem do solo (sinal de Gowers). Na área A escola alemã de Neurologia
de movimentos anormais, definiu com precisão a Dentre as inúmeras contribuições da escola
síndrome coreica e suas principais causas. Como à alemã de Neurologia pode-se destacar o papel
época a febre reumática era endêmica em Londres, de três importantes neurólogos, Moritz Heinrich
ele descreveu com rigor as manifestações clínicas Romberg (1795-1873) (Figura 5A), Wilhelm Erb
de coreia de Sydenham37,40,41. Ainda que não tenha (1880-1883) (Figura 5B), e Ernst Adolph G. G.
sido inglês e tampouco neurologista, é obrigatório von Strümppell (1852-1925) (Figura 5C)1,2. Moritz
citar aqui o nome de Sir William Osler (1849-1919). Romberg é considerado um dos fundadores da
Clínico geral nascido do Canadá teve carreira Neurologia na Alemanha, e publicou um dos
peripatética, inicialmente em seu país, depois primeiros tratados de Neurologia em todo o mundo.
fundando o John Hopkins Hospital nos EUA, mudou- Seu nome tonou-se famoso por ter identificado
se para o Reino Unido, onde se tornou Professor em um sinal de ataxia sensitiva ou aferente bastante
Oxford. Na Neurologia, teve contribuição grande à conhecido, que é encontrado nas doenças da
definição etiológica das coreias42. Há outros nomes coluna dorsal da medula espinhal, chamado de
da Neurologia britânica na transição entre os séculos sinal de Romberg47. William Erb (Figura 7), também
XIX e XX que precisam ser citados. O primeiro é reconhecido como um dos fundadores da Neurologia
Samuel Alexander Kinnier Wilson (1878-1937), alemã, tem o seu nome mundialmente aclamado
nascido nos EUA, mas com carreira desenvolvida pelos seus estudos em atrofia muscular progressiva,
na Inglaterra e que descreveu a doença que leva em particular as distrofias musculares48,49. Já Adolph
seu nome43. Sir Gordon Morgan Holmes (1876-1965) Strümppell tem o seu nome ligado às paraplegias
nasceu em Dublin quando a Irlanda ainda era parte espásticas hereditárias, ou doença de Strümppell-
do Reino Unido e, após um período na Nova Zelândia Lorain, como é conhecido35,50. É indispensável
e Alemanha, estabeleceu-se no National Hospital for mencionar o papel de Alois Alzheimer (1864-
Nervous Diseases, Queen Square, em Londres. Seus 1915). Embora ele se considerasse psiquiatra
estudos mais significativos foram sobre cerebelo e e neuropatologista, sua maior contribuição foi a
córtex visual, baseando-se na observação detalhada descrição da doença que hoje é conhecida pelo seu
de feridos na Primeira Guerra Mundial, quando atuou nome e a causa mais comum de demência em todo
como médico do exército britânico44. Já próximo ao o mundo51. Outro nome incontornável na Alemanha
momento em que nos encontramos, é mandatório é o neurologista e neuropatologista berlinense,
mencionar a figura de Charles David Marsden (1938- Fritz Jakob Heinrich Lewy (1885-1950), também
1968), que, sem qualquer hipérbole, revolucionou conhecido como Friedrich Lewy. Ele descreveu as
o modo de se observar e classificar movimentos inclusões neuronais na doença de Parkinson que
anormais. Nenhum setor desta área neurológica caracterizam esta enfermidade e são conhecidas
deixou de receber sua contribuição, além de ter como corpúsculos de Lewy. De origem judaica, ele
sido um dos fundadores da International Parkinson foi forçado pelos nazistas a abandonar a Alemanha
Capítulo 1 6
em 1933, estabelecendo-se nos EUA52. da raiz dorsal, Denny-Brown também desenvolveu
pesquisas com os núcleos da base, publicando um
livro muito famoso intitulado “The basal ganglia and
their relation to disorders of movement” 55. Raymond
Adams é considerado um dos mais brilhantes
neurologistas do século XX, com inúmeras
contribuições à Neurologia americana e mundial. Ele
era neurologista de altas qualidades técnicas, com
grande experiência na área de neuropatologia, além
da descrição de várias síndromes clínicas como,
Figura 5: A. Moritz Heinrich Romberg (1795-1873); B.
Whilem Erb (1840-1921); e C. Ernst Adolph G. G. von
por exemplo, a hidrocefalia de pressão normal. Em
Strümppell (1852-1925). 1977 ele publicou o seu livro mais famoso, intitulado
Fonte: Acervo do autor. “Principles of Neurology” (Miller Fisher, 2010)56.
Miller Fisher nasceu em Waterloo, no Canadá e
graduou-se médico na Universidade de Toronto em
A influência da Neurologia dos Estados 1938. Ele realizou a sua formação em Neurologia
Unidos da América
em Montreal e depois em neuropatologia em Boston,
Silas Weir Mitchell (1829-1914) é considerado
EUA. Trabalhou na Universidade de McGill, em
um dos mais celebrados neurologistas dos EUA, com
Montreal, Canadá, antes de fixar-se nos EUA, em
importantes contribuições para o desenvolvimento
Boston, inicialmente no Massachusetts General
da Neurologia americana e mundial no século
Hospital e, depois, na Universidade de Harvard. Miller
XIX. A partir de sua experiência na Guerra Civil
Fisher foi o responsável pela criação do primeiro
americana, ele descreveu a causalgia (síndrome
serviço mundial de investigação e tratamento de
da dor regional complexa), o membro fantasma,
pacientes com acidente vascular encefálico, e
e as lesões traumáticas dos nervos periféricos1,2.
suas contribuições à Neurologia mundial são de
Mitchell fundou o primeiro hospital de Neurologia na
grande monta, com definição do ataque isquêmico
Filadélfia (EUA), bem como a Associação Americana
transitório, de várias síndromes vasculares do
de Neurologia, da qual foi o primeiro presidente45,53.
sistema nervoso central, amnésia global transitória,
Inúmeros neurologistas, nascidos ou radicados
além da descrição da síndrome de Miller-Fisher57.
nos EUA, tiveram enorme contribuição para o
desenvolvimento da Neurologia mundial, e pode-se
destacar dentre eles os nomes de Derek Denny-
Brown (1901-1981) (Figura 6A), Raymond Adams
(1911-2008) (Figura 6B) e Charles Miller Fisher
(1913-2012) (Figura 6C)54-57. Denny-Brown nasceu
na Nova Zelândia, com treinamento neurológico em
Oxford, na Inglaterra e, posteriormente, no renomado
serviço de Neurologia do National Hospital, Queen
Square, em Londres, onde desenvolveu o serviço de
doenças neuromusculares. Posteriormente, radicou- Figura 6: A. Derek Denny-Brown (1901-1981); B.
Raymond D. Adams (1911-2008); e C. Charles Miller
se nos EUA, onde foi professor de Neurologia da
Fisher (1913-2012).
Harvard Medical School e diretor da Unidade
Fonte: Acervo do autor.
Neurológica da Harvard no renomado Hospital
Boston City. Além de suas pesquisas com o gânglio
Capítulo 1 7
Teixeira Brandão, Francisco de Castro, Aloysio de
A NEUROLOGIA NO BRASIL
Castro, Faustino Esposel e José Dantas de Souza
A criação da Neurologia no Brasil teve forte
Leite. Souza Leite realizou estágio no serviço
influência da escola neurológica francesa2,58,59,60.
do Professor Charcot em Paris, sob supervisão
Primeiramente no Rio de Janeiro, com Antônio
do Professor Pierre Marie, e publicou junto com
Austregésilo Rodrigues de Lima, o pioneiro da
Marie um trabalho de excepcional qualidade sobre
Neurologia brasileira e primeiro professor da Cátedra
a acromegalia, considerada a primeira descrição
de Neurologia da Faculdade de Medicina do Rio de
mundial da doença62. Deve-se lembrar ainda as
Janeiro, que ele assumiu em 191261. Posteriormente
contribuições dos professores Deolindo Augusto de
em São Paulo, em 1925, com a indicação do
Nunes Couto, Adherbal Pinheiro Machado Tolosa,
professor Enjolras Vampré para a coordenação da
Paulino Watt Longo, Paulo Pinto Pupo, Oswaldo
Clínica Neurológica e Psiquiátrica da Faculdade de
Lange, Fausto Guerner, Antonio Branco Lefèvre
Medicina e Cirurgia de São Paulo. Posteriormente
e Celso Machado de Aquino2,58. Cumpre destacar
esta seria renomeada como Faculdade de Medicina
no panteão da Neurologia brasileira a importante
da Universidade de São Paulo2,58-60.
contribuição do neurofisiologista Aristides Leão que
se tornou mundialmente conhecido pelo seu trabalho
sobre a “depressão alastrante” (“Leão's spreading
depression”) publicado em 194563.
do professor Charcot, como Pierre Marie e Babinski, da Europa e de outros países do mundo na
além também de estágios no serviço do famoso Neurologia brasileira não foi tão expressiva nos
professor Jules-Joseph Dejerine2,58,59,60,61. Há seus primórdios. Houve sim uma grande influência
outros médicos e professores de Neurologia no brasileira, no final do século XIX e no início do século
no Brasil, como os nomes de José Martins da Cruz uma maior influência da Neurologia britânica e,
Jobim, José Francisco da Silva Lima, João Vicente deve-se ressaltar, contudo, que a partir da segunda
Torres Homem, Juliano Moreira, João Carlos metade do século XX a escola neurológica brasileira
passou a sofrer grande influência da moderna escola
Capítulo 1 8
de Neurologia dos EUA, o que se mantém até os 20. Kundu AKR. Charcot in Medical Eponyms. JAPI.
2004;53:716-718.
dias atuais.
21. Souques A.Charcot Intime. La Presse Medicale.
1925;42:693-698.
22. Sigerson G. Lectures on the diseases of the nervous
REFERÊNCIAS system by J-M Charcot. New York: Hafner Publishing
1.Finger S. Origins of Neuroscience. A history of Company; 1962.
explorations into brain function. New York: Oxford University 23. Teive HAG. Charcot´s contribution to Parkinson's
Press; 1994. disease. Arq Neuropsiquiatr. 1998;56:141-145.
2. Gomes MM. Marcos Históricos da Neurologia. Rio de 24. Teive HAG, Zavala JA, Iwamoto FM, Sa D, Carraro H Jr,
Janeiro: Editora Científica Nacional; 1998. Werneck LC. Contributions of Charcot and Marsden to the
3. Józefowicz RF. Neurophobia: The fear of neurology development of movement disorders in the 19th and 20th
among medical students. Arch Neurol. 1994;51(4):328-329. centuries. Arq Neuropsiquiatr. 2001;59:633-636.
4. Solorzano GE, Józefowicz RF. Neurophobia: a chronic 25. Teive HAG, Chien HF, Munhoz RP, Barbosa ER.
disease of medical students. Neurology. 2015;85(2):116- Charcot´s contribution to the study of Tourette´s syndrome.
117. Arq Neuropsiquiatr. 2008;66(4):918-921.
5. Freeman WD, Valtz KA. The future of Neurology. Neurol 26. Bonduelle M. Charcot, anatomo-pathologist. Arch Anat
Clin. 2010;28:537-561. Cytol Pathol. 1994;42:171-180.
6. Fuller GN. Neurophilia: a fascination for neurology-a new 27. Teive HAG, Almeida SM, Arruda WO, Sá DS, Werneck
syndrome. Pract Neurol. 2012;12(5):276-278. LC. Charcot and Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2001;59:295-
299.
7. Clifford Rose F. A short history of Neurology. The British
contribution 1660-1910. Oxford: Butterworth Heinemann; 28. Almeida GM, Germiniani FMB, Teive HAG. The seminal
1999. role played by Pierre Marie in Neurology and Internal
Medicine. Arq neuropsiquiatr. 2015;73(10):887-889.
8. Feindel W. The beginnings of neurology: Thomas Willis
and his circle of friends. In: Clifford Rose F (ed). A short 29. Pedroso JL, Barsottini OG, Goetz CG. Babinski's
history of Neurology. The British contribution 1660-1910. contributions to cerebellar symptomatology: building the
Oxford: Butterworth Heinemann; 1999. pp.1-18. basis of the Neurological examination. Arq Neuropsiquiatr.
2013;71(12):973-975.
9. Bayat M. Pioneers in neurology: Leonardo da Vinci
(1452-1519). J Neurol. 2020;267(7):2176-2178. 30. Philippon J, Poirier J. Joseph Babinski. A biography.
Oxford University Press, New York; 2009.
10. Pevsner J. Leonardo da Vinci's contributions to
neuroscience. Trends in Neurociences. 2002;25(4):217-220. 31. Walusinski O. Georges Gilles de la Tourette. Beyond the
eponym. Oxford University Press, New York; 2019.
11. Pevsner J. Leonardo da Vinci's studies of the brain.
Lancet. 2019;393(10179): 1465-1472. 32. Ellis H. Jules Joseph Dejerine: distinguished French
neurologist. Br J Hosp Med. 2017;78(2):115.
12. Guillain GJM. Charcot; his life-his work. New York: Paul
B. Hoeber; 1959. 33. Kondo GK, Schramm CC, Novaes MRR, Teive HAG.
Jules Joseph Dejerine: and outstanding neurologist and
13. Goetz CG. Charcot: the clinician. The Tuesday lessons. Charcot´s enemy. Arq Neuropsiquiatr. 2018;76(5):353-354.
New York: Raven Press; 1987.
34. Teive HAG, Ferreira MG, Camargo CHF, Munhoz RP,
14. Goetz CG, Bonduelle M, Gelfand T. Charcot: Walusinski O. The duels of Pierre Marie and Jules Dejerine.
Constructing Neurology. New York: Oxford Univ Press; Eur Neurol. 2020;83(3):345-350.
1995.
35. Lehmann HC, Hartung HP, Kiesseier BC. Jean-Martin
15. Guinon G. Charcot Intime. Hommage a Charcot. Paris Charcot in German neurology. Nervenarzt. 2004;75(2):187-
Medical. 1925;23:511-516. 192.
16. Goetz CG. Chapter 15: Jean-Martin Charcot and the 36. Aminoff MJ. Brown-Séquard. An improbable genius who
anatomo-clinical method of neurology. Handb Clin Neurol. transformed medicine. Oxford University Press, New York;
2010;95:203-212. 2011.
17. Goetz CG, Bonduelle M. Charcot as therapeutic 37. Vale TC, Cardoso F. Chorea: A journey through history.
interventionist and treating neurologist. Neurology. 1995; Tremor Other Hyperkinet Mov (N Y). 2015;5:5-296.
45:2102-2106.
38. Critchley M, Critchley EA. John Hughlings Jackson.
18. Miller H. Three great neurologists. Proc R Soc Med. Father of English Neurology. Oxford University Press, New
1967;60:399-405. York; 1998.
19. Lellouch A. Charcot, discoverer of diseases. Rev Neurol 39. Scott A, Eadie M, Lees AJ. William Richard Gowers
(Paris). 1994;150:506-510. (1845-1915). Exploring the Victorian brain. A biography.
Oxford University Press, New York; 2012.
Capítulo 1 9
40. Vale TC, Lees AJ, Cardoso F. A biosketch of William 53. Goetz CG. Jean-Martin Charcot and Silas Weir Mitchell.
Richard Gowers with a new review of his inpatient case Neurology. 1997;48(4):1128-1132.
history notes. Arq Neuropsiquiatr. 2013;71:411-413.
54. Martinez ARM, Faber I, Martins CR, et al. Derek-Denny
41. Vale TC, Glass PG, Lees A, Cardoso F. Gowers’ Queen Brown: the man behind the ganglia. Arq Neuropsiquiatr.
Square case notes on chorea: a 21st century re-appraisal. 2017;75(2):127-129.
Eur Neurol. 2013;69:48-52.
55. Denny-Brown D. The basal ganglia and their relation to
42. Goetz C. William Osler: on Chorea: on Charcot. Ann disorders of movement. Oxford University Press, London;
Neurol. 2000;47:404-407. 1962.
43. Walshe JM. History of Wilson’s disease. Mov Disord. 56. Fisher CM. Dr. Raymond Delacy Adams (1911-2008). An
2000;21:1422-1427. appreciation. The Neurologist. 2010;16(3):141-142.
44. Penfield W. Sir Gordon Morgan Holmes. J Neurol Sci. 57. Araújo TFS, Lange M, Zétola VH, Massaro A, Teive
1967;5:185-190. HAG. Charles Miller Fisher: ther 65th anniversary of
the publication of his groundbreaking study, “Transient
45. Teive HAG, Germiniani FMB, Kowacs PA, Munhoz RP.
monocular blindness associated with hemiplegia”. Arq
Charcot, Mitchell and Less: Neurology free thinkers and
Neuropsiquiatr. 2017;75(10):754-756.
their experiences of psychoactive drugs. Arq Neuropsiquiatr.
2016;74(12):1035-1038. 58. Gomes MM, Teive HAG. História da Neurologia
Brasileira. Cinquentenário da Academia Brasileira
46. Teive HAG, Meira AT, Camargo CHF, Cardoso FEC.
de Neurologia. Centenário da Neurologia Brasileira.
Tribute to Professor Andrew Lees. Arq Neuropsiquiatr.
OmniFarma, 1ª edição, São Paulo; 2012.
2020;78(5):307-310.
59. Reimão R. Ed. História da Neurologia no Brasil. São
47. Housman B, Bellary SS, Walters A, Mirzayan N, Tubbs
Paulo: Lemos Editorial; 1999.
RS, Loukas M. Moritz Heinrich Romberg (1795-1873): Early
found of neurology. Clin Anat. 2014;27(2):147-149. 60. Meira AT, Betini BG, Cardoso F, et al. First stages
towards the establishement of Brazilian neurology faculties.
48. Rüdel R. Wilhelm Erb, founder and first president of
Arq Neuropsiquuiatr. 2019;77(12):888-895.
the German society of neural medicine. Fortschr Neurol
Psychiatr. 2001;69:S11-S17. 61. Teive HAG, Sá DS, Neto OS, Silveira OA, Werneck LC.
Professor Antonio Austregésilo: O pioneiro da Neurologia
49. Steinberg H, Wagner A. Wilhelm Erb's years in Leipzig
e do estudo dos distúrbios do movimento no Brasil. Arq
(1880-1883) and their impact on the history of neurology.
Neuropsiquiatr. 1999;57:898-902.
Eur Neurol. 2013;70:267-275.
62. Teive HAG, Lima PM, Germiniani FMB, Boguszewski
50. Faber I, Pereira ER, Martinez ARM, França Jr M, Teive
CL. In the land of giants: the legacy of José Dantas de
HAG. Hereditary spastic paraplegia from 1880 to 2017: an
Souza Leite. Arq Neuropsiquiatr. 2015;73(7):630-632.
historical review. Arq Neuropsiquiatr. 2017;75(11): 813-818.
63. Teive HAG, Kowacs PA, Maranhão Filho P, Piovesan
51. Engelhardt E, Gomes MM. Alzheimer’s 100th
EJ, Werneck LC. Leão's cortical spreading depression: from
anniversary of death and his contribution to a better
experimental “artifact” to physiological principle. Neurology.
understanding of Senile dementia. Arq Neuropsiquiatr.
2005;65(9):1455-1459.
2015;73(2):159-162
52. Rodrigues e Silva AM, Geldsetzer F, Holdorff B, et al.
Who was the men who discovered the “Lewy bodies”? Mov
Disord. 2010;25:1765-1773.
Capítulo 1 10
PARTE 2
NEUROANATOMIA BÁSICA
CAPÍTULO 2
NEUROANATOMIA DOS SULCOS E GIROS
CEREBRAIS
Vanessa Milanese Holanda Zimpel composto de vários giros, que são separados por sulcos.
O conhecimento dos sulcos e giros permite ao cirurgião
Natally Santiago
mais exatidão no planejamento da abordagem cirúrgica,
na escolha do acesso e delimitação da craniotomia. É
Capítulo 2 12
Alterações no giro frontal superior e médio estão na parte posterior e medial à pars triangularis do
relacionadas à disfunção da memória de longo giro frontal inferior. É a parte mais proeminente e
prazo .
8
superficial da ínsula, vista da superfície lateral12.
Capítulo 2 13
Lobo temporal SULCOS E GIROS DA FACE MEDIAL DO
CÉREBRO
Os lobos temporal e occipital são delimitados
pela metade inferior da linha imaginária que liga a Lobo frontal
extremidade superior do sulco parieto-occipital à
incisura pré-occipital. A anatomia da convexidade Giro frontal superior
cerebral apresenta grande importância prática, tanto O giro frontal superior é uma região importante
em clínica como em cirurgia. implicada em uma variedade de tarefas, incluindo
movimento motor, memória de trabalho, estado
de repouso e controle cognitivo. Na face medial
Sulco temporal superior do cérebro localiza-se superiormente ao sulco do
O limite entre os giros temporais médio e límbico. O giro do cíngulo está localizado na
inferior frequentemente não são bem definidos, superfície medial dos hemisférios cerebrais, acima do
porque o sulco temporal inferior é frequentemente corpo caloso. Pode ser subdividido anatomicamente
interrompido por pontes girais14. Os giros temporais em anterior e posterior e de acordo com a função e,
médio e inferior fundem-se com o lobo occipital de forma correspondente, as crises epilépticas com
Lobo temporal
O lobo temporal encontra-se inferior ao sulco
lateral (fissura silviana) e linha horizontal imaginária
(linha temporo-occipital), limitado posteriormente por
outra linha vertical imaginária (linha parietotemporal
lateral) unindo a incisura pré-occipital ao sulco
parieto-occipital.
Capítulo 2 14
giro é isolado da substância perfurada anterior pelo Sulco calcarino
sulco entorrinal e trato óptico e anteromedialmente,
O sulco calcarino é um sulco consistente e
do giro ambiens pelo sulco semianular.
se origina no nível do istmo do giro do cíngulo.19
Exibe uma trajetória póstero-superior, atingindo a
área do polo occipital. Quatro padrões morfológicos
Giro ambiens
diferentes podem ser observados, sendo o mais
O giro ambiens, formado principalmente pelo comum o de um “M” ou morfologia em forma de V
córtex entorrinal, ocupa as partes anterior e inferior reverso18.
desse segmento. As divisões superior e inferior
do segmento uncal posterior são separadas pelo
sulco uncal. A parte inferior, formada pelo giro para- Sulco retrocalcarino
hipocampal, é ocupada pela região entorrinal .17
Este sulco aparece como a bifurcação terminal
da fissura calcarina. Foi detectado em cerca 10%
Lobo occipital
dos casos, exibindo uma preponderância lateral
O lobo occipital atraiu particular interesse
esquerda de 75%.
científico desde a segunda metade do século XIX. Na
verdade, diferentes técnicas foram implementadas
para abordar os relatos anatomofuncionais desta
Sulco occipitopolar
área altamente eloquente. Inicialmente, Brodmann
(1909), Economo e Koskinas (1925) focaram na O sulco occipitopolar pode ser identificado em
organização citoarquitetônica. A classificação do cerca de 1/4 dos hemisférios. Este pequeno sulco em
córtex occipital nas áreas de Brodmann 17, 18 e 19 forma de crescente aparece como um recorte curto
com orientação vertical sulco com sua concavidade Esse giro aparece como uma fina faixa cortical entre
voltada para o polo occipital.18 Em 10%, o sulco os dois sulcos, acima mencionados, situando-se
semilunar dá origem a um pequeno ramo, que corre imediatamente anterior ao ápice do polo occipital
Capítulo 2 15
visual. Abriga o córtex somatossensorial primário,
que está localizado no giro pós-central, posterior ao
sulco central. Também é responsável por receber
informações sensoriais contralaterais.
Sulco central
O sulco central mostra uma linha oblíqua de
dentro para fora na vista de convexidade (Figura
3). O sulco central pode ser identificado com essa
técnica em cerca de 77% dos hemisférios. Essa
técnica de identificação do sulco central é muito
importante não só para a volumetria, mas também
para o diagnóstico clínico21.
Lobo parietal
Ele é responsável pela percepção, sensação
e integração da entrada sensorial com o sistema
Capítulo 2 16
Figura 4: Visão da superfície inferior do cérebro. Ant.:
anterior; Call.: caloso; Cing.: cíngulo; Col.: colateral; Com.:
comissura; Corp.: corpo; Espl.: esplênio; Fiss.: fissura;
Figura 3: Visão da superfície superior do cérebro. Call.:
Front.: frontal; Gir.: giro; Inf.: inferior; Intrap.: intraparietal;
caloso; Cing.: cíngulo; Com.: comissura; Corp.: corpo;
Lat.: lateral; Lob.: Lóbulo; Long.: longitudinal; Mam.: mamilar;
Espl.: esplênio; Fiss.: fissura; Front.: frontal; Gir.: giro; Inf.:
Méd.: médio; Orb.: orbitário; Olf.: olfatório; Para-hip.:
inferior; Intrap.: intraparietal; Lat.: lateral; Lob.: Lóbulo;
para-hipocampal; Par.: Parietal; Post.: posterior; Subst.:
Long.: longitudinal; Méd.: médio; Par.: Parietal; Pós-cent.:
substância; Sulc.: sulco; Sup.: superior; Trig.: trígono.
pós-central; Pré-cent.: pré-central; Sulc.: sulco; Sup.:
superior. Fonte: Os autores, 2021.
Fonte: Os autores, 2021.
Lobo frontal
O lobo frontal é o maior lobo do cérebro,
situado à frente do sulco central.
Sulco olfatório
Delimita medialmente o giro orbital medial. Em
uma visão inferior e anterior do cérebro, podemos
visualizar os giros orbitários anterior, medial, lateral e
Figura 5: Visão da superfície antero-inferior do cérebro.
posterior, separados do giro reto pelo sulco olfatório Ant.: anterior; C.: craniano; Call.: caloso; Cing.: cíngulo;
(Figuras 4 e 5). Col.: colateral; Com.: comissura; Corp.: corpo; Espl.:
esplênio; Fiss.: fissura; Front.: frontal; Gir.: giro; Inf.: inferior;
Intrap.: intraparietal; Lat.: lateral; Lob.: Lóbulo; Long.:
longitudinal; Mam.: mamilar; Méd.: médio; N.: nervo; Orb.:
orbitário; Olf.: olfatório; Para-hip.: para-hipocampal; Par.:
Parietal; Post.: posterior; Subst.: substância; Sulc.: sulco;
Sup.: superior; Temp.: temporal; Tr.: trato.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 2 17
Sulcos orbitários Giro fusiforme
São eles: sulco orbital medial, sulco orbital O sulco occipito-temporal está localizado entre
lateral, sulco orbital transverso e sulco orbital o giro temporal inferior e o giro fusiforme. Ambos
intermediário. Os sulcos orbitários medial e lateral têm uma orientação anterior posterior.
podem ser divididos em porções anterior e posterior
levando em consideração sua conexão com o sulco
transverso. Esses sulcos delimitam o giro orbital. O Giro para-hipocampal
giro orbital anterior está situado anterior ao sulco
O sulco colateral projeta-se para a cavidade
transverso e entre as porções anteriores dos sulcos
ventricular formando a eminência colateral lateral ao
orbital lateral e medial. O giro orbital medial está
corpo do hipocampo, sendo um ponto de referência
situado medial ao sulco orbital medial, lateral ao
anatômico útil para orientação microcirúrgica.
sulco olfatório. O giro orbital lateral está situado
A eminência colateral é o limite lateral da
lateralmente ao sulco orbital lateral e se junta a
amigdalohipocampectomia seletiva.
pars orbitalis do giro frontal inferior23. O giro orbital
posterior está situado posteriormente ao sulco orbital O sulco colateral localiza-se entre o giro
transverso (Figuras 4 e 5). As áreas inferolaterais do fusiforme e para-hipocampal (Figuras 4 e 5). Esse
hemisfério dominante (geralmente lado esquerdo) giro relaciona-se inferiormente com o hipocampo,
do lobo frontal são a área de linguagem expressiva sendo que essa estrutura lateralmente tem relação
(área de Broca, áreas de Brodmann 44 e 45), com a fissura colateral e com o giro fusiforme24.
para a qual o dano resultará em um tipo de afasia O giro para-hipocampal se estende para frente
expressiva. Outras áreas do lobo frontal, incluindo para formar a metade inferior da parte posterior do
a área orbitofrontal e a área frontal medial, estão uncus, a cabeça do hipocampo forma a metade
envolvidas em uma variedade de processos de superior, enquanto a amígdala forma a metade
funcionamento superior, como a regulação de anterior.
emoções, interações sociais e personalidade.
O uncus é dividido em três segmentos: anterior
Os lobos frontais são essenciais para decisões e posterior que se fundem em um ápice que se
e interações mais difíceis que são essenciais para projeta medialmente. A amígdala funde-se supero-
o comportamento humano. Portanto, danos a essa medialmente, ao longo da borda lateral do trato
área podem resultar em desinibição e déficits de óptico, no globo pálido sem uma demarcação clara11.
concentração, orientação e julgamento. Uma lesão O ápice do uncus estende-se medialmente acima da
do lobo frontal também pode resultar em regressão incisura tentorial e é posicionado lateralmente ao
ou ressurgimento de reflexos primitivos. Os campos nervo oculomotor e medial ao recesso uncal que se
oculares frontais são a área central de controle do estende medialmente entre a amígdala e a cabeça
movimento ocular sacádico e danos a esta área do hipocampo14.
podem causar desvio do olho para o lado da lesão.
A superfície inferior do segmento uncal anterior
Capítulo 2 18
11. Ribas EC, Yagmurlu K, Wen HT, Rhoton AL Jr.
CONCLUSÃO Microsurgical anatomy of the inferior limiting insular sulcus
and the temporal stem. J Neurosurg. 2015;122(6):1263-
Na atualidade, dispomos de recursos
1273.
que podem nos auxiliar significativamente no 12. Pastor-Escartín F, García-Catalán G, Holanda VM,
planejamento cirúrgico, como a neuronavegação et al. Microsurgical Anatomy of the Insular Region and
Operculoinsular Association Fibers and its Neurosurgical
e a estereotaxia. Entretanto, o conhecimento da
Application. World Neurosurg. 2019;129:407-420.
anatomia cerebral é fundamental. É mandatório o 13. Harkey HL, al-Mefty O, Haines DE, Smith RR. The
conhecimento das relações entre a anatomia óssea surgical anatomy of the cerebral sulci. Neurosurgery.
1989;24(5):651-654.
e sua relação com os sulcos e giros. Assim como a
14. Frigeri T, Rhoton A, Paglioli E, Azambuja N. Cortical
possibilidade de acessar lesões por meio de sulcos projection of the inferior choroidal point as a reliable
e fissuras. O conhecimento anatômico inclui também landmark to place the corticectomy and reach the temporal
horn through a middle temporal gyrus approach. Arq
conhecimento das funções das estruturas cerebrais Neuropsiquiatr. 2014;72(10):777-781.
para adequado planejamento de monitorização 15. Briggs RG, Khan AB, Chakraborty AR, et al. Anatomy
intra-operatória, proteção das áreas eloquentes, and White Matter Connections of the Superior Frontal
Gyrus. Clin Anat. 2020;33(6):823-832.
menor risco de lesão de tecido saudável e melhores 16. Powell R, Elwes R, Hamandi K, Mullatti N. Cingulate
resultados cirúrgicos. gyrus epilepsy. Pract Neurol. 2018;18(6):447-454.
17. Parmar SK, Pruthi N, Ravindranath R, Ravindranath
Y, Somanna S, Philip M. Anatomical Variations of the
Temporomesial Structures in Normal Adult Brain-A
REFERÊNCIAS Cadaveric Study. J Neurosci Rural Pract. 2018;9(3):317-
325.
1. Ribas GC. The cerebral sulci and gyri. Neurosurgical
Focus. 2010;28(2):E2. 18. Koutsarnakis C, Komaitis S, Drosos E, et al. Mapping
the superficial morphology of the occipital lobe: proposal of
2. Türe U, Yaşargil MG, Friedman AH. Fiber dissection
a universal nomenclature for clinical and anatomical use.
technique: lateral aspect of the brain. Neurosurgery.
Neurosurg Rev. 2021;44(1):335-350.
2000;47:417-426.
19. Baydin S, Gungor A, Holanda VM, Tanriover N,
3. Pouratian N, Bookheimer SY. The reliability of
Danish SF. Microneuroanatomy of the Anterior Frontal
neuroanatomy as a predictor of eloquence: a review.
Laser Trajectory to the Insula. World Neurosurg.
Neurosurg Focus. 2010;28(2):E3.
2019;132:e909-e921.
4. Ribas GC, Yasuda A, Ribas EC, Nishikuni K, Rodrigues
20. Alagapan S, Lustenberger C, Hadar E, Shin HW,
AJ Jr. Surgical anatomy of microneurosurgical sulcal key
Frӧhlich F. Low-frequency direct cortical stimulation of
points. Neurosurgery. 2006;59(4 Suppl2):177-210.
left superior frontal gyrus enhances working memory
5. Gusmão S, Ribas GC, Silveira RL, Tazinaffo U. performance. Neuroimage. 2019;184:697-706.
Localização dos sulcos e giros da face súpero-lateral do
21. Hayashi N, Sakuta K, Minehiro K, et al. Development
cérebro na tomografia computadorizada e na ressonância
of identification of the central sulcus in brain magnetic
magnética. Arq Neuropsiquiatr. 2001;59(1):65-70.
resonance imaging. Radiol Phys Technol. 2011;4(1):53-60.
6. Li W, Qin W, Liu H, et al. Subregions of the human
22. Javed K, Reddy V, Lui F. Neuroanatomy, Cerebral
superior frontal gyrus and their connections. Neuroimage.
Cortex. 2021. In: StatPearls. Treasure Island (FL):
2013;78:46-58.
StatPearls Publishing; 2021.
7. Yagmurlu K, Vlasak AL, Rhoton AL Jr. Three-dimensional
23. Rodrigues TP, Rodrigues MA, Paz Dde A, et al.
topographic fiber tract anatomy of the cerebrum.
Orbitofrontal sulcal and gyrus pattern in human: an
Neurosurgery. 2015;11:274-305.
anatomical study. Arq Neuropsiquiatr. 2015;73(5):431-435.
8. Chen ZX, Xue L, Liang CY, et al. Specific marker of
24. Isolan GR, Azambuja N, Paglioli Neto E, Paglioli E.
feigned memory impairment: The activation of left superior
Hippocampal microsurgical anatomy regarding the selective
frontal gyrus. J Forensic Leg Med. 2015;36:164-71.
amygdalohippocampectomy in the Niemeyer’s technique
9. Kowatari Y, Yamamoto M, Takahashi T, et al. Dominance perspective and preoperative method to maximize the
of the left oblique view in activating the cortical network for corticotomy. Arq Neuropsiquiatr. 2007;65(4A):1062-1069.
face recognition. Neurosci Res. 2004;50(4):475-480.
10. Yaşargil MG, Cravens GF, Roth P. Surgical approaches
to “inaccessible” brain tumors. Clin Neurosurg. 1988;34:42-
110.
Capítulo 2 19
CAPÍTULO 3
NEUROANATOMIA FUNCIONAL DO CÓRTEX
CEREBRAL
Capítulo 3 20
Figura 1: A. Desenvolvimento evolutivo do SNC. Owen dividiu os animais em lisencéfalos e girencéfalos conforme a
presença de giros cerebrais. O encéfalo aumentou consideravelmente durante a filogênese, atingindo o máximo do
desenvolvimento no encéfalo humano (as representações não estão em escala para melhor observação da superfície
cortical). B. Gratiolet e Leuret mapearam os sulcos e fissuras corticais e demonstraram que, apesar das esperadas
variações, os mesmos se dispõem conforme uma arquitetura básica. C. O aspecto típico do córtex cerebral humano é
caracterizado por proeminências arredondadas (circunvoluções ou giros) delimitadas por sulcos e fissuras. Cerca de 2/3
da superfície cortical humana encontra-se “escondida” no interior dos sulcos e fissuras.
Fonte: Adaptada dos estudos de Gratiolet, 18547; e Hubel, 19798.
Capítulo 3 21
O córtex cerebral é completamente liso em um de correlacionar a anatomia cerebral à função
grande número de animais inferiores, motivo pelo começaram a partir de 1820, com os trabalhos
qual o anatomista e paleontólogo inglês Richard de Franz Gall, Bouillaud, Robert Todd, Rolando e
Owen (1804-1892) os denominou de lisencéfalos . 10
muitos outros, através da observação de déficits
Os animais superiores ou girencéfalos, pelo contrário, neurológicos secundários a alguma patologia12. No
apresentam numerosos giros cerebrais (Figura 1)10. O entanto, o conhecimento das correlações anátomo-
aparecimento dos giros foi determinado pela grande funcionais das estruturas nervosas, por sua vez,
expansão da superfície cortical sem que ocorresse só passaram a ser melhor esclarecidas a partir da
um aumento concomitante e proporcional da caixa segunda metade do século XIX2. Os pioneiros da
craniana. Assim, o extenso processo de dobramento localização das funções corticais cerebrais foram o
da superfície cortical foi um evento poupador de cirurgião, anatomista e antropólogo francês Pierre
espaço intracraniano. A consequência natural Paul Broca (1824-1880) e o neurologista inglês John
desse processo poupador de espaço é o aspecto Hughlings Jackson (1835–1911)2.
típico do córtex cerebral humano, caracterizado por
Broca, particularmente motivado e influenciado
proeminências arredondadas delimitadas por sulcos
pelas recentes descrições de Gratiolet, introduziu
e fissuras. Tais proeminências são denominadas
o conceito de localização funcional cortical, pois
de giros ou circunvoluções cerebrais11. Cada giro
demonstrou pela primeira vez que uma lesão, em
apresenta uma porção superficial, exposta, e uma
uma região circunscrita do córtex, era responsável
porção oculta, intra-sulcal, que localiza-se nas
pela perda de uma determinada função cortical2,13.
paredes e no assoalho do sulco. Dessa forma, o
Em 1861, ele correlacionou uma lesão em uma área
córtex de cada hemisfério cerebral é uma lâmina
restrita do giro frontal inferior esquerdo (área de
contínua de matéria cinzenta com aproximadamente
Broca) com a perda da expressão da linguagem10.
2.200 cm , sendo um terço visível na superfície,
2
encontra-se “enterrada” nas profundezas dos sulcos Gustav Fritsch (1838-1927) e o neurologista e
Capítulo 3 22
defendiam uma interpretação funcional holística do a porção anterior da ínsula, o córtex orbitofrontal
córtex e aqueles que acreditavam na localização posterior e parte do lobo temporal)10.
funcional cortical13. Enquanto os seguidores de um
conceito holístico enfatizavam o papel de todo o
córtex na execução de qualquer função cerebral,
aqueles favoráveis ao paradigma localizacionista
estavam convencidos de que essas funções eram
localizáveis em áreas corticais específicas13.
Capítulo 3 23
(Figura 2)1,5. contém a estria de Kaes e é formada principalmente
pelas fibras talamocorticais que, antes de terminarem
No isocórtex existem seis camadas corticais
na camada granular, assumem trajeto horizontal10.
(ao menos durante o período embrionário). No
alocórtex, o número de camadas é variável (entre A terceira camada cortical (piramidal externa)
três a cinco camadas), mas sempre menor do contém células piramidais grandes e de tamanho
que seis (mesmo nas fases mais precoces do médio.
desenvolvimento) e sem um padrão uniforme 1,5,10
.
A quarta camada cortical (granular interna)
As seis camadas do isocórtex são numeradas contém a estria externa de Baillarger e é a principal
da superfície pial para a profundidade e recebem as camada receptora de projeção da superfície cortical
seguintes denominações (Figura 3) 1,15,17
: (mais desenvolvida nas áreas sensitivas primárias).
Na área visual primária, a estria da lâmina granular
I: camada molecular (lamina zonalis);
interna é muito desenvolvida e pode ser vista
II: camada granular externa (lamina granularis macroscopicamente (estria de Gennari)10.
externa);
A quinta camada cortical (piramidal interna)
III: camada piramidal externa (lamina
contém a estria interna de Baillarger e é a principal
pyramidalis);
camada efetuadora de projeção (mais desenvolvida na
IV: camada granular interna (lamina granularis
área motora primária). Ela é formada principalmente
interna);
por células piramidais de tamanhos médio e grande
V: camada piramidal interna (ou ganglionar) e, na área motora primária, observam-se as células
(lamina ganglionaris); e
piramidais gigantes (Betz)5,10.
VI: camada de células fusiformes (ou
A sexta camada cortical (multiforme) é uma
multiforme) (lamina multiformis).
camada de neurônios heterogêneos (por isso o
A camada molecular, situada superficialmente, nome multiforme) com predomínio das células
é rica em fibras nervosas amielínicas de direção piramidais pequenas. É a lâmina mais interna do
horizontal e contém poucos neurônios (células córtex cerebral (adjacente à substância branca)5,10.
horizontais de Cajal). Nas demais camadas corticais
O isocórtex possui diferentes arranjos
predomina o tipo neuronal que dá nome à respectiva
organizacionais de suas camadas ao longo de
camada1,10.
toda a sua extensão, os quais estão relacionados
Neurônios granulares (células estreladas) são aos diferentes papéis funcionais da superfície
o principal interneurônio cortical e caracterizados cortical (Figura 3). Dessa forma, as diversas áreas
por serem células receptoras do córtex. A densidade corticais podem ser classificadas, de acordo com
destes neurônios aumentou progressivamente suas características histológicas, conforme a Figura
durante a filogênese e, assim, possibilitou a 21,5,15,18.
existência de circuitos corticais cada vez mais
No isocórtex homotípico, as seis camadas
complexos1. Neurônios piramidais são células de
corticais são sempre individualizadas. Já no
projeção, pois seus axônios, em geral, ganham a
isocórtex heterotípico, as seis camadas não podem
substância branca para constituir as fibras eferentes
ser claramente individualizadas no adulto, pois a
do córtex1,5. Neurônios fusiformes também são
estrutura laminar típica, que era encontrada nas fases
considerados neurônios efetuadores, pois seus
mais precoces do desenvolvimento, foi substituída
axônios descendentes também ganham o centro
por um grande desenvolvimento de algumas das
branco medular do cérebro1.
camadas (granular ou piramidal)1,5. Assim, no
A segunda camada cortical (granular externa) isocórtex heterotípico granular, característico de
Capítulo 3 24
Figura 3: Camadas do isocórtex. A espessura de cada camada do isocórtex varia ao longo das superfície cortical.
As áreas motoras tendem a ter camadas V mais proeminentes (isocórtex heterotípico agranular). As áreas sensitivas
tendem a ter a camada IV mais proeminente (isocórtex heterotípico granular). No isocórtex homotípico, característico
das áreas corticais de associação, não há um grande predomínio de neurônios piramidais ou granulares.
Capítulo 3 25
áreas corticais sensitivas, é evidenciada uma
maior densidade neuronal de células granulares na
camada IV, que invadem as camadas piramidais
adjacentes (III e V) e dificultam a identificação
histológica destas camadas piramidais (Figuras 2 e
3). No isocórtex heterotípico agranular, característico
de áreas corticais motoras, é evidenciada uma
maior densidade neuronal de células piramidais na
camada V que invadem a camada granular (IV) e
dificultam a identificação histológica desta camada
granular (Figuras 2 e 3)1,5.
Capítulo 3 26
comparativos de encéfalos de primatas humanos e com a sensibilidade ou com a motricidade. Assim,
não humanos, além da anatomia comparativa com as áreas de projeção podem ser subdivididas em
encéfalos de muitos outros mamíferos (ele estudou áreas sensitivas (isocórtex heterotípico granular) e
pelo menos 64 espécies diferentes de vertebrados) . 16
motoras (isocórtex heterotípico agranular) (Figura
A distribuição dos corpos celulares na massa 2)1,5. As áreas de associação estão relacionadas com
cinzenta, a citoarquitetura das camadas corticais, a o processamento mais complexo de informações.
presença de tipos celulares específicos e o arranjo Nessas áreas prevalece o isocórtex homotípico,
das células em grupos e colunas estavam entre as pois não sendo tais áreas nem sensitivas e nem
características que permitiram a Brodmann parcelar motoras, não há um grande predomínio de neurônios
o córtex cerebral em “áreas funcionais” (Figura 4) .13
granulares ou piramidais (Figura 2)1,5.
A estrutura microscópica e a classificação dessas
O neuropsicólogo russo Alexander Luria (1902
áreas estão em paralelo com a distinção evolutiva
– 1977) propôs uma divisão funcional didática do
entre as subdivisões corticais antigas e novas. Com
córtex cerebral baseada no grau de relacionamento
base nesse conceito integrativo (histologia com
de determinada área com as funções motoras e
filogenia), Brodmann indicou, por meio de seu sistema
sensitivas (Figura 5)1.
de numeração, homologias entre áreas corticais de
diferentes mamíferos (reforçando o significado da Áreas de projeção (diretamente relacionadas
dos maiores méritos de Brodmann foi integrar as podem ser divididas em secundárias e terciárias.
ideias evolutivas e a análise histológica do córtex Áreas secundárias são unimodais, pois estão
com a localização funcional13. Dessa forma, uma área relacionadas, fundamentalmente, com as áreas
cortical tem uma história evolutiva. A identificação de primárias. Assim, as áreas secundárias sensitivas
uma área citoarquitetônica requer a demonstração de recebem impulsos nervosos de uma determinada área
estruturas homólogas e a modificação de seu padrão primária sensitiva e as áreas secundárias motoras
laminar em estudos neuroanatômicos comparativos. projetam fibras nervosas para uma determinada
definição de uma área citoarquitetônica é, portanto, supramodais, ou seja, não se relacionam diretamente
fundamentado na teoria da evolução do cérebro com as funções sensitivas ou motoras. Tais áreas
durante o longo e complexo processo filogenético16. estão envolvidas com o processamento da atividade
cortical superior (atividades psíquicas complexas,
memória, pensamento abstrato, planejamento, etc.),
CLASSIFICAÇÃO HIERÁRQUICA ocupando o topo da hierarquia funcional do córtex
FUNCIONAL cerebral. As áreas terciárias mantêm conexões
Funcionalmente, o encéfalo está organizado com as diferentes áreas secundárias e terciárias da
em áreas específicas. Estas localizações funcionais superfície cortical1,5.
devem ser consideradas como especializações Durante o longo processo filogenético, houve
funcionais e não como compartimentos um aumento expressivo das áreas corticais de
independentes do córtex humano1. associação. No homem, as áreas de associação
Do ponto de vista funcional, as áreas corticais terciária ocupam a maior parte da superfície cortical
podem ser classificadas em dois grandes grupos: cerebral1.
áreas de projeção e áreas de associação1,5. As Para que se possa entender melhor a
áreas de projeção são as que recebem ou dão classificação funcional proposta por Luria, pode-
origem a fibras nervosas relacionadas diretamente se simplificar o complexo conceito, com o seguinte
Capítulo 3 27
exemplo: Ao chegar em casa, o indivíduo coloca Caso a lesão fosse na área motora secundária,
a mão no bolso para pegar a chave. O objeto o paciente teria uma apraxia motora e não seria
desejado é inicialmente reconhecido pelo tato (área capaz de realizar um movimento harmônico e
somestésica primária), mesmo sem ser observado. adequado capaz de encaixar perfeitamente a
A área somestésica primária emite aferências para chave na fechadura (apesar de não ter um déficit
a área de associação secundária para correta motor propriamente dito). Áreas motoras de ordem
identificação e interpretação do objeto (comparação superior (secundárias) são responsáveis pela
do formato do objeto com o conceito de chave codificação do planejamento dos movimentos (reais
previamente conhecido pelo indivíduo). No entanto, ou potenciais) e tal programa motor é transmitido
após a sensibilidade tátil inicial do objeto, na área ao córtex motor primário para a sua implementação
sensitiva primária, e o seu reconhecimento, na (caso o movimento seja de fato realizado). Se a
área sensitiva secundária, é necessário definir o lesão fosse na área motora primária, o paciente
que fazer com a chave pela área de associação teria uma paralisia do membro e não seria capaz
terciária (supramodal). Neste momento, o indivíduo de movimentar, pelo menos na plenitude da força,
vai refletir se está carregando tudo que desejava o braço. O córtex motor primário é o responsável
(terá que se lembrar de não esqueceu algo no carro, cortical pelos movimentos voluntários dos membros
por exemplo). Definindo, pela área de associação e do tronco contralateral (é designado primário
terciária, que a melhor estratégia é entrar em casa porque contém neurônios que ativam diretamente
para descansar, é necessário dar início ao plano os neurônios motores somáticos). O córtex
motor para executar adequadamente o processo motor primário é o local cortical “final” no para o
de retirar a chave do bolso e abrir a porta. O plano processamento do comando motor5.
motor, com a sequência de movimentos harmônicos
Por fim, uma lesão em áreas supramodais
necessários (sequência, amplitude e força), é
(terciárias) poderia acarretar déficits em funções
definido pela área motora secundária e enviado
corticais superiores, como memória, pensamento
para a área motora primária para a execução final
abstrato ou tomada de decisões estratégicas. Áreas
do movimento.
de associação multimodais (terciárias) integram as
No exemplo, caso a área sensitiva primária diversas informações disponíveis e coordenam essa
fosse lesada, o indivíduo não teria sensibilidade tátil informação com um plano de ação (Figura 6).
(não perceberia que o objeto encostou em sua mão).
Pode-se dizer que o fisiologista Jean Fernel
As áreas sensoriais primárias recebem a maior parte
sintetizou este conceito de forma poética em sua
de sua informação do tálamo, que por sua vez,
famosa afirmação: “O cérebro é a cidadela e morada
recebe sinais dos receptores periféricos. As áreas
da mente humana, a casa dos pensamentos e da
corticais sensoriais primárias são os locais “iniciais”
razão, a fonte e origem do movimento e de todos os
do processamento cortical da informação sensorial.
sentidos; ocupa o ponto mais alto do corpo, olhando
Se a lesão fosse na área sensitiva secundária, o
para cima, mais próximo do céu”3.
indivíduo teria uma agnosia tátil e não seria capaz
de reconhecer o objeto apenas pelo tato (apesar Áreas primárias e secundárias
de perceber que está encostando em algo). A área
Áreas sensitivas
sensorial primária transporta a informação a uma
área adjacente e de ordem superior (área secundária) As áreas sensitivas do córtex estão distribuídas
onde os neurônios seletivamente codificam as nos lobos parietal, temporal, insular e occipital. Tais
características específicas dos diferentes estímulos áreas são divididas em primárias (de projeção) e
sensoriais e, em conjunto, processam informações secundárias (de associação) (Figura 5). As áreas
complexas .5 primárias recebem fibras talamocorticais do sistema
Capítulo 3 28
Figura 5: Luria propôs uma divisão funcional do córtex cerebral baseada no grau de relacionamento de determinada
área com as funções motoras e sensitivas. Alexander Luria (1902 – 1977) está destacado na figura. No desenho
esquemático do encéfalo humano, as diferentes áreas corticais estão coloridas conforme o padrão de cores adotado na
chave (verde: áreas primárias; amarelo: áreas secundárias; e azul: áreas terciárias).
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 6: Desenho esquemático do sequenciamento hierárquico da informação no córtex cerebral. Áreas primárias estão
diretamente relacionadas com a sensibilidade ou com a motricidade. As áreas secundárias sensitivas recebem impulsos
nervosos de uma determinada área sensitiva primária e as áreas secundárias motoras projetam fibras nervosas para
uma determinada área motora primária. As áreas terciárias são supramodais e não se relacionam diretamente com as
funções sensitivas ou motoras (estão envolvidas com o processamento da atividade cortical superior). O processamento
da informação sensorial no córtex cerebral tem início nas áreas sensoriais primárias, continua nas áreas de associação
unimodal (secundárias) e completa-se nas áreas terciárias (supramodais). Os sistemas sensoriais também se
comunicam com o córtex motor, pois para o ato motor adequado são necessárias informações sensoriais sobre o objeto,
o corpo e o espaço. Após definida, pelas áreas terciárias, qual a melhor estratégia de interação com o meio ambiente.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 3 29
sensorial (exceto a área olfativa) e estão relacionadas segmento distal do sulco frontal superior localiza-
à percepção inicial deste estímulo. As áreas se a extensa área sensitiva da mão que é seguida,
secundárias estão relacionadas à caracterização e mais inferiormente, pela área do segmento cefálico,
processamento adicional da informação . Assim, a
1,5
onde a face e a boca também apresentam uma área
informação sensorial é processada de forma seriada, cortical desproporcionalmente grande em relação à
com cada área da cadeia neuronal desempenhando área corporal. Na porção mais baixa do giro pós-
certas computações e transmitindo os resultados central localizam-se as áreas da língua e faringe1,5.
para a próxima área. As vias sensoriais, no entanto,
O fato da representação cortical para a mão
não são exclusivamente seriais5. Em cada nível
(especialmente dedos) e face (especialmente
funcional, áreas de associação se projetam de volta
lábios) ser ampla demonstra o princípio de que
para as áreas primárias e, dessa forma, modulam
sua extensão de uma parte do corpo depende da
a atividade de neurônios das áreas primárias
importância funcional desse segmento corporal para
(por exemplo, o processamento da informação
a biologia do animal, e não do tamanho do segmento
de áreas visuais secundárias podem originar
corporal1,5.
sinais retrógrados que permitem os neurônios da
área visual primária a analisar informações mais Modalidades mais grosseiras de sensibilidade,
detalhadas de uma parte específica da face)5. Cada como o tato não discriminativo (protopático) e a
tipo de sensibilidade especial corresponde a uma sensibilidade térmica e dolorosa, são processadas
área primária cortical, enquanto todas as formas de inicialmente já em nível talâmico e podem permanecer
sensibilidade geral convergem para uma só área, a mesmo em pacientes com lesões extensas de S11.
área somestésica.
área 3 localiza-se na profundidade do sulco central, táteis (agnosia tátil)1,5. S2 também está associada a
Capítulo 3 30
Figura 7: A representação do homúnculo ilustra a área cortical relativa para cada parte específica do corpo. (A)
Homúnculo motor A área da superfície cortical de uma determinada região corporal está relacionada ao grau de
controle motor da respectiva parte do corpo. Nos humanos, uma considerável parte do córtex motor é dedicada aos
músculos da mão e da fala. 1: deglutição, 2: língua, 3: mandíbula, 4: lábios, 5: face, 6: pálpebra e olho, 7: testa, 8:
pescoço, 9: polegar (dedo), 10: indicador (dedo), 11: médio (dedo), 12: anular (dedo), 13: mínimo (dedo), 14: mão, 15:
punho, 16: cotovelo, 17: ombro, 18: tronco, 19: quadril, 20: perna, 21: joelho e panturrilha, 22: tornozelo e artelhos. (B)
Homúnculo sensitivo – toda a superfície corporal é representada no córtex de forma ordenada. A área cortical dedicada
ao processamento da informação de uma região particular do corpo não é proporcional à área da região corporal e sim
a densidade de receptores sensoriais da respectiva região. Nos humanos, uma considerável parte do córtex sensitivo
é dedicada aos lábios e mão. 1: intra-abdominal, 2: faringe, 3: língua, 4: dentes, gengiva e mandíbula, 5: lábio inferior,
6: lábio superior, 7: face, 8: nariz, 9: olho, 10: polegar (dedo), 11: indicador (dedo), 12: médio (dedo), 13: anular (dedo),
14: mínimo (dedo), 15: mão, 16: punho, 17: antebraço, 18: cotovelo, 19: braço, 20: ombro, 21: nuca e região dorsal da
cabeça, 22: pescoço, 23: tronco, 24: quadril, 25: perna, 26: pé e artelhos e 27: genitais.
Fonte: Adaptado de Kandel et al., 20145.
Capítulo 3 31
corpo geniculado lateral. Existe uma correspondência aspectos diferentes da percepção visual1,2,5. A via
(retinotopia) do córtex visual primário com a retina, dorsal corresponde às áreas de V3 e V5 e é uma
pois a metade superior da retina se projeta, através via que se origina de V1 e segue em direção ao
da cadeia neuronal das vias ópticas, no lábio superior lobo parietal posterior. A via ventral corresponde às
do sulco calcarino, e a metade inferior da retina para áreas de V2 e V4 e é uma via que se origina em
o lábio inferior do sulco calcarino. A mácula retiniana V1 e segue em direção às porções mais anteriores
(área de maior acuidade visual) projeta-se na parte e basais do lobo temporal. Na via dorsal são
mais posterior do sulco calcarino (próximo do polo processadas características dinâmicas do objeto
occipital) . O giro descendente de Ecker é um
1
(posição, movimento, velocidade e representação
pequeno lóbulo composto pelo córtex estriado e seus espacial). Assim, processa informações de “onde
limites correspondem aos limites posterolaterais está o objeto” – mais particularmente relacionado à
reais do córtex estriado em humanos . 2
percepção espacial e dinâmica da informação visual.
Na via ventral são processadas características
A área visual primária processa
específicas do objeto (cor, forma, textura,
fundamentalmente o contorno do objeto (detecção da
reconhecimento do objeto e da face humana) e,
intensidade da luz e de padrões visuais), resultando
assim, processa informações do “o que é o objeto” –
em um rascunho da imagem (esboço primitivo).
mais particularmente relacionado à discriminação e
Curiosamente, esta área é ativada não apenas com
reconhecimento de padrão visual1,2,5. De acordo com
a apresentação física de informações visuais, mas
estudos funcionais, as áreas visuais secundárias
também em tarefas de imagens mentais.
(áreas 18 e 19 de Brodmann) também participam
Lesões em V1 causam déficit no campo visual de outras funções visuais, como preparação visual
conforme a extensão da lesão (desde escotoma e atenção visual. É interessante enfatizar que a área
até cegueira)1,5. Na maioria dos mamíferos, no 19 de Brodmann está relacionada com algumas
entanto, a visão não é completamente corticalizada funções relacionadas à linguagem, em particular no
e pode-se manter alguma persistência de sensação processamento da língua de sinais.
luminosa grosseira mesmo após lesões extensas no
Lesões nas áreas visuais secundárias
córtex visual primário1. Lesões bilaterais completas
causam agnosia visual (incapacidade de reconhecer
dos lobos occipitais produzem cegueira cortical, que
o objeto, ou características dele, mesmo com a
às vezes está associada à falta de consciência ou
percepção primária preservada). Assim, o indivíduo
negação da cegueira (síndrome de Anton).
enxerga, mas não reconhece um determinado objeto
ou suas características. A agnosia visual pode ter
Áreas visuais secundárias (V2, V3, V4 e V5) diferentes manifestações. Um exemplo de lesão da
via cortical dorsal é a acinetopsia (incapacidade de
As áreas visuais secundárias estão localizadas
perceber, visualmente, o movimento dos objetos ou
no lobo occipital, de forma adjacente à área visual
da cena)1. Neste caso, o paciente pode observar
primária, e se estendem para o lobo temporal e para
uma escada rolante funcionando e acreditar que a
uma diminuta porção posterior do lobo parietal. Tais
mesma está desligada. Um exemplo de lesão da
áreas correspondem às áreas 18, 19, 20, 21 e 37
via cortical ventral é a prosopagnosia (incapacidade
de Brodmann e são responsáveis pela interpretação
de reconhecer faces humanas previamente
das informações visuais (Figura 4)1,5.
conhecidas). Neste caso, o paciente pode enxergar
Segundo estudos experimentais em macacos, a face de um familiar, porém não o reconhecer.
as áreas visuais secundárias estão unidas por duas
vias corticais de projeção, aparentemente distintas,
que se originam da área visual primária e processam
Capítulo 3 32
Sensibilidade auditiva características mais refinadas da informação sonora.
Área auditiva primária (A1) Esta área tem especial interesse quanto à sua
assimetria funcional nos hemisférios cerebrais. Sua
A área auditiva primária dos mamíferos é
lesão, no hemisfério dominante para a linguagem,
cercada por múltiplas regiões distintas na superfície
determina afasia sensitiva.
opercular do lobo temporal, mas a principal área
auditiva primária está localizada no giro temporal
transverso anterior (giro de Heschl) e corresponde à
área 41 de Brodmann (Figura 4)5. Em A1 se projetam Sensibilidade vestibular
as fibras da radiação auditiva que se originam no
Área vestibular primária
corpo geniculado medial. Assim como o córtex
A área vestibular primária está localizada no
somatossensorial e visual, o córtex auditivo primário
lobo parietal em uma pequena região próxima da
contém um mapa tonotópico que reflete o padrão
área somestésica facial. Nesta área é processada a
de sensores periféricos (neurônios são organizados
percepção consciente da orientação espacial1. Além
em um mapa sistemático refletindo as frequências
desta área, a ínsula granular posterior também é
que melhor os estimulam)5. Neurônios sintonizados
descrita como córtex vestibular primário21.
para frequências mais baixas são encontrados na
extremidade rostral de A1, enquanto aqueles que
respondem a frequências mais altas se situam na
região mais caudal5. Sensibilidade olfatória
A área auditiva primária está relacionada Área olfatória primária (O1)
no processamento básico de estímulos
A área olfatória primária está localizada no lobo
auditivos, processamento de padrões acústicos
temporal medial em uma pequena área na região
descontinuados, detecção rápida de som e
mais anterior do uncus e do giro para-hipocampal.
processos auditivos semelhantes.
Esta área, também denominada de córtex piriforme,
Lesões unilaterais do córtex auditivo primário corresponde, pelo menos parcialmente, à área 34 de
causam déficits auditivos discretos, pois, ao Brodmann e é considerada a principal área cortical
contrário das demais formas de sensibilidade, a via olfativa (Figura 4)1. Esta área é grosseiramente
auditiva não é completamente cruzada1,5. Neurônios definida como a porção do córtex que recebe a
auditivos de A1 são estimulados por aferências de projeção direta do bulbo olfatório e está relacionada
ambas as cócleas, com a aferência contralateral com o processamento da informação olfatória
geralmente sendo mais importante do que a (discriminação dos odores)5,10.
aferência ipsilateral5. Lesões bilaterais dos giros de
Uma particularidade do córtex olfatório é ser
Heschl podem resultar em surdez central.
o destino de neurônios situados no bulbo olfatório
ipsilateral (via sensitiva consciente sem um relé
talâmico e com projeção cortical não cruzada)1,5.
Área auditiva secundária (A2)
O córtex olfatório recebe sinais centrífugos de
As áreas auditivas secundárias se localizam áreas encefálicas modulatórias, o que permite a
no lobo temporal, de forma adjacente a A1, e modulação da percepção sensorial conforme o
correspondem as áreas 42 e 22 de Brodmann estado comportamental5.
(Figura 4). Áreas auditivas também são observadas
no córtex insular posterior20. A função das áreas
secundárias é processar a informação auditiva para
Capítulo 3 33
Áreas olfatórias secundárias (O2) Áreas motoras
As áreas olfatórias secundárias se localizam As áreas motoras do córtex estão distribuídas
em regiões diversas, como ínsula, demais áreas do no lobo frontal (Figura 5). Tais áreas, assim como as
córtex piriforme e córtex orbitofrontal. A função das áreas sensitivas, também são divididas em primárias
áreas secundárias é processar a informação olfatória (de projeção) e secundárias (de associação). A
para características mais refinadas da informação . 22
área primária está relacionada à execução do ato
Um detalhe das áreas olfatórias secundárias motor e as áreas secundárias estão relacionadas
Capítulo 3 34
que é representada, segundo ilustrado por Penfield através dos tratos corticoespinal e corticonuclear5.
e Rasmussem, por um homúnculo motor (Figura 7).
A diversidade de funções envolvendo a
Superomedialmente, neste homúnculo, localiza-se
área 6 de Brodmann, provavelmente a maior
a área motora do pé e pernas. Na borda superior
área citoarquitetônica do mapa de Brodmann, é
do hemisfério localiza-se a área do tronco e braço.
surpreendente. No entanto, sua função básica
Na proximidade do segmento distal do sulco frontal
é a codificação do sequenciamento motor e
superior, localiza-se a extensa área motora da mão
planejamento de movimentos. As áreas motoras
que é seguida, mais inferiormente, pela área do
secundárias são ativadas funcionalmente antes
segmento cefálico, onde a boca também apresenta
da execução do movimento (planejamento do ato
uma área cortical desproporcionalmente grande em
motor). Este planejamento envolve estabelecer
relação à área corporal. Na porção mais baixa do
quais grupos musculares devem ser contraídos em
giro pós-central localizam-se as áreas da língua e
função da trajetória, velocidade, distância e força
faringe1,5.
necessárias para um movimento corporal harmônico
O fato da representação cortical para a mão e efetivo. As informações do planejamento motor
(especialmente dedos) e face (especialmente boca) são transmitidas à área M1 para que a execução do
terem representação cortical amplas demonstra, plano motor seja efetuada1.
mais uma vez, o princípio de que a extensão da
Lesões de M2 causam apraxias, ou seja,
representação cortical de uma parte do corpo
incapacidade de realizar um determinado movimento
depende da importância funcional desse segmento
apesar da capacidade de movimentar o membro
corporal para a biologia do animal (destreza do
estar preservada. Nestes pacientes, M1 não recebe
movimento pelo grupamento muscular), e não do
a codificação cortical para realizar o movimento
tamanho do segmento corporal1.
adequadamente1.
A área M1 está envolvida no controle de
todos os aspectos do movimento, mas em especial
nos movimentos fracionados necessários para atos Área pré-motora
motores voluntários que requerem habilidade e A área pré-motora está localizada na superfície
destreza . 5
superolateral do lobo frontal, anteriormente à área
organização somatotópica do córtex cerebral pode que compõem majoritariamente o trato cortico-
Capítulo 3 35
cerebelares) e demais áreas secundárias e principais aferências para a área motora suplementar
terciárias do córtex cerebral. Acredita-se que o são o tálamo (informações dos núcleos da base) e
planejamento motor da área pré-motora esteja demais áreas secundárias e terciárias do córtex
relacionado com o movimento corporal realizado cerebral. Acredita-se que o planejamento motor
por uma “influência externa” . Dessa forma, essa
1
da área motora suplementar esteja relacionado
área seria especialmente ativada para planejar um com o movimento corporal realizado por uma
movimento corporal que deve ser feito secundário a “decisão interna” - planejamento de sequências
um determinado estímulo externo . 1
complexas de movimentos1,10. Assim, essa área
seria especialmente ativada para planejar um
A área pré-motora integra o sistema de
movimento corporal que deve ser feito secundário
neurônios-espelho. Neurônios-espelho foram
a um planejamento estratégico das áreas corticais
inicialmente observados em macacos nas áreas
terciárias1.
corticais pré-motoras e parietais e, apenas mais
recentemente, foram descritos em humanos. Esse
sistema neuronal é ativado não somente antes do
Área de Broca
ato motor, como seria esperado para uma área
motora secundária, mas também quando o indivíduo Em 1861, Broca correlacionou a lesão do giro
observa outro realizando um determinado ato frontal inferior esquerdo com perda da expressão
motor1. Esse sistema localiza-se em parte da área da linguagem10. Situada nas partes opercular e
pré-motora e também no lóbulo parietal inferior. É porção posterior triangular do giro frontal inferior,
provável que exista uma distribuição somatotópica corresponde à área 44 de Brodmann. É responsável
dos neurônios nesse sistema. Os neurônios-espelho pela programação da atividade motora relacionada
das ações). Este sistema é a base anatomofuncional Esta área tem especial interesse quanto à sua
da aprendizagem motora por observação (modulação assimetria funcional nos hemisférios cerebrais. Sua
da excitabilidade de neurônios responsáveis pelo lesão, no hemisfério dominante para a linguagem,
ato motor aprendido através da observação) . 1
determina afasia motora.
A área motora suplementar está localizada na feixe corticonuclear e vai projetar-se na formação
proximidade da borda superomedial e face medial reticular pontina paramediana do lado oposto10. Essa
do lobo frontal, anteriormente à área motora primária formação, através do fascículo longitudinal medial,
Capítulo 3 36
(rotação da cabeça)10. A área oculógira frontal provavelmente nos mostrarão que todas as áreas
corresponde a uma subdivisão do córtex motor corticais apresentam algum componente funcional.
secundário.
Áreas terciárias
Lesão dessa área causa desvio conjugado do
As áreas terciárias (supramodais) ocupam o
globo ocular na direção da área lesada (déviation
topo da hierarquia funcional do córtex cerebral e
conjuguée).
não se relacionam diretamente com a modalidade
sensitiva ou motora. Dessa forma, as áreas
supramodais recebem e integram todas as
Áreas eloquentes
informações sensitivas já processadas pelas áreas
Segundo o dicionário de língua portuguesa secundárias e são responsáveis por planejar as
Michaelis, eloquente é um atributo das pessoas diversas estratégias comportamentais que podem,
com a habilidade de se expressar em público com ou não, ser expressas por atos motores através
desenvoltura; é a capacidade de convencimento. de conexões eferentes com as áreas motoras
Trata-se de um termo frequentemente utilizado na correspondentes1.
literatura neurológica para descrever algumas áreas
corticais. Tentar rastrear a origem dessa curiosa
terminologia mostra-se difícil, mas frequentemente Área pré-frontal
o termo aparece na literatura sobre malformação
A área pré-frontal localiza-se anteriormente
arteriovenosa (MAV)23. Essa terminologia foi
no lobo frontal e compreende a parte não motora
utilizada por Spetzler e Martin em um sistema
desse lobo cerebral. Trata-se de uma região que
de graduação proposto para MAVs, em que os
se desenvolveu muito durante a filogênese e, no
autores definiram áreas cerebrais eloquentes como
homem, ocupa cerca de 25% da superfície cortical1.
aquelas que correspondem a funções neurológicas
prontamente identificáveis e, se lesadas, resultam A área pré-frontal apresenta conexões com
em déficit neurológico incapacitante24. Esses autores diversas regiões corticais secundárias e terciárias,
consideraram como regiões eloquentes do córtex além de diversas estruturas subcorticais. Assim,
cerebral as áreas primárias somestésica, motora e justificando este amplo número de conexões
visual, e as áreas da linguagem24. neuronais, a área pré-frontal é responsável por
ser a coordenadora das funções neurais mais
Classicamente, o critério para definir o
complexas, tais como memória, manutenção da
sucesso neurocirúrgico se baseia no breve exame
atenção, estratégias comportamentais e o controle
neurológico à beira do leito. Os pacientes que foram
do comportamento emocional (controle executivo do
aprovados nessa breve avaliação são considerados
comportamento). Corresponde às áreas 9, 10, 11,
“neurologicamente intactos”, mesmo que tenham
12, 32, 45, 46 e 47 de Brodmann (Figura 4)1,10.
alguma alteração neuropsicológica ainda não
diagnosticada. Alterações de comportamento Funcionalmente, pode-se dividir a área pré-
ou memória, por exemplo, estão muito distantes frontal em duas regiões principais: dorsolateral e
de serem consideradas insignificantes23. Talvez, orbitofrontal1,5.
com um padrão mais rigoroso na avaliação do
resultado neurocirúrgico, nenhuma região do córtex
cerebral possa ser considerada “não eloquente”23. Área pré-frontal dorsolateral
Como veremos nos próximos itens deste texto, as
A subárea dorsolateral localiza-se na porção
modernas técnicas de neuroimagem e as avaliações
anterior e na superfície superolateral do lobo frontal.
neuropsicológicas cada vez mais sofisticadas,
Capítulo 3 37
Em decorrência de amplas conexões com o corpo e uma pequena parte adjacente aos lábios do sulco
estriado (em especial o putame - do latim, putamen), temporal superior (Figura 4)1.
esta região integra o circuito córtico-estriado-
Esta região localiza-se entre as áreas
talâmico-cortical. Tal circuito está envolvido nas
secundárias auditiva, visual e somestésica, e
chamadas funções executivas do córtex cerebral,
tem a função de integrar informações recebidas
tais como o planejamento e execução de estratégias
dessas três áreas sensitivas. A integração das
comportamentais mais adequadas às diferentes
informações já processadas dessas áreas gera uma
situações físicas e sociais do indivíduo; modificações
imagem mental completa dos objetos sob a forma
de comportamento em decorrência das modificações
de percepções mais holísticas (aparência, som,
do meio; avaliação das consequências das ações
tato, nomenclatura, etc.). Esta integração sensorial
do indivíduo em relação ao meio; planejamento e
também é importante para a autopercepção espacial,
organização estratégica; inteligência e memória
permitindo ao indivíduo determinar as relações entre
operacional1,5.
os diferentes objetos no espaço externo e, também,
criando uma imagem do indivíduo no espaço (área
do esquema corporal)1.
Área pré-frontal orbitofrontal
Além das funções sensoriais integrativas,
A subárea orbitofrontal localiza-se na a área parietal posterior também tem funções
superfície basal e parte da superfície medial do lobo associadas à atenção seletiva e as motoras
frontal. Em decorrência de amplas conexões com (planejamento do movimento e sistema de neurônios-
o corpo estriado (em especial, o núcleo caudado), espelho)1. A ampla integração sensitiva permitindo
esta região integra o circuito córtico-estriado- a autopercepção espacial é parte fundamental para
pálido-talâmico-cortical. Tal circuito está envolvido fornecer respostas motoras adequadas2,5.
no processamento das emoções (comportamento
emocional em decorrência de estímulos externos),
supressão do comportamento social indesejado e na Áreas límbicas
manutenção da atenção . 1,5
Na face medial do hemisfério localiza-
Outra importante via de projeção para a área se um “anel cortical” contínuo que é constituído
pré-frontal orbitofrontal é o feixe prosencefálico fundamentalmente pelos giros paraterminais, giro
medial. Este feixe forma o sistema dopaminérgico do cíngulo, istmo do giro do cíngulo, giro para-
mesolímbico (sistema de recompensa) e é hipocampal e hipocampo. Tal anel cortical contorna
caracterizado pela percepção de prazer em formações inter-hemisféricas, tais como o corpo
decorrência de comportamentos específicos, caloso e as comissuras anterior e posterior, e foi
tanto relacionados ao comportamento motivado considerado por Broca como um lobo independente
(importantes para a sobrevivência, tais como (lobo límbico)1,10. O lobo límbico é separado do córtex
as atividades alimentares e sexuais), quanto a adjacente pela fissura límbica, sulco descontínuo
situações do cotidiano . 1,5
formado sucessivamente pelos sulcos: para-olfatório
anterior, do cíngulo, subparietal, calcarino anterior,
colateral e rinal10.
Área parietal posterior O córtex límbico está funcionalmente
A área parietal posterior ocupa, na superfície relacionado à memória, às emoções e ao controle
superolateral do hemisfério, o lóbulo parietal inferior do sistema nervoso autônomo. Interessante
(áreas 39 e 40 de Brodmann), parte do lóbulo parietal notar que as áreas cerebrais envolvidas com o
superior (região posterior da área 7 de Brodmann), comportamento emocional são semelhantes e
Capítulo 3 38
próximas das áreas envolvidas na memória. Existe espaço (rotas e caminhos)1. A lesão do hipocampo
uma associação estreita entre emoção e a memória, resulta em amnésia anterógrada associada a uma
pois apenas as informações que são significativas amnésia retrógrada parcial (poucos anos).
do ponto de vista emocional e motivacional são
O giro denteado está relacionado com a
memorizadas. Informações emocionalmente neutras
dimensão temporal da memória (ordem cronológica
são geralmente esquecidas.
dos fatos e eventos)1.
Importante ressaltar que o conceito de sistema
O córtex entorrinal (área 28 de Brodmann)
límbico, relacionado às emoções e à memória, é
ocupa a face medial do giro para-hipocampal,
constituído por um amplo conjunto de estruturas
imediatamente posterior ao córtex olfatório do
corticais e subcorticais. Apesar do conceito ser
uncus. Dele se origina o principal sistema de fibras
controverso, em termos de sua concepção e
para o hipocampo. O córtex entorrinal pode ser
composição, os principais elementos do sistema
caracterizado como um “portão de entrada” das
límbico são a formação hipocampal e a amígdala,
informações para o hipocampo e, assim, também
que participam de circuitos distintos1,2. A formação
está relacionado à consolidação da memória10.
hipocampal está principalmente relacionada ao
processo de converter a memória de curto prazo O córtex para-hipocampal que ocupa a parte
que incluem a amígdala estão mais relacionados de Brodmann) está funcionalmente relacionado
Capítulo 3 39
cuja consolidação inicial depende das atividades humana cresceu desproporcionalmente mais do
do hipocampo e córtex entorrinal. As diferentes que o resto da ínsula em comparação com todas
modalidades de conhecimento são armazenadas as outras espécies de primatas.21 Recentemente, é
nas diferentes áreas de associação do neocórtex. observado um interesse no córtex insular humano,
Algumas formas específicas de memórias também com um número crescente de estudos com imagens
podem ser armazenadas em córtices de associação funcionais, identificando a ínsula como uma região
secundários . 1
central afetada por alguns distúrbios psiquiátricos e
neurológicos20.
Capítulo 3 40
córtices sensitivos secundários e de associação mais posterior do giro fusiforme. Esta área é uma
terciária. extensão das áreas de associação visual do lobo
occipital para o lobo temporal. A prosopagnosia
Em um modelo simplificado, a área de Wernicke
(incapacidade de reconhecer faces previamente
é responsável pela compreensão da linguagem e a
conhecidas) pode ser uma manifestação clínica
área de Broca pelo programa motor para expressar
de lesões corticais que envolvem o giro fusiforme
a linguagem. A conexão entre essas duas áreas
(principalmente no hemisfério direito).
corticais distintas, via fascículo arqueado, possibilita
compreender e expressar a linguagem (falada e A área parietal posterior é uma área envolvida
escrita) de forma adequada . Lesões na área de
1
na associação modal cruzada entre informações
Wernicke resultam em afasia sensitiva (distúrbio de secundárias (somestésica, auditiva e visual).
linguagem caracterizado por fala fluente, parafasias Classicamente, supõe-se que a área parietal
e incapacidade para a compreensão da linguagem). posterior esquerda participe das habilidades de
A afasia de Wernicke, entretanto, é bastante variável, cálculo, leitura, escrita, nomeação e algum tipo de
dependendo da localização e da extensão da lesão conhecimento corporal (somatognóstico). O déficit
cerebral. associado à lesão desta área no hemisfério esquerdo
(síndrome de Gerstmann) inclui acalculia, agrafia,
As áreas homólogas, no hemisfério não
desorientação direita-esquerda e agnosia digital.
dominante, acabam por ter funções complementares
A área parietal posterior direita participa de forma
às exercidas pelas áreas de Broca e Wernicke.
mais significativa no processamento visuoespacial
Dessa forma, no hemisfério não dominante, a área
e sua lesão resulta em negligência hemi-espacial
44 de Brodmann processa o programa motor que
(síndrome de negligência). Nestes casos, o paciente
permite a prosódia e a expressão facial adequadas
pode negligenciar tanto a metade esquerda do seu
ao conteúdo a ser expresso. Posteriormente, a
esquema corporal (o paciente não reconhece como
área 22 de Brodmann codifica a compreensão dos
“sua” a metade esquerda do corpo), quanto o lado
aspectos emocionais da linguagem.
esquerdo do espaço extrapessoal (o lado esquerdo
Funções caracteristicamente lateralizadas do mundo “deixa de existir de forma significativa”)1.
para o hemisfério direito são a capacidade de
distinguir notas musicais, percepção de relações
espaciais, atenção visuoespacial e o reconhecimento NEUROIMAGEM FUNCIONAL
da fisionomia dos indivíduos1. O objetivo da neurociência é a compreensão
Sons com intensidade espectral complexa e de como o fluxo de sinais elétricos através de
estruturas temporais (canto e música, por exemplo) circuitos neurais origina o comportamento humano
ativam áreas auditivas associativas espacialmente (como percebemos, agimos, pensamos, aprendemos
extensas em ambos os hemisférios, mas a área 22 e recordamos). Para estudar este complexo
de Brodmann, no hemisfério não dominante, parece comportamento, nós devemos desenvolver novas
desempenhar papel central neste processamento da abordagens para compreendermos o funcionamento
informação. de sistemas que vão de células nervosas individuais
ao substrato da cognição. Nossa capacidade de
O córtex somestésico secundário direito
registrar a atividade elétrica e visualizar alterações
está envolvido no processamento visuoespacial,
funcionais no encéfalo durante a atividade mental,
incluindo a percepção do espaço pessoal e imagens
normal e anormal permite que mesmo processos
espaciais1,5.
cognitivos complexos sejam estudados diretamente
O aspecto basal (inferior) da área 37 de nos dias atuais. Não estamos mais restritos a
Brodmann corresponde, grosseiramente, à parte simplesmente atribuir funções mentais a partir do
Capítulo 3 41
comportamento observado5. Brodmann é a variabilidade individual da localização
das diversas áreas funcionais. A falta de dados
A possibilidade de estudar as funções
sobre a variabilidade intersujeitos das áreas
corticais do indivíduo vivo, tanto sadio quanto o
citoarquitetônicas é uma grande desvantagem e um
acometido por patologias, proporcionada pelas
dilema para os pesquisadores contemporâneos13,16.
modernas técnicas de neuroimagem, expandiu
A localização das áreas de ativação cortical pode
exponencialmente as possibilidades de estudo
ser expressa apenas em termos de probabilidade,
da neuroanatomia funcional do córtex cerebral.
uma vez que as bordas citoarquitetônicas são
Imagens sem precedentes na história, acerca das
altamente variáveis entre os diferentes indivíduos.
complexidades do encéfalo intacto e plenamente
Consequentemente, os mapas citoarquitetônicos
funcional, agora são obtidas5. Tais pesquisas estão
como referências para estudos funcionais devem
permitindo o melhor entendimento de áreas até então
ser probabilísticos13. Um terceiro desafio para o
pouco conhecidas e a ampliação do conhecimento
estudo das áreas funcionais corticais é que nenhuma
de áreas previamente conhecidas, em especial as
tarefa neuropsicológica é realizada pela atividade
áreas corticais de associação secundária e terciária1.
de apenas uma área anatomicamente distinta17.
O advento da ressonância magnética, no Estudos de imagem funcional parecem apoiar essa
final dos anos 70 e início dos anos 80 do século compreensão holística.
XX, revolucionou o estudo da neuroanatomia, pois
Mesmo considerando tais desafios, o mapa
pela primeira vez ela pôde ser estudada in vivo com
citoarquitetônico de Brodmann é o mais conhecido
definição suficiente para diferenciar os diversos
e utilizado do córtex cerebral humano, e foi
compartimentos encefálicos. A capacidade de
reproduzido em diversos livros e atlas19,27. Com
obter informações detalhadas e de alta qualidade
a maior disponibilidade das novas técnicas de
revolucionou claramente a nossa compreensão da
neuroimagem, este mapa tende a ser cada vez mais
neuroanatomia26.
utilizado19.
Na atualidade, as duas técnicas mais utilizadas
O conhecimento da neuroanatomia funcional
na prática médica são a tomografia por emissão
da superfície cortical, discutida anteriormente,
de pósitrons e a ressonância magnética funcional.
tem importância não só para a compreensão
Ambos os métodos têm como princípio detectar
do funcionamento fisiológico do encéfalo, mas
modificações no fluxo e metabolismo que ocorrem
também para a correta interpretação dos exames
com a atividade local (áreas encefálicas mais ativas
neurorradiológicos.
consomem mais oxigênio e glicose)1.
Capítulo 3 42
comparativa do córtex dos mamíferos16,29. Oskar mas frequentemente ele encontrou limites mal
Vogt sugeriu a Brodmann que ele estudasse definidos entre as diferentes áreas. Além disso,
sistematicamente as células do córtex cerebral, nem todas as áreas mostra um padrão homogêneo
usando seções coradas com o método recém- de citoarquitetura: as áreas 6 e 24, por exemplo,
descrito por Franz Nissl (1860-1919) . 4
mudam gradualmente sua estrutura na direção
dorsoventral17. É importante também recordar
Ele descreveu as diferenças citoarquitetônicas
que as fronteiras entre as áreas muitas vezes não
do córtex cerebral e mostrou que o córtex humano
correspondem exatamente aos sulcos e fissuras
é organizado anatomicamente da mesma forma
cerebrais.
que nos demais mamíferos. O córtex consistia em
seis camadas e, com base nisso, ele planejou seu Embora ele planejasse publicar um atlas
sistema numérico para se referir a diferentes áreas citoarquitetônico completo do cérebro humano (e
corticais. Isso culminou em sua magnum opus em assim fornecer uma documentação histológica
1909 . A monografia de Brodmann é um resumo
15
abrangente para seu mapa cortical), esse plano
de seu conceito de citoarquitetura. Ele definiu a nunca foi realizado devido à eclosão da Primeira
citoarquitetura como ‘‘a localização dos elementos Guerra Mundial e sua morte prematura em 191819.
histológicos individuais, suas camadas e sua parcela Sua monografia e suas publicações sobre a divisão
no cérebro adulto’’ 4,16
. citoarquitetônica de todo o córtex cerebral humano
fizeram de Brodmann um dos fundadores do campo
O mapa de Brodmann do córtex humano exibe
do mapeamento anatômico do cérebro13.
43 áreas citoarquitetônicas, enquanto macacos e
grandes símios têm apenas cerca de 30 áreas. Cada Raramente, na história da neurociência uma
área cortical de seu mapa humano é rotulada por um única ilustração teve tanta influência quanto o mapa
número entre 1 e 52, mas as áreas com os números citoarquitetônico do cérebro humano publicado por
12 a 16 e 48 a 51 não são mostradas no mapa. Brodmann13. O mapa é um desenho esquemático de
Brodmann explicou essas «lacunas» com o fato de uma vista lateral e medial de um cérebro humano.
que algumas áreas não são identificáveis no córtex Ele segregou o córtex cerebral em 43 áreas corticais
humano, mas são bem desenvolvidas em outras pertencentes a 11 regiões. Cada uma das áreas é
espécies de mamíferos. Isso é válido principalmente caracterizada por uma citoarquitetura específica13.
para os córtices olfatório, límbico e insular13. A ínsula Não há um único "mapa de Brodmann", mas sim
humana não foi parcelada por Brodmann, apesar várias versões dele, que foram gradualmente sendo
dele ter encontrado duas sub-regiões claramente modificados entre 1908 e 191419.
distintas, uma área agranular (anterior) e uma área
Até hoje os mapas de Brodmann são
granular (posterior), separadas por uma linha que é
universalmente usados para localizar funções
um prolongamento do sulco central15,19. No entanto,
neuropsicológicas no córtex cerebral, embora o
ele achou difícil dividir a ínsula em áreas separadas,
sistema classificatório de Brodmann tenha sido
e concluiu que “a localização precisa desses campos
debatido, refinado e renomeado por mais de um
individuais deve aguardar uma investigação mais
século17.
aprofundada” 15,19
.
Capítulo 3 43
sensitivo; associação terciária (7b). Córtex sensitivo
secundário (7a – área parietal superior an-
• área 2: área caudal pós-central. Locali- terior) e córtex de associação terciário (7b
zada no giro pós-central. Área primária – área parietal superior posterior);
da sensibilidade geral (somestésica). Os
neurônios são organizados de maneira • área 8: área frontal intermediária. Locali-
somatotópica no giro pós-central. Córtex zada no giro frontal superior anteriormente
sensitivo; à área 6 de Brodmann (tanto na superfície
medial – área motora suplementar; quanto
• área 3: área rostral (oral) pós-central. Lo- na superfície superolateral área pré-moto-
calizada no giro pós-central. Área primária ra e área oculógira frontal). Córtex motor
da sensibilidade geral (somestésica). Os secundário;
neurônios são organizados de maneira
somatotópica no giro pós-central. Córtex • área 9: área frontal granular. Localizada
sensitivo; no lobo frontal anteriormente à área 8 de
Brodmann. Parte do córtex pré-frontal dor-
• área 4: área piramidal gigante. Localiza- solateral, esta área desempenha um pa-
da aproximadamente na metade posterior pel importante na memória de trabalho e
do giro pré-central. Área motora primária. nos processos cognitivos superiores (por
Nela encontram-se os neurônios pirami- exemplo, resolução de problemas e julga-
dais gigantes (células de Betz) que dão mentos recentes). Junto com as áreas 10,
origem ao trato corticospinal e corticonu- 11 e 46 de Brodmann, esta área constitui
clear. Córtex motor; o córtex pré-frontal que está associado à
personalidade do indivíduo e está envolvi-
• área 5: área pré-parietal. Localizada na
do com a memória e aspectos cognitivos.
porção mais anterior do lóbulo parietal
Córtex de associação terciário;
superior e em uma pequena área do pré-
-cuneo na superfície medial do hemisfério. • área 10: área frontopolar. Localizada na
Área de associação sensitiva (em especial porção anterior do lobo frontal (polo fron-
no processamento visuoespacial). Córtex tal). Parte do córtex pré-frontal, esta área
sensitivo secundário; desempenha um papel importante na me-
mória de trabalho e nos processos cogni-
• área 6: área frontal agranular. Localizada
tivos superiores (em especial, na memória
anteriormente à área 4 de Brodmann (por-
de trabalho, memória espacial e no esque-
ção mais anterior do giro pré-central e por-
cimento intencional de memórias. Córtex
ções mais posteriores dos giros frontais
de associação terciário;
superior e médio). Compreende as áreas
motora suplementar (porção mais superior • área 11: área pré-frontal. Localizada ante-
e medial) e pré-motora (porção mais infe- roinferiormente no lobo frontal (parte ante-
rior e lateral). Córtex motor secundário; rior do giro reto e giros orbitais). Parte do
córtex pré-frontal que está relacionada ao
• área 7: área parietal superior. Localizada
comportamento social (pode-se associar
posteriormente à área 5 de Brodmann e
esta área ao “estilo de reação” ou “estilo
ocupando a maior parte do lóbulo parietal
emocional idiossincrático” do indivíduo).
superior e a região do pré-cuneo na su-
Córtex de associação terciário;
perfície medial cerebral. Está envolvida
na contagem e matemática (hemisfério • área 12: área pré-frontal. Localizada na
dominante), processamento visuoespacial superfície medial do lobo frontal posterior
(especialmente no hemisfério não domi- e superior à área 11 de Brodmann (maior
nante) e recuperação de memória episódi- parte do giro reto). Esta área não foi in-
ca. Área de associação sensitiva (7a) e de cluída inicialmente no mapa de Brodmann.
Capítulo 3 44
Córtex de associação terciário; • área 20: área temporal inferior. Localiza-
da principalmente no giro temporal inferior
• área 13: área insular posterior. Localizada (córtex visual temporal) e em parte do giro
na parte posterior do córtex insular. Essa fusiforme (área cortical para o reconheci-
área não foi definida para o cérebro huma- mento facial). Córtex de associação visual
no por Brodmann, mas é análoga à locali- (significado emocional para cores e ex-
zação do córtex insular do macaco; pressão facial). Córtex sensitivo (visual)
secundário;
• área 14: área insular anterior. Localizada
na parte anterior do córtex insular. Essa • área 21: área temporal média. Localizada
área não foi definida para o cérebro huma- no giro temporal médio, ocupando a maior
no por Brodmann, mas é análoga à locali- parte desse giro (córtex visual temporal).
zação do córtex insular do macaco; Córtex de associação visual. Córtex sensi-
tivo (visual) secundário;
• área 15: área insular ventral. Localizada
na parte ventral do córtex insular. Essa • área 22: área temporal superior. Locali-
área não foi definida para o cérebro huma- zado na porção do giro temporal superior
no por Brodmann, mas é análoga à locali- adjacente às áreas 41 e 42 de Brodmann.
zação do córtex insular do macaco; Córtex de associação auditivo (no hemis-
fério dominante para linguagem esta área
• área 16: área insular olfatória. Essa área
constitui parte da área de Wernicke). Cór-
não foi definida para o cérebro humano
tex sensitivo (auditivo) secundário;
por Brodmann, mas é análoga à localiza-
ção do córtex insular do macaco; • área 23: área cingular ventral posterior.
Localizada na metade inferior da parte
• área 17: Área estriada. Localizada adja-
posterior do giro do cíngulo (acompanhan-
cente ao sulco calcarino (lábios da meta-
do aproximadamente a metade posterior
de posterior do sulco calcarino). Recebe
do corpo do corpo caloso e o esplênio do
aferências da radiação óptica. A área vi-
corpo caloso). Esta área é aparentemente
sual primária também é denominada de
mais ativada durante tarefas de linguagem
área estriada devido à presença, em sua
(por exemplo, processamento léxico-
estrutura, da estria de Gennari ou de Vicq
semântico) e processos emocionais.
d’Azyr. Córtex de projeção visual (possui
Córtex límbico. Córtex de associação
organização retinotópica e é responsável
terciário;
pela percepção visual). Córtex sensitivo
(visual) primário; • área 24: área cingular ventral anterior.
Localizada na parte anterior do giro do
• área 18: área occipital. Localizada de for-
cíngulo. Córtex límbico (relacionado ao
ma adjacente (circundando) à área 17 de
julgamento emocional da consciência so-
Brodmann. Também denominada de área
matossensorial, especificamente da per-
paraestriada. Córtex de associação visual
cepção de dor). Córtex de associação ter-
(reconhecimento inicial da cor e movimen-
ciário;
to). Córtex sensitivo (visual) secundário;
• área 25: área subgenual. Localizada na
• área 19: área pré-occipital. Localizado de
superfície medial do lobo frontal (giro pa-
forma adjacente à área 18 de Brodmann
raterminal). Área relacionada às funções
(porção mais anterior do lobo occipital).
executivas emocionais e motivacionais.
Também denominada de área periestria-
Córtex límbico. Córtex de associação ter-
da. Córtex de associação visual (reconhe-
ciário;
cimento de objetos). Córtex sensitivo (vi-
sual) secundário; • área 26: área ectosplenial. Localizada no
Capítulo 3 45
istmo do giro do cíngulo (inferoposterior- caloso. Córtex límbico (ativado durante a
mente ao esplênio do corpo caloso). Cór- excitação sexual e desempenha papel na
tex límbico. Córtex de associação terciário; interocepção). Córtex de associação ter-
ciário;
• área 27: área pré-subicular. Localizada no
giro para-hipocampal, adjacente ao sulco • área 34: área entorrinal dorsal. Localizada
do hipocampo. Córtex límbico (associada no uncus e pertence ao córtex entorrinal
à codificação da memória, memória de (em conjunto com a área 28 de Brodmann).
trabalho e memória episódica). Córtex de Área associada a memória, avaliação
associação terciário; emocional e olfato. Córtex límbico. Córtex
olfativo e de associação terciário;
• área 28: área entorrinal. Localizada na
face medial e anterior do giro para-hipo- • área 35: área perirrinal. Localizada no lobo
campal (imediatamente caudal ao córtex temporal adjacente ao sulco rinal (entre as
olfatório do uncus). Dessa área origina- áreas 28 e 36 de Brodmann). Córtex lím-
-se o principal sistema de fibras aferentes bico (envolvimento com a memória e fun-
para o hipocampo (assim, essa área está ções emocionais). Córtex de associação
muito relacionada a codificação e consoli- terciário;
dação da memória). Córtex límbico. Cór-
tex de associação terciário; • área 36: área ectorrinal. Localizada apro-
ximadamente na metade medial do giro
• área 29: área retrolímbica granular. Lo- fusiforme (superfície basal do lobo tempo-
calizada no istmo do giro do cíngulo ral). Córtex de associação terciário;
(justaposta posteriormente à área 26 de
Brodmann). Córtex límbico. Córtex de as- • área 37: área occipitotemporal. Localiza-
sociação terciário; da na porção mais posterior do lobo tem-
poral, tanto na superfície superolateral
• área 30: área retrolímbica agranular. (giros temporais médio e inferior) quanto
Localizada no istmo do giro do cíngulo na superfície basal (giros temporal infe-
(justaposta posteriormente à área 29 de rior e fusiforme). Córtex de associação
Brodmann). Córtex límbico. Córtex de as- visual (reconhecimento e nomenclatura
sociação terciário; de palavras e objetos, contribuição para o
reconhecimento facial e associações léxi-
• área 31: área cingular dorsal posterior. co-semânticas). Córtex sensitivo (visual)
Localizada na metade superior da parte secundário;
posterior do giro do cíngulo (logo acima
da área 23 de Brodmann). Córtex límbico. • área 38: área temporopolar. Localizada
Córtex de associação terciário; no polo temporal. Córtex límbico (vários
papéis putativos são atribuídos ao polo
• área 32: área cingular dorsal anterior. temporal: processamento social e emocio-
Localizada na superfície medial do lobo nal, distinção self-outro, recuperação de
frontal (giro frontal superior e parte do giro memória e até mesmo a compreensão do
do cíngulo) entre as áreas 8, 9 e 10 de humor). Córtex de associação terciário;
Brodmann (anteriormente) e a área 24 de
Brodmann (posteriormente). Córtex límbi- • área 39: área angular. Localizada no giro
co (relacionado ao julgamento emocional angular (lóbulo parietal inferior). As princi-
da consciência somatossensorial, especi- pais funções atribuídas a essa área são
ficamente da percepção de dor). Córtex de o processamento visual (reconhecimento
associação terciário; facial, leitura), imagens espaciais, função
visuomotora (movimento dos olhos), me-
• área 33: área pré-genual. Localizada adja- mória ortográfica e matemática (hemisfé-
cente à porção anterior do sulco do corpo
Capítulo 3 46
rio dominante). Córtex de associação ter- e 47 foram denominados como área sub-
ciário; frontal por Brodmann). Localizada na por-
ção triangular do giro frontal inferior (no
• área 40: área supramarginal. Localizada hemisfério dominante para a linguagem,
no giro supramarginal (lóbulo parietal in- esta área também é identificada como
ferior), exceto por uma estreita faixa cor- área de Broca). Essa área é especialmente
tical anteriormente. As principais funções relacionada à programação motora da
atribuídas a essa área são a discriminação língua e em funções mais complexas como
espacial, funções numéricas e, no hemis- o processamento de metáforas e memória
fério dominante para a linguagem, a con- de trabalho. Área pré-motora (posterior-
versão grafema-letra. Córtex de associa- mente) e de associação terciária (anterior-
ção terciário; mente). Córtex motor secundário (na sua
porção mais posterior) e de associação
• área 41: área temporal transversa ante-
terciária (na sua porção mais anterior);
rior (interna). Localizada no giro temporal
transverso anterior. O córtex auditivo pri- • área 46: área frontal média. Localizada na
mário é responsável pela percepção do porção anterior do giro frontal médio (pos-
som. Seus neurônios são organizados de terior à área 10 de Brodmann na superfície
maneira tonotópica. Córtex de projeção superolateral). Essa divisão do córtex pré
auditiva. Córtex sensitivo (auditivo) primá- -frontal está envolvida na motivação, me-
rio; mória, atenção e várias tarefas cognitivas.
Córtex de associação terciário;
• área 42: área temporal transversa poste-
rior (externa). Localizada posteriormente • área 47: área orbital (as áreas 44, 45 e 47
à área 41 de Brodmann. Tem papel como foram denominados como área subfrontal
córtex auditivo secundário e é, no hemis- por Brodmann). Localizada na parte or-
fério dominante para a linguagem, um bitária do giro frontal inferior (posterior à
elemento da área de Wernicke. Córtex de área 11 de Brodmann na superfície supe-
associação auditivo. Córtex sensitivo (au- rolateral). Memória, emoção e olfato são
ditivo) secundário. Nota. Alguns autores funções putativas dessa área do córtex
consideram essa área como córtex audi- frontal. Córtex de associação terciário;
tivo primário;
• área 48: área pós(retro)-subicular. Locali-
• área 43: área subcentral. Localizado nas zada na área retrossubicular, posterior à
regiões operculares frontal e parietal. Cór- área 35 de Brodmann, na face medial do
tex de projeção gustativa. Córtex sensitivo lobo temporal. Essa área não foi definida
(gustativo) primário; para o cérebro humano por Brodmann
(embora descrita, a área não foi ilustrada
• área 44: área opercular (as áreas 44, 45
no mapa cortical);
e 47 foram denominados como área sub-
frontal por Brodmann). Localizada na por- • área 49: área parassubicular. Essa área
ções opercular e pequena parte da trian- não foi definida para o cérebro humano
gular do giro frontal inferior. No hemisfério por Brodmann;
dominante para a linguagem, esta área é
identificada como área de Broca (respon- • área 50: área gustatória. Essa área não foi
sável pela programação da atividade mo- definida para o cérebro humano por Brod-
tora relacionada com a expressão da lin- mann;
guagem). Área pré-motora no lobo frontal.
Córtex motor secundário; • área 51: área piriforme. Essa área não foi
definida para o cérebro humano por Brod-
• área 45: área triangular (as áreas 44, 45 mann; e
Capítulo 3 47
• área 52: área parainsular. Localizada na 15. Garey LJ. Brodmann’s localisation in the cerebral cortex:
superfície opercular do giro temporal su- the principles of comparative localisation in the cerebral
cortex based on cytoarchitectonics. 3rd ed. New York:
perior (entre a área 41 de Brodmann e a Springer; 2006.
ínsula). Representa uma área de transição
16. Zilles K. Brodmann: a pioneer of human brain mapping-
estreita, semelhante a uma faixa, entre o his impact on concepts of cortical organization. Brain.
córtex temporal e a ínsula. Trata-se de 2018;141(11):3262-3278.
uma área sem informações funcionais cla-
ras disponíveis.
17. Strotzer M. One century of brain mapping using
Brodmann areas. Klin Neuroradiol. 2009;19(3):179-86.
18. Brodmann K. Vergleichende localisationslehre der
grosshirnrinde in ihren principien dargestellt auf grund des
REFERÊNCIAS zellenbaues. Leipzig: Barth; 1909.
1. Machado A, Haertel LM. Neuroanatomia Funcional. 3ª ed.
19. Judaš M, Cepanec M, Sedmak G. Brodmann’s map
São Paulo: Atheneu; 2014.
of the human cerebral cortex-or Brodmann’s maps?
2. Ribas, GC. Applied Cranial-Cerebral Anatomy: Brain Translational Neuroscience. 2012;3(1),67-74.
Architecture and Anatomically Oriented Microneurosurgery.
20. Gogolla N. The insular córtex. Curr Biol.
Cambridge: Cambridge University Press; 2018.
2017;27(12):R580-R586.
3. Tubbs RS. “Anatomy is to physiology as geography is
21. Benarroch EE. Insular cortex: Functional complexity and
to history; it describes the theatre of events”. Clin Anat.
clinical correlations. Neurology. 2019;93(21):932-938.
2015;28(2):151.
22. Uddin LQ, Nomi JS, Hébert-Seropian B, Ghaziri J,
4. Pearce JM. Brodmann’s cortical maps. J Neurol
Boucher O. Structure and Function of the Human Insula. J
Neurosurg Psychiatry. 2005;76(2):259.
Clin Neurophysiol. 2017;34(4):300-306.
5. Kandel ER, Schwartz JH, Jessell TM, Siegelbaum SA,
23. Fried I. The myth of eloquent cortex, or what is non-
Hudspeth AJ (eds). Princípios de Neurociências. 5ª ed.
eloquent cortex? J Neurosurg. 1993;78(6):1009-1010.
Porto Alegre: McGraw-Hill & Artmed; 2014.
24. Spetzler RF, Martin NA. A proposed grading system for
6. Leuret F, Gratiolet PL. Anatomie comparée du système
arteriovenous malformations. J Neurosurg. 1986;65:476-
nerveux considéré dans ses rapports avec l’intelligence.
483.
Paris: Baillière; 1839.
25. Butti C, Hof PR. The insular cortex: a comparative
7. Gratiolet LP. Mémoire sur les plis cerébraux de l’homme
perspective. Brain Struct Funct. 2010;214(5-6):477-493.
et des primates. Paris: Bertrand; 1854.
26. Lerch JP, van der Kouwe AJ, Raznahan A, et al.
8. Hubel DH. The brain. Sci Am. 1979;241(3):44-53.
Studying neuroanatomy using MRI. Nat Neurosci.
9. Herculano-Houzel S. The human brain in numbers: a 2017;20(3):314-326.
linearly scaled-up primate brain. Front Hum Neurosci.
27. Tailarach J, Tournoux P. Coplanar stereotaxic atlas of
2009;3:31.
the human brain. Stuttgart: Thieme; 1988.
10. Gusmão SS, Ribas GC. Dicionário de Neuroanatomia.
28. Loukas M, Pennell C, Groat C, Tubbs RS, Cohen-Gadol
1ª ed. Rio de Janeiro: Dilivros; 2009.
AA. Korbinian Brodmann (1868-1918) and his contributions
11. Williams PL, Warwick R (eds). Gray’s Anatomy. 36nd ed. to mapping the cerebral cortex. Neurosurgery. 2011;68(1):6-
Philadelphia: Saunders; 1980. 11.
12. Pearce JMS. Fragments of neurological history. London: 29. Bielchowsky M, Brodmann K. Zur feineren histologie
Imperial College Press; 2003. und histopathologie der grosshirnrinde mit besonderer
berücksichtigung der dementia paralytica, dementia senilis
13. Zilles K, Amunts K. Centenary of Brodmann’s map-
und idiotie. Journal für Psychologie und Neurologie.
conception and fate. Nat Rev Neurosci. 2010;11(2):139-45.
1905;5:173–99.
14. Sarnat HB, Netsky MG. Evolution of the Nervous
30. Zilles K. Brodmann: a pioneer of human brain mapping-
System, 2nd ed. New York: Oxford University Press; 1981.
his impact on concepts of cortical organization. Brain.
2018;141(11):3262-3278.
Capítulo 3 48
CAPÍTULO 4
ANATOMIA DA MEDULA ESPINHAL
Capítulo 4 49
como formada por duas porções celulares distintas: profundidade aproximada de 3mm, e contém os
uma lâmina externa contínua e mais compacta, em ramos sulcais da artéria e veia espinhal anterior. Na
contato com a dura-máter e uma porção menos linha média da face posterior encontra-se o sulco
densa que forma as trabéculas aracnoides. O mediano posterior. Mais raso na superfície, ele se
espaço definido entre a lâmina externa e a pia-máter continua por uma delicada camada glial, que se
é denominado espaço subaracnoideo, contém o estende profundamente, até a substância cinzenta
líquido cefalorraquidiano (líquor) e os vasos (artérias intermediária da medula, denominada septo mediano
e veias) que vão nutrir a medula espinhal. O espaço posterior. De cada lado da linha média, tanto
subaracnoideo (ESA) medular se comunica com anterior quanto posteriormente, pode-se observar
o ESA intracraniano na altura do forame magno e um sulco menos distinto, que corresponde à origem
se continua inferiormente até a altura da segunda aparente das raízes espinhais. A porção anterior,
vértebra sacra (S2). É um espaço relativamente onde emergem as fibras da raiz ventral (motora)
amplo e contém aproximadamente metade do líquido denomina-se sulco anterolateral e a posterior,
cefalorraquidiano (aproximadamente 75ml). Como onde penetram as raízes sensitivas (dorsais) sulco
a medula espinhal termina na altura da segunda posterolateral. Uma vez que os filamentos radiculares
vértebra lombar (L2), o espaço subaracnoideo distal ventrais emergem em intervalos menos regulares e
a este ponto forma a cisterna lombar, com a cauda são menos numerosos que os da raiz dorsal, este
equina no seu interior, espaço ideal para colheita de sulco acaba por ser mais difícil de ser identificado1.
LCR via punção lombar. Ainda na superfície posterior da medula, nas regiões
torácica alta e cervical pode ser identificado, entre
A pia-máter é a membrana mais interna,
os sulcos mediano posterior e o póstero-lateral, o
envolve a medula espinhal em toda sua extensão,
sulco intermédio posterior, o qual se projeta no
estando intimamente aderida a ela. A pia-máter
interior da substância branca como septo intermédio
emite uma série de projeções laterais, de formato
posterior, uma banda glial que se estende em
triangular, que a une à dura-máter, dividindo-a em 21
direção à substância cinzenta da medula e divide
segmentos, denominados ligamentos denticulados.
o funículo posterior em duas porções, os funículos
Estes ligamentos, mais espessos na porção cervical
grácil e cuneiforme.
que no lombar, se projetam lateralmente até o nível
do cone medular, situam-se entre a raiz motora e Numa sessão transversal da medula, observa-
sensitiva e se inserem na dura-máter cerca de 2mm se que a fissura mediana anterior e o septo mediano
dorsal e cranial ao forame intervertebral. A pia-máter posterior dividem (incompletamente) a medula em
termina, no final do cone medular, formando uma duas metades, conectadas por uma comissura
estrutura ligamentar (filum terminale) que une o estreita na linha média, formada por substância
cone ao cóccix. Do ponto de vista biomecânico, os branca e cinzenta. Diferentemente do cérebro, que
ligamentos denticulados e o cone medular exercem tem a camada cortical (cinzenta) externamente,
uma proteção ao movimento de tração da medula a medula espinhal tem uma estrutura cinzenta em
espinhal .
3
forma de asa de borboleta localizada centralmente.
A presença de grande número de corpos celulares
de neurônios, com cromatina no núcleo, confere
esta coloração mais escura da substância cinzenta.
ANATOMIA MACRO E MICROSCÓPICA
A substância cinzenta da medula é circundada
Na superfície da medula espinhal alguns
por um conjunto de fibras mielinizadas (axônios)
sulcos longitudinais são visíveis. Na face anterior
ascendentes e descendentes, que lhe dão o aspecto
identifica-se a fissura mediana anterior, a qual,
de substância branca. A substância cinzenta da
revestida pela pia-máter, penetra a medula numa
medula é formada, de cada lado, por uma coluna
Capítulo 4 50
cinzenta posterior ou corno dorsal, e uma coluna ou
VASCULARIZAÇÃO
corno anterior. Unindo as duas colunas (anterior e
O suprimento arterial da medula espinhal é
posterior), na linha média, encontra-se a comissura
constituído por dois sistemas de vasos dispostos
cinzenta, com o canal central do epêndima no centro.
ortogonalmente, denominados sistema longitudinal
Circundando o canal central, microscopicamente,
e transversal4.
pode-se identificar uma camada granular fina,
composta predominantemente de neuroglia, O sistema longitudinal é composto pelas
denominada substância gelatinosa central. artérias espinhais, em número de três: uma artéria
espinhal anterior e um par de artérias espinhais
A coluna cinzenta posterior ou corno posterior
posteriores. A artéria espinhal anterior, localizada
se estende póstero-lateralmente quase até a
na linha média, anterior à fissura mediana anterior,
superfície da medula, onde se localiza a zona de
dá origem aos ramos sulcais que penetram a
entrada da raiz dorsal (do inglês: dorsal root entry
fissura anterior e perfundem principalmente o corno
zone ou DREZ), e está relacionada a neurônios
anterior, os funículos anterior e lateral da medula
predominantemente sensitivos. A coluna cinzenta
espinhal e a base do corno posterior. As artérias
anterior, relacionada à atividade motora, se estende
espinhais posteriores, localizadas de cada lado na
ventralmente, tem um aspecto mais arredondado, e
superfície posterior da medula, aproximadamente
não se aproxima tanto da superfície. No segmento
equidistante entre o sulco mediano posterior e o
torácico da medula, entre o corno anterior e
sulco póstero-lateral (origem das raízes posteriores),
posterior, existe uma pequena proeminência lateral,
são responsáveis pela perfusão do corno e funículo
a coluna cinzenta lateral da medula, que contêm os
posteriores da medula.
corpos celulares dos neurônios do sistema nervoso
autônomo simpático. O sistema transversal basicamente é
formado a partir dos ramos espinhais das artérias
A substância branca medular pode ser
segmentares, ramos da aorta, que penetram o
subdividida, de cada lado, em três regiões: funículos
canal medular de cada lado da medula espinhal
anterior, lateral e posterior. O funículo anterior é
acompanhando a raiz correspondente. Cada ramo
delimitado pela fissura mediana anterior e o sulco
espinhal se divide em dois ramos, um anterior, que
anterolateral (origem das raízes motoras). O funículo
quando nutre a medula espinhal é denominado
lateral entre os sulcos anterolateral e o póstero-
artéria radiculomedular anterior, que acompanha a
lateral (origem das raízes motoras e sensitivas
raiz motora e se anastomosa com a artéria espinhal
respectivamente). O funículo posterior tem suas
anterior, e um ramo posterior, artéria radiculopial,
margens definidas pelo corno posterior da medula e
que acompanha a raiz posterior e se anastomosa
o septo mediano posterior. Na linha média anterior
com as artérias espinhais posteriores e com um
à comissura cinzenta, existe um conjunto de fibras
sistema (vasocorona) na superfície pial da medula5.
transversas, a comissura branca anterior. Cada
um desses funículos é formado por um conjunto Na região cervical, correspondendo à
de fibras nervosas ascendentes e descendentes intumescência cervical, um ramo radiculomedular
mielinizados ou não. Estes conjuntos de fibras no segmento C6-7 ou C5-6, mais frequentemente
nervosas, quando tem uma mesma origem, trajeto do lado esquerdo, se anastomosa com a espinhal
e destino são denominados tractos ou fascículos. anterior, sendo a principal responsável pela
A posição relativa destes tractos nos funículos da vascularização deste segmento da medula.
medula está representada na Figura 1:
Na região torácica baixa, em geral na altura
de T10, também predominantemente à esquerda,
existe uma artéria radiculomedular, a artéria de
Capítulo 4 51
Figura 1: Tractos nos funículos da Medula.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 4 52
Adamkievicz, que, se lesada, pode levar a paraplegia, sistema coletor longitudinal formado por duas veias
déficit sensitivo nos membros inferiores e perda do predominantes, uma anterior e uma posterior. Neste
controle esfincteriano. sistema extrínseco não se verifica uma dominância
anterior ou posterior. Estes sistemas drenam por
Várias outras artérias segmentares, em
veias segmentares (utilizando, por exemplo, o
diferentes regiões, colaboram no suprimento
sistema lombar ascendente ou o sistema azygus)
sanguíneo para a medula espinhal: na região cervical,
para a veia cava superior e ilíacas.
as artérias vertebrais, as cervicais ascendentes e as
artérias cervicais profundas. Na região torácica, as
artérias intercostais. Na região lombar, as artérias
REFERÊNCIAS
lombares, ileolombares, lombares inferiores e 1. Parent A, Spinal cord: regional anatomy and internal
sacrais. structure. In: Parent A, Carpenter MB, eds. Carpenter’s
human neuroanatomy. Baltimore: Williams & Wilkins; 1996.
O sistema de drenagem venosa da p. 325-359.
medula espinhal tem recebido especial atenção 2. Acioly, M.A. Operative spinal cord anatomy. The
neurosurgical Atlas; 2020.
principalmente nos últimos 30 anos, devido a sua
3. Tubbs RS, Salter G, Grabb PA, Oakes WJ. The
importância nas, assim chamadas, malformações
denticulate ligament: anatomy and functional significance. J
arteriovenosas extramedulares posteriores na Neurosurg. 2001;94(2):271-275.
medula espinhal. O sistema de drenagem venoso
medular é subdividido em dois, um intrínseco e um 4. Aguiar LR, C Martins. Embriologia e anatomia vascular
extrínseco. O sistema intrínseco é formado a partir da medula espinhal. In: Tahara A, Antunes ACMA, Isolan
GR, Aguiar PHP, eds. Tratamento neurocirúrgico das
de uma rede capilar venosa com anastomoses doenças vasculares do SNC. Rio de Janeiro: DiLivros;
axiais (radiais), arranjadas simetricamente e tem um 2012. p. 45-60.
padrão de distribuição predominantemente anterior, 5. Lasjaunias PL, Berenstein A, Brugge GR. Surgical
Neuroangiography. 2nd edition. Heidelberg: Springer; 2001.
para uma veia sulcal ou central. O sistema venoso Spinal and spinal cord arteries and veins; p. 73-164.
extrínseco mostra uma correlação mais próxima do
sistema arterial, inclui uma rede venosa pial, e um
Capítulo 4 53
PARTE 3
SEMIOLOGIA E EXAMES COMPLEMENTARES
CAPÍTULO 5
SEMIOLOGIA NEUROLÓGICA
Alexandre Souza Bossoni Um único capítulo não será suficiente para detalhar todos
os padrões de lesões medulares, cerebrais, as diversas
síndromes autonômicas, as mononeuropatias focais, os
INTRODUÇÃO diversos padrões de polineuropatias dentre tantas outras
Primeiramente, vamos definir os termos semiologia alterações neurológicas.
e semiótica.
Este capítulo é uma provocativa e um roteiro
Semiologia: Substantivo feminino. Meio e modo sugerido de exame neurológico, tentando trazer
de se examinar um doente. Meio de se verificar sinais e maior clareza ao estudante. O avanço dos métodos
sintomas de alguma doença. Sintomatologia. Semiótica. diagnósticos pode tentar o jovem médico a considerar os
Propedêutica. achados de exame físico e de história clínica supérfluos e
Semiótica: substantivo feminino. Ciência geral que até dispensáveis. Entretanto, quanto maior a quantidade
tem como objetivo todos os sistemas de signos e todos de informações criadas por métodos complementares de
Capítulo 5 55
sequências e ordens de avaliação. A ordem exata cuidado nesta observação. Vale lembrar que os
não importa. O relevante é que todos os pontos testes propostos para avaliação de determinada
sejam avaliados e que, ao final do exame, tenhamos função mental nunca avaliam exclusivamente uma
uma visão geral do doente e de suas queixas e única função. Os testes requerem todas as funções
necessidades. ao mesmo tempo, porém em maior ou menor grau
de uma determinada função (por exemplo, um
Por exemplo, o livro de DeJong opta por
paciente com afasia de compreensão pode ter
iniciar o exame neurológico por aspectos gerais do
grande dificuldade de compreender testes para
funcionamento mental e funções corticais superiores,
atenção ou função executiva). Ter consciência
posteriormente, nervos cranianos e, então, a
disto e adaptar à beira do leito os instrumentos de
motricidade, sensibilidade e demais avaliações.
avaliação, para cada situação e cada paciente, são
Outra boa referência, Brazis, opta por começar
muito importantes.
o exame com nervos periféricos, avaliação de
plexos, medula, e então, nervos cranianos. No livro A abordagem do coma e da morte encefálica
Propedêutica Neurológica, de Eduardo Mutarelli, serão feitas futuramente.
a ordem proposta é outra. Estas são as principais
referências usadas por este autor para este capítulo. Orientação
Neste item o foco principal é determinar se o
doente é capaz de situar-se no espaço e no tempo.
ESTADO MENTAL E FUNÇÕES As alterações aqui podem indicar tanto quadros
COGNITIVAS
psiquiátricos (como manifestação de transtorno
A consciência humana é entendida como o dissociativo) como quadros neurológicos (síndrome
estado de entendimento de si e do meio. Neste item demenciais, por exemplo). O modo mais prático é,
do exame neurológico o objetivo é avaliar como está em paciente devidamente acordado, perguntar se o
a percepção de si e do meio do doente examinado. doente sabe o dia do mês, dia da semana, mês do
O doente está acordado ou dormindo? Acorda com ano, ano, local em que está, cidade em que está,
facilidade? Mantém a vigília sem dificuldades? nome de bairros e ruas, por exemplo.
Compreende comandos e os executa corretamente?
Sabe o dia de hoje e o local em que está? Mantém a Atenção
atenção em uma tarefa ou se distrai com facilidade? A atenção é a capacidade cognitiva de
Note que essas perguntas propostas fazem focarmos em um determinado estímulo, inibindo
parte de diversas escalas de avaliação da função de chegar à consciência estímulos concorrentes.
mental, com a de Glasgow, inicialmente proposta Faz também parte da função Atenção mudar o foco
para avaliação de trauma; como o Miniexame do atencional entre os estímulos. Quando a atenção está
estado mental (mini mental), que se propõe a ser comprometida, todos e quaisquer testes futuramente
uma avaliação de triagem de quadros demenciais; propostos estarão contaminados pela alteração de
o MoCA test, com o mesmo objetivo do mini mental, atenção, sendo, portanto, esta avaliação de vital
porém com uma estrutural diferente e até a escala importância. Para avaliação da atenção, além da
de NIH para avaliação do acidente vascular cerebral. observação direta e passiva do comportamento do
doente, podemos submetê-lo a testes específicos.
Basicamente, a avaliação da função
mental é basicamente feita pela observação Teste da letra A: solicite que o doente levante
dos comportamentos produzidos pelo doente, e abaixe a mão toda vez que ouvir a letra A, dentro
espontaneamente e durante tarefas dirigidas. É de uma sequência aleatória de letras. Importante
necessário que o examinador tenha atenção de observar as omissões (quando a letra é dita e o
Capítulo 5 56
Figura 1: Nervo óptico e vias ópticas.
Fonte: Arte de Pedro Schmidt dos Reis Matos Figueiredo, 2021.
Capítulo 5 57
doente não emite comportamento) e as intrusões atos motores ou atos aprendidos.
(quando o doente emite o comportamento sem ter
Basicamente os testes de memória são
ouvido a letra – falta de controle inibitório).
baseados na apresentação de estímulos (forma,
Limite de dígitos direto: é dito para o doente figuras, palavras, cores, etc.) e a recuperação da
uma sequência numérica progressivamente maior informação em diferentes tempos. Os estímulos
e solicita-se que ele repita a sequência. Exemplo: podem ser repetidamente apresentados em diferentes
fala-se a sequência: 3,8,9. Aguardamos a resposta intervalos ao longo da testagem, e ainda podemos
do doente. A seguir, damos uma nova sequência colocar estímulos confundidores no momento da
aleatória maior: 3,9,0,1. Espera-se que um indivíduo recordação da informação (por exemplo, pedir para
normal consiga cumprir a tarefas com sequências de um doente identificar em um conjunto de palavras,
7 ± 2 números. Veja que neste teste a memória de as quais já teriam sido apresentadas anteriormente
trabalho também e requerida. ou não).
Capítulo 5 58
principalmente para aspectos de leitura e funções Após testar a nomeação podemos avaliar a
não verbais da linguagem. Foge à função deste fluência verbal, ou seja, a quantidade de palavras
capítulo a avaliação total da linguagem. formadas em determinado tempo. Com isso, as
afasias podem ser classificadas em fluentes (com
a fluência preservada – Wernicke e de condução,
Disartrias por exemplo) e não-fluentes (como a de Broca,
em que a fluência está reduzida). A fluência pode
Diz-se disartria quando existe apenas
ser estimada pela observação de fala espontânea
um problema mecânico na produção da fala. A
ou pela avaliação sistematizada com número de
ideia, o objetivo e as funções da linguagem estão
palavras ditas em 1 minuto (categoria semântica
preservados. Apenas a produção dos sons é que está
– animais, por exemplo – ou categoria fonêmica –
comprometida. Isto pode ocorrer por dificuldades da
palavras iniciadas com a letra P, por exemplo).
coordenação dos músculos da fala e por problemas
anatômicos do aparelho fonador. Também podem Testada a fluência, prossegue-se para o teste
ser causadas por lesões dos nervos bulbares ou dos da compreensão, ou seja, quanto da informação
núcleos dos nervos bulbares, que causam paralisias fornecida é decodificada e executada. Para isto
locais, comprometendo a produção da fala. pode-se pedir ao doente para executar tarefas
simples (colocar o dedo da mão direta na orelha
esquerda, por exemplo) e também coisas sobre o
Afasias dia a dia (Quem é maior, o rato ou a galinha? Pedra
boia na água? O céu é azul?)
É fundamental o conhecimento e o
reconhecimento das afasias, que são os distúrbios Após a compreensão, prosseguimos para o
da linguagem. Na prática clínica, é bastante comum teste de repetição, que testa mais especificamente
pacientes afásicos serem interpretados como a função do fascículo arqueado. Pede-se ao doente
“confusos”, desorientados ou até portadores de para repetir uma frase padronizada (O preço do
patologia psiquiátrica. A classificação das afasias tomate subiu ontem. O trem chegou atrasado com
pode ser problemática, e gerar opiniões diferentes mais de uma hora na estação).
entre os examinadores e até entre o mesmo
A capacidade de leitura e escrita
examinador em momentos diferentes de avaliação.
complementam a avaliação da linguagem. Com
O exame da linguagem e, consequentemente todos estes dados disponíveis é possível classificar
das afasias é iniciado pela observação da fala as afasias em motora, sensitiva, transcorticais
espontânea. O doente fala normalmente, usa sujeito, motoras e sensitivas, mistas, global, de condução,
verbo e predicado de forma correta? Tem habilidade anomia pura e demais, porém este não será assunto
no uso de elementos conectivos (preposições e específico desta sessão.
conjunções)? O doente tem prosódia, cadência e
entonação? Agnosias
O denominador comum das afasias é a Gnosis é o termo que indica conhecimento,
quando solicitado, informar o substantivo específico, e apreciação dos estímulos recebidos. Pode-se
ou seja, quando é mostrada uma caneta ao doente, entender como o final do processamento cortical
espera-se que ele diga “caneta” em resposta à das informações. A agnosia, portanto é a perda
pergunta “que objeto é este?” ou “o que é isso?”. da capacidade de reconhecer um estímulo, sua
Os afásicos não terão essa capacidade. Este é o função, importância ou significado, mesmo tendo
primeiro passo no exame formal das afasias. sido adequadamente percebido e na ausência de
Capítulo 5 59
alterações cognitivas e perceptuais. Geralmente a esquerdo não atingem a consciência e ficam como se
agnosia acaba sendo específica para algum canal fossem ignorados. Existem vários tipos de graduação
sensorial. Por exemplo, de olhos fechados, por meio destes déficits, desde o não reconhecimento do
exclusivamente do tato, o doente seria incapaz de membro do corpo como sendo próprio do paciente,
reconhecer um objeto cilíndrico com uma ponta em tanto o não reconhecimento de estímulos vindo
uma das extremidades como uma caneta (porém do hemi-espaço esquerdo quando um estímulo
mantém a capacidade de descrever exatamente o simultâneo é apresentado (por exemplo, com o
objeto que está em suas mãos). Entretanto com a examinador diante o paciente, o doente é capaz de
visão, este reconhecimento seria imediatamente indicar se o examinador está movimentando a mão
feito. Em outro exemplo, não reconheceria os sons direita ou a esquerda, quando o faz separadamente,
característicos do tilintar de chaves, mais ao tocá- porém não é capaz de identificar o movimento da mão
las saberia que objeto é. esquerda quando as duas estão se movimentando
simultaneamente). Além disso, existem alterações
Apraxias específicas em que o doente não tem capacidade
de compreender uma cena por completo, é capaz
Apraxia é a incapacidade de realizar um ato
apenas de identificar os elementos isolados, ou
motor voluntário, intencional, complexo, porém
é incapaz de reconhecer o rosto de pessoas, ou
familiar na ausência de déficit de força, sensorial, de
ainda pode referir que um estímulo foi aplicado
coordenação ou cognitivo que justifique melhor esta
do lado direito quando na verdade foi aplicado do
incapacidade. Há diversos tipos de apraxia descritos
lado esquerdo. Este capítulo é muito pequeno para
nos livros. A apraxia ideomotora é a incapacidade do
entrarmos em todos os detalhes. Porém chamo
doente em realizar um ato motor complexo (mostrar
atenção para quando houver evidências outras de
o ato motor para pedir carona, para responder que
lesões do hemisfério não dominante para que estas
sim, para cumprimentar, por exemplo). Pode ser
funções sejam ativamente avaliadas ou, ainda,
incapaz de mostrar com mímica como se usam
quando existir alguma alteração comportamental ou
objetos simples do dia a dia, como escova de dentes
cognitiva, também haja avaliação específica destas.
e martelo. Em alguns casos o doente consegue
fazer o gesto apenas por imitação. A apraxia ideativa
Demais alterações da função mental
está mais relacionada com um comprometimento
Na mesma proporção da complexidade
na concepção do objetivo global do movimento. O
da experiência cognitiva e emocional humana,
doente consegue fazer cada parte isolada do ato
existem alterações patológicas. Existem alterações
motor mais complexo, porém, ao tentar fazer o ato
específicas da leitura, da capacidade de abstração,
final, ele erra a sequência, omite movimentos e os
de cálculo, do reconhecimento de objetos, sons,
faz de modo inadequado. Por exemplo, se solicitado
música, símbolos e demais. Porém, no momento, o
para mostrar como faz para escovar os dentes,
objetivo desde capítulo não comportaria a discussão
pode primeiro escová-los propriamente dito antes
de todas estas lesões. Contudo, é fundamental o
de colocar a pasta na escova.
estudo destas alterações para todos aqueles em
formação para serem neurologistas, neurocirurgiões
Atenção espacial e reconhecimento de
estímulos ou neuropediatras.
Capítulo 5 60
fundamental o conhecimento neuroanatômico das movimentos. Pode haver hipotonia, quando os
vias motoras e suas relações nos diversos locais do músculos estão mais flácidos do que o esperado.
sistema nervoso central. Resumidamente, há dois Pode haver hipertonia quando o estado de semi-
neurônios principias quando se fala de motricidade: contração está acima do esperado. O conceito de
o neurônio motor superior, cujo corpo celular está “acima do esperado” é adquirido com muita prática
localizado no córtex motor e cujo axônio percorre e repetição da observação clínica, pois certamente
todo o caminho até o corno anterior da medula, e idade, compleição física e hábitos mudam o tônus
o neurônio motor inferior, cujo corpo celular está e o trofismo sem necessariamente implicar em uma
localizado no corno anterior da medula e cujo axônio patologia. As hipertonias podem ser divididas em
irá em direção à fibra muscular e diretamente inerva plásticas e elásticas. As primeiras estão relacionadas
o miócito. A lesão de cada um desses neurônios com alterações centrais da regulação motora e não
causará padrões diferentes de acometimento. são dependentes da velocidade do movimento. Ou
seja, ao se examinar os pacientes, a hipertonia está
A redução da força motora é descrita como
presente durante todo o arco do movimento, na
paresia. A ausência de contração muscular é
mesma intensidade, independente da velocidade
descrita como plegia. Quando acomete um único
do movimento, comum em doenças extrapiramidais,
membro, recebe o prefixo mono; quando acomete
como a doença de Parkinson. A hipertonia elástica
dois membros equivalentes (as duas pernas,
está relacionada com alteração tardia de lesões do
por exemplo), recebe o prefixo para; e quando
sistema piramidal. Relaciona-se com a presença de
acomete os membros de um dos lados do corpo,
espasticidade. Neste tipo de hipertonia, quanto mais
será denominada hemi. O termo completo(a) indica
rápido o membro for passivamente movimentado,
que há alteração motora da face. Predomínio
maior e mais agressiva será a resposta motora
crural ou braquifacial indicam lesões que mais
dos músculos antagonistas ao movimento. Ao se
severamente acometem membros inferiores ou
manter a força para realização do movimento, o
superiores, respectivamente. Bi (paresia ou plegia)
músculo antagonista logo cede, dando origem, por
quer identificar duas lesões separadas que causam
exemplo, ao sinal do canivete, quando se testa o
hemiparesias. Tetra (paresia ou plegia) indica uma
músculo quadríceps femoral. Outra manifestação
única lesão que causa perda motora bilateralmente.
da espasticidade é o clônus, que é uma série de
A motricidade voluntária fica a cargo do trato contrações musculares rítmicas em que o espasmo e
corticoespinhal. Tem início no córtex motor, suas o relaxamento se sucedem por tempo indeterminado
fibras percorrem a corona radiata, passam pela (clônus inesgotável) ou por tempo limitado (clônus
cápsula interna, atravessam o mesencéfalo. No esgotável) após o estiramento súbito de uma parte
tronco cruzam de lado e se separam, formando o do corpo, sendo mantida a força de estiramento.
trato corticoespinhal lateral e o trato corticoespinhal
A hipotonia da criança é um dos primeiros
anterior na medula. O primeiro é responsável
sinais de diversas doenças neurológicas. Nos
principalmente pela movimentação voluntária dos
adultos as hipotonias podem ser vistas em lesões
membros e o segundo pelo controle motor axial do
medulares agudas, lesões de nervos periféricos e
corpo. O funcionamento do trato corticoespinhal é
doenças musculares.
modulado e influenciado por diversos outros tratos
descendentes, que não comentaremos aqui.
Trofismo
Enquanto no tônus é um estado de semi-
Tônus
contração do músculo, o trofismo se relaciona mais
É o estado de semi-contração dos músculos,
com o tamanho e o contorno do músculo. Certamente
que os mantém prontos para execução de
Capítulo 5 61
estas características são modificadas por hábitos de podemos citar:
vida e compleição física, logo, a avaliação do trofismo
• desvio pronador (sinal de Barré): pacien-
deve estar contextualizada para cada doente e as
te com os braços estendidos para frente,
assimetrias e as desproporções são indicativos de
palmas das mãos voltadas para cima, de
possíveis anormalidades. olhos fechados. Quando há perda de força
motora de padrão piramidal ocorre o des-
Força Motora vio da mão em pronação, com queda do
A força motora pode ser quantificada por meio braço e leve flexão do cotovelo;
da escala que segue:
• manobra do rolamento: com os membros
Zero – indica ausência de contração muscular superiores levemente estendidos para
perceptível: frente, em rotação internação de ombro,
com os cotovelos flexionados a 90 graus,
1 – indica presença de contração muscular,
pede-se para o paciente girar simultanea-
porém sem movimento perceptível:
mente os antebraços entre si. O lado pa-
2 – indica presença de contração muscular rético não fará o movimento adequado,
que gera movimento do membro, porém que tendo amplitude e velocidade diferente do
não vence a força da gravidade: membro contralateral;
3 – indica presença de contração muscular
• velocidade do movimento: com as extre-
que gera movimento e que vence a gravidade,
midades pede-se para o paciente fazer
contudo não vence resistência aplicada ao
movimento na máxima velocidade possí-
membro:
vel. Nas mãos é possível testar movimen-
4 – indica presença de contração muscular, to de pinçamento, por exemplo, e nos pés,
com movimento no membro examinado que movimento de flexão e extensão de torno-
vence a gravidade e alguma resistência (neste zelo; e
ponto importante considerar características
dos indivíduos): e o grau 4 pode ser subdividido • manobra de Mingazzini: paciente se dei-
entre 4 + (quatro mais) e 4 – (quatro menos) ta, com os quadris e joelhos flexionados a
para tentar indicar os pacientes que vencem 90 graus. Do lado parético ocorrerá queda
resistências maiores ou menores durante o do membro. Este teste exige grande força
exame. dos músculos abdominais, desde modo,
pode ser um teste de difícil realização em
5 – força muscular normal.
pacientes sedentários.
Cada músculo deve ser examinado
isoladamente pedindo que o paciente tente realizar Movimentos anormais
o movimento do músculo, contra resistência imposta Os movimentos anormais são um grande
pelo examinador. O examinador deve posicionar o capítulo da Neurologia e devem ser estudados
paciente de modo que o músculo possa exercer sua separadamente, dada sua grande gama de
melhor ação e o músculo deve ser palpado durante apresentações e complexidade envolvida. Coloco
o exame, para melhor avaliação da contração aqui apenas as principais definições dos principiais
muscular. Para cada músculo há uma posição de movimentos anormais para serem reconhecidos. A
técnica específica. Convido o leitor à consulta de existência dos movimentos anormais psicogênicos
livros específicos (por exemplo, os citados no início coloca uma camada extra de complexidade na
desde capítulo) para as técnicas isoladas. avaliação clínica.
Existem manobras clássicas para avaliação,
especialmente das hemiparesias. Dentre elas
Capítulo 5 62
Tremor migratórios dando a impressão de movimentos
fluidos de uma dança. A atetose é um termo que
Movimentos oscilantes, geralmente rítmicos,
quer descrever o mesmo padrão de movimento,
gerados pela contração alternante entre músculos
porém mais distais e mais discretos. Este termo tem
agonistas e antagonistas. Deve ser descrito em
sido cada vez menos usado.
termos de sua frequência, sentido do tremor (prono-
supinação, flexão, extensão, etc) em que momento
ocorrem (durante o movimento – de ação; durante
Balismo
o repouso – de repouso; ou quando uma intenção é
dada ao membro – tremor de intenção) Movimentos anormais bruscos, mais violentos
de que os demais, geralmente acometendo
musculatura proximal dos membros causando
Mioclonias movimento de lançamento, arremesso do segmento
corporal acometido.
Movimento anormal caracterizado por uma
contração muscular rápida e forte seguida de uma
breve fase de contração isotônica e, então, seguida
Tiques
de um relaxamento mais lento do que foi a contração.
Podem ocorrer após estímulo sensorial. Existe Movimento anormal parcialmente involuntário.
também a mioclonia negativa, termo que descreve a Pode assumir múltiplas fenomenologias. É
perda transitória de tônus muscular. caracterizado por um movimento que pode ser
suprimido pela vontade. A supressão do movimento
é associada a uma sensação desconfortável,
Distonia crescente até que o indivíduo não é mais capaz
de conter o movimento, realizando-o e tendo a
É um padrão de movimento anormal
sensação de desconforto aliviada. Após um período
involuntário causado pela contração síncrona de
de supressão, pode ocorrer um aumento transitório
músculos agonistas e antagonistas, causando
da quantidade e da intensidade dos tiques.
posturas de torção dos membros e tronco. Podem
ocorrer movimentos repetitivos de torção (por
vezes chamados de tremor distônico) ou a distonia
Asterix ou Flapping
pode ser fixa. Pode ser descrita nos termos da sua
localização (focal – um único grupamento muscular É um tremor do punho causado pela dorsiflexão
é acometido; por exemplo, cãimbra do escrivão, passiva e força desta articulação, semelhante ao
distonia cervical, blefaroespasmo/multifocal – “bater de asas de um pássaro”. Geralmente, quando
quando duas ou mais regiões não contíguas estão presente, indica desordens metabólicas.
envolvidas/segmentar – quando todo um segmento
do corpo é acometido, com grupamentos musculares
contíguos/generalizada – quando acomete membros Estereotipias
e porção axial). Descreve movimentos bastante padronizados,
feitos repetidamente, com pouca variação, por tempo
prolongado podendo ser auto-lesivos. Geralmente
Coreia e Atetose encontrados em crianças com transtornos invasivos
Movimentos anormais involuntários do desenvolvimento ou pacientes com desordens
caracterizados por movimentos oscilantes, psiquiátricas.
ondulatórios, erráticos, não padronizados e
Capítulo 5 63
Acatisia A sensibilidade térmica pode ser testada
usando objetos semelhantes com diferentes
Descreve a situação de incapacidade de
temperaturas. No cotidiano está disseminado
ficar sentado e parado. O paciente experimenta
o teste com algodão seco e outro embebido de
uma sensação de inquietude, angústia, agitação
álcool. A crítica a esta técnica é que o líquido
interna, que o impele a mover-se para aliviar esta
pode causar estimulação tátil e então mascarar a
sensação. Quadro causado por neurolépticos de
resposta. Tubos de ensaio com água em diferentes
primeira geração. O termo não deve ser usado
temperaturas podem ser também usados, porém
para descrever comportamento decorrentes de
são menos práticos e disponíveis.
transtorno de ansiedade.
A sensibilidade dolorosa é grosseiramente
testada por meio de alfinetes descartáveis que
se faz punturas na pele. Existem outros métodos
SENSIBILIDADE
mais acurados e técnicas para avaliação de dor,
A sensibilidade é processo por meio do qual
especialmente nos pacientes com quadros de
os estímulos físicos e químicos são convertidos
dores neuropáticas. Essas técnicas, entretanto,
em impulsos elétricos nos neurônicos, conduzidos
não serão abordadas aqui.
centralmente e então interpretados pelo sistema
nervoso. É parte fundamental da nossa comunicação
e relação com o meio ambiente e parte fundamental Tato epicrítico, sensibilidade vibratória e
propriocepção
para o controle de nossos próprios corpos.
Tato epicrítico é o tato discriminativo.
Nesta sessão o foco é voltado para
Aquele que identifica texturas e tem alta resolução
percepções táteis e do corpo. A nocicepção é
espacial. A sensibilidade vibratória é aquela testada
apenas brevemente comentada.
com o diapasão, indicando, portanto, alta resolução
temporal desta via. A propriocepção é a capacidade
Sensibilidade térmico-dolorosa, tato de sentir uma parte do corpo em relação às outras.
protopático
Anatomicamente esta via é diferente daquela
A sensibilidade térmico-dolorosa é dada
do tato protopático. É uma via formada por axônios
por receptores cutâneos e terminações nervosas
altamente mielinizados, de condução rápida. Vindos
livres localizadas na pele. É uma via primitiva
da periferia, logo ao entrar na medula, estes axônios
de sensibilidade, composta por fibras pouco
se acumulam no corpo posterior da medula, dando
mielinizadas de condução lenta. Desde modo a
origem ao trato grácil e cuneiforme. Cranialmente,
resolução espacial é pouco acurada. O primeiro
farão a primeira sinapse da via nos núcleo do trato
neurônio da via está no gânglio da raiz dorsal
grácil e núcleos do trato cuneiforme. O neurônio de
dos nervos espinhais (sendo este neurônio um
segunda ordem, por sua vez, cruza a linha média,
pseudounipolar). Seu axônio, vindo da periferia,
formando o lemnisco lateral, fazendo sua sinapse
direciona-se para o corno posterior da medula,
no tálamo, que repassará as informações para
onda faz sua primeira sinapse. Na sequência, o
diversas regiões do córtex.
próximo neurônio, encaminha seu axônio para o
lado contralateral da medula e então direciona-se
cranialmente pelos tratos espinotalâmicos laterais
até o tálamo. Esta mesma via é responsável pelo
tato protopático, uma forma primitiva, não sendo
capaz de gerar grande discriminação espacial.
Capítulo 5 64
sensibilidade dolorosa contralateral ao dé-
PRINCIPAIS PADRÕES DE ALTERAÇÕES
ficit motor, preservando sensibilidade pro-
SENSÓRIO-MOTORAS EM LESÕES DO
SISTEMA NERVOSO funda (síndrome hemimedular).
• cápsula interna – fraqueza completa (in- dolorosa contralateral à lesão. Síndrome piramidal
clui face) e proporcionada. Hemi-hipoeste- deficitária homolateral à lesão.
sia contralateral ao tálamo acometido; Lesão do funículo posterior (tratos grácil e
Capítulo 5 65
sem predomínio, déficits sempre proporcionais. pela contração do ânus, quando a pele ao seu redor
é estimulada.
Córtex cerebral: hemi-hipoestesia contralateral
à lesão com predomínio braquiofacial ou crural. Reflexo bulbo cavernoso; está relacionado
ao reflexo anal. Ocorre contração do esfíncter anal
quando é aplicado estímulo na glande peniana.
Capítulo 5 66
ou ao final do movimento);
COORDENAÇÃO
O cerebelo e suas vias são responsáveis • hipotonia: achado também comum em le-
pela coordenação motora e pelo aprendizado sões cerebelares;
motor. Recebe ampla aferência cortical e nunca faz
• disartria: manifestação na voz e perda de
eferência direta para moto-neurônios. Sua função controle fino da musculatura do aparelho
é modular as respostas motoras do organismo, fonatório; e
garantindo que os movimentos sejam harmônicos,
corretos e se alternem corretamente ao longo do • ataxia: nome dado a perda da coordena-
ção dos movimentos.
tempo. O cerebelo também desempenha funções
cognitivas como memória e aprendizado motor,
Principais testes de avaliação da função
porém não serão objetos neste capítulo.
cerebelar
A avaliação da coordenação passa pela
Testes índex-nariz, índex-nariz-índez,
realização de movimentos voluntários pelo doente. índex-índex e calcanhar-joelho
Deve-se observar se o doente acerta o alvo do
Em todas as situações o doente é solicitado
movimento, se ele ocorre de modo harmônico e com
para realizar um movimento com alvo determinado.
a velocidade correta.
No primeiro, o doente deve tocar o próprio nariz e
Nas alterações cerebelares podem ser então estender totalmente seu braço. No segundo,
encontradas as seguintes alterações: deve tocar o dedo do examinador e então voltar e
tocar o próprio nariz. No terceiro, o doente deve tocar
• dissinergia: perda da ação harmoniosa e
coordenação entre os diversos músculos os dedos em frente ao corpo de olhos fechados.
para realização de um movimento. A força, No último, com o paciente deitado, solicita-se que
escala temporal, amplitude do movimento o doente toque um dos joelhos com o calcanhar
e a sequência de ativação dos músculo contralateral, deslize-o pela tíbia e então retorne o
estão dessincronizados; membro para maca de exames. Em todos os testes,
devem ser observados tremores nas manobras,
• dismetria: erros no julgamento de distân-
cia entre o membro e o objeto. São erros durante o movimento, se o alvo foi corretamente
no julgamento de distância, velocidade do acertado, se o movimento foi homogêneo e fluido.
movimento e na direção do movimento. O
Teste de Romberg: paciente em pé, inicialmente
doente erra o alvo;
de olhos abertos, com os pés juntos e com os
• coordenação agonista e antagonista: du- braços ao longo do corpo. Solicita-se que o paciente
rante o movimento normal ocorre uma feche os olhos. No caso de doenças cerebelares,
ativação da musculatura agonista e de o equilíbrio não é fortemente prejudicado quando o
modo proporcional uma inibição dos anta- paciente fecha os olhos. Quando há desequilíbrio
gonistas. No caso de lesões cerebelares
e queda, nas lesões cerebelares não tem lado
esta coordenação é perdida de modo que
preferencial. No caso de síndromes com perda da
o primeiro surto de ativação agonista não
é contrabalanceado por inativação anta- sensibilidade profunda, ocorre queda sem latência,
gonista, ocorrendo o movimento de modo logo ao se fechar os olhos, por perda de aferência
mais rápido e forte do que o esperado; visual; quando há quadro vestibular o desequilíbrio
ocorre com latência e com queda para o lado da
• tremores: podem ocorrer tremores duran-
preferencial.
te os movimentos, caracteristicamente
são tremores intencionais (durante o mo- Enquanto o paciente está em ortostase com
vimento, piores quando próximos do alvo os pés juntos, é possível observar contrações
Capítulo 5 67
irregulares dos tendões do pé. Este é o sinal da longo do corpo com os olhos inicialmente abertos.
dança dos tendões e indica uma contínua tentativa É observado se mantém a ortostase. Em seguida,
de correção da postura para manter o paciente em o doente é solicitado a fechar seus olhos. Segue a
ortostase. observação do doente. Para sensibilizar a manobra,
pode-se pedir ao doente para ficar na ponta dos
Marcha: caminhar é uma atividade complexa
pés, posteriormente apoiado nos calcanhares e, por
e altamente coordenada. Lesões cerebelares
final, com os pés em tandem, lembrando de trocar
causarão alteração da marcha, sendo ela irregular,
sempre o pé de apoio para avaliação simétrica dos
com tamanho de passos variando a cada momento,
membros inferiores. Outro teste adicional pode ser
com base de apoio alargada (aumento da distância
a aplicação, por trás, de uma tração firme, curta e
entre os pés).
brusca dos ombros do doente, para desestabilizá-
Olhos: os movimentos oculares também lo. Uma resposta normal implica na semi-flexão do
estão acometidos. Em caso de doenças cerebelares joelho, coordenada com a propulsão para frente do
podem ocorrer nistagmos grosseiros, flutter ocular, tronco, para manter a ortostase.
nistagmos com mudança de direção conforme a
A avaliação dinâmica é feita com o paciente
direção do olhar, e desvios oblíquos do olhar.
andando normalmente, com marcha bípede
Disdiadococinesia: dificuldade em realizar espontânea, marcha em tandem, na ponta dos pés
movimento rápidos e alternados. e nos calcanhares; marcha estática (marcha de
Podemos reconhecer três principais síndromes Fukuda) e marcha em estrela são testes adicionais
cerebelares. As lesões na região do lobo flóculo para auxiliar na avaliação de lesões cerebelares e
nodular causarão principalmente alterações da vestibulares.
motricidade ocular e nistagmos. As lesões mediais, A marcha humana normal compreende uma
interessando principalmente o verme cerebelar, sequência complexa de movimentos coordenados e
manifestar-se-ão por meio de ataxia de marcha; alternados ao longo do tempo, ocorrendo uma troca
e, por sua vez, lesões hemisféricas causarão alternada do apoio do corpo e propulsão do membro
principalmente ataxia apendicular, com alteração à frente, culminando com o deslocamento do corpo.
dos movimentos dos membros. O ciclo completo da marcha é composto de duas
partes: fase de apoio (quando o pé está em contato
com o solo) e a fase de balanço (quando o pé está se
EQUILÍBRIO E MARCHA deslocando sem contato com o solo – corresponde a
Equilíbrio e marcha somente são possíveis 40% do tempo do ciclo da marcha). A fase de apoio é
com os sistemas estudados até o momento íntegros. composta pelas seguintes subfases: 1) fase de toque
Ou seja, alterações do sistema somatossensorial, do calcanhar (quando o calcanhar começa a tocar
cerebelar e demais podem causar, no final, alteração o solo); 2) fase de contato (quando todo o pé está
de equilíbrio e marcha. apoiado no chão); 3) fase de apoio médio (quando
ocorre deslocamento anterior da tíbia e o centro
Por equilíbrio, entende-se a capacidade
de pressão desloca-se anteriormente); 4) fase de
do doente em manter-se em ortostase. Ele pode
saída do calcanhar (quando o calcanhar se descola
ser estático, quando a ortostase é mantida com o
do solo e ocorre extensão do hálux e o centro de
paciente parado, ou dinâmico, quando o paciente
pressão está bastante anteriorizado no pé); e 5) fase
está em movimento.
de propulsão (pré-balanço – que é o contato final do
Para testar o equilíbrio estático, pede-se háluz no solo). A fase de Balanço é composta de três
ao paciente para ficar em pé, com os braços ao subfases: 1) balanço inicial (quando o halux termina
Capítulo 5 68
seu contato com o solo, ocorre flexão de joelho e
NERVOS CRANIANOS
quadril); 2) fase do balanço médio (quando ocorre
maior flexão do quadril, elevação do joelho e sua Nervo olfatório (I NC)
flexão); e 3) fase de balanço final (quando ocorre Responsável pela identificação de moléculas
extensão do joelho, flexão de tornozelo e preparação voláteis presentes no ar inalado, sendo responsável
para o toque do tornozelo no chão.). pelo olfato. Atua em íntima relação com as papilas
gustativas, sendo parte fundamental da percepção
Principais marchas patológicas de sabor dos alimentos. Conecta-se diretamente
Marcha cerebelar: base de apoio aumentada, com o sistema nervoso central, não passando pelo
Marcha talonante: é a marcha decorrente de cotidiana é pouco realizada. Existem testes formais
elevação do joelho durante a fase de balanço com odor específico padronizado e então, o sujeito é
lançamento vigoroso do pé contra o solo durante a solicitado para identificar o odor (banana, alho e
fase de desaceleração. café, por exemplo). De modo prático podem ser
usados condimentos e substâncias do cotidiano,
Marcha em tesoura: marcha com adução
apresentadas isoladamente, requerendo que o
das coxas, decorrente de lesões piramidais com
doente as identifique.
acometimento bilateral.
É importante testar uma narina de cada vez.
Marcha hemiparética: marcha feita com ombro
As causas mais frequentes de perda de olfato são
em rotação interna e adução, flexão de cotovelo,
problemas locais do nariz (processos inflamatórios
punho e dedos, e membros inferiores em extensão
e alérgicos) ou traumatismo cranioencefálico no
do joelho e tornozelo. Assim, na fase de balanço
sentido anteroposterior que levam ao cisalhamento
o quadril é basculado lateralmente, permitindo o
das terminações nervosas.
deslocamento anterior do membro inferior para
troca do passo. Pode ser conhecida como marcha Nervo óptico (II NC) e vias ópticas
ceifante.
A visão é tida como um dos principais sentidos
Marcha escarvante: ocorre quando há do ser humano. Os nervos ópticos são compostos
fraqueza na dorsiflexão do pé, o doente faz uma pelos axônios dos neurônios ganglionares da camada
grande elevação do joelho durante a fase de balanço da retina, que fazem sinapse no corpo geniculado
para que a ponta do pé não toque o solo. lateral, que por sua vez emite axônio, coletivamente
Marcha parkinsoniana: ocorre com passos chamada de radiação ótica, até o córtex visual
pequenos, anteroflexão do tronco, giro e trocas de primário, localizado ao redor do sulco calcarino. São
direção feitos em múltiplas etapas. Extremidades estruturas responsáveis pela captação da radiação
superiores geralmente estão em flexão e rotação eletromagnética que compõe a luz e a sua transdução
Capítulo 5 69
da percepção visual. Esta avaliação deve ser feita fundamental para avaliação do segundo par,
em ambiente bem iluminado, com um olho de cada embora bastante negligenciado. Deve ser realizada
vez, preferencialmente usando óculos para correção em ambiente escuro, idealmente com as pupilas
de erro de refração (que reduzem a acuidade visual dilatadas. Na prática clínica do dia a dia, entretanto,
aferida no consultório, porém não por problema é bastante comum a realização do exame sem a
no nervo) por meio das tabelas de Snellen (tabela dilatação farmacológica das pupilas. Esta parte do
colocada a 3 metros do doente) ou de Rosenbaun exame demanda, particularmente, bastante treino até
(versão “de bolso” do Snellen). O limite da percepção que o médico seja capaz de rapidamente identificar
é visto quando o doente é capaz de reconhecer 50% e avaliar as estruturas. Nesta parte do exame físico,
mais um dos estímulos apresentados. é possível a avaliação das transparências dos meios
(córnea, humor aquoso e humor vítreo), da retina
A visão de cores é integralmente avaliada
(se descolada ou não), de sangramento e outras
por meio do uso do Teste de Cores de Ishihara.
alterações da retina, dos vasos sanguíneos da retina
São painéis compostos por múltiplos círculos de
e especialmente da papila do nervo ótico.
tamanhos diferentes. Individualmente cada círculo
terá um padrão de cor, em conjunto os círculos
Nervos oculomotor, troclear e abducente
formarão um número, letra ou forma. Indivíduos (III, IV e VI NC)
daltônicos terão dificuldade de identificar o número São os nervos responsáveis pela
ou letra em determinados painéis. Na rotina diária movimentação ocular. O adequado funcionamento
a forma mais prática de avaliação é por meio da é fundamental para manter a visão binocular.
percepção da cor vermelha, a mais intensamente Alteração da função gerará diplopia, que é a visão
acometida por patologia dos nervos óticos. Tendo duplicada. O conhecimento da anatomia destes
um objeto vermelho de referência, compara-se nervos e da anatomia das fibras de interconexão
a percepção da cor na visão central e na visão entre eles é fundamental para o entendimento das
periférica. A cor vermelha deve ser percebida como manobras semiológicas indicadas. O entendimento
mais brilhante, ou vibrante, sempre na visão central, dos funcionamentos dos centros superiores dos
pois esta é dada pela fóvea, local da retina rico em movimentos oculares é fundamental.
cones, células que dão a percepção de cor.
De modo geral, temos que o impulso nervoso
O campo visual na prática clínica é feito por sempre chega ao núcleo do sexto par, ipsilateral
meio da campimetria de confrontação. O médico fica ao movimento do olho. Deste núcleo, por meio do
diante do doente, com os olhos na mesma altura e fascículo longitudinal medial, saem fibras excitatórias
vai examinar um olho de cada vez. O campo visual para o quarto nervo contralateral e inibitórias para
do doente será comparado com o do próprio médico o sexto nervo contralateral, além de haver inibição
que aleatoriamente apresenta estímulos nos quatro ipsilateral, por sua vez (Figura 2).
quadrantes do campo visual e verificará se há locais
em que o estímulo não é percebido. Geralmente
podem-se mostrar dedos e solicitar para o paciente
dizer quantos foram mostrados ou perguntar se os
dedos estão parados ou se movimentando.
Capítulo 5 70
Músculo Função Nervo
Reto medial Adução III
Reto superior Elevação e inciclodução III
Reto inferior Abaixamento e exciclodução III
Oblíquo inferior Elevação e exciclodução III
Oblíquo superior Abaixamento e inciclodução IV
Reto Lateral Abdução VI
Tabela 1: Musculatura ocular extrínseca e sua respectiva
inervação.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 5 71
pterigoides. Pode-se pedir para o paciente morder A motricidade da face deve ser testada no
um palito e então tentar retirá-los contra a resistência. terço superior, médio e inferior. As paralisias faciais
Os músculos também podem ser palpados durante de padrão central acometem o terço médio e inferior
movimentação. A abertura e o fechamento da boca da face, pois o terço superior recebe inervação
podem ser observados. Desvios laterais podem bilateral, ou seja, na lesão de um dos lados do
indicar perda de força de um dos lados. cérebro, as fibras contralaterais são capazes
de manter a movimentação da face. Nas lesões
A parte sensorial deve ser testada com
periféricas, ocorre perda da mímica facial na metade
as mesmas técnicas descritas anteriormente na
ipsilateral da lesão.
avaliação sensitiva. Vale aqui ressaltar achados
não orgânicos da sensibilidade: respeitar a O teste da motricidade da face é baseado
linha do cabelo, alteração sensitiva que respeita na realização de movimentos de mímica facial
perfeitamente a linha média, perda da sensibilidade conforme solicitação. Inicialmente podemos pedir
vibratória em apenas metade do osso frontal, para o paciente franzir a testa e posteriormente
alteração sensitiva que não respeita o tragus nem fazer a contração dos músculos corrugadores (como
o ângulo da mandíbula (duas regiões que não são se fosse fazer “cara de bravo”). A seguir, pede-se ao
inervadas pelo V NC. Estes achados são úteis para paciente para fechar os olhos com bastante força.
avaliação de quadros não orgânicos. Pode-se tentar abrir os olhos do paciente neste
momento. O lado parético não apresenta tanta
A parte reflexa pode ser testada por meio
resistência e pode não ser percebida a contração
do reflexo córneo palpebral, que consiste na
da musculatura. A simetria do sorriso e a simetria
contração do músculo orbicular dos olhos por meio
durante a protrusão dos lábios é importante serem
da estimulação da córnea. O reflexo massetérico
avaliados, além da movimentação do músculo
também pode ser testado, fazendo percussão com
platisma.
interposição do dedo no mento com a mandíbula
semiaberta. O principal reflexo associado ao VII NC é o
córneo palpebral, discutido na sessão referente do
Nervo facial (VII NC) V NC.
Capítulo 5 72
beira do leito o diagnóstico é grosseiro e não seria A avaliação da função vestibular e das queixas
capaz de identificar déficits leves. A avaliação da de tontura pode ser um grande desafio técnico e de
audição deve ser feita em uma orelha de cada vez. empatia para com o doente. A avaliação começa com
Uma primeira avaliação pode ser feita solicitando uma detalhada história clínica, tentando desvendar
que o paciente compare os sons de esfregar de o que cada um dos pacientes quer significar
dedos em cada uma das orelhas. quando usa a palavra “tontura”. Alguns pacientes
usam esta palavra para descrever sensação de
O teste com o diapasão é útil na avaliação da
girar, rodar, inclinar ou cair, associado com ilusão
condução óssea e da condução aérea. Esses testes
de movimento da própria pessoa e do ambiente. A
são úteis para diferenciar lesões do nervo ou lesão
isso damos o nome de vertigem. Estes sintomas
do sistema de condução do ouvido médio. Pode-
estão geralmente relacionados com disfunção do
se pedir para o paciente comparar a intensidade
sistema vestibular, central ou perifericamente. A
do som do diapasão em cada um de seus ouvidos,
palavra tontura pode querer significar sensação de
além de testar também, afastando-se o diapasão do
perda de equilíbrio, equilíbrio inadequado, mas não
ouvido do paciente, a distância em que o som deixa
propriamente uma sensação rotatória, mas sim uma
de ser percebido.
sensação oscilatória ou de dificuldade de manter a
Há dois testes clássicos para serem feitos ortostase. Esta descrição pode ser encontrada em
com o diapasão: teste de Rinne e teste de Weber. disfunções vestibulares periféricas bilaterais, perda
No primeiro, o diapasão é ativado e colocado na da sensibilidade profunda, lesões de cerebelo,
mastoide. Quando ele não foi mais ouvido, deve alterações extrapiramidais e até efeito colateral
ser colocado junto ao ouvido ipsilateral. Num teste de medicamentos. Outros pacientes descrevem a
normal o paciente deve ouvir o diapasão junto ao sensação de tontura no contexto de visão turva, de
ouvido pelo dobro do tempo que o escutou quando estar atordoado, com sensação de quase perda da
estava colocado na mastoide. O segundo é realizado consciência e com diaforese. Este quadro é mais
colocando-se o diapasão ativado no vértice crânio. compatível com situações de pré-síncope, quando
No teste normal o paciente deve ouvir vibração no ocorre a hipoperfusão cerebral global de múltiplas
meio da cabeça, sendo o som ouvido igualmente em causas, desde autonômicas a cardíacas. Outros
ambos ouvidos. No caso de lesões neurossensoriais, pacientes têm queixas vagas, pouco específicas,
o lado afetado terá uma audição pior, sendo que o associadas com dificuldade de caminhar. Devem-
som é percebido mais intenso no lado contralateral se investigar múltiplos déficits sensoriais múltiplos
à lesão. No caso de perda condutivas, o teste (visão, tato, propriocepção, audição, etc.), quadro
lateraliza-se para o lado anormal. demenciais e psicogênicos.
Capítulo 5 73
paciente. De olhos fechados, solicita-se posição da cabeça do paciente de uma
ao paciente que eleve os braços acima da posição sentada para posição deitada,
cabeça, estendidos, e então retorne para em decúbito dorsal, com o pescoço
posição inicial. Nos distúrbios vestibula- estendido a 45 graus e rotacionada 45
res, ocorrerá desvio para o lado afetado; graus para o lado que se deseja testar.
Nistagmo periférico pode ter latência
• teste de Romberg: já foi descrito anterior- e é geotrópico (“bate em direção ao
mente, basicamente, nos quadros vesti- chão”).
bulares, o fechamento dos olhos causará
desequilíbrio com lado preferencial e com
latência;
Achado Periférico Central
• teste de Fukuda: o paciente com os olhos Sim, tipicamente
fechados tenta caminhar marcando o pas- Latência 3-10s, podendo Não
so (como se estivesse marchando). Pa- chegar até 40s
cientes com lesões vestibulares desviar- Sim, episodio
-se-ão para o lado da lesão; e típico dura 10-30s,
Fatigabilidade não
podendo chegar até
1 min
• reflexos oculocefálico ou reflexos vestí-
Sim, manobra
bulo-ocular: rotaciona-se a cabeça para
realizada
os lados, alternadamente, e observa-se a
repetidamente
resposta ocular. Usando-se movimentos Adaptabilidade Não
provoca uma
rápidos e bruscos e solicitando ao pacien- resposta cada vez
te que mantenha a fixação ocular, temos o menos
teste de Arremesso da Cabeça (head im- Direção
pulse test). Direção fixa, de mutável,
rotação com batidas variável,
Direção do
• nistagmos ascendentes e muitas
nistagmo
pequeno volume vezes,
horizontal puramente
• nistagmo espontâneo: ocorre sem po-
verticais
sição específica da cabeça. A fase len-
Supressão do
ta indica o lado da lesão e a fase rá-
nistagmo por Sim Não
pida indica o lado normal. Geralmente, fixação visual
é horizontal e rotatório. A amplitude do Consistência Mais
nistagmo tende a aumentar quando o Menos consistente
(reprodutibilidade) consistente
paciente olha na direção da fase rápi- Pode ser na
Ultrapassagem do Na direção da fase
da. Durante o exame de fundoscopia, direção da
alvo lenta
quando o paciente perde a fixação do fase rápida
olhar por causa da luz, pode-se flagrar Tabela 3: Características do nistagmo periférico versus
um nistagmo sutil que estava sendo central.
suprimido pela fixação. Nistagmos dis- Fonte: Os autores, 2021.
cretos podem ser evocados sacudindo-
-se a cabeça do paciente, este com os
olhos fechados, por aproximadamente
30 s e, então, abrindo os olhos; e
Capítulo 5 74
parte sensorial leva sensações de dor, temperatura
e tato da faringe, laringe e superfície externa da
membrana timpânica para o sistema nervoso central.
Também leva informações aferentes viscerais.
Capítulo 5 75
REFERÊNCIAS
1. Campbell WW, Barohn RJ. DeJong-O Exame
Neurológico, 7ª. Edição. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2014.
2. Brazis PW, Masdeu JC, Biller J. Localization in Clinical
Neurology. 7th edition. Philadelphia: Lippincot Williams &
Wilkins; 2012.
3. Coelho FF, Hadad MS, Mutarelli EG. Propedeutica
Neurologica: Do sintoma ao diagnóstico. 2ª. Edição. São
Paulo: Sarvier; 2014.
Capítulo 5 76
CAPÍTULO 6
ELETRONEUROMIOGRAFIA
Maria Tereza de Moraes Souza Nascimento foi desenvolvido em 1948, pelo trabalho conjunto do
engenheiro James Golseth, da Northwestern School of
Medicine, James A. Fizzel, do laboratório de testes de
INTRODUÇÃO Illinois3 , associados às pesquisas de Herbert Jasper, da
Eletroneuromiografia (ENMG) é um método de McGill University. Neste período, havia grande número
exame complementar, baseado nos aspectos funcionais de pacientes com lesões do sistema nervoso periférico
dos tecidos nervoso e muscular, utilizado para o estudo em consequência da Segunda Guerra Mundial.
do sistema nervoso periférico. É composto de duas
O eletromiógrafo é composto por eletrodos (de
partes distintas: estudos de condução nervosa (sensitiva
superfície ou de agulha), amplificadores de sinais,
e motora) e traçados eletromiográficos (eletromiografia
displays (visuais e auditivos) e estimuladores elétricos4.
de agulha). Cada uma destas partes é utilizada para
Os eletrodos são colocados sobre a região anatômica
distinguir tipos e locais específicos de anormalidades,
a ser estudada, ligados a cabos de captação de sinal
baseiam-se em diferentes princípios, e ambas se
elétrico e, estes, ligados a um pré-amplificador, que
completam, a fim de fornecer as adequadas bases para
converte o sinal biológico em sinal elétrico, que adentra
as conclusões do exame. Segundo Kimura, “o exame
o sistema e é mostrado no display visual, produzindo um
eletroneuromiográfico deve ser conduzido como uma
som (display auditivo). Os gráficos obtidos são expressos
extensão do exame físico, e não como um procedimento
em um sistema de coordenadas no display (eixos X e
de laboratório”1 , uma vez que simula os estímulos
Y), que são avaliados segundo parâmetros específicos,
elétricos fisiológicos que trafegam pelos nervos, captando
a depender do tipo de estudo (condução nervosa ou
respostas à distância sobre seus alvos (pele e músculos),
eletromiografia).
e estuda a contração muscular, através de eletrodos de
agulha colocados na intimidade dos músculos. Através Os estimuladores elétricos fornecem pulsos de
de uma sequência de estudos e métodos específicos, é corrente contínua, de 50 a 100 V, gerando uma corrente de
possível confirmar a topografia e o tipo das afecções do 5 a 50 mA, modo de corrente quadrada, com intensidade
sistema nervoso periférico (mielínicas ou axonais), bem de 0,2 a 100 mA, através de um estimulador bipolar, em
como estimar a gravidade e os aspectos cronológicos forma de barra fixa ou de garfo5.
das doenças estudadas.
Capítulo 6 77
ESTUDOS DE CONDUÇÃO NERVOSA Alvos
SENSITIVA
As estruturas avaliadas pelos estudos
São estudos que avaliam a integridade dos de condução nervosa sensitiva são os nervos
nervos periféricos, em relação ao componente periféricos, em seu componente aferente formado
aferente das fibras grossas e mielinizadas. Os corpos pelas fibras grossas e mielinizadas.
celulares destes neurônios, do tipo pseudounipolar,
estão localizados nos gânglios das raízes dorsais, Indicações
próximo aos forames de conjugação da coluna Os estudos de condução nervosa sensitiva
vertebral. Seus prolongamentos periféricos, oriundos são utilizados para avaliar as seguintes condições:
dos receptores localizados na pele, são avaliados
através de estímulos elétricos (choques), aplicados • mononeuropatias por compressão (entra-
e registrados no trajeto do nervo, sobre a superfície pment syndromes), por exemplo, a sín-
drome do túnel do carpo (nervo mediano),
da pele.
síndrome do canal cubital (nervo ulnar),
paralisia do “sábado à noite” (nervo ra-
Método dial), síndrome do canal do tarso (nervo
tibial posterior – plantar medial e plantar
Os estímulos elétricos aplicados são pulsos
lateral), e todas as neuropatias compressi-
de corrente quadrada, que variam de 0,2 a 100 mA
vas, que afetam os nervos periféricos em
de intensidade, liberados a partir de um estimulador canais anatômicos, e cursam com sinto-
elétrico bipolar, que pode ser do tipo barra ou do tipo mas sensitivos, motores e autonômicos,
garfo. O estimulador libera corrente elétrica, cuja conforme a gravidade do quadro;
intensidade deve ser ajustada pelo neurofisiologista,
• mononeuropatias traumáticas: lesões de
até que seja suficiente para despolarizar todas as
nervos periféricos em decorrência de aci-
fibras do nervo em estudo. Isso ocorre quando dentes, cirurgias, procedimentos e instru-
a amplitude dos potenciais de ação atinge sua mentações que causem dano a nervos
amplitude máxima, e não mais oscilam. Estes periféricos, produzindo semiologia carac-
estímulos elétricos oferecidos trafegam pelos nervos terística, com manifestações clínicas no
estudados e são captados à distância, na superfície trajeto do nervo afetado;
da pele, em locais pré-determinados, variando de
• plexopatias braquiais e lombossacrais: le-
acordo com a anatomia de cada nervo. sões em decorrência de acidentes, com-
Os potenciais obtidos, chamados potenciais plicações do parto, radioterapia, etc., que
afetem os plexos braquiais ou lombossa-
de ação do nervo sensitivo (PANS) apresentam
cros, em suas estruturas sensitivas e mo-
três parâmetros que devem ser avaliados: latência
toras;
(tempo decorrido entre o estímulo fornecido e o
início do registro do potencial de ação na tela do • polineuropatias: condições distais e simé-
computador, a partir do eixo X); amplitude (tamanho tricas, afetando o indivíduo em um padrão
do potencial registrado, desde o ponto de partida, semiológico de botas e luvas, e cuja de-
tecção é facilitada quando estudamos os
quando o gráfico deixa a linha de base no eixo
quatro membros, ampliando a amostra de
X, até o pico do potencial, no eixo Y, quando sua
nervos periféricos examinados;
polaridade se inverte); e velocidade de condução
(baseada na fórmula física da velocidade constante, • mononeuropatias múltiplas: condições
obtida através da divisão entre a distância do ponto que afetam os nervos de maneira não
de estímulo e o ponto de captação (S), dividido pela contígua, nervos esparsos em vários lu-
gares do corpo, simultaneamente, cujas
latência do potencial (T) [V=S/T]).
Capítulo 6 78
etiologias mais comuns são doenças reu-
máticas, inflamatórias e nos estados pós-
-COVID 196; e
Capítulo 6 79
músculo, na região equatorial das fibras, de acordo
Alvos
com um mapa anatômico.
As estruturas avaliadas pelos estudos de
Método condução nervosa motora são os nervos periféricos,
Os estímulos elétricos aplicados são pulsos em seu componente eferente, formado pelas fibras
de corrente quadrada, que variam de 0,2 a 100 mA grossas e mielinizadas dos motoneurônios alfa, as
Capítulo 6 80
também as amplitudes dos PAMC. Este duração dos estímulos elétricos aplicados, a correta
achado só é observado nas radiculopatias medida dos espaços entre os pontos de estímulo e
motoras graves, que promovem inclusive captação são cruciais para obtenção de PAMC com
atrovia muscular;
uma linha de base estável, livre de artefatos, com
• miastenia gravis, doença de Eaton Lam- um pico claramente detectável, e reprodutível em
bert e botulismo: nas doenças da junção exames subsequentes.
neuro-muscular, podemos lançar mão de
A presença de atrofia muscular severa impede
uma técnica aprimorada, chamada teste
a captação de PAMC, que devem ser registrados no
de estimulação repetitiva (T.E.R). Ela con-
siste em aplicar sequências de 10 a 100 laudo como “abolidos” ou “ausentes”.
estímulos sucessivos, com frequências de As fibras motoras do tipo gama (que são
3 a 10 Hz, a um mesmo nervo, captando
dirigidas aos fusos musculares) não são acessíveis
os PAMC gerados a partir desta estimula-
ao método eletroneuromiográfico.
ção, em um ponto fixo, no músculo alvo;
Capítulo 6 81
de aproximadamente 0,03 a 0,07 mm2, e custam por
TIPOS DE ANORMALIDADE DOS ESTUDOS
DE CONDUÇÃO NERVOSA volta de 11 dólares por eletrodo. O polo negativo é
o eixo do eletrodo, e o positivo, seu revestimento
Os estudos de condução nervosa, sensitiva e
externo, de modo que ambos estão localizados na
motora, podem demonstrar anormalidades, que são
intimidade do músculo estudado.
interpretadas da seguinte maneira:
Os eletrodos monopolares têm acesso a uma
• doenças primariamente mielínicas: alte-
superfície de leitura de 0,28 a 0,34 mm2 e custam por
ram os potenciais de ação sensitivos e
volta de 7 dólares por eletrodo, mas seus registros
motores, aumentando suas latências, re-
duzindo suas velocidades de condução estão mais sujeitos a artefatos externos, visto que o
e aumentando a duração dos potenciais polo positivo é um eletrodo colocado sobre a pele10.
(dispersão temporal); e
ELETROMIOGRAFIA DE AGULHA
A eletromiografia por agulha (EMG) é a técnica
de registro e análise dos sinais elétricos derivados
de fibras musculares individuais de unidades
motoras, em repouso e durante a contração
voluntária, usando um eletrodo de registro de Figura 5: Esquema da área de registro dos diferentes tipos
agulha inserido no músculo. Envolve a inserção de de eletrodos de agulha. A: agulha monopolar – 0,28 a 0,34
mm2 ; B: concêntrica – 0,03 a 0,07mm2; C: agulha de fibra
um eletrodo de agulha em um músculo, registrando única – 0,0005mm2.
e amplificando os sinais elétricos gerados a partir
Fonte: Adaptado de Kimura, 20151.
de fibras musculares em repouso ou em contração,
e interpretando os sinais para determinar a função
das fibras musculares e unidades motoras. Muitos Método
fatores afetam os sinais registrados durante a EMG A EMG de agulha consiste em obter amostras
de agulha, incluindo os tipos de eletrodos de agulha, de sinais elétricos de diferentes fibras musculares,
filtros e configurações do amplificador. Diferentes e requer inserção correta e movimentos ao longo
métodos semi-quantitativos e quantitativos de do músculo, para obter um estudo completo.
análise dos sinais registrados estão disponíveis, Dependendo da hipótese clínica, músculos de
cada um com vantagens e desvantagens. Embora diferentes distribuições devem ser estudados. A
a EMG com agulha seja uma técnica segura, os EMG de agulha tem três momentos de avaliação:
riscos potenciais incluem dor, sangramento e repouso, recrutamento e esforço máximo.
pneumotórax10.
• fase do repouso: registro obtido a partir da
Os tipos de eletrodo de agulha utilizados na
colocação da agulha no músculo, com o
ENMG de rotina variam quanto aos custos e quanto paciente em repouso e o músculo em es-
à área de registro. tado de relaxamento.
Capítulo 6 82
registro eletromiográfico dos músculos maiores unidades motoras, quanto maior
normais em repouso é constituído por uma for o esforço, de modo a produzirem um
linha reta, chamada de “silêncio elétrico”. registro conhecido como "traçado interfe-
rencial", com padrão de rampa . As doen-
Doenças que promovem dano aos
ças neurogênicas vão tornando o traçado
neurônios motores inferiores (quer seja nos
de esforço mais rarefeito, conforme são
corpos celulares ou em seus axônios), ou
perdidos os componentes das unidades
que promovem soluções de continuidade
motoras, até produzirem um traçado sim-
das fibras musculares (miopatias em geral),
ples, onde apenas uma unidade motora é
fazem com que as fibras musculares,
registrada no esforço máximo, ou quan-
anteriormente componentes de uma
do não há unidades motoras registradas
mesma unidade motora e comandadas por
naquele sítio (traçado de esforço máximo
neurônios motores sadios, disparem de
ausente).
forma aleatória, e promovam um registro
de repouso anormal, que contêm o que
chamamos de “atividades espontâneas”. Alvos
As atividades espontâ,neas mais O alvo da EMG de agulha são os músculos,
precoces são as ondas agudas positivas e propriamente, as unidades motoras, ao longo dos
e as fibrilações. Fasciculações podem ser miótomos, nos territórios pretendidos para o estudo.
registradas após 15 a 21 dias do início do
processo de desnervação ou miopatia.
Indicações
Também são anormalidades que podem
ser registradas com o músculo em repouso • miopatias: o único estudo eletroneuromio-
as descargas repetitivas complexas e as gráfico que pode registrar anormalidades
descargas miotônicas (que ocorrem por dos músculos, na intimidade da unidade
uma hiperexcitabilidade de membrana, motora, é a EMG de agulha. Geralmen-
característica de algumas doenças te, nas miopatias, os traçados de repouso
neuromusculares, como as miotonias apresentam atividades espontâneas do
congênitas e a doença de Pompe); tipo descargas, ondas agudas positivas e
fibrilações. Os traçados de recrutamento
• fase do recrutamento muscular: obtido a exibem recrutamento precoce, com MUP
partir de uma pequena contração mus- de baixas amplitudes e curtas durações.
cular contra a resistência. Este momento Os traçados de esforço são geralmente in-
do exame serve para o neurofisiologista terferenciais. Há miopatias agudas e crôni-
avaliar a morfologia dos potenciais de uni- cas, com maiores ou menores proporções
dades motoras (MUP), que devem ter du- de atividades espontâneas, porém, o estu-
rações e amplitudes adequadas. Doenças do eletromiográfico está sempre indicado
de natureza neurogênica ou miopática de- nestas situações;
formam e promovem remodelamento dos
MUP, gerando anormalidades nesta fase • paralisia facial periférica: juntamente com
do exame: recrutamento aumentado (mio- outras técnicas especiais (como reflexo do
patias) ou reduzido (doenças que promo- piscamento supra-orbital. Estudo de con-
vem desnervação), com potenciais de uni- dução nervosa motora do nervo facial), as
dades motoras polifásicos (doença aguda) eletromiografias de agulha são particular-
ou de altas amplitudes (doença crônica): e mente úteis no estudo das paralisias fa-
ciais periféricas. O exame pode mostrar se
• fase de esforço máximo: obtido a partir de há desnervacão em atividade, se há sinais
um esforço de contração plena do mús- de reinervação nos músculos afetados,
culo, contra a resistência. Os músculos se algum ramo do nervo facial é afetado
sadios, inervados por motoneurônios ín- de forma desproporcional em relação aos
tegros, vão recrutando cada vez mais e demais e se há possibilidade do múscu-
Capítulo 6 83
lo responder à reinervação cirúrgica, ba-
seando-se no registro eletromiográfico da
manutenção de atividade contrátil, mesmo
que pequena, nos músculos paralisados;
e
Capítulo 6 84
especialista: a formação em Neurofisiologia sua característica de estudo funcional e
Clínica, no Brasil, é chancelada pela de extensão do exame clínico, deve ser
Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica acompanhado por um pedido adequadamente
(SBNC). Os médicos neurologistas e fisiatras, preenchido. Cada laboratório possui uma rotina
com especialidade devidamente registrada de execução de exame, determinada pelas
no Conselho Regional de Medicina (CRM) sociedades de especialidade de cada país,
de seus estados, devem realizar formação que examina uma gama de nervos e músculos
complementar em eletroneuromiografia, em pré-determinada. Quando o clínico suspeita
centros capacitados. A duração desta formação de comprometimento do sistema nervoso
varia entre um ano (dedicação exclusiva) e periférico, e as anormalidades detectadas
dois anos, sob supervisão de pelo menos estão explicadas no pedido médico, o exame
um membro titular da Academia Brasileira de se torna muito mais efetivo e mais detalhado,
Neurologia e SBNC, cumprindo um programa pois além dos estudos de rotina, o profissional
teórico e prático determinados. Ao final do pode realizar estudos adicionais, visando a
período de formação, devem ser submetidos melhorar a acurácia e confirmar a hipótese
à prova do título de especialista, ministrada clínica. Realizar um pedido médico contendo
anualmente pela SBNC, na modalidade a suspeita diagnóstica é de grande auxílio
“Eletroneuromiografia”. Após aprovação, o para o Neurofisiologista Clínico, na execução
neurofisiologista clínico pode requerer o selo do exame, e mais ainda, para o paciente,
da especialidade, que deve constar em todos na obtenção do melhor e mais específico
os laudos dos exames realizados. Realizar um resultado para sua moléstia.
exame com um especialista é uma forma de
III. Aspectos inerentes ao paciente
assegurar a qualidade técnica do examinador.
Quanto ao laboratório, condições estruturais • Condições da pele e do subcutâneo: uma
devem ser observadas para garantir um vez que os estudos de condução nervosa
registro eletroneuromiográfico adequado, são obtidos a partir do registro de poten-
e o mais importante é que o eletromiógrafo ciais elétricos captados na superfície do
seja ligado a uma rede elétrica que contenha corpo, a condição de integridade da pele é
sistema de aterramento, com menos de 5 crucial. Superfícies com higienização ina-
KOhms: isto melhora a qualidade da linha dequada, presença de crostas, soluções
de base dos traçados eletromiográficos, de continuidade, feridas, queimaduras, ou
reduzindo a interferência externa e os elementos como fixadores externos, tor-
fatores de confusão, que podem prejudicar a nam o exame mais demorado (uma vez
interpretação do estudo. que é necessária adequação da superfície
para o estudo), e às vezes, inviabiliza a
É importante o controle do ambiente onde
realização do exame. Uma vez observa-
a ENMG será realizada: garantir que a
das, estas condições inadequadas devem
temperatura esteja amena, que o ambiente
ser descritas pelo neurofisiologista, no lau-
seja o mais livre possível de interferências
do, e também devem ser levadas em con-
elétricas, que o paciente esteja confortável.
sideração no momento da interpretação
Também é crucial que o paciente seja dos resultados para a conclusão.
informado de como é realizado o exame, quais
os incômodos que podem advir, por meio de • Presença de cremes e óleos na pele, no
termo de consentimento livre e esclarecido, momento da realização do exame: estas
que deve sempre ser assinado antes da substâncias oleosas dificultam a aderên-
realização do exame. cia dos eletrodos de superfície à pele,
aumentando a impedância, e contribuin-
II. Aspectos inerentes ao médico solicitante
do para a obtenção de potenciais pobres
do exame
em definição. No ato do exame, alguns
O exame eletroneuromiográfico, devido a elementos abrasivos podem ser aplicados
Capítulo 6 85
para adequado preparo da pele, mas tam- periférico, em tempo real, de maneira qualitativa e
bém tornam o processo mais demorado. quantitativa.
Orientar os pacientes quanto a estes cui-
dados facilita e agiliza o exame.
Capítulo 6 86
CAPÍTULO 7
INTERPRETAÇÃO DO EXAME DO LÍQUIDO
CEFALORRAQUIDIANO
Helio Rodrigues Gomes adulto aos três anos de idade, como mostra a Figura 2:
Capítulo 7 87
Figura 1: Esquema da anatomia da síntese, circulação e absorção do LCR.
Fonte: Modificado de Netter, 20001; e Shah et al., 20142.
Capítulo 7 88
indivíduos que estejam recebendo quimioprofilaxia atravessado a BHE pérvia.
anticoagulante, a mediação deve ser interrompida
Toda albumina que circula no LCR é sintetizada
previamente por ao menos seis horas. A fim de
no fígado, portanto a relação ou quociente (Q) entre
evitar acidentes, os pacientes agitados devem ser
a albumina liquórica e a albumina sérica (Qalb) é o
sedados para serem submetidos à punção liquórica.
principal marcador para avaliar a permeabilidade
da BHE. A coleta concomitante de LCR e soro é
BARREIRA HEMATOENCEFÁLICA (BHE)
necessária para essa avaliação e associando-se
Além de uma estrutura anatômica formada
o cálculo de quocientes dos elementos a serem
por células endoteliais, astrócitos, pericitos, matriz
pesquisados, por exemplo IgG, e de albumina
extracelular e proteínas como a ocludina e a claudina,
pode-se estabelecer uma avaliação quantitativa da
a BHE é um conceito, que pode ser entendido
integridade da barreira e se o elemento pesquisado
como o isolante do SN ou uma interface que limita
foi sintetizado no sistema LCR, se atravessou a BHE
e regula a troca de substâncias entre sangue e o
ou ambos. O Nomograma de Reiber e Felgenhauer
sistema nervoso central. A impermeabilidade da
(Figura 4) permite uma correta interpretação da
BHE é o resultado de uma série de características
permeabilidade da BHE, pois relaciona o quociente
únicas, que acrescenta dificuldade a moléculas
de IgG (IgG liquórica/IgG sérica) e o Qalb. Através
tentando penetrar nesta barreira. Esta propriedade
desse nomograma, pode-se concluir se há ou não
é baseada na existência de uma permeabilidade
síntese intratecal com ou sem lesão da barreira
muito restrita do endotélio, além da presença de
(Figura 4)
enzimas degradantes presentes em grande número
no interior do endotélio. Assim, com exceção de
água, gases como oxigênio e o dióxido de carbono
SISTEMATIZAÇÃO DA ANÁLISE DO LCR
e determinadas moléculas lipossolúveis muito
pequenas podem passar de forma íntegra. As A punção liquórica deve ser feita
moléculas essenciais para o metabolismo do cérebro preferencialmente com o paciente deitado e nos
como íons, glicose, aminoácidos e componentes níveis entre L3 e L4, L4 e L5 ou L5 e S1. A posição
de ácido nucléico, passam pela BHE através de sentada é reservada para crianças que necessitam
canais especializados. Desta forma, a BHE se torna de maior contenção ou indivíduos muito obesos ou
altamente restritiva, mas de qualquer forma pode ser com desvios importantes da coluna lombar. Assepsia
incapaz de impedir a passagem de alguns toxinas rigorosa deve ser utilizada. A punção cisternal
e agentes terapêuticos da corrente sanguínea para ou suboccipital está reservada a casos muito
o cérebro. Além das funções de permeabilidade específicos em que a coleta do LCR é necessária e
seletiva, a BHE possui aspectos importantes como a via lombar esteja indisponível.
de anticorpos no LCR não necessariamente está a compressão da jugular não modifica a pressão
relacionada à síntese intratecal desses anticorpos, do LCR, tem-se um bloqueio completo do canal
podendo apenas expressar anticorpos que tenham raquidmedular. Nos bloqueios parciais, o aumento
Capítulo 7 89
Figura 3: Contraindicações à puncão liquórica.
Fonte: Os autores, 2021.
Fig. 4. Nomograma de Reiber – quociente LCR/soro para IgG, IgA e IgM. 1. Normal, sem lesão da BHE ou
imunoprodução intratecal; 2. Lesão da BHE; 3. Síntese intratecal de IgG e lesão da BHE; 4. Síntese intratecal de IgG
sem lesão da BHE; e 5. Ausência de significado clínico.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 7 90
verificado é pequeno, inicia-se após curta latência e analisados em medicina laboratorial, os teores de
persiste após certo período cessada a compressão proteínas, glicose e lactato têm maior importância
jugular e/ou diminui lentamente (tempo maior que 30 na análise geral do LCR. O aumento nos teores de
segundos) nem sempre retornando ao valor da PI, proteínas no LCR está relacionado principalmente à
mantendo-se acima dele. quebra da BHE. Ocorre também quando há aumento
da síntese intratecal de anticorpos e nos bloqueios
Em condições normais, o LCR é límpido
à circulação liquórica no espaço subaracnoideo.
e incolor. O aspecto turvo decorre da presença
Uma vez que a quantidade de proteínas no LCR é
patológica de elementos figurados (células,
aproximadamente 100 vezes menor que a do soro,
bactérias, fungos) e o aspecto hemorrágico da
a metodologia analítica deve ser adaptada para que
presença de hemácias. Após centrifugada, a amostra
esses constituintes sejam detectados e analisados.
de LCR deve estar límpida. A xantocromia pode ser
A hipoglicorraquia ocorre quando há consumo
observada se houver presença de bilirrubina (reflexo
celular importante, como nos processos infecciosos
de hiperbilirrubinemia ou hemólise no sistema LCR)
mediados por PMN ou nos processos neoplásicos.
ou à hiperproteinorraquia excessiva. As cores
O aumento dos teores de glicose no LCR está
eritrocrômica e acastanhada decorrem da presença
relacionado à hiperglicemia. O aumento dos
de grande quantidade de hemoglobina (hemorragia
níveis de lactato ocorre nos processos infecciosos
prévia).
bacterianos, na carcinomatose meníngea e nas
Com relação à análise citológica, o LCR mitocondriopatias.
normal tem até 4 células/mm³ e o aumento de células
A eletroforese de proteínas está indicada
no LCR está relacionado aos processos infecciosos,
sobretudo nos processos inflamatórios agudos em
inflamatórios e neoplásicos que acometem o
que se observa quebra da BHE através do aumento
SN. A presença de hemácias revela hemorragia
das frações albumina, alfa-1 e alfa-2. Nos processos
subaracnoidea ou acidente de punção. Em linhas
inflamatórios crônicos, observa-se aumento da fração
gerais, a pleocitose à custa de linfócitos e monócitos
gama. Por meio dessa fração, podem-se observar
indica processo inflamatório ou asséptico, enquanto
perfis monoclonais e policlonais de produção de
que quantidades moderadas ou o predomínio de
anticorpos. Para a pesquisa de bandas oligoclonais,
PMN está relacionado aos processos exudativos. A
utiliza-se a isoetrofocalização. A presença de bandas
presença de eosinófilos ou basófilos indica a reação
oligoclonais no LCR é fundamental no diagnóstico
imuno alérgica, sobretudo quando há infecções
da esclerose múltipla e outras doenças inflamatórias
parasitárias enquanto que macrófagos hemáticos,
do SN. É imprescindível a realização concomitante
pigmentados ou mistos, indicam hemorragia
do exame no soro. O comprometimento do SN só
subaracnoide. O encontro de células neoplásicas
pode ser diagnosticado se as bandas estiverem
no LCR permite o diagnóstico de carcinomatose
presentes exclusivamente no LCR ou, então, no
meníngea. Através da imunofenotipagem por
LCR e no soro, desde que não haja quebra da BHE.
citometria de fluxo pode-se identificar e avaliar
antígenos celulares através da utilização de De acordo com a hipótese diagnóstica ou o
anticorpos monoclonais, permitindo o diagnóstico quadro clínico que o paciente apresenta, podem
de doenças onco-hematológicas e o diagnóstico ser pesquisadas as atividades de enzimas, como
diferencial destas com processos inflamatórios ou a adenosina deaminase, marcadores de atividades
reacionais. A realização da imunofenotipagem no celulares e inflamatórias, marcadores de doenças
LCR está indicada em amostras com mais de 6 degenerativas e neoplásicas. A Tabela 1 apresenta
células/mm³. os valores de referência dos elementos mais
comumente analisados no LCR.
Dos analitos bioquímicos passíveis de serem
Capítulo 7 91
Exame Metodologia Valor de referência
Caracteres físicos aspecto RN: límpido e xantocrômico
Observação visual
e cor Crianças e adultos: límpido e incolor
Até 15 dias de vida: até 25 células/mm³
Microscopia óptica comum em
Citologia global Adultos: até 4 células/mm³ e ausência de
câmara de Fuchs-Rosenthal.
hemácias
Microscopia óptica comum e
Presença de linfócitos, monócitos e alguns
Citologia específica coloração por Leishmann, após
macrófagos (hemáticos nos RN)
cito centrifugação.
Microscopia óptica comum e
Citologia oncótica coloração por Leishman, após cito Ausência de células neoplásicas
centrifugação.
LCR ventricular: até 25 mg/dL
Proteínas totais Colorimétrico automatizado LCR cisternal: até 30 mg/dL
LCR lombar: até 40 mg/dL
Glicose Colorimétrico automatizado Até 2/3 da glicemia
Lactato Colorimétrico automatizado Até 22 mg/dL
Adenosina deaminase Automatizado por desanimação
Até 9 UI/L
(ADA) enzimática
Pré-albumina: < 8%; albumina:45-64%;
alfa-1: 3-7%;
Eletroforese de proteínas Corrida em acetato de celulose
alfa-2: 5-11%;
beta (1 e 2): 13-25%; gama: 7-14%
Pesquisa de bandas
Isoeletrofocalização Ausência de bandas oligoclonais
oligoclonais
Qalb < 7x103
Capítulo 7 92
O diagnóstico das doenças infecciosas do SN Sensibilidade Especificidade
Agente
deve ser feito através de exames bacteriológico, (%) (%)
micobacteriológico e micológicos diretos com Herpes vírus I e II 98 100
coloração específica e semeadura em meios
Pneumococo 87-93 95-98
de cultura próprios. Uma vez que a quantidade
de patógenos circulantes no LCR, mesmo nas Meningococo 92-100 95-98
infecções, é pequena, a sensibilidade desses
Enterovirus 90 75-90
métodos habitualmente é baixa.
Adenovirus 80 90
Os exames imunológicos para a identificação
de antígenos e anticorpos auxiliam na identificação Arbovirus 95 90
Capítulo 7 93
COMPLICAÇÕES
A cefaleia pós-punção é a complicação mais
REFERÊNCIAS
comumente observada. Ela ocorre em torno de 10% 1. Netter, Frank H. Atlas de Anatomia Humana. 2ed. Porto
dos procedimentos, é mais frequente em mulheres, Alegre: Artmed, 2000.
na terceira e quarta décadas de vida, em indivíduos 2. Shah L, Iyer AK, Talekar M, Amiji MM. Targeted Drug
Delivery: Concepts and Design. In: Devarajan PV, Jain
magros ou que tenham antecedente de cefaleia. S. Image-Guided Delivery of Therapeutics to the Brain.
A causa da cefaleia pode estar relacionada à Springer. DOI:10.1007/978-3-319- 11355-5_4.
manutenção do pertuito na aracnoide após a retirada 3. Deisenhammer F, Bartos A, Egg R, et al. Guidelines on
routine cerebrospinal fluid analysis. Report from an EFNS
da agulha e, à medida que o paciente se senta ou
task force. Eur J Neurol. 2006;13(9):913-922.
assume a posição ortostática, há drenagem do LCR
4. Guldbrandsen A, Vethe H, Farag Y, et al. In-depth
para o espaço peridural. A cefaleia pós-punção pode characterization of the cerebrospinal fluid (CSF) proteome
ser evitada com o uso de agulhas de pequeno calibre displayed through the CSF proteome resource (CSF-PR).
Mol Cell Proteomics. 2014;13(11):3152-3163.
ou atraumáticas e com repouso após o procedimento.
5. Jeppsson A, Zetterberg H, Blennow K, Wikkelsø C.
O tratamento consiste em repouso deitado e o Idiopathic normal-pressure hydrocephalus: pathophysiology
uso de analgésicos à base de cafeína. Em casos and diagnosis by CSF biomarkers. Neurology.
2013;80(15):1385-1392.
extremos, pode-se optar pelo blood patch, ou seja,
6. Reiber H. Proteins in cerebrospinal fluid and blood:
a injeção peridural de 40 ml de sangue do próprio
barriers, CSF flow rate and source-related dynamics. Restor
paciente. Lesões radiculares, vertebrais, infecções Neurol Neurosci. 2003;21(3-4):79-96.
e hemorragias são raras e estão relacionadas à não 7. Thanabalasundaram G, Pieper C, Lischper M, Galla HJ.
observação das técnicas adequadas. No caso da Regulation of the blood-brain barrier integrity by pericytes
via matrix metalloproteinases mediated activation of
punção cisternal, as complicações podem ser mais vascular endothelial growth factor in Capítulo 7 141. vitro.
graves, como a lesão do tronco cerebral ou da artéria Brain Res. 2010;1347:1-10.
Capítulo 7 94
CAPÍTULO 8
DOPPLER TRANSCRANIANO
INTRODUÇÃO
Neste capítulo será descrita a utilidade do exame A partir dele, é possível realizar o cálculo da
de Doppler transcraniano (DTC) na prática clínica da velocidade de fluxo sanguíneo pela fórmula1,3:
Neurologia e Neurocirurgia, além de descrever dois outros
exames com importância clínica relevante à beira leito,
a ultrassonografia com Dupplex colorida transcraniana
(UDCT) e o ultrassom de nervo óptico.
Capítulo 8 95
do espectro das velocidades de fluxo sanguíneo1,3 4. avaliação da reatividade microcirculatória
(Figura 1): encefálica (teste do gás carbônico,
acetazolamida e da apneia);
a. Velocidade média de fluxo sanguíneo en-
cefálico (Vm): 5. avaliação de atividade embólica
espontânea, além de detecção de shunt
direita-esquerda intra ou extracardíaco
através do teste de microbolhas;
Os valores de normalidade desses índices que devem ser mais elevados com o objetivo
são1,3: IP < 1.2 e IR < 0.75. de manter a área de penumbra viável. O exame
avalia também a reabertura do vaso em pacientes
Cerca de 20% das pessoas não possuem
submetidos ou não às terapias trombolíticas. Utiliza-
janela acústica adequada, impossibilitando a
se da escala de TIBI (thrombolysis in brain ischemia)
realização do exame.
para avaliação da dinâmica de recanalização pós
trombólise (0-1 sugere oclusão arterial da artéria
APLICAÇÕES CLÍNICAS cerebral média; 2-3 recanalização parcial; e 4-5
recanalização total). Durante a terapia trombolítica,
Acidente vascular cerebral isquêmico
a presença de embolização espontânea também
(AVEi)
sugere recanalização da artéria (Figura 2). Já a
Os principais achados do DTC que podem
presença de embolização espontânea em territórios
auxiliar no manejo do paciente com doença vascular
arteriais diferentes pode sugerir a presença de fonte
encefálica são os seguintes1,3:
emboligênica cardíaca (tais como fibrilação atrial,
1. detecção de estenoses e oclusões arteriais trombos, endocardite). Durante o exame, também,
intracranianas; se pode realizar o teste de microbolhas que tem
como objetivo avaliar a presença de shunt direito
2. detecção de alterações da hemodinâmica
esquerdo intra ou extracardíaco, o que permite a
encefálica associadas às estenoses
criticas das artérias carótidas intra e ocorrência de embolia paradoxal1,2,3.
extracraniana; O DTC também possibilita avaliação da
presença de hipertensão intracraniana nos casos de
3. avaliação da ativação e da efetividade de
circulação encefálica colateral primária AVEis malignos de artéria cerebral média.
(Polígono de Willis) e/ou secundária
(artérias leptomeníngeas);
Capítulo 8 96
Janela Artérias avaliadas
submandibular Artérias carótidas interna e externa
Transorbital Artéria oftálmica, sifão carotídeo
Capítulo 8 97
A HSA pode ser dividida em três fases:
Traumatismo cranioencefálico (TCE)
o TCE é uma das principais causas de • fase oliguêmica: geralmente tem duração
morbimortalidade na população jovem. O objetivo de 24h, ocorre redução aguda do fluxo
principal do manejo desses pacientes na unidade sanguíneo encefálico associado à hiper-
tensão intracraniana e redução da pres-
de terapia intensiva é evitar dano neurológico
são de perfusão encefálica. A presença
secundário. O DTC permite a avaliação da
de intensa vasoconstrição microvascular
hemodinâmica cerebral desses pacientes à beira encefálica é a base principal da fisiopato-
leito e, portanto, auxilia no diagnóstico e terapêutica logia dessa fase. A intensidade da fase de
através dos achados das fases hemodinâmicas oliguemia é a que mais está associada a
associadas ao TCE4,5: lesões encefálicas e mau prognóstico dos
pacientes na HSA. Os achados do DTC
• Fase de oliguemia (ocorre nas primeiras podem ser velocidades baixas associadas
24h): caracterizada pela redução do fluxo à elevação da resistência cerebrovascular
sanguíneo cerebral; caracterizada pelo aumento dos índices
de pulsatilidade e de resistência. Nes-
• Fase de hiperemia (após as primeiras se momento, fatores que acentuem essa
24h): caracterizada pelo aumento do fluxo condição devem ser evitados, tais como
sanguíneo nas artérias encefálicas: e hipocapnia e hipotensão; as correções da
volemia e do débito cardíaco podem pro-
• Fase de vasoespasmo: ocorre nova redu-
mover a restauração circulatória encefáli-
ção do fluxo sanguíneo associada a ocor-
ca. O prolongamento da duração da fase
rência de vasoespasmo em grandes ou
oliguemia pode estar associada a prog-
pequenas artérias.
nóstico desfavorável6;
Essas três fases também estão presentes
• fase hiperêmica: a fase anterior leva a pro-
na hemorragia subaracnoidea (HSA) e serão
dução de ácido lático devido à redução de
pormenorizadas no próximo tópico.
oxigênio no tecido cerebral e consequente
É importante ressaltar que o vasoespasmo produção de energia pela via anaeróbia. O
no TCE em comparação com a HSA tem início mais ácido lático causa vasodilatação da micro-
vasculatura encefálica levando a um au-
precoce e é mais fugaz. Pode estar associado ao
mento do fluxo sanguíneo cerebral. Assim,
estiramento do vaso que provoca contração dos
o DTC mostrará aumento das velocidades
miócitos na parede arterial. Já na HSA, geralmente de fluxo sanguíneo encefálico desde a
está associado à reação inflamatória na parede carótida interna cervical até as artérias in-
do vaso e, desta forma, também considerado com tracranianas. Devem-se evitar fatores que
vasculite associado à HSA. Importante ressaltar que acentuem a hiperemia: hipercapnia, hiper-
pode haver vasoespasmo inflamatório semelhante à tensão e estados hipermetabólicos (como
febre e crise convulsiva)6. Esta fase pode
HSA no TCE principalmente associado a contusões
ocorrer 24h após a fase de oliguemia, o
encefálicas.
que demonstra importância dos exames
sequenciais, pois o tratamento do pacien-
Hemorragia subaracnoidea (HSA) te nesta fase é totalmente oposto ao da
O DTC seriado é fundamental no manejo fase de oliguemia: e
dos pacientes com HSA. Através da avaliação da
• fase do vasoespasmo: a fase do vasoes-
hemodinâmica cerebral à beira leito é possível pasmo inicia-se após 48h, sobretudo do
avaliar as diferentes fases da doença e assim auxiliar terceiro dia até a segunda semana. Cerca
no manejo do tratamento desses pacientes1,6. de 70% dos pacientes apresentarão va-
soespasmo angiográfico, porém apenas
Capítulo 8 98
30% desses serão sintomáticos. É uma
Hipertensão intracraniana (HIC) e morte
complicação grave que se pode causar is-
encefálica (ME)
quemia ou lesão encefálica6-8.
O aumento progressivo da pressão
Os principais critérios diagnósticos do intracraniana (PIC) leva ao aumento da resistência
vasoespasmo no DTC são o aumento focal de cerebrovascular, pois há restrição do fluxo sanguíneo
velocidade e o cálculo dos índices de Lindegaard encefálico devido a redução do espaço intracraniano.
(IL) e Soustiel (IS). O exame tem alta especificidade Assim, ocorrerá queda progressiva da velocidade
e alto valor preditivo positivo para o diagnóstico diastólica com concomitante aumento do índice de
de vasoespasmo na artéria cerebral média. pulsatilidade e do índice de resistência (Figura 3).
Considera-se vasoespasmo quando Vm ≥ 120cm/s O DOPPLER transcraniano pode, portanto, ser uma
e vasoespasmo grave se > 200cm/s9-12. ferramenta útil para avaliação da PIC em pacientes
Aumentos abruptos de Vm em 24h também sem monitonirazação invasiva1,3.
merecem atenção. Aumentos em mais de 50cm/s É preciso ressaltar que tanto o IP quanto o IR
entre um dia e outro sugerem pior prognóstico1. dependem da relação entre as velocidades sistólica,
O estreitamento focal da artéria causa diastólica e média. Ou seja, esses índices podem
elevação da velocidade de fluxo nesse segmento se elevar também em outras condições que não a
e retardo nos segmentos que antecedem essa hipertensão intracraniana1,3. Além disso, pacientes
estenose. Assim, além do aumento de Vm, a com hipertensão intracraniana leve não apresentam
relação entre a velocidade da artéria cerebral média aumento da resistência cerebrovascular (não haverá
acometida com a artéria carótida interna cervical (IL) alteração desses índices).
precisa ser avaliada para correta interpretação dos Portanto, é preciso correlacionar os achados do
achados do DTC. O IL deve ser > 3 para que se DTC com as demais condições clínicas do paciente
configure vasoespasmo, entre 3 e 6 vasoespasmo e reforçar a importância de exames seriados.
moderado e > que 6 vasoespasmo grave. Valores
Com o aumento progressivo da PIC, a
elevados de Vm associados à IL < 3 podem configurar
velocidade diastólica atingirá o valor zero. Nessa
hiperemia1,13.
situação, ocorre restrição importante ao fluxo
Para a artéria basilar, calcula-se o IS sanguíneo e durante a diálise não haverá perfusão
(relação entre a Vm na artéria basilar e a Vm da encefálica1,3.
artéria vertebral extracraniana). Valores de IS > 2
Quando a PIC superar o valor da pressão
associam-se à presença de vasoespasmo (se IS >
arterial média, todo o fluxo que tentará perfundir
3, vasoespasmo grave)12.
o encéfalo na diástole irá refluir na diástole (fluxo
As principais características do vasoespasmo alternante). Aumentos progressivos da PIC levarão
associadas a sintomas clínicos são14: a formação de espículas sistólicas até a ocorrência
de ausência de sinais detectáveis durante o exame
• início precoce do vasoespasmo;
(Figura 4). Essas situações descrevem a ausência
• Vm > 200cm/s (sugestiva de vasoespas- de perfusão encefálica e quando presente em todas
mo grave); as artérias intracranianas sugere-se a presença de
morte encefálica (ME) 1,3. É importante ressaltar que
• vasoespasmo em tandem, isto é, sequên-
cia que se estende de uma artéria para o diagnóstico de ME é eminentemente clínico, sendo
outra; e o DTC um dos exames complementares possíveis a
serem realizados dentro do protocolo brasileiro.
• ocorrência de vasoespasmo em múltiplos
segmentos arteriais encefálicos;
Capítulo 8 99
Figura 3: AVE hemorrágico intraparenquimatoso lobar à esquerda com sinais de hipertensão intracraniana
compartimentalizada deste lado (aumento do índice de pulsatilidade à esquerda).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 8 100
Autorregulação encefálica
A autorregulação encefálica pode estar
comprometida em todas as patologias supracitadas.
Ela é definida pela capacidade de manutenção
do fluxo sanguíneo encefálico (entre 50 e 60
ml/100g/min) dentro de uma determinada faixa
pressórica (entre 60 e 160mmHg). Através do DTC,
a autorregulação pode ser avaliada por manobras
estáticas e dinâmicas1,15-17.
Capítulo 8 101
Figura 6: Foto de modelo experimental. Espessura normal da bainha do nervo óptico na figura à esquerda, 4 mm.
Espessura aumentada à direita, 6,4 mm.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 8 102
in neurocritical care. J Ultrasound. 2018;21(1):1-16. 12. Soustiel JF, Shik V, Shreiber R, Tavor Y, Goldsher D.
Basilar vasospasm diagnosis: investigation of a modified
4. Martin NA, Patwardhan RV, Alexander MJ, et al.
“Lindegaard Index” based on imaging studies and blood
Characterization of cerebral hemodynamic phases following
velocity measurements of the basilar artery. Stroke.
severe head trauma: hypoperfusion, hyperemia, and
2002;33(1):72-77.
vasospasm. J Neurosurg. 1997l;87(1):9-19.
13. Lindegaard KF, Nornes H, Bakke SJ, Sorteberg W,
5. Bor-Seng-Shu E, Teixeira MJ. Brain vasospasm after
Nakstad P. Cerebral vasospasm after subarachnoid
head injury. J Neurosurg. 2007;106(4):728-730.
haemorrhage investigated by means of transcranial Doppler
6. de Lima Oliveira M, de Azevedo DS, de Azevedo MK, ultrasound. Acta Neurochir Suppl. 1988;42:81-84.
et al. Encephalic hemodynamic phases in subarachnoid
14. Bor-Seng-Shu E, de-Lima-Oliveira M, Teixeira MJ,
hemorrhage: how to improve the protective effect in patient
Panerai RB. Predicting symptomatic cerebral vasospasm
prognoses. Neural Regen Res. 2015;10(5):748-752.
after aneurysmal subarachnoid hemorrhage. Neurosurgery.
7. Connolly ES Jr, Rabinstein AA, Carhuapoma JR, 2011;69(2):E501-2
et al. Guidelines for the management of aneurysmal
15. Panerai RB. Cerebral autoregulation: from models to
subarachnoid hemorrhage: a guideline for healthcare
clinical applications. Cardiovasc Eng. 2008;8(1):42-59.
professionals from the American Heart Association/american
Stroke Association. Stroke. 2012;43(6):1711-1737. 16. Rangel-Castilla L, Gasco J, Nauta HJ, Okonkwo
DO, Robertson CS. Cerebral pressure autoregulation in
8. de Oliveira Manoel AL, Goffi A, Marotta TR, Schweizer
traumatic brain injury. Neurosurg Focus. 2008;25(4):E7.
TA, Abrahamson S, Macdonald RL. The critical care
management of poor-grade subarachnoid haemorrhage. Crit 17. Aries MJ, Elting JW, De Keyser J, Kremer BP,
Care. 2016;20:21. Vroomen PC. Cerebral autoregulation in stroke: a review
of transcranial Doppler studies. Stroke. 2010;41(11):2697-
9. Aaslid R, Huber P, Nornes H. A transcranial Doppler
2704.
method in the evaluation of cerebrovascular spasm.
Neuroradiology. 1986;28(1):11-6. 18. Nag DS, Sahu S, Swain A, Kant S. Intracranial pressure
monitoring: Gold standard and recent innovations. World J
10. Lysakowski C, Walder B, Costanza MC, Tramèr MR.
Clin Cases. 2019;7(13):1535-1553.
Transcranial Doppler versus angiography in patients
with vasospasm due to a ruptured cerebral aneurysm: A
systematic review. Stroke. 2001;32(10):2292-2298.
11. Sloan MA, Haley EC Jr, Kassell NF, et al. Sensitivity
and specificity of transcranial Doppler ultrasonography
in the diagnosis of vasospasm following subarachnoid
hemorrhage. Neurology. 1989;39(11):1514-1518.
Capítulo 8 103
CAPÍTULO 9
ECODOPPLER VASCULAR DE VASOS CERVICAIS
INTRODUÇÃO
CLÍNICA
A doença arterial carotídea aterosclerótica
é uma das principais causas de acidente vascular A estenose carotídea é classificada e quantificada
encefálico (AVE) e ataque isquêmico transitório (AIT), de acordo com o grau de obstrução. Assim, podemos
correspondendo a 15%. A incidência anual de estenose classificar em vários graus, de acordo com o NASCET
da artéria carótida (AC) extracraniana como causa de (North American Symptomatic Carotid Endarterectomy
Capítulo 9 104
não se tem alteração clínica, mas existe imagem uma aproximação ou um afastamento da fonte
cerebral de isquemia, a estenose carotídea será em relação ao observador. Leva o nome de seu
classificada como sintomática . 4
descobridor Christian Andreas Doppler, matemático
e físico, proveniente de Salzburgo, Áustria.
O principal exame para graduar a estenose
é a ultrassonografia Dupplex colorida, associada Em 1822, as habilidades escolares em
a extensão da estenose distal utilizando o matemática e ciências de Doppler impressionaram o
método North American Symptomatic Carotid professor local, Simon Stampfer, que o recomendou
Endarterectomy Trial (NASCET). Na existência de ao Instituto Politécnico de Viena, onde estudou
dúvidas quanto à graduação, pode ser realizada matemática e física por três anos e concluiu sua
a angiografia por ressonância magnética com graduação em Salzburg, em 1829. Durante quatro
contraste ou a angiotomografia computadorizada anos ocupou o cargo de assistente superior de
3
. Todos os pacientes sintomáticos devem ser matemática no Instituto Politécnico de Viena. Em
submetidos a exames de imagem cerebral antes da 1835 ocupou o cargo, convidado como professor de
endarterectomia ou implante de stent . 4
matemática elementar e contabilidade comercial,
na Escola Secundária Estadual de Praga. Em
A triagem de rotina para estenose carotídea
1841, tornou-se professor titular de matemática e
não é recomendada. Este rastreamento é
geometria prática no Instituto Politécnico de Viena.
conveniente quando há fatores de risco vascular em
Em 1842 apresentou seu artigo em uma reunião de
que o diagnóstico de estenose teria consequências
ciências naturais em Praga. E, em 1843, publicou
terapêuticas, devido a alterações hemodinâmicas
seu famoso artigo, nos Anais da sociedade, sobre
importantes. Pacientes com estenose carotídea
efeito Doppler intitulado “On the colored light of the
conhecida devem ser acompanhados em intervalos
double stars and certain other stars of the heavens”
de 6 a 12 meses3,4.
(Figura 1). O artigo gerou questionamentos críticos
e experimentos que tentavam refutar sua teoria,
Assintomático
porém, acabaram por comprovar a existência do
A estenose assintomática da AC é definida
efeito Doppler. Desde então, o princípio Doppler tem
como um estreitamento da AC maior ou igual a
sido usado extensivamente em diversos campos da
50% na ausência de AVE isquêmico, AIT ou outros
ciência e tecnologia. Em 1843 foi eleito membro da
sintomas neurológicos relacionados às artérias
Sociedade Boêmia Real de Ciências e, em 1847, da
carótidas nos 6 meses anteriores. A prevalência de
Academia Imperial de Ciências de Viena. Em 1850
estenose da AC assintomática é baixa na população
foi nomeado para o cargo de Cadeira de Física
em geral, de 0% a 3,1% embora aumente com a
Experimental na Universidade de Viena. Veio a
idade, e a taxa anual de AVE nesses pacientes varia
falecer em 1853.
de 1% a 3%5,6.
O trabalho de Doppler baseou-se na teoria da
Pacientes assintomáticos com mais de 80
aberração da luz desenvolvida por Edmund Bradley,
anos, aproximadamente 3% dos homens e 1% das
no século XVIII. Doppler determinou o princípio da
mulheres desenvolverão estenose grave7.
mudança de frequência e desenvolveu uma fórmula
para calcular essa velocidade a partir disso. Desde
o início de seus estudos sobre esse efeito, esteve
HISTÓRICO certo a respeito da transmissão dos sons, embora
O fenômeno natural conhecido como efeito estivesse enganado a respeito da transmissão de
Doppler é definido como a observação das alterações luz. Postulava que todas as estrelas emitiam apenas
na frequência das ondas transmitidas quando ocorre luz branca pura8.
Capítulo 9 105
Figura 1: Artigo de Christian Doppler “On the colored light of the double stars and certain other stars of the heavens”.
Fonte: Maulik, 20058.
Capítulo 9 106
sem ultrapassar os 60 graus para alcançar esse
INTERPRETAÇÃO DO EXAME
paralelismo, pois um pequeno erro na estimativa
A ultrassonografia Dupplex não mede
do ângulo promove um grande erro acima do
diretamente o diâmetro da lesão estenótica. Mede a
valor real. Assim, registram-se fluxos em carótida
velocidade do fluxo sanguíneo. Demonstra o pico da
comum, ramos interno e externo. Deve-se colocar
velocidade sistólica na AC interna e a relaciona com
o ponto de amostra do Doppler pulsado no local de
o pico da AC comum ipsilateral3.
maior turbulência nas placas. Este ponto não deve
Não há nenhum preparo necessário para a ultrapassar mais do que 50% da luz do vaso e deve
realização do exame e não existem contraindicações, apenas se aproximar sem encostar nas paredes dos
mas existem algumas limitações que podem reduzir vasos, a fim de impedir falsas turbulências9. Onde:
sua acurácia, como pescoço curto, grosso; pacientes
a) artéria carótida interna → fluxo com
com curativos, feridas ou cateteres no pescoço;
característica de baixa resistência, com
pacientes não colaborativos; pacientes com placas
importante fluxo sistodiastólico;
extensas calcificadas que dificultam a visualização
b) artéria carótida externa → fluxo de alta
da bifurcação carotídea10.
resistência, com diminuição do componente
A Tabela 1 apresenta o protocolo em relação à diastólico; e
posição do paciente, equipamento e controles para c) artéria carótida comum → padrão misto do
a realização do Doppler . fluxo.
Capítulo 9 107
Não pressionar
Porção cefálica
estruturas
é demonstrada
Cabeça não Lado oposto ao venosas com o
Paciente Decúbito dorsal à esquerda
flexionada examinado transdutor (não
no plano
colabar a veia
longitudinal
jugular)
Transdutores Frequência entre
Equipamento
lineares 4-10 MHZ
Correção do
Aplicativos
ângulo, inclinação
que corrigem O ângulo não
da caixa de
Controles profundidade, deve ultrapassar
amostragem do
filtros, pacote de os 60 graus
mapeamento de
medidas
fluxo e cores
Tabela 1: Protocolo do exame.
Fonte: Os autores, 2021.
Corte da carótida
Localização Direção
comum
Fossa supraclavicular, lateral ao
Transverso Ao ângulo da mandíbula
esternocleidomastoideo
Tabela 2: Sequência do exame.
Fonte: Os autores, 2021.
Anatomia
Ecogenicidade Textura Superfície Formato Local
vasos
Homogêneas –
Hiperecóicas-
predomínio de Regular Circular Parede anterior Tortuosos
calcificadas
material lipídico
Irregular
Heterogêneas
(ulceradas e
Hipoecóicas- placas – mais de um Parede
escavadas tem Semicircular Dilatados
moles elemento (ex: posterior
maior risco
fibrocalcificadas)
emboligênico)
Isoecóicas Lateral ao vaso
Medial ao vaso
Tabela 4: Morfologia das placas.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 9 108
As tortuosidades mais acentuadas de carótidas prévias de stents carotídeos, que diminuem a
costumam ser também chamadas de Kinking. A complacência da parede do vaso e a velocidade do
presença de artérias vertebrais de calibres diferentes fluxo 16
. Para pacientes assintomáticos, este exame
não é rara, constituindo uma variação anatômica . 9
é recomendado na presença de sopro carotídeo.
Também em casos de estenose carotídea conhecida
Além disso, através do corte longitudinal,
ou suspeita, doença arterial periférica sintomática,
deve-se relatar a extensão da placa e se há
doença arterial coronariana ou aneurisma
prolongamento em direção aos ramos9.
aterosclerótico de aorta, embora muitos desses
pacientes já possuíssem indicação terapêutica para
prevenir sintomas isquêmicos. O exame também
EXAMES
está recomendado em pacientes assintomáticos
Ecodoppler de Carótida sem evidência clínica de aterosclerose que têm dois
É a modalidade de imagem da AC de primeira ou mais dos seguintes fatores de risco: hipertensão,
linha para avaliar estenoses extracranianas de AC hiperlipidemia, tabagismo, história familiar em
interna 10
junto com a determinação da extensão da um parente de primeiro grau de aterosclerose
estenose distal usando o método NASCET . Trata- 11 manifestada antes dos 60 anos, ou história familiar
se de um exame não invasivo que determina o grau de AVE isquêmico. É indicado repetir o ecodoppler
de estenose carotídea cervical e a morfologia da de carótida anualmente para avaliar a progressão
placa na maioria dos pacientes. Também, é possível ou regressão da doença e a resposta a intervenções
a análise macroscópica das placas aderidas à terapêuticas em pacientes com aterosclerose
parede do vaso, como calcificações e hemorragias que tiveram estenose maior que 50% detectada
intraplaca, bem como o espessamento parietal e o anteriormente3,17. Para pacientes sintomáticos,
comprometimento hemodinâmico 10,11
. A determinação o exame deve ser feito em casos de sintomas
do grau de estenose da AC é baseada na análise do focais neurológicos de território de AC (fraqueza
pico de velocidade sistólica (PVS) ou da velocidade contralateral da face, braço ou perna, ou ambos;
diastólica final (VDF), ou ambas, da AC. Especialistas déficit sensorial contralateral ou parestesia da face,
da Society of Radiologists in Ultrasound chegaram braço, ou perna, ou ambos), isquemia transitória de
ao consenso de um corte de PVS da ACI de 125 cm/ retina (amaurose fugaz) e afasia nos seis meses
seg para estenose angiográfica de 50% e 230 cm/ anteriores3,18,19.
seg para predizer estenose de 70% da ACI 12
. De
Angiotomografia de vasos cervicais
acordo com os critérios do consenso, o ecodoppler
de carótida possui uma sensibilidade de 93%, A rápida aquisição de imagens espirais da
especificidade de 68% e acurácia geral de 85% para tomografia computadorizada (TC) permite imediata
estenose entre 50% e 69%. Um PVS de 230 cm/ aquisição de imagens com administração de
seg para estenose de 70% teve uma sensibilidade contraste não iônico e fornece imagens de qualidade
de 99%, especificidade de 86% e acurácia geral de que podem ser visualizadas em vários planos.
95%13. Ajustes baseados na velocidade de estenose Também pode demonstrar anomalias vasculares,
podem ser necessários em certas circunstâncias, por possui a capacidade de quantificar a extensão da
exemplo, velocidades mais altas em mulheres do que calcificação e permite o estudo da árvore arterial
em homens e velocidades mais altas na presença de desde o arco aórtico até o círculo de Willis. As
oclusão da AC contralateral14,15. Bifurcação carotídea estenoses podem ser medidas com microcalipers
alta, tortuosidade arterial extensa, calcificação eletrônicos baseados em métodos NASCET ou
vascular e obesidade também podem reduzir a European Carotid Surgery Trial (ECST)20-22. Para
acurácia da imagem. Deve-se atentar a cirurgias o método NASCET, o diâmetro do menor lúmen
Capítulo 9 109
residual (a) é comparado com o diâmetro da artéria invasivos produzem resultados conflitantes. O
normal distal à bifurcação carotídea (b), de acordo estudo da estenose carotidea geralmente é feita
com a seguinte fórmula: porcentagem de estenose = com a medição do método NASCET29. Quando o
b-a/b × 100. Porém é menos confiável na descrição ecodoppler é duvidoso, a arteriografia é preferível à
da morfologia da placa carotídea, especificamente o TC e RM na avaliação de pacientes com disfunção
componente lipídico ou ulceração 3,23
. renal (minimizando a carga de contraste), obesidade
ou material ferromagnético permanente.
Angioressonância de vasos cervicais
Dificuldades operacionais do exame
Este exame possui a vantagem de ser não
invasivo, permite o planejamento da revascularização As principais limitações do exame ecodoppler
do lúmen carotídeo a partir de uma única aquisição. da AC proximal e porções intracranianas. Embora
Pode também avaliar lesões intratorácicas e as artérias cerebrais intracranianas possam ser
intracranianas que não são possíveis de estudar avaliadas com DTC, essa técnica não está tão
no ecodoppler. As desvantagens são de que não amplamente disponível na maioria das instituições
pode ser utilizado em pacientes com dispositivos quanto as outras modalidades de imagem. Já as
compostos à base de gadolínio usados como agente à radiação. Além disso, uma grande carga de cálcio
de contraste foram associados a fibrose sistêmica pode limitar a capacidade de distinguir o contraste do
Esse exame fornece imagens de alta tanto para a redução de AVEs quanto para eventos
qualidade que são precisas, objetivas e fáceis de cardiovasculares gerais, incluindo mortalidade
aórtico até os vasos intracranianos. As principais A hipertensão arterial sistêmica é um fator de risco
limitações da angiografia que a tornam inadequada que está altamente associado a eventos isquêmicos
custo e riscos associados, especificamente de arterial (PA) resulta em um aumento no risco de AVE
Capítulo 9 110
140/90 mmHg por meio de mudanças no estilo de AAS e clopidogrel não é recomendada por causa do
vida e tratamento anti-hipertensivo é fundamental em risco aumentado de sangramento. Porém há dados
indivíduos que têm hipertensão com aterosclerose de estudos de implante de stent coronário que
carotídea ou vertebral assintomática 30-34
. As metas sugerem que essa combinação possa ser utilizada
do tratamento devem levar em consideração o risco rotineiramente por um curto período (um a três meses)
de redução da perfusão cerebral com o tratamento após o implante de stent na AC47. A combinação de
excessivamente agressivo, evitar a hipoperfusão AAS mais dipiridamol de liberação prolongada (25
durante a endarterectomia carotídea ou colocação de e 200 mg duas vezes ao dia, respectivamente) é
stent e a síndrome de hiperperfusão imediatamente preferível em relação à combinação de AAS com
após a intervenção . 35
clopidogrel. A escolha da terapêutica antiplaquetária
deve ser individualizada com base nos perfis de
Pacientes com doença aterosclerótica
fatores de risco do paciente, custo e tolerância44,48-50.
previamente conhecida mostram taxas reduzidas de
AVE quando tratados com terapia hipolipemiante.
Embora o colesterol de lipoproteína de baixa Angioplastia com stent ou endarterectomia
densidade (LDL) seja o principal determinante do Uma vez que um paciente com estenose
risco cardiovascular e de AVE, os níveis reduzidos carotídea clinicamente significativa é identificado,
de colesterol de lipoproteína de alta densidade o tratamento apropriado deve ser selecionado. O
(HDL) também influenciam, e ao aumentar os níveis tratamento é escolhido com base na avaliação do
de HDL verifica-se a redução do risco de AVE 36,37
.O risco associado à intervenção e na probabilidade
tratamento com estatina é recomendado para todos de uma determinada intervenção alterar
os pacientes com doença carótida extracraniana ou favoravelmente o curso da doença. Isso envolve
aterosclerose vertebral para reduzir LDL abaixo de avaliação apropriada dos fatores de risco, terapia
100 mg/dL e LDL abaixo de 70 mg/dL para pessoas perioperatória de seleção do paciente e desempenho
de risco muito alto com múltiplos fatores de risco ou de uma operação tecnicamente excelente. As duas
doença carotídea sintomática 38,39
. modalidades cirúrgicas são a endarterectomia e
a angioplastia com implante de stent (AIS). As
Pacientes diabéticos devem ser orientados
indicações para a revascularização cirúrgica são
à prática de exercício físico, dieta e tratamento
risco cirúrgico médio ou baixo que apresentam
medicamentoso para reduzir os níveis séricos de
AVE isquêmico não incapacitante (déficit residual
glicose. O controle da glicose para níveis quase
associado a uma pontuação menor ou igual a dois, de
normoglicêmicos (meta de hemoglobina glicada
acordo com a escala de Rankin modificada) ou AIT,
7%) é o recomendado para reduzir complicações
incluindo eventos hemisféricos ou amaurose fugaz,
microvasculares. A recomendação do colesterol
dentro de seis meses (pacientes sintomáticos);
para pacientes diabéticos é LDL abaixo de 70 mg/
diâmetro do lúmen da AC interna ipsilateral menor
Dl40,41.
do que 70%, conforme documentado por imagem
O tabagismo quase duplica o risco de não invasiva; ou mais de 50%, conforme verificado
AVE42,43. Deve-se aconselhar a suspenção imediata por angiografia por cateter; e a taxa prevista de AVE
do hábito tabágico. Os agentes antiplaquetários perioperatório ou mortalidade for inferior a 6%3. Para
são recomendados para pacientes com episódio pacientes assintomáticos, a seleção deve ocorrer
de acidente isquêmico transitório (AIT) e/ou AVE por uma avaliação das comorbidades, expectativa
associado a doença aterosclerótica oclusiva ou não de vida e outros fatores individuais e deve incluir
oclusiva carotídea ou vertebral. Os medicamentos uma discussão completa dos riscos e benefícios
de escolha são o ácido acetilsalicílico (AAS) 75 a do procedimento com uma compreensão das
325 mg ou clopidogrel 75 mg44-46. A combinação preferências do paciente. A endarterectomia deve ser
Capítulo 9 111
a melhor escolha quando há tortuosidade importante autoexpansível. Retira-se o cateter balão e então é
dos vasos cervicais, arco aórtico desfavorável, lesão posicionado o stent. Administra-se atropina 0,5 mg
longa, calcificação abundante, trombos e doença intravenoso para evitar bradicardia e hipotensão. É
oclusiva 51,52
. Já a AIS é considerada a melhor opção feita uma nova troca e coloca-se um novo cateter
quando há lesões de difícil acesso cirúrgico como balão para angioplastia pós-dilatação. Por fim,
bifurcação alta (ao nível ou acima de C2), pescoço retira-se o sistema de proteção cerebral e possíveis
curto (lesão aterosclerótica próxima à clavícula), fragmentos da placa presos a ele, realiza-se um
cirurgia e/ou radioterapia prévia na região cervical, controle angiográfico da circulação intracraniana
traqueostomia, reestenose pós-endarterectomia, e do vaso tratado que é comparado com o estudo
paralisia de nervos cranianos contralateral inicial e é recolhido o introdutor femoral. Clopidogrel
(incluindo paralisia de cordas vocais), oclusão da AC 75mg e AAS 100mg são orientados por 90 dias pó-
contralateral e lesão adjacente 53-55
. procedimento e a monitorização da pressão arterial
deve ficar abaixo de 140mmHg na sistólica e abaixo
Angioplastia com implante de stent de 90mmHg na diastólica59. O exame de controle
deve ser feito de um a seis meses e após isso,
A AIS surgiu como uma alternativa à
anualmente, preferencialmente por ecodoppler3.
endarterectomia carotídea em pacientes com
alto risco de endarterectomia, como oclusão
Endarterectomia para estenose carotídea
contralateral ou doença arterial coronariana grave.
sintomática
As recomendações pré-procedimento são de que
Em pacientes que apresentaram episódios
a terapia anti-hipertensiva e hipolipemiante devem
de AIT e/ou AVE isquêmico de território carotídeo
ser iniciadas em pacientes selecionados para AIS.
ipsilateral e estenose carotídea de 70% ou mais,
Já a terapia antiplaquetária deve ser dupla com
a endarterectomia reduziu fortemente risco
AAS (81 a 325 mg) e clopidogrel (75 mg) pelo
subsequente de eventos isquêmicos, segundo
menos 5 dias antes e no mínimo 30 dias após o
estudos do NASCET e ECST30,60. Para estenoses
procedimento. Nos casos de alergia ao clopidogrel,
moderadas (50 a 69%) os benefícios foram maiores
este pode ser subistitído por ticlopidina 250 mg56-
em casos mais específicos, como em homens de 75
58
. No procedimento, é realizado anestesia local
anos ou mais, sintomas dentro dos últimos 3 meses,
na região inguinal direita. Punciona-se a artéria
cegueira mononuclear transitória e, principalmente,
femoral direita e é posicionado um introdutor femoral
maior grau de estenose61-63. Estenoses menores do
4 ou 5 French. A sedação não é recomendada,
que 50% não possuem benefícios na cirurgia29.
pois se houver alteração neurológica, é possível
a visualização logo após o procedimento, que
Endarterectomia para estenose carotídea
costuma ser de curta duração. A infusão de heparina
assintomática
80 a 100 unidades por Kg é feita com o objetivo de
Está indicada para pacientes cuja estenose
obter um tempo de coagulação ativada (TAP) de 250
seja de 60% ou mais, em bom estado clínico e em
a 300s. Pode-se estudar a anatomia e a circulação
hospitais cuja morbidade e mortalidade é inferior
cerebral, bem como possíveis lesões através do
a 3% nas endarterectomias carotídeas, segundo
estudo angiográfico. Um fio-guia hidrofílico 0,35
estudos da Asymptomatic Carotid Atherosclerosis
é posicionado cranialmente no vaso que possui
Study (ACAS) e Asymptomatic Carotid Surgery Trial
a placa aterosclerótica e posiciona-se o filtro de 64,65
.
proteção cerebral. Depois é posicionado um cateter
balão de 2 mm de diâmetro para a angioplastia
sobre a estenose para a realização da pré-dilatação,
procedimento que facilita a colocação do stent
Capítulo 9 112
Uma vez encontrada a ACC, o cirurgião
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO
disseca até a bifurcação, preferencialmente pela
A endarterectomia carotídea pode ser feita
porção mais posterior do vaso, para evitar de
tanto com anestesia locorregional quanto com a geral.
lesionar os nervos vago, acessório, laríngeo superior,
As vantagens da locorregional são a possibilidade
laríngeo recorrente e a veia jugular. Na bifurcação
da monitorização do nível de consciência e
encontramos a veia tireoidiana superior, veia
estado neurológico durante a cirurgia, bem como
facial e a veia lingual, podendo ainda ser um único
a realização do procedimento em pacientes que
tronco (tireolinguofacial), que devem ser ligadas e
possuem contraindicação para anestesia geral.
seccionadas. Na bifurcação, também encontramos
A principal desvantagem é a de não poder fazer a
a artéria tireoidiana superior correndo medialmente
proteção cerebral com barbitúricos durante o teste
e um clipe hemostático pode ser usado para ocluí-la.
de oclusão da carótida, procedimento este que
Nos pacientes que estão sob anestesia locorregional,
permite a avaliação dos pacientes que irão precisar
recomendamos o teste de tolerância à oclusão da
de shunt intraoperatório. Também pode vir a ser
ACI, no qual é feita a clipagem deste vaso por dois
desconfortável para o paciente. Já a anestesia geral
minutos, é possível verificar força de membros e
possui os benefícios de não ser desconfortável para
nível de consciência. Caso o paciente não resista a
o paciente e permite a utilização de barbitúricos
esse período de tempo, deve-se introduzir um shunt
para a proteção cerebral. A seleção dos pacientes
entre a ACC e a ACI. Recomendamos a palpação
que irão utilizar shunt deve ser realizada por exames
da ACC e da ACI para identificar a porção distal da
de eletroencefalografia e monitoração do potencial
placa para planejar a dissecção até 1,5 cm acima
evocado perioperatório 66,67
.
do topo da extremidade distal da lesão. A ACC e
A cirurgia deve ser realizada no máximo a ACE, então, são clipadas e o cirurgião deve se
duas semanas após o último evento isquêmico e os lembrar que a placa e a íntima espessada sempre se
pacientes devem estar em uso de AAS (81 a 325 estendem até o arco aórtico e que muita pressão de
mg). Qualquer terapia dupla antiagregação deve oclusão na ACC pode levar a uma fratura ou ruptura
ser reduzida à apenas AAS, e se o paciente estiver da íntima com estenose pós-operatória ou até a
em uso de varfarina, deve-se converter a heparina oclusão da ACC.
até a normalização do RNI 3,68
. A cabeça do paciente
A incisão é feita na ACC com um bisturi de
deve ser ligeiramente estendida e girada para o
lâmina nº 11 e estendida com tesoura Potts até a ACI.
lado oposto do cirurgião. A incisão é feita no bordo
Durante este procedimento, o assistente do cirurgião
anterior do músculo esternocleidomastoide, e é
deve irrigar com uma solução salina de heparina
estendida até a ponta do processo mastoide. Após
e sucção para permitir uma boa visualização da
incisão da pele, a dissecção continua através do
placa distal. É preferível dissecar a placa em bloco,
músculo platisma e na borda inferior o cirurgião deve
iniciando pela ACI distal. Ao remover a placa da ACI
encontrar o músculo omo-hioide, que forma um V com
distal, uma pequena espátula pode ser usada para
o esternocleidomastoide, local onde normalmente
empurrar a ACI para longe da placa. Ao empurrar
se encontra a bainha da AC comum (ACC). Deve-se
a artéria para longe da placa, esta se fraturará
atentar para não seccionar o ramo espinhal do nervo
suavemente. Com esta técnica, não é necessário
acessório, localizado sob o esternocleidomastoide.
colocar suturas de aderência, pois podem causar
Localizada a bainha carótida, é feita a heparinização
estenose arterial.
com 1mg/kg que deve elevar o tempo de coagulação
(TAP) para mais de 200s visando a proteção cerebral Após a remoção da placa, é necessário
de eventos isquêmicos causados pela embolia de certificar-se de que não existem retalhos na camada
fragmentos da placa ou da própria dissecção. íntima, que podem ser fonte de complicações
Capítulo 9 113
tromboembólicas. Terminada a endarterectomia, a ACC ipsilateral e reimplante da AV com enxerto
deve-se fechá-la com sutura contínua de Prolene 5.0 venoso para a artéria subclávia. Também pode ser
ou 6.0. A clipagem é então suavemente liberada para feita a reconstrução distal da AV por anastomose
limpar quaisquer detritos proximais e, em seguida, do tronco principal da ACE com a AV. Para as
é feita a reoclusão. Depois de assegurar o nó da reconstruções da AV proximal, a taxa de mortalidade
sutura da arteriotomia, o cirurgião deve assegurar-se perioperatória varia de 0 a 4%. Já nas reconstruções
de que a PA foi normalizada para ajudar a prevenir o de AV distal as taxas de mortalidade variam de 4
sangramento excessivo do reparo arterial e/ou uma a 8%. Tratamento endovascular possui poucas
síndrome de hiperperfusão. evidências de superioridade, com risco de óbito de
0,3% e de 5,5% de complicações 3.
A retirada da clipagem é feita primeiro pela
ACE e depois o da ACC, com o intuito de liberar
possíveis resíduos ou bolhas de ar para o sistema
da ECA. Por fim, retira-se o clipe da ACI e a incisão
é fechada. No pós-operatório, a PA sistólica deve
ficar abaixo de 150 mmHg para evitar hemorragias
ou convulsões por hiperperfusão, e o AAS deve ser
mantido até a alta hospitalar69.
Capítulo 9 114
3. Brott TG, Halperin JL, Abbara S, et al. 2011 ASA/ACCF/ 13. Grant EG, Benson CB, Moneta GL, Alexandrov AV,
AHA/AANN/AANS/ACR/ASNR/CNS/SAIP/SCAI/SIR/SNIS/ Baker JD, Bluth EI, et al. Carotid artery stenosis: grayscale
SVM/SVS guideline on the management of patients with and Doppler ultrasound diagnosis – Society of Radiologists
extracranial carotid and vertebral artery disease: executive in Ultrasound Consensus Conference. Ultrasound Q
summary: a report of the American College of Cardiology 2003;19:190-8.
Foundation/American Heart Association Task Force on
14. AbuRahma AF, Srivastava M, Stone PA, Mousa AY, Jain
Practice Guidelines, and the American Stroke Association,
A, Dean LS, et al. Critical appraisal of the carotid duplex
American Association of Neuroscience Nurses, American
consensus criteria in the diagnosis of carotid artery stenosis.
Association of Neurological Surgeons, American College of
J Vasc Surg 2011;53:53-60.
Radiology, American Society of Neuroradiology, Congress of
Neurological Surgeons, Society of Atherosclerosis Imaging 15. Busuttil SJ, Franklin DP, Youkey JR, Elmore JR.
and Prevention, Society for Cardiovascular Angiography Carotid duplex overestimation of stenosis due to severe
and Interventions, Society of Interventional Radiology, contralateral disease. Am J Surg 1996;172:144-7.
Society of NeuroInterventional Surgery, Society for Vascular
16. Comerota AJ, Salles-Cunha SX, Daoud Y, Jones L,
Medicine, and Society for Vascular Surgery. Developed in
Beebe HG. Gender differences in blood velocities across
collaboration with the American Academy of Neurology and
carotid stenoses. J Vasc Surg 2004;40:939-44.
Society of Cardiovascular Computed Tomography. Catheter
Cardiovasc Interv. 2013;81(1):E76-123. 17. Lal BK, Hobson RW, Tofghi B, Kapadia I, Cuadra S,
Jamil Z. Duplex ultrasound velocity criteria for the stented
4. Eckstein HH, Kühnl A, Berkefeld J, Lawall H, Storck
carotid artery. J Vasc Surg 2008;47:63-73.
M, Sander D. Diagnosis, Treatment and Follow-up
in Extracranial Carotid Stenosis. Dtsch Arztebl Int. 18. de Bray JM, Glatt B. Quantification of atheromatous
2020;117(47):801-807. stenosis in the extracranial internal carotid artery.
Cerebrovasc Dis 1995;5:414-26.
5. de Weerd M, Greving JP, Hedblad B, et al. Prevalence
of asymptomatic carotid artery stenosis in the general 19. Eckstein HH, Kühnl A, Dörfler A, et al. The diagnosis,
population: an individual participant data meta-analysis. treatment and follow-up of extracranial carotid stenosis.
Stroke. 2010;41(6):1294-1297. Dtsch Arztebl Int. 2013;110(27-28):468-476. doi:10.3238/
arztebl.2013.0468.
6. Abbott AL, Brunser AM, Giannoukas A, et al.
Misconceptions regarding the adequacy of best medical 20. Warlow CP, Dennis MS, van Gijn J. What caused the
intervention alone for asymptomatic carotid stenosis. J Vasc transient or persisting ischaemic event, In Warlow CP, et al,
Surg. 2020;71(1):257-269. editors. Stroke a practical guide to management. Oxford,
Engle: Blackwell Science; 2001. p. 223-300.
7. de Weerd M, Greving JP, Hedblad B, Lorenz MW,
Mathiesen EB, O’Leary DH, et al. Prevalence of 21. Bartlett ES, Walters TD, Symons SP, Fox AJ.
asymptomatic carotid artery stenosis in the general Quantification of carotid stenosis on CT angiography. AJNR
population: an individual participant data meta-analysis. Am J Neuroradiol 2006;27:13.
Stroke. 2010; 41:1294–1297.
22. Koelemay MJ, Nederkoorn PJ, Reitsma JB, Majoie CB.
8. Marjolein de Weerd, Jacoba P. Greving, Bo Hedblad, Systematic review of computed tomographic angiography
Matthias W. Lorenz, Ellisiv B. Mathiesen, Daniel H. O’Leary, for assessment of carotid artery disease. Stroke
Maria Rosvall, Matthias Sitzer, Erik Buskens, Michiel L. 2004;35:2306-12.
Bots. Prevalence of Asymptomatic Carotid Artery Stenosis
23. Grønholdt ML. B-mode ultrasound and spiral CT for the
in the General Population. (2010) Stroke. 41 (6): 1294-7.
assessment of carotid atherosclerosis. Neuroimaging Clin N
doi:10.1161/STROKEAHA.110.581058.
Am 2002;12:421-35.
9. Maulik D. Doppler Sonography: A Brief History. In: Maulik
24. Gagne PJ, Matchett J, MacFarland D, et al. Can the
D. (eds) Doppler Ultrasound in Obstetrics and Gynecology.
NASCET technique for measuring carotid stenosis be
Springer, Berlin, Heidelberg, 2005. https://doi.org/10.1007/3-
reliably applied outside the trial? J Vasc Surg 1996;24:449-
540-28903-8_1.
56.
10. Nogueira ACS, Schettino CD, Barros MVL, et al .
25. Nederkoom PJ, van der Graaf Y, Hunink MG. Duplex
Normatização dos equipamentos e das técnicas para a
ultrasound and magnetic resonance angiography compared
realização de exames de ultra-sonografia vascular. Arq.
with digital subtraction angiography in carotid artery
Bras. Cardiol. 2004;82(Suppl 6):1-14.
stenosis: a systematic review. Stroke 2003;34:1324-32.
11. Sprynger M, RF, Moonen M, Aboyans V, Edvardsen
26. Remonda L, Senn P, Barth A, Arnold M, Lövblad
T, Alcantara M, Brodmann M, Naka K, Kownaator S,
KO, Schroth G. Contrast-enhanced 3D MR angiography
Vlachopoulos C, Wautrecht JC, Lancellotti P. EACVI
of the carotid artery: comparison with conventional
recommendations on echovascular imaging assessment of
digital subtraction angiography. AJNR Am J Neuroradiol
arterial diseases: Partim I. (in preparation), 2017.
2002;23:213-9.
12. Arning C, Widder B, von Reutern GM, Stiegler H, Gortler
27. Hatsukami TS, Ross R, Polissar NL, Yuan C.
M. [Revision of DEGUM ultrasound criteria for grading
Visualization of fibrous cap thickness and rupture in human
internal carotid artery stenoses and transfer to NASCET
atherosclerotic carotid plaque in vivo with high-resolution
measurement]. Ultraschall Med 2010; 31: 251–7.
magnetic resonance imaging. Circulation 2000;102:959-64.
Capítulo 9 115
28. Hankey GJ, Warlow CP, Molyneux AJ. Complications of 40. marenco P, Bogousslavsky J, Callahan A III, et al. High-
cerebral angiography for patients with mild carotid territory dose atorvastatin after stroke or transient ischemic attack. N
ischaemia being considered for carotid endarterectomy. J Engl J Med. 2006;355: 549 –59.
Neurol Neurosurg, Psychiatry 1990;53:542-8.
41. Colhoun HM, Betteridge DJ, Durrington PN, et
29. Davies KN, Humphrey PR. Complications of cerebral al. Primary prevention of cardiovascular disease with
angiography in patients with symptomatic carotid territory atorvastatin in type 2 diabetes in the Collaborative
ischaemia screened by carotid ultrasound. J Neurol Atorvastatin Diabetes Study (CARDS): multicentre
Neurosurg, Psychiatry 1993;56:967-72. randomised placebo-controlled trial. Lancet. 2004;364:685–
96.
30. North American Symptomatic Carotid Endarterectomy
Trial Collaborators (NASCET). Beneficial effect of carotid 42. Patel A, MacMahon S, Chalmers J, et al. Intensive blood
endarterectomy in symptomatic patients with high- glucose control and vascular outcomes in patients with type
grade carotid stenosis. North American Symptomatic 2 diabetes. N Engl J Med. 2008;358:2560 –72.
Carotid Endarterectomy Trial Collaborators N Engl J Med
43. Shinton R, Beevers G. Meta-analysis of relation
1991;325:445.
between cigarette smoking and stroke. BMJ 1989;298:789-
31. Sacco RL, Adams R, Albers G, Alberts MJ, Benavente 94.
O, Furie K, et al. Guidelines for prevention of stroke in
44. Wolf PA, D’Agostino RB, Kannel WB, Bonita R, Belanger
patients with ischemic stroke or transient ischemic attack:
AJ. Cigarette smoking as a risk factor for stroke. The
a statement for healthcare professionals from the American
Framingham study. JAMA 1988;259:1025-9.
Heart Association/American Stroke Association Council on
Stroke: co-sponsored by the Council on Cardiovascular 45. Antithrombin Trialists’ Collaboration. Collaborative
Radiology and Intervention: the American Academy of meta-analysis of randomised trials of antiplatelet therapy for
Neurology affirms the value of this guideline. Stroke prevention of death, myocardial infarction, and stroke in high
2006;37:577-617. risk patients. BMJ. 2002;324: 71– 86.
32. Lawes CM, Bennett DA, Feigin VL, Rodgers A. Blood 46. Goldstein LB, Adams R, Alberts MJ, et al. Primary
pressure and stroke: an overview of published reviews. prevention of ischemic stroke: a guideline from the American
Stroke 2004;35:1024. Heart Association/ American Stroke Association Stroke
Council: cosponsored by the Atherosclerotic Peripheral
33. Rashid P, Leonardi-Bee J, Bath P. Blood pressure
Vascular Disease Interdisciplinary Working Group;
reduction and secondary prevention of stroke and
Cardiovascular Nursing Council; Clinical Cardiology Council;
other vascular events: a systematic review. Stroke.
Nutrition, Physical Activity, and Metabolism Council; and the
2003;34:2741– 8.
Quality of Care and Outcomes Research Interdisciplinary
34. PROGRESS Collaborative Group. Randomised trial of a Working Group. Stroke. 2006;37:1583– 633.
perindopril-based blood-pressure-lowering regimen among
47. The Canadian Cooperative Study Group. A randomized
6,105 individuals with previous stroke or transient ischaemic
trial of aspirin and sulfinpyrazone in threatened stroke. N
attack. Lancet. 2001;358:1033– 41.
Engl J Med. 1978;299:53–9.
35. Neal B, MacMahon S, Chapman N, et al. Effects of ACE
48. Jauch EC, Saver JL, Adams HP Jr, et al. Guidelines
inhibitors, calcium antagonists, and other blood-pressure-
for the early management of patients with acute ischemic
lowering drugs: results of prospectively designed overviews
stroke: a guideline for healthcare professionals from the
of randomised trials. Lancet. 2000; 356:1955– 64.
American Heart Association/American Stroke Association.
36. Henderson RD, Phan TG, Piepgras DG, Wijdicks EF. Stroke 2013;44:870- 947.
Mechanisms of intracerebral hemorrhage after carotid
49. CAPRIE Steering Committee. A randomised, blinded,
endarterectomy. J Neurosurg 2001;95.
trial of clopidogrel versus aspirin in patients at risk of
37. van den Bogaard B, van den Born BJ, Fayyad R, ischaemic events (CAPRIE). Lancet. 1996;348:1329 –39.
Waters DD, DeMicco DA, LaRosa JC, et al. On-treatment
50. Diener HC, Bogousslavsky J, Brass LM, et al. Aspirin
lipoprotein components and risk of cerebrovascular events
and clopidogrel compared with clopidogrel alone after recent
in the Treating to New Targets study. Eur J Clin Invest
ischaemic stroke or transient ischaemic attack in high-risk
2011;41:134-42.
patients (MATCH): randomised, double-blind, placebo-
38. National Cholesterol Education Program (NCEP) controlled trial. Lancet. 2004;364:331–7.
Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of
51. Sacco RL, Diener HC, Yusuf S, et al. Aspirin and
High Blood Cholesterol in Adults (Adult Treatment Panel
extended-release dipyridamole versus clopidogrel for
III). Third Report of the National Cholesterol Education
recurrent stroke. N Engl J Med. 2008;359:1238 –51.
Program (NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluation,
and Treatment of High Blood cholesterol in Adults (Adult 52. Eckstein HH, Ringleb P, Allenberg JR, et al. Results
Treatment Panel III) final report. Circulation 2002;106:3143- of the StentProtected Angioplasty versus Carotid
421. Endarterectomy (SPACE) study to treat symptomatic
stenoses at 2 years: a multinational, prospective,
39. Adams RJ, Albers G, Alberts MJ, et al. Update to the
randomised trial. Lancet Neurol. 2008;7:893–902.
AHA/ASA recommendations for the prevention of stroke in
patients with stroke and transient ischemic attack. Stroke.
2008;39:1647–52.
Capítulo 9 116
53. Ederle J, Dobson J, Featherstone RL, et al. Carotid 62. Barnett HJM, Taylor DW, Eliasziw M, et al. Benefit
artery stenting compared with endarterectomy in patients of carotid endarterectomy in patients with symptomatic
with symptomatic carotid stenosis (International Carotid moderate or severe stenosis. N Engl J Med 1998;339:1415-
Stenting Study): an interim analysis of a randomised 25.
controlled trial. Lancet. 2010;375:985–97.
63. Randomised trial of endarterectomy for recently
54. Jaspers GW, Witjes MJ, van den Dungen JJ, Reintsema symptomatic carotid stenosis: final results of the
H, Zeebregts CJ. Mandibular subluxation for distal internal MRC European Carotid Surgery Trial (ECST). Lancet
carotid artery exposure in edentulous patients. J Vasc Surg 1998;351:1379-87.
2009;50:1519-22.
64. Streifler JY, Eliasziw M, Benavente OR, et al. The risk
55. Yadav JS, Wholey MH, Kuntz RE, et al. Protected of stroke in patients with first-ever retinal vs hemispheric
carotid-artery stenting versus endarterectomy in high-risk transient ischemic attacks and high-grade carotid stenosis:
patients. N Engl J Med. 2004;351:1493–501. North American Symptomatic Carotid Endarterectomy Trial.
Arch Neurol 1995;52:246-9.
56. Gurm HS, Yadav JS, Fayad P, et al. Long-term results of
carotid stenting versus endarterectomy in high-risk patients. 65. Endarterectomy for asymptomatic carotid artery
N Engl J Med. 2008;358: 1572–9. stenosis. Executive Committee for the Asymptomatic
Carotid Atherosclerosis Study. JAMA 1995; 273: 1421-8.
57. Garg N, Karagiorgos N, Pisimisis GT, et al. Cerebral
protection devices reduce periprocedural strokes during 66. Halliday A, Mansfield A, Marro J, Peto C, Peto R,
carotid angioplasty and stenting: asystematic review of the Potter J, et al. Prevention of disabling and fatal strokes by
current literature. J Endovasc Ther. 2009;16: 412–27. successful carotid endarterectomy in patients without recent
neurological symptoms: randomised controlled trial. Lancet
58. Mas JL, Chatellier G, Beyssen B, et al. Endarterectomy
2004; 363:1491.
versus stenting in patients with symptomatic severe carotid
stenosis. N Engl J Med. 2006;355:1660 –71. 67. De Sousa AA. Carotid endarterectomy under regional
anesthesia. Neurol Med Chir 1998; 38(Suppl): 279-83.
59. International Carotid Stenting Study investigators, Ederle
J, Dobson J, Featherstone RL, Bonati LH, van der Worp HB, 68. Lobo M, Mourão J, Afonso G. Endarterectomia
et al. Carotid artery stenting compared with endarterectomy carotídea: revisão de 10 anos de prática de anestesia geral
in patients with symptomatic carotid stenosis (International e locorregional num hospital terciário em Portugal. Brazilian
Carotid Stenting Study): an interim analysis of a randomised Journal of Anesthesiology. 2015;65(4):249–254.
controlled trial. Lancet 2010;375:985-97.
69. Rothwell PM, Eliasziw M, Gutnikov SA, Warlow CP,
60. Thummala RP, Souslian FG. Extracranial arterial Barnett HJM. Endarterectomy for symptomatic carotid
occlusive disease. ln: Deshaies EM, Eddleman CS, Boulos stenosis in relation to clinical subgroups and timing of
AS (eds.). Handbook of neuroendovascular surgery. New surgery. Lancet 2004; 363: 915-24.
York: Thieme Medical Publishers; 2012. p. 323-44.
70. Nussbaum ES, Mocco J. Cerebral Revascularization:
61. European Carotid Surgery Trialists’ Collaborative Group. Microsurgical and Endovascular Techniques. Stuttgart:
MRC European Carotid Surgery Trial: interim results for Thieme Medical Publishers, 2011.
symptomatic patients with severe (70-99%) or with mild (0-
29%) carotid stenosis. Lancet 1991;337: 1235-43.
Capítulo 9 117
CAPÍTULO 10
ELETROENCEFALOGRAMA
Capítulo 10 118
montagens são usadas para melhorar a análise da
Esquerda Direita Linha média
localização espacial dos grafoelementos, que são
Fp1 Frontopolar Fp2 Frontopolar
Fz Frontal médio as inflexões do traçado eletroencefalográfico a partir
esquerdo direito
F3 Frontal de sua linha de base. Devido à alta sensibilidade
F4 Frontal direito Cz Central médio
esquerdo do amplificador do aparelho de EEG, não é
F7 Temporal F8 Temporal
Pz Parietal médio incomum o registro de artefatos, seja gerados pelos
anterior esquerdo anterior direito
componentes do equipamento, ou por potenciais
T3 Temporal T4 Temporal
médio esquerdo médio direito eletromagnéticos ambientais ou extracerebrais.
C3 Central Grafoelementos eletroencefalográficos que apontam
C4 Central direito Auriculares
esquerdo para baixo da linha de base têm polaridade negativa,
P3 Parietal A1 Auricular
P4 Parietal direito e para cima polaridade positiva. Uma onda mais
esquerdo esquerdo
negativa permite determinar o eletrodo que está
T5 Temporal
T6 Temporal A2 Auricular mais próximo da eletronegatividade (Figura 2)1.
posterior
posterior direito direito
esquerdo
O1 Occipital O2 Occipital
esquerdo direito
Tabela 1: Abreviação dos nomes dos eletrodos.
Fonte: Os autores, 2021.
O USO DE FILTROS
Filtros de alta: no EEG, esse filtro é graduado
em 60 a 70 Hz. Isso significa que os sinais com
frequência maior vão ter sua amplitude atenuada. Figura 2: Reversão de fase. A interpretação dos
grafoelementos também implica no reconhecimento de
Seu uso é comum para remover artefatos, como por padrões de atividade elétrica.
exemplo, os de origem muscular. Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 10 119
definida como a resistência a passagem da corrente são comuns para a maior parte das atividades
elétrica de um meio ao outro . 3
bioelétricas normais, porém quando desproporcionais
e permanentes podem ter um significado importante4.
Grafoelementos repetidos geram atividades
bioelétricas. As atividades bioelétricas cerebrais
(Figura 4) são reconhecidas por seus padrões.
ATIVIDADE BIOELÉTRICA CEREBRAL
FISIOLÓGICA DA VIGÍLIA
Um adulto deve apresentar necessariamente
pelo menos duas atividades bem definidas em
seu EEG de vigília: a atividade alfa, posterior, e a
atividade beta, anterior. Habitualmente a atividade
alfa é bloqueada de maneira simétrica pela abertura
palpebral (Figura 5), e inicia imediatamente ao
fechamento ocular. Também pode ser alentecida
de maneira simétrica pela hiperventilação (Figura
6) e pode apresentar resposta de seguimento à
fotoestimulação intermitente (Figura 7)4.
2. amplitude (mV);
3. morfologia;
4. distribuição (lobar);
5. irradiação;
6. simetria (inter-hemisférica);
Figura 6: Alentecimento difuso induzido pela
7. sincronia (inter-hemisférica); e hiperventilação voluntária.
Fonte: Os autores, 2021.
8. reatividade (Figura 5).
Capítulo 10 120
nas crianças e nos pré-adolescentes, o EEG tem
maturação paralela àquela da idade cronológica.
levando-se em conta a idade gestacional. Também, entanto, definir uma crise como generalizada
Capítulo 10 121
ou focal nem sempre é possível clinicamente. a ser ressecada em uma cirurgia de epilepsia.
Portanto, a maior parte dos pacientes necessita Vídeo-eletroencefalogramas são, habitualmente,
de investigação complementar adicional. Ademais, realizados utilizando-se eletrodos de superfície,
crises generalizadas como as ausências, quando colados ao escalpo com colódio, mas também
prolongadas, podem assemelhar-se clinicamente podem ser feitos com eletrodos intracranianos,
a uma crise focal disperceptiva (com alteração da através de strips, placas ou de eletrodos profundos
qualidade da percepção, previamente chamadas de introduzidos no parênquima cerebral. A atividade
parciais complexas ou de discognitivas). A presença ictal pode emergir sobre a forma de ondas lentas
de anormalidades focais sejam elas de natureza nas bandas delta ou teta, monomórficas, de caráter
lenta (disfuncional) ou epileptiforme (pontas e recrutante ou não-recrutante, e como complexos
ondas agudas, associadas ou não a ondas lentas) de polipontas, ponta-onda ou poliponta-onda, por
sinalizam para crises focais, manifestação clínica das exemplo, em trens longos e clinicamente associados
epilepsias focais. Já nas epilepsias generalizadas a crises, com duração superior a 10 s5.
amiúde o traçado revela paroxismos generalizados
de complexos poliponta, ponta-onda ou poliponta
onda, com atividade de base normal (geralmente nas EEG NO DIAGNÓSTICO DAS
ENCEFALOPATIAS
genéticas, previamente chamadas de idiopáticas) ou
O traçado eletroencefalográfico nas
alentecida (geralmente nas epilepsias sintomáticas
encefalopatias mostra-se alentecido (Figura 9)
ou secundárias)3.
com relação àquele da vigília, seja sob a forma
É importante lembrar que a sensibilidade de atividade teta e/ou delta generalizada. Alguns
de um primeiro EEG é de apenas 50% para o tipos de encefalopatia apresentam-se com
diagnóstico de epilepsia, e que este percentual padrões eletroencefalográficos específicos, como
aumenta para 80% ao 6o registro6. Também pode-se a encefalopatia hepática, a encefalopatia renal, e
utilizar os diversos métodos de ativação existentes, algumas encefalopatias degenerativas e algumas
seja a hiperventilação (particularmente para as das encefalopatias infecciosas (Quadro 2)1.
crises de ausência), a fotoestimulação (para as
epilepsias fotossensíveis), e a privação de sono, as
quais elevam a sensibilidade diagnóstica do EEG4.
VÍDEO-EEG
O vídeo-eletroencefalograma tem dois
principais objetivos: um deles é o diagnóstico
diferencial entre crises epilépticas e os chamados
eventos não epilépticos, sejam eles distúrbios
do sono, crises não epilépticas psicogênicas
ou outros. Já o segundo, é o da lateralização
e possível localização da zona epileptogênica,
ou seja, da zona correspondente à atividade
detectada pelo eletroencefalograma de escalpo ao
início de um evento ictal típico. Esta informação
é utilizada em conjunto com outros dados de Figura 9 - Alentecimento difuso, com frequência de 5 a 6
Hz.
investigação complementar para indicar a zona
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 10 122
Alfa Beta Teta Gama
Encefalopatias leves a
Agitação, ansiedade Encefalopatias severas
moderadas
Capítulo 10 123
EEG NO DIAGNÓSTICO DAS DEMÊNCIAS MONITORIZAÇÃO
ELETROENCEFALOGRÁFICA NAS UTIS
O eletroencefalograma tem baixo potencial
diagnóstico para as demências em geral, A monitorização eletroencefalográfica nas
excetuando-se naquelas de natureza priônica UTIs pode ser feita para a detecção de estado de
(Figura 10). Já na forma mais comum de demência, mal epiléptico não convulsivo, para a definição de
a doença de Alzheimer, pode ser vista a redução morte encefálica (através de metodologia específica
Capítulo 10 124
8. não deve haver reatividade no EEG a 4. Niedermeyer E, Lopes da Silva F.
estímulos somato-sensitivos, auditivos ou Electroencephalography: basic principles, clinical
applications, and related fields. 5a. Ed Filadélfia: Lippincott
visuais, mesmo intensos; Williams & Wilkins, 2005.
Capítulo 10 125
CAPÍTULO 11
POTENCIAIS EVOCADOS
Capítulo 11 126
serem registrados pelos eletrodos e diferenciados
POTENCIAL EVOCADO
do ruído elétrico de fundo.
Por definição, é o registro de ondas (potenciais)
resultantes (evocadas) da despolarização de O estímulo tem que ser eficiente para a
sistema funcional estimulado de forma controlada. características (tipo, intensidade, duração, etc)
quando se analisa o registro final para considerar
Tipos de Potenciais Evocados se o registro foi adequado. Para seu uso, quer
As três formas mais comuns de potenciais seja clínico ou cirúrgico, se pressupõe o uso de
evocados são o auditivo (PEA), o visual (PEV) e o estímulo supra máximo em intensidade para que
somatossensitivo (PES). Estes apresentam ondas de haja o recrutamento do maior número possível de
morfologias características que permitem que sejam fibras contribuindo com a resposta analisada. O
estudadas rotineiramente. Algumas modalidades mesmo critério de estímulo é utilizado para o PEM
são derivadas destes três tipos de potenciais, como medular (onda D). Entretanto, para o PEM muscular
por exemplo, os potenciais evocados cognitivos a intensidade de estímulo deve ser apenas supra
Capítulo 11 127
de componentes específicos do PE considerado envolvida, é de importância fundamental para a
normal. O exemplo mais claro para se ilustrar esse interpretação correta das ondas registradas quando
conceito é o PEA. são utilizados para diagnóstico clínico, como se
percebe na Figura 1A. No seu uso intraoperatório,
O PEA é o resultado de estimulação intermitente
contudo, o conhecimento deve ser ampliado,
monoaural, mais comumente por cliques, que ativa
acrescentando-se o de neuranatomia cirúrgica,
sequencialmente os diferentes geradores ao longo
das técnicas e manobras operatórias e dos passos
da via auditiva. O padrão de ondas resultante de
cirúrgicos, já que estes acrescentam outros níveis
geradores presentes espacialmente da cóclea,
de complexidade na interpretação dinâmica dos
ponte, mesencéfalo até as áreas associativas está
registros seriados que se sucedem, em tempo real,
ilustrado na Figura 1: Na prática clínica, o PEA é
durante a monitorização neurofisiológica, como se
dividido de acordo com o tempo de aparecimento de
observa nas Figuras 1C e 2C. Outro exemplo, a
suas ondas em PEA de curta, média e longa latência.
Figura 2F mostra registros simultâneos do mesmo
A sequência das primeiras ondas de curta latência
PESS permitindo identificação do sulco central
é também conhecida como potencial evocado
que divide as áreas sensitiva e motora no córtex
de tronco cerebral (PEATC), uma vez que seus
cerebral. Esse conhecimento aplicado também foge
geradores se estendem da cóclea ao mesencéfalo.
ao escopo deste capítulo, mas deve ser estudado8-10.
Em outros PEs, como o PESS, os padrões de ondas
registrados podem se sobrepor ou serem mais ou
Significância clínica
menos exuberantes na contribuição para com a
Inicialmente, acreditou-se que os PEs
morfologia do registro final, como observado na
pudessem expressar linearmente os graus de
Figura 2.
integridade de função do sistema estimulado.
Outro fator que pode influenciar o Contudo, seu uso em diagnóstico clínico mostrou-
reconhecimento e a análise do registro final tem se limitado. Um ponto fundamental para se
relação à montagem dos eletrodos de registro. compreender essa limitação na linearidade entre
Alguns dos eventos elétricos resultantes da ativação os potenciais evocados e a clínica do indivíduo
de estruturas neurológicas podem se propagar testado é lembrar que as funções sensoriais, bem
pelo corpo. O seu registro pode ser obtido a partir como as motoras, são o resultado de fenômenos
de pontos não necessariamente dentro do sistema de alta complexidade. Essa complexidade advém
nervoso, como por exemplo, na superfície da pele. da integralidade de ativação de diferentes vias
Fenômeno semelhante ao que ocorre em registro de participantes de um sistema e as circunstâncias
componentes do eletrocardiograma. As montagens no momento da sua ativação. A expressão clínica
de eletrodos padronizadas em neurofisiologia levam funcional é a expressão de processos em diversos
em conta essas características dos geradores e dos níveis no espaço-tempo de um sistema biológico. Já
campos eletromagnéticos gerados, utilizando-se de o potencial evocado é o registro da resposta elétrica
eletrodo de registro mais próximo ao gerador para de apenas uma parte do sistema neurofuncional
alguns registros (por exemplo, componente cortical naquele momento da estimulação, artificial e
do PESS ou em pontos independentes da distância controlada. Essa resposta e seu registro dependem
do gerador para outras (por exemplo, componentes da interação de múltiplos fatores no momento em
subcorticais do PESS e as ondas do PEA), como se que são gerados: a(s) montagem(s) de eletrodos de
observa na Figura 1 e 2B. registro; as características do estímulo, como, por
Conhecer as vias e as estruturas responsáveis exemplo, sua eficiência, tipo, intensidade, duração
pela geração dos diferentes tipos de PE e seus e frequência; o aporte de fibras disponíveis e
subcomponentes, bem como a neurofisiologia recrutadas, bem como a capacidade de condução
Capítulo 11 128
Figura 1 – Potencial evocado auditivo (PEA): Em A, observa-se a sequência de ondas geradas pela estimulação
intermitente monoaural (cliques) dos diferentes geradores, espacialmente em série, ao longo da via auditiva. Em
B, observa-se um segmento de registro de ondas de curta latência, o PEA de tronco cerebral (PEA-TC) usado em
audiometria e em registros intraoperatório para monitorização neurofisiológica. Em C, a cascata de registros ao longo do
tempo cirúrgico evidencia a perda de definição das ondas II e III (setas amarelas) e o aumento de latência da onda V a
partir do registro de 10:28:10 (horários na coluna da esquerda). As setas azul, no registro inicial em verde, e vermelha,
no registro final em vermelho, apontam para a onda V do PEA-TC.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 2 – Potencial evocado somatossensitivo (PESS) de nervo mediano esquerdo em punho em diferentes equipamentos:
Em A, a representação esquemática do ponto de registro C4’, do sistema internacional 10-20 de EEG, e fotografia de estria
de eletrodos para registros intraoperatórios colocada sobre o córtex cerebral. Ambas as setas vermelhas de A apontam
para respectivos registros. Em B, o mesmo PESS é visto em registros simultaneos, a partir de diferentes montagens: C4’-
Fz eletrodo ativo em escalpo, #5-Fz ativo em estria cortical e C5’-Fz ativo em região cervical. Observe a amplitude muito
maior do registro cortical (70uV) em comparação com o do escalpo (7uV). Em C, D, e E registros intraoperatórios durante
monitoração de cirurgia para clipagem de aneurisma mostram a perda de alguns componentes da onda e de amplitude
em registros subsequentes de PESS. A alteração é coincidente com o periodo de supressão cortical no EEG induzida por
manipulação anestésica durante parte crítica da cirurgia (em realce no retângulo vermelho). No detalhe, em D, os registros
são ampliados para se melhor observar a redução da amplitude dos componentes N20 e N30 e a mudança de morfologia
com perda do pico negativo (setas vermelhas vazadas) entre P25-N30. Em F, observa-se série de registros simultâneos
realizados com eletrodos no escalpo (C4’-Fz, em verde, ao topo) e com estria de eletrodos cortical cerebral (em vermelho). As
setas vermelhas apontam para a reversão de fase N20, no registro #4-Fz, para P20, no #5-Fz, indicando a transição funcional
cortical cerebral das áreas pós-central (#1 a #4) para pré-central (#5 e #6).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 11 129
da via no momento do estímulo. Estes dois últimos PR), presença de patologias oculares (por exemplo,
(aporte e neurocondução) dependem do estado catarata ou glaucoma) e outros impedimentos à
físico da via bem como da base biológica no chegada apropriada do estímulo ao nervo óptico e
momento da estimulação. A presença de alterações sua condução pela via.
ao longo da via, tanto as físicas e mecânicas
Uma vez atingidos os níveis técnicos ótimos
como as biológicas podem ter impacto funcional.
para o registro, as respostas evocadas coletadas
O estado físico se refere à integridade axonal e de
não indicam se a visão do sujeito testado está
mielinização. A base biológica é a que possibilita a
presente, se é percebida em todos os quadrantes
neurocondução e denota principalmente o ambiente
e com que qualidade e acuidade. Essa dissociação
metabólico. Este dependente da perfusão sanguínea
existe porque a expressão clínica da função visão
e do aporte eletrolítico e energético. Alterações
não é simplesmente a resultante da ativação das
como as decorrentes, por exemplo, de fenômenos
vias óculo-occipito-corticais (origem do potencial
inflamatórios têm papel primário (por exemplo,
evocado visual), mas sua ativação interconectada
metabólico, como é visto no trauma agudo), bem
com múltiplas vias integradas (por exemplo, a
como secundário (quando causa edema e/ou se
via ventral – “o que é visto” – e a via dorsal –
resolve deixando tecido cicatricial). Estiramentos ou
“quando e como é visto”) e a cognição final desse
compressões nervosas podem ocorrer decorrentes
processamento11. Isso posto, o PEV pode ser um bom
de um processo agudo (edema cerebral peri-tumoral
indicador para se avaliar a integridade do segmento
afetando a cápsula interna) ou concomitantemente
inicial da via responsável pela visão. Sua aplicação
(exemplo, uma luxação de nervo ulnar no cotovelo
em oftalmologia e neurologia para se diagnosticar
em um paciente com multineuropatia diabética).
neurite óptica é bem indicada e um bom exemplo
Fenômenos relacionados à inflamação podem
de seu uso coadjuvante clínico12,13. Já seu uso em
tanto desencadear como potencializar os efeitos ao
monitorização intracirúrgica é limitado pela sua falta
sistema nervoso de trauma mecânico e determinar
de correlação linear com a visão.
bloqueio funcional de neurocondução.
Uma vez entendidos os graus de alcance e
O potencial evocado visual (PEV) talvez seja
de limitação (do valor) dos registros, os potenciais
o melhor exemplo para se ilustrar esses conceitos: o
evocados passaram a ter aplicações hoje
PEV é uma sequência de ondas mais bem registrada
consagradas baseados em sua especificidade
por montagens sobre a região occipital. É evocado
e sensibilidade, tanto para diagnóstico e
por estimulação visual ou com um padrão reverso
acompanhamento em cenários clínicos, bem como
(PR, tipo tabuleiro de xadrez) apresentado ao
coadjuvante cirúrgico. Seu uso hoje é maior em
indivíduo testado em um monitor de vídeo, ou através
neuroftalmologia, audiologia, neuropsicologia e no
de flashes repetidos de luz aplicados com óculos
monitoramento intraoperatório.
específicos para esse fim. A qualidade das respostas
registradas depende do tipo de estímulo (PR ou O uso dos PEs para diagnóstico clínico tem
flash), do ângulo, da intensidade (luminosidade), e sido progressivamente abandonado, tanto pela sua
da cor da fonte de luz, da frequência de aplicação limitada aplicabilidade como pelo fato de que os
do estímulo, bem como da presença de artefatos métodos de imagem e laboratoriais têm se mostrado
e ruídos de linha de fundo que possam contaminar mais específicos e informativos. Por outro lado, o
(e confundir) a interpretação dos registros. Mesmo seu uso intraoperatório para a monitoramento de
que as dificuldades técnicas primárias sejam cirurgias que colocam o sistema nervoso em risco
controladas em uma rotina adequada, ainda há tem sido crescente e tido mais aceitação nos últimos
tais como a acuidade visual, nível de atenção (ao neurofisiológicas intraoperatórias (TNFIO), como os
Capítulo 11 130
registros de EEG e EcoG, eletromiografia (EMG) e inoperáveis em centros menores passaram a ter
métodos de estudo de neurocondução, ampliando abordagens terapêuticas novas nos centros onde as
o arsenal neurofisiológico disponível 3,8,14
. O seu TNFIO são presentes8-10,15.
uso apropriado pode proporcionar diminuição da
Apesar da falta de linearidade dos registros
morbidade intraoperatória, melhoria dos resultados
com o grau de função clínica (como discutido
cirúrgicos e ampliação do espectro de lesões
anteriormente), os PEs podem mostrar boa
passíveis de tratamento. Além disso, o emprego das
correlação com o quadro clínico neurológico
TNFIO pelo cirurgião, bem como da monitorização
pré e pós-operatório, quando se acompanha
neurofisiológica intraoperatória (MNIO) realizada
sua estabilidade e se analisa os padrões e grau
pelo neurofisiologista, tem contribuído no
de flutuação de eventuais alterações durante
aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas e no
sua monitoração intraoperatória. A presença de
refinamento do prognóstico13-16 por permitir que
um registro de PE dentro de parâmetros pré-
decisões mais adequadas para a preservação
estabelecidos representa a “permeabilidade” da
funcional sejam tomadas ainda no transcurso da
via estudada e a sua capacidade para levar a cabo
cirurgia.
a função tal qual documentada no momento de
O cirurgião é o ator principal no ato operatório início do procedimento cirúrgico. Sua manutenção
e demanda dele a aplicabilidade construtiva no transcorrer intraoperatório indica que a via não
da informação neurofisiológica trazida pelas sofreu alterações significantes. Quando alterada,
TNFIO. Apesar da formação dos cirurgiões ser dentro de limites pré-estabelecidos e apesar de
fundamentalmente anatômica e privilegiar os não se conseguir determinar o quanto da função
métodos de imagem, são atualmente os profissionais está preservada, permite afirmar que há ainda certo
que mais se utilizam dos PEs ao se depararem com grau estrutural do sistema que permite que aquela
desafios concretos a serem vencidos no centro função seja expressa. O melhor exemplo talvez seja
cirúrgico quanto à preservação neurofuncional. a persistência de potenciais motores (dentro de
O aperfeiçoamento das ferramentas de imagens parâmetros aceitáveis) ao final de uma ressecção
funcionais, dos recursos de imagem disponíveis na de um tumor adjacente à área motora, ou outro
sala cirúrgica (angiografia, fluoroscopia, tomografia intramedular.
e ressonância magnética intracirúrgicas) e da
A presença dos PEMs indica que o trato
neuronavegação ainda não são suficientes para
corticoespinhal (base dos PEMs) está conduzindo,
suprir o cirurgião com informações em tempo real,
e, portanto, capaz de sustentar movimentação
sobre a preservação funcional dos diversos sistemas
voluntária. Contudo, é impossível somente com base
neurológicos durante as abordagens e ressecções
na sua presença, indicar o grau de força, resistência,
cirúrgicas. Muitas das técnicas neurofisiológicas foram
tono muscular durante atos voluntários, ou outros
incorporadas à técnica cirúrgica e automatizadas
qualificativos da função motora, já que estes
para uso intermitente, em várias etapas da cirurgia,
dependem de vias paralelas ao trato corticoespinhal
para fornecer atualizações constantes e dinâmicas,
e que não são avaliadas pelos PEMs. O paciente
por exemplo, o mapeamento de estruturas no
que acorda plégico de uma cirurgia onde os PEMs
campo cirúrgico, na identificação de nervos, de
estavam presentes (embora alterados) ao final
vias, ou de atividade cortical cerebral8,17-19. Novos
do procedimento, excluídos erros técnicos, tem
desafios e avanços passaram a ser apresentados
um indicador de preservação da sua capacidade
pelos cirurgiões aos neurofisiologistas à medida
de movimento e um prognóstico favorável à sua
que as opções de tratamento cirúrgico para lesões
reabilitação. Se há perda dos PEMs, sua chance de
que comprometem o sistema nervoso aumentaram
recuperação é incerta. Essa correlação, ainda que
com o refinamento do diagnóstico. Muitas lesões
Capítulo 11 131
possa parecer grosseira, permite que o cirurgião está reduzida (talvez, ainda mais) pelos efeitos
mude sua estratégia ou interrompa um procedimento fisiológicos das drogas utilizadas na anestesia.
de acordo com os primeiros sinais de alteração
Apesar disso, os registros basais não têm valor
dos PEs, visando um resultado funcional mais
diagnóstico absoluto e não devem ser utilizados
favorável. Quando a perda é súbita e inevitável,
para tanto, mas apenas como referência para se
agora em seu papel documental, os PEs permitem
determinar a monitorabilidade (e o seu grau) da via
um aprimoramento técnico para futuros pacientes,
testada e para parâmetro de eventuais alterações
permitindo entender o momento da ocorrência de
no decorrer da cirurgia. A avaliação neurofisiológica
uma lesão.
diagnóstica prévia à cirurgia, embora não seja
O entendimento de que as funções fundamental para a MNFIO, pode auxiliar no uso de
neurológicas são como uma sinfonia orquestrada algumas das metodologias e em questões médico-
por vários componentes de um sistema através legais como item documental pré-operatório de
do aporte de diferentes grupos de vias e fibras déficits existentes20-24.
contribuintes, em diferentes tempos, permite
O respaldo por estudos imparciais,
considerar as nuances de variações de respostas
multicêntricos randomizados para o uso dos PEs
de PEs e das expressões clínicas dentro de um
em ambiente cirúrgico, e mesmo dos protocolos
conceito de reserva neurológica. Nem toda a
complexos de MNIO, todavia são escassos.
totalidade de fibras e vias de um sistema funcional
Isso pode deixar o clínico e o cirurgião receosos.
participam o tempo todo na geração de um PE e nem
Principalmente quando o método é alvo de ataques
na expressão clínica de uma função qualquer. Os
por profissionais que tiveram maus resultados ou de
seus recrutamentos são intermitentes e alternantes.
fontes pagadoras que visam minimizar o gasto com
Quanto mais disponíveis para serem ativadas, mais
procedimentos complexos. A escassez daqueles
íntegra será a expressão clínica e mais próximos do
estudos se deve a vários motivos, mas principalmente
normal serão os PEs. Dessa forma, funções clínicas
por questões ético-legais na restrição à oferta de
podem estar aparentemente normais até que sejam
procedimentos (duplo-cego) que são aceitos como
testadas adequadamente e, só então, alterações não
trazendo benefícios.
mencionadas ou mesmo percebidas pelo paciente
podem ser identificadas. Outras vezes, o sistema Até há cerca de uma década, o número de
está em seu limite, ainda capaz de uma expressão publicações sobre o uso de NFIO era muito restrito.
clínica normal, mas com a progressão da patologia Nos últimos anos, observou-se um crescimento
(estresse) perderá essa capacidade (alterações Contudo, deve-se refletir sobre o critério de frequência
subclínicas). Não raramente, essas alterações são com que as técnicas e resultados são publicados.
detectadas nos registros basais iniciais de referência A análise da genealogia das publicações pode
no momento anterior à incisão cirúrgica: retardos mostrar que elas convergem para poucos Centros
de latências de respostas motoras, sensitivas ou ou grupos de estudiosos. Isso pode ter um efeito
sensitivas ou do limiar de excitabilidade aumentado que passam a ser aceitos pela repetição e não
(para o registro de respostas) para um ou vários dos por efetividade metodológica ou, ainda mesmo,
diversos potenciais evocados, quando se comparam totalmente corretos. Esse fato, na verdade, tem
às respostas entre os dois lados do corpo ou com o efeito paradoxal limitante na expansão e resolução
padrão para diagnóstico clínico. Isso pode acontecer de questões técnicas e questionamentos saudáveis
apesar de não existirem alterações clinicamente que possam trazer a ampliação da aquisição do
aparentes, por que a “reserva neurológica funcional” conhecimento e à percepção limitante do uso dos
Capítulo 11 132
PEs. Daí a necessidade do cirurgião aprofundar pode parecer que a falha é do método.
seu conhecimento em neurofisiologia colocando
O cirurgião tem que entender precisamente
teorias e metodologias em prática e à prova. O
quais informações pode obter e quando as
cirurgião e o neurofisiologista devem guiar um ao
solicitar bem como compreender de forma
outro para esse exercício. Os resultados devem ser
precisa as alterações dos registros que lhe são
discutidos, buscando correlacioná-los com os pós-
comunicadas pelo neurofisiologista8,24-26 para
operatórios, fortalecendo o senso crítico da equipe,
que medidas pertinentes sejam tomadas. Para
cooperando com o progresso da especialidade e o
tanto, há a necessidade imperiosa de que tanto
maior alcance dos PEs na neuromonitorização. Essa
o neurofisiologista quanto o cirurgião tenham
dinâmica proporciona maior segurança do paciente
treinamento e desenvolvam experiência no uso das
e melhores resultados cirúrgicos.
TNFIO. A não observância dessa condição está por
trás da maioria dos chamados “maus resultados”.
Critérios de análise e correlações
A parte mais importante na análise do registro Uma vez que a NFIO influencia especificamente
de um padrão de ondas de um PE é o reconhecimento o índice de morbidade neurológica intracirúrgica e o
de sua morfologia, a qual é característica em cada pós-operatório, pode haver uma falsa sensação de
uma das modalidades e sua reprodutibilidade em segurança e, paradoxalmente, aumentar o índice
registros sequenciais. Só a partir do reconhecimento de morbidade quando mal empregada. Assim, o
morfológico das ondas registradas e sua emprego inadequado de PEs e as demais técnicas
reprodutibilidade é que determinamos que aquele neurofisiológicas na monitoração intraoperatória
registro não é um artefato ou ruído de fundo e podem ser tão ou mais prejudiciais que a ausência
podemos iniciar a análise da onda propriamente do seu uso.
dita. A análise principal rotineira é feita em base das De maneira geral, o baixo índice de morbidade
latências dos picos e vales (deflexões negativas intraoperatória está diretamente ligado à patologia
e positivas) das ondas e sua amplitude de pico a de base, à competência da equipe cirúrgica na
pico. Como discutido anteriormente, vários fatores curva de aprendizado-experiência e à técnica
devem ser observados durante a análise, tais como (abordagem) operatória escolhida. A informação
aqueles inerentes às técnicas de estimulação funcional fornecida pelas TNFIO não diminui os
e registro utilizadas, qualidade dos registros, riscos intrínsecos de um procedimento cirúrgico, mas
patologias existentes, desvios da homeostase, definitivamente contribui para a maior segurança
outras alterações dinâmicas (por exemplo, atenção deste e para a limitação de prejuízos funcionais
no monitor de PEV, posicionamento do membro em inevitáveis quando apropriadamente empregada
PESS de nervo ulnar, etc.), nível de relaxamento ao longo da cirurgia. Esses dois conceitos, risco
e consciência, entre outros. Esse grau de e segurança, devem ser claros para a equipe
complexidade que se sobrepõe ao reconhecimento cirúrgica e para o paciente quando apresentado à
básico do padrão de ondas do PE se reflete no seu possibilidade desses recursos neurofisiológicos.
uso adequado, tanto clínico como intraoperatório.
Sempre que se observam maus resultados
Não é de se estranhar que seu uso clínico "popular"
cirúrgicos relacionados à via monitorada, o
seja extremamente limitado e advogado mais por
neurofisiologista deve proceder a uma revisão
neurofisiologistas experientes. O mesmo observa-se
crítica do procedimento para a devida adequação
no seu uso intraoperatório. Quando o monitorizador
dos protocolos utilizados, promover ações corretivas
(médico, especializado ou não, ou “técnico”) falha na
plausíveis, e/ou a educação continuada da equipe
realização do registro pertinente ao tempo cirúrgico
quanto aos limites das técnicas empregadas27-29,
e/ou com sua análise objetiva, acurada e dinâmica,
através de discussão com a equipe cirúrgica
Capítulo 11 133
(cirurgião e anestesista) para melhoria contínua da
CONCLUSÃO
segurança do paciente e resultados cirúrgicos.
Muito tempo e conhecimento foram
Qualquer metodologia propedêutica que necessários para vermos os potenciais evocados
demande alta complexidade em sua execução e como ferramenta adjuvante útil, tanto no diagnóstico
análise está fadada a ter seu uso limitado até que clínico como no tratamento cirúrgico de patologias
o conhecimento tenha sido democratizado e o que comprometem o sistema nervoso.
treinamento técnico de excelência se torne a norma.
Decorreram séculos, desde que Galvani
Vemos isso acontecer com testes laboratoriais e
descreveu a “eletricidade animal”32,33 e mais de
de imagem, com procedimentos endoscópicos e
um século desde as observações de Caton34
endovasculares. O uso relativamente restrito dos PEs
sobre alterações elétricas no cérebro de animais
e sua credibilidade colocada em questão por falta de
decorrentes de estimulação sensorial e atividade
conhecimento sobre o método e a consequente baixa
motora. Quase 100 anos após o primeiro EEG por
demanda contribuem para um ciclo vicioso de baixos
Berger35 e quase 70 anos após Penfield36 publicar
investimentos, tanto financeiros e tecnológicos para
seus trabalhos em estimulação cortical e todos
o aprimoramento de equipamentos e insumos, como
os estudos de padrões de ondas cerebrais foram
humanos em formação adequada de profissionais
necessários para nos conduzir até as metodologias de
aptos ao uso ótimo dessas metodologias funcionais.
estudo neurofisiológico de PEs. Essas metodologias
No Brasil, os baixos valores de remuneração para o registro de PEs variam com as modalidades
associados a limitações na regulamentação na área de estimulação e via neurológica estudada, em
de atuação médica permitem que os PEs e a MNIO testes para estudo diagnóstico, de investigação e de
sejam oferecidos por profissionais sem formação seguimento, em protocolos clínicos e cirúrgicos.
verificável, ou “independente”, ou por autodidatas,
Embora os testes neurofisiológicos e o
ou com períodos variáveis subótimos de estágios
embasamento teórico sejam os mesmos, as técnicas
de observação de profissionais em serviços
e normatizações são distintas nos vários cenários
terceiros. Com o passar do tempo, o examinador
e ambientes. O conhecimento neuroanatômico e a
e/ou o monitorizador de formação independente
familiarização com técnicas e abordagens cirúrgicas
podem ter adquirido uma percepção simplificada
são de extrema importância para o uso adequado
da metodologia e se tornar bastante confiante, sem
das ferramentas neurofisiológicas, incluindo-se os
estar consciente de erros ou percalços, tanto técnicos
PEs, em ambiente cirúrgico.
como de aplicação clínica. São exatamente essas
circunstâncias que acarretam vícios e conceitos O profissional envolvido com o uso de PEs para
equivocados, levando a resultados desfavoráveis, à a neuromonitoração necessita mais que expertise
aparente dissociação dos registros com a clínica e à clínica. Deve se dedicar à NFIO de forma integral,
percepção ou sentimento, tanto pelo clínico, no uso desenvolver a agilidade e dinamismo requeridos
diagnóstico, como pelo cirurgião, no uso da MNIO nas áreas cirúrgicas em foco e aguçar o senso de
de que as metodologias são muito limitadas ou não pesquisa para melhor se adaptar às necessidades
confiáveis. Contudo, a carência de profissionais bem da área.
capacitados não deve ser fator limitante, mas sim,
Como acontece com qualquer técnica de
fonte de estímulos para que se invista na formação
escopo circunscrito, sempre há certa lentidão na
e na construção de experiência8,30,31.
disseminação, e apreensão na implementação e no
uso dos PEs. Novos empregos de não-tão-novas
metodologias aparecem com a sofisticação tecnológica
e a democratização do conhecimento fundamental.
Capítulo 11 134
Esse processo requer ajustes, adaptação através 5- Kraft GH, Aminoff MJ, Baran EM, Litchy WJ, Stolov WC.
Somatosensory evoked potentials: clinical uses. AAEM
da experiência e o despertar do interesse tanto nas
Somatosensory Evoked Potentials Subcommittee. American
áreas clínica como cirúrgica. Em especial no uso Association of Electrodiagnostic Medicine. Muscle Nerve.
1998;21(2):252-258.
de PEs em protocolos intraoperatórios, o relativo
pequeno esforço que se requer para sua utilização 6- Butcher G. Tour of the Electromagnetic Spectrum,
National Aeronautics and Space Administration, U.S.
adequada, assim como de todas outras ferramentas National Aeronautics and Space Administration. 2011.
neurofisiológicas existentes, é compensado, em 7- MacDonald DB, Skinner S, Shils J, Yingling C.
muito, pela segurança disponibilizada ao paciente Intraoperative motor evoked potential monitoring-A position
statement by the American Society of Neurophysiological
e ao cirurgião, particularmente nos momentos de Monitoring. Clinical Neurophys 2013;124(12):2291-2316.
tomada de decisões durante a cirurgia. 8- Bueno de Camargo A. Monitorização Neurofisiológica
Intraoperatória. In: Pinto LC (ed). Neurofisiologia Clínica
A nossa experiência coincide com o que -Princípios Básicos e Aplicações. 2ª edição. São Paulo:
outros centros têm mostrado: o uso clínico dos Editora Atheneu.
PEs tem indicações bastante específicas e 9- Nuwer M. Intraoperative Monitoring of Neural Function:
Handbook of Clinical Neurophysiology. Elsevier; 2008.
permitem seguimento clínico-funcional. Seu uso
intraoperatório é considerado indispensável para 10- Simon MV. Intraoperative neurophysiology a
comprehensive guide to monitoring and mapping. 2nd ed.
muitos procedimentos uma vez que a equipe cirúrgica USA: Demos Medical Publishing-Springer; 2019.
(cirurgião, anestesista e neurofisiologista) domine o 11- Creel DJ. Visually evoked potentials. Handb Clin Neurol.
uso das metodologias e sinta-se mais confortável com 2019;160:501-522.
as ferramentas neurofisiológicas, compartilhando os 12- Gronseth GS, Ashman EJ. Practice parameter: the
usefulness of evoked potentials in identifying clinically silent
avanços atingidos em Neurocirurgia, Neurofisiologia lesions in patients with suspected multiple sclerosis (an
e Anestesia. A adequada utilização dos potenciais evidence-based review): Report of the Quality Standards
Subcommittee of the American Academy of Neurology.
evocados na neurofisiologia intraoperatória constitui
Neurology. 2000;54(9):1720-1725.
um avanço valioso dentro das diretrizes da medicina
13- Polman CH, Reingold SC, Banwell B, et al. Diagnostic
possibilitando procedimentos minimamente criteria for multiple sclerosis: 2010 revisions to the
invasivos e maximamente monitorados. Seu McDonald criteria. Ann Neurol. 2011;69(2):292-302.
emprego é importante na redução da morbidade 14- Hussain AM. A practical approach to neurophysiologic
intraoperative monitoring, 2nd ed. New York: Demos
intracirúrgica e aumento da eficiência terapêutica e Medical Publishing; 2015.
maior segurança do paciente. 15- Deletis V, Bueno De Camargo A. Interventional
neurophysiological mapping during spinal cord procedures.
Stereotact Funct Neurosurg. 2001;77(1-4):25-8.
16- Deletis V, Shils J. Neurophysiology in Neurosurgery –
REFERÊNCIAS a modern intraoperative approach. New York: Academic
1- Olejniczak P. Neurophysiologic basis of EEG. J Clin Press; 2002.
Neurophysiol. 2006;23(3):186-189.
17- Szelényi A, Bueno de Camargo A, Flamm E, Deletis
2- Helfrich RF, Knight RT. Cognitive neurophysiology: Event- V. Neurophysiological criteria for intraoperative prediction
related potentials. In: Levin KH, Chauvel P, eds. Handbook of pure motor hemiplegia during aneurysm surgery. Case
of Clinical Neurology,vol. 160 3rd edition. Amsterdã; 2019. report. J Neurosurg. 2003;99(3):575-578.
p. 543-558.
18- Tian NF, Huang QS, Zhou P, et al. Pedicle screw
3- Guérit JM, Amantini A, Amodio P, et al. Consensus on insertion accuracy with different assisted methods: a
the use of neurophysiological tests in the intensive care systematic review and meta-analysis of comparative
unit (ICU): electroencephalogram (EEG), evoked potentials studies. Eur Spine J. 2011;20(6):846-859.
(EP), and electroneuromyography (ENMG). Neurophysiol
19- Szelényi A, Kothbauer K, de Camargo AB, Langer D,
Clin. 2009;39(2):71-83.
Flamm ES, Deletis V. Motor evoked potential monitoring
4- Nuwer MR. Fundamentals of evoked potentials and during cerebral aneurysm surgery: technical aspects and
common clinical applications today. Electroencephalogr Clin comparison of transcranial and direct cortical stimulation.
Neurophysiol. 1998;106(2):142-148. Neurosurgery. 2005;57(4):331-338.
Capítulo 11 135
20- Pisanu A, Porceddu G, Podda M, Cois A, Uccheddu A. 28- Journée HL, Shils J, Bueno de Camargo A, Novak K,
Systematic review with meta-analysis of studies comparing Deletis V. Failure of Digitimer’s D-185 transcranial stimulator
intraoperative neuromonitoring of recurrent laryngeal nerves to deliver declared stimulus parameters. Clin Neurophysiol.
versus visualization alone during thyroidectomy. J Surg Res. 2003;114(12):2497-2498.
2014;188(1):152-161.
29- Szelényi A, Kothbauer K, de Camargo AB, Langer D,
21- Sand T, Kvaløy MB, Wader T, Hovdal H. Evoked Flamm ES, Deletis V. Motor evoked potential monitoring
potential tests in clinical diagnosis. Tidsskr Nor Laegeforen. during cerebral aneurysm surgery: technical aspects and
2013;133(9):960-965. comparison of transcranial and direct cortical stimulation.
Neurosurgery. 2005;57(4):331-338.
22- Sawamura Y, de Tribolet N. Can we cure gliomas?
Limitations of treatment including surgery. In: Crockard A, 30- Sala F, Palandri G, Basso E, et al. Motor evoked
Hayward R, Hoff TJ (eds). Neurosurgery: the scientific basis potential monitoring improves outcome after surgery for
of clinical practice, 3rd ed. Blackwell Science; 2000. p. 621. intramedullary spinal cord tumors: a historical control study.
Neurosurgery. 2006;58(6):1129-1143.
23- Kimura J. Facts, fallacies, and fancies of nerve
conduction studies: twenty-first annual Edward H. Lambert 31- Skinner S, Holdefer R, McAuliffe JJ, Sala F. Medical
Lecture. Muscle Nerve. 1997;20(7):777-87. Error Avoidance in Intraoperative Neurophysiological
Monitoring: The Communication Imperative. J Clin
24- Tankisi H, Pugdahl K, Fuglsang-Frederiksen A, et al.
Neurophysiol. 2017;34(6):477-483.
Pathophysiology inferred from electrodiagnostic nerve
tests and classification of polyneuropathies. Suggested 32- Piccolino M. Luigi Galvani’s path to animal electricity. C
guidelines. Clin Neurophysiol. 2005l;116(7):1571-1580. R Biol. 2006;329(5-6):303-318.
25- May DM, Jones SJ, Crockard HA. Somatosensory 33- Finger S, Piccolino M, Stahnisch FW. Alexander
evoked potential monitoring in cervical surgery: identification von Humboldt: galvanism, animal electricity, and self-
of pre- and intraoperative risk factors associated with experimentation part 1: formative years, naturphilosophie,
neurological deterioration. J Neurosurg. 1996;85(4):566- and galvanism. J Hist Neurosci. 2013;22(3):225-260.
573.
34- Spillane JD. A memorable decade in the history of
26- Novak K, Widhalm G, de Camargo AB, et al. The value neurology 1874-84--II. Br Med J. 1974;4(5947):757-759.
of intraoperative motor evoked potential monitoring during
35- Walter WG. Critical Review: The Technique And
surgical intervention for thoracic idiopathic spinal cord
Application Of Electro-Encephalography. J Neurol
herniation. J Neurosurg Spine. 2012;16(2):114-126.
Psychiatry. 1938;1(4):359-385.
27- Szelényi A, Bueno de Camargo A, Deletis V.
36- Penfield W, Erickson T, Tarlov I. Relation of intracranial
Neurophysiological evaluation of the corticospinal tract by
tumors and symptomatic epilepsy. Arch Neurol Psychiatry.
D-wave recordings in young children. Childs Nerv Syst.
1940;44:300–315.
2003;19(1):30-34.
Capítulo 11 136
CAPÍTULO 12
LINGUAGEM – DISTÚRBIOS DA FALA
Afasia é a perda da habilidade de produzir e/ou Os estudos confirmaram que a afasia de condução
entender a linguagem . 2
de Wernicke poderia ocorrer em lesões restritas aos
Paul Broca descreveu, em 1861, um paciente tratos de substância branca. Por outro lado, as afasias de
com perda da fala e com uma lesão no giro frontal condução formam grupos heterogêneos de sintomas de
inferior esquerdo. Carl Wernicke relatou, em 1874, uma acordo com o segmento afetado do fascículo arqueado,
área localizada no giro temporal superior relacionada ao contrário do que afirmava Wernicke4.
Wernicke postulou a existência de uma via individual na localização das principais áreas de
conectando essas duas áreas, cuja lesão causaria linguagem, sendo impossível de se prever a localização
linguagem e fala fluente, porém incapacitando de se repetir Além disso, outras regiões como o cerebelo, tálamo
o que foi escutado naquele mesmo momento. Burdach já e núcleos da base parecem desempenhar um papel na
havia descrito uma via que conectava o lobo frontal inferior elaboração da linguagem. A estimulação talâmica pode
com o lobo temporal superior, sendo posteriormente produzir anomia, erros de repetição e alteração da
confirmada e denominada por Dejerine de fascículo memória verbal. O papel dos núcleos da base parece
arqueado de Burdach. O Fascículo arqueado conectaria estar ligado ao planejamento do momento liberação das
as atividades das áreas de Wernicke (receptora) e Broca palavras dentro de um discurso6.
(efetuadora) permitindo a compreensão, o processamento
e a expressão linguística4.
ANATOMIA
Posteriormente Geschwind teorizou um modelo de
O modelo clássico de organização anatômica da
linguagem com maior ênfase às conexões do giro angular,
linguagem se dá por uma rede localizada no entorno da
modelo conhecido como Wernicke-Geschwind3-5.
fissura silviana no hemisfério dominante, mais comumente
O avanço das técnicas de neuroimagem com as o esquerdo (Figura 1A).
tractografias por diffusion tensor imaging (DTI) permitiu o
Os centros da linguagem clássicos são as áreas de
estudo detalhado dos fascículos e fibras de associação.
Wernicke e Broca.
Foi possível descobrir que o fascículo arqueado é mais
Capítulo 12 137
A área de Broca está localizada no giro frontal
inferior, no hemisfério dominante, nas pars triangular
e opercular, correspondendo à área 44 e parte da
área 45 de Broadmann7. Ela está relacionada aos
aspectos motores da linguagem, sendo a via de
saída dos comandos da linguagem. Entretanto,
estudos recentes de tractografia mostram que o
território de Broca pode abranger uma área mais
extensa incluindo parte posterior do giro frontal
médio e do giro pré-central (Figura 1B)3.
Capítulo 12 138
Além do fascículo arqueado, uma intricada anterior médio e está envolvido no reconhecimento
rede conecta os centros sensitivos e motores da da fala e na representação léxica (palavras). Essa
linguagem, com fibras atravessando a cápsula via parece ocorrer bilateralmente nos hemisférios
extrema da ínsula. O lobo da ínsula participa cerebrais (Figura 1D).
também da articulação normal da linguagem. Fibras
O fluxo dorsal parece transmitir informações a
operculares que conectam o território de Broca
respeito da integração motora-sensorial mapeando
com o córtex rolândico também desempenham um
a informação fonológica (sons) em representações
importante papel na coordenação da musculatura da
motoras articulatórias e se direciona ao lobo frontal
língua, lábios, laringe e faringe4.
posterior e regiões temporoparietais peri-silvianas
Catani et al. sugeriram que o fascículo aparentemente do hemisfério dominante. Duas
arqueado apresenta uma via direta e uma indireta. atividades principais parecem estar relacionadas ao
A via direta estaria localizada mais medialmente fluxo dorsal, uma usada para manter as habilidades
e corresponde à descrição clássica do fascículo fonéticas básicas e uma segunda que permite o
arqueado ligando as áreas de Wernicke e Broca. A aprendizado de novos vocabulários.
via indireta seria composta por segmento anterior
Duffau et al. propuseram que os processos
e um posterior correndo lateralmente à via direta.
fonológicos e semânticos ocorreriam em paralelo,
O segmento anterior liga o território de Broca ao
através dos fluxos dorsal e ventral respectivamente,
lobo parietal inferior (território de Geschwind) e o
similar ao proposto por Hickok-Poeppel6.
segmento posterior liga o território de Geschwind
ao território de Wernicke. O território de Geschwind As principais vias que conectam o fluxo dorsal
é uma área de integração e convergência das são o fascículo longitudinal superior (FLS) e o
Capítulo 12 139
lobo temporal. Fibras dos fascículos longitudinal palavras. A leitura de palavras e textos podem
médio e inferior também parecem participar deste evidenciar a cegueira pura para palavras.
processamento . 6
A repetição de palavras, frases e sentenças é
um teste simples, mas importante na avaliação da
linguagem. Deve-se começar pedindo para repetir
AVALIAÇÃO DO PACIENTE
frases simples e gradativamente ir aumentando
Na pesquisa dos distúrbios de linguagem a complexidade. A repetição costuma estar
é importante obter informações sobre o nível de prejudicada nas afasias de Broca, Wernicke, global
escolaridade, se o paciente é destro ou canhoto e e de condução. A repetição pode estar preservada
em quais línguas ele é fluente. nas afasias transcorticais1,2.
A investigação sobre outros distúrbios
corticais envolvendo funções como motricidade,
visão ou distúrbios de sensibilidade pode fornecer FORMAS CLÍNICAS DE AFASIAS
informações sobre a natureza do distúrbio de Inicialmente é importante a diferenciação das
linguagem. afasias com as disartrias.
A avaliação se inicia na própria conversa As disartrias são relacionadas à perda de
com o paciente, quando é possível se observar os articulação motora, porém com as funções mentais
aspectos motores da fala, a fluência, compreensão e preservadas. A compreensão, escrita e leitura estão
a formulação das palavras e frases. A compreensão preservadas. Trata-se de um distúrbio puramente
pode ser testada pedindo para que o paciente realize motor dos músculos responsáveis pela articulação
comandos de diferentes complexidades1,2. da fala. São ocasionadas por alterações neurológicas
A linguagem não fluente normalmente é em nível periférico ou central como, por exemplo,
esparsa, com redução do número de palavras por em situações em que há o comprometimento do
minuto, as frases são curtas com cinco palavras nervo vago ou glossofaríngeo ou lesões centrais
ou menos. Pode ocorrer a supressão de partes cerebelares, extrapiramidais ou pseudobulbares1,2.
de palavras e de construções gramaticais com a
Afasia de Broca
supressão de artigos, preposições, conjunções, etc.
A afasia de Broca ou afasia motora é uma
Pode ocorrer alteração do ritmo e da coordenação
deficiência na produção da linguagem falada, com
da articulação de movimentos para a fala1,2.
relativa preservação da compreensão. Ocorre o
Parafasias podem ocorrer na afasia de
comprometimento da fluência. Os pacientes podem
Wernicke, com a substituição de letras das palavras
apresentar a comunicação reduzida a algumas
ou mesmo de palavras inteiras1,2.
palavras ou poucas frases. Quando presente o
Nos casos de afasia de Broca a fala apresenta discurso torna-se lento e monótono, podendo
fluência prejudicada, por vezes falando somente ocorrer a supressão de artigos e preposições
algumas palavras ou sílabas esparsas. Na afasia de (telegráfico). Em formas mais severas da afasia
Wernicke a compreensão está afetada e a fluência pode ocorrer mutismo ou apenas poucas palavras
preservada, porém o discurso se torna vazio e sem são expressadas como “sim” ou “não”1,2.
sentido1,2.
A repetição está afetada. Pode apresentar
A leitura, a escrita e a nomeação podem dificuldade na escrita, com letras malformadas e
auxiliar no diagnóstico das afasias. A escrita está palavras com trocas de letras (disgrafia) associada,
prejudicada na maioria das formas de afasia, exceto além de dificuldade na leitura. Em geral, o paciente
nos casos de mutismo puro e cegueira pura para identifica a sua dificuldade. Lesão da área motora
Capítulo 12 140
adjacente pode provocar hemiparesia de predomínio corticais da linguagem com as outras regiões do
braquifacial associada. córtex cerebral. Não há lesão das áreas de Broca
ou Wernicke. Nesses casos a repetição está
Afasia de Wernicke preservada.
A afasia de Wernicke ou sensorial é uma
Na afasia transcortical motora a compreensão
afasia de compreensão, com dificuldade para se
está preservada, mas o paciente é incapaz de
compreender a palavra falada ou escrita. Pode
iniciar o movimento para emitir sons de maneira
ocorrer omissão de palavras, frases ou letras
espontânea. Quando pedido para repetir palavras
(parafasias). As frases são mal construídas e, muitas
esta função está preservada. Pode ocorrer em
vezes, os pacientes não percebem os próprios erros.
situações de lesão do lobo frontal onde pode-se
Outras vezes, o paciente se utiliza de neologismos,
encontrar abulia associada.
fazendo uso de palavras ou silabas não pertencentes
à língua. Na afasia transcortical sensorial ocorre
disfunção da compreensão oral e escrita, como na
A fluência está preservada. A repetição está
afasia de Wernicke. Entretanto, quando o paciente
afetada e há dificuldade em compreender a leitura
é pedido para repetir as palavras, a repetição está
(alexia). O paciente pode apresentar também
preservada. Por vezes essa repetição encontra-se
dificuldade em escrever o que não consegue
tão exacerbada que o paciente repete o que foi dito
expressar oralmente (agrafia)1,2.
inúmeras vezes (ecolalia)1,2.
O paciente geralmente apresenta dificuldade
para obedecer a comandos verbais, por vezes até os
Outras formas de afasia
mais simples. Lesões das radiações ópticas podem
Na agnosia auditiva ou surdez pura para
ocorrer ocasionando hemianopsia homônima.
palavras ocorre a interrupção da conexão do córtex
Hemiparesia é infrequente neste tipo de afasia.
auditivo primário (giro de Herschel) com as áreas
de associação do lobo temporal, de forma uni ou
Afasia Global
bilateral. Nesta variação da afasia de Wernicke
Ocorre nas lesões extensas do hemisfério
há deficiência na compreensão e repetição, com
dominante com comprometimento dos territórios
incapacidade de escrever o que foi ditado, porém
de Broca e Wernicke, muitas vezes por infarto da
o paciente mantém a capacidade de escrever de
artéria cerebral média. Geralmente, essa afasia
maneira espontânea. O paciente refere não escutar,
ocorre acompanhada de hemiparesia contralateral.
mas os testes audiométricos e de potencial evocado
Clinicamente, há comprometimento da compreensão
estão normais, o paciente não identifica os sons
e da expressão oral1,2.
emitidos como palavras.
Capítulo 12 141
preserva a habilidade de escrever e compreender a Deve-se aplicar tais conceitos na prática
palavra falada e escrita. Poucos casos são relatados, neurocirúrgica, considerando-se a complexidade
estando a região imediatamente superior e anterior desse processo e a multiplicidade de áreas nele
à área de Broca mais comumente envolvida. envolvido. A aplicação de técnicas de estimulação
cortical e subcortical permite mapear as inúmeras
Na afasia nominal ou amnéstica ocorre a
variabilidades funcionais. A determinação
dificuldade em nomear objetos, com dificuldade em
individualizada das áreas envolvidas na linguagem
evocar as palavras corretamente. Por exemplo, ao
de cada paciente é fundamental para a segurança e
se mostrar uma caneta, o paciente descreverá a
sucesso do procedimento.
utilização desta, não evocando o nome do objeto.
Essa condição pode estar associada a lesão do lobo
temporal do hemisfério dominante, muitas vezes
REFERÊNCIAS
associado às demências1,2.
1. Ropper AH, Samuels MA, Klein JP. Disorders of speech
and language in Adams and Victor’s principles of neurology
tenth edition. New York: McGraw Hill; 2014:486-506.
2. Sanvito WL. Distúrbios da comunicação através da fala
OUTROS DISTÚRBIOS DA FALA e da linguagem in Propedêutica neurológica básica. São
A disfonia é uma alteração da voz causada Paulo: Atheneu; 2010:167-176.
por alteração da laringe ou de sua inervação. Pode 3. Catani M, Jones DK, Ffytche DH. Perisylvian Language
Networks of the Human Brain. Annals of Neurology.
ocorrer alteração de intensidade e timbre do som 2005;57(1):8-16.
produzido. A linguagem está preservada. 4. Catani M, de Schotten MT. Perisylvian Pathways in Atlas
of Human Brain Connections. Oxford: Oxford University
A dislalia é um distúrbio da articulação da press; 2012:239-295.
palavra que decorre de causa múltiplas. As dislalias 5. Tremblay P, AS Dick, Small SL. New insights into the
podem ser fisiológicas, como nas crianças até neurobiology of language from functional brain imaging.
In: Duffau H (ed). Brain Mapping From neural basis od
quatro anos de idade, ou podem ocorrer em casos cognition to surgical applications. New York: Springer;
em que há um atraso no desenvolvimento neuro- 2012:131-143.
psico-motor1,2. 6. Chang EF, Raygor KP, Berger MS. Contemporary model
of language organization: an overview for neurosurgeons. J
Neurosurg. 2015;122(2):250-261.
7. Ribas GC. The microneurosurgery anatomy of the
CONCLUSÃO cerebral córtex. In: Duffau H. Brain Mapping From neural
basis of cognition to surgical applications. New York:
O conhecimento sobre como ocorre o
Springer; 2012; p.7-26.
processamento da linguagem avançou muito nos
8. Palacios E, Clavijo-Prado C. Fasciculo longitudinal
últimos anos com as técnicas de estimulação cortical inferior: uma nueva mirada del linguaje. Repert Med Cir.
e subcortical, tractografia por DTI e RM funcional. A 2016;25(4):232-234.
organização que classicamente era descrita como 9. Türe U, Yaşargil MG, Friedman AH, Al-Mefty O.
Fiber dissection technique: lateral aspect of the brain.
localizada em áreas específicas do cérebro avançou Neurosurgery. 2000;47(2):417-426.
para uma rede maior de distribuição funcional. Além
das áreas de Broca, Wernicke e fascículo arqueado
participam da formação da linguagem inúmeros
fascículos com conexões com lobos parietal,
temporal, frontal, occipital por vezes do hemisfério
dominante e não dominante. Participam também
desse processo estruturas subcorticais como os
núcleos da base, tálamo e o cerebelo.
Capítulo 12 142
PARTE 4
DOENÇAS VASCULARES DO SISTEMA NERVOSO
CAPÍTULO 13
ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO ISQUÊMICO
Capítulo 13 144
que muitos dos sintomas clínicos de um paciente com áreas de infarto, prolongando a viabilidade tecidual
AVEi agudo estão relacionados à parte do cérebro e, consequentemente, a janela terapêutica para o
que se encontra hipoperfundida e eletricamente tratamento do AVEi. O comportamento da circulação
não funcionante, que entretanto, permanece viável, colateral é altamente dinâmico, alguns canais de
definindo o conceito de penumbra isquêmica. Com colaterização persistem enquanto outros, nas áreas
o passar do tempo, a área de penumbra tende a de penumbra, tendem a desaparecer. Após a oclusão
evoluir para infarto com perda neuronal irreversível. de uma grande artéria intracraniana, em questão de
A diferenciação entre penumbra e infarto é segundos, desenvolve-se o fluxo colateral, devido
fundamental na seleção dos pacientes candidatos à modificação do gradiente pressórico circulatório,
a terapias de reperfusão, visando a restauração sendo as arteríolas corticais de 50 a 250μm o
de fluxo sanguíneo regional e consequentemente, primeiro sítio de diminuição da resistência vascular5.
preservação da área de penumbra. A variabilidade Entretanto, existe grande variabilidade do tempo
individual de tempo e severidade da evolução da em que as colaterais se manterão funcionantes e
isquemia depende principalmente da competência seu impacto na progressão da isquemia cerebral.
da circulação colateral. Se inicialmente, um bom sistema de colaterização
mantém o parênquima cerebral viável, a ausência
Outros fatores que podem influenciar na
de reperfusão tecidual e a falência do sistema de
taxa de perda neuronal são o pré-condicionamento
colaterais (que pode ocorrer em até 3 a 5 dias após o
isquêmico, pressão de perfusão cerebral (PPC),
evento) determinam crescimento do infarto6 (Figura
volume sanguíneo cerebral, glicemia sérica,
2).
temperatura e capacidade de extração de O2 3.
O efeito de tempo-dependência da reperfusão
cerebral em relação à colaterização foi demonstrado
CIRCULAÇÃO COLATERAL recentemente por Hwang et al.7. Pacientes com
A presença e eficácia da circulação colateral colaterais ruins foram muito mais dependentes do
influenciarão diretamente na progressão da tempo do tratamento para atingir bons resultados
penumbra para infarto tecidual. Colaterais são vasos clínicos, ao contrário do que se observou com os
anastomóticos que promovem rotas alternativas para pacientes com ótimas colaterais, nos quais o tempo
o fluxo sanguíneo. As vias colaterais primárias estão para o tratamento teve menor influência no desfecho
relacionadas ao polígono de Willis, e sua eficácia neurológico.
depende de variações anatômicas individuais . 4
Apesar de existirem diferentes escores de
No contexto do AVE, as vias colaterais fluxo colateral, na prática clínica a informação
secundárias estão relacionadas a anastomoses radiológica das colaterais é dicotomizada em
extra-intracranianas através de ramos das artérias “ausente” e “presente”, sendo mais simples, rápida
supra-aórticas e, principalmente, das anastomoses e bastante útil, de acordo com o estudo ESCAPE8.
colaterais leptomeníngeas.
Capítulo 13 145
Figura 1: Linha do tempo da epidemiologia do AVE no Brasil.
Fontes: os autores, 2021.
Figura 2: Modelo de progressão da isquemia cerebral, a partir de uma oclusão na artéria cerebral média. Segundos
após a oclusão, cria-se uma grande área de penumbra. Rapidamente há infarto do território suprido pelas artérias
lenticuloestriadas, sobretudo por não haver rede colateral eficaz (ramos terminais). Com o passar do tempo, a área
de infarto vai aumentando, a uma taxa inversamente proporcional à eficácia da circulação colateral. Com o passar do
tempo há falência da circulação colateral, determinando o volume final de infarto.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 13 146
temporal de evolução dos sintomas.
JANELA TERAPÊUTICA
A janela terapêutica do AVEi é diferente
para cada indivíduo9-11. A aplicação estrita de QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
parâmetros relacionados ao tempo de evolução A manifestação clínica do AVEi é bastante
de isquemia para a tomada de decisão terapêutica variada dependendo da extensão da lesão e do local
(por exemplo, 4,5h para rtPA IV ou 6h para do cérebro que teve o fluxo sanguíneo reduzido.
trombectomia) foi inicialmente derivada de estudos A maioria dos eventos isquêmicos cerebrais está
e análises populacionais, privando do tratamento relacionada a eventos tromboembólicos, com
indivíduos com cérebro viável e janelas terapêuticas origem em ateromatose de grandes artérias ou
estendidas além desses limites de tempo. Em 2017, patologias cardíacas, especialmente a fibrilação
os estudos DAWN12 e DEFUSE13, demonstraram que atrial. Geralmente, o início do quadro é súbito e
o tratamento endovascular é extremamente efetivo com o nadir ocorrendo em poucos minutos. Poucos
em janelas temporais de 6 a 24h para pacientes pacientes apresentam piora progressiva dos sinais
selecionados através de critérios avançados de e sintomas, sugerindo progressão do processo
imagem, utilizando uma abordagem baseada em trombótico, situação mais comum nos casos de
viabilidade tecidual ao invés de uma abordagem acometimento da circulação posterior. Assim, é
puramente temporal. fundamental conhecer a anatomia vascular e as
Em termos gerais, o tratamento do AVE funções do território suprido por cada artéria do
é tempo-dependente. Por exemplo, no estudo cérebro. Abaixo, seguem tabelas que correlacionam
REVASCAT14, para cada atraso de 30 min no a anatomia básica com a função do território suprido
tempo de reperfusão, as chances de bom desfecho por cada artéria do cérebro.
neurológico diminuíram em 26%.
Capítulo 13 147
Local de Infarto Déficits
Divisão superior da artéria cerebral Paresia de face e MS à direita; afasia não fluente (de Broca); pode haver perda
média esquerda sensitiva de face e MS à direita.
Divisão inferior da artéria cerebral Afasia fluente (de Wernicke); déficit visual à direita; pode haver paresia e perda
média esquerda de sensibilidade em face e MS à direita.
Artéria cerebral média esquerda Afasia severa ou global; hemiplegia e hemianestesia direita; hemianopsia
completa homônima direita; preferência em olhar para esquerda.
Divisão superior da artéria cerebral Paresia contralateral de face e MS; heminegligência esquerda em extensão
média direita variável; pode haver perda sensitiva de face e MS à esquerda.
Heminegligência esquerda profunda; déficit visual à esquerda; pode haver
Divisão inferior da artéria cerebral
paresia e perda de sensibilidade contralateral em face e MS; pode haver
média direita
preferência em olhar para a direita.
Artéria cerebral média direita Heminegligência esquerda profunda; hemiplegia esquerda; preferência em
completa olhar para a direita.
Paresia e perda sensitiva de MI direito; pode haver reflexo de preensão palmar,
Artéria cerebral anterior esquerda
alterações comportamentais, afasia transcortical, hemiplegia direita.
Paresia e perda sensitiva de MI esquerdo; pode haver reflexo de preensão
Artéria cerebral anterior direita palmar, alterações comportamentais, negligência esquerda, hemiplegia
esquerda.
Hemianopsia homônima direita; pode haver alexia sem agrafia, afasia, paresia
Artéria cerebral posterior esquerda
ou perda sensitiva direita.
Hemianopsia homônima esquerda; pode haver paresia ou perda sensitiva
Artéria cerebral posterior direita
esquerda.
Tabela 1: Síndromes clínicas das artérias cerebrais.
Fonte: Baseado em Moro, 201717.
Capítulo 13 148
Topografia Suprimento Vascular Sintomas
Bulbo lateral Artéria vertebral (mais comum) Vertigem, nistagmo
Artéria cerebelar posterior inferior Ataxia de marcha e de membros ipsilaterais
Redução de sensibilidade para dor e temperatura na face
ipsilateral e corpo contralateral
Disfagia, rouquidão
Síndrome de Horner ipsilateral (miose, ptose e anidrose)
Redução da gustação ipsilateral
Bulbo medial Ramos paramedianos da artéria Hemiparesia contralateral
vertebral e artéria espinhal anterior Paresia de língua ipsilateral
Redução da propriocepção e sensibilidade discriminativa
contralateral
Ponte lateral Artéria cerebelar anterior inferior Ataxia de marcha e de membros ipsilaterais
Artéria cerebelar superior Redução de sensibilidade para dor, temperatura e tato na
Artérias circunferenciais longas face ipsilateral
Surdez, zumbidos
Redução de dor e sensibilidade térmica no corpo
contralateral
Paresia de mandíbula ipsilateral
Síndrome de Horner ipsilateral
Mesencéfalo Ramos da artéria cerebral posterior Síndrome de Parinaud (paresia de mirada superior,
dorsal e do topo da artéria basilar nistagmo de retração e convergência, perda do reflexo
fotomotor com preservação do reflexo de acomodação).
Capítulo 13 149
especialmente no Sistema Público de Saúde. de espessura, de duas diferentes regiões da artéria
cerebral média: gânglios basais (onde tálamo,
gânglios basais e núcleo caudado estejam visíveis)
ABORDAGEM RADIOLÓGICA AO e nível supra ganglionar (onde a corona radiata e
PACIENTE COM SUSPEITA DE AVE
centro semioval estejam visíveis). A anormalidade
A abordagem diagnóstica inicial do AVE
deve ser observada em, no mínimo, dois cortes
agudo requer a diferenciação entre AVE isquêmico
axiais. Cada área padrão envolvida (hipodensa)
e hemorrágico, assim como, a exclusão de
determina a perda de um ponto, de maneira que
mimetizadores (hematoma subdural crônico,
uma tomografia completamente normal receberá um
tumores cerebrais, infecção do SNC, hipoglicemia,
escore ASPECTS 10 (Figura 3).
hiperglicemia, paralisia de Todd ou síndromes
psiquiátricas). Como não existem preditores clínicos
acurados para a diferenciação entre AVE isquêmico
e hemorrágico, a realização de estudo de imagem
é mandatória. Geralmente utiliza-se a tomografia
computadorizada (TC) de crânio e a angiotomografia
(angioTC) de pescoço e de crânio.
Capítulo 13 150
para tratamento de reperfusão e na estimativa ser feita através da angioRM com ou sem contraste
prognóstica pós AVE .22
IV.
do tratamento endovascular. Oclusão vascular deve para a seleção de pacientes com a utilização da
ser diagnosticada por método não invasivo o mais RM ao invés da TC24, entretanto a experiência do
precoce possível, considerando a possibilidade de serviço, controle rigoroso dos indicadores de tempo
Capítulo 13 151
Figura 4: Sugestão de encaminhamento e tempo de manejo dos pacientes triados no APH.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 13 152
• status funcional prévio.
Tratamento da fase aguda
O atendimento em casos de suspeita de O exame físico deve ser realizado de forma
AVE deve ter a mesma prioridade da dispensada à a excluir diagnósticos diferenciais e condições que
grave, independentemente da gravidade dos déficits neurológico deve abranger a National Institutes of
neurológicos. O hospital deve dispor de protocolos Health Stroke Scale (NIHSS)30 e ser capaz de afastar
organizados para que cada etapa do atendimento diagnósticos diferenciais (mimetizadores de AVE).
Capítulo 13 153
• TC com hemorragia aguda; desconhecido ou o paciente chega ao hospital após
as 4h30min, classicamente não há indicação de
• TC com sinais claros de isquemia ex-
trombólise IV. A utilização de técnicas de imagem
tensa;
que possam diferenciar o volume de tecido infartado
• AVEi nos últimos 3 meses; e a área de cérebro salvável, pode auxiliar na
seleção de pacientes, mesmo em janelas de tempo
• traumatismo craniano grave nos últi-
estendidas ou desconhecidas.
mos 3 meses;
O estudo WAKE-UP (Efficacy and Safety
• histórico de hemorragia intracraniana; of MRI-Based Thrombolysis in Wake-Up Stroke)33
utilizou a RM para estimar o tempo de evolução
• hemorragia subaracnoide;
dos sintomas, analisando as alterações de sinal
• neoplasia maligna do trato gastrointes- na sequência FLAIR e DWI. Pacientes com
tinal; alteração de sinal na DWI sem alteração de sinal
na sequência FLAIR (mismatch DWI/FLAIR), estão
• sangramento gastrointestinal nos últi-
mos 21 dias; provavelmente na janela de tratamento de 4,5h.
Os pacientes com alteração de sinal na sequência
• coagulopatia: FLAIR correspondente à área de alteração de sinal
na DWI, provavelmente possuem um tempo de
• plaquetas < 100.000/mm³;
evolução maior do que 4,5h, havendo menor chance
• RNI > 1,7; de benefício com qualquer medida terapêutica34,35.
Capítulo 13 154
de recanalização determinariam melhores desfechos ao tratamento com rtPA IV, consolidando a eficácia do
clínicos. Nos últimos seis anos, a confirmação manejo endovascular do AVE, mesmo em sistemas
científica da absoluta eficácia da trombectomia de saúde públicos nos países em desenvolvimento
mecânica definiu o manejo endovascular como (Figura 5).
terapia de primeira linha (1A de evidência) para
tratamento do AVEi agudo com OGV. Estes Evidências da eficácia do tratamento
estudos modificaram o cenário da neurologia endovascular do AVE nos países em
desenvolvimento
vascular, enfatizando ainda mais a importância da
Existem poucas publicações científicas
estruturação de sistemas de saúde que possam lidar
sobre os resultados da utilização de técnicas
com a complexidade dos pacientes com AVE.
endovasculares no manejo do AVEi agudo em países
em desenvolvimento.
Oclusão de grande vaso (OGV)
Refere-se a oclusão vascular aguda que No Brasil, a grande maioria dos hospitais
prejudica a perfusão cerebral resultando em (públicos e privados) não oferece sequer o
significativo déficit clínico e que é acessível para a tratamento IV na fase aguda do AVE. As unidades
trombectomia endovascular. Os seguintes sítios de de AVE ainda são raras e apenas uma ínfima parcela
oclusão normalmente são considerados OGV: artéria dos pacientes recebe tratamento endovascular45,46.
carótida interna, artéria cerebral média (segmentos Neste cenário, a organização dos serviços
M1 e/ou M2) e artéria basilar. para o imprescindível incremento de complexidade
no manejo do paciente com AVE, tende a ser
Evidências científicas do tratamento
desafiadora.
endovascular do AVE
No ano de 2015, os resultados dos estudos MR Em 2020, a publicação do estudo RESILIENT44
CLEAN38, EXTEND-IA39, ESCAPE8, SWIFT PRIME40 confirmou a trombectomia mecânica até 8h de
e REVASCAT14 confirmaram os significativos evolução. Este estudo clínico randomizado realizado
benefícios da utilização da trombectomia mecânica no sistema de saúde público brasileiro (SUS),
no tratamento dos pacientes com AVEi e OGV, nas randomizou 221 pacientes com AVE e OGV para os
primeiras 6 a 8h, marcando uma completa mudança grupos de tratamento com trombectomia mecânica
de paradigma no manejo do AVE41,42. (111 pacientes) + rtPA IV versus rtPA IV (110
pacientes no grupo controle). A idade média foi de 64
Os dados individuais dos pacientes dos
anos e NIHSS mediano de 18. Como resultado, 35%
ECRs foram analisados em uma metanálise43,
dos pacientes tratados com trombectomia obtiveram
que demonstrou que o “number needed to treat –
bom desfecho clínico (mRS≤2) versus 20% no grupo
NNT” do método endovascular para redução de
controle.
1 ponto de incapacidade na escala modificada de
Rankin (mRS) foi de 2,6. A partir da publicação Com um NNT de 6,6 e superando as limitações
dos ECRs DAWN12 e DEFUSE13, o conceito de logísticas, financeiras, culturais e políticas, o ECR
“janela terapêutica” perdeu espaço para o conceito RESILIENT abriu caminho para o estabelecimento
de “janela de parênquima”, comprovando que da trombectomia mecânica como método de escolha
pacientes com cérebro viável (penumbra) podem para manejo do AVE com OGV nos países em
obter ótimos desfechos funcionais, mesmo quando desenvolvimento.
tratados tardiamente. Em 2020, a publicação do
estudo RESILIENT44 confirmou que a trombectomia
mecânica em até 8h de evolução, determina
melhores desfechos funcionais quando comparado
Capítulo 13 155
Figura 5: Comparação dos desfechos funcionais de independência neurológica (mRS0-2) dos principais ECRs de
trombectomia versus tratamento clínico.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 13 156
pacientes com NIHSS ≥ 6. Entretanto, existem
Trombectomia em vasos distais: o conceito
de oclusão de vaso médio (OVM)47 pacientes com AVEi e oclusão de grande vaso
que apresentam quadro clínicos leve a moderado
Os benefícios da trombectomia em territórios
(NIHSS < 8). Nesses pacientes, a decisão deve
mais distais da artéria cerebral média, artéria
ser individualizada de acordo com o risco estimado
cerebral anterior, vertebrais e cerebrais posteriores
do procedimento e a experiência do serviço.
parecem ser promissores, havendo diversas
Atualmente, estudos clínicos randomizados estão
publicações que demonstram a eficácia e segurança
testando sistematicamente este cenário. De maneira
do tratamento. Entretanto, os riscos de vasoespasmo
geral, se os sintomas são incapacitantes, se existe
e de perfuração vascular parecem ser maiores
uma área de tecido eloquente em sofrimento e os
nestas topografias. As diretrizes de 2019 da AHA/
estudos de imagem demonstram viabilidade tecidual
ASA consideram como nível de evidência C classe
no sítio acometido, o tratamento endovascular é
IIb as intervenções nestes territórios. Na prática
indicado.
clínica, deve-se levar em consideração a história
natural das oclusões distais (ACM segmento M3,
Neuroimagem
ACA, ACP), que parece ser mais favorável do que
das OGV proximais, entretanto, podem determinar Outro aspecto da avaliação dos pacientes
geral, se os sintomas são incapacitantes, se existe relacionado ao tipo de imagem disponível. Baseado
uma área de tecido eloquente em sofrimento e os nas evidências científicas disponíveis até o
estudos de imagem demonstram viabilidade tecidual momento, de 0 a 6h a avaliação tecidual pode ser
Capítulo 13 157
altas taxas de recanalização e baixos índices de
Manejo endovascular das oclusões da
artéria basilar complicação. Os stent retrievers são dispositivos
em forma de stents, autoexpansíveis que podem
Apesar de amplamente utilizada nos casos
ser completamente resgatados após seu implante.
de oclusão aguda da artéria basilar, a trombectomia
Estes dispositivos propiciam, além da imediata
mecânica não possui o mesmo nível de evidência
restauração de fluxo, a possibilidade de resgate
científica, quando comparada ao tratamento de
do trombo/coágulo caracterizando a trombectomia
lesões da circulação anterior. Publicado em 2009,
mecânica. As taxas de recanalização vascular (TICI
o estudo BASICS50 possuía desenho prospectivo
2b e 3) utilizando-se esta técnica podem aproximar-
não randomizado e avaliou o desfecho de pacientes
se de 80%, e sua utilização está relacionada a
com OAB51. Os grupos comparados foram terapia
significativa melhora de desfechos clínicos. A técnica
antitrombótica (antiplaquetários ou anticoagulantes),
é comprovadamente segura, com mínimas taxas
trombólise endovenosa com rtPA e trombectomia
de sangramento cerebral e mortalidade nos ECRs
mecânica. Os pacientes tratados com rtPA ou
publicados.
trombectomia apresentaram melhores desfechos do
que o grupo com antitrombóticos, porém não houve
Técnica “clássica” de trombectomia
diferença significativa entre estas duas intervenções. utilizando-se aspiração
O estudo clínico randomizado BASICS50 foi A técnica de aspiração para tratamento do
apresentado na conferência ESO-WSO em maio de AVEi, utilizando-se cateteres de acesso distal
2020, demonstrando que o tratamento endovascular neurovasculares de grande lume, é bastante
é efetivo em pacientes com oclusão da artéria praticada e existe comprovação da não inferioridade
basilar e que apresentem déficits neurológicos nas taxas de recanalização e de desfecho clínico,
moderados a severos (NIHSS ≥ 10). Aparentemente, quando comparada a técnica com stent retriever.
os pacientes com déficits clínicos menos severos O estudo ASTER (Contact aspiration versus
(NIHSS <10) apresentaram melhores desfechos stent retriever for successful revascularization)52
com tratamento medicamentoso. Na prática clínica, demonstrou não haver diferença nas taxas de
as oclusões de artéria basilar com apresentação recanalização quando utilizado aspiração versus
clínica grave (NIHSS ≥10) deverão ser manejadas stent retriever. Subsequentemente, o estudo
rotineiramente com trombectomia mecânica, mesmo COMPASS (Comparison of direct aspiration versus
não existindo evidências de benefício tão robustas stent retriever as a first approach)53 demonstrou a não
como na circulação anterior. Em casos selecionados, inferioridade da técnica de aspiração no desfecho
sobretudo se não houver alterações sugestivas de funcional (mRs) dos pacientes acometidos.
lesão irreversível e extensa em tronco cerebral,
sugere-se o tratamento endovascular mesmo em Técnica “combinada” de trombectomia:
janelas de tempo tardias (até 24h do início dos aumentando a taxa de “TICI 3 na primeira
passada”
sintomas).
A utilização da técnica de dupla aspiração
através de cateter guia balão (CGB) e cateter de
acesso distal (cateter de aspiração de grande lume),
TÉCNICAS DE TRATAMENTO
associado à stent retriever é considerada atualmente
ENDOVASCULAR
a técnica com maior eficácia. A utilização de cateter
Técnica “clássica” de trombectomia guia balão é, sempre que possível, imprescindível,
utilizando-se stent retriever
pois comprovadamente está associada a
A utilização de stent retriever no contexto do melhores taxas de recanalização, menor tempo
AVEi agudo com oclusão de grande vaso demonstrou de procedimento e, consequentemente, melhores
Capítulo 13 158
desfechos clínicos54-56. dentro de 48h do ictus, em casos de infarto maligno
da artéria cerebral média58.
O tratamento de fase aguda do paciente
com AVE deve ser encarado como uma sucessão
de eventos que iniciam no reconhecimento dos
sintomas, direcionamento da vítima para centro UNIDADE DE AVE
capacitado, confirmação da suspeita clínica, seleção As unidades de AVE representam o modelo de
dos pacientes candidatos ao tratamento, avaliação tratamento mais eficaz no tratamento de pacientes
do tipo de tratamento com maior probabilidade de acometidos por AVE23-25 (nível de recomendação
benefício clínico, rápida implementação terapêutica, IA), caracterizadas por uma área física restrita aos
manutenção dos cuidados de prevenção de pacientes com AVE, com modelo de atendimento
complicações e reabilitação precoce. Encarando- baseado em equipe multidisciplinar especializada no
se desta forma o manejo do AVE, fica claro que a tratamento de pacientes com AVE, com protocolos e
trombectomia mecânica nada mais é do que uma condutas bem definidos nas diversas especialidades
pequena parcela do complexo manejo do paciente. envolvidas no cuidado do paciente, tendo como
principais focos:
Parte-se do pressuposto de que os centros
de AVE que fazem (ou planejam fazer) o tratamento • atendimento de fase aguda (U-AVE – Agu-
endovascular nos pacientes com AVEi devido a da);
OGV, já possuam experiência e organização no
manejo do AVE, cumprindo os requisitos mínimos • investigação da etiologia do AVE;
estabelecidos pelas diretrizes atuais, tais como, • inserção de medidas de prevenção secun-
unidade de AVE, neurologista e serviço de imagem dária precocemente;
24/7, além de constante análise de indicadores,
assegurando assim, a qualidade do serviço prestado • reabilitação precoce;
Capítulo 13 159
Figura 7: Fluxograma proposto de atendimento ao paciente com suspeita de AVE agudo.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 13 160
pacientes internados na enfermaria de medicina gia para Lues.
interna do mesmo hospital. Ambos os grupos foram
Pacientes cuja etiologia não foi definida
submetidos ao mesmo tratamento e investigação e
após esta fase de investigação são habitualmente
dispunham dos mesmos recursos técnicos, exceto
submetidos a uma segunda etapa de exames:
pela assistência multidisciplinar da U-AVE61.
• angioTC ou angioRM da circulação cer-
Uma metanálise publicada pela Cochrane
vical e encefálica: suspeita de dissecção
Stroke Group62, em 2013, identificou os seguintes
arterial, estenoses intra ou extracranianas,
pontos, realizados na U-AVE, relacionados aos outras arteriopatias não ateroscleróticas;
melhores desfechos dos pacientes internados em
U-AVE: • holter cardíaco de 24h: suspeita de FA pa-
roxística ou cardiopatia atrial;
• melhor acurácia diagnóstica;
• doppler transcraniano com bubble test:
• melhor cuidado de enfermagem; suspeita de PFO, estenoses intracrania-
nas;
• mobilização precoce;
• ecocardio transesofágico: suspeita de
• reabilitação precoce; e fonte cardioembólica não detectada pelos
métodos anteriores;
• maior eficácia na prevenção de complica-
ções da imobilidade. • investigação de trombofilia: especialmente
paciente com histórico de outros eventos
O mesmo estudo evidenciou menor tempo
trombóticos não usuais;
médio de internação, devido menor número de
complicações imobilidade e disfagia62. • líquor: suspeita de neuroinfecção (lues e
cisticercose) ou vasculite;
Capítulo 13 161
Figura 8: Principais subtipos etiológicos de acordo com a classificação de TOAST.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 13 162
intracraniana é responsável pelo evento isquêmico,
Hipolipemiantes
um manejo clínico agressivo deve ser iniciado.
As estatinas são consideradas terapias de
Este deve incluir a terapia anti-plaquetária dupla
primeira linha em casos de dislipidemia após AVE66,67
com AAS e clopidogrel por 90 dias81, além de anti-
e devem ser iniciadas durante a internação do AVE.
hipertensivos, estatina, mudança do estilo de vida,
controle de diabetes mellitus, atividade física,
Controle glicêmico cessação de tabagismo e perda de peso.
O rastreio para investigação de diabetes
Em recorrência de AVE ou AIT, a despeito
mellitus deve ser realizado para todos os pacientes
do tratamento clínico otimizado, deve-se avaliar a
após evento de AVE ou AIT. De forma geral, a
possibilidade da realização de angioplastia isolada
HbA1c pode ser mais precisa do que outros testes
ou com colocação de stent81.
de rastreio no período pós evento cerebrovascular68
(Classe IIa, Nível de evidência C).
Doença aterotrombótica de carótidas
extracranianas
Terapia antiplaquetária
Todos os pacientes com doença de carótida
A terapia antitrombótica, realizada com devem receber tratamento clínico, o qual inclui
abordagem antiplaquetária, é recomendada para estatina e antiagregação plaquetária, além de
a prevenção secundária na maioria dos subtipos mudança dos fatores de risco81.
de AVEi, incluindo o AVE lacunar , ateroma do
69
Capítulo 13 163
O tratamento cirúrgico pode ser avaliado em
Anticoagulação
casos de recorrência apesar da terapia adequada
A prevenção secundária com anticoagulantes
antitrombótica e falha do tratamento endovascular81.
está indicada nos casos de AVE de origem
cardioembólica e pode ser realizada com varfarina
Forame oval patente
ou anticoagulantes orais diretos (NOACs). São
indicações: Dois ensaios clínicos evidenciaram diminuição
do risco de AVE recorrente após fechamento
• fibrilação ventricular não valvar; percutâneo de forame oval patente (FOP) em
pacientes com AVE criptogênico82,83, em oposição a
• trombo em átrio ou ventrículo esquerdos;
estudos anteriores que não mostraram benefício84,85,
• IAM com supra de ST de parede anterior o que corrobora a relação causal entre FOP e AVEi
com formação de trombo em VE; e justifica criteriosa consideração do fechamento em
pacientes selecionados.
• acinesia ou discinesia apical anterior (in-
dicação de anticoagulação por três meses O escore de risco de embolia paradoxal
após o infarto); (RoPE), uma ferramenta objetiva, pode auxiliar a
avaliar a probabilidade de o FOP estar associado
• dispositivo mecânico de assistência ventri-
ao AVEi86.
cular esquerda;
Em pacientes jovens, com AVE de aparência
• fração de ejeção de VE < 35%; e
embólica, sem comorbidades vasculares e um
• doença cardíaca valvar, incluindo doença grande FOP e a associação de aneurisma do
valvar mitral reumática ou válvulas cardía- septo atrial à relação causal é ainda mais forte.
cas protéticas mecânicas na posição aór- Uma vez que a recorrência de AVE relacionada a
tica ou mitral; FOP é baixa, deve haver discussão entre uma
equipe multidisciplinar, que envolve neurologista e
cardiologista intervencionista, a fim de determinar
AVE DE OUTRAS ETIOLOGIAS entre terapia medicamentosa ou fechamento do
FOP.
Dissecção arterial
A dissecção de artéria carótida ou vertebral
Reabilitação
são causas relativamente comuns de AVE ou AIT,
Em virtude dos avanços terapêuticos recentes,
especialmente em pacientes jovens. Pode ser
um maior número de pacientes sobrevive ao AVE
relacionada a trauma, entretanto pode ocorrer
e parte significativa desses pacientes apresenta
espontaneamente ou por trauma simples.
sequelas neurológicas87.
É controversa a opção ideal para prevenção
Nos países desenvolvidos, o AVE é a principal
secundária após um evento de dissecção arterial.
causa de incapacidade88. Dessa maneira, os
A estratégia pode incluir anticoagulação, terapia
pacientes com sequelas pós-AVE devem ter acesso
antitrombótica, angioplastia com ou sem stent, ou
garantido à reabilitação89, cujos principais objetivos
conduta conservadora.
são:
A recomendação da AHA/American Stroke
Association é tratamento antitrombótico com • auxiliar na recuperação das habilidades
funcionais que o paciente perdeu em con-
antiplaquetários ou anticoagulantes por pelo menos
sequência do AVE;
três a seis meses81. Em casos de recorrência, deve-
se considerar terapia endovascular com stent81. • proporcionar novas formas de adaptação
Capítulo 13 164
a incapacidades que não podem ser recu-
REFERÊNCIAS
peradas;
1. GBD 2016 Stroke Collaborators. Global, regional, and
national burden of stroke, 1990-2016: a systematic analysis
• tornar o paciente o mais independente for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet
possível nas atividades da vida diária bá- Neurol. 2019;18(5):439-458.
sicas e instrumentais (comunitárias), retor- 2. World Stroke Organization. WSO global stroke fact sheet.
nar a exercer as suas atividades de lazer e WSO. 2019. Disponível em: https://www.world-stroke.org/
laborativa, se ele assim desejar; e publications-and-resources/resources/global-stroke-fact-
sheet.
• dar suporte ao paciente e à família, tanto 3. Kidwell CS, Wintermark M. The role of CT and MRI in the
social quanto psicológico; emergency evaluation of persons with suspected stroke.
Curr Neurol Neurosci Rep. 2010;10(1):21-28.
Para obter melhor resultado, a reabilitação 4. Liebeskind DS. Collateral Circulation. Stroke.
deve seguir os seguintes princípios: 2003;34(9):2279-2284.
5. Romero JR, Pikula A, Nguyen TN, Nien Y-L, Norbash A,
• acesso rápido, pois a capacidade de repa- Babikian VL. Cerebral collateral circulation in carotid artery
ração após o dano cerebral (neuroplastici- disease. Curr Cardiol Rev. 2009;5(4):279-288.
dade), ocorre de forma mais intensa nos 6. Campbell BC, Christensen S, Tress BM, et al.
3 meses pós-AVE, principalmente para Failure of collateral blood flow is associated with infarct
growth in ischemic stroke. J Cereb Blood Flow Metab.
déficit motor; 2013;33(8):1168-1172.
• utilizar de terapias baseadas em ativida- 7. Hwang Y-H, Kang D-H, Kim YW, Kim Y-S, Park SP,
Liebeskind DS. Impact of time-to-reperfusion on outcome
des que devem ter alta intensidade para in patients with poor collaterals. AJNR Am J Neuroradiol.
maior benefício; e 2015;36(3):495- 500.
8. Goyal M, Demchuk AM, Menon BK, Eesa M, Rempel
• adequação da técnica a ser utilizada de JL, Thorton J, et al. Randomized Assessment of Rapid
acordo com as necessidades e preferên- Endovascular Treatment of Ischemic Stroke. N Engl J Med.
cias do paciente89. 2015;372:1019–1030.
9. Yuh WT, Alexander MD, Ueda T, et al. Revisiting
Current Golden Rules in Managing Acute Ischemic
Stroke: Evaluation of New Strategies to Further Improve
CONCLUSÃO Treatment Selection and Outcome. AJR Am J Roentgenol.
O AVE isquêmico é uma das doenças da área 2017;208(1):32-41.
neurológica que apresentou os maiores avanços 10. Jovin TG, Chamorro A, Cobo E, et al. Thrombectomy
within 8 Hours after Symptom Onset in Ischemic Stroke. N
terapêuticos nas últimas duas décadas, possuindo Engl J Med. 2015;372(24):2296-2306.
tratamentos de fase aguda muito eficazes. 11. Bang OY, Saver JL, Kim SJ, et al. Collateral flow
Entretanto, o desafio, especialmente em países predicts response to endovascular therapy for acute
ischemic stroke. Stroke. 2011 Mar;42(3):693-699.
em desenvolvimento como o Brasil, é organizar os
12. Nogueira RG, Jadhav AP, Haussen DC, et al.
serviços que prestam atendimento aos pacientes
Thrombectomy 6 to 24 Hours after Stroke with a Mismatch
com AVE, para que essas intervenções sejam between Deficit and Infarct. N Engl J Med. 2018;4:11–21.
adequadamente alocadas e estejam disponíveis 13. Albers GW, Marks MP, Kemp S, Christensen S, Tsai JP,
para o maior número de pacientes. Portanto, todos Ortega-Gutierrez S, et al. Thrombectomy for Stroke at 6
to 16 Hours with Selection by Perfusion Imaging. N Engl J
os pontos de atenção ao paciente com AVE devem Med. 2018;378(8):708-718.
interagir para o sucesso dessa cadeia assistencial, 14. Ribo M, Molina CA, Cobo E, et al. Association between
na sua função essencial que é a redução da carga time to reperfusion and outcome is primarily driven by the
time from imaging to reperfusion. Stroke. 2016;47(4):999-
do AVE para o paciente, seus familiares e sociedade. 1004.
15. Rocha M, Jovin TG. Fast versus slow progressors of
infarct growth in large vessel occlusion stroke: clinical and
research implications. Stroke. 2017;48:2621-2627.
Capítulo 13 165
16. Rocha M, Desai SM, Jadhav AP, Jovin TG. Prevalence 30. Lyden P, Brott T, Tilley B, et al. Improved reliability of the
and temporal distribution of fast and slow progressors of NIH Stroke Scale using video training. NINDS TPA Stroke
infarct growth in large vessel occlusion stroke. Stroke. Study Group. Stroke. 1994;25(11):2220-2226.
2019;50:2238-2240.
31. National Institute of Neurological Disorders and Stroke
17. Moro CHC, de Magalhães PSC, Longo AL, et al. Guia rt-PA Stroke Study Group. Tissue plasminogen activator for
de Implementação de Centro de AVE. 1. ed.;2017. p. 354. acute ischemic stroke. N Engl J Med. 1995;333(24):1581-
1587.
18. Rothwell PM, Warlow CP. Timing of TIAs preceding
stroke: time window for prevention is very short. Neurology. 32. Demaerschalk BM, Kleindorfer DO, Adeoye OM, et al.
2005;64(5):817-820. Scientific Rationale for the Inclusion and Exclusion Criteria
for Intravenous Alteplase in Acute Ischemic Stroke: A
19. Rothwell PM, Giles MF, Chandrateva A, et al. Effect
Statement for Healthcare Professionals From the American
of urgent treatment of transient ischaemic attack and
Heart Association/American Stroke Association. Stroke.
minor stroke on early recurrent stroke (EXPRESS study):
2016;47(2):581-641.
a prospective population-based sequential comparison.
Lancet. 2007;370(9596):1432-1442. 33. Thomalla G, Simonsen CZ, Boutitie F, et al. MRI-Guided
Thrombolysis for Stroke with Unknown Time of Onset. N
20. Lavallee PC, Meseguer E, Abboud H, et al. A transient
Engl J Med. 2018;379(7):611–22.
ischaemic attack clinic with round-the-clock access (SOS-
TIA): feasibility and effects. Lancet Neurol. 2007;6(11):953- 34. Thomalla G, Cheng B, Ebinger M, et al. DWI-FLAIR
960. mismatch for the identification of patients with acute
ischaemic stroke within 4·5 h of symptom onset (PRE-
21. Pexman JH, Barber PA, Hill MD, Sevick RJ, Demchuk
FLAIR): a multicentre observational study. Lancet Neurol.
AM, Hudon ME, et al. Use of the Alberta Stroke Program
2011;10(11):978-986.
Early CT Score (ASPECTS) for Assessing CT Scans
in Patients with Acute Stroke. AJNR Am J Neuroradiol. 35. Rimmele DL, Thomalla G. Wake-up stroke: clinical
2001;22(8):1534–42. characteristics, imaging findings, and treatment option - an
update. Front Neurol. 2014;5:35.
22. Silva GS, Nogueira RG. Endovascular Treatment
of Acute Ischemic Stroke. Continuum (Minneap Minn). 36. Ma H, Campbell BCV, Parsons MW, et al. Thrombolysis
2020;26(2):310–331. Guided by Perfusion Imaging up to 9 Hours after Onset of
Stroke. N Engl J Med. 2019;380(19):1795–803.
23. Wahlgren N, Moreira T, Michel P, et al. Mechanical
thrombectomy in acute ischemic stroke: Consensus 37. Campbell BCV, Ma H, Ringleb PA, et al. Extending
statement by ESO-Karolinska Stroke Update 2014/2015, thrombolysis to 4·5-9 h and wake-up stroke using perfusion
supported by ESO, ESMINT, ESNR and EAN. Int J Stroke. imaging: a systematic review and meta-analysis of individual
2016 Jan;11(1):134-47. patient data. Lancet. 2019;394(10193):139-147.
24. Provost C, Soudant M, Legrand L, et al. Magnetic 38. Berkhemer OA, Fransen PSS, Beumer D, et al. A
Resonance Imaging or Computed Tomography Randomized Trial of Intraarterial Treatment for Acute
Before Treatment in Acute Ischemic Stroke. Stroke. Ischemic Stroke. N Engl J Med. 2015;372(1):11-20.
2019;50(3):659–664.
39. Campbell BCV, Mitchell PJ, Kleinig TJ, et al.
25. Fassbender K, Walter S, Grunwald IQ, et al. Prehospital Endovascular Therapy for Ischemic Stroke with Perfusion-
stroke management in the thrombectomy era. Lancet Imaging Selection. N Engl J Med. 2015;372(11):1009-1018.
Neurol. 2020;19(7):601-610.
40. Saver JL, Goyal M, Bonafe A, et al. Stent-Retriever
26. Jauch EC, Saver JL, Adams HP Jr, et al Guidelines Thrombectomy after Intravenous t-PA vs. t-PA Alone in
for the early management of patients with acute ischemic Stroke. N Engl J Med. 2015;372(24):2285-2295.
stroke: a guideline for healthcare professionals from the
41. Berkhemer OA, Fransen PSS, Beumer D, et al. A
American Heart Association/American Stroke Association.
Randomized Trial of Intraarterial Treatment for Acute
Stroke. 2013;44(3):870-947.
Ischemic Stroke. N Engl J Med. 2015;372(1):11-20.
27. Kobayashi A, Czlonkowska A, Ford GA, et al. European
42. Jovin TG, Chamorro A, Cobo E, et al. Thrombectomy
Academy of Neurology and European Stroke Organization
within 8 Hours after Symptom Onset in Ischemic Stroke. N
consensus statement and practical guidance for pre-hospital
Engl J Med. 2015;372(24):2296-2306.
management of stroke. Eur J Neurol. 2018;25(3):425-433.
43. Goyal M, Menon BK, van Zwam WH, et al Endovascular
28. Douglas VC, Tong DC, Gillum LA, et al. Do the Brain
thrombectomy after large-vessel ischaemic stroke: a meta-
Attack Coalition’s criteria for stroke centers improve care for
analysis of individual patient data from five randomised
ischemic stroke? Neurology. 2005;64(3):422-7.
trials. Lancet. 2016;387(10029):1723-1731.
29. Jauch EC, Saver JL, Adams HP Jr, et al. Guidelines
44. Martins SO, Mont’Alverne F, Rebello LC, et al.
for the early management of patients with acute ischemic
Thrombectomy for Stroke in the Public Health Care System
stroke: a guideline for healthcare professionals from the
of Brazil. N Engl J Med. 2020;382(24):2316-2326.
American Heart Association/American Stroke Association.
Stroke. 2013;44(3):870-947.
Capítulo 13 166
45. Martins SC, Pontes-Neto OM, Alves CV, de Freitas GR, 59. Indredavik, B, Slørdahl SA, Bakke F, Rokseth R,
Filho JO, Tosta ED, Cabral NL; Brazilian Stroke Network. Håheim LL. Stroke unit treatment. Long-term effects. Stroke.
Past, present, and future of stroke in middle-income 1997;28(10):1861-1866.
countries: the Brazilian experience. Int J Stroke. 2013;8
60. Indredavik B, Bakke F, Slordahl SA, Rokseth R, Hâheim
Suppl A100:106-11.
LL. Stroke unit treatment. 10-year follow-up. Stroke.
46. Martins SCO, Sacks C, Hacke W, et al. Priorities to 1999;30(8):1524-1527.
reduce the burden of stroke in Latin American countries.
61. Cabral NL, Moro C, Silva GR, Scola RH, Werneck LC.
Lancet Neurol. 2019;18(7):674-683.
Study comparing the stroke unit outcome and conventional
47. Goyal M, Ospel JM, Menon BK, Hill MD. MeVO: the next ward treatment. Arq Neuro-Psiquiatr. 2003;61:188–19.
frontier? J Neurointerv Surg. 2020;12(6):545-547.
62. Stroke Unit Trialists’ Collaboration. Organised inpatient
48. Meretoja A, Keshtkaran M, Tatlisumak T, Donnan GA, (stroke unit) care for stroke. Cochrane Database Syst Ver.
Churilov L. Endovascular therapy for ischemic stroke: Save 2013;2013(9):CD000197.
a minute – save a week. Neurology. 2017;88(22):2123-
63. Hackam DG, Spence JD. Combining multiple
2127.
approaches for the secondary prevention of vascular
49. Kaesmacher J, Chaloulos-Iakovidis P, Panos L, et al. events after stroke: a quantitative modeling study. Stroke.
Mechanical Thrombectomy in Ischemic Stroke Patients With 2007;38(6):1881–1885.
Alberta Stroke Program Early Computed Tomography Score
64. GBD 2017 Risk Factor Collaborators. Global, regional,
0–5. Stroke. 2019;50(4):880–888.
and national comparative risk assessment of 84 behavioral,
50. Schonewille WJ, Wijman CAC, Michel P, et al. Treatment environmental and occupational, and metabolic risks or
and outcomes of acute basilar artery occlusion in the clusters of risks for 195 countries and territories, 1990–
Basilar Artery International Cooperation Study (BASICS): 2017: a systematic analysis for the global burden of disease
a prospective registry study. Lancet Neurol. 2009;8(8):724- study 2017. Lancet. 2018;392(10159):1923–1994.
730.
65. Whelton PK, Carey RM, Aronow WS, et al. 2017 ACC/
51. Schulte-Altedorneburg G, Liebig T, Brückmann AHA/AAPA/ ABC/ACPM/AGS/APhA/ASH/ ASPC/NMA/
H, Jansen O. Treatment of basilar artery occlusion: a PCNA guideline for the prevention, detection, evaluation,
prospective randomised therapeutic study is needed. Lancet and management of high blood pressure in adults: executive
Neurol. 2009;8(12):1084-1085. summary: a report of the American College of Cardiology/
American Heart Association task force on clinical practice
52. Lapergue B, Blanc R, Gory B, et al. Effect of
guidelines. Circulation. 2018;138(17):e484–e594.
Endovascular Contact Aspiration vs Stent Retriever on
Revascularization in Patients With Acute Ischemic Stroke 66. Amarenco P, Bogousslavsky J, Callahan A 3rd, et al.
and Large Vessel Occlusion: The ASTER Randomized High-dose atorvastatin after stroke or transient ischemic
Clinical Trial. JAMA. 2017;318(5):443–10. attack. N Engl J Med. 2006;355(6):549–559.
53. Turk AS, Siddiqui AH, Mocco J. A comparison 67. Sever PS, Dahlöf B, Poulter NR, et al. Prevention of
of direct aspiration versus stent retriever as a first coronary and stroke events with atorvastatin in hypertensive
approach (“COMPASS”): protocol. J Neurointerv Surg. patients who have average or lower-than-average
2018;10(10):953-957. cholesterol concentrations, in the Anglo-Scandinavian
Cardiac Outcomes Trial–Lipid Lowering Arm (ASCOT-
54. Zaidat OO, Mueller-Kronast NH, Hassan AE, et
LLA): a multicentre randomised controlled trial. Lancet.
al. Impact of Balloon Guide Catheter Use on Clinical
2003;361(9364):1149–1158.
and Angiographic Outcomes in the STRATIS Stroke
Thrombectomy Registry. Stroke. 2019;50(3):697-704. 68. Powers WJ, Rabinstein AA, Ackerson T, et al.
Guidelines for the Early Management of Patients With
55. Nguyen TN, Malisch T, Castonguay AC, et al.
Acute Ischemic Stroke: 2019 Update to the 2018 Guidelines
Balloon Guide Catheter Improves Revascularization
for the Early Management of Acute Ischemic Stroke: A
and Clinical Outcomes With the Solitaire Device. Stroke.
Guideline for Healthcare Professionals From the American
2014;45(1):141-145.
Heart Association/American Stroke Association. Stroke.
56. Nguyen TN, Castonguay AC, Nogueira RG, et al. 2019;50:e344–e418.
Effect of balloon guide catheter on clinical outcomes and
69. SPS3 Investigators. Effects of clopidogrel added to
reperfusion in Trevo thrombectomy. J Neurointerv Surg.
aspirin in patients with recent lacunar stroke. N Engl J Med.
2019;11(9):861-865.
2012;367(9):817–825.
57. Jauch EC, Saver JL, Adams HP Jr, et al. Guidelines
70. Hart RG, Sharma M, Mundl H, et al. Rivaroxaban for
for the early management of patients with acute ischemic
stroke prevention after embolic stroke of undetermined
stroke: a guideline for healthcare professionals from the
source. N Engl J Med. 2018;378(23): 2191–2201.
American Heart Association/American Stroke Association.
Stroke. 2013;44(3):870-947. 71. Markus HS, Levi C, King A, Madigan J, Norris J.
Antiplatelet therapy vs anticoagulation therapy in cervical
58. The European Stroke Organization (ESO) Executive
artery dissection: the cervical artery dissection in stroke
Committee, ESO Writing Committee. Guidelines for
study (CADISS) randomized clinical trial final results. JAMA
Management of Ischaemic Stroke and Transient Ischaemic
Neurol. 2019;76(6):657–664.
Attack 2008. Cerebrovasc Dis. 2008;25(5):457–507.
Capítulo 13 167
72. Chimowitz MI, Lynn MJ, Derdeyn CP, et al. Stenting 82. Søndergaard L, Kasner SE, Rhodes JF, et al. Patent
versus aggressive medical therapy for intracranial arterial foramen ovale closure or antiplatelet therapy for cryptogenic
stenosis. N Engl J Med. 2011;365(11):993-1003. stroke. N Engl J Med. 2017;377(11): 1033–1042.
73. Antiplatelet Trialists’ Collaboration. Collaborative 83. Mas J-L, Derumeaux G, Guillon B, et al. Patent foramen
overview of randomised trials of antiplatelet therapy–I: ovale closure or anticoagulation vs. antiplatelets after
prevention of death, myocardial infarction, and stroke by stroke. N Engl J Med. 2017; 377(11):1011–1021.
prolonged antiplatelet therapy in various categories of
84. Furlan AJ, Reisman M, Massaro J, et al. Closure or
patients. BMJ. 1994;308(6921):81-106.
medical therapy for cryptogenic stroke with patent foramen
74. Sandercock PA, Counsell C, Tseng M-C, Cecconi ovale. N Engl J Med. 2012;366(11):991-999.
E. Oral antiplatelet therapy for acute ischaemic stroke.
85. Meier B, Kalesan B, Mattle HP, et al. Percutaneous
Cochrane Database Syst Rev. 2014;(3):CD000029.
closure of patent foramen ovale in cryptogenic embolism. N
75. Johnston SC, Rothwell PM, Nguyen-Huynh MN, et Engl J Med. 2013;368(12):1083-1091.
al. Validation and refinement of scores to predict very
86. Kent DM, Ruthazer R, Weimar C, et al. An index to
early stroke risk after transient ischaemic attack. Lancet.
identify stroke-related vs incidental patent foramen ovale in
2007;369(9558): 283–292.
cryptogenic stroke. Neurology. 2013;81(7):619-625.
76. Wang Y, Wang Y, Zhao X, et al. Clopidogrel with aspirin
87. Joundi RA, Smith EE, Yu AYX, Rashid M, Fang J,
in acute minor stroke or transient ischemic attack. N Engl J
Kapral MK. Temporal Trends in Case Fatality, Discharge
Med. 2013;369(1):11-19.
Destination, and Admission to Long-term Care After Acute
77. Johnston SC, Easton JD, Farrant M, et al. Clopidogrel Stroke. Neurology. 2021;96(16):e2037-e2047.
and aspirin in acute ischemic stroke and high-risk TIA. N
88. Mozaffarian D, Benjamin EJ, Go AS, et al. Heart disease
Engl J Med. 2018;379(3):215-225.
and stroke statistics – 2015 update: a report from de
78. Johnston SC, Elm JJ, Easton JD, et al. Time course American Heart Association. Circulation. 2015;131(4):e29-
for benefit and risk of clopidogrel and aspirin after acute 322.
transient ischemic attack and minor ischemic stroke.
89. Winstein CJ, Stein J, Arena R, et al. Guidelines for
Circulation. 2019;140(8):658-664.
Adult Stroke Rehabilitation and Recovery: A Guideline
79. Diener H-C, Bogousslavsky J, Brass LM, et al. Aspirin for Healthcare Professionals From the American Heart
and clopidogrel compared with clopidogrel alone after recent Association/American Stroke Association. Stroke.
ischaemic stroke or transient ischaemic attack in high-risk 2016;47(6):e98-e169.
patients (MATCH): randomised, double-blind, placebo-
controlled trial. Lancet. 2004;364(9431):331-337.
80. Amarenco P, Denison H, Evans SR, et al. Ticagrelor
Added to Aspirin in Acute Nonsevere Ischemic Stroke or
Transient Ischemic Attack of Atherosclerotic Origin. Stroke.
2020;51(12):3504-3513.
81. Powers WJ, Rabinstein AA, Ackerson T, et al.
Guidelines for the Early Management of Patients With
Acute Ischemic Stroke: 2019 Update to the 2018 Guidelines
for the Early Management of Acute Ischemic Stroke: A
Guideline for Healthcare Professionals From the American
Heart Association/American Stroke Association. Stroke.
2019;50:e344–e418.
Capítulo 13 168
CAPÍTULO 14
EMBOLIA PARADOXAL
Capítulo 14 169
ESUS
Critérios para diagnóstico Investigação proposta
TC ou RM de crânio
• AVE isquêmico não lacunar na imagem de TC
(<1,5cm) ou RM (<2cm). Eletrocardiograma 12 derivações
• Ausência de aterosclerose intra ou
extracraniana com estenose ≥50% no território Ecocardiograma transtorácico
arterial da área isquêmica.
Monitoração de ritmo cardíaco ≥24 h
• Ausência de fonte cardioembólica de alto risco
para embolia.
Imagem de vasos intra e extracraniana
• Sem outra causa específica para AVE (Arteriografia cerebral, angiografia por TC ou
(dissecção arterial, vasculite, etc.) RM, ou ultrassom de vasos cervicais e doppler
transcraniano).
Quadro 1: ESUS (embolic stroke of unknown source), critérios diagnósticos e investigação. AVE: acidente vascular
encefálico; RM: ressonância magnética; TC: tomografia computadorizada.
Fonte: Hart et al., 2014 4.
Figura 1: Ressonância magnética, axial em difusão, AVE isquêmico classificado como ESUS. A: Mulher, 46 anos, hígida,
identificado FOP com shunt grande. B: Mulher, 90 anos, dislipidemia, identificada cardiopatia atrial. AVE: acidente
vascular cerebral; FOP: forame oval patente.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 14 170
Dentre as potenciais causas para ESUS alemão que após necropsia de uma mulher de 35
estão: cardiopatia atrial, fibrilação atrial subclínica, anos que sofreu um AVE fatal, encontrou trombose
endocardite não-bacteriana, embolia paradoxal, extensa dos membros inferiores e FOP de grande
ateroembolia a partir do arco aórtico, ou de placas tamanho. Conheim levantou a hipótese de que esse
com estenoses menores de 50%, coagulopatia trombo poderia ter migrado do membro inferior
relacionada ao câncer . 4
e facilmente atravessado o átrio direito para o
esquerdo, chegando à artéria cerebral9.
A primeira associação entre FOP e AVE foi Estudos post mortem encontraram um
descrita em 1877 por Julius Conheim, um patologista tamanho médio de FOP em adultos de 4,9m
Capítulo 14 171
(variando de 1 a 19 mm). O risco de embolia
Embolia paradoxal e migrânea
paradoxal aumenta conforme o tamanho do FOP,
Migrânea com aura é fator de risco para AVE
além de outras alterações anatômicas, como
isquêmico, principalmente em mulheres em uso
aneurisma de septo atrial (aumenta o risco de AVE
de contraceptivos orais e fumantes15. Há várias
em até 20 vezes), rede de Chiari (formação de
outras condições genéticas associadas a migrânea
trombo in situ), tamanho do FOP maior que 2 mm
que se manifestam com AVE, como CADASIL
e grande passagem de microbolhas no exame de
(arteriopatia cerebral autossômica dominante com
Doppler transcraniano (DTC). O estudo da anatomia
infartos subcorticais e leucoencefalopatia) e MELAS
do FOP é fundamental para estratificação de risco e
(Miopatia mitocondrial, Encefalopatia, Acidose lática
planejamento cirúrgico8,10.
e episódios semelhantes a AVE). Supõe-se que
A detecção de trombose venosa profunda o AVE em pacientes com migrânea possa estar
(TVP) é encontrada em até 20% dos pacientes associado à presença de FOP, já que prevalência
com AVE agudo classificados como criptogênico de FOP em pacientes com AVE e migrânea com
comparado a 4% dos pacientes que possuem aura é significativamente maior comparado aos
uma causa definida. Tal achado pode indicar uma pacientes com migrânea com aura e sem AVE (84%
relação maior com o FOP, devendo, portanto ser vs 38,1%)16.
investigado .
11
Capítulo 14 172
Figura 3: Escore RoPE (Risk of Risk of paradoxal embolism).
Fonte: Hart et al., 20144.
Quadro 2: Sensibilidade e especificidade do ETT e DTC (ambos com microbolhas), comparados ao ETE, na avaliação
de FOP5. DTC: Doppler transcraniano; ETE: ecocardiograma transesofágico; ETT: ecocardiograma transtorácico.
Fonte: Pristipino et al., 20195.
Capítulo 14 173
Através do ETE pode-se fazer a detecção Durante a infusão das microbolhas, deve ser feita
e visualização direta do septo interatrial e possui manobra de Valsalva para sensibilização do teste. O
capacidade de visualizar FOP acima de 2 mm. aumento da pressão abdominal e torácica provocado
Estudos demonstram uma prevalência de 39% nesta manobra eleva a pressão no átrio direito, e
usando ETE comparado a 18% em ETT e 27% em consequentemente aumenta o fluxo de passagem
DTC. O diagnóstico pelo ETE envolve o uso de de sangue (e microbolhas) através do forame oval
solução salina agitada, e a realização da manobra patente em direção ao átrio esquerdo.
de Valsalva aumenta a sensibilidade de detecção . 18
Em 2019, foi estabelecido o Consenso Latino
O ETE identifica a anatomia detalhada do FOP,
Americano20 para o diagnóstico de shunt direita-
incluindo tamanho e extensão do túnel, bordas e
esquerda pelo DTC, o qual estabelece a quantificação
estruturas adjacentes, como veias cavas e aorta. É
dos sinais de alta intensidade relacionados às
recomendável sempre o estudo com ETE antes do
microbolhas (Figura 4):
fechamento do FOP principalmente para escolha de
dispositivo9. 1. ausência de sinais: negativo para shunt
direita-esquerda;
O diagnóstico de shunt direita-esquerda
pelo DTC é feito através da identificação de 2. menos de 10 sinais: shunt pequeno ou
microêmbolos de ar (microbolhas) na artéria não significativo;
cerebral média após a injeção em veia periférica de
3. mais de 10 e menos de 20 sinais: shunt
solução salina agitada. As microbolhas formadas
moderado;
pela agitação de solução salina não são absorvidas
no leito vascular pulmonar, portanto, são facilmente 4. mais de 20 sinais: shunt grande; e
detectadas na monitorização artérial. O DTC é
5. “padrão cortina”: incontáveis sinais,
realizado com o paciente em decúbito dorsal,
impossível discriminar os sinais no
em ambiente confortável, utilizando o transdutor espectro.
de 2 MHz posicionado na janela transtemporal,
Comparado ao ETE, as vantagens do DTC são:
posicionado pela mão do examinador ou por
maior conforto ao paciente, quantificação do shunt
capacete de monitorização. Pode-se utilizar registro
e possibilidade de detectar shunts extra cardíacos,
de telas ou contínuo. Identifica-se o fluxo pela artéria
como fístulas arteriovenosas pulmonares21.
cerebral média (nos capacetes de monitorização, é
Entretanto, estima-se em quem 10% dos pacientes
possível registrar ambas artérias cerebrais médias
a janela transtemporal não é adequada À insonação,
direita e esquerda). É necessária punção venosa
limitando a execução do exame. O uso da solução
em membro superior, utilizando cateter venoso
de microbolhas, tanto para o ETE quanto para o
de calibre 20 ou 22G, torneira de três vias e duas
DTC é extremamente seguro, sendo reportados
seringas de 10 ml. O consenso atual preconiza uma
muitos raros casos de sintomas relacionados à
solução de 10 ml contendo soro fisiológico e ar (9
infusão das microbolhas, tais como sintomas visuais
ml de salina agitada com 1 ml de ar). A opção de
transitórios (similares a aura migranosa) e cefaleia.
misturar 1 ml de sangue do paciente permanece
A manobra de Valsalva também pode gerar sintomas
controverso, mas não há consenso se opondo a
transitórios (tontura, cefaleia, náusea, taquicardia e
esta técnica e possui segurança comprovada. A
desconforto torácico)22.
adição de sangue aumenta a intensidade de sinal
das microbolhas pela fragmentação das hemácias, Uma vez que a embolia paradoxal está
aumentando a sensibilidade da técnica. Quando associada à formação de trombos, principalmente
feito, deverá respeitar a razão 8:1:1, ou seja, 8 ml na circulação venosa, a investigação complementar
de salina, 1 ml de ar e 1 ml do sangue do paciente . 19
de trombofilias é fundamental para o adequado
Capítulo 14 174
manejo do paciente. Deve-se investigar estados
Terapias antitrombóticas
de hipercoagulabilidade (mutação do Fator V de
O substrato trombembólico da embolia
Leiden e hiperfibrinogenemia), mutação do gene da
paradoxal levanta a tese de que as terapias com
protrombina, deficiência de anticoagulantes naturais
anticoagulante oral (AO) possam ser superiores
(proteínas C, S e antitrombina III), síndrome do
ao uso de antiagregantes plaquetários (AP) na
anticorpo antifosfolipídeo e hiperhomocisteinemia8.
prevenção secundária de AVE criptogênico e do
Devido à elevada prevalência de FOP na ESUS relacionados ao FOP. No entanto, ainda
população adulta saudável, não se recomenda existem dados controversos na literatura médica.
pesquisa rotineira de embolia paradoxal em adultos.
Há poucos estudos clínicos randomizados
Do ponto de vista da neurologia, esta investigação
comparando o efeito de AO com AP. Quando a AO foi
deve ser recomendada em pacientes com AVE
realizada com varfarina (alvo da razão normalizada
ou ataque isquêmico transitório sem etiologia
internacional – RNI 2,0 a 3,0), comparado ao uso
determinada, na investigação de infartos cerebrais
de aspirina (até 325mg/dia), as metanálises não
silenciosos, nos casos de ESUS e em pacientes com
demonstram superioridade de um tratamento em
formas complicadas de migrânea (migrânea com
relação a outro no desfecho de recorrência do AVE
aura, migrânea hemiplégica e infarto migranoso)5,8.
isquêmico, AIT ou morte24. Uma metanálise de 16
estudos, com 3953 pacientes (AO= 1527, AP= 2426)
demonstrou que o grupo AO apresentou menor
TRATAMENTO
risco de recorrência do AVE sem aumento do risco
Tendo em vista que FOP está presente em 75%
hemorrágico25. Outra revisão demonstra que a
da população adulta, faz-se necessário identificar
recorrência de AVE é menor no grupo de pacientes
quais são os pacientes que necessitam de terapias
tratados com AO26. Em outra revisão sistemática5
para prevenção de eventos clínicos relacionados ao
houve maior prevenção de recorrência de AVE
FOP. A maioria da população não requer nenhuma
em pacientes utilizando AO em comparação a AP,
intervenção ou terapia5.
no entanto, o risco aumentado para hemorragia
Na avaliação e orientação ao paciente com intracraniana (OR 2,54) parece superar o beneficio
FOP, leva-se em consideração a situação em que observado com AO. Estudos com anticoagulantes
foi detectado: 1) na investigação de AVE/AIT; 2) na diretos (rivaroxabana27 e dabigratrana28) falharam em
investigação de outras condições clinicas (infartos demonstrar superioridade da terapia anticoagulante
cerebrais silenciosos, doença descompressiva do na prevenção de ESUS, inclusive nos pacientes com
mergulhador, migranea com aura); ou 3) achado FOP.
incidental durante exame de ecocardiograma. Nas
situações 1 e 2, é necessário determinar o papel Terapia intervencionista
do FOP na gênese do evento. A avaliação do RoPE As intervenções para oclusão do FOP se
escore, nos casos de AVE/AIT13 tamanho do FOP e baseiam na fisiopatologia, pela qual a junção
grau do shunt (Quadro 3), são fundamentais para definitiva das lâminas do septum primum e secundum
identificar casos em que se faz necessária terapia impediria a formação de trombos entre as lâminas e
intervencionista. A abordagem multidisciplinar deve bloquearia o caminho para a embolia paradoxal.
ser feita entre neurologista, cardiologista clínico e Diversos estudos avaliaram o tratamento
cardiointervencionista, e também com a participação do FOP através de fechamento percutâneo, em
do paciente na tomada de decisão, além, claro, do pacientes com AVE isquêmico critptogênico.
seu consentimento na terapia indicada5,23. Entretanto, existem variações quanto aos critérios
de inclusão do paciente, o tamanho do FOP, tipo de
Capítulo 14 175
Figura 4: Classificação de shunt direita-esquerda pelo DTC. mb: microbolhas.
Fonte: Os autores, 2021.
2. Relação espacial e distâncias entre o FOP e raiz da aorta, veia cava, valvas e as paredes livres dos átrios
6. Avaliação do grau de shunt (Doppler colorido, teste com microbolhas) em repouso e durante manobra de
Valsalva
Quadro 3: Variáveis a considerar na indicação de fechamento percutâneo do FOP. ASA: aneurisma de septo interatrial;
FOP: forame oval patente.
Fonte: Pristipino et al., 20195.
Capítulo 14 176
dispositivo utilizado, e os desfechos de seguimento. risco, em que não se detecte outra etiologia)37.
Os primeiros estudos randomizados (CLOSURE I29 e
Naqueles pacientes com TVP confirmada e
PC Trial30, ambos em 2012) falharam em demonstrar
com relação temporal ao AVE, o tratamento deve ser
superioridade da oclusão percutânea na prevenção
feito com uso de anticoagulante oral, usualmente por
de recorrência de AVE, devido ao tipo de dispositivo
3 meses antes de considerar o fechamento do FOP23.
utilizado 29
e o pequeno número de pacientes
Caso seja necessária a anticoagulação permanente
randomizados30. Já no estudo RESPECT31 houve
(trombofilia e fenômenos embólicos de repetição) há
uma tendência a melhores resultado com a oclusão,
pouca evidência sobre o benefício do fechamento
mas não atingiu significância estatística. No entanto,
do FOP, uma vez que o risco de recorrência do
o acompanhamento tardio (mediana 5,9 anos) dos
evento persiste mesmo após a oclusão percutânea
pacientes do estudo RESPECT demonstrou redução
do FOP38.
de risco de AVE recorrente em 45% no grupo
oclusão percutânea, em relação ao tratamento
antitrombótico32. Já em 2017 e 2018, os estudos CONCLUSÕES
CLOSE33, Gore REDUCE34 e DEFENSE-PFO35
A embolia paradoxal está relacionada
selecionaram pacientes em que o FOP apresentava
a ocorrência de eventos cerebrovasculares
sinais de alto risco para embolia paradoxal, todos
tromboembólicos, sobretudo nos casos de AVE
com resultado favorável ao grupo de intervenção
embólico de etiologia indeterminada (ESUS). Na
percutânea (Quadro 4).
avaliação do paciente com AVE, a investigação
As revisões sistemáticas que seguiram a deve ser realizada de forma completa, com objetivo
divulgação destes 6 estudos conseguiram incluir de atribuir a classificação etiológica do evento.
mais de 3500 pacientes randomizados entre Nos casos de AVE criptogênico, de aspecto
tratamento com antitrombóticos versus oclusão embólico, deve-se incluir a pesquisa de embolia
percutânea, pelo menos 50% destes acompanhados paradoxal, de forma a demonstrar a existência de
por mais de 5 anos. Em relação ao tratamento FOP e shunt direita-esquerda, bem como o grau
antitrombótico, a oclusão percutânea promoveu de shunt. No estado atual da literatura em 2021, a
redução de risco relativo em 64% para recorrência oclusão percutânea do FOP, em pacientes com AVE
de AVE (RR 0,36, IC 95% 0,17-0,79) (Figura 5). criptogênico não-lacunar, com FOP de alto risco, sem
Esta diferença faz com que sejam necessários tratar outra etiologia identificada, na idade entre 18 e 60
131 pacientes para evitar 1 caso de recorrência anos, promove benefício de redução de recorrência
do AVE em 1 ano, no entanto, deve ser levado em de AVE isquêmico.
consideração que se trata de pacientes com muitos
anos de vida em potencial para ocorrência de
eventos, sendo possível traduzir: tratar 13 pacientes REFERÊNCIAS
para evitar um AVE recorrente, em 10 anos. No 1. Brasil. Ministério da Saúde. Informações de saúde:
estatísticas vitais: mortalidade geral. Brasília; 2008.
grupo de intervenção houve maior risco de fibrilação
Disponível em:http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.
atrial paroxística (RR 4,33, IC 95% 2,37-7,89), php?area=0205&id=6937.
em sua maioria eventos autolimitados ao período 2. Yaghi S, Bernstein RA, Passman R, Okin PM, Furie KL.
periprocedimento . Em 2021, a American Heart
36 Cryptogenic Stroke. Research and Practice. Circulation
Research. 2017;120:527–540.
Association e American Stroke Association incluíram
3. Adams Jr HP, Bendixen BH, Kappelle LJ, et al.
o procedimento de oclusão percutânea do FOP nas Classification of subtype of acute ischemic stroke.
recomendações para prevenção secundaria de AVE Definitions for use in a multicenter clinical trial. TOAST.
Trial of Org 10172 in Acute Stroke Treatment. Stroke.
criptogênico para pacientes selecionados (AVE não 1993;24:35-41.
lacunar, idade entre 18 e 60 anos, FOP de elevado
Capítulo 14 177
Estudo Dispositivo n Desfecho primário Resultados
Total de óbitos (0-30 dias), óbito de
CLOSURE I STARflex
909 causa neurológica, AVE/AIT em 2 Redução não significativa (p=0,37)
(2012)29 system
anos
PC-trial Óbito, AVE/AIT ou embolia periférica
AMPLATZER 414 Redução não significativa (p=0,34)
(2013)30 em até 4,5 anos
Redução não significativa em 2 anos
RESPECT
(p=0,08)
(2013)31 AMPLATZER 980 Óbito, AVE/AIT
Redução significativa no seguimento de
(2017)32
5,9 anos (p=0,046)
Redução significativa em AVE follow up
GORE
Helex e de 3,2 anos (p=0,002)
REDUCE 664 AVE ou isquemia cerebral silenciosa
Cardioform Redução significativa em isquemia
(2017)34
cerebral silenciosa (p=0,04)
CLOSE
Vários 663 AVE Redução significativa (p<0,001)
(2017)33
DEFENSE
AVE, óbito de causa vascular,
PFO AMPLATZER 120 Redução significativa (p=0,013)
sangramento maior em 2 anos
(2018)35
Quadro 4: Descrição resumida dos estudos randomizados em oclusão percutânea do FOP versus terapia antitrombótica.
AVE: acidente vascular encefálico. AIT: ataque isquêmico transitório.
Figura 5: Análise conjunta do risco relativo (A) e taxa de risco (B) para AVE recorrente em pacientes randomizados para
oclusão do FOP versus terapia antitrombótica. As colunas Oclusão e Antitrombótica demonstram o numero de eventos
pelo total de pacientes em cada grupo. IC: intervalo de confiança; FOP: HR: Hazard Ratio (taxa de risco); forame oval
patente; RR: risco relativo.
Fonte: Adaptado de Turc et al., 201836.
Capítulo 14 178
4. Hart RG, Diener HC, Coutts SB, et al. Embolic strokes of 19. Lange MC, Zétola VF, Piovesan ÉJ, Werneck LC. Saline
undetermined source: the case for a new clinical construct. versus saline with blood as a contrast agent for right-to-
Lancet Neurol. 2014;13(4):429-38. left shunt diagnosis by transcranial Doppler: is there a
significant difference? J Neuroimaging. 2012;22(1):17-20.
5. Pristipino C, Sievert H, D’Ascenzo F, et al. European
position paper on the management of patients with patent 20. Zetola VF, Lange MC, Scavasine VC, et al. Latin
foramen ovale. General approach and left circulation American Consensus Statement for the Use of Contrast-
thromboembolism. EuroIntervention. 2019;14:1389-1402. Enhanced Transcranial Ultrasound as a Diagnostic Test
for Detection of Right-to-Left Shunt. Cerebrovasc Dis.
6. Aggeli C, Verveniotis A, Andrikopoulou E, Vavuranakis E,
2019;48(3-6):99-108.
Toutouzas K, Tousoulis D. Echocardiographic features of
PFOs and paradoxical embolism: a complicated puzzle. Int 21. Hara H, Virmani R, Ladich E, et al. Patent foramen
J Cardiovasc Imaging. 2018;34(12):1849-1861. ovale: current pathology, pathophysiology, and clinical
status. J Am Coll Cardiol. 2005;46(9):1768-1776.
7. Putaala J, Metso AJ, Metso TM, et al. Analysis of
1008 consecutive patients aged 15 to 49 with first-ever 22. Pstras L, Thomaseth K, Waniewski J, Balzani I,
ischemic stroke: the Helsinki young stroke registry. Stroke. Bellavere F. The Valsalva manoeuvre: physiology and
2009;40(4):1195-1203. clinical examples. Acta Physiol (Oxf). 2016;217(2):103-119.
8. Homma S, Messe SR, Rundek T, et al. Patent foramen 23. Kernan WN, Ovbiagele B, Black HR, et al. Guidelines for
ovale. Nat Rev Dis Primers. 2016;2:15086. the prevention of stroke in patients with stroke and transient
ischemic attack: a guideline for healthcare professionals
9. Collado FMS, Poulin MF, Murphy JJ, Jneid H,
from the American Heart Association/American Stroke
Kavinsky CJ. Patent Foramen Ovale Closure for Stroke
Association. Stroke. 2014;45(7):2160-2236.
Prevention and Other Disorders. J Am Heart Assoc.
2018;7(12):e007146. 24. Kent DM, Dahabreh IJ, Ruthazer R, et al. Anticoagulant
vs. antiplatelet therapy in patients with cryptogenic stroke
10. Hagen PT, Scholz DG, Edwards WD. Incidence and
and patent foramen ovale: an individual participant data
size of patent foramen ovale during the first 10 decades of
meta-analysis. Eur Heart J. 2015;36(35):2381-2389.
life: an autopsy study of 965 normal hearts. Mayo Clin Proc.
1984;59:17–20. 25. Angelini F, Fortuni F, Tsivgoulis G, et al. Comparison
of antithrombotic strategies in patients with cryptogenic
11. Fauveau E, Cohen A, Bonnet N, Gacem K, Lardoux H.
stroke and patent foramen ovale: an updated meta-analysis.
Surgical or medical treatment for thrombus straddling the
Cardiovasc Drugs Ther. 2021;35(5):987-993.
patent foramen ovale: impending paradoxical embolism?
Report of four clinical cases and literature review. Arch 26. Sagris D, Georgiopoulos G, Perlepe K, et al.
Cardiovasc Dis. 2008;101(10):637-44. Antithrombotic Treatment in Cryptogenic Stroke Patients
With Patent Foramen Ovale: Systematic Review and Meta-
12. Mojadidi MK, Zaman MO, Elgendy IY, et al. Cryptogenic
Analysis. Stroke. 2019;50(11):3135-3140.
Stroke and Patent Foramen Ovale. J Am Coll Cardiol.
2018;71(9):1035-1043. 27. Kasner SE, Swaminathan B, Lavados P, et al.
Rivaroxaban or aspirin for patent foramen ovale and
13. Kent DM, Ruthazer R, Weimar C, et al. An index to
embolic stroke of undetermined source: a prespecified
identify stroke-related vs incidental patent foramen ovale in
subgroup analysis from the NAVIGATE ESUS trial. Lancet
cryptogenic stroke. Neurology 2013;81:619-625.
Neurol. 2018;17(12):1053-1060.
14. Bang OY, Ovbiagele B, Kim JS. Evaluation of
28. Diener H-C, Chutinet A, Easton JD, et al. Dabigatran
cryptogenic stroke with advanced diagnostic techniques.
or Aspirin After Embolic Stroke of Undetermined Source in
Stroke. 2014;45(4):1186-94.
Patients With Patent Foramen Ovale: Results From RE-
15. Carolei A, Marini C, De Matteis G. History of migraine SPECT ESUS. Stroke. 2021; 52(3):1065-1068.
and risk of cerebral ischaemia in young adults. The Italian
29. Furlan AJ, Reisman M, Massaro J, et al. Closure or
National Research Council Study Group on Stroke in the
medical therapy for cryptogenic stroke with patent foramen
Young. Lancet. 1996;347(9014):1503-1506.
ovale. N Engl J Med. 2012;366(11):991-999.
16. Wilmshurst P, Nightingale S. The role of cardiac and
30. Meier B, Kalesan B, Mattle HP, et al. Percutaneous
pulmonary pathology in migraine: a hypothesis. Headache.
closure of patent foramen ovale in cryptogenic embolism. N
2006;46:429-434.
Engl J Med. 2013;368(12):1083-1091.
17. Alakbarzade V, Keteepe-Arachi T, Karsan N, Ray
31. Carroll JD, Saver JL, Thaler DE, et al. Closure of patent
R, Pereira AC. Patent foramen ovale. Pract Neurol.
foramen ovale versus medical therapy after cryptogenic
2020;20(3):225-233.
stroke. N Engl J Med. 2013;368(12):1092-1100.
18. Di Tullio M, Sacco RL, Venketasubramanian N,
32. Saver JL, Carroll JD, Thaler DE, et al. Long-Term
Sherman D, Mohr JP, Homma S. Comparison of diagnostic
Outcomes of Patent Foramen Ovale Closure or Medical
techniques for the detection of a patent foramen ovale in
Therapy after Stroke. N Engl J Med. 2017;377(11):1022-
stroke patients. Stroke. 1993;24(7):1020-1024.
1032.
33. Mas JL, Derumeaux G, Guillon B, et al. Patent Foramen
Ovale Closure or Anticoagulation vs. Antiplatelets after
Stroke. N Engl J Med. 2017;377(11):1011-1021.
Capítulo 14 179
34. Søndergaard L, Kasner SE, Rhodes JF, et al. Patent 37. Kleindorfer DO, Towfighi A, Chaturvedi S, et al. 2021
Foramen Ovale Closure or Antiplatelet Therapy for Guideline for the Prevention of Stroke in Patients With
Cryptogenic Stroke. N Engl J Med. 2017; 377:1033-1042. Stroke and Transient Ischemic Attack: A Guideline From the
American Heart Association/American Stroke Association.
35. Lee PH, Song JK, Kim JS, et al. Cryptogenic Stroke
Stroke. 2021;52(7):e364-e467.
and High-Risk Patent Foramen Ovale: The DEFENSE-PFO
Trial. J Am Coll Cardiol. 2018;71(20):2335-2342. 38. Hviid CVB, Simonsen CZ, Hvas AM. Recurrence Risk
in Patients with Cryptogenic Stroke, Patent Foramen
36. Turc G, Calvet D, Guérin P, et al. Closure,
Ovale, and Thrombophilia: A Systematic Review and Meta-
Anticoagulation, or Antiplatelet Therapy for Cryptogenic
Analysis. Thromb Haemost. 2019;119(11):1839-1848.
Stroke With Patent Foramen Ovale: Systematic Review
of Randomized Trials, Sequential Meta-Analysis, and
New Insights From the CLOSE Study. J Am Heart Assoc.
2018;7(12):e008356.
Capítulo 14 180
CAPÍTULO 15
TRATAMENTO DE ACIDENTE VASCULAR
ENCEFÁLICO AGUDO
EPIDEMIOLOGIA
A incidência global de AVE se divide em 80% de
etiologia isquêmica e 20% de etiologia hemorrágica,
sendo a segunda causa mais comum de mortalidade e a
Capítulo 15 181
Variável Total (%) difusão uma pequena quantidade de oxigênio e
Sexo glicose das artérias colaterais, impedindo a sua
Masculino 1,6 morte imediata. A área central que contém células
Feminino 1,4 mortas ou destinadas a morrer é chamada de infarto,
Idade (anos) já a região potencialmente salvável, de penumbra7.
18 – 29 0,1
Quando há oclusão de um vaso ou
30 – 59 1,1
hipotensão arterial sistêmica grave, a PPC
60 – 64 2,9
65 – 74 5,1 reduz-se consideravelmente e ativa mecanismos
75 + 7,3 compensatórios para garantir a homeostase local.
Residência A queda inicial da PPC pode ser compensada pela
Urbana 1,6 autorregulação, levando à dilatação dos vasos
Rural 1,0 intracranianos a fim de manter o FSC. Conforme a
Tabela 1: Epidemiologia do AVE no Brasil. queda da PPC persiste e ultrapassa a capacidade
Fonte: Adaptado de Bensenor et al., 2015 .
6
compensatória do organismo, atingida com a
vasodilatação máxima, o FSC começa a reduzir. Em
resposta, o oxigênio transportado pelas hemácias
FISIOPATOLOGIA passa a ser extraído em frações maiores para
O cérebro é um órgão sensível a pequenas atender às necessidades celulares. No decorrer do
alterações nos mecanismos que regulam sua quadro, à medida que PPC continua em queda e a
homeostase, visto não conter um sistema de reserva fração de extração de oxigênio é máxima, surgem
energética e depender exclusivamente do que lhe é consequências funcionais aos neurônios7-12.
ofertado através do fluxo sanguíneo cerebral (FSC).
Quando o FSC atinge 50 ml/100g/min, a
Deve-se a isso o fato de pequenas privações terem
síntese proteica é reduzida, e completamente
grande potencial para causar dano e até mesmo a
inibida em 35 ml/100g/min, quando há o aumento da
morte tecidual7.
captação de glicose. Quando essa fonte energética
A autorregulação é um mecanismo esgota-se, o organismo recorre à sua obtenção
compensatório que permite ao organismo manter por via anaeróbica, porém, como consequência, o
o FSC em níveis constantes. Os protagonistas ácido lático produzido leva à acidose metabólica
desse fenômeno são a musculatura lisa arterial e cerebral quando o FSC atinge 25 ml/100g/min. O
as substâncias vasoativas; o primeiro responde desfecho dessa sucessão de acontecimentos é que
diretamente a alterações na pressão de perfusão quando o FSC está entre 16 a 18 ml/100g/min, os
cerebral (PPC), contraindo quando o valor pressórico neurônios entram em falência elétrica e, aos 10 a 12
aumenta, para evitar o FSC excessivo e o edema, ml/100g/min, entra em falência a homeostase iônica
e relaxando conforme as pressões diminuem, a fim da membrana neuronal, fato que marca o infarto
de suprir o tecido. Dentre as substâncias vasoativas cerebral7,8,10,11.
está o óxido nítrico (NO), o qual é liberado quando o
Durante a falência elétrica, o organismo
FSC é reduzido, levando à vasodilatação8-11.
aumenta a liberação de um neurotransmissor
Durante a isquemia, as células da região excitatório: o glutamato. Ele abre canais iônicos,
perivascular à artéria ocluída são as mais afetadas permitindo a saída dos íons potássio para o meio
pela falta de suprimento sanguíneo que, caso seja extracelular e a entrada de íons sódio e cálcio para o
longo o bastante, levará a danos irreversíveis intracelular; a alteração à homeostase iônica leva à
e à morte celular por necrose. Em regiões mais ativação de vias sinalizadoras pelos níveis de cálcio,
afastadas, algumas células podem receber por implicando em repercussões fisiológicas7,14-17.
Capítulo 15 182
O aumento da concentração de íons de O primeiro origina-se da falência do transportador
sódio no meio intracelular interfere no processo de iônico dependente de ATP presente na membrana
degradação de neurotransmissores pelos astrócitos. celular, levando ao acúmulo de água e à tumefação
A captação do glutamato, que foi liberado com a dos componentes celulares. Já o segundo surge a
falência elétrica, é prejudicada e a sua permanência partir do aumento da permeabilidade ou ruptura das
na fenda estimula ainda mais a sua liberação, células que constituem a barreira hematoencefálica;
levando a um estado excitatório contínuo conhecido isso permite que proteínas e outras macromoléculas
como excitotoxicidade. Além disso, o aumento de partam para o espaço extracelular, aumentando o
sódio atrai por diferença osmótica a água do meio seu volume pela atração osmótica da água7,10,29,30.
extracelular, levando ao edema cerebral7,14-17.
Apesar de danoso por si só, o edema cerebral
Outro efeito da liberação do glutamato é a também pode levar a algumas complicações
produção de NO. Essa molécula pode ser benéfica neurológicas como o agravo da isquemia e a
em pequenas porções quando o organismo enfrenta herniação. O primeiro acontece principalmente
a hipóxia. Entretanto, a ação do glutamato sobre devido ao aumento da pressão intracraniana
as enzimas que catalisam a sua produção leva à (PIC), que quando elevada reduz a PPC e o
liberação de grandes quantidades dessa substância FSC, intensificando a isquemia. Já o segundo é
que, aliada ao excesso de espécies reativas de consequência do deslocamento tecidual de um dos
oxigênio (ERO), passa a ofertar risco à integridade compartimentos cerebrais para outro, cursando
celular. Além disso, a interação do NO com o com risco de vida. Aproximadamente 10% dos AVEi
superóxido produz uma espécie reativa capaz de são classificados como malignos ou massivos e o
danificar o DNA, resultando não só na ativação das que define esse estado é a presença de um edema
enzimas de reparo, mas também na morte celular cerebral severo o bastante para elevar a PIC a ponto
programada 18-24
. de herniar o tecido cerebral7,12,25,28,29.
Capítulo 15 183
Território vascular Manifestações clínicas
• hemiplegia ipsilateral
lesão do território tanto
• hemianopsia homônima
SCAT superficial quanto profundo da
ACM • disfunção cortical superior (linguagem,
cálculo, função visuoespacial)
• dois dos três componentes da TACS
infartos corticais mais restritos OU
com a oclusão da divisão
• disfunção cortical superior isolada
SCAP superior da ACM ou oclusão
isolada da ACA OU
• déficit motor/sensitivo puro não tão extenso
quando o das síndromes lacunares
• déficit motor puro
• déficit sensitivo puro
• déficit sensitivo-motor
infarto lacunar no território dos
SL • hemiparesia atáxica
gânglios da base ou da ponte
• sem disfunção cortical superior ou déficit
visual
• déficits proporcionados
• síndromes cruzadas: paralisia de nervo
craniano ipsilateral + déficit sensitivo e/ou
motor contralateral
infartos que envolvem a
• déficit sensitivo e/ou motor bilateral
circulação do tronco encefálico,
SCP cerebelo e / ou lobo occipital, • alterações do movimento conjugado dos
a exemplo da ACP e artéria olhos
basilar • disfunção cerebelar sem déficit de trato
longo ipsilateral
• hemianopsia isolada ou cegueira cortical
Tabela 2: Classificação clínica de Bamford.
Fonte: Baseado em Bamford et al.,199132.
Capítulo 15 184
Na história atual do paciente, o curso descritos a seguir.
dos sintomas facilita a investigação etiológica,
fornecendo pistas sobre a provável etiologia. Pré-hospitalar
Quando a origem do AVE é a partir de uma O rápido e preciso diagnóstico do AVE por
estenose arterial por aterosclerose ou dissecção, paramédicos, médicos emergencistas e até mesmo
os sintomas neurológicos tendem a ser flutuantes pessoas da comunidade em seu primeiro contato
e são decorrentes da lesão de apenas um território com o paciente é fundamental para o rápido início do
vascular. Ao contrário, os AVEi de origem embólica tratamento adequado. Assim, o fator tempo é uma
podem ter diferentes territórios afetados ao mesmo variável decisiva no prognóstico do paciente37.
tempo, sendo os déficits súbitos e máximos desde
Dentre os principais sinais e sintomas
o início34.
apresentados pela doença teremos: paralisia ou
Na história pregressa, a ocorrência de um fraqueza facial súbita; alterações motoras em braços
ataque isquêmico transitório (AIT) prévio auxilia e / ou pernas; afasias; distúrbios da marcha; perda
no fechamento do diagnóstico, especialmente se o do equilíbrio; distúrbios visuais, e cefaleia de origem
AIT ocorreu no mesmo território vascular do AVE. É desconhecida38.
importante perguntar diretamente ao paciente se ele
Muitas vezes, o AVEi pode ter semelhanças
já apresentou sintomas transitórios de parestesias
com o AVEh quando comparamos as sintomatologias.
nos membros, dificuldade de fala ou perda visual35.
No entanto, o hemorrágico pode elevar mais
O exame físico também é um recurso que rapidamente a pressão intracraniana levando mais
auxilia na identificação da etiologia. A presença facilmente à redução do nível de consciência e
de fibrilação atrial ou sopros e de membros morte39.
frios e cianóticos falam a favor de embolia. Já a
Por conta da grande possibilidade topográfica
ausência de pulsos (radial ou carotídeo) fala a
e variações de intensidade, a doença pode
favor da aterosclerose. A constatação de sopro
apresentar sintomas diferentes e variados graus de
no pescoço guia o diagnóstico para uma doença
comprometimento. No entanto, os quadros citados
oclusiva extracraniana. A fundoscopia pode revelar
apresentam grande prevalência nos pacientes
êmbolos de colesterol amarelos e brilhantes, as
acometidos pelo AVE. Para isso, diversas escalas
placas de Hollenhorst, ou êmbolos de fibrina e
foram desenvolvidas na tentativa de identificar todos
plaquetas brancos. As manchas de Roth são áreas
os pacientes com AVE40. As escalas mais utilizadas
de hemorragia retiniana com central observadas na
são:
endocardite, uma das causas de AVE embólico36.
Capítulo 15 185
• fala anormal. Nem sempre a sintomatologia do paciente
apresenta uma imagem correspondente, mas é
• Los Angeles Prehospital Stroke Screen
de suma importância que a TC não contrastada
(LAPSS): a positividade nos 8 critérios da
exclua AVEh e outros diagnósticos diferenciais que
escala apresenta valor preditivo positivo
de 87%, com sensibilidade de 59% e es- mimetizem o AVEi.
pecificidade de 85%40. Mais recentemente, a ressonância magnética
(RM) tem sido utilizada em sua ponderação de
• idade acima dos 45 anos;
difusão (DWI) para determinação da área infartada
• sem história de convulsões ou epilep- (core) e perfusão (PWI) para determinação da área
sia; de penumbra, que é mantida por circulação colateral.
A redução da difusão do tecido na RM é o mais
• duração dos sintomas abaixo de 24h;
confiável e prematuro indicador de infarto cerebral44.
• paciente previamente em cadeira de
O conceito de perfusion-diffusion
rodas ou acamado;
mismatch é aplicado com o objetivo de mensurar
• glicemia entre 60 e 400; aproximadamente o tecido viável, mas ainda em risco
no paciente com AVE. Tem importância terapêutica
• queda óbvia em qualquer modalidade
na indicação da terapia trombolítica45.
de exame;
• prensão; e
DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
• queda dos braços.
Apesar de os sinais e sintomas serem muito
• Recognition of Stroke in Emergency Room característicos da doença, é fundamental que
(ROSIER): escala mais indicada para uti- sejam feitos diagnósticos diferenciais para correta
lização em pronto-socorro, sendo efetiva
realização do tratamento ideal. Essas doenças são
na diferenciação do AVE e seus diagnós-
denominadas stroke mimics e stroke chameleon46.
ticos diferenciais. Sua sensibilidade é de
93% e especificidade de 83%, com valor A tabela abaixo lista alguns dos possíveis
preditivo positivo de 90%37. diagnósticos diferenciais do AVEi (Tabela 3)47:
Hospitalar
Após o encaminhamento hospitalar, além do
Enxaqueca com aura Abscesso ou tumor do
diagnóstico clínico o paciente deve ser submetido Paresia pos-ictal (Paralisia SNC
a exames de imagem, a fim de identificar o AVE e de Todd) Trombose do SNC
excluir os possíveis diagnósticos diferenciais41. Transtorno conversivo TCE
Encefalopatia hipertensiva Hematoma subdural
Inicialmente, é preconizada a utilização da Esclerose múltipla Encefalite vital
Síncope Encefalopatia de Wernicke
tomografia computadorizada (TC) não contrastada.
Doença metabólica Amnésia global transitoria
Em sua fase aguda a imagem pode apresentar
Tabela 3: Diagnósticos diferenciais de AVE agudo.
edema citotóxico, perda da interface entre substância
Fonte: Adaptado de Powers et al., 201847.
branca e cinzenta e perda da delimitação entre os
sulcos e giros ou pode aparecer sem alterações. Em
alguns casos, onde o trombo se encontra na porção
TRATAMENTO
proximal da artéria cerebral média, o vaso pode se
A abordagem do AVE em fase aguda tem
apresentar com hiperdensidade42,43.
como objetivos imediatos garantir a estabilidade do
Capítulo 15 186
paciente, reverter rapidamente as condições que Critérios de inclusão
podem piorar o quadro e determinar a elegibilidade - diagnóstico clínico de AVE por déficit neurológico
para terapia trombolítica ou trombectomia quantificável
- início dos sintomas ou último horário em que o paciente
endovascular.
foi observado normal < 4,5h
- >18 anos
Medidas iniciais na urgência Critérios de exclusão absolutos
História, exame neurológico, glicose sérica, - antecedente de TCE grave ou AVEi extenso < 3 meses
- AVE hemorrágico atual
saturação de oxigênio e TC sem contraste são
- tumor intraxial, MAV ou AVE hemorrágico prévio
suficientes, na maioria dos casos, para orientar a - hemorragia gastrointestinal < 21 dias
terapia aguda. Outros testes são considerados, - cirurgia crânio ou espinhal < 3 meses
- coagulopatia conhecida
dependendo das características individuais do
- hemorragia ativa
paciente, mas a ausência ou indisponibilidade de - história típica de HSA
qualquer teste não é motivo para adiar a terapia. - endocardite infecciosa/dissecção aorta
Critérios de exclusão relativos
• vias aéreas, respiração e circulação: ava- - idade < 18 anos
liar os sinais vitais e garantir a estabilização - sintomas em melhora (novo NIH <4)
das vias aéreas, respiração e circulação - uso de anticoagulante oral*, **
fazem parte da avaliação inicial de todos - gravidez ou lactação
- crise convulsiva no inicio (fenômeno de Todd)
os pacientes com doença crítica, incluindo
- tumor extraxial, aneurisma pequeno não roto
aqueles com AVE47. Pacientes com que- - punção arterial ou lombar < 7 dias**
da do nível de consciência ou disfunção - cirurgia maior, aborto ou trauma ≤ 14 dias**
bulbar podem não conseguir proteger as - hemorragia trato genitourinário ≤ 21 dias**
vias aéreas e aqueles com PIC aumenta- - IAM/Pericardite pós-IAM ≤ 3 meses**
da por hemorragia ou isquemia hemisfé- Tabela 4: Critérios de elegibilidade para trombólise.
rica podem apresentar vômito, diminuição *
Considerar fármaco anticoagulante e coagulograma.
do drive respiratório ou obstrução das vias **
Considerar trombólise intraarterial ou trombectomia.
aéreas. Nesses casos, a intubação pode
Fonte: Adaptado de Connolly et al., 201248.
ser necessária para restaurar a ventilação
adequada e proteger as vias aéreas. Pa-
cientes hipóxicos devem receber oxigênio O exame neurológico deve tentar confirmar
suplementar para manter uma saturação
os achados da história e fornecer um exame
>94%; e
quantificável para posterior avaliação ao longo do
• história clínica e exame neurológico: é tempo. Uma das escalas mais utilizada é a National
fundamental estabelecer o tempo de início Institutes of Health Stroke Scale (NIHSS)47.
dos sintomas do AVEi porque é o principal
A pontuação do NIHSS na admissão foi
determinante da elegibilidade para o tra-
tamento com trombólise intravenosa (me- correlacionada com o desfecho clínico do AVE49,50, e
nos de 4,5h após o início dos sintomas) e seu uso é recomendado para todos os pacientes com
trombectomia endovascular (até 24h após suspeita de AVE51. Algumas situações com NIHSS
o início dos sintomas)48. Para pacientes baixo poderiam não ter indicação de trombólise,
que não conseguem definir o tempo de iní- como NIH < 4 com sintomas de circulação anterior
cio do déficit neurológico, o início dos sin-
ou afasia ou déficit visual isolado. Efetuam-se
tomas é definido como o horário em que o
avaliações do estado neurológico a cada 15 min
paciente foi observado normal pela última
vez47 (Tabela 4). durante a infusão do trombolítico e a cada 30 min
durante as primeiras 6h. Após isso, durante as
primeiras 24h, é recomendável avaliações a cada
hora. O aumento do escore do NIHSS, em 4 pontos
Capítulo 15 187
ou mais, é sinal de alerta para hemorragia e sugere co e avaliar a indicação de trombectomia
reavaliação tomográfica . 52 mecânica. Estudos perfusionais avança-
dos de TC e RM podem ser capazes de
Exames distinguir a área de penumbra isquêmica,
permitindo melhor seleção de pacientes
Todos pacientes com suspeita de AVE devem
que provavelmente se beneficiarão da te-
ser monitorizados e submetidos aos seguintes
rapia de reperfusão.
exames:
Fluidos: a depleção de volume intravascular é
• glicemia capilar; frequente no quadro de AVE agudo, particularmente
em pacientes idosos, o que pode piorar o fluxo
• exames laboratoriais (hemograma incluín-
do plaquetas, coagulograma, ureia, creati- sanguíneo cerebral53. Para a maioria dos pacientes
nina, sódio, potássio, CK-MB e troponina): com hipovolemia, a solução salina isotônica sem
pode se trombolisar antes do coagulogra- dextrose é o agente de escolha para reposição
ma, exceto se em uso de anticoagulantes de fluidos intravasculares e fluidoterapia de
orais ou coagulopatia conhecida. Poderia manutenção . 54
Capítulo 15 188
a redução da PA, em caso de hipertensão extrema os pacientes com AVE poderiam ser elegíveis para
(pressão arterial sistólica >220 mmHg ou pressão trombectomia69.
arterial diastólica >120 mmHg), ou pacientes com
Em geral, a trombectomia mecânica em
doença coronária isquêmica ativa, insuficiência
paciente com oclusão de artéria proximal e sem
cardíaca, dissecção da aorta, encefalopatia
muitas comorbidades tem poucas contraindicações.
hipertensiva ou pré-eclâmpsia / eclâmpsia47,65.
Até pacientes que são inelegíveis para trombólise
Quando o tratamento é indicado, a redução cautelosa
intravenosa, devido a um risco de sangramento
de aproximadamente 15% da pressão arterial é
sistêmico, poderiam ser tratados por via
sugerida nas primeiras 24h após o início do AVE.
endovascular. A abordagem vascular proximal pode
O uso de anti-hipertensivos endovenosos como o
complicar o procedimento e reduzir a probabilidade
metoprolol, labetalol e nicardipina é recomendável,
de sucesso, mas geralmente não impediria uma
o nitruprusiato de sódio é escolha de segunda
tentativa de trombectomia em um candidato bom.
linha (risco de aumento de pressão intracraniana e
A trombectomia mecânica está associada a risco
plaquetopenia)47.
de transformação hemorrágica do AVE, porém ao
Trombólise: a trombólise com alteplase é analisar ensaios, verificou-se que ocorreu em uma
o tratamento de primeira linha nos pacientes com proporção semelhante em pacientes que foram
AVEi dentro da janela terapêutica de 4,5h do ictus e submetidos a trombólise66. Pode ocorrer perfuração
que cumprem os critérios de inclusão (Tabela 2). A ou dissecção arterial, mas foi relativamente
dose indicada é de 0,9 mg/kg (dose máxima de 90 incomum (aproximadamente 1,3%) nos centros
mg) em infusão contínua por 60 minutos, sendo 10% com experiência que participaram de estudos
da dose administrada em bolus intravenoso . 31
randomizados70.
Capítulo 15 189
Figura 1: Algoritmo de manejo do AVE agudo.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 2: Trombectomia mecânica. A. Arteriografia cerebral com oclusão proximal de artéria cerebral média. B.
Arteriografia cerebral após trombectomia mecânica, com revascularização da artéria cerebral média. C. Trombos
extraídos no procedimento.
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 15 190
basilar é objeto de estudos randomizados em
Prevenção secundária do AVE
andamento, mas é amplamente aceita como
Após a fase aguda, os pacientes devem
uma intervenção efetiva baseada nos resultados
receber investigação diagnóstica complementar,
endovasculares da circulação anterior.
antes da alta hospitalar, com o objetivo de definir o
A angioplastia em pacientes com infarto agudo mecanismo e a etiologia do AVE, visando definição
de miocárdio tem substituído a trombólise nas regiões do melhor tratamento de prevenção secundária para
metropolitanas74. Contudo, para o AVEi, a trombólise evitar recorrências e planejamento da reabilitação.
intravenosa permanece como terapia-padrão para
todos os pacientes elegíveis, onde a trombectomia
é, então, adicionada sem demora. O tempo entre REFERÊNCIAS
a administração intravenosa do trombolítico e a 1. Teixeira SS, Merida KB, Leal AG. Neurovascular. In:
Leal AG, Novak Filho JL (eds). Neuro Fundamental. 1a ed.
trombectomia mecânica varia de alguns minutos
Curitiba: CRV; 2019. p. 65–72.
a várias horas, dependendo da necessidade de
2. Casaubon LK, Boulanger JM, Glasser E, et al. Canadian
transferência inter-hospitalar e o tempo necessário Stroke Best Practice Recommendations: Acute Inpatient
para transporte. Estão em andamento ensaios Stroke Care Guidelines, Update 2015. Int J Stroke.
2016;11(2):239-252.
para testar se a trombectomia sem trombólise
3. Krishnamurthi RV, Feigin VL, Forouzanfar MH, et al.
intravenosa não é inferior quando a trombectomia é Global and regional burden of first-ever ischaemic and
imediatamente acessível. No entanto, esse problema haemorrhagic stroke during 1990-2010: findings from the
Global Burden of Disease Study 2010. Lancet Glob Health.
se aplica apenas a uma minoria de pacientes 2013;1(5):e259-81.
elegíveis para trombectomia. O estudo INTERSECT 4. Lozano R, Naghavi M, Foreman K, et al. Global
demonstrou que aproximadamente 60% das and regional mortality from 235 causes of death for 20
age groups in 1990 and 2010: a systematic analysis
oclusões de grandes vasos podem eventualmente
for the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet.
ser dissolvidas por alteplase, mas isso pode levar 2012;380(9859):2095-2128.
até 6h dependendo da localização do trombo75. 5. Feigin VL, Forouzanfar MH, Krishnamurthi R, et al. Global
and regional burden of stroke during 1990–2010: findings
from the Global Burden of Disease Study 2010. Lancet.
Outras orientações 2014;383(9913):245–255.
• unidade especializada: estudos sugerem 6. Bensenor IM, Goulart AC, Szwarcwald CL, Vieira ML,
que pacientes com AVE agudo têm melho- Malta DC, Lotufo PA. Prevalence of stroke and associated
disability in Brazil: National Health Survey-2013. Arq
res resultados quando internados em uma Neuropsiquiatr. 2015;73(9):746-750.
unidade especializada no atendimento de
7. Caplan L. Basic Pathology, Anatomy, and Pathophysiology
pacientes com AVE (UTI ou unidade crítica of Stroke. In: Caplan L. Caplan’s Stroke. A clinical apporach.
neurológica); 4th ed. Philadelphia: Saunders Elsevier, 2009. p.22-63.
8. Markus HS. Cerebral perfusion and stroke. J Neurol
• antiagregação plaquetária: iniciar aspirina Neurosurg Psychiatry. 2004;75(3):353-361.
nas primeiras 48h o mais rápido possível;
9. Colli B. Hipertensão intracraniana. J Bras Neurocir.
1990:2(1):30-39.
• profilaxia de trombose venosa profunda:
iniciar uso profilático subcutâneo de hepa- 10. Atkins ER, Brodie FG, Rafelt SE, Panerai RB, Robinson
TG. Dynamic cerebral autoregulation is compromised
rina de baixo peso molecular (enoxapari- acutely following mild ischaemic stroke but not transient
na 40 mg/dia) ou heparina não fracionada ischaemic attack. Cerebrovasc Dis. 2010;29(3):228‐235.
(5000 UI – 8/8h), observando também o 11. Aries MJ, Elting JW, De Keyser J, Kremer BP, Vroomen
protocolo de cada serviço de tromboem- PC. Cerebral autoregulation in stroke: a review of
bolismo pulmonar; e transcranial Doppler studies. Stroke. 2010;41(11):2697‐2704.
12. Deb P, Sharma S, Hassan KM. Pathophysiologic
• uso de estatinas: recomenda-se o uso de mechanisms of acute ischemic stroke: An overview with
estatinas assim que o paciente tolere a via emphasis on therapeutic significance beyond thrombolysis.
Pathophysiology. 2010;17(3):197‐218.
oral.
Capítulo 15 191
13. Doyle KP, Simon RP, Stenzel-Poore MP. Mechanisms 31. Campbell BCV, De Silva DA, Macleod MR, Coutts SB,
of ischemic brain damage. Neuropharmacology. Schwamm LH, Davis SM, et al. Ischaemic stroke. Nat Rev
2008;55(3):310-318. Dis Primers. 2019;5:70.
14. Douen AG, Akiyama K, Hogan MJ, et al. intraischemic 32. Bamford J, Sandercock P, Dennis M, Burn J,
cerebral glutamate levels and down-regulates excitatory amino Warlow C. Classification and natural history of clinically
acid transporters EAAT1 and EAAT2 from rat cerebal cortex identifiable subtypes of cerebral infarction. Lancet.
plasma membranes. J Neurochem. 2000;75(2):812-818. 1991;337(8756):1521-1526.
15. Szatkowski M, Barbour B, Attwell D. Non-vesicular 33. Parmar P, Sumaria S, Hashi S. Stroke: classification and
release of glutamate from glial cells by reversed electrogenic diagnosis. Clinical Pharmacist. 2011;3:200-202.
glutamate uptake. Nature. 1990;348(6300):443‐446.
34. Caplan LR, Gorelick PB, Hier DB. Race, sex and
16. Rossi DJ, Oshima T, Attwell D. Glutamate release occlusive cerebrovascular disease: a review. Stroke.
in severe brain ischaemia is mainly by reversed uptake. 1986;17(4):648‐655.
Nature. 2000;403:316-321.
35. Boehme AK, Esenwa C, Elkind MS. Stroke Risk Factors,
17. Grewer C, Gameiro A, Zhang Z, Tao Z, Braams S, Rauen Genetics, and Prevention. Circ Res. 2017;120(3):472-495.
T. Glutamate forward and reverse transport: from molecular
36. Smith WS, Johnston SC, Hemphill JC. Doenças
mechanism to transporter-mediated release after ischemia.
Vasculares Encefálicas. In: Kasper DL, Hauser SL, Jameson
IUBMB Life. 2008;60(9):609-619.
JL, et al. (eds). Medicina Interna de Harrison. 19ª ed. Porto
18. Nandagopal K, Dawson TM, Dawson VL. Critical role Alegre: AMGH, 2017. p. 10287-10363.
for nitric oxide signaling in cardiac and neuronal ischemic
37. Zhelev Z, Walker G, Henschke N, Fridhandler J, Yip
preconditioning and tolerance. J Pharmacol Exp Ther.
S. Prehospital stroke scales as screening tools for early
2001;297(2):474‐478.
identification of stroke and transient ischemic attack.
19. Lu GW, Liu HY. Downregulation of nitric oxide in the brain Cochrane Database Syst Rev. 2019;4(4):CD011427.
of mice during their hypoxic preconditioning. J Appl Physiol.
38. Rymer MM. Hemorrhagic stroke: intracerebral
2001;91(3):1193‐1198.
hemorrhage. Mo Med. 2011;108(1):50-54.
20. Bolaños JP, Almeida A. Roles of nitric oxide in brain
39. Tambara EM. Diretrizes para atendimento pré-hospitalar
hypoxia-ischemia. Biochim Biophys Acta. 1999;1411(2-
no acidente vascular encefálico. In: Cavalcante IL, Cantinho
3):415‐436.
FAF, Assad AR. (eds). Medicina Perioperatória. Rio de
21. Love S. Oxidative stress in brain ischemia. Brain Pathol. Janeiro: SAERJ, 2006. p. 77-83.
1999;9(1):119‐131.
40. Nor AM, Davis J, Sen B, et al. The Recognition of Stroke
22. Mattson MP, Kroemer G. Mitochondria in cell death: in the Emergency Room (ROSIER) scale: development and
novel targets for neuroprotection and cardioprotection. validation of a stroke recognition instrument. Lancet Neurol.
Trends Mol Med. 2003;9(5):196‐205. 2005;4(11):727-734.
23. Leist M, Single B, Castoldi AF, Kühnle S, Nicotera P. 41. Eswaradass P, Appireddy R, Evans J, et al. Imaging in
Intracellular adenosine triphosphate (ATP) concentration: acute stroke. Expert Rev Cardiovasc Ther. 2016;14(8):963-
a switch in the decision between apoptosis and necrosis. J 975.
Exp Med. 1997;185(8):1481‐1486.
42. Rolim CVLRC, Martins M. O uso de tomografia
24. Lipton P. Ischemic cell death in brain neurons. Physiol computadorizada nas internações por Acidente Vascular
Rev. 1999;79(4):1431‐1568. Cerebral no Sistema Único de Saúde no Brasil. Rev. bras.
epidemiol. 2012;15(1):179-187.
25. Back T, Hemmen T, Schüler OG. Lesion evolution in
cerebral ischemia. J Neurol. 2004;251(4):388‐397. 43. Gonçalves FG, Barra FR, Matos VL, Jovem CL, Amaral
LLF, delCarpio-O’Donovan R. Sinais em neurorradiologia:
26. Coyle JT, Puttfarcken P. Oxidative stress,
parte 1. Radiol Bras. 2011;44(2):123-128.
glutamate, and neurodegenerative disorders. Science.
1993;262(5134):689‐695. 44. González RG. Clinical MRI of acute ischemic stroke. J
Magn Reson Imaging. 2012;36(2):259-271.
27. Rosell A, Lo EH. Multiphasic roles for matrix
metalloproteinases after stroke. Curr Opin Pharmacol. 45. Chen F, Ni YC. Magnetic resonance diffusion-perfusion
2008;8(1):82‐89. mismatch in acute ischemic stroke: An update. World J
Radiol. 2012;4(3):63-74.
28. Simard JM, Kent TA, Chen M, Tarasov KV, Gerzanich
V. Brain oedema in focal ischaemia: molecular 46. Erbguth F. Stroke Mimics and Stroke Chameleons:
pathophysiology and theoretical implications. Lancet Neurol. Differential Diagnosis of Stroke. Fortschritte der Neurologie-
2007;6(3):258‐268. psychiatrie. 2017;85(12):747-764.
29. Yang Y, Rosenberg GA. Blood-brain barrier breakdown 47. Powers WJ, Rabinstein AA, Ackerson T, et al. 2018
in acute and chronic cerebrovascular disease. Stroke. Guidelines for the Early Management of Patients With Acute
2011;42(11):3323‐3328. Ischemic Stroke: A Guideline for Healthcare Professionals
From the American Heart Association/American Stroke
30. Klatzo I. Pathophysiological aspects of brain edema.
Association. Stroke. 2018;49(3):e46-e110.
Acta Neuropathol. 1987;72(3):236‐239.
Capítulo 15 192
48. Connolly ES Jr, Rabinstein AA, Carhuapoma JR, et al. 62. Parsons MW, Barber PA, Desmond PM, et al. Acute
Guidelines for the management of aneurysmal subarachnoid hyperglycemia adversely affects stroke outcome: a magnetic
hemorrhage: a guideline for healthcare professionals from resonance imaging and spectroscopy study. Ann Neurol.
the American Heart Association/american Stroke Association. 2002;52(1):20-28.
Stroke. 2012;43(6):1711-1737.
63. Bruno A, Levine SR, Frankel MR, et al. Admission
49. The NINDS t-PA Stroke Study Group. Generalized glucose level and clinical outcomes in the NINDS rt-PA
efficacy of t-PA for acute stroke. Subgroup analysis of the Stroke Trial. Neurology. 2002;59(5):669-674.
NINDS t-PA Stroke Trial. Stroke. 1997;28:2119-2125.
64. Ginsberg MD, Busto R. Combating hyperthermia
50. Adams HP Jr, Davis PH, Leira EC, et al. Baseline NIH in acute stroke: a significant clinical concern. Stroke.
Stroke Scale score strongly predicts outcome after stroke: 1998;29(2):529‐534.
A report of the Trial of Org 10172 in Acute Stroke Treatment
65. Jauch EC, Saver JL, Adams HP Jr, et al. Guidelines
(TOAST). Neurology. 1999;53(1):126-131.
for the early management of patients with acute ischemic
51. Adams HP Jr, del Zoppo G, Alberts MJ, et al. Guidelines stroke: a guideline for healthcare professionals from the
for the early management of adults with ischemic stroke: a American Heart Association/American Stroke Association.
guideline from the American Heart Association/American Stroke. 2013;44(3):870-947.
Stroke Association Stroke Council, Clinical Cardiology
66. Goyal M, Menon BK, van Zwam WH, et al. Endovascular
Council, Cardiovascular Radiology and Intervention Council,
thrombectomy after large-vessel ischaemic stroke: a meta-
and the Atherosclerotic Peripheral Vascular Disease and
analysis of individual patient data from five randomised trials.
Quality of Care Outcomes in Research Interdisciplinary
Lancet. 2016;387(10029):1723-1731.
Working Groups: The American Academy of Neurology
affirms the value of this guideline as an educational tool for 67. Nogueira RG, Jadhav AP, Haussen DC, et al.
neurologists. Circulation. 2007;115(20):e478-534. Thrombectomy 6 to 24 Hours after Stroke with a Mismatch
between Deficit and Infarct. N Engl J Med. 2018;378(1):11-
52. Martins SCO, Freitas GR de, Pontes-Neto OM, et al .
21.
Guidelines for acute ischemic stroke treatment: part II: stroke
treatment. Arq. Neuro-Psiquiatr. 2012;70(11): 885-893. 68. Albers GW, Marks MP, Kemp S, et al. Thrombectomy for
Stroke at 6 to 16 Hours with Selection by Perfusion Imaging.
53. Rodriguez GJ, Cordina SM, Vazquez G, et al. The
N Engl J Med. 2018;378(8):708-718.
hydration influence on the risk of stroke (THIRST) study.
Neurocrit Care. 2009;10(2):187-94. 69. Chia NH, Leyden JM, Newbury J, Jannes J, Kleinig TJ.
Determining the Number of Ischemic Strokes Potentially
54. Burns JD, Green DM, Metivier K, DeFusco C. Intensive
Eligible for Endovascular Thrombectomy: A Population-
care management of acute ischemic stroke. Emerg Med Clin
Based Study. Stroke. 2016;47(5):1377‐1380.
North Am. 2012;30(3):713‐744.
70. Campbell BCV, van Zwam WH, Goyal M, et al. Effect of
55. Weir CJ, Murray GD, Dyker AG, Lees KR. Is
general anaesthesia on functional outcome in patients with
hyperglycaemia an independent predictor of poor outcome
anterior circulation ischaemic stroke having endovascular
after acute stroke? Results of a long-term follow up study.
thrombectomy versus standard care: a meta-analysis of
BMJ. 1997;314(7090):1303‐1306.
individual patient data. Lancet Neurol. 2018;17(1):47-53.
56. Bruno A, Biller J, Adams HP Jr, et al. Acute blood glucose
71. Broderick JP, Palesch YY, Demchuk AM, et al.
level and outcome from ischemic stroke. Trial of ORG 10172
Endovascular therapy after intravenous t-PA versus t-PA
in Acute Stroke Treatment (TOAST) Investigators. Neurology.
alone for stroke. N Engl J Med. 2013;368(10):893-903.
1999;52(2):280-284.
72. Lapergue B, Blanc R, Gory B, et al. Effect of
57. Capes SE, Hunt D, Malmberg K, Pathak P, Gerstein HC.
Endovascular Contact Aspiration vs Stent Retriever on
Stress hyperglycemia and prognosis of stroke in nondiabetic
Revascularization in Patients With Acute Ischemic Stroke
and diabetic patients: a systematic overview. Stroke.
and Large Vessel Occlusion: The ASTER Randomized
2001;32(10):2426-2432.
Clinical Trial. JAMA. 2017;318(5):443-452.
58. Dave JA, Engel ME, Freercks R, et al. Abnormal glucose
73. Turk AS, Siddiqui AH, Mocco J. A comparison of
metabolism in non-diabetic patients presenting with an acute
direct aspiration versus stent retriever as a first approach
stroke: prospective study and systematic review. QJM.
(‘COMPASS’): protocol. J NeuroInterv Surg. 2018;10:953-
2010;103(7):495-503.
957.
59. Béjot Y, Aboa-Eboulé C, Hervieu M, et al. The deleterious
74. O’Gara PT, Kushner FG, Ascheim DD, et al. 2013
effect of admission hyperglycemia on survival and functional
ACCF/AHA guideline for the management of ST-elevation
outcome in patients with intracerebral hemorrhage. Stroke.
myocardial infarction: a report of the American College of
2012;43(1):243-245.
Cardiology Foundation/American Heart Association Task
60. Zonneveld TP, Nederkoorn PJ, Westendorp WF, et Force on Practice Guidelines. Circulation. 2013;127(4):e362-
al. Hyperglycemia predicts poststroke infections in acute 425.
ischemic stroke. Neurology. 2017;88(15):1415-1421.
75. Menon BK, Al-Ajlan FS, Najm M, et al. Association
61. Lindsberg PJ, Roine RO. Hyperglycemia in acute stroke. of Clinical, Imaging, and Thrombus Characteristics With
Stroke. 2004;35:363-364. Recanalization of Visible Intracranial Occlusion in Patients
With Acute Ischemic Stroke. JAMA. 2018;320(10):1017-1026.
Capítulo 15 193
CAPÍTULO 16
VASCULITES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Leandro José Haas desse fator, bem como à reparação com consequentes
alterações da espessura e diâmetro do vaso1.
Bernardo Przysiezny
Em diversas vasculites primárias, os eventos
imunopatogênicos que iniciam a inflamação vascular
INTRODUÇÃO ainda não são conhecidos1. Em situações de resposta
As vasculites representam desordens inflamatória persistente ou exagerada, em vez de haver
caracterizadas pela inflamação e lesão da parede dos um reparo eficaz, pode ocorrer a lesão vascular. Nas
vasos sanguíneos. Sua definição histopatológica constitui vasculites primárias são descritos mecanismos de lesão
a presença de infiltrado inflamatório no lúmen do vaso, relacionados com anticorpos. Isso ocorre por lesão direta,
associado a lesão mural e isquemia dos tecidos supridos pela deposição de imunocomplexos ou pela sua interação
pelo mesmo .1,2 com os neutrófilos, sobretudo nas vasculites de pequenos
vasos. Embora a patogenia exata permaneça incerta, em
O diagnóstico das vasculites apresenta implicações
todos os casos, o sistema imune desempenha um papel
terapêuticas importantes1. O reconhecimento precoce da
central, e os agentes imunossupressores constituem a
clínica, dos achados radiológicos e histopatológicos é
base do tratamento.
vital para orientação diagnóstica e essencial para evitar
danos permanentes no sistema nervoso central (SNC) e As vasculites primárias podem ser classificadas
no sistema nervoso periférico (SNP)3. também pela sua etiologia no envolvimento exclusivo
do órgão alvo como primária não sistêmica, ou de forma
As vasculites do SNC constituem um amplo
sistêmica, com acometimento de múltiplos órgãos e
e heterogêneo grupo de doenças inflamatórias que
tecidos, classificada como primária sistêmica.
acometem os vasos sanguíneos das leptomeninges e
do parênquima cerebral, de forma que qualquer tipo, Nas vasculites em que sua etiologia relaciona-se
tamanho e localização de vaso sanguíneo podem ser com lesão direta e/ou resposta imunológica a antígenos
acometidos. A vasculite e suas consequências, podem conhecidos, como, por exemplo, agentes infecciosos,
ser a manifestação primária, ou única, de uma doença. fármacos, substâncias tóxicas, neoplasia, ou mediada
Contudo, a vasculite pode ser um componente secundário imunologicamente por doenças do tecido conjuntivo, são
de amplas condições como infecções, neoplasias, conhecidas como vasculites secundárias1.
doenças do tecido conjuntivo e uso de drogas2. Ao tentar distinguir e classificar o tipo das vasculites
Presume-se de modo geral, que a maioria das do sistema nervoso central, diversas classificações
síndromes seja, pelo menos em parte, mediada por foram elaboradas, ora embasada no tamanho dos vasos
mecanismos imunopatogênicos, que ocorrem em resposta acometidos, ou nas suas características histológicas ou
a certos estímulos antigênicos2. A inflamação decorrente de marcadores imunológicos4.
da lesão vascular relacionada com determinado agente O Consenso Internacional de Chapel Hill, realizado
é, no indivíduo normal, transitória e conduz à eliminação em 2012, propôs um sistema de nomenclatura revisado
Capítulo 16 194
de forma a classificar as vasculites considerando presença de AVEs recorrentes, indivíduos jovens
múltiplos fatores, incluindo o tamanho dos vasos e sem risco cardiovascular ou hipercoagulobidade
acometimento primário ou secundário . (Tabela 1)
5
reconhecida, meningites crônicas com sintomas
neurológicos recorrentes, disfunção neurológica
ou medular inexplicada não associada a alguma
ANGEÍTE PRIMÁRIA DO SISTEMA doença sistêmica ou agente causador conhecido1,2,6.
NERVOSO CENTRAL (APSNC)
A vasculite isolada do SNC, também
Diagnóstico
conhecida por vasculite primária do sistema nervoso
O diagnóstico da APSNC é desafiador à
central, está associada a inflamação e destruição
medida que os sintomas são inespecíficos, assim
preferencial de vasos de pequenos e médio calibre
como não existem testes diagnósticos específicos
do parênquima cerebral, da medula espinhal e das
para doença. A abordagem inicial se dá por uma
leptomeninges, resultando em sinais e sintomas de
completa avaliação sistêmica excluindo outras
disfunção do SNC6.
desordens.
O termo angeíte é sinônimo de vasculite e
A avaliação complementar deve ser guiada por
refere-se ao comprometimento dos vasos sanguíneos
uma boa história clínica, com completa revisão de
arteriais e venosos. A APSNC é considerada uma
órgãos e sistemas e adequado exame físico. Essa
doença rara, com incidência anual de 2,4 casos por
avaliação permite, por um lado, verificar se existe
milhão de indivíduos-ano, com maior acometimento
insulto a outros órgãos, e por outro, caracterizar o
em indivíduos do sexo masculino (2:1) diagnosticados
padrão de envolvimento vascular e diagnosticar
em torno dos 50 anos, com possibilidade de ocorrer
possíveis causas de vasculites secundárias. Em
em qualquer idade6.
1998, Calabrese e Mallek elaboraram um conjunto
A etiologia e patogenia não são bem de critérios diagnósticos da APSNC do qual, o
esclarecidas. Associa-se com agentes infecciosos diagnóstico é estabelecido quando todos os três
como herpes-vírus-zóster, vírus do Nilo Ocidental critérios se fazem presentes7:
e vírus varicela-zóster, como possíveis causas ou
fatores desencadeantes3. • história ou apresentação clínica de déficit
neurológico adquirido de origem desco-
nhecida;
Quadro clínico
• exame de angiografia cerebral apresen-
As manifestações da APSNC são variáveis
tando características clássicas de vascu-
e inespecíficas, e sua evolução clínica pode se lite ou exame histopatológico de tecido de
apresentar com formas hiperaguda e gradual até SNC evidenciando vasculite; e
crônica e insidiosa. O quadro clínico mais frequente
consiste em estado de obnubilação mental e redução • ausência de sinais de vasculite sistêmica
ou de qualquer outro distúrbio que possam
da capacidade cognitiva. Devido à possibilidade de
ser atribuídas às características dos exa-
acidente vascular encefálico (AVE), quadros com
mes de imagem e histopatológico.
cefaleias, crises epilépticas e déficits neurológicos
focais podem ser observados. Sinais e sintomas Apesar de não haver exame complementar
periférica, febre, perda ponderal ou exantema, não exames complementares podem desempenhar
Capítulo 16 195
International Chapel Hill Consensus Conference 2012 (CHCC)
1. Vasculite primária com envolvimento exclusivo do
Angeíte Primária do SNC (APSNC)
sistema nervoso central
2. Vasculites sistêmicas primárias com envolvimento do sistema nervoso central
Arterite de Células Gigantes (ACG)
2.1. Vasos de Grande calibre
Arterite de Takayasu
Poliarterite Nodosa (PAN)
2.2. Vasos de Médio calibre
Doença de Kawasaki
Capítulo 16 196
(PCR), estão habitualmente sem alterações. A
análise do líquido cerebroespinhal (LCS) auxilia
na distinção do diagnóstico, em que a maioria dos
doentes com APSNC apresentam LCS com elevação
de leucócitos e de proteínas8.
Capítulo 16 197
de APSNC9. O procedimento é seguro, com baixo
risco de sequelas, em que um exame positivo
confirma vasculite e exclui doenças mimetizadoras.
A taxa de resultados falso-negativos é de 25% e,
em alguns casos, podem ser necessários, duas
ou mais biópsias para estabelecer o diagnóstico.
A taxa de positividade da biópsia melhora com
maiores amostras teciduais, incluindo meninges
sobrejacentes, examinando áreas que se
apresentaram afetadas com realce na RM . No 10
anos, com melhor prognóstico sem a necessidade em pacientes com APSNC. O tratamento na
do uso crônico de imunossupressores. APSNC tem sido análogo àqueles utilizados para
outras vasculites, em geral, por meio do uso de
Apesar da evolução de técnicas menos
glicocorticoides3,8,12.
invasivas, como a angiografia cerebral, a biópsia
do SNC (parênquima cerebral e leptomeníngea) Em situações agudas, a nível hospitalar,
continua sendo o exame padrão-ouro no diagnóstico inicia-se terapia empírica com metilprednisolona
Capítulo 16 198
endovenosa, 15mg/kg/dia, por 3 a 5 dias, seguido papel fisiopatológico, desencadeando uma cascata
por prednisona, 1 mg/kg/dia, por 4 a 6 semanas. patogênica e recrutando células T e macrófagos
na formação de infiltrados granulomatosos3. A ACG
Nos casos de menor gravidade a nível
caracteriza-se classicamente por uma combinação
ambulatorial, inicia-se terapia única com prednisona
de três de cinco critérios:
por 4 a 6 semanas, com desmame de forma gradual.
Capítulo 16 199
endovenosa, 1000 mg/dia, por 3 dias consecutivos,
Diagnóstico
continuado por terapia via oral com prednisona.
Na investigação laboratorial é comum
encontrar valores elevados de VHS e PCR, sendo Nos casos que já apresentaram ou possuem
o exame de VHS considerado um importante exame elevado risco para efeitos adversos pelo uso de
o padrão-ouro para diagnosticar ACG. Inicialmente, a ser bom, com rápida melhora clínica após início do
Em casos da biópsia ser negativa para ACG, glicorticoides é extremamente satisfatória, com
fato que pode ocorrer em até 40% dos pacientes rápida evolução. Os benefícios no tratamento
com suspeita de ACG, a decisão de realizar uma em associação com ácido acetilsalicílico a fim de
nova biópsia controlateral dependerá da suspeita prevenir eventos isquêmicos permanece incerto na
Capítulo 16 200
apresentar alteração nos valores de fase aguda doença (DARMD) não biológico como, por exemplo,
como o VHS e PCR. Devido à localização dos vasos metotrexato e ciclosporina, com um DARMD
acometidos, a histopatologia se torna impraticável, biológico, como adalimumab e infliximabe.
mas, ocasionalmente, pode-se obter amostras após
Em indivíduos com quadro de isquemia
procedimentos endovasculares.
crítica devido a estenose arterial ou nas
Nesta condição, os exames de imagem se formações de grandes aneurismas, podem ser
tornam imprescindíveis na definição diagnóstica necessárias intervenções endovasculares ou outros
da TAK e na avaliação do acometimento vascular. procedimentos cirúrgicos que devem ser realizados
Os pacientes devem ser submetidos a angioTC ou após a remissão da doença, visto o risco de aumentar
angioRM a fim de avaliar o lúmen arterial cervical, a estenose presente29.
craniano, torácico, abdominal e de outras áreas do
corpo, revelando estreitamento cônico ou oclusão
que pode ser acompanhado de adelgaçamento da POLIARTERITE NODOSA (PAN)
parede do vaso28. Também conhecida como panarterite nodosa,
periarterite nodosa ou doença de Kussmaul-Meier,
Conduta essa vasculite afeta tipicamente vasos de pequeno
A doença é caracterizada por apresentar e médio calibre30. É considerada uma vasculite
clínica flutuante, com períodos de exacerbações sistêmica necrotizante, rara, que acomete mais
e remissões, em que apenas 20% dos casos homens do que mulheres, podendo acometer
apresentam curso de doença limitado, enquanto que adultos jovens e mais velhos com pico na quarta à
a maioria requer terapia imunossupressora a longo sexta décadas de vida31.
prazo.
Sua patogênese é pouco conhecida, mas sabe-
O uso de estratégias combinadas aos se que a infecção pelo vírus da hepatite B (HBV),
glicocorticoides sugerem apresentar benefícios no assim como a leucemia de células pilosas, podem
controle da doença a longo prazo. Para maioria dos ser importantes causas de sua patogênese através
pacientes com TAK ativa, inicia-se tratamento com da deposição de imunocomplexos32,33. A inflamação
doses altas de prednisona com terapia combinada, vascular começa na camada adventícia, podendo
de modo que, a escolha dessa medicação combinada progredir para pan-arterite, resultando em necrose
dependerá de diversos fatores como presença de fibrinoide, podendo formar múltiplos aneurismas
comorbidades, idealização de gestação, custos pequenos que, à medida em que progridem, podem
terapêuticos e disponibilidade de específicas ocluir o vaso ou sofrerem ruptura, resultando em
medicações. O metotrexato 20 a 25 mg por hemorragia ou infarto3.
semana ou a azatioprina 2mg/kg/dia, assim como
o micofenolato de mofetila podem ser considerados Quadro clínico
boas opções na terapia combinada.
O início dos sintomas pode cursar de insidioso
Em casos selecionados, conforme a severidade até complicações agudas e fatais. O doente
da doença, a associação com um inibidor do fator de apresenta-se com HAS renovascular sem história de
necrose tumoral (TNF) com glicocorticoide possui hipertensão, azotemia, livedo reticular, aneurismas
boa aceitação. e anginas mesentérica e testicular. A neuropatia
periférica, na forma de mononeurite múltipla,
Nos casos de progressão da doença sem
sendo esta uma disfunção simultânea de dois ou
melhora com terapia inicial, pode-se combinar
mais nervos periféricos de regiões distintas do
o uso de drogas modificadoras de atividade da
corpo cursando com fraqueza, constitui o distúrbio
Capítulo 16 201
neurológico mais comum. O envolvimento do SNC
Conduta
é menos frequente, ocorre em torno de 5 a 15% dos
O tratamento permanece incerto, varia de
pacientes com PAN34. As manifestações de SNC
acordo com a gravidade da doença, incluindo
variam desde cefaleia, retinopatia, encefalopatias
glicocorticoides em doses altas nas formas mais
com crises epilépticas e declínio cognitivo até
leves da doença a associações com agentes
hemorragia intracerebral35.
imunossupressores como azatioprina, metotrexato
ou ciclofosfamida.
Diagnóstico
Nos casos leves e com combinação pela
Os achados de exame físico e clínica do
infecção por HBV ou HCV, inicia-se administração
paciente, assim como os achados laboratoriais,
de antivirais, enquanto que nos casos graves
ajudam na investigação da PAN. Deve-se levantar a
associados a hepatite, a terapia com glicocorticoides
suspeita de PAN em todos os pacientes com doença
e plasmaférese pode ser considerada3,37. O
febril obscura caracterizada com quadros anginosos
prognóstico melhorou com o passar do tempo, mas
e neuropatia periférica crônica sem acometimento
os pacientes costumam evoluir com óbito dentro de
pulmonar. Para a classificação da PAN, o Colégio
18 meses da doença em virtude de quadro de doença
Americano de Reumatologia de 1990, elaborou
renal crônica e infartos mesentéricos, cardíacos ou
critérios diagnósticos para doença, classificando-a
cerebrais.
na presença de dois de dez critérios36:
Capítulo 16 202
químicos, tóxicos ou farmacológicos em indivíduos órgãos, são classificados como doença leve e
com predisposição genética com baixa tolerância a podem ser tratados com esquema combinado de
autoantígenos de ANCA . 3
glicocorticoides em associação com metotrexato.
com a Academia Americana de Reumatologia, ANCA positivo que envolve vasos de pequeno e médio
o diagnóstico de GPA pode ser estabelecido na calibre40,41, de epidemiologia incerta, com relatos
Quando houver grande suspeita clínica múltipla, em mais de 75% dos casos45-47. Com a
para vasculite com ANCA positivo, deve-se iniciar evolução da doença, o acometimento motor e atrofia
tratamento empírico a estes pacientes. muscular podem ocorrer, assim como uma redução
ou ausência da velocidade de condução nervosa,
Os casos sem agressão renal ou de outros
Capítulo 16 203
indicando uma predominante degeneração axonial3. se com maior frequência no Oriente Médio e na parte
O SNC é menos afetado na GEPA, em torno de 10 a oriental do continente asiático, com prevalência em
20%, eventos cerebrovasculares tem sido reportados torno de 13 a 35 casos por 100.000 indivíduos-ano,
em associação com angeítes cerebrais e áreas de em adultos jovens entre 20 a 40 anos de idade,
infarto subcorticais na substância branca 48,49
. ocorrendo igualmente entre homens e mulheres3,50.
Capítulo 16 204
mais frequentes, com quadro de vasculite infecciosa
Conduta
segmentar, com formação secundária de aneurismas
Atualmente não existe consenso quanto ao
e tromboses, levando a áreas de infarto nos núcleos
tratamento de Behçet. O método terapêutico levará
da base, córtex cerebral, tronco encefálico e no
em conta a gravidade da doença e seu acometimento
cerebelo55. A arterite de Heubner, forma mais comum
sistêmico. O uso de glicocorticoides ou agentes
de vasculite sifilítica, é uma endarterite obliterante
imunossupressores deve ser considerado nos casos
de vasos de médio e grande calibre, evoluindo
de eritema nodoso e pioderma gangrenoso.
para isquemia local. Deve-se investigar todos os
Quadros de comprometimento neurológico doentes com sorologia positiva para sífilis e doença
e alteração visual com uveíte posterior neurológica ou oftalmológica associada, sugerindo
requerem tratamento imediato com altas doses quadro de sífilis terciária ou neurossífilis56.
de glicocorticoides em associação a agente
imunossupressor (metotrexato, ciclofosfamida,
azatioprina ou inibidor TNF-α). A doença cursa REFERÊNCIAS
com episódios de surtos e remissões, de maiores 1. Neto JP, Takayanagui OM. Tratado de Neurologia da
índices de morbimortalidade quando associada Academia Brasileira de Neurologia. 1 ed. Rio de Janeiro:
Gen Guanabara Kogan; 2013. p. 402.
a manifestações neurológicas, oculares e
2. Kasper D, Fauci A, Hauser S, Longo DL, Jameson J,
acometimento de vasos de grande calibre. O Loscalzo J. Harrison’s Principles of Internal Medicine. 19ª
envolvimento parenquimatoso apresenta pior ed. Macgraw-Hill; 2017.
prognóstico 3,53
. 3. Louis ED, Mayer SA, Rowland LP. Merritt, tratado
de neurologia. 13ª ed. Rio de Janeiro: Gen Guanabara
Koogan; 2018.
4. Rossi CM, Di Comite G. The clinical spectrum of the
VASCULITES INFECCIOSAS DO SNC neurological involvement in vasculitides. Journal of the
neurological sciences. 2009;285(1-2):13-21.
No caso de vasculites infecciosas do SNC,
5. Jennette JC, Falk RJ, Bacon PA, et al. 2012 revised
diversos microrganismos se associam à vasculite International Chapel Hill Consensus Conference
do SNC e a identificação se torna mais fácil Nomenclature of Vasculitides. Arthritis Rheum.
2013;65(1):1-11.
através de sorologias, com amplo espectro de
6. Salvarani C, Brown RD Jr, Calamia KT, et al. Primary
agentes infecciosos passíveis de causar inflamação central nervous system vasculitis: analysis of 101 patients.
vascular como, virais (hepatite B, EBV e CMV), Ann Neurol. 2007;62(5):442-51.
meningite bacteriana, meningite crônica devido a 7. Calabrese LH, Duna GF, Lie JT. Vasculitis in the central
nervous system. Arthritis Rheum. 1997;40(7):1189-1201.
tuberculose, infecção por espiroquetas ou infecção
8. Salvarani C, Brown Jr RD, Hunder GG. Adult primary
fúngica (Aspergillus e Candida sp.), infecção central nervous system vasculitis. IMAJ. 2017;19:448-453.
por riquétsias e parasitária. A etiologia viral mais
9. Miller DV, Salvarani C, Hunder GG, et al. Biopsy findings
prevalente se dá pelo vírus varicela-zóster, após in primary angiits of the central nervous system. Am J Surg
Pathol. 2009;33(1):35-43.
lesão herpética principalmente em região oftálmica,
com acometimento de vasos de grande calibre em 10. Salvarani C, Brown RD Jr, Calamia KT, et al. Rapidly
progressive primary central nervous system vasculitis.
imunocompetentes caracterizada por estenoses Rheumatology (Oxford). 2011;50(2):349-358.
segmentares visíveis na angiografia . 54
11. Salvarani C, Brown RD Jr, Calamia KT, et al. Primary
central nervous system vasculitis presenting with intracranial
Em quadros bacterianos, a vasculite surge hemorrhage. Arthritis Rheum. 2011;63(11):3598-3606.
como infecção purulenta em base de crânio evoluindo 12. Salvarani C, Brown RD Jr, Hunder GG. Adult
para infiltrações vasculares, manifestando-se na primary central nervous system vasculitis. Lancet.
2012;380(9843):767-777.
forma de AVE isquêmico e hemorragias. Infecções
13. Godasi R, Pang G, Chauhan S, Bollu PC. Primary
pelo bacilo de Koch, na tuberculose do SNC, são
Central Nervous System Vasculitis. 2021.
Capítulo 16 205
14. Gonzalez-Gay MA, Vazquez-Rodriguez TR, Lopez-Diaz 30. O Sato, DL Cohn. Polyarteritis and Microscopic
MJ, et al. Epidemiology of giant cell arteritis and polymyalgia Polyangiitis. In: Rheumatology, J. H Klippel, PA Dieppe.
rheumatica. Arthritis Rheum. 2009;61(10):1454-1461. (eds). Mosby, St Louis, USA, 2003.
15. Gonzalez-Gay MA, Vazquez-Rodriguez TR, Gomez- 31. Mahr A, Guillevin L, Poissonnet M, Aymé S. Prevalences
Acebo I, et al. Strokes at time of disease diagnosis in a of polyarteritis nodosa, microscopic polyangiitis, Wegener’s
series of 287 patients with biopsy-proven giant cell arteritis. granulomatosis, and Churg-Strauss syndrome in a French
Medicine (Baltimore). 2009;88(4):227-235. urban multiethnic population in 2000: a capture-recapture
estimate. Arthritis Rheum. 2004;51(1):92-99.
16. Caselli RJ, Hunder GG, Whisnant JP. Neurologic
disease in biopsy‐proven giant cell (temporal) arteritis. 32. Guillevin L, Mahr A, Callard P, et al. Hepatitis B virus-
Neurology. 1988;38(3):352. associated polyarteritis nodosa: clinical characteristics,
outcome, and impact of treatment in 115 patients. Medicine.
17. Turney TM, Garraway WM, Whisnant JP. The natural
2005;84(5):313-322.
history of hemispheric and brainstem infarction in
Rochester, Minnesota. Stroke. 1984;15(5)790-794. 33. Ramos-Casals M, Muñoz S, Medina F, et al. Systemic
autoimmune diseases in patients with hepatitis C virus
18. Klink T, Geiger J, Both M, et al. Giant cell arteritis:
infection: characterization of 1020 cases (The HISPAMEC
diagnostic accuracy of MR imaging of superficial cranial
Registry). J Rheumatol. 2009;36(7):1442-1448.
arteries in initial diagnosis-results from a multicenter trial.
Radiology. 2014;273(3):844-852. 34. Pagnoux C, Seror R, Henegar C, et al. Clinical
features and outcomes in 348 patients with polyarteritis
19. Schmidt WA, Kraft HE, Vorpahl K, Völker L, Gromnica-
nodosa: a systematic retrospective study of patients
lhle EJ. Color duplex ultrasonography in the diagnosis of
diagnosed between 1963 and 2005 and entered into the
temporal arteritis. N Engl J Med. 1997; 337(19):1336-1342.
French Vasculitis Study Group Database. Arthritis Rheum.
20. Schmidt WA. Ultrasound in vasculitis. Clin Exp 2010;62(2):616-626.
Rheumatol. 2014;32:S71-77.
35. Rosenberg MR, Parshley M, Gibson S, Wernick R.
21. Arida A, Kyprianou M, Kanakis M, Sfikakis PP. The Central nervous system polyarteritis nodosa. West J Med.
diagnostic value of ultrasonography-derived edema of the 1990;153(5):553.
temporal artery wall in giant cell arteritis: a second meta-
36. Lightfoot RW Jr, Michel BA, Bloch DA, et al. The
analysis. BMC Musculoskelet Disord. 2010;11(1):1-8.
American College of Rheumatology 1990 criteria for the
22. Docken WP, Trobe JE, Matteson ELE, Curtis MR. classification of polyarteritis nodosa. Arthritis Rheum.
Treatment of giant cell arteritis. UpToDate. 2020. Disponível 1990;33(8):1088-1093.
em: https://www.uptodate.com/contents/treatment-of-giant-
37. Merkel PA, Matteson ELE, Curtis MRE. Treatment
cell-arteritis#H1518118106.
and prognosis of polyarteritis nodosa. UpToDate. 2020.
23. Lupi-Herrera E, Sánchez-Torres G, Marcushamer J, Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/
Mispireta J, Horwitz S, Vela JE. Takayasu’s arteritis. Clinical treatment-and-prognosis-of-polyarteritis-nodosa.
study of 107 cases. Am Heart J. 1977;93(1):94-103.
38. Leavitt RY, Fauci AS, Bloch DA, et al. The American
24. Arend WP, Michel BA, Bloch DA, et al. The American College of Rheumatology 1990 criteria for the classification
College of Rheumatology 1990 criteria for the classification of Wegener’s granulomatosis. Arthritis Rheum.
of Takayasu arteritis. Arthritis Rheum. 1990;33(8):1129- 1990;33(8):1101-1107.
1134.
39. Di Comite G, Bozzolo EP, Praderio L, Tresoldi M,
25. Ishikawa K. Natural history and classification of Sabbadini MG. Meningeal involvement in Wegener’s
occlusive thromboaortopathy (Takayasu’s disease). granulomatosis is associated with localized disease. Clin
Circulation. 1978;57(1):27-35. Exp Rheumatol. 2006;24(2):S60-64.
26. Serra R, Butrico L, Fugetto F, et al. Updates in 40. Churg J, Strauss L. Allergic granulomatosis,
Pathophysiology, Diagnosis and Management of Takayasu allergic angiitis, and periarteritis nodosa. Am J Pathol.
Arteritis. Ann Vasc Surg. 2016;35:210-225. 1951;27(2):277.
27. Rodríguez-Pla A, de Miguel G, López-Contreras J, 41. Szczeklik W, Jakieła B, Adamek D, Musiał J. Cutting
de Llobet JM, Llauger J, Díaz C. Bilateral blindness in edge issues in the Churg-Strauss syndrome. Clin Rev
Takayasu’s disease. Scand J Rheumatol. 1996;25(6):394- Allergy Immunol. 2013;44(1):39-50.
395.
42. Mohammad AJ. An update on the epidemiology of
28. Keenan NG, Mason JC, Maceira A, et al. Integrated ANCA-associated vasculitis. Rheumatology. 2020;59:42.
cardiac and vascular assessment in Takayasu arteritis
43. Conron M, Beynon HL. Churg-Strauss syndrome.
by cardiovascular magnetic resonance. Arthritis Rheum.
Thorax. 2000;55(10):870-877.
2009;60(11):3501-3509.
44. Moiseev S, Bossuyt X, Arimura Y, et al. International
29. Merkel P, Matteson ELE, Curtis MRE. Treatment of
Consensus on ANCA Testing in Eosinophilic Granulomatosis
Takayasu arteritis. UpToDate. 2020. Disponível em: https://
with Polyangiitis. Am J Respir Crit Care Med.
www.uptodate.com/contents/treatment-of-takayasu-arteritis.
2020;202(10):1360-1372.
Capítulo 16 206
45. Masi AT, Hunder GG, Lie JT, et al. The American 51. Haghighi AB, Pourmand R, Nikseresht AR. Neuro-
College of Rheumatology 1990 criteria for the classification Behcet disease: a review. The neurologist. 2005;11(2):80-
of Churg-Strauss syndrome (allergic granulomatosis and 89.
angiitis). Arthritis Rheum. 1990;33(8):1094-1100.
52. Kidd D, Steuer A, Denman AM, Rudge P.
46. Wolf J, Bergner R, Mutallib S, Buggle F, Grau Neurological complications in Behcet’s syndrome. Brain.
AJ. Neurologic complications of Churg-Strauss 1999;122(11):2183-2194.
syndrome-a prospective monocentric study. Eur J Neurol.
53. Al-Fahad SA, Al-Araji AH. Neuro-Behcet’s disease in
2010;17(4):582-588.
Iraq: a study of 40 patients. J Neurol Sci. 1999;170(2):105-
47. Santos-Pinheiro F, Li Y. Eosinophilic granulomatosis 111.
with polyangiitis (Churg-Strauss syndrome) presenting with
54. Pagnoux C, Cohen P, Guillevin L. Vasculitides
polyneuropathy-a case series. J Clin Neuromuscul Dis.
secondary to infections. Clinical and experimental
2015;16(3):125-130.
rheumatology. 2006;24(2):S71.
48. Sehgal M, Swanson JW, DeRemee RA, Colby TV.
55. Chan KH, Cheung RTF, Lee R, Mak W, Ho SL.
Neurologic manifestations of Churg–Strauss syndrome.
Cerebral infarcts complicating tuberculous meningitis.
Mayo Clin Proc. 1995;70(4):337-341.
Cerebrovascular Diseases. 2005;19(6):391-395.
49. Hattori N, Ichimura M, Nagamatsu M, et al.
56. Jay CA. Treatment of neurosyphilis. Current treatment
Clinicopathological features of Churg–Strauss syndrome-
options in neurology. 2006;8(3):185-192.
associated neuropathy. Brain. 1999;122(3):427-439.
50. Akman-Demir G, Serdaroglu P, Tasçi B. Clinical patterns
of neurological involvement in Behcet’s disease: evaluation
of 200 patients. Brain. 1999;122(11):2171-2182.
Capítulo 16 207
CAPÍTULO 17
VASOCONSTRIÇÃO ARTERIAL CEREBRAL
REVERSÍVEL
Capítulo 17 208
mas geralmente são normais; É muito importante a identificação de eventuais
fatores causais como uso de vasoconstritores,
b. a pesquisa para feocromocitoma também
antidepressivos como inibidores da recaptação
deve ser feita com a dosagem de cateco-
de serotonina e drogas ilícitas para evitar uma
laminas e metanefrinas na urina;
reexposição.
c. o LCR geralmente é normal ou pouco al-
terado em 0 a 60% mostrando discreto
aumento da celularidade (5 a 35 células)
e da proteinorraquia. A glicorraquia é nor-
PROGNÓSTICO
mal2; Nas três séries mais conhecidas da
literatura a mortalidade foi de menos de 1% e a
d. exames de imagem: segundo Ducros2, a
maioria dos pacientes evoluiu bem, sem sequelas,
RM ou a tomografia de crânio inicial foi
diferentemente dos casos de vasculite primária
normal em 55 a 80% dos casos e alterada
em 12 a 81% dos casos ao longo da evolu- cerebral. Por esse motivo a anamnese cuidadosa
ção como hemorragia meníngea localiza- bem como investigação detalhada são fundamentais
da na convexidade cerebral, hemorragia para diferenciar essas duas entidades para que a
cerebral ou infarto cerebral (geralmente terapêutica especifica seja instituída em cada uma
em áreas de fronteiras). Alguns pacientes das patologias3-5.
apresentaram alterações compatíveis com
encefalopatia posterior reversível3-5; e
Capítulo 17 209
CAPÍTULO 18
DISSECÇÃO ARTERIAL CERVICAL
EXTRACRANIANA
Capítulo 18 210
de serem lesionadas pelo contato com estruturas
QUADRO CLÍNICO
ósseas, como as vértebras cervicais ou o processo
O quadro clinico é variável, sendo em alguns
estiloide. Essa maior mobilidade envolve a porção
casos assintomáticos. Os sintomas dividem-se em
faríngea da artéria carótida interna extracraniana,
manifestações locais e isquêmicas transitórias ou
entre sua origem no bulbo carotídeo e sua entrada
permanentes, de acordo com a artéria acometida e
na base do crânio, e os segmentos V1 (ancorada
a gravidade da lesão. Na dissecção carotídea, os
em sua origem na coluna vertebral) e V3 (ancorado
sintomas mais comuns relatados são a cefaleia (67%),
no ponto em que penetra na dura-máter) da artéria
dor cervical (49%), síndrome de Horner (29%), perda
vertebral1,4-6,15.
visual monocular transitória (29%), tinnitus (8%) e
As dissecções das artérias carótidas e paralisia de nervo craniano (6%)14. A tríade clássica
vertebrais geralmente surgem de uma ruptura da se apresenta com dor em um lado da cabeça, rosto,
íntima. Essa ruptura permite que o sangue arterial ou pescoço, acompanhada de síndrome de Horner
penetre na parede da artéria e forme um hematoma e de isquemia cerebral ou retiniana, ocorrendo em
intramural, chamado de lúmen falso (Figura 1). O menos de 1/3 dos casos. Na dissecção vertebral, o
hematoma intramural geralmente está localizado quadro típico é dor cervical de variável intensidade
dentro das camadas da túnica média, mas pode associada a cefaleia, geralmente occipital, em
ser excêntrico, tanto em direção à íntima quanto 2/3 dos pacientes. Em alguns casos pode levar a
em direção à adventícia. Uma dissecção subintimal radiculopatia, usualmente em território de C5-C6.
tende a resultar em estenose do lúmen arterial, As manifestações isquêmicas são mais comuns, em
enquanto uma dissecção subadventicial pode até 90% dos casos, quando o acometimento é da
causar dilatação aneurismática da artéria. Embora artéria vertebral. Podem envolver o tronco cerebral,
tais aneurismas sejam frequentemente referidos particularmente a medula lateral (síndrome de
como “pseudoaneurismas”, eles não são, porque Wallenberg), bem como o tálamo, o cérebro e os
suas paredes são compostas de elementos do vaso hemisférios cerebelares. As isquemias carotídeas,
sanguíneo (isto é, mídia e adventícia) 1,4-6,15
. variam de 50 a 75%, levando desde a alterações
As rupturas da camada íntima são difíceis de oftalmológicas agudas (cegueira monocular súbita)
identificar no momento do exame microscópico post- aos mais variados graus de isquemia cerebral12,14.
mortem ou em peças anatomopatológicas cirúrgicas,
mas a ausência de qualquer comunicação entre o
lúmen arterial falso e verdadeiro sugere que algumas DIAGNÓSTICO
dissecções das artérias carótidas e vertebrais podem O diagnóstico é feito através de métodos
ser causadas por um hematoma intramural primário. não invasivos como ultrassom, tomografia
A íntima também pode ser lesada pela ruptura de computadorizada (TC) e ressonância magnética
um hematoma intramural primário no lúmen arterial, (RM). A angiografia arterial digital é considerada o
mas tal evento é difícil de distinguir de uma ruptura método padrão-ouro15. Para uma avaliação inicial,
primária da íntima. É possível que ambos ocorram. a ultrassonografia com doppler pode ser útil,
Os possíveis mecanismos de AVE isquêmico na identificando alteração de fluxo em cerca de 90%
dissecção neurovascular incluem trombose com dos casos, embora alterações mais específicas de
embolia distal em 95% dos casos e 5 % a estenose dissecção, como hematoma intramural ou flap intimal,
ou oclusão com sintomas relacionados a ausência sejam observadas em menos de 1/3 dos casos14. Os
de colaterais suficientes em 5% dos casos1,4-6,15. exames mais utilizados são a angiotomografia e a
angiorressonância arterial cervical com contraste.
Os sinais mais comumente vistos são: estenose de
Capítulo 18 211
Figura 1: Achados patológicos em mulher de 37 anos com dissecção da artéria carótida interna. Fotomicrografias da
artéria carótida interna extracraniana direita (Painéis A, B e C) mostram uma dissecção dentro das camadas externas
da túnica média, resultando em estenose do lúmen arterial (L). Os retângulos delineados em azul à esquerda indicam
os locais das fotomicrografias. A hemorragia intramural (asterisco) se estende quase inteiramente ao redor da artéria
(Painel A) (coloração de van Gieson, x 4); B. As vistas em maior aumento da artéria carótida interna no ponto de
dissecção mostram fragmentação do tecido elástico (Painel B) (coloração de van Gieson, x 25); com o acúmulo de
substância de vidro fosco claro na túnica média, indicada pelo azul. Coloração de mucopolissacarídeos (Painel C)
(Alcian blue, x25). Essas alterações são consistentes com o diagnóstico de necrose medial cística.
Fonte: Modificado de Schievink, 200116.
Capítulo 18 212
Figura 2: Imagens evidenciando: A. local mais comum de dissecção de artéria carótida, segmento faríngeo 2 cm acima
da bifurcação (entre linhas); B. locais mais comuns de dissecção de artéria vertebral segmentos V1 e V3 (entre chaves).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 18 213
vaso, irregularidade luminal e hematoma intramural. causa foi uma dissecção extracraniana21,22.
Ambos os métodos são bons para o diagnóstico e têm
O tratamento cirúrgico (aberto e endovascular)
equivalência parecida. Possuem boa sensibilidade
possui um nível de evidência menor, estando
(angioTC 51 a 98% versus angioRM 50 a 79%) e
recomendado para situações específicas, como:
especificidade (67 a 100% angioTC versus 67 a
(1) sintomas isquêmicos recorrentes, apesar
99% angioRM), porém na RM pode-se visualizar
da terapia medicamentosa; (2) hipoperfusão
hematoma mural com o uso da sequência T1 com
hemodinâmica secundária a estenose, colaterais
saturação de gordura17.
ruins ou envolvimento de múltiplos vasos; (3)
A escala de DENVER foi desenvolvida estenose persistente com risco de AVE contínuo; (4)
para dissecções traumáticas da artéria carótida, expansão da dissecção ou dissecção sintomática
podendo também ser utilizada para dissecções de ou pseudoaneurismas; (5) oclusão contralateral ou
artéria vertebral. Tal escala é dividida em: grau I, estenose de alto grau; e (6) contraindicações para
irregularidade vascular com estenose menor que anticoagulação devido a hemorragia intracraniana
25%; grau II, estenose luminal maior que 25%; grau ou sistêmica23,24.
III, formação de pseudoaneurisma; grau IV, oclusão
A cirurgia aberta, muito utilizada na era pré-
vascular; e grau V, transecção arterial18.
endovascular, hoje está suplantada pelas técnicas
endovasculares. Grande parte das técnicas
consiste na oclusão de vaso acometido. Em relação
CONDUTA às técnicas reparatórias, a mais utilizada é a
O tratamento das dissecções é dividido em ressecção do segmento dissecado e substituição
medicamentoso e cirúrgico (aberto e endovascular). por enxerto venoso (veia safena). Pode ser utilizada
O tratamento medicamentoso tem o objetivo de a trombectomia seguida de angioplastia com patch.
prevenção de eventos isquêmicos. Em pacientes As complicações mais frequentes são eventos
cuja apresentação inicial foi de AVEi, a recorrência isquêmicos (9 a 10%) e lesão de nervo craniano
da isquemia é de 6,2 % versus 1,1% para pacientes (58%). O bypass extra/intracraniano (artéria temporal
com sintomas locais ou assintomáticos. Na grande superficial-cerebral média, occipital-vertebral) pode
maioria dos casos é tratado com anticoagulantes ser utilizado em caso de fluxo sanguíneo colateral
(ACO) ou antiagregantes plaquetários (ADP)19. insuficiente. O tratamento seletivo dos aneurismas
O estudo CADISS não encontrou diferença com clipagem ou ligadura aneurismática pode ser
estatística na prevenção de novas de isquemias realizado, porém existem poucas séries de casos
(2,4% ADP vs 0,8% ACO), com 0,8% de eventos publicadas e os resultados são variáveis25-28.
hemorrágicos graves com anticoagulantes contra
O tratamento cirúrgico endovascular tornou-
0% em antiagregantes20. Pelo menor risco de
se a primeira escolha nas últimas duas décadas.
hemorragias maciças, a maioria dos autores prefere
Pode ser dividido em tratamento desconstrutivo
usar antiagregantes plaquetários, porém, em alguns
e reconstrutivo. A oclusão do vaso é um método
casos, como refratariedade a antiagregantes e
eficaz para a prevenção de novas isquemias e
presença de trombo intraluminal, os anticoagulantes
deve ser realizada após teste de oclusão com
podem ser considerados como primeira escolha.
balão para verificação de fluxo colateral. Podem
Observa-se, entretanto, que na presença de
ser utilizados espirais (coils), agentes embólicos
dissecção intracraniana concomitante e AVEi
líquidos (n-BCA, Onyx) e plugs vasculares de vários
extensos devem-se evitar os anticoagulantes21.
tamanhos. Devido ao amplo sucesso relatado de
A trombólise e a trombectomia venosa estão bem
técnicas reconstrutivas de tratamento, envolvendo
estabelecidas no tratamento de AVEi agudo cuja
várias estratégias de implante de stent, o sacrifício
Capítulo 18 214
Figura 3: A. angioRM cervical com contraste evidenciando dissecção do segmento cervical da artéria carótida. B.
angioTC arterial cervical com contraste evidenciando dissecção no segmento V2 da artéria vertebral com formação de
pseudo-aneurisma. C. Imagem de RM cervical T1 axial com saturação de gordura evidenciando hematoma intramural
(hiperintenso) com lúmen residual (hipointenso). D. US doppler evidenciando duplo lúmen em uma visão longitudinal da
artéria carótida comum.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 4: Escala de Denver para dissecção traumática arterial cervical. I. estenose 25%; II. estenose luminal maior que
25%; III. formação de pseudoaneurisma; IV. oclusão vascular; V. transecção arterial.
Fonte: Adaptado de Spiotta, 201915.
Capítulo 18 215
Figura 5: Séries angiográficas digitais da artéria carótida evidenciando dissecções em diferentes formas. A. estenose
leve da artéria; B. estenose grave; C. formação de pseudo-aneurisma; D-E. oclusão total da artéria.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 6: Séries angiográficas digitais da artéria vertebral evidenciando A. dissecção com formação de pseudo-
aneurisma gigante da artéria vertebral; B. dissecção traumática em angiografia arterial; C. dissecção em segmento V2 e
V3 da artéria vertebral; D. dissecção em segmento V3 e V4 da artéria vertebral.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 18 216
de vasos está se tornando menos comum. Tem se 10. Serkin Z, Le S, Sila C. Treatment of extracranial arterial
dissection: the roles of antiplatelet agents, anticoagulants,
dado preferência ao tratamento reconstrutivo com
and stenting. Curr Treat Options Neurol. 2019;21:48.
uso de stents para o tratamento endovascular das
11. Demartini Z Jr, Rodrigues Freire M, Lages RO, et al.
dissecções arteriais. Utiliza-se stents convencionais Internal Carotid Artery Dissection in Brazilian Jiu-Jitsu. J
metálicos auto-expansíveis ou os expansíveis Cerebrovasc Endovasc Neurosurg. 2017;19(2):111-116.
por balão, stents revestidos e stents flow diverter, 12. Béjot Y, Aboa-Eboulé C, Debette S, et al. Characteristics
and outcomes of patients with multiple cervical artery
associados ou não a espirais, em caso de dissection. Stroke. 2014 Jan;45(1):37-41.
pseudoaneurismas. Para lesões mais proximais de 13. Debette S, Grond-Ginsbach C, Bodenant M. Differential
carótida e vertebrais, os stents convencionais auto- features of carotid and vertebral artery dissections. The
CADISP study.Neurology 2011;77:1174–81.
expansíveis, os expansíveis por balão e os stents
14. Beletsky V, Norris JW. Spontaneous dissection
revestidos são uma excelente alternativa, com of the carotid and vertebral arteries. N Engl J Med.
resultados muito bons. Para segmentos arteriais 2001;345(6):467.
mais distais, curvos ou de maior mobilidade, como 15. Spiotta AM, Turner RD, Chaudry MI, Turk AS
região cervical alta e base do crânio, são preferidos . Management of Cerebrovascular Disorders A
Comprehensive, Multidisciplinary Approach. Charlestone,
stents redirecionadores de fluxo, visto que possuem USA: Springer; 2019.
maior resistência a compressão e deformidade, 16. Schievink WI. Spontaneous dissection of the carotid and
melhor navegabilidade e facilidade de liberação. Os vertebral arteries. N Engl J Med. 2001;344(12):898-906. doi:
10.1056/NEJM200103223441206.
estudos demostram excelentes resultados com uma
17. Provenzale JM. Dissection of the internal carotid and
alta taxa de sucesso técnico de 99,1%, com apenas vertebral arteries: imaging features. AJR Am J Roentgenol.
3,3% de taxas de reestenose, e AVE recorrente ao 1995;165(5):1099-104.
longo de 20,9 meses de apenas 2,1%29-35. 18. Biffl WL, Moore EE, Offner PJ, Brega KE, Franciose
RJ, Burch JM. Blunt carotid arterial injuries: implications
of a new grading scale. J Trauma Inj Infect Crit Care.
1999;47(5):845–53.
REFERÊNCIAS 19. Georgiadis D, Arnold M, von Buedingen HC, et al.
1. Beletsky V, Norris JW. Spontaneous dissection Aspirin vs anticoagulation in carotid artery dissection: a
of the carotid and vertebral arteries. N Engl J Med. study of 298 patients. Neurology. 2009;72(21):1810–1815.
2001;345(6):467.
20. CADISS trial investigators, Markus HS, Hayter E, et
2. Watson A. Dissecting aneurysm of arteries other than the al. Antiplatelet treatment compared with anticoagulation
aorta. J Pathol Bacterial 1956;72: 439–449. treatment for cervical artery dissection (CADISS): a
randomised trial. Lancet Neurol. 2015;14(4):361–367.
3. Wolman L. Cerebral dissecting aneurysms. Brain
1959;82: 276–291. 21. Powers WJ, Rabinstein AA, Ackerson T, et al. 2018
Guidelines for the Early Management of Patients With Acute
4. Fisher CM, Ojemann RG, Roberson GH. Spontaneous
Ischemic Stroke: A Guideline for Healthcare Professionals
dissection of cervico-cerebral arteries. Can J Neurol Sci.
From the American Heart Association/American Stroke
1978;5(1):9-19.
Association. Stroke. 2018;49(3):e46-e110.
5. Mokri B, Sundt TM Jr, Houser OW. Spontaneous internal
22. Blassiau A, Gawlitza M, Manceau PF, Bakchine S,
carotid dissection, hemicrania, and Horner’s syndrome. Arch
Serre I, Soize S, Pierot L. Mechanical Thrombectomy for
Neurol. 1979;36(11):677-80.
Tandem Occlusions of the Internal Carotid Artery-Results of
6. Giroud M, Fayolle H, André N, et al. Incidence of internal a Conservative Approach for the Extracranial Lesion. Front
carotid artery dissection in the community of Dijon. J Neurol Neurol. 2018;9:928.
Neurosurg Psychiatry. 1994;57(11):1443.
23. Asif KS, Lazzaro MA, Teleb MS, Fitzsimmons B-F, Lynch
7. Schievink W, Roiter V. Epidemiology of cervical artery J, Zaidat O. Endovascular reconstruction for progressively
dissection. Front Neurol Neurosci. 2005;20:12-15. worsening carotid artery dissection. J NeuroIntervent Surg.
2015;7(1):32–39.
8. Putaala J, Metso AJ, Metso TM, et al. Analysis of
1008 consecutive patients aged 15 to 49 with first-ever 24. Xianjun H, Zhiming Z. A systematic review of
ischemic stroke: the Helsinki young stroke registry. Stroke. endovascular management of internal carotid
2009;40:1195–1203.
artery dissections. Interv Neurol. 2013;1(3–4):164–170.
9. Nash M, Rafay MF. Craniocervical Arterial Dissection
25. Schievink WI, Piepgras DG, McCaffrey TV, Mokri B.
in Children: Pathophysiology and Management. Pediatr
Surgical treatment of extracranial internal carotid artery
Neurol. 2019;95:9-18.
dissecting aneurysms. Neurosurgery. 1994;35(5):809-815
Capítulo 18 217
Figura 7: Séries angiográficas em fase aguda e tardia de paciente com AVE isquêmico de circulação posterior
evidenciando A. dissecção de segmento V3 da artéria vertebral; B. controle tardio com cura completa da lesão.
Fonte: Dr. Luciano Manzato, 2021.
Figura 8: Paciente com história de dor cervical intensa e AVE isquêmico. A. pseudo aneurisma do segmento cervical da
artéria carótida; B. imagem evidenciando stent cervical dupla malha; C. controle tardio com oclusão completa da lesão.
Fonte: Dr. Luciano Manzato, 2021.
Capítulo 18 218
Figura 9: Paciente de 43 anos com AVE isquêmico de repetição. A. imagem em 3D evidenciando dissecção do segmento
V2 da artéria vertebral; B. imagem evidenciando navegação distal a lesão; C-D. controle final pós-implante de stent
coronariano farmacológico.
Fonte: Dr. Mário Túlio Rezende, 2021.
Figura 10: Paciente vítima de traumatismo raquimedular cervical submetido a artrodese via anterior com sangramento
intenso durante a cirurgia. A. Angiografia evidenciando dissecção no segmento V2 da artéria vertebral direita com
formação de pseudoaneurisma; B. controle tardio realizado tratamento com coils e stent; C. radiografia cervical
anteroposterior de controle.
Fonte: Dr. Marco Túlio Rezende, 2021.
Capítulo 18 219
Figura 11: Paciente de 50 anos com AVE agudo. A. dissecção em segmento cervical com estenose grave de artéria
carótida direita; B. Imagem evidenciando pobreza de circulação intracraniana; C-D. controle tardio pós-implante de 2
stents.
Fonte: Dr. Luciano Manzato, 2021.
Capítulo 18 220
Figura 12: Paciente de 32 anos vítima de trauma cervical apresentando massa pulsátil e dor intensa em região cervical.
A-B. angiografia demostrando dissecção artéria vertebral com formação de pseudo-aneurisma gigante; C-D. realizada
oclusão total da arterial com coils de artéria vertebral. E-F. implante de stent revestido em artéria subclávia.
Fonte: Dr. Tiago de Jesus, 2021.
Figura 13: Paciente de 41 anos com dor cervical seguida de afasia e hemiplegia direita. A. angiografia demonstrando
dissecção da artéria carótida esquerda com oclusão total; B. navegação de microcateter; C. implante de 2 stents
telescopados; D. trombectomia com stent retriever; E. controle imediato após implante de stents; F. controle imediato
após trombectomia.
Fonte: Dr. Tiago Madeira, 2021.
Capítulo 18 221
26. Müller BT, Luther B, Hort W, Neumann-Haefelin 31. Baptista-Sincos APW, Simplício AB, Sincos IR, et al.
T, Aulich A, Sandmann W. Surgical treatment of 50 Flow-diverting Stent in the Treatment of Cervical Carotid
carotid dissections: indications and results. J Vasc Surg. Dissection and Pseudoaneurysm: Review of Literature and
2000;31(5):980-988. Case Report. Ann Vasc Surg. 2018;46:372-379.
27. Ota N, Okada Y, Noda K, Tanikawa R. Microsurgical 32. Wang A, Santarelli J, Stiefel MF. Pipeline embolization
embolectomy with superficial temporal artery-middle device as primary treatment for cervical internal carotid
cerebral artery bypass for acute internal carotid artery artery pseudoaneurysms. Surg Neurol Int. 2017;19;8:3.
dissection: A technical case report. Surg Neurol Int.
33. Plou P, Landriel F, Beltrame S, Hem S, Peralta O,
2020;11:223.
García-Mónaco R, Yampolsky C. Flow Diverter for the
28. Inoue Y, Matsuzawa K. Occipital Artery-to-Vertebral Treatment of Pseudoaneurysms of the Extracraneal
Artery Bypass to Stop Transient Ischemic Attacks Caused Vertebral Artery: Report of Two Cases and Review of the
by Traumatic Vertebral Artery Dissection. World Neurosurg. Literature. World Neurosurg. 2019;127:72-78.
2019;123:64-66.
34. Brzezicki G, Rivet DJ, Reavey-Cantwell J. Pipeline
29. Xianjun H, Zhiming Z. A systematic review of Embolization Device for treatment of high cervical and
endovascular management of internal carotid artery skull base carotid artery dissections: clinical case series. J
dissections. Interv Neurol. 2013;1(3–4):164–170. Neurointerv Surg. 2016;8(7):722-728.
30. Amuluru K, Al-Mufti F, Roth W, Prestigiacomo CJ, 35. Fischer S, Perez MA, Kurre W, Albes G, Bäzner H,
Gandhi CD. Anchoring Pipeline Flow Diverter Construct in Henkes H. Pipeline embolization device for the treatment of
the Treatment of Traumatic Distal Cervical Carotid Artery intra. and extracranial fusiform and dissecting aneurysms:
Injury. Interv Neurol. 2017;6(3-4):153-162. initial experience and long-term follow-up. Neurosurgery.
2014;75(4):364-374.
Capítulo 18 222
CAPÍTULO 19
TROMBOSE DOS SEIOS VENOSOS
Alexandre Bossoni relevantes quando TVC ocorre acima dos 65 anos ou sem
causa aparente – tumores sólidos, leucemia). No grupo de
outras causas estão: traumatismo craniano, infecções de
INTRODUÇÃO cabeça e pescoço, punção lombar, hipotensão liquóricas,
Trombose venosa cerebral (TVC) é a situação em uso de substâncias e medicamentos (asparaginase,
que ocorre a coagulação do sangue dentro do sistema imunoglobulina, lítio, ecstasy, vitamina A, danazol e
venoso intracraniano. É uma doença relativamente rara tamoxifeno, por exemplo), doenças hematológicas
quando comparada a incidência de acidente vascular (policitemia vera e plaquetose, por exemplo),
encefálico isquêmico (AVEi) na população. Ela é procedimentos endovasculares e desidratação. Anemia e
responsável por, aproximadamente, 0,5% de todos os obesidade estão sendo descritos como possíveis fatores
eventos cerebrovasculares e tem uma fisiopatologia de risco para TVC. Apesar de uma extensa investigação
diferente dos demais eventos. etiológica, em aproximadamente 12,5% dos casos não se
A trombose, de modo simplificado, ocorre por um encontra uma causa para a TVC.
Capítulo 19 223
benigna. Entretanto, aproximadamente metade dos de exames de imagem contrastados não é viável e
pacientes que tiveram TVC não retornou ao trabalho tampouco indicado?
após um ano de seguimento e dois terços dos
A cefaleia, especialmente nas unidades de
pacientes referem sintomas residuais.
emergência, deve ser criteriosamente avaliada. Uma
Os fatores de riscos identificados para um cuidadosa história clínica buscando-se fatores de
desfecho desfavorável, definido por uma pontuação risco para TVC e uma análise detalhada de qualquer
de igual ou maior que dois na escala modificada cefaleia pré-existente, são de grande importância.
de Rankin são diagnósticos de câncer, coma Mudanças no padrão desta cefaleia devem ser
na apresentação da TVC, trombose do sistema valorizadas e contextualizadas. A ocorrência de uma
venoso profundo cerebral, rebaixamento do nível cefaleia nova, em pacientes que costumeiramente
de consciência na apresentação aguda da TVC, não apresentam esta queixa, deve ser também
presença de hemorragia intracraniana e sexo melhor investigada. Em linhas gerais, a TVC está
masculino. Estes mesmos fatores fazem parte de um associada com uma cefaleia nova ou com a piora
escorre que tenta predizer a o risco de recorrência de uma cefaleia prévia. Frequentemente é descrita
da trombose. como contínua e progressivamente mais intensa
ao longo dos dias e com baixa resposta ao uso de
sintomáticos.
manifestação em até 25% dos casos. Sendo assim, se um escore clínico para selecionar os pacientes
como considerar a hipótese de TVC em um paciente com maior risco de apresentar este diagnóstico
Capítulo 19 224
O diagnóstico da TVC é realizado por exame de eventos trombóticos e os estudos foram
de imagem. A combinação de angioTM venosa controversos sobre o papel do D-dímero no
de crânio (angioTC) e angiorressonância venosa diagnóstico da TVC. Heldenrr et al.,5 em 2020,
de crânio (angioRM) nos dão quase 100% de realizaram um estudo multicêntrico, prospectivo que
sensibilidade e especificidade, contudo, quando incluiu sequencialmente pacientes possivelmente
estes exames são inconclusivos e a persiste a portadores de TVC. Foram realizadas coletas de
suspeita clínica, o exame padrão-ouro, arteriografia dados clínicos, angioRM e a coleta de sangue
digital, deve ser usado .
1,2
para nível sérico de D-dímero. Ao todo, foram 94
pacientes com confirmação por angioRM de um
Existem, entretanto, sinais nos exames não
universo de 359 pacientes avaliados.
contrastados que são úteis no diagnóstico de TVC.
Na TC de crânio sem contraste é possível identificar Ao juntar os dados clínicos, na forma de um
hiperdensidades espontâneas nos seios venosos e escore para o diagnóstico de TVC, encontrou-se
veias corticais. A presença destes sinais é pouco uma sensibilidade de 83%, especificidade de 86,8%
frequente, porém, quando identificados, têm alta para ausência do diagnóstico de TVC naqueles com
especificidade para trombose venosa cerebral. níveis de D-dímero < 500 µg/L e baixo risco do escore
Quando existe uma hiperdensidade no seio sagital, clínico para o diagnóstico de TVC, que foi definido
próximo da região da tórcula, em corte axial, o sinal por zero a 2 pontos considerando os seguintes
é o do delta cheio, por causa da sua forma triangular itens: crises na apresentação (4 pontos), trombofilia
(semelhante à letra grega Δ, delta), opondo-se conhecida (4 pontos), uso de contraceptivo oral (2
ao delta vazio, nome dado à falha de enchimento pontos), duração de sintomas de mais de 6 dias (2
na angioTC venosa na mesma região, em que o pontos), a pior dor de cabeça da vida (1 pontos) e
contraste desenha as bordas do seio sagital. As um sintoma neurológico deficitário na apresentação
hiperdensidades espontâneas das veias corticais (1 ponto). Ou seja, nos pacientes com baixo risco
são denominadas, por sua vez, de sinal da corta, clínico para a presença de TVC, os baixos níveis de
pela sua semelhança óbvia ao objeto de mesmo D-dímero foram úteis para descartar o diagnóstico
nome. de TVC.
Capítulo 19 225
clínico criterioso individualizado, o paciente deve
Terapias endovasculares e craniectomia
ser mantido em anticoagulação com inibidores da descompressiva
vitamina K com alvo de NRI (Internation Normalized
As terapias endovasculares e as craniectomias
Ratio) entre 2,0 e 3,0.
descompressivas não fazem parte da rotina do
O uso da anticoagulação na fase aguda tratamento da TVC. São condutas de exceção,
foi relacionado com menor risco relativo de morte criteriosa e individualmente selecionadas, baseadas
(0,33; IC95%; 0,08-1,21) e dependência funcional em evidências científicas não randomizadas de
(0,46; IC95%, 0,16-1,31). A anticoagulação deve pequenas séries de casos. Ambas as técnicas
ser mantida mesmo na presença de hemorragia podem ser consideradas em pacientes com
intracraniana, pois o sangramento pode ser uma deterioração neurológica progressiva a despeito do
complicação causada pela trombose. A conduta melhor tratamento médico disponível, porém não
de anticoagulação deve ser revista quando há há parâmetros mais objetivos e consensuais para a
deterioração clínica do paciente a despeito da seleção correta dos pacientes.
anticoagulação, com perspectiva de tratamento mais
Dentre as terapias endovasculares, há a
invasivos9,10. Os dados do International Study on
possibilidade de trombólise venosa ou trombectomia
Cerebral Vein and Dural Sinus Thrombosis indicam
mecânica. Ambas estão associadas, em pequenas
que a heparina de baixo peso molecular pode ser mais
séries de casos e metanálises, a maior taxa
segura que a heparina não fracionada, garantindo
de recanalização quando comparados com
uma maior probabilidade de independência funcional
anticoagulação isolada. Contudo, o médico deve
seis meses após o evento (OR 2,4; IC95%; 1,0-
estar atento ao fato de que os procedimentos
5,7) sem diferenças significativas na ocorrência de
referidos têm risco inerentes, como a hemorragia
sangramento intracraniano11. Quando a trombose é
intracraniana. Estudos multicêntricos randomizados
causada por infecções do sistema nervoso central,
são necessários para elucidar a eficácia destas
por infecções sistêmicas ou por foco infeccioso
modalidades de tratamento12.
de cabeça e pescoço, é fundamental que haja
tratamento antimicrobiano específico para etiologia As craniectomias descompressivas são
infecciosa presumida associada com anticoagulação. destinadas aos pacientes que, raramente, apresentam
A abordagem cirúrgica do foco infeccioso deve ser infarto cerebral maligno, lesões hemorrágicas com
Capítulo 19 226
não está indicado. Seu uso justifica-se nos pacientes compressão do nervo óptico, causando isquemia do
com uma ou mais crises de diagnóstico confirmado nervo. Por este motivo a monitorização da acuidade
de trombose venosa cerebral. Não há estudos visual, do campo visual e do edema de papila são
que indiquem qual o anticonvulsivante de escolha, fundamentais para prevenção de cegueira ou visão
portanto o uso de uma medicação específica fica a subnormal definitivas. Pacientes com alto risco
critério do médico que está conduzindo o caso. As de perda visual grave definitiva refratários aos
crises são mais frequentes na presença de infartos tratamentos já instituídos (anticoagulação e controle
venosos, sangramentos intracranianos e hipertensão de pressão intracraniana) podem ser candidatos à
intracraniana 14-16
. fenestração do nervo óptico6,18.
Capítulo 19 227
etiológica nos pacientes com trombose venosa indicada a anticoagulação, salvo motivo contrário.
cerebral pode ser o seguinte: A duração da anticoagulação deve ser definida em
conjunto com outros especialistas, conforme houver
Coleta da na fase aguda de: coagulograma
sinais de remissão ou cura da doença de base.
completo, fator anti-núcleo, anti-Ro, anti-La,
pesquisa da mutação do fator V, pesquisa da
mutação do gene da protrombina (Fator II) e
GESTAÇÃO FUTURA
rastreio de neoplasia em pacientes com 50
anos ou mais. O planejamento familiar é um tópico
importante em famílias em que houve um caso de
Coleta após 3 meses da trombose:
anticardiolipina IgG e IgM, pesquisa do TVC. Considerando que o uso de anticoncepcionais
anticoagulante lúpico, dosagem de anti-beta2 combinados, a gestação e o puerpério são os
glicoproteína IgG e IgM, homocisteína e principais fatores de risco para a ocorrência de TVC,
dosagem da antitrombina III. questionamentos sobre a possibilidade e segurança
Ao término da anticoagulação: proteína C, de uma gestação futura, do uso da fertilização in
proteína S, nova dosagem de antitrombina III vitro e de qual o melhor método anticoncepcional
(se a primeira estiver baixa)22-24. Os tempos aparecem espontaneamente durante o seguimento
indicados são justificados por alterações do
médico e também devem ser abordados ativamente
nível sérico causada pela trombose aguda ou
pelo neurologista.
pelo tratamento instituído. Atentar para a coleta
de proteína C e S, que deve ser somente após Em relação à segurança de sua gestão após
2 a 4 semanas sem uso de inibidor da vitamina a TVC, existe uma revisão sistemática25 que reuniu
K. Neste intervalo sugere-se manter o paciente 13 estudos. No universo de 217 gestantes ocorreu
em uso de anticoagulante com heparina
um caso de recorrência da TVC; em 186 gestações
de baixo peso molecular até o resultado do
ocorreram 5 casos de evento trombótico não-TVC. Em
exame. Caso algum dos exames documente a
deficiência, é fundamental sua repetição para relação ao desfecho da gestação houve 99 abortos
confirmação do diagnóstico. espontâneos em um universo de 186 gestações. A
São considerados fatores de risco fortes conclusão desta metanálise é que o risco absoluto
para TVC: homozigose para F V Leiden, de recorrência de TVC durante a gestação é baixo,
homozigose para mutação do gene da entretanto, o risco relativo de evento trombótico
protrombina, deficiência de proteína S, não-TVC e de recorrência da TVC é 16 vezes e 80
deficiência de proteína C, deficiência de vezes maior, respectivamente, quando comparado
antitrombina III e combinações destas (mesmo
com o risco da população geral. Desde modo, a
que em heterozigose).
gestação não deve ser contraindicada nos casos de
São consideradas como trombofilia de baixo mulheres que tiveram TVC. O desfecho da gestação
risco para TVC: heterozigose do fator V de
não foi alterado pela presença da TVC. Há poucos
Leiden, Heterozigose para mutação do gene
dados sobre o risco de TVC e ou evento trombótico
da protrombina e aumento do fator VIII. Os
fatores de risco fortes para TVC indicam sistêmico em relação à profilaxia.
anticoagulação por tempo indeterminado. Já os Outro estudo, do mesmo grupo do anterior26,
fatores de risco baixo para TVC não necessitam
descreveu uma amostra de 119 mulheres em
de anticoagulação por tempo indeterminado.
idade reprodutiva com passado de TVC. Houve
O papel do uso de antiagregantes neste
subgrupo de pacientes, os de baixo risco, não 82 gestações em 47 destas mulheres. Em 83%
está totalmente estabelecido. das gestações foi prescrita alguma forma de
profilaxia durante a gestação ou puerpério. Eventos
Em eventos trombóticos nas doenças trombóticos ocorreram em 3 gestações, incluindo
inflamatórias e autoimunes e nas neoplasias deve ser
Capítulo 19 228
uma recorrência de TVC. Houve 20 abortos se avalie a segurança do uso destas medicações
espontâneos. Os autores concluíram que os eventos após um episódio de TVC. Amoozegar et al.30, em
trombóticos foram pouco frequentes. 2015, documentaram por meio de uma metanálise
que mulheres expostas aos anticoncepcionais
Martinelli et al.27, em 2016, descreveram uma
combinados tiveram um risco de TVC sete vezes
coorte composta de 52 mulheres com passado de
maior quando comparado com mulheres não
TVC e 204 mulheres saudáveis, em que todas as
expostas. O risco permaneceu elevado, mesmo
mulheres com passado de TVC estavam em uso de
nas mulheres em uso de anticoncepcionais de
heparina de baixo peso molecular. O risco relativo
terceira geração (definidos como sendo aqueles
de complicações gestacionais foi 6 vezes maior no
contraceptivos combinados que contêm desogestrel
grupo TVC, com risco absoluto de 24%. O risco de
ou gestodene, desenvolvidos para redução do
complicações obstétricas não esteve associado
risco cardiovascular). Os estudos disponíveis nesta
com complicações obstétricas prévias. Não houve
metanálise foram bastante heterogêneos e não
sangramentos nem recorrência de trombose. Os
permitiram, portanto, conclusões mais claras.
autores concluem que mulheres com TVC prévia em
uso profilático de heparina de baixo peso molecular Os efeitos nas células sanguíneas dos
têm baixo risco de recorrência da trombose ou anticoncepcionais já foram estudados no nível
de sangramentos. Parece que neste grupo foi molecular. Documentou-se que progestágenos
encontrado aumento do risco de complicações alteram as propriedades viscoelásticas dos
obstétricas. coágulos. Incrementaram a velocidade de formação
do coágulo, facilitaram a agregação das hemácias
Na prática, mulheres com passado de TVC e
e a formação espontânea de fibrina. Em conjunto,
outro fator que determine anticoagulação por tempo
estes fatores podem explicar o risco aumentado de
indeterminado, deve permanecer em anticoagulação
trombose, porém, não são todos os sujeitos expostos
durante toda gestação. Mulheres com passado de
que terão eventos tromboembólicos, sugerindo que
TVC, cujo único fator desencadeante tenha sido o
outros fatores também são determinantes 31.
uso de anticoncepcional, gestação, puerpério ou
TVC de causa indeterminada recebem profilaxia Diante de lacunas do conhecimento básico da
com heparina de baixo peso molecular até o final do coagulação e nas evidências divergentes, assume-
puerpério 28,29
. se que as mulheres com passado de TVC não
devem usar nenhum anticoncepcional hormonal
Planejamento familiar combinado, o uso de anticoncepcionais apenas
Aprovados pelo FDA para uso em território de progestágenos ainda é controverso (porém
americano, os anticoncepcionais moldaram aceitável) e mulheres que desejam fertilização in
parte do comportamento e a sociedade. Os vitro devem receber profilaxia para trombose desde
anticoncepcionais orais tiveram papel considerável o início do tratamento hormonal. Contraceptivos
na emancipação feminina, e na revolução sexual. combinados injetáveis também não devem ser
Eram também atacados pelo risco de cânceres usados nesta situação. DIU de cobre, prata ou com
hormônio-dependentes e pelo risco maior de eventos hormônio oferecem baixo disco de tromboses.
trombóticos. A evolução dos medicamentos trouxe
contraceptivos com doses melhores e com novos Complicações tardias – fístula dural,
hipertensão intracraniana e perda visual
compostos com o objetivo de melhor tolerância ao
medicamento e melhor perfil de segurança. Especialmente no período que se segue à
fase aguda, o neurologista deve estar atento e
Como o uso de anticoncepcional é um dos
ativamente investigar a ocorrência de fístula dural, de
principais fatores de risco para TVC é natural que
Capítulo 19 229
hipertensão intracraniana e perda visual progressiva. em que é necessária a anticoagulação, trazendo
Portanto, o exame de campimetria por confrontação, uma facilidade posológica ao paciente, além de
de acuidade visual e de fundoscopia devem fazer não sofrerem grandes influências da alimentação
parte do exame neurológico de rotina nas consultas (aporte diário de vitamina K), não sendo necessário
de seguimento. Paralelamente, o questionamento coletas frequente de exames de sangue. Contra seu
ativo de sintomas clínicos é fundamental, uso temos que não existem reversores para todos
especialmente sobre o sintoma cefaleia. Tanto a (idarucizumab e andexanet, por exemplo), quando
fístula dural quando a hipertensão intracraniana existe, a disponibilidade é baixa e também têm custo
são situações cujo principal e frequentemente único mais elevado. Trouxeram comodidade para médicos
sintoma clínico (especialmente em seu início) é a e pacientes, entretanto faltam estudos para que
cefaleia. Por conseguinte, o registro detalhado dos eles substituam completamente o tradicional uso
padrões de cefaleia (antes da trombose venosa, no dos inibidores da vitamina K, que já demonstraram
diagnóstico da trombose venosa e posterior à TVC), seu perfil de segurança e sua eficácia em diversas
incluindo tipo da dor, frequência, duração, respostas patologias, que têm reversores possível de menor
aos analgésicos e profiláticos, é de fundamental custo e maior disponibilidade32.
importância para selecionar os pacientes que
Nas situações de AVE isquêmico por
merecerão investigação por meio de exames de
fibrilação atrial, trombose venosa profunda,
imagem. O neurologista necessita estar atento a
tromboembolismo pulmonar e prevenção de TVP
toda e qualquer mudança no padrão de cefaleia.
após grandes cirurgias o uso dos NOACs já está
A despeito de todo cuidado e atenção, a mais bem estabelecido, fazendo parte da rotina
interpretação do sintoma cefaleia é desafiador, pois, de cardiologistas, neurologistas, neurocirurgiões e
sabe-se que esta é um dos principais sintomas ortopedistas, por exemplo. Entretanto, existe uma
residuais, ao lado de problemas cognitivos, da TVC. ampla gama de situações em que as evidências
Existe ainda uma lacuna no conhecimento sobre científicas não abordam diretamente o tema.
a cefaleia que corre após uma TVC, não existindo
Em relação à TVC, grupo de estudo RE-
dados sistematizados até o momento sobre o
SPECT CVT33 publicou um importante estudo
principal padrão, se esta cefaleia estaria relacionada
randomizado cujo objetivo foi comparar entre o uso
com cefaleias primárias prévias ou se estaria
de dabigatrana comparada com o uso dose ajustada
relacionada com alguma variável específica da TVC
de varfarina. Este foi um estudo formado por
ou de seu tratamento. Neste contexto, o julgamento
grupos em paralelo, multicêntrico e aberto. Foram
clínico e o cuidadoso exame físico são fundamentais
incluídos 120 pacientes, entre dezembro de 2016 a
para proporcionar o melhor atendimento médico aos
junho de 2018 em nove países, randomizados para
pacientes.
tratamento com dabigratrana 150 mg duas vezes
ao dia e varfarina em dose ajustada (60 em cada
grupo).
TÓPICOS EMERGENTES O tempo médio de exposição a dabigrana
Uso dos novos anticoagulantes orais no foi de 22,3 (6,16) semanas no grupo dabigatrana
tratamento da TVC e de 23,0 (5,20) no grupo varfarina. Não houve
Os novos anticoagulantes orais (NOAC, na recorrência da TVC em ambos os grupos. O grupo
sigla em inglês) são formados pelos inibidores do dabigatrana ocorreu em sangramento intestinal
fator Xa (ribaroxana, apixabana e edoxabana) e maior (1,7%; IC95%; 0,0-8,9) e dois eventos
pelos inibidores diretos da trombina (dabigatrana). (intracranianos) no grupo varfarina (3,3%; IC95%;
Foram uma grande revolução nos tratamentos 0,4-11,5). Recanalização foi documentada em 33
Capítulo 19 230
pacientes no grupo dabigatrana versus 35 no grupo tardios foram dificuldades neuropsicológicas (41%),
varfarina. Os autores, portanto, concluíram que a alteração de linguagem (21%) e cefaleia mais de
recorrência de TVC em ambos os grupo foi baixo e uma vez na semana (20%), depressão diagnosticada
o risco de sangramento foi semelhante nos grupos. (19%) e que apenas 57% dos pacientes retornaram
Em conjunto, esses achados sugerem que tanto ao trabalho. Ou seja, a despeito do bom resultado
dabigatrana como varfarina podem ser tratamentos na mRS, o retorno ao trabalho não foi completo e
seguros e efetivos no tratamento da TVC. os indivíduos sofrem com mudanças de humor,
linguagem e cefaleia. Mais estudos, entretanto,
No mesmo sentido, outros autores34,35
são necessários para melhor caracterizar esta
demostram evidências de que existe segurança
população, além dos desfechos analisados por meio
no uso de novos anticoagulantes orais. Entretanto,
do mRS e do NIHSS.
sempre com séries de casos (anteriores ao
estudo acima citados) e com número pequeno de
participantes. A molécula com maiores estudo é a
dabigatrana. Deste modo restam algumas dúvidas: REFERÊNCIAS
1. Dronkers CE, Klok FA, Huisman MV. Current and future
existem diferenças entre os NOACs? Qual o
perspectives in imaging of venous thromboembolism. J
desfecho entre a varfarina versus cada um dos Thromb Haemost. 2016 Sep;14(9):1696-1710.
NOACs? Existem diferenças em desfechos como 2. Sadigh G, Mullins ME, Saindane AM. Diagnostic
desempenho cognitivo, cefaleia, recanalização, Performance of MRI Sequences for Evaluation of Dural
Venous Sinus Thrombosis. AJR Am J Roentgenol.
recorrência tarde entre NOACs versus varfarina? 2016;206(6):1298-306.
A depender da etiologia da TVC, o desfecho entre 3. Chiewvit P, Piyapittayanan S, Poungvarin N. Cerebral
NOACs versus varfarina é diferente? venous thrombosis: diagnosis dilemma. Neurol Int.
2011;3(3):e13.
4. Niu PP, Yu Y, Guo ZN, Jin H, Liu Y, Zhou HW, Yang Y.
Diagnosis of non-acute cerebral venous thrombosis with
3D T1-weighted black blood sequence at 3T. J Neurol Sci.
SINTOMAS RESIDUAIS DA TVC 2016;367:46-50.
A TVC é tida como uma doença de baixa 5. Heldner MR, Zuurbier SM, Li B, et al. Prediction of
mortalidade e bom prognóstico, definido por Escala cerebral venous thrombosis with a new clinical score and
D-dimer levels. Neurology. 2020;95(7):e898-e909.
modificada de Rankin (mRS) de zero a 1. O estudo
6. Saposnik G, Barinagarrementeria F, Brown RD Jr, et al.
ISCVT 20
em um estudo prospectivo que incluiu
Diagnosis and management of cerebral venous thrombosis:
624 pacientes e após uma mediana de 16 meses a statement for healthcare professionals from the American
Heart Association/American Stroke Association. Stroke.
de seguimento, 356 (57,1%) não apresentavam
2011;42(4):1158-1192.
sintomas, 137 (22%) possuíam sintomas residuais e
7. Afshari D, Moradian N, Nasiri F, Razazian N, Bostani
47 (7,5%) apresentaram discretas sequelas. Nesse A, Sariaslani P. The efficacy and safety of low-molecular-
estudo a mortalidade ficou em 8,3%. Os principais weight heparin and unfractionated heparin in the treatment
of cerebral venous sinus thrombosis. Neurosciences
residuais descritos ou situações descritas após a (Riyadh). 2015;20(4):357-361.
TVC foram crises convulsivas (10,6%), cefaleia de 8. Bushnell C, Saposnik G. Evaluation and management of
forte intensidade (14,1%) e perda visual grave em cerebral venous thrombosis. Continuum (Minneap Minn).
2014;20(2):335-351.
6%. Koopman36 relatou em estudo grupo-controle
9. Einhäupl KM, Villringer A, Meister W, Mehraein S,
maior frequência de sintomas residuais no grupo
Garner C, Pellkofer M, Haberl RL, Pfister HW, Schmiedek
estudo. Cefaleia (43% vs 9%), cansaço (30% vs P. Heparin treatment in sinus venous thrombosis. Lancet.
1991;338(8767):597-600.
7%), sintomas depressivos (30% vs 7%), problemas
de concetração (75% vs 23%). No mesmo sentido 10. de Bruijn SF, Stam J. Randomized, placebo-controlled
trial of anticoagulant treatment with low-molecular-
Hiltunen37, em 2016, encontrou que em seu grupo de weight heparin for cerebral sinus thrombosis. Stroke.
161 indivíduos com TVC que os sintomas residuais 1999;30(3):484-488.
Capítulo 19 231
11. Coutinho J, de Bruijn SF, Deveber G, Stam 24. Wawrusiewicz-Kurylonek N, Krętowski AJ, Posmyk R.
J. Anticoagulation for cerebral venous sinus Frequency of thrombophilia associated genes variants:
thrombosis. Cochrane Database Syst Rev. 2011 Aug population-based study. BMC Med Genet. 2020;21(1):198.
10;2011(8):CD002005.
25. Aguiar de Sousa D, Canhão P, Ferro JM. Safety of
12. Siddiqui FM, Dandapat S, Banerjee C, Zuurbier Pregnancy After Cerebral Venous Thrombosis: A Systematic
SM, Johnson M, Stam J, Coutinho JM. Mechanical Review. Stroke. 2016;47(3):713-718.
thrombectomy in cerebral venous thrombosis: systematic
26. Aguiar de Sousa D, Canhão P, Crassard I, et al. Safety
review of 185 cases. Stroke. 2015;46(5):1263-1268.
of Pregnancy After Cerebral Venous Thrombosis: Results
13. Avanali R, Gopalakrishnan MS. Devi I, Bhat DI, Shukla of the ISCVT (International Study on Cerebral Vein and
DP, Shanbhag NC. Role of Decompressive Craniectomy in Dural Sinus Thrombosis)-2 PREGNANCY Study. Stroke.
the Management of Cerebral Venous Sinus Thrombosis. 2017;48(11):3130-3133.
Front Neurol. 2019;10:511.
27. Martinelli I, Passamonti SM, Maino A, et al. Pregnancy
14. Ageno W, Beyer-Westendorf J, Garcia DA, Lazo- outcome after a first episode of cerebral vein thrombosis. J
Langner A, McBane RD, Paciaroni M. Guidance for the Thromb Haemost. 2016;14(12):2386-2393.
management of venous thrombosis in unusual sites. J
28. Bates SM, Greer IA, Middeldorp S, Veenstra
Thromb Thrombolysis. 2016;41(1):129-43.
DL, Prabulos AM, Vandvik PO. VTE, thrombophilia,
15. Fam D, Saposnik G; Stroke Outcomes Research antithrombotic therapy, and pregnancy: Antithrombotic
Canada Working Group. Critical care management Therapy and Prevention of Thrombosis, 9th ed: American
of cerebral venous thrombosis. Curr Opin Crit Care. College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical
2016;22(2):113-119. Practice Guidelines. Chest. 2012;141(2):e691S-e736S.
16. Ferro JM, Bousser MG, Canhão P, et al. European 29. Durmuș B, Yperzeele L, Zuurbier SM. Cerebral venous
Stroke Organization guideline for the diagnosis and thrombosis in women of childbearing age: diagnosis,
treatment of cerebral venous thrombosis - endorsed treatment, and prophylaxis during a future pregnancy. Ther
by the European Academy of Neurology. Eur J Neurol. Adv Neurol Disord. 2020;13:1756286420945169.
2017;24(10):1203-1213.
30. Amoozegar F, Ronksley PE, Sauve R, Menon BK.
17. Coutinho JM, Majoie CB, Coert BA, Stam J. Hormonal contraceptives and cerebral venous thrombosis
Decompressive hemicraniectomy in cerebral sinus risk: a systematic review and meta-analysis. Front Neurol.
thrombosis: consecutive case series and review of the 2015;6:7.
literature. Stroke. 2009;40(6):2233-2235.
31. Swanepoel AC, Emmerson O, Pretorius E. Effect of
18. Einhäupl K, Stam J, Bousser MG, et al. EFNS guideline Progesterone and Synthetic Progestins on Whole Blood Clot
on the treatment of cerebral venous and sinus thrombosis in Formation and Erythrocyte Structure. Microsc Microanal.
adult patients. Eur J Neurol. 2010;17(10):1229-1235. 2017;23(3):607-617.
19. Liu Y, Li K, Huang Y, Sun J, Gao X. Treatment of the 32. Campello E, Spiezia L, Simion C, et al. Direct Oral
superior sagittal sinus and transverse sinus thrombosis Anticoagulants in Patients With Inherited Thrombophilia and
associated with intracranial hemorrhage with the mechanical Venous Thromboembolism: A Prospective Cohort Study. J
thrombectomy and thrombolytics: Case report. Medicine Am Heart Assoc. 2020;9(23): e018917.
(Baltimore). 2017;96(49):e9038.
33. Ferro JM, Coutinho JM, Dentali F, et al. Safety
20. Ferro JM, Canhão P, Stam J, Bousser MG, and Efficacy of Dabigatran Etexilate vs Dose-Adjusted
Barinagarrementeria F; ISCVT Investigators. Prognosis Warfarin in Patients With Cerebral Venous Thrombosis: A
of cerebral vein and dural sinus thrombosis: results of Randomized Clinical Trial. JAMA Neurol. 2019;76(12):1457-
the International Study on Cerebral Vein and Dural Sinus 1465.
Thrombosis (ISCVT). Stroke. 2004;35(3):664-670.
34. Bose G, Graveline J, Yogendrakumar V, Fergusson D,
21. Dutra AP. Trombose venosa cerebral - evolução clínica Dowlatshahi D. Direct oral anticoagulants in treatment of
e fatores prognóstico em 111 pacientes [tese de doutorado]. cerebral venous thrombosis: a systematic review protocol.
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Syst Rev. 2019;8(1):99.
2008.
35. Fayyaz M, Abbas F, Kashif T. The Role of Warfarin
22. Lijfering WM, Brouwer JL, Veeger NJ, et al. and Rivaroxaban in the Treatment of Cerebral Venous
Selective testing for thrombophilia in patients with first Thrombosis. Cureus. 2019;11(5):e4589.
venous thrombosis: results from a retrospective family
36. Koopman K, Uyttenboogaart M, Vroomen PC, van der
cohort study on absolute thrombotic risk for currently
Meer J, De Keyser J, Luijckx GJ. Long-term sequelae after
known thrombophilic defects in 2479 relatives. Blood.
cerebral venous thrombosis in functionally independent
2009;113(21):5314-5322.
patients. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2009;18(3):198-202.
23. Cohen W, Castelli C, Alessi MC, et al. ABO blood
37. Hiltunen S, Putaala J, Haapaniemi E, Tatlisumak T.
group and von Willebrand factor levels partially explained
Long-term outcome after cerebral venous thrombosis:
the incomplete penetrance of congenital thrombophilia.
analysis of functional and vocational outcome, residual
Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2012;32(8):2021-8.
symptoms, and adverse events in 161 patients. J Neurol.
2016;263(3):477-484.
Capítulo 19 232
CAPÍTULO 20
ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO
HEMORRÁGICO HIPERTENSIVO
compõem grande causa de morbiletalidade na população Em pesquisas com ratos4,16 verificamos que, com
brasileira sendo a segunda causa principal de morte tempo definido de insuflação de um balão com o mesmo
sendo que o acidente vascular encefálico hemorrágico volume, em dois grupos de ratos (um com volume maior
(AVEh) perfaz 15 a 17% de todos os AVEs. A amiloidose, que o outro) há morte celular maior no de maior volume.
hipertensão arterial e metástases cerebrais são causas Se usarmos balões com volume de fluido iguais, o que
frequentes de hematomas intraparenquimatosos em permanecer mais tempo com balão insuflado terá maior
idosos, e em jovens as malformações arteriovenosas morte de neurônios. Quando comparamos volumes iguais
(MAV), cavernomas, uso de drogas ilícitas e drogas com balão e sangue injetados por estereotaxia em ratos,
simpatomiméticas tem sido a etiologia principal1-16. há morte e lesão tecidual maior no que foi administrado
A hipertensão arterial no Brasil é muito prevalente sangue, mostrando a irritabilidade do sangue no tecido
e o controle tem sido obtido através de distribuição cerebral4. Isso demonstra que a morte celular dependerá
de drogas pelo Sistema Único de Saúde. Todavia, do volume do hematoma, do tempo que este hematoma
muitos pacientes não conseguem atingir uma rotina de ficará comprimindo tecido cerebral e, substancialmente,
medicação anti-hipertensiva e os escapes de pressão o hematoma será mais deletério que a isquemia pelos
em uma artéria já comprometida por diabetes, tabagismo efeitos dos derivados tóxicos do grupo heme, bilirrubina,
Capítulo 20 233
cursa com sinais meningoradiculares. Muitos
INDICAÇÕES
pacientes, pelo volume de hematoma, evoluem para
Hematomas com mais de 3 cm em cerebelo
o coma profundo. A tomografia computadorizada
devem ser sempre drenados. Aqueles localizados
(TC) é imperativa nesse momento para diferenciar
em região do central core com volumes maiores
se é um evento isquêmico ou hemorrágico3,9,10
de 52 cm3 e desvio de linha média importante são,
(Figura 1).
de início, cirúrgicos. Sinais inequívocos clínicos de
A depender da extensão da hemorragia, deve- herniação devem ser considerados na indicação
se proceder uma angioTC na urgência, ou angiografia precoce11.
digital, para descartar MAV ou aneurismas cerebrais
em jovens5.
hipertensão intracraniana pelo hematoma, por meio sódio, mas que não haja prejuízo da pressão de
de aumento do índice de pulsatilidade, e servirá perfusão cerebral, a qual deve estar em torno de 60
PPC=PAM-PIC
Capítulo 20 234
parâmetros de monitoração multimodal. BiS (bispectral index monitoring) com valores
abaixo de 40, para taxa de supressão. Em muitos
Proteção gástrica e anticonvulsivantes,
casos, a hipotermia leve de 35 a 36 graus Celsius
normalmente fenitoína, com ataque (e depois
pode ser usada com colchão térmico, por semanas,
manutenção) devem ser adicionadas à prescrição.
descontinuando se houver coagulopatia ou arritmia
A cirurgia deve contemplar a região cardíaca16.
anatômica do hematoma intraparenquimatoso. Leve
corticectomia deve ser realizada. Sob magnificação
microscópica, o hematoma deve ser removido REFERÊNCIAS
lentamente com instilacão contínua de soro fisiológico 1 Ziai WC, Thompson CB, Mayo S, et al. Intracranial
para desfazer os coágulos. Hemostasia meticulosa, Hypertension and Cerebral Perfusion Pressure Insults
in Adult Hypertensive Intraventricular Hemorrhage:
com coagulação bipolar e hemostáticos (Surgicel, Occurrence and Associations With Outcome. Crit Care Med.
Johnson & Johnson, EUA) deve ser realizada e, 2019;47(8):1125-1134.
sempre que possível, monitoração neurofisiológica 2 Qureshi AI, Mendelow AD, Hanley DF. Intracerebral
haemorrhage. Lancet. 2009;373(9675):1632-1644.
intraoperatória deve ser utilizada para minimizar os
3 Mendelow AD, Unterberg A. Surgical treatment
efeitos deletérios da manipulação de áreas motoras of intracerebral haemorrhage. Curr Opin Crit Care.
ou funcionais. Pode ser removido o coágulo com 2007;13(2):169-174.
endoscopia e trombolíticos6,7,14. 4 Mendelow AD. Comment on ‘Time window for clinical
effectiveness of mass evacuation in a rat balloon model
No passado, era instilada estreptoquinase e mimicking an intraparenchymatous hematoma’. J Neurol
uroquinase para dissolver coágulos sólidos. Hoje se Sci. 2000;174(1):1-2.
sabe que os riscos são maiores que os benefícios, 5 Mendelow AD, Gregson BA, Mitchell PM, et al. Surgical
trial inlobar intracerebral haemorrhage (STICH II) protocol.
porém alteplase e trombolíticos modernos podem Trials. 2011;12:124.
ser usados desfazendo os coágulos e facilitando 6 Mendelow AD, Gregson BA, Rowan EN, Murray GD,
remoção com aspiradores cirúrgicos13. A instilação Mitchell PM. Surgery for cerebral haemorrhage-STICH II
trial - Authors’ reply. Lancet. 2013;382(9902):1402.
contínua com soro morno parece ser benéfica e ajuda
7 Mendelow AD. Surgical Craniotomy for Intracerebral
na remoção dos coágulos. O uso de endoscopia Haemorrhage. Front Neurol Neurosci. 2015;37:148-54.
para remoção de coágulos pode ser terapêutico,
8 Mendelow AD. Operation versus non-operative treatment
mas está associado à remoção parcial do coágulo e for spontaneous supratentorial intracerebral haemorrhage:
manutenção de resíduos, o que poderia prejudicar o Is a change in current clinical practice required? Neurol
India. 2017;65(4):759-760.
tecido circunvizinho ao hematoma4,16.
9 Hanley DF, Thompson RE, Rosenblum M, et alEfficacy
A derivação ventricular externa pode ser and safety of minimally invasive surgery with thrombolysis
in intracerebral haemorrhage evacuation (MISTIE III): a
usada quando a hidrocefalia aguda acontece, randomised, controlled, open-label, blinded endpoint phase
em vigência de obstrução dos forames de Monro, 3 trial. Lancet. 2019;393(10175):1021-1032.
devido aos coágulos endurecidos ou pela falta 10 Haley MD, Gregson BA, Mould WA, Hanley DF,
Mendelow AD. Retrospective Methods Analysis of
de absorção de líquor quando as granulações Semiautomated Intracerebral Hemorrhage Volume
aracnoideas e inflamação 12
estão obstruídas por Quantification From a Selection of the STICH II Cohort
(Early Surgery Versus Initial Conservative Treatment
resíduos sanguíneos. O cateter de monitorização da
in Patients With Spontaneous Supratentorial Lobar
PIC deve ser inserido nos ventrículos e raramente Intracerebral Haematomas). Stroke. 2018;49(2):325-332.
nos parênquimas. 11 Gregson BA, Mitchell P, Mendelow AD. Surgical Decision
Making in Brain Hemorrhage. Stroke. 2019;50(5):1108-1115.
A sedação com monitoração da pressão
12 Fam MD, Zeineddine HA, Eliyas JK, et al. CSF
intracraniana deve ser realizada no pós-operatório inflammatory response after intraventricular hemorrhage.
e muitas vezes mantida por uma a duas semanas Neurology. 2017;89(15):1553-1560.
Capítulo 20 235
13 Chambers IR, Banister K, Mendelow AD. Intracranial 15. Auer LM, Deinsberger W, Niederkorn K, et al.
pressure within a developing intracerebral haemorrhage. Br Endoscopic surgery versus medical treatment for
J Neurosurg. 2001;15(2):140-141. spontaneous intracerebral hematoma: a randomized study.
J Neurosurg. 1989;70(4):530-535.
14 Broderick JP, Brott TG, Duldner JE, Tomsick T, Huster
G. Volume of intracerebral hemorrhage. A powerful and 16 Aguiar PH, Mandel M, Lourenço L, et al. Hemorragia
easy-to-use predictor of 30-day mortality. Stroke. 1993 intracerebral espontânea: O que há de novo? J Bras
Jul;24(7):987-993. Neurocir. 2001;12(3):126-138.
Capítulo 20 236
CAPÍTULO 21
HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA
após admissão hospitalar1,2. Boa parte dos pacientes o dano inicial, com duração de 3-4 dias após o
que sobrevivem à fase aguda e subaguda acabam por ictus, iniciado com ruptura de aneurisma cerebral e
manter diversas incapacidades físicas e cognitivas extravasamento de sangue para espaço subaracnoideo.
que reduzem a sobrevida a longo prazo, com estudos O aumento da pressão intracraniana inicial pode ser
prospectivos demonstrando taxas da mortalidade de, compensado inicialmente pela autorregulação cerebral
aproximadamente, 18%, 29,5% e 43,6% em 10, 15 ou mantido como consequência de inchaço cerebral e
comprometer anos de vida produtiva destes doentes, cerebral é característica em pacientes com HSA durante
gerando altos custos à sociedade3,4. evolução clínica, o que promove diminuição difusa e
generalizada do fluxo sanguíneo cerebral (FSC) e lesão
Em geral, a HSA não-traumática tem etiologia
isquêmica secundária. O insulto isquêmico desencadeia
na ruptura de um aneurisma cerebral (cerca de
uma cascata fisiopatológica relacionada à hipóxia e
85% dos casos), acometendo preferencialmente
inflamação, com piora do inchaço cerebral e manutenção
indivíduos de meia idade (aproximadamente 50 anos),
do edema cerebral difuso. Portanto, a condição
predominantemente do sexo feminino, portadores de
sustentada de hipertensão intracraniana (HIC) e lesão
fatores de risco classicamente relacionados a doenças
inflamatória direta ao tecido cerebral acaba por resultar
cardiovasculares, como hipertensão e tabagismo5. No
em herniação cerebral, pior cenário clínico no contexto
entanto, podem ser causadas de forma espontânea sem
de lesão cerebral precoce7.
lesão aneurismática detectável ou ainda relacionadas
Capítulo 21 237
aneurismas, localizados no segmento comunicante
Isquemia cerebral tardia
posterior da artéria carótida interna (ACI).
O processo fisiopatológico relacionado com
isquemia cerebral está relacionado, inicialmente, O conceito de cefaleia sentinela está
por lesão direta por radicais livres, produtos ou a maior fragilidade da parede dos aneurismas
microcirculação promove insulto isquêmico adicional nova de início súbito, intensa, tipo pontada que, em
ao tecido, ativação das vias inflamatórias, ativação geral, precede ruptura de aneurisma cerebral em
de plaquetas, o que resulta na formação de trombos como essas devem ser prontamente investigadas10.
Capítulo 21 238
hiperdensidade localizada em espaços cisternais a diagnósticos diferenciais como coleções de origem
depender da localização dos AIs. Além disso, avalia neoplásica, inflamatória ou infecciosa15.
de forma satisfatória a presença de hidrocefalia,
hemorragia intraventricular e hematomas Exames de imagem na investigação
vascular
intracerebrais. Na HSA aneurismática, a escala
Apesar dos avanços da angioTC de crânio
tomográfica de Fisher modificada 12
correlaciona a
na identificação de AIs, a angiografia por subtração
magnitude da hemorragia subaracnoidea com risco
digital (ASD) continua sendo o exame padrão-
de desenvolvimento de vasoespasmo cerebral após
ouro. A praticidade e disponibilidade da angioTC
HSA (Figura 1).
a tem tornado o principal exame utilizado para
investigação e estudo vascular em HSA. A angioTC
Punção lombar
com reconstrução tridimensional proporciona
Como discutido anteriormente, cerca de 5% detalhamento anatômicos dos AIs, bem como
dos pacientes com apresentação clínica típica, relações com demais estruturas, principalmente
podem apresentar TC normal. Nestes doentes, a com marcos anatômicos ósseos da base do crânio
punção lombar está indicada para excluir hemorragia como os processos clinoideos anterior ou posterior.
meníngea, embora tenha baixa sensibilidade para Em exames de boa qualidade, a angioTC pode
diagnóstico de HSA. A prática se justifica pela sua atingir valores de sensibilidade e especificidade de
importância para definição de conduta13. 90 a 97% e 93 a 100%, respectivamente, quando
Algumas medidas podem ser tomadas comparado à ASD16.
para aumentar a sensibilidade diagnóstica da Em centros onde a ASD está amplamente
punção lombar. Quanto mais tardia a punção em disponível, bem como o tratamento endovascular, a
relação ao ictus, maior a sensibilidade. Cerca de angioTC pode não ser realizada no mesmo tempo
12h após o sangramento, o líquor (LCR) coletado da TC de crânio para reduzir exposição a radiação,
contém produtos da degradação da hemoglobina contraste e, eventualmente, reações anafiláticas.
como bilirrubina, o que pode ser diferenciado de Entretanto, a ASD não é isenta de riscos, consiste
sangramento agudo ocasionado por acidentes de em um exame invasivo com risco de complicações,
punção. O LCR pode ser coletado em três tubos que variam de 1 a 8%17.
seriados e avaliação de redução na contagem
Doentes com HSA, porém sem lesões
de hemácias em espectrofotometria e aspecto
identificadas em ASD, devem ser submetidos a um
xantocrômico mantido no último tubo para
novo exame em 7 a 14 dias após o exame inicial.
diagnóstico de HSA. Após centrifugação, se mantido
Além disso, a investigação deve ser complementada
sobrenadante xantocrômico e confirmado presença
com estudo cervical (por exemplo, RM cervical) para
de bilirrubina na espectrofotometria confirma-se
descartar fístulas ou MAVs do tronco cerebral ou da
diagnóstico de HSA14.
coluna cervical.
Capítulo 21 239
Classificação de Hunt & Hess da HSA
Vasoespasmo
Grau Descrição
clínico
0 Aneurisma não-roto -
1 Paciente assintomático ou com leve cefaleia e leve rigidez de nuca 22%
1a Sem reação meníngea/cerebral aguda, mas com déficit neurológico fixo -
Paralisia de NC (por exemplo, III e VI), cefaleia variando de moderada a
2 33%
grave, rigidez na nuca
3 Déficit focal leve, letargia ou confusão 52%
Estupor, hemiparesia variando de moderada a grave, rigidez de
4 53%
descerebração precoce
5 Coma profundo, rigidez de descerebração, aspecto moribundo 74%
Obs 1: Acrescentar um grau para doença sistêmica grave (por exemplo, hipertensão, diabetes melito,
aterosclerose grave, doença pulmonar obstrutiva crônica) ou vasoespasmo significativo na arteriografia.
Obs 2: Os graus “0” e “1a” não faziam parte da classificação original.
Quadro 1 – Escala de Hunt & Hess modificada.
Fonte: Baseado em Rosen e MacDonald, 2205 11.
Figura 1: Escala de Fisher modificada com sequencias de imagens de TC de crânio com principais achados
radiográficos de HSA. A. Corte axial de TC de crânio sem contraste com HSA focal ou fina em superfície cortical parietal
direita seta vermelha; B. Corte axial de TC sem contraste com HSA focal ou final em cisterna silviana e hemoventrículo
setas vermelhas; C. Corte axial de TC com HSA espessa em cisterna carotídea, cisterna silviana (seta vermelha) e
perimesencefálica.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 21 240
hemorragia cisternal, localizada anteriormente ao mostrando anormalidades vasculares dinâmicas,
mesencéfalo, sem extensão ao ventrículo ou com que alternam entre regiões de estenose e dilatação.
componente intracerebral. Esta condição acomete Métodos não invasivos como angioTC e angioRM
preferencialmente indivíduos do sexo masculino, também podem ser utilizados, com boa acurácia
sem relação com fatores de risco classicamente diagnóstica quando associada a uma história clínica
relacionados à HSA aneurismática (por exemplo, típica. Porém, apresenta menor sensibilidade se
hipertensão e tabagismo). AngioTC e ASD são realizada antes de 3 a 5 dias do início dos sintomas,
recomendados para investigação quanto à origem pois a vasoconstrição costuma iniciar distalmente,
do sangramento. Recomenda-se repetir ASD em vasos que não são bem visualizados por
em 7 a 14 dias após o ictus para excluir AIs. Em esses métodos. Apesar disso, é comum que os
cerca de 4% das hemorragias perimesencefálicas, pacientes precisem submeter-se a repetidos
aneurismas pequenos na circulação posterior estudos angiográficos, tanto pela falta de achados
podem ser identificados em ASD seriada (Figura característicos da SVCR como, principalmente, pela
2). A evolução clínica desta condição é benigna em gravidade de uma possível HSA aneurismática não
comparação com HSA aneurismática; piora do nível diagnosticada21.
de consciência e déficits focais foram descritos em
A Figura 3 resume o fluxograma diagnóstico
menos de 5% dos casos18.
em HSA.
Síndrome da vasoconstricção cerebral reversível
(SVCR)
MANEJO CLÍNICO E TRATAMENTO
A SVCR compõe um espectro de manifestações
neurológicas causadas por estenoses multifocais, Suporte clínico inicial para HSA
porém reversíveis, das artérias cerebrais. Está O manejo inicial de HSA consiste em
relacionada a determinadas condições clínicas diagnóstico precoce e atendimento inicial com
como uso de drogas vasoconstrictoras, tabagismo, priorização de preservação de vias aéreas,
gravidez e migrânea . Clinicamente, caracteriza-
19
padrão respiratório e cardiovascular. Dessa forma,
se por cefaleia de forte intensidade, geralmente pacientes com piora do nível de consciência
acompanhada de náusea e fotossensibilidade, com devem imediatamente ser submetido à intubação
flutuações de melhora e exacerbação recorrentes orotraqueal (IOT) e, aqueles doentes com sinais
por dias a semanas. Outras apresentações possíveis clínicos de hipertensão intracraniana (HIC), devem
são crise convulsiva, hemiplegia, ataxia e déficits ser submetidos a analgesia e sedação, elevação
visuais – principalmente quando associada com a de decúbito para controle da pressão intracraniana
síndrome de leucoencefalopatia posterior reversível desde atendimento pré-hospitalar.
(síndrome PRES) .20
Após estabilização inicial, há recomendação
Apesar de não ser a apresentação mais de transferência dos doentes com HSA para
comum, alguns pacientes podem desenvolver HSA centros especializados em manejo de doenças
da convexidade, provavelmente devido à ruptura cerebrovasculares. A admissão destes doentes em
de pequenas artérias de superfície, submetidas a serviços com baixo volume (<35 casos de HSA por
estresse mecânico dinâmico de vasoconstricção- ano) está relacionado a maior mortalidade em 30
vasodilatação. Em uma série de 139 pacientes com dias22,23.
SVCR, houve desenvolvimento de lesão cerebral em
81% dos casos, com HSA de convexidade em cerca Prevenção de ressangramento
de 33% .
21
Os pacientes que alcançam atendimento
Capítulo 21 241
Figura 2: Caso ilustrativo de doente de 61 anos com cefaleia súbita de forte intensidade associada à diplopia. Na
TC de crânio sem contraste, evidenciada HSA perimesencefálica predominantemente em cisterna pré-pontina e
perimesencefálica a direita (A, B e C). Submetido a angioTC, sem evidências de lesões aneurismásticas, bem
como ASD inicial logo após admissão. Repetida ASD após 1 semana, com achado de aneurismas blister de ACI
supraclinoidea (D e E).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 21 242
a unidades de terapia intensiva (UTI) para manejo grau de independência para atividade de vida diária
clínico inicial relacionado a síndrome de resposta em seguimento de 10 anos. Entretanto, o tratamento
inflamatória sistêmica (SIRS) e, concomitantemente, microcirúrgico apresentou menores taxas de
controle de pressão para prevenção de recanalização de AI, representando menor risco de
ressangramento de aneurismas ainda não tratados. ressangramento a longo prazo25. O ensaio clínico
BRAT (Barrow ruptured aneurysm trial), conduzido
O risco de ressangramento de aneurisma roto
em um único centro e de menores dimensões que
é maior nas primeiras 72h do ictus, sendo a grande
o ISAT, apresentou alguns dados relevantes em
maioria (50 a 90%) ocorrendo nas primeiras 6h24 com
relação a alta taxa de “crossover” entre doentes
morbimortalidade de 80%9. A medida mais efetiva para
inicialmente randomizados ao grupo endovascular
prevenção de ressangramento consiste em controle
e posteriormente encaminhados para tratamento
de pressão arterial rigoroso, de preferência através
microcirúrgico, por falha do tratamento inicial.
de medidas invasivas de pressão arterial, mantendo-
Além disso, os pacientes do grupo de tratamento
se a pressão arterial sistólica abaixo de 160 mmHg.
endovascular foram submetidos com maior
O controle de pressão deve ser preferencialmente
frequência a um segundo tempo de tratamento para
controlado com medicamentos IV, evitando-se
AIs26.
flutuações nos valores de pressão. Além disso, um
adequado controle da dor deve ser objetivado neste Diversos fatores influenciam na decisão
momento da doença, principalmente relacionado à terapêutica dos AIs rotos. A condição clínica e
irritação meníngea. Dessa forma, o uso de opioides idade dos doentes, localização dos aneurismas,
fortes de ação rápida ou até associados a uso não características morfológicas e angioarquitetura
prologado de corticoides devem ser recomendados. dos AIs. Compreende-se que o tratamento com
clipagem dos aneurismas é mais “definitivo” em
Não há evidência clara do uso de
relação às técnicas endovasculares; portanto, desde
antifibrinolíticos (ácido tranexâmico) para prevenção
que em condições clínicas factíveis e aneurismas
de ressangramento em HSA aneurismática. Alguns
anatomicamente acessíveis, estes devem ser
ensaios clínicos randomizados têm recomendado
tratados por microcirurgia. Alguns doentes
uso seguro de antifibrinolíticos por curto período
apresentam-se com sinais de franca hipertensão
de tempo (≤ 72h). As principais complicações
intracraniana por inchaço hemisférico ou hematoma
relacionadas ao uso prolongado de antifibrinolíticos
intracerebral; estes pacientes necessariamente
consiste em maiores riscos de trombose venosa
devem ser submetidos ao tratamento cirúrgico para
profunda, AVE isquêmico e infarto agudo do
controle de HIC e tentativa de clipagem do AIs no
miocárdio.
mesmo tempo.
Capítulo 21 243
aneurismas da circulação posterior. HSA é tão exuberante quanto os efeitos no sistema
nervoso central. A ruptura de um AI promove o início
Em relação à idade, indivíduos mais jovens,
de lesão cerebral precoce, perda de autorregulação
com maior reserva funcional e expectativa de
cerebral e lesão isquêmica secundária. Os
vida, devem ser preferencialmente submetidos
processos fisiopatológicos da HSA promovem
ao tratamento microcirúrgico, devido ao risco de
aumento da circulação de citocinas inflamatórias
recanalização com o tratamento endovascular no
que desencadeiam processo inflamatório com
seguimento e necessidade de novo tratamento para
repercussões sistêmicas.
prevenir ressangramento.
O extravasamento de sangue no espaço
AIs de colo largo são mais favoráveis
subaracnoideo promove secreção hipotalâmica de
ao tratamento microcirúrgico pela dificuldade
catecolaminas, responsável pela descarga simpática
de posicionamento de molas dentro do saco
e importante repercussão cardiopulmonar23. As
aneurismático; entretanto, avanços em técnicas de
repercussões cardíacas na HSA podem variar desde
embolização assistida por stent têm possibilitado
quadros transitórios de taquiarritmia, disfunção de
o tratamento seguro destas lesões por técnica
ventrículo esquerdo leve até miocardiopatia grave
endovascular.
por lesão direta de catecolaminas hipotalâmicas no
A decisão do melhor tratamento para miocárdio. A limitação na função cardíaca inotrópica e
aneurismas cerebrais rotos deve ser individualizada aumento da pós-carga por vasoconstricção periférica
e compartilhada em equipe multidisciplinar resultam em edema pulmonar, piora do padrão
com neurocirurgiões, neurorradiologistas e, respiratório e hipóxia. Portanto, pacientes com HSA
principalmente, profissionais da terapia intensiva. devem estar monitorados em terapia intensiva com
intuito de identificar precocemente repercussões
Tratamento de hidrocefalia sistêmicas e evitar lesões secundárias27.
A hidrocefalia após HSA ocorre em,
O controle de temperatura é essencial nesses
aproximadamente, 20% dos doentes . Em geral 5
doentes visto que aproximadamente 70% podem
comporta-se como hidrocefalia comunicante de
apresentar febre em fases iniciais da doença. A
instalação de minutos até dias após o ictus. Estima-
principal medida é manter normotermia e descartar
se que em 30% dos casos há resolução espontânea
causas infecciosas como origem da febre; não há
da dilatação ventricular; portanto, em pacientes sem
evidências de benefício de hipotermia controlada em
sinais e sintomas de HIC pode-se tentar conduta
HSA.
não cirúrgica inicial para hidrocefalia. Entretanto,
doentes intubados e com sinais de hidrocefalia Após o tratamento dos AIs, recomenda-se
aguda pós HSA na TC devem ser submetidos à manter hipertensão induzida (em geral, pressão
derivação ventricular externa, preferencialmente arterial média > 90 mmHg) conforme características
dependência do sistema de derivação deve ser cerebral através do Doppler transcraniano (DTC)
testada após 48h de sua inserção, devido alto risco de seriado pode guiar a faixa de pressão ideal para
ventriculite. Aproximadamente 40% desses doentes esses pacientes. Droga inotrópicas (milrinona e
necessitam de derivação ventrículo peritoneal. dobutamina) pode ser utilizada em pacientes com
cardiopatias e baixo débito cardíaco28.
Suporte intensivo para HSA Além disso, esses doentes devem, idealmente,
Síndrome resposta inflamatória sistêmica ser mantidos euvolêmicos ou com balanço hídrico
Capítulo 21 244
isquemia cerebral tardia. Sd. cerebral
SIADH
perdedora de sal
Outros cuidados que devem ser atentados em
Peso Perda de peso Ganho de peso
paciente com HSA consistem em controle de sódio
Volemia Hipovolemia Euvolemia
(Na), controle de glicemia e prevenção de anemia29.
Hematócrito Alto Normal ou baixo
A descarga adrenérgica secundária a ruptura Hipotensão
Presente Ausente
postural
de um aneurisma cerebral, aumento do metabolismo
Balanço Hídrico Negativo Positivo
associado a jejum prolongado aumentam risco de
Pressão venosa
hipoglicemia e crise metabólica cerebral. Portanto, < 6 cmH2O > 6 cmH2O
central (PVC)
associado a piores desfechos clínicos. Idealmente,
Quadro 2: Diferenças entre SIADH e síndrome cerebral
os níveis de glicemia devem ser mantidos entre 80 perdedora de sal.
a 200 mg/dL30. Fonte: Modificado de Connolly et al., 2021 30.
Capítulo 21 245
Alguns estudos sugerem efeitos do uso de cerebral. Entretanto, o déficit deve
bloqueador de canal de cálcio – nimodipina – como ser atribuído a: 1) território isquêmico
medida de prevenção de vasoespasmo pós-HSA por compatível com déficit neurológico;
2) não deve ter relação com compli-
manter volume intravascular. Entretanto, apesar de
cações durante o tratamento do AI; e
estar relacionado a melhores desfechos clínicos, não
3) excluído complicações clínicas da
previne vasoespasmo angiográfico. O mecanismo HSA que levem a piora do neurológica
fisiopatológico neuroprotetor da nimodipina ainda é como: hidrocefalia, epilepsia, ressan-
pouco esclarecida, entretanto, seu benefício clínico gramento ou distúrbios do sódio.
para doentes com HSA é inquestionável33.
2. isquemia cerebral: região de hipodensidade
na TC de crânio ou área de restrição à
difusão na RM até 6 semanas após o ictus.
Vasoespasmo
Entretanto, a área de infarto não deve
Alguns conceitos devem ser definidos para surgir no mesmo território de manipulação
estudo do vasoespasmo pós-HSA: o vasoespasmo e logo após tratamento cirúrgico para
cerebral identificado em exames de imagem podem oclusão de aneurisma cerebral, bem
como devem ser excluídas outras causas
ter repercussões clínicas ou não. A repercussão
como hematoma intracerebral ou lesões
clínica do vasoespasmo pode ser denominada
relacionadas a retração cerebral durante
vasoespasmo clínico ou déficit neurológico isquêmico clipagem microcirúrgica.
tardio (delayed ischemic neurologic déficit - DIND).
A presença de vasoespasmo documentado em
exames de imagem não determina a ocorrência de
DIND; bem como a presença de déficit neurológico
CONCLUSÃO
pode preceder a ocorrência de vasoespasmo nos HSA é uma condição grave que deve
exames, tendo o infarto cerebral como desfecho ser compreendida com doença sistêmica com
final e irreversível31. resposta inflamatória exacerbada. Apesar dos
avanços no tratamento de AIs por meio de técnicas
endovasculares e cirurgias minimamente invasivas,
Conceitos poucos avanços nos cuidados intensivos e
prevenção de complicações têm sido alcançados.
1. vasoespasmo cerebral:
O vasoespasmo é a complicação mais frequente e
• angiografia cerebral/angioTC: estrei- mais temida em doentes com HSA, responsável pela
tamento maior que 50% do diâmetro maioria das evoluções clínicas desfavoráveis.
normal, prolongado e reversível, dos
principais vasos da circulação cerebral
após HSA;
REFERÊNCIAS
• DTC: aumento da velocidade de fluxo 1. Go AS, Mozaffarian D, Roger VL, et al. Heart Disease
da artéria cerebral média > 120 cm/s; and Stroke Statistics – 2014 Update: A report from the
American Heart Association. Vol. 129. Circulation; 2014.
e
2. Lovelock CE, Rinkel GJ, Rothwell PM. Time trends in
• vasoespasmo clínico/DIND: Déficit outcome of subarachnoid hemorrhage: Population-based
study and systematic review. Neurology. 2010;74(19):1494-
neurológico focal (hemiparesia, afa- 1501.
sia, hemianopsia e heminegligência)
3. Roquer J, Cuadrado-Godia E, Guimaraens L, et
ou global (piora do nível de consciên- al. Short- and long-term outcome of patients with
cia) com duração de pelo menos 1h aneurysmal subarachnoid hemorrhage. Neurology.
ou compatível com região de infarto 2020;95(13):e1819-e1829.
Capítulo 21 246
4. Muehlschlegel S. Subarachnoid Hemorrhage. Continuum 20. Muehlschlegel S, Kursun O, Topcuoglu MA, Fok
(Minneap Minn). 2018;24(6):1623-1657. J, Singhal AB. Differentiating reversible cerebral
vasoconstriction syndrome with subarachnoid hemorrhage
5. Greving JP, Wermer MJH, Brown RD, et al. Development
from other causes of subarachnoid hemorrhage. JAMA
of the PHASES score for prediction of risk of rupture of
Neurol. 2013;70(10):1254-1260.
intracranial aneurysms: A pooled analysis of six prospective
cohort studies. Lancet Neurol. 2014;13(1):59–66. 21. Singhal AB, Hajj-Ali RA, Topcuoglu MA, Fok J, Bena J,
Yang D, Calabrese LH. Reversible cerebral vasoconstriction
6. Al-Khindi T, Macdonald RL, Schweizer TA. Cognitive
syndromes: analysis of 139 cases. Arch Neurol.
and functional outcome after aneurysmal subarachnoid
2011;68(8):1005-1012.
hemorrhage. Stroke. 2010;41(8):e519-36.
22. Rush B, Romano K, Ashkanani M, McDermid RC,
7. van Lieshout JH, Dibué-Adjei M, Cornelius JF, et al.
Celi LA. Impact of hospital case-volume on subarachnoid
An introduction to the pathophysiology of aneurysmal
hemorrhage outcomes: A nationwide analysis adjusting for
subarachnoid hemorrhage. Neurosurg Rev. 2018;41(4):917-
hemorrhage severity. J Crit Care. 2017;37:240-243.
930.
23. Suarez JI. Diagnosis and Management of Subarachnoid
8. Ruigrok YM, Rinkel GJ, Algra A, Raaymakers TW,
Hemorrhage. Continuum (Minneap Minn). 2015;21(5):1263-
Van Gijn J. Characteristics of intracranial aneurysms in
1287.
patients with familial subarachnoid hemorrhage. Neurology.
2004;62(6):891-894. 24. Macdonald RL, Schweizer TA. Spontaneous
subarachnoid haemorrhage. Lancet. 2017;389(10069):655-
9. van Gijn J, Kerr RS, Rinkel GJ. Subarachnoid
666.
haemorrhage. Lancet. 2007;369(9558):306-18.
25. Molyneux AJ, Birks J, Clarke A, Sneade M, Kerr RS.
10. De Falco FA. Sentinel headache. Neurological Sciences.
The durability of endovascular coiling versus neurosurgical
2004;25:S215-217.
clipping of ruptured cerebral aneurysms: 18 year follow-
11. Rosen DS, Macdonald RL. Subarachnoid hemorrhage up of the UK cohort of the International Subarachnoid
grading scales: a systematic review. Neurocrit Care. Aneurysm Trial (ISAT). Lancet. 2015;385(9969):691-697.
2005;2(2):110-118.
26. Spetzler RF, McDougall CG, Zabramski JM, et al. Ten-
12. Frontera JA, Claassen J, Schmidt JM, et al. Prediction year analysis of saccular aneurysms in the Barrow Ruptured
of symptomatic vasospasm after subarachnoid hemorrhage: Aneurysm Trial. J Neurosurg. 2019;132(3):771-776.
the modified fisher scale. Neurosurgery. 2006;59(1):21-27.
27. Hall A, O’Kane R. The Extracranial Consequences
13. Rabinstein AA, Lanzino G. Aneurysmal Subarachnoid of Subarachnoid Hemorrhage. World Neurosurg.
Hemorrhage: Unanswered Questions. Neurosurg Clin N Am. 2018;109:381-392.
2018;29(2):255-262.
28. Reynolds MR, Buckley RT, Indrakanti SS, et al. The
14. Perry JJ, Alyahya B, Sivilotti ML, et al. Differentiation safety of vasopressor-induced hypertension in subarachnoid
between traumatic tap and aneurysmal subarachnoid hemorrhage patients with coexisting unruptured,
hemorrhage: prospective cohort study. BMJ. 2015;350:h568. unprotected intracranial aneurysms. J Neurosurg.
2015;123(4):862-871.
15. de Oliveira Manoel AL, Mansur A, Murphy A, et
al. Aneurysmal subarachnoid haemorrhage from a 29. English SW, Fergusson D, Chassé M, et al. Aneurysmal
neuroimaging perspective. Crit Care. 2014;18(6):557. SubArachnoid Hemorrhage-Red Blood Cell Transfusion And
Outcome ( SAHaRA ): a pilot randomised controlled trial
16. McKinney AM, Palmer CS, Truwit CL, Karagulle
protocol. BMJ. 2016;1–10.
A, Teksam M. Detection of aneurysms by 64-section
multidetector CT angiography in patients acutely suspected 30. Connolly ES Jr, Rabinstein AA, Carhuapoma JR,
of having an intracranial aneurysm and comparison with et al Guidelines for the management of aneurysmal
digital subtraction and 3D rotational angiography. AJNR Am subarachnoid hemorrhage: a guideline for healthcare
J Neuroradiol. 2008;29(3):594-602. professionals from the American Heart Association/american
Stroke Association. Stroke. 2012;43(6):1711-37.
17. Cloft HJ, Lynn MJ, Feldmann E, Chimowitz M. Risk
of cerebral angiography in patients with symptomatic 31. Yamaki V, Cavalcanti D, Figueiredo E. Delayed
intracranial atherosclerotic stenosis. Cerebrovasc Dis. ischemic neurologic deficit after aneurysmal subarachnoid
2011;31(6):588-91. hemorrhage. Asian J Neurosurg. 2019;14(3):641.
18. Mensing LA, Vergouwen MDI, Laban KG, et al. 32. Diringer MN, Bleck TP, Claude Hemphill J 3rd, et al.
Perimesencephalic Hemorrhage: A Review of Epidemiology, Critical care management of patients following aneurysmal
Risk Factors, Presumed Cause, Clinical Course, and subarachnoid hemorrhage: recommendations from the
Outcome. Stroke. 2018;49(6):1363-1370. Neurocritical Care Society’s Multidisciplinary Consensus
Conference. Neurocrit Care. 2011;15(2):211-240.
19. Ducros A. Reversible cerebral vasoconstriction
syndrome. Lancet Neurol. 2012;11(10):906-917. 33. Dorhout Mees SM, Rinkel GJ, Feigin VL, et al. Calcium
antagonists for aneurysmal subarachnoid haemorrhage.
Cochrane Database Syst Rev. 2007;2007(3):CD000277.
Capítulo 21 247
CAPÍTULO 22
ANEURISMAS INTRACRANIANOS
Matheus Kahakura Franco Pedro alongada ao longo do eixo principal do vaso. Com relação
ao tamanho (diâmetro colo/domus, ou altura) (Figura
André Giacomelli Leal
2), diversas classificações já foram propostas; aqui
Capítulo 22 248
variação anatômica do tipo A, enquanto aneurismas
de ACI são mais relacionados à variação tipo P8.
Na variação tipo A, um dos segmentos proximais
da ACA está ausente ou hipoplásico, necessitando
da ACI contralateral para realizar o suprimento
sanguíneo da ACM contralateral à variante
anatômica e ambas as ACA. Assim, aumentando o
fluxo de sangue nesta artéria quando comparado
com a ACI ipsilateral à variação, que supre apenas
a ACM ipsilateral8-10. Esse aumento de fluxo resulta
em maior tensão de cisalhamento, principalmente
na junção da AComA com a ACA, predispondo ao
Figura 2: Dimensões relevantes dos aneurismas surgimento de aneurismas nessa região11. Também
intracranianos, em reconstrução tridimensional de imagem é evidenciado que mulheres possuem diâmetros de
de ASD: amarelo - domus; verde - colo; azul - altura, ou
dimensão colo-domus; preto - largura.
vasos menores, velocidade maior de fluxo sanguíneo
e maior tensão de cisalhamento nas bifurcações da
Fonte: Os autores, 2021.
ACI6. Dos pacientes diagnosticados com AI, 20 a 30%
apresentam aneurismas múltiplos (AIM)12,13. AIM são
EPIDEMIOLOGIA mais prevalentes em mulheres, sendo o subgrupo
Estima-se que a prevalência de AI saculares mais comum os aneurismas em espelho (AIE),
na população seja de aproximadamente 2% a 5%, correspondendo a 40% dos casos de AIM e 5% do
sendo estes responsáveis por 85% das hemorragias total de todos os AI14, os quais se apresentam como
subaracnoides (HSA) não-traumáticas; outras causas aneurismas simétricos acometendo os mesmos
menos comuns incluem HSA perimesencefálica, de segmentos de artérias equivalentes contralaterais.
etiologia presumivelmente venosa, e malformações
A HSA decorrente da rotura de um AI possui
arteriovenosas (MAV). A frequência de AI aumenta
prevalência de 6 a 16 pessoas a cada 100.00012,13
com a idade, sendo maior na faixa etária dos 50
estando relacionada a fatores do paciente e do
a 60 anos; os AI também são mais prevalentes no
aneurisma em si. A ruptura acontece principalmente
sexo feminino5, com proporção estimada de cerca
na faixa etária de 45 a 55 anos de idade. Mulheres
de 1,6 a 4,5 casos em pacientes do sexo feminino
têm mais risco para ruptura de aneurisma que
para cada caso no sexo masculino6. A presença de
homens, numa razão de 3:1. Alguns estudos
múltiplos AI também é fator que deve ser levado em
mostram uma relação nos níveis de estrogênio e a
conta na avaliação clínica, sendo estes encontrados
ruptura do aneurisma, o que pode justificar o índice
em cerca de 20 a 30% dos pacientes diagnosticados
maior de rupturas em mulheres. Tabagismo e etilismo
com AI7 mesmo que em momentos diferentes da
também são fatores relacionados à ruptura dos AI14.
vida.
A taxa de mortalidade de uma HSA é estimada em
A localização mais comumente acometida por 45% após 30 dias da rotura do aneurisma15.
AI é o polígono de Willis8. Entretanto, as artérias
mais acometidas mudam conforme o sexo do
paciente. Em mulheres, há maior acometimento FISIOPATOLOGIA
da ACI; já em homens, a artéria mais comumente
Em termos fisiopatológicos, a patogênese dos
acometida é a AComA. Isso se deve a variações
aneurismas é um processo multifatorial envolvendo
anatômicas do polígono de Willis. Segundo Williams,
tanto predisposição genética quanto fatores
aneurismas da AComA são mais prevalentes na
Capítulo 22 249
ambientais, como envelhecimento e aterosclerose; superfície luminal irregular e desorganização da
estes geralmente se formam na vida adulta . 16
camada média17.
FATORES DE RISCO
Figura 3: Aneurisma localizado em área de bifurcação; É possível encontrar história familiar de AI
imagem de ASD com bifurcação de artéria basilar, dando
origem às artérias cerebrais posteriores. em até 20% dos pacientes, sendo os familiares de
Fonte: Os autores, 2021. 1º grau aqueles com risco maior de desenvolver AI
21
. Outros fatores de risco associados são idade,
sexo feminino, hipertensão, tabagismo, alcoolismo,
As artérias intracranianas são primariamente
aterosclerose, presença de outras lesões vasculares
formadas por dois tipos de células: células
cerebrais como MAV, assimetrias do polígono de
endoteliais, que formam a camada íntima, e células
Willis, uso de anticoncepcional hormonal oral e
musculares lisas, que formam a camada média.
deficiência de colágeno tipo III18,22.
Quando ocorre a formação do AI, há uma infiltração de
células inflamatórias, como macrófagos, neutrófilos, Já para a ruptura do AI e consequente HSA,
células B e células T . Cada célula contribui
6 os fatores de risco imediatos incluem hipertensão
com a formação do AI por meio de mecanismos arterial, tabagismo e etilismo18, 21,23,25. A morfologia
celulares e moleculares diferentes. Outras do AI tem grande relação com seu risco de ruptura,
alterações histopatológicas encontradas nos AI são sendo os fatores levados em consideração tamanho,
hipocelularidade com necrose e apoptose de células localização, formato e parede irregular, entre outros5.
do colo e do domus do AI, hiperplasia miointimal,
Capítulo 22 250
efeito de massa, resultando em queixas como
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
cefaleia; geralmente, esses AI são de tamanho
Apesar de pacientes geralmente iniciarem
grande ou gigantes. Dependendo da localização
a investigação que detecta o AI devido a queixas
do AI, outros sintomas decorrentes do efeito
como cefaleia ou tontura, a maior parte dos AI é
massa incluem síndrome de seio cavernoso, crises
assintomática até a sua ruptura, sendo então, em
convulsivas, disfunções de hipotálamo e hipófise,
sua maioria, achados incidentais. Dessa forma,
neuralgia do trigêmeo, defeitos de campo visual e
a grande maioria é evidenciada acidentalmente
disfunções de tronco cerebral. Os AI que causam
através de exames de imagem ou quando o paciente
efeito de massa têm uma chance muito maior de
apresenta uma HSA1.
ruptura, com uma frequência estimada de 6% ao
Quando da ruptura de um AI e, ano24,26,27.
consequentemente, uma HSA, o paciente apresenta
Os AI também podem se manifestar com
um quadro de cefaleia intensa, de início abrupto,
isquemia cerebral, devido a embolização de trombos
podendo ser acompanhado de náusea, vômitos e
formados em seu domus devido ao fluxo turbilhonar
perda de consciência; tamanhas são a intensidade
do sangue dentro do saco aneurismático. Quando
e a velocidade de instalação da dor que esta é
esses trombos embolizam para a circulação
tradicionalmente chamada de cefaleia em trovoada,
cerebral, podem causar ataque isquêmico transitório
ou em padrão thunderclap. A ruptura também
e acidente vascular cerebral isquêmico24,26,27.
pode causar sangramento retiniano, percebido na
avaliação oftalmoscópica. Como sinal tardio, ainda
pode haver meningismo, devido à degradação dos
produtos sanguíneos no espaço subaracnoide. DIAGNÓSTICO
Além de causar HSA, a ruptura de um AI também Embora o diagnóstico inicial de um AI
pode causar sangramentos intraventriculares, geralmente seja por método de imagem não-
intraparenquimatosos e até subdurais, embora específico, a investigação direcionada geralmente
menos comumente24. Caso o AI seja do segmento envolve angioTC, angioRM e ASD, cada uma
cavernoso da ACI, sua manifestação será uma fístula apresentando méritos e peculiaridades particulares28.
carótido-cavernosa, podendo causar exoftalmia, A angioTC é uma técnica de tomografia
quemose, dor ocular e injeção escleral; em casos computadorizada por feixes de raio-X (RX) em que
extremos, pode acarretar perda visual definitiva. vários canais emissores de RX giram em torno da
Quando não se rompem, a sintomatologia área de estudo no paciente, com cada feixe de RX o
causada por um AI tipicamente depende de sua atravessando. A reconstrução de forma matemática
localização. AI de artéria oftálmica pode causar da imagem usa a diferente atenuação do RX ao
escotomas, defeitos de campo visual ou síndromes longo de cada trajeto através do corpo para calcular
quiasmáticas, por compressão devido ao seu volume. a atenuação local em cada ponto determinado no
Paralisias agudas de nervos cranianos podem ser volume da aquisição. É feita a normalização dos
causadas pelo súbito aumento de volume do AI; coeficientes de atenuação locais, em que cada
paralisias do nervo oculomotor são associadas a AI ponto da matriz da imagem de origem corresponde
de artéria comunicante posterior, artéria coroideia a um pixel na imagem que será gerada. Finalmente,
anterior, artéria basilar e ACI intracavernosa; e, esses dados de imagem tomográfica são convertidos
paralisia do nervo abducente pode ser causada por em tons de cinza e exibidos em forma de imagem
AI de artéria cerebelar inferior anterior 5,25,26
. ou de fatia da região da análise. Graças ao advento
dos tomógrafos com tubos de RX com rotação e
Além de sintomas focais, AI podem causar
subsequente aquisição contínuas, se tornou possível
Capítulo 22 251
a aquisição também contínua de grande volume de A angioRM é um método diagnóstico
dados em curto espaço de tempo, em que os dados derivado da ressonância magnética; este é um
brutos são adquiridos durante várias rotações, método não-invasivo, sem radiação ionizante, que
enquanto a mesa, onde o paciente está situado, utiliza um campo magnético intenso com ondas
avança . A técnica permite reconstrução de grande
29
de radiofrequência para permitir a geração de
conjunto de dados 3D completos formados por estas imagens anatômicas de diversas partes do corpo6,30.
imagens helicoidais superpostas, sendo a base da A angioRM é utilizada para mostrar informações
angioTC. Para realce das estruturas vasculares, é vasculares em três dimensões, fornecer dados
utilizado contraste iodado intravenoso; a angioTC sobre velocidade e taxa de fluxo volumétrico de
coloca-se superior à tomografia computadorizada sangue, obtendo estas imagens vasculares sem uso
contrastada regular ao utilizar bomba infusora de contraste pela técnica time of flight ou através
para a injeção desse contraste, permitindo volume do uso de contraste paramagnético de gadolíneo.
padronizado e fluxo controlado, propiciando imagens Simultaneamente, permite avaliação dos tecidos
superiores. É um exame rápido e seguro, sendo a moles intracranianos. Outras classificações do
técnica mais difundida para avaliação inicial de um tipo de angioRM envolvem contraste de fase e
AI . As informações disponíveis são tridimensionais,
6
tempo de movimento, apresentando diferenças de
com boa resolução espacial, e é possível avaliar tempo de aquisição de imagens, quantidade de
simultaneamente luz vascular, parede do vaso e ruídos, ou artefatos, e qualidade da imagem final30.
estruturas subjacentes29. Assim, é vantagem da É um método conveniente e essencialmente não
ATC a possibilidade de demonstrar o AI em relação apresenta risco, sendo amplamente usado para
às estruturas ósseas próximas, apresentando o rastreio de AI. Porém, o método apresenta suas
grande valor no planejamento pré-operatório. desvantagens, pois dificilmente detecta aneurismas
Ainda, apresenta grande utilidade para detectar pequenos (menores de 3 mm de diâmetro); assim,
calcificações na parede aneurismática (Figura 4) . 28
raramente é suficiente para o planejamento pré-
operatório final (Figura 5)6,28.
Capítulo 22 252
superiores (Figura 6) aos dos métodos de imagem basicamente em duas situações: história familiar
não-invasivos supracitados . O exame começa com
31
de AI e em pacientes com doença renal policística
punção arterial, tradicionalmente em artérias femoral autossômica dominante28. No primeiro caso, o
ou radial direitas, através da técnica de Seldinger, com rastreio é recomendado em pacientes assintomáticos
cateterização subsequente dos vasos intracranianos que apresentem dois ou mais membros da família
e injeção de contraste iodado não-ionizante, com diagnosticados com AI, sendo comumente apenas
captura das imagens por RX e reconstrução das os parentes de primeiro grau contados28, tratando-se
mesmas de forma computadorizada, subtraindo da doença renal policística autossômica dominante,
artefatos ósseos, o que lhe confere o nome atual. aproximadamente 5 a 10% dos pacientes que
Possuindo alta especificidade e sensibilidade 32
tem submetem-se ao rastreio encontram AI28.
a característica única de permitir exames dinâmicos
da circulação intracraniana. Por ser exame invasivo, TRATAMENTO
o método apresenta riscos de complicação baixos, O objetivo de todo e qualquer tratamento de
porém pertinentes; infarto cerebral, formação de AI é a exclusão do saco aneurismático da circulação
hematoma ou pseudoaneurisma no local de punção sanguínea, preservando o leito arterial28. Seu manejo
e injúria renal são alguns exemplos, constatados em depende de múltiplas variáveis, incluindo a história
entre 0,1% a 2,6% dos pacientes 28,33
. natural das lesões e a mortalidade e morbidade
associadas ao tratamento35.
Capítulo 22 253
parece ser menos dependente da idade do paciente instalação do diversor de fluxo38 (Figura 8).
do que se supunha inicialmente, justificando tal
Uma nova variedade de abordagem
opção de tratamento para aqueles com idade mais
endovascular, surgida na década de 2010, é a
avançada36.
dos diversores intrassaculares, como o woven
Entretanto, diversos fatores influenciam a taxa endobrigde (WEB®), que junta a malha de um
de sucesso da abordagem endovascular, além de diversor de fluxo, disposta de forma esférica, ao
sugerirem a necessidade de complementar a técnica raciocínio por trás da embolização com micromolas
de embolização simples com outros materiais de (obliteração do interior do aneurisma), sendo outra
suporte, como balões e stents. Dentre esses fatores forma de abordagem promissora (Figura 9).
incluímos as características do aneurisma, tais como
A abordagem endovascular tem sido associada
tamanho, relação colo/domus e presença de trombo
em muitos estudos com menores riscos a curto
intraluminal36. Em AI com colo de diâmetro ≤4 mm e
prazo; entretanto, ainda não se tem conhecimento
com relação colo/domus ≤2, a embolização torna-se
de seus impactos na morbimortalidade a longo
uma opção viável1 (Figura 7).
prazo quando comparada à microcirurgia, que já
Outra opção mais moderna e que tem vem sendo realizada desde 193836. Por tratar-se de
representado a maior mudança de paradigma do uma técnica de evolução contínua, novos materiais,
tratamento de AI, no sentido estritamente kuhniano 37
como os próprios diversores de fluxo e diversores
é a de uso de diversores de fluxo, como o flow intrassaculares, mostram-se eficazes e vêm sendo
redirection embolization device (FRED®). Enquanto cada vez mais utilizados, apresentando resultados
as modalidades tradicionais de tratamento de promissores38.
AI focam em reparo da lesão, os diversores de
A clipagem microcirúrgica do colo
fluxo apresentam a possibilidade de tratamento
aneurismático, por sua vez, é a forma mais antiga
circunferencial da artéria doente, apresentando
de tratamento, com eficácia comprovada a longo
índices de oclusão do AI superiores a 90%,
prazo, sendo o tratamento de escolha em casos
comparáveis à clipagem tradicional, com morbidade
selecionados. Com o desenvolvimento de técnicas
e mortalidade baixas. Os diversores de fluxo têm
microcirúrgicas, microscópio operatório, coagulação
sido usados amplamente em aneurismas com
bipolar e uma variedade de clipes aneurismáticos,
morfologia e localização complexa38 que exigiriam
as técnicas cirúrgicas para AI apresentaram grande
múltiplas técnicas de suporte para micromolas caso
implementação nas últimas décadas28 (Figura 8).
fosse usada a abordagem endovascular tradicional.
Em uma revisão sistemática clássica, Brinjikji et al. A idade do paciente é um fator importante
foram abordados com diversores de fluxo. A técnica de AI. Há um aumento significativo do risco após os
demonstrou altas taxas de sucesso na oclusão 50 anos, sendo ainda mais substancial após os 60
de AI, independentemente de seu tamanho; a 70 anos. Outros fatores que contribuem para um
porém, é preciso destacar que encontraram maior desfecho desfavorável são tamanho do aneurisma,
menores38. Entretanto, embora raras, ainda há na artéria basilar) e história de doença cerebral
Capítulo 22 254
Figura 7: Imagens de ASD em perfil mostrando embolização com micromolas de aneurisma de ACI: A - imagem pré-
procedimento; B - aquisição em roadmapping mostrando preenchimento do saco aneurismático com as micromolas; C
- imagem final, mostrando exclusão do aneurisma da circulação arterial.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 8: Imagens de ASD em perfil mostrando implante de diversor de fluxo para tratamento de AI gigante de ACI: A -
imagem pré-procedimento; B - retenção tardia de contraste durante liberação do diversor; C - imagem final, mostrando
exclusão do aneurisma da circulação arterial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 22 255
Figura 9: Imagens de embolização com WEB® de aneurisma de AComA: A - imagem pré-procedimento, em
reconstrução 3D de ASD; B - WEB® antes de ser implantado; C - aquisição em roadmapping mostrando liberação do
WEB® no interior do aneurisma; D - aquisição radioscópica sem contraste mostrando o WEB® aberto, antes de sua
liberação; E e F - imagens finais, obtidas em tempos precoce e tardio, mostrando exclusão do aneurisma da circulação
arterial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 22 256
consideração os múltiplos fatores de risco: idade, hematoma48.
comorbidades, tamanho, morfologia e efeito de
Alguns pacientes podem apresentar MAV
massa do aneurisma36.
associadas a AI. Nestas situações, há uma maior
O tratamento cirúrgico deve ser contemplado possibilidade de crescimento e ruptura do aneurisma,
em pacientes mais jovens, com AI com colo largo sendo fortemente recomendado o tratamento do
(> 4 mm), AI muito pequenos ou parcialmente aneurisma49.
trombosados, AI em bifurcações maiores ou na
Os AI parecem ser mais comuns, quando há
falha, cada vez mais rara, da terapia endovascular1.
associação com doenças sintomáticas da carótida,
A arteriografia intraoperatória pode ser útil principalmente em casos de displasia fibromuscular.
para facilitar o posicionamento do clipe e confirmar No caso de doença ateromatosa carotídea, o
a patência dos vasos próximos após a oclusão do tratamento através da endarterectomia da carótida
AI. Desta forma, é possível a imediata reversão interna pode ocasionar alterações hemodinâmicas,
da clipagem, se necessária, o que ocorre em acarretando a ruptura aneurismática50.
aproximadamente 10% dos procedimentos; novas
técnicas para aferir a acurácia intra-operatória
incluem o uso de indocianina verde (ICG)39-43. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
Uma das manifestações mais prevalentes em
Quando associado a hemorragia subaracnoide,
casos de AI sintomáticos é a cefaleia, acarretada
alguns neurocirurgiões ainda recomendam a
pelo efeito massa. O diagnóstico diferencial mais
abordagem cirúrgica, desde que o paciente
recorrente de cefaleia isolada pode ser feito com
apresente boa condição clínica, devido ao edema
cefaleia de etiologia migranosa (com ou sem aura).
cerebral associado; no entanto, a conduta na fase
Em casos da apresentação ser de uma cefaleia com
aguda, atualmente, tende a favorecer a abordagem
sinais focais, doença cerebrovascular isquêmica
endovascular. Em caso de quadro clínico mais
aguda, hemorragia intracraniana (traumática ou
reservado, a conduta varia conforme a instituição
não traumática), hemorragia subaracnoide por
em que o mesmo está sendo atendido. É importante
outras etiologias, como MAV, arterite temporal,
destacar que a abordagem endovascular permite
trombose venosa cerebral, hidrocefalia e neoplasias
uma abordagem mais agressiva do vasoespasmo,
intracranianas devem ser consideradas no
sendo uma importante causa de isquemia cerebral
diagnóstico diferencial .51
tardia28.
Nos casos de ruptura aneurismática,
Os riscos associados à clipagem microcirúrgica
o diagnóstico diferencial deve ser feito com
incluem aparecimento de novos déficits neurológicos
hemorragia subaracnoide perimesencefálica
ou deterioração de déficits pre-existentes devido
não-aneurismática, malformação arteriovenosa,
à retração cerebral, oclusão arterial temporária ou
síndrome da vasoconstrição cerebral reversível,
hemorragia intraoperatória44-46, rotura aneurismática
dissecção arterial intracraniana e trombose venosa
intraoperatória, que ocorreu em 19 dos 711 pacientes
cerebral52-54.
tratados com clipagem cirúrgica no estudo CARAT
(cerebral aneurysm rerupture after treatment),
associada a déficits e morte28. Complicações REFERÊNCIAS
ocorreram em 20% dos procedimentos analisados 1 Steiner T, Juvela S, Unterberg A, et al. European Stroke
em uma série retrospectiva, embora o desfecho Organization guidelines for the management of intracranial
aneurysms and subarachnoid haemorrhage. Cerebrovasc
funcional tenha sido bom em 76% desses pacientes47. Dis. 2013;35(2):93-112.
A cirurgia de emergência é indicada na presença
de efeitos massa amplamente sintomáticos ou
Capítulo 22 257
2 Rinkel GJ, Djibuti M, Algra A, van Gijn J. Prevalence 18 McLaughlin N, Bojanowski MW. Early surgery-
and risk of rupture of intracranial aneurysms: a systematic related complications after aneurysm clip placement: an
review. Stroke. 1998;29(1):251-256. analysis of causes and patient outcomes. J Neurosurg.
2004;101(4):600-606.
3 Suarez JI, Tarr RW, Selman WR. Aneurysmal
subarachnoid hemorrhage. N Engl J Med. 2006;354(4):387- 19 Lee S, Kim IK, Ahn JS, et al. Deficiency of endothelium-
396. specific transcription factor Sox17 induces intracranial
aneurysm. Circulation. 2015;131(11):995-1005.
4 Leal AG, Agnoletto GJ, Meneses MS. Tratamento
endovascular dos aneurismas cerebrais da circulação 20 Sathyan S, Koshy LV, Srinivas L, et al. Pathogenesis
anterior. In: Aguiar PHP, Antunes ACM, Maldaum MVC. et of intracranial aneurysm is mediated by proinflammatory
al, eds. Princípios Técnicos de Neurocirurgia: Atlas e Texto. cytokine TNFA and IFNG and through stochastic
São Paulo: DiLivros; 2016. p. 47–58. regulation of IL10 and TGFB1 by comorbid factors. J
Neuroinflammation. 2015;12:135.
5 Krzyżewski RM, Kliś KM, Kucala R, et al. Intracranial
aneurysm distribution and characteristics according to 21 Teunissen L, Rinkel G, Algra A, van Gijn. Risk factors
gender. Br J Neurosurg. 2018;32(5):541-543. for subarachnoid hemorrhage: a systematic review. Stroke.
1996;27(3):544-549.
6 Leal AG. Investigação da utilização de biomodelos 3D
fabricados por manufatura aditiva para eleição de clipe 22 Houlden H, Werring DJ, Alg VS, Sofat R. Genetic risk
e simulação cirúrgica nas microcirurgias de aneurismas factors for intracranial aneurysms: a meta-analysis in more
intracranianos. Curitiba: Pontifícia Universidade Católica do than 116,000 individuals. Neurology. 2013;80(23):2154-
Paraná, 2019. 2165.
7 Etminan N, Rinkel GJ. Unruptured intracranial aneurysms: 23 Knekt P, Reunanen A, Aho K, et al. Risk factors for
development, rupture and preventive management. Nat Rev subarachnoid hemorrhage in a longitudinal population study.
Neurol. 2016;12(12):699-713. J Clin Epidemiol. 1991;44(9):933-939.
8 Williams LN, Brown RD Jr. Management of unruptured 24 Raps EC, Rogers JD, Galetta SL, et al. The clinical
intracranial aneurysms. Neurol Clin Pract. 2013;3(2):99-108. spectrum of unruptured intracranial aneurysms. Arch Neurol.
199;50(3):265-268.
9 Raamt AF, Mali WP, van Laar PJ, van der Graaf Y.
The fetal variant of the circle of Willis and its influence 25 Leppa JM, Paunio M, Virtamo J, et al. Alcohol
on the cerebral collateral circulation. Cerebrovasc Dis. Consumption and Stroke Incidence in Male Smokers.
2006;22(4):217-224. Circulation v. 1999;41: 1209-1214.
10 Hendrikse J, van Raamt AF, van der Graaf Y, Mali WP, 26 Huston J 3rd, Nichols DA, Luetmer PH, et al. Blinded
van der Grond J. Distribution of cerebral blood flow in the prospective evaluation of sensitivity of MR angiography to
circle of Willis. Radiology. 2005;235(1):184-189. known intracranial aneurysms: importance of aneurysm
size. AJNR Am J Neuroradiol. 1994;15(9):1607-14.
11 Horikoshi T, Akiyama I, Yamagata Z, Sugita M, Nukui
H. Magnetic resonance angiographic evidence of sex- 27 Friedman JA, Piepgras DG, Pichelmann MA, Hansen
linked variations in the circle of willis and the occurrence of KK, Brown RD Jr, Wiebers DO. Small cerebral aneurysms
cerebral aneurysms. J Neurosurg. 2002;96(4):697-703. presenting with symptoms other than rupture. Neurology.
2001;57(7):1212-1216.
12 Vlak MH, Algra A, Brandenburg R, Rinkel GJ. Prevalence
of unruptured intracranial aneurysms, with emphasis on sex, 28 Schievink WI. Intracranial Aneurysms. N Engl J Med.
age, comorbidity, country, and time period: a systematic 1997;336(1):28-40.
review and meta-analysis. Lancet Neurol. 2011;10(7):626-
29 Prokop M. Princípios de angiografia por tomografia
636.
computadorizada. In: Rubin GD, Rofsky NM, eds.
13 WE S. Aneurysms and anatomical variations of cerebral Angiografia por TC e RM. Avaliação vascular abrangente.
arteries. Arch Pathol. 1963;75:45–65. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2010. p. 3-44.
14 Liu HJ, Zhou H, Lu DL, et al. Intracranial Mirror 30 Korosec FR. Princípios de angiografia por ressonância
Aneurysm: Epidemiology, Rupture Risk, New Imaging, magnética. In: Rubin GD, Rofsky NM, eds. Angiografia por
Controversies, and Treatment Strategies. World Neurosurg. TC e RM. Avaliação vascular abrangente. Rio de Janeiro:
2019;127:165-175. Guanabara Koogan; 2010. p. 45-73.
15 Chan V, Lindsay P, McQuiggan J, Zagorski B, Hill MD, 31 Mayberg MR, Winn, R. The history of neurosurgical
O’Kelly C. Declining Admission and Mortality Rates for technique. Neurosurgery Clinics of North America.
Subarachnoid Hemorrhage in Canada Between 2004 and Philadelphia: Saunders. 2001. p.1-228.
2015. Stroke. 2018.
32 Andrade GC; Teixeira P; Alves HFP, et al. Cerebral
16 Xu Z, Rui YN, Hagan JP, Kim DH. Intracranial aneurysms diagnosis by three-dimensional CT angiography.
Aneurysms: Pathology, Genetics, and Molecular Arq de Neurops. 2003;61(1):74-78.
Mechanisms. Neuromolecular Med. 2019;21(4):325-343.
33 Earnest F 4th, Forbes G, Sandok BA, Piepgras DG,
17 Austin G, Fisher S, Dickson D, Anderson D, Richardson Faust RJ, Ilstrup DM, Arndt LJ. Complications of cerebral
S. The significance of the extracellular matrix in intracranial angiography: prospective assessment of risk. AJR Am J
aneurysms. Ann Clin Lab Sci. 1993 Ma;23(2):97-105. Roentgenol. 1984;142(2):247-253.
Capítulo 22 258
34 van Gelder JM. Computed tomographic angiography for 45 Samson D, Batjer HH, Bowman G, et al. A clinical
detecting cerebral aneurysms: implications of aneurysm study of the parameters and effects of temporary arterial
size distribution for the sensitivity, specificity, and likelihood occlusion in the management of intracranial aneurysms.
ratios. Neurosurgery. 2003;53(3):597-605. Neurosurgery. 1994;34(1):22-28.
35 Rochester M, Wiebers D, Whisnant JP, Meissner I. 46 Fridriksson S, Säveland H, Jakobsson KE, et al.
Unruptures intracranial aneurysms - risk of rupture and risks Intraoperative complications in aneurysm surgery: a
of surgical intervention. N Engl J Med. 1998;339(24):1725- prospective national study. J Neurosurg. 2002;96(3):515-
1733. 522.
36 Wiebers DO, Whisnant JP, Huston J 3rd, et al. 47 Elijovich L, Higashida RT, Lawton MT, Duckwiler G,
Unruptured intracranial aneurysms: natural history, clinical Giannotta S, Johnston SC; Cerebral Aneurysm Rerupture
outcome, and risks of surgical and endovascular treatment. After Treatment (CARAT) Investigators. Predictors and
Lancet. 2003;362(9378):103-110. outcomes of intraprocedural rupture in patients treated for
ruptured intracranial aneurysms: the CARAT study. Stroke.
37 Kuhn, T. The Structure of Scientific Revolutions. 1ª
2008;39(5):1501-1506.
edição. Chicago: University of Chicago Press; 1962.
48 McLaughlin N, Bojanowski MW. Early surgery-
38 Brinjikji W, Murad MH, Lanzino G, Cloft HJ, Kallmes DF.
related complications after aneurysm clip placement: an
Endovascular treatment of intracranial aneurysms with flow
analysis of causes and patient outcomes. J Neurosurg.
diverters: a meta-analysis. Stroke. 2013;44(2):442-447.
2004;101(4):600-606.
39 Connolly ES Jr, Rabinstein AA, Carhuapoma JR,
49 Wiebers DO, Torres VE. Screening for unrupted
et al. Guidelines for the management of aneurysmal
intracranial aneurysms in autosomal dominant polycystic
subarachnoid hemorrhage: a guideline for healthcare
disease. N Engl J Med. 1992;327:953-955. v. 327, 953-955,
professionals from the American Heart Association/american
1992.
Stroke Association. Stroke. 2012;43(6):1711-1737.
50 Héman LM, Jongen LM, van der Worp HB, Rinkel GJ,
40 Tang G, Cawley CM, Dion JE, Barrow DL. Intraoperative
Hendrikse J. Incidental intracranial aneurysms in patients
angiography during aneurysm surgery: a prospective
with internal carotid artery stenosis: a CT angiography study
evaluation of efficacy. J Neurosurg. 2002;96(6):993-999.
and a metaanalysis. Stroke. 2009;40(4):1341-1346.
41 Chiang VL, Gailloud P, Murphy KJ, Rigamonti D,
51 Schoenen J, Sándor PS. Headache with focal
Tamargo RJ. Routine intraoperative angiography during
neurological signs or symptoms: a complicated differential
aneurysm surgery. J Neurosurg. 2002;96(6):988-992.
diagnosis. Lancet Neurol. 2004;3(4):237-245.
42 Klopfenstein JD, Spetzler RF, Kim LJ, et al. Comparison
52 Tatter SB, Crowell RM, Ogilvy CS. Aneurysmal and
of routine and selective use of intraoperative angiography
microaneurysmal “angiogram-negative” subarachnoid
during aneurysm surgery: a prospective assessment. J
hemorrhage. Neurosurgery. 1995;37(1):48-55.
Neurosurg. 2004;100(2):230-235.
53 Hurley T, Balandrin J. Perimesencephalic nonaneurysmal
43 Kumar R, Friedman JA. Intraoperative angiography
subarachnoid hemorrhage: Review of the literature.
during cerebral aneurysm surgery. Neurocrit Care.
Neurosurgery. 1997;40(4):885.
2009;11(2):299-302.
54 Caplan LR. Dissections of brain-supplying arteries. Nat
44 Andrews RJ, Bringas JR. A review of brain retraction and
Clin Pract Neurol. 2008;4(1):34-42.
recommendations for minimizing intraoperative brain injury.
Neurosurgery. 1993;33(6):1052-1063.
Capítulo 22 259
CAPÍTULO 23
MALFORMAÇÕES ARTERIOVENOSAS CEREBRAIS
angiomas arteriovenosos são alterações vasculares números brasileiros, aproximadamente 2.700 novos
caracterizadas pela drenagem anormal e precoce casos de MAV cerebrais seriam diagnosticados por ano
de uma artéria em direção ao seu efluente venoso no Brasil. Paradoxalmente, dados do Sistema DATASUS
sem o intermédio de um leito capilar diferenciado e, apontam para apenas cerca de 600 internações para
por conseguinte, pelas alterações morfoestruturais tratamento dessa condição pelo sistema único de saúde
decorrentes do remodelamento vascular adaptativos à por ano, na maioria das vezes de embolização, com
anomalia1,2. Elas podem estar localizadas na cavidade custo estimado em 5 milhões de reais ao ano e taxas de
craniana (MAV cerebrais) ou raquidiana (MAV espinhais), mortalidade entre 1 a 10% dependendo da modalidade.
tendo características clínicas, prognósticas e terapêuticas Um estudo na população escocesa estimou uma
específicas. Tipicamente, existe um enovelado de prevalência de 10 a 18 casos por 100.000 indivíduos,
vasos sanguíneos com canais venosos dilatados e que no Brasil representaria cerca de 20 a 30 mil casos
de paredes espessadas, algumas vezes calcificadas. entre pacientes com malformações rotas e não rotas
Microscopicamente, os vasos variam de artérias e diagnosticadas4. Por outro lado, considerando-se a
veias bem caracterizadas até estruturas de paredes prevalência em achados de ressonância magnética (RM),
espessadas ou finas. Ainda se encontram espessamentos chega-se a uma estimativa de 0,05% de casos, cerca de
hialinizados das camadas íntima e muscular projetados 105 mil casos no Brasil para uma população estimada
na luz dos vasos. As leptomeninges que os recobrem de 209.000.000 habitantes em 2020. Não existem dados
frequentemente possuem áreas de espessamento e populacionais completos no Brasil e a desproporção entre
opacificação. Existe parênquima nervoso geralmente prevalência estimada e casos efetivamente tratados no
degenerado entre os vasos emaranhados. A continuidade Brasil pode revelar que existe um baixo acesso a meios
do fluxo arterial em direção à drenagem venosa se faz de diagnóstico e tratamento pela população afetada.
por intermédio de uma coleção de canais vasculares
A patogênese da MAV e os mecanismos que levam
pouco diferenciados conhecidos como nidus ou nicho.
à hemorragia intracraniana não são bem conhecidos.
A angioarquitetura malformativa frequentemente se
As MAV podem manifestar-se clinicamente em qualquer
Capítulo 23 260
período da vida, porém na maioria das vezes se ativação angiogenética mediada pelas vias do
apresentam entre a segunda e a quarta década TFG-β através da expressão de SMAD13 (Figura
de vida. No estudo cooperativo de aneurismas 1). Da mesma forma, estudos análogos forneceram
cerebrais e hemorragia subaracnoidea, 44% dos indícios que o fenômeno de ruptura da malformação
casos situavam-se entre os 20 e os 40 anos e 31% trata-se de processo inflamatório mediado em
entre os 40 e os 60 anos. Cerca de 54% das MAV nível molecular, analogamente complexo, mas
que sangraram ocorreram em pacientes de até 30 não necessariamente dependente das vias de
anos de idade . Na maioria dos estudos não existe
5
angiogênese (Tabela 1). Apesar da caracterização
uma diferença significativa entre a incidência de de grande número de entidades fisiopatológicas
MAV relacionada a gênero. candidatas a explicar a complexa fisiopatologia das
MAV, a relevância dessas alterações nas entidades
esporádicas é objeto de estudo e não está bem
FISIOPATOLOGIA esclarecida neste momento14.
O ensinamento clássico de que a maioria das
As MAV são locais de inflamação ativa.
MAV são entidades congênitas6 – que “aparecem
Citocinas inflamatórias, incluindo o TNF e algumas
durante o desenvolvimento fetal entre a 4ª e a 8ª
interleucinas, são potentes estimuladores tanto
semanas de vida” – tem sido ativamente questionado
da angiogênese quanto da quebra da barreira
nos últimos anos. Esse dogma é diretamente
hematoencefálica. Elas podem contribuir para a
contra-argumentado pelos seguintes fatos: as MAV
progressão da lesão e para ruptura.
incomumente são identificadas no feto, raros são
os pacientes que possuem história familiar positiva Apesar de vários estudos sugerirem
para essa doença, o fenótipo visto em adultos difere associações de polimorfismos genéticos únicos
substancialmente do visto na infância e as lesões com MAV ou com risco de ruptura de MAV15, não
típicas podem ser induzidas através de trauma foi possível identificar essas associações em um
tecidual . Apesar dos indicativos de anormalidades
7 estudo genoma wide colaborativo16. Recentemente,
de falha de regressão nas veias durais-piais na fase mutações somáticas ativadoras no KRAS (um
embrionária e no desenvolvimento capilar
8 9,10
, eles membro da via de sinalização MAPK-ERK) foram
são insuficientes para explicar a grande variabilidade identificadas no tecido da lesão de casos de MAV
e a cronologia da anormalidade observada in vivo. esporádicas, sugerindo fortemente um mecanismo
Ainda, evidências clínicas atestam tanto a regressão somático subjacente para a formação de MAV. A
como a progressão espontânea das lesões . 11 via de sinalização da MAPK desempenha um papel
Portanto, modernamente favorece-se a hipótese de central na angiogênese. Vários estudos relataram
que o desenvolvimento da MAV seja um processo que mutações somáticas em vários genes da MAPK
multifatorial e dinâmico, quando um ou mais fatores estão associadas a outras anomalias vasculares.
de iniciação interajam ativamente com fatores de Duas mutações somáticas recorrentes ativadoras
progressão da dismorfogênese vascular . 12 do KRAS (p.G12D e p.G12V) foram identificadas
em lesões MAV. No entanto, essas mutações
Os estudos da ocorrência de MAV em
foram identificadas apenas em um subconjunto de
síndromes genéticas como a telangiectasia
pacientes com MAV, sugerindo que em mutações
hemorrágica hereditária, associado ao avanço
somáticas em outra via MAPK, os genes também
das técnicas de biologia molecular e epigenética,
podem contribuir para a etiologia da MAV. Embora as
forneceram importantes indicativos das vias que
mutações somáticas do KRAS identificadas tenham
podem influenciar na iniciação ou progressão das
baixa representação alélica (<4%), os modelos
MAV. É biologicamente plausível que a progressão
animais sugerem que a proporção de células
das MAV corresponda ao fenótipo molecular de
Capítulo 23 261
mutantes em uma lesão pode estar associada com a foi predominante na maioria das séries estudadas,
gravidade fenotípica. Assim, estudos subsequentes variando em torno de 90%.
para identificar e replicar com precisão as mutações
Na análise da história natural em busca
somáticas em outros genes da via MAPK e avaliar a
de fatores associados a risco de hemorragia, a
relação entre carga alélica e fenótipo clínico serão
localização profunda tem sido implicada com maior
importantes para entender como essas mutações
risco de hemorragia em estudos prospectivos20,22.
levam à formação de MAV e/ou hemorragia e para
avaliar a via MAPK como um novo alvo terapêutico17. Drenagem Venosa
A associação entre drenagem venosa profunda
com maior incidência de apresentação hemorrágica
ANGIOARQUITETURA NO TRATAMENTO tem sido sugerida, porém estudos prospectivos
DA MAV
não conseguiram demonstrar essa associação
20,22
.
Tamanho A presença de drenagem venosa profunda é um
principal fator preditivo do resultado do tratamento conjuntamente com tamanho e eloquência, também
da MAV. Este fator influencia diretamente os diversos não determinou risco aumentado de desfechos
esquemas utilizados para classificação das MAV, desfavoráveis no curso clínico de uma coorte
apresentação clínica com hemorragia foi sugerida venoso, que frequentemente são encontradas
e ainda é tema de debate na literatura, em geral em casos com apresentação hemorrágica, como
associando o maior tamanho com maior risco20. A estenoses ou ectasias, ainda necessita de estudos
maioria dos estudos prévios utilizaram características prospectivos para comprovação de relação com
presentes no evento da hemorragia inicial, na risco aumentado de hemorragia.
apresentação clínica, extrapolando estas variáveis
como fatores de risco. A apresentação inicial, no Aneurismas associados a MAV
entanto, representa apenas um momento da história A sobrecarga hemodinâmica que as MAV
natural da doença, não podendo ser utilizada para provocam nos seus vasos arteriais nutridores
análise de risco ou fatores preditivos. Para cada MAV predispõe à formação e crescimento de aneurismas.
pequena que sangra, por exemplo, deverão existir A elevada presença de aneurismas nos ramos
outras muitas que permanecerão assintomáticas principais das MAV, comparada com as localizações
durante toda a vida do indivíduo. Em uma análise habituais relatadas na população em geral sem MAV
de uma coorte prospectiva de MAV não-rotas e não foi percebida por Okamoto et al.,23 e os aneurismas
tratadas, o grau da escala Spetzler e Martin (que associados a MAV podem ser agrupados em
é fortemente influenciado pelo tamanho) não foi aneurismas pré-nidais, intranidais e remotos. Cunha
associado a risco subsequente de hemorragia . 21
e Sa et al.,24 classificaram estes aneurismas em
cinco subtipos, sendo o primeiro (tipo I) proximal em
Localização um vaso aferente maior ipsilateral à MAV; o segundo
Numa série grande de 453 casos, relatada (tipo IA) num vaso grande proximal contralateral; o
no estudo cooperativo de aneurismas cerebrais e terceiro (tipo II) num vaso superficial distal nutrindo a
hemorragia subaracnoidea , 5
foram encontradas MAV; o quarto (tipo III) num vaso profundo (proximal
MAV em ambos os lados do encéfalo com igual ou distal) nutrindo a MAV; e o quinto (tipo IV) em
frequência e a localização supratentorial das MAV vaso não relacionado à MAV. Na sua série de 400
Capítulo 23 262
pacientes, encontraram uma incidência de 10% de em torno de 2 a 4%26-28, embora Fults e Kelly tenham
aneurismas associados. Em uma série prospectiva encontrado taxas maiores de ressangramento nos
houve um aumento do risco de hemorragia , com25
primeiros 5 anos (17,9%), declinando a 3% após29.
uma incidência de sangramento de 9,8%/ano na Segundo estes mesmos autores existe cerca de
história natural de pacientes não tratados com 13,6% de chance de o paciente morrer na primeira
aneurismas intranidais. hemorragia e 20,7% em caso de ressangramento
e, no caso de MAV em fossa posterior, menos
da metade dos pacientes sobreviveu à primeira
QUADRO CLÍNICO hemorragia.
Pacientes com MAV podem permanecer Brown et al.,22 encontraram um risco de
assintomáticos ou sofrer crises epilépticas, déficits hemorragia de 2,2% ao ano, com um risco de
neurológicos focais ou hemorragia intracraniana mortalidade após hemorragia de 29% e morbidade
(HIC). A última é a complicação mais temida e a severa (déficit neurológico incapacitante) em 23%
principal razão para tratar uma MAV. No geral, as dos sobreviventes.
MAV representam 25% dos acidentes vasculares
Ondra et al.,30 realizaram um estudo
cerebrais hemorrágicos em adultos <50 anos,
combinado de casos com e sem hemorragia
de 8 a 40% dos pacientes com MAV morrem ou
prévia com seguimento de 24 anos de uma série
permanecem comprometidos funcionalmente dentro
de 166 pacientes sintomáticos não operados que
de um ano após a hemorragia intracerebral.
demonstrou um índice de sangramento de 4% ao
Até há pouco tempo, apenas raramente ano, com mortalidade de 1% ao ano. As taxas de
uma MAV não rota era diagnosticada durante hemorragia permaneceram constantes durante todo
uma investigação angiográfica para cefaleia ou o período de seguimento.
epilepsia. A hipótese de que a hemorragia por MAV
Analisando apenas o grupo de MAV que não
é um acontecimento de frequência equiparável à
apresentou sangramento prévio, alguns autores
hemorragia por aneurisma cerebral – cerca de 3% ao
sugerem que estes casos teriam um menor risco
ano – pode ter sido estabelecida na época em que
de complicações31, em torno de 1%, gerando a
tais casos se manifestavam, na maioria das vezes,
fundamentação teórica para a realização do único
por uma hemorragia cerebral declarada e o único
ensaio clínico randomizado para MAV não-rotas28.
método diagnóstico era a angiografia. No geral,
Neste estudo prospectivo, a taxa de sangramento foi
as MAV são responsáveis por 25% dos acidentes
de 2,2% ao ano, similar aos estudos prévios.
vasculares encefálicos (AVEs) hemorrágicos em
adultos <50 anos e até 40% dos pacientes com As crises epilépticas foram as formas iniciais
MAV morrem ou permanecem funcionalmente de apresentação mais comuns além da hemorragia,
prejudicados dentro de um ano após a HIC. As variando de 15% a 32%29,32. A cefaleia que acompanha
MAVs cerebrais são uma das principais causas de as MAV não associada a eventos hemorrágicos pode
hemorragia intracraniana em pessoas mais jovens. ser unilateral, bilateral, tipo enxaqueca, periódica
ou constante e varia de 1 a 24% dos casos. Esta
A causa mais comum de apresentação na
dor pode resultar da dilatação dos vasos aferentes
maioria das séries foi a hemorragia, variando de
e das veias de drenagem adjacentes à dura-máter,
52 a 72%. Cerca de 1% dos acidentes vasculares
especialmente na região da tenda do cerebelo.
encefálicos são causados por angiomas. O primeiro
episódio de hemorragia é fatal em 6 a 13,6% dos Os déficits neurológicos ocorrem por
casos. A maioria dos estudos posiciona a taxa anual diminuição da perfusão do tecido nervoso ocasionado
de sangramento por MAV cerebrais de forma linear, pelo fenômeno de “roubo” da circulação pela MAV,
Capítulo 23 263
por hipertensão venosa ou pela combinação de hemorrágica prévia e tipo de nidus (difuso ou
ambos. A sua ocorrência varia de 2,3% a 7% e compacto). No caminho inverso, Spetzler e Ponce
o sinal neurológico predominante relatado foi a simplificaram a classificação Spetzler e Martin em
hemiparesia, seguida de déficits visuais. Menos apenas três categorias, sendo: (A) feita por tipos I
frequentemente ocorreram demência e edema de e II da classificação antiga; (B) pelo tipo III; e (C)
papila. pelos tipos IV e V37. Essa classificação é mais
simples e vem sendo universalmente aceita, bem
MAV na gestação e puerpério correlacionada com desfechos após tratamento
(Tabela 2).
Existe ainda uma grande controvérsia a
respeito do risco de hemorragia de MAV associado
à gestação. Em uma série de pacientes do sexo
CONDUTA
feminino com MAV, acompanhadas durante a
gestação e puerpério, ocorreu uma taxa anual O manejo das MAV continua a representar um
calculada de 5,7% de hemorragia, contra 1,3% dilema desafiador para os médicos, uma vez que são
nas mulheres sem gestação33. Para as pacientes difíceis e caras de tratar e podem causar morbidade
portadoras de MAV, acredita-se que não há aumento e mortalidade significativas. As estratégias de
do número de casos com hemorragia cerebral tratamento para as MAV têm sido discutidas há
condicionado pelo esforço envolvido durante o parto muitos anos e atualmente a maioria dos centros,
vaginal34, e o tratamento da MAV durante a gestação após a publicação do estudo ARUBA, em 2014,
não parece estar associado a piores desfechos determina a conduta dependendo da presença ou
maternos ou fetais35. não de apresentação hemorrágica.
Capítulo 23 264
também podem ser empregados para a redução do americanos. Chama a atenção neste estudo que,
tamanho da MAV, obtendo uma eliminação parcial utilizando os mesmos casos de MAV pequenas
do angioma. Sabe-se, porém, que somente a cura “operáveis”, a cirurgia foi melhor em termos de
completa da MAV oferece a eliminação do risco de custo, melhorando ainda mais quando considerados
ruptura e que as MAV parcialmente tratadas tem os resultados cirúrgicos obtidos por neurocirurgiões
história natural igual às nunca tratadas . 20
de grandes centros especializados.
A combinação dos tipos de tratamento, aos Com o aumento de estudos prospectivos sobre
poucos, vai compondo uma árvore de decisão que a história natural e tratamento das MAV poderão
permite ao neurocirurgião vislumbrar os diferentes surgir ferramentas estatísticas mais poderosas
cenários de manejo terapêutico, inclusive o para a formulação de decisões. O conhecimento do
conservador. Este tipo de abordagem, embora traga comportamento dos diferentes subgrupos formados
uma expectativa de decisões terapêuticas mais por fatores específicos da MAV (como tamanho,
objetivas, esbarra no grande número de variáveis localização e angioarquitetura) determinarão um
presentes nesta doença. Muito cuidado deve ser maior grau de confiança nas ferramentas estatísticas.
tomado na interpretação dos dados, principalmente
quando se relacionam a opções de tratamento. Não se
conhece bem a história natural das MAV para afirmar CIRURGIA
que se comportam como um grupo homogêneo. As técnicas cirúrgicas classicamente
Além disso, esta abordagem pressupõe os números empregadas para o tratamento das MAV consistiam
de morbidade e mortalidade de tratamento relatados inicialmente de ligadura proximal de grandes vasos,
na literatura, muitas vezes difíceis de serem ligadura dos vasos aferentes da MAV ou ressecção
reproduzidos pela comunidade neurocirúrgica em da MAV, de acordo com a possibilidade. A ligadura
geral. Num raciocínio assim, os neurocirurgiões farão de vasos proximais está hoje em desuso, pois
previsões aos pacientes baseados em resultados prontamente um novo sistema de suplência arterial
obtidos em centros neurocirúrgicos de excelência, se estabelece com base nas anastomoses do
esquecendo que as taxas de morbi-mortalidade polígono de Willis, porém pode utilizar do fechamento
oferecidas nas condições locais poderão ser mais proximal seletivo de alguns vasos aferentes diretos
elevadas. A impossibilidade de alcançar os índices da MAV em técnicas endovasculares feitas por
de morbi-mortalidade iguais aos pressupostos neurorradiologistas intervencionistas.
invalida completamente a aplicação do modelo.
Alguns aspectos da arquitetura vascular da
Em um estudo interessante, Nussbaum et MAV complicam o tratamento, como a presença
al., 38
fizeram uma análise de custo-efetividade de um nidus compacto ou difuso, como aferentes
do tratamento cirúrgico das MAV. Este estudo profundos dilatados (artérias coroideias e estriadas),
também se baseou em alguns pressupostos que acentuada drenagem venosa e a relação da MAV com
representavam resultados bem estabelecidos na artérias importantes, idade, tamanho e localização39.
literatura mundial e comparou o tratamento cirúrgico
Os resultados do tratamento cirúrgico das
com terapia conservadora e radiocirurgia em termos
malformações arteriovenosas cerebrais modificaram-
de custo-efetividade. O custo estimado de cura das
se muito nos últimos relatos em relação às primeiras
MAV tratadas conservadoramente é de $33.137,64
séries, especialmente com o uso do microscópio
dólares americanos por paciente em toda a sua vida.
cirúrgico e da coagulação bipolar. Atualmente temos
O mesmo custo para tratamento cirúrgico chega a
uma melhor seleção de casos, melhora das técnicas
$37.484,47 dólares americanos e da radiocirurgia de
de diagnóstico e melhor manejo perioperatório e na
MAV menores que 3 cm vai a $32.137,77 dólares
maioria das séries revisada os dados de mortalidade
Capítulo 23 265
operatória para os tipos Spetzler e Ponce A e B são frequentemente aquelas que têm um melhor
variam de 2 a 21%, com melhores resultados no resultado cirúrgico.
grupo pediátrico 40–42
. A morbidade também varia de
Os primeiros agentes empregados na
acordo com os estudos de 11 a 28%.
embolização de MAV foram as microesferas,
Baseados em experimentos num modelo funcionando como agentes embólicos e levadas
animal, Spetzler et al. postularam que o leito vascular
43
na corrente sanguínea até as malformações
de um hemisfério cronicamente hipoperfundido conduzidas pelo fluxo aumentado. Esta técnica teve
perde a resposta auto-reguladora às mudanças da um grande índice de insucessos, com complicações
pressão de perfusão após o fechamento abrupto neurológicas frequentes e incapacidade de reduzir o
da comunicação arteriovenosa. A restauração da tamanho do nicho da MAV. Da mesma forma, o uso
perfusão normal na microcirculação cronicamente de balões para provocar oclusão dos vasos aferentes
dilatada permite a transmissão de uma pressão das MAV não obteve sucesso. As taxas de sucesso
de perfusão não regulada ao leito capilar. Como com a embolização como única forma de tratamento
conseqüência ocorre o extravasamento de plasma são bem menores, habitualmente menos de 4%,
e eritrócitos, com formação de edema vasogênico e com o uso de outros materiais como partículas,
diapedese. Este fenômeno foi chamado de “normal balões e micromolas e muito frequentemente ocorre
perfusion pressure breakthrough”. A existência desta a recanalização da MAV.
situação tem sido questionada e não foi identificada
Todas as técnicas modernas de embolização
em um estudo pesquisando alterações no mecanismo
de MAVs partem do princípio de seletividade
de autoregulação da pressão cerebral após 28
dos vasos de interesse e do microcateterismo
procedimentos de ressecção de MAV utilizando o
superseletivo das estruturas a serem embolizadas.
método de medida do fluxo sanguíneo cerebral com
A preferência é pela via percutânea endovascular,
xenônio-13344.
por sua simplicidade e segurança, mas em casos
específicos são necessários acesso cirúrgico
aberto às estruturas ou mesmo punções guiadas
EMBOLIZAÇÃO
por imagem a distância. Apesar da existência de
Os benefícios da embolização de uma MAV são
microcateteres e técnicas variadas de fluxo, todas
a oclusão do nicho da MAV – reduzindo o seu fluxo
as abordagens ocorrem através da via arterial, da
sanguíneo e enchimento – facilitando a remoção da
via venosa, ou de ambas as vias e através dos
MAV, a redução gradual no número e no tamanho
microcateteres são empregados subsequentemente
das comunicações arteriovenosas (na tentativa
os materiais embólicos. Modernamente, os materiais
de evitar problemas relacionados à perfusão),
embólicos são líquidos e dividem-se em adesivos e
uma melhor definição do nicho pela diminuição do
coesivos.
tamanho da lesão e finalmente pela interrupção dos
aferentes profundos, como as artérias coroideias e Com o desenvolvimento de microcateteres,
estriadas, além da obliteração de aneurismas que a navegação endovascular começou a ser feita
podem estar relacionados a estes vasos. Da mesma com maior sucesso e outros agentes passaram a
forma, o emprego de embolização seria mais útil ser empregados, como o isobutil-2 cianoacrilato
como uma etapa preliminar à cirurgia em casos onde (IBCA), partículas de polivinil álcool, seda e
o acesso a vasos nutridores principais esteja difícil. micromolas metálicas, embora um grande número
Em casos de deterioração neurológica progressiva de complicações tenha sido relatado com estas
nas grandes MAVs, a embolização também seria técnicas. A introdução do N-butil cianoacrilato
uma alternativa. Deve ponderar-se, no entanto, que (NBCA) substituiu o uso do IBCA, sendo empregado
as MAV com máximo benefício pela embolização em larga escala. Ao contato com os íons da
Capítulo 23 266
corrente sanguínea, desencadeiam uma reação paliativa. A indicação historicamente mais frequente
de polimerização e solidificação que libera calor. A do tratamento endovascular de MAV, especialmente
taxa de polimerização pode ser ajustada através da fora de centros europeus, é como parte de uma
diluição desta substância com solventes, como o estratégia multimodal de tratamento. Assim, a
lipiodol e o ácido acético glacial, entre outros. embolização é utilizada como uma estratégia pré-
operatória ou pré-radiocirúrgica no sentido de
O controle da injeção e da polimerização
facilitar, ou mesmo tornar possível, o procedimento
do NBCA é difícil, sendo comum a passagem
subsequente. Nesta indicação, é mais comum ter
deste agente ao lado venoso da MAV, efeito esse
como objetivo redução do volume nidal ou obliteração
indesejável. Complicações sistêmicas pela passagem
de componentes específicos da malformação
da cola para a circulação sistêmica, especialmente
que possam apresentar dificuldade durante a
a pulmonar, já foram relatadas. Também existem
abordagem subsequente. O exemplo mais evidente
relatos de retenção de cateteres colados em
é à abordagem direcionada (targeted) à obliteração
vasos sanguíneos de MAV, com conseqüências.
exclusiva de um aneurisma nidal, ou uma fístula de
As taxas de cura relatadas na literatura quando
alto fluxo, sem intenção deliberada de oclusão nidal
a embolização é empregada isoladamente com
completa. Idealmente, a embolização pré-ressecção
N-butil-cianoacrilato variam de 13 a 15%. É comum
deveria ser indicada quando: 1) a equipe entende
a necessidade de várias sessões de embolização
que os riscos combinados dos procedimentos não
para obtenção do resultado desejado, sendo que a
excede o risco da cirurgia sem embolização; 2) se
maioria é submetida a uma ou duas sessões.
espera eliminar alguma característica anatômica
Na década de 90, surgiram os copolímeros de de alto risco para a abordagem cirúrgica, como um
etileno vinil álcool (EvOH). Sua diluição é feita em pseudoaneurisma ou uma veia ectásica profunda de
um solvente específico – o dimetilsulfóxido (DMSO). difícil manuseio; e 3) se antevê reduções expressivas
Esses compostos apresentam natureza “coesiva”, no volume nidal idealmente acima de 75%, mas
ao invés de adesiva. Sua progressão no sistema não não inferior a 50%. No que tange à neoadjuvância
apresenta o efeito de polimerização e cristalização à radiocirurgia, a embolização é controversa, pois
observada com o cianoacrilato. A penetração do pode piorar a eficácia do método radioablativo.
líquido se faz de forma mais completa através de Isso é especialmente verdadeiro nos casos em
camadas laminantes, a exemplo da progressão que se induz à compartimentalização nidal após a
de um manto de lava. Ainda, a presença de uma embolização (ou seja, criam-se alvos adicionais
pequena quantidade de refluxo do material embólico para a radiocirurgia). Por fim, quando a abordagem
proximalmente à extremidade do microcateter primária é a cirurgia ou a radiocirurgia, os métodos
faz parte da técnica e ajuda na progressão distal endovasculares podem ser utilizados de forma
do material. Por todos esses motivos verifica- adjuvante. Nesse caso, o objetivo é a obliteração de
se, então, uma maior taxa de embolizações resíduos da malformação que, por motivos variados,
completas e um significativo maior tempo para o poderiam ser considerados de difícil abordagem ou
manejo do microcateter (em teoria, infinito) sem intratáveis pelos demais métodos.
retenção. Recentemente, foram disponibilizadas
Recentemente, tem existido interesse
comercialmente novas concentrações desse material
crescente na embolização curativa primária de
e formulações sem necessidade de agitação ou com
malformações arteriovenosas cerebrais. Para
os problemas de radiopacidade inerentes ao tântalo.
a obtenção desta finalidade, se faz necessária
Em relação às indicações, as modalidades a desvascularização completa do leito nidal,
de tratamento endovascular podem ter intenção idealmente com a desconexão do nidus com o
neoadjuvante ou adjuvante, curativa primária ou leito venoso. A decorrência lógica do entendimento
Capítulo 23 267
desse requerimento é que, haja vista à diversidade foram relatadas taxas de morbidade neurológica
angioarquitetural das MAV, existirão grupos de lesões permanente de 2 a 14% e mortalidade variando
nos quais essa abordagem é factível e outros onde entre 1 a 3,7% 46. A causa mais comum de morbidade
a chance de sucesso é pequena. Analogamente às relatada foi hemorragia intracraniana, seja pela
escalas específicas para a abordagem cirúrgica e perfusão de vasos pela microguia ou microcateter,
radiocirúrgica, Lopes et al. 45
desenvolveram o escore ou pelas mudanças de fisiologia vascular induzidas
AVMES estudando como fatores que influenciam na pela embolização (obstrução da via de saída venosa
chance de cura endovascular, o tamanho do nidus, o e normal pressure perfusion breakthrough). Ainda,
número de pedículos vasculares, o número de veias existe sempre o risco de complicações isquêmicas
de drenagem e a eloquência vascular do território. pela presença do corpo estranho intravascular, pela
Apesar de ainda carecer de maior validação embolização de estruturas não alvo em passagem, e
prospectiva, essa ferramenta fornece em dados as complicações de acesso vascular. A embolização
quantitativos a probabilidade de cura e de cura neoadjuvante é um procedimento com morbidade
sem complicações e corresponde aos resultados e mortalidade significativas, devendo apenas ser
encontrados na prática clínica. Para grupos de empregada quando a soma destes riscos com o do
pacientes com características angioarquiteturais procedimento subsequente for menor que o uso do
específicas e com uso de dispositivos modernos, as procedimento isolado.
taxas de obliteração a longo prazo chegam a 96%
com taxas de complicações maiores pequenas,
mas em cenários mais pragmáticos no mundo RADIOTERAPIA
real, com pacientes menos selecionados e em
Estima-se que o período de latência entre o
estudos prospectivos, foi observada taxa média de
tratamento radioterápico e a cura seja de 1 a 2 anos
erradicação de 52% em 50 meses se considerado o 47
. Os estudos que utilizaram o LINAC (acelerador
braço endovascular do estudo ARUBA . 27
linear) para o tratamento das MAV classicamente
Por fim, as técnicas endovasculares ainda relatam demonstração angiográfica de cura em 40
podem ser utilizadas de forma paliativa em pacientes a 50% dos casos após um ano e 80% a 90% dos
de outra forma considerados “intratáveis” por outras casos em dois anos48.
modalidades ou com recidivas não passíveis de
A incidência de complicações da radiocirurgia
reabordagem (sem acesso cirúrgico ou sem dose
varia de 1% a 10% em lesões pequenas e estes
adicional de radiação disponível). A lógica que
resultados são comparáveis com os resultados
guia essa abordagem é a modulação da fisiologia
obtidos com outras técnicas como gamma knife e
vascular, como por exemplo, obliteração de um
cyberknife.
componente fistuloso que levaria a fenômeno de
roubo ou edema cerebral. Lundsford et al.,49 apresentaram uma série de
227 casos de MAV tratadas com gamma knife, em
Em suma, a segurança do tratamento
Pittsburg, e obteve uma taxa de cura de 100% em
endovascular das malformações arteriovenosas
MAVs com menos de 1 cm3, 85% naquelas entre 1
teve avanços significativos nas últimas décadas,
e 4 cm3 e 58% nas de 4 a 10 cm3. Essa relação de
mas ainda merece especial atenção quando a
tamanho e taxa de cura se mantém similar até hoje
modalidade é considerada. De forma geral, espera-
em estudos recentes50.
se que em torno de 7% dos pacientes experimentem
efeitos adversos dessa terapia, que mais comumente
são periprocedimento. Em uma revisão sistemática
de 2425 pacientes tratados pela via endovascular
Capítulo 23 268
pequenas Spetzler e Ponce tipo A sejam operadas.
CONCLUSÃO
Da mesma forma, em MAV maiores que 3 cm, tipo
Os dados publicados disponíveis atualmente,
B Spetzler e Ponce, o tratamento multimodal deve
tanto sobre o tratamento conservador quanto
ser a regra, com a decisão sendo feita por grupo
sobre a morbidade e a mortalidade relacionadas
multidisciplinar de forma integrada entre terapia
ao tratamento, não separam os desfechos pelo
endovascular, radioterapia e cirurgia.
estado pré-tratamento (com ou sem sangramento)
e apresentam pouca consistência para o modo e o Em casos de MAV maiores de 3 cm
Assim, há considerável incerteza na literatura clínica tratamento fica mais difícil, pois todas as modalidades
existente, o que não oferece evidências conclusivas apresentam altos índices de morbi-mortalidade
sobre as melhores abordagens de tratamento para e baixas taxas de cura e alguns centros tratam o
Capítulo 23 269
secundárias como a epilepsia ou a cefaleia. 14. Rangel-Castilla L, Russin JJ, Martinez-Del-Campo E,
Soriano-Baron H, Spetzler RF, Nakaji P. Molecular and
cellular biology of cerebral arteriovenous malformations: a
review of current concepts and future trends in treatment.
REFERÊNCIAS Neurosurg Focus. 2014;37(3):E1.
1. Challa VR, Moody DM, Brown WR. Vascular 15. Franciscatto AC, Ludwig FS, Matte US, Mota S, Stefani
malformations of the central nervous system. J Neuropathol MA. Replication Study of Polymorphisms Associated With
Exp Neurol. 1995;54(5):609-621. Brain Arteriovenous Malformation in a Population From
2. Joint Writing Group of the Technology Assessment South of Brazil. Cureus. 2016;8(2):e508.
Committee American Society of Interventional 16. Weinsheimer S, Bendjilali N, Nelson J, et al. Genome-
and Therapeutic Neuroradiology; Joint Section on wide association study of sporadic brain arteriovenous
Cerebrovascular Neurosurgery a Section of the American malformations. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
Association of Neurological Surgeons and Congress 2016;87(9):916-23.
of Neurological Surgeons; Section of Stroke and the
Section of Interventional Neurology of the American 17. Bameri O, Salarzaei M, Parooie F. KRAS/BRAF
Academy of Neurology, et al. Reporting terminology for mutations in brain arteriovenous malformations: A
brain arteriovenous malformation clinical and radiographic systematic review and meta-analysis. Interv Neuroradiol.
features for use in clinical trials. Stroke. 2001;32(6):1430- 2021;27(4):539-546.
1442. 18. Steinmeier R, Schramm J, Müller HG, Fahlbusch R.
3. Stapf C, Mast H, Sciacca RR,et al. The New York Islands Evaluation of prognostic factors in cerebral arteriovenous
AVM Study: design, study progress, and initial results. malformations. Neurosurgery. 1989;24(2):193-200.
Stroke. 2003;34(5):e29-33. 19. Spetzler RF, Martin NA. A proposed grading system for
4. Al-Shahi R, Bhattacharya JJ, Currie DG, et al. Scottish arteriovenous malformations. JNeurosurg. 1986;65:476–83.
Intracranial Vascular Malformation Study (SIVMS): 20. Stefani MA, Porter PJ, terBrugge KG, Montanera
evaluation of methods, ICD-10 coding, and potential W, Willinsky RA, Wallace MC. Large and deep brain
sources of bias in a prospective, population-based cohort. arteriovenous malformations are associated with risk of
Stroke. 2003;34(5):1156-1162. future hemorrhage. Stroke. 2002;33(5):1220-1224.
5. Perret G, Nishioka H. Report on the cooperative study 21. Stefani MA, Sgarabotto Ribeiro D, Mohr JP. Grades of
of intracranial aneurysms and subarachnoid hemorrhage: brain arteriovenous malformations and risk of hemorrhage
Section VI - Arteriovenous malformations. JNeurosurg. and death. Ann Clin Transl Neurol. 2019;6(3):508–514.
1966;25:467–490.
22. Brown RD Jr, Wiebers DO, Forbes G, et al. The
6. Osborn AG. Diagnostic Cerebral Angiography. Second. natural history of unruptured intracranial arteriovenous
Lippincot Williams & Wilkins; 1998. p. 480. malformations. J Neurosurg. 1988;68(3):352-357.
7. Hashimoto N, Nozaki K. Do cerebral arteriovenous 23. Okamoto S, Handa H, Hashimoto N. Location
malformations recur after angiographically confirmed total of intracranial aneurysms associated with cerebral
extirpation? Crit Rev Neurosurg. 1999;9(3):141-146. arteriovenous malformation: statistical analysis. Surg
8. Mullan S, Mojtahedi S, Johnson DL, Macdonald RL. Neurol. 1984;22(4):335-340.
Embryological basis of some aspects of cerebral vascular 24. Cunha e Sa MJ, Stein BM, Solomon RA, McCormick
fistulas and malformations. J Neurosurg. 1996;85(1):1–8. PC. The treatment of associated intracranial aneurysms and
9. Lasjaunias P. A Revised Concept of the Congenital arteriovenous malformations. J Neurosurg. 1992;77:853–
Nature of Cerebral Arteriovenous Malformations. Interv 859.
Neuroradiol. 1997;3(4):275–281. 25. Redekop G, terBrugge K, Montanera W, Willinsky R.
10. Mullan S, Mojtahedi S, Johnson DL, Macdonald RL. Arterial aneurysms associated with cerebral arteriovenous
Cerebral venous malformation-arteriovenous malformation malformations: classification, incidence, and risk of
transition forms. J Neurosurg. 1996;85(1):9-13. hemorrhage. J Neurosurg. 1998;89:539–546.
11. Minakawa T, Tanaka R, Koike T, Takeuchi S, Sasaki 26. Mohr JP. A randomized trial of unruptured
O. Angiographic follow-up study of cerebral arteriovenous brain arteriovenous malformations (ARUBA). Acta
malformations with reference to their enlargement and NeurochirSuppl. 2008;103:3–4.
regression. Neurosurgery. 1989;24(1):68-74. 27. Mohr JP, Overbey JR, Hartmann A, et al. Medical
12. Kim H, Su H, Weinsheimer S, Pawlikowska L, Young management with interventional therapy versus medical
WL. Brain arteriovenous malformation pathogenesis: management alone for unruptured brain arteriovenous
a response-to-injury paradigm. Acta Neurochir Suppl. malformations (ARUBA): final follow-up of a multicentre,
2011;111:83-92. non-blinded, randomised controlled trial. Lancet Neurol.
2020;19(7):573-581.
13. Pardali E, Goumans MJ, ten Dijke P. Signaling by
members of the TGF-β family in vascular morphogenesis
and disease. Trends Cell Biol. 2010;20(9):556–567.
Capítulo 23 270
28. Mohr JP, Parides MK, Stapf C, et al. Medical Neurosurgery. 2010;66(4):702-713.
management with or without interventional therapy for
40. Potts MB, Lau D, Abla AA, et al. Current surgical
unruptured brain arteriovenous malformations (ARUBA):
results with low-grade brain arteriovenous malformations. J
a multicentre, non-blinded, randomised trial. Lancet.
Neurosurg. 2015;122(4):912-920.
2014;383(9917):614-621.
41. Abla AA, Rutledge WC, Seymour ZA, et al. A treatment
29. Fults D, Kelly DL. Natural history of arteriovenous
paradigm for high-grade brain arteriovenous malformations:
malformations of the brain: A clinical study. Neurosurgery.
volume-staged radiosurgical downgrading followed by
1984;15(5):658–662.
microsurgical resection. J Neurosurg. 2015;122(2):419-432.
30. Ondra SL, Troupp H, George ED, Schwab K. The
42. Sanchez-Mejia RO, Chennupati SK, Gupta N, Fullerton
natural history of symptomatic arteriovenous malformations
H, Young WL, Lawton MT. Superior outcomes in children
of the brain: a 24 year follow-up assessment. JNeurosurg.
compared with adults after microsurgical resection of brain
1990;73:387–391.
arteriovenous malformations. J Neurosurg. 2006;105(2):82-
31. Stapf C, Mohr JP, Pile-Spellman J, Solomon RA, 87.
Sacco RL, Connolly ES Jr. Epidemiology and natural
43. Spetzler RF, Wilson CB, Weinstein P. Normal perfusion
history of arteriovenous malformations. Neurosurg Focus.
pressure breakthrough teory. Clin Neurosurg. 1978;25:651-
2001;11(5):e1.
672.
32. Stefani MA, Porter PJ, terBrugge KG, Montanera
44. Young WL, Kader A, Prohovnik I, et al. Pressure
W, Willinsky RA, Wallace MC. Angioarchitectural factors
autoregulation is intact after arteriovenous malformation
present in brain arteriovenous malformations associated
resection. Neurosurgery. 1993;32(4):491-496.
with hemorrhagic presentation. Stroke. 2002;33(4):920-924.
45. Lopes DK, Moftakhar R, Straus D, Munich SA, Chaus F,
33. Porras JL, Yang W, Philadelphia E, et al. Hemorrhage
Kaszuba MC. Arteriovenous malformation embocure score:
Risk of Brain Arteriovenous Malformations During
AVMES. J Neurointerv Surg. 2016;8(7):685-691.
Pregnancy and Puerperium in a North American Cohort.
Stroke. 2017;48(6):1507-1513. 46. Castel JP, Kantor G. Morbidité et mortalité du traitement
chirurgical des malformations artério-veineuses cérébrales:
34. Horton JA, Chambers WA, Lyons SL, Adams RD,
Données actuelles et analyse de la littérature récente.
Kjellberg RN. Pregnancy and the risk of hemorrhage from
Neurochirurgie. 2001;47(2):369-383.
cerebral arteriovenous malformations. Neurosurgery.
1990;27(6):867–872. 47. Steiner L, Lindquist C, Cail W, Karlsson B, Steiner
M. Microsurgery and radiosurgery in brain arteriovenous
35. Yan KL, Ko NU, Hetts SW, et al. Maternal and
malformations. JNeurosurg. 1993;79:647–52.
Fetal Outcomes in Women with Brain Arteriovenous
Malformation Rupture during Pregnancy. Cerebrovasc Dis. 48. Colombo F, Benedetti A, Pozza F, Marchetti C, Chierego
2021;50(3):296-302. G. Linear accelerator radiosurgery of cerebral arteriovenous
malformations. Neurosurgery. 1989;24(6):833-840.
36. Lawton MT, Hamilton MG, Spetzler RF. Multimodal
treatment of deep arteriovenous malformations: thalamus, 49. Lunsford LD, Kondziolka D. Radiosurgery of
basal ganglia, and brainstem. Neurosurgery. 1995;37(1):29– arteriovenous malformations: Current technique. Contemp
36. Neurosurg. 1993;15(24):1-6.
37. Spetzler RF, Ponce FA. A 3-tier classification of cerebral 50. Kim BS, Yeon JY, Shin HS, et al. Gamma Knife
arteriovenous malformations. Clinical article. J Neurosurg. Radiosurgery for Incidental, Symptomatic Unruptured, and
2011;114(3):842-849. Ruptured Brain Arteriovenous Malformations. Cerebrovasc
Dis. 2021;50(2):222-230.
38. Nussbaum ES, Heros RC, Erickson DL. Cost-
effectiveness of carotid endarterectomy. Neurosurgery.
1996;38(2):237–244.
39. Lawton MT, Kim H, McCulloch CE, Mikhak B, Young
WL. A supplementary grading scale for selecting patients
with brain arteriovenous malformations for surgery.
Capítulo 23 271
PARTE 5
DOENÇAS DESMIELINIZANTES
CAPÍTULO 24
DOENÇAS INFLAMATÓRIAS DESMIELINIZANTES
DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Capítulo 24 273
de visual;
Metodologia de pesquisa do anticorpo
A metodologia utilizada para a detecção deste • mielite: déficit motor de membros, com ou
anticorpo (anti-MOG) é importante. Os métodos sem nível sensitivo e envolvimento esfinc-
iniciais utilizaram a conhecida técnica de ELISA teriano;
Apresentação clínica
Assim como a EM e a NMOSD, a doença
relacionada ao anti-MOG caracteriza-se por episódios
de surtos de déficits neurológicos desmielinizantes.
Esses eventos podem se caracterizar, basicamente,
por envolvimento neurológico subagudo cursando
com6,7: Figura 1: Mielite torácica baixa envolvendo o cone
medular. Lesão sugestiva para MOGAD.
• neurite óptica: dor ocular à movimentação Fonte: Adaptado de Denève et al., 20198.
dos olhos, discromatopsia e baixa acuida-
Capítulo 24 274
Os pacientes portadores de MOGAD qualquer paciente com apresentação neurológica
geralmente possuem uma idade menor na pelo risco de comprometer as taxas de sensibilidade,
primeira apresentação e também tem uma menor especificidade, falsos positivos e falsos negativos
preponderância de mulheres sobre homens do que da metodologia. Para isso, desenvolveram critérios
os casos de NMOSD antiaquaporina-4 positivos. para a pesquisa do anticorpo principalmente em
Tendem a apresentar edema de papila bilateral e os síndromes clínicas em que a chance pré-teste de
casos de mielite isolada anti-MOG+ possuem maior positividade é elevada para justificar a solicitação do
risco de recidiva do que os casos negativos . 6-8
exame5.
Capítulo 24 275
Figura 2: A. Corte axial das órbitas. B. Corte coronal das órbitas. As setas apontam o realce perineural da bainha dos
nervos ópticos bilateralmente (perineurite).
Fonte: Adaptado de Lopez-Chiriboga et al., 201910.
Capítulo 24 276
tentorial em paciente com neurite ou erétil permamente após mieli-
óptica, mielite ou encefalite do te;
tronco encefálico;
• diagnóstico de ADEM, ADEM re-
• RM encefálica sem lesão ovoide corrente, ADEM multifásico ou
periventricular, em lobo temporal qualquer outra variante de ADEM;
inferior, fibras justacorticais em U
ou dedos de Dawson (achados • sinais de desmielinização asso-
esses que seriam típicos para ciados à episódio de insuficiência
EM); e respiratória aguda, alteração do
nível de consciência, alterações
• lesões largas e confluentes em T2 comportamentais ou crises con-
sugestivas de ADEM. vulsivas;
Capítulo 24 277
quêmicos); e lopatia posterior reversível ou qualquer
outra evidência de infecção do SNC).
• piora contínua dos sintomas após se-
manas: considerar tumor e sarcoidose. Então, resumidamente, o diagnóstico da
doença relacionada ao Anti-MOG se faz basicamente
2. ressonância magnética:
em um paciente com5:
• lesões adjacentes aos ventrículos late-
1. neurite óptica, mielite ou encefalite;
rais, ovoides, lesões no lobo temporal
inferior, padrão em dedos de Dawson
2. comprovação por RM ou PEV desse
ou então aumento assintomático da acometimento com padrão desmielinizante; e
carga lesional nos exames subsequen- 3. positividade para o anti-MOG IgG no soro.
tes: considerar esclerose múltipla.
Capítulo 24 278
diferenciação entre EM e MOGAD, pois medicações segundo evento desmielinizante ocorrido com o
habitualmente utilizadas em pacientes com EM surgimento de novos sintomas três meses após a
podem levar ao aumento dos surtos e piora da doença inicial, passam a ser denominados como
doença em pacientes com a doença relacionada ao encefalomielite multifásica disseminada16.
MOG11-13.
Caso ocorra um terceiro evento semelhante
a ADEM, não será mais caracterizado como
encefalomielite multifásica disseminada, e sim como
ENCEFALOMIELITE DISSEMINADA uma doença desmielinizante crônica e recorrente do
AGUDA
SNC, incluindo a NMOSD e EM15.
A encefalomielite aguda disseminada (ADEM)
é uma doença desmielinizante imuno-mediada Epidemiologia
do SNC que ocorre preferencialmente na primeira A incidência de ADEM é de 0,3 a 0,6 por
infância, sendo um dos distúrbios desmielinizantes 100.000 por ano no EUA, onde acompanha uma
mais frequentes da infância. distribuição geográfica semelhante à da EM.
As primeiras descrições de um transtorno Conforme aumenta a distância da linha do Equador,
semelhante a ADEM com reconhecimento de uma também aumenta a incidência da ADEM15.
relação temporal com infecções (especialmente a A idade média na apresentação é 5 a 8
varíola e o sarampo) ocorreram no século XVIII15. anos, com predominância do sexo masculino. O
Posteriormente, foi relatada a associação de ADEM risco de desenvolver a ADEM após imunizações é
a imunizações como a vacina antirrábica. significativamente menor do que o risco de ADEM
pós-infecciosa15.
Definição
Considerando a elevada prevalência de
Em 2007, o Grupo Internacional de Estudo
infecções e vacinações em crianças pequenas, uma
de Esclerose Múltipla Pediátrica (IPMSSG) propôs
associação cronológica entre uma vacinação ou
novas definições consensuais para a ADEM, e estes
infecção e ADEM não prova causalidade.
critérios foram revisados em 201315.
Capítulo 24 279
Um padrão de ativação microglial distinta
Ressonância magnética
da EM, caracterizada por agregados microgliais
A RM demonstra múltiplas lesões ponderadas
multifocais não associados com desmielinização
em T2 e imagens de recuperação de inversão (STIR)
cortical, também pode ser encontrado na ADEM.
hiperintensas bilaterais, assimétricas e irregulares,
Essas alterações microgliais corticais difusas podem
bem como lesões tumefativas com edema
representar o substrato patológico do rebaixamento
perilesional. A presença de lesões de tamanhos
da consciência tipicamente observado em pacientes
diferentes é comum em um mesmo paciente16,17.
com ADEM15.
As lesões típicas de ADEM envolvem a
Leucoencefalopatia hemorrágica aguda
substância branca subcortical e central e a substância
caracterizada pela presença de hemorragias, necrose
cinzenta cortical – junção da matéria branca, tálamo,
fibrinoide de vasos, exsudatos perivasculares, edema
gânglios da base, cerebelo e tronco cerebral (Figura
e infiltração de granulócitos, com desmielinização
4). O envolvimento da medula espinhal foi descrito
perivascular e astrocitose reativa, também pode
em até um terço dos pacientes, com grandes lesões
ocorrer na ADEM.
confluentes estendendo-se por vários segmentos,
às vezes associado com edema medular. O realce
Apresentação clínica
do gadolínio é relatado em até 30% dos pacientes16.
Caracterizada por um início agudo de
encefalopatia em associação com déficits A maioria dos pacientes apresenta resolução
neurológicos polifocais, precedidos por febre, mal- completa ou parcial de anormalidades na RM17.
estar, irritabilidade, sonolência, cefaleia, náuseas e Sugere-se reavaliar os pacientes com pelo menos
Capítulo 24 280
Figura 4: Lesões típicas de ADEM na ressonância magnética de crânio. A e B. T2- FLAIR demonstrando grandes lesões
multifocais na substância branca e pequenas lesões subcorticais em ambos os hemisférios cerebrais. C. Lesões em T1-
pós contraste demonstrando a impregnação pelo gadolíneo, e lesão parietal esquerda com edema associado.
Fonte: Adaptado de Koelman et al., 201716.
Características na RM ADEM EM
Envolvimento da substância cinzenta profunda e envolvimento cortical Sim Não
Lesões bilaterais difusas Sim Não
Lesões mal delimitadas Sim Não
Lesões periventriculares Sim Não
Lesões perpendiculares ao corpo caloso Não Sim
Lesões ovoides Não Sim
Lesões confinadas ao corpo caloso Não Sim
Presença de lesões bem definidas Não Sim
Black-holes na sequência T1 Não Sim
Tabela 1 – Características de imagem na ressonância magnética entre ADEM e EM (embora não existam critérios de
imagem absolutos para diferenciar ADEM de EM).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 24 281
Deve-se descartar, primeiramente, as observados, afetando a atenção, função executiva,
infecções do SNC potencialmente tratáveis, processamento verbal e comportamento, bem como
especialmente o vírus herpes simplex, enterovírus, pontuações de QI, especificamente em crianças
vírus Epstein-Barr e micoplasma . 15
com ADEM antes dos 5 anos15.
ou como um tratamento de segunda linha nos casos 9. Jarius S, Ruprecht K, Kleiter I, et al. . MOG-IgG in NMO
and related disorders: a multicenter study of 50 patients.
de ADEM não responsiva a esteroides. A dose total Part 1: Frequency, syndrome specificity, influence of disease
usual é de 2 g/kg, administrado durante 2 a 5 dias. activity, long-term course, association with AQP4-IgG, and
origin. J Neuroinflammation. 2016;13(1):279.
Plasmaférese é recomendado para pacientes 10. Lopez-Chiriboga AS, Van Stavern G, Flanagan EP, et
refratários à terapia com doença fulminante, por al. Myelin Oligodendrocyte Glycoprotein Antibody (MOG-
IgG)-Positive Optic Perineuritis. Neuroophthalmology.
exemplo, usando sete trocas em dias alternados. 2019;44(1):1-4.
Outras medidas como hipotermia e craniotomia 11. Whittam DH, Karthikeayan V, Gibbons E, et al.
Treatment of MOG antibody associated disorders: results of
descompressiva já foram usados em casos de ADEM
an international survey. J Neurol. 2020;267(12):3565-3577.
fulminante.
12. Chen JJ, Flanagan EP, Bhatti MT, et al. Steroid-sparing
A maioria das crianças com ADEM apresenta maintenance immunotherapy for MOG-IgG associated
disorder. Neurology. 2020;95(2):e111-e120.
recuperação total, em dias a meses após a introdução
do tratamento. As taxas de mortalidade variam de
1 a 3% e déficits cognitivos de longo prazo foram
Capítulo 24 282
13. Ramanathan S, Mohammad S, Tantsis E, et al. Clinical 16. Koelman DLH, Benkeser DC, Klein JP, Mateen FJ.
course, therapeutic responses and outcomes in relapsing Acute disseminated encephalomyelitis: prognostic value of
MOG antibody-associated demyelination. J Neurol early follow-up brain MRI. J Neurol. 2017;264(8):1754-1762.
Neurosurg Psychiatry. 2018;89(2):127-137.
17. Boesen MS, Blinkenberg M, Born AP, et al. Magnetic
14. Hacohen Y, Banwell B. Treatment Approaches for resonance imaging at baseline and follow-up to differentiate
MOG-Ab-Associated Demyelination in Children. Curr Treat between pediatric monophasic acquired CNS demyelination
Options Neurol. 2019;21(1):2. and MS. Mult Scler Relat Disord. 2020;46:102590.
15. Pohl D, Alper G, Van Haren K, et al. Acute disseminated
encephalomyelitis: Updates on an inflammatory CNS
syndrome. Neurology. 2016;87(2):S38-45.
Capítulo 24 283
CAPÍTULO 25
ESCLEROSE MÚLTIPLA
Capítulo 25 284
T. Alguns polimorfismos interagem com os fatores em uma teoria de que o evento inicial imunológico
ambientais, aumentando o risco de desenvolvimento ocorra na periferia e leve a uma resposta imune
da EM. O HLA-DRB1*15:01 promove um maior risco aberrante contra o SNC. Ambos os cenários irão
da doença em pacientes tabagistas, com história de levar à liberação de antígenos da periferia, os quais
obesidade na adolescência e também em paciente causarão uma resposta imunológica nos tecidos
com infecção prévia por Epstein-Barr vírus. Já outro linfáticos, seguida de uma invasão destes linfócitos
polimorfismo (CYP24A1) aumenta o risco da doença no SNC (Figura 2). Esta invasão é associada à
em pacientes com baixos níveis séricos de vitamina disfunção da barreira hemato-encefálica (BHC) e a
D 18,23
. uma anormal permeabilidade vascular de capilares
cerebrais, processo que se acredita iniciar antes
mesmo do processo inflamatório24,28.
PATOGÊNESE
Como auxílio nas evidências do envolvimento
O dano neurológico na EM resulta de um imunológico na patogênese da doença, sabe-se que
mecanismo patogênico complexo e dinâmico, há produção intratecal de imunoglobulinas do tipo
envolvendo sistema imune inato e adaptativo, IgG e IgM, vistas em análise de bandas oligoclonais
micróglia, oligondendrócitos, astrócitos e no líquor cefalorraquidiano dos pacientes, dado
neurônios24,25. não encontrado na análise sérica. Além disso,
O papel fundamental do sistema imune há o envolvimento não muito enfatizado dos
adaptativo na doença envolve células T e B, oligodendrócitos, os quais ficam aprisionados ao
recrutadas por antígenos-específicos expressos redor das placas inflamatórias, sendo ineficientes na
no SNC. O motivo pelo qual há uma resposta remielinização das lesões inflamatórias29. Podemos
imunológica contra antígenos centrais ainda não é citar também o papel das drogas modificadoras da
conhecido, porém alguns mecanismos estudados doença, as quais têm demonstrado efeito benéfico no
podem ser levados em conta para o início desta controle da ativação da doença, através da atuação
reação imune (Figura 1), como a reatividade entre em mecanismos imunológicos como a regulação da
antígenos da microbiota intestinal e auto-antígenos, resposta imune de células T, o bloqueio do transporte
ou respostas autoimunes contra um estímulo dos linfócitos para o SNC e redução da atividade das
inflamatório, como um processo infeccioso ou uma células B.
doença autoimune já previamente instalada26,27. O sistema imune inato, englobando as células
A expansão de uma grande quantidade de fagocíticas, também possui papel na fisiopatologia
linfócitos antígenos-específicos ocorre a partir de da EM desde o início do processo inflamatório. Os
células precursoras presentes nos linfonodos da macrófagos auxiliam na resposta pró-inflamatória
periferia, a qual necessita de células apresentadoras gerada pelas células T e B. Já a ativação microglial
de antígeno (APC), como as células dendríticas, para promove secreção de citocinas pró-inflamatórias,
desencadear uma resposta específica de células T quimiocinas e radicais livres. A micróglia é
e B . Acredita-se que a resposta imune patológica
26 encontrada abundantemente na substância branca
aos antígenos do SNC possa ser iniciada de duas cerebral. Enquanto ela tem um papel importante na
maneiras : através do modelo intrínseco ou do
25 mediação da inflamação, acredita-se que também
modelo extrínseco do SNC. No primeiro, postula-se tenha influência na reparação de danos, promovendo
que a resposta imune ocorra inicialmente no SNC, limpeza dos debris de mielina30. O mesmo ocorre com
o qual leva à liberação de antígenos do SNC para o processo envolvendo os astrócitos31, os quais são
a periferia, local em que ocorre a reação autoimune os maiores componentes das placas inflamatórias na
contra estes antígenos centrais. O segundo consiste EM. Enquanto este processo aumenta a inflamação
Capítulo 25 285
Figura 1: Resposta imunológica anormal frente a antígenos e formação de linhagens celulares autorreativas contra o
SNC.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 25 286
através da produção de moléculas pró-inflamatórias, abrem o diagnóstico na forma de EMRR
ele também limita o dano tecidual através do aumento irá desenvolver a EMSP após alguns anos
de glutamato, o qual promove suporte metabólico da doença, sendo esta caracterizada
por incapacidades lentamente
aos axônios e ajuda na manutenção da BHC32.
progressivas e irreversíveis que ocorrem
Conforme a doença avança para a fase independentemente da presença de
progressiva, a contribuição do sistema imune surtos. A taxa de conversão de EMRR para
periférico na patogênese da doença reduz e a resposta EMSP é de 2 a 3% dos pacientes ao ano.
Sabe-se que, nesta fase, o componente
imune fica mais confinada em compartimentos do
inflamatório da patogênese da doença
SNC, levando a dano difuso da substância branca
torna-se menor, e há um predomínio de
e inúmeros infiltrados de linfócitos e monócitos, e a componentes neurodegenerativos35,37;
aumento do envolvimento cortical nesta etapa. Além
disso, o dano tecidual na fase progressiva inclui 3. EM primariamente progressiva (EMPP):
degeneração axonal por desmielinização crônica, assim como a EMRR, é um fenótipo de
abertura da doença, ocorrendo em 10
disfunção de astrócitos e ativação microglial33.
a 15% dos casos. A EMPP se manifesta
Do ponto de vista anátomo-patológico, o com incapacidades e déficits neurológicos
marco da EM é a desmielinização, gliose astrocítica, progressivos e irreversíveis desde o início
perda axonal e neurodegeneração, sendo estas do quadro, se mais de 1 ano ou ocorrência
de surtos38;
responsáveis pelo surgimento de incapacidades
clínicas permanentes, motoras e cognitivas. 4.
síndrome clínica isolada (CIS):
Acredita-se que a perda neuronal esteja ligada a consiste em um fenótipo de abertura
disfunção mitocondrial, perda do suporte mielínico, comum, englobando os pacientes que
edema celular progressivo e desorganização apresentaram apenas um surto clínico
citoesquelética, reflexo da desmielinização e sugestivos de doença desmielinizante,
porém que não preenche todos os critérios
inflamação crônica . 34
clínico-radiológicos para EM no momento.
Na CIS, não há evidência ou história
prévia de outros sintomas compatíveis
QUADRO CLÍNICO com surto desmielinizante. Em 20 anos,
As manifestações relacionadas à EM aproximadamente 85% dos pacientes com
CIS irão apresentar outros sintomas ou
dependem de qual fenótipo de doença o paciente se
surgimento de lesões desmielinizantes em
enquadra, sendo que este está relacionado ao início
estudos de imagem, os quais enquadrarão
e ao curso clínico da doença (Figura 3): estes pacientes dentro dos outros
fenótipos EM39,40; e
1. EM remitente-recorrente (EMRR): é
o fenótipo de abertura mais comum, 5. síndrome radiológica isolada (RIS):
ocorrendo em cerca de 85% dos casos, trata-se de um diagnóstico dado quando
caracterizado pela ocorrência de lesões desmielinizantes assintomáticas
manifestações em intervalos irregulares, em localizações típicas de EM são
agudas ou subagudas, chamadas de encontradas, sem que o paciente tenha
surto, das quais podem ter recuperação tido nenhuma manifestação clínica prévia
completa ou incompleta. Há mínima (durante exames de imagem solicitados
progressão de sintomas entre um surto e por outros motivos). Cerca de 34% dos
outro35,36; casos evoluem com uma manifestação
clínica dentro de 5 anos, principalmente
2.
EM secundariamente progressiva
em pacientes do sexo masculino, com
(EMSP): uma parcela dos pacientes que
idade precoce ou com lesões em medula
Capítulo 25 287
Figura 3: Curso clínico da esclerose múltipla (EM).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 25 288
espinhal41,42. plegia internuclear ou paresias de nervos
cranianos, em especial o nervo abducen-
Nos fenótipos que englobam ocorrências
te, são frequentes.
de surto, as manifestações clínicas destes variam
conforme o local da lesão desmielinizante no SNC. Além disso, mesmo na ausência de novo
Estes surtos são caracterizados como surgimento evento desmielinizante, déficits de surtos prévios
de sintomas neurológicos focais compatíveis podem piorar temporariamente em cenários de
com episódios desmielinizantes, com duração de temperatura corporal elevada, como febre, atividade
mais de 24h, na ausência de febre, encefalopatia física, aumento da temperatura ambiente e aumento
(como redução do nível de consciência ou crises do metabolismo, conhecido como fenômeno de
epilépticas) ou sintomas infecciosos43,44. Estes Uhthoff. Estas pioras temporárias costumam ocorrer
sintomas iniciam de forma aguda ou subaguda, por poucas horas ou dias e são denominadas
com piora progressiva, atingindo um pico com 2 a “pseudo-surtos”.
3 semanas, com posterior remissão variável, entre Além dos surtos, há outros achados presentes
resolução mínima a completa melhora, geralmente em pacientes com EMRR e que, geralmente,
após 2 a 4 semanas do pico dos sintomas35. ocorrem depois de alguns anos de doença, devido
Os sintomas de surto dependem da localização à progressão sutil que ocorre independentemente
do processo inflamatório no SNC. Os sintomas mais de surtos. Estes sintomas costumam ocorrer de
comumente presentes em surtos de EM são35,44: forma mais significativa em pacientes com formas
progressivas da EM46:
• neurite óptica (NO): redução da acuidade
visual (como turvação visual ou escotoma • disfunção vesical e intestinal: presente em
central), geralmente unilateral e dolorosa. 75 e 50% dos casos, respectivamente. Há,
Ocorre como primeiro sintoma da doen- principalmente, queixas sobre urgência
ça em 25% dos pacientes, sendo que até urinária e/ou fecal, porém também podem
70% dos casos terão um episódio de NO ocorrer casos de retenção urinária e cons-
ao longo da doença45. Na avaliação do tipação47;
fundo de olho, é comum encontrarmos pa-
piledema, quando o processo inflamatório • disfunção cognitiva: presente em 45 a 70%
da NO ocorre na região anterior do nervo; dos casos, não sendo incomum ocorrer
desde o início da doença48,49. Os principais
• mielite transversa parcial: geralmente com domínios afetados são atenção, função
sintomas sensitivos (presentes inicialmen- executiva, memória de curto prazo, evoca-
te em até 45% dos casos) com ou sem ção de palavras e velocidade de proces-
sinal de Lhermitte (sensação de choque samento de informações50. O grau do de-
em tronco e membros superiores, quando clínio cognitivo corresponde diretamente
paciente realiza flexão cefálica). Sintomas com a severidade da patologia cerebral e
motores também são comuns, abrindo o da carga lesional no estudo de ressonân-
quadro em até 40% dos pacientes, através cia magnética (RM), sendo comum encon-
de paresia e sinais de liberação piramidal. trarmos, nestes pacientes, atrofia e lesões
Podem ocorrer sintomas esfincterianos chamadas black holes, que correspondem
agudos, como urge-incontinência e disfun- a hipossinais em T1 e à perda da arquite-
ção erétil; e tura tecidual cerebral51,52;
Capítulo 25 289
nio cognitivo53; agilizar o diagnóstico (Tabela 1). A chave principal
para o diagnóstico consiste em evidências de
• fadiga: é descrita como uma sensação
lesões no sistema nervoso central demonstrando
de exaustão física, presente em até 90%
disseminação no tempo (lesões que ocorreram
dos pacientes com EM, que pode ocorrer
diariamente e tende a melhorar após o em tempos diferentes) e disseminação no espaço
descanso. É um sintoma que piora em si- (lesões em mais de uma localização típica no SNC).
tuações de depressão, distúrbios do sono Em 2017, algumas mudanças ocorreram baseadas
e uso de algumas medicações (anti his- nos critérios de 2010, como a inclusão de presença
tamínicos, anti-inflamatórios, sedativos e de bandas oligoclonais (BOC) como possível critério
relaxantes musculares)54,55;
para caracterizar a disseminação no tempo, de
• espasticidade: cerca de 15% dos pacien- lesões sintomáticas e assintomáticas na RM como
tes apresentam espasticidade moderada determinantes de disseminação em tempo e espaço,
a severa ao longo do curso da doença, e de lesões corticais como possível localização para
a qual ocorre devido a lesão de neurônio disseminação em espaço. Vale lembrar que quando
motor superior por desmielinização no
a presença de BOC é parte do processo diagnóstico,
SNC56;
esta deve ser avaliada tanto em LCR quanto em soro,
• dor: presente em até 65% dos pacientes, a para confirmar sua presença apenas no primeiro.
dor geralmente decorre de cefaleia, dor de
Como visto na revisão dos critérios
origem neuropática, neuralgia do trigêmeo
diagnósticos, o estudo de imagens através da RM
ou espasmos dolorosos57;
é essencial para a avaliação dos pacientes com
• disfunção sexual: presente em até 70% suspeita de EM ou de, também, outras doenças
dos casos, em algum momento da doen- desmielinizantes do SNC. As lesões características
ça. A disfunção sexual pode ser resultado de EM vistas em estudos de imagem são tipicamente
de lesão direta das vias motoras e sensi-
ovoides e encontradas na substância branca,
tivas da medula espinhal, bem como de
em áreas como periventricular, justacorticais, no
fatores psicológicos47,58; e
corpo caloso, no tronco encefálico, no cerebelo
• alterações de sono: ocorrem em até 55% e na medula espinhal cervical (Figura 4). As
dos pacientes e são representadas por lesões periventriculares são organizadas de forma
insônia, síndrome das pernas inquietas e perpendicular ao corpo caloso, dando o aspecto,
apneia e hipopneia obstrutiva do sono59.
em cortes sagitais, do que chamamos de Dawson
fingers. As lesões são hiperintensas nas sequências
T2/FLAIR e, quando antigas, são hipointensas nas
DIAGNÓSTICO
sequências T1 (chamados black holes), geralmente
O diagnóstico da EM pode ser um desafio associadas a algum grau de atrofia cerebral. A
para o médico, visto que não existe um exame captação de contraste gadolíneo por lesões sugere
específico ou teste molecular que detecte a doença. ativação recente com inflamação local, sendo este
O processo depende da história clínica, exame físico fenômeno transitório, o qual pode persistir por até
neurológico e de exames complementares como 8 semanas após o início da inflamação (média de 3
imagens do sistema nervoso central em estudos de semanas)60. Quando falamos de lesões medulares,
RM e coleta do líquor cefalorraquidiano (LCR). as características típicas de EM são: lesões curtas
A última atualização dos critérios diagnósticos (extensão de menos de três segmentos vertebral),
(critérios de McDonald) ocorreu em 201744, na dorsolaterais nos cortes axiais, hiperintensas em
tentativa de aumentar a acurácia do método e T2/FLAIR, com pouco ou menos edema reacional e,
geralmente, com bordos bem delimitados61.
Capítulo 25 290
Apresentação Clínica Critérios adicionais para o diagnóstico
Capítulo 25 291
Figura 4: Imagens de RM demonstrando lesões desmielinizantes típicas de EM. A e B. Corte axial na sequência T2/
FLAIR, demonstrando lesões hiperintensas em substância branca, principalmente periventriculares; C. Corte axial na
sequência T1, na qual visualizamos lesão captante de contraste parietal esquerda, com realce anelar; D. Lesão que
capta contraste periventricular frontal direita e lesão hipointensas sugestiva de black hole parietal esquerda no corte
axial na sequência T1; E e F. Mielite parcial, curta e lateralizada, demonstrada através de hiperssinal em corte sagital e
axial T2/FLAIR, na altura de C3.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 25 292
A pesquisa de BOC no LCR não é obrigatória representam pacientes com necessidade de auxílio
em todos os pacientes, mas é importante dentro uni ou bilateral de pessoas, muletas ou bengalas.
do diagnóstico diferencial, especialmente naqueles E pontuações maiores ou iguais a 7,0, representam
que as lesões na RM não fecham os critérios pacientes que estão restritos a cadeira de rodas ou
diagnósticos de disseminação em tempo, nos casos acamados64. Em estudos prévios, o tempo médio
de CIS, nos suspeitos de EMPP e nos pacientes de doença para atingir um EDSS de 6,0 é de cerca
com sinais atípicos para EM . Outros exames
44
de 15 a 35 anos, sendo que as formas progressivas
complementares, também não essenciais e não da EM costumam promover uma evolução mais
específicos para EM, podem auxiliar no diagnóstico rápida65,66.
como os potenciais evocados, tomografia de
Apesar de ser amplamente utilizado, o EDSS
coerência ópticas (para casos de NO), investigação
não avalia de forma adequadas outros sintomas
de doenças reumatológicas e pesquisa de auto-
importantes para o paciente, como a disfunção
anticorpos, como anticorpos contra aquaporina-4
cognitiva, fadiga e alterações de humor. Baterias
(biomarcador específico para doenças do espectro
de testes neuropsicológicos podem ser usadas
da neuromielite óptica) e MOG-IgG (marcador neurite
para a avaliação cognitiva, como o brief repeatable
óptica, encefalite e mielite associada ao MOG-IgG
battery of neuropsychological test (BRB-N), o brief
- MOGAD). Estes devem ser solicitados quando há
international cognitive assessment for multiple
características atípicas para EM, como NO bilateral
sclerosis (BICAMS) e o minimal assessment of
ou envolvendo o quiasma óptico, NO causando perda
cognitive function in MS (MACFIMS), as quais
visual severa com pouca recuperação ou com defeitos
englobam testes para avaliação de velocidade
altitudinais na campimetria, mielite completa, baixa
de pensamento, atenção, memória e funções
ou longitudinalmente extensa (acometendo três ou
executivas67. Um destes testes, chamado symbol
mais corpos vertebrais), clínica de síndrome da área
digit modalities test (SDMT), foi avaliado como
postrema (náusea, vômitos e soluços prolongados
ferramenta de screening cognitivo, podendo ser
e súbitos), sintomas sistêmicos associados, como
usado em avaliações rotineiras de consultório68.
febre, lesões de pele e artralgia 62,63
.
A severidade da doença depende de fatores
como velocidade de progressão da pontuação
do EDSS, frequência de surtos e de sintomas
AVALIAÇÃO CLÍNICA E DA SEVERIDADE
DA DOENÇA progressivos, e evolução comparativa dos exames
de RM de controle. O termo “EM benigna” caiu em
Diversas escalas já foram propostas para
desuso por ser de difícil identificação nos primeiros
avaliar o grau de acometimento clínico em pacientes
anos da doença69. Já a EM altamente ativa pode ser
com EM. A escala expandida de incapacidade (em
definida conforme os seguintes critérios70,71:
inglês expanded disability status scale, EDSS) é
a mais disseminada para uso clínico. Ela possui • pontuação no EDSS de 4 pontos nos pri-
uma pontuação que varia de 0 (exame neurológico meiros 5 anos da doença;
completamente normal) a 10 (morte devido a EM).
• dois ou mais surtos com recuperação in-
Além disso, o EDSS é composto por 8 diferentes sub-
completa dos sintomas no primeiro ano da
escalas, chamadas de escores funcionais (domínios
doença;
piramidais, cerebelares, de tronco encefálico,
sensitivos, vesicais, visuais, mentais e outras). De • duas ou mais RM cerebrais demonstran-
forma geral, pacientes com pontuação menor ou igual do novas lesões ou aumentos do tamanho
a 5,5 conseguem deambular sem auxílio, mesmo das lesões prévios em sequência T2, ou
surgimento de lesões captando contraste,
que com dificuldades. Pontuações entre 6,0 e 6,5
Capítulo 25 293
mesmo em pacientes com tratamento ins- de 2g/kg dividida em 2 a 5 dias, ou a realização
talado; e de plasmaférese, de 4 ou 6 sessões em dias
intercalados. Os efeitos colaterais da corticoterapia
• ausência de resposta ao tratamento com
mais graves são a alteração do estado mental,
uma ou mais droga modificadora da doen-
ça (DMD) por pelo menos um ano. sintomas envolvendo o trato gastrointestinal,
depressão, episódios maníacos/hipomaníacos e
Algumas características da doença podem
aumento do risco de infecções.
ajudar a predizer o risco de conversão de CIS para
EM e o prognóstico dos pacientes já diagnosticados
Drogas modificadoras da doença
com a doença8. Os fatores de mau prognóstico estão
Em 1993, foi publicado o primeiro estudo
listados na Tabela 2.
envolvendo uma DMD como tratamento profilático
Quanto à mortalidade na EM, sabe-se que há para EM, sendo este o interferon-β subcutâneo
uma redução da expectativa de vida nos pacientes (IFN-1β)73. A partir deste momento, mais de outras
em 7 a 14 anos, sendo que aqueles com idade 10 medicações foram aprovadas e estão disponíveis
avançada na abertura do quadro e com formas para tratamento da doença, através de estudos
progressivas da doença possuem menor sobrevida. que compararam a eficácia destas com a do IFN-
Em mais de 50% dos casos, fatores relacionados à 1β. A Figura 5 ilustra a evolução das aprovações
própria EM são a causa da morte. Outras etiologias e disponibilidades destas ao longo das últimas
comuns incluem suicídio, doenças cardiovasculares, décadas26. Sabe-se que estas drogas possuem efeito
neoplasia e doenças respiratórias72. reduzindo a neuroinflamação e podem ter um efeito,
mais modesto e indireto, na neurodegeneração.
Atualmente, apenas o ocrelizumabe demonstrou
TRATAMENTO redução da progressão em pacientes com EMPP74.
Capítulo 25 294
Associação com risco de Associação com progressão
Fator
conversão para EM e incapacidades
Tabagismo Alto risco Pior prognóstico
Baixo nível sérico de vitamina D Alto risco Desconhecido
Infecção pelo EBV Alto risco Desconhecido
Obesidade na infância e adolescência Alto risco Pior prognóstico
HLA-DRB1*1501 Alto risco Desconhecido
Raças não caucasiana Alto risco Pior prognóstico
Sexo feminino Alto risco Bom prognóstico
Sexo masculino Baixo risco Pior prognóstico
Idade avançada Baixo risco Pior prognóstico
Idade precoce Alto risco Bom prognóstico
Início com NO ou quadros sensitivos Baixo risco Bom prognóstico
Início com quadro motor ou outros sintomas Alto risco Pior prognóstico
Início monofocal (apenas um sistema) Baixo risco Bom prognóstico
Início multifocal (mais de um sistema) Alto risco Pior prognóstico
Declínio cognitivo Alto risco Pior prognóstico
Alta taxa de surtos nos primeiros 2 a 5 anos da doença;
Recuperação incompleta dos sintomas após um surto;
Incapacidades acumuladas nos primeiros 2-5 anos da NA Pior prognóstico
doença;
Período curto até conversão para EMSP
Presença de BOC na análise do LCR Alto risco Pior prognóstico
Alto nível de neurofilamentos de cadeia leve Alto risco Pior prognóstico
Grande número ou volume de lesões hiperintensas em T2
Alto risco Pior prognóstico
na RM
Lesões infratentoriais ou medulares Alto risco Pior prognóstico
Presença de lesões ativas, que captam o contraste Alto risco Desconhecido
Tabela 2: Fatores associados ao risco de conversão de casos de CIS para EM e associados a pior prognóstico da
doença e progressão.
EM, esclerose múltipla; CIS, síndrome clínica isolada; EBV, Epstein-Barr vírus; NO, neurite óptica; NA, não se aplica;
EMSP, esclerose múltipla secundariamente progressiva; BOC, bandas oligoclonais; LCR, líquor cefalorraquidiano; RM,
ressonância magnética nuclear.
Fonte: Adaptada de Filippi et al., 20188.
Figura 5: Evolução e aprovação dos tratamentos profiláticos com DMD para pacientes com EM. EMRR, Esclerose
Múltipla Remitente-Recorrente; EMPP, Esclerose Múltipla Primariamente Progressiva.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 25 295
mais efetivas, porém com um perfil de segurança de dimetila. No final de 2017, o fingolimode foi
menor, são escolhidas inicialmente, como aprovado para uso em casos de falha terapêutica
natalizumabe, fingolimode, cladribina, ocrelizumabe ou necessidade de interrupção dos fármacos de
ou alemtuzumabe. Esta estratégia trabalha com a primeira linha. Caso este apresente também falha
ideia de que pacientes recém-diagnosticados com terapêutica, medicações de alta eficácia podem ser
EMRR de alta atividade ou que possuem fatores de utilizadas, como o natalizumabe.
mau prognóstico poderiam se beneficiar com uma
Apesar de ainda serem amplamente usados
forte imunointervenção no início do tratamento,
no nosso país, tratamentos com altas doses de
promovendo uma redução importante na atividade
vitamina D não são recomendados e estudos
de células T, B e mieloides e, consequentemente,
realizados não demonstraram relação da conduta
na inflamação central. Após o tratamento com estas
com diminuição da progressão da doença81,82. A
medicações, DMD menos efetivas são usadas para
maioria dos protocolos recomenda manter os níveis
continuidade do manejo.
séricos de 25-hidroxivitamina D entre 40 a 60 ng/
Semelhante a estes, o guideline brasileiro , 71
mL71,83.
publicado pelo BCTRIMS, enfatiza a importância do
tratamento precoce e efetivo, baseado nos diferentes Troca medicamentosa
níveis de atividade inflamatória da doença. Isto A Figura 7 representa o fluxograma sobre
porque, estudos demonstraram a relação direta a avaliação da resposta à DMD e as possíveis
com o grau de atividade da doença nos primeiros condutas subsequentes, de acordo com o protocolo
anos com o grau de incapacidades e progressão brasileiro71. Para os americanos e europeus75,76, a
tardios 77-79
. Estes dados sugerem a existência de troca medicamentosa pode ser considerada, após 12
uma “janela de oportunidade” no início da doença, a meses do início da medicação, quando há um ou mais
qual, se bem manejada, pode refletir em um melhor surtos neste período, ou em casos de surgimento de
prognóstico no futuro. A Figura 6 ilustra o fluxograma duas ou mais lesões novas detectadas em estudo de
de opções medicamentosas conforme o guideline RM, ou ainda aumento do grau de incapacidade no
brasileiro, de acordo com o fenótipo da doença. exame físico (através do EDSS).
Vale enfatizar que o trabalho considera CIS de alto
É importante enfatizar que não há uma
risco em pacientes com RM demonstrando uma ou
única conduta a ser seguida, visto que os guidelines
mais lesões típicas em T2/FLAIR, sendo que tanto a
disponíveis apenas sugerem modificações, porém
apresentação clínica quanto a aparência das lesões
o tratamento deve ser individualizado de acordo
são sugestivas de desmielinização do SNC, e não
com o paciente e sua doença. Alguns autores
atribuíveis a outras doenças. O conceito de EM
sugerem realizar um intervalo entre uma medicação
altamente ativa já foi descrito anteriormente neste
e outra, chamado de washout, com a finalidade
capítulo.
de evitar excesso de imunossupressão e reduzir
Entretanto, no Brasil, a escolha de tratamento risco de infecção. Porém, esta conduta deve ser
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é influenciada balanceada com o risco de exacerbação, rebote
pelas regras do Protocolo Clínico e Diretrizes da doença causado por este intervalo, presente em
Terapêuticas (PCDT)80. Os fármacos de primeira usuários de natalizumabe e fingolimode. A decisão
escolha ou de plataforma, segundo o PCDT de de fazer ou não o período de washout deve levar
2019, são os imunomoduladores: os interferons, o em consideração a DMD atual e a escolha futura,
acetato de glatirâmer e a teriflunomida. Caso haja bem como o motivo da troca medicamentosa. Por
falha de algum destes citados, pode-se realizar a exemplo, em usuários de Fumarato de Dimetila que
troca por outro de plataforma ou então pelo fumarato necessitam da troca de medicação por linfopenia é
Capítulo 25 296
Figura 6: Fluxograma do Protocolo Brasileiro de Tratamento para EM: opções terapêuticas conforme o fenótipo
da doença. CIS, Síndrome Clínica Isolada; EM, Esclerose Múltipla, EMSP, Esclerose Múltipla Secundariamente
Progressiva; EMPP, Esclerose Múltipla Primariamente Progressiva.
Fonte: Adaptado de Marques et al.,201871.
Capítulo 25 297
recomendado o intervalo. Em pacientes que utilizam os riscos destas infecções, bem como que procure
teriflunomida e desenvolveram toxicidade hepática, por infecções latentes (como tuberculose, vírus
a eliminação da droga através de colestiramina JC e hepatite B), antes do início de uma DMD,
ou carvão ativado é recomendado. Na troca de principalmente de fingolimode, natalizumabe,
natalizumabe por outra DMD, não é preconizado um cladribina, alemtuzumabe e ocrelizumabe. É
intervalo maior que quatro semanas pelo risco de recomendado que as vacinas de hepatite B e do
rebote. Nas trocas de medicações injetáveis ou orais vírus varicela-zoster sejam dadas 4 a 6 semanas
de primeira linha para medicações infusionais, não é antes do início de alguma DMD, quando paciente
recomendado intervalo de washout . 84
não previamente imunizado. Todos os pacientes
devem receber a vacina anual da gripe, sendo
Monitoramento dos pacientes evitadas, durante o uso de uma DMD, apenas as
vacinas que contenham vivos-atenuados. Além
Para controle da doença e monitoramento da
disso, é importante realizar a vacinação na ausência
eficácia do tratamento, avaliações clínicas e estudos
de surto clínico e, se este estiver presente, aguardar
de RM de crânio (e caso necessário, de coluna
até resolução do episódio para vacinar87.
cervical e dorsal) são realizados, inicialmente, a cada
três meses, e após a estabilização do tratamento,
a cada 6 a 12 meses, considerando características EM na gestação
individuais 71,75,76
. A atividade da EM se reduz durante a gestação,
principalmente no último trimestre e que, nos
Os exames complementares necessários
primeiros três meses de puerpério, há um maior risco
para monitoramento de cada DMD estão expostos
de exacerbações e surtos rebotes88. Em casos de
na Tabela 3: Principalmente para os usuários de
pacientes que desejam engravidar, devem-se pesar
Natalizumabe, devemos ficar atentos a quadros de
os riscos de efeitos adversos no feto que uma DMD
leucoencefalopatia multifocal progressiva (LEMP),
pode causar e também os riscos de descontinuar o
possível efeito colateral desta DMD em pacientes
tratamento e ter um surto grave da doença. Apesar de
que são portadores do vírus JC. O risco estimado
não haver regra nestas situações, na grande maioria
de LEMP é de 4 para 1000 usuários, porém este
das pacientes, há a recomendação de interrupção da
aumenta em pacientes com índices maiores de
droga durante o planejamento ou após a descoberta
anticorpos contra o vírus (maior ou igual a 0,9, com
da gestação, sendo que, idealmente, a gestação
maior atenção para índices maiores de 1,5), bem
deve ser programada para um momento em que a
como em usuários de natalizumabe de longa data
doença está estável há pelo menos um ano. Esta
(mais de 2 anos) e previamente imunossupressos
conduta permite também uma maior segurança
por outros medicações75,85. É preconizado que
no período de washout da medicação antes da
seja realizado o controle do índice de anticorpos
gestação, além do fato que de a DMD pode ser
contra o vírus JC antes do início da medicação e
retornada assim que iniciar o período pós-parto89. Há
a cada 6 meses durante seu uso86. Em casos de
situações, principalmente aquelas em que a doença
uso de natalizumabe por mais de 2 anos ou índices
é altamente ativa, em que há maior tendência em
do anticorpo maiores que 0,9, recomenda-se a
adiar a gestação ou em manter a DMD (dependendo
realização de imagem por RM a cada 3 a 6 meses75.
de qual for), mesmo com os riscos potenciais para
Vacinação na EM o feto. Estudos realizados com interferon-β, acetato
A vacinação em pacientes com EM atua como de glatirâmer e natalizumabe demonstraram certa
auxílio para evitar doenças oportunistas preveníveis. segurança do uso destas durante a gestação, sendo
É aconselhado que seja exposto para os pacientes que, destas três opções, a única categoria B para
uso é o acetato de glatirâmer90,91. A Tabela 3 resume
Capítulo 25 298
Figura 7: Princípios gerais para avaliação do tratamento e da necessidade de troca medicamentosa. DMD, Droga
Modificadora da Doença; RM, ressonância magnética.
Fonte: Adaptado de Marques et al., 201871.
Nível de evidência de
DMD Período de washout
segurança
Capítulo 25 299
o grau de recomendação e de segurança da DMD 7. Thompson AJ, Baranzini SE, Geurts J, Hemmer
B, Ciccarelli O. Multiple sclerosis. Lancet.
durante a gestação e, também, o período de washout
2018;391(10130):1622-1636.
recomendado.
8. Baecher-Allan C, Kashow BJ, Weiner HL. Multiple
sclerosis: Mechanisms and Immunotherapy. Neuro
Na maioria dos casos, pacientes com EM
2018;97(4):742-768.
acabam optando por não amamentar, visto a
9. Absinta M, Nair G, Sati P, Cortese IC, Filippi M, Reich
necessidade de retorno imediato da medicação logo DS. Direct MRI detection of impending plaque development
após o parto. Acetato de glatirâmer e interferon-β são in multiple sclerosis. Neurol Neuroimmunol Neuroinflamm.
2015;2(5):e145.
seguros para uso durante este período. As demais
10. Franklin RJM, Goldman SA. Glia disease and repair-
DMD devem ser evitadas por falta de evidências remyelination. Cold Spring Harb Perspect Biol 2015;7(7):
para uso92. a020594.
11. Aguzzi A, Barres BA, Bennett ML. Microglia: scapegoat,
saboteur, or something else? Science 2013;339:156-161.
12. Ponath G, Park C, Pitt D. The role of astrocytes in
CONSIDERAÇÕES FINAIS multiple sclerosis. Front Immunol. 2018;9:217.
A EM apresenta-se de forma extremamente 13. Ludwin SK, Rao VTs, Moore CS, Antel JP. Astrocytes in
variada e o diagnóstico diferencial deve ser feito com multiple sclerosis. Mult Scler. 2016;22(9):1114-1124.
outras doenças inflamatórias do SNC, tal como com 14. Kutzelnigg A, Lucchinetti CF, Stadelmann C, et al.
Cortical demyelination and diffuse white matter injury in
outras doenças neurológicas que possam provocar multiple sclerosis. Brain. 2005;128(11):2705-2712.
sintomas focais como tumores, malformações e 15. Mahad DH, Trapp BD, Lassmann H. Pathological
doenças infecciosas. O diagnóstico deve ser precoce mechanisms in progressive multiple sclerosis. Lancet
Neurol. 2015;14(2):183-193.
e baseado em manifestações clínicas e achados
16. Multiple Sclerosis International Federation. Atlas of MS
de imagem por RM e a presença de BOC no LCR.
2013: mapping multiple sclerosis around the world. MSIF.
O tratamento deve ser individualizado para cada 2014.
paciente e ajustado de acordo com o monitoramento 17. Ministério da Saúde (Brasil). Secretaria de Atenção à
de segurança e resposta clínica, sempre com o Saúde. Portaria no 391, de 5 de maio de 2015. Protocolo
Clínica e Diretrizes Terapêuticas de Esclerose Múltipla.
objetivo principal de reduzir o risco de incapacidade 2015. p. 1–27.
permanente e disfunção cognitiva. 18. da Gama Pereira AB, Sampaio Lacativa MC, da Costa
Pereira FF, Papais Alvarenga RM. Prevalence of multiple
sclerosis in Brazil: A systematic review. Mult Scler Relat
Disord. 2015;4(6):572-579.
REFERÊNCIAS 19. Filippi M, Bar-Or A, Piehl F, et al. Multiple sclerosis. Nat
1. Orrel RW. Multiple sclerosis: The history of a disease. J R Rev Dis Primers. 2018;4(1):43.
Soc Med. 2005;98(6):289. 20. Yeshokumar AK, Narula S, Banwell B. Pediatric multiple
2. Nylander A, Hafler DA. Multiple sclerosis. J Clin Invest. sclerosis. Curr Opin Neurol. 2017;30(3):216-221.
2012;122(4):1180-1188. 21. Vasconcelos CCF, Thuler LCS, Rodrigues BC, Calmon
3. Kobelt G, Thompson A, Berg J, et al. New insights into AB, Alvarenga RMP. Mutiple Sclerosis in Brazil: A systematic
the burden and costs of multiple sclerosis in Europe. Mult review. Clinical Neurology and Neurosurgery. 2016;151:24-
Scler. 2017;23(8):1123-1136. 30.
4. Kobelt G, Teich V, Cavalcanti M, Canzonieri AM. 22. Belbasis L, Bellou V, Evangelou E, Ioannidis JP,
Burden and cost of multiple sclerosis in Brazil. Plos One. Tzoulaki I. Environmental risk factors and multiple sclerosis:
2019;14(1):e0208837. an umbrella review of systematic reviews and meta-
analyses. Lancet Neurol. 2015;14(3):263-273.
5. Reich DS, Lucchinetti CF, Calabresi PA. Multiple
Sclerosis. N Engl J Med 2018;378:169-80. 23. Handel AE, Williamson AI, Disanto G, Dobson
R, Giovannpni G, Ramagopalan SV. Smoking and
6. Hemmer B, Kerschensteiner M, Korn T. Role of the innate multiple sclerosis: an update meta-analysis. PLoS One
and adaptive immune responses in the course of multiple 2011;6(1):e16149.
sclerosis. Lancet Neurol. 2015;14(4):406-419.
Capítulo 25 300
24. GBD 2016 Multiple Sclerosis Collaborators. Global, 41. Hou Y, Jia Y, Hou J. Natural Course of Clinically Isolated
regional, and national burden of multiple sclerosis 1990- Syndrome: A Longitudinal Analysis Using a Markov Model.
2016: a systematic analysis for the Global Burden of Sci Rep. 2018;8(1):10857.
Disease Study 2016. Lancet Neurol 2019;18:269.
42. De Stefano N, Giorgio A, Tintoré M, et al. Radiologically
25. Simpson S Jr, Wang W, Otahal P, Blizzard L, van der isolated syndrome or subclinical multiple sclerosis:
Mei IAF, Taylor BV. Latitude continues to be significantly MAGNIMS consensus recommendations. Mult Scler.
associated with the prevalence of multiple sclerosis: an 2018;24(2):214-221.
updated meta-analysis. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
43. Okuda DT, Siva A, Kantarci O, et al. Radiologically
2019;90(11):1193-1200.
isolated syndrome: 5-year risk for an initial clinical event.
26. Mokry LE, Ross S, Ahmad OS, et al. Vitamin D and Risk PLoS One. 2014;9(3):e90509.
of Multiple Sclerosis: A Mendelian Randomization Study.
44. Miller DH, Chard DT, Ciccarelli O. Clinically isolated
PLoS Med. 2015;12(8):e1001866.
syndromes. Lancet Neurol. 2012;11(2):157-69.
27. Lucas RM, Ponsonby AL, Dear K, et al. Sun exposure
45. Thompson AJ, Banwell BL, Barkhof F, et al. Diagnosis of
and vitamin D are independent risk factors for CNS
multiple sclerosis: 2017 revisions of the McDonald criteria.
demyelination. Neurology. 2011;76(6):540-548.
Lancet Neurol. 2018;17(2):162-173.
28. Munger KL, Bentzen J, Laursen B, et al. Childhood body
46. Toosy AT, Mason DF, Miller DH. Optic neuritis. Lancet
mass index and multiple sclerosis risk: a long-term cohort
Neurol. 2014;13(1):83-99.
study. Mult Scler. 2013;19(10):1323-1329.
47. Ruet A, Deloire M, Charré-Morin J, Hamel D, Brochet B.
29. Mielcarz DW, Kasper LH. The gut microbiome in multiple
Cognitive impairment differs between primary progressive
sclerosis. Curr Treat Options Neurol. 2015;17(4):344.
and relapsing-remitting MS. Neurology. 2013;80(16):1501-
30. Olsson T, Barcellos LF, Alfredsson L. Interactions 1508.
between genetic, lifestyle and environmental risk factors for
48. DasGupta R, Fowler CJ. Bladder, bowel and sexual
multiple sclerosis. Nat Rev Neurol. 2017;13(1):25-36.
dysfunction in multiple sclerosis: management strategies.
31. Patsopoulos NA, De Jager PL. Genetic and gene Drugs. 2003;63(2):153-166.
expression signatures in multiple sclerosis. Mult Scler.
49. Guimarães J, Sá MJ. Cognitive dysfunction in multiple
2020;26(5):576-581.
sclerosis. Front Neurol. 2012;3:74.
32. Patsopoulos NA, Barcellos LF, Hintzen RQ, et al.
50. Oset M, Stasiolek M, Matysiak M. Cognitive Dysfunction
Fine-mapping the genetic association of the major
in the Early Stages of Multiple Sclerosis-How Much and
histocompatibility complex in multiple sclerosis: HLA and
How Important? Curr Neurol Neurosci Rep. 2020;20(7):22.
non-HLA effects. PLoS Genet. 2013;9(11):e1003926.
51. Deloire MS, Salort E, Bonnet M, et al. Cognitive
33. International Multiple Sclerosis Genetics Consortium,
impairment as marker of diffuse brain abnormalities in early
Hafler DA, Compston A, et al. Risk alleles for multiple
relapsing remitting multiple sclerosis. J Neurol Neurosurg
sclerosis identified by a genomewide study. N Engl J Med.
Psychiatry. 2005;76(4):519-526.
2007;357(9):851-62.
52. Filippi M, Rocca MA, Benedict RH, et al. The
34. Baranzini SE, Oksenberg JR. The Genetics of Multiple
contribution of MRI in assessing cognitive impairment in
Sclerosis: From 0 to 200 in 50 Years. Trends Genet.
multiple sclerosis. Neurology. 2010;75(23):2121-2128.
2017;33(12):960-970.
53. Rocca MA, Amato MP, De Stefano N, et al. Clinical and
35. Sawcer S, Franklin RJ, Ban M. Multiple sclerosis
imaging assessment of cognitive dysfunction in multiple
genetics. Lancet Neurol. 2014;13(7):700-709.
sclerosis. Lancet Neurol. 2015;14(3):302-317.
36. Brownlee WJ, Hardy TA, Fazekas F, Miller DH.
54. Patten SB, Marrie RA, Carta MG. Depression in multiple
Diagnosis of multiple sclerosis: progress and challenges.
sclerosis. Int Rev psychiatry. 2017;29:463-472.
Lancet. 2017;389(10076):1336-1346.
55. Ayache SS, Chalah MA. Fatigue in multiple sclerosis
37. McDonald WI. Relapse, remission, and progression in
– Insights into evaluation and management. Clin
multiple sclerosis. N Engl J Med. 2000;343(20):1486-1487.
Neurophysiology. 2017;47:139-171.
38. Lublin FD, Reingold SC. Defining the clinical course of
56. Braley TJ, Segal BM, Chervin RD. Hypnotic use and
multiple sclerosis: results of an international survey. National
fatigue in multiple sclerosis. Sleep med. 2015;16(1):131-
Multiple Sclerosis Society (USA) Advisory Committee
137.
on Clinical Trials of New Agents in Multiple Sclerosis.
Neurology. 1996;46(4):907-911. 57. Rizzo MA, Hadjiminchael OC, Preiningerova J, Vollmer
TL. Prevalence and treatment of spasticity reported by
39. Rice CM, Cottrell D, Wilkins A, Scolding NJ. Primary
multiple sclerosis patients. Mult Scler. 2004;10(5):589-595.
progressive multiple sclerosis: progress and challenges. J
Neurol Neurosurg Psychiatry. 2013;84(10):1100-1106. 58. Drulovic J, Basic-Kes V, Grgic S, et al. The Prevalence
of Pain in Adults with Multiple Sclerosis: A Multicenter
40. Lublin FD, Reingold SC, Cohen JA, et al. Defining the
Cross-Sectional Survey. Pain Med. 2015;16(8):1597-1602.
clinical course of multiple sclerosis: the 2013 revisions.
Neurology. 2014;83(3):278-286.
Capítulo 25 301
59. Lew-Starowicz M, Gianotten WL. Sexual dysfunction 75. TIMSS Group. Interferon beta-lb is effective in
in patients with multiple sclerosis. Handb Clin Neurol. relapsing-remitting-multiple sclerosis. I. Clinical results of a
2015;130:357-370. multicenter, randomized, double-blind, placebo-controlled
trial. Neurology. 1993;43:655–666.
60. Veauthier C, Paul F. Sleep disorders in multiple sclerosis
and their relationship to fatigue. Sleep Med. 2014;15:5-14. 76. Montalban X, Hauser SL, Kappos L, et al. Ocrelizumab
versus placebo in primary progressive multiple sclerosis. N
61. Thompson AJ, Banwell BL, Barkhof F, et al. Diagnosis of
Engl J Med. 2017;376:209–220.
multiple sclerosis: 2017 revisions of the McDonald criteria.
Lancet Neurol. 2018;17(2):162-173. 77. Jacobs LD, Cookfair DL, Rudick RA, et al. Intramuscular
interferon beta-1a for disease progression in relapsing
62. Filippi M, Preziosa P, Banwell BL, et al. Assessment
multiple sclerosis. The Multiple Sclerosis Collaborative
of lesions on magnetic resonance imaging in multiple
Research Group (MSCRG). Ann Neurol. 1996;39(3):285-
sclerosis: practical guidelines. Brain. 2019;142(7):1858-
294.
1875.
78. PRISMS (Prevention of Relapses and Disability by
63. Bot JC, Barkhof F, Polman CH, et al. Spinal cord
Interferon β-1ª Subcutaneously in Multiple Sclerosis) Study
abnormalities in recently diagnosed MS patients:
Group. Randomised double-blind placebo-controlled study
added value of spinal MRI examination. Neurology.
of interferon β-1a in relapsing/remitting multiple sclerosis.
2004;62(2):226-233.
Lancet. 1998;352(9139):1498-1504.
64. Wildner P, Stasiolek M, Matysiak M, Differential
79. Comi G, De Stefano N, Freedman MS, et al.
diagnosis of multiple sclerosis and other inflammatory CNS
Comparison of two dosing frequencies of subcutaneous
disease. Mult Scler Rel Dis. 2020;37:101452.
interferon beta-1a in patients with a first clinical
65. Dos Passos GR, Oliveira LM, da Costa BK, et al. MOG- demyelinating event suggestive of multiple sclerosis
IgG-Associated Optic Neuritis, Encephalitis, and Myelitis: (REFLEX): a phase 3 randomised controlled trial. Lancet
Lessons Learned From Neuromyelitis Optica Spectrum Neurol. 2012;11(1):33-41.
Disorder. Front Neurol. 2018;9:217.
80. The IFNB Multiple Sclerosis Study Group. Interferon
66. Kurtzke JF. Rating neurologic impairment in multiple beta-1b is effective in relapsing-remitting multiple sclerosis.
sclerosis: an expanded disability status scale (EDSS). I. Clinical results of a multicenter, randomized, double-blind,
Neurology. 1983;33, 1444–1452. placebo controlled trial. Neurology. 1993;43(4):655-661.
67. Tremlett H, Paty D, Debonshire V. Disability progression 81. Comi G, Martinelli V, Rodegher M, et al. Effect of
in multiple sclerosis is slower than previouly reported. glatiramer acetate on conversion to clinically definite
Neurology. 2006;66(2):172. multiple sclerosis in patients with clinically isolated
syndrome (PreCISe study): a randomised, double-blind,
68. Runmarker B, Andersen O. Prognostic factors in a
placebo-controlled trial. Lancet. 2009;374(9700):1503-1511.
multiple sclerosis incidence cohort with twenty-five years of
follow-up. Brain. 1993;116(1):117. 82. Fox RJ, Miller DH, Phillips JT, et al. Placebo-controlled
phase 3 study of oral BG-12 or glatiramer in multiple
69. Oreja-Guevara C, Blanco TA, Ruiz LB, Pérez MAH,
sclerosis. N Engl J Med. 2012;367(12):1087-1097.
Meca-Lallana V, Ramió-Torrentà L. Cognitive dysfunctions
and assessments in multiple sclerosis. Front Neurol. 83. O’Connor P, Wolinsky JS, Confavreux C, et al.
2019;10:581. Randomized trial of oral teriflunomide for relapsing multiple
sclerosis. N Engl J Med. 2011;365(14):1293-1303.
70. Kim S, Zemon V, Rath JF, Picone M, Gromisch
ES, Glubo H, et al. Screening Instruments for the Early 84. Confavreux C, O’Connor P, Comi G, et al. Oral
Detection of Cognitive Impairment in Patients with Multiple teriflunomide for patients with relapsing multiple sclerosis
Sclerosis. Int J MS Care. 2017;19(1):1-10. (TOWER): a randomised, double-blind, placebo-controlled,
phase 3 trial. Lancet Neurol. 2014;13(3):247-256.
71. Pittock SJ, McClelland RL, Mayr WT, Jorgensen NW,
Weinshenker BG, Noseworthy J. Clinical implications of 85. Kappos L, Radue EW, O’Connor P, et al. A placebo-
benign multiple sclerosis: a 20-year population-based controlled trial of oral fingolimod in relapsing multiple
follow-up study. Ann Neurol. 2004;56(2):303. sclerosis. N Engl J Med. 2010;362(5):387-401.
72. Díaz C, Zarco LA, Rivera DM. Highly active multiple 86. Calabresi PA, Radue EW, Goodin D, et al. Safety and
sclerosis: an update. Mult Scl Rel Dis. 2019;30:215-224. efficacy of fingolimod in patients with relapsingremitting
multiple sclerosis (FREEDOMS II): a double-blind,
73. Marques VD, dos Passos GR, Mendes MF, et al.
randomised, placebo-controlled, phase 3 trial. Lancet
Brazilian consensus for the treatment of Multiple Sclerosis:
Neurol. 2014;13(6):545-556.
Brazilian Academy of Neurology and Brazilian Committee
on Treatment and Research in Multiple Sclerosis. Arq 87. Polman CH, O’Connor PW, Havrdova E, et al. A
Neuropsiquiatr. 2018;76(8):539-554. randomized, placebo-controlled trial of natalizumab for
relapsing multiple sclerosis. N Engl J Med. 2006;354(9):899-
74. Scalfari A, Knappertz V, Cutter G, Goodin DS, Ashton
910.
R, Ebers GC. Mortality in patients with multiple sclerosis.
Neurology. 2013;81:184-192. 88. Giovannoni G, Comi G, Cook S, et al. A placebo-
controlled rial of oral cladribine for relapsing multiple
sclerosis. N Engl J Med. 2010;362(5):416-426.
Capítulo 25 302
89. Coles AJ, Twyman CL, Arnold DL, et al. Alemtuzumab 101. Bhargava P, Cassard S, Steele SU, et al. The vitamin
for patients with relapsing multiple sclerosis after D to ameliorate multiple sclerosis (VIDAMS) trial: study
diseasemodifying therapy: a randomised controlled phase 3 design for a multicenter, randomized, double-blind controlled
trial. Lancet. 2012;380(9856):1829-1839. trial of vitamin D in multiple sclerosis. Contemp Clin Trials
2014;39(2):288-293.
90. Cohen JA, Coles AJ, Arnold DL, et al. Alemtuzumab
versus interferon beta 1ª as first-line treatment for patients 102. Gross RH, John R, Corboy MD. Monitoring, Switching,
with relapsing-remitting multiple sclerosis: a randomised and Stopping Multiple Sclerosis Disease-Modifying
controlled phase 3 trial. Lancet. 2012;380(9856):1819-1828. Therapies. Continuum. 2019;25(3):715-735.
91. Hauser SL, Bar-Or A, Comi G, et al. Ocrelizumab versus 103. Treadaway K, Cutter G, Salter A, et al. Factors that
Interferon Beta-1a in relapsing multiple sclerosis. N Engl J influence adherence with diseasemodifying therapy in MS. J
Med. 2017;376(3):221-234. Neurol. 2009;256:568–576.
92. Montalban X, Hauser SL, Kappos L, et al. Ocrelizumab 104. Vargas DL, Tyor WR. Update on disease-modifying
versus Placebo in Primary Progressive Multiple Sclerosis. N therapies for multople sclerosis. J investig Med.
Engl J Med. 2017;376(3):209-220. 2017;65:883-891.
93. Rae-Grant A, Day GS, Marrie RA, et al. Pratice 105. Farez MF, Correale J, Armstrong MJ, et al. Practice
guideline recommendations summary: Disease-modifying guideline update summary: Vaccine-preventable infections
therapies for adults with multiple sclerosis. Neurology and immunization in multiple sclerosis: Report of the
2018;90(17):777-788. Guideline Development, Dissemination, and Implementation
Subcommittee of the American Academy of Neurology.
94. Montalban X, Gold R, Thompson AJ, et al. ECTRIMS/
Neurology. 2019;93(13):584-594.
EAN Guideline on the pharmacological treatment of people
with multiple sclerosis. Mult Scler 2018;24(2):96-120. 106. Confavreux C, Hutchinson M, Hours MM, Cortinovis-
Tourniaire P, Moreau T. Rate of pregnancy-related relapse in
95. Scalfari A, Neuhaus A, Degenhardt A, et al. The
multiple sclerosis. Pregnancy in Multiple Sclerosis Group. N
natural history of multiple sclerosis: a geographically
Engl J Med. 1998;339(5):285-291.
based study 10: relapses and long-term disability. Brain.
2010;133(7):1914-1929. 107. Freedman MS, Devonshire V, Duquette P, et al.
Treatment Optimization in Multiple Sclerosis: Canadian
96. Hirst C, Ingram G, Pearson O, Pickersgill T, Scolding N,
MS Working Group Recommendations. Can J Neurol Sci.
Robertson N. Contribution of relapses to disability in multiple
2020;47(4):437-455.
sclerosis. J Neurol. 2008;255(2):280-287.
108. Lu E, Wang BW, Guimond C, Synnes A, Sadovnick
97. Vercellino M, Romagnolo A, Mattioda A, et al.
D, Tremlett H. Disease-modifying drugs for multiple
Multiple sclerosis relapses: a multivariable analysis of
sclerosis in pregnancy: a systematic review. Neurology.
residual disability determinants. Acta Neurol Scand.
2012;79(11):1130-1135.
2009;119(2):126-130.
109. Coyle PK. Multiple Sclerosis and Pregnancy
98. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias
Prescriptions. Exp Op Drug Saf. 2014;13(12):1565-1568.
no SUS (CONITEC). Protocolo Clínico e Diretrizes
Terapêuticas–Esclerose Múltipla. Ministério da Saúde, 110. Langer-Gould AM. Pregnancy and Family Planning in
2019;455. Multiple Sclerosis. Continuum 2019;25(3):773-792.
99. Stein MS, Liu Y, Gray OM, et al. A randomized trial
of high-dose vitamin D2 in relapsing-remitting multiple
sclerosis. Neurology. 2011;77(17):1611-1618.
100. Kampman MT, Steffensen LH, Mellgren SI, Jørgensen
L. Effect of vitamin D3 supplementation on relapses,
disease progression, and measures of function in persons
with multiple sclerosis: exploratory outcomes from a
double-blind randomised controlled trial. Mult Scler.
2012;18(8):1144-1151.
Capítulo 25 303
CAPÍTULO 26
NEUROMIELITE ÓPTICA
Capítulo 26 304
20/60) dependendo do estudo, cerca de 11% dos visível neurite retrobulbar, observada através de
pacientes com neurite óptica apresentam AV de um hipersinal em T1 com saturação de gordura
20/20 . Os escotomas costumam ser centrais, mas
6
com impregnação de contraste na fase aguda. Nas
diversas outras formas são possíveis. sequências baseadas em T2 existe a presença
de hiperintensidade do nervo afetado. Exames
Dor ocular, geralmente leve que piora com a
mais específicos que podem ser úteis: perimetria
movimentação ocular, ocorre em aproximadamente
computadorizada, teste de cores (tabela de Ishihara,
90% dos casos (inflamação da bainha do NO no
d15 Farnsworth ou tabela de HRR- Hardy-Rand-
ápice orbitário onde há proximidade dos músculos
Rittler), punção lombar, potencial evocado visual por
extraoculares)7.
padrão reverso (PEV-PR), tomografia de coerência
Existe, também, a alteração do reflexo óptica (OCT) e raio-X de tórax9-11.
fotomotor: reflexo fotomotor reduzido ou abolido,
Dentre os principais diagnósticos diferenciais
reflexo consensual preservado e presença de
estão: neuropatia óptica isquêmica (geralmente
defeito pupilar aferente relativo (DPAR) (um sinal
indolor e ocorre em pacientes com mais de 50 anos);
de anomalia unilateral na via aferente do reflexo
oclusão vascular retiniana (fundoscopia apresenta
pupilar).
lesões características); síndromes compressivas; e
Presença ou relato do fenômeno de Uhthoff doenças infecciosas.
(ocorre em alguns processos desmielinizantes,
quando o aumento da temperatura corporal leva à
Prognóstico
piora da sintomatologia). Paciente pode queixar-se
O prognóstico a longo prazo da neurite óptica
de piora dos sintomas após exercícios físicos, por
típica permanece bom, aproximadamente 90%
exemplo8.
dos pacientes se recuperam com AV de 20/40 ou
melhoram em 6 meses, independentemente do
Diagnóstico
uso de corticoesteroides. Embora a recuperação
O diagnóstico é baseado predominantemente
da AV seja a regra, pequenas sequelas visuais são
na história e características clínicas. Os exames que
comuns como a discromatopsia, perda do contraste
auxiliam no diagnóstico consistem em:
visual, escotomas, resposta pupilar deficiente,
• exame oftalmológico completo com ênfase alterações da papila da fundoscopia, PEV-PR e
em: teste de AV, teste do reflexo fotomo- OCT persistentemente alterado8. A neurite óptica
tor com a técnica da iluminação alternada associada a NMO possui pior prognóstico e necessita
rápida, com transiluminador adaptado ao de pronto atendimento para evitar sequela grave.
cabo do oftalmoscópico direito, ou na au-
sência deste, com a luz do oftalmoscópico Frequentemente, os casos são episódios
direto, para detectar o DPAR em casos de isolados, entretanto, aqueles associados a EM
neurite retrobulbar assimétrica (que afeta costumam ser recorrentes e sem o manejo
mais um dos olhos). adequado podem deixar déficits visuais sequelares
progressivos e atrofia óptica, detectada à fundoscopia
• oftalmoscopia direta: em 2/3 dos casos, a
papila é normal (neurite retrobulbar) e em pela palidez, especialmente na sua porção temporal,
1/3 há edema de disco óptico e hiperemia7. que se desenvolve de 4 a 6 semanas8.
Capítulo 26 305
uma RM de crânio contrastada com gadolínio. O sequelas podem permanecer como palidez papilar.
tratamento vai depender da associação ou não Na perimetria computadorizada, geralmente, nota-
com EM ou presença de sinais de risco para seu se escotoma altitudinal.
desenvolvimento (Quadro 1).
Manejo
Não existe tratamento estabelecido para
NEUROPATIA ÓPTICA ISQUÊMICA
NOIA-NA. Entretanto, os pontos mais relevantes
É a isquemia do nervo óptico (NOI), é a
no manejo são: distinguir o quadro de uma NOIA-A,
neuropatia óptica aguda mais comum em pacientes
detectar e controlar os riscos vasculares em caso de
idosos, é causada pela redução do fluxo sanguíneo
NOIA-NA. Algumas sugestões estão apresentadas
nos vasos que suprem a parte anterior do NO
no Quadro 2:
(NOIA), cursa com edema de papila ou posterior
(NOIP), sem edema de papila, sendo esta última
Neuropatia óptica isquêmica anterior
rara, relacionada à anemia e hipotensão severas
arterítica (NOIA-A)
que revertidas podem levar a melhora do quadro.
Quadro mais raro de NOIA (5%),
A NOIA corresponde a 90% dos casos de frequentemente secundário a uma vasculite,
neurite óptica isquêmica, divide-se em duas formas: geralmente afeta pacientes com > 60 anos, em
NOIA não arterítica (NOIA-NA) e a NOIA arterítica conjunto com a arterite temporal ou arterite de
(NOIA-A) .14
células gigantes12.
Neuropatia óptica isquêmica anterior não No quadro clínico típico, o paciente relata
arterítica (NOIA-NA) BAV súbita unilateral e indolor e grave (60 % dos
Quadro mais comum, acomete geralmente casos pior que 20/200). Diplopia transitória ou
pessoas entre 45 a 65 anos. Não possui causas permanente (devido a isquemia nervosa ou dos
identificadas, alguns fatores associados são diabetes, músculos extrínsecos do olho) pode preceder a
hipertensão, presença de hipotensão noturna, BAV em até 10% dos pacientes1. A fundoscopia
apneia do sono, cirurgias e traumas com hipotensão geralmente mostra um edema de disco óptico pálido
prolongada . Medicamentos relacionados são a
2 e hemorragias peripapilares ou palidez papilar.
amiodarona, vasoconstritores (descongestionante Por acometer pacientes com vasculites
nasal), drogas para disfunção erétil, alfa interferon sistêmicas, pode apresentar associado:
e sumatriptana. emagrecimento, astenia, dor no pescoço ou couro
No quadro clínico típico o paciente queixa- cabeludo, claudicação de mandíbula, febre, nódulos
se de BAV súbita, unilateral, indolor, geralmente temporais dolorosos ou episódios prévios de
ao acordar. Ao exame físico, nota-se também a amaurose fugaz. No entanto, muitos pacientes não
presença do DPAR e papila contralateral congesta os apresentam (forma oculta em 20 % dos casos),
(sem escavação). sendo obrigatória a triagem com exames laboratoriais
para vasculites em pacientes com NOIA2.
A fundoscopia geralmente mostra um
edema de disco óptico segmentar e hemorragias
Conduta
peripapilares. Os exames de imagem geralmente
É uma urgência oftalmológica, deve ser
estão normais, a RM de órbitas contrastada e com
tratada imediatamente, pois pode evoluir em poucos
saturação de gordura pode auxiliar a excluir outras
dias com acometimento ocular contralateral e/ou do
causas de BAV. Após algumas semanas do episódio,
sistema nervoso central se não tratada (Quadro 3).
geralmente, há resolução do edema, mas algumas
Capítulo 26 306
Pulsoterapia • nos casos de neurite óptica, a pulsoterapia com metilprednisolona intravenosa
(IV) acelera a recuperação da função visual no curto prazo, em especial de campo
visual, sensibilidade do contraste e visão das cores. Entretanto, a pulsoterapia a
longo prazo (6 meses após o episódio) não parece influenciar na função visual
final ou na formação de atrofia do NO. Corticosteroides via oral (VO) isolados não
são recomendados, pois mostraram aumentar a recorrência da neurite óptica nos
primeiros 2 anos11.
• o esquema para os pacientes com neurite óptica idiopática, com nenhuma
ou menos de duas lesões na RM central baseia-se em pulsoterapia com
metilprednisolona IV 1000 mg, em dose única, por 3 a 5 dias seguida de
prednisona 1 mg/kg por dia por 11 dias.
• nos pacientes pediátricos, a pulsoterapia direciona-se para casos mais reservados
como os com presença de baixa de AV severa ou acometimento bilateral 11.
Orientação • orientação quanto ao prognóstico visual: a visão pode oscilar, melhorando ou piorando
pouco nos primeiros 6 meses após o episódio 2. A recorrência de NOIA-NA no mesmo
olho é menor do que 5%. O risco em 5 anos de acometimento bilateral gira em torno
de 12-15%14
Capítulo 26 307
Se não tratada o quadro se torna bilateral na papila ou região peripapilar. Outras ferramentas
em dias/semanas em pelo menos 50% dos casos. que auxiliam no diagnóstico do papiledema
Apesar de eficaz em impedir o acometimento no são: perimetria computadorizada, retinografia,
olho não afetado, os glicocorticoides geralmente não angiofluoresceinografia, OCT, neuroimagem e
revertem a perda visual existente no olho afetado .14
punção lombar.
Capítulo 26 308
NOIA-A • os exames laboratoriais de velocidade de hemossedimentação (VHS), nível de proteína C reativa
(PCR), hemograma completo com contagem de plaquetas e fibrinogênio.
• internação e pulsoterapia com metilprednisolona, 1 g/dia intravenoso (IV) por 3 dias, seguida de
corticoterapia oral guiada pelos sintomas e marcadores inflamatórios 2.
• a prednisona via oral (VO), se for usado em monoterapia, recomenda-se uma dosagem de 1-2 mg/kg/
dia (80-120 mg de prednisona). A terapia de manutenção nessa dosagem deve ser mantida por pelo
menos 4-6 semanas até normalização dos sintomas sistêmicos e laboratoriais, seguindo então com
o desmame adequado e acompanhamento cuidadoso dos níveis de VHS e PCR. Regimes em dias
alternados não são recomendados, pois foram associados a um efeito rebote da arterite. Recorrência
dos sintomas ou aumento dos níveis de VHS e PCR ocorrem em aproximadamente metade do
pacientes no desmame, nesses casos deve ser considerado retornar a dose do corticosteroide anterior
a última redução 15
• controle de comorbidades clínicas e efeitos colaterais dos glicocorticoides
• a biopsia da artéria temporal é padrão-ouro para o diagnóstico: deve ser realizada para confirmação
diagnóstica, preferencialmente nos primeiros 3 dias do início do tratamento 2. A arterite temporal é
muito responsiva aos glicocorticoides, com imediata redução de sintomas como cefaleia, dor em couro
cabeludo, astenia, febre e mialgia
Orientação • orientação quanto ao prognóstico visual: apenas 4-15% dos pacientes com NOIA-A têm melhora
na função visual com a terapia. Quando ocorre, há melhora na acuidade visual, mas presença e
persistência de severos defeitos no campo visual 15
Quadro 3: Manejo da neuropatia óptica isquêmica anterior arterítica.
Fonte: Baseado em Martins et al., 20162; e, Rucker et al., 200415.
Figura 1: A. fundoscopia apresentando papiledema de olho direito (paciente 1). B. fundoscopia normal de olho esquerdo
(paciente 2).
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 309
o alívio dos sintomas e preservação da visão. HII doenças (por exemplo, glaucoma), mas ainda
secundária a massas intracranianas, malformação apresenta limitações quando se trata de doenças
de Chiari ou hidrocefalia são tipicamente tratadas neurológicas18.
cirurgicamente. Na ausência de lesões cirúrgicas,
Quanto à clínica, vale ressaltar, que a
os pacientes devem ser submetidos ao screening
percepção do paciente quanto à própria alteração
de causas secundárias e tratados de acordo.
do CV dependerá da característica e nível do déficit,
Medicações como causa da HII devem ser
perdas progressivas e lentas podem, por exemplo,
adequadamente descontinuadas, sempre que
passar despercebidas pelo paciente.
possível, e com acompanhamento do especialista.
O ponto crucial da análise do CV é determinar
Pacientes com papiledema mínimo, sem perda
se a lesão está antes, depois ou no quiasma óptico.
visual e sem outros sintomas podem se beneficiar de
A RM é essencial para estabelecer a causa da
tratamento conservador e monitorização frequente
maioria dos déficits de CV12. Embora a campimetria
de possível perda visual ou novos sintomas.
detalhada possa sugerir uma localização específica,
em muitos casos, a imagem serve para estabelecer
se a lesão responsável é vascular, neoplásica ou
ALTERAÇÕES DE CAMPO VISUAL inflamatória19.
Introdução
Campimetria de confrontação
O exame do campo visual (CV) é fundamental
na abordagem de distúrbios neurológicos que É a técnica recomendada na sala de
corresponde a uma área no espaço que o olho imóvel concentração e em crianças. Este exame com
percebe durante a fixação central17. A visão pode ser examinadores treinados, é uma técnica simples,
afetada por acometimento em qualquer ponto do rápida e que deve fazer parte da rotina dos exames
sistema visual, dos olhos aos lobos occipitais. oftalmológico e neurológico. O CV de confrontação
é um teste de triagem e os pacientes na medida do
O diagnóstico e a topografia da lesão se dão a
possível, devem ser submetidos posteriormente a
partir do padrão, evolução e severidade dos defeitos
outros tipos de perimetria. Na realização do exame,
apresentados. A perimetria é útil, então, para
o paciente deve ficar sentado, aproximadamente
detectar, quantificar e acompanhar os déficits do
a 1 metro do examinador, mesmo nível, devendo
CV. Dentre as principais modalidades de perimetria
fechar um dos olhos e orientar para que o paciente
estão a de confrontação, a computadorizada e a
fixe no olho não-ocluso ou no nariz do examinador
manual.
(por exemplo, ao avaliar o CV do olho esquerdo
O exame de confrontação tem considerável do paciente, cobre-se o olho direito deste que fixa
acurácia em determinar a topografia anatômica da no olho direito do examinador). O estímulo a ser
lesão, é o exame que o neurologista pode fazer no apresentado deve estar na metade da distância entre
leito do paciente e a forma ideal de sua testagem o examinador e o paciente. Por convenção inicia-se
é avaliar cada olho separadamente. A perimetria pelo olho direito, mas na prática inicia-se pelo olho
manual no campímetro de Goldmann é útil em de melhor visão. O paciente é questionado como
avaliar o CV central e periférico .
17
vê a face do examinador. Nessa etapa do exame é
possível detectar defeitos dos CV central, altitudinal
A perimetria computadorizada tornou-se
ou hemianopsia; por exemplo: se ao fixar no nariz
padrão-ouro na avaliação do CV na última década,
o paciente consegue ver somente a parte superior
em especial, pela menor exigência técnica e
da face, provavelmente apresenta um defeito
praticamente se equivale a manual em determinadas
Capítulo 26 310
Farmacoterapia, perda de • a farmacoterapia, perda de peso e dieta hipossódica são a primeira linha de
peso e dieta hipossódica tratamento clínico da HII16
• perda de peso: pode isoladamente normalizar a pressão liquórica, se atingida
é a melhor terapia a longo prazo. Uma perda de 5 a 10% da massa corpórea
total já é suficiente para melhora dos sinais e sintomas16
Inibidores da anidrase • tratamento com inibidores da anidrase carbônica, como a acetazolamida, reduz
carbônica a produção de LCR e consequentemente a pressão intracraniana (PIC). O
esquema de acetazolamida via oral (VO) inicia-se com 500 mg de 12 em 12h,
se não houver contraindicação (em alguns casos pode-se iniciar com 1x/dia e ir
aumentando para minimizar os efeitos colaterais), aumentando até uma média
de 2g/dia
• se o esquema com acetazolamida não for tolerado pode-se recorrer a um
tratamento de segunda linha com furosemida (fraco inibidor da anidrase
carbônica) na dosagem de 20 mg de 12 em 12h, ajustando a dose até uma
média de 40 mg 3x/dia16
• se a acetazolamida e perda de peso falharem e a perda visual for progressiva,
uma derivação ventricular ou fenestração da bainha do nervo óptico deve ser
realizada o mais breve possível para evitar amaurose2
• topiramato não é primeira linha de tratamento, mas vem mostrando benefícios
similares ao da acetazolamida na redução da PIC. Tem eventos adversos
diferentes da acetazolamida, podendo ser útil em pacientes intolerantes. Uma
grande vantagem é o efeito de perda de peso associado ao seu uso16
Quadro 4: Manejo do paciente com papiledema.
Fonte: Baseado em Martins et al., 20162 e;, Rigi et al., 201516.
Capítulo 26 311
altitudinal inferior. O examinador pode usar vários da retina (por exemplo, retinose pigmentosa),
tipos de estímulos, tais como os dedos, abaixador maculopatias hereditárias ou adquiridas e
de língua com marca e cores na sua extremidade, descolamento de retina.
tampas de colírios e pequenos brinquedos. O CV
de confrontação deve ser realizado nos quatro
quadrantes, incluindo o hemicampo superior e inferior Lesões de Nervo óptico
ao longo do meridiano horizontal e hemicampo nasal
Produzem padrões característicos de perda
e temporal ao longo do meridiano vertical, bem como
de CV. Danos ao polo superior ou inferior do NO,
dos campos visuais central e periférico. No exame do
por exemplo, levam a escotomas altitudinais, típicos
CV periférico o examinador apresenta um estímulo
de neuropatias ópticas isquêmicas, podendo ocorrer
simples, que move fora dos limites do campo em
também em oclusão vascular retiniana, glaucoma
direção à fixação, até o ponto em que o paciente
avançado e neurite óptica. Nos casos de papiledema
detecte o estímulo. Isso é repetido em todas direções
ocorre um aumento da espessura da camada de
para gerar uma isóptera periférica. Em muitas
fibras nervosas ao redor do disco óptico podendo
situações o teste de confrontação duplo simultâneo,
levar a um aumento da mancha cega.
que é realizado apresentando um estímulo (dedos)
de forma estática ou dinâmica entre os hemicampos, Lesões na porção pré-quiasmática (por
criança podem ser usados fantoches ou pedir para geram escotoma cecocentral ipsilateral e uma
que esta imite os dedos, quando ela percebe o quadrantopsia superior contralateral à lesão (Figura
estímulo, olha em direção a este, sendo possível 2, item 3). Esta alteração é um importante sinal de
de confrontação é a sua simplicidade, flexibilidade conhecida, também, como síndrome do nervo óptico
Capítulo 26 312
Figura 2: Local das lesões nas vias ópticas e tipos de defeitos campimétricos. 1: lesão no disco óptico esquerdo e
aumento da mancha cega no CV em olho esquerdo (OE); 2: NO direito e escotoma cecocentral no CV de olho direito
(OD); 3: NO esquerdo pré-quiasmático com escotoma juncional (escotoma cecocentral no CV de OD e pequeno defeito
temporal superior no CV do OE); 4: quiasma com hemianopsia (cegueira de metade do CV em um ou ambos os olhos)
– bitemporal; 5: trato óptico esquerdo e hemianopsia homônima não-congruente direita; 6: trato óptico posterior direito e
hemianopsia homônima esquerda; 7: lobo temporal esquerdo e quadrantopsia superior direita; 8: lobo parietal esquerdo
e hemianopsia homônima direita; 9: lobo occipital direito e hemianopsia homônima esquerda com preservação macular;
10: fissura calcarina anterior direita e abolição da crescente temporal esquerda; e 11: ponta do lobo occipital esquerdo e
escotoma hemianópico homônimo direito.
Fonte: Sato, 2013 17.
Capítulo 26 313
meningioma, aneurismas volumosos do
Lesões pós-quiasmáticas
seio cavernoso e lesões quiasmáticas in-
trínsecas, resultam em uma hemianopsia Lesões pós quiasmáticas são difíceis de se
bitemporal19; localizar precisamente, pois lesão em qualquer
segmento podem levar à hemianopsia homônima
• a compressão inferior do quiasma, geral-
(trato óptico, corpo geniculado lateral, radiações
mente por macroadenoma hipofisário, fre-
ópticas ou córtex visual).
quentemente leva a uma quadrantopsia
bitemporal superior19;
Figura 3: A. olho esquerdo. B. olho direito. A-B. campo visual computadorizado mostrando hemianopsia homônima à
esquerda. C. tomografia computadorizada de crânio mostrando malformação vascular em lobo temporal e parietal à
direita.
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 314
está, frequentemente, associada à oclu-
são da artéria cerebral posterior cursan-
Trato óptico do com uma hemianopsia homônima que
poupa a região macular (córtex responsá-
• trato óptico recebe a aferência do CV con- vel pela mácula geralmente é suprido por
tralateral, ou seja, o trato óptico direito re- colaterais da artéria cerebral média) (Fi-
cebe a aferência do CV esquerdo (retina gura 2, item 9)12. Outras causas incluem
temporal do OD e retina nasal do OE). Le- traumatismos, tumores, abcessos e des-
sões no trato óptico são raras e ocorrem mielinização;
no traumatismo craniano, adenoma hipo-
fisário, craniofaringioma e nas malforma- • as lesões corticais dependendo de sua lo-
ções vasculares17. calização levarão a diferentes padrões de
CV. Lesão isquêmica bilateral do córtex
visual resulta em hemianopsia homônima
Corpo geniculado lateral bilateral que pode ser de dois tipos: 1. ce-
gueira cortical, o paciente não está cons-
• corpo geniculado lateral recebe a aferên- ciente da sua cegueira, é denominada de
cia do CV contralateral, ou seja, o corpo síndrome de Anton e é caracterizada por
geniculado lateral direito recebe a aferên- cegueira bilateral, reflexos pupilares nor-
cia do CV esquerdo (retina temporal do mais, fundo de olho normal, negação da
OD e retina nasal do OE). Lesões nesta cegueira e lesão occipitocortical bilateral;
estrutura são raras e geram hemianopsias e 2. visão em túnel com preservação ma-
homônimas com alta incongruência17. cular, resulta da oclusão bilateral das ar-
térias cerebrais posteriores ou infarto do
lobo occipital, mas com preservação da
ilha central da visão, o CV periférico é con-
Radiações ópticas
traído e a visão está preservada12; e
• lesões nas radiações ópticas anteriores
• outras causas de lesão occipital, como
tendem a ser incongruentes e quando se
traumatismo ou infiltração neoplásica, ten-
aproximam do córtex visual tendem a ser
dem menos a poupar seletivamente o lobo
congruentes. Uma lesão ântero-inferior da
occipital e, de forma típica, causarão uma
radiação óptica produz quadrantanopia
hemianopsia que divide a mácula19.
superior contralateral, um defeito homôni-
mo incongruente clássico, que é denomi-
nado de “pie in the sky”17;
DIPLOPIA
• uma lesão completa da radiação óptica na Diplopia ou visão dupla é um sintoma no qual
porção do lobo temporal, produz quadran- o paciente tem a percepção de duas imagens de um
tanopia superior contralateral. Em con-
mesmo objeto. A diplopia é um sintoma presente
traste, uma lesão afetando as radiações
tanto no contexto de consultório quanto de urgência/
ópticas na porção do lobo parietal produz
quadrantanopia inferior contralateral de- emergência, sua avaliação envolve conhecimentos
nominado “pie on the floor”17. de múltiplas áreas especialmente as referentes
à oftalmologia e neurologia. O sintoma pode se
referir a um erro de refração não corrigido até um
Córtex visual aneurisma intracraniano.
Capítulo 26 315
como o teste de oclusão ocular, que auxilia a IV ou VI NC.
determinar se a diplopia persiste ou não após cobrir
um dos olhos (Figura 4). Etiologias da diplopia
A diplopia monocular está presente quando Dentre as etiologias da diplopia podemos citar
apenas um olho está aberto. Diplopia binocular, os processos infecciosos, neoplásicos, metabólicos,
que ocorre com os dois olhos abertos, desaparece degenerativos, inflamatório e vasculares. Na diplopia
quando um dos olhos é fechado. binocular devemos procurar por defeito de junção
neuromuscular, restrição da musculatura extrínseca
Ou seja se a diplopia persistir durante a
dos olhos ou defeito neuronal.
oclusão de um dos olhos, o diagnóstico é de
diplopia monocular causada normalmente por A diplopia restritiva pode ser devido a massas
defeitos intrínsecos do olho (por exemplo, defeitos orbitais, miosite, infecção, doença tireoidiana
corneanos, defeito refrativo não corrigido, olho seco, e encarceramento muscular, sendo que o seu
catarata, entre outros). diagnóstico baseia-se em sinais locais do olho e
exames de imagem (Figura 5).
Se a diplopia melhorar durante a oclusão de
um dos olhos, o diagnóstico é de diplopia binocular, Na diplopia por defeito de junção neuromuscular
gerada por um desalinhamento ocular que pode temos a miastenia gravis, sendo a maior causa de
ser por defeito de junção neuromuscular, restrição diplopia, que apresenta-se de forma intermitente,
da musculatura extrínseca dos olhos ou defeito variável e não se limita a apenas um território de NC,
neuronal. as pupilas raramente são afetadas, ptose flutuante
pode estar presente. Muitos pacientes apresentam a
Pacientes com diplopia binocular de início
forma puramente ocular, sem qualquer evidência de
recente devem ser submetidos a anamnese
acometimento sistêmico.
detalhada, com ênfase em como as imagens se
separam (vertical, horizontal ou oblíqua), se piora em Se excluído o diagnóstico de miastenia gravis
determinada direção do olhar fixo ou com a fixação e restrição, a outra causa mais comum de diplopia
do olhar à distância, presença de dor, se melhora binocular é lesão dos NC que inervam a musculatura
em alguma posição da cabeça, modo de início, extrínseca do olho2. Em relação às paralisias da
duração, intermitência, variação diurna e associação musculatura ocular extrínseca, VI NC é o mais
com sistemas neurológicos ou sistêmicos, com comumente acometido, seguido do III NC e, depois,
atenção aos reflexos pupilares e à motilidade ocular do IV NC. O algoritmo para investigação da diplopia
extrínseca, buscando padrões de lesão nervosa do está exemplificado no Fluxograma 1.
III, IV ou VI nervos cranianos (NC)2.
Capítulo 26 316
Figura 4: Exame da motilidade ocular extrínseca. Direção da mirada indicada pelas setas. RS = músculo reto superior,
OI = músculo oblíquo inferior, RL = músculo reto lateral, RM = músculo reto medial, RI = músculo reto inferior, OS =
músculo oblíquo superior, III NC (nervo craniano oculomotor), IV NC (nervo craniano troclear) e VI NC (nervo craniano
abducente).
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 317
Figura 5: A. paciente apresenta hiperemia e ptose em pálpebra do olho esquerdo (OE) e restrição na supraversão e
infraversão. B. TC de crânio com olho direito (OD) normal. C. TC do crânio com espessamento do músculo reto superior
e inferior de OE.
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 318
Fluxograma 1. Esquema para investigação da diplopia.
Fonte: Adaptado de University of Calgary, 202120.
Capítulo 26 319
artéria comunicante posterior ou no topo da artéria casos. Geralmente manifesta-se em menores de 10
basilar (Figura 6). anos, acompanhada de cefaleia ipsilateral e náusea.
Capítulo 26 320
Figura 6: A. foto da mirada inferior em paciente com paralisia do III NC; ptose total de olho direito (OD), ausência
de ptose em olho esquerdo (OE); restrição de movimento de OD na supraversão, restrição de movimento de OD
na levoversão com anisocoria (pupila de OD > OE), movimentação normal na dextroversão e discreta alteração na
infraversão de OD. B. arteriografia cerebral com aneurisma sacular gigante no topo da artéria basilar.
Fonte: Os autores, 2020.
Figura 7: Paciente com paralisia do IV NC congênita à esquerda. A. movimentação ocular normal na inclinação
da cabeça à direita. B. hipertropia do olho esquerdo na inclinação da cabeça à esquerda, presença do sinal de
Bielschowsky.
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 321
Fluxograma 2. Abordagem da hipertropia ao exame físico.
Fonte: Adaptado de Prasad, 2013 19.
Figura 8: Paralisia do VI NC em olho direito (OD), movimentação normal na supra, infra e levoversão. Presença de
restrição do movimento do músculo reto lateral de OD na dextroversão.
Fonte: Os autores, 2020.
Capítulo 26 322
à paralisia completa do olhar para o lado devido Nos casos de paralisia do III NC, secundários
a fraqueza dos músculos reto lateral ipsilateral e a um aneurisma, o tratamento microcirúrgico ou
reto medial contralateral (o núcleo do VI NC possui endovascular, geralmente, permite a recuperação
interneurônios que se projetam para o subnúcleo do completa ou parcial das funções do III NC em
reto medial contralateral). semanas a meses24, 25.
Capítulo 26 323
ortotrópico na posição primária do olhar, comitantes 11. Lawton MT, Vates GE. Subarachnoid Hemorrhage.
N Engl J Med 2017; 377:257-266. doi:10.1056/
e persistentes (a mais de 12 meses). Nos pacientes
NEJMcp1605827.
em que o tratamento com prisma falhar, a modalidade
12. Hauser S, Josephson S (eds). Harrison’s Neurology
cirúrgica pode ser uma opção, sendo esta, in Clinical Medicine. 3rd Edition. McGraw-Hill Education,
geralmente, de alta complexidade, em casos em há 2013.
diversos músculos envolvidos. Em alguns pacientes 13. Horton L, Bennett JL. Acute Management
of Optic Neuritis: An Evolving Paradigm. J
a correção cirúrgica da ptose pode ser necessária. Neuroophthalmol. 2018;38(3):358-367. doi: 10.1097/
Outra opção, inclui aplicação periódica de toxina WNO.0000000000000700.
botulínica na musculatura ocular antagônica ao 14. Biousse V, Newman NJ. Ischemic Optic Neuropathies.
N Engl J Med 2015; 372:2428-2436. Doi: 10.1056/
músculo paralisado29. NEJMra1413352.
15. Rucker JC, Biousse V, Newman NJ. Ischemic optic
neuropathies. Curr Opin Neurol. 2004;17(1):27-35. doi:
REFERÊNCIAS 10.1097/00019052-200402000-00006.
1. Liu GT. Visual loss: optic neuropathies. In: Neuro- 16. Rigi M, Almarzouqi SJ, Morgan ML, Lee AG.
Ophthalmology: Diagnosis and Management, Liu GT, Papilledema: epidemiology, etiology, and clinical
Volpe NJ, Galetta SL (Eds), WB Saunders, Philadelphia management. Eye Brain. 2015;7:47-57. doi:10.2147/
2001. EB.S69174.
2. Martins HS, Brandão Neto RA, Velasco IT. Medicina 17. Sato MT. Semiologia básica da visão periférica e
de emergência: abordagem prática. 11ª ed. São Paulo: campimetria. In: Moreira CA. (Org.). Semiologia básica
Manole; 2016. em oftalmologia. 3a ed. Rio de Janeiro: Cultura Medica,
3. Söderström M, Link H, Xu Z, Fredriksson S. Optic 2013, v. I, p. 31-49.
neuritis and multiple sclerosis: anti-MBP and anti-MBP 18. Pereira A, Monteiro MLR. Perimetria computadorizada
peptide antibody-secreting cells are accumulated in e manual em pacientes com defeitos perimétricos
CSF. Neurology. 1993;43(6):1215-22. doi: 10.1212/ temporais avançados causados por tumores supra-
wnl.43.6.1215. PMID: 7513391. selares. Arq. Bras. Oftalmol. Outubro 2005;68(5):587-
4. Frederiksen JL, Madsen HO, Ryder LP, Larsson HB, 591. –doi: 10.1590/S0004-27492005000500003.
Morling N, Svejgaard A. HLA typing in acute optic neuritis. 19. Prasad S. Neuro-ophthalmology. ACP Medicine. 2013.
Relation to multiple sclerosis and magnetic resonance Neuroftalmologia, MedicinaNET- Acesso em junho de
imaging findings. Arch Neurol. 1997;54(1):76-80. doi: 2010. .Disponível em: <http://assinantes.medicinanet.
10.1001/archneur.1997.00550130058016. com.br/conteudos/acp-medicine/6242/neuroftalmologia.
5. de la Cruz J, Kupersmith MJ. Clinical profile htm#>.
of simultaneous bilateral optic neuritis in adults. 20. University of Calgary - Opthalmologic diplopia
Br J Ophthalmol. 2006;90(5):551-4. doi: 10.1136/ schemes. Acesso em julho 2020. Disponível em: https://
bjo.2005.085399. blackbook.ucalgary.ca/schemes/opthalmologic/diplopia/.
6. Balcer LJ. Clinical practice. Optic neuritis. N 21. Locksley HB. Natural history of subarachnoid
Engl J Med. 2006;354(12):1273-80. doi: 10.1056/ hemorrhage, intracranial aneurysms and arteriovenous
NEJMcp053247. malformations. J Neurosurg. 1966;25(3):321-68. doi:
7. The clinical profile of optic neuritis. Experience of 10.3171/jns.1966.25.3.0321.
the Optic Neuritis Treatment Trial. Optic Neuritis Study 22. Silva LP, Soldatelli M D, Palmini ALF. Diagnóstico e
Group. Arch Ophthalmol. 1991;109(12):1673-8. doi: manejo da diplopia aguda no adulto. Acta méd. (Porto
10.1001/archopht.1991.01080120057025. Alegre). 2015;36[9],.ID biblio-879695.
8. Menon V, Saxena R, Misra R, Phuljhele S. 23. Biousse V, Newman NJ. Third nerve palsies. Semin
Management of optic neuritis. Indian J Ophthalmol. Neurol. 2000;20(1):55-74. doi: 10.1055/s-2000-6833.
2011;59(2):117-22. doi: 10.4103/0301-4738.77020.
24. Brazis PW, Lee AG. Binocular vertical diplopia.
9. Jacobs LD, Kaba SE, Miller CM, Priore RL, Mayo Clin Proc. 1998;73(1):55-66. doi: 10.1016/S0025-
Brownscheidle CM. Correlation of clinical, magnetic 6196(11)63620-3.
resonance imaging, and cerebrospinal fluid findings
in optic neuritis. Ann Neurol. 1997;41(3):392-8. doi: 25. Yanaka K, Matsumaru Y, Mashiko R, Hyodo
10.1002/ana.410410315. A, Sugimoto K, Nose T. Small unruptured cerebral
aneurysms presenting with oculomotor nerve palsy.
10. Nilsson P, Larsson EM, Maly-Sundgren P, Perfekt R, Neurosurgery. 2003;52(3):553-7. doi: 10.1227/01.
Sandberg-Wollheim M. Predicting the outcome of optic neu.0000047816.02757.39.
neuritis: evaluation of risk factors after 30 years of follow-
up. J Neurol. 2005;252(4):396-402. doi: 10.1007/s00415-
005-0655-9.
Capítulo 26 324
26. Capó H, Warren F, Kupersmith MJ. Evolution of 29. Iliescu DA, Timaru CM, Alexe N, Gosav E, De
oculomotor nerve palsies. J Clin Neuroophthalmol. Simone A, Batras M, et al. Management of diplopia.
1992;12(1):21-5. Rom J Ophthalmol. 2017;61(3):166-170. doi: 10.22336/
rjo.2017.31.
27. King AJ, Stacey E, Stephenson G, Trimble RB.
Spontaneous recovery rates for unilateral sixth nerve
palsies. Eye (Lond). 1995;9 ( Pt 4):476-8. doi: 10.1038/
eye.1995.110.
28. Holmes JM, Beck RW, Kip KE, Droste PJ, Leske
DA. Botulinum toxin treatment versus conservative
management in acute traumatic sixth nerve palsy or
paresis. J AAPOS. 2000;4(3):145-9.
Capítulo 26 325
PARTE 6
DOENÇAS DOS NERVOS PERIFÉRICOS, DA JUNÇÃO
NEUROMUSCULAR E MUSCULAR
CAPÍTULO 27
EXAME FÍSICO DO PLEXO BRAQUIAL
Francisco Flávio Leitão de Carvalho Filho desta anatomia podem ocorrer. Algumas vezes, o plexo
braquial pode receber a contribuição da quarta raiz
Raquel Queiroz Sousa Lima
cervical, sendo assim chamado de plexo pré-fixado.
Francisco Flávio Leitão de Carvalho A importância clínica desta variação está relacionada
à importante contribuição motora desta raiz para a
formação do plexo. Outra variação que pode acontecer é
a contribuição da segunda raiz torácica. Nesta situação,
INTRODUÇÃO
nomeamos o plexo de pós-fixado. Quando presentes,
Das lesões que acometem o sistema nervoso essas são as variações anatômicas mais comuns.
periférico (SNP), as lesões traumáticas do plexo braquial Demonstramos um modelo do plexo braquial logo abaixo
são as que mais impactam a vida do paciente. Não é (Figura 1).
difícil compreender as consequências psicossociais
Algumas raízes que compõem o plexo braquial
e econômicas que estes enfermos enfrentam ao
emitem ramos espinhais que saem anteriormente à
experimentar de maneira aguda um déficit neurológico.
formação dos troncos. São elas: C5, C6 e C7, capazes
Além disso, nenhuma lesão neurológica tem de contribuir para a formação de nervos espinhais
exame físico tão rico em informação ao examinador com funções importantes, salvo os casos de variação
quanto as lesões que acometem o SNP. Não é incomum, anatômica4,6.
o exame neurológico conseguir localizar de forma tão
Os primeiros ramos formados pelas raízes de C5,
precisa a lesão, muitas vezes declinando dos métodos
também chamados de ramos dos nervos espinhais, são o
complementares.
nervo frênico, o nervo torácico longo e o nervo escapular
Neste capítulo traremos detalhes desse exame que dorsal. O primeiro é composto das raízes de C3, C4 e C5
nortearão a topografia da lesão, bem como a estratégia e é responsável pela inervação do diafragma. Enquanto
terapêutica. o segundo recebe contribuições anatômicas de C6 e
C7 para inervar o músculo serrátil anterior. Já o terceiro
compõe a inervação dos músculos romboides4,6.
ANATOMIA
Independentemente da área médica que você queira
abraçar, o conhecimento da anatomia é fundamental e sem
este qualquer esforço de compreensão será frustrante.
Dito isso, aconselhamos que seus conhecimentos
anatômicos sejam revisados e atualizados.
Capítulo 27 327
Figura 1: Plexo braquial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 328
no plexo braquial, antes, portanto da formação dos
INSPEÇÃO
troncos, a lesão deste nervo, implica em avulsão
Todo exame físico inicia com a inspeção e
desta raiz.
as lesões do plexo braquial não fogem à regra. O
exame deverá ser feito com o paciente de tronco
Cicatrizes
e membros desnudos. Nesta etapa buscaremos
aspectos importantes os quais estão listados abaixo. A presença de uma cicatriz por sob a
perceptíveis quando avaliamos os nervos espinhais. mudanças do estado neurológico observadas nas
Por exemplo, o nervo torácico longo é responsável consultas subsequentes, podem significar melhora
pela abdução e rotação para cima da escápula, neurológica. Assim, recuperação dos estímulos
atuando na fixação desta. Lesões proximais de C5, elétricos, pode, por exemplo, trazer o retorno da
longo, a qual se apresentará com deslocamento não tão frequente, essa melhora pode preceder a
Capítulo 27 329
Figura 2: Atrofia muscular em lesão completa do plexo braquial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 330
Figura 4: Escápula alada.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 331
Figura 6: Cicatriz sobre o sulco delto-peitoral.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 332
Figura 8: Edema com mudança da coloração na mão esquerda.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 333
Figura 10: Síndrome de Horner em olho direito.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 334
Figura 12: Amputação das unhas.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 335
Uma explicação para esse fenômeno é o
Assimetria torácica
fato de que o componente sensitivo das raízes são
A presença de assimetria torácica durante a
geralmente mais longos que os motores, ficando
inspiração caracteriza a lesão do nervo frênico4. Este
mais resistentes ao trauma (Figura 15).
é o responsável pela inervação do diafragma. Um
paciente com lesão proximal de C5 pode apresentar
Dor
assimetria torácica durante a inspiração sugerindo
Alteração da sensibilidade extremamente
lesão da raiz de C5.
comum nas lesões do plexo braquial 10,11
. A literatura
mostra que pacientes padecem de dor em até
aproximadamente 70% dos casos11. Há algumas
SENSIBILIDADE
escalas que podem ser usadas como meio de
O conhecimento neuroanatômico e topográfico
graduar e/ou quantificar a dor. No entanto, todas
do plexo braquial e dos dermátomos deste é de
essas escalas apresentam o viés da dúvida, afinal o
extrema relevância para o raciocínio médico durante
julgamento é absolutamente subjetivo.
o exame físico do plexo braquial. Para melhor
compreensão, mapeamos as áreas da pele com
suas raízes correspondentes na figura seguinte
MOTRICIDADE
(Figura 14).
Para avaliar a função motora do plexo braquial
A raiz de C5 tem como dermátomo
temos que conhecer a função motora de cada raiz
correspondente a região lateral do antebraço até
que o compõe. Como dito anteriormente, as raízes
o cotovelo. Dor causada por lesão de C5 causaria
cervicais de C5 a C8 e a raiz torácica T1 formam o
dor nessa região e na borda medial da escápula.
plexo braquial. Interessante apontar para o fato de
Quanto à raiz de C6, esta tem como dermátomo
que as raízes do tronco médio e as do tronco inferior
correspondente a área lateral do antebraço incluindo
têm exame neurológico mais complexo e mais fácil
o polegar e o índex. A única raiz do tronco médio, que
de causar erros no diagnóstico. Vejamos as funções
é a raiz de C7, é responsável pela sensibilidade na
de cada uma delas:
região que cobre o tríceps, portanto parte posterior
do braço, uma estreita região mediana do antebraço C5: esta raiz alimenta dois nervos que são
raiz de C8 inerva a pele localizada na região medial e nervo axilar. O primeiro é responsável pela
do antebraço indo até o 5º quirodáctilo. Finalmente, a abdução dos primeiros 90o e o segundo possibilita a
raiz de T1 é responsável pela área que compreende abdução até 180o. Assim, lesões nesta raiz causam
Capítulo 27 336
Figura 14: Dermátomos das raízes do plexo braquial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 337
Figura 15: Seta Vermelha: raiz sensitiva. Seta amarela: raiz motora.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 338
inspeção. Enquanto o segundo e o terceiro podem o músculo extensor longo dos dedos e flexor longo
demonstrar alterações ao exame de motricidade ; 6
dos dedos6,9. Além disso, a raiz de C8 contribui para
inervação de alguns músculos da mão. Uma boa
C6: esta raiz tem como importante contribuição
maneira de testar a viabilidade dessa raiz é solicitar
motora a flexão do cotovelo. O nervo musculocutâneo
ao paciente que aperte dois dedos do examinador,
recebe contribuição desta raiz e também da raiz de
principalmente com os dedos inervados pelo
C5, sendo este nervo importante na inervação do
mediano, ou seja do 1 ao 3 quirodáctilos;
o o
bíceps e do brachialis4,6,9. A flexão deste grupo de
músculos ocorre na posição supina conforme pode T1: esta raiz contribui enormemente para a
ser apreciado logo abaixo (Figura 16). Além do nervo musculatura da mão6,9. Por ser o nervo ulnar e a raiz
musculocutâneo, o nervo radial também recebe de T1 importantes contribuintes para os movimentos
informação dessa raiz e o ramo dele que vai para da mímica da mão, diferenciar uma lesão radicular
o músculo brachiradialis é responsável pela flexão de T1 ou periférica do nervo ulnar pode não ser
do braço em posição semi-supina. Nas lesões desta tão fácil assim. Uma importante dica é avaliar o
raiz o reflexo do bíceps pode estar ausente; flexor curto do polegar. Se este estiver intacto com
movimentos normais, a lesão é periférica do nervo
C5 e C6: essas duas primeiras raízes do plexo
ulnar, uma vez que este músculo recebe inervação
braquial formam o tronco superior. A lesão do tronco
do nervo mediano; e
superior é chamada de lesão de Erb e,nesse caso a
abdução do braço bem como a flexão do cotovelo se C8 e T1: essas duas últimas raízes formam
encontram ausentes, havendo somente movimento o tronco inferior. Pacientes com lesões do tronco
de extensão do braço e movimentos do punho e dos inferior não apresentam movimentos da mão.
dedos 12,13
; Esse tipo de paralisia é chamada de paralisia de
Klumpke11,15,20.
C7: os principais movimentos desta raiz
incluem os de adução do ombro, de extensão do Digno de nota, as lesões expansivas do 1/3
cotovelo, de extensão e flexão do punho Esta raiz
4
superior do pulmão podem pressionar ou invadir as
contribui principalmente para dois nervos que fazem raízes do tronco inferior ocasionando inicialmente dor
movimentos no antebraço: radial e mediano. O na região do nervo ulnar e depois pode evoluir com
nervo ulnar recebe uma tímida contribuição da raiz paresia. Esse fenômeno é chamado de síndrome de
de C7 para inervar o músculo flexor ulnar do carpo. Pancoast19.
Algumas vezes, as lesões do plexo braquial impõem
Em continuidade aos troncos, seguimos com
desafio ao examinador, principalmente quando
os fascículos (também chamados de cordões) e,
temos que topografar a lesão. Em outras palavras,
via de regra, quanto mais distal for a lesão, melhor
nem sempre é claro se estamos diante de uma lesão
é o prognóstico. São 3 os cordões: lateral, medial
radicular (da raiz) ou do nervo periférico que recebe
e posterior. A pergunta que o leitor deve fazer é:
axônio da mesma raiz14. Felizmente, há maneiras
lateral a quê? Medial a quê? Posterior a quê? A
de esclarecer essa dúvida. Para isso é primordial o
resposta é a artéria axilar. Dito isto, sabemos que o
conhecimento exato de todas as funções dos nervos.
cordão lateral encontra-se lateral à artéria axilar e é
Por exemplo, se houver plegia da adução, a causa
o primeiro a ser identificado quando dissecamos o
certamente é radicular uma vez que o nervo radial
sulco delto-peitoral16. Seguindo o mesmo raciocínio,
não contribui para esse movimento, como também
o cordão medial encontra-se medial à artéria e o
não contribui para o movimento de flexão do punho.
cordão posterior encontra-se posterior a artéria
Esta raiz compõe, solitariamente, o tronco médio;
axilar4. Vamos conhecer as funções de cada um:
C8: esta raiz contribui principalmente para
• lesão do cordão lateral: Aqui encontramos
extensão e flexão dos dedos, uma vez que ela inerva
Capítulo 27 339
Figura 16: Flexão dos músculos bíceps e brachialis.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 340
braço fletido em 90º e abduzido, aplica-se
REFLEXOS o martelo de reflexo no tendão do tríceps
O estudo dos reflexos nas lesões completas aproximadamente 1,5 cm acima do olécra-
do plexo braquial ou nas lesões completas de um no provocando contração da musculatura.
É carreado somente por C7 através do
dos seus troncos perde um pouco a sua importância,
nervo radial4; e
uma vez que a ausência da força impossibilitará o
reflexo. Por outro lado, nas lesões parciais de um • reflexo dígito-digital: com a mão em po-
tronco, o exame de um reflexo pode se mostrar de sição supina e os dedos meio fletidos, o
utilidade para confirmar a lesão radicular. São eles: examinador repousa seus dedos de for-
ma transversa aos dedos do paciente e,
• reflexo peitoral: esse reflexo é desenca- fazendo uma força suficiente para manter
deado quando colocamos dois dedos no certa tensão nos dedos fletidos do pacien-
sulco delto-peitoral e com ajuda de um te, percute com o martelo de reflexo os
martelo de reflexo, aplicamos uma força dedos do examinador. Como resposta, os
suficiente para desencadear esse reflexo. dedos do paciente tendem a fletir, inclusi-
Este é carreado pelas raízes de C7 e C84; ve o polegar. Isso é carreado por C8 4.
Capítulo 27 341
MÉTODO COMPLEMENTAR
Radiografia
Capítulo 27 342
portanto, de um importante método complementar,
Mielotomografia
desde que realizado por profissionais experientes e
Quando o cirurgião monta a estratégia
competentes.
terapêutica, a informação mais importante é se há ou
não avulsão de raiz possibilitando o uso desta como
fonte doadora de axônios. Assim, o diagnóstico da
REFERÊNCIAS
viabilidade da raiz é crucial. Esse método consiste 1- Sakellariou VI, Badilas NK, Mazis GA, et al. Brachial
em submeter o paciente a uma punção lombar e plexus injuries in adults: evaluation and diagnostic
approach. ISRN Orthop. 2014;2014:726103.
injetar contraste intrarraquidiano, obrigatoriamente,
2- Tharin BD, Kini JA, York GE, Ritter JL. Brachial
não iônico, e, após deitar o paciente o colocamos plexopathy: a review of traumatic and nontraumatic causes.
em posição de Trendelenburg. Assim, o contraste irá AJR Am J Roentgenol. 2014;202(1):W67-75.
migrar em direção à região cefálica, devendo realizar 3- Noland SS, Bishop AT, Spinner RJ, Shin AY. Adult
Traumatic Brachial Plexus Injuries. J Am Acad Orthop Surg.
tomografia cervical com cortes finos de no máximo
2019;27(19):705-716.
3 mm de C3 a T1, logo em seguida à migração do
4- Patten J. Neurological Differential Diagnosis. 2ª edição.
contraste. Como podemos observar, trata-se de Springer; 1996.
método invasivo e associado a exposição de raio-x. 5- Sunderland S. Nerves and nerve injuries. 2ª edição.
Por esta razão, este método é a segunda opção Churchill Livingstone; 1978.
viabilidade das raízes18. Além disso, como 15% dos 9- O’Berry P, Brown M, Phillips L, Evans SH. Obstetrical
Brachial Plexus Palsy. Curr Probl Pediatr Adolesc Health
casos de lesão do plexo braquial apresentam trauma Care. 2017;47(7):151-155.
raquimedular 19. A viabilidade da medula também 10- Kaya Y, Sarikcioglu L. Sir Herbert Seddon (1903-1977)
pode ser estudada com este método. Por esse and his classification scheme for peripheral nerve injury.
Childs Nerv Syst. 2015;31(2):177-180.
motivo, a ressonância é o padrão-ouro em termos
11- Teixeira MJ, da Paz MG, Bina MT, et al. Neuropathic
de imagem, pois além de apresentar uma excelente pain after brachial plexus avulsion--central and peripheral
qualidade de imagem, é um método menos invasivo mechanisms. BMC Neurol. 2015;15:73.
(Figura 20). Contudo, diante do custo elevado, nem 12- Jennett RJ, Tarby TJ, Krauss RL. Erb’s palsy contrasted
with Klumpke’s and total palsy: different mechanisms are
todo centro pode contar com este método.
involved. Am J Obstet Gynecol. 2002;186(6):1216-1219.
13- Hems TE, Mahmood F. Injuries of the terminal
Eletroneuromiografia branches of the infraclavicular brachial plexus: patterns of
injury, management and outcome. J Bone Joint Surg Br.
É um importante método complementar por 2012;94(6):799-804.
apresentar informações sobre a topografia da lesão, 14- Brunelli GA, Brunelli GR. A fourth type of brachial
bem como o grau da intensidade desta18,20. Além do plexus lesion: the intermediate (C7) palsy. J Hand Surg Br.
1991;16(5):492-494.
mais, considerando que as lesões do plexo braquial
15- Merryman J, Varacallo M. Stat Pearls Publishing. 2021.
podem apresentar um caráter dinâmico com melhora
expontânea, este método tem a vantagem de avaliar 16- Haninec P, Hradecky J, Mencl L. Lower subscapular
nerve transfer for axillary nerve repair in upper brachial
com precisão esta melhora. Para que o leitor tenha plexus palsy. Acta Neurochir (Wien). 2020;162(1):135-139.
uma ideia, 15% da série pessoal do autor sênior 17- Gutkowska O, Martynkiewicz J, Urban M, Gosk J.
evoluíram de lesão completa para incompleta, sendo Brachial plexus injury after shoulder dislocation: a literature
review. Neurosurg Rev. 2020;43(2):407-423.
este método essencial para esta avaliação. Trata-se,
Capítulo 27 343
18- Antonovich D, Dua A. Electrodiagnostic Evaluation 20- Kamble N, Shukla D, Bhat D. Peripheral Nerve Injuries:
Of Brachial Plexopathies. [Atualizado em 9/8/2021]. In: Electrophysiology for the Neurosurgeon. Neurol India.
StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls 2019;67(6):1419-1422.
Publishing; 2021. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.
gov/books/NBK562197/.
19- Rhee PC, Pirola E, Hébert-Blouin MN, et al.
Concomitant traumatic spinal cord and brachial plexus
injuries in adult patients. J Bone Joint Surg Am.
2011;93(24):2271-2277.
Capítulo 27 344
Figura 20: Ressonância magnética com avulsão da raiz motora direita.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 27 345
CAPÍTULO 28
ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Frederico Mennucci de Haidar Jorge prevalência mundiais, as quais variam de 0,46 a 2,39
e 2,01 a 11,3 por 100.000 hab., respectivamente. Por
razões desconhecidas, atinge, ligeiramente, mais o sexo
INTRODUÇÃO masculino, com proporção masculino:feminino de 1,5:1,
As doenças dos neurônios motores incluem uma porém esta proporção de acometimento nos gêneros
variedade de condições neurodegenerativas adquiridas fica invertida na forma bulbar da doença. A idade média
e hereditárias que lesam total ou predominantemente os habitual de aparecimento da doença ocorre entre os 55
neurônios motores. A esclerose lateral amiotrófica (ELA) a 65 anos de idade, embora, em alguns casos, cerca de
é a mais comum dessas doenças e será o foco de grande 5% possa manifestar-se a partir da segunda década de
parte deste capitulo. vida2,3.
O sistema de neurônios motores é composto por ELA é uma doença fatal, com um período de
neurônios motores superiores e inferiores. Os neurônios sobrevida em média de 3 anos a partir do início da
motores superiores residem no córtex motor primário fraqueza4. Pneumonia por aspiração e complicações
do cérebro, e seus axônios compreendem o trato médicas de imobilidade contribuem para a morbidade
corticobulbar (conectando-se ao tronco cerebral) e o em pacientes com a doença. Em alguns casos, a ELA se
trato corticoespinhal (conectando-se à medula espinhal). sobrepõe clínica, patológica e biologicamente à demência
Os neurônios motores inferiores, também chamados de frontotemporal e pode compartilhar mecanismos
neurônios motores alfa ou células do corno anterior, estão biológicos comuns com a doença de Alzheimer, doença
localizados nos núcleos motores do tronco cerebral ou na de Parkinson e outras doenças neurodegenerativas5,6.
substância cinzenta anterior da medula espinhal. Seus
A ELA resulta do desmantelamento sistemático do
axônios se conectam aos músculos da região bulbar ou
sistema neurônio motor, com as manifestações clínicas
membros. A lesão do sistema neuronal motor resulta na
em cada paciente derivando do local de início (segmento
perda da função muscular voluntária que pode afetar a
cefálico, membros superiores, tronco e membros
função dos membros, bulbar e / ou respiratória, com os
inferiores); do tipo de célula envolvida (neurônio motor
sintomas específicos dependendo de qual parte da via
superior e/ou neurônio motor inferior) e a taxa de
motora é afetada.
progressão da doença5.
Desde as primeiras descrições das características
clínicas e patológicas da ELA por Jean-Martin Charcot na
década de 1870, nossa compreensão da fisiopatologia
APRESENTAÇÃO CLÍNICA
subjacente da doença se expandiu enormemente1.
ELA é uma doença heterogênea com uma variedade
Ainda assim, uma teoria causal unificadora permanece
de fenótipos clínicos e todas as apresentações têm
indefinida.
em comum um declínio progressivo na funcionalidade
Atualmente, descreve-se sua incidência e devido à fraqueza ou espasticidade sem perda sensorial
Capítulo 28 346
ou dor equivalente. Alguns pacientes também No segmento bulbar, esses sintomas e sinais
apresentam alterações na expressão emocional ou podem se manifestar como disartria e disfagia,
anormalidades cognitivas, sendo ambos marcadores juntamente com fraqueza facial, por acometimento de
de pior prognóstico .
7
neurônio motor superior e/ou inferior. Neurônio motor
superior, ou disartria espástica, é caracterizada por
Características motoras fala lenta e tensa, geralmente com disfonia espástica.
Aproximadamente 70% dos pacientes com Enquanto no acometimento do neurônio motor
ELA apresentam fraqueza dos membros como inferior, ou flácido, a disartria é caracterizada por
primeira manifestação da doença, definido como fraqueza dos músculos linguais, faciais e palatinos
ELA espinhal, que é tipicamente assimétrica e distal causando fala imprecisa, soprosa e hipernasal.
no início. Vinte e cinco por cento dos pacientes Laringoespasmo e mordedura involuntária da
apresentam sintomas bulbares, que se manifestam bochecha ou da língua são sintomas adicionais do
com dificuldade para falar, mastigar ou engolir. Uma neurônio motor superior bulbar. A fraqueza facial e
pequena minoria de pacientes tem início respiratório a disfagia costumam causar sialorreia e dificuldade
e menos de 1% apresenta fasciculações difusas para controlar as secreções. Os reflexos liberados
e uma síndrome debilitante. Uma das poucas e patológicos que podem ser encontrados no
exceções de acometimento de músculos estriados segmento bulbar incluem espasmos da mandíbula,
são responsáveis pelos movimentos extraoculares, sinais palmomentuais e reflexos faciais (snout e
poupados até estágios muito avançados da doença. glabelar). A presença de uma disartria espástica e
flácida mista quase sempre é indicativa de ELA.
A natureza progressiva dos sintomas é um
componente crítico para o diagnóstico. Os sintomas Os sinais do neurônio motor superior e do
começam insidiosamente em uma região afetada e neurônio motor inferior nos membros podem causar
progridem nessa região à medida que a propagação desequilíbrio na marcha, quando presentes nas
para outras regiões também ocorre (contiguidade). pernas. Câimbras podem ocorrer nos membros,
Digno de nota, alguns pacientes com ELA irão região torácica e pescoço e são frequentemente
descrever sintomas de início “súbito”, mas uma provocadas por atividades que causam contração e
revisão cuidadosa de sua história normalmente encurtamento do músculo envolvido. A insuficiência
revelará sintomas progressivos antes da perda de respiratória é preferencialmente causada por
uma capacidade funcional específica. disfunção do neurônio motor inferior do diafragma
e músculos acessórios da respiração resultando
Os sintomas e sinais de ELA podem ser
em falta de ar, ortopneia, distúrbios respiratórios do
amplamente classificados como neurônio motor
sono, respiração paradoxal e redução do volume
superior ou neurônio motor inferior e também podem
vocal8, 9.
ser classificados pelo segmento do corpo em que
ocorrem. A fraqueza do neurônio motor superior é As complicações da ELA pode incluir:
causada pela perda da inibição descendente nos tratos
• incapacidade progressiva de realizar ativi-
corticobulbar e corticoespinhal, consequentemente
dades de vida diária, incluindo o manuseio
leva ao aumento do tônus e espasticidade, lentidão de utensílios para alimentação própria;
de movimento, aumento dos reflexos tendinosos
e presença de reflexos patológicos. A fraqueza do • deterioração da deambulação;
neurônio motor inferior é causada por danos à célula
• pneumonia por aspiração;
do corno anterior e resulta em fraqueza motora pura,
reflexos reduzidos, atrofia muscular, fasciculações e • insuficiência respiratória;
câimbras.
• complicações por estar em cadeira de ro-
Capítulo 28 347
das ou acamado, incluindo úlceras de de- outras causas potenciais para esses achados. No
cúbito e dor por imobilidade; e exame, uma combinação de sinais do neurônio motor
superior e do neurônio motor inferior é esperada.
• trombose venosa profunda e êmbolos pul-
monares. Os critérios revisados de El Escorial14 e
Awaji15 são os critérios mais utilizados (Quadro
1). É importante observar que esses são critérios
Afeto pseudobulbar
de classificação e não uma medida da gravidade
O afeto pseudobulbar é um distúrbio da
da doença. Embora uma classificação de ELA
expressão emocional causado pela interrupção
clinicamente definida carregue, em média, um
das vias corticopontocerebelares10. Os pacientes
prognóstico pior do que ELA clinicamente possível.
apresentam riso e/ou choro incontroláveis e, muitas
Sistemas de estadiamento que visam informar a
vezes, desproporcional ao seu estado emocional
progressão da doença e o prognóstico também
interno; o bocejo excessivo também pode ser
foram propostos e estão começando a ganhar
uma característica dessa síndrome. O afeto
terreno e aceitação, como por exemplo, o sistema
pseudobulbar não é específico da ELA, mas, quando
de estadiamento de King e o Milano-Torino16.
presente no quadro de fraqueza progressiva,
pode apontar para uma causa neurogênica para a Para pacientes com história de fraqueza
fraqueza, distinguindo-a, assim, de outras doenças progressiva e um exame revelando achados difusos do
neuromusculares. neurônio motor superior e do neurônio motor inferior,
a avaliação diagnóstica pode ser focada. Devem ser
Características cognitivas realizados estudos de eletroneuromiografia (ENMG).
Os estudos de condução nervosa geralmente
Anormalidades cognitivas foram descritas na
demonstram a preservação das respostas sensoriais
ELA por mais de um século.
com amplitudes motoras normais. Já no estudo da
Nos últimos 30 anos, vários estudos agulha deve demonstrar sinais de desnervação
observacionais sugeriram que até metade ativa (potenciais de fibrilação e ondas agudas
dos pacientes com ELA tem anormalidades positivas) juntamente com desnervação crônica
neuropsicológicas, mais comumente se em vários miótomos. Discretas anormalidades
manifestando como disfunção executiva. Uma eletromiográficas com achados no exame físico
população menor de pacientes com ELA (5%) tem de neurônio motor superior podem ser vistas em
demência frontotemporal franca (DFT)11, 12. fases precoces ou, então, o paciente pertencer à
A maioria dos pacientes com ELA-DFT variante de predomínio do neurônio motor superior
apresenta desinibição, falta de empatia, iniciação (esclerose lateral primária). No entanto, isso deve
deficiente e funcionamento executivo prejudicado, levar à consideração de uma etiologia alternativa
embora distúrbios de produção de linguagem que de envolvimento do neurônio motor superior
se manifestam como a variante não fluente da com uma lesão coexistente do neurônio motor
afasia progressiva primária também tenham sido inferior (por exemplo, radiculomielopatia cervical).
relatados . 13 Recomendada, nestes casos, a ressonância
magnética do neuroeixo.
Capítulo 28 348
Quadro 1: Critérios diagnósticos Awaji.
Fonte: Adaptado de Carvalho et al., 200817.
Fasciculações benignas Início agudo, generalizado, sem fraqueza ENMG não demonstra desnervação ou
reinervação crônica
Miopatia por corpos de Fraqueza dos flexores profundos dos ENMG miopático, mais anticorpo NT5C1A e
inclusão dedos e quadríceps achados de biópsia muscular
Neuropatia motora Padrão de neurogênico (em vez de Bloqueio de condução motora parcial em
multifocal (MMN) com miopático) com predominância assimétrica estudos de condução nervosa, anticorpos
bloqueio de condução de extremidade superior anti-GM1 positivos
Amiotrofia neurálgica Dor no início, envolvimento de nervos Estudos de condução nervosa e achados
identificados, curso autolimitado EMG, RM com e sem contraste do plexo
envolvido
Doença de Hirayama Jovem do sexo masculino com fraqueza Achados de RM
e atrofia em mãos assimétricas, curso
autolimitado
Doença de Kennedy Progressão lenta, espasmos faciais, Expansão da repetição CAG no gene do
tremor, neuropatia sensorial, evidência receptor de andrógeno
de insensibilidade a androgênios (por
exemplo, ginecomastia, atrofia testicular)
Doença de Charcot-Marie- Início simétrico e distal, início precoce, Estudos de condução nervosa que
Tooth com predominância progressão lenta demonstram amplitudes anormais do
motora (CMT) / atrofia potencial de ação do nervo sensorial e (em
muscular espinhal distal CMT tipo 1) evidência de desmielinização;
teste genético positivo para CMT
Síndrome pós pólio História de poliomielite pregressa de longa Potenciais de ação da unidade motora
data seguida por lenta progressão de gigante em EMG
fraqueza; dor muscular é comum
Quadro 2: Diagnósticos diferenciais (predomínio do neurônio motor inferior).
Fonte: Adaptado de Quinn & Elman, 202018.
Capítulo 28 349
Diagnóstico Pista Diagnóstica Teste Confirmatório
Doença de corpos Perda sensorial distal, bexiga RM com lesão em substância branca,
poliglucosanos do adulto neurogênica, ataxia cerebelar, déficits mutações de GBE1
cognitivos
Capítulo 28 350
estabelecido, uma reavaliação cuidadosa deve significado ainda não foi explicado21. Potencialmente
ser realizada rotineiramente nas visitas de mais relevantes são as inclusões citoplasmáticas
acompanhamento para garantir que quaisquer novos ubiquitinadas que contêm a proteína de ligação ao
sintomas ou sinais permaneçam consistentes com o DNA 43 (TDP-43), que estão presentes em quase
diagnóstico de ELA e não sugiram um diagnóstico todos os pacientes e representam uma ligação
alternativo. patológica entre a ELA e a DFT22.
devido à heterogeneidade das características sem grandes descobertas, uma família com ELA
patológicas originais descritas por Charcot. Junto mais comum já observada (inclusões de TDP-43),
com a atrofia muscular (amiotrofia) devido à e marcou o início de uma década de descoberta de
desnervação, ele notou cicatrizes e endurecimento novos genes associados com ELA familiar. O TDP-
espinhal, a localização dos tratos corticospinais. de RNA e essa via se tornou um foco central na
também incluem corpos de Bunina, pequenas Mutações no gene fundido no sarcoma (FUS)
inclusões citoplasmáticas eosinofílicas encontradas são uma causa incomum de ELA familiar (<5%), mas
no citoplasma de neurônios motores sobreviventes são importantes por causa da semelhança entre a
em quase todos os tipos de ELA. No entanto, seu função FUS e TARDBP. Além disso, as mutações
Capítulo 28 351
FUS são mais comumente vistas em pacientes com
Processamento prejudicado de RNA
ELA de início precoce e devem ser consideradas em
Com a descoberta das inclusões citoplasmáticas
qualquer paciente que apresente ELA na segunda
do TDP-43 na ELA, o processamento do RNA se
ou terceira década de vida24. A descoberta mais
tornou uma área importante de foco na patogênese.
significativa na genética de ELA da última década
TDP-43 é uma proteína de ligação a DNA / RNA
é a localização de uma mutação no C9orf72. Um
envolvida na transcrição, splicing e transporte de
estudo finlandês, que é uma região geográfica
RNA e geralmente está localizada exclusivamente
ideal para estudo devido à alta incidência de ELA
no núcleo. A descoberta de TDP-43 deslocado para
e relativa homogeneidade genética. Expansões de
o citoplasma levantou preocupação para uma perda
pelo menos 30 repetições estão associadas a ELA,
da função nuclear TDP-43 no processamento de RNA
DFT ou ELA-DFT. Expansões no C9orf72 explicam
ou um efeito tóxico de agregados citoplasmáticos
40% da ELA familiar em uma população europeia e
TDP-43, ou uma combinação dos dois.
quase 10% da ELA esporádica25.
Capítulo 28 352
Figura 1: Mecanismos patológicos na ELA.
Fonte: Adaptado de Ilieva et al., 200928.
exemplo, rapamicina) estão em testes humanos ação variados, apenas dois agentes modificadores
ativos. As células-tronco mesenquimais, que podem da doença estão disponíveis atualmente (no Brasil,
ter uma variedade de efeitos tróficos nos neurônios apenas um), ambos com efeitos modestos sobre
motores, também parecem ter um impacto nos os resultados da doença. Riluzol, um inibidor da
marcadores inflamatórios, que podem predizer a transmissão neuronal glutamatérgica, foi aprovado
resposta a essa terapia .
30
pela primeira vez em 1995 após demonstrar
consistentemente um benefício modesto de
sobrevida em média de 3 meses . Edaravone, que
31
Capítulo 28 353
efeito32. Uma série de questões permanece em começam a experimentar os efeitos iniciais da
aberto sobre a eficácia do edaravone. insuficiência ventilatória, incluindo a interrupção do
sono ou com valores na CVF menor que 70% do
Para tratamento sintomático, algumas opções
previsto ou no teste de SNIP menor que 40cmH2O,
são:
este é um teste simples e de rápida realização com
• câimbra: baclofeno; vantagem de não depender da prensa bucal, muitas
vezes já comprometida, para a sua avaliação. A
• depressão: IRSS;
eficácia da ventilação não invasiva é apoiada por um
• espasticidade: baclofeno; tizanidina; estudo randomizado e controlado34.
Capítulo 28 354
de fadiga muscular e cansaço do paciente, pois condição similar, onde o prejuízo predominante
após esse limiar poderá evoluir com sobrecarga e encontra-se nos membros inferiores, nesta variante
sofrimento das vias ainda ativas. ainda existem outras condições que ainda carecem
de melhores compreensões, se são a mesma
Considerações de fim de vida entidade ou sub variantes (por exemplo, forma
pseudopolineuropática, Patrikius)35.
Questões de fim de vida devem começar a
serem discutidas e esclarecidas precocemente. No A atrofia muscular progressiva ocorre quando
entanto, isso pode não funcionar bem para alguns a doença clínica é limitada ao neurônio motor inferior.
pacientes. O médico deve estar ciente do estado Uma série mostrou que os pacientes com atrofia
individual e das leis nacionais que regulam essas muscular progressiva têm maior probabilidade de
questões. Também encorajar, se apropriado para ser homens e mais velhos no início da doença e
o paciente, a conclusão de diretivas antecipadas, sobreviver por mais tempo.
e documentar as preferências do paciente nos
A esclerose lateral primária é uma doença
registros médicos. Importante saber informar as
de progressão lenta com sobrevida prolongada
opções, esclarecer as dúvidas e ressoar com as
que permanece isolada no neurônio motor superior
dificuldades do cenário do paciente.
por pelo menos 4 anos desde o início. A esclerose
lateral primária geralmente começa por volta dos 50
anos, na maioria das vezes começa nas pernas e
VARIANTES DE ELA frequentemente envolve a região bulbar.
A paralisia bulbar progressiva é uma síndrome
rara em que a doença se limita ao segmento bulbar.
Termo mais antigo, porém, ainda utilizado, hoje há MÍMICAS DE ELA
uma tendência de chamá-la de ELA bulbar, pois se Atrofia monomélica, também chamada de
inicia no segmento cefálico, mas com o ganho de doença de Hirayama, mais comumente se apresenta
sobrevida dos pacientes nos últimos tempos, nota- com fraqueza assimétrica no braço em homens
se que o acometimento motor se espalha para os jovens. Geralmente, envolve a musculatura C8/T1
demais segmentos. Provavelmente, antigamente, e a progressão ocorre ao longo de 2 a 5 anos em
o paciente falecia antes desta evolução clínica. etapas. O diagnóstico é feito com base na história,
Apresenta-se com mais frequência em mulheres nos achados clínicos clássicos e nos achados
mais velhas e o prognóstico é pior do que as outras cervicais de RM, incluindo flexão dinâmica. Os
formas de doença do neurônio motor. achados de imagem têm um deslocamento da dura-
máter levando à compressão da medula espinhal
O flail arm, também conhecido como diplegia
e a presença do plexo venoso peridural posterior
amiotrófica braquial, envolve a perda lentamente
proeminente. O mecanismo fisiopatológico proposto
progressiva da função de ambos os braços, nota-
é de compressão da medula espinhal, na flexão
se acometimento em outros segmentos, tanto
cervical, pelo deslocamento para frente da dura-
clinicamente como ENMG, porém, claramente, há
máter com isquemia das células do corno anterior.
uma desproporção de velocidade de progressão.
É muito comum o paciente ficar com os braços Isso pode resultar do crescimento insuficiente
plégicos, proximal e distal enquanto que o segmento da dura-máter em relação à coluna vertebral durante
cefálico e pernas mantêm a funcionalidade por a puberdade, o que explicaria a maior prevalência
longo período. Fenótipo muito mais frequente em em homens jovens. A terapia com colar cervical
homens do que mulheres e é relacionado a um e evitar a flexão prolongada do pescoço tem sido
melhor prognóstico. Existe também o flail leg, recomendada durante a fase inicial ou rapidamente
Capítulo 28 355
progressiva da doença. A intervenção cirúrgica,
artrodese que raramente era indicada, cada vez
mais comum vem tornando-se numa alternativa
relativamente simples, duradoura e segura (Figuras
2 e 3).
Capítulo 28 356
idade de início dos sintomas e disfunções motoras nas ultimas décadas.
apresentadas, e é útil para o prognóstico. Pacientes
com tipo 1 (AME1) apresentam fraqueza severa, com
início em menos de 6 meses de idade, e não alcançam REFERÊNCIAS
1- Charcot JM, Joffroy A. Deux cas d’atrophie musculaire
a capacidade de sentar-se independentemente. progressive avec lesion de la substance grise et des
Pacientes com tipo 2 (AME2) têm fraqueza mais leve faisceaux antero-lateraux de la moelle epiniere. Arch
Physiol Neurol Path. 1869;2:744-754.
que se apresenta antes dos 18 meses de idade e são
2- Chiò A, Logroscino G, Hardiman O, et al. Prognostic
capazes de sentar, mas não alcançam a capacidade
factors in ALS: A critical review. Amyotroph Lateral Scler.
de andar independentemente. Pacientes com tipo 2009;10(5-6):310-323.
3 (AME3) apresentam fraqueza na infância e são 3- Chiò A, Logroscino G, Traynor BJ, et al. Global
capazes de deambular. Pacientes com tipo 4 (AME4) epidemiology of amyotrophic lateral sclerosis: a systematic
review of the published literature. Neuroepidemiology.
apresentam fraqueza mais branda de início na idade 2013;41(2):118-130.
adulta. A gravidade da doença é influenciada por 4- Hardiman O, van den Berg LH, Kiernan MC. Clinical
um número de cópias variável de um segundo gene diagnosis and management of amyotrophic lateral
sclerosis. Nat Rev Neurol. 2011;7(11):639-649.
SMN2 parálogo.
5- Ravits JM, La Spada AR. ALS motor phenotype
Nas últimas décadas, uma compreensão heterogeneity, focality, and spread: deconstructing motor
neuron degeneration. Neurology. 2009;73(10):805-811.
do papel da proteína SMN no desenvolvimento e
6- Wijesekera LC, Mathers S, Talman P, et al. Natural
manutenção da unidade motora e a genética intrincada
history and clinical features of the flail arm and flail leg ALS
subjacente à AME levou a desenvolvimentos notáveis variants. Neurology. 2009;72(12):1087-1094.
na terapêutica com três tratamentos aprovados pelo 7- Miller RG, Jackson CE, Kasarskis EJ, et al.
FDA, um visando a substituição do gene SMN1 Practice parameter update: The care of the patient
with amyotrophic lateral sclerosis: multidisciplinary
(onasemnogene abeparvovec-xioi) e dois outros care, symptom management, and cognitive/behavioral
que aumentam a produção da proteína SMN a partir impairment (an evidence-based review): report of the
Quality Standards Subcommittee of the American Academy
do gene SMN2 (nusinersen e risdiplam). Essas of Neurology. Neurology. 2009;73(15):1227-1233.
terapias são mais eficazes quanto mais precoces 8- Niedermeyer S, Murn M, Choi PJ. Respiratory failure in
são iniciadas. amyotrophic lateral sclerosis. Chest 2019;155(2):401–408.
9- Sarmento A, Fregonezi G, Dourado-Junior MET, et al.
Thoracoabdominal asynchrony and paradoxical motion in
middle stage amyotrophic lateral sclerosis. Respir Physiol
CONCLUSÃO Neurobiol 2019;259:16–25.
A ELA permanece como uma desordem 10- Lapchak PA. Neuronal dysregulation in stroke-
devastadora sem tratamentos substanciais associated pseudobulbar affect (PBA): diagnostic scales
and current treatment options. J Neurol Neurophysiol.
modificadores da progressão da doença. O 2015;6(5):323.
diagnóstico é clínico, com apoio de ENMG, com base 11- Massman PJ, Sims J, Cooke N, et al. Prevalence and
nos sinais e sintomas do neurônio motor superior e do correlates of neuropsychological deficits in amyotrophic
lateral sclerosis. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
neurônio motor inferior. Ressaltando que a orientação 1996;61(5):450–455.
adequada, o amparo do paciente e de familiares, a 12- Lomen-Hoerth C, Murphy J, Langmore S, et al. Are
condução assertiva e individualizada das decisões amyotrophic lateral sclerosis patients cognitively normal?
Neurology. 2003;60(7):1094–1097.
a serem tomadas (por exemplo, gastrostomia e
13- Lomen-Hoerth C, Anderson T, Miller B. The overlap of
traqueostomia) e os cuidados multidisciplinares
amyotrophic lateral sclerosis and frontotemporal dementia.
e integrados (nutrição, fonoaudiologia, terapia Neurology. 2002;59(7):1077–1079.
ocupacional, psicologia, fisioterapia respiratória e 14- Ludolph A, Drory V, Hardiman O, et al. A revision of
neurológica e aprendizado de novas habilidades) têm the El Escorial criteria – 2015. Amyotroph Lateral Scler
Frontotemporal Degener. 2015;16(5–6):291–292.
demonstrado um ganho significativo na sobrevida e,
principalmente, na qualidade de vida dos pacientes
Capítulo 28 357
15- Nodera H, Izumi Y, Kaji R. New diagnostic criteria of 27- Robberecht W, Philips T. The changing scene
ALS. Brain Nerve. 2007;59(10):1023–1029. of amyotrophic lateral sclerosis. Nat Rev Neurosci.
2013;14(4):248–264.
16- Fang T, Al Khleifat A, Stahl DR, et al. Comparison of
the King’s and MiToS staging systems for ALS. Amyotroph 28- Ilieva H, Polymenidou M, Cleveland DW. Non–cell
Lateral Scler Frontotemporal Degener. 2017;18(3–4):227– autonomous toxicity in neurodegenerative disorders: ALS
232. and beyond. J Cell Biology 2009;187:761–772.
17- de Carvalho M, Dengler R, Eisen A, England JD, Kaji 29- McGeer PL, McGeer EG. Inflammatory processes
R, Kimura J, Mills K, Mitsumoto H, Nodera H, Shefner J, in amyotrophic lateral sclerosis. Muscle Nerve
Swash M. Electrodiagnostic criteria for diagnosis of ALS. 2002;26(4):459–470.
Clin Neurophysiol. 2008;119(3):497-503.
30- Kern R, Cudkowicz M, Berry J, et al. NurOwn® Phase
18- Quinn C, Elman L. Amyotrophic Lateral Sclerosis and 2 ALS study: ALSFRS-R subscale responder analysis.
Other Motor Neuron Diseases. Continuum (Minneap Minn). Paper presented at: 70th Annual Meeting of the American
2020;26(5):1323-1347. Academy of Neurology. 2018;S38.002.
19- Benatar M, Boylan K, Jeromin A, et al. ALS biomarkers 31- Miller RG, Mitchell JD, Moore DH. Riluzole for
for therapy development: state of the field and future amyotrophic lateral sclerosis (ALS)/motor neuron disease
directions. Muscle Nerve. 2016;53(2):169–182. (MND). Cochrane Database Syst Rev. 2012;(2):CD001447.
20- Vijayakumar UG, Milla V, Cynthia Stafford MY, et 32- Maragakis NJ. What can we learn from the edaravone
al. A systematic review of suggested molecular strata, development program for ALS? Amyotroph Lateral Scler
biomarkers and their tissue sources in ALS. Front Neurol. Frontotemporal Degener. 2017;18(1):98–103.
2019;10:400.
33- Miller RG, Jackson CE, Kasarskis EJ, et al. Practice
21- Mori F, Kakita A, Takahashi H, Wakabayashi K. Co- parameter update: the care of the patient with amyotrophic
localization of Bunina bodies and TDP-43 inclusions in lateral sclerosis: drug, nutritional, and respiratory therapies
lower motor neurons in amyotrophic lateral sclerosis. (an evidence-based review): report of the Quality
Neuropathology. 2014;34(1):71–76. Standards Subcommittee of the American Academy of
Neurology. Neurology. 2009;73(15):1218–1226.
22- Neumann M, Sampathu DM, Kwong LK, et
al. Ubiquitinated TDP-43 in frontotemporal lobar 34- Bourke SC, Tomlinson M, Williams TL, Bullock RE,
degeneration and amyotrophic lateral sclerosis. Science. Shaw PJ, Gibson GJ. Effects of non-invasive ventilation
2006;314(5796):130–133. on survival and quality of life in patients with amyotrophic
lateral sclerosis: a randomised controlled trial. Lancet
23- Neumann M, Sampathu DM, Kwong LK, et
Neurol. 2006;5(2):140-147.
al. Ubiquitinated TDP-43 in frontotemporal lobar
degeneration and amyotrophic lateral sclerosis. Science. 35- Jawdat O, Statland JM, Barohn RJ, et al. Amyotrophic
2006;314(5796):130–133. lateral sclerosis regional variants (brachial amyotrophic
diplegia, leg amyotrophic diplegia, and isolated
24- Kwiatkowski TJ Jr, Bosco DA, Leclerc AL, et al.
bulbar amyotrophic lateral sclerosis). Neurol Clin.
Mutations in the FUS/TLS gene on chromosome 16
2015;33(4):775–785.
cause familial amyotrophic lateral sclerosis. Science.
2009;323(5918):1205–1208. 36- Madeira JLO, Souza ABC, Cunha FS, et al. A
severe phenotype of Kennedy disease associated with
25- Renton AE, Majounie E, Waite A, et al. A
a very large CAG repeat expansion. Muscle Nerve.
hexanucleotide repeat expansion in C9ORF72 is the
2018;57(1):E95-E97.
cause of chromosome 9p21-linked ALS-FTD. Neuron.
2011;72(2):257–268.
26- Chadi G, Maximino JR, Jorge FMH, Borba FC, Gilio
JM, Callegaro D. Genetic analysis of patients with familial
and sporadic amyotrophic lateral sclerosis in a Brazilian
Research Center. Amyotroph Lateral Scler Frontotemporal
Degener. 2017;18(3-4):249-255.
Capítulo 28 358
CAPÍTULO 29
SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ
Capítulo 29 359
necessidade da observação de um curso monofásico O maior número de desencadeadores e de
da doença para o diagnóstico de certeza, proposta anticorpos específicos fazem com que a cascata
pela mudança, faz com que a modificação dos imunológica presente na forma desmielinizante seja
critérios tenha pouca relevância no momento da mais complexa do que em sua forma axonal. Alguns
admissão do paciente, haja visto que a imunoterapia gangliosídeos como GM1 e GQ1b estão presentes
deve ser iniciada o mais precocemente possível e tanto na membrana axonal quanto nas membranas
a observação do curso da doença será feita em um gliais do nodo de Ranvier, o que pode acarretar
segundo momento. tanto desmielinização paranodal quanto o próprio
desacoplamento da bainha de mielina do axônio,
Como o próprio nome sugere, a injúria
prejudicando a condução do potencial de ação.
imunomediada tem como alvo a bainha de mielina
Outros anticorpos contra proteínas específicas
na AIDP e a membrana axonal (axolema) na AMAN.
do nodo de Ranvier já foram identificados na
A base da fisiopatologia da síndrome de Guillain-
AIDP, incluindo: gliomedina, contactina, TAG1,
Barré é a semelhança entre as moléculas de
moesina e neurofascina. A arquitetura molecular do
superfície dos organismos infecciosos e do axolema
complexo nodal, paranodal e justanodal medeia as
ou membrana glial do indivíduo. O mimetismo
interações axono-gliais e promove a fundação da
molecular decorre da indução da resposta imune
patogênese da SGB. O termo nodo-paranodopatia
por meio de anticorpos contra glicanas expressas
fora criado para descrever as injúrias nesse
nas membranas lipooligossacarídeas desses
domínio. A caracterização do tipo de lesão pode ser
organismos, como por exemplo o C. jejuni. Dessa
especialmente difícil nas nodo-paranodopatias, uma
forma, os anticorpos anti-lipooligossacarídeo se
vez que o estudo eletrofisiológico pode apresentar
ligam às estruturas semelhantes presentes nos
características muito semelhantes em ambas as
gangliosídeos do nervo. Na AMAN, os anticorpos
formas. O bloqueio de condução nodal, seja de
anti-gangliosídeos se ligam principalmente aos
origem axonal ou glial, pode ter apresentação clínica
gangliosídeos GM1 e GD1a. Em modelos animais, os
como uma forma grave e de rápida evolução, mas
anticorpos anti-gangliosideos causam injúria axonal
também com rápida recuperação após regeneração
através da deflagração da cascata de complemento,
das membranas afetadas no complexo nodal.
do recrutamento de macrófagos e do depósito de
Tal prognóstico difere da AMAN, no qual a lesão
imunocomplexos na membrana axonal. A integridade
axonal completa promove degeneração Walleriana
anatômica e fisiológica dos terminais nervosos e
e costuma ter pior prognóstico de recuperação,
nodos de Ranvier é afetada, ocasionando bloqueio
principalmente quando situada em localização
de condução reversível ou mesmo degeneração
distante ao músculo inervado2,12,13.
axonal, essa com pior prognóstico. A síndrome de
Miller-Fisher apresenta fisiopatologia semelhante,
mas com diferentes anticorpos associados.
Anticorpos anti-GQ1b, característicos da síndrome, QUADRO CLÍNICO
têm como alvo os gangliosídeos GQ1b que se A síndrome de Guillain-Barré é caracterizada
apresentam em grande concentração nos nervos por fraqueza rápida, progressiva e simétrica dos
cranianos motores que inervam a musculatura ocular membros, combinada com a hipo/arreflexia. A
extrínseca . Outros anticorpos séricos são descritos
12
presença, distribuição e extensão dos sintomas
na literatura (Tabela 2) e sua relação com a forma de de déficit sensitivo, dor, neuropatia craniana e
apresentação clínica é justificada pela distribuição disautonomia é bastante diversa. Parestesia e/
dos diferentes gangliosídeos nos diferentes nervos ou hipoestesia podem aparecer como sintomas
periféricos. sensitivos. Até metade dos pacientes pode
apresentar alguma neuropatia craniana, sendo a
Capítulo 29 360
Estudo de condução
Subtipos de SGB Quadro clínico Anticorpos*
nervosa
Polineuropatia Sensitivo-motor.
inflamatória Neuropatia cranial é Polirradiculoneuropatia
Diversos
desmielinizante comum. Disautonomia desmielinizante
aguda (AIDP) frequente
Capítulo 29 361
paralisia facial periférica bilateral e a dificuldade SGB de um paciente com polirradiculoneuropatia
na deglutição as mais comuns. A maior parte dos desmielinizante inflamatória crônica (PDIC) com
pacientes desenvolve dor, que pode até mesmo uma apresentação mais aguda do que o usual que,
preceder a fraqueza em cerca de um terço dos em geral, ocorre em 5 a 10% dos casos de PDIC16,17.
casos. As parestesias dolorosas, dor radicular, dor
A apresentação clínica da SGB adquire
muscular, lombalgia e meningismo são formas mais
diversas formas e corresponde aos diferentes
comuns de apresentação. Um quarto dos pacientes
graus de acometimento e da localização dos
chegam a necessitar de ventilação mecânica devido
neurônios afetados. A avaliação eletrofisiológica
à insuficiência respiratória. A disautonomia pode
é essencial para diferenciar as apresentações,
estar presente em até dois terços dos pacientes,
no entanto alguns parâmetros clínicos podem
com gravidade variável. A disfunção autonômica
corroborar com o diagnóstico. A forma mais
mais frequente consiste em desregulação do sistema
prevalente de SGB é a AIDP. Sua apresentação
cardiovascular, com variações da pressão arterial,
envolve sintomas predominantemente motores,
hipotensão postural, taquicardia sinusal e arritmias.
com padrão de fraqueza simétrica, progressiva e
Outras apresentações são as anormalidades
aguda, de acometimento proximal e distal. Apesar
pupilares e de sudorese. Disfunções esfincterianas
da forma clássica ser descrita como padrão
podem estar presentes, mas quando severas, devem
ascendente, a fraqueza proximal pode anteceder
alertar para diagnósticos diferenciais como mielopatia
a distal. Os sintomas sensitivos (parestesia e dor)
ou síndrome da cauda equina. É importante ressaltar
estão presentes na maioria dos casos e costumam
que parte dos pacientes manifesta sintomatologia
preceder os sintomas motores, no entanto as
mais branda e mantém a habilidade de andar durante
alterações sensitivas ao exame neurológico são
todo curso da doença1,2,5,14,15.
menos frequentes. Alguns pacientes podem
O curso da doença é monofásico e consiste em apresentar um quadro de paraparesia, com fraqueza
quatro fases: progressão, nadir, platô e recuperação. restrita aos membros inferiores, o que pode dificultar
Após início dos sintomas, cerca de 80% dos pacientes o diagnóstico. Um estudo mostrou que até 70%
atingem o nadir em até duas semanas e 97% dos desses pacientes podem persistir com paraparesia
pacientes em até quatro semanas. A fase de platô durante seguimento. É importante ressaltar que
tem sua duração bastante variável, com a maior parte a fraqueza marcadamente assimétrica é muito
dos pacientes iniciando a recuperação em até sete incomum em pacientes com SGB, e que quando
dias, mas podendo se prolongar por até seis meses. presente deve levar à investigação de diagnósticos
Apesar de possuir característica monofásica, cerca diferenciais14.
de 5% dos pacientes com SGB podem apresentar
A AMAN é a forma mais prevalente entre os
recorrências14. É importante lembrar, no entanto,
subtipos com acometimento axonal. A apresentação
que a deterioração relacionada ao tratamento pode
é essencialmente de sintomas motores, apesar de
ocorrer. Essa, por definição, acontece em até oito
uma minoria dos casos ter sintomas sensitivos18,19.
semanas do início do mesmo14,16,17. A piora ocorre
Normalmente, os sintomas iniciam nos membros
quando a fase de progressão do paciente tem
inferiores e são ascendentes. Na AMAN a paralisia de
sua duração maior do que o efeito do tratamento
nervos cranianos e sintomas autonômicos também
empregado. Um estudo mostrou que até 10% dos
podem estar presentes, mas são menos frequentes
472 pacientes apresentaram flutuação relacionada
do que na forma desmielinizante. Como as fibras
ao tratamento, enquanto apenas 5% dos pacientes
aferentes sensitivas tipo Ia estão preservadas, os
apresentou deterioração após mais de 8 semanas
reflexos tendinosos profundos refletem apenas à
do início dos sintomas14. Essa diferenciação pode
fraqueza do grupo muscular examinado. Uma parcela
ser importante ao distinguir um paciente com
Capítulo 29 362
dos pacientes pode apresentar reflexos normais orofaringe, do pescoço e dos ombros24 é discutida
ou até mesmo hiperreflexia20,21. Normalmente, os hoje como uma variante dentro de um espectro
pacientes com AMAN deterioram mais rapidamente contínuo entre SGB-MF-FCB devido à sobreposição
e a recuperação é mais prolongada do que na AIDP. clínica e imulógica frequente entre as formas
Alguns pacientes, no entanto, se recuperam de forma de apresentação25. A encefalite de Bickerstaff,
rápida, mesmo de apresentações severas, o que caracterizada por alteração do nível de consciência
pode estar relacionado ao mecanismo fisiopatológico ou hiperreflexia, associada a ataxia e oftalmoplegia e
das nodo-paranodopatias, discutido acima. A a neuropatia autonômica aguda também são outras
AMAN está mais associada à infecção prévia por formas clínicas dentro do espectro da SGB15,25.
Campylobacter jejuni18,19, dessa forma, a informação
de uma gastroenterite precedendo o quadro de SGB
pode ser valiosa. A neuropatia axonal sensitivo- DIAGNÓSTICO
motora aguda (AMSAN) é uma forma menos comum Conforme descrito anteriormente, o diagnóstico
e geralmente mais grave da SGB axonal . Pacientes
22
da Síndrome de Guillain-Barré é essencialmente
com AMSAN costumam apresentar um envolvimento clínico, mas a investigação adicional pode auxiliar
mais severo dos nervos sensitivos e motores e uma ou até mesmo ser necessária para confirmação
frequência maior de sintomas autonômicos, o que diagnóstica. A punção lombar, frequentemente
explica seu pior prognóstico. realizada em pacientes com suspeita de SGB,
A síndrome de Miller-Fisher (MF) é tem a dissociação proteíno-citológica como uma
caracterizada pela tríade de oftalmoplegia, ataxia e marcante característica, uma combinação entre
arreflexia. Apesar de não constar na tríade clássica, hiperproteinorraquia e contagem de células normais
não raro a fraqueza de membros está presente. no líquido cefalorraquidiano (LCR). Apesar de
Esses casos são considerados como uma forma importante, apenas 64% dos pacientes apresenta a
sobreposta de síndromes SGB-MF. A síndrome de dissociação. O aumento dos níveis de proteína no
Miller-Fisher compartilha os mesmos intervalos de LCR está presente em cerca de 50% dos pacientes
progressão e nadir da SGB clássica, bem como a nas primeiras 72h e em 80% após a primeira
dissociação proteíno-citológica e a relação frequente semana dos sintomas14. A pleocitose com mais de
com exposição a antígenos que precedem a doença, 50 células deve chamar a atenção para diagnósticos
sendo o mais comum C. jejuni. O prognóstico é diferenciais como HIV, linfoma e carcinomatose
favorável e a síndrome é considerada benigna e leptomeníngea1,14,26. É importante ressaltar que o
auto-limitada, com resolução dos sintomas em até uso de altas doses de imunoglobulina humana pode
6 meses na maioria dos pacientes11,15. A avaliação aumentar os níveis tanto de proteína quanto de
eletrofisiológica apresenta alteração no reflexo H células no LCR, o que pode atrapalhar o diagnóstico.
do músculo sóleo na maioria dos casos e o estudo Os estudos de condução e eletromiografia
de condução sensitivo e motor frequentemente são podem ser úteis para confirmar o acometimento de
normais, com apenas cerca de 30% dos pacientes nervo periférico ou radicular, bem como determinar
apresentando alteração no potencial de ação do padrões de acometimento, diferenciar entre subtipos
nervo sensitivo23. axonais e desmielinizantes e acrescentar informação
Outras variantes mais raras também fazem prognóstica quanto à extensão da lesão neural. Em
parte do acervo de síndromes clínicas que compõe casos com apresentação clínica de paraparesia,
o espectro da síndrome de Guillain-Barré. A variante a eletroneuromiografia pode ser essencial para
faringo-cérvico-braquial (FCB) inicialmente descrita determinar o acometimento subclínico dos membros
como uma fraqueza aguda na musculatura da superiores. O estudo de condução geralmente é
Capítulo 29 363
normal nas primeiras semanas da doença e as doenças da junção neuromuscular (miastenia
alterações eletrofisiológicas costumam surgir após gravis e botulismo), miopatias agudas graves como
duas semanas do início dos sintomas. Marcadores a miopatia necrosante imunomediada, paralisias
como o prolongamento ou ausência da onda-F, que periódicas e neuropatias vasculítica, do doente
reflete acometimento proximal de nervos, troncos ou crítico, PIDC, neuropatias carenciais, metabólicas
raízes, podem estar presentes na primeira semana. (diabetes e porfíria) e tóxicas (organofosforados e
Outra característica da forma desmielinizante é a hexacarbonos). A investigação adicional pode ser
preservação do potencial de ação sensitivo do nervo realizada caso a caso, a depender da apresentação
sural associado a potenciais sensitivos anormais clínica e subtipo da SGB. Nível sensitivo no exame
nos membros superiores 15,27
. físico neurológico sugere mielopatia. O acometimento
desproporcional da musculatura respiratória sugere
As anormalidades encontradas na
desordens do músculo ou da junção neuromuscular
eletroneuromiografia dependem do subtipo da
e quase nunca está presente em casos de PIDC.
SGB. Pacientes com AIDP revelam sinais de
desmielinização, como prolongamento da latência
motora distal, diminuição da velocidade de condução,
TRATAMENTO
prolongamento da latência da onda-F, dispersão
O tratamento de síndrome de Guillain-Barré
temporal e bloqueio de condução. Pacientes com
consiste em dois pilares igualmente importantes:
as formas axonais AMAN ou AMSAN demonstram
o suporte clínico na fase aguda e o tratamento
redução da amplitude dos potenciais motores
com imunoterapia. O cuidado multidisciplinar é
e/ou sensitivos, com ausência das alterações
importante, a fim de evitar complicações graves
desmielinizantes descritas. Alguns pacientes
da doença. Cerca de um quarto dos pacientes
com a forma axonal podem ser erroneamente
evolui com falência respiratória, fazendo com que
diagnosticados com AIDP devido à presença
a monitorização da capacidade vital forçada seja
de bloqueio de condução reversível no estudo
importante para a transferência precoce para uma
eletrofisiológico. Nesses casos, novos exames
unidade intensiva e intubação orotraqueal profilática,
seriados podem auxiliar o diagnóstico, uma vez que
quando necessário. A necessidade de ventilação
nas formas axonais, a recuperação dos potenciais
mecânica é mais comum entre os pacientes com
de ação ocorre sem a dispersão temporal2,15.
progressão rápida da doença, paralisia bulbar,
A dosagem de anticorpos antigangliosídeos acometimento de membros superiores e disfunção
não tem valor diagnóstico definido. Visto que a autonômica. Os pacientes graves devem ser
frequência em que os anticorpos estão presentes é monitorizados para avaliação de possíveis arritmias
baixa, o exame negativo não exclui a doença. Outro cardíacas. Anticoagulantes em doses profiláticas,
fator de confusão é que os anticorpos, principalmente como a heparina de baixo peso molecular, devem ser
o IgM, podem estar presentes em outras doenças, utilizados em pacientes. Outras complicações como
gerando falsos positivos. Os anticorpos anti-GQ1b, dor, úlceras de pressão e disfunção esfincteriana
anti-GM1 e anti-GD1a IgG podem ser considerados também exigem atenção e medidas específicas. É
exceções, já que o primeiro aparece em pelo menos importante lembrar que casos com paralisia facial
90% dos pacientes com Miller-Fisher e os outros periférica podem necessitar de oclusão oftálmica.
dois são bastante frequentes na AMAN 2,28,29
. A reabilitação precoce é tão importante quanto o
Apesar de facilmente reconhecida, a SGB emprego da terapia imunológica.
pode ser confundida com diversas desordens devido A imunoterapia na SGB compreende as
ao seu amplo espectro clínico. Os diagnósticos formas de plasmaférese e imunoglobulina humana
diferenciais mais comuns incluem mielopatias, endovenosa (IgEV). Os estudos realizados com
Capítulo 29 364
Características requeridas para o diagnóstico de SGB
● Fraqueza progressiva em MMII e MMSS (por vezes, inicialmente apenas em MMII)
● Arreflexia (ou hiporreflexia) nos membros paréticos
AIDP
Sintomas adicionais
● Fase progressiva dura de dias até 4 semanas
● Sintomas relativamente simétricos
● Sintomas ou sinais sensitivos leves
● Comprometimento de nervos cranianos, especialmente fraqueza dos músculos faciais bilateralmente
● Disfunção autonômica
● Dor (sintoma comum)
Estudo de condução nervosa
● Alterações sugestivas de desmielinização (possível de avaliar apenas se a amplitude do PAMC distal >
10% do LIN)
● Latência motora distal prolongada
● Velocidade de condução do neurônio motor diminuída
● Latência da onda-F aumentada, dispersão temporal e bloqueio de condução
AMAN
Sintomas adicionais
● Fase progressiva dura de dias até 4 semanas
● Sintomas relativamente simétricos
● Ausência de sintomas sensitivos
● Raro comprometimento de nervos cranianos
● Disfunção autonômica
● Dor (sintoma ocasional)
Estudo de condução nervosa
● Ausência de alterações sugestivas de desmielinização (ou 1 alteração em um nervo se a amplitude do
PAMC distal < 10% do LIN)
● Amplitude do PAMC distal < 80% do LIN em ao menos 2 nervos
● Bloqueio de condução transitório pode estar presente
Achados que lançam dúvida quanto ao diagnóstico de SGB
● Pleocitose (>50 células/uL)
● Disfunção pulmonar grave com fraqueza em membros pouco proeminente no início da doença
● Sinais sensitivos importantes com fraqueza em membros pouco proeminente no início da doença
● Disfunção esfincteriana inicial
● Febre
● Nível sensitivo medular
● Progressão lenta com fraqueza pouco proeminente e sem disfunção respiratória
● Fraqueza assimétrica marcante
● Disfunção esfincteriana persistente
Abreviações: SGB, síndrome de Guillain-Barré; PAMC, potencial de ação muscular composto; LIN, limite inferior
da normalidade
Tabela 2: Critérios diagnósticos para SGB.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 29 365
ambas as formas de tratamento selecionaram
REFERÊNCIAS
pacientes com base em uma escala de incapacidade, 1. Hughes RA, Cornblath DR. Guillain-Barré syndrome.
onde apenas os com grau 3 – andam dez metros Lancet. 2005;366(9497):1653-1666.
com apoio – ou superior receberam a imunoterapia. 2. van den Berg B, Walgaard C, Drenthen J, Fokke C,
A escala Guillain-Barré Syndrome Disability Scale Jacobs BC, van Doorn PA. Guillain-Barré syndrome:
pathogenesis, diagnosis, treatment and prognosis. Nat Rev
Scores varia de 0 a 6, na qual o maior número Neurol. 2014;10(8):469-482.
representa maior incapacidade. A eficácia para 3. Sejvar J J, Baughman A L, Wise M, Morgan O W.
o aceleramento da fase de recuperação fora Population incidence of Guillain-Barré syndrome: a
systematic review and meta-analysis. Neuroepidemiology.
comprovada tanto para a plasmaférese em até quatro 2011;36(2):123-33.
semanas após início dos sintomas, quanto para a 4. Rocha M S G, Brucki S M D, Carvalho A A de S, Lima U
imunoglobulina em até duas semanas após início W P. Epidemiologic features of Guillain-Barré syndrome in
São Paulo, Brazil. Arq. Neuro-Psiquiatr. 2004;62(1):33-37.
dos sintomas30. Apesar de eficácia equivalente, a
5. Malta JMAS, Vargas A, Leite PL, et al. Síndrome de
IgEV é de mais fácil acesso e manejo. A dose usual
Guillain-Barré e outras manifestações neurológicas
da imunoglobulina é de 2g/kg dividido em cinco dias, possivelmente relacionadas à infecção pelo vírus Zika
considerando 100kg como peso máximo. em municípios da Bahia, 2015. Epidemiol Serv Saúde.
2017;26(1):9-18.
A resposta ao tratamento é definida como 6. Malta JMAS, Ramalho WM. Aumento das internações
redução em um ou mais pontos na escala de por síndrome de Guillain-Barré no Brasil: estudo ecológico.
Epidemiol Serv Saúde. 2020; 29(4): e2020056.
incapacidade, após quatro semanas do tratamento.
7. Salmon DA, Proschan M, Forshee R, et al. Association
Cerca de 40 a 50% dos pacientes não apresentam between Guillain-Barré syndrome and influenza A (H1N1)
melhora significativa após o tratamento inicial. 2009 monovalent inactivated vaccines in the USA: a meta-
analysis. Lancet. 2013;381(9876):1461-1468.
Nesses casos, muitas vezes a terapia combinada
8. Poland G A, Jacobsen S J. Influenza vaccine,
é empregada, normalmente com a plasmaférese Guillain-Barré syndrome, and chasing zero. Vaccine.
seguida da IgEV. No entanto, em 1997 um estudo 2012;30(40):5801-5803.
mostrou que não há benefício da terapia combinada 9. Freitas MRG, Vidal CM, Orsini M. Guillain-Barré
em relação à qualquer uma das monoterapias . A 31 syndrome: celebrating a century. Arq Neuropsiquiatr.
2017;75(8):600-603.
IgEV seguida de plasmaférese apesar de pouco
10. Asbury AK, Cornblath DR. Assessment of current
intuitiva, também pode ser utilizada, no entanto diagnostic criteria for Guillain-Barré syndrome. Ann Neurol.
assim como a primeira, não mostrou eficácia ao 1990;27:S21-24.
comparada com IgEV em monoterapia.32 Outra forma 11. Sejvar JJ, Kohl KS, Gidudu J, et al. Guillain-Barré
syndrome and Fisher syndrome: case definitions and
de tratamento em casos refratários é a repetição guidelines for collection, analysis, and presentation of
da dose de IgEV em pacientes refratários ao immunization safety data. Vaccine. 2011;29(3):599-612.
primeiro tratamento com IgEV. Até o momento não 12. Willison HJ, Jacobs BC, van Doorn PA. Guillain-Barré
syndrome. Lancet. 2016;388(10045):717-727.
há nenhum estudo randomizado para confirmar ou
13. Uncini A, Susuki K, Yuki N. Nodo-paranodopathy:
refutar a eficácia dessa modalidade de tratamento.33
beyond the demyelinating and axonal classification in
Como discutido anteriormente, cerca de 10% dos anti-ganglioside antibody-mediated neuropathies. Clin
pacientes tratados apresentam uma piora de 1 Neurophysiol. 2013;124(10):1928-1934.
ponto ou mais na escala de incapacidade em até 14. Fokke C, van den Berg B, Drenthen J, Walgaard C, van
Doorn PA, Jacobs BC. Diagnosis of Guillain-Barré syndrome
8 semanas do início dos sintomas, após a melhora and validation of Brighton criteria. Brain. 2014;137(1):33-43.
inicial. Essa situação é conhecida como flutuação 15. Sheikh KA. Guillain-Barré Syndrome. Continuum
relacionada ao tratamento e seu reconhecimento é (Minneap Minn). 2020;26(5):1184-1204.
importante principalmente ao diferenciar dos casos 16. Ruts L, Drenthen J, Jacobs BC, van Doorn PA; Dutch
GBS Study Group. Distinguishing acute-onset CIDP from
de PIDC aguda.
fluctuating Guillain-Barre syndrome: a prospective study.
Neurology. 2010;74(21):1680-1686.
Capítulo 29 366
17. Kleyweg R P, van der Meché F G. Treatment related 26. van Doorn P A. Diagnosis, treatment and prognosis
fluctuations in Guillain-Barré syndrome after high-dose of Guillain-Barré syndrome (GBS). Presse Med.
immunoglobulins or plasma-exchange. J Neurol Neurosurg 2013;42(6):e193-201.
Psychiatry. 1991;54(11):957-960.
27. Derksen A, Ritter C, Athar P, et al. Sural sparing pattern
18. Kuwabara S, Yuki N. Axonal Guillain-Barré discriminates Guillain-Barré syndrome from its mimics.
syndrome: concepts and controversies. Lancet Neurol. Muscle Nerve. 2014;50(5):780-784.
2013;12(12):1180-1188.
28. Mori M, Kuwabara S. Fisher syndrome. Curr Treat
19. Van der Meché FG, Van Doorn PA, Meulstee J, Options Neurol. 2011;13(1):71-78.
Jennekens FG; GBS-consensus group of the Dutch
29. Kuwabara S, Yuki N. Axonal Guillain-Barré
Neuromuscular Research Support Centre. Diagnostic and
syndrome: concepts and controversies. Lancet Neurol.
classification criteria for the Guillain-Barré syndrome. Eur
2013;12(12):1180-1188.
Neurol. 2001;45(3):133-139.
30. Hughes RA, Swan AV, van Doorn PA. Intravenous
20. Yuki N, Kokubun N, Kuwabara S, et al. Guillain-Barré
immunoglobulin for Guillain-Barré syndrome. Cochrane
syndrome associated with normal or exaggerated tendon
Database Syst Rev. 2014;2014(9):CD002063.
reflexes. J Neurol. 2012;259(6):1181-1190.
31. Plasma Exchange/Sandoglobulin Guillain-Barré
21. Uncini A, Notturno F, Kuwabara S. Hyper-reflexia in
Syndrome Trial Group. Randomised trial of plasma
Guillain-Barré syndrome: systematic review. J Neurol
exchange, intravenous immunoglobulin, and combined
Neurosurg Psychiatry. 2020;91(3):278-284.
treatments in Guillain-Barré syndrome. Plasma Exchange/
22. Feasby TE, Gilbert JJ, Brown WF, et al. An acute Sandoglobulin Guillain-Barré Syndrome Trial Group. Lancet.
axonal form of Guillain-Barré polyneuropathy. Brain. 1997;349(9047):225-230.
1986;109(6):1115-1126.
32. Oczko-Walker M, Manousakis G, Wang S, Malter J S,
23. Kuwabara S, Sekiguchi Y, Misawa S. Electrophysiology Waclawik A J. Plasma exchange after initial intravenous
in Fisher syndrome. Clin Neurophysiol. 2017;128(1):215- immunoglobulin treatment in Guillain-Barré syndrome:
219. critical reassessment of effectiveness and cost-efficiency. J
Clin Neuromuscul Dis. 2010;12(2):55-61.
24. Ropper A H. Unusual clinical variants and signs in
Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol. 1986;43(11):1150- 33. Verboon C, van den Berg B, Cornblath DR, et al.
1152. Original research: Second IVIg course in Guillain-Barré
syndrome with poor prognosis: the non-randomised ISID
25. Nagashima T, Koga M, Odaka M, Hirata K, Yuki N.
study. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2020;91(2):113-121.
Continuous spectrum of pharyngeal-cervical-brachial variant
of Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol. 2007;64(10):1519-
1523.
Capítulo 29 367
CAPÍTULO 30
MIASTENIA GRAVIS
raro de doenças que afetam a junção neuromuscular na Porém tem se observado um aumento da prevalência,
medicamentos como, por exemplo, inibidores ambos os sexos e qualquer idade, a depender do subtipo
No geral se caracterizam por fatigabilidade flutuante Não é uma doença hereditária, porém parece haver
de músculos esqueléticos, sendo a musculatura ocular relação genética, uma vez que fora demonstrado risco
a mais afetada inicialmente ou no decorrer do curso da de 4,5% de desenvolvimento da doença em parentes de
Capítulo 30 368
No nervo, há três reservatórios de acetilcolina – uma de acetilcolina (distúrbios pós-sinápticos) ou pela
zona ativa com moléculas de liberação imediata baixa quantidade de acetilcolina liberada das
(aproximadamente 1000 quanta), uma segunda vesículas (distúrbios pré-sinápticos), insuficientes
zona inativa com aproximadamente 10 mil quanta para a geração de um potencial de ação na fibra
e uma terceira zona de depósito com moléculas muscular.
procedentes da ressíntese de acetilcolina com cerca
A miastenia gravis é uma doença autoimune
de 100 mil quanta.
e os anticorpos envolvidos na patologia são
Normalmente é liberado na fenda sináptica primariamente da classe IgG 1-4, sendo os da classe
cerca de 20% da acetilcolina armazenada. Caso IgG4 os únicos não ativadores de complemento.
persista o estímulo para liberação, há uma redução
Não se tem uma explicação quanto à origem
da quantidade de vesículas liberadas devido ao
da autoimunidade, mas anormalidades tímicas e
esgotamento do estoque da primeira zona. Caso o
predisposição genética fazem parte dos mecanismos.
estímulo persista por ainda mais tempo, a segunda
zona é recrutada e a liberação do transmissor é Oitenta por cento dos pacientes apresentam
Capítulo 30 369
fraqueza dos músculos faciais, da mastigação, da descrita como juvenil naquelas iniciadas antes dos
deglutição ou da fala, sendo que em 5 a 10% serão 15 anos, forma que é mais comum no oeste asiático.
as manifestações iniciais.
Está associada à presença dos HLA DR3, B8
Outras características comumente e genes não HLA.
encontradas são o chamado “sorriso canino” –
Mais comumente está associada à presença de
um sorriso “reto” – e a atrofia da língua na forma
anticorpos anti receptor de acetilcolina e apresenta
associada ao anticorpo anti-MuSK.
uma relação de afecção entre homens e mulheres
No geral, é difícil diferenciar os subtipos de 1:3. Não se sabe o porquê de mulheres serem
ocasionados pelos diversos anticorpos baseados mais afetadas, porém é o padrão de acometimento
apenas na apresentação clínica. mais frequentemente visto nas doenças auto-imunes
em geral.
Não é incomum não ser identificado um fator
precipitante para os sintomas, porém podem ser Mais de 80% dos casos estão relacionados
desencadeados por infecções, estresse emocional, à hiperplasia tímica, caracterizada pelo achado
trauma físico, descompensação de comorbidades histopatológico de infiltrado linfocítico e centros
(por exemplo, hipo/hipertireoidismo), procedimentos germinais similares àqueles dos linfonodos,
cirúrgicos, gestação ou parto e exposição a contendo linfócitos T e B e células plasmocitárias.
determinados medicamentos.
Costuma ter boa resposta à timectomia
Sendo a miastenia uma doença autoimune, quando realizada nos primeiros dois anos da doença
é comum a identificação concomitante de outras e, também, à terapia imunossupressora1.
doenças autoimunes, que devem ser pesquisadas
ativamente caso não haja diagnóstico prévio. As Forma generalizada de início tardio
mais comuns são tireoidite de Hashimoto, lúpus Início após os 50 anos de idade. Parece
eritematoso sistêmico e artrite reumatoide. Há ter uma incidência discretamente maior no sexo
relatos de coexistência com doenças do espectro masculino. Associada com os genes HLA DR2, B7
de neuromielite óptica com a presença do anticorpo e DRB1.
anti-aquaporina 4 e esclerose múltipla1,4.
Relacionada a diversos tipos de anticorpos
além do anti-AchR, como anti-titina, anti-interleucina
2, anti-receptor da rianodina e anti-interferon gama,
CLASSIFICAÇÃO que geralmente estão associados a sintomas mais
Pode ser classificada conforme dados severos.
clínicos, epidemiológicos, imunológicos e patologia
O timo encontra-se comumente atrofiado ou
tímica, em ocular pura, generalizada com início
normal. Apresenta boa resposta à imunoterapia1.
precoce (antes dos 45 anos) ou tardio (após os 45
anos) e timomatosa. Ainda, pode ser baseada nos
anticorpos detectados – anti receptor de acetilcolina Forma associada ao anticorpo anti-MuSK
(anti-AchR), anti quinase músculo-específica (anti- Corresponde a cerca de 5 a 8% de todos os
MuSK), anti proteína 4 relacionada com o receptor casos e 40% das miastenias generalizadas negativas
da lipoproteína de baixa densidade (anti-LRP4), para anti-AchR.
entre outros.
A afecção do MuSK, um polipeptídeo
transmembrana envolvido na manutenção funcional
Forma generalizada de início precoce
da integridade da junção neuromuscular, acaba
Tem início antes dos 50 anos de idade, sendo
afetando a mudança conformacional necessária do
Capítulo 30 370
Figura 1: A transmissão neuromuscular envolve a liberação de acetilcolina (Ach) na fenda sináptica, que se liga aos
receptores de acetilcolina (AchR) na membrana pós-sináptica. Os receptores interagem com outras proteínas da
membrana para permitir a transmissão do sinal e geração do potencial de ação da fibra muscular. A acetilcolinesterase
(AchE) na membrana pós-sináptica degrada as moléculas de Ach já utilizada para permitir sua re-síntese.
Fonte: O autor, 2021.
Capítulo 30 371
AchR para continuidade da transmissão do potencial demonstram redução dos receptores de acetilcolina à
de ação à fibra muscular. biópsia muscular e hiperplasia tímica à histopatologia
do orgão.
Pode ter início em qualquer idade, com pico de
incidência na 3ª década de vida, com predominância Estudos recentes demonstraram a presença
no sexo feminino (mais de 70%). de anticorpos IgG1 de menor afinidade pelo AchR em
pacientes previamente tidos como soronegativos,
O anticorpo anti-MuSK, diferentemente dos
que se ligam ao receptor já agrupado, porém esses
anticorpos anti-AchR, são da classe IgG4 e por isso
testes não são ainda comercialmente disponíveis8,9.
não ativam a cascata do complemento.
Capítulo 30 372
de todos os pacientes. É comum haver positividade eletrofisiológicos tem uma boa acurácia diagnóstica,
para ambos os anticorpos. porém a sensibilidade destes métodos não é muito
elevada em alguns contextos e, assim, os testes
Acomete mais indivíduos do sexo feminino e
imunológicos (anticorpos) podem acrescentar
a idade de apresentação inicial é por volta dos 44
informações complementares importantes.
anos.
Capítulo 30 373
sialorreia, sudorese, náusea, cólicas abdominais A estimulação repetitiva de baixa frequência
e fasciculações. Ainda, deve-se atentar para a (2 a 5 Hz) depleta os estoques de liberação imediata
possibilidade, apesar de infrequente, de hipotensão de acetilcolina do terminal nervoso, levando à
e bradicardia e, por esse motivo, recomenda-se falha na transmissão do potencial por volta do
fazer o teste em ambiente hospitalar controlado, sob 4º ou 5º estímulo, quando se recrutam vesículas
monitorização contínua e com disponibilidade de das zonas subsequentes de armazenamento do
atropina. neurotransmissor e a transmissão se estabiliza.
Para sua realização deve-se suspender o uso Eletromiografia de fibra única (EMG-FU)
de qualquer anticolinesterásico pelo menos 12 horas
antes do exame.
Capítulo 30 374
Mensura o tempo comparativo para a ativação Outros anticorpos contra componentes intra
de duas fibras musculares inervadas pela mesma ou extracelulares da junção neuromuscular já foram
unidade motora (jitter). descritos, incluindo a titina, o receptor de rianodina,
a agrina, o colágeno Q, os canais de potássio Kv1.4,
É considerado positivo (alterado) quando pelo
a proteína 4 relacionada ao receptor de lipoproteína
menos 15 pares de registros apresentam diferença
de baixa densidade (LRP4) e a cortactina, porém
maior do que dois desvios padrão ou 10% acima da
suas utilidades clínicas ainda estão em análise.18
normalidade. Os valores de referência variam de
acordo com a idade e o músculo em questão. Até 10 a 15% dos pacientes serão soronegativos
após uma primeira testagem. Nesses pacientes, a
É um exame operador dependente e pode
análise deve ser repetida em 6 a 12 meses. Acredita-
variar conforme o músculo e a quantidade de
se que a prevalência real da doença soronegativa é
músculos analisados e, por isso, apresenta
ainda mais baixa. Ensaios baseados em células são
sensibilidade variável, estimada entre 80 a 99%,
mais sensíveis para detecção e estão disponíveis
sendo considerado o teste mais sensível14,15.
para a testagem dos anticorpos anti-AchR, anti-
Para o diagnóstico de formas oculares, o MuSK e anti-LRP4, porém não comercialmente. Até
músculo de maior sensibilidade diagnóstica é o um terço dos pacientes soronegativos nos testes
orbicularis oculi, com sensibilidade média de 80%, habituais são soropositivos nos testes baseados em
especificidade de 80%, valor preditivo positivo de células1,9.
90% e valor preditivo negativo de 61%. Assim, um
Idealmente a testagem imunológica deve
teste positivo em paciente com suspeita de miastenia
ser feita sem o uso de imunossupressores por
ocular suporta o diagnóstico, porém um resultado
preferencialmente 6 meses.
negativo não exclui em até 40% dos casos. Em
pacientes com ptose palpebral a sensibilidade chega
a 99% e pode ser tão baixa quanto 32% naqueles Anticorpo anti-AchR
com diplopia pura.
Ligante
O achado de um jitter normal em um músculo
Forma mais comumente disponível do teste,
clinicamente fraco descarta a presença de defeito na
apresenta a maior sensibilidade dos testes, estando
transmissão neuromuscular, porém a presença de
entre 70 e 95% em formas generalizadas e 50 e
alteração não é específica para doenças da junção
75% na forma ocular. Considerado positivo para
neuromuscular.
valores >0,08nmol/L. Sua concentração não prediz
Resultados falso-positivos são vistos em a gravidade da doença e uma dosagem negativa
pacientes com oftamoplegia externa crônica e não exclui o diagnóstico. Sua especificidade gira em
algumas neuropatias. Falso-negativos geralmente torno de 90%.
estão associados à sintomatologia branda e/ou
Resultados falso-positivos são raros, porém
diplopia isolada17.
podem ocasionalmente acontecer em hepatites
autoimunes, lúpus, artrite reumatoide, timoma sem
miastenia.
Testes imunológicos
Valores maiores são mais positivamente
Em 80 a 90% dos pacientes com miastenia
correlacionados com verdadeiros positivos, porém
gravis os anticorpos anti-AchR serão identificados.
não predizem a severidade da doença8,14,18.
Aqueles negativos para esses anticorpos, com
doença generalizada, mais comumente serão
positivos para o anticorpo anti-MuSK.
Capítulo 30 375
Figura 4: Registro de jitter durante ativação voluntária. A. eletrodo de FU inserido para registrar potenciais de duas ou
mais fibras pertencentes à mesma unidade motora. Um dos potenciais de ação serve de referência e o intervalo entre
os potenciais é medido em descargas consecutivas. B. músculo normal: há variação mínima no intervalo entre os dois
potenciais em descargas repetitivas (jitter normal). C. doença da JNM: marcada variabilidade no intervalo entre os
potenciais (jitter anormal).
Fonte: Adaptado de Meriggioli & Sanders, 200514.
Capítulo 30 376
Modulador Estratégia diagnóstica sugerida
Mede a taxa de degradação do receptor de Varia conforme a forma de apresentação, a
acetilcolina. É considerado positivo em valores sensibilidade e especificidade dos testes disponíveis
>20%. Tem utilidade clínica naqueles em que e a experiência dos profissionais envolvidos nas
o ligante é negativo, uma vez que ocorre em 3 testagens.
a 4% desses pacientes. Porém, sua dosagem
Os testes à beira do leito podem ser realizados
concomitante naqueles pacientes positivos para a
naqueles pacientes que apresentam ptose palpebral.
detecção dos anticorpos ligantes aumenta a acurácia
e especificidade diagnóstica para até 95%, visto ser A eletroneuromiografia é um teste amplamente
alterações tímicas, em especial o timoma. ainda investigação torácica com imagem (tomografia
ou ressonância)8,14.
Deve-se atentar para o risco em potencial de
exacerbação dos sintomas com o uso de contraste
iodado.
Capítulo 30 377
Testes à beira do leito
Anticolinesterásicos Úteis para pacientes com ptose/fraqueza da MOE
Autoanticorpos
Anti-AchR 85% MG generalizada, 50% MG ocular
Anti-MuSK 40% MG generalizada negativa para anti-AchR
Anti-AchR de baixa afinidade 66% MG generalizada negativa para anti-AchR e anti-
MuSK
Anti-Titina 95% MG timomatosa; 50% MG não timomatosa de início
tardio
Anti-receptor de rianodina 70% MG timomatosa
Tabela 1: Testes à beira do leito eletrofisiológicos e de auto-anticorpos.
Fonte: Adaptado de Meriggioli & Sanders, 20098.
Disfunção de SNC ocasionando disfunção de nervos Início pode ser súbito; afecção da consciência,
cranianos coordenação e sensibilidade; fraqueza ocular na
distribuição de nervos individuais
Tabela 2: Diagnósticos diferenciais.
Fonte: Adaptado de Meriggioli & Sanders, 20098.
Capítulo 30 378
TRATAMENTO Terapia imunossupressora
Remissão espontânea completa é rara, mas Usadas em pacientes que não têm melhora
já foi reportada em até 10 a 20% dos pacientes e satisfatória com inibidores da acetilcolinesterase
três quartos dos pacientes têm boa resposta aos isoladamente.
tratamentos convencionais.
A primeira linha de tratamento são os
Dentre as modalidades de tratamento corticosteroides (prednisona ou prednisolona) em
medicamentoso podem-se dividir em duas combinação ou não com a azatioprina.
categorias: sintomáticos e imunossupressores. Há
ainda pacientes que se beneficiam da timectomia. Corticosteroides
Prednisona e prednisolona são igualmente
A escolha do regime terapêutico deve ser
eficazes e a dose alvo dependerá do quadro clínico
individualizada e não existe consenso sobre um
do paciente, chegando geralmente até 1 a 1,5mg/kg,
único melhor tratamento.
a um máximo de 60 a 100 mg/dia.
O objetivo deve ser sempre a manutenção do
Recomenda-se o aumento gradual da dose,
estado de manifestação mínima, caracterizada por
pois até 50% dos pacientes podem apresentar
ausência de sintomas ou de limitações funcionais,
uma piora inicial nas duas primeiras semanas de
ainda que haja alguma fraqueza evidente ao exame
tratamento, caso doses mais altas sejam prontamente
físico, na ausência de efeitos adversos severos.
iniciadas. Após atingida melhora, a dose deve ser
reduzida até a menor dose eficaz, podendo ter
Inibidores da acetilcolinesterase sido acrescentada outra terapia imunossupressora
São medicamentos sintomáticos com boa poupadora de corticoide para possibilitar essa
resposta por todos os subtipos da doença, apesar redução de dose ou não8.
de as formas anti-MuSK poderem apresentar uma
Nas formas oculares puras, que não obtiverem
resposta pouco menos favorável em comparação
melhora satisfatória apenas com medicamentos
com as demais.
sintomáticos após 4 a 6 semanas, uma dose menor
A piridostigmina representa o medicamento de corticoide geralmente é suficiente (10 a 15mg/
preferencial para início do tratamento em todas as dia), podendo-se iniciar com doses pouco mais
formas. A dose é baseada na resposta sintomática elevadas (geralmente não superiores a 25mg/dia)
e tolerância ao medicamento e costuma variar e reduzidas após melhora clínica até a menor dose
de 60 a 600 mg/dia. A maioria dos pacientes eficaz19.
acaba conseguindo ajustar sua própria dose, com
A maioria dos pacientes apresenta melhora
possibilidades de variação entre os dias, conforme
clínica em uma média de 2 a 3 semanas, podendo, no
sintomatologia e possíveis fatores precipitadores de
entanto, levar até 2 a 3 meses ou mais. A resolução
piora como, por exemplo, o calor.
da oftalmoparesia persistente pode levar tempo
Pacientes com sintomas leves e boa resposta mais longo, em média de sete meses, podendo se
aos sintomáticos não necessitam de outra terapia estender para >1 ano20.
adjuvante.
Não há evidência clara de que o uso de
Os efeitos colaterais mais comuns são diarreia, corticosteroides em formas oculares previna a
cólicas abdominais, flatulência, náusea, sialorreia e progressão para formas generalizadas. Assim, seu
sudorese1. uso com o intuito somente profilático, frente aos
potenciais efeitos adversos, não é recomendado8,19,20.
Capítulo 30 379
Os principais efeitos colaterais são metotrexate.
relacionados ao uso crônico dos corticoides. São
Atualmente vem-se observando um
eles: distúrbios hidroeletrolíticos como hipocalemia
crescimento no desenvolvimento de drogas alvo-
e retenção líquida com aumentos pressóricos,
específicas para o tratamento da miastenia gravis,
intolerância à glicose e diabetes, osteoporose,
com algumas já aprovadas para uso em alguns
ansiedade e psicose, glaucoma e catarata, miopatia
países, como o eculizumab, e outras em estágio
induzida por esteroides, supressão do crescimento
avançado de estudo.
(em crianças) e úlcera péptica. Os efeitos colaterais
devem ser manejados com o ajuste da dose do Ainda, para resgate em caso de piora clínica ou
Capítulo 30 380
parece ser menor que as demais terapias disponíveis. e risco aumentado de infecções e neoplasias8,1.
Capítulo 30 381
Deve ser administrada vacina contra estimado em até três anos, e visa a possibilidade de
meningococo sorotipos A, C, Y, W135 e B pelo redução da menor dose eficaz de imunossupressor.
menos 2 semanas antes de iniciar o tratamento
Indicada para pacientes com timoma, doença
ou, caso o eculizumab tenha sido iniciado antes
generalizada não-timomatosa anti-AchR positivo
do período recomendado após a vacinação, deve-
entre 18 e 50 anos em estágio precoce e doença
se manter cobertura antibiótica idealmente com
generalizada anti-AchR negativo refratária ao
fenoximetilpenicilina oral 250 a 500 mg (400.000 a
tratamento imunossupressor. Pode ser realizada
800.000 Ui) de 12 em 12h, por pelo menos quatro
em pacientes com miastenia ocular com anticorpo
semanas após a vacina. Em pacientes alérgicos à
anti-AchR detectável e resposta insatisfatória aos
penicilina pode-se utilizar azitromicina 500 mg ao dia,
anticolinesterásicos que não possam fazer uso de
ciprofloxacino 500 mg ao dia ou eritromicina 500 mg
imunossupressores ou que sejam refratários a eles.
duas vezes ao dia, porém quinolonas e macrolídeos
podem precipitar piora do quadro miastênico, o que Não há dados que suportem a indicação de
torna a profilaxia nesses pacientes difícil e reforça a timectomia em pacientes com miastenia relacionada
necessidade de vacinação prévia, dentro do prazo aos anticorpos anti-MuSK, anti-LRP4 ou anti-Agrina.
Os principais efeitos colaterais descritos são (aberto ou por vídeo), devendo-se preferir aquele
Capítulo 30 382
Aminoglicosídeos Usar com cautela se não houver outra opção de tratamento
Capítulo 30 383
paciente em uso de anticolinesterásico, apesar de sua quadro miastênico transitório devido à passagem
ocorrência ser rara. Após a intubação, recomenda- transplacentária de anticorpos, que acontece em
se suspender o uso dos anticolinesterásicos, pois cerca de 20% dos bebês e não tem relação com
eles podem atrapalhar o manejo das secreções de a severidade da doença materna ou sua titulação
vias aéreas .21
de anticorpos. Geralmente o quadro tem início
nas primeiras horas, é autolimitado em até poucos
Miastenia e gestação meses e requer apenas tratamento suportivo.
Recomenda-se que a programação da Sinais sugestivos do acometimento são choro fraco,
gestação se dê uma vez que a doença encontre-se hipotonia e dificuldade de sucção. Raramente pode
com bom controle clínico. manifestar-se já intra-útero e levar à artrogripose
A maioria das pacientes permanece estável múltipla.
durante a gestação e, caso ocorra descompensação, Durante o aleitamento o corticoide deve ser
essa é mais comum no primeiro trimestre e até três mantido na menor dose possível e atentar para
meses após o parto. sinais de crise colinérgica no recém-nascido devido
Em caso de haver piora clínica durante ao uso da piridostigmina. Naquelas pacientes em
a gestação, tratamentos com imunoglobulina e tratamento com imunossupressores não esteroidais
plasmaférese são seguros. a amamentação deve ser contraindicada.
A primeira linha de tratamento durante a Vacinas de vírus vivos não devem ser
gravidez é a piridostigmina e, caso haja necessidade administradas à criança nos primeiros meses de vida
de imunossupressão, corticosteroides. A azatioprina devido ao risco de imunossupressão pela passagem
e a ciclosporina parecem ser opções seguras transplacentária dos medicamentos21.
caso haja impossibilidade do uso do corticoide. O
micofenolato e o metotrexate têm riscos elevados
de teratogenicidade e são portanto contraindicados. REFERÊNCIAS
1. Gilhus NE. Myasthenia Gravis. N Engl J Med.
É recomendado aguardar pelo menos 1 ano para 2016;375(26):2570-2581.
engravidar após o término do tratamento com
2. Preston DC, Shapiro BC. Electromyography and
rituximab. neuromuscular disorders: clinical-electrophysiologic
correlations. London: Elsevier Saunders; 2013.
Caso o diagnóstico seja em vigência de
3. Ohkawara B, Ito M, Ohno K. Secreted Signaling
gestação, a realização da tomografia de tórax e a Molecules at the Neuromuscular Junction in Physiology
timectomia, caso haja indicação, devem ser adiadas and Pathology. International Journal of Molecular Sciences.
2021;22(5):2455.
para após o parto.
4. Grob D, Brunner N, Namba T, Pagala M. Lifetime course
Recomenda-se não fazer uso de sulfato de of myasthenia gravis. Muscle & Nerve. 2007;37(2):141–149.
magnésio no manejo da eclâmpsia devido aos efeitos 5. Farrugia ME. MRI and clinical studies of facial and
bulbar muscle involvement in MuSK antibody-associated
de bloqueio à junção neuromuscular. Barbitúricos ou myasthenia gravis. Brain. 2006;129(6):1481–1492.
fenitoína apresentam efeito terapêutico adequado e 6. Rodolico C, Bonanno C, Toscano A, Vita G. MuSK-
maior segurança. Associated Myasthenia Gravis: Clinical Features and
Management. Frontiers in Neurology. 2020;11(660).
A via de parto é de indicação obstétrica, não
7. Pasnoor M, Wolfe GI, Nations S, et al. Clinical findings
havendo contraindicação a nenhum meio, podendo in MuSK-antibody positive myasthenia gravis: a U.S.
ser necessário uso de fórceps no parto normal a fim experience. Muscle Nerve. 2010;41(3):370-374.
Capítulo 30 384
9. Rodríguez Cruz PM, Al-Hajjar M, Huda S, et al. Clinical 18. Shelly S, Paul P, Bi H, et al. Improving accuracy of
Features and Diagnostic Usefulness of Antibodies to myasthenia gravis autoantibody testing by reflex algorithm.
Clustered Acetylcholine Receptors in the Diagnosis Neurology. 2020;95(22):e3002–11.
of Seronegative Myasthenia Gravis. JAMA Neurol.
19. Benatar M, Mcdermott MP, Sanders DB, et al. Efficacy
2015;72(6):642-649.
of prednisone for the treatment of ocular myasthenia
10. Grob D, Brunner NG, Namba T. The natural course of (EPITOME): A randomized, controlled trial. Muscle Nerve.
myasthenia gravis and effect of therapeutic measures. Ann 2016;53(3):363-369.
N Y Acad Sci. 1981;377:652-669.
20. Europa TA, Nel M, Heckmann JM. Myasthenic
11. Peeler CE, De Lott LB, Nagia L, Lemos J, Eggenberger ophthalmoparesis: Time To resolution after initiating immune
ER, Cornblath WT. Clinical Utility of Acetylcholine Receptor therapies. Muscle & Nerve. 2018;58(4):542–549.
Antibody Testing in Ocular Myasthenia Gravis. JAMA
21. Sanders DB, Wolfe GI, Benatar M, et al. International
Neurology. 2015;72(10):1170.
consensus guidance for management of myasthenia gravis:
12. Rivner MH, Quarles BM, Pan JX, et al. Clinical features Executive summary. Neurology. 2016;87(4):419-425.
of LRP4/agrin-antibody-positive myasthenia gravis: A
22. Narayanaswami P, Sanders DB, Wolfe G, et al.
multicenter study. Muscle Nerve. 2020;62(3):333-343.
International Consensus Guidance for Management
13. Czaplinski A, Steck AJ, Fuhr P. Ice pack test for of Myasthenia Gravis: 2020 Update. Neurology.
myasthenia gravis. Journal of Neurology. 2003;250(7):883– 2021;96(3):114-122.
884.
23. Mantegazza R, Wolfe GI, Muppidi S, et al. Post-
14. Meriggioli MN, Sanders DB. Advances in the Diagnosis intervention Status in Patients With Refractory Myasthenia
of Neuromuscular Junction Disorders. American Journal of Gravis Treated With Eculizumab During REGAIN and Its
Physical Medicine & Rehabilitation. 2005;84(8):627-638. Open-Label Extension. Neurology. 2021;96(4):e610-e618.
15. Benatar M. A systematic review of diagnostic 24. Usman U, Chrisman C, Houston D, Haws CC,
studies in myasthenia gravis. Neuromuscular Disorders. Wang A, Muley S. The use of eculizumab in ventilator‐
2006;16(7):459–467. dependent myasthenia gravis patients. Muscle & Nerve.
2021;64(2):212–215.
16. Lamb CJ, Rubin DI. Sensitivity and specificity of
repetitive nerve stimulation with lower cutoffs for abnormal
decrement in myasthenia gravis. Muscle & Nerve.
2020;62(3):381–385.
17. Giannoccaro MP, Di Stasi V, Zanesini C, Donadio
V, Avoni P, Liguori R. Sensitivity and specificity of
single-fibre EMG in the diagnosis of ocular myasthenia
varies accordingly to clinical presentation. J Neurol.
2020;267(3):739-745.
Capítulo 30 385
CAPÍTULO 31
MIOPATIAS
não é menos importante, pois com a etiologia precisa da acometimento da musculatura faríngea, pode surgir
miopatia, trazemos o sentimento de diagnóstico fechado
Capítulo 31 386
Adquiridas Genéticas
F. Distrofias musculares
A. Imunomediadas a. Distrofinopatias
a. Dermatomiosite i. Distrofia muscular de Duchenne
b. Síndrome antissintetase ii. Distrofia muscular de Becker
c. Miopatia necrotizante imunomediada b. Distrofia muscular de cinturas
d. Miosite de sobreposição c. Distrofia muscular de Emery-Dreifuss
e. Polimiosite d. Distrofia facioescapuloumeral
e. Distrofia miotônica
B. Tóxicas e induzidas por drogas
a. Medicamentos G. Miopatias congênitas
b. Outras substâncias a. Miopatias congênitas estruturais
b. Distrofias musculares congênitas
C. Infecciosas
a. Bacterianas H. Doenças dos canais iônicos
b. Virais a. Paralisias periódicas
c. Parasitárias b. Miotonias congênitas
d. Fúngicas
I. Miopatias metabólicas
D. Miosite por corpos de inclusão a. Glicogenoses
E. Doenças sistêmicas b. Miopatias mitocondriais
a. Endocrinopatias c. Lipidoses
b. Neoplasias
Miopatias miofibrilares
Quadro 1: Principais etiologias das miopatias.
Fonte: Os autores, 2021.
disfonia, rouquidão e disfagia. O acometimento do cutânea, fadiga e febre baixa, seguidos de fraqueza
diafragma e musculatura respiratória acessória pode muscular insidiosa e mialgia. As lesões mais
agravar a doença em casos mais avançados. Mialgia frequentes são o patognomônico heliótropo (lesão
difusa também é relatada, porém geralmente não é arroxeada nas pálpebras superiores com ou sem
tão intensa . As MI podem ser uma apresentação
6
edema), o sinal de Gottron (lesão eritematosa sobre
paraneoplásica em muitos casos, principalmente se a face extensora das articulações, principalmente
estiverem relacionadas com alguns autoanticorpos mãos), sinal do V (lesão eritematosa em forma
e em pacientes mais idosos, fazendo com que a de V no pescoço e tórax anterior), sinal do Xale
investigação seja intensiva, pois pode mudar o (lesão eritematosa nas costas e ombros), as
prognóstico e o curso da doença . 9
“mãos de mecânico” (aparência áspera e com
rachaduras na pele nas pontas dos dedos) e as
telangiectasias periungueais. Alguns casos podem
Dermatomiosite evoluir sem fraqueza. Dentre as manifestações
extramusculares, pode apresentar acometimento 1)
A dermatomiosite (DM) é mais frequente em
cardíaco (arritmias ou distúrbios da fração de ejeção,
mulheres e tem geralmente um caráter subagudo,
incluindo pericardite, miocardite e insuficiência
podendo acometer crianças e adultos (pico de
cardíaca), que embora raro, pode ser fatal; 2)
incidência bimodal), sendo caracterizada por
pulmonar (doença pulmonar intersticial), que pode
fraqueza muscular proximal associada a mialgias e
ser grave e geralmente é a principal causa de morte
precedidas, em semanas ou meses, por erupções
dos pacientes; 3) gastrintestinal (disfagia, distúrbios
cutâneas eritematosas generalizadas de predomínio
da motilidade gástrica e pneumonia por aspiração);
em áreas fotossensíveis, podendo ter edema e
e 4) articular (artralgia das grandes e pequenas
prurido. As crianças podem cursar com erupção
Capítulo 31 387
articulações). A presença dos autoanticorpos anti- essas doenças não costumam cursar com fraqueza
TIF-1g e anti-NXP-2 está relacionada ao aumento muscular relevante, exceto em casos de artrite ou
da incidência de malignidade 6,9,10
. atrofia muscular por desuso. Enquanto nos casos
com sobreposição de miosite, a fraqueza muscular
proximal é frequentemente observada6,13.
Síndrome antissintetase
A síndrome antissintetase (SAS) está
associada à presença de autoanticorpos séricos
Polimiosite
contra várias sintetases, ou aminas ativadoras, Cada vez mais rara, a polimiosite (PM) é
do aminoacil do RNA transportador (aminoacil- encarada atualmente como um diagnóstico de
tRNA). Dessa forma, pode cursar com uma exclusão, devendo sempre ter o seu diagnóstico
extensa variedade de manifestações clínicas em reconsiderado. Em um passado não tão distante,
diversas combinações. As principais são a miopatia era reconhecida como uma entidade que cursava
inflamatória, doença pulmonar intersticial, artrite, com subaguda fraqueza muscular proximal,
síndrome de Raynaud, febre e o sinal chamado elevação de creatinofosfoquinase sérica (CK),
“mãos de mecânico”. A fraqueza muscular é mais achados miopáticos à eletroneuromiografia (ENMG)
frequente em pacientes portadores de anti-Jo-1, mas e a presença de inflamação endomisial com
pode não estar presente e geralmente é de caráter infiltrados de células T CD8+ à biópsia muscular.
proximal e evolução subaguda (semanas a meses). Frequentemente, as reconsiderações diagnósticas
Além disso, alguns pacientes apresentam alterações levam ao diagnóstico de outras doenças musculares,
dermatológicas que podem lembrar a DM . 6
como a miosite por corpos de inclusão (IBM), a SAS
sem lesões dermatológicas ou a MNI6,14,15.
Capítulo 31 388
frequentemente causa confusão na prática clínica, marcado hipossinal nesta sequência. As imagens
podendo levar a exames invasivos de maneira axiais ponderadas em T1 são úteis para análise de
desnecessária. Nestes casos, recomenda-se dosar lipossubstituição secundária à atrofia muscular. A
gama glutamil transferase (GGT) para o diagnóstico UM pode ser também uma ferramenta excelente para
diferencial . Em casos crônicos, com expressiva
6
rastreio da musculatura acometida6,17,18. Principais
atrofia muscular ou lipossubstituição, os níveis de achados podem ser encontrados no Quadro 2:
CK podem ser normais, mesmo em vigência da
atividade da doença.
Capítulo 31 389
Característica DM SAS MNI MS PM
Fraqueza
proximal proximal generalizada proximal proximal
muscular
Tempo de
subagudoa subagudoa rápido e grave subagudo a crônico subagudoa
instalação
Nível de CK e
outras enzimas frequentemente frequentemente
acentuadamente elevadoc frequentemente elevado frequentemente elevado
musculares elevadob elevado
séricas
alterações
ENMG alterações miopáticas alterações miopáticasd alterações miopáticas alterações miopáticas
miopáticas
Fisiopatologia depende da doença que mecanismo incerto,
risco imunogenéticoe IFN-II risco imunogenéticof
estiver envolvida diversos são propostosg
anti-Jo-1, anti-PL-7, anti-Ro52/TRIM21, anti-
Principais Anti-Mi-2, Anti-TIF- anti-SRP, anti-HMG- Anti-ANA, outros
anti-PL-12, anti-EJ, PMScl, anti-complexo
Autoanticorpos 1g, Anti-NXP-2, CoA redutase, MNI com anticorpos quando existe
anti-OJ, anti-KS, anti- de ribonucleoproteína,
anti-MDA-5 autoanticorpo negativoh sobreposição
Zo e anti-Ha anti-Ku
infiltrado inflamatório
atrofia perifascicular, endomisial
necrose de fibras
anormalidades da (predominantemente
atrofia perifascicular, musculares ou
microvasculatura, linfócitos CD8+), invasão
infiltrados regeneração, ausência
alterações de fibras com ou sem
Biópsia inflamatórios de ou escassez de infiltrados
características da achados podem ser necrose, aumento
muscular predomínio perimisial inflamatórios linfocitários,
presença de anti-Jo- similares à DM e/ou PM da expressão para
e perivascular, sinais expressão MHC-I, não
1k, patognomônica MHC-I (importante para
de vasculopatiai, ocorrem inflamação
agregação de actina diagnóstico diferencial
outros achadosj perivascular ou atrofia
nuclear (microscopia com algumas distrofias
perifascicular
eletrônica) musculares que possuem
inflamação)
Hipersinal muscular Edema muscular
de distribuição generalizado homogêneo,
Hipersinal
heterogênea em necrose, atrofia,
intramuscular em
STIR, edema lipossubstituição, Hipersinal intramuscular
STIR (65%), edema, Hipersinal muscular
subcutâneo e mínimo edema fasciall, em STIR (65%), edema,
Ressonância infiltração gordurosa bilateral e simétrico em
fasciíte (incomum menor envolvimento infiltração gordurosa
magnética e atrofia sem padrão STIR na cintura pélvica
nas outras MI), do compartimento e atrofia sem padrão
específico (aparente e coxas, preservação da
infiltração gordurosa anterior da coxam, anti- específico e dependente
predileção pelo arquitetura muscular
leve, depósitos SRP apresenta mais da doença sobreposta
compartimento
subcutâneos de lipossubstituição e atrofia
posterior da coxa)
calcinose (hipossinal quando comparada com
em STIR) anti-HMG-CoA redutase
para monitorar a progressão ou atividade da doença. c O aumento da CK pode preceder o aparecimento da fraqueza. d Podem
estar presentes descargas complexas repetitivas ou descargas pseudomiotônicas. e alelos do antígeno leucocitário humano
(HLA) classe 2, exposições ambientais, superprodução de interferons (IFN-1), superexpressão gênica dos genes estimulados
por IFN (ISG). f associação do alelo HLA classe 2 DRB1*08:03 com a miopatia anti-SRP; DRB1*11:01 é fator de risco para
miopatia anti-HMG-CoA redutase (70% dos portadores versus 15% da população geral). g 1) dano direto pela ativação anormal
de CD8+ e macrófagos (pode ter envolvimento de linfócitos tipo B e células dendríticas); 2) mediadores inflamatórios (citocinas
e interleucinas); resposta T helper tipo 1 (TNF, IFN-gama, interleucina-12) e T helper tipo 17 (interleucina-17, interleucina-22
e interleucina-6); 3) aumento da expressão MHC-I via NF-kappaB; 4) danos ao endotélio vascular. h MNI com autoanticorpos
negativo apresenta risco relativamente alto de malignidade, enquanto a presença do anti-HMG-CoA redutase apresenta uma
associação relativamente fraca e o anti-SRP não está associado a malignidade. i Redução dos capilares e deposição do complexo
de ataque à membrana (MHC) na microvasculatura muscular. j inclusões microtubulares endoteliais, núcleos centralizados /
internalizados, necrose, regeneração, basofilia, aumento da atividade de enzima oxidativa, fibrose endomisial e aumento na
reação de MHC-I. k necrose na região perifascicular, fragmentação do perimísio), aumento da atividade da fosfatase alcalina
perimisial. l importante para o diagnóstico diferencial com DM. m diagnóstico diferencial com IBM.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 31 390
ser feito de maneira contundente e o mais breve Nos casos em que o CTC faz parte do tratamento
possível. de uma MI, a biópsia muscular pode ajudar
mostrando atrofia de fibras tipo II. Descrição de
Miopatias tóxicas e induzidas por drogas alterações miopáticas mitocondriais reversíveis com
Com uma prevalência estimada de mais a zidovudina, além do risco de miopatia também
de 2.000 por 100.000 habitantes no Ocidente, as com antivirais mais modernos, como a telbivudina
miopatias tóxicas e induzidas por drogas (MT) e o raltegravir. O mecanismo de lesão pode ser
representam o grupo mais comum de miopatia18. Os direto ou indireto como, por exemplo, as disfunções
sintomas musculares são comuns entre os usuários imunológicas ou metabólicas. Os principais sinais
de estatinas, sendo reversíveis na maioria dos e sintomas relacionados à toxicidade são mialgia,
casos após a descontinuação da droga. Raramente, fraqueza e câimbras, mais raramente rabdomiólise
desencadeiam uma MNI com necessidade de e hipertermia maligna. Geralmente, cursa com início
tratamento específico. A presença de autoanticorpos subagudo, elevação de CK e/ou mioglobinúria após
anti-HMG-CoA redutase auxilia na diferenciação o início da droga e que geralmente melhoram após
entre o quadro tóxico e o imunomediado. Outra a suspensão. Os achados à RM são inespecíficos
classe de drogas que tem uma crescente relação e pode apresentar edema (hipersinal em STIR)
com a miotoxicidade inflamatória é a terapia muscular simétrico acometendo os glúteos,
imunológica para o tratamento das neoplasias, quadríceps femoral, adutores e musculatura profunda
como os inibidores de checkpoint (ponto de controle) das panturrilhas18,25-27. Os principais medicamentos
imunológico. O uso de CTC pode causar miopatia e drogas que podem causar miopatia encontram-se
com queixa de fadiga, fraqueza e atrofia muscular. descritos no Quadro 3:
Capítulo 31 391
pelo estilo de vida, até a criação de critérios
Miopatias infecciosas
diagnósticos mais inclusivos e a relação com a
A miosite infecciosa é uma condição rara e
dosagem de anticorpos séricos. Antigamente era
pode ser causada por bactérias, vírus, parasitas
incluída no grupo das MI, porém nos últimos anos
ou fungos. Os sintomas mais frequentes são
foi categorizada como uma entidade nosológica
mialgia e fraqueza muscular focal ou generalizada,
à parte, tanto pelas novas descobertas, incluindo
seguidos de rabdomiólise e aumento das provas
achados degenerativos, quanto pela falta de
inflamatórias. Apresentações difusas associadas
resposta com as terapias habitualmente eficazes nas
a um quadro influenza-símile ou sintomas
MI, incluindo uma recente publicação que utilizou
gastrintestinais geralmente estão relacionados à
bimagrumabe por até 2 anos e não teve benefícios
etiologia viral, enquanto febre e queda do estado
em relação à mobilidade, embora apresentasse bom
geral comumente tem relação com abscesso
perfil de segurança e boa tolerabilidade. Evolução
bacteriano localizado. Epidemiologia tropical e
lentamente progressiva e destaque para os sinais e
eosinofilia lembram mais quadros parasitários, ao
sintomas mais frequentes, como fraqueza muscular
mesmo tempo que imunossupressão usualmente
(predomínio nos quadríceps, iliopsoas, flexores dos
tem relação com etiologia fúngica. Diversos vírus
punhos e quirodáctilos), hiporreflexia miotática,
têm relação com quadros de miosite, dentre os
instabilidade postural com aumento do risco de
principais destacamos o enterovírus, o influenza,
quedas, disfagia e perda ponderal, podendo ainda
o adenovírus, o pavovírus B19, o vírus da hepatite
raramente apresentar dispneia. Os níveis séricos
B, C e E, a família do herpes vírus, as arboviroses,
de CK podem ser normais ou pouco elevados,
além do Ebola e mais recentemente o SARS-CoV-2.
geralmente não ultrapassando 10 vezes o limite
Devemos ficar atentos quanto à possibilidade
superior da normalidade. Descrito na última década,
de miocardite associada. Miosites bacterianas
o autoanticorpo sérico anti-cN1A (anti-5’nucleotidase
pós cirurgia abdominal sugerem a presença de
1ª citosólica) ganhou destaque na IBM, embora
Closridium spp, enquanto quadro focais sugerem
também possa ser encontrado no LES e na síndrome
Staphylococcus aureus. As principais parasitoses
de Sjögren, devido à especificidade de 87 a 100% e
relacionadas com as miosites são a toxoplasmose,
sensibilidade de 33 a 76% (diferentes métodos de
a criptococose e a sarcocistose. A TC ou RM
detecção e limites de corte), além da correlação mais
podem ser úteis na identificação da musculatura
recente com maior risco de disfagia grave. Além dos
comprometida. A identificação do patógeno poder-
achados miopáticos, a ENMG pode evidenciar uma
se-á via direta (patologia muscular, hemocultura
neuropatia sensitiva em até um terço dos pacientes.
ou outros materiais) ou indireta (sorologia). O
Os achados AP musculares incluem uma mistura de
tratamento dependerá da etiologia, sendo que a
inflamação (inflamação endomisial ou invasão focal
drenagem cirúrgica deverá ser considerada em caso
mediada por células T) e degeneração muscular
de abscessos28-30.
(vacúolos marginados, alterações mitocondriais e
acúmulo intramuscular de proteínas ubiquitinadas e
Miosite por corpos de inclusão agregados proteicos com aspecto congofílico). O INF-
A IBM, na sua forma esporádica, é considerada II parece ser uma citocina importante na inflamação
a miopatia adquirida mais comum após os 50 anos e potencialmente ligada ao processo degenerativo
de idade. Mais comum no sexo masculino, apresenta da IBM. Muitas doenças hereditárias podem ser
prevalência estimada de 5 a 71 por milhão. Ainda confundidas com a IBM, tanto clinicamente, quanto
muito subdiagnosticada em nosso meio, apresenta anatomopatologicamente (vacúolos marginados ou
teorias relacionadas ao aumento da prevalência, agregados proteicos). Destaque para as doenças
que vão do envelhecimento populacional, passando com mutações patogênicas relatadas nas formas
Capítulo 31 392
hereditárias de IBM [VCP (valosin-containing carcinomatosa). Diversas são as neoplasias
protein) e SQSTM1 (sequestosome1)], para as descritas 6,39-43
.
miopatias miofibrilares e outras miopatias com
vacúolos marginados. Um achado AP que pode
ajudar na diferenciação é a falta de infiltração MIOPATIAS GENÉTICAS
inflamatória nestes casos. A miopatia associada a
VCP pode ter características associadas à doença Distrofias musculares
óssea de Paget ou demência frontotemporal. Além As distrofias musculares compreendem um
disso, nos casos de MI com acometimento precoce grupo heterogêneo de doenças com uma diversa
distal, principalmente dos flexores dos quirodáctilos, variedade de apresentações. O diagnóstico preciso,
devemos sempre pensar em IBM como diagnóstico o acompanhamento individualizado, o tratamento
diferencial. Os portadores de IBM apresentam multidisciplinar contínuo e a orientação genética
morbidade acentuada com fraqueza geralmente devem ser feitos o mais precocemente possível.
incapacitante e a necessidade de suporte
multidisciplinar, envolvendo fisioterapia, fonoterapia
e psicoterapia. Existem algumas evidências de que Distrofinopatias
o exercício físico seja favorável para portadores de Dentre as distrofias musculares, as mais
IBM e deverá ser estimulado6,19,31-37. conhecidas são as distrofinopatias, como as
distrofias musculares de Duchenne (DMD) e de
Doenças sistêmicas Becker (DMB), que possuem herança recessiva
Além das colagenoses já descritas nas MS, ligada ao cromossomo X (gene DMD / Xp21) e
outras doenças que podem cursar com miopatias são são causadas pela ausência ou redução da função
as endocrinopatias e as neoplasias, estas também da proteína distrofina, com consequente necrose
já abordadas superficialmente no item das MI. A muscular e consequente substituição por tecido
miopatia secundária ao uso de CTC, frequentemente conjuntivo ou lipídico. Mais recente, temos a
incluída como um tipo de miopatia endócrina (ME) já descrição do fenótipo da cardiomiopatia dilatada
foi discutida no tópico de MT. As ME foram relatadas associada à DMD (CMD). Os homens são afetados,
com disfunção da tireoide (hipotireoidismo, mas as mulheres portadoras possuem risco de
hipertireoidismo, doença de Graves e canalopatias CMD, além de poderem apresentar fraqueza
com paralisia periódica), paratireoide, adrenal proximal e elevação da CK sérica. Raramente,
(síndrome de Cushing e insuficiência adrenal), as meninas podem apresentar o quadro clínico
disfunção gonadal (deficiência de testosterona), habitual da DMD. O fenótipo mais grave é a DMD,
diabetes mellitus (mionecrose) e acromegalia. com sintomas iniciados por volta dos 3 a 4 anos
Podem cursar com fraqueza muscular, câimbras, de idade e pouco menos da metade dos pacientes
fadiga, atrofia e elevação de CK sérica 25,38
. apresentam sintomas cognitivos. A DMB apresenta
quadro mais insidioso e com menor velocidade de
No contexto de uma neoplasia, a miopatia
progressão com manutenção da marcha por mais
pode ser uma apresentação paraneoplásica e,
tempo. O quadro clínico inclui tetraparesia flácida
conforme já citado no item das MII (MNI, DM, MCI,
progressiva de predomínio proximal e ambas podem
etc), estar relacionada à presença ou ausência de
apresentar cardiomiopatia. Os níveis séricos de
autoanticorpos, e consequentemente um maior
CK são muito elevados. Cerca de ¾ dos pacientes
risco de relação com neoplasia. Além disso, pode
apresentam deleção ou duplicação no gene da
ser secundária à caquexia, à quimioterapia e ainda
distrofina, sendo que o restante apresenta mutações
associada à própria infiltração tumoral (miosite
de ponto. Na DMD, o uso de corticoterapia está
Capítulo 31 393
relacionado à redução da progressão sintomática e lentamente progressiva, acompanhada por atrofia
de maior tempo de manutenção da marcha. Avanços de predomínio umeral e fibular. Frequentemente
na terapia genética e o fato de serem monogênicas apresentam bloqueios atrioventriculares, bradicardia
fizeram com que as distrofinopatias se tornassem e cardiomiopatia, com consequente necessidade
um modelo para a abordagem terapêutica. O óbito, de implante de marcapasso. Dispositivos de
geralmente, ocorre por insuficiência respiratória ou desfibrilação automatizados estão indicados para os
por suas complicações, porém nas últimas décadas a pacientes que apresentam alto risco de morte súbita.
expectativa de vida aumentou expressivamente 44-47
. Atentar para o início de anticoagulação para os
pacientes que desenvolverem fibrilação/flutter atrial.
Os pacientes evoluem precocemente com retrações
Distrofia muscular de cinturas musculares e redução da movimentação da coluna
vertebral, principalmente da coluna cervical50-52.
As distrofias musculares de cinturas (limb
girdle muscular dystrophies – LGMD) também
possuem um caráter lentamente progressivo, quadro
clínico heterogêneo entre elas, mas geralmente com
Distrofia facioescapuloumeral
tetraparesia flácida de predomínio proximal e dos A distrofia facio-escapulo-umeral (FSHD)
membros inferiores, acompanhada de redução do possui herança autossômica dominante e apresenta
trofismo muscular. Os fenótipos apresentam desde fenótipo classicamente composto por acometimento
sintomas leves até quadros muito acentuados, que assimétrico da musculatura da face, dos braços e da
podem ser confundidos com as distrofinopatias. cintura escapular. O acometimento da musculatura
Alguns pacientes também podem apresentar estabilizadora das escápulas leva inevitavelmente
acometimento respiratório e cardíaco. Elevação à presença da condição chamada escápula alada,
sérica de CK está presente em quase a totalidade além de acometer também a musculatura peitoral.
dos casos. O diagnóstico etiológico geralmente Além da musculatura, cerca de 50% dos pacientes
é feito através da anatomia patológica muscular com FSHD também apresentam perda auditiva
e atualmente mais frequentemente pela análise subclínica de alta frequência e retinovasculopatia. O
molecular 48,49
. Uma maneira atemporal e rápida de diagnóstico definitivo é molecular (deleção no braço
consultar a forma de LGMD, a herança, o gene/ longo do cromossomo 4). Alvo terapêutico promissor
locus, a deficiência proteica e as formas clínicas envolvendo o gene tóxico DUX4 (double homeobox
associadas é através do site “https://medlineplus. 4 gene) está no horizonte53-55.
gov/genetics/”.
Distrofia miotônica
Distrofia muscular de Emery-Dreifuss A distrofia miotônica, também conhecida como
A distrofia muscular de Emery-Dreifuss doença de Steinert, possui herança autossômica
(DMED) é uma condição rara, de herança dominante, apresenta fenômeno de antecipação e
autossômica dominante ou recessiva ligada ao X. corresponde à distrofia mais comum nos adultos.
Ao menos 9 genes estão relacionados à DMED, Apresenta uma tríade clínica composta por
sendo eles EMD, LMNA, SYNE1, SYNE2, FHL1, fraqueza muscular de predomínio distal, miotonia
TMEM43, SUN1, SUN2 e TTN, responsáveis pela (relaxamento muscular retardado) e catarata.
codificação da emerina, lamina A/C, nesprina-1, Outras manifestações sistêmicas que podem estar
nesprina-2, FHL1, LUMA, SUN1, SUN2 e titina, presentes são as cardiopatias, endocrinopatias,
respectivamente. O fenótipo clássico é a fraqueza acometimento gastrintestinal, cerebral, respiratório,
Capítulo 31 394
dermatológico e calvície. Grupo composto por no primeiro ano de vida, mas devemos ter cautela,
duas entidades clínicas distintas chamadas de pois é crescente o conhecimento relacionado
distrofia miotônica tipo 1 (DM1) e tipo 2 (DM2). A ao amplo espectro da gravidade e progressão
DM1 possui uma prevalência de 1 para 2.500 com do quadro clínico, com características variáveis,
idade de início do nascimento até a idade adulta dependendo do subtipo e da gravidade da
(congênita, infantil, adulta ou de início tardio), mutação genética específica. As DMC apresentam
padrão de fraqueza apendicular distal e facial, sendo biópsias musculares com características distróficas
a miotonia o sintoma mais proeminente. Já a DM2 inespecíficas, sintomatologia descrita acima e podem
tem prevalência desconhecida, com idade de início estar associadas a deformidades osteoesqueléticas,
de predomínio na vida adulta, padrão de fraqueza incluindo as frequentes retrações musculares. A
apendicular proximal e mialgia proeminente. A fraqueza é marcantemente apendicular proximal,
evocação da miotonia tende a ser mais facilmente mas a musculatura do pescoço, paravertebral e facial,
evocada no exame físico ou eletroneuromiográfico incluindo a mastigatória, podem ser acometidas.
na DM1. A ENMG revela descargas miotônicas e A mais comum, quase metade dos casos, é
potenciais miopáticos. Ambas são causadas por causada por mutações no gene da cadeia a2 da
uma expansão repetida que sequestra proteínas laminina-2 (merosina), com incapacidade frequente
de ligação ao RNA e resulta em splicing alternativo de adquirir marcha, importante comprometimento
desregulado, sendo na DM1 uma região polimórfica ventilatório, graves deformidades osteoesqueléticas,
de repetição do trinucleotídeo CTG em sua região 3′ neuroimagem com leucoencefalopatia, porém as
não traduzida no gene DMPK (Dystrophia Myotonica- funções cognitivas são preservadas. Outras formas
Protein Kinase, 19q13.3) e na DM2 uma repetição mais conhecidas são as deficiências de colágeno VI,
intrônica do tetranucleotídeo CCTG no gene CNBP de lâmina A/C, selenoproteína-N1, fukutina, fukutina-
/ ZNF9 (CCHC-Type Zinc Finger Nucleic Acid relacionada, dentre outras. Os principais tipos de
Binding Protein). Desta forma, o diagnóstico é feito miopatias congênitas estruturais são a central core,
de maneira molecular. A sobrevida média da DM1 a centronuclear, a nemalínica e a desproporção
é de 50 anos de idade, sendo as principais causas congênita de fibras. Além das características
as arritmias cardíacas, insuficiência respiratória clássicas, a musculatura ocular extrínseca e
e as neoplasias . Atualmente, não há tratamento
56
a musculatura mastigatória e facial podem ser
médico aprovado para distrofia miotônica além do acometidas. Fugiria ao objetivo deste capítulo
manejo sintomático da miotonia com mexiletina descrever cada uma delas de maneira detalhada.
(classicamente) ou outros agentes menos eficazes . 57
Desta forma, para aprofundar o conhecimento, sugiro
Tratamentos propostos envolvem vias de modulação que acessem a excelente revisão bibliográfica feita
do RNA ou Exon SKipping via ASO (oligonucleotídeo por Butterfield RJ (2019)61. A melhora nas técnicas e
antisense sintético)58-60. o aumento do acesso aos testes genéticos levaram a
um aumento expressivo de novos genes associados
a essas doenças, além de destacar sobreposições
Miopatias congênitas antes não tão bem estabelecidas somente com as
características clínica e histopatológicas61. Tal fato
Basicamente são divididas em miopatias
abre portas para futuros tratamentos guiados.
congênitas estruturais e distrofias musculares
congênitas (DMC), e formam um grupo heterogêneo
de doenças que resultam em hipotonia e fraqueza
muscular lentamente progressiva (eventualmente
Distúrbios musculares episódicos
estabilizada). Classicamente, a fraqueza está Grupo heterogêneo de doenças composto
presente desde o nascimento ou se torna aparente pelas paralisias periódicas, pelas miotonias não
Capítulo 31 395
distróficas (incluindo canalopatias de sódio e pela presença de fenômeno miotônico, mas
cloreto) e pela síndrome benigna de câimbra- sem distrofia muscular associada. A miotonia é
fasciculação. Os distúrbios musculares episódicos o relaxamento retardado após uma contração
são definidos como episódios de fraqueza muscular, voluntária intensa, ou após uma percussão muscular;
dor muscular ou rigidez com duração de minutos a geralmente é visto nas mãos, mas também pode
horas ou dias, em geral em indivíduos de aparência estar presente nos membros inferiores, músculos
saudável, embora alguns possuam atrofia muscular, faciais e mandibulares. Pacientes com miotonia
que geralmente é proximal e leve, geralmente não distrófica, geralmente, apresentam rigidez
não associada a limitações em repouso ou entre episódica, desencadeada mais frequentemente por
os episódios de fraqueza. A força muscular e os mudanças na temperatura ou por repouso após o
reflexos osteotendíneos também costumam ser exercício. Nas canalopatias de sódio, os pacientes
normais entre estes episódios. No entanto, alguns podem ter dor episódica e, tanto nas canalopatias
pacientes apresentam fraqueza proximal e atrofia de sódio quanto nas de cloreto, os pacientes
muscular permanente, podendo ser incapacitante. podem apresentar fraqueza episódica. Pode estar
As paralisias periódicas primárias são doenças presente o fenômeno warm up que corresponde
musculares autossômicas dominantes raras em que à melhora progressiva da miotonia após atividade
os episódios de fraqueza muscular generalizados, muscular repetitiva. Outra característica comum é a
ou mais frequentemente acometendo somente um hipertrofia muscular generalizada, porém com força
ou mais membros, geralmente são desencadeados reduzida. As mutações mais comuns são as que
por atividade física matinal intensa seguida de envolvem o gene codificador dos canais de cloro
repouso, refeições ricas em carboidratos, frio, (CLCN1, 7q35), nas formas de miotonia congênita
estresse e consumo de álcool. Tipicamente, de Thomsen (herança autossômica dominante)
surgem na primeira infância, podem ser mais e de Becker (herança autossômica recessiva). O
tardios. A forma mais comum é a paralisia periódica diagnóstico geralmente se dá pelo exame físico e
hipercalêmica (prevalência 1:100.000) e está presença de descargas miotônicas difusas à ENMG.
relacionada a mutações no gene do canal de sódio As enzimas musculares e a biópsia muscular são
(SCN4A), possuindo episódios de fraqueza com normais. Em alguns casos os pacientes podem ter
duração geralmente inferior a duas horas. A paralisia benefício com o uso de fenitoína, carbamazepina,
periódica hipocalêmica (prevalência 1:200.000) sulfato de quinidina, procainamida e mexitileno.
está, geralmente, relacionada a mutações no canal As formas mais raras de miotonias congênitas são
de cálcio (CACNA1S) e apresenta episódios de causadas por mutações no gene do canal de sódio
fraqueza prolongados. A síndrome de Andersen- (SCN4A), que podem levar a paramiotonia (doença
Tawil (prevalência 1:1.000.000) é mais comumente de von Eulemburg) e miotonias relacionadas ao
causada por mutações do gene KCNJ2 e apresenta canal de sódio, melhorando drasticamente com o
envolvimento muscular similar às outras, porém uso de acetazolamida62.
frequentemente apresentam arritmias graves, além
Vale ressaltar que os distúrbios da tireoide são
de diversas outras características, como micrognatia,
as principais causas clínicas de paralisia periódica e
implantação baixa de orelhas, hipotelorismo, dentes
ocasionalmente podem cursar com miotonia62.
com fileira dupla, dentre outras. Na síndrome benigna
de câimbra-fasciculação, os principais sintomas
são câimbra e fasciculação claramente visíveis no
Miopatias metabólicas e mitocondriais
exame, geralmente confinados às panturrilhas em
repouso e após percussão muscular62. Grupo heterogêneo de doenças genéticas
raras composto pelas glicogenoses, pelas miopatias
As miotonias congênitas são caracterizadas
Capítulo 31 396
mitocondriais e pelas lipidoses, que envolvem ácida (GAA), a qual é responsável pela quebra do
o metabolismo energético (distúrbios da função glicogênio em glicose nos lisossomos. Existem
mitocondrial da cadeia respiratória, algumas das formas infantis e do adulto. As formas mais precoces
etapas do metabolismo lipídico e distúrbios de geralmente apresentam cardiomegalia, fraqueza
armazenamento ou uso de glicogênio), causando muscular e hipotonia (bebê hipotônico), insuficiência
miopatias, porém muitas vezes com sintomatologia respiratória, hepatomegalia, macroglossia, disfagia e
muscular sutil. As principais queixas são fraqueza e dificuldade para sugar o leito materno, atraso motor
intolerância ao exercício, mas podem gerar quadro e de crescimento. As fases mais tardias podem
musculares muito graves, como a rabdomiólise, ser confundidas com outras doenças musculares e
causando lesão muscular grave e de característica frequentemente apresentam fenótipo de fraqueza
intermitente, o que pode fazer com que o exame lentamente progressiva proximal dos 4 membros,
neurológico e os exames laboratoriais estejam acometimento respiratório, fraqueza da língua e da
normais entre os episódios. O acometimento musculatura abdominal. O diagnóstico é feito com
da função mitocondrial pode gerar uma ampla aferição da atividade da GAA ou análise genética63-65.
sintomatologia clínica neurológica ou envolvendo
As lipidoses são distúrbios do metabolismo
outros sistemas, levando a diversas formas de
lipídico que se manifestam em crianças ou adultos
apresentação, mas a miopatia geralmente é a
com queixas de intolerância aos exercícios e
apresentação mais frequente e comum entre elas.
mioglobunúria. As principais doenças que cursam
Os quadros resultantes de distúrbios da glicólise
com o quadro são as deficiências de carnitil-palmitoil-
(quebra da glicose) ou da glicogenólise (formação
transferase 2, de acil-CoA desidrogenase de cadeia
e quebra do glicogênio) são caracterizados como
muito longa e de proteína trifuncional63-65.
glicogenoses e lipidoses. Avanços expressivos
nas análises moleculares, principalmente o As miopatias mitocondriais podem ser
tornaram os diagnósticos mais fáceis e acessíveis, muito variado e geralmente inespecífico. Pode se
porém atrasos no diagnóstico são comuns e manifestar em qualquer faixa etária. Os sistemas
apresenta herança autossômica devido a mutações estruturais, como a DMB (distrofina), as LGMDs
no gene PYGM. Manifesta-se, geralmente, em (mutações SGCA, SGCB, SGCD, ANO5 e DYSF) e a
crianças e adultos jovens, com mialgia, intolerância hipertermia maligna (mutações RYR1 e CACNA1S)
pode ser suspeitado por biópsia muscular, mas exercícios e fazer diagnóstico diferencial com as
geralmente é confirmado por mutações na análise do miopatias metabólicas. Estes casos podem ser
gene PYGM. A doença de Pompe (glicogenose tipo II) suspeitados em quadros persistentes de elevação
é causada por mutações no gene GAA (cromossomo de CK após 10 dias de rabdomiólise. Outra causa
17) levando a deficiência da enzima α-glicosidase que faz diagnóstico diferencial é o uso de estatinas,
Capítulo 31 397
podendos estas desmascararem uma miopatia 3. Carvalho AAS. Miopatias. Revista Neurociências.
2015;13:35-38.
metabólica incipiente 63-65
.
4. Lazarou IN, Guerne PA. Classification, diagnosis, and
Devemos estar atentos ao diagnóstico management of idiopathic inflammatory myopathies. J
Rheumatol. 2013;40(5):550-564.
precoce, pois existem terapias de reposição
enzimática específicas disponíveis (por exemplo, 5. Selva-O’Callaghan A, Pinal-Fernandez I, Trallero-
Araguás E, Milisenda JC, Grau-Junyent JM, Mammen
doença de Pompe por meio da reposição enzimática AL. Classification and management of adult inflammatory
intravenosa usando uma α-glicosidase ácida myopathies. Lancet Neurol. 2018;17(9):816-828.
esquelética e cardíaca causadas por agregados 13. Nuño-Nuño L, Joven BE, Carreira PE, et al. Overlap
myositis, a distinct entity beyond primary inflammatory
proteicos intramioplasmáticos, desarranjo de myositis: A retrospective analysis of a large cohort from the
miofibrilas e alterações nas proteínas do disco REMICAM registry. Int J Rheum Dis. 2019;22(8):1393-1401.
Z do sarcômero. São frequentes as associações 14. Sarwar A, Dydyk AM, Jatwani S. Polymyositis. 2021.
In: StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing;
com cardiomiopatia e neuropatia periférica. O 2021.
diagnóstico preciso pode ser difícil, mas o crescente
15. Dalakas MC. Inflammatory myopathies: update on
conhecimento molecular e a inclusão de novas diagnosis, pathogenesis and therapies, and COVID-19-
related implications. Acta Myol. 2020;39(4):289-301.
variantes em painéis usando sequenciamentos
de segunda geração, trazem um futuro promissor 16. Camargo AJS, Camargo LV. Eletroneuromiografia e
Pontenciais Evocados na Prática Ortopédica. In: Motta G,
no auxílio da detecção em grupo tão grande e Barros T (eds). Ortopedia e Traumatologia. 1. Ed. Rio de
heterogêneo66-69. Janeiro, RJ: Elsevier; 2018. pp 1660-1671.
17. Guimaraes JB, Zanoteli E, Link TM, et al. Sporadic
Inclusion Body Myositis: MRI Findings and Correlation With
Clinical and Functional Parameters. AJR Am J Roentgenol.
REFERÊNCIAS 2017;209(6):1340-1347.
1. Pasnoor M, Dimachkie MM. Approach to Muscle and 18. Guimaraes JB, Nico MA, Omond AG, et al. Diagnostic
Neuromuscular Junction Disorders. Continuum (Minneap Imaging of Inflammatory Myopathies: New Concepts and a
Minn). 2019;25(6):1536-1563. Radiological Approach. Curr Rheumatol Rep. 2019;21(3):8.
2. Oddis CV. Myopathy for the general internist: Statins and 19. Bolko L, Jiang W, Tawara N, et al. The role of interferons
much more. Cleve Clin J Med. 2019;86(10):656-664. type I, II and III in myositis: A review. Brain Pathol.
2021;31(3):e12955.
Capítulo 31 398
20. Gklinos P, Papadopoulou M, Stanulovic V, Mitsikostas 37. Amato AA, Hanna MG, Machado PM, et al. Efficacy
DD, Papadopoulos D. Monoclonal Antibodies as and Safety of Bimagrumab in Sporadic Inclusion Body
Neurological Therapeutics. Pharmaceuticals (Basel). Myositis: Long-term Extension of RESILIENT. Neurology.
2021;14(2):92. 2021;96(12):e1595-e1607.
21. Pipitone N, Salvarani C. Up-to-date treatment 38. Katzberg HD, Kassardjian CD. Toxic and Endocrine
and management of myositis. Curr Opin Rheumatol. Myopathies. Continuum (Minneap Minn). 2016;22:1815-
2020;32(6):523-527. 1828.
22. Zengin O, Onder ME, Alkan S, et al. Three cases of 39. Lindboe CF, Torvik A. The effects of ageing, cachexia
anti-TNF induced myositis and literature review. Rev Bras and neoplasms on striated muscle. Quantitative histological
Reumatol Engl Ed. 2017;57(6):590-595. and histochemical observations on an autopsy material.
Acta Neuropathol. 1982;57(2-3):85-92.
23. Mazeda C, Cunha R, Ferreira PG, Barcelos A, Aguiar
R. Myopathy associated with anti-signal recognition particle 40. Ferraz AP, José FF. Paraneoplastic necrotizing
antibodies with pulmonary involvement and response to myopathy-a case report. Rev Bras Reumatol Engl Ed.
rituximab. Rheumatol Int. 2021. 2017;57(1):82-84.
24. Xiong A, Yang G, Song Z, et al. Rituximab in the 41. Rubio Solís D, Sánchez García S, López Valcarcel M,
treatment of immune-mediated necrotizing myopathy: a Costilla García S. Carcinomatous myositis secondary to
review of case reports and case series. Ther Adv Neurol gastric cancer. Med Clin (Barc). 2018;150(5):e9.
Disord. 2021;14:1756286421998918.
42. Tiniakou E, Mammen AL. Idiopathic Inflammatory
25. Soni M, Amato AA. Myopathic complications of medical Myopathies and Malignancy: a Comprehensive Review. Clin
disease. Semin Neurol. 2009;29(2):163-180. Rev Allergy Immunol. 2017;52(1):20-33.
26. Mastaglia FL, Needham M. Update on toxic myopathies. 43. Vu HJ, Pham D, Makary R, Nguyen T, Shuja S.
Curr Neurol Neurosci Rep. 2012;12(1):54-61. Paraneoplastic necrotizing myopathy presenting as severe
muscle weakness in a patient with small-cell lung cancer:
27. Doughty CT, Amato AA. Toxic Myopathies. Continuum
successful response to chemoradiation therapy. Clin Adv
(Minneap Minn). 2019;25(6):1712-1731.
Hematol Oncol. 2011;9(7):557-566.
28. Molina B, Pogossian A, De Moreuil C, Rouvière B,
44. Thangarajh M. The Dystrophinopathies. Continuum
Le Berre R. Myosites infectieuses. Rev Med Interne.
(Minneap Minn). 2019;25(6):1619-1639.
2020;41(4):241-249.
45. Morales JA, Mahajan K. Dystrophinopathies. 2020. In:
29. Borah P, Deb PK, Chandrasekaran B, et al. Neurological
StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing;
Consequences of SARS-CoV-2 Infection and Concurrence
2021.
of Treatment-Induced Neuropsychiatric Adverse Events in
COVID-19 Patients: Navigating the Uncharted. Front Mol 46. Kamdar F, Garry DJ. Dystrophin-Deficient
Biosci. 2021;8:627723. Cardiomyopathy. J Am Coll Cardiol. 2016;67(21):2533-2546.
30. Amissah-Arthur MB, Poller B, Tunbridge A, Adebajo 47. Ishizaki M, Kobayashi M, Adachi K, Matsumura T,
A. Musculoskeletal manifestations of Ebola virus. Kimura E. Female dystrophinopathy: Review of current
Rheumatology (Oxford). 2018;57(1):28-31. literature. Neuromuscul Disord. 2018;28(7):572-581.
31. Camargo LV, Carvalho MS, Shinjo SK, Oliveira ASB, 48. Bockhorst J, Wicklund M. Limb Girdle Muscular
Zanoteli E. Clinical, Histological, and Immunohistochemical Dystrophies. Neurol Clin. 2020;38(3):493-504.
Findings in Inclusion Body Myositis. Biomed Res Int.
49. Wicklund MP. The Limb-Girdle Muscular Dystrophies.
2018;2018:5069042.
Continuum (Minneap Minn). 2019;25(6):1599-1618.
32. Camargo LV. Estudo clínico, histológico,
50. Wang S, Peng D. Cardiac Involvement in Emery-
imunoistoquímico e da função lisossomal na miosite
Dreifuss Muscular Dystrophy and Related Management
por corpos de inclusão [tese]. São Paulo: Faculdade de
Strategies. Int Heart J. 2019;60(1):12-18.
Medicina; 2016.
51. Muchir A, Worman HJ. Emery-Dreifuss muscular
33. Weihl C. Sporadic inclusion body myositis and other
dystrophy: focal point nuclear envelope. Curr Opin Neurol.
rimmed vacuoloar myopathies. Continuum (Minneap Minn)
2019;32(5):728-734.
2019;25(6):1586–1598.
52. Heller SA, Shih R, Kalra R, Kang PB. Emery-Dreifuss
34. Gang Q, Bettencourt C, Machado PM, et al. Rare
muscular dystrophy. Muscle Nerve. 2020;61(4):436-448.
variants in SQSTM1 and VCP genes and risk of sporadic
inclusion body myositis. Neurobiol Aging. 2016;47:218.e1- 53. Wagner KR. Facioscapulohumeral Muscular
218.e9. Dystrophies. Continuum (Minneap Minn). 2019;25(6):1662-
1681.
35. Weihl CC, Baloh RH, Lee Y, et al. Targeted sequencing
and identification of genetic variants in sporadic inclusion 54. Fecek C, Emmady PD. Facioscapulohumeral Muscular
body myositis. Neuromuscul Disord. 2015;25(4):289-296. Dystrophy. 2021. In: StatPearls. Treasure Island (FL):
StatPearls Publishing. 2021.
36. Lucchini M, Maggi L, Pegoraro E, et al. Anti-cN1A
Antibodies Are Associated with More Severe Dysphagia in
Sporadic Inclusion Body Myositis. Cells. 2021;10(5):1146.
Capítulo 31 399
55. Cohen J, DeSimone A, Lek M, Lek A. Therapeutic 62. Sansone VA. Episodic Muscle Disorders. Continuum
Approaches in Facioscapulohumeral Muscular Dystrophy. (Minneap Minn). 2019;25(6):1696-1711.
Trends Mol Med. 2021;27(2):123-137.
63. Cohen BH. Mitochondrial and Metabolic Myopathies.
56. Johnson NE. Myotonic Muscular Dystrophies. Continuum (Minneap Minn). 2019;25(6):1732-1766.
Continuum (Minneap Minn). 2019;25(6):1682-1695.
64. Tarnopolsky MA. Metabolic Myopathies. Continuum
57. Salguero-Bodes R, Ruiz-Curiel A, Palomino-Doza J, (Minneap Minn). 2016;22(6):1829-1851.
Valverde-Gómez M, Domínguez-González C, Arribas-
65. Lilleker JB, Keh YS, Roncaroli F, Sharma R, Roberts M.
Ynsaurriaga F. Cardiovascular effects of mexiletine for
Metabolic myopathies: a practical approach. Pract Neurol.
treatment of myotonia in myotonic dystrophy type 1. Rev
2018;18(1):14-26.
Esp Cardiol. 2021;74(11):986-987.
66. Kley RA, Leber Y, Schrank B, et al. FLNC-Associated
58. Datta N, Ghosh PS. Update on Muscular Dystrophies
Myofibrillar Myopathy: New Clinical, Functional, and
with Focus on Novel Treatments and Biomarkers. Curr
Proteomic Data. Neurol Genet. 2021;7(3):e590.
Neurol Neurosci Rep. 2020;20(6):14.
67. Felice KJ. Distal Myopathies. Neurol Clin.
59. LoRusso S, Weiner B, Arnold WD. Myotonic
2020;38(3):637-659.
Dystrophies: Targeting Therapies for Multisystem Disease.
Neurotherapeutics. 2018;15(4):872-884. 68. Selcen D. Myofibrillar myopathies. Neuromuscul Disord.
2011;21(3):161-171.
60. Crudele JM, Chamberlain JS. AAV-based gene
therapies for the muscular dystrophies. Hum Mol Genet. 69. Verdonschot JAJ, Vanhoutte EK, Claes GRF, et al. A
2019;28(R1):R102-R107. mutation update for the FLNC gene in myopathies and
cardiomyopathies. Hum Mutat. 2020;41(6):1091-1111.
61. Butterfield RJ. Congenital Muscular Dystrophy and
Congenital Myopathy. Continuum (Minneap Minn).
2019;25(6):1640-1661.
Capítulo 31 400
PARTE 7
DISTÚRBIOS DO MOVIMENTO
CAPÍTULO 32
DOENÇA DE PARKINSON
INTRODUÇÃO
A doença de Parkinson (DP) é uma enfermidade
neurodegenerativa, progressiva, de causa ainda
idiopática, que é considerada a segunda doença
neurogenerativa mais comum no mundo, após a doença
de Alzheimer1-3. Tem uma incidência estimada entre
4,9 a 26 casos por 100.000, e uma prevalência de 102
a 190 casos por 100.00, acometendo cerca de 2% das
pessoas com idade superior a 65 anos1-7. Do ponto de
vista histórico, a DP foi descrita em 1817, portanto há
mais de 200 anos, por James Parkinson (1755-1824),
um apotecário inglês que ficou famoso mundialmente,
após a publicação de uma monografia clássica intitulada
“An Essay on the Skaking Palsy”8,9. (Figura 1) Coube ao
Professor Jean-Martin Charcot (Figura 2) Figura 2: Professor Jean-Martin Charcot (1825-1893).
Fonte: Acervo pessoal do autor, 2021.
Capítulo 32 402
Lewy descobriu a presença de corpos de inclusão DP, com a publicação de um estudo de necrópsia em
citoplasmática na substância negra, que seriam que os autores identificaram os estágios patológicos
posteriormente denominadas de corpos de Lewy, evolutivos da DP, caracterizando o acometimento
por Konstantin Tretiakoff, em 1919 12,13
. No ano de inicial do nervo vago, da medula oblonga e da ponte,
1958, Arvid Carlson fez a primeira desmonstração antes do acometimento do mesencéfalo/substância
da ação da dopamina no cérebro, como um negra (estágios de I a VI)12,13,15. Esta descoberta
neurotransmissor. No ano seguinte, em 1960, Oleh permitiu a definição dos chamados sinais pré-
Hornykiewicz descobriu a redução dos níveis da motores da DP, como a hiposmia, a obstipação,
dopamina ao nível do corpo estriado dos pacientes o distúrbio comportamental do sono REM e a
com DP 12,13
. Depois desta descoberta ele sugeriu ao depressão (conhecidos como sinais preditivos da
seu colega Walther Birkmayer o uso de levodopa em DP)15,16. Finalmente, nos anos de 2014 e 2016, foram
pacientes com DP. Estratégia esta que também foi publicados vários estudos, como os de Guo e de
utilizada por outros como George Cotzias e Melvin Mao, enfatizando uma nova hipótese de transmissão
Yahr 12,13
. Posteriormente, no de 1961, a levodopa foi da DP, com um mecanismo transmissão da proteína
utilizada com eficácia no tratamento da DP por André α-sinucleína via célula-célula, de forma semelhante
Barbeau. No ano de 1967, George Cotzias utilizou ao que ocorre nas doenças priônicas12,13. Desde
pela primeira a combinação de levodopa associada então, o eixo intestino-cerebral (com a detecção
com um inibidor da dopa-descarboxilase periférica, precoce da presença da proteína α-sinucleína no
com melhora da eficácia do tratamento da DP 12,13
. sistema nervoso entérico) tem sido aventado como
Neste mesmo ano de 1967, Melvin Yahr e Margareth o principal sistema relacionado com a etiopatogenia
Hoehn, estabeleceram os estágios evolutivos da DP da DP12,13,17-19 (Tabela 2). Por fim, deve-se lembrar
(H & Y – I a V)12-14. Nos anos de 1970 e 1974, George também de importantes contribuições clínicas dos
Cotzias e Donald Calne realizaram estudos com uso, professores C. David Marsden, já falecido, um dos
pela primeira vez, de apomorfina e de bromocriptina neurocientistas mais produtivos do século XX, e
(um agonista dopaminérgico), respectivamente, no do Professor Andrew J. Lees, outro neurocientista
tratamento de pacientes com DP 12,13
. No início dos de destaque mundial, ambos do National Hospital
anos 80, William Langston e Irwin Kopin encontraram for Neurology and Neurosurgery, e do University
uma causa da DP, relacionada com o meio ambiente College of London, em Londres, da Inglaterra, no
(intoxicação pelo MPTP), com a descrição de Reino Unido20-23. O professor Marsden contribuiu de
quadros de parkinsonismo em jovens estudantes forma significativa com as pesquisas relacionadas
universitários viciados em drogas 12,13
. No ano de 1997, à etiopatogenia da DP, em particular, com estudos
foi realizada por Spillantini e colegas a identificação sobre estresse oxidativo, defeitos no complexo 1
das principais proteínas que compõem os corpos de da mitocôndria, e estudos bioquímicos, além da
Lewy, sendo a α-sinucleína a mais importante. 12,13
sua participação na criação do banco de cérebro de
Ainda em 1997, Mihael Polymeropoulos descobriu Londres20,22,23. Já o professor Lees foi considerado
os primeiros casos de DP em famílias oriundas da recentemente como o pesquisador da área de
Itália, relacionadas com a presença de mutações distúrbios do movimento, com maior número de
genéticas (o gene da α-sinucleína, definido como citações de artigos relevantes relacionados com a
SNCA ou PARK 1) 12,13
. Outro marco importante DP21-23. Lees tem inúmeras importantes contribuições
no tratamento da DP, surgiu no ano de 1987, no conhecimento da DP, em particular os estudos
quando Alim-Louis Benabid introduziu o tratamento com o banco de cérebro de Londres, e as correlações
neurocirúrgico, com a estimulação cerebral profunda clínico-patológicas, que definiram de forma mais
(DBS) 12,13
. No ano de 2003, Heiko Braak et al. adequada a evolução natural da doença21.
formularam uma nova hipótese etiopatogênica da
Capítulo 32 403
1- Sugestão do nome “doença de Parkinson”
2- Definição e caracterização do tremor como sinal cardeal da DP
3- Diagnóstico diferencial do tremor da DP, do tremor senil (tremor essencial) e da esclerose múltipla
4- O tremor da DP não costuma acometer a cabeça
5- Descrição da instabilidade postural da DP (“Pull test”)
6- Presença de micrografia
7- Definição da disartria e da hipofonia
8- Descrição da rigidez muscular
9- Definição da bradicinesia
10- Definição da ausência de fraqueza muscular
11- Definição da presença de disfunção cognitiva
12- Primeiro tratamento medicamentoso (Uso de alcaloides de beladona/hioscinamida (uma medicação anti-
colinérgica)
Tabela 1: Principais contribuições de Charcot na DP.
Fonte: Adaptado de Goetz, 198610.
Capítulo 32 404
Na atualidade, a DP é considerada uma ligase do sistema da ubiquitina, Ubiquitina C-terminal
enfermidade multisistêmica, com comprometimento hidrolase-UCH (Park 5), Pink1 (Park 6), DJ-1 (Park
de vários sistemas monoaminérgicos (dopaminérgico, 7) e LRRK2 (Park 8). Uma característica comum
noradrenérgico, colinérgico e serotoninérgico) . 1-7
a todos estes genes é que de uma forma geral, a
A ideia prévia de que a etiopatogenia da DP maioria dos genes estão relacionados com o sistema
estaria relacionada somente com a perda neuronal proteosomal-ubiquitina e desta forma envolvidos
progressiva da parte compacta da substância com o processo etiopatogênico da DP25-43.
negra do mesencéfalo, com o subsequente déficit
A primeira mutação descrita, a da α-sinucleína
dopaminérgico, e a disfunção nigro-estriatal, levando
é de ocorrência extrememente rara, encontrada
ao aparecimento dos clássicos sinais motores,
em poucas famílias da Itália e Grécia, tendo sido
bradicinesia, rigidez muscular, tremor de repouso
pesquisada em outros países, inclusive no Brasil,
e, posteriormente, instabilidade postural, tem se
com resultados negativos43-45.
modificado substancialmente . 1-6
Na atualidade,
pode-se correlacionar a evolução da DP, com o Do ponto de vista epidemiológico, a mutação
seu cortejo sintomático clássico, incluindo também Park 2 ou Parkin é a mais importante tendo sido
os chamados sinais e sintomas não-motores, com encontrada em cerca de 49 % dos pacientes com
os estágios neuropatológicos propostos, em 2003, Parkinsonismo de início precoce (com início antes
por Braak et al15. Estes autores definiram em um dos 45 anos) e em 77% dos pacientes com início
estudo neuro-patológico bem delineado, que a DP antes dos 20 anos (parkinsonismo juvenil)25-28.
apresenta seis estágios evolutivos, com início da Periquet et al. avaliaram a presença da mutação
enfermidade ao nível da medula oblonga (núcleo parkin em pacientes com parkinsonismo de início
motor dorsal do nervo vago) e, também, do bulbo precoce, casos isolados, e encontrou uma frequência
2), mesencéfalo (estágio 3) até acometer as áreas Outra característica clínica importante
corticais (estágios 4, 5, e 6) . De acordo com o
3
nos pacientes portadores da mutação parkin é a
estudo de Braak et al., a DP, com o seu marcador ocorrência de fenótipos diferentes, com a presença
neuropatológico definido como uma sinucleinopatia, de hiperreflexia, distonia no início do quadro,
acometeria vários sistemas mono-aminérgicos, apresentação simétrica, além de fenótipos atípicos
incluindo assim os sistemas noradrenérgico (com o como, por exemplo, a presença de tremor ortostático
aparecimento do distúrbio comportamental do sono e ataxia cebebelar26-29.
REM), serotoninérgico (depressão), dopaminérgico
As formas monogênicas, com herança
(síndrome rígido-acinética) e também colinérgico
autossômica recessiva, como a Park 6 e a Park 7,
(disfunção cognitiva)15,16. Em relação ao processo
representam formas muito raras de DP, enquanto
etiopatogênico da DP, várias considerações devem
que a mutação LRRK2 (Park 8) representa uma
ser feitas, com ênfase as possíveis etiologias,
forma mais comum de DP, com herança autossômica
incluindo fatores genéticos e ambientais, bem como
dominante ou esporádica (recessiva), descrita com
as novas propostas relacionadas com o processo
grande frequência em judeus asquenazi e árabes
patogênico da enfermidade16-19,24.
do norte da África46. Mais recentemente, novas
Nos últimos anos, vários loci foram mutações genéticas foram encontradas em pacientes
descobertos e diferentes genes foram clonados em com DP, como a mutação do gene GBA, que causa
famílias com DP. Estes loci foram definidos como a doença de Gaucher, e a mutação VPS35, definida
Park 1 (gene SNCA) sendo que os principais genes como Park1743 (Tabela 3).
mais importantes são conhecidos como α-sinucleína
(Park 1), Parkin (Park 2), que na verdade é uma
Capítulo 32 405
Gene Herança Início da doença
PARK1/PARK4 - SNCA Autossômica dominante Precoce
PARK 2- PARKIN Autossômica recessiva Precoce ou Juvenil
PARK 6 – PINK 1 Autossômica recessiva Precoce ou Juvenil
PARK 7 – DJ1 Autossômica recessiva Precoce ou Juvenil
PARK 8 – LRRK2 Autossômica dominante/recessiva Tardio
PARK 17 – VPS35 Autossômica dominante Precoce
GBA Autossômica dominante Precoce
Tabela 3: Genética da doença de Parkinson – formas monogênicas.
Fonte: Adaptado de Lohmann et al., 2009 41.
forma de doença priônica47.
Capítulo 32 406
cadeira de rodas, necessitando de ajuda total14,50. das pernas (bater com o calcanhar no chão em
sucessões rápidas), o levantar da cadeira, e a
A DP pode ser classificada, de acordo com
diminuição dos gestos de uma forma geral), entre
a idade de início, ou dependendo da forma de
outros72. Outro sinal de suma importância na DP
apresentação clínica, em diferentes subtipos, quais
é a presença do tremor. O tremor de repouso é
sejam: a) forma clássica, com início ao redor dos
caracterizado por ser de 4 a 6 Hz, com o membro
60 anos; b) parkinsonismo de início precoce (abaixo
em repouso, e que é suprimido durante o início do
de 45 anos); c) parkinsonismo juvenil (início abaixo
movimento. Trata-se de um tremor mais comumente
dos 21 anos); d) parkinsonismo tremulante benigno
nas mãos, predominantemente de repouso, com
(de início tardio); e) DP benigna; f) DP maligna; g)
baixa frequência, tipo pronação-supinação72. Por
DP com instabilidade postural/distúrbio de marcha;
vezes, existe um tremor de mãos, postural, re-
h) DP forma rígido-acinética; e i) DP com tremor
emergente. O tremor ocorre em 70% dos pacientes
predominante5,51.
com DP72. Associa-se, frequentemente, à presença
de rigidez muscular, com ou sem a presença do
sinal da roda denteada. A rigidez muscular, definida
QUADRO CLÍNICO como a presença de movimento passivo lento das
Em primeiro lugar, existe uma série de juntas maiores, com o paciente em posição relaxada
sintomas, definidos como não motores, que podem e com o examinador manipulando os membros e
preceder o início dos sintomas motores da DP. o pescoço72. A rigidez muscular é melhor avaliada
Alguns deles são chamados de sinais preditivos da pelo movimento passivo das grandes articulações,
DP, e incluem a presença de depressão, obstipação, estando o paciente sentado e relaxado. A rigidez
hiposmia e o distúrbio comportamental do sono muscular, também caracterizada como tipo “cano
REM (um marcador de sinucleinopatias)1-6,52-71. A de chumbo”, é definida como uma resistência,
sequência de aparecimento e a evolução dos sinais velocidade independente, ao movimento passivo, a
não motores da DP encontra-se resumida na Figura qual pode estar ou não associada com a presença
1. do fenômeno da roda denteada72. Um sinal mais
Dentre os sinais motores da DP, destaca-se tardio, é a presença de instabilidade postural, que
a presença de bradicinesia, também definida como é avaliada pelo pull test, descrito originalmente por
hipocinesia/oligocinesia ou acinesia69-72. A Movement Charcot, e que consiste na resposta ao deslocamento
Disorder Society (MDS) define bradicinesia como súbito para trás, puxando o paciente pelos ombros,
lentidão de movimento e decremento na amplitude com o mesmo ereto, de olhos abertos e os pés
ou velocidade do movimento repetitivo72. Existem separados. Na resposta patológica, o paciente tem
inúmeros sinais ou manobras que definem a presença uma retropulsão, sem recuperação, com graus
de bradicinesia e, dentre eles, pode-se destacar: variados72. Outros sinais associados são a postura
a bradifrenia, a redução da taxa de piscamento recurvada (postura simiesca), e a presença de
palpebral (em torno de 12/minuto, para um normal bloqueio motor (ou freezing), principalmente nos
de 24), o facies com hipomímica, a boca entreaberta, estágios mais avançados da doença69-72.
por vezes com sialorreia, a disartria, com hipofonia, a Com relação às manifestações não-motoras
micrografia, a redução dos movimentos automáticos da DP, pode-se dividi-las didaticamente em: 1)
dos membros superiores na marcha (arm swing), o sintomas neuro-psiquiátricos; 2) distúrbios do sono;
teste do bater dos dedos continuadamente (finger 3) sinais e sintomas autonômicos; 4) sintomas
taps), os movimentos das mãos (abrir e fechar gastrointestinais; 5) sintomas sensitivos; e 6) outros
rapidamente), os movimentos rápidos e alternados sintomas52-68.
das mãos (pronação e supinaçâo), a agilidade
Capítulo 32 407
Figura 1: Progressão dos sinais não-motores através dos diferentes estágios da DP.
RBD: Distúrbio comportamental do sono REM.
Fonte: Adaptado de Hawkes, 200857.
Capítulo 32 408
As manifestações neuropsiquiátricas mais presença de afasia ou demência, a presença
comuns da DP são, depressão, apatia, anedonia, de parkinsonismo predominante em membros
ansiedade (incluindo crises de pânico), distúrbio inferiores, o uso prévio de drogas bloqueadoras
de atenção, comportamento obsessivo-compulsivo, de receptores dopaminérgicos ou depletoras de
demência (que pode ocorrer em cerca de 30% dos dopamina, a ausência de reposta terapêutica ao uso
casos), episódios de confusão mental (delirium), de altas doses de levodopa, presença de sinais de
delírio e alucinações 52-68
. perda sensitiva cortical, exames de neuroimagem
funcional do sistema dopaminérgico pré-sináptico
Dentre os vários distúrbios do sono, destacam-
normal, entre outros), as chamadas red flags (como,
se o distúrbio comportamental do sono-REM, a
por exemplo, a rápida progressão do distúrbio
síndrome das pernas inquietas e os movimentos
de marcha, a completa falta de progressão dos
periódicos dos membros, a insônia, a sonolência
sintomas e sinais motores, a presença de disfunção
excessiva diurna, e a síndrome de apneia do sono52-
bulbar precoce, a disfunção respiratória inspiratória/
68
.
estridor, a disfunção autonômica acentuada e
A disfunção autonômica da DP pode-se precoce, quedas precoces recorrentes, presença
manifestar com o aparecimento de urgência/ de anterocolo desproporcionado, presença de
incontinência urinária, hipotensão arterial ortostática, sinais piramidais, e quadro de parkinsonismo
disfunção sexual (incluindo disfunção erétil) e a simétrico, entre outros sinais), que sempre sinalizam
hiperidrose52-67. para o diagnóstico diferencial com formas de
Na esfera gastrointestinal, sobressaem- parkinsonismo atípico) e os critérios de suporte
se na DP os sintomas de sialorreia, disgeusia, para o diagnóstico da DP72. Dentre os critérios de
disfagia, náuseas, obstipação intestinal e, também, suporte para o diagnóstico da DP estão: a resposta
incontinência fecal 52-67
. clara e objetiva ao uso de dopaminérgicas, o
aparecimento posterior de flutuações motoras e de
Os sintomas sensitivos mais comuns são dor
discinesias, e a presença de resultados positivos em
(que leva o paciente com DP, no início da doença,
testes auxiliares, como a detecção de hiposmia, e
muitas vezes, a consultas com ortopedistas e
a documentação de desinervação cardíaca através
reumatologistas), as parestesias e a hiposmia (este,
do exame de cintilografia com uso de meta-iodo-
um dos sintomas mais precoces da DP, vide estágio
benzilguanidina72. Foram delineados ainda dois
1 de Braak et al.)52-67.
níveis de certeza: a DP clinicamente estabelecida,
Por fim, uma série de outros sintomas não e a DP provável. Os critérios diagnósticos para a
motores acometem os pacientes com DP, quais DP estabelecem a ausência absoluta dos critérios
sejam, queixas de fadiga, diplopia, seborreia e, de exclusão, a presença de no mínimo dois critérios
também, perda de peso52-67. suportivos e a exclusão das chamadas red flags72.
Seguindo as determinações deste novo critério
diagnóstico, existe a necessidade, em primeiro
DIAGNÓSTICO DA DOENÇA DE lugar, da definição do quadro de parkinsonismo,
PARKINSON
o qual tem por base a presença fundamental de
No ano de 2015, um grupo de experts em
bradicinesia, associada com um segundo sinal
DP da MDS publicou um artigo definindo os novos
que pode ser rigidez muscular ou tremor de
critérios clínicos para o diagnóstico da DP72. Foram
repouso. A instabilidade postural é considerada
definidos critérios de exclusão absoluta (como a
um sinal de aparecimento mais tardio. A presença
presença de sinais cerebelares evidentes, a presença
de parkinsonismo, de forma assimétrica, com boa
de paralisia da mirada vertical supranuclear, a
resposta, nos primeiros 3 anos da doença com o uso
Capítulo 32 409
de levodopa (na dose mínima de ao menos 450 mg exame complementar que pode ser usado na
ao dia) sugere o diagnóstico de DP. Pode-se associar investigação dos quadros de parkinsonismo típico
ainda a estes dados a presença de flutuações e atípicos está a cintilografia miocárdica, com uso
motoras (tipos wearing off e on-off) e de discinesias, de metaiodobenzilguanidina, que pode demonstrar
após 3 a 5 anos de tratamento com levodopa . 72
sinais de desinervação pré-sináptica nos casos de
Obviamente que o diagnóstico de DP exclui a DP62,63,72.
presença das chamadas red flags que sugerem o
diagnóstico de parkinsonismo atípico, quais sejam,
demência precoce, disautonomia precoce, presença TRATAMENTO
de oftalmoplegia, ataxia cerebelar, sinais piramidais, O tratamento da DP vai depender de
neuropatia periférica, distonia, mioclonia, apraxia, uma forma geral de vários fatores, quais sejam,
bem como a presença dos distúrbios sensitivos idade do paciente, grau de incapacidade motora,
corticais . Os principais diagnósticos diferenciais da
72
estado cognitivo, e por fim dos riscos e benefícios
DP, são os chamados parkinsonismos atípicos, como da medicação escolhida74,75. Na atualidade, o
a paralisia supranuclear progressiva (PSP), a atrofia tratamento dos sintomas e sinais motores da DP,
de múltiplos sistemas (AMS-tipo P), a demência a maior parte deles de origem dopaminérgica, tem
associada com corpos de Lewy e a degeneração como opções terapêuticas o uso de inibidores da
córtico-basal, além de formas de parkinsonismo MAO tipo B (monoamino oxidase), como a rasagilina
heredo-degenerativo (como a doença de Wilson, e a selegelina, os agonistas dopaminérgicos (como
a doença de Huntington, a doença de Niemann- o pramipexol, e o rotigotine, sendo que o ropinirol
Pick, além de formas de ataxias espinocerebelares e o piribedil não estão disponíveis no Brasil), a
(SCAs), como a doença de Machado-Joseph), além levodopa (nas associações com benserazida e com
das formas de parkinsonismo secundário . Dentre 69
carbidopa, na forma standard e na forma de liberação
os quadros de parkinsonismo secundário, deve-se prolongada, ou ainda na forma de liberação dupla e
lembrar dos parkinsonismo secundário ao uso de dispersível), os inibidores da COMT (catecol-orto-
drogas, como os neurolépticos típicos (haloperidol, metil transferase), como o entacapone, também
risperidona e olanzapina), as drogas bloqueadoras utilizado na tríplice combinação, com levodopa e
de cálcio (flunarizina, cinarizina, nifedipina e carbidopa, o tolcapone, além do uso de amantadina.
anlodipina), bem como ao uso de metoclopramida O uso de drogas anticolinérgicas deve ser utilizado
e bromoprida. Outras formas de parkinsonismo somente em casos especiais, e na atualidade são de
secundário, estão o parkinsonismo vascular e pouca utilidade, principalmente após as publicações
quadros de hidrocefalia, entre outros. Por fim, não de vários estudos correlacionando o uso de drogas
se pode esquecer o diagnóstico diferencial entre anticolinérgicas e o aumento de placas de amiloide e
DP e o tremor essencial 69-73
. Dentre os exames aumento de disfunção cognitiva nos pacientes com
complementares que podem auxiliar no diagnóstico DP 1-6,74-82
(Tabela 4).
do parkinsonismo, estão o exame de ultrassom
No último ano, tivemos a aprovação em
transcraniano (com o sinal de hiper-ecogenicidade
países da Europa e América do Norte de novos
da substância negra do mesencéfalo), a ressonância
medicamentos, como a levodopa na forma de spray
magnética do encéfalo (com a ausência do sinal da
(para uso de emergência), da istradefilina (uma
cauda da andorinha no mesencéfalo) e a cintilografia
droga com ação em receptores da adenosina 2A),
cerebral (SPECT, com uso de Trodat) com a
uma apresentação de apomorfina sublingual (na
detecção do déficit de transporte dopaminérgico
forma de um pequeno filme para uso sublingual),
pré-sináptico. Deve-se lembrar que são sinais de
além de drogas com ação inibidora da MAO B e
parkinsonismo, mas não exclusivos da DP. Outro
Capítulo 32 410
ação anti-glutamatérgica (safinamida), que deve ser nas fases intermediária e avançada (com restrições
lançada neste ano no Brasil, e uma nova droga com aos pacientes com demência, por exemplo), com
ação de inibição da COMT (opicapone), em dose diferentes métodos, como os ablativos (palidotomia
única diária (Tabela 5). e muito raramente talamotomia, hoje em desuso),
além da estimulação cerebral profunda – DBS – (no
De uma forma geral, o tratamento da DP pode
núcleo sub-talâmico ou no globo pálido), dependendo
ser dividido didaticamente, no tratamento da fase
da apresentação clínica e das complicações motoras.
inicial (os primeiros 3 a 5 anos), a fase intermediária
Mais recentemente uma nova técnica de tratamento
(do sexto ao décimo ano) e da fase avançada (após
não cirúrgico tem sido utilizada em pacientes
11 anos). Existe um consenso de que na fase inicial,
com DP, principalmente idosos, a chamada FUS
particularmente em pacientes com idade abaixo de
(Focused-Ultra Sound)87,88.
60 anos, com grau de incapacitação baixo, pode-se
optar pelo uso de drogas inibidoras da MAO-B, como O caso clínico descrito abaixo ilustra um caso
a rasagilina, e de agonistas dopaminérgicos (como o de DP com sinais motores e não motores.
pramipexol e a rotigotina). Da mesma forma, pode-
Paciente masculino, de 62 anos de idade,
se fazer o uso de levodopa, em doses baixas (abaixo
procura atendimento neurológico por apresentar
de 450 mg ao dia). Na fase intermedíária, torna-se
queixas, com 3 anos de evolução, com micrografia,
obrigatório o uso de levodopa, em combinação com
falta de destreza da mão direita, dor em ombro
inibidores da MAO-B, de agonistas dopaminérgicos,
direito, apatia, desânimo, fadiga. Referia uso de
de inibidores da COMT (como o entacapone), além do
sertralina 75 mg ao dia e várias consultas prévias,
uso de amantadina, para o tratamento das flutuações
com clínico geral, ortopedista, e geriatra, com
motoras (on-off e wearing off) e das discinesias.
exames sanguíneos de rotina, RX de ombro direito,
Na fase avançada, além dos medicamentos já
RM do crânio, coluna cervical, todos com resultados
citados, utilizam-se outras formas de levodopa (com
normais. Entre outras queixas, havia ainda perda do
liberação lenta, combinada com a standard, além
olfato, obstipação intestinal e a esposa declarava
da forma dispersível), com diferentes associações
que o sono do paciente tinha se tornado, já há
de medicamentos. Nesta fase faz-se necessário o
alguns anos, muito agitado, com sonhos intensos,
tratamento dos diferentes sintomas não motores,
associados com gritos, movimentos excessivos,
com o tratamento da disautonomia, dos distúrbios
inclusive com agressão física à esposa. O exame
do sono, da disfunção cognitiva e o tratamento dos
neurológico revelou a presença de bradicinesia em
distúrbios psiquiátricos, além das comorbidades
dimídio direito, particularmente no membro superior
comuns nos pacientes com DP, em fase avançada
direito, associado com rigidez muscular e sinal
(hipertensão arterial sistêmica, hipotireoidismo,
da roda denteada. O paciente diagnosticado com
síndromes dispépticas, osteoartrose, dislipidemias,
parkinsonismo, e estádio de Hoehn-Yahr = 1, e após
etc) 74-82
(Tabela 6). Dentre os principais efeitos
uso da tríplice combinação levodopa-carbidopa-
colaterais da terapia dopaminérgica, deve-se
entacapona, na dose de 50 mg, três vezes ao dia,
lembrar dos quadros dispépticos, hipotensão arterial
ocorreu boa melhora clínica.
postural, sintomas neuro-psiquiátricos (alucinações
visuais e confusão mental), sonolência, além dos O relato de caso acima apresentado demonstra
distúrbios do controle do impulso (hipersexualidade, que os sinais não-motores da DP, muitas vezes são
síndrome da desregulação dopaminérgica, ou leves, e sem a presença de tremor, podem ter maior
O tratamento neurocirúrgico pode ser utilizado Deve-se ressaltar ainda que os sintomas e
sinais não motores da DP estão, na maior parte,
Capítulo 32 411
Fase inicial:
IMAO-B
Agonistas Dopaminérgicos
Levodopa
Fase intermediária:
Levodopa
IMAO-B + Agonistas Dopaminérgicos + ICOMT + Amantadina
Fase avançada:
Polifarmácia
Tratamento das flutuações e discinesias
Tratamento da disautonomia
Tratamento dos distúrbios do sono
Tratamento da disfunção cognitiva
Tratamento dos distúrbios psiquiátricos
Medicações anti-depressivas
Medicações ansiolíticas
Drogas para os distúrbios do sono
Uso de domperidona
Uso de laxantes
Drogas para hipotensão postural
Drogas para incontinência urinária
Drogas para a disfunção erétil
Drogas anti-psicóticas (neurolépticos atípicos)
Drogas inibidoras da enzima acetil-colinesterase
Capítulo 32 412
relacionados com disfunção de vários sistemas clínicos e neurocirúrgicos estão sendo utilizados,
monoaminérgicos, não dopaminérgicos, e portanto, no sentido de melhorar a qualidade de vida dos
podem requerer a utilização de várias medicações, pacientes com DP.
incluindo anti-depressivos, benzodiazepínicos,
laxantes, medicamentos para controle da
incontinência urinária e da hipotensão ortostática, REFERÊNCIAS
fazendo com que o paciente utilize, de forma 1. Espay AJ, Lang AE. Parkinson Diseases in the 2020s
and Beyond: Replacing Clinico-Pathologic Convergence
combinada, uma série de medicamentos, além do With Systems Biology Divergence. J Parkinsons Dis.
tratamento dopaminérgico padrão. Esta abordagem 2018;8(s1):S59-S64.
racional acima referida causa, com frequência, 2. Kalia LV, Lang AE. Parkinson disease in 2015: Evolving
basic, pathological and clinical concepts in PD. Nat Rev
dificuldades para a aderência dos pacientes ao Neurol. 2016;12(2):65-66.
tratamento politerápico, causando assim piora da
3. Lees AJ. The Parkinson's chimera. Neurology.
qualidade de vida dos pacientes com DP1-6,74,75. 2009;72(2):S2-S11.
4. Marras C, Lang A. Changing concepts in Parkinson's
Torna-se crucial, desta forma que o médico
disease. Moving beyond the decade of the brain. Neurology.
neurologista, com experiência no atendimento de 2008;70:1996-2003.
pacientes com DP, particularmente aqueles em 5. Thenganatt MA, Jankovic J. Parkinson disease subtypes.
fase avançada, tenha uma boa relação médico- JAMA Neurol. 2014;71:499-504.
paciente e um grande conhecimento das diversas 6. Silveira-Moriyama L, Lees AJ. Parkinson disease: How
reliable are prodromal indicators of Parkinson disease? Nat
complicações motoras da enfermidade (flutuações Rev Neurol. 2015;11:5-6.
motoras e discinesias), bem como das diversas 7. Brooks DJ. The early diagnosis of Parkinson’s disease.
manifestações não motoras, acima explicitadas. Ann Neurol. 1998;44:S10-S18.
Soma-se a isso ainda o fato de que a maioria dos 8. Parkinson J. An essay on the shaking palsy. 1817. J
Neuropsychiatry Clin Neurosci. 2002;14(2):223-236.
pacientes com DP, em fase avançada, apresentam
inúmeras comorbidades, tais como hipertensão 9. Kempster PA, Hurwitz B, Lees AJ. A new look at James
Parkinson's Essay on the Shaking Palsy. Neurology.
arterial sistêmica, dislipidemias, diabetes mellitus, 2007;69:482-485.
osteoartrose, osteoporose, dispepsias (incluindo 10. Goetz CG. Charcot on Parkinson's disease. Mov Disord.
refluxo gastroesofágico e hérnia de hiato esofágico), 1986;1:27-32.
entre outras, que necessitam de tratamento específico 11.Teive HA. Charcot's contribution to Parkinson's disease.
Arq Neuropsiquiatr. 1998;56:141-145.
e por vezes podem provocar o aparecimento de
12. Li S, Le W. Milestones of Parkinson's Disease
interações medicamentosas devido a politerapia research: 200 years of history and beyond. Neurosci Bull.
utilizada74,75. 2017;33(5):598-602.
13. Przedborski S. The two-century journey of Parkinson's
disease research. Nat Rev Neurosci. 2017;18:251-257.
14. Hoehn MM, Yahr MD. Parkinsonism: onset, progression
CONCLUSÃO and mortality. Neurology. 1967;17(5):427-442.
A DP é uma enfermidade neurodegenerativa 15. Braak H, Del Tredici K, Rub U, de Vos RA, Jansen Steur
progressiva, multi-sistêmica, com o comprometimento EN, Braak E. Staging of brain pathology related to sporadic
Parkinson’s disease. Neurobiol Aging. 2003;24(2):197-211.
de vários sistemas monoaminérgicos, e com
16. Braak H, Del TK. Invited Article: Nervous system
apresentações clínicas diversas, com sinais motores pathology in sporadic Parkinson disease. Neurology.
e não motores. Novos mecanismos etiopatogênicos 2008;70:1916-1925.
estão sendo estudados na atualidade, com a 17. Grathwohl SA, Steiner JA, Britschgi M, Brundin P. Mind
discussão de diferentes fatores genéticos e the gut: secretion of α-synuclein by enteric neurons. J
Neurochem. 2013;125(4):487-490.
ambientais, incluindo o papel do intestino na gênese
18. Borghammer P, Van Den Berge N. Brain-First versus
da doença. Da mesma forma, novos tratamentos Gut-First Parkinson’s Disease: A Hypothesis. J Parkinsons
Dis. 2019;9(s2):S281-S295.
Capítulo 32 413
19. Chao YX, Gulam MY, Chia NSJ, Feng L, Rotzchke 35. Di Fonzo A, Tassorelli C, De Mari M, et al.
O, Tan EK. Gut-brain axis: potential factors involved in Comprehensive analysis of the LRRK2 gene in sixty families
the pathogenesis of Parkinson's disease. Front Neurol. with Parkinson’s disease. Eur J Hum Genet. 2006;14:322–
2020;11:849. 331.
20. Teive HA, Zavala JA, Iwamoto FM, Sá D, Carraro H Jr, 36. Bonifati V. Genetics of Parkinsonism. Parkinsonism and
Werneck LC. As contribuições de Charcot e de Marsden Related Disorders. 2007;13:S233–241.
para o desenvolvimento dos distúrbios do movimento nos
37. Paisan-Ruiz C, Nath P, Washecka N, Gibbs JR,
séculos XIX e XX. Arq Neuropsiquiatr. 2001;59(3-A):633-
Singleton AB. Comprehensive analysis of LRRK2 in publicly
636.
available Parkinson’s disease cases and neurologically
21. Teive HAG, Meira AT, Camargo CHF, Cardoso FEC. normal controls. Hum Mutat. 2008;29:485–490.
Tribute to Professor Andrew J. Lees. Arq Neuropsiquiatr.
38. Munhoz RP, Wakutani Y, Marras C, et al. The G2019S
2020;78(5):307-310.
LRRK2 mutation in Brazilian patients with Parkinson’s
22. Sorensen AA, Weedon D. Productivity and impact of the disease: phenotype in monozygotic twins. Mov Disord.
top 100 cited Parkinson's disease investigations since 1985. 2008;23(2):290-294.
J Park Dis. 2011;1(1):3-13.
39. Lesage S, Brice A. Parkinson’s disease: from monogenic
23. Ponce FA, Lozano A. The most cited Works in forms to genetic susceptibility factors. Hum Mol Genet.
Parkinson's disease. Mov Disord. 2011;26(3):380-390. 2009;18(R1):R48-59.
24. Kline EM, Houser MC, Herrick MK, et al. Genetic and 40. Camargos ST, Dornas LO, Momeni P, et al. Familial
Environmental Factors in Parkinson’s Disease Converge Parkinsonism and early onset Parkinson’s disease
on Immune Function and Inflammation. Mov Disord. in a Brazilian movement disorders clinic: phenotypic
2021;36(1):25-36. characterization and frequency of SNCA, PRKN, PINK1,
and LRRK2 mutations. Mov Disord. 2009;15:24:662-666.
25. Shimura H, Hattori N, Kubo S, et al. Familial Parkinson
disease gene product, parkin, is a ubiquitin-protein ligase. 41. Lohmann E, Thobois S, Lesage S, et al. A
Nat Genet. 2000;25:302–305. multidisciplinary study of patients with early-onset PD with
and without parkin mutations. Neurology. 2009;13:110-116.
26. Lucking CB, Durr A, Bonifati V, et al. Association
between early-onset Parkinson’s disease and mutations in 42. Silveira-Moriyama L, Munhoz RP, de J Carvalho M, et
the parkin gene. N Engl J Med. 2000;342:1560–1567. al. Olfactory heterogeneity in LRRK2 related Parkinsonism.
Mov Disord. 2010;25(16):2879-2883.
27. Periquet M, Latouche M, Lohmann E, et al. Parkin
mutations are frequent in patients with isolated early-onset 43. Liu X, Le W. Profiling no-motor symptoms in
parkinsonism. Brain. 2003;126:1271-1278. monogenic Parkinson's Disease. Front Aging Neurosci.
2020;12:591183.
28. Lohmann E, Periquet M, Bonifati V, et al. How much
phenotypic variation can be attributed to parkin genotype? 44. Polymeropoulos MH, Lavedan C, Leroy E, et al.
Ann Neurol. 2003;54:176–185. Mutation in the alpha-synuclein gene identified in families
with Parkinson's Disease. Science 1997;276:2045-2047.
29. Rawal N, Periquet M, Lohmann E, et al. New
parkin mutations and atypical phenotypes in families 45. Teive HAG, Raskin S, Iwamoto FM, et al. The G2009A
with autosomal recessive parkinsonism. Neurology. mutation in the alpha-synuclein gene in Brazilian families
2003;60:1378-1381. with Parkinson's disease. Arq Neuropsiquiatr. 2001;59(3-
B):722-724.
30. Zimprich A, Biskup S, Leitner P, et al. Mutations in
LRRK2 cause autosomal-dominant parkinsonism with 46. Lesage S, Patin E, Condroyer C, et al. Parkinson's
pleomorphic pathology. Neuron. 2004;44:601–607. disease- related LRRK2 G2019S mutation results from
independente mutational events in humans. Hum Mol
31. Paisan-Ruiz C, Jain S, Evans EW, et al. Cloning of
Genet. 2010;19(10):1998-2004.
the gene containing mutations that cause PARK8-linked
Parkinson’s disease. Neuron. 2004;44:595–600. 47. Steiner JÁ, Waunsah E, Brundin P. The concept of
alpha-synuclein as a prion-like protein: the years after. Cell
32. Goldwurm S, Di Fonzo A, Simons EJ, et al. The G6055A
Tissue res. 2018;373(1):161-173.
(G2019S) mutation in LRRK2 is frequent in both early
and late onset Parkinson’s disease and originates from a 48. Gibb WR, Lees AJ. The relevance of the Lewy body to
common ancestor. J Med Genet. 2005;42:e65. the pathogenesis of idiopathic Parkinson’s disease. J Neurol
Neurosurg Psychiatry. 1988;51:745-752.
33. Ishihara L, Warren L, Gibson R, et al. Clinical features
of Parkinson disease patients with homozygous leucine- 49. Burke RE, Dauer WT, Vonsattel JPG. A critical
rich repeat kinase 2 G2019S mutations. Arch Neurol. evaluation of the Braak staging scheme for Parkinson's
2006;63:1250–1254. disease. Ann Neurol. 2008;64:485-491.
34. Hedrich K, Winkler S, Hagenah J, et al. Recurrent 50. Horta W. Escalas clínicas para avaliação de pacientes
LRRK2 (Park8) mutations in early-onset Parkinson’s com doença de Parkinson. In: Meneses MS, Teive HAG,
disease. Mov Disord. 2006;21:1506–1510. eds. Doença de Parkinson. Guanabara-Koogan, Rio de
Janeiro; 2003. pg. 153-1162.
Capítulo 32 414
51. Teive HAG. Classificação. In: Meneses MS, Teive HAG, 67. Hely MA, Reid WG, Adena MA, Halliday GM, Morris
eds. Doença de Parkinson. Guanabara-Koogan, Rio de JG. The Sydney Multicenter Study of Parkinson's Disease:
Janeiro; 2003. pg. 91-93. The inevitability of dementia at 20 years. Mov Disord.
2008;23:837-844.
52. Chauduri KR, Healy DG, Schapira AHV. Non-
Motor symptoms of Parkinson's disease: diagnosis and 68. Munhoz RP, Teive HA, Eleftherohorinou H, Coin LJ,
management. Lancet Neurol. 2006;5:235-245. Lees AJ, Silveira-Moriyama L. Demographic and motor
features associated with the occurrence of neuropsychiatric
53. Poewe W. Non-motor symptoms in Parkinson’s disease.
and sleep complications of Parkinson’s disease. J Neurol
Eur J Neurol. 2008;15:(1)14–20.
Neurosurg Psychiatry. 2013;84:883-887.
54. Abbott RD, Petrovitch H, White LR, et al. Frequency
69. Hughes AJ, Daniel SE, Kilford, Lees AJ. Accuracy
of bowel movements and the future risk of Parkinson’s
of clinical diagnosis of idiopathic Parkinson’s disease: a
disease. Neurology. 2001;57:456-462.
clinico-pathological study of 100 cases. J Neurol Neurosurg
55. Barone P, Antonini A, Colosimo C, et al. The PRIAMO Psychiatry. 1992;55:181-184.
study: A multicenter assessment of nonmotor symptoms and
70. Hughes AJ, Daniel SE, Bem-Shlomo Y, Lees AJ.
their impact on quality of life in Parkinson’s disease. Mov
The accuracy of diagnosis of parkinsonian syndromes
Disord. 2009;24:1641-1649.
in a specialist movement disorder service. Brain.
56. Berendse HW, Ponsen MM. Detection of preclinical 2002;125(4):861-870.
Parkinson’s disease along the olfactory tract. J Neural
71. Kempster PA, O'Sullivan SS, Holton JL, Revesz T,
Transm Suppl. 2006;321-325.
Lees AJ. Relationships between age and late progression
57. Hawkes CH. The prodromal phase of sporadic of Parkinson's disease: a clinic-pathological study. Brain.
Parkinson’s disease: does it exist and if so how long is it? 2010;133:1755-1762.
Mov Disord. 2008;23:1799-1807.
72. Postuma RB, Berg D, Stern M, et al. MDS clinical
58. O’Sullivan SS, Williams DR, Gallagher DA, Massey diagnostic criteria for Parkinson's Disease. Mov Disord.
LA, Silveira-Moriyama L, Lees AJ. Nonmotor symptoms 2015;30:1591-1601.
as presenting complaints in Parkinson’s disease: a
73. Munhoz RP, Werneck LC, Teive HA. The differential
clinicopathological study. Mov Disord. 2008;23:101-106.
diagnoses of parkinsonism: findings from a cohort of 1528
59. Ponsen MM, Stoffers D, Booij J, van Eck-Smit BL, patients and a 10 years comparison in tertiary movement
Wolters EC, Berendse HW. Idiopathic hyposmia as a disorders clinics. Clin Neurol Neurosurg. 2010;112:431-435.
preclinical sign of Parkinson’s disease. Ann Neurol.
74. Teive HAG. Tratamento da doença de Parkinson
2004;56:173-181.
em pacientes idosos: Interações medicamentosas,
60. Postuma RB, Lang AE, Massicotte-Marquez J, Comorbidades e efeitos colaterais de medicamentos. In:
Montplaisir J. Potential early markers of Parkinson disease Meneses MS, Teive HAG, eds. Doença de Parkinson.
in idiopathic REM sleep behavior disorder. Neurology. Guanabara-Koogan, Rio de Janeiro; 2003. pg. 219-225.
2006;66:845-851.
75. Teive HAG. Tratamento da doença de Parkinson
61. Ross GW, Petrovitch H, Abbott RD, et al. Association of em pacientes idosos: Interações medicamentosas e
olfactory dysfunction with risk for future Parkinson’s disease. Comorbidades. In: Andrade LAF, Barbosa ER, Cardoso F,
Ann Neurol. 2008;63(2):167-173. Teive HAG, eds. Doença de Parkinson. Estratégias atuais
de tratamento. Omnifarma, São Paulo, SP; 2010. pg. 201-
62. Sommer U, Hummel T, Cormann K, et al. Detection
225.
of presymptomatic Parkinson’s disease: combining smell
tests, transcranial sonography, and SPECT. Mov Disord. 76. Le Witt PA, Lyons KE, Pahwa R, et al. Advanced
2004;19:1196-1202. Parkinson's disease treated with rotigotine transdermal
system: PREFER study. Neurology. 2007;68:1262-1267.
63. Stiasny-Kolster K, Doerr Y, Moller JC, et al. Combination
of ‘idiopathic’ REM sleep behaviour disorder and olfactory 77. Chen F, Jin L, Nie Z. Safety and Efficacy of Rotigotine
dysfunction as possible indicator for alpha-synucleinopathy for Treating Parkinson’s Disease: A Meta-Analysis of
demonstrated by dopamine transporter FP-CIT-SPECT. Randomised Controlled Trials. J Pharm Pharm Sci.
Brain. 2005;128:126-137. 2017;20(0):285-294.
64. Munhoz RP, Moro A, Silveira-Moriyama L, Teive HA. 78. Poewe WH, Rascol O, Quinn N, et al. Efficacy of
Non-motor signs in Parkinson's disease: a review. Arq pramipexole and transdermal rotigotine in advanced
Neuropsiquiatr. 2015; 73:454-462. Parkinson's disease: a double-blind, double-dummy,
randomized controlled trial. Lancet Neurol. 2007;6:513-520.
65. Noyce AJ, Lees AJ, Schrag AE. The prediagnostic phase
of Parkinson's disease. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 79. Trenkwalder C, Kies B, Rudzinska M, et al. Rotigotine
2016;87:871-878. effects on early morning motor function and sleep in
Parkinson's disease: a double-blind, randomized, placebo-
66. Hely MA, Morris JG, Reid WG, Trafficante R. Sydney
controlled study (RECOVER). Mov Disord. 2011;26:90-99.
Multicenter Study of Parkinson’s disease: non-L-dopa-
responsive problems dominate at 15 years. Mov Disord.
2005;20(2):190-199.
Capítulo 32 415
80. Barbosa ER, Limongi JCP. Agonistas da dopamina. In: 84. Emre M, Aarsland D, Albanese A, et al. Rivastigmine
Andrade LAF, Barbosa ER, Cardoso F, Teive HAG, eds. for dementia associated with Parkinson’s disease. N Engl J
Doença de Parkinson. Estratégias atuais de tratamento. Med. 2004;351(24):2509-2518.
São Paulo: Omnifarma; 2010. p. 51-66
85. Weintraub D, Chen P, Ignacio RV, et al. Patterns and
81. LeWitt P, Fahn S. Levodopa therapy fro Parkinson trends in antipsychotic prescribing for Parkinson's disease
Disease: A look backward and forward. Neurology. psychosis. Ann Neurol. 2011;68:899-904.
2016;86(14):S3-12.
86. Becker N, Munhoz RP, Teive HAG. Lees' syndrome: a
82. Lees AJ, Tolosa E, Olanow CW. Four pioneers of L-dopa case series. Arq Neuropsiquiatr. 2011;69(5):756-759.
treatment: Arvid Carlsson, Hornykiewicz O, Cotzias G, and
87. Boutet A, Gramer R, Steele CJ, et al. Neuroimaging
Melvin Yahr. Mov Disord. 2015;30(1):19-36.
technological advancements for targetoing in functional
83. Garcia-Ruiz PJ, Martinez-Castrillo JC, Alonso- neurosurgery. Curr Neurol Neurosci Rep. 2019;19(7):42.
Canovas A, et al. Impulse control Disorder in patients with
88. Chazen JL, Stavarache M, Kaplitt M. Cranial MR-
Parkinson's Disease under dopamine agonist therapy:
guided focused ultrasound: Clinical challenges and future
a multicenter study. J Neural Neurosurg Psychiatry.
directions. World Neurosurg. 2021; 145:574-580.
2014;85(8):840-844.
Capítulo 32 416
CAPÍTULO 33
COREIA, TREMOR E OUTROS MOVIMENTOS
ANORMAIS
Capítulo 33 417
descreveremos o quadro clínico e epidemiológico doença é mais frequente dentre os indivíduos de
das principais etiologias e, no item “diagnóstico”, as ancestralidade Europeia4.
pistas que poderão nos direcionar para nosologias
A idade média de início é em torno de 40 anos
específicas e, dentro delas, para o diagnóstico final.
(2 a 87 anos), quando iniciada antes dos 20 anos é
conhecida como doença de Huntington juvenil. Os
pacientes com início na meia idade adulta tipicamente
QUADRO CLÍNICO
têm 40 a 55 repetições CAG. Já as formas juvenis
As coreias são classificadas como primárias
possuem repetições maiores, em geral acima de 60.
(idiopáticas ou hereditárias) ou secundárias
Isto decorre do fenômeno de antecipação: quanto
(adquiridas). As hereditárias tendem a evoluir
maior o número de repetições CAG, mais precoce o
lentamente e a ser mais simétricas, ao passo
início da doença. Como vimos acima, quanto mais
que as adquiridas têm maior probabilidade de
repetições CAG maior a instabilidade durante a
se apresentarem de forma aguda ou subaguda e
espermatogênese e maior o risco de transmissão
assimétrica ou unilateral.
de alelos com maiores expansões. Por isso, 90%
Capítulo 33 418
Sintomas motores
Coreia
Tende a predominar em DH de início do adulto e tende a atingir um platô em estágios tardios5,6.
Parkinsonismo Tende a predominar em DH de início mais precoce e em estágios tardios das do início no adulto. A
forma com predomínio de parkinsonismo desde o início é conhecida como westphal5,6.
Outros
Distonia, tiques, mioclonias5, ataxia9.
movimentos
Comprometimento do início das sacadas e sacadas lentificadas podem ser alterações precoces.
Motricidade ocular
Anti-sacadas também ficam comprometidas10.
Tabela 1: Sintomas motores da DH.
Fonte: Baseado em Gosh et al., 20185; Ross et al., 20146; Franklin et al., 20209; e, Termsarasab et al., 201510.
Sintomas cognitivos
Lentificação cognitiva6
Comprometimento da atenção, flexibilidade de pensamento, planejamento, funções visuoespaciais e reconhecimento de
emoções 6
O aprendizado e evocação de novas informações estão prejudicados. Em contraste com a doença de Alzheimer, o
acometimento da memória episódica não é pronunciado e a linguagem é relativamente preservada6
Com frequência, há desinibição e falta de insight em relação aos déficits4
Tabela 2: Sintomas cognitivos da DH.
Fonte: Baseado em Bates et al., 20154; e, Ross et al., 20146.
Sintomas neuropsiquiátricos
Depressão
O mais comum (~50%)5,6
Outras alterações
Alterações na fala secundárias a uma combinação de dificuldade de encontrar palavras
Comunicação (cognitivo) e disartria (comprometimento de movimentos voluntários e incoordenação da
língua e musculatura orofacial)5
Capítulo 33 419
Doença por mutação do C9orf72 ressonância magnética, podemos observar atrofia
cerebelar e de caudado, além de rima putaminal.
O C9orf72 é considerado a causa genética
É importante lembrar que outras formas de SCA
mais comum de esclerose lateral amiotrófica
podem ter fenótipo HDL: SCAs 1,2 e 3 12-14
.
e demência frontotemporal. Recentemente,
constatou-se que também é causa mais comum Doença de Huntington-like 2
do chamado grupo doença de Huntington-like, com
Descrita apenas em famílias com
uma prevalência em torno de 1,95% dos casos
ancestralidade africana, é causada por uma
fenotipicamente semelhantes a DH com teste
expansão de repetição de trinucleotídeo CTG/CAG
genético com mutação negativa. A mutação ocorre
no gene da junctofilina 3 (JPH3) no cromossomo
por expansões de repetição de hexanucleotídeo
16q24.3. Os afetados apresentam expansões de 41
(GGGGCC). A idade média é de 43 anos (8 a 60
a 58 repetições. A faixa etária é de 31 a 48 anos
anos) e a mutação é mais encontrada em populações
e é possível observar fenômeno de antecipação.
europeias. Acima de 30 repetições (realmente 250 a
Porém, neste caso, a antecipação ocorre mais
1.600) são encontradas em pacientes sintomáticos.
em herança materna. Clinicamente, distonia e
Sintomas comportamentais e psiquiátricos precoces
parkinsonismo parecem ser mais proeminentes que
são comuns: depressão, apatia, comportamento
na DH e alterações de personalidade e sintomas
obsessivo e psicose. Disfunção executiva e
psiquiátricos podem ser precoces como na DH. Ao
comprometimento de memória se destacam dentre
contrário da forma juvenil da DH (onde o fenótipo
os cognitivos. Os movimentos anormais podem ser
parkinsoniano de Westphal com epilepsia é mais
coreia, distonia, mioclonia, tremor e parkinsonismo.
frequente) há quase completa ausência de crises na
Um achado que pode ajudar a diferenciar de DH é a
HDL2 e a maioria tem movimentos oculares normais.
presença de doença do neurônio motor superior12-14.
A doença também pode ser classificada dentre as
neuroacantocitoses, haja vista acantócitos serem
observados em cerca de 10% dos casos. Exames de
Doença de Huntington-like 4 ou ataxia
espinocerebelar 17 imagem evidenciam atrofia do caudado e putamen,
além da rima putaminal. A morte ocorre dentro de 10
A ataxia espinocerebelar 17 (SCA 17)
a 20 anos do início dos sintomas12-14.
é causada por uma expansão de repetição
trinucleotídeo CAG/CAA no gene TBP (TATA box- Nas tabelas abaixo estão listadas outras
binding protein) no cromossomo 6q27. Expansões doenças hereditárias por padrão de herança. No
de 41 a 48 têm penetrância reduzida, ao passo que item “clínica”, estão elencados os achados não
≥ 49 têm penetrância completa. tão comuns na DH e, portanto, podem auxiliar na
suspeita de DH-like (Tabelas 5 e 6).
O fenótipo é marcadamente heterogêneo com
início de idade de 3 a 75 anos, e pode ser verificado
Adquiridas
fenômeno de antecipação. A clínica mais comum é
de ataxia (95%) em geral lentamente progressiva, Desordens endócrino-metabólicas
mas podendo ser rápida como em síndromes Hiperglicemia não-cetótica e, também,
paraneoplásicas ou priônicas. Sinais extrapiramidais hipoglicemia podem se apresentar classicamente
ocorrem em 73%, em particular distonia e coreia. como hemicoreia (ou mais comumente hemicoreia-
Demência em 76% das SCA17. Outros sintomas que hemibalismo), mas também é possível haver
não são incomuns: piramidais, epilepsia e distúrbios acometimento bilateral. A correção do distúrbio
psiquiátricos. Uma verdadeira apresentação DH-like normalmente é curativa, mas raramente pode
(HDL) ocorre apenas num subgrupo das SCA17. Na persistir por meses após a resolução, possivelmente
Capítulo 33 420
Figura 1: Frequência relativa de fenocópias de doença de Huntington.
Fonte: Baseado em Schneider et al., 201613.
Capítulo 33 421
Desordens AR Gene Clínica
HDL 3 indeterminado Família na Arábia Saudita
Umas das neuroacantocitoses
Distonia com movimentos orofaciais proeminentes e mutilação de
lábios e língua
Coreoacantocitose VPS13A Marcha do homem de borracha, crises epilépticas (50%)
Miopatia e neuropatia axonal
CPK alta, acantócitos, coreina ausente
RM: atrofia do caudado
Coreia vista apenas ocasionalmente (15%)
Doença de Wilson ATP7B
Maioria apresenta tremor, distonia, ataxia ou parkinsonismo
Desordens ligadas ao X
Gene Clínica
e mitocondriopatias
Uma das neuroacantocitoses
Antígeno kell reduzido e kx ausente na superficie de eritrócitos
McLeod XK Semelhante à coreoacantocitose, mas arreflexia e cardiomiopatia
(2/3) ajudam a distinguir
RM: atrofia do caudado e putamen
Distonia da região craniana inferior com automutilação
Síndrome de
HPRT1 Pode lembrar coreoacantocitose, mas a faixa etária é mais jovem
Lesch-nyham
Hiperuricemia
Mioclonias e distonia predominam
Exemplos: Leigh (hipersinal em t2 em núcleos da base e/ou
Mitocondriais
troncno), Melas (pode ter calcificação dos núcleos da base)
Dosar lactato no sangue e, eventualmente, líquor
Tabela 7: Desordens ligadas ao X e mitocondriopatias.
Fonte: Baseado em Termsarasab, 20191; Wild et al., 200712; Schneider et al., 201613; e, Hermann et al., 201514.
Capítulo 33 422
devido a mudanças vasculares permanentes no Induzida por drogas
estriado .
14
Discinesia tardia induzida por neurolépticos e
Coreia gravídica também se apresenta discinesia induzida por levodopa são causas mais
classicamente num hemicorpo e, geralmente, no comuns de coreia medicamentosa. A maioria remite
primeiro trimestre de gravidez. São fatores de ao interromper a medicação, mas algumas (em
risco: história prévia de febre reumática, coreia de especial as discinesias tardias) podem persistir por
Sydenham, síndrome de anticorpo antifosfolípide, meses ou anos. Coreia induzida por contraceptivo
hipertireoidismo e lúpus. Pode haver melhora oral tem ligação com a coreia de Sydenham e pode
espontânea no terceiro trimestre ou logo após o ser mediada por anticorpos anti-núcleos da base12.
parto e pode não requerer tratamento 1,12,14
.
Infecciosa e pós-infecciosa
Autoimunes e paraneoplásicas
Infecções por HIV, tanto por efeito direto na
A coreia de Sydenham é a segunda causa encefalopatia por HIV como por resultado de infecções
de coreia mais comum em crianças (a primeira é secundárias. A doença priônica de Creutzfeltd-Jakob
paralisia cerebral coreoatetoide) e a causa mais também deve ser considerar em quadros subagudos
comum de coreia autoimune na mesma faixa etária. de coreia associada a deterioração cognitiva.
Tipicamente, o quadro tem início 2 a 3 meses após Dentre infecções bacterianas, sífilis e micoplasma
uma infecção de garganta estreptocócica do grupo (causadora de necrose estriatal em crianças) são
A β-hemolítico. outras possibilidades14.
Capítulo 33 423
função renal, eletrólitos, perfil do ferro, glicemia, em especial crianças e adultos jovens, pesquisar
β-HCG, anti-HIV, FTAbs, VDRL, FAN, anti-DNAds, o perfil do cobre. Exames de imagem, com
anti-RO, anti-LA e anticorpos antifosfolípides. destaque para a ressonância magnética, devem
Screening para desordens da tireoide e deficiência de ser solicitados principalmente quando se suspeita
vitamina B12 devem ser realizados na investigação de causas adquiridas, mas também para buscar
de qualquer distúrbio do movimento novo. Avaliação alterações típicas de algumas doenças hereditárias
do metabolismo do cálcio, relacionado a desordens e degenerativas12,14.
da paratireoide, especialmente em alterações
paroxísticas do movimento. Em alguns pacientes,
Capítulo 33 424
comprometimento cognitivo, ganho de peso e
TRATAMENTOS
discinesia tardia.
Este dependerá diretamente da causa. Se a
causa puder ser tratada, modificada ou removida, Não há ensaios clínicos controlados com
o tratamento específico será o de escolha. Por placebo usando neurolépticos típicos para coreia.
exemplo, tratar infecções, desordens metabólicas e A evidência vem de relato de casos ou estudos
que também requeiram controle medicamentoso1. de fármacos de eleição haja vista menor risco de
discinesia tardia. O nível de evidência é de séries,
Agentes depletores de dopamina pré- relatos de caso e estudos abertos. São opções:
sinapticos olanzapina, risperidona, ziprasidona, quetiapina
Esta classe contém os agentes com melhores e clozapina. A clozapina tem o menor risco de
evidências científicas atualmente para tratamento da discinesia tardia. Há um estudo randomizado com
coreia da DH e discinesia tardia (DT). O mecanismo benefício para coreia, porém, foi interrompido
geral é a inibição do transportador de monoamina precocemente devido a efeitos adversos. Uma vez
vesicular (VMAT2) no sistema nervoso central. Na iniciada, pelo risco de agranulocitose (0,5 a 2%),
Tabela 7, estão elencados os representantes da é necessário realizar hemograma semanal por 6
classe. meses, quinzenal do sexto ao décimo segundo
mês e mensal após um ano. O aripiprazol, uma das
Medicações com alvo em sítios drogas mais usadas na psiquiatria, reduziu a coreia
dopaminérgicos pós-sinápticos
num grau comparável à tetrabenazina em relatos de
As medicações listadas aqui são
caso e em um estudo isolado16.
essencialmente os bloqueadores de receptor de
dopamina. Os mais eficazes para tratamento da
Outros tratamentos medicamentosos
coreia são os bloqueadores de receptor D2 (D2R),
os quais contribuem também para o risco de Drogas antiepilépticas podem ser usadas
discinesia tardia. Os mais “limpos” dos bloqueadores para controle da coreia de Sydenham. Ácido
D2 são a quetiapina e clozapina, porém não têm valpróico e carbamazepina são opções eficazes.
tanta afinidade aos D2R e, consequentemente, Os antipsicóticos, pelo risco de parkinsonismo, são
menor eficácia para o controle da coreia. Uma boa tipicamente tidos como opções de segunda linha.
estratégia de escolha desta classe em detrimento Benzodiazepínicos podem ser usados como
dos inibidores VMTA2 é a associação de quadros adjuvantes em casos com ansiedade importante,
neuropsiquiátricos associados à coreia. distonia, rigidez ou mioclonias. Há relatos de caso
Capítulo 33 425
Inibidor VMTA2 Estudo Posologia Adversos Outras informações
Risco de suicídio e depressão
Iniciar 12,5-
Uso off-label em outras causas
25 mg/D
Depressão, de coreia
Máximo 100
Tetrabenazina TETRA-HD parkinsonismo Aprovado para DH
mg/D
acatisia Não prescrever em conjunto com
divididos em
paroxetina e fluoxetina (inibem o
3x
citocromo P4502D6)
Mesmo com efeitos adversos
6-48 mg/D similares ao placebo, há aviso na
FIRST-HD Similar ao
Deutetrabenazina Divididos em bula de risco de suicídio.
AIM-TD placebo
2x Aprovado para DH e Discinesia
tardia (DT)
Cefaleia, fadiga,
40-8 mg/D sonolência
Valbenazina KINECT-3 Aprovado apenas para DT
1x ao dia Prolongamento
de QT
Tabela 7: Inibidores de transportador vesicular de monoaminas (VMTA2).
Fonte: Baseado em Termsarasab, 20191;Ghosh et al., 20185; e, Bashir et al., 201816.
Capítulo 33 426
uma opção viável para coreia hereditária ou adquirida tremor, ele pode ser focal, com apenas uma região
persistente ou refratária a medicações. A experiência do corpo afetada (voz, cabeça, mandíbula, ou
na doença de Parkinson demonstrou efeito anti- apenas um membro); segmentar, duas ou mais
discinético na região ventral do núcleo globo pálido partes contíguas (cabeça e braço, bibraquial,
interno (GPi) e pró-cinético na região dorsal. Devido bicrural); hemitremor, apenas um lado do corpo; e
o sucesso do uso do alvo em discinesia induzida generalizado, metade superior e inferior do corpo.
pela levodopa, é um dos mais usados em estudos Há ainda o tremor ortostático, caracterizado por
de DBS em DH. Nível de evidência é escasso, tremor em membros inferiores ou tronco durante a
contendo múltiplos relatos de caso, séries de casos ortostase.
e um ensaio duplo-cego randomizado prospectivo
O tremor também pode ser classificado em
demonstrando redução da coreia com DBS no GPi
relação às condições de ativação. O tremor de
bilateral.
repouso ocorre quando há completo suporte da parte
Em coreias não DH, há relatos e séries de do corpo contra a gravidade. O exemplo clássico
casos de implante de DBS em neuroacantocitose é o tremor de repouso da doença de Parkinson.
com benefício, com alvo no GPi e tálamo (VOP). Tremor de ação ocorre quando há manutenção da
Há também relatos de casos com terapêutica bem- parte do corpo sem suporte (postural) ou durante
sucedida em coreia ou hemibalismo por diabetes, e movimentos voluntários (cinético). O cinético pode
AVE talâmico ou de núcleos da base . 16
ser subdividido em simples (tremor semelhante ao
longo do movimento) e intenção (há um crescendo
à medida que a parte afetada alcança o alvo). Uma
terceira subdivisão do tremor de ação é o isométrico,
TREMOR
o qual ocorre durante contração muscular contra um
Introdução objeto rígido estacionário, por exemplo, ao cerrar o
Tremor é definido como um movimento punho18.
involuntário, rítmico (regularmente recorrente) e
Em relação à frequência do tremor, esta não
oscilatório (ao redor de um plano central)17,18.
auxilia tanto na sua distinção, pois a maioria dos
Em 2017, foi publicada uma atualização tremores patológicos está entre 4 a 8 Hz. Entretanto,
da classificação do transtorno do movimento na essa característica pode auxiliar em alguns casos,
International Parkinson and Movement Disorder como podemos ver na tabela abaixo. Podemos
Society de forma a facilitar o raciocínio diagnóstico separar em < 4Hz, 4 a 8 Hz, 8 a 12 Hz e > 12 Hz,
e seguimento clínico de longo prazo. Dois eixos medindo com um transdutor de movimento ou
alicerçam a classificação. O Eixo 1 abrange eletromiografia18.
características clínicas: história, características
Estas características fenomenológicas
do tremor, sinais associados e testes laboratoriais
agrupadas na classificação caracterizam as
adicionais (Figura 2). O Eixo 2 foca na etiologia:
síndromes que se apresentam com tremor, e que
adquirida, geneticamente definida ou idiopática
podem ser isoladas ou combinadas (com outros
(Figura 4)18.
sinais neurológicos ou sinais sistêmicos relevantes).
Com relação à idade, há dois intervalos de Estas são ferramentas de reconhecimento de
idade na infância (nascimento aos 2 anos e dos 3 padrão, as quais levarão ao diagnóstico dentro do
anos aos 12 anos, adolescência (13 aos 20 anos), eixo dois18 (Figura 4).
adulto precoce (21 a 45 anos), adulto médio (46 a 60
anos) e adulto tardio (> 60 anos).
Capítulo 33 427
Figura 3: Características do tremor segundo tipo de ativação.
Fonte: Baseado em Bhatia et al., 201818.
Frequência do tremor
Capítulo 33 428
Quadro clínico Síndromes de tremor isolado
Agora, detalharemos as principais síndromes Tremor essencial
de tremor, as quais podem ter múltiplas etiologias.
Caracteriza-se por uma síndrome de tremor
Teoricamente, qualquer combinação do Eixo 1 é
isolado que acomete cerca de 1% da população
uma síndrome possível18.
mundial. Há distribuição mundial com picos na
segunda e sexta décadas (em ≥ 65 anos há mais
Capítulo 33 429
condições cognitivas e físicas coexistentes)19. Há (2% em estudos populacionais a 46% num estudo
forte componente genético: parentes de primeiro de banco de cérebro). Outro achado tardio é o
grau de pacientes com tremor essencial (TE) têm 4 tremor de intenção, em torno de 44% dos casos,
a 5 vezes maior chance de desenvolver a doença. podendo acometer também cabeça e tronco21. Pode
Entre 20 a 90% dos pacientes com TE têm história haver tremor em membros inferiores (28,6% em TE
familiar positiva, o que é mais frequente nos casos e 51,4% em TE plus)20.
de início em jovens20.
O TE é uma condição progressiva. Apesar
O tremor de ação do TE em membros tem disto, menos de 10% dos casos de longa duração
início e progressão insidiosos. O componente desenvolvem perda de funcionalidade significativa.
cinético é o mais importante, pode ocorrer com ou Sãos listados como preditores clínicos de progressão:
sem o postural, e tem frequência típica de 8 a 12 duração, assimetria e envolvimento isolado de um
Hz. Entretanto, a amplitude do tremor cinético é o membro no início. Parece haver um risco maior
componente mais importante. Ambos os braços são de doença de Parkinson (DP) em pacientes com
acometidos, porém, é comum uma leve a moderada TE (~6% de coexistência) e de pacientes com DP
assimetria de amplitude. O tremor postural dos desenvolverem TE (5 a 10x mais)21.
membros é fora de fase, por este motivo é atenuado
Haja vista o diagnóstico de TE ser puramente
ao segurar itens com as duas mãos. Pode haver
clínico, é importante identificar os detalhes que
tremor de repouso em quadros de longa duração
auxiliam na diferenciação de outras condições.
Capítulo 33 430
Quadro 3: Sintomas do tremor essencial plus.
Fonte; Baseado em Sepúlveda et al., 201920; e, Shanker, 201921.
Capítulo 33 431
Figura 7: Doze pérolas para caracterizar o tremor essencial.
Fonte: Baseado em Louis, 201422.
Tremor Tremor
Características Tremor parkinsoniano
Essencial Distônico
Repouso
Repouso ≥ postural
Ação
Tremor reemergente (pausa
Cinético ≥ postural
Descrição habitual antes do retorno do Ação
Frequência: 3-6 Hz
do tremor tremor na postura) Cinético >> postural
Tremor de repouso ao
Frequência 6-12 Hz
caminhar: não
Tremor de repouso ao
caminhar: sim
Bilateral, leve assimetria, Uni ou bilateral, assimetria
Uni ou bilateral, assimetria
Tremor em MMSS acometimento do punho, dedos marcada, envolve o punho,
marcada, cotovelo, punho ou
no início não envolvidos, movimento de envolve os dedos, movimento
dedos. Direcionalidade.
flexão-extensão rotatório
Outros
Pescoço, voz Boca, língua, mandíbula, perna Pescoço, voz, mandíbula
tremores
Truque sensitivo (melhora
Fatores do tremor com toque), ponto
Repouso, álcool Atividade
de alívio nulo (posição na qual o tremor
diminui ou remite)
Tamanho normal ou macrografia
Qualidade variável
Pressão da caneta normal ou
Micrografia, decremento Aumento da pressão da caneta
levemente aumentada
Espiral e escrita Pressão da caneta reduzida sobre o papel
Na espiral, eixo de oscilação em
Eixo unilateral na espiral Espiral com eixos
2-3h na mão direita e 10-12h na
multidirecionais
mão esquerda
Tremor Possível após longo período de
Geralmente, ausente Geralmente, ausente
de intenção doença
Capítulo 33 432
Associados nos
Nenhum Bradicinesia e rigidez Posturas torcionais
MMSS
Geralmente, positiva (>60%), Geralmente, negativa: 5-15% de
História familiar Variável
padrão autossômico dominante história familiar
Tabela 9: Diferenciação entre tremor essencial, tremor distônico e tremor parkinsoniano.
Fonte: Baseado em Shanker, 201921; Reich, 201923; Louis, 201924; e, Uchida et al., 201125.
Outros tremores
Capítulo 33 433
de tremor. Os dois maiores problemas são alguns
DIAGNÓSTICO
efeitos colaterais, como disartria, anormalidade
O diagnóstico é essencialmente clínico e
de marcha e instabilidade (maior risco em
baseado nas características descritas no item
procedimentos bilaterais, podendo chegar a 76%); e
anterior. Exames complementares devem ser
perda de benefício no longo prazo (tolerabilidade)20.
solicitados para excluir causas secundárias,
especialmente quando há sintomas neurológicos OUTROS MOVIMENTOS ANORMAIS
adicionais20,21. Existem vários outros movimentos anormais
A ressonância magnética está indicada com que nos deparamos na nossa prática clínica
em casos de TE-PLUS, tremores focais, tremor como neurologistas especialistas em distúrbios do
associado a sintomas sistêmicos ou outros sintomas movimento. Entrar em detalhes de cada um deles
neurológicos (como na doença de Wilson, por demandaria uma obra voltada apenas para o tema
exemplo). Imagem de transportador dopaminérgico desta complexa e inesgotável especialidade. É
pode auxiliar na diferenciação entre DP forma importante, porém, conhecer a definição sindrômica
tremulante e TE com 84,4% de sensibilidade e de cada um deles.
96,2% de especificidade. A neurofisiologia, por
sua vez, pode auxiliar na diferenciação entre TE,
DP tremulante e tremor distônico. O laboratório, REFERÊNCIAS
a depender da suspeita clínica, pode envolver 1. Termsarasab P. Chorea. Continuum (Minneap Minn).
2019;25(4):1001-1035.
hemograma, dosagem de eletrólitos, glicemia,
2. Walker RH. American Academy of Neurology Courses
função hepática, renal e tireoidiana 20,21
. Proceedings, Seattle; 2009.
3. Barbosa ER, Haddad MS, Gonçalves, MRR. Distúrbios
Do Movimento. In: Bacheschi LA, Nitrini R, Eds. A
Neurologia Que Todo Médico Deve Saber, 2 Edição,
CONDUTA
Atheneu; 2003.
Neste tópico, traremos mais detalhes sobre 4. Bates GP, Dorsey R, Gusella JF, et al. Huntington
tremor essencial pela relevância epidemiológica disease. Nat Rev Dis Primers. 2015;1:15005.
e volume de estudos. As medicações de primeira 5. Ghosh R, Tabrizi SJ. Huntington disease. Handb Clin
Neurol. 2018;147:255-278.
para esta condição são propranolol e primidona
6. Ross CA, Aylward EH, Wild EJ, et al. Huntington disease:
(igualmente eficazes29), destacando-se dentre as de
natural history, biomarkers and prospects for therapeutics.
segunda linha o topiramato. Nat Rev Neurol. 2014;10(4):204-216.
Na prática, doses menores que as descritas 7. Tabrizi SJ, Scahill RI, Durr A, et al. Biological and clinical
changes in premanifest and early stage Huntington’s
acima podem ser suficientes, e devemos escalonar disease in the TRACK-HD study: the 12-month longitudinal
lentamente e observar a resposta31. A combinação analysis. Lancet Neurol. 2011;10(1):31-42.
de primidona 250 mg e propranolol 80 mg, duas 8. Tabrizi SJ, Scahill RI, Owen G, et al. Predictors of
phenotypic progression and disease onset in premanifest
vezes ao dia mostrou maior benefício no tremor and early-stage Huntington’s disease in the TRACK-HD
postural de membro (medido por acelerômetro) em study: analysis of 36-month observational data. Lancet
Neurol. 2013;12(7):637-649.
comparação a cada uma das drogas isoladas30.
9. Franklin GL, Camargo CHF, Meira AT, et al. Is Ataxia an
Bloqueadores cardiosseletivos podem ser tentados
Underestimated Symptom of Huntington’s Disease? Front
quando o propranolol for contraindicado29. Neurol. 2020;11:571843.
Capítulo 33 434
Figura 8: Raciocínio diagnóstico diante do tremor de membros superiores.
Fonte: Baseado em van der Wardt et al., 202027.
Capítulo 33 435
Antiarrítmicos Amiodarona, mexiletine, procainamida
Amicacina, anfotericina B, cotrimazol, gentamicina, itraconazol,
Antibióticos, antivirais e antimicóticos
pentamidina, vidarabina,
Antidepressivos e estabilizadores de
Tricíclicos, lítio, inibidores seletivos de recaptação de serotonina
humor
Anticrise Benzodiazepínicos, lamotrigina, ácido valpróico
Broncodilatadores Salbutamol, salmeterol
Quimioterápicos Cisplatina, citarabina, ifosfamida, tamoxifeno, talidomida
Diuréticos De alça, tiazídicos
Insulina, tiroxina, medroxiprogesterona, epinefrina, calcitonina,
Hormônios
paratormônio
Imunossupressores Ciclosporina, interferon α, tacrolimus
Neurolépticos e depletores de
Cinarizina, flunarizina, haloperidol, reserpina, tetrabenazina
dopamina
Toxinas Amônia, cobre, mercúrio, chumbo, manganês
Drogas recreativas Cocaína, etanol, nicotina
Outros Donepezila, 4 aminopiridina
Quadro 4: Drogas e toxinas causadoras de tremor.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 33 436
Figura 10: Fluxograma para tratamento do tremor essencial.
Fonte: Baseado em Sharma et al., 202029.
Capítulo 33 437
Distúrbios do movimento hipercinéticos
Contrações musculares sustentadas ou intermitentes levando a movimentos
Distonia35 anormais, com frequência repetitivos, posturas anormais ou ambos. Os movimentos
(continuum, 2019 são tipicamente padronizados e torcionais, e podem ser tremulantes. É frequente
distonia) que os movimentos iniciem ou piorem após ação voluntária e se associem a
ativação muscular em transbordamento.
Contração muscular breve e súbita, como um choque. Com frequência desloca um
Mioclonia36,37
membro ou articulação.
Ataxia significa “fora de ordem”. As ataxias sensitivas e cerebelares merecem
destaque na prática clínica e têm suas particularidades no exame neurológico
pertinentes a anormalidades desses sistemas. Cerebelar: nistagmo evocado,
Ataxias38,39
sacadas dismétricas, seguimento ocular sacádico, dissinergia e decomposição dos
movimentos em membros, tremor de intenção. Sensitiva: anormalidades de reflexos
profundos, artrestesia e palestesia, sinal de Romberg.
Movimentos súbitos, rápidos, recorrentes, não rítmicos ou vocalizações. Podem ser
Tiques40
temporariamente suprimíveis voluntariamente.
Tabela 15: Definições de outros transtornos do movimento hipercinéticos.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 33 438
11. Paulsen JS, Hoth KF, Nehl C, Stierman L. Critical 26. Erro R, Bhatia KP, Cordivari C. Shaking on Standing: A
periods of suicide risk in Huntington’s disease. Am J Critical Review. Mov Disord Clin Pract. 2014;1(3):173-179.
Psychiatry. 2005;162(4):725-731.
27. van de Wardt J, van der Stouwe AMM, Dirkx M, et al.
12. Wild EJ, Tabrizi SJ. The differential diagnosis of chorea. Systematic clinical approach for diagnosing upper limb
Pract Neurol. 2007;7(6):360-373. tremor. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2020;91(8):822-830.
13. Schneider SA, Bird T. Huntington’s Disease, 28. Ure RJ, Dhanju S, Lang AE, Fasano A. Unusual tremor
Huntington’s Disease Look-Alikes, and Benign Hereditary syndromes: know in order to recognize. J Neurol Neurosurg
Chorea: What’s New? Mov Disord Clin Pract. 2016;3(4):342- Psychiatry. 2016;87(11):1191-1203.
354.
29. Sharma S, Pandey S. Treatment of essential tremor:
14. Hermann A, Walker RH. Diagnosis and treatment current status. Postgrad Med J. 2020;96(1132):84-93.
of chorea syndromes. Curr Neurol Neurosci Rep.
30. Ferreira JJ, Mestre TA, Lyons KE, et al. MDS evidence-
2015;15(2):514.
based review of treatments for essential tremor. Mov Disord.
15. Balint B, Vincent A, Meinck HM, Irani SR, Bhatia KP. 2019;34(7):950-958.
Movement disorders with neuronal antibodies: syndromic
31. Schneider SA, Deuschl G. The treatment of tremor.
approach, genetic parallels and pathophysiology. Brain.
Neurotherapeutics. 2014;11(1):128-138.
2018;141(1):13-36.
32. Fasano A, Bove F, Lang AE. The treatment of dystonic
16. Bashir H, Jankovic J. Treatment options for chorea.
tremor: a systematic review. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
Expert Rev Neurother. 2018;18(1):51-63.
2014;85(7):759-769.
17. Louis ED. Tremor. Continuum (Minneap Minn).
33. Pandey S, Sarma N. Tremor in dystonia. Parkinsonism
2019;25(4):959-975.
Relat Disord. 2016;29:3-9.
18. Bhatia KP, Bain P, Bajaj N, et al. Consensus Statement
34. Raina GB, Cersosimo MG, Folgar SS, et al.
on the classification of tremors. from the task force on
Holmes tremor: Clinical description, lesion localization,
tremor of the International Parkinson and Movement
and treatment in a series of 29 cases. Neurology.
Disorder Society. Mov Disord. 2018;33(1):75-87.
2016;86(10):931-938.
19. Haubenberger D, Hallett M. Essential Tremor. N Engl J
35. Jinnah HA. The Dystonias. Continuum (Minneap Minn).
Med. 2018;378(19):1802-1810.
2019;25(4):976-1000.
20. Sepúlveda Soto MC, Fasano A. Essential tremor: New
36. Caviness JN. Myoclonus. Continuum (Minneap Minn).
advances. Clin Park Relat Disord. 2019;3:100031.
2019;25(4):1055-1080.
21. Shanker V. Essential tremor: diagnosis and
37. Espay AJ, Chen R. Myoclonus. Continuum (Minneap
management. BMJ. 2019;366:l4485.
Minn). 2013;19(5):1264-1286.
22. Louis ED. Twelve clinical pearls to help distinguish
38. Kuo SH. Ataxia. Continuum (Minneap Minn).
essential tremor from other tremors. Expert Rev Neurother.
2019;25(4):1036-1054.
2014;14(9):1057-1065.
39. Chhetri SK, Gow D, Shaunak S, Varma A. Clinical
23. Reich SG. Essential Tremor. Med Clin North Am.
assessment of the sensory ataxias; diagnostic algorithm
2019;103(2):351-356.
with illustrative cases. Pract Neurol. 2014;14(4):242-251.
24. Louis ED. Essential tremor: a nuanced approach to the
40. Singer HS. Tics and Tourette Syndrome. Continuum
clinical features. Pract Neurol. 2019;19(5):389-398.
(Minneap Minn). 2019;25(4):936-958.
25. Uchida K, Hirayama M, Yamashita F, Hori N, Nakamura
41. Zesiewicz TA. Parkinson Disease. Continuum (Minneap
T, Sobue G. Tremor is attenuated during walking in essential
Minn). 2019;25(4):896-918.
tremor with resting tremor but not parkinsonian tremor. J
Clin Neurosci. 2011;18(9):1224-1228.
Capítulo 33 439
CAPÍTULO 34
DISTONIA
Capítulo 34 440
Figura 3: Figura do artigo original de Oppenheim.
Fonte: Klein, tradução de Oppnehiem de 1911, 20131.
Capítulo 34 441
generalizada (tronco e pelo menos dois locais fia dentatorubropalidolouisiana (DRPLA) e
acometidos). outras;
diurna (pode ocorrer durante o dia e sofrer influência • mitocondrial: distonia e atrofia óptica de
do ciclo circadiano); e paroxística (episódio súbito Leber e doença de Leigh.
e autolimitado que geralmente é desencadeado por
As formas adquiridas apresentam diversas
um gatilho).
etiologias como: uso crônico de medicamentos com
Considerando a ausência ou presença de atividade bloqueadora dopaminérgico (por exemplo,
características associadas, a distonia é denominada neurolépticos), anti-eméticos (por exemplo,
isolada quando é pura ou associada somente ao metoclopramida e bromoprida), anóxia perinatal,
tremor. Se a distonia estiver associada a outros doenças metabólicas, acidentes vasculares
movimentos involuntários como, por exemplo, cerebrais, sequela de encefalites, tumores,
mioclonia ou parkinsonismo é denominada intoxicações (manganês, cobalto e metanol) e
combinada. psicogênica, entre as outras causas. O uso de
Quando a distonia está associada a outras medicamentos e anoxia perinatal são as causas
manifestações neurológicas ou sistêmicas, tais como: mais frequentes de distonias adquiridas no Brasil3,4.
alterações cognitivas, transtornos psiquiátricos e As distonias idiopáticas podem ser
distúrbios metabólicos, geralmente, é considerada esporádicas ou familiares e de causa desconhecida.
complexa.
Capítulo 34 442
Estudos de imagem funcionais demonstraram
que a distonia pode estar associada a atividades
anormais em várias regiões do cérebro, incluindo
córtex motor, áreas motoras suplementares, tronco
cerebral, cerebelo e gânglios da base.
Capítulo 34 443
habitualmente nos mesmos músculos. Os As distonias isoladas e combinadas podem
movimentos podem ser lentos ou rápidos, pioram ser reconhecidas de acordo com as manifestações
com a ação voluntária (ou podem ocorrer somente clínicas que serão descritas a seguir.
nela, como no caso das distonias tarefa-específicas).
Distonia Generalizada Isolada de início pre-
Existe uma tendência a piora com estresse e coce
fadiga e melhora com relaxamento, sono e gestos
antagonistas, como por exemplo segurar a região • DYT-TOR1A: uma distonia generalizada
de início precoce que tipicamente se ma-
do mento no torcicolo espasmódico, segurar a
nifesta na infância (média: 13 anos, varia
caneta em nova posição na câimbra do escrivão
de 1 a 28 anos) com a torção da extremi-
ou olhar para baixo/tocar a lateral da pálpebra no dade de um dos membros. Os sintomas
blefaroespasmo. geralmente iniciam nos membros inferio-
res, progridem para os outros membros e
É importante ressaltar que os quadros
tronco, mas geralmente poupam a face e a
clínicos possuem grande variabilidade fenotípica,
região cervical. A penetrância deste traço
não havendo sinais patognomônicos que permitam genético é reduzida e, aproximadamente
correlação clínico-etiológica confiável, tanto para 35% dos heterozigotos para a variante
apresentações genéticas quanto ambientais2. patológica do gene TOR1A são afetados.
A expressividade varia de acordo com a
O reconhecimento dessas principais síndromes
idade de início da doença, local do início
serve como guia para adequada investigação e da distonia e progressão clínica. Pessoas
classificação etiológica. que iniciam a doença mais tardiamente
nos membros superiores tendem a ser
A distonia hereditária inicialmente era
menos afetadas. Uma variante patogênica
designada pela sigla DYT seguida por um número
específica TOR1A, deleção de 3 pares
que representava a ordem cronológica da descrição de base (NM_000113.2:c.907_909del-
fenotípica ou descoberta genética que primeiro havia GAG) na região codificadora do gene, é
sido descrita na literatura. Esta nomenclatura era responsável por, aproximadamente, 60%
bastante controversa uma vez que sobreposições das distonias generalizadas na população
fenotípicas podem ocorrer como, por exemplo, o não judia e quase 90% na população judia
Ashkenazi7;
fenótipo da DYT-TOR 1A e da DYT-KMT2B7-9.
Capítulo 34 444
Tabela 2: Distonias isoladas.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 34 445
a causa mais comum de distonia genera- causar trismus, bruxismo, abertura ou fechamento
lizada de início precoce, pelo menos fora involuntário da boca e movimentos involuntários da
da população judia Askenazi. Como a des- língua, disfagia e disartria4.
crição da DYT-KMT2B é muito recente e
tem sido descrita com distonia e caracte- A câimbra do escrivão é a distonia tarefa-
rísticas sindrômicas leves, ainda está para específica mais frequente na idade adulta. Ocorre
ser determinado se ela permanecerá clas- durante a escrita e o quadro inicial pode ser um
sificada como distonia isolada ou mudará movimento involuntário simples e tornar-se mais
para a classe das distonias hereditárias
complexo com a progressão. Pode haver uma
complexas7.
história de trauma precedendo o quadro e tende a
O principal diagnóstico diferencial da distonia manter-se focal ou limitada ao membro envolvido.
generalizada isolada se faz com a distonia dopa
Outros tipos de distonia tarefa-específica
responsiva, cujo acometimento dos membros
como a distonia dos músicos (pianistas, violinistas e
inferiores e a idade de início são semelhantes.
guitarristas) ocorrem nas mãos ou mesmo em outras
regiões corporais como na boca nos trompetistas,
Distonia focal isolada de início adulto saxofonistas e flautistas.
Na idade adulta, as distonias mais frequentes A distonia focal laríngea afeta a voz, é mais
são as focais e sem tendência à generalização. comum em mulheres e seu início se dá em torno dos
As formas mais comuns são a distonia cervical, o 30 anos. Existem dois tipos, a distonia de adução
blefaroespasmo e a câimbra do escrivão4. que acomete a musculatura adutora causando
o fechamento inapropriado da glote e levando a
A distonia cervical se caracteriza por
estrangulamentos característicos durante a fala. É
contrações dos músculos do pescoço produzindo
responsável por cerca de 80% dos casos. O outro
movimentos anormais da cabeça e do pescoço e
tipo, a distonia de abdução, ao contrário, causa uma
podem provocar dor local. Os tipos de movimentos
abertura inapropriada na glote e produz pausas
são: torcicolo, laterocolo, anterocolo e retrocolo. É a
respiratórias. O diagnóstico é feito em bases clínicas
forma mais frequente de distonia e um pouco mais
e levando em consideração a história clínica e a
prevalente em mulheres. Pode estar associada a
visualização da glote durante a fala4.
um tremor na região cervical ou tremor de ação e
postura nos membros superiores4. As distonias focais isoladas de início no adulto
geralmente são formas esporádicas, mas mutações
O blefaroespasmo é caracterizado por
nos genes GNAL (DYT-25) e ANO3 (DYT24) têm
piscamentos resultantes da contração forçada dos
sido descritas.
músculos orbiculares dos olhos, e pode levar à
cegueira funcional quando é muito intenso, devido • DYT-ANO3: variantes patogênicas no
à incapacidade de manter os olhos abertos. Outros gene ANO3 foram inicialmente relatadas
sintomas associados são a fotofobia, irritação ocular em pessoas com distonia predominante-
mente craniocervical com idades de início
e secura dos olhos. Geralmente se inicia após os
variadas7.
40 ou 50 anos e com predomínio nas mulheres. É
a segunda forma mais frequente de distonia focal. • DYT-GNAL: inicia frequentemente na
Pode ser confundido, especialmente na fase inicial, quarta década de vida (7 a 54 anos) e é
com tiques ou problemas oftalmológicos4. caracterizada por distonia craniana ou cer-
vical. Aproximadamente 30 variantes pato-
A distonia oromandibular decorre do gênicas no gene GNAL, sobretudo em he-
envolvimento dos músculos mastigatórios (masseter terozigose, já foram descritas em pessoas
e pterigoideos), faciais inferiores e língua. Pode com distonia e estão espalhadas por todo
Capítulo 34 446
o gene6. comuns incluem parkinsonismo, hiperto-
nia dos membros, hiperreflexia, prejuízo
O diagnóstico diferencial das distonias
intelectual, alterações psiquiátricas, dis-
focais se faz com tremor vocal, disfonia de tensão função autonômica e distúrbios do sono7.
muscular. A associação de tremor vocal e disfonia
espasmódica torna o diagnóstico mais complexo. • DYT-TAF1: endêmica na ilha Panay, Fili-
pinas, onde é conhecida como “lubag” do
dialeto local que significa “torcido”. É ca-
Distonia combinada racterizada por uma combinação de dis-
tonia e parkinsonismo, e é a única DYT
A distonia combinada é caracterizada pela com neurodegeneração documentada.
presença de distonia combinada com outro(s) A penetrância é completa nos homens. A
distúrbio(s) de movimento. As distonias paroxísticas variante patogênica exata ainda aguarda
combinadas com outras discinesias são consideradas definição7.
distonias combinadas.7
• DYT-PRKRA: forma de distonia com en-
volvimento oromandibular proeminente,
• DYT-GCH1: caracterizada por uma disto-
disfagia e retrocolo. As características
nia de início na infância (em média 6 anos)
parkinsonianas são leves ou ausentes e
e uma resposta marcante e sustentada ao
não respondem à levodopa12.
uso de baixas doses de levodopa. A apre-
sentação típica é um distúrbio de marcha
• DYT-ATP1A3: caracterizada por uma dis-
causado por distonia dos pés e, posterior-
tonia de início rápido com parkinsonismo
mente, aparecimento de parkinsonismo,
(bradicinesia e instabilidade postural),
com flutuação clínica ao longo do dia. As
gradiente rostro-caudal (face > braço >
características não motoras incluem dis-
perna) com envolvimento de regiões bul-
túrbios do sono, do humor e enxaqueca.
bares e nenhuma resposta à levodopa.
A herança é autossômica dominante com
Ansiedade, depressão e crises ictais já
penetrância reduzida, particularmente em
foram descritas. A idade de início varia de
homens7.
4 a 55 anos. Os deflagradores descritos
desta condição clínica são: febre, estresse
• DYT-TH: distonia parcialmente responsiva
psicológico e uso abusivo do álcool. Após
à levodopa, de início na infância e causa-
a instalação desta condição clínica ge-
da pela deficiência da tirosina hidroxilase.
ralmente a sintomatologia estabiliza com
O início das manifestações clínicas ocor-
pouca melhora e, episódios subsequentes
re entre 1 a 6 anos de idade e os sinto-
podem causar pioras abruptas. A pene-
mas iniciais são, tipicamente, distonia de
trância deste traço genético é incompleta.
membros inferiores e/ou dificuldades para
As variantes patogênicas no gene ATP1A3
caminhar. A flutuação diurna (sintomas
podem causar hemiplegia alternante na in-
são melhores no início da manhã, após o
fância caracterizada por episódios de fra-
sono) pode ocorrer. Outras características
queza e/ou distonia, crises ictais e declínio
clínicas incluem bradicinesia e hipotonia
cognitivo13.
(ambas podem ser muito intensas), distúr-
bios autonômicos (flushing facial), ptose e
• DYT-SGCE: caracterizada por uma com-
crises oculogíricas7.
binação de mioclonia e, na maioria das
vezes, distonia. Muitos heterozigotos para
• DYT-SPR: forma rara de distonia parcial-
a variante patogênica SCGE desenvolvem
mente responsiva à levodopa, de início
sintomas psiquiátricos em associação ou
na infância e caracterizada por hipotonia
ao invés do distúrbio de movimento. O im-
axial, atraso motor e da fala, fraqueza e
printing materno do SCGE explica porque
crises oculogíricas. Os sintomas mostram
a maioria dos acometidos herda a variante
flutuação diurna. Outras características
Capítulo 34 447
patogênica do pai (herança AD)14. • PxMD-ECHS1 (discinesia paroxística re-
lacionada com ECHS1): variantes pato-
• PxMD-PNKD (discinesia paroxística não gênicas bialélicas ECHS1 são tipicamente
cinesiogênica): os ataques geralmente associadas às intensas síndromes leigh
são uma combinação de distonia, atetose, like de início na infância. Porém, recente-
coreia, e balismo, duração de minutos a mente, fenótipos mais leves têm sido des-
horas e, na maioria dos indivíduos afeta- critos com variantes patogênicas bialéli-
dos, podem ocorrer várias vezes em 1 se- cas ECHS1 como distonia paroxística
mana. Os ataques podem ser precipitados induzida por exercício com envolvimento
por: ingesta de álcool ou cafeína, estres- proeminente axial (por exemplo, opistóto-
se, fome, fadiga e uso de tabaco. Duas no). Os ataques iniciam entre 2 e 4 anos
variantes do PNKD (anteriormente MR-1) de idade e, entre as crises, algumas crian-
missense patogênicas (NM_015488.4:- ças são assintomáticas e outras demons-
c.20C>T (p.Ala7Val) e NM_015488.4:c- tram quadro leve a moderado da síndrome
26C>Tp.Ala9Val) são causas de discine- leigh like (problemas na fala, disfagia, en-
sia paroxística não cinesiogência7. volvimento piramidal e prejuízo cognitivo).
Hiperintensidades palidais ao exame de
• PxMD-PRRT2 (discinesia paroxística ci-
ressonância magnética de crânio são mui-
nesiogênica): os ataques são constituídos
to características7.
principalmente por distonia, coreoatetose
e balismo e são deflagrados por movimen- As distonias complexas apresentam a distonia
tos súbitos, início geralmente ocorre na com características atípicas frequentemente
infância ou na adolescência, podem durar associadas a outros sinais neurológicos como:
vários minutos e ocorrer até 100 vezes por distonia sustentada no repouso, envolvimento
dia. Variantes heterozigotas missense ou
proeminente de língua e musculatura perioral,
variante truncada PRRT2 foram identifi-
por exemplo, o risus sardonicus, sinais
cados como causa da DYT-PRRT2 assim
como dos distúrbios alélicos; convulsões piramidais ou cerebelares, ataxia, anormalidades
benignas da infância, epilepsia rolândica, oculomotoras, distúrbios cognitivos, perda auditiva,
discinesia paroxística induzida por exer- comprometimento intelectual e crises convulsivas.
cício e cãimbra do escrivão. Os fenótipos
A lista das distonias complexas é longa e
associados às variantes patogênicas no
PRRT2 incluíam alta frequência de enxa- bastante complicada e agrupá-las em 1) hereditárias
queca e enxaqueca hemiplégica7. ou associadas a distúrbios metabólicos; e 2)
adquiridas por lesão cerebral, drogas ou causas
• PxMD-SLC2A1 (discinesia paroxística in-
psicológicas tem se mostrado útil.
duzida por exercício): os ataques se ca-
racterizam por uma combinação de coreia, A descrição das distonias complexas não será
atetose e distonia nas regiões do corpo abordada neste capítulo.
exercitadas sendo os membros inferiores
a região corporal mais frequentemente
acometida. Os ataques duram de minutos
DIAGNÓSTICO
até uma hora e ocorrem após exercício
físico prolongado. A variante patogênica O diagnóstico das distonias é primariamente
SLC2A1 pode se associar a fenótipos va- clínico. A investigação adicional e a necessidade
riados incluindo discinesia paroxística ci- de exames complementares, vai depender da
nesiogênica, discinesia paroxística não ci- anamnese, exame neurológico e exame clínico.
nesiogênica, ataxia episódica e miotomia.
Outras manifestações incluem: epilepsia, Importante durante a investigação relacionar
anemia hemolítica e enxaqueca7. medicações e substâncias em uso, com objetivo de
descartar quadro secundário a uso de medicamentos,
Capítulo 34 448
como uso de antipsicóticos.
Drogas anticolinérgicas
Algumas distonias primárias, como por exemplo As medicações anticolinérgicas, ainda são
distonias focais após 40 anos, na maioria das vezes consideradas as mais efetivas no tratamento das
não necessita avaliações complementares. distonias generalizadas, ainda que possam ser
Os testes genéticos podem ser úteis, utilizadas em outros tipos de distonias. A mais
mas ainda são pouco utilizados pelo custo e utilizada é o triexifenidila. Caso não haja resposta
disponibilidade, sendo mais utilizados em pesquisas ao uso de levodopa, pode utilizar-se das drogas
clínicas e epidemiológicas. anticolinérgicas como o biperideno e a triexifenidila15.
Exames sugeridos como investigação basal Essas drogas também podem ser utilizadas
de quadros distônicos, em pacientes abaixo de 40 nas distonias agudas induzidas por drogas (como
anos: ressonância magnética de crânio, pesquisa a metoclopramida). Pacientes pediátricos e jovens
de doença de Wilson (exames de função hepática, normalmente toleram melhor altas doses.
dosagem sérica de ceruloplasmina, dosagem de Doses sugeridas: biperideno e triexifenidila:
cobre na urina de 24h e pesquisa de anel de Kaiser- iniciar com doses baixas 1 a 2 mg e escalonar
Fleischer por exame de lâmpada de fenda). conforme a necessidade (boa resposta com doses
Exames de imagem molecular (PET e SPECT) entre 15 a 30 mg/dia)
podem ajudar na diferenciação de distonias dopa-
responsivas e quadros de parkinsonismo juvenil Outras drogas
ou ainda na observação de lesões relacionadas a Medicamentos benzodiazepínicos, como
quadros hipóxicos. o clonazepam, lorazepam e diazepam, são
considerados tratamentos de segunda ou terceira
linha. Podem ser utilizados, usualmente sendo
TRATAMENTO mais eficazes quando associado a anticolinérgicos.
O tratamento das distonias ainda é sintomático Diazepam e clonazepam são preferíveis pela sua
Capítulo 34 449
e tetrabenazina (não disponível no mercado de eficácia15.
brasileiro). Canabinoides são descritos em alguns
Estimulação magnética transcraniana:
relatos de caso e pequenas séries de estudos, com
estudos relacionados ao benefício terapêutico em
resultados dúbios, porém, o número de publicações
pacientes com distonia, que não obtiveram resposta
vem crescendo a respeito dos possíveis efeitos
satisfatória com aplicação de toxina botulínica ou
terapêuticos dos derivados canabinoides em
não são candidatos a estimulação cerebral profunda.
doenças neurológicas e seu uso em pacientes
Os estudos atuais têm sido limitados a demonstrar
portadores de distonia, nos quais parece haver
benefícios a longo prazo dessas abordagens,
melhora sintomática, porém são necessários
mas têm apontado benefícios de curto prazo ou
estudos adicionais16.
mudanças fisiológicas que podem sugerir potencial
para impacto positivo na distonia, principalmente
Toxina botulínica
para distonia cervical e focal de mão15.
É o tratamento de escolha para distonias
focais como blefaroespasmo, espasmo hemifacial,
câimbra do escrivão, distonia cervical, entre outras.
REFERÊNCIAS
A aplicação deve ser feita por profissional experiente
1. Klein C, Fahn S. Translation of Oppenheim’s 1911 paper
e treinado, diretamente nos músculos afetados17. on dystonia. Mov Disord. 2013;28(7):851-862.
2. Albanese A, Bhatia K, Bressman SB, et al.
Phenomenology and classification of dystonia: a consensus
Tratamento cirúrgico update. Mov Disord. 2013;28(7):863-873.
Pacientes com falha ao tratamento 3. Steeves TD, Day L, Dykeman J, Jette N, Pringsheim T.
medicamentoso, podem ser encaminhados para a The prevalence of primary dystonia: a systematic review
and meta-analysis. Mov Disord. 2012;27(14):1789–1796.
realização de procedimentos cirúrgicos.
4. Pedroso JL, Ferraz HB. Transtornos do Movimento,
Atualmente, o mais utilizado, para pacientes Ataxias e Outros Transtornos Motores Neurodegenerativos.
1. ed. Rio de Janeiro: Atheneu; 2017. p. 73–82.
com distonia generalizada e distonia cervical é
5. Ribot B, Aupy J, Vidailhet M, et al. Dystonia and
o implante de eletrodo de estimulação cerebral dopamine: From phenomenology to pathophysiology. Prog
profunda (DBS) em pálido interno18. Neurobiol. 2019;182:101678.
6. Vitek JL. Pathophysiology of dystonia: a neuronal model.
Mov Disord. 2002;17(3):S49-62.
Terapias adjuvantes e novas técnicas
7. Klein C, Lohmann K, Marras C, Münchau A. Hereditary
Terapias complementares como fonoterapia, Dystonia Overview. 2003. In: Adam MP, Ardinger HH,
Pagon RA, eds. GeneReviews®. Seattle (WA): University of
fisioterapia, terapia ocupacional, psicoterapia e
Washington, Seattle; 1993–2021.
atividades físicas direcionadas para o tipo de distonia
8. Klein C. Genetics in dystonia. Parkinsonism Relat Disord.
do paciente devem ser reforçadas com o intuito de 2014;20(1):S137-142.
reabilitar os pacientes e prevenir complicações. 9. Lohmann K, Klein C. Update on the Genetics of Dystonia.
Curr Neurol Neurosci Rep. 2017;17(3):26.
A literatura das abordagens de reabilitação na
10. Marras C, Lang A, van de Warrenburg BP, et
distonia é marcada por significativa heterogeneidade al. Nomenclature of genetic movement disorders:
de técnicas de intervenção, tornando um pouco Recommendations of the international Parkinson and
movement disorder society task force. Mov Disord.
difícil reunir resultados e generalizar descobertas. 2016;31(4):436-457.
Seu estudo é também difícil devido ao desafio em
11. Carvalho PA, Fuchs T, Borges V, et al. Screening of
projetar condições de controle verdadeiramente Brazilian families with primary dystonia reveals a novel
THAP1 mutation and a de novo TOR1A GAG deletion. Mov
cegas como comparadores. Ainda assim, as técnicas
Disord. 2010;25(16):2854–2857.
de reabilitação são encorajadas, principalmente se
associadas entre elas, aumentando sua possibilidade
Capítulo 34 450
12. Camargos S, Scholz S, Simón-Sánchez J, et al. DYT16, 15. Bledsoe IO, Viser AC, San Luciano M. Treatment of
a novel young-onset dystonia-parkinsonism disorder: Dystonia: Medications, Neurotoxins, Neuromodulation, and
identification of a segregating mutation in the stress- Rehabilitation. Neurotherapeutics.2020;17(4):1622–1644.
response protein PRKRA. Lancet Neurol. 2008;7(3):207-
16. Mascia MM, Carmagnini D, Defazio G. Cannabinoids
215.
and dystonia: an issue yet to be defined. Neurol Sci.
13. Carvalho PA, Sweadner KJ, Penniston JT, et al. 2020;41(4):783-787.
Mutations in the Na+/K+ -ATPase alpha3 gene ATP1A3 are
17. Spiegel LL, Ostrem JL, Bledsoe IO. FDA Approvals
associated with rapid-onset dystonia parkinsonism. Neuron.
and Consensus Guidelines for Botulinum Toxins in the
2004;43(2):169–175.
Treatment of Dystonia. Toxins. 2020;12(5):332.
14. Borges V, Aguiar Pde C, Ferraz HB, Ozelius LJ.
18. Jinnah HA. Medical and Surgical Treatments for
Novel and de novo mutations of the SGCE gene in
Dystonia. Neurologic Clinics. 2020;38(2):325–348.
Brazilian patients with myoclonus-dystonia. Mov Disord.
2007;22(8):1208-1209.
Capítulo 34 451
CAPÍTULO 35
TRATAMENTO CIRÚRGICO DA DISTONIA
Capítulo 35 452
evolução da doença8. Em contrapartida, apenas eficácia. Para as distonias focais o padrão-ouro de
20% dos pacientes com distonia cervical evoluem tratamento ainda é a utilização de toxina botulínica
com comprometimento de outros segmentos. Já que para um subgrupo de pacientes não traz
em situações de distonia com início agudo deve- efeito significativo, possivelmente relacionado com
se pensar em exposição a neurolépticos, início de resistência10,11. Dentre as opções para tratamento
síndrome combinada com parkinsonismo de evolução cirúrgico temos os procedimentos ablativos e a
rápida ou transtorno conversivo. Por outro lado, a Estimulação Cerebral Profunda ou chamada cirurgia
evolução lenta e progressiva ao longo do tempo pode de Deep Brain Stimulation (DBS).
indicar causas metabólicas subjacentes ou processo
neurodegenerativo. Existem também outras formas Estimulação Cerebral na Distonia
ou padrão temporal como a variação diurna sugestiva Embora a patofisiologia das distonias
de dopa responsiva ou a forma intermitente que ainda não seja claramente bem definida, acredita-
sugere uma das formas discinéticas paroxísticas. se que exista uma desorganização funcional no
Finalmente, a classificação em distonia isolada circuito tálamo córtico basal12. Recentemente
(previamente primária) versus combinada (antes outros estudos apontam para envolvimento de
chamada de distonia plus ou heredodegenerativa) outras estruturas como tronco cerebral e cerebelo
foi introduzida para enfatizar a importância de na gênese das distonias13-15. Inicialmente, na
padrões sindrômicos que consequentemente podem década de 60 e 70, eram realizados procedimentos
direcionar para condições específicas. Através da ablativos com palidotomias e talamotomias como
classificação e delineamento das características principais modalidades além de outros alvos. Os
clínicas é possível reduzir a lista de possibilidades resultados cirúrgicos não eram homogêneos e ainda
ou condições já que estudar geneticamente todas demonstravam alta incidência de complicações,
as formas de distonia acaba sendo inviável. Os especialmente devido ao fato de serem bilaterais16.
eixos de características clínicas e etiológicas Alguns autores já haviam tentado DBS antes da
se complementam e servem para tentar prever década de 198017-20. Na década de 1990 alguns
um diagnóstico ou quadro sindrômico que então autores descreveram resultados positivos para os
apontará sua correta e mais precisa investigação e procedimentos ablativos com alvo no Globo Pálido
tratamento, conforme Figura 1: A Tabela 2 contém a porção póstero ventral na doença de Parkinson
lista das distonias hereditárias chamadas de DYT. (DP), sendo efetivo para rigidez, discinesias e
O Quadro 1 contém a lista das principais etiologias. freezing de marcha. Como as discinesias e distonia
do Parkinson são similares à distonia generalizada,
a palidotomia também foi realizada para esta
TRATAMENTO condição com resultados positivos21-30. Durante este
O tratamento das distonias é individualizado período, a cirurgia de DBS para Parkinson com
e personalizado para cada paciente. Opções alvo no núcleo subtalâmico (STN) e porção ventral
de tratamento cirúrgico são importantes para intermédia do tálamo (Vim) tinha sido estabelecida
casos refratários aos tratamentos convencionais como tratamento sintomático dos sintomas motores.
objetivo do tratamento é melhorar sintomas motores, ablativos para DP e tremor foi demonstrada devido à
aliviar dor e contraturas e prevenir complicações facilidade de ajustes e reversibilidade deste método
Capítulo 35 453
randomizados comparando DBS e palidotomia para escrita, por exemplo, mesmo após terem controlado
distonias. Os procedimentos de DBS com alvo no bem outros sintomas com DBS. A distonia cervical
globo pálido interno (GPI) foram adaptados desde residual após DBS, por exemplo, pode necessitar
o final da década de 1990, sem uma evidência de tratamento com toxina botulínica ou até mesmo
científica significativa de superioridade sobre os de procedimentos periféricos com denervação
procedimentos ablativos, com a suposição de indicados para casos específicos e selecionados.
que DBS fosse melhor pela sua reversibilidade e No aconselhamento sempre é importante mencionar
facilidade de programação . Nos últimos 20 a 30
31
que dificuldades de articulação da fala podem ser
anos, o procedimento de DBS com alvo no GPI refratários ao DBS47,48. Pacientes com distonia
tornou-se um tratamento padrão e estabelecido cervical fásica ou complexa ou distonia orofacial
para distonia generalizada e outras formas de (síndrome de Meige) podem ser bom candidatos
distonia. Sua eficácia e efeito estável no longo à terapia com DBS-GPI se os sintomas são
prazo também já foram demonstrados ao longo do refratários à toxina botulínica49-55. É, geralmente,
tempo32-37. Outros alvos como STN também podem aceito e conhecido que distonias secundárias
ser utilizados como local preferencial de tratamento não respondem bem a terapia com DBS quando
com DBS nas distonias seja como alvo primário ou comparado com distonias primárias. No entanto,
até como resgate em caso de falha ou ineficácia distonias tardias secundárias ao uso de medicações
com GPI 38-40
. antipsicóticas podem ter uma ótima resposta ao
DBS comparável com as distonias primárias56-62.
Através da DBS no GPI para as distonias,
Ainda em relação às distonias secundárias como,
acredita-se que o efeito positivo esteja relacionado
por exemplo, na paralisia cerebral, existem relatos
com efeito neuromodulatório a nível dos
do uso de DBS com graus variáveis de resposta,
gânglios da base e local com modificações no
na maioria das vezes modestos, principalmente
funcionamento dos neurotransmissores. Através
relacionado com a fisiopatologia destas formas
da estimulação, ocorrem modificações no traçado
de distonia e por causa da heterogeneidade de
eletroencefalográfico e efeitos modulatórios corticais
sintomas e combinação com espasticidade e
também. O efeito neuromodulatório reestabeleceria
atetose63-65. Nestas situações de paralisia cerebral
o funcionamento entre córtex e núcleos da base
ou de distonias espásticas existem também outras
melhorando os sintomas motores41-43.
formas de tratamentos e que são personalizados
para a necessidade de cada paciente, como por
Indicação cirúrgica exemplo, todas as formas de tratamentos ablativos
Já está bem estabelecido que as distonias (rizotomias), neurotomias de nervos periféricos e
generalizadas de início precoce com positividade formas reversíveis, como o uso de baclofeno por
para DYT-1 são as melhores indicações para via intratecal ou, até mesmo, intraventricular, para
DBS com alvo no GPI. Outras distonias primárias as causas centrais a nível de cérebro podendo
generalizadas não hereditárias com início na vida apresentar excelente resposta66-72. Muitos casos de
adulta também podem responder bem ao DBS 44-46
. distonia espástica também configuram indicação
Também já foi demonstrado e é conhecido que início ou necessidade de terapia dupla com bomba de
precoce e duração curta da doença são fatores de infusão com baclofeno e DBS. Para muitos casos
bom prognóstico com DBS nas distonias. Sintomas de distonia secundária com comprometimento
proximais e de tronco tendem a responder melhor severo, mesmo com modesta melhora objetiva dos
com a terapia em comparação com sintomas cervicais sintomas após DBS, o tratamento ainda pode ter
e distais de extremidades. Alguns pacientes podem um impacto positivo na melhora de qualidade de
permanecer com dificuldades a nível distal com vida destes pacientes no longo prazo. Exames de
Capítulo 35 454
imagem são fundamentais antes de procedimentos Alguns autores e centros defendem como alvo
invasivos, como DBS, para ajudar no diagnóstico alternativo de DBS nas distonias o STN86. O STN já
bem como identificação de lesões estruturais. possui considerável e estabelecida evidência como
Procedimentos prévios ablativos como talamotomias alvo de escolha na DP. Entretanto, os mecanismos
ou palidotomia não são contraindicações para DBS de controle ou a fisiopatologia na distonia não são
posteriormente 73-75
. Atualmente o principal alvo completamente compreendidos. Em DBS-STN
para distonia no DBS é o GPI e evidências sobre para distonia podemos melhorar a distonia pela
alvos como Vim ainda são poucas. Possivelmente, estimulação de fibras entre o GPI e núcleo ventral
DBS-Vim pode ser uma alternativa para a distonia oral do tálamo que estão localizadas dorsalmente ao
do escrivão e outros autores recomendam ainda STN e que chamamos fascículo lenticular ou área H/
talamotomias para estes casos ou para distonia do Campos de Forel. Na estimulação com baixo estímulo
músico acometendo focalmente a mão, pois são de ou voltagem nessa localização, os pacientes podem
apresentação unilateral e não teríamos os riscos melhorar os sintomas distônicos87-91.
relacionados com os implantes76-78.
Mais recentemente, o cerebelo tem recebido
atenção como promissor alvo no tratamento dos
movimentos anormais incluindo as distonias devido
ALVOS à sua importância em termos de complexidade de
O GPI na porção sensório motora é considerado conexões relacionadas com os circuitos motores.
ainda como o alvo de eleição para as distonias 79-82
. Até o momento, não dispomos de estudos
Alguns autores ainda discutem sobre qual seria a recomendando seu uso rotineiro, como temos com
melhor localização dentro da área sensório-motora os demais alvos mencionados. No entanto, alguns
do GPI. As coordenadas indiretas para o GPI são trabalhos relatam melhora dos sintomas de distonia
2 mm anterior do ponto médio comissural (MC), 4 em casos secundários à paralisia cerebral com DBS
mm abaixo da linha MC e em média 20mm lateral à no cerebelo92-94.
linha MC. A lateralidade é ajustada de acordo ou em
relação ao trato óptico nas sequências ponderadas
em T2 da ressonância magnética (RM) de crânio
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO
(usualmente logo acima do trato óptico). Este ponto
O procedimento cirúrgico difere entre os
é o mesmo proposto por Laitinen para palidotomias.
diferentes centros do mundo, conforme demonstrado
Os parâmetros indiretos de localização fornecidos
por Abosch et al. em um estudo de 2013, sendo
pelo Atlas de Schaltenbrand são usualmente
difícil determinar qual a melhor técnica95. Alguns
confrontados com métodos de localização direta
centros preferem sistemas com braço robótico ou
com RM de maior definição associados a sequências
até os sistemas chamados de frameless ou mini
específicas para melhor visualização dos núcleos da
frame96-98. Muitos centros ainda preferem os sistemas
base e alvos, como GPI e STN, bem como relação
tradicionais com estereotaxia e arco. Muitos cirurgiões
com as estruturas adjacentes. Estes métodos de
e centros acadêmicos com volume significativo de
visualização facilitam a visualização com nitidez
procedimentos para movimentos normais utilizam
do GPI e divisão pela lâmina medular interna com
de rotina monitorização neurofisiológica, ou
o Globo Pálido Externo (GPE)22,83,84 . Algumas
chamado micro-registro [microelectrode recording
sequências de alta definição em T1, chamadas de
(MER)], para melhor localização do alvo funcional
FGATIR (que possibilitam a melhor identificação dos
e correlação com alvo anatômico, confrontando
limites entre GPI e GPE), fazem parte do protocolo
também com o exame clínico intraoperatório do
de imagens obtidas em RM pré-operatórias de
paciente quando este for operado acordado, etapa
DBS85.
Capítulo 35 455
que chamamos de macro-registro. ângulo de entrada e trajetória são planejados
evitando passagem pelo sistema ventricular. Os
Para procedimentos de DBS em distonia, na
orifícios de trepanação são usualmente feitos
maioria das vezes, operamos estes pacientes com
anteriormente à sutura coronal e lateralmente à
anestesia geral (em função dos movimentos distônicos,
linha média entre 3,5 e 4 cm. Na sala de cirurgia, o
interferência com colocação do arco de estereotaxia,
paciente é posicionado com a cabeça ligeiramente
precisão do procedimento e imprecisão dos exames
fletida em torno de 10 a 15 graus e o frame é fixado à
de imagem), tendo como parâmetros de localização o
mesa cirúrgica. Se o paciente for operado acordado,
MER e a visualização direta do alvo. Muitos centros
uma leve sedação é realizada durante o momento
dispensam o uso de MER, que é considerada uma
inicial de abertura e trepanações. Em nosso centro,
ferramenta opcional. O seu uso tem algumas potenciais
preferimos tricotomia total para melhor visualização
desvantagens como alto custo e risco de provocar
da conformação craniana do paciente e realizamos
sangramentos intraperenquimatosos, principalmente
incisões retilíneas e separadas. Não observamos
relacionados com o número de passagens da
aumento do índice de infecções relacionados ao
agulha de registro além de prolongar o procedimento
tipo de incisão. Utilizamos antibióticos por pelo
cirúrgico99,100. O risco de sangramentos utilizando
menos 48h de pós-operatório. A abertura da dura-
MER, no entanto, é considerado baixo.
máter é cuidadosa, evitando-se sangramentos
Outra modalidade de monitorização é o uso desnecessários e o suficiente para visualização do
de potencial evocado visual (visual evoked potential córtex e melhor identificação do ponto de entrada
VEP) para localizar proximidade com o trato óptico. da cânula de MER evitando vasos corticais. Cola
Em crianças a utilização de anestesia geral é a biológica é sempre utilizada para evitar saída de
rotina para a maioria dos centros e obtenção da RM líquor e minimizar ocorrência de pneumoencéfalo e
de planejamento obtida no dia anterior ou no mesmo desvio das estruturas profundas do cérebro (brain
dia do DBS (o planejamento do procedimento e shift). Acreditamos que, desta forma, nossa acurácia
escolha de alvo + trajetória são realizados em exame seja maior. Normalmente utilizamos, na maioria
de imagem recente devido ao constante crescimento dos casos, passagem única de eletrodo de MER.
do crânio). Além disso, em crianças, os eletrodos Após esta etapa, se estivermos satisfeitos com o
podem ser implantados mais profundamente devido traçado eletrofisiológico, efetuamos a passagem
ao crescimento do cérebro, prevendo o tracionando do eletrodo de DBS e, subsequentemente, a etapa
destes e potencial saída do alvo de escolha. de macro-estímulo, caso o paciente esteja sendo
Quando possível, em nosso centro, operado sem anestesia geral. Quando realizamos
preferimos realizar o procedimento com o paciente macro-estímulo utilizamos 130 Hz de frequência,
acordado e colocando o frame de estereotaxia com testamos os contatos com estímulo bipolar em toda
o paciente acordado e anestesia local utilizando sua extensão com intensidades de até 4,5 volts e
uma solução diluída com lidocaína e bicarbonato comprimento de onda (até 200 μs). Quando não
de sódio, aumentando a latência e diminuindo o temos efeitos piramidais ou de cápsula com estes
desconforto das infiltrações por tornar o pH da parâmetros, estamos seguros, ou seja, estamos
mistura menos ácido. Utilizamos de rotina o frame bem localizados dentro do alvo pretendido. Em caso
Leksell G (Elekta). A fixação do frame leva em média de para-efeitos da estimulação com baixo estímulo,
20 min e, após, o paciente é levado para realizar uma possível correção deve ser considerada. Após
a tomografia computadorizada (TC) de crânio com esta etapa, o eletrodo é fixado e utilizamos de rotina
sequência volumétrica – exame de referência que os dispositivos específicos de acordo com a marca
será fusionado com a RM e planejamento cirúrgico dos implantes que estão sendo utilizados. Controle
prévio, obtidos na véspera do procedimento. O radioscópico é realizado após a colocação dos dois
Capítulo 35 456
eletrodos e a tunelização, e a internalização do os parâmetros podem modificar de acordo com a
sistema é realizada com o paciente sob anestesia necessidade103. Utilizamos como referência para
geral. Após o procedimento, o paciente realizará, no adequação de seguimento e início do teste de
dia seguinte, uma TC de controle para exclusão de contato a programação com o algoritmo utilizado
complicações pós-operatórias e para fusão com a pelo serviço de DBS do Toronto Western Hospital103.
RM prévia facilitando uma posterior programação e
cálculo de precisão ou acurácia.
EFEITOS COLATERAIS E COMPLICAÇÕES
O efeito colateral mais comum após DBS-GPI
ESTIMULAÇÃO
bilateral para distonia é a disartria. Provavelmente,
Geralmente, os parâmetros de estimulação para
a disartria seja ocasionada pela estimulação sobre
DBS-GPI são maiores nas distonias em comparação
o trato córtico-bulbar, localizado na cápsula interna
com a DP, quando o alvo é o STN. O GPI é um alvo
(porção póstero-medial). Para evitar este efeito
maior e nas distonias, normalmente, os efeitos obtidos
colateral (disartria ou efeitos à nível de cápsula) o
ou melhora costumam aparecer no longo prazo
eletrodo deve ficar confinado dentro do GPI com
através da estimulação crônica. Os parâmetros mais
macroestímulo sem efeitos colaterais até 4 volts de
comuns para GPI são 130 a 185 Hz, 210 a 450 μs
estimulação. Complicações relacionadas com os
de comprimento de onda e 1,5 a 5 V de estímulo,
implantes são as mais comuns, especialmente as
mas estes variam entre os diferentes centros. Alguns
infecções. Infecção intracraniana é rara nos diversos
centros utilizam parâmetros similares como na DP,
estudos reportados, no entanto, relacionada com
enquanto outros preferem largura de pulso maiores
subcutâneo pode chegar até 5% ou mais dependendo
como 450 μs e baixo estímulo (ao redor de 1,5 V).
do centro. A maioria dos estudos recomenda a
Não existem parâmetros universais e unânimes e,
remoção de parte ou de todo conjunto de implantes.
quando programamos um paciente, a estimulação é
Muitos cirurgiões optam por tentar salvar o sistema/
personalizada bem como escolha do melhor contato.
implantes através de desbridamento, fechamento
Para os casos de distonia, trabalhamos com cuidadoso e utilização de antibióticos por tempo
grupos de estimulação, facilitando e otimizando o variável dependendo dos estudos, mas geralmente
avanço da terapia, já que para estimulação do GPI entre 4 a 6 semanas. Muito pacientes conseguem
demoravam alguns dias para o paciente apresentar salvar ou evitar infecção dos eletrodos cerebrais
para-efeitos. Em geral, quando realizamos e, após tratamento da infecção, são submetidos a
mudanças na programação temos efeitos imediatos novo procedimento para recolocação das extensões
(relacionados com STN), efeitos de médio prazo e e/ou gerador. Em casos relacionados com infecção,
efeitos de longo prazo. Trabalhando com grupos especialmente se o paciente estiver sob estimulação
de estimulação e com o controle do paciente, crônica, devemos desligar a estimulação antes
conseguimos conhecer adequadamente qual o de proceder com a remoção dos implantes. Se o
melhor conjunto de parâmetros para cada caso, paciente não tolerar ficar sem a terapia, então,
melhorando o resultado no longo prazo. Se a alta procedimentos ablativos como palidotomia devem
frequência não funcionar adequadamente pode- ser considerados. Alguns estudos apontam para
se tentar baixa com 60 a 80 Hz, de acordo com possível desenvolvimento de sintomas bradicinéticos
alguns estudos 101, 102
. Usualmente, utilizamos os semelhantes à DP pela estimulação do GPI na
contatos 0 e/ou 1 com estímulo monopolar, duplo distonia. Esta é uma justificativa para utilização do
monopolar ou bipolar (3 a 3,5 V ou miliamperes (mA) STN como alvo preferencial por alguns centros e
/ corrente contínua), 130 Hz e comprimento de onda cirurgiões para evitar tal complicação104,105.
iniciando em 80-100 μs. Ao longo do seguimento,
Capítulo 35 457
O tipo mais comum de distonia focal é a
DISCUSSÃO
distonia cervical ou torcicolo espasmódico que
DBS com alvo no GPI para distonia refratária é
é, frequentemente, refratário ao tratamento
um dos principais e mais estabelecidos tratamentos
convencional. Um estudo recente com 62 pacientes
pela literatura com nível de evidência que varia
submetidos a DBS-GPI demonstrou benefício com
desde classe I (distonia generalizada) até classe
estimulação e melhora significativa de até 41% na
IV (distonias adquiridas e combinadas) 106. Algumas
escala de TWSTRS (Toronto Western Spasmodic
questões ainda são discutidas como, por exemplo, a
Torticollis Rating Scale)111. Outros estudos com DBS-
escolha do alvo no GPI ser a porção mais profunda
GPI também demonstram melhora de 47,6 a 70%
deste onde as fibras da ansa lenticularis se localizam.
no longo prazo de até 10 anos de seguimento112.
Entretanto, muitos neurocirurgiões ou neurologistas
Alguns pacientes com resposta não satisfatória
especializados em distúrbios do movimento utilizam
com DBS-GPI podem melhorar com denervação
não só o contato 0 (ventral), mas também outros
periférica subsequente, no entanto, uma metanálise
contatos longe destas fibras. Consequentemente,
de Ravindran et al., de 2019, comparando DBS
não sabemos ainda qual o melhor local para estimular
versus denervação para distonia cervical, não
no GPI. Algumas perguntas ainda são fundamentais
demonstrou diferença significativa na redução da
como, por exemplo: 1) quando o tratamento
escala TWSTRS113,114.
medicamentoso não é suficiente?; 2) como selecionar
melhor os candidatos para DBS?; 3) qual o segmento Nas distonias craniocervicais incluindo a
do GPI que devemos estimular ou será o STN um alvo síndrome de Meige, a resposta com DBS-GPI pode
superior?; 4) ainda existe espaço para palidotomia ser significativa. Reese et al., em 2011, demonstraram,
nas distonias?; e 5) denervação periférica ainda pode em seguimento de longo prazo de 6,5 anos, uma
após DBS de 65,2%82. Os estudos com DBS-STN respondem bem ao DBS. Vidailhet et al., em 2005,
anos com melhora da qualidade de vida38. ano79. Bruggemann, em 2015, relatou uma melhora
Capítulo 35 458
de 42 a 61% em seguimento de cinco anos pós- e 9,2% nas subescalas motora e incapacidade da
DBS 125
. As distonias generalizadas são normalmente BMFDRS em 12 meses. Entretanto, em um estudo
associadas com mutações, chamadas de distonias de longo prazo com 15 pacientes, foi demonstrada
monogenéticas e designadas com a sigla DYT. As uma melhora de 49% na subescala motora com
formas que melhor respondem ao DBS são as DYTs seguimento médio de 4,4 anos123,136,138,139.
1 e 6107,121,126. As distonias DYT 1, que são condições
Status distônico é uma indicação específica
autossômicas dominantes de penetrância baixa
para DBS. Representa uma condição com
(mutação torsina 1ª gene TOR1a), iniciam na infância
risco de vida para o paciente e que pode levar a
ou adolescência com comprometimento inicial de um
complicações respiratórias, metabólicas e bulbares
segmento e, posteriormente, dentro de alguns anos
necessitando de intubação e ventilação mecânica.
se tornam generalizadas127,128. De todas as distonias,
Esta condição pode comprometer pacientes já
as DYTs 1 demonstraram os melhores resultados
submetidos a tratamento com DBS que por alguma
em vários estudos com índices que variam entre 60
razão passaram por falha súbita dos implantes ou
a 90% de melhora na escala BFMDRS, no primeiro
equipamento (normalmente quando o gerador fica
ano pós tratamento com DBS107,109,121,126,129-132.
sem energia ou falha). Status distônico refratário
Distonia tardia pode decorrer do efeito de tem sido tratado com talamotomias, palidotomia e,
longo prazo das medicações antidopaminérgicas, mais recentemente, com DBS (GPI)140-142.
trazendo incapacidade aos pacientes. Normalmente
se manifesta em segmento isolado ou como
distonia generalizada afetando o tronco e pode CONSIDERAÇÕES FINAIS
se combinar com discinesia tardia. O prognóstico O tratamento das distonias deve ser
costuma ser reservado mesmo suspendendo as multidisciplinar e personalizado. Os procedimentos de
medicações 133-136
. De maneira geral, as revisões DBS são atualmente as principais opções cirúrgicas
sistemáticas e metanálises de 35 estudos com 117 no tratamento de pacientes com distonia refratária
pacientes que foram submetidos à DBS (maioria incapacitante, sendo um tratamento de baixo
GPI) para esta condição obtiveram uma melhora risco, seguro e reversível. Estudos randomizados,
média de 62% na Abnormal Involuntary Movement controlados e prospectivos já provaram a eficácia
Scale e 76% na FMDRS 137
. e segurança da terapia com DBS no longo prazo
para distonias isoladas, idiopáticas ou hereditárias,
Distonias causadas por hipóxia, lesão
segmentárias e generalizadas. Os fatores de bom
traumática ou condições neurodegenerativas
prognóstico para DBS são idade de início precoce,
representam as distonias adquiridas. Evidência
duração de doença curta e mutação DYT 1 presente.
científica para DBS neste grupo não é robusta como
Outros alvos como STN ou mesmo o cerebelo
para outras formas de distonia. Hipóxia perinatal,
podem ser promissores. Procedimentos ablativos,
que se manifesta como paralisia cerebral, é uma
como talamotomias, palidotomias e denervações,
etiologia comum para distonia, sendo frequentemente
podem ser indicados para casos selecionados. Da
resistente ao tratamento farmacológico. DBS-GPI
mesma forma: lesão guiada por ultrassom focado
para paralisia cerebral e distonia mostrou uma
é uma opção. Sistemas de DBS com close loop ou
melhora modesta de 24% na BMFDRS em 13 casos,
sistema de alça fechada associados com eletrodos
segundo Vidailhet, em 2009. De qualquer maneira,
direcionais e formas mais eficientes de estimulação
a variação em cada paciente mostrou variações
são promissores e podem melhorar os resultados da
significativas desde -7,5% até +55% (melhora).
terapia, assim como outros avanços tecnológicos.
Uma metanálise com 68 casos submetidos a DBS-
GPI demonstrou uma melhora modesta de 23,6%
Capítulo 35 459
Figura 1: Classificação e delineamento das características clínicas. Os eixos de características clínicas e etiológicas
se complementam e servem para tentar prever um diagnóstico ou quadro sindrômico que então apontará sua correta e
mais precisa investigação e tratamento.
Fonte: Os autores, 2021.
Dimensões para
Eixo Subgrupos
classificação
Infância (nascimento – 2 anos)
Idade infantil (3 – 12 anos)
Idade de início Adolescência (13 – 20 anos)
Adultos jovens (21 – 40 anos)
Adultos tardios (41 anos em diante)
Focal (1 região do corpo isolada)
Segmento ( 2 ou mais regiões contiguas)
Eixo I: características Distribuição corporal Multifocal (2 ou mais regiões não contiguas)
clínicas Hemidistonia (hemicorpo)
Generalizada (tronco mais 2 regiões)
Curso da doença (estática vs. progressiva)
Padrão temporal Variação de curto prazo (persistente, ação específica, diurna
ou paroxística)
Isolada (com ou sem tremor)
Características
Combinada (com outras características neurológicas ou
associadas
sistêmicas)
Capítulo 35 460
Patologia em sistema Degenerativa
nervoso central (causa Estrutural (lesões estáticas focais)
estrutural) Sem patologia degenerativa ou estrutural
Herdada (ligada ao sexo, mitocondrial ou autossômica
Eixo II: etiologia dominante ou recessiva)
Herança
Adquirida (lesões cerebrais, drogas, toxinas, vascular ou
neoplásica)
Esporádica
Idiopática
Familiar
Tabela 1: Classificação das Distonias.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 35 461
Distonia primária
Capítulo 35 462
Figura 2: Planejamento pré-operatório de DBS-GPI em paciente de 66 anos com Síndrome de Meige, três anos de
evolução sendo refratário ao tratamento medicamentoso e toxina botulínica. Na imagem, sequências de SWI da RM
em 3 Teslas demonstrando escolha direta do alvo (GPI) / visualização direta compatível com parâmetros indiretos. GPI
direito baseado na linha da comissura anterior e posterior (ACPC) (X 21mm, Y 2mm e Z-4mm) GPI esquerdo (X -21mm,
Y 2mm e Z -4mm).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 35 463
Figura 3: Implantação do arco de estereotaxia (Leksell G (Elekta)) de forma simétrica.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 4: Ao lado confirmação intraoperatória com intensificador de imagem demonstrando correto posicionamento dos
eletrodos.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 35 464
Figura 5: Imagem pós-operatória demonstrando a fusão da TC com a RM com eletrodo à direita ligeiramente mais
medial.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 35 465
Figura 7: Programação do mesmo paciente ao longo do seguimento através da utilização de grupos e controle do
paciente otimizando a terapia.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 35 466
15. Neumann WJ, Jha A, Bock A, et al. Cortico-pallidal 31. Tronnier VM, Fogel W. Pallidal stimulation for
oscillatory connectivity in patients with dystonia. Brain. generalized dystonia. Report of three cases. J Neurosurg.
2015;138(7):1894-1906. 2000;92(3):453-456.
16. Delnooz CC, van de Warrenburg BP. Current and future 32. Mehrkens JH, Botzel K, Steude U, et al. Long-term
medical treatment in primary dystonia. Ther Adv Neurol efficacy and safety of chronic globus pallidus internus
Disord. 2012;5(4):221-240. stimulation in different types of primary dystonia. Stereotact
Funct Neurosurg. 2009;87(1):8-17.
17. Andy OJ. Thalamic stimulation for control of movement
disorders. Appl Neurophysiol. 1983;46(1-4):107-111. 33. Moro E, Gross RE, Krauss JK. What’s new in surgical
treatment for dystonia? Mov Disord. 2013;28(7):1013-1020.
18. Cooper IS, Upton AR, Amin I. Reversibility of chronic
neurologic deficits. Some effects of electrical stimulation 34. Reese R, Gruber D, Schoenecker T, et al. Long-
of the thalamus and internal capsule in man. Appl term clinical outcome in meige syndrome treated with
Neurophysiol. 1980;43(3-5):244-258. internal pallidum deep brain stimulation. Mov Disord.
2011;26(4):691-698.
19. Hariz MI, Blomstedt P, Zrinzo L. Deep brain stimulation
between 1947 and 1987: the untold story. Neurosurg Focus. 35. Tagliati M, Krack P, Volkmann J, et al. Long-
2010;29(2):E1. Term management of DBS in dystonia: response to
stimulation, adverse events, battery changes, and special
20. Mundinger F. Neue stereotaktisch-funktionelle
considerations. Mov Disord. 2011;26(1):S54-62.
Behandlungsmethode des Torticollis spasmodicus mit
Hirnstimulatoren [New stereotactic treatment of spasmodic 36. Koyama H, Mure H, Morigaki R, et al. Long-Term Follow-
torticollis with a brain stimulation system (author’s transl)]. Up of 12 Patients Treated with Bilateral Pallidal Stimulation
Med Klin. 1977;72(46):1982-1986. for Tardive Dystonia. Life (Basel). 2021;11(6):477.
21. Iacono RP, Kuniyoshi SM, Lonser RR, Maeda G, Inae 37. Krause P, Volzmann S, Ewert S, Kupsch A, Schneider
AM, Ashwal S. Simultaneous bilateral pallidoansotomy for GH, Kuhn AA. Long-term effects of bilateral pallidal deep
idiopathic dystonia musculorum deformans. Pediatr Neurol. brain stimulation in dystonia: a follow-up between 8 and 16
1996;14(2):145-148. years. J Neurol. 2020;267(6):1622-1631.
22. Laitinen LV, Bergenheim AT, Hariz MI. 38. Deng Z, Pan Y, Zhang C, et al. Subthalamic deep brain
Ventroposterolateral pallidotomy can abolish all stimulation in patients with primary dystonia: A ten-year
parkinsonian symptoms. Stereotact Funct Neurosurg. follow-up study. Parkinsonism Relat Disord. 2018;55:103-
1992;58(1-4):14-21. 110.
23. Bhatia KP, Marsden CD, Thomas DG. Posteroventral 39. Aragao VT, Barbosa Casagrande SC, Listik C, Teixeira
pallidotomy can ameliorate attacks of paroxysmal dystonia MJ, Barbosa ER, Cury RG. Rescue Subthalamic Deep Brain
induced by exercise. J Neurol Neurosurg Psychiatry. Stimulation for Refractory Meige Syndrome. Stereotact
1998;65(4):604-605. Funct Neurosurg. 2021:1-3.
24. Islekel S, Zileli M, Zileli B. Unilateral pallidal stimulation 40. Cury RG, Fraix V, Moro E. Celebrating thirty years of
in cervical dystonia. Stereotact Funct Neurosurg. 1999;72(2- deep brain stimulation in movement disorders patients:
4):248-252. A successful marriage between neurologists and
neurosurgeons. Parkinsonism Relat Disord. 2018;46:98-99.
25. Lai T, Lai JM, Grossman RG. Functional recovery
after bilateral pallidotomy for the treatment of early-onset 41. Kroneberg D, Plettig P, Schneider GH, Kuhn AA. Motor
primary generalized dystonia. Arch Phys Med Rehabil. Cortical Plasticity Relates to Symptom Severity and Clinical
1999;80(10):1340-1342. Benefit From Deep Brain Stimulation in Cervical Dystonia.
Neuromodulation. 2018;21(8):735-740.
26. Lin JJ, Lin GY, Shih C, Lin SZ, Chang DC, Lee
CC. Benefit of bilateral pallidotomy in the treatment 42. Udupa K, Chen R. The mechanisms of action of deep
of generalized dystonia. Case report. J Neurosurg. brain stimulation and ideas for the future development. Prog
1999;90(5):974-976. Neurobiol. 2015;133:27-49.
27. Ondo WG, Desaloms JM, Jankovic J, Grossman 43. Barow E, Neumann WJ, Brücke C, et al. Deep brain
RG. Pallidotomy for generalized dystonia. Mov Disord. stimulation suppresses pallidal low frequency activity
1998;13(4):693-698. in patients with phasic dystonic movements. Brain.
2014;137(11):3012-3024.
28. Vitek JL, Bakay RA. The role of pallidotomy in
Parkinson’s disease and dystonia. Curr Opin Neurol. 44. Haridas A, Tagliati M, Osborn I, et al. Pallidal deep brain
1997;10(4):332-339. stimulation for primary dystonia in children. Neurosurgery.
2011;68(3):738-743.
29. Vitek JL, Zhang J, Evatt M, et al. GPi pallidotomy for
dystonia: clinical outcome and neuronal activity. Adv Neurol. 45. Isaias IU, Alterman RL, Tagliati M. Deep brain
1998;78:211-219. stimulation for primary generalized dystonia: long-term
outcomes. Arch Neurol. 2009;66(4):465-470.
30. Yoshor D, Hamilton WJ, Ondo W, Jankovic J, Grossman
RG. Comparison of thalamotomy and pallidotomy for the 46. Panov F, Gologorsky Y, Connors G, Tagliati M, Miravite
treatment of dystonia. Neurosurgery. 2001;48(4):818-824. J, Alterman RL. Deep brain stimulation in DYT1 dystonia: a
10-year experience. Neurosurgery. 2013;73(1):86-93.
Capítulo 35 467
47. Lumsden DE, Kaminska M, Gimeno H, et al. Proportion 62. Trinh B, Ha AD, Mahant N, Kim SD, Owler B, Fung VS.
of life lived with dystonia inversely correlates with response Dramatic improvement of truncal tardive dystonia following
to pallidal deep brain stimulation in both primary and globus pallidus pars interna deep brain stimulation. J Clin
secondary childhood dystonia. Dev Med Child Neurol. Neurosci. 2014;21(3):515-517.
2013;55(6):567-574.
63. Katsakiori PF, Kefalopoulou Z, Markaki E, et al. Deep
48. Yamada K, Hamasaki T, Hasegawa Y, Kuratsu J. Long brain stimulation for secondary dystonia: results in 8
disease duration interferes with therapeutic effect of globus patients. Acta Neurochir (Wien). 2009;151(5):473-478.
pallidus internus pallidal stimulation in primary cervical
64. Koy A, Hellmich M, Pauls KA, et al. Effects of deep brain
dystonia. Neuromodulation. 2013;16(3):219-225.
stimulation in dyskinetic cerebral palsy: a meta-analysis.
49. Kim JP, Chang WS, Park YS, Chang JW. Effects of Mov Disord. 2013;28(5):647-654.
relative low-frequency bilateral globus pallidus internus
65. Marks W, Bailey L, Reed M, et al. Pallidal stimulation
stimulation for treatment of cervical dystonia. Stereotact
in children: comparison between cerebral palsy and DYT1
Funct Neurosurg. 2012;90(1):30-36.
dystonia. J Child Neurol. 2013;28(7):840-848.
50. Krauss JK. Deep brain stimulation for treatment of
66. Ruggiero C, Meccariello G, Spennato P, et al. Early
cervical dystonia. Acta Neurochir Suppl. 2007;97(2):201-
intraventricular baclofen therapy (IVB) for children with
205.
dystonic and dysautonomic storm. Childs Nerv Syst.
51. Lyons MK, Birch BD, Hillman RA, Boucher OK, Evidente 2019;35(1):15-18.
VG. Long-term follow-up of deep brain stimulation for Meige
67. Nahm NJ, Graham HK, Gormley ME Jr, Georgiadis AG.
syndrome. Neurosurg Focus. 2010;29(2):E5.
Management of hypertonia in cerebral palsy. Curr Opin
52. Morgan JC, Sethi KD. A single-blind trial of bilateral Pediatr. 2018;30(1):57-64.
globus pallidus internus deep brain stimulation in medically
68. Rocque BG, Leland Albright A. Intraventricular vs
refractory cervical dystonia. Curr Neurol Neurosci Rep.
intrathecal baclofen for secondary dystonia: a comparison of
2008;8(4):279-280.
complications. Neurosurgery. 2012;70(2):321-325.
53. Ostrem JL, Racine CA, Glass GA, et al. Subthalamic
69. Park TS. Intraventricular baclofen. J Neurosurg.
nucleus deep brain stimulation in primary cervical dystonia.
2007;107(3):224.
Neurology. 2011;76(10):870-878.
70. Saulino M. Intrathecal Therapies. Phys Med Rehabil Clin
54. Walsh RA, Sidiropoulos C, Lozano AM, et al. Bilateral
N Am. 2018;29(3):537-551.
pallidal stimulation in cervical dystonia: blinded evidence of
benefit beyond 5 years. Brain. 2013;136(3):761-769. 71. Tedroff K, Hagglund G, Miller F. Long-term effects of
selective dorsal rhizotomy in children with cerebral palsy: a
55. Witt JL, Moro E, Ash RS, et al. Predictive factors of
systematic review. Dev Med Child Neurol. 2020;62(5):554-
outcome in primary cervical dystonia following pallidal deep
562.
brain stimulation. Mov Disord. 2013;28(10):1451-1455.
72. Novak I, McIntyre S, Morgan C, et al. A systematic
56. Chang EF, Schrock LE, Starr PA, Ostrem JL. Long-
review of interventions for children with cerebral palsy: state
term benefit sustained after bilateral pallidal deep brain
of the evidence. Dev Med Child Neurol. 2013;55(10):885-
stimulation in patients with refractory tardive dystonia.
910.
Stereotact Funct Neurosurg. 2010;88(5):304-310.
73. Thobois S, Taira T, Comella C, Moro E, Bressman S,
57. Cohen OS, Hassin-Baer S, Spiegelmann R. Deep
Albanese A. Pre-operative evaluations for DBS in dystonia.
brain stimulation of the internal globus pallidus for
Mov Disord. 2011;26(1):S17-22.
refractory tardive dystonia. Parkinsonism Relat Disord.
2007;13(8):541-544. 74. Bronte-Stewart H, Taira T, Valldeoriola F, et al. Inclusion
and exclusion criteria for DBS in dystonia. Mov Disord.
58. Eltahawy HA, Feinstein A, Khan F, Saint-Cyr J, Lang AE,
2011;26(1):S5-16.
Lozano AM. Bilateral globus pallidus internus deep brain
stimulation in tardive dyskinesia: a case report. Mov Disord. 75. Chernov MF, Ochiai T, Taira T, et al. Serial (1)H-MRS
2004;19(8):969-972. of thalamus during deep brain stimulation of bilateral
globus pallidus internus for primary generalized dystonia.
59. Franzini A, Marras C, Ferroli P, et al. Long-term high-
Neuroradiology. 2008;50(12):1055-1059.
frequency bilateral pallidal stimulation for neuroleptic-
induced tardive dystonia. Report of two cases. J Neurosurg. 76. Horisawa S, Taira T, Goto S, Ochiai T, Nakajima T. Long-
2005;102(4):721-725. term improvement of musician’s dystonia after stereotactic
ventro-oral thalamotomy. Ann Neurol. 2013;74(5):648-654.
60. Gruber D, Trottenberg T, Kivi A, et al. Long-term effects
of pallidal deep brain stimulation in tardive dystonia. 77. Fukaya C, Katayama Y, Kano T, et al. Thalamic
Neurology. 2009;73(1):53-58. deep brain stimulation for writer’s cramp. J Neurosurg.
2007;107(5):977-982.
61. Sako W, Goto S, Shimazu H, et al. Bilateral deep
brain stimulation of the globus pallidus internus in tardive 78. Taira T, Hori T. Stereotactic ventrooralis thalamotomy for
dystonia. Mov Disord. 2008;23(13):1929-1931. task-specific focal hand dystonia (writer’s cramp). Stereotact
Funct Neurosurg. 2003;80(1-4):88-91.
Capítulo 35 468
79. Vidailhet M, Vercueil L, Houeto JL, et al. Bilateral 94. Sokal P, Rudas M, Harat M, Szylberg L, Zielinski P.
deep-brain stimulation of the globus pallidus in primary Deep anterior cerebellar stimulation reduces symptoms of
generalized dystonia. N Engl J Med. 2005;352(5):459-467. secondary dystonia in patients with cerebral palsy treated
due to spasticity. Clin Neurol Neurosurg. 2015;135:62-68.
80. Kupsch A, Benecke R, Muller J,et al. Pallidal deep-brain
stimulation in primary generalized or segmental dystonia. N 95. Abosch A, Timmermann L, Bartley S, et al. An
Engl J Med. 2006;355(19):1978-1990. international survey of deep brain stimulation procedural
steps. Stereotact Funct Neurosurg. 2013;91(1):1-11.
81. Volkmann J, Wolters A, Kupsch A, et al. Pallidal deep
brain stimulation in patients with primary generalised or 96. Krahulik D, Nevrly M, Otruba P, et al. O-Arm Navigated
segmental dystonia: 5-year follow-up of a randomised trial. Frameless and Fiducial-Less Deep Brain Stimulation. Brain
Lancet Neurol. 2012;11(12):1029-1038. Sci. 2020;10(10):683.
82. Moro E, LeReun C, Krauss JK, et al. Efficacy of pallidal 97. Eleopra R, Rinaldo S, Devigili G, et al. Frameless Deep
stimulation in isolated dystonia: a systematic review and Brain Stimulation Surgery: A Single-Center Experience
meta-analysis. Eur J Neurol. 2017;24(4):552-560. and Retrospective Analysis of Placement Accuracy of 220
Electrodes in a Series of 110 Patients. Stereotact Funct
83. Nowinski WL. Towards construction of an ideal
Neurosurg. 2019;97(5-6):337-346.
stereotactic brain atlas. Acta Neurochir (Wien).
2008;150(1):1-13. 98. Liu L, Mariani SG, De Schlichting E, et al. Frameless
ROSA(R) Robot-Assisted Lead Implantation for Deep Brain
84. Vayssiere N, Hemm S, Cif L, et al. Comparison of
Stimulation: Technique and Accuracy. Oper Neurosurg
atlas- and magnetic resonance imaging-based stereotactic
(Hagerstown). 2020;19(1):57-64.
targeting of the globus pallidus internus in the performance
of deep brain stimulation for treatment of dystonia. J 99. Zrinzo L, Foltynie T, Limousin P, Hariz M. Image-verified
Neurosurg. 2002;96(4):673-679. deep brain stimulation reduces risk and cost with no
apparent impact on efficacy. Mov Disord. 2012;27(12):1585-
85. Sudhyadhom A, Haq IU, Foote KD, Okun MS, Bova FJ.
1586.
A high resolution and high contrast MRI for differentiation
of subcortical structures for DBS targeting: the Fast Gray 100. Vitek JL, Delong MR, Starr PA, Hariz MI, Metman LV.
Matter Acquisition T1 Inversion Recovery (FGATIR). Intraoperative neurophysiology in DBS for dystonia. Mov
Neuroimage. 2009;47(2):T44-52. Disord. 2011;26(1):S31-6.
86. Ostrem JL, San Luciano M, Dodenhoff KA, et 101. Merola A, Zibetti M, Artusi CA, et al. 80 Hz versus
al. Subthalamic nucleus deep brain stimulation in 130 Hz subthalamic nucleus deep brain stimulation: effects
isolated dystonia: A 3-year follow-up study. Neurology. on involuntary movements. Parkinsonism Relat Disord.
2017;88(1):25-35. 2013;19(4):453-456.
87. Pahapill PA, O’Connell B. Long-term follow-up study of 102. Alterman RL, Miravite J, Weisz D, Shils JL, Bressman
chronic deep brain stimulation of the subthalamic nucleus SB, Tagliati M. Sixty hertz pallidal deep brain stimulation for
for cervical dystonia. Neuromodulation. 2010;13(1):26-30. primary torsion dystonia. Neurology. 2007;69(7):681-688.
88. Schrock LE, Ostrem JL, Turner RS, Shimamoto SA, 103. Picillo M, Lozano AM, Kou N, Munhoz RP, Fasano
Starr PA. The subthalamic nucleus in primary dystonia: A. Programming Deep Brain Stimulation for Tremor and
single-unit discharge characteristics. J Neurophysiol. Dystonia: The Toronto Western Hospital Algorithms. Brain
2009;102(6):3740-3752. Stimul. 2016;9(3):438-452.
89. Novak KE, Nenonene EK, Bernstein LP, Vergenz S, 104. Blahak C, Capelle HH, Baezner H, Kinfe TM, Hennerici
Cozzens JW, Rezak M. Successful bilateral subthalamic MG, Krauss JK. Micrographia induced by pallidal DBS for
nucleus stimulation for segmental dystonia after unilateral segmental dystonia: a subtle sign of hypokinesia? J Neural
pallidotomy. Stereotact Funct Neurosurg. 2008;86(2):80-86. Transm (Vienna). 2011;118(4):549-453.
90. Sun B, Chen S, Zhan S, Le W, Krahl SE. Subthalamic 105. Berman BD, Starr PA, Marks WJ, Jr., Ostrem JL.
nucleus stimulation for primary dystonia and tardive Induction of bradykinesia with pallidal deep brain stimulation
dystonia. Acta Neurochir Suppl. 2007;972):207-214. in patients with cranial-cervical dystonia. Stereotact Funct
Neurosurg. 2009;87(1):37-44.
91. Kleiner-Fisman G, Liang GS, Moberg PJ, et al.
Subthalamic nucleus deep brain stimulation for severe 106. Macerollo A, Sajin V, Bonello M, et al. Deep brain
idiopathic dystonia: impact on severity, neuropsychological stimulation in dystonia: State of art and future directions. J
status, and quality of life. J Neurosurg. 2007;107(1):29-36. Neurosci Methods. 2020;340:108750.
92. Franca C, de Andrade DC, Teixeira MJ, et al. Effects 107. Aravamuthan BR, Waugh JL, Stone SS. Deep brain
of cerebellar neuromodulation in movement disorders: A stimulation for monogenic dystonia. Curr Opin Pediatr.
systematic review. Brain Stimul. 2018;11(2):249-260. 2017;29(6):691-696.
93. Cury RG, Kalia SK, Shah BB, Jimenez-Shahed J, 108. Neumann WJ, Horn A, Ewert S, et al. A localized
Prashanth LK, Moro E. Surgical treatment of dystonia. pallidal physiomarker in cervical dystonia. Ann Neurol.
Expert Rev Neurother. 2018;18(6):477-492. 2017;82(6):912-924.
Capítulo 35 469
109. Andrews C, Aviles-Olmos I, Hariz M, Foltynie T. Which 124. Elhadd KT, Alusi SH, Wieshmann UC, Hammersley
patients with dystonia benefit from deep brain stimulation? B, Eldridge PR. Deep brain thalamic stimulation in the
A metaregression of individual patient outcomes. J Neurol simultaneous treatment of generalised epilepsy and
Neurosurg Psychiatry. 2010;81(12):1383-1389. dystonic tremor. Seizure. 2020;75:87-88.
110. Vidailhet M, Jutras MF, Roze E, Grabli D. Deep brain 125. Krause P, Bruggemann N, Volzmann S, et al. Long-
stimulation for dystonia. Handb Clin Neurol. 2013;116:167- term effect on dystonia after pallidal deep brain stimulation
187. (DBS) in three members of a family with a THAP1 mutation.
J Neurol. 2015;262(12):2739-2744.
111. Volkmann J, Mueller J, Deuschl G, et al. Pallidal
neurostimulation in patients with medication-refractory 126. Kojovic M, Parees I, Lampreia T, et al. The syndrome
cervical dystonia: a randomised, sham-controlled trial. of deafness-dystonia: clinical and genetic heterogeneity.
Lancet Neurol. 2014;13(9):875-884. Mov Disord. 2013;28(6):795-803.
112. Rodrigues FB, Duarte GS, Prescott D, Ferreira J, Costa 127. Ozelius LJ, Kramer PL, de Leon D, et al. Strong allelic
J. Deep brain stimulation for dystonia. Cochrane Database association between the torsion dystonia gene (DYT1)
Syst Rev. 2019;1:CD012405. andloci on chromosome 9q34 in Ashkenazi Jews. Am J Hum
Genet. 1992;50(3):619-628.
113. Chung M, Han I, Chung SS, Jang DK, Huh R.
Effectiveness of selective peripheral denervation in 128. Bressman SB, Sabatti C, Raymond D, et al. The DYT1
combination with pallidal deep brain stimulation for the phenotype and guidelines for diagnostic testing. Neurology.
treatment of cervical dystonia. Acta Neurochir (Wien). 2000;54(9):1746-1752.
2015;157(3):435-442.
129. Bruggemann N, Kuhn A, Schneider SA, et al. Short-
114. Ravindran K, Ganesh Kumar N, Englot DJ, Wilson TJ, and long-term outcome of chronic pallidal neurostimulation
Zuckerman SL. Deep Brain Stimulation Versus Peripheral in monogenic isolated dystonia. Neurology. 2015;84(9):895-
Denervation for Cervical Dystonia: A Systematic Review and 903.
Meta-Analysis. World Neurosurg. 2019;122:e940-e946.
130. Ahn JH, Kim AR, Kim NKD, et al. The Effect of Globus
115. Wang X, Zhang C, Wang Y, et al. Deep Brain Pallidus Interna Deep Brain Stimulation on a Dystonia
Stimulation for Craniocervical Dystonia (Meige Syndrome): Patient with the GNAL Mutation Compared to Patients with
A Report of Four Patients and a Literature-Based Analysis DYT1 and DYT6. J Mov Disord. 2019;12(2):120-124.
of Its Treatment Effects. Neuromodulation. 2016;19(8):818-
131. Fox MD, Alterman RL. Brain Stimulation for Torsion
823.
Dystonia. JAMA Neurol. 2015;72(6):713-719.
116. Ghang JY, Lee MK, Jun SM, Ghang CG. Outcome of
132. Isaias IU, Volkmann J, Kupsch A, et al. Factors
pallidal deep brain stimulation in meige syndrome. J Korean
predicting protracted improvement after pallidal DBS for
Neurosurg Soc. 2010;48(2):134-138.
primary dystonia: the role of age and disease duration. J
117. Luthra NS, Mitchell KT, Volz MM, Tamir I, Starr PA, Neurol. 2011;258(8):1469-1476.
Ostrem JL. Intractable Blepharospasm Treated with Bilateral
133. Soares-Weiser K, Fernandez HH. Tardive dyskinesia.
Pallidal Deep Brain Stimulation. Tremor Other Hyperkinet
Semin Neurol. 2007;27(2):159-169.
Mov (N Y). 2017;7:472.
134. Burke RE, Fahn S, Jankovic J, et al. Tardive dystonia
118. Yamada K, Shinojima N, Hamasaki T, Kuratsu J.
and inappropriate use of neuroleptic drugs. Lancet.
Pallidal stimulation for medically intractable blepharospasm.
1982;1(8284):1299.
BMJ Case Rep. 2016;2016.
135. Burke RE, Fahn S, Jankovic J, et al. Tardive dystonia:
119. Holloway KL, Baron MS, Brown R, Cifu DX, Carne
late-onset and persistent dystonia caused by antipsychotic
W, Ramakrishnan V. Deep brain stimulation for dystonia: a
drugs. Neurology. 1982;32(12):1335-1346.
meta-analysis. Neuromodulation. 2006;9(4):253-261.
136. Reese R, Volkmann J. Deep Brain Stimulation for
120. Speelman JD, Contarino MF, Schuurman PR, Tijssen
the Dystonias: Evidence, Knowledge Gaps, and Practical
MA, de Bie RM. Deep brain stimulation for dystonia: patient
Considerations. Mov Disord Clin Pract. 2017;4(4):486-494.
selection and outcomes. Eur J Neurol. 2010;17(1):102-106.
137. Macerollo A, Deuschl G. Deep brain stimulation for
121. Jinnah HA, Alterman R, Klein C, et al. Deep brain
tardive syndromes: Systematic review and meta-analysis. J
stimulation for dystonia: a novel perspective on the value of
Neurol Sci. 2018;389:55-60.
genetic testing. J Neural Transm (Vienna). 2017;124(4):417-
430. 138. Fehlings D, Brown L, Harvey A, et al. Pharmacological
and neurosurgical interventions for managing dystonia in
122. Asahi T, Koh M, Kashiwazaki D, Kuroda S. Stereotactic
cerebral palsy: a systematic review. Dev Med Child Neurol.
neurosurgery for writer’s cramp: report of two cases with
2018;60(4):356-366.
an overview of the literature. Stereotact Funct Neurosurg.
2014;92(6):405-411. 139. Vidailhet M, Yelnik J, Lagrange C, et al. Bilateral
pallidal deep brain stimulation for the treatment of patients
123. Ramirez-Zamora A, Kaszuba B, Gee L, et al. Clinical
with dystonia-choreoathetosis cerebral palsy: a prospective
outcome and intraoperative neurophysiology for focal
pilot study. Lancet Neurol. 2009;8(8):709-717.
limb dystonic tremor without generalized dystonia treated
with deep brain stimulation. Clin Neurol Neurosurg.
2016;150:169-176.
Capítulo 35 470
140. Elkay M, Silver K, Penn RD, Dalvi A. Dystonic storm 142. Manji H, Howard RS, Miller DH, et al. Status
due to Batten’s disease treated with pallidotomy and deep dystonicus: the syndrome and its management. Brain.
brain stimulation. Mov Disord. 2009;24(7):1048-1053. 1998;121(2):243-252.
141. Apetauerova D, Schirmer CM, Shils JL, Zani J, Arle
JE. Successful bilateral deep brain stimulation of the globus
pallidus internus for persistent status dystonicus and
generalized chorea. J Neurosurg. 2010;113(3):634-638.
Capítulo 35 471
PARTE 8
CEFALEIA E EPILEPSIA
CAPÍTULO 36
CEFALEIAS
A cefaleia é uma das queixas mais comuns na uma abordagem estruturada em todos os seus aspectos.
prática médica, sendo considerada o motivo primordial Embora a anamnese e exame físico sejam elementos
das consultas em neurologia1,2. Além de ser extremamente cruciais ao diagnóstico, em casos selecionados, em
prevalente, ocorrendo em até 93% dos homens e 99% das especial aqueles que apresentam o que chamamos de
mulheres ao longo da vida3,4, a cefaleia é descrita como sinais de alarme ou red flags (Quadro 1)14,15, pode haver
uma das principais causas mundiais de incapacidade, a necessidade da solicitação de exames complementares
caracterizando a segunda principal causa de anos vividos de imagem ou mesmo laboratoriais, incluindo análise do
70,6%, constituída, em sua maior parte, por indivíduos cefaleia de origem primária, onde a cefaleia é a própria
do sexo feminino (77,8%)6. Estimativas de prevalência doença, daqueles de origem secundária, cuja conduta
entre os sexos variam entre os tipos de cefaleia. Segundo será guiada pela desordem subjacente ao sintoma. Uma
estudos de abrangência nacional, a migrânea, cuja vez identificada a etiologia da cefaleia, o tratamento deve
prevalência é de 15,8% da população brasileira, costuma ser direcionado, quando possível, à causa, e o indivíduo
ser mais prevalente no sexo feminino7, enquanto a cefaleia deve ser acompanhado, considerando a eficácia
do tipo tensão, responsável por uma prevalência de 29,5%, das medidas de tratamento e o manejo de possíveis
é habitualmente mais prevalente no sexo masculino8. sequelas17.
Capítulo 36 473
edition (ICHD-3), as cefaleias primárias consistem conjunctival injection and tearing); e 5) SUNA (short
em migrânea, cefaleia tipo tensão (CTT), cefaleias lasting, unilateral, neuralgiform attacks with cranial
trigêmino-autonômicas (CTA) e outras cefaleias autonomic symptoms) (Quadro 6)22,23.
primárias18.
Diagnóstico
Quadro clínico Os Quadros 2 a 5 mostram os critérios
A migrânea ou enxaqueca é caracterizada diagnósticos de cada cefaleia primária. Já o
por crises de cefaleia unilateral, de caráter pulsátil, Quadro 6 apresenta uma maneira prática de fazer o
intensidade moderada a intensa, duração de 4 a 72h, diagnóstico diferencial das CTAs.
exacerbada pela atividade física rotineira e associada
a sintomas característicos, que incluem fotofobia,
fonofobia, osmofobia, náuseas e vômitos (Quadro Condutas
2) . Pode ser subdividida pela presença ou ausência
18
O tratamento das crises de migrânea inclui
de aura, a qual é definida por sintomas neurológicos
medidas farmacológicas e não farmacológicas,
focais transitórios que precedem ou acompanham
lembrando que todas as crises devem ser tratadas,
a cefaleia; podem ser principalmente alterações
independentemente da sua intensidade. A terapia
visuais, sensoriais e motoras (Quadro 3)18,19. Algumas
não medicamentosa envolve repouso num ambiente
pessoas podem evoluir com migrânea crônica, em
com baixa luminosidade, arejado e silencioso; dormir
que a frequência da cefaleia é igual ou superior a 15
durante a crise; e uso de compressas frias na região
dias por mês, por pelo menos 3 meses, sendo que em
frontal da cabeça podem ajudar.
pelo menos 8 dias do mês as suas características são
migranosas (Quadro 4)18,20. O tratamento farmacológico abrange diversas
classes medicamentosas, tais como triptanas,
A CTT é descrita por episódios de cefaleia
derivados do ergot, analgésicos simples e anti-
bilateral, em pressão ou aperto, leve a moderada
inflamatórios não esteroidais (AINEs). Além disso,
intensidade, duração de 30 min a 7 dias, sem piora
muitas vezes é necessária a associação com
com atividade física rotineira. Aqui, vale ressaltar
antieméticos, neurolépticos e corticosteroides24
que não há náusea associada, mas a presença
(Quadro 7)22. As triptanas são indicadas
de fotofobia ou fonofobia é aceita. É subdividida
principalmente para as crises de moderada a forte
conforme a frequência da dor, em episódica
intensidade, entretanto, aproximadamente 30% dos
(frequente/infrequente) e crônica (Quadro 5)18,21.
pacientes não respondem adequadamente a este
As CTA são um grupo de 5 subtipos de tratamento, tendo como efeito colateral mais comum
cefaleias que apresentam manifestações em comum a sonolência. Essa classe é contraindicada em
por serem unilaterais fixas, além da presença de pacientes com histórico de cardiopatia isquêmica
pelo menos um fenômeno autonômico craniano ou acidente vascular encefálico. Os derivados do
ipsilateral à dor, tal como hiperemia conjuntival e/ ergot (diidroergotamina é a única apresentação no
ou lacrimejamento, edema e/ou ptose palpebral, Brasil) possuem a desvantagem de aumentar as
congestão nasal e/ou rinorreia, inquietude/agitação. náuseas e vômitos, além disso, suas apresentações
Por outro lado, diferenciam-se na frequência, duração são combinadas com outras substâncias (dipirona,
e resposta ao tratamento. As CTA são classificadas acetominofeno, cafeína ou metoclopramida). Os
em: 1) cefaleia em salvas; 2) hemicrania paroxística; analgésicos simples (acetominofeno e dipirona) e os
3) hemicrania contínua; 4) SUNCT (short lasting, AINEs podem ser úteis na crise migranosa de leve a
unilateral, neuralgiform headache, associated to moderada intensidade25.
Capítulo 36 474
Primeira ou a pior cefaleia já experimentada pelo paciente
Mudança do padrão ou surgimento de uma nova cefaleia em pacientes com cefaleia recorrente
Presença de qualquer anormalidade ao exame físico neurológico (por exemplo, alteração do estado mental,
sinais de irritação meníngea, presença de Babinski) e/ou fundo de olho (por exemplo, papiledema)
Cefaleia nova em indivíduos com doenças sistêmicas (por exemplo, HIV, neoplasias) ou gestantes e
puérperas
Cefaleia associada a sintomas autonômicos (por exemplo, hiperemia ocular, ptose palpebral)
Capítulo 36 475
A. Ao menos duas crises preenchendo os critérios B e C
B. Ocorrendo em um paciente que tenha apresentado ao menos 5 crises preenchendo os critérios B-D
para migrânea sem aura e/ou critérios B e C para migrânea com aura
Capítulo 36 476
A. Uma das três opções abaixo:
1. Episódica Infrequente: ao menos 10 episódios de cefaleia ocorrendo em <1 dia/mês em média
(<12 dias/ano) e preenchendo os critérios B(i)-D;
2. Episódica Frequente: ao menos 10 episódios de cefaleia ocorrendo em média em 1 a 14 dias/
mês por >3 meses e preenchendo os critérios B(i)-D
3. Crônica: ≥15 dias/mês episódios de cefaleia, por >3 meses (≥180 dias/ano), preenchendo os
critérios B(ii)-D
B. Uma das opções abaixo:
i. Duração de 30 min a 7 dias
ii. Duração de horas a dias, ou sem remissão
C. Ao menos duas das 4 seguintes características:
1. Localização bilateral
2. Qualidade em pressão ou aperto
3. Intensidade fraca ou moderada
4. Não agravada por atividade física rotineira
D. Ambos os seguintes:
1. Ausência de náuseas ou vômitos
2. Fotofobia ou fonofobia
E. Não melhor explicada por outro diagnóstico
Quadro 5: Critérios diagnósticos para a CTT.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Autonômicos ++ ++ ++ +++
Oxigenioterapia 70% - - -
Capítulo 36 477
Classes Vias de
Fármacos Posologias
medicamentosas administração
25, 50 e 100 mg VO
Sumatriptana 6 mg SC
10 mg Spray nasal
Triptanas
Naratriptana 2,5 mg VO
Rizatriptana 10 mg VO
Zolmitriptana 2,5 mg VO
1000-2000 mg
Dipirona VO
(dose máxima: 4g/dia
Analgésicos simples
1000mg
Acetaminofeno VO
(dose máxima: 4g/dia)
Ácido Acetilsalicílico 975-1000 mg VO
Ibuprofeno 400 mg VO
Antiinflamatórios
Naproxeno 500-550 mg VO
Diclofenaco Potássico 50 mg VO
Acetaminofeno 250 mg
Ácido Acetilsalicílico 250 mg VO
Analgésicos combinados Cafeína 65mg
(1-2 cp de 6/6 horas, não exceder 8 cp/dia)
Quadro 7: Tratamento farmacológico das crises de migrânea.
Fonte: Baseado em Bordini et al., 201622.
Capítulo 36 478
Classes medicamentosas Fármacos Posologias Efeitos adversos
Capítulo 36 479
A terapia farmacológica aguda da CTT cefaleia, quando devidamente solicitada, realizada
normalmente é resolvida com uso de analgésicos e avaliada por um radiologista experiente36. Após
simples ou AINEs, já que as crises usualmente este período, sua sensibilidade cai para 85,7%30.
são de leve a moderada intensidade. Nos casos Caso o diagnóstico não tenha sido estabelecido, é
de CTT episódica frequente ou crônica, a classe essencial a realização de uma punção lombar37,38,
de medicamentos com maior evidência é a dos cuja xantocromia está presente em 100% dos
antidepressivos tricíclicos, especialmente a casos, quando o líquido cefalorraquidiano (LCR) é
amitriptilina .
25
colhido entre 12h e duas semanas de evolução39, e
é analisado por espectrofotometria. A ressonância
Os tratamentos abortivos da cefaleia em
magnética (RM) de crânio não está indicada como
salvas e profiláticos das CTA estão ilustrados nos
método diagnóstico inicial, embora as sequências
quadros 9 e 10, respectivamente26,27.
ponderadas em T2 gradiente de eco e em FLAIR
possam ser úteis18. A angioTC, por sua vez, tem
Cefaleias secundárias
uma sensibilidade de até 98% e uma especificidade
Cefaleia atribuída a hemorragia de 100% para aneurismas em pacientes com HSA
subaracnoidea não traumática conhecida40,41. Alguns estudos propõem que este
A hemorragia subaracnoidea aguda (HSA) é a exame seja um excelente substituto à punção
causa mais frequente de cefaleia intensa, persistente lombar, já que pode ser realizado logo após a TC41,42.
e incapacitante de início súbito18, além de ser No entanto, em razão da baixa prevalência de
uma condição potencialmente grave, com uma aneurismas na população em geral43, um aneurisma
taxa de mortalidade de até 50%28. É resultante encontrado neste exame pode ser incidental e não
do extravasamento de sangue para o espaço estar relacionado à causa da cefaleia31. Além disso,
subaracnoideo29, onde a ruptura de um aneurisma sua sensibilidade cai para 92,3% na existência de
sacular é responsável por até 80% dos casos . 30,
aneurismas menores do que 4 mm44 e o paciente
acaba sendo exposto à radiação e à infusão de
A cefaleia geralmente é descrita como intensa
contraste por mais tempo31, gerando uma certa
e súbita, atingindo a intensidade máxima em
limitação do seu uso na prática clínica.
segundos ou minutos31, estando associada a outros
sinais e sintomas em até dois terços dos pacientes32, Uma vez diagnosticada a hemorragia ou,
incluindo: déficits neurológicos focais, meningismo, caso os exames anteriores ainda permaneçam
náuseas, vômitos, cervicalgia, alteração do nível de inconclusivos frente à uma forte suspeita diagnóstica,
consciência, convulsões e/ou síncope . Contudo,
33
a investigação adicional por meio de angiografia
alguns indivíduos podem manifestar apenas uma cerebral deve ser considerada45, já que é capaz de
cefaleia moderada de maneira isolada34 e até estudar a configuração anatômica de um possível
50% apresenta um exame neurológico normal , 35
aneurisma em relação às artérias adjacentes, além
dificultando o diagnóstico. Os critérios de diagnóstico de permitir a escolha da melhor técnica terapêutica
estabelecidos pela ICHD-3 para a cefaleia atribuída a ser utilizada, seja por microcirurgia intracraniana
à hemorragia subaracnoidea não traumática 18
são convencional (craniotomia para clipagem) ou por
descritos no Quadro 11 .18
técnica endovascular (embolização)45.
O diagnóstico da HSA, na grande maioria dos Com relação ao manejo clínico, frente à
casos, é confirmado por tomografia computadorizada uma suspeita de HSA, devem ser priorizadas a
(TC) de crânio sem contraste, que, segundo estabilização hemodinâmica e a manutenção das vias
uma metanálise publicada em 2016, possui uma aéreas do paciente31, seguido da redução da pressão
sensibilidade de 98,7% nas primeiras seis do início da arterial para níveis abaixo de 160x35 mmHg e a
Capítulo 36 480
Classes
Fármacos Posologias Efeitos adversos
medicamentosas
Náusea, vômito, tontura, fadiga,
6 mg, SC
parestesias
Triptanas Sumatriptana
Sensação de gosto desagradável,
10 mg, IN
sonolência, náusea, tontura
Oxigênio 100% 12-15 L/min, por
(posição sentada e com o tronco inclinado para 20 min; repetir conforme Nenhum
frente; máscara de alto fluxo – Venturi) necessidade
0,5 ml na narina
Lidocaína intranasal 4%
ipsilateral à crise com
(decúbito dorsal com leve extensão cefálica e Tontura, hipotensão, bradicardia
auxílio de aplicador com
rotação da cabeça contralateral à dor)
ponta de algodão
Quadro 9: Tratamento abortivo da cefaleia em salvas.
Fonte: Baseado em Hoffmann et al., 201826.
Vias de
Fármacos Doses
administração
240-720 mg/dia
Verapamil VO
(3x ao dia)
600-900 mg/dia
Carbonato de Lítio VO
(1x ao dia)
Cefaleia em Salvas
100 mg/dia
Topiramato VO
(2x ao dia)
10 mg/dia
Melatonina VO
(1x ao dia)
Hemicrania
Paroxística 225 mg/dia
Indometacina VO
(3x ao dia)
Hemicrania Contínua
100-200 mg/dia
Lamotrigina VO
(2-3x ao dia)
SUNCT/SUNA
1-3,5 mg/kg/h
Lidocaína EV
(1x por semana)
Quadro 10: Tratamento farmacológico profilático das cefaleias trigêmino-autonômicas.
Fonte: Baseado em Burish et al., 201927.
Capítulo 36 481
reversão de possíveis efeitos anticoagulantes, a fim desenvolvendo-se rapidamente, até atingir seu pico
de evitar novos sangramentos 31,46
. O nitroprussiato e de intensidade máximo em minutos, com duração
a nitroglicerina devem ser evitados em razão do seu de horas até dias48-50. Sua fisiopatologia não foi
potencial efeito vasodilatador e risco de aumento da totalmente elucidada. Acredita-se que mudanças
pressão intracraniana (PIC) 31,46
. Outras estratégias estruturais na parede de um aneurisma, incluindo
incluem o controle da dor, náuseas e do efeito valsalva, uma reação vasoespástica local desencadeada
por meio do uso de analgésicos, antieméticos e por isquemia ou mesmo pequenos sangramentos
laxativos, conforme necessário 31,46
. O fentanil, assim para o espaço subaracnoide, podem ser os fatores
como o midazolam, é um analgésico muito eficaz e responsáveis pela dor48-56.
facilmente titulável, podendo ser usado tanto para
Recentes estudos têm demonstrado que, além
analgesia como para controle da ansiedade31,45 O uso
da HSA espontânea, outros distúrbios neurológicos
de analgésicos comuns, como dipirona e paracematol,
podem ser precedidos por este tipo de cefaleia,
bem como de opioides, incluindo codeína, tramadol
incluindo ataque isquêmico transitório, trombose
ou morfina, deve ser considerado e sua dose titulada
venosa cerebral, dissecção arterial, síndrome de
e individualizada para cada paciente, a fim de manter
vasoespasmo cerebral reversível e, sobretudo,
o controle álgico45. Medicamentos antiepilépticos
vasculites47,57,58.
podem ser recomendados se o exame neurológico
for insatisfatório ou a quantidade de sangue for Embora o diagnóstico da cefaleia sentinela
significativa, pressagiando o risco de convulsão seja eminentemente clínico, com base na definição
Capítulo 36 482
distúrbios cognitivos, convulsões e/ou déficits flexão cervical70,77.
neurológicos focais, juntamente com sinais de
Uma vez que as metástases cerebrais são os
hipertensão intracraniana (náuseas, vômitos,
tumores cerebrais mais comuns em adultos, todo
presença de papiledema e turvação visual)69,70.
paciente com neoplasia apresentando uma cefaleia
Atualmente, a causa mais citada da nova caracteriza um sinal de alarme e deve ser
sintomatologia provocada pelas neoplasias do submetido a investigação complementar com exame
sistema nervoso central deve-se à ocorrência de imagem67,69,74,78. A rapidez do diagnóstico contribui
de pressão ou tração de estruturas sensíveis de maneira substancial ao prognóstico e tratamento
à dor intra e extracranianas pelo crescimento subsequente do paciente.
tumoral ou, mesmo, pela presença de edema e/ou
Na maioria dos casos, o tratamento da
hemorragia secundários62,67,71. Além disso, postula-
neoplasia subjacente melhora a cefaleia63,64,79,80.
se que o próprio tumor possa produzir agentes pró-
No entanto, naqueles pacientes cuja cirurgia
inflamatórios que contribuem diretamente para o
não é uma opção terapêutica, onde os riscos
desenvolvimento dos sintomas67,72.
superam os benefícios ou mesmo naqueles que
As cefaleias associadas a neoplasias se mantêm sintomáticos após a abordagem, uma
intracranianas não apresentam características terapia convencional para cefaleia primária deve
clínicas patognomônicas , são bastante variáveis, a
73
ser considerada, em vista de sua alta prevalência
depender da localização, do tipo e da velocidade de nesses indivíduos62,63,76. Ademais, uma abordagem
crescimento do tumor e das comorbidades prévias conservadora deve incluir a prevenção e o controle
do paciente . No geral, tumores de crescimento
74
do uso abusivo de analgésicos67.
rápido, intraventriculares, da linha média ou da fossa
A terapia da cefaleia costuma ter como objetivo
posterior tendem a gerar cefaleias mais frequentes
o controle da hipertensão intracraniana secundária
e de início mais precoce, quando comparados aos
ao edema cerebral, onde é tradicionalmente tratado
outros tumores,67,75.
com corticosteroides, em especial a dexametasona,
A cefaleia considerada típica, segundo a embora a sua eficácia clínica no alívio da dor ainda
ICHD-3 18
(Quadro 12) , raramente é observada .
18 62
seja controversa67. Em pacientes que não apresentem
Usualmente, este sintoma é descrito como edema ou que não manifestaram alívio significativo
de moderada intensidade 63,65
, localizado em da dor ao uso dos corticosteroides, podem ser
região frontal bilateral 62,63
e sem uma nítida utilizados medicamentos antiinflamatórios não
distribuição circadiana . Mesmo a dor não sendo
67
esteroidais (AINEs) ou, ainda, opioides, cuja escolha
necessariamente ipsilateral ao tumor , existem 18
deve ser realizada de maneira individualizada com
algumas síndromes que podem estar relacionadas base nas comorbidades e características pessoais
à sua localização 70,72,76,77
. Tumores orbitais, por de cada indivíduo67,72,76.
exemplo, tendem a gerar dor em região supraorbital,
unilateral, de forte intensidade, comumente
associada à diplopia, ptose palpebral e perda Cefaleia atribuída ao traumatismo craniano
sensitiva em território de inervação do nervo
É a cefaleia secundária mais prevalente na
trigêmeo70,77. Tumores parasselares, por sua vez,
população18. A dor cefálica é o sintoma mais comum,
costumam causar dor em região frontal associada à
mas podem surgir também tontura, fadiga, declínio
perda sensitiva em território de V1, além de diplopia
cognitivo, alterações do humor e do comportamento.
e paresia ocular70,77. Já os tumores occipitais se
Nestes casos, é especificada como síndrome
manifestam predominantemente com dor intensa em
pós-concussão cerebral. A patogênese ainda é
região occipital que piora significativamente com a
desconhecida e pode apresentar-se como nova
Capítulo 36 483
Critérios de diagnósticos
A. Qualquer cefaleia que preencha o critério C
B. Foi demonstrada uma neoplasia intracraniana com efeito de massa
C. Evidência de causalidade demonstrada por, pelo menos, dois dos seguintes:
1. A cefaleia ocorre em relação temporal com a neoplasia intracraniana, ou leva ao seu
diagnóstico
2. Presença de qualquer um ou ambos dos seguintes:
a. A cefaleia agrava-se em estreita relação temporal com o agravamento da neoplasia
b. A cefaleia melhorou significativamente em relação temporal com o tratamento bem-
sucedido da neoplasia intracraniana
3. Cefaleia com pelo menos um dos seguintes:
a. Progressiva
b. Pior pela manhã e/ou ao deitar
c. Agravada por manobras de Valsalva
d. Acompanhada por náuseas e/ou vômitos
D. Não melhor explicada por outro diagnóstico da ICHD-3
Quadro 12: Critérios diagnósticos para a cefaleia atribuída à neoplasia intracraniana.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
AGUDA PERSISTENTE
A. Qualquer cefaleia preenchendo os critérios C e D Idem A
B. Ocorrência de traumatismo craniano Idem B
C. Cefaleia ocorre em menos de 7 dias após 1 dos seguintes:
1. Traumatismo craniano
2. Recuperação da consciência após traumatismo
craniano Idem C
3. Descontinuação da(s) medicação(ões) que prejudicam
a capacidade de sentir ou relatar a cefaleia após o
traumatismo craniano
D. Um dos seguintes: D. Cefaleia
1. Cefaleia resolvida em 3 meses após seu início persiste por > 3
2. Cefaleia não resolvida, mas 3 meses ainda não se meses após seu
passaram desde seu início início
E. Não melhor explicada por outros diagnósticos da ICHD-3 Idem E
Quadro 13: Critérios diagnósticos da cefaleia atribuída a traumatismo da cabeça e/ou pescoço.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Capítulo 36 484
cefaleia em indivíduos sem histórico prévio, dor O implante de derivação ventrículo-peritoneal
de outro padrão naqueles que já possuem algum (DVP) é uma das formas cirúrgicas mais comuns
diagnóstico de cefaleia primária ou piora de outra no tratamento da hidrocefalia, especialmente na
cefaleia pré-existente . 81
população infantil86, e muitas dessas crianças
tornam-se dependentes desse sistema por
Na maioria dos casos, a cefaleia surge após
vários anos . Apesar da maioria dos pacientes
87
traumas leves e com características de algum tipo
demostrarem grande satisfação pós-operatória pela
de cefaleia primária, especialmente a cefaleia tipo
melhora dos sintomas decorrentes do aumento
tensão82. Contudo, a ICHD-3 classifica em seis
da pressão intracraniana, alguns fatores podem
subtipos: 1) cefaleia aguda atribuída a traumatismo da
impactar negativamente a qualidade de vida, tal
cabeça (trauma moderado/severo e leve); 2) cefaleia
como a cefaleia, que possui elevada incidência
persistente atribuída a traumatismo da cabeça (trauma
nesses indivíduos88.
moderado/severo e leve); 3) cefaleia aguda atribuída
a traumatismo cervical do tipo chicote; 4) cefaleia Na ICHD-3 não consta o diagnóstico específico
persistente atribuída a traumatismo cervical do tipo para cefaleia atribuída ao implante de DVP
chicote; e 5) cefaleia aguda atribuída a craniotomia; propriamente dito, contudo, sabe-se que o padrão
e 6) cefaleia persistente atribuída a craniotomia. Vale da dor tende a ser na região frontal da cabeça, de
lembrar que a aguda é considerada nos primeiros 3 caráter opressivo e intensidade moderada88.
meses pós-trauma e persistente após esse período
O tratamento abortivo e profilático da cefaleia
(Quadro 13)18.
atribuída a hipertensão intracraniana secundária a
O tratamento é multifatorial, incluindo hidrocefalia e cefaleia pós-implante de DVP deve ser
fisioterapia, psicoterapia, atividade física e baseado no fenótipo clínico da cefaleia apresentada,
medicamentos . Como o padrão da cefaleia simula
83
com uso de analgésicos simples, anti-inflamatórios
diversos tipos de cefaleias primárias, a escolha do não esteroidais, opioides em casos selecionados,
fármaco a ser prescrito deve levar em consideração antidepressivos tricíclicos e duais, gabapentinoides,
o fenótipo apresentado pelo paciente, tais como entre outros. É importante sempre avaliar os sinais
antidepressivos tricíclicos e duais, anticonvulsivantes, clínicos da própria hipertensão intracraniana e o
betabloqueadores, entre outros 84,85
. funcionamento de todo o sistema de derivação para
que sejam afastadas outras etiologias para a cefaleia89.
Capítulo 36 485
Os principais fatores de risco para o como complicações tardias em oito sujeitos e
desenvolvimento de cefaleias pós-procedimento dores faciais graves em outros nove104. A falta de
foram: localização dos aneurismas na artéria informações completas dificulta a identificação
carótida interna, uso de stent adjuvante às molas correta das cefaleias e, portanto, uma sistematização
e uso de molas bioativas 95,96
. O quanto estas da abordagem terapêutica. O tratamento destas
cefaleias guardam relação com outras formas de condições, portanto, deve individualizado para cada
tratamento endovascular, seja de aneurismas ou de caso.
malformações arteriovenosas (por exemplo, Ônix®
e cola) permanece para ser esclarecido97,98.
A existência de uma cefaleia pós-Gamma feminino, idade entre 31 e 50 anos, história de cefaleia
Knife foi aventada por Rozen e Swanson (1997)100, pós-punção dural prévia e orientação do bisel da
submetido 15 meses antes à radiocirurgia de uma vertebral105. Sua prevalência pode ser reduzida pelo
Capítulo 36 486
A. Nova cefaleia ou piora significativa de uma cefaleia pré-existente, preenchendo os critérios
C
B. Diagnóstico de hipertensão intracraniana:
1. Pressão do LCR > 25 cm H2O (ou > 28 cm H2O em crianças obesas)
2. Composição normal do LCR
C. Evidência de causalidade demonstrada por pelo menos dois dos seguintes:
1. Cefaleia desenvolveu-se em relação temporal à hipertensão intracraniana ou levou
a sua descoberta
2. Cefaleia aliviada com a redução da pressão intracraniana
3. Papiledema
D. Não melhor explicada por outros diagnósticos da ICHD-3
Quadro 14: Critérios diagnósticos da cefaleia atribuída ao aumento da pressão do LCR.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Capítulo 36 487
Distúrbios do tecido conjuntivo
- Síndrome de Marfan
- Síndrome de Ehler-Danlos
- Hiperelasticidade articular
- Outras doenças do tecido conjuntivo
Malformações durais
- Cistos meníngeos
- Ectasias durais
Esporões osteofitários vertebrais
Fístulas durais-venosas
Quadro 16. Condições associadas à ocorrência da cefaleia da hipotensão liquórica espontânea.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Tosse
Espirro
Coito
Esforço físico
Estrangulamento
Exercícios e esportes
Abaixar-se para apanhar objetos
Mudanças de posição
Quedas insignificantes
Montanha-russa
Manipulação de quiroprática do pescoço
Quadro 17. Eventos descritos como precipitantes de hipotensão liquórica “espontânea”.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Características clínicas: Estas cefaleias se minutos a horas e torna-se menos evidente com
caracterizam por serem bilaterais, occipito-nucais, o passar do tempo. Sintomas cócleo-vestibulares
ortostáticas, com piora à manobra de Valsalva e são comuns e podem ser a principal manifestação,
ao movimentar a cabeça. Divergindo da ICHD, o principalmente nos indivíduos com mais de 45
tempo de ortostatismo e decúbito para o início e o anos (Quadro 18)108,109. Manifestações neurológicas
alívio da cefaleia, respectivamente, pode variar de menos frequentes podem ocorrer (Quadro 18)108,109.
Capítulo 36 488
Diagnóstico: Investigação diagnóstica elevada, sem hidrocefalia ou lesão expansiva, LCR
adicional deverá ser realizada em casos de fístula normal e ausência de condição nosológica causal
pós-operatória e na hipotensão liquórica espontânea. são critérios para o diagnóstico de HII110 (Quadro
Esta inclui imagens por RM de crânio, e, nos 19)18. O fenótipo da cefaleia pode se assemelhar
quadros espontâneos, exame de mielografia ou de ao de outras dores de cabeça, inclusive das
mielotomografia, que ganharam o espaço do exame primárias104. Podem ser relatados obscurecimentos
de cisternocintilografia109 (Figura 1). Na ausência visuais com a duração de segundos, turvação visual,
de neuroimagem compatível, pode proceder-se a zumbido pulsátil, dorsalgia, cervicalgia, tontura,
punção lombar com raquimanometria, e pressões distúrbios cognitivos, dores radiculares e diplopia
de abertura iguais ou inferiores a 60 mmHg são horizontal111-113. O papiledema (Figura 2), apesar de
diagnósticas108. “clássico”, pode não estar presente110,114. A HII deve
ser suspeitada nos pacientes com cefaleia e índice
Tratamento: a hipotensão liquórica pós-punção
de massa corporal (IMC) >30 114
, principalmente
lombar pode ser tratada com 108
: 1) repouso em
se for agravada pelo decúbito horizontal. Além
decúbito horizontal, sem travesseiro; 2) hidratação
da investigação laboratorial (Quadro 20)110 e de
SSI > 2,5 L/dia; 3) cafeína, na dose de 300 mg, por via
campimetrias (sequenciais) (Figura 2), previamente
oral, de 12/12 horas ou aminofilina 6 mg/kg ataque
à punção lombar devem ser solicitadas imagens
e 3 mg mg/kg, por via endovenosa, em pelo menos
do encéfalo por TC, a ser complementadas por
30 min de 8/8h; 4) faixas abdominais compressivas;
exames de RM e angio-RM da cabeça e pescoço,
e 5) tampão sanguíneo epidural (blood patch) “cego”
arterial e venosa (ou angioTC de igual teor) (Quadro
com 10 a 50 ml de sangue autólogo, o qual pode ser
20110, Figura 3). A pressão de abertura lombar deve
reaplicado até duas vezes em caso de insucesso.
ser medida com o paciente em decúbito lateral.
Podem ser adicionados ao sangue: a) contraste
Os critérios de diagnóstico para HII exigem uma
iodado (5 ml) para visualização radioscópica; e/ou
pressão de abertura ≥ 250 mm LCR, porém esta não
b) cola de fibrina. Após o procedimento, o paciente
deve ser interpretada como dado isolado para este
deve ser mantido em Trendelemburg por 8h e, após
diagnóstico110-113.
a alta, não fazer exercícios durante uma semana.
Outras abordagens terapêuticas incluem blood patch Quanto ao tratamento, a acetazolamida
epidural direcionado ao nível da fístula, redução associada à dieta para redução de peso/hipossódica
cirúrgica do volume do saco dural ou fechamento mostrou-se superior à dieta isolada quanto à
cirúrgico direto. melhora do campo visual, da qualidade de vida
após seis meses, redução da pressão de abertura
Deve ser individualizada a abordagem de
e levou a uma menor desistência do tratamento114.
casos secundários a abordagens cirúrgicas e/ou a
Se houver dificuldade na perda de peso, em casos
trauma, se conservadora (dreno lombar) ou cirúrgica
selecionados pode ser indicada a cirurgia bariátrica,
(abordagem direta), associados ou não às medidas
que pode ter sucesso elevado na redução de peso e
supracitadas.
no controle da pressão intracraniana111-114
Capítulo 36 489
Zumbido
Plenitude auricular
Percepção de eco ou disacusia
Hipoacusia
Tontura
Vertigem rotatória
Dor interescapular
Diplopia transitória
Amortecimento da face ou dor facial
Diplegia facial
Espasmo facial
Disgeusia
Galactorreia
Quadriplegia
Movimentos involuntários
Comprometimento cognitivo
Quadro 18. Outros sintomas descritos por indivíduos com hipotensão intracraniana.
Fonte: Baseado em Ferrante et al., 2019108.
Figura 1: Espessamento e contrastação meníngea (A, B e C). A: apagamento dos sulcos corticais e das cisternas
encefálicas. B: Descenso do encéfalo com colapso do hipotálamo sobre a sela túrcica, da ponte sobre o clivus, do
cerebelo em direção ao forame magno e deformidade dos seios venosos cerebrais. C: Ventrículos em fenda. D, E:
Estiramento dos nervos ópticos.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 36 490
1. São necessários para o diagnóstico de síndrome do pseudotumor cerebral a
A. Papiledema
B. Exame neurológico normal, exceto para anormalidades dos nervos cranianos
C. Neuroimagem: Parênquima cerebral normal sem evidência de hidrocefalia, massa ou lesão estrutural e nenhum
realce meníngeo anormal na M, com e sem gadolínio, para pacientes típicos (mulheres e obesos), e M, com e sem
gadolínio e angioRM venosa para outros; se a RM não estiver disponível ou for contraindicada, a TC de crânio com
contraste pode ser usada
D. Composição normal do CSF
E. Pressão elevada de abertura da punção lombar (>= 250 mm de LCR em adultos e >= 280 mm de LCR em crianças
(250 mm de LCR se a criança não estiver sedada e não for obesa) em uma punção lombar realizada adequadamente
2. Diagnóstico de síndrome de pseudotumor cerebral sem papiledema
Na ausência de papiledema, um diagnóstico de síndrome de pseudotumor cerebral pode ser feito se B – E acima
forem preenchidos e se, além disso, o paciente tiver paralisia do nervo abducente unilateral ou bilateral
Na ausência de papiledema ou paralisia do sexto nervo, um diagnóstico de síndrome de pseudotumor cerebral pode
ser sugerido, mas não se além de B – E satisfeitos, pelo menos 3 dos seguintes critérios de neuroimagem forem
satisfeitos:
i. Sela vazia
ii. Achatamento da face posterior do globo
iii. Distensão do espaço subaracnoideo perióptico com ou sem nervo óptico tortuoso
iv. Estenose do seio venoso transverso
Quadro 19. Critérios diagnósticos de hipertensão intracraniana idiopática.
a
Um diagnóstico de síndrome de pseudotumor cerebral é definitivo se o paciente atender aos critérios A – E. O
diagnóstico é considerado provável se os critérios A – D forem atendidos, mas a pressão medida do LCR for inferior à
especificada para um diagnóstico definitivo.
Fonte: The International Classification of Headache Disorders, 201818.
Figura 2: A: papiledema avançado com elevação do disco óptico, desaparecimento da escavação, obscurecimento dos
vasos peripapilares, tortuosidade vascular e exsudatos na área macular; B: OCT mostra espaço hiporefletivo triangular
com elevação do disco óptico e desaparecimento da escavação em AO; C: angiofluoresceinografia revela vazamento do
contraste nos discos ópticos e tortuosidade vascular em AO; D: RM de crânio em corte axial mostrando achatamento no
polo posterior do globo ocular e proeminência dos espaços liquóricos e edema nas bainhas dos nervos ópticos em AO;
e E: CV computadorizado com perda do CV periférico e remanescente do CV central em AO. OD: olho direito, OE: olho
esquerdo, AO: ambos os olhos, OCT: TC de coerência óptica, CV: campo visual.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 36 491
Hipertensão intracraniana idiopática
Inclui pacientes com obesidade, ganho de peso recente, síndrome do ovário policístico e crianças magras
Pseudotumor cerebral secundário
Anormalidades venosas cerebrais
Trombose do seio venoso cerebral
Trombose da veia jugular bilateral ou ligadura cirúrgica
Infecção do ouvido médio ou mastoide
Aumento da pressão do coração direito
Síndrome da veia cava superior
Fístulas arteriovenosas
Diminuição da absorção de LCR devido a infecção intracraniana anterior ou HSA
Estados hipercoaguláveis
Exposição a medicamentos
Antibióticos
Tetraciclina, minociclina, doxiciclina, ácido nalidíxico, sulfas
Vitamina A e Retinoides
Hipervitaminose A, isotretinoína, ácido retinóico all-trans para leucemia promielocítica, ingestão excessiva de
fígado)
Hormônios
Hormônio do crescimento humano, tiroxina [em crianças], acetato de leuprorrelina, levonorgestrel (sistema
Norplant), esteroides anabolizantes)
Retirada de corticosteroides em uso crônico
Lítio
Clordecona
Condições médicas
Desordens endócrinas
Doença de Addison
Hipoparatireoidismo
Hipercapnia
Apneia do sono
Síndrome de Pickwick
Anemia
Insuficiência renal
Síndrome de Turner
Síndrome de Down
Quadro 20. Condições que podem predispor a hipertensão intracraniana idiopática e outras que podem desencadear
quadros secundários.
Fonte: Baseado em Friedman et al., 2013110 ; Boyter, 2019112 ;e Wall M, 2017113.
Capítulo 36 492
Figura 3 A: Sela túrcica vazia; B: Estenose do seio transverso direito; C e D: Tortuosidade dos nervos ópticos e
espessamento de sua bainha.
Fonte: Os autores, 2021.
pacientes submetidos a algum tipo de derivação, as cefaleias persistem relatadas por 68% e em 79% dos
indivíduos após 6 meses e 2 anos, respectivamente, e em até 1/3 dos casos são secundárias a hipotensão
liquórica iatrogênica115.
Estima-se que entre 50% a 90% dos pacientes apresentam a sua forma aguda e, destes, cerca de ¼
desenvolvem a forma persistente. É mais comum em cirurgias de base de crânio e quando a duração da
cirurgia é maior que 4h116,104. Embora a cefaleia, normalmente, apresente sua intensidade máxima na região
da craniotomia, ela pode ser difusa e, às vezes, assemelhar-se à cefaleia do tipo tensão e à migrânea104.
Medidas para esta cefaleia podem ser tomadas em quatro momentos distintos: pré, intra, pós-
imediato e pós-operatório tardio. No pré-operatório se recomenda a infiltração de anestésico local nas
margens do local onde será feita a incisão cirúrgica ou bloqueio do couro cabeludo, a fim de prevenir a
hipersensibilização. No intraoperatório, realizar a duroplastia, substituir o retalho ósseo e cuidar para manter
os resíduos ósseos longe do local da cirurgia. No pós-operatório imediato, utiliza-se analgesia endovenosa
com analgésicos simples (dipirona) e antiinflamatórios não esteroidais, em caso de dor leve a moderada,
Capítulo 36 493
e opioides em caso de dor forte (tramadol, morfina local do processo estiloide e dos ligamentos
ou metadona). Caso a cefaleia se torne persistente, estilo-hioideo, que resulta em hiperplasia reativa
indica-se a utilização de antidepressivos tricíclicos ossificante119.
ou duais, além da infiltração de anestésicos locais
Considera-se normal o tamanho do processo
ao redor da cicatriz cirúrgica117.
estiloide até 25 mm, por outro lado, quando possui
é maior, define-se como anormalmente alongado.
Estima-se que cerca de 4% da população em geral
Cefaleia atribuída a dissecção arterial apresentam o alongamento do processo estiloide,
cervical
porém apenas 4% destes sofrem com algum
Dissecção arterial cervical (DAC) provoca até sintoma em decorrência desta anormalidade, o
cerca de 25% dos acidentes vasculares encefálicos que representa uma incidência real de 0,16% na
em pessoas abaixo dos 55 anos. Suas principais população geral120.
manifestações clínicas são: cefaleia, dor facial,
Pode ser classificada em dois tipos: síndrome
cervicalgia, síndrome de Horner, paralisia de nervo
de Eagle clássica e síndrome estilocarotídea. A
craniano e déficit neurológico focal118. Um estudo
primeira provoca dor nas distribuições sensitivas
realizado na China analisou as características da
do X, VII, VIII, IX e X nervos cranianos, disfagia
cefaleia em 146 indivíduos com DAC. A cefaleia e
e sensação de corpo estranho na orofaringe. Já
a cervicalgia ocorreram em aproximadamente 40%
no outro subtipo, a dor ocorre na região da artéria
dos casos de DAC, quase sempre com início súbito
carótida, além de vertigem, síncope e até ataques
(98,3%), podendo ser descrito como “em trovoada”,
isquêmicos transitórios.
e de localização ipsilateral ao vaso dissecado
(40%) ou bilateral (52,7%). Dissecção na circulação O diagnóstico é realizado através da presença
posterior (71,7%) provocou cefaleia e cervicalgia de sintomas sugestivos e evidência de alongamento
mais frequentemente em comparação à circulação do processo estiloide ipsilateralmente à dor, através
anterior (28,3%). Em média, a duração dos sintomas de radiografia ou TC cervical.
álgicos foi de 2 a 4 semanas . 118
O tratamento pode ser feito de maneira
O tratamento da DAC deve ser realizado conservadora (analgésicos, antiinflamatório,;
com heparina seguida de anticoagulação oral por antidepressivos, anticonvulsivantes, infiltração
3 a 6 meses, enquanto que o manejo da cefaleia local de anestésico e corticoide, preferencialmente
é feito com medicações sintomáticas (analgésicos, guiada por ecografia) ou cirúrgico (encurtamento do
antiinflamatórios e opioides fracos), já que na processo estiloide)119.
maioria das vezes o seu curso é subagudo104.
Neuralgia do trigêmeo
Cefaleia e/ou dor facial atribuída a É a neuralgia craniana mais comum e possui
inflamação do ligamento estilo-hioideo
como característica episódios recorrentes de dor em
A síndrome de Eagle é uma condição rara crises ultracurtas semelhantes a choques elétricos,
caracterizada por um alongamento do processo afetando um ou mais ramos do nervo trigêmeo.
estiloide, o qual interfere no funcionamento das Possui prevalência de 0,07% na população geral e
estruturas vizinhas, provocando dores orofaciais de 2% de todas as pessoas com dor facial. Afeta três
e/ou cervicais frequentemente desencadeadas mulheres a cada homem e 90% dos casos iniciam
por movimentos do pescoço. A principal hipótese após os 40 anos, sendo que a principal idade de
fisiopatológica é que ocorra uma irritação crônica surgimento é a partir dos 60 anos121,122.
Capítulo 36 494
É classificada em três tipos121-123: 4. Farias da Silva W. Manual prático para diagnóstico
e tratamento das cefaleias. 2 edição. Rio de Janeiro:
• clássica (80 a 90% dos casos): quando Sociedade Brasileira de Cefaleia, 2001, p. 1-96.
há compressão neurovascular [artéria 5. Saylor D, Steiner TJ. The Global Burden of Headache.
cerebelar superior (50% dos pacientes)]; Semin Neurol. 2018;38(2):182-190.
6. Queiroz LP, Silva Júnior AA. The Prevalence and Impact
• secundária (5 a 15%): lesão expansiva em of Headache in Brazil. Headache. 2015;55(S1):32-38.
ângulo pontocerebelar ou esclerose múl- 7. Queiroz LP, Peres MFP, Piovesan EJ, et al. A nationwide
tipla; e population-based study of migraine in Brazil. Cephalalgia.
2009;29:642-649.
• idiopática (<5%): sem evidência de com- 8. Queiroz LP, Peres MFP, Piovesan EJ, et al. A nationwide
pressão neurovascular, lesão expansiva population-based study of tension-type headache in Brazil.
Headache. 2008;49:71-78.
em ângulo pontocerebelar ou esclerose
múltipla. 9. Kristoffersen ES, Stavem K, Lundqvist C, Russell MB.
Impact of chronic headache on workdays, unemployment
As dores geralmente são em choque, and disutility in the general population. J Epidemiol
Community Health. 2019;0:1-8.
unilaterais (97%), com duração de segundos a 2
10. Gustavsson A, Svensson M, Jacobi F, et al.
min, frequência média de 10 a 50 vezes ao dia, não Cost of disorders of the brain in Europe 2010. Eur
apresenta sintomas associados em suas crises e, em Neuropsychopharmacol. 2011;21:718–779.
metade dos casos, pode haver sensação incômoda 11. Steiner TJ, Stovner LJ, Katsarava Z, Lainez JM,
Lampl C, Lantéri-Minet M, et al. The impact of headache
persistente entre os paroxismos de dor. Em 96% dos
in Europe: principal results of the Eurolight project. J
pacientes há presença de gatilhos por manobras Headache Pain. 2014;15(31):1-11.
típicas: bocejar, escovar os dentes, falar, mastigar, 12. Raggi A, Leonardi M. Burden and cost of neurological
tocar na face. Os ramos maxilar e mandibular são os diseases: a European north–south comparison. Acta
Neurol Scand. 2014;132(1):16–22.
mais acometidos121-123.
13. Raggi A, Leonardi M, Scaratti C, Sansone E, Grazzi
O tratamento pode ser realizado com L, D’Amico D. Gender and education inequalities in
the cost of medication-overuse headache. Neurol Sci.
medicamentos, procedimentos minimamente 2018;39(S1):S117–S119.
invasivos, radocirurgia e cirurgia convencional. Os 14. Wootton RJ, Wippold FJ, Whealy, MA. Evaluation of
medicamentos de primeira linha são: carbamazepina headache in adults. Waltham (MA): Up to date; 2020.
Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/
e oxcarbazepina; já os de segunda linha são a evaluation-of-headache-in-adults.
lamotrigina, baclofeno e gabapentina. A aplicação
15. Newman LC, Lipton RB. Emergency department
de toxina botulínica no território trigeminal afetado evaluation of headache. Neurol Clin. 1998;16(2):285-303.
doi:10.1016/s0733-8619(05)70065-7.[1]
e rizotomia trigeminal percutânea, além da
radiocirurgia com Gamma Knife são possibilidades 16. Perla AS. Cefaleias: Diagnóstico diferencial. In:
Chaves MLF, Finkelsztejn A, Stefani MA (orgs), Mallmann
terapêuticas antes de prosseguir para a cirurgia AB, et al (Ed). Rotinas em neurologia e neurocirurgia.
convencional (descompressão microvascular)124-127. Porto Alegre: Artmed; 2009, p. 128-139.
17. Freitas FL, Freitas TG. Eventos agudos na atenção
básica: Cefaleia. Florianópolis: Universidade Federal do
Paraná, 2013, p. 1-18.
REFERÊNCIAS 18. Headache classification commitee of the international
1. Stewart WF, Celentano D, Linet M. Disability, physician headache society (IHS). The international classification
consultation, and use of prescription medications of headache disorders, 3ª Edição. Cephalalgia. 2018;
in a population-based study of headache. Biomed 38(1):1-211.
Pharmacother. 1989;43:711-718.
19. Dodick DW. Migraine. Lancet. 2018; 391(10127): 1315-
2. Ferri-de-Barros J, Nitrini R. Que pacientes atende um 1330.
neurologista? Alicerce de um currículo em neurologia. Arq
20. Oliveira RA. Tratado de neurologia da academia
Neuropsiquiatr. 1996;54:637-644.
brasileira de neurologia. 2a ed. São Paulo (SP): Elsevier;
3. Ramussen BK, Jessen R, Schroll N, Olsen J. 2019. p. 280.
Epidemiology of headache in a general population: a
prevalence study. J Clin Epidemiol. 1991;44:1147-1157.
Capítulo 36 495
21. Oliveira RA. Tratado de neurologia da academia 37. Lledo A, Calandre L, Martinez-Menendez B, Perez-
brasileira de neurologia. 2a ed. São Paulo (SP): Elsevier; Sempere A, Portera-Sanchez A. Acute headache of recent
2019. p. 299. onset and subarachoid haemorrhage: a prospective study.
Headache. 1994;34(3):172-174.
22. Bordini CA, Roesler C, Carvalho DS, Macedo DD,
Piovesan E, Melhado EM et al. Recommendations for the 38. Vermeulen M, van Gijn J. The diagnosis of
treatment of migraine attacks - a Brazilian consensus. Arq subarachnoid haemorrhage. J Neurol Neurosurg
Neuropsiquiatr. 2016;74(3):262-71. Psychiatry 1990;53(5):365-372.
23. Benoliel R. Trigeminal autonomic cephalalgias. Br J 39. Leblanc R. The minor leak preceding subarachnoid
Pain. 2012;6(3):106-23. haemorrhage. J Neurosurg. 1987;66(1):35-39.
24. Becker WJ. Acute Migraine Treatment in Adults. 40. Agid R, Lee SK, Willinsky RA, terBrugge KG. Acute
Headache. 2015;55(6):778-793. subarachnoid hemorrhage: using 64-slice multidetector CT
angiography to “triage” patients’ treatment. Neuroradiology.
25. Jensen RH. Tension-type headache - the normal and
2006;48(11):787-794.
most prevalent headache. Headache. 2018;58(2):339-345.
41. McCormack RF, Hutson A. Can computed tomography
26. Hoffmann J, May A. Diagnosis, pathophysiology,
angiography of the brain replace lumbar puncture in the
and management of cluster headache. Lancet Neurol.
evaluation of acute-onset headache after a negative
2018;17(1):75-83.
noncontrast cranial computed tomography scan? Acad
27. Burish JB, Rozen TD, Trigeminal autonomic Emerg Med. 2010;17(4):444-451.
cephalalgias. Neurol Clin. 2019;37(4):847-869.
42. Meurer WJ, Walsh B, Vilke GM, Coyne CJ. Clinical
28. The Magnetic Resonance Angiography in Relatives guidelines for the emergency department evaluation of
of Patients with Subarachnoid Hemorrhage Study subarachnoid hemorrhage. J Emerg Med. 2016;50(4):696-
Group. Risks and benefits of screening for intracranial 701.
aneurysms in first-degree relatives of patients with
43. Brisman JL, Song JK, Newell DW. Cerebral
sporadic subarachnoid hemorrhage. N Engl J Med.
aneurysms. N Engl J Med. 2006;355(9):928-939.
1999;341(18):1344-1350.
44. McKinney AM, Palmer CS, Truwit CL, Karagulle
29. Becske T. Subarachnoid hemorrhage. Medscape.
A, Teksam M. Detection of aneurysms by 64-section
2018.
multidetector CT angiography in patients acutely suspected
30. Singer RJ, Ogilvy CS, Rordorf G. Etiology, clinical of having an intracranial aneurysm and comparison with
manifestations, and diagnosis of aneurysmal subarachnoid digital subtraction and 3D rotational angiography. Am J
hemorrhage. UpToDate. 2010. Disponível em: <http:// Neuroradiol. 2008;29(3):594-602.
ekstern.infonet.regionsyddanmark.dk/Files/Formularer/
45. van Gijn J, Kerr RS, Rinkel GJE. Subarachnoid
Upload/2011/12/Etiology-clinical-manifestatio.%20
haemorrhage. Lancet. 2007;369(9558):306-318.
Subarachnoid% 20hemorrage_5.pdf>.
46. Connolly ES, Jr., Rabinstein AA, Carhuapoma JR,
31. Marcolini E, Hine J. Approach to the Diagnosis and
Derdeyn CP, Dion J, Higashida RT, et al. Guidelines for the
Management of Subarachnoid Hemorrhage. West J
management of aneurysmal subarachnoid hemorrhage: A
Emerg. 2019;20(2):203-211.
guideline for healthcare professionals from the American
32. Linn FHH, Wijdicks EFM, van der Graaf Y, Heart Association/American Stroke Association. Stroke.
Weerdesteyn-van Vliet FAC, Bartelds AIM, van Gijn J. 2012;43(6):1711-1737.
Prospective study of sentinel headache in aneurysmal
47. Lebedeva ER, Ushenin AV, Gurary NM, Gilev DV,
subarachnoid haemorrhage. Lancet. 1994;344(8922):590–
Olesen J. Sentinel headache as a warming sympton of
593.
ischemic stroke. J Headache Pain. 2020;21(70):1-10.
33. Green DM, Burns JD, DeFusco CM. ICU management
48. Pereira JLB, de Albuquerque LAF, Dellaretti M, et al.
of aneurysmal subarachnoid hemorrhage. J Intensive Care
Importance of recognizing sentinel headache. Surg Neurol
Med. 2013;28(6):341-354.
Int. 2012;3(162):1-4.
34. Ferro JM, Lopes J, Melo TP, Oliveira V, Crespo M,
49. Anderson C, Anderson N, Bonita R, et al. Epidemiology
Campos JG, et al. Investigation into the causes of delayed
of aneurysmal subarachnoid hemorrhage in Australia
diagnosis of subarachnoid hemorrhage. Cerebrovasc Dis.
and New Zealand: Incidence and case fatality from the
1991;1:160–164.
Australasian Cooperative Research on Subarachnoid
35. Edlow JA, Fisher J. Diagnosis of subarachnoid Hemorrhage Study (ACROSS). Stroke 2000;31(8):1843-
hemorrhage: time to change the guidelines? Stroke. 1850.
2012;43(8):2031-2032.
50. Asano AGC, da Silva WF, Valença MM. Cefaleia
36. Dubosh NM, Bellolio MF, Rabinstein AA, Edlow JA. sentinela: Sinal de alerta da hemorragia subaracnoidea
Sensitivity of early brain computed tomography to exclude por ruptura de aneurisma intracraniano. Migrâneas
aneurysmal subarachnoid hemorrhage: a systematic Cefaleias. 2008;11(2):78-83.
review and meta-analysis. Stroke. 2016;47(3):750-755.
51. Inagawa T. What are the actual incidence and
mortality rates of subarachnoid hemorrhage? Surg Neurol.
1997;47(1):47-52.
Capítulo 36 496
52. Linn FHH, Rinkel GJE, Algra A, van Gijn J. Incidence 69. Christiaans MH, Kelder JC, Arnoldus EP, Tijssen CC.
of subarachnoid hemorrhage: Role of region, year, and Prediction of intracranial metastases in cancer patients
rate of computed tomography: A meta-analysis. Stroke. with headache. Cancer. 2002;94(7):2063–2068.
1996;27(4):625-629.
70. Loghin M, Levin VA. Headache related to brain tumors.
53. Polmear A. Sentinel headaches in aneurysmal Curr Treat Options Neurol. 2006;8(1):21–32.
subarachnoid haemorrhage: What is the true incidence?
71. Obermann M, Holle D, Naegel S, Diener HC.
A systematic review. Cephalalgia 2003;23(10):935-941.
Headache attributable to nonvascular intracranial
doi:10.1046/j.1468-2982.2003.00596.x.
disorders. Curr Pain Headache Rep. 2011;15(4): 314–323.
54. Schwedt TJ, Matharu MS, Dodick DW. Thunderclap
72. Kahn K, Finkel A. It IS a tumor – current review of
headache. Lancet Neurol. 2006;5(7):621-631.
headache and brain tumor. Curr Pain Headache Rep.
55. Suarez JI, Tarr RW, Selman WR. Aneurysmal 2014;18(6):421.
subarachnoid hemorrhage. N Engl J Med.
73. Do TP, Remmers A, Schytz HW, et al. Red and
2006;354(4):387-396.
Orange flags for secondary headaches in clinical practice:
56. Van Gijn J, Rinkel GJE. Subarachnoid haemorrhage: SNNOOP10 list. Neurology. 2019;92:1-11.
Diagnosis, causes and management. Brain.
74. Hadidchi S, Surento W, Lerner A, Liu CSJ, Gibbs WN,
2001;124(2):249-278.
Kim PE, et al. Headache and brain tumor. Neuroimag Clin
57. Lebedeva ER, Gurary NM, Olesen J. Headache N Am. 2019;29(2):1-10.
in transiente ischemic attacks. J Headache Pain.
75. Goffeaux P, Fortin D. Brain tumor headaches: From
2018;19(1):1-8.
bedside to bench. Neurosurgery. 2010;67(2):459–466.
58. Vermeulen MJ, Schull MJ. Missed diagnosis of
76. Kirby S, Purdy RA. Headaches and brain tumors.
subarachnoid haemorrhage in the emergency department.
Neurol Clin. 2014;32(2):423–432.
Stroke. 2007;38(4):1216-1221.
77. Greenberg HS, Deck MD, Vikram B, Chu FC, Posner
59. Wan Z, Meng H, Xu N, et al. Clinical characteristics
JB. Metastasis to the base of the skull: clinical findings in
associated with sentinel headache in patients with
43 patients. Neurology. 1981;31(5):530–537.
unruptured intracranial aneurysms. Interv Neuroradiol.
2021;27(4):497-502. 78. Argyriou AA, Chroni E, Polychronopoulos P, et
al. Headache characteristics and brain metastases
60. Freitas FL, Freitas TG. Eventos agudos na atenção
prediction in cancer patients. Eur J Cancer Care (Engl).
básica: Cefaleia. Florianópolis: Universidade Federal do
2006;15(1):90–95.
Paraná, 2013. p. 1-18.
79. Schmidinger M, Linzmayer L, Becherer A, et al.
61. Vázquez-Barquero A, Ibánez FJ, Herrera S, Izquierdo
Psychometric-and quality-of-life assessment in longterm
JM, Berciano J, Pascual J. Isolated headache as the
glioblastoma survivors. J Neurooncol. 2003;63(1):55–61.
presenting clinical manifestation of intracranial tumors: A
prospective study. Cephalalgia. 1994;14(4):270–272. 80. Pace A, Di Lorenzo C, Guariglia L, Jandolo B,
Carapella CM, Pompili A. End of life issues in brain tumor
62. Forsyth PA, Posner JB. Headache in patients
patients. J Neurooncol. 2009;91(1):39–43.
with brain tumors: A study of 111 patients. Neurology.
1993;43(9):1678–1683. 81. Láinez MJ, Pesquera BL. Headache after trauma:
physiological considerations. Curr Pain Headache Rep.
63. Valentinis L, Tuniz F, Valent F, et al. Headache
2011;15(6):467-473.
attributed to intracranial tumours: A prospective cohort
study. Cephalalgia. 2010;30(4):389–398. 82. Theeler BJ, Flynn FG, Erickson JC. Headaches
after concussion in US soldiers returning from Iraq or
64. Pfund Z, Szapáry L, Jászberényi O, Nagy F, Czopf
Afghanistan. Headache. 2010;50(8):1262-1272.
J. Headache in intracranial tumors. Cephalalgia.
1999;19(9):787–790. 83. Obermann M, Holle D, Katsarava Z. Post-traumatic
headache. Expert Rev Neurother. 2009;9(9):1361-70.
65. Schankin CJ, Ferrari U, Reinisch VM, Birnbaum T,
Goldbrunner R, Straube A. Characteristics of brain tumour- 84. Channell MK, Mueller LL, Hahn R. Management
associated headache. Cephalalgia. 2007; 27(8):904–911. of chronic posttraumatic headache: a multidisciplinary
approach. J Am Osteopath Assoc. 2009; 109(9): 509-13.
66. Suwanwela N, Phanthumchinda K, Kaoropthum
S. Headache in brain tumor: A cross-sectional study. 85. Gunreben-Stempfle B, Griessinger N, Lang E,
Headache. 1994;34(7):435–438. Muehlhans B, Sittl R, Ulrich K. Effectiveness of an
intensive multidisciplinary headache treatment program.
67. Palmieri A, Valentinis L, Zanchin G. Update on
Headache. 2009;49(7):990-1000.
headache and brain tumor. Cephalalgia. 2020;0(0):1-7.
86. Kahle KT, Kulkarni AV, Limbrick DD Jr, Warf BC.
68. Boiardi A, Salmaggi A, Eoli M, Lamperti E, Silvani
Hydrocephalus in children. Lancet. 2016; 387(10020): 788-
A. Headache in brain tumours: a symptom to reappraise
799.
critically. Neurol Sci. 2004;25(S3):S143–S147.
87. Maldonado IL, Valery CA, Boch AL. Shunt dependence:
myths and facts. Acta Neurochir (Wien). 2010;152(9):1449-
54.
Capítulo 36 497
88. Beez T, Bellstädt L, Steiger HJ, Sarikaya-Seiwert S. 102. Chao ST, Thakkar VV, Barnett GH,et al. Prospective
Headache and Shunt-Related Impact on Activities of Daily study of the short-term adverse effects of Gamma Knife
Life in Patients Growing Up with a Ventriculoperitoneal radiosurgery. Technol Cancer Res Treat. 2012;11(2):117-
Shunt. J Neurol Surg A Cent Eur Neurosurg. 122.
2018;79(3):196-199.
103. Majhail NS, Chander S, Mehta VS, Julka PK, Ganesh
89. Rekate HL. Shunt-related headaches: the slit ventricle T, Rath GK. Factors influencing early complications
syndromes. Childs Nerv Syst. 2008;24(4):423-30. following Gamma Knife radiosurgery. A prospective study.
Stereotact Funct Neurosurg. 2001;76(1):36-46.
90. Schwedt TJ, Samples S, Rasmussen P, Stillman
M. New headache after endovascular or microsurgical 104. Vachhrajani S, Fawaz C, Mathieu D, et al.
treatment of intracranial aneurysm. Neurology. Complications of Gamma Knife surgery: an early report
2011;31(10):1082. from 2 Canadian centers. J Neurosurg. 2008;109:2-7.
91. Schwedt TJ, Gereau RW, Frey K, Kharasch ED. 105. Headache Classification Committee of the
Headache outcomes following treatment of unruptured International Headache Society (2013) The international
intracranial aneurysms: a prospective analysis. classification of headache disorders, 3rd edition (beta
Cephalalgia. 2011;31(10):1082-1089. version). Cephalalgia. 2013;33:629–808.
92. Qureshi AI, Suri MF, Kim SH, et al. Effect of 106. Buettner J, Wresch KP, Klose R. Postdural puncture
endovascular treatment on headaches in patients headache: comparison of 25-gauge Whitacre and Quincke
with unruptured intracranial aneurysms. Headache. needles. Reg Anesth. 1993;18(3):166-9.
2003;43(10):1090-6.
107. Pittoni G, Toffoletto F, Calcarella G, Zanette G,
93. Hwang G, Jeong EA, Sohn JH, et al. The Giron GP. Spinal anesthesia in outpatient knee surgery:
characteristics and risk factors of headache development 22-gauge versus 25-gauge Sprotte needle. Anesth Analg.
after the coil embolization of an unruptured aneurysm. 1995;81(1):73-79.
AJNR Am J Neuroradiol. 2012;33(9):1676-8.
108. Ferrante E, Trimboli M, Rubino F. Spontaneous
94. Park JH, Kim H, Kim SR, Park IS, Byeon MS, Kim YW. intracranial hypotension: review and expert opinion. Acta
Headache Outcomes After Coil Embolization in Patients Neurol Belg. 2020;120:9–18.
with Unruptured Intracranial Aneurysms: Do They Get
109. Chan SM, Chodakiewitz YG, Maya MM, Schievink
Better or Worse? A Prospective Analysis. World Neurosurg.
WI, Moser FG. Intracranial Hypotension and Cerebrospinal
2018;114:e191-e198.
Fluid Leak. Neuroimaging Clin N Am. 2019;29(2):213-226.
95. Takigawa T, Matsumaru Y, Nakai Y, Nakamura K,
110. Friedman DI, Liu GT, Digre KB. Revised diagnostic
Hayakawa M, Tsuruta W, Matsumura A. Bioactive coils
criteria for the pseudotumor cerebri syndrome in adults
cause headache and fever after endovascular treatment of
and children. Neurology. 2013;81(13):1159-65.
intracranial aneurysms. Headache. 2012;52(2):312-321.
111. Markey KA, Mollan SP, Jensen RH, Sinclair AJ.
96. Choi KS, Lee JH, Yi HJ, Chun HJ, Lee YJ, Kim DW.
Understanding idiopathic intracranial hypertension:
Incidence and risk factors of postoperative headache after
mechanisms, management, and future directions. Lancet
endovascular coil embolization of unruptured intracranial
Neurol. 2016;15(1):78-91.
aneurysms. Acta Neurochir (Wien). 2014;156(7):1281-7.
112. Boyter E. Idiopathic intracranial hypertension. JAAPA.
97. Baron EP, Moskowitz SI, Tepper SJ, Gupta R,
2019;32(5):30-35.
Novak E, Hussain MS, Stillman MJ. Headache following
intracranial neuroendovascular procedures. Headache. 113. Wall M. Update on Idiopathic Intracranial
2012;52(5):739-48. Hypertension. Neurol Clin. 2017;35(1):45-57.
98. Gweh D, Khan S, Pelletier L, Tariq N, Llinas RH, 114. Vieira DS, Masruha MR, Gonçalves AL, et al.
Caplan J, Marsh EB. The Post-Pipeline Headache: New Idiopathic intracranial hypertension with and without
Headaches Following Flow Diversion for Intracranial papilloedema in a consecutive series of patients with
Aneurysm. J Vasc Interv Neurol. 2020;11(1):34-39. chronic migraine. Cephalalgia. 2008;28(6):609-613.
99. Triplett D, Colon R, Springer K, Solomon GD. 115. Sinclair AJ, Kuruvath S, Sen D, Nightingale PG,
Treatment of headache following intra-arterial coiling Burdon MA, Flint G. Is cerebrospinal fluid shunting in
for cerebral aneurysm with indomethacin. Headache. idiopathic intracranial hypertension worthwhile? A 10-year
2015;55(5):696-7. review. Cephalalgia. 2011;31(16):1627-1633.
100. Rozen TD, Swanson JW. Post Gamma Knife 116. Rocha-Filho PA. Post-craniotomy headache: a clinical
headache: a new headache syndrome? Headache. view with a focus on the persistent form. Headache.
1997;37(3):180-183. 2015;55(5):733-8.
101. Togha M, Moghadasi AN, Haghighi S, Motamedi 117. Lutman B, Bloom J, Nussenblatt B, Romo V. A
M. Intractable headache with autonomic features after Contemporary Perspective on the Management of Post-
Gamma Knife radiosurgery: A case report. Iran J Neurol. Craniotomy Headache and Pain. Curr Pain Headache Rep.
2019;18(3):143-144. 2018;22(10):69.
Capítulo 36 498
118. Wang Y, Cheng W, Lian Y, et al. Characteristics and 124. Tai AX, Nayar VV. Update on Trigeminal Neuralgia.
relative factors of headache caused by cervicocerebral Curr Treat Options Neurol. 2019;21(9):42.
artery dissection. J Neurol. 2019;266(2):298-305.
125. Wu S, Lian Y, Zhang H, et al. Botulinum Toxin Type
119. Badhey A, Jategaonkar A, Anglin Kovacs AJ, et al. A for refractory trigeminal neuralgia in older patients:
Eagle syndrome: A comprehensive review. Clin Neurol a better therapeutic effect. Journal of Pain Research.
Neurosurg. 2017;159:34-38. 2019;12:2177–2186.
120. Colby CC, Del Gaudio JM. Stylohyoid complex 126. Swanson. Oper Neurosurg (Hagerstown).
syndrome: a new diagnostic classification. Arch 2019;17(2):S209-S228.
Otolaryngol Head Neck Surg. 2011;137(3):248-252.
127. Constanzo F, Silva RSD, de Almeida DB, et al.
121. Araya EI, Claudino RF, Chichorro J.Trigeminal Gamma Knife radiosurgery for trigeminal neuralgia: first
Neuralgia: Basic and Clinical Aspects. Scienc Pub. case series from Latin America. Arq Neuropsiquiatr.
2020;16:1–18. 2019;77(4):232-238.
122. Cruccu G. Trigeminal Neuralgia. Continuum (Minneap
Minn). 2017;23(2):396-420.
123. Gambeta E, Chichorro JG, Zamponi GW.
Trigeminal neuralgia: An overview from pathophysiology
to pharmacological treatments. Mol Pain.
2020;16:1744806920901890.
Capítulo 36 499
CAPÍTULO 37
EPILEPSIA
Segundo a Organização Mundial de Saúde, de início da crise. Outras crises, entretanto, podem não
cerca de 68 milhões de pessoas no mundo convivem ser reconhecidas por pacientes, seus familiares e até
com a epilepsia. A epilepsia é uma das quatro doenças mesmo por médicos, pois apresentam manifestações
neurológicas crônicas mais comuns, assim como sutis, como alteração discreta de comportamento, olhar
As crises epilépticas são definidas como crise tônico-clônica bilateral (antigamente chamada de
anormal excessiva ou sincrônica dos neurônios, na As crises focais podem ainda ser divididas em perda
ausência de fatores temporários e reversíveis como ou não da percepção do ambiente. A percepção é definida
insultos tóxicos, metabólicos ou febris . A epilepsia,
6
como o conhecimento de si mesmo e do ambiente e pode
assim, é a predisposição das células neuronais em estar preservada nas crises focais, por isso algumas
gerar crises epilépticas recorrentes e as consequências pessoas com epilepsia podem interagir, responder e até
neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais mesmo falar durante uma crise. Por outro lado, há crises
decorrentes delas. No entanto, a epilepsia não é uma em que a perda da percepção ocorre desde o começo
doença única, mas um grupo de doenças que possuem da crise, ou, pelo menos, há uma alteração na qualidade
diversas etiologias: estruturais, genéticas, infecciosas, de percepção, mantém a consciência preservada, pode
metabólicas, autoimunes ou desconhecidas . 7
ficar com dificuldade para responder comandos e não
conseguir se comunicar9. Assim, as crises podem ser
classificadas em perceptivas (antigamente chamadas de
Capítulo 37 500
simples na classificação de 1981) e em disperceptivas o início, por isso, não temos a subclassificação
(antigamente complexas). de perceptivas ou disperceptivas9. É importante
determinar o início da crise, se a crise começou
A seguir, deve-se pesquisar o tipo
com movimentos tônicos, mioclônicos ou clônicos
predominante da crise: se com movimentos início
e como foi a sua evolução. Crises generalizadas
motor ou não motor. Os de início motor, podem
tônico clônicas apresentam percepção alterada
ser automatismos, que são os movimentos que
antes dos movimentos de contração e abalos, as
acontecem repetidamente sem intervenção de uma
crises clônicas evoluem e terminam com abalos
vontade consciente. Podem ser atônicas, que são
rítmicos sustentados bilaterais; crises generalizadas
as crises em que se perde a força dos músculos
tônicas apresentam-se como contração bilateral
e há, geralmente, uma queda. Crises clônicas que
dos membros, por vezes, associados a rigidez
são movimentos repetitivos ritmados compostos de
cervical. Crises mioclônico-tônico-clônicas iniciam
contrações e relaxamentos de um grupo muscular,
com abalos e evoluem e estão presentes em
rápidos e involuntários. Os espasmos epilépticos são
pacientes com epilepsia mioclônica juvenil (EMJ).
como sustos, em que há uma mobilização maior de
Crises mioclono-atônica apresentam abalos de
um grupo muscular, súbito. As crises hipercinéticas
membros seguidos de queda por perda de tônus,
podem ser descritas como movimentos sem intenção
geralmente para trás. Crises de ausência ocorrem
de amplitude alta, envolvendo a parte proximal dos
com a parada súbita da atividade e da percepção
membros que podem parecer violentos. Crises
(como nas crises focais disperceptivas), mas seu
mioclônicas são crises breves, rápidas, não ritmadas,
início e final são mais abruptos e tendem a acometer
de um grupamento muscular. E as crises tônicas são
indivíduos mais jovens e podem ser acompanhadas
crises em que há contração sustentada de um ou
de automatismos. As crises de ausência atípicas
mais grupos musculares9.
têm início e términos mais graduais e podem levar a
As crises de início não motor podem ser mais dúvidas no diagnóstico, por vezes a distinção
classificadas como alterações sensitivas, como das crises focais disperceptivas só pode ser feita
formigamento em um membro ou outras sensações pelo exame de eletroencefalograma (EEG)10.
como gelado ou quente; autonômicas–tipo batimento
A classificação das crises (primeiro nível
cardíaco acelerado, respiração alterada, náuseas
da classificação) contribui para o entendimento
e vômitos; alterações cognitivas, como dificuldade
e classificação das epilepsias (segundo nível
para falar, para realizar uma atividade, deja vu
da classificação) e após isso, pode-se fazer um
(sensação de já ter vivenciado o episódio), jame
diagnóstico sindrômico específico (terceiro nível da
vu (sensação de estranhamento do ambiente ou
classificação). De acordo com a classificação das
situação) ou alucinações (ver coisas que não estão
crises, as epilepsias podem ser classificadas como:
no ambiente). Outro tipo de crise não motora são
a) focais; b) generalizadas; c) focais e generalizadas
as crises emocionais, que podem ser medo, alegria,
combinadas; e d) desconhecidas10.
ou crises com parada comportamental que são a
suspensão da resposta com o meio. As crises focais As epilepsias generalizadas devem ter
podem evoluir para a crise tônico clônica bilateral, crises generalizadas e descargas epileptiformes
que é a crise com perda de consciência e evolução generalizadas no EEG corroboram o diagnóstico, um
motora em todos os membros . 9
exemplo é a EMJ. As epilepsias focais incluem crises
unifocais ou multifocais, mas que envolvam somente
As crises generalizadas também podem
um hemisfério, sendo assim, pode acometer o lobo
ser classificadas em início motor e não motor
frontal, parietal, temporal ou occipital7,10. O EEG
(ausências), mas geralmente a percepção nas
mostra descargas epileptiformes focais localizadas
crises generalizadas não está preservada desde
Capítulo 37 501
Figura 1: Classificação dos tipos de crises da ILAE, 2017.
Fonte: Adaptado de Fisher et al., 20179.
Capítulo 37 502
na maioria das vezes, na área epileptogênica as aminoacidopatias, crises por dependência de
anatômica, exemplo de epilepsia focal é a epilepsia piridoxina ou as por deficiência de folato. Houve
de lobo temporal mesial (ELMT). As epilepsias focais grande crescimento no reconhecimento de epilepsias
e generalizadas combinadas apresentam crises imunes tanto em adultos como em crianças,
focais e generalizadas e o EEG pode revelar os dois caracterizadas por uma inflamação imunomediada
padrões de descargas, mas não é obrigatório para o no sistema nervoso central, tais como a encefalite
diagnóstico, exemplos são as síndromes de Dravet anti-receptor NMDA e a encefalite anti-LGI1.
e a de Lennox-Gastaut 10,12
. Existem ainda epilepsias em que as causas não são
conhecidas, pela dificuldade de acesso aos exames
A caracterização de uma síndrome epiléptica
diagnósticos ou pelo desconhecimento científico, e
específica pode ajudar no manejo terapêutico além
devem ser incluídas nesta categoria10,12.
de fornecer mais informações sobre evolução,
prognóstico e comorbidades. Durante todas estas
etapas, a etiologia, que pode ter implicações sobre o
tratamento, deve tentar ser obtida e pode necessitar DIAGNÓSTICO
de exames complementares . 10
O diagnóstico da epilepsia é clínico e, em
2014, Fischer et al.,6 propuseram uma definição
A etiologia da epilepsia de um paciente
operacional de epilepsia que ampliou os conceitos
pode ser classificada em mais de uma categoria
e definiu o diagnóstico de epilepsia em um dos três
etiológica, que não são hierárquicas e podem
seguintes: pelo menos duas crises não provocadas
coexistir. As etiologias estruturais podem ser
(ou duas crises reflexas) ocorrendo em um intervalo
adquiridas, genéticas ou ambas. As adquiridas são
superior a 24h; uma crise não provocada (ou uma crise
acidente vascular encefálico, trauma, encefalopatia
reflexa) e chance de ocorrência de uma nova crise
hipóxico-isquêmica, infecções, malformações do
estimada em pelo menos 60% ou o diagnóstico de
desenvolvimento cortical, a esclerose hipocampal, o
uma síndrome epiléptica. Isso autoriza o diagnóstico
hamartoma hipotalâmico, síndrome de Rasmussen
de epilepsia e o médico deve avaliar individualmente
e hemiconvulsão-hemiplegia-epilepsia, dentre
a introdução de fármacos anticrise.
outros. Quando uma etiologia estrutural tem uma
base genética bem estabelecida, como o complexo Os principais diagnósticos diferenciais são
da esclerose tuberosa, causada por mutações nos a síncope (especialmente a síncope convulsiva);
genes TSC1 e TSC2 que codificam a hamartina e a episódios isquêmicos transitórios; distúrbios do
tuberina, ambos os termos etiológicos, estrutural e movimento, como discinesias paroxísticas, tiques,
genética podem ser utilizados . 10
coreias; amnésia global transitória; vertigem;
enxaqueca; doenças psiquiátricas, como ansiedade,
As epilepsias na quais a etiologia genética está
crises de pânico, crises não epilépticas psicogênicas;
presente são muito diversas e, na maioria dos casos,
distúrbios de sono (narcolepsias, parassonias) e
os genes responsáveis ainda não são conhecidos.
quadros confusionais agudos8.
Exceções são a síndrome de Dravet, na qual mais
de 80% dos pacientes têm uma mutação do gene Os exames complementares, como visto
SCN1A. As causas de origem infecciosa, podem ser anteriormente, mais importantes para a avaliação do
secundárias a uma infecção aguda como meningite paciente com epilepsia é o EEG, vídeo EEG (VEEG),
ou encefalite, neurocisticercose, tuberculose, HIV, a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância
toxoplasmose e infecções congênitas como pelo magnética (RM). O EEG é um exame indolor, não
citomegalovírus 10,12
. invasivo, que pode ser feito ambulatorialmente, que
registra a atividade elétrica cerebral, tem o objetivo
As causas metabólicas se referem a
de captar descargas epileptiformes no período
distúrbios metabólicos como a porfiria, a uremia,
Capítulo 37 503
interictal (entre as crises)e, eventualmente, pode manejo adequado principalmente em pacientes com
captar descargas epileptiformes ictais (durante a exame neurológico anormal, história predisponente
crise). O exame tem duração de 20 min e o método ou início de crises focais. Nestes casos, o tratamento
padrão de colocação dos eletrodos, o Sistema imediato pode ser requerido, como hemorragias e
Internacional 10-20, amplamente utilizado na prática lesões com efeito de massa20. Pode ser feita também
clínica, é capaz de detectar, nas epilepsias em quando o exame de ressonância magnética é contra-
geral, aproximadamente 58% das espículas . Uma 13
indicado, como nas pessoas com marcapasso,
limitação do EEG é a baixa sensibilidade, Dantas implantes cocleares, clipes e próteses metálicas18,21.
et al., (2014)avaliaram o exame e encontraram
A RM de encéfalo tem alta sensibilidade
sensibilidade de 33,5% e especificidade de 90,9%
e especificidade para malformações corticais de
sem diferenças quanto à idade e ao gênero14. EEGs
desenvolvimento, incluindo displasia cortical focal
repetidos ou de longa duração podem aumentar a
(DCF) e esclerose mesial temporal, um grupo de
sensibilidade para 80 a 90%15.
lesões estruturais prevalentes associadas com risco
A probabilidade de capturar uma crise durante aumentado de resistência aos medicamentos22,
o exame de rotina de 20 min em paciente com uma sendo este um exame essencial para a avaliação
crise por semana é de 1%. Deste modo, o exame pré-cirúrgica23. Em 2019, a Força Tarefa de
de VEEG é o recurso tecnológico mais utilizado Neuroimagem da ILAE, propôs o HARNESS‐ MRI,
para avaliação do período ictal 16,17
. O VEEG é um um protocolo de ressonância magnética estrutural
exame de eletroencefalograma com a gravação central que compreende três aquisições: imagens
em vídeo co-registrado e pode durar várias horas, ponderadas em T1, T2 Fluid Attenuated Inversion
dias e semanas, a depender da suspeita médica. Recovery (FLAIR) e plano 2D coronal ponderada
Ele é importante para avaliação de pacientes nos em T2, todos em 3D de alta resolução. O protocolo
quais não se pode fazer o diagnóstico de epilepsia HARNESS-MRI é aplicável a adultos e crianças23.
ou descartá-lo somente pela anamnese. O VEEG é
Outros exames podem ajudar quando a
também necessário nas investigações de epilepsia
ressonância magnética tem resultado normal e não
refratária, tanto para cirurgia de epilepsia, quando
explica a origem das crises, como o PET neurológico
há a necessidade de identificar a região onde
e o SPECT. A tomografia por emissão de prótons
começam as crises, como também quando há
(PET) neurológico, é um exame funcional que avalia
suspeita de crises não epilépticas, principalmente
o metabolismo cerebral e pode ser feito no período
as psicogênicas18.
interictal. No preparo para este exame, é importante
Importante lembrar que atualmente o termo que nas 24h anteriores não tenha havido nenhuma
foco epileptiforme tem sido abandonado e substituído crise, para não confundir os resultados. O objetivo
por zona irritativa, que faz parte das cinco zonas que é identificar a área onde as crises se iniciam. A
constituem a zona epileptogênica. A rede neuronal tomografia por emissão de fóton único (SPETC),
é formada por: a zona irritativa, de início ictal, ao contrário do PET, precisa ser realizada o mais
sintomatogênica, lesional e de déficit funcional. A próximo do início de uma crise, portanto, geralmente
zona irritativa corresponde às descargas interictais, é realizada durante a internação do paciente na
pode estar colocalizada com a zona de início ictal ou Unidade de VEEG18.
ser extensa e atingir outras áreas19.
Na avaliação pré-cirúrgica, a identificação do
A TC de crânio é indicada para pacientes foco epileptiforme é o requisito mais importante e
que se apresentam na emergência com a primeira vários exames são utilizados com este fim: história
crise epiléptica, conforme as diretrizes da Academia clínica detalhada, EEG interictal e ictal, VEEG,
Americana de Neurologia (ANN), para orientar o avaliação neuropsicológica, a RM e, às vezes, PET
Capítulo 37 504
e/ou SPECT. Quando estes exames são insuficientes No entanto, as diretrizes atuais recomendam evitar
ou incongruentes, é necessário lançar mão de o ácido valpróico em mulheres com potencial para
outras modalidades de investigação como eletrodos engravidar sempre que possível, devido a maiores
invasivos intracranianos, eletrodos profundos ou riscos de teratogênese27.
strip/grid17.
Em estudo recente, Chen et al.28 (2018)
Exames de sangue são úteis para identificar acompanharam pacientes por 30 anos e encontraram
possíveis causas de crises epilépticas provocadas, ausência de crises em 1 ano de 63,7%, e destes,
também são realizados no acompanhamento para 86,8% estavam tomando um único FAC. Pacientes
avaliar possíveis efeitos colaterais das medicações, com epilepsia generalizada têm uma resposta melhor
o nível sérico das medicações fica restrito a pacientes do que os com epilepsia focal. A probabilidade de
grávidas e quando há suspeita de toxicidade . 18
ficar livre de crises diminui com cada regime de FAC
sem controle de crises. Embora um segundo regime
de FAC aumentasse em 11% os pacientes que
CONDUTA ficaram livres de crises, o benefício foi reduzido em
O tratamento da epilepsia é primeiramente mais da metade para o terceiro regime e, ao tentar
medicamentoso. A decisão de iniciar um tratamento um quarto FAC ou mais forneceu menos de 5% de
para epilepsia deve ser individualizado, levando- probabilidade adicional de não ter crises28.
se em conta o risco de recorrência, a idade, sexo,
A epilepsia farmacorresistente é definida
tipo de crise, as comorbidades e interações com
como a persistência de crises epilépticas apesar do
outros medicamentos em uso. A base do tratamento
uso de duas drogas bem toleradas e apropriadas,
são os fármacos anticrise (FAC), nomenclatura
em monoterapia ou associadas, nos últimos doze
mais adequada do que drogas antiepilépticas ou
meses ou um período três vezes maior que o
anticonvulsivantes, uma vez que os medicamentos
período sem crises prévio a intervenção29. Esta
suprimem as crises, mas não a doença24.
farmacorresistência causa impacto negativo na
O objetivo da terapia com FAC é garantir a qualidade de vida do paciente, que pode contribuir
melhor qualidade de vida possível, maximizando o para a perda da independência, isolamento social e
controle das crises e minimizando a toxicidade dos limitações laborais, contribuindo para a ocorrência
medicamentos, por isso deve-se sempre priorizar a de comorbidades psiquiátricas4. Portanto, estes
monoterapia, iniciando o medicamento com doses devem ser encaminhadas para um centro terciário
baixas e aumentando de maneira lenta até que se de epilepsia, para que possam ser avaliados para
atinja a menor dose suficiente para controle das procedimentos cirúrgicos, o que será descrito em
crises .
25
outro capítulo deste livro.
generalizadas e epilepsias não classificadas. A 3. Murray CJ, Vos T, Lozano R, et.al. Disability-adjusted life
years (DALYs) for 291 diseases and injuries in 21 regions,
superioridade do ácido valpróico foi mais pronunciada 1990-2010: a systematic analysis for the Global Burden of
no subgrupo com epilepsia genética generalizada. Disease Study 2010. Lancet. 2012;380(9859):2197-223.
Capítulo 37 505
Figura 3: Princípios gerais para o tratamento farmacológico das epilepsias.
Fonte: Adaptado de Perucca et al., 201824.
4. Tedrus GMAS, Fonseca LC, Carvalho RM. Epilepsy 10. Scheffer IE, Berkovic S, Capovilla G, et al. ILAE
and quality of life: socio-demographic and clinical classification of the epilepsies: position paper of the ILAE
aspects, and psychiatric co-morbidity. Arq Neuropsiquiatr. Commission for Classification and Terminology. Epilepsia.
2013;71(6):385-391. 2017;58(4):512-521.
5. Bell GS, Gaitatzis A, Johnson AL, Sander JW. Predictive 11. Téllez-Zenteno JF, Hernández-Ronquillo L. A review of
value of death certification in the case ascertainment of the epidemiology of temporal lobe epilepsy. Epilepsy Res
epilepsy. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2004;75(12):1756- Treat. 2012;2012:630853.
1758.
12. Yacubian EM, Pinto LF, Morita M e Mendes MFSG.
6. Fisher RS, Acevedo C, Arzimanoglou A, et al. ILAE official Classificação da ILAE das epilepsias: artigo da posição da
report: a practical clinical definition of epilepsy. Epilepsia. Comissão de Classificação e Terminologia da International
2014;55(4):475-482. League against Epilepsy. Comissão de Consenso da Liga
Brasileira de Epilepsia. Disponível em: https://www.ilae.org/
7. Guerreiro CAM, Guerreiro MM, Cendes F, Lopes-Cendes
files/ilaeGuideline/ClassificationEpilepsies-Scheffer2017-
I. Epilepsia. São Paulo: Lemos Editorial; 2002.
Brazil.pdf
8. Liga Brasileira de Epilepsia. Manual para o diagnóstico e
13. Sadler RM, Goodwin J. Multiple electrodes for detecting
tratamento das epilepsias. Rio de Janeiro: Thieme Revinter;
spikes in partial complex seizures. Can J Neurol Sci.
2021.
1989;16(3):326-329.
9. Fisher RS, Cross JH, French JA, et al. Operational
14. Dantas FG, de Melo ES, Cavalcanti AP, et al. EEG
classification of seizure types by the International
in epilepsy: sensibility and specificity. J Epilepsy Clin
League Against Epilepsy: Position Paper of the ILAE
Neurophysiol. 2014;20(2):116-118.
Commission for Classification and Terminology. Epilepsia.
2017;58(4):522-530. 15. Salinsky M, Kanter R, Dasheiff RM. Effectiveness of
multiple EEGs in supporting the diagnosis of epilepsy: an
Capítulo 37 506
operational curve. Epilepsia. 1987;28(4):331-334. A consensus report from the International League
Against Epilepsy Neuroimaging Task Force. Epilepsia.
16. Sundaram M, Sadler RM, Young GB, Pillay N. EEG
2019;60(6):1054-1068.
in epilepsy: current perspectives. Can J Neurol Sci.
1999;26(4):255-262. 24. Perucca P, Scheffer IE, Kiley M. The management
of epilepsy in children and adults. Med J Aust.
17. Javidan M. Electroencephalography in mesial
2018;208(5):226-233.
temporal lobe epilepsy: a review. Epilepsy Res Treat.
2012;2012:637430. 25. Raspall-Chaure M, Neville BG, Scott RC. The medical
management of the epilepsies in children: conceptual and
18. Engel J, Pedley TA. Epilepsy: a comprehensive
practical considerations. Lancet Neurol. 2008;7:57-69.
textbook. 2° ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins;
2008. 26. Marson AG, Al-Kharusi AM, Alwaidh M, et al. The
SANAD study of effectiveness of carbamazepine,
19. Bartolomei F, Chauvel P, Wendling F. Epileptogenicity
gabapentin, lamotrigine, oxcarbazepine, or topiramate for
of brain structures in human temporal lobe epilepsy:
treatment of partial epilepsy: an unblinded randomized
a quantified study from intracerebral EEG. Brain.
controlled trial. Lancet. 2007;369:1000-1015.
2008;131(7):1818-1830.
27. Marson AG, Al-Kharusi AM, Alwaidh M, et al. The
20. Harden CL, Huff JS, Schwartz TH. Reassessment:
SANAD study of effectiveness of valproate, lamotrigine,
neuroimaging in the emergency patient presenting
or topiramate for generalised and unclassifiable epilepsy:
with seizure (an evidence‐based review): report of the
an unblinded randomised controlled trial. Lancet.
Therapeutics and Technology Assessment Subcommittee
2007;369:1016-1026.
of the American Academy of Neurology. Neurology.
2007;69:1772–1780. 28. Chen Z, Brodie MJ, Liew D, Kwan P. Treatment
Outcomes in Patients With Newly Diagnosed Epilepsy
21. Middlebrooks EH, Ver Hoef L, Szaflarski JP.
Treated With Established and New Antiepileptic Drugs:
Neuroimaging in epilepsy. Curr Neurol Neurosci Rep.
A 30-Year Longitudinal Cohort Study. JAMA Neurol.
2017;17(4):32.
2018;75(3):279-286
22. Krumholz A, Wiebe S, Gronseth GS. Evidence‐based
29. Kwan P, Arzimanoglou A, Berg AT, et al. Definition of
guideline: management of an unprovoked first seizure in
drug resistant epilepsy: consensus proposal by the ad
adults: report of the Guideline Development Subcommittee
hoc Task Force of the ILAE Commission on Therapeutic
of the American Academy of Neurology and the American
Strategies. Epilepsia. 2010;51:1069–1077.
Epilepsy Society. Neurology. 2015;84:1705–1713.
23. Bernasconi A, Cendes F, Theodore WH, et al.
Recommendations for the use of structural magnetic
resonance imaging in the care of patients with epilepsy:
Capítulo 37 507
PARTE 9
DEMÊNCIA E DISTÚRBIOS COGNITIVOS
CAPÍTULO 38
DEMÊNCIAS
Figura 1: Definições do o continuum das alterações cognitivas no idoso. Em vermelho o “x” representa a ausência e em verde o “v”
representa a presença do item descrito.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 38 509
parkinsonismos, doença cerebrovascular, demência
DEFINIÇÃO: O CONTINUUM DAS
ALTERAÇÕES COGNITIVAS NO IDOSO frontotemporal (DFT), hidrocefalia de pressão
normal, traumatismos cranioencefálicos] podem
Declínio cognitivo subjetivo iniciar o quadro clínico com DCS. A maioria das
Por muito tempo existiu um pensamento clínico doenças neuropsiquiátricas (depressão, ansiedade,
equivocado em que pacientes que procuravam etc) e distúrbios do sono (apneia obstrutiva do
avaliação médica por percepção de alterações sono, insônia, alterações do ciclo sono-vigília, etc)
na memória não deveriam ter nenhum problema podem causar alterações cognitivas ou percepção
cognitivo e provavelmente estariam preocupados de declínio cognitivo. Padrões de personalidade
em excesso com o desempenho cognitivo. Esse e comportamento também podem influenciar a
pensamento era válido principalmente quando os percepção subjetiva em relação ao desempenho
pacientes compareciam sozinhos à consulta. No cognitivo. Sujeitos com padrões de neuroticismo,
entanto, estudos longitudinais demonstraram um traços somatoformes e medo excessivo de
risco aumentado de declínio cognitivo nos sujeitos demência podem apresentar mais frequentemente a
que tinham percepção subjetiva de redução do queixa de declínio cognitivo. Alterações endócrinas,
desempenho cognitivo (principalmente na memória), metabólicas e sistêmicas como hipotireoidismo,
podendo anteceder o diagnóstico de demência em diabetes, deficiências nutricionais (vitamina B12,
10 anos, em média2–4. É importante ressaltar que ácido fólico, tiamina, etc), doença renal crônica
a maioria dos sujeitos com percepção subjetiva de e insuficiência cardíaca também podem estar
declínio cognitivo não irão desenvolver demência, relacionados com o DCS. Além disso, causas
mas a possibilidade da percepção de declínio iatrogênicas, como medicações com efeito sedativo
cognitivo ser um sintoma inicial de alguma doença ou anticolinérgico, são frequentes na prática clínica.
neurodegenerativa (principalmente a doença de
Independentemente do diagnóstico etiológico,
Alzheimer – DA), fez com que recentemente uma
os sujeitos que apresentam DCS devem ser
definição fosse proposta para facilitar o estudo desta
orientados em relação a mudanças do estilo de vida e
condição2.
controle dos fatores de risco para declínio cognitivo,
Declínio cognitivo subjetivo (DCS) é uma com especial atenção para tratamento adequado
condição caracterizada por: 1) autopercepção da hipertensão arterial, diabetes e dislipidemia,
persistente de declínio na capacidade cognitiva, em tratamento de transtornos neuropsiquiátricos
comparação com o padrão prévio e habitual individual associados, redução da obesidade e do
(que deveria ser normal), usualmente sem relação sedentarismo, combate ao tabagismo, mudança
com nenhum evento agudo. A percepção externa da dieta com aproximação do estilo mediterrâneo
(pela família, pessoas próximas e/ou profissionais de alimentação, melhora da qualidade do sono,
de saúde) não é necessária para o diagnóstico; promoção de estimulação cognitiva e engajamento
e 2) desempenho normal na testagem cognitiva social e redução da privação sensorial, principalmente
de rastreio e/ou avaliação neuropsicológica, com déficits visuais e auditivos6,7. É fundamental corrigir
resultados ajustados para variáveis demográficas as causas potencialmente tratáveis de declínio
(idade, escolaridade, etc) . 5
cognitivo (por exemplo, reposição de vitamina B12
O diagnóstico diferencial do DCS é amplo em caso de deficiência, tratamento dos distúrbios de
e envolve desde o processo fisiológico de sono, etc) nos sujeitos com DCS. Até o momento
envelhecimento cerebral até fases iniciais de doenças que esse capítulo está sendo escrito, não existe
neurodegenerativas2. Doenças neurológicas que nenhuma medicação aprovada para o tratamento
classicamente causam alterações cognitivas [DA, do DCS. Dessa forma, a base do tratamento da
condição se baseia no tratamento de causas
Capítulo 38 510
reversíveis subjacentes e no manejo farmacológico em termos cognitivos quanto neuropatológicos11,12.
e não-farmacológico dos fatores de risco para A condição destaca-se entre os principais fatores
declínio cognitivo. de risco para a demência, com uma taxa de
conversão anual para demência entre 5% e 15%
Comprometimento cognitivo leve (em comparação com uma taxa de 1% em idosos
cognitivamente normais)8. É importante ressaltar
O comprometimento cognitivo leve (CCL)
que, apesar da forte associação com a DA, o
é uma condição heterogênea caracterizada por
diagnóstico de CCL não é sinônimo de DA ou outra
declínio cognitivo que não é suficientemente intenso
demência degenerativa na fase pré-demencial, uma
para causar prejuízo funcional, evidenciando,
vez que inúmeros estudos mostram reversão para
dessa maneira, o diagnóstico de demência8,9.
cognição normal ou estabilidade cognitiva em uma
Nessa condição pode existir autopercepção de
parcela dos sujeitos com CCL3,13,14. No entanto,
declínio cognitivo ou não. No caso de não haver
mesmo os sujeitos com CCL que revertem para
autopercepção de declínio, o sintoma pode ser
um desempenho cognitivo normal têm maior risco
referido por uma terceira pessoa (cônjuge, familiar
de evoluir para demência quando comparados com
ou profissional de saúde). O CCL difere do DCS
sujeitos que nunca tiveram declínio cognitivo15,16.
pela presença de alterações nos testes cognitivos
de rastreio ou na avaliação neuropsicológica (que O CCL pode ser dividido em formas
são normais no DCS). Normalmente a intensidade amnésticas (CCL A) e não-amnésticas (CCL
do declínio cognitivo é leve, porém, o parâmetro NA) 9,17
. Essa primeira divisão diz respeito ao
principal de diferencia o CCL da demência é a acometimento ou não do domínio da memória na
preservação das atividades funcionais . Apesar de
8
avaliação cognitiva. Classicamente o CCL A está
algumas atividades mais complexas (atividades mais relacionado ao diagnóstico de DA do que o
profissionais, planejamento financeiro, organização CCL NA. Porém, essa correlação não é ubíqua e
pessoal) poderem estar levemente comprometidas existe uma grande heterogeneidade clínica. O CCL
e/ou necessitarem de mais esforço mental ou NA estaria relacionado mais fortemente a outras
algumas adaptações, no CCL os sujeitos afetados doenças que não DA como doença cerebrovascular
conseguem viver de maneira independente ou não (principalmente a forma com isquemias subcorticais
apresentam nenhuma grande mudança em relação de doença dos pequenos vasos), doenças
à capacidade funcional prévia. Desta maneira, neuropsiquiátricas, condições metabólicas, etc.
é fundamental a caracterização de padrões A segunda divisão utilizada na caracterização do
cognitivos, comportamentais e funcionais prévios CCL é se existe apenas um ou mais de um domínio
(antes da doença) para facilitar a caracterização das cognitivo afetado. No caso de apenas um domínio
mudanças associadas ao envelhecimento. Muitas ser afetado, o CCL é caracterizado de “CCL único
vezes é necessário obter informações colaterais de domínio – CCL UD”. Quando mais de um domínio é
membros da família, amigos e de profissionais da afetado, a caracterização é “CCL múltiplos domínios
equipe de saúde. - CCL MD”. Assim, existem 4 possibilidades de
classificação: CCL A UD, CCL A MD, CCL NA UD
Parte dos sujeitos com CCL tem a DA em
e CCL NA MD. Normalmente a forma de múltiplos
uma fase pré-demencial, como causa subjacente
domínios é mais grave e mais próxima da síndrome
ao declínio cognitivo10. Porém, da mesma maneira
demencial no continuum de alterações cognitivas.
que o DCS, várias condições degenerativas ou
não, podem causar o declínio cognitivo. O CCL Recentemente critérios diagnósticos de
pode representar um estado de transição entre o CCL por DA foram publicados na literatura . Esse 10
Capítulo 38 511
imagem (ressonância magnética e imagem nuclear) 2. o diagnóstico de demência exige a
e no líquor (LCR). Biomarcadores podem demonstrar existência de declínio cognitivo, ou seja,
a deposição do peptídeo amiloide (dosagem uma piora em relação ao funcionamento
cognitivo prévio. Algumas vezes é
do peptídeo amiloide no LCR e PET-amiloide),
difícil caracterizar declínio cognitivo
deposição da proteína Tau (dosagem da proteína
principalmente em sujeitos com alguma
p-Tau no LCR e PET-Tau) e neurodegeneração alteração crônica da cognição, tais
(atrofia em algumas áreas específicas na ressonância como as alterações do desenvolvimento.
magnética, dosagem da proteína t-Tau no LCR e Nesse sentido, informações colaterais
hipometabolismo em regiões típicas da DA no PET- com familiares, amigos ou qualquer
FDG). Apesar de fundamental no campo da pesquisa, fonte disponível que ajude a caracterizar
um declínio nas funções cognitivas
a validade clínica da determinação etiológica por
são fundamentais para a correta
biomarcadores ainda não foi totalmente validada
caracterização da síndrome demencial.
na prática clínica e está além do escopo desse O mesmo raciocínio é válido para o nível
capítulo. Os próximos anos serã,o importantes na de funcionamento nas atividades diárias.
determinação de opções terapêuticas com drogas É importante ressaltar que nem sempre
potencialmente modificadoras de doença nos CCLs essas alterações cognitivas e funcionais
por DA. são percebidas pelo doente, visto que a
presença de anosognosia é comum e até
Da mesma maneira que no DCS,não existe mesmo um fator de risco para demência19;
nenhuma medicação aprovada para o tratamento
do CCL. Porém, a investigação diagnóstica ampla e 3. o diagnóstico de demência é caracterizado
por declínio em pelo menos dois domínios
tentativa de diagnóstico etiológico é importante para
cognitivos, mas não necessariamente
o tratamento de causas potencialmente reversíveis.
da memória. Classicamente, quando se
Semelhante ao DCS, as mesmas medidas não- pensa em demência, automaticamente
farmacológicas devem ser implementadas e a presença de amnésia (principalmente
enfatizadas como medidas de redução de risco para anterógrada- dificuldade de aprender
demência. novas informações) vem à mente.
Realmente a maior parte das demências
tem o declínio na memória como parte do
Demência
quadro, uma vez que a principal causa
Demência é definida como uma síndrome de demência, a DA, tipicamente afeta a
caracterizada por declínio em mais de 1 domínio memória de maneira desproporcional.
cognitivo, sendo suficientemente intenso para No entanto, o acometimento da memória
causar alteração da capacidade funcional (social, não é necessário nem suficiente para o
diagnóstico de demência. Domínios como
laboral, autocuidado, etc)18. Aqui alguns pontos são
linguagem, funções executivas, atenção
importantes:
complexa, funções perceptomotoras
e cognição social podem ser afetados
1. demência é um diagnóstico sindrômico
independentemente da memória. Um
e não etiológico. A definição clássica de
exemplo é a DFT, na qual as alterações
“síndrome” é um conjunto de sinais e
de linguagem, funções executivas e
sintomas que frequentemente aparecem
cognição social ultrapassam em muito o
em conjunto e que podem ter várias
acometimento da memória20;
possíveis etiologias. Desta maneira,
diagnósticos como “demência senil” ou
4. a definição de síndrome demencial não
simplesmente “demência” não deve ser
necessariamente exige início e piora
encarada como etiologia;
lentamente progressivos e/ou cronicidade.
Apesar da maior parte das demências
Capítulo 38 512
seguirem o curso descrito por serem
doenças neurodegenerativas, existem
quadros demenciais com possibilidade
de reversão (parcialmente, na maioria
das vezes, mas ocasionalmente completa
– genericamente denominadas de
demências potencialmente reversíveis),
início rápido (demências rapidamente
progressivas como as doenças priônicas
ou encefalites, por exemplo) e curso não
progressivo (alguns tipos de demências
vascular ou relacionadas a insultos Figura 2: Tríade das demências.
cerebrais não progressivos). Desta Fonte: Os autores, 2021.
maneira, o tempo de início e curso da # Nota: O termo “demência” foi substituído por “transtorno
doença não participam da definição da neurocognitivo maior” na quinta edição do Manual
síndrome demencial; e de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(conhecido como DSM V)23,24. Da mesma maneira, o
CCL foi denominado “transtorno neurocognitivo menor”.
5. apesar de não constar explicitamente A substituição foi motivada pela alta carga emocional
na definição de demência, alterações de negativa associada ao termo “demência” com a conotação
comportamento denominadas “alterações de “loucura” ou “insanidade”. Entretanto, neste capítulo
o termo clássico “demência” será usado com a ressalva
comportamentais e psicológicas em
de que a palavra deve ser usada sempre seguida da
demência” são muito frequentemente explicação técnica quando usada com familiares.
associadas às síndromes demenciais,
sendo parte integrante do conjunto de
sintomas presentes que reduzem a
qualidade de vida do paciente e da família Comprometimento comportamental leve
e contribuem para o declínio funcional Recentemente, o termo comprometimento
e aumento do estresse familiar21. As comportamental leve (CCoL) foi cunhado para
alterações comportamentais podem até definir alterações neuropsiquiátricas que começam
mesmo anteceder a fase demencial em
tardiamente (após os 50 anos de idade) e que
algumas condições neurodegenerativas,
podem representar sinais precoces de doenças
condição classificada como declínio
comportamental leve22. Sendo assim, neurodegenerativas25. Nessa condição existem
a avaliação e caracterização dessas sintomas neuropsiquiátricos que representam
alterações de comportamento devem fazer mudanças em relação ao padrão prévio e que
parte da rotina clínica nesses pacientes. impactam as relações pessoais, sociais ou
A tríade clássica das demências é: profissionais do paciente. As alterações de
alteração cognitiva associada à alteração
comportamento podem ser caracterizadas em
de comportamento causando declínio
diferentes classes (motivação, controle emocional,
funcional (Figura 2).
controle de impulsos, adequação social e percepção,
e conteúdo do pensamento). A definição de CCoL
não comporta a presença de demência, mas o CCL
pode ser uma morbidade associada à condição.
Capítulo 38 513
para CCL e demência. É importante ressaltar que cia, sendo que pontuações maiores que
os sintomas comportamentais do CCoL podem ser 25 são consideradas normais27. O MoCA
de difícil manejo e/ou refratários ao tratamento, e foi desenvolvido para tentar suprir as difi-
culdades descritas em relação ao MEEM,
frequentemente reduzem a qualidade de vida de
sendo mais sensível para detecção de al-
maneira clinicamente relevante.
terações nas funções executivas e lingua-
gem. Além disso, o MoCA é melhor para
Avaliação cognitiva e neuropsicológica
tentar diferenciar o padrão da alteração
nas demências
na memória, avaliando se existe ou não
Nos quadros demenciais, a avaliação benefício com dicas semânticas e/ou com
cognitiva pode ser didaticamente dividida em testes múltiplas escolhas após a recordação li-
de rastreio e avaliação neuropsicológica completa. vre.
Os testes de rastreio possibilitam uma verificação
• Addenbrooke’s cognitive examination-
breve da cognição, mas não são sensíveis para
-revised (ACE-R): escala utilizada para a
uma compreensão mais profunda, principalmente
detecção de declínio cognitivo em várias
nos quadros mais sutis e nos indivíduos de alta demências por avaliar múltiplos domínios
escolaridade. A vantagem dos testes de rastreio é a cognitivos. Avalia a orientação, atenção,
identificação de declínios cognitivos mais evidentes memória, fluência, linguagem e habilida-
de forma relativamente rápida e a possibilidade des visuoespaciais. Pode ser aplicada em
de aplicação durante a avaliação médica. Abaixo, pacientes mais jovens28, pois há dados
normativos para a população brasileira
algumas sugestões de instrumentos normatizados:
para indivíduos entre 50 e 93 anos de ida-
• Mini exame do estado mental (MEEM): de, de 4 a 24 anos de escolaridade29. Tan-
de fácil e rápida aplicação (em torno de to o MEEM, o MoCA como o ACE-R são
10 min). Avalia-se a orientação, atenção, testes de rastreio cognitivo e podem ser
memória, atenção, cálculos, linguagem e utilizados na prática clínica por médicos
habilidades visuoespaciais. Dados nor- envolvidos na avaliação de sujeitos com
mativos de indivíduos analfabetos até >11 declínio cognitivo.
anos de escolaridade26. Apesar de ser o
• Mattis dementia rating scale (MDRS): a
teste de rastreio cognitivo mais utilizado
escala Mattis é utilizada, normalmente,
na prática clínica, principalmente por não
por neuropsicólogos para detectar de-
especialistas em demências, o MEEM
mências desde as fases iniciais. Pode ser
apresenta uma baixa sensibilidade para
considerada uma escala de rastreio cog-
detecção de alterações nas funções exe-
nitivo mais profunda que os testes des-
cutivas e linguagem, o que faz necessá-
critos anteriormente. Avalia-se a atenção,
ria cautela na interpretação de resultados
iniciação e perseveração, construção,
“normais” em sujeitos com fases iniciais
conceituação e memória, com dados nor-
de declínio cognitivo, sujeitos com alta es-
mativos para os indivíduos ≥ 50 anos e
colaridade e /ou predomínio de disfunções
escolaridade de 0 a ≥13 anos30.
executivas e de linguagem.
Capítulo 38 514
auxiliando desta maneira no diagnóstico diferencial dificuldades para se expressar ou terem alterações
das diversas etiologias de demência (por exemplo, na compreensão. Dificuldade na condução de
processos degenerativos x transtorno de humor, veículos e deambular por locais conhecidos podem
DA x DFT), além de fornecer diretrizes para as indicar alterações nas funções perceptomotoras.
intervenções necessárias . 31
Na cognição social podem tomar decisões sem
considerar a segurança e adotar comportamentos
A ANP é composta por várias fontes
sociais pouco aceitáveis, demonstrando pouca
de informação, onde se realiza uma análise
sensibilidade.
quantitativa e qualitativa das alterações cognitivas
e comportamentais, além de avaliar o impacto das Sintomas depressivos são frequentes e podem
disfunções nas atividades de vida do paciente 32,33
. alterar o funcionamento cognitivo. Entretanto,
O impacto na funcionalidade é relevante quando quando os sintomas são tratados e revertidos, mas
se cogita um quadro demencial. A presença de um as alterações cognitivas persistem, é sinal de que
familiar na primeira consulta é de grande valia, pois um quadro degenerativo está presente28.
informará sobre o funcionamento prévio e atual do
paciente.
Avaliação das atividades funcionais e
Testes mais específicos apresentam maior instrumentais (AIVD)
sensibilidade para avaliação dos domínios cognitivos A avaliação da funcionalidade é fundamental
e a maioria deles é de uso restrito aos psicólogos. para clarificar o diagnóstico de demência36. As
A entrevista inicial e a observação clínica favorecem atividades instrumentais são aquelas atividades
o levantamento de hipóteses e a escolha de mais complexas e o grau de eficiência ou dificuldade
instrumentos técnicos padronizados e normatizados na execução dessas tarefas pode indicar o nível de
com base na idade, sexo e escolaridade34. autonomia do paciente, como por exemplo, o uso
de equipamentos de comunicação (telefone/celular,
O desempenho quantitativo de um indivíduo
computador), lembrar de compromissos, administrar
com demência habitualmente apresenta-se com
suas medicações, habilidade para lidar com dinheiro
dois desvios-padrão (-2DPs) abaixo do esperado
(pagamentos e compras), compreender e discutir
para a idade e escolaridade, o que representaria,
um assunto, dentre outras.
um percentil 3 ou menos35. Na ANP são avaliados o
quociente intelectual (QI) e as funções cognitivas da
memória, atenção, funções executivas, linguagem, Avaliação funcional por meio de
funções perceptomotora e cognição social.
informações do familiar
Questionário de atividades instrumentais de
Memória Pfeffer (FAQ): abrange questões sobre habilidade
Entre as queixas de memória podem ocorrer de preparar refeições, se manter em dia com
dificuldades em recordar uma lista de compras compromissos dentre outras37. Um ponto de corte
pode haver dificuldade em lidar com estímulos escala pode ser aplicada pelo médico para obter
Capítulo 38 515
atividades instrumentais complexas38. demências. Eles incluem distúrbios de humor,
apatia, agitação, agressividade, psicose, distúrbios
Activities of daily living questionnaire (ADLQ):
da regulação do impulso e do comportamento,
avalia atividades de autocuidado, interação,
distúrbios do sono e do comportamento alimentar
organização, planejamento, participação social,
(Tabela 2).
atividade intelectiva e alimentação. Possui boa
precisão para detectar declínio leve e acentuado Embora todos esses BPSD possam estar
nos casos de demência de Alzheimer . 39
presentes de maneira universal nas demências,
alguns tipos de demência estão mais associados com
alguns desses sintomas. Por exemplo, depressão é
Escala de avaliação instrumental por meio
da observação direta mais comum na demência vascular e alucinações
Nas situações em que o idoso reside sozinho são mais vistas na demência com corpos de Lewy
e não convive com alguém que possa trazer (DCL) do que na DA. Pacientes com DFT variante
Capítulo 38 516
Modalidade de exame Comentários
Hemograma, eletrólitos (sódio, potássio, cálcio), ureia, creatinina, TSH, T4 livre,
Sangue*
albumina, TGO, TGP, gama-GT, vitamina B12, sorologias para sífilis e HIV
Neuroimagem estrutural* Ressonância magnética (preferível) OU tomografia computadorizada de crânio
Considerar nos casos de: demência pré-senil (início antes dos 65 anos); suspeita de
hidrocefalia de pressão normal, apresentação ou curso clínico atípico; suspeita de
Exame do LCR doença inflamatória, infecciosa ou priônica do SNC.
Útil também para aumentar a confiabilidade diagnóstica in vivo da DA (níveis de
β-amiloide 1-42, tau e fosto-tau podem indicar “assinatura patológica” da DA).
F-FDG PET ou 99mTC-HMPAO SPECT.
18
Retraimento
Perda de interesse
Apatia
Desmotivação
Redução da iniciativa e do planejamento de ações
Resistência agressiva às tarefas
Agressão Agressão física
Agressão verbal
Depressão
Distúrbios de humor Mania/hipomania
Irritabilidade
Alucinações
Psicose
Delírios
Desinibição (comportamentos sociais e/ou sexuais inapropriados)
Desregulação do impulso e do
Sintomas obsessivos e compulsivos
comportamento
Estereotipias
Insônia
Transtornos de ritmo circadiano (por exemplo, avanço ou atraso de
Distúrbios do sono
fase, sono polifásico)
Sonolência excessiva
Hiperfagia ou inapetência
Mudanças de preferências alimentares
Distúrbios do comportamento alimentar
Hiperoralidade
Comer noturno
Perambulação sem objetivo
Agitação Inquietação psicomotora
Comportamentos repetitivos
Tabela 2: Lista de BPSD frequentes das demências.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 38 517
primeira escolha de tratamento. e DCL), pode haver benefício com tais medicações
para os sintomas psicóticos47.
Uma situação de exceção é quando o
BPSD conferir riscos ao paciente ou a terceiros46. O uso de antipsicóticos está associado
Nesses casos, o uso de psicofármacos pode ser ao aumento de eventos cerebrovasculares (por
imprescindível, ainda que não haja indicação exemplo, AVE, ataque isquêmico transitório e
formal em bula para nenhum BPSD em contexto síncope) e ao aumento de mortalidade por todas as
de demências. Por isso, o médico deverá sempre causas em idosos com demência48. Portanto, o uso
avaliar o risco atrelado aos BPSD. Por exemplo, dessas medicações deve ser restrito e criterioso. A
quando houver sintomas psicóticos que levem o Associação Americana de Psiquiatria recomenda o
paciente a ficar agitado e agressivo com o cuidador, seu uso para agitação, psicose e comportamentos
a possibilidade do uso de medicações antipsicóticas agressivos quando esses sintomas trouxerem
deverá ser discutida com os familiares, sopesando grande sofrimento ou riscos de lesão ao paciente ou
os riscos e benefícios; ou quando houver uma a terceiros49.
síndrome depressiva com perda de autocuidado ou
ideação suicida, o uso de antidepressivos poderá
ser benéfico. Depressão
Dito isso, a investigação de fatores A depressão pode ser uma causa reversível
precipitantes dos BPSD deverá ser feita sempre de de declínio cognitivo. Por outro lado, a depressão,
forma minuciosa (Figura 1) . É somente com essa
46
principalmente quando o primeiro episódio da vida é
investigação que estratégias de intervenção mais de início tardio (≥60 anos), está associada a declínio
direcionadas poderão ser instituídas. cognitivo subsequente50.
Capítulo 38 518
Figura 1: Fatores precipitantes dos BPSD associados ao paciente, ao cuidador e ao ambiente.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 38 519
Distúrbios do sono ansiedade, irritabilidade e desinibição, e essa
discriminação é importante para o manejo.
São decorrentes de atrofia de estruturas
implicadas no ciclo sono-vigília, como o núcleo O tratamento farmacológico deve ser
supraquiasmático e, em alguns tipos de demência, considerado apenas quando a remoção dos fatores
da redução da atividade colinérgica, também desencadeantes não tiver sido efetiva, quando o
fundamental para a fisiologia desse ciclo. comportamento é grave ou quando a agitação é
persistente.
Nenhum estudo de boa qualidade
metodológica demonstrou benefícios consistentes
com medicações sedativas. Benzodiazepínicos Tratamento não-farmacológico
e “drogas-Z” devem ser evitadas nos idosos por A abordagem não-farmacológica deve ser
aumentarem o risco de quedas, piora cognitiva e instituída para todos os pacientes com demência
delirium . A trazodona e a mirtazapina podem ser
56
apresentando BPSD.
alternativas mais seguras.
a) revisão da prescrição: considerar a
suspensão de medicações que possam estar
contribuindo para o BPSD (por exemplo, apatia
Apatia
e sonolência por antipsicóticos; agitação e
A apatia na DA parece estar relacionada hiperativação por antidepressivos; psicose por
à redução da neurotransmissão dopaminérgica. antiparkinsonianos);
Trata-se de uma síndrome que envolve redução de
b) anamnese e exame físico abrangentes:
motivação, interesse, iniciação de comportamentos
buscar por locais de dor, lesões de cavidade oral,
dirigidos por metas, além de perda da emoção
prótese dentária desajustada, sinais de agravos
espontânea ou da responsividade emocional57.
clínicos levando a delirium;
Pode estar presente em várias demências,
c) avaliação e modificações do ambiente
destacando-se a DFT-vc, DA e a demência vascular
subcortical. Nessas etiologias, a apatia tende a ser • ambientes muito estimulantes podem le-
um BPSD persistente, agregando grande prejuízo var à agitação psicomotora (por exemplo,
funcional e piora na qualidade de vida58. barulho, múltiplas conversas simultâneas
e, rotina com excesso de atividades), en-
quanto ambientes pouco estimulantes po-
dem contribuir com apatia e sonolência
Agitação excessiva; A intervenção com terapia ocu-
Agitação pode ser amplamente definida como pacional pode ser particularmente interes-
um comportamento motor excessivo ou agressão sante nesse contexto;
física ou verbal59. Ela sempre deve ser investigada de • quando há padrão de piora de agitação,
maneira cuidadosa, pois pode surgir em decorrência piora cognitiva e psicose ao entardecer
de múltiplos fatores: necessidades não atendidas (sundowning ou síndrome do entardecer):
do paciente (por exemplo, dor, temperatura 1) orientar adequação de luminosidade do
desconfortável), efeitos colaterais de medicações ambiente (isto é, exposição solar diurna,
com iluminação mais amena à noite), 2)
(por exemplo, acatisia por antipsicóticos), dor,
orientar medidas de higiene do sono e 3)
delirium hiperativo, etc60. Um tratamento bem-
estimular atividade física supervisionada
sucedido da agitação passará pela correção desses para ajuste de ciclo sono-vigília; e
fatores. Em alguns casos, a agitação também pode
ser decorrente de outros BPSD, como psicose, • identificar se há algum contexto em que os
Capítulo 38 520
BPSD tendem a ocorrer. Por exemplo, se de percepção do declínio cognitivo; 2) desempenho
o paciente oferece resistência e fica agita- cognitivo objetivo (testes de rastreio e/ou avaliação
do apenas para tomar banho, uma estra- neuropsicológica); e 3) desempenho funcional (como
tégia possível é reduzir a frequência dos
o sujeito desempenha as atividades na vida real),
banhos.
facilita o diagnóstico sindrômico e posteriormente o
d) as evidências para as seguintes estratégias etiológico. Alterações de comportamento chamadas
não-farmacológicas para redução de BPSD são de “sintomas comportamentais e psicológicos das
heterogêneas e nenhuma conclusão positiva demências” são componentes muito frequentes nas
ou negativa pode ser feita para esse grupo de síndromes que caracterizam o continuum cognitivo
intervenções em geral42: e devem sempre ser avaliadas em conjunto com a
cognição.
• terapia de reminiscência: técnicas para
auxiliar o paciente a evocar memórias au-
tobiográficas, permitindo-lhes a atribuição
de significados; REFERÊNCIAS
1. Prince M, Wimo A, Guerchet M, Gemma-Claire A, Wu
• terapia de validação: responder aos com- Y-T, Prina M. World Alzheimer Report 2015: The Global
portamentos do paciente com empatia, Impact of Dementia - An analysis of prevalence, incidence,
reconhecendo que tais comportamentos cost and trends. Alzheimer’s Dis Int. 2015.
podem decorrer de necessidades não 2. Jessen F, Amariglio RE, Buckley RF, et al. The
characterisation of subjective cognitive decline. Lancet
atendidas e que são difíceis de serem ver-
Neurol. 2020;19(3):271–278.
balizadas por conta da demência;
3. Mitchell AJ, Beaumont H, Ferguson D, Yadegarfar M,
Stubbs B. Risk of dementia and mild cognitive impairment
• terapia de presença simulada: uso de gra-
in older people with subjective memory complaints: meta-
vações de áudio ou vídeo com familiares analysis. Acta Psychiatr Scand. 2014;130(6):439-451.
em momentos de agitação do paciente
4. Verlinden VJA, van der Geest JN, de Bruijn RFAG,
com demência avançada; Hofman A, Koudstaal PJ, Ikram MA. Trajectories of decline
in cognition and daily functioning in preclinical dementia.
• atividades de estimulação sensorial: aro- Alzheimers Dement. 2016;12(2):144-153.
materapia, acupuntura, fototerapia e mu- 5. Jessen F, Amariglio RE, van Boxtel M, et al. A conceptual
sicoterapia; framework for research on subjective cognitive decline
in preclinical Alzheimer’s disease. Alzheimers Dement.
2014;10(6):844-852.
• intervenções cognitivas: treino cognitivo e,
reabilitação cognitiva; 6. Livingston G, Huntley J, Sommerlad A, et al. Dementia
prevention, intervention, and care: 2020 report of the Lancet
Commission. Lancet. 2020;396(10248):413-446.
• exercícios físicos; e
7. Montero-Odasso M, Ismail Z, Livingston G. One third
• terapia ocupacional. of dementia cases can be prevented within the next 25
years by tackling risk factors. The case “for” and “against.”
e) reavaliar se as intervenções propostas foram Alzheimer’s Research and Therapy. 2020;12(1):81.
efetivas e se houve consequências indesejadas com 8. Petersen RC. Mild Cognitive Impairment. Continuum
(Minneap Minn). 2016;22(2):404-418.
alguma delas.
9. Petersen RC, Caracciolo B, Brayne C, Gauthier S, Jelic
V, Fratiglioni L. Mild cognitive impairment: a concept in
evolution. J Intern Med. 2014;275(3):214-228.
Capítulo 38 521
11. Guillozet al, Weintraub S, Mash DC, Mesulam MM. 27. Cecato JF, Montiel JM, Bartholomeu D, Martinelli JE.
Neurofibrillary tangles, amyloid, and memory in aging and Poder preditivo do MoCa na avaliação neuropsicológica de
mild cognitive impairment. Arch Neurol. 2003;60(5):729-736. pacientes com diagnóstico de demência. Rev Bras Geriatr e
Gerontol. 2014;17(4):707–719.
12. Winblad B, Palmer K, Kivipelto M, et al. Mild cognitive
impairment--beyond controversies, towards a consensus: 28. Morris RG, Brookes RL. Neuropsychological
report of the International Working Group on Mild Cognitive Assessment of Older Adults. In: Parsons MW, Hammeke
Impairment. J Intern Med. 2004;256(3):240-246. TA, eds. Clinical Neuropsychology A Practical Guide to
Assessment and Management for Clinicians. 2° ed. Wiley;
13. Schroeter ML, Stein T, Maslowski N, Neumann J.
2013. p. 347–373.
Neural correlates of Alzheimer’s disease and mild cognitive
impairment: a systematic and quantitative meta-analysis 29. Amaral-Carvalho V, Caramelli P. Normative data for
involving 1351 patients. Neuroimage. 2009;47(4):1196- healthy middle-aged and elderly performance on the
1206. addenbrooke cognitive examination-revised. Cogn Behav
Neurol. 2012;25(2):72-76.
14. Mitchell AJ, Shiri-Feshki M. Rate of progression of
mild cognitive impairment to dementia--meta-analysis of 30. Foss MP, de Carvalho VA, Machado TH, et al. Mattis
41 robust inception cohort studies. Acta Psychiatr Scand. dementia rating scale (DRS) normative data for the brazilian
2009;119(4):252-265. middle-age and elderly populations. Dement Neuropsychol.
2013;7(4):374-379.
15. Roberts RO, Knopman DS, Mielke MM, et al. Higher
risk of progression to dementia in mild cognitive impairment 31. Zucchella C, Federico A, Martini A, Tinazzi M, Bartolo
cases who revert to normal. Neurology. 2014;82(4):317-325. M, Tamburin S. Neuropsychological testing. Pract Neurol.
2018;18(3):227–237.
16. Pandya SY, Clem MA, Silva LM, Woon FL. Does mild
cognitive impairment always lead to dementia? A review. J 32. Begali VL. Neuropsychology and the dementia
Neurol Sci. 2016;369:57-62. spectrum: Differential diagnosis, clinical management, and
forensic utility. Neuro Rehabilitation. 2020;46(2):181–194.
17. Petersen RC. Mild cognitive impairment. N Engl J Med.
2011;364:227-2234. 33. Ramos AA, Hamdan AC. Avaliação Neuropsicológica
na Doença Alzheimer e Demência Frontotemporal : critérios
18. Arvanitakis Z, Shah RC, Bennett DA. Diagnosis
nosológicos. Interação Psicol. 2014;18(3):391–397.
and Management of Dementia: Review. JAMA.
2019;322(16):1589-1599. 34. Barboza ENB e, Faria CDA, Alves HVD, et al. Perfis
neuropsicológicos do Comprometimento Cognitivo
19. de Ruijter NS, Schoonbrood AMG, van Twillert B,
Leve no envelhecimento (CCL). Neuropsicol Latinoam.
Hoff EI. Anosognosia in dementia: A review of current
2015;7(2):15–23.
assessment instruments. Alzheimers Dement (Amst).
2020;12(1):e12079. 35. American Psychiatric Association. Manual diagnóstico
de transtornos mentais: DSM-V-TR. American Psychiatric
20. Seeley WW. Behavioral Variant Frontotemporal
Association. 2014. p. 948.
Dementia. Continuum (Minneap Minn). 2019;25(1):76-100.
36. Fransen NL, Holz M, Pereira A, Fonseca RP, Kochhann
21. Bessey LJ, Walaszek A. Management of Behavioral and
R. Acurácia do desempenho funcional em idosos saudáveis,
Psychological Symptoms of Dementia. Curr Psychiatry Rep.
com comprometimento cognitivo leve e doença de
2019;21(8):66.
Alzheimer. Temas em Psicol. 2018;26(4):1907–1919.
22. Ismail Z, Smith EE, Geda Y, et al. Neuropsychiatric
37. Assis LO; Assis MG, Paula JJ, Malloy-Diniz LF. O
symptoms as early manifestations of emergent dementia:
questionário de atividades funcionais de Pfeffer: Revisão
Provisional diagnostic criteria for mild behavioral
Integrativa da literatura brasileira. Estud interdiscipl
impairment. Alzheimers Dement. 2016;12(2):195-202.
Envelhec. 2015;20(1):297–324.
23. American Psychiatric Association. American Psychiatric
38. Bahia VS, Carthery-Goulart MT, Novelli MM, et al.
Association, 2013. Diagnostic and statistical manual of
Functional disability in Alzheimer disease: A validation
mental disorders (5th ed.). American Journal of Psychiatry.
study of the Brazilian version of the disability assessment
2013.
for dementia (DAD-Br). Alzheimer Dis Assoc Disord.
24. Sachdev PS, Mohan A, Taylor L, Jeste DV. DSM-5 and 2010;24(3):291–295.
Mental Disorders in Older Individuals: An Overview. Harv
39. Medeiros M, Guerra R. Tradução, adaptação cultural
Rev Psychiatry. 2015;23(5):320-328.
e análise das propriedades psicométricas do Activities of
25. Ismail Z, Smith EE, Geda Y, et al. Neuropsychiatric Daily Living Questionnaire (ADLQ) para avaliação funcional
symptoms as early manifestations of emergent dementia: de pacientes com a doença de Alzheimer. Brazilian J Phys
Provisional diagnostic criteria for mild behavioral Ther. 2009;13(3):257–266.
impairment. Alzheimers Dement. 2016;12(2):195-202.
40. Pereira FS, Oliveira AM, Diniz BS, Forlenza OV,
26. Brucki SM, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PH, Yassuda MS. Cross-cultural adaptation, reliability and
Okamoto IH. Sugestões para o uso do mini-exame do validity of the DAFS-R in a sample of Brazilian older adults.
estado mental no Brasil [Suggestions for utilization of the Arch Clin Neuropsychol. 2010;25(4):335–343.
mini-mental state examination in Brazil]. Arq Neuropsiquiatr.
2003;61(3B):777-781.
Capítulo 38 522
41. Caramelli P, Teixeira LA, Buchpiguel CA, et al. Diagnosis 53. Siarkos KT, Katirtzoglou EA, Politis AM. A review of
of Alzheimer’s disease in Brazil: Supplementary exams. pharmacological treatments for depression in Alzheimer’s
Dement Neuropsychol. 2011;5(3):167–177. disease. Journal of Alzheimer’s Disease. 2015. p. 15–34.
42. Kales HC, Gitlin LN, Lyketsos CG. Assessment and 54. Sepehry AA, Lee PE, Hsiung GYR, Beattie BL, Jacova
management of behavioral and psychological symptoms of C. Effect of selective serotonin reuptake inhibitors in
dementia. BMJ. 2015;350:h369. Alzheimer’s disease with Comorbid depression: A meta-
analysis of depression and cognitive outcomes. Drugs and
43. van der Linde RM, Dening T, Stephan BC, Prina AM,
Aging. 2012;29(10):793–806.
Evans E, Brayne C. Longitudinal course of behavioural and
psychological symptoms of dementia: systematic review. Br 55. Orgeta V, Tabet N, Nilforooshan R, Howard R. Efficacy
J Psychiatry. 2016;209(5):366-377. of Antidepressants for Depression in Alzheimer’s Disease:
Systematic Review and Meta-Analysis. J Alzheimer’s Dis.
44. Geda YE, Roberts RO, Mielke MM, et al. Baseline
2017;58(3):725–733.
neuropsychiatric symptoms and the risk of incident mild
cognitive impairment: a population-based study. Am J 56. Phan SV, Osae S, Morgan JC, Inyang M, Fagan SC.
Psychiatry. 2014;171(5):572-581. Neuropsychiatric Symptoms in Dementia: Considerations for
Pharmacotherapy in the USA. Drugs in R and D. Springer
45. Rosenberg PB, Mielke MM, Appleby BS, Oh ES, Geda
International Publishing. 2019. p. 93–115.
YE, Lyketsos CG. The association of neuropsychiatric
symptoms in MCI with incident dementia and Alzheimer 57. Harrison F, Aerts L, Brodaty H. Apathy in Dementia:
disease. Am J Geriatr psychiatry Off J Am Assoc Geriatr Systematic Review of Recent Evidence on Pharmacological
Psychiatry. 2013;21(7):685–695. Treatments. Curr Psychiatry Rep. 2016;18(11)103.
46. Gerlach LB, Kales HC. Managing Behavioral and 58. Ford AH. Neuropsychiatric aspects of dementia.
Psychological Symptoms of Dementia. Psychiatric Clinics of Maturitas. 2014;79(2):209–215.
North America. WB. Saunders; 2018. p. 127–139.
59. Cummings J, Mintzer J, Brodaty H, et al. Agitation
47. Cummings JL, McRae T, Zhang R. Effects of donepezil in cognitive disorders: International Psychogeriatric
on neuropsychiatric symptoms in patients with dementia Association provisional consensus clinical and research
and severe behavioral disorders. Am J Geriatr Psychiatry. definition. Int Psychogeriatrics. 2015;27(1):7–17.
2006;14(7):605–612.
60. Gallagher D, Fischer CE, Iaboni A. Neuropsychiatric
48. Rubino A, Sanon M, Ganz ML, et al. Association of Symptoms in Mild Cognitive Impairment: An Update on
the US Food and Drug Administration Antipsychotic Drug Prevalence, Mechanisms, and Clinical Significance.
Boxed Warning With Medication Use and Health Outcomes Canadian Journal of Psychiatry. SAGE Publications Inc.
in Elderly Patients With Dementia. JAMA Netw open. 2017. p. 161–169.
2020;3(4):e203630.
61. Rosenberg PB, Lanctôt KL, Drye LT, et al. Safety and
49. Reus VI, Fochtmann LJ, Eyler AE, et al. The American efficacy of methylphenidate for apathy in Alzheimer’s
psychiatric association practice guideline on the use of Disease: A randomized, placebo-controlled trial. J Clin
antipsychotics to treat agitation or psychosis in patients with Psychiatry. 2013;74(8):810–816.
dementia. Am J Psychiatry. 2016;173(5):543–546.
62. Herrmann N. Galantamine Treatment of Problematic
50. Gallagher D, Mhaolain AN, Greene E, et al. Late life Behavior in Alzheimer Disease: Post-Hoc Analysis of Pooled
depression: A comparison of risk factors and symptoms Data From Three Large Trials. Am J Geriatr Psychiatry.
according to age of onset in community dwelling older 2005;13(6):527–534.
adults. Int J Geriatr Psychiatry. 2010;25(10):981–987.
63. Rothenberg KG, Rajaram R. Advances in Management
51. Alexopoulos GS. Mechanisms and treatment of late-life of Psychosis in Neurodegenerative Diseases. Curr Treat
depression. Transl Psychiatry. 2019;9(1)188. Options Neurol. 2019;21(1):3.
52. Nelson JC, Devanand DP. A systematic review and
meta-analysis of placebo-controlled antidepressant studies
in people with depression and dementia. J Am Geriatr Soc.
2011;59(4):577–585.
Capítulo 38 523
CAPÍTULO 39
DOENÇA DE ALZHEIMER
Renato Anghinah
EPIDEMIOLOGIA
Os estudos epidemiológicos sobre as demências
INTRODUÇÃO foram desenvolvidos em países de alta renda, mas nos
Descrita primeiramente por Alois Alzheimer em países de média e baixa renda essa estatística ainda é
1906, a doença de Alzheimer (DA) era inicialmente pouco conhecida. Estima-se que estes números variem
mesma fisiopatologia descrita estava presente na maioria A incidência e a prevalência da DA estão conectadas
das demências senis, a partir de então, entendeu-se que com os números das demais causas de demência2.
a DA é uma doença neurodegenerativa muito comum e Embora a DA seja a causa mais comum, com o avançar
relacionada com a idade1. da idade, a causa multifatorial também aumenta. Em um
A DA é secundária a depósitos de placas estudo neuropatológico com 184 pacientes, apenas 31%
A maioria dos casos de DA é esporádica e vida, embora provar esta relação de causa e efeito esteja
A partir da evolução do conhecimento clínico da acordo com a idade. Em uma metanálise de 34 estudos,
doença e auxiliado por exames complementares, os realizados em países de alta renda, a prevalência de CCL
critérios diagnósticos sofreram modificações ao longo foi de 6,7% entre indivíduos entre 60 a 64 anos e 25,2%
dos anos e, atualmente apresentam-se com alta acurácia. naquele com idade entre 80 a 84 anos5.
Capítulo 39 524
Dentre os fatores de riscos, a idade mostra
ser o mais importante2. As mulheres representam
2/3 da população mundial com DA, provavelmente DOENÇA DE ALZHEIMER TÍPICA
em consequência à maior mortalidade masculina por O sintoma inicial costuma ser o de perda
variadas causas acima dos 45 anos . No entanto, em
1
de memória, caracterizado por um acometimento
muitos estudos, a prevalência de demência é maior mais proeminente da memória episódica, que
em mulheres, em outros não há diferença entre os se manifesta como uma dificuldade em codificar,
sexos .
2
armazenar e evocar fatos recentes, com um discurso
Estão associados a risco aumentado de mais repetitivo e relativa preservação da lembrança
demência ao longo da vida portadores de doenças dos eventos antigos e memória autobiográfica. Isso
metabólicas (diabetes mellitus, hipertensão, ocorre pelo envolvimento precoce das estruturas
obesidade e baixos níveis de colesterol HDL), de dos lobos temporais mediais (hipocampos e córtex
deficiência auditiva, de lesão cerebral traumática entorrinal, os quais formam o circuito de Papez)1.
e de abuso de álcool. Com o passar da idade, O acometimento das regiões parietais e cíngulo
o tabagismo, a depressão, o sedentarismo, o posterior também ocorre em estágios mais iniciais e
isolamento social e a poluição do ar também se se reflete em disfunção de funções visuoespaciais,
somam à maior chance de desenvolver demência2. que se manifesta como desorientação topográfica
Estudos variados mostram que a sobrevida (dificuldade de navegar por caminhos previamente
pode variar de 4 a 8 anos, sofrendo influência conhecidos). A dificuldade em lembrar onde
da idade do diagnóstico, sexo, características guardaram objetos pessoais pode refletir um déficit
psicológicas, comorbidades e envolvimento motor. de memória visual7.
Em pacientes saudáveis, a sobrevivência pode A relativa preservação de estruturas e circuitos
ser de 15 a 20 anos , o que resulta em impacto
1
frontais e subcorticais é o motivo pelo qual o
socioeconômico expressivo. acometimento de outros domínios cognitivos, como
funções executivas, linguagem, praxias e funções
visuoperceptivas ocorre em menor proporção,
QUADRO CLÍNICO ficando mais evidente nas fases moderadas a
DA é uma patologia neurodegenerativa avançadas da patologia8.
caracterizada por um declínio cognitivo lento e
Crises convulsivas9, distúrbios do sono6,
gradual, associado a perda funcional.
sinais piramidais e extrapiramidais11 podem ocorrer,
O quadro clínico da doença varia de acordo geralmente em menor intensidade e em fases mais
com a idade de início dos sintomas. Definimos DA tardias.
senil quando os sintomas se iniciam após os 65
Sintomas neuropsiquiátricos são muito
anos, e DA pré-senil quando os sintomas se iniciam
prevalentes durante o curso clínico da DA, ocorrendo
antes dos 65 anos. Geralmente, as apresentações
em até 90% dos pacientes. São mais comuns e
clínicas típicas são mais comuns nas formas senis,
proeminentes em fases moderadas a avançadas da
enquanto as apresentações atípicas são mais
doença12,13.
comuns nas pré-senis .
6
Capítulo 39 525
como disfunção executiva, visuoespacial e e repetição comprometida19.
comprometimento de linguagem14.
Variante frontal / disexecutiva:
Essas variantes ocorrem com maior frequência
nas doenças de início precoce (até 1/3 das DA pré- A variante frontal da DA é caracterizada por um
senis), sendo associadas com maior erro e atraso maior comprometimento dos lobos frontais, mesmo
diagnóstico, além de progressão clínica mais em fases precoces, com prejuízo em testes de
rápida6,14. funções executivas e sintomas comportamentais, de
maneira desproporcional ao grau de acometimento
da memória episódica20-22.
Atrofia cortical posterior (ACP)
O principal diagnóstico diferencial é com a
A ACP é uma variante atípica da doença
demência frontotemporal variante comportamental
de Alzheimer, rara, caracterizada por um início
(DFTvc), porém o início dos sintomas em idades
dos sintomas em idade pré-senil e acometimento
mais avançadas (semelhante às formas típicas
predominante das vias occipitoparietais e
de DA), menor grau de compulsão alimentar e
occipitotemporais, que se manifestam como
comprometimento concomitante da memória
comprometimento das funções visuoespaciais e
episódica ajudam a diferenciar, sendo mais comuns
visuoperceptivas15.
nas variantes frontais da DA21.
Clinicamente, esses pacientes se queixam
de dificuldade de leitura, identificação de objetos Exames complementares
estáticos, julgar distâncias, sensibilidade à luz,
Os exames complementares auxiliam no
discalculia e apraxia16.
diagnóstico de DA e na exclusão de outras patologias.
Em alguns casos, podem se apresentar
com os componentes da síndrome de Balint
(simultaneoagnosia, apraxia oculomotor e ataxia Ressonância magnética (RM)
óptica) ou Gerstmann (acalculia, agrafia, agnosia
A RM deve ser solicitada preferencialmente
digital, desorientação direita e esquerda).
na avaliação de todo paciente com suspeita de DA.
Ocorre uma relativa preservação da memória Sua principal função é excluir achados que sugiram
semântica e anterógrada, o que ajuda a diferenciar outros diagnósticos diferenciais, como demência
da forma clássica. vascular e hidrocefalia de pressão normal23.
Capítulo 39 526
DA Típica ACP APP logopênica DA frontal
Idade de início > 65 anos < 65 anos < 65 anos > 65 anos
Desinibição +
comprometimento
Afasia + fenômeno
Déficit memória de funções
Quadro clínico Sintomas visuoespaciais de “word finding” +
episódica executivas
repetição comprometida
proeminente e
precoce
RM com redução
do volume de RM e PET-FDG com
PET-FDG com
hipocampos. PET-FDG com atrofia/hipometabolismo
Exames hipometabolismo
PET-FDG com hipotabolismo temporal posterior
complementares frontal bilateral
hipometabolismo parietooccipital bilateral e parietal inferior
importante
temporoparietal esquerdo
bilateral
Dúvida diagnóstica
Evolução lenta com DFTvc.
Queixas “visuais”
e gradual. Acometimento de Início mais tardio
predominam. Pacientes
Acometimento de linguagem proeminente. e acometimento
Dicas podem procurar
outros domínios Evolução para quadro concomitante de
Oftalmologista
cognitivos menos amnéstico após anos memória episódica
inicialmente
frequente favorecem DA
frontal
Tabela 1: Doença de Alzheimer: idade, quadro clínico e exames complementares.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 1: RM encéfalo evidenciando atrofia dos hipocampos e estruturas dos lobos temporais mesiais bilateralmente,
mais evidente à esquerda.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 39 527
como hipocampos, lobos parietais mesiais (pré- seu alto custo e baixa disponibilidade clínica,
cuneus) e transição temporoparietal (Figuras 2 e especialmente no Brasil, onde o PET-amiloide
3) .27
é disponível em apenas alguns poucos centros,
enquanto o PET-Tau ainda não é encontrado no
A maior aplicação do PET-FDG é em
país.
diferenciar DFT de apresentações atípicas de DA,
além de ajudar a diferenciar de nosologias não-
neurodegenerativas 28. Também é útil em identificar,
entre os indivíduos com sintomas cognitivos leves,
Biomarcadores no plasma e líquido
cefalorraquidiano (LCR)
aqueles com maior chance de progressão para DA
nos anos seguintes29. Até o momento, existem três principais
biomarcadores no LCR disponíveis para uso clínico,
dentre eles: Aβ42 (ou relação Aβ42/Aβ40), tau-total
cognitivo leve (CCL) possuem maior chance de correlacionam bem com os níveis no LCR, porém
conversão para DA nos anos seguintes32, 33. a relação Aβ42/Aβ40 sim, podendo ser útil na
avaliação desses pacientes38. Por outro lado, os
PET-Tau, por outro lado, utiliza radiotraçadores
níveis plasmáticos de p-tau (p-tau181 e p-tau217)
específicos para detecção do acúmulo da proteína
parecem se correlacionar com a maior chance de
tau 3R/4R na forma de emaranhados neurofibrilares,
indivíduos cognitivamente normais de evoluir para
outra marca neuropatológica da DA34.
declínio cognitivo39 e boa acurácia na identificação
Até o momento, apenas um radiotraçador é da patologia DA40. Alguns estudos sugerem que a
disponível para uso, atuando como um marcador de p-tau217 pode estar presente em níveis elevados no
neurodegeneração melhor que o PET-amiloide na plasma até décadas antes dos sintomas cognitivos
DA , sendo menos útil em outras taupatias
35 34,36
. em pacientes com DA40.
Capítulo 39 528
Figuras 2: PET-FDG evidenciando hipometabolismo extenso e predominando no córtex de associação temporoparietal
bilateral, pré-cúneus e cíngulos posteriores, com extensão para regiões pré-frontais, sugerindo DA em fase avançada.
Fonte: Dr. Artur Martins N. Coutinho, Centro de Medicina Nuclear do Instituto de Radiologia do HC-FMUSP.
Figuras 4 e 5: PET-amiloide (traçador 11C-PIB) positivo, evidenciando deposição de placas de proteína β-amiloide
difusamente no córtex cerebral, poupando o cerebelo e em parte o lobo occipital, com concentração também na
substância branca (perda da diferenciação).
Fonte: Dr. Artur Martins N. Coutinho, Centro de Medicina Nuclear do Instituto de Radiologia do HC-FMUSP.
Capítulo 39 529
Figuras 6 e 7: PET-amiloide (traçador 11C-PIB) negativo, sem evidência de deposição de placas de proteína β-amiloide
no córtex cerebral, com concentração do radio-fármaco restrita aos tratos de substância branca (corpo caloso e tronco
cerebral), graças à sua afinidade por mielina.
Fonte: Dr. Artur Martins N. Coutinho, Centro de Medicina Nuclear do Instituto de Radiologia do HC-FMUSP.
Capítulo 39 530
centemente, sendo os principais SORL1, anteriormente), além da possibilidade da avaliação de
ABCA7 e TREM2. Muitas vezes, pode-se painéis genéticos em casos suspeitos que permitiram
calcular um “escore de risco poligênico” maior assertividade e até confirmação diagnóstica in
com avaliação completa do sequencia-
vivo. Atualmente, dispomos de critérios diagnósticos
mento genético do indivíduo42; e
clínicos de alta acurácia para o diagnóstico da DA. O
• genes protetivos : sua presença reduz o
43 principal utilizado na prática clínica é o do National
risco do desenvolvimento da DA, sendo Institute of Aging (NIA), publicado em 201147.
o principal APOE ε2, que reduz em cer- Basicamente, envolve o diagnóstico de demência,
ca de 2 vezes o risco do desenvolvimen- com característica de evolução gradual ao longo
to de DA. Outras descobertas recentes
de meses ou anos, acometimento tipicamente de
são: mutação Ala673Thr, no gene da APP;
memória mais outra função cognitiva (admite-se
Pro522Arg, no gene PLCG2; e a mutação
em homozigose do Christchurch, no alelo a possibilidade de variantes de evolução atípica,
APOE ε342. descritas anteriormente no capítulo) e exclusão de
outros diagnósticos neurológicos. Atualmente, é
Ao atender um paciente com possível
admitida a possibilidade da evolução rapidamente
doença neurodegenerativa, é imperativo acessar a
progressiva da DA. Entretanto, trata-se de
história familiar de casos semelhantes e sua idade
achado incomum e deve-se excluir outras causas,
de início, principalmente parentes de primeiro
principalmente doenças priônicas e auto-imunes
grau e, se possível, construir um heredograma de
(encefalites) nesse contexto48.
no mínimo três gerações. Em relação à análise
genética, a testagem do polimorfismo da APOE Em terminologia de pesquisa e estudos
não é recomendada na prática clínica45, tendo científicos, o critério ATN, publicado em 201849, valida
em vista que 75% dos portadores de um alelo da e realça o uso dos biomarcadores. O significado do
APOE ε4 não desenvolvem DA e 50% dos pacientes acrônimo: “A” refere-se à patologia amiloide, “T” a
com DA não têm o alelo APOE ε4. A solicitação patologia tau e “N” determina neurodegeneração,
do teste genético, em casos com herança familiar cada um deles poderá ser presente (+) ou ausente
determinada e de início precoce deverá ser discutida (-), possibilitando diversos tipos de combinações
com os familiares e eventualmente ser realizada e diagnósticos distintos. Atualmente é utilizada
através dos painéis genéticos ou sequenciamento principalmente nos trabalhos com ênfase na
do exoma, tendo-se em vista que sempre deverá terapêutica da doença, como os anticorpos
ser acompanhado de aconselhamento genético por monoclonais contra o β-amiloide e tau, com intuito
profissional habilitado41. de maior acurácia e possibilidade do diagnóstico
na fase pregressa à demência (prodrômica),
como DCS e CCL. Em aspectos de amplo uso
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS prático e clínico, sua obrigatoriedade atualmente
década de 70, o termo “DA provável” foi cunhado e subdesenvolvidos ao adotar essa estratégia
amnésticos de evolução progressiva46. Nesse séricos de alta acurácia é o foco atual em relação à
ínterim, surgiram exames complementares com pesquisa em diagnóstico da DA, com detecção do
avaliação de neuroimagem de alta definição, com β-amiloide e proteína tau no soro e possibilidade de
através do PET-CT para amiloide e tau (descritos invasiva nos próximos anos50,51.
Capítulo 39 531
A formulação da rivastigmina transdérmi-
PREVENÇÃO E TRATAMENTO
ca (Exelon Patch®) possui a mesma efi-
O tratamento atual da DA baseia-se em quatro cácia terapêutica, ficando reservada prin-
vertentes: cipalmente aos casos com intolerância
da medicação por via oral ou sua prefe-
• estratégia preventiva e não farmacológica: rência de via por facilidade em aplicação.
compreende modificação do estilo de vida Deve-se estar atento aos pacientes com
(incentivo a atividade física, interrupção de bradicardia, polifarmácia e alteração da
tabagismo, alimentação saudável – com condução cardíaca (bloqueio atrioventri-
elementos da dieta do mediterrâneo e que cular de segundo e terceiro grau). Caso
previnam doenças cardio e cerebrovas- necessário, realizar ECG antes da introdu-
culares44, evitar sobrepeso e obesidade), ção e após ajuste da dose, que deverá ser
controle de comorbidades, especialmen- feito normalmente após quatro semanas,
te HAS e DM, tratamento adequado do se bem tolerado. Em casos de dúvidas,
transtorno depressivo e outros sintomas é recomendada avaliação cardiológica
psiquiátricos, atenção e cuidado com bai- especializada. Em relação à memantina,
xa acuidade visual, hipoacusia e manu- a indicação é reservada para os quadros
tenção de atividades sociais e intelectuais moderados e graves da DA, com introdu-
no idoso. A alta escolaridade no início da ção paulatina e em geral apresenta boa
vida age como fator protetor, enquanto o tolerância. Os efeitos adversos mais co-
excesso de álcool, poluição e traumatismo muns são tontura, cefaleia, sonolência
craniano pode exercer efeito negativo52. e, eventualmente, pode ocorrer agitação
O principal estudo amplo de intervenção paradoxal com a introdução do fármaco.
multi-domínio – FINGER53 – apresentou É importante monitorar previamente a fun-
resultados positivos, mesmo em indiví- ção renal e, caso o clearence de creatinina
duos com susceptibilidade genética à DA. (ClCr) esteja abaixo de 30 ml/min, utilizar
Em 2020, o design do estudo foi expandi- metade da dose máxima preconizada, ou
do para 25 países – World Wide FINGERS seja, 10mg ao dia.
network com intuito de avaliar tais efeitos
em países e sociedades cultural e econo- • tratamento dos sintomas neuropsiquiátri-
micamente distintos. cos: poucos estudos são robustos e pos-
suem validação efetiva para o tratamento
• tratamento sintomático, com os inibido- das manifestações neuropsiquiátricas das
res da acetilcolinesterase (donepezila, doenças neurodegenerativas. Deve-se
galantamina e rivastigmina) e o antago- lembrar de que, idealmente, os pacientes
nista não competitivo do receptor NMDA devem estar com a dose dos anticolineste-
(memantina)54: O primeiro grupo de me- rásicos e memantina (quando indicada) no
dicação deverá ser introduzido ao diag- alvo antes de iniciar uma das medicações
nóstico do quadro demencial por DA. Em abaixo, pelo potencial auxílio destas nos
linhas gerais, não há benefício definido sintomas neuro-psiquiátricos. Para sinto-
inequívoco em quadros de DCS ou CCL mas de irritabilidade, ansiedade e depres-
e redução da taxa de conversão para são, podemos dispor dos ISRS43, sendo
demência, portanto não se recomenda o os mais utilizados na prática clínica, nesse
uso rotineiro nessas situações. Não foi grupo de pacientes, a sertralina, citalo-
observado diferença de eficácia em rela- pram44 e escitalopram, pelo baixo perfil de
ção aos três agentes34,54, os efeitos adver- efeitos adversos e boa tolerabilidade em
sos mais comuns são: náuseas, vômitos, idosos. Para sintomas delirantes, alucina-
diarreia, hiporexia, perda de peso, bradi- tórios e agressividade, o uso dos antipsi-
cardia, câimbras e hipotensão. Insônia e cóticos poderá ser benéfico, com preferên-
sonhos vívidos podem ocorrer, sendo seu cia para os atípicos e com menor potencial
uso, portanto, recomendado pela manhã.
Capítulo 39 532
de efeitos adversos extrapiramidais e uso nal, psicologia e cuidados de enfermagem
em dose baixa, como olanzapina, que- com o paciente e principais cuidadores
tiapina e clozapina. Deve-se lembrar de são indispensáveis.
que tais medicações são “black box” pelo
FDA por aumento de risco de mortalida-
de, devendo-se usar com cautela43,44,54. A
pimavenserina (Nuplazid®) é um antago- PERSPECTIVAS TERAPÊUTICAS
nista inverso do receptor 5-HT2a e uma Em julho de 2020, havia 121 agentes
medicação promissora para controle de cadastrados no clinicaltrials.gov para o tratamento
sintomas psicóticos pelo menor perfil de da DA, dentre eles os direcionados para o tratamento
efeitos adversos e já aprovado na doen-
dos aspectos cognitivos e comportamentais
ça de Parkinson, encontra-se em análise
(sintomáticos) e as terapias modificadoras de
pelo FDA para DA42,44. O uso de benzodia-
zepínicos deve ser desencorajado nesse doença, caracterizadas pela ação na fisiopatologia
grupo de pacientes, pelo potencial efei- da mesma56. Os principais e mais promissores
to sedativo, risco de quedas aumentado medicamentos em fase II e III desse extenso grupo
e piora dos sintomas cognitivos, assim são representados pelos anticorpos monoclonais
como dos antidepressivos tricíclicos43. Nos direcionados a proteína β-amiloide. Atualmente,
pacientes com transtorno comportamental
estão em andamento estudos com aducanumab (em
do sono REM, pode-se tentar o uso dos
análise pelo FDA), donanemab e o lecanemab (BAN
benzodiazepínicos em doses baixas ou,
preferencialmente, a melatonina. Outros 2401), além de dois estudos com imunização passiva
distúrbios, como insônia e inversão do contra o β-amiloide44. Anticorpos monoclonais
ciclo sono-vigília, podem ser manejados direcionados a proteína Tau, para redução dos
com antidepressivos “atípicos”, como mir- emaranhados neurofibrilares e Tau agregado e
tazapina e trazodona54. possível redução da neurodegeneração estão
em análise, assim como fármacos e substâncias
• medidas multidisciplinares e nutraucêu-
ticos: o Souvenaid®, um composto de que atuam em estresse oxidativo, neuroproteção,
multinutrientes, foi estudado prospectiva- neurogênese, metabolismo lipídico, inflamação,
mente em 36 meses sobre seu efeito em morte celular , antibióticos, antivirais , agentes
56 42
Capítulo 39 533
5- Petersen RC, Lopez O, Armstrong MJ, et al. Practice 21 - Blennerhassett R, Lillo P, Halliday GM, Hodges JR, Kril
guideline update summary: Mild cognitive impairment: JJ. Distribution of pathology in frontal variant Alzheimer’s
Report of the Guideline Development, Dissemination, and disease. J Alzheimers Dis. 2014;39(1):63-70.
Implementation Subcommittee of the American Academy of
22 - Dickerson BC, Wolk DA; Alzheimer’s Disease
Neurology. Neurology. 2018;90(3):126-135.
Neuroimaging Initiative. Dysexecutive versus amnesic
6 - van der Flier WM, Pijnenburg YA, Fox NC, Scheltens phenotypes of very mild Alzheimer’s disease are
P. Early-onset versus late-onset alzheimer’s disease: associated with distinct clinical, genetic and cortical
the case of the missing APOE ɛ4 allele. Lancet Neurol. thinning characteristics. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
2011;10(3):280-288. 2011;82(1):45-51.
7 - Matthews BR. Alzheimer’s disease. In: Miller BL, Boeve .23 - Knopman DS, DeKosky ST, Cummings JL, et
BF, eds. The Behavioral Neurology of Dementia. 2th ed. al. Practice parameter: diagnosis of dementia (an
Cambridge, UK: Cambridge; 2017. p. 123–142. evidence-based review). Report of the Quality Standards
Subcommittee of the American Academy of Neurology.
8 - Bondi MW, Edmonds EC, Salmon DP. Alzheimer’s
Neurology. 2001;56(9):1143-1153.
Disease: Past, Present, and Future. J Int Neuropsychol Soc.
2017;23(9-10):818-831. 24 - van de Pol LA, Hensel A, Barkhof F, Gertz HJ,
Scheltens P, van der Flier WM. Hippocampal atrophy in
9 - Scarmeas N, Honig LS, Choi H, et al. Seizures in
Alzheimer disease: age matters. Neurology. 2006;66(2):236-
Alzheimer disease: who, when, and how common? Arch
238.
Neurol. 2009;66(8):992-997.
25 - Barkhof F, Polvikoski TM, van Straaten EC, et al. The
10 - Ju YE, Lucey BP, Holtzman DM. Sleep and Alzheimer
significance of medial temporal lobe atrophy: a postmortem
disease pathology--a bidirectional relationship. Nat Rev
MRI study in the very old. Neurology. 2007;69(15):1521-
Neurol. 2014;10(2):115-119.
1527.
11 - Portet F, Scarmeas N, Cosentino S, Helzner EP,
26 - Wahlund LO, Almkvist O, Blennow K, et al. Evidence-
Stern Y. Extrapyramidal signs before and after diagnosis
based evaluation of magnetic resonance imaging as a
of incident Alzheimer disease in a prospective population
diagnostic tool in dementia workup. Top Magn Reson
study. Arch Neurol. 2009;66(9):1120-1126.
Imaging. 2005;16(6):427-37.
12 - Mega MS, Cummings JL, Fiorello T, Gornbein J. The
27 - Hu WT, Wang Z, Lee VM, Trojanowski JQ, Detre JA,
spectrum of behavioral changes in Alzheimer’s disease.
Grossman M. Distinct cerebral perfusion patterns in FTLD
Neurology. 1996;46(1):130-135.
and AD. Neurology. 2010;75(10):881-888.
13 - Lyketsos CG, Lopez O, Jones B, Fitzpatrick AL,
28 - Foster NL, Heidebrink JL, Clark CM, et al.
Breitner J, DeKosky S. Prevalence of neuropsychiatric
FDG-PET improves accuracy in distinguishing
symptoms in dementia and mild cognitive impairment:
frontotemporal dementia and Alzheimer’s disease. Brain.
results from the cardiovascular health study. JAMA.
2007;130(10):2616-2635.
2002;288(12):1475-1483.
29 - Silverman DH, Small GW, Chang CY, et al. Positron
14 - Balasa M, Gelpi E, Antonell A,et al. Clinical features
emission tomography in evaluation of dementia: Regional
and APOE genotype of pathologically proven early-onset
brain metabolism and long-term outcome. JAMA.
alzheimer disease. Neurology. 2011;76(20):1720-1725.
2001;286(17):2120-2127.
15 - Crutch SJ, Lehmann M, Schott JM, Rabinovici GD,
30 - Clark CM, Pontecorvo MJ, Beach TG, et al. Cerebral
Rossor MN, Fox NC. Posterior cortical atrophy. Lancet
PET with florbetapir compared with neuropathology
Neurol. 2012;11(2):170-178.
at autopsy for detection of neuritic amyloid-β plaques:
16 - Crutch SJ, Schott JM, Rabinovici GD, et al. Consensus a prospective cohort study. The Lancet Neurology.
classification of posterior cortical atrophy. Alzheimers 2012;11(8):669–678.
Dement. 2017;13(8):870-884.
31 - Jansen WJ, Ossenkoppele R, Knol DL, et
17 – Gorno-Tempini ML, Hillis AE, Weintraub S, et al. al. Prevalence of Cerebral Amyloid Pathology in Persons
Classification of primary progressive aphasia and its Without Dementia. JAMA. 2015;313(19):1924.
variants. Neurology. 2011;76(11):1006-1014.
32 - Chételat G, Arbizu J, Barthel H, et al. Amyloid-PET and
18 – Bergeron D, Gorno-Tempini ML, Rabinovici GD, et 18F-FDG-PET in the diagnostic investigation of Alzheimer’s
al. Prevalence of amyloid-β pathology in distinct variants of disease and other dementias. The Lancet Neurology.
primary progressive aphasia. Ann Neurol. 2018;84(5):729- 2020;19(11):951–962.
740.
33 - Zhang S, Han D, Tan X, Feng J, Guo Y, Ding
19 - Leyton CE, Villemagne VL, Savage S, et al. Subtypes Y. Diagnostic accuracy of 18F-FDG and 11C-PIB-PET for
of progressive aphasia: application of the International prediction of short-term conversion to Alzheimer’s disease
Consensus Criteria and validation using β-amyloid imaging. in subjects with mild cognitive impairment. International
Brain. 2011;134(10):3030-3043. Journal of Clinical Practice. 2012;66(2)185–198.
20 - Johnson JK, Head E, Kim R, Starr A, Cotman CW. 34 - Betthauser TJ. AD molecular: Imaging tau aggregates
Clinical and pathological evidence for a frontal variant of with positron emissions tomography. Prog Mol Biol Transl
Alzheimer disease. Arch Neurol. 1999;56(10):1233-1239. Sci. 2019;165:107-138.
Capítulo 39 534
35 - Xia C, Makaretz SJ, Caso C, et al. Association of In 48. Studart Neto A, Soares Neto HR, Simabukuro MM, et al.
Vivo [18F]AV-1451 Tau PET Imaging Results With Cortical Rapidly Progressive Dementia: Prevalence and Causes in a
Atrophy and Symptoms in Typical and Atypical Alzheimer Neurologic Unit of a Tertiary Hospital in Brazil. Alzheimer Dis
Disease. JAMA Neurol. 2017;74(4):427-436. Assoc Disord. 2017;31(3):239-243.
36 - Rowley PA, Samsonov AA, Betthauser TJ, Pirasteh 49. Jack CR Jr, Bennett DA, Blennow K, et al. NIA-AA
A, Johnson SC, Eisenmenger LB. Amyloid and Tau PET Research Framework: Toward a biological definition of
Imaging of Alzheimer Disease and Other Neurodegenerative Alzheimer’s disease. Alzheimers Dement. 2018;14(4):535-
Conditions. Semin Ultrasound CT MR. 2020;41(6):572-583. 562.
37 - Molinuevo JL, Ayton S, Batrla R, et al. Current state 50. Karikari TK, Pascoal TA, Ashton NJ, et al. Blood
of Alzheimer’s fluid biomarkers. Acta Neuropathologica. phosphorylated tau 181 as a biomarker for Alzheimer’s
2018;136(6):821-853. disease: a diagnostic performance and prediction modelling
study using data from four prospective cohorts. Lancet
38 - Olsson B, Lautner R, Andreasson U, et al. CSF and
Neurol. 2020;19(5):422-433.
blood biomarkers for the diagnosis of Alzheimer’s disease:
a systematic review and meta-analysis. The Lancet 51. Schindler SE, Bollinger JG, Ovod V, et al. High-precision
Neurology. 2016;15(7):673–684. plasma β-amyloid 42/40 predicts current and future brain
amyloidosis. Neurology. 2019;93(17):e1647-e1659.
39 - Mielke MM, Hagen CE, Wennberg AMV, et
al. Association of Plasma Total Tau Level With Cognitive 52. Livingston G, Huntley J, Sommerlad A, et al. Dementia
Decline and Risk of Mild Cognitive Impairment or Dementia prevention, intervention, and care: 2020 report of the Lancet
in the Mayo Clinic Study on Aging. JAMA Neurology. Commission. Lancet. 2020;396(10248):413-446.
2017;74(9):1073.
53. Ngandu T, Lehtisalo J, Solomon A, et al. A 2 year
40 - Palmqvist S, Janelidze S, Quiroz YT, et al. multidomain intervention of diet, exercise, cognitive training,
Discriminative Accuracy of Plasma Phospho-tau217 for and vascular risk monitoring versus control to prevent
Alzheimer Disease vs Other Neurodegenerative Disorders. cognitive decline in at-risk elderly people (FINGER): a
JAMA. 2020;324(8):772-781. randomised controlled trial. Lancet. 2015;385(9984):2255-
2263.
41. Pedroso JL, França MC, Camargos ST, Barsottini OGP,
Kok F. Neurogenética na Prática Clínica. Atheneu, 2019. 54. Boeve B, Miller B. The Behavioral Neurology of
Dementia. 2nd edition. San Francisco. Cambridge
42. Scheltens P, De Strooper B, Kivipelto M, et al.
University Press, 2017.
Alzheimer’s disease. Lancet. 2021;397(10284):1577-1590.
55. Soininen H, Solomom A, Visser PJ, et al. 36-month
43. Rabinovici GD. Late-onset alzheimer Disease.
LipiDiDiet multinutrient clinical trial in prodromal Alzheimer’s
Continuum (Minneap Minn). 2019;25(1):14-33.
disease. Alzheimer’s Dement. 2020;17(1):29-40.
44. Knopman DS, Amieva H, Petersen RC, et al. Alzheimer
56. Cummings J, Lee G, Ritter A, Sabbagh M, Zhong K.
disease. Nat Rev Dis Primers. 2021;7(1):33.
Alzheimer’s disease drug development pipeline: 2020.
45. Choudhury P, Ramanan VK, Boeve BF. APOE ɛ4 Alzheimers Dement (N Y). 2020;6(1):e12050.
Allele Testing and Risk of Alzheimer Disease. JAMA.
57. Xiao S, Chan P, Wang T, et al. A 36-week multicenter,
2021;325(5):484-485.
randomized, double-blind, placebo-controlled, parallel-
46. Knopman DS, Petersen RC, Jack CR Jr. A brief history group, phase 3 clinical trial of sodium oligomannate for mild-
of “Alzheimer disease”: Multiple meanings separated by a to-moderate Alzheimer’s dementia. Alzheimers Res Ther.
common name. Neurology. 2019;92(22):1053-1059. 2021;13(1):62.
47. McKhann GM, Knopman DS, Chertkow H, et al.
The diagnosis of dementia due to Alzheimer’s disease:
recommendations from the National Institute on Aging-
Alzheimer’s Association workgroups on diagnostic
guidelines for Alzheimer’s disease. Alzheimers Dement.
2011;7(3):263-269.
Capítulo 39 535
CAPÍTULO 40
HIDROCEFALIA DE PRESSÃO NORMAL
Capítulo 40 536
proeminente em fases iniciais3. forma secundária a processos pregressos como
meningite, hemorragia subaracnoidea, hemorragia
Alteração de marcha intracerebral, traumatismo craniano e tumores
A marcha na HPNi é caracterizada por malignos, principalmente. O enfoque desse capítulo
redução da velocidade, pequenos passos e base é transcorrer sobre a fisiopatologia da HPNi, que
alargada, comumente descrita como “magnética” representa 50% dos casos de HPN1,2.
ou “grudada no chão”. Há um prejuízo do equilíbrio Alguns fatores de risco vasculares foram
dinâmico, marcadamente percebido no giro, que relacionados com a ocorrência de HPNi em
caracteristicamente é descrito como “giro em bloco” estudos epidemiológicos, como diabetes mellitus
(≥3 passos para completar 180º). Geralmente, o e hipertensão arterial sistêmica8. Existem algumas
balançar dos braços está preservado na marcha, evidências de que fatores genéticos possam estar
caraterística que pode diferenciar da marcha na envolvidos na fisiopatogênese da HPN9. Mais
Doença de Parkinson .3,7
recentemente, a síndrome de apneia obstrutiva do
sono foi também correlacionada como fator de risco
Demência e alteração cognitiva para HPNi10.
O padrão de alteração cognitiva encontrado
Uma das explicações fisiopatológicas da HPNi
na HPNi é o de uma disfunção subcortical, com
mais aceita decorre em torno do distúrbio do manejo
comprometimento principal de memória de
do fluxo liquórico. Consiste na teoria de que o aumento
trabalho, aprendizado, atenção, velocidade de
da pulsatilidade do líquor gera como consequência
processamento mental e função executiva. Tais
final a diminuição da absorção liquórica, levando
características são diferentes do comprometimento
ao desenvolvimento de ventriculomegalia e déficits
cortical, classicamente encontrado na Demência de
neurológicos subsequentes. Este estado de fluxo
Alzheimer2.
hiperdinâmico do líquor desencadeia uma cascata de
eventos patogênicos que culmina na diminuição da
Incontinência urinária complacência intracerebral, e redução de absorção
As alterações urinárias costumam ser mais liquórica. Nesta linha fisiopatológica, estudos mais
tardias em relação aos sintomas clássicos da HPN, recentes correlacionam também uma provável
tipicamente os pacientes apresentam incontinência disfunção do sistema glinfático contribuindo para a
urinária. No entanto, é possível identificar a alteração da dinâmica do fluxo liquórico2,5.
ocorrência de alguma disfunção urinária mais
Acredita-se também que o desenvolvimento
precoce, como urgência urinária e/ou noctúria3,6.
de ventriculomegalia ocasionado pelo distúrbio
Vale reforçar que sintomas de trato urinário inferior
da dinâmica do fluxo liquórico cause um estresse
são prevalentes na população acima de 60 anos1
mecânico no parênquima cerebral e tecido vascular
e é necessária uma investigação cuidadosa para
subjacente, gerando hipóxia e hipoperfusão tecidual.
diagnósticos diferenciais desses sintomas.
Este processo de hipoperfusão pode ser responsável
pelo desencadeamento de outros mecanismos
propostos no desenvolvimento fisiopatológico da
FISIOPATOLOGIA HPNi, como neuroinflamação, astrogliose e quebra
A Hidrocefalia de Pressão Normal (HPN) pode da barreira hematoencefaláfica. A Figura 1, resume
ser dividida em duas grandes entidades, a HPN dita de forma esquemática os principais mecanismos
idiopática (HPNi), cujo mecanismo fisiopatológico descritos na patogênese da HPNi5.
ainda não é completamente esclarecido, e a
HPN secundária (HPNs), que pode ocorrer de
Capítulo 40 537
Uma punção lombar realizada com o paciente em
decúbito lateral deve confirmar uma pressão de
abertura liquórica normal11. Testes investigativos,
como o tap test, auxiliam na confirmação diagnóstica,
conforme será descrito abaixo.
Critérios diagnósticos
Os critérios diagnósticos de HPNi continuam
um tópico de discussão em relação a muitas
divergências nos critérios diagnósticos já publicados
nos Consensos, sendo os mais importantes, o
guideline internacional, publicado em 200511 e
o guideline japonês, publicado em 201212. Em
2017, Andersson et al.13 avaliaram os guidelines e
encontraram discrepâncias relevantes, reforçando
a falta de consenso e impossibilidade de unificação
dos critérios diagnósticos. A ausência de um padrão-
Figura 1: Figura esquemática dos mecanismos ouro para o diagnóstico dificulta tanto a prática
fisiopatológicos na HPNi e cascata de eventos.
clínica, quanto os estudos epidemiológicos13.
Legendas: IL-10, interleucina 10; IL-1β, interleucina 1beta;
IL-6, interleucina 6; IL-8, interleucina 8; TNF-α, Fator de De acordo com o guideline internacional,
Necrose Tumoral- alfa; MCP-1, Proteína Quimiotática
de Monócito-1; TGF-β, Fator de Transformação de a HPNi pode ser classificada como “provável”,
Crescimento- β; NAA- N Acetil Aspartato. “possível” e “improvável”11.
Fonte: Wang, 20205.
O diagnóstico de HPNi “provável” é baseado
na história clínica, neuroimagem, exame físico e no
DIAGNÓSTICO resultado da pressão de abertura de líquor, obtido
As manifestações clínicas presentes na HPNi por punção lombar. Para o diagnóstico provável, em
podem também ocorrer em vários outros quadros relação à tríade de Hakim, é necessária a presença
neurodegenerativos, como em algumas síndromes de alteração de marcha, com pelo menos um outro
parkinsonianas, na doença de Alzheimer e na sintoma da tríade, o comprometimento cognitivo e/ou
demência vascular, tornando o diagnóstico muitas alteração urinária. O quadro clínico deve preencher
vezes um desafio. A alteração de marcha pode os seguintes critérios11:
ocorrer em cerca de 20% dos idosos acima dos
a. Início insidioso
75 anos em associação com quadro demencial.
Por sua vez, a incontinência urinária pode ocorrer b. início após os 40 anos;
em cerca de 28% das mulheres nesta faixa etária
e 18% dos homens. Os sintomas da tríade clínica c. duração sintomática mínima de 3 a 6 me-
ses;
não necessariamente precisam ocorrer de forma
concomitante. Geralmente, o primeiro sintoma é o de d. nenhuma evidência de evento prévio
alteração de marcha6,9. O diagnóstico de hidrocefalia como traumatismo craniano, meningite,
de pressão normal idiopática (HPNi) requer hemorragia intracerebral ou outra causa
evidências convergentes de história clínica, exame conhecida de hidrocefalia secundária;
neurológico e alterações de imagem compatíveis.
Capítulo 40 538
e. evolução progressiva; e comprometimento cognitivo como únicos sintomas,
sem a presença de um segundo sintoma da tríade de
f. ausência de outra condição neurológica
Hakim. Além disso, para HPNi “possível”, é preciso
ou não, que seja por si só suficiente para
preencher os seguintes critérios11.
justificar os sintomas.
Para fechar o diagnóstico de HPNi “provável” Em relação ao valor da pressão liquórica, para
o valor da pressão de abertura liquórica deve estar o diagnóstico de HPNi possível, este deve estar fora
na faixa entre 7 a 24,5 cmH20. Valores inferiores da faixa definida na categoria HPNi “provável” (7
a 7 cmH20 ou superiores a 24,5 cmH20 não são a 24,5 cmH20). O diagnóstico de HPNi “possível”
consistentes com o diagnóstico dito como provável11. também pode ser estabelecido quando o valor da
baseado na história clínica, neuroimagem, exame HPNi é dita como improvável quando11:
Capítulo 40 539
ser explicados por outras desordens. impacto do ângulo calosal no diagnóstico de HPNi foi
avaliado por um estudo através de RM de crânio17.
Neuroimagem A partir de então, outros estudos também avaliaram
O exame de imagem com maior acurácia a importância do ângulo calosal no diagnóstico
diagnóstica na avaliação de HPNi é a ressonância diferencial de HPNi com outras desordens
magnética (RM) de crânio. Entretanto, nos Consensos degenerativas, sendo que o ângulo calosal entre 40
Diagnósticos tanto a tomografia computadorizada a 90º mostrou ser sugestivo para HPNi e quando
de crânio, quanto a RM de crânio são mencionadas. acima de 90 graus, indicador de atrofia cerebral,
Os achados de neuroimagem que podem ser apontando para uma maior possibilidade de outros
encontrados na HPN são: dilatação ventricular diagnósticos degenerativos, como doença de
desproporcional ao grau de atrofia cerebral, Alzheimer e doença de Lewy . 18
arredondamento dos cornos frontais dos ventrículos Outro achado importante de neuroimagem e
laterais, hiperintensidades periventriculares na que ganhou notoriedade nos últimos anos para o
RM, adelgaçamento e elevação do corpo caloso, diagnóstico de HPNi é a presença de DESH (do inglês
dilatação dos cornos temporais dos ventrículos disproportionately enlarged subarachnoid space
laterais sem evidência de atrofia hipocampal14. hydrocephalus). Foi descrito em 2010 por Hashimoto
Para avaliação de ventriculomegalia, o índice et al e consiste na presença de fissuras sylvianas
de Evans (IE) é um marcador linear indireto, de alargadas por acúmulo de líquor e apagamento
fácil aplicabilidade e que consiste na medida da dos sulcos da alta convexidade frontoparietal. Este
divisão entre o maior diâmetro dos cornos frontais achado radiológico foi incorporado no guideline
dos ventrículos laterais e o maior diâmetro biparietal japonês, e acredita-se que seja importante no
interno do crânio. Em 1987, Sherman et al. afirmaram auxílio do diagnóstico diferencial de HPNi com
que o IE normalmente é menor de 0,3 em adultos outras doenças degenerativas. Além disso, no
saudáveis e que o índice poderia ser uma forma estudo conduzido por Hashimoto et al, a presença
objetiva de diagnosticar a hidrocefalia, quando > de DESH foi considerada como um bom marcador
0,3. O valor de corte normal do IE foi revisado em prognóstico de resposta cirúrgica no primeiro ano
diversos estudos ao longo dos últimos anos, tentando após derivação ventricular9, 15,19.
estipular um IE conforme idade e sexo, para melhor O sinal de flow void é a perda (aumento da
sensibilidade e especificidade diagnóstica. Em hipointensidade) do sinal visto no aqueduto e
2017, um estudo publicado no European Journal of arredores do 3º e 4º ventrículos, particularmente
Radiology estabeleceu novos valores de corte para em aquisições ponderadas em T2 na RM de crânio.
o IE, conforme sexo e idade, e concluiu que um valor A presença desse sinal aponta para a ocorrência
>0,3 pode ser normal em idosos saudáveis ou com indireta de fluxo hiperdinâmico de líquor no
doença de Alzheimer15,16. aqueduto cerebral, com aumento de velocidade e
A medida do ângulo calosal é outro critério fluxo turbilhonado (Figura 2).
suportivo de imagem, de acordo com o Consenso
Internacional, para o diagnóstico de HPNi quando
acima de 40º. É a medida entre os ventrículos
laterais, aferida em corte coronal de imagem, no
nível da comissura posterior14. O conceito do ângulo
calosal foi primeiramente descrito por Benson et al.,
em 1970, como um achado diagnóstico para HPN
em pneunoencefalografia. Somente em 2008 que o
Capítulo 40 540
Tap test (TT)
Uma melhora transitória nos sintomas da
tríade da HPN após a retirada de líquor através da
realização de uma punção lombar foi primeiramente
descrita por Adams et al.,20. Com o tempo, ocorreu
um aprimoramento da análise sintomática após a
realização de punção lombar, através da análise
quantitativa e qualitativa dos parâmetros de marcha e
análise dos parâmetros cognitivos, o que chamamos
hoje de TT, do inglês, literalmente, teste da torneira7.
Figura 2: Sinal de flow void no quarto ventrículo (seta
branca). O TT é uma importante ferramenta para a
Fonte: Acervo de Dr. Ricardo Krause Martinez de Souza, confirmação diagnóstica de HPN e pode ajudar a
2018.
predizer os resultados pós-cirúrgicos em pacientes
com HPN, auxiliando a selecionar os pacientes que
A Figura 3, mostra alguns dos principais mais provavelmente responderão com a derivação
achados de imagem na RM de Crânio que dão liquórica3. No entanto, um resultado negativo, não
suporte ao diagnóstico de HPNi. exclui necessariamente a possibilidade de indicação
cirúrgica. Não existe um protocolo padrão para
a realização do TT. Além disso, nos estudos, os
pacientes são avaliados desde 30 min após a punção,
até 1 a 2 dias após a realização da punção lombar,
também podendo ser submetidos a 1 ou 2 punções
lombares em dias consecutivos7,9. Na maior parte
dos centros, o volume de líquor retirado na punção
lombar é de 30 a 50 ml, também chamado de TT de
grande volume. A marcha do paciente é analisada
antes e após a realização de punção lombar, assim
como a parte cognitiva9.
Capítulo 40 541
mencionado consiste na avaliação de alguns 9%, mas com melhora em pelo menos dois outros
critérios, como a velocidade de marcha, a cadência parâmetros, como cadência dos passos, equilíbrio,
dos passos (número de passos/minuto), tempo e melhora do tempo de giro, etc.
número de passos para girar 180 graus, elevação dos
Em relação à parte cognitiva, a resposta
pés, ângulo desviado para fora, distância entre os
positiva com o TT é ainda mais variável, dependendo
passos, equilíbrio estático e dinâmico7. A avaliação
das escalas utilizadas, do tempo de avaliação após
cognitiva deste protocolo, contempla a avaliação de
a punção lombar ou punções lombares seriadas,
alguns domínios cognitivos como memória imediata,
entre outros fatores.
aprendizagem, memória semântica, fluência verbal,
atenção, orientação temporo-espacial, funções De acordo com dados da literatura, o TT
informação, entre outros, antes e após as punções favorável ao tratamento cirúrgico entre 72 a 100%,
Capítulo 40 542
alterações patológicas compatíveis com doença de que nesses pacientes, há maior chance de mau
Alzheimer. Tal achado suscita a hipótese de que, funcionamento e deslocamento do sistema, sendo
ao menos a nível celular, as doenças podem não então preferível a DVP. A derivação ventriculoatrial
ser mutuamente exclusivas. Embora isso possa tem um índice de complicações maior em pacientes
influenciar na resposta ao tratamento cirúrgico, é idosos com doença cardiovascular avançada, sendo
importante considerar que uma suspeita de doença considerada opção inadequada6,25,26.
de Alzheimer sobreposta ao diagnóstico clínico
Na vigência do avanço da endoscopia, visando
de HPN não deve automaticamente excluir esse
divergir do implante de sistemas que podem trazer
paciente da possibilidade de tratamento com a
complicações como mau funcionamento, infecção
derivação ventricular2.
e, consequente necessidade de procedimentos
A Tabela 2 mostra características comuns cirúrgicos para revisão, retirada e troca de sistema,
e atípicas na HPN quando comparadas com as a terceiroventriculostomia endoscópica tem ganhado
condições neurodegenerativas citadas na Tabela 1: espaço em estudos para tratamento da HPN.
Atualmente, tem mostrado resultados positivos em
pacientes com diagnóstico e evolução precoce, que
TRATAMENTO apresentam como principal queixa a alteração de
O tratamento da HPN se baseia no balanço marcha. Essa modalidade de tratamento tem sua
da dinâmica do fluxo liquórico. Como resultado, os principal indicação em pacientes com estenose
fluxo alterado podem sofrer a regressão esperada. A pérvio, mas com deslocamento inferior do assoalho
decisão terapêutica deve ser baseada no diagnóstico do terceiro ventrículo, de forma evidente. Além da
clínico e por imagem e na resposta avaliada nos perviedade do aqueduto, a indicação também requer
protocolos de drenagem de líquor, como o TT2. que o pico de velocidade de fluxo no aqueduto do
mesencéfalo seja maior do que 5 cm/s, medida
Não há tratamento clínico eficaz, apesar de
avaliada pela ressonância magnética com cinética
alguns estudos apontarem para a possibilidade
de fluxo do líquor26-28.
de condução farmacológica com acetazolamida e
realização de punção lombar de repetição como As válvulas implantáveis possuem diferentes
terapêuticas que poderiam levar a alguma melhora. mecanismos. Existem válvulas de pressão fixa,
bons resultados e sucesso do tratamento. A cirurgia assim como as reguladas por fluxo6.
mecanismo antissifão, implantadas através da As de média pressão (51 a 100 cmH20) tem como
derivação ventriculoperitoneal (DVP) tem trazido os risco principal a drenagem insatisfatória de líquor e
melhores resultados. A derivação lomboperitoneal persistência dos sintomas. As válvulas de pressão alta
(DLP) tem suas contraindicações em pacientes não são usadas no contexto da HPN. O mecanismo
Capítulo 40 543
Desordens Neurodegenerativas Demência Vascular Outras Causas
Degeneração Corticobasal
Capítulo 40 544
ortostase. Entre as diferentes válvulas implantáveis, 4. Martín-Láez R, Caballero-Arzapalo H, López-
Menéndez LÁ, Arango-Lasprilla JC, Vázquez-Barquero A.
houve desfecho geral similar nos trabalhos que
Epidemiology of Idiopathic Normal Pressure Hydrocephalus:
estudaram os diferentes mecanismos6,29. A Systematic Review of the Literature. World Neurosurg.
2015;84(6):2002-2009.
5. Wang Z, Zhang Y, Hu F, Ding J, Wang X. Pathogenesis
and pathophysiology of idiopathic normal pressure
PROGNÓSTICO hydrocephalus. CNS Neurosci Ther. 2020;00:1–11.
Resultados clínicos heterogêneos após 6. Mori E, Ishikawa M, Kato T, et al. Guidelines for
o tratamento cirúrgico reforçam a fisiopatologia Management of Idiopathic Normal Pressure Hydrocephalus:
Second Edition. Neurol Med Chir (Tokyo). 2012;(52):775-
complexa e ainda não completamente entendida da 809.
HPNi e que a problemática do tratamento vai além 7. Souza RKM, Rocha SFBD, Martins RT, Kowacs PA,
de apenas drenar o excesso de líquor5. Porém, Ramina R. Gait in normal pressure hydrocephalus:
characteristics and effects of the CSF tap test. Arq
diante de um quadro potencialmente reversível, é Neuropsiquiatr. 2018;76(5):324-331.
importante considerar sempre o tratamento cirúrgico. 8. Jaraj D, Agerskov S, Rabiei K, et al. Vascular factors in
suspected normal pressure hydrocephalus: A population-
A apraxia de marcha é geralmente o sintoma based study. Neurology. 2016;86(7):592-599.
mais responsivo à derivação liquórica. A urge- 9. Graff-Radford NR, Jones DT. Normal Pressure
incontinência urinária e as alterações de memória/ Hydrocephalus. Continuum (Minneap Minn).
2019;25(1):165-186.
demência são sintomas menos responsivos e de
pior prognóstico ao longo do tempo15. 10. Tan C, Wang X, Wang Y, Wang C, Tang Z, Zhang Z,
Liu J, Xiao G. The Pathogenesis Based on the Glymphatic
Uma revisão sistemática de 30 artigos de System, Diagnosis, and Treatment of Idiopathic Normal
Pressure Hydrocephalus. Clin Interv Aging. 2021;16:139-
derivação liquórica através de DVP evidenciou 153.
índices similares de melhora sintomática dentro de 3 11. Relkin N, Marmarou A, Klinge P, Bergsneider M, Black
meses a um ano. Porém, após uma melhora inicial, PM. Diagnosing idiopathic normal-pressure hydrocephalus.
Neurosurgery. 2005;57(3):S4-16.
os sintomas parecem evoluir independente da
12. Mori E, Ishikawa M, Kato T, et al. Guidelines for
manutenção de uma válvula funcionante. Esta piora management of idiopathic normal pressure hydrocephalus:
evolutiva sintomática acaba sendo mais prevalente second edition. Neurol Med Chir (Tokyo). 2012;52(11):775-
809.
em pacientes mais idosos, e uma das teorias é a
13. Andersson J, Rosell M, Kockum K, Söderström L,
de provável sobreposição da HPNi com doença
Laurell K. Challenges in diagnosing normal pressure
neurodegenerativa30. hydrocephalus: Evaluation of the diagnostic guidelines.
eNeurologicalSci. 2017;7:27-31.
14. Damasceno BP. Neuroimaging in normal pressure
hydrocephalus. 2015;9(4):350-355.
REFERENCIAS 15. Capone PM, Bertelson JA, Ajtai B. Neuroimaging of
1. Skalicky, P, Mládek A, Vlasák A, De Lacy P, Benes V, Normal Pressure Hydrocephalus and Hydrocephalus.
Bradác O. Normal pressure hydrocephalus – an overview of Neurol Clin. 2020 Feb;38(1):171-183.
pathophysiological mechanisms and diagnostic procedures.
16. Brix MK, Westman E, Simmons A, et al. The Evans’
Neurosurg Rev. 2020;43(6):1451-1464.
Index revisited: New cut-off levels for use in radiological
2. Oliveira LM, Nitrini R, Román GC. Normal-pressure assessment of ventricular enlargement in the elderly. Eur J
hydrocephalus: A critical review. Dement Neuropsychol Radiol. 2017;95:28-32.
2019;13(2):133-143.
17. Ishii K, Kanda T, Harada A, et al. Clinical impact of the
3. Pereira RM, Mazeti L, Cristina D, Lopes P. Hidrocefalia callosal angle in the diagnosis of idiopathic normal pressure
de pressão normal: visão atual sobre a fisiopatologia, hydrocephalus. Eur Radiol. 2008;18(11):2678-2683.
diagnóstico e tratamento Normal pressure hydrocephalus:
18. Kiefer M, Unterberg A. The differential diagnosis and
current view on pathophysiology, diagnosis and treatment.
treatment of normal-pressure hydrocephalus. Dtsch Arztebl
2012;91(2):96-109.
Int. 2012;109(1-2):15-25
Capítulo 40 545
19. Hashimoto M, Ishikawa M, Mori E, Kuwana N; Study of 26. Tasiou A, Brotis AG, Esposito F, Paterakis KN.
INPH on neurological improvement (SINPHONI). Diagnosis Endoscopic third ventriculostomy in the treatment of
of idiopathic normal pressure hydrocephalus is supported idiopathic normal pressure hydrocephalus: a review study.
by MRI-based scheme: a prospective cohort study. Neurosurg Rev. 2016;39(4):557–563.
Cerebrospinal Fluid Res. 2010;7:18.
27. Kang YS, Park E-K, Kim J-S, Kim D-S, Thomale U-W,
20. Hakim S, Adams RD. The special clinical problem of Shim K-W. Efficacy of endoscopic third ventriculostomy
symptomatic hydrocephalus with normal cerebrospinal in old aged patients with normal pressure hydrocephalus.
fluid pressure. Observations on cerebrospinal fluid Neurol Neurochir Pol. 2018;52(1):29–34.
hydrodynamics. J Neurol Sci. 1965;2(4):307-327.
28. Gangemi M, Maiuri F, Buonamassa S, Colella
21. Bugalho P, Guimaraes J. Gait disturbance in normal G, de Divitiis E. Endoscopic third ventriculostomy in
pressure hydrocephalus: a clinical study. Parkinsonism idiopathic normal pressure hydrocephalus. Neurosurgery.
Relat Disord. 2007;13(7):434-437. 2004;55(1):129–34; discussion 134.
22. Marmarou A, Bergsneider M, Relkin N, Klinge P, Black 29. Giordan E, Palandri G, Lanzino G, Murad MH, Elder BD.
PM. Development of guidelines for idiopathic normal- Outcomes and complications of different surgical treatments
pressure hydrocephalus: introduction. Neurosurgery. for idiopathic normal pressure hydrocephalus: a systematic
2005;57(3):S1-3. review and meta-analysis. J Neurosurg. 2018;1–13.
23. Gavrilov GV, Gaydar BV, Svistov DV, et al. Idiopathic 30. Toma AK, Papadopoulos MC, Stapleton S, Kitchen ND,
normal pressure hydrocephalus (Hakim-Adams syndrome): Watkins LD. Systematic review of the outcome of shunt
Clinical symptoms, diagnosis and treatment. Psychiatr surgery in idiopathic normal-pressure hydrocephalus. Acta
Danub. 2019;31(5):737–744. Neurochir (Wien). 2013 Oct;155(10):1977-80
24. Isaacs AM, Williams MA, Hamilton MG. Current update
on treatment strategies for idiopathic normal pressure
hydrocephalus. Curr Treat Options Neurol. 2019;21(12):65.
25. Nakajima M, Miyajima M, Akiba C, et al.
Lumboperitoneal shunts for the treatment of idiopathic
normal pressure hydrocephalus: A comparison of small-
lumen abdominal catheters to gravitational add-on
valves in a single center. Oper Neurosurg (Hagerstown).
2018;15(6):634–642.
Capítulo 40 546
PARTE 10
NEOPLASIAS DO SISTEMA NERVOSO
CAPÍTULO 41
VISÃO GERAL DAS NEOPLASIAS DO SISTEMA
NERVOSO CENTRAL
Isabela Caiado Caixeta Vencio adjuvante. Não abordaremos aqui os tumores de base de
crânio, pediátricos e intraraquianos.
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Capítulo 41 548
Tumores astrocíticos e oligodendrogliais (Grau) Tumores neurogliais mistos (Grau)
Astrocitoma difuso, IDH- mutante II Tumor neuroepitelial disembioplastico I
Astrocitoma difuso, IDH- selvagem II Gangliocitoma I
Astrocitoma difuso, NOS II Ganglioglioma I
Astrocitoma anaplásico, IDH mutante III Ganglioglioma anaplásico III
Gangliocitoma displásico cerebelar (doença de
Astrocitoma anaplásico, IDH selvagem III I
Lhermitte-Duclos)
Astrocitoma anaplásico, NOS III Ganglioglioma e Astrocitoma desmoplastico infantil I
Glioblastoma, IDH mutante IV Tumor glioneuronal papilar I
Glioblastoma, IDH selvagem IV Tumor glioneuronal em formas de rosetas I
Glioblastoma, IDH NOS IV Tumor glioneuronal leptomeníngeo difuso I
Glioma difuso de linha média, H3 K27M
Neurocitoma central, extraventricular I
mutante
Oligodendroglioma, IDH mutante e codelação
II Liponeurocitoma cerebelar I
do 1p/19q
Oligodendroglioma, NOS II Paraganglioma I
Oligodendroglioma anaplásico IDH mutante e
III Tumores da região pineal
codelação do 1p/19q
Oligodendroglioma anaplásico, NOS III Pineocitoma I
Oligoastrocitoma, NOS II Pineoblastoma IV
Oligoastrocitoma anaplásico III Tumor papilar da região pineal II ou III
Capítulo 41 549
Papiloma do plexo coroide atípico II Melanomatose meníngea
Carcinoma de plexo coroide III Carcitomatose meníngea
Meningiomas Linfomas
Meningioma meningotelial I Linfoma de células
Meningioma fibroso I Linfoma associado a imunodeficiência (SIDA, EBV)
Meningioma transicional I Linfoma de células B intravascular
Meningioma psamomatoso I Linfoma de células T e NK
Meningioma angiomatoso I Linfoma anaplásico, ALK- positivo
Meningioma microcístico I Linfoma anaplásico, ALK- negativo
Meningioma secretor I Linfoma MALT da dura-máter
Meningioma ricos em linfoplasmocitos I Neoplasias histiocíticas
Meningioma metaplastico I Histiocitose de células de Langerhans.
Meningioma cordoide I Doença de Erdheim-Chester
Meningioma de células claras I Doença de Rosai-Dorfman
Meningioma atípico II Xantogranuloma juvenil
Meningioma papilar II Sarcoma histiocítico
Meningioma rabdoide II Tumores de células germinativas
Meningioma anaplásico (maligno) III Germinoma
Tumores mesenquimais, não meningoteliais Carcinoma embrionário
Hemangioperecitoma/ tumor fibroso solitário
II ou III Neoplasia do saco de Yolk
(grau 1,2 e 3)
Hemangioblastoma I Coriocarcinoma
Hemangioma I Teratoma (maduro e imaturo)
Hemangioendotelioma epitelioide IV Neoplasia de células germinativas mistas
Angiosarcoma IV Tumores da região selar
Sarcoma de Kaposi Craniofaringioma (adamantinomatoso e papilar) I
Sarcoma de Ewing/ PNET Neoplasias de células granulares I
Lipoma I Pituicitoma I
Angiolipoma I Oncocitomas de células fusiformes I
Liposarcoma III Metástases
Pulmão (adenocarcinoma, células claras,
Miofibrosarcoma III
carcinoma brônquico)
Leiomioma I Mama (carcinoma, HER +, triplo negativo)
Leiomiosarcoma IV Renal (carcinoma de células renais)
Rabdomiosarcoma IV Gástrico (carcinoma)
Condroma I Intestino (carcinoma de cólon)
Condrosarcoma III Melanoma
Osteoma I Tireoide
Tabela 1: Classificação das neoplasias do SNC, segundo World Health Organization (WHO).
Fonte: Modificado de Louis et al, 20165.
Capítulo 41 550
a depender de polimorfismos genéticos; Grau III estimar a neovascularização e a espectroscopia
(atrocitoma anaplásico) tende a acometer mais onde existe a possibilidade de determinar a
adultos jovens; e Grau IV (glioblastoma) tem um presença de aminoácidos específicos, estes o
pico de incidência dos 50 a 60 anos, sendo que os tornam como método de escolha. Os gliomas de alto
homens são mais acometidos . 5
grau se apresentam heterogêneos com captação
de contraste em suas bordas e centro necrótico
Quadro clínico (Figura 3). A realização de eletroencefalograma e
Os gliomas se tornam sintomáticos quando monitorização por vídeo contínua está indicada em
apresentam aumento do volume intracraniano. Os caso de epilepsia.
tumores considerados de baixo grau WHO 1 e 2
tendem a abrir em caso de crises convulsivas, já
Tratamento
os tumores de alto grau WHO 3 e 4, além da crise
A maioria destas lesões deve ser ressecada
convulsiva, apresentam rápida perda neurológica
sempre que possível. Quanto mais lesão for
(hemiparesia, déficits visuais, disfagia, alterações
retirada, pode levar a uma maior porcentagem
da fala e déficits comportamentais e cognitivos).
de sobrevida e tempo livre de doença. O uso da
Com o aumento do volume da neoplasia, pode
neuronagevação intraoperatória (Figura 4) possibilita
ocorrer a síndrome de hipertensão intracraniana com
menores incisões e maior precisão, associados
papiledema na fundoscopia (Figura 1), sonolência,
ao uso de aspiração ultrassônica podem reduzir o
torpor e possível progressão para o coma.
tempo da cirurgia em 25%. O uso da microscopia
associado a fluorescência intraoperatória (Figura
5) e, em alguns casos, a possibilidade de RM
intraoperatória aumentam o grau de ressecção e
isto impacta diretamente no aumento da sobrevida.
A monitorização eletrofisiológica intraoperatória
(Figura 6), permite que seja realizado estimulação
de áreas motoras, permitindo maiores ressecções
de lesões próximas ou adjacentes às áreas críticas
de aspiração durante a cirurgia. Em alguns casos
Figura 1: Exame de fundoscopia evidência ndo edema de
papila.
selecionados de lesões em áreas eloquentes da fala,
semântica e motoras específicas, é possível realizar
Fonte: Os autores, 2021.
a cirurgia com o paciente acordado (técnica sleep-
awake-sleep), na qual é promovido um protocolo
de anestesia com medicamentos de curta duração,
Diagnóstico
para que o paciente possa retirar o tubo ou máscara
Uma vez levantada a suspeita de glioma,
laríngea para interagir com os examinadores
deverão ser realizados exames de imagens.
durante o tempo cirúrgico da manipulação das
Tomografia computadorizada (TC) de crânio pode
áreas críticas. Em alguns casos de lesões em áreas
ajudar a avaliar a presença de calcificações,
consideradas eloquentes ou tronco cerebral pode-se
porém a ressonância magnética (RM) (Figura 2)
considerar a realização de biópsias estereotáxicas,
é considerada o padrão-ouro, pois pode estimar
onde é possível a retirada de fragmentos da lesão,
o diagnóstico histológico, melhora caracterização
possibilitando a determinação histopatológica.
do edema e suas relações encefálicas com
Quando existe a presença de edema perilesional, o
várias ponderações. Além disso, com técnicas de
uso de dexametasona 4mg IV 6/6 h pode promover
sequenciamento, determinação da perfusão para
alguma estabilização neurológica. Além de uso de
Capítulo 41 551
anticonvulsivantes quando convulsões surgirem ou meningiomas a depender da sua localização. Os
em lesões que se localizam no lobo temporal. localizados nas regiões temporomesial ou peri-
rolândicas podem predispor a crises convulsivas,
O tratamento adjuvante depende do
os tumores frontobasais podem apresentar déficits
diagnóstico estabelecido pela pesquisa anatomo-
focais, sintomas de hidrocefalia obstrutiva, perdas
patológica, imuno-histoquimica e pesquisa genética
visuais e alterações comportamentais. Porém,
molecular do IDH selvagem ou mutado, codeleção do
frequentemente, muitos deles não apresentam
1p19q e metilação da MGMT (Figura 7). A realização
sintomas.
de radioterapia (RT) normalmente é realizada após a
cirurgia dos gliomas de alto grau sendo aplicados 54
Diagnóstico
Gy seguidos de 1,8 Gy fracionados em 6 semanas e,
A RM é o exame de eleição para o diagnóstico
se possível, com 2 cm de margem. A quimioterapia
de meningiomas (Figura 8), porém se faz necessário
é realizada com temozolamida dose oral com
o estudo vascular da lesão com exame da fase
melhores resultados para os casos que apresentam
arterial para a análise da aferência e nutrição tumoral
hipermetilação da MGMT. Terapias de resgaste e com
e estudo da fase venosa pela possibilidade de
uso de imunobiológicos como o bevacizumabe são
edema cerebral pós-operatório. Além disso, quando
utilizadas nos casos de recidivas com aumento do
a aferência tumoral for oriunda da artéria carótida
tempo livre de doença. Infelizmente, o glioblastoma
interna, deve-se suspeitar de meningiomas malignos,
apresenta uma taxa de sobrevida em torno de 15
como o meningioma papilar, meningosarcoma e
meses nas melhores séries.
também da possibilidade de hemangioperecitoma2,4.
Tratamento
MENINGIOMAS
A maioria dos casos de meningioma são
Meningiomas se originam da camada aracnoide tratados com a ressecção cirúrgica baseada
da dura-máter, podendo ocorrer em qualquer parte pela classificação de Simpson (Tabela 2). Essa
6
do SNC onde é circunscrita por este revestimento, classificação pode predizer a chance de recidiva.
inclusive os ventrículos cerebrais2. Podem ser O uso da neuronavegação, monitorização
classificados em: grau I (benignos), correspondem a neurofisiológica intraoperatória e uso de aspirador
80% dos casos; grau II (atípicos) tende a apresentar ultrassônico (para a realização do debulking ou
alta celularidade e sinais de proliferação e maior esvaziamento intratumoral) podem minimizar a
chance de recorrência; e, grau III (anaplásicos e manipulação do parênquima cerebral adjacente.
papilar) agressivos e malignos. Geneticamente, Os meningiomas da base do crânio ou em regiões
são encontradas deleções no cromossomo 22. consideradas de risco para lesão de estruturas
Existem receptores de progesterona e estrógeno neurovasculares com tamanho de até 3 cm
relacionados à hipertrofia e hiperplasia celular dos podem ser tratados com radiocirurgia (Figura 10).
meningiomas3. São mais frequentes em mulheres A embolização dos vasos nutridores pode ser
(3:1) com pico de incidência aos 60 anos. Gravidez, indicada em casos selecionados. Para meningiomas
uso de hormônios, exposição a radiação ionizante e anaplásicos, o tratamento quimioterápico pode ser
componente hereditário como neurofibromatose tipo empregado.
2 são fatores de risco para o desenvolvimento de
meningiomas2-4.
LINFOMAS
Quadro Clínico
A origem dos linfomas do SNC ainda é tema
Os sintomas podem ser bem distintos nos de muita controvérsia, sendo que a maioria é de
Capítulo 41 552
Figura 2: Imagens de RM com evidência de lesão infiltrativa, edema perilesional e acometimento de fibras brancas do
corpo caloso com extensão contralateral (A e B).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 41 553
Figura 5: Utilização de fluorosceína intraoperatória com sistema de microscopia e lentes fluorescentes (A e B). Notem as
áreas em verde as quais evidência m a maior área de metabolismo tumoral (C e D). O neurocirurgião consegue avaliar o
grau de ressecção quando não se observa mais a impregnação do corante.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 41 554
Figura 7: Algoritmo simplificado da classificação de um glioma difuso com base nas características histológicas e
genéticas.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 8: RM com evidência de extenso meningioma de convexidade à esquerda em A. corte axial; B. corte sagital e C.
imagem de TC pós-operatória.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 41 555
Figura 9: Meningioma de asa do esfenoide. A. vista coronal; B. vista sagital; C. angioRM sem evidência de nutrição pela
artéria carótida interna; D. vista em sistema de neuronavegação para o planejamento cirúrgico.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 10: Imagens do planejamento de radiocirurgia em meningioma de asa de esfenoide com invasão do seio
cavernoso, menor que 2,5 cm (A, B e C).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 41 556
Figura 11: Caso de linfoma do SNC, sendo realizada a biópsia estereotáxica com retirada de fragmentos das lesões
periventriculares. Nota-se em destaque em vermelho a diferenciação das lesões em relação ao parênquima cerebral (A
e B).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 41 557
células do tipo B, sendo os de células T mais raros.
TUMORES DE CÉLULAS GERMINATIVAS
Este tipo de neoplasia é mais comum nos idosos e
em pacientes imunossuprimidos, sendo responsável Conceitos básicos
por cerca de 6% das neoplasias do SNC . 7
Tumores de células germinativas ocorrem
principalmente na população pediátrica e,
Quadro clínico normalmente, originam-se do tecido embrionário,
O principal sintoma é a convulsão, seguida sendo os mais comuns tumores do saco de Yolk,
de déficits neurológicos focais rapidamente teratoma, teratocarcinoma, carcinoma embrionário
progressivos. Estes sintomas são potencializados e coriocarcinoma. Sua epidemiologia é a favor dos
em decorrência do característico edema perilesional. asiáticos, com predisposição ao sexo masculino e
constituem 2% dos tumores do SNC8 .
Diagnóstico
Em uma suspeita de linfoma do SNC, devem-
Quadro clínico
se procurar lesões periventriculares na substância
Germinomas crescem normalmente na
branca pela RM, porém podem ser encontrados
região pineal e região supraselar e particularmente
acometimentos corticais extensos, edema cerebral,
em relação com a haste hipofisária. Os sintomas
lesões císticas e lesões com captação de contraste.
podem ser decorrentes da hidrocefalia obstrutiva
Muitas vezes a realização de biópsia estereotáxica
pela compressão do aqueduto de Sylvius, distúrbios
será necessária para confirmar o diagnóstico e
hormonais, diabetes insipidus, insuficiência pituitária,
orientar o tratamento (Figura 11).
além de distúrbios visuais. Distúrbios hipotalâmicos
são muito frequentes nos germinomas, sendo
Tratamento caracterizados por crises gelásticas.
A maioria dos casos de linfoma pode ser
tratada de forma conservadora, exceto quando Diagnóstico
a lesão ocupa espaço e, consequentemente, Estes tipos de tumores podem apresentar altos
necessita de evacuação cirúrgica. Diferentes níveis de hormônios no líquor como alfafetoproteína
combinações de quimioterapia e radioterapia ou beta HCG. É mandatória a realização de RM no
têm sido utilizadas. Novos protocolos incluem o corte sagital para avaliação da relação da placa
uso de metotrexato e anticorpos monoclonais, quadrigeminal (Figura 12). A TC de crânio pode
porém com grande questionamento em relação à avaliar extensão de calcificação. Lesões da região
passagem destes pela barreira hematoencefálica. pineal, geralmente, são císticas e os teratomas são
O importante, nestes casos, é não iniciar terapia extremamente heterogêneos.
com corticoide até estabelecer o diagnóstico. Muitas
vezes, necessita-se de biópsia estereotáxica, pois a
lesão pode diminuir de forma significativa o tamanho
após o início do corticoide, dificultando o acesso.
O prognóstico dos linfomas ainda é considerado
desfavorável em uma boa parte dos casos.
Capítulo 41 558
principal grupo é representado pelos adenomas
do lobo anterior da hipófise, seguidos pelos
craniofaringeomas. Os meningiomas e metástases
também podem acometer a região selar. Muitos
destes tumores são ativos do ponto de vista
hormonal, sendo secretores de hormônios como
prolactina, hormônio do crescimento (GH), hormônio
adrenocorticoestimulante (ACTH), hormônio
tireoide estimulante (TSH) ou gonadotróficos (LH/
FHS). Na grande maioria são benignos, porém
existem adenomas anaplásicos e carcinomas, os
quais apresentam características agressivas. Os
craniofaringeomas surgem dos remanescentes
do ducto craniofaríngeo, do epitélio da bolsa de
Rathke, sendo frequentemente císticos e localmente
invasivos e, na sua imensa maioria, benignos WHO
Figura 12: Neoplasia da topografia da glândula pineal vista I. Os adenomas aparecem nos adultos jovens e os
em corte sagital com relação da placa quadrigeminal e craniofaringeomas mais em crianças9.
aqueduto cerebral.
Fonte: Os autores, 2021.
Quadro clínico
O quadro clínico depende do hormônio
Tratamento envolvido. Prolactinomas causam infertilidade,
forma multidisciplinar, sendo que o mais importante homens, causa de ginecomastia. Adenomas
que possível, a ressecção cirúrgica deverá ser secretores de ACTH causam hipercortisolismo
puro for obtido, o tratamento poderá ser preconizado levam ao quadro de hipertireoidismo também
Capítulo 41 559
intratumoral com uso de interferon-β pode ser opção
Diagnóstico
em tratamento de craniofaringeomas císticos em
O exame de eleição é a RM de sela túrcica
pacientes pediátricos em fase de crescimento.
(Figura 13), sendo que a TC é útil para avaliar
calcificações, especialmente nos craniofaringeomas,
os quais se apresentam na maioria das vezes
METÁSTASES
multicísticos e heterogêneos.
Conceitos básicos
Metástases são os tipos mais frequentes de
tumores do SNC. Com o aumento da expectativa
de vida associado ao maior controle das doenças
sistêmicas, a incidência de metástases cerebrais
tende a aumentar. São na maioria das vezes
disseminadas por via hematogênica. Podem ser
únicas ou múltiplas e têm como característica
edema adjacente desproporcional ao seu tamanho.
São consideradas solitárias quando somente elas
são diagnosticadas sem um diagnóstico primário
estabelecido. Os focos de metástases mais comuns,
em sua ordem de frequência, são: pulmão 45%;
mama 20%; melanoma 15%; carcinoma de células
renais 10%; carcinoma de cólon 5%; e outros
5%. Em números relativos, com probabilidade
Figura 13: RM de sela túrcica com evidência de adenoma
hipofisário. de disseminação para o SNC: melanoma é o que
Fonte: Os autores, 2021. mais origina metástases cerebrais 50%, seguido
de carcinoma pulmonar 25%, carcinoma de mama
25%, carcinoma de células renais 15% e carcinoma
Tratamento de cólon 5%10.
Os prolactinomas podem ser tratados com
o uso de agonistas dopaminérgicos; os adenomas Quadro clínico
secretores de GH com antagonistas do receptor Muitas metástases cerebrais são
de GH; e, os secretores de somatostatina podem assintomáticas. Podem ser suspeitadas pela
ser tratados com cetoconazol. Se mesmo com o presença de cefaleia e parestesia de membros ou
tratamento conservador refratário houver sinais como apresentação de síndromes paraneoplásicas
de compressão do quiasma com perda visual em pacientes oncológicos. Dependendo da
ou extensão do tumor em regiões adjacentes, localização, as metástases podem desenvolver
o tratamento cirúrgico é preconizado. O acesso sintomas neurológicos diversos. Na localização
transesfenoidal deverá sempre ser considerado. frontal, podem se apresentar com alterações
Em tumores com extensões suprasselares comportamentais, alterações visuais, déficits
ou com grandes envolvimentos de estruturas motores ou sensitivos e alterações da fala em
neurovasculares, o acesso transcraniano deverá hemisfério dominante. As metástases localizadas na
ser considerado. A radioterapia com radiocirurgia região temporal ou perirolândica cursam com crises
deverá ser considerada em tumores com extensão convulsivas. Frequentemente, as metástases podem
para o seio cavernoso. O uso de quimioterapia se apresentar com hemorragias cerebrais, levando à
Capítulo 41 560
síndrome de hipertensão intracraniana.
Diagnóstico
A RM pode apresentar lesão com captação de
contraste e centro necrótico, com edema perilesional,
mimetizando o glioblastoma. A multiplicidade é
um forte indicador de metástases (Figura 14). A
disseminação neoplásica nas meninges, o que
indica carcinomatose meníngea, pode ser avaliada
pela RM (Figura 15).
Tratamento
O tratamento deve ser definido a partir da
definição de grupos prognósticos de pacientes
favoráveis. Critérios foram definidos por Gaspar et
Figura 14: Imagens de RM mostrando uma lesão
al.11 (Recursive Partitioning Analysis, RPA) baseados
metastática com captação de contraste, centro necrótico e
edema perilesional. em 3 parâmetros: idade, controle da doença local
Fonte: Os autores, 2021. e performance pela escala de Karnofsky12 (KPS,
Tabela 3). A classe I inclui pacientes com KPS>70,
idade < 65 anos e doença controlada (média de
sobrevida 7,1 meses); classe II apresenta pacientes
com idade > 65 anos ou doença primária não
controlada (média de sobrevida 4,2 meses); e,
classe III comporta pacientes com KPS<70 (média
de sobrevida 2,3 meses). Assim, os pacientes de
classe I são considerados os melhores candidatos
para a cirurgia, enquanto os de classe III não são.
Capítulo 41 561
100% Sem sinais ou queixas, sem evidência de 3. Tahara A, de Santana PA Jr, Calfat Maldaun MV, et
al. Petroclival meningiomas: surgical management and
doença
common complications. J Clin Neurosci. 2009;16(5):655-
90% Mínimos sinais e sintomas, capaz de realizar 659.
suas atividades com esforço
4. Aguiar PH, Tahara A, Almeida AN, et al. Olfactory groove
80% Sinais e sintomas maiores, realiza suas meningiomas: approaches and complications. J Clin
atividades com esforço Neurosci. 2009;16(9):1168-1173.
70% Cuida de si mesmo, é capaz de trabalhar 5. Louis DN, Perry A, Reifenberger G, et al. The 2016
World Health Organization Classification of Tumors of the
60% Necessita de assistência ocasional, não é
Central Nervous System: a summary. Acta Neuropathol.
capaz de trabalhar
2016;131(6):803-820.
50% Necessita de assistência considerável e
6. Simpson D. The recurrence of intracranial meningiomas
cuidados médicos frequentes
after surgical treatment. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
40% Necessita de cuidados especiais 1957;20(1):22-39.
30% Extremamente incapacitado, necessita de 7. Grommes C, DeAngelis LM. Primary CNS Lymphoma. J
hospitalização, mas sem iminência de morte Clin Oncol. 2017;35(21):2410-2418.
20% Muito doente, necessita de suporte 8. Boop FA. Germ cell tumors. J Neurosurg Pediatr.
2010;6(2):123
10% Moribundo, morte iminente
9. Schwetye KE, Dahiya SM. Sellar Tumors. Surg Pathol
Tabela 3: Escala de performance de Karnofsky. Clin. 2020;13(2):305-329.
Capítulo 41 562
CAPÍTULO 42
NEOPLASIAS PRIMÁRIAS DO SISTEMA NERVOSO
CENTRAL
Quadro clínico
INTRODUÇÃO
Cefaleia e convulsões são os principais sintomas
As neoplasias primárias do sistema nervoso central vistos em tumores intracranianos, seguidos por
(SNC) compreendem uma vasta miscelânea de tumores sinais focais como alterações motoras, alterações da
classificados por critérios histopatológicos e imuno- coordenação ou alterações sensitivas. Os sintomas
histoquímicos. Em 2016, a OMS incorporou informações encontrados são decorrentes do envolvimento de
genotípicas para determinar diagnósticos, sendo um estruturas importantes, como áreas corticais eloquentes,
avanço considerável em relação às classificações nervos cranianos, tratos, ou por aumento da pressão
anteriores1. intracraniana. A instalação tende a ser progressiva,
podendo evoluir com agudização por inchaço, perda
Epidemiologia e etiologia
de complacência ou acidentes cerebrovasculares.
Aproximadamente 67% dos tumores do SNC são A correlação anátomo-clínica é fundamental para o
primários. Os tumores secundários, ou metastáticos, entendimento da sintomatologia.
correspondem a 33% dos casos. Segundo dados do
As neoplasias primárias raquimedulares também
INCA de 2020, as neoplasias primárias do SNC estão em
terão manifestações clínicas de acordo com a localização.
décimo quinto lugar em frequência, com incidência de 3-8
Dor é o sintoma mais encontrado. Meningiomas e
casos em homens e 2,6 a 7 em mulheres para cada 100
schwannomas são os tumores intradurais extramedulares
mil habitantes. Em crianças, são os tumores sólidos mais
mais frequentes, podendo ser achados incidentais de
frequentes e abrangem 20% dos casos, com um pico de
exames. A sintomatologia será lenta e progressiva e
incidência do primeiro ao quarto ano de vida2,3.
ocorrerá por envolvimento de raízes nervosas ou por
A histologia e a localização dos tumores variam rechaço ou infiltração da medula espinhal, ocasionando
conforme o sexo e faixa etária: gliomas acometem sinais de liberação piramidal. Lesões intradurais
homens com mais frequência, enquanto meningiomas intramedulares, como ependimomas ou astrocitomas,
acometem mais mulheres. Na população pediátrica, também evoluem com instalação lenta e progressiva dos
meduloblastomas e astrocitomas pilocíticos são os sintomas7,8.
tumores mais frequentes. Em adultos, 30% dos tumores
são infratentoriais; em crianças, 70%1,3-5.
Capítulo 42 563
desenvolvê-las12.
Investigação
A investigação com ressonância magnética
(RM) é o método de escolha para formular o GLIOMAS
diagnóstico e definir a abordagem terapêutica. Não Os gliomas são tumores originários da
existem sinais patognomônicos para diferenciar neuroglia e podem ter três origens celulares distintas:
tumores primários de secundários; todavia, métodos astrócitos, oligodendrócitos e células ependimárias.
avançados da RM conseguem refinar as hipóteses e Por conta disso, podem surgir no encéfalo ou na
devem ser incorporados ao arsenal de investigação. medula espinhal. Representam aproximadamente
A espectroscopia oferece informações 33% das neoplasias do SNC e mais de 80% das
químicas dos tecidos e diferencia tumores de outras neoplasias malignas encefálicas1,10,11.
doenças por evidenciar picos de colina; a perfusão Os astrocitomas pilocíticos são tumores grau
mostra a atividade sanguínea cerebral, também I da OMS, de crescimento lento e progressivo,
ajudando a refinar o diagnóstico e orientando biópsia. correspondendo a aproximadamente 5% de todos os
Outras técnicas como tractografia e RM gliomas. Possuem ótimo prognóstico, com sobrevida
funcional são aplicadas para estudar a relação em 10 anos maior que 95% após remoção cirúrgica
de estruturas importantes com o tumor, como por completa. É o glioma mais comum em crianças,
exemplo, o trato corticoespinhal, as vias ópticas, sobretudo em menores de 14 anos de vida e podem
áreas de Broca e Wernicke ou área motora ocorrer em adultos jovens. Raramente, ocorrem
suplementar 9-11
. em pacientes com mais de 50 anos de idade. Na
investigação com RM, se apresentam como lesões
Gradação e estadiamento císticas com nódulo captante no T1, frequentemente
na fossa posterior, onde tendem a cursar com
A graduação histológica dos tumores em quatro
hidrocefalia e sinais de hipertensão intracraniana.
graus distintos prediz o comportamento biológico.
Astrocitomas pilocíticos das vias ópticas cursam
As lesões grau I, apresentam baixo potencial
com defeitos visuais. Nestes casos, a cirurgia
proliferativo, sendo potencialmente curáveis com
tem papel de biópsia e o tratamento seguirá com
remoção cirúrgica. As lesões grau II são infiltrativas,
quimioterapia13.
apresentam baixa atividade mitótica e tendem a
evoluir com recorrência ou progredir para alto grau. Os tumores astrocitários difusos ou
As lesões grau III são tumores malignos infiltrativos, oligodendrogliomas compreendem neoplasias
com atipias nucleares, alto índice de mitoses e extremamente heterogêneas em histologia e
anaplasia. Por fim, os tumores grau IV são os mais genética, consequentemente com evoluções e
malignos, com necrose, progressão e recorrência prognósticos distintos. São tumores infiltrativos e
rápida e prognóstico fatal .
1,6 complexos devido ao comportamento incerto14.
Capítulo 42 564
para graus piores e, invariavelmente, responder calcificações, hemorragia ou cistos também pode
melhor ao tratamento 1,15,16
. ser ser vistos. A investigação do neuroeixo com RM
e pesquisa de citologia oncótica no líquor deve ser
Os oligodendrogliomas e astrocitomas
realizada quando se suspeita de ependimomas, visto
difusos são os gliomas grau II mais frequentes.
que, nos ependimomas grau II e III, o envolvimento do
São frequentemente supratentoriais, não captantes
espaço subaracnoide pode ocasionar disseminação
no T1 e melhor visíveis na sequência FLAIR
e/ou envolvimento da medula espinhal (Figura 3).
da RM (Figura 1). Os oligodendrogliomas se
Em casos complexos, pode haver vários tumores
diferenciam pela presença de mutação e codeleção
com localizações distintas ou lesões gigantes,
nos cromossomos 1p e 19q. Isso é identificável
holocord. O tratamento adjuvante com irradiação
através da análise molecular e se traduz como
tem papel fundamental, visto a dificuldade com
um melhor prognóstico e uma melhor resposta
terapias sistêmicas1,20.
ao tratamento. Os astrocitomas difusos tendem
a ter um comportamento menos favorável que os Dentre outros tipos de ependimomas,
oligodendrogliomas. Entretanto, todos tendem a destacam-se os subependimomas, que consistem
evoluir com progressão e dediferenciação para em tumores grau I, indolentes, de crescimento lento,
lesões de alto grau e podem apresentar recorrência curativos com remoção cirúrgica; e, ependimomas
mesmo após o tratamento. A gliomatose cerebri é mixopapilares, lesões grau I, encontrados com mais
definida como o acometimento de três ou mais lobos frequência em adultos jovens, de origem no cone
infiltrados pelo tumor e, a partir da classificação medular e no filum terminalis, também curativos com
da OMS de 2016, passou a ser descrita como um remoção cirúrgica completa1,2,19.
padrão de progressão dos gliomas17.
Os glioblastomas são gliomas grau IV,
As lesões grau III são os astrocitomas sendo neoplasias malignas muito agressivas e
anaplásicos ou oligodendrogliomas anaplásicos. invariavelmente fatais. Possuem um microambiente
São tumores malignos que já se manifestam na imunossupressor e heterogêneo, comprometendo
investigação como lesões infiltrativas captantes no a resposta terapêutica. Correspondem a 15% de
T1 (Figura 2). Mesmo em caso de remoção cirúrgica todos os tumores intracranianos e 65 a 75% dos
completa, o tratamento adjuvante estará indicado, gliomas. O prognóstico esperado costuma ser de 15
com irradiação do leito operatório e/ou quimioterapia meses de vida, onde pouco mais de 50% estará vivo
adjuvante. A sobrevida esperada varia de 2 a 5 após dois anos do tratamento. Quanto à expressão
anos 1,10,14
. de IDH, 90% dos glioblastomas são negativos, ou
seja, são tumores que já surgiram como grau IV e
Os ependimomas derivam das células
denominados de glioblastomas primários. Os IDH
ependimárias que revestem os ventrículos e surgem
positivos ocorrem em 10% dos casos, chamados
com mais frequência no IV ventrículo. Correspondem
de glioblastomas secundários por terem origem de
a menos de 10% dos tumores primários do SNC.
linhagens de menor grau. Na RM, se apresentam
Na população pediátrica, contam como 5% dos
como tumores captantes no T1, com áreas
tumores primários do SNC, com idade média de
necróticas, edema adjacente e efeito de massa.
diagnóstico aos 5 anos de idade e ocorrendo em
Em alguns casos, podem ser multicêntricos, com a
60% dos casos na fossa posterior. Em adultos, 75%
presença de áreas captantes à distância1,21,22
dos casos ocorrem no canal ependimário da medula
espinhal. A sintomatologia ocorrerá de acordo com a O tratamento convencional consiste em
localização 18,19
. máxima remoção cirúrgica com preservação
funcional seguida do esquema de irradiação com
Na imagem tendem a realçar com contraste
quimioterapia (temozolamida) concomitante e, em
como nódulos captantes bem delimitados. As
Capítulo 42 565
Figura 1: Glioma de baixo grau frontal direito. A. na linha superior, imagens T1 pós-contraste da RM, sem evidenciar
captação; na linha inferior, imagens do FLAIR, demonstrando a lesão hiperintensa. B. espectroscopia (coluna esquerda)
com inversão do pico de colina e perfusão (coluna direita) fria.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 2: Astrocitoma anaplásico. A. imagem da sequência T1 pós-contraste, evidenciando infiltração tumoral com
edema e efeito de massa, realçando na insula e lobo frontal esquerdo. B. imagem transoperatória, após a craniotomia,
mostrando a interface entre o tumor e o cérebro normal.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 42 566
Figura 3: Ependimoma. A. imagem T1 pós-contraste da RM, evidenciando lesão captante com cisto no IV ventrículo; B.
aspecto intraoperatório; C. imagem intraoperatória demonstrando fluorescência 5-ALA positiva (tumor em vermelho).
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 4: Glioblastoma. A. imagem T1 pós-contraste da RM demonstrando tumor captante com necrose e efeito de
massa e hérnia uncal no lobo temporal direito; B. imagem intraoperatória sem (superior) e com (inferior) a fluorescência
5-ALA positiva; C. imagem T1 pós-contraste no pós-operatório imediato, evidenciando remoção máxima da área
captante.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 42 567
Figura 5: Biópsia estereotáxica com neuronavegação de um glioblastoma no mesencéfalo. A. sistema frameless para
colocação da agulha; B. imagem da orientação intraoperatória; C. aspecto dos fragmentos para a congelação sem
(superior) e com (inferior) fluorescência 5-ALA positiva.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 7: meningioma. A. imagem T1 pós-contraste da RM evidenciando lesão nodular parassagital frontal esquerda; B.
intraoperatório com remoção Simpson I; C e D. status do tumor sem e com a fluorescência 5-ALA positivo.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 8: adenoma hipofisário. A. macroadenoma hipofisário, com extensão suprasselar em um corte T1 sagital; B e
C. microadenoma hipofisário, visível apenas em sequência dinâmica (identificado pela seta vermelha, hipointenso em
relação ao parênquima hipofisário).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 42 568
seguida, temozolamida por 6 meses. Para o arsenal Na suspeita de um meduloblastoma, a
intraoperatório existem diversas ferramentas investigação de todo o neuroeixo com RM e pesquisa
empregadas para otimizar a citorredução: RM de células neoplásicas no líquor são fundamentais
intraoperatória, fluorescência com 5-ALA, cirurgia para estadiamento7,26.
acordado, patologia intraoperatória, biópsias
Com a classificação de 2016 da OMS, os perfis
seriadas (Figuras 4 e 5). Visto a dificuldade em
moleculares dos meduloblastomas foram adicionados
se identificar limites entre cérebro normal e tecido
aos achados imunohistoquímicos, dividindo-os em
infiltrado na cirurgia dos gliomas, tais técnicas
quatro grupos com características e prognósticos
orientam melhor a remoção, tornando a primeira
distintos. O grupo 1 WNT-ativado corresponde a
etapa do tratamento mais segura.
aproximadamente 10% dos casos, possui histologia
Além do IDH1, o outro marcador molecular clássica, baixo risco e melhor prognóstico. O
importante para os glioblastomas é a metilguanina- grupo 2 SHH-ativado compreende 30% dos casos,
metiltransferase (MGMT), uma enzima de reparo possui histologia clássica ou desmoplásico/nodular,
molecular capaz de remover uma metilação. tendo prognóstico bom em crianças e sendo mais
Os tumores MGMT positivos tendem a ter uma grave em adultos. Tumores não-WNT/não-SHH
melhor resposta ao tratamento sistêmico com a dos grupos 3 e 4 correspondem a 20% e 40% dos
temozolamida, um agente alquilante. A recidiva dos meduloblastomas, respectivamente. São variantes
glioblastomas ocorre nas margens do leito operatório provisórias, ainda não tão bem diferenciadas como
em 90% dos casos. Não existem consensos claros os grupos 1 e 2, e possuem pior prognóstico e maior
quanto ao retratamento. Se o paciente tiver condições risco de metástase para o neuroeixo1.
clínicas, a reoperação pode ser considerada, assim
A remoção cirúrgica do tumor seguida de
como reirradiação. O bevacizumabe tem sido
tratamento adjuvante com radioterapia do neuroeixo
utilizado como terapia sistêmica na recorrência da
e quimioterapia é o tratamento preconizado para
doença23-25.
crianças maiores e adultos. Em crianças menores de
3 anos de idade ou em pacientes com ótima condição
clínica, o transplante de medula autólogo pode ser
MEDULOBLASTOMAS considerado, dispensando a irradiação. Apesar das
Os meduloblastomas são tumores terapias disponíveis permitirem uma sobrevida maior
neuroepitelioides embrionários de origem cerebelar que 80% após 5 anos, seus efeitos colaterais podem
ou do dorso do tronco encefálico, de apresentação ocasionar complicações tardias como distúrbios
mais comum em crianças. Classificam-se como cognitivos ou doenças endocrinológicas2,9,10.
tumores grau IV da OMS, sendo o tipo de tumor
embrionário mais comum e a neoplasia maligna
SCHWANNOMA VESTIBULAR
mais frequente na infância.
Schwannomas são tumores de origem nas
Aproximadamente um quarto dos
células de Schwann da bainha nervosa periférica.
meduloblastomas ocorre em adultos, onde
São benignos e de crescimento lento (grau I da
menos de 1% dos tumores intracranianos são
OMS). Podem surgir na periferia, intraespinhal ou
meduloblastomas. Por crescerem dentro do IV
intracraniano. As raízes dorsais (sensoriais) são
ventrículo, cursam com efeito de massa e bloqueio do
mais frequentemente afetadas do que motoras.
fluxo liquórico, ocasionando hidrocefalia obstrutiva
com cefaleia e vômitos de instalação progressiva. De 5 a 10% de todos os tumores intracranianos
Capítulo 42 569
vestibulares, também conhecidos como neurinomas do schwannoma vestibular. O acesso transmastoideo
do acústico, são os tumores da bainha neuronal translabiritino é utilizado principalmente por
mais frequentes. Representam aproximadamente 6 otologistas, quando não se intenciona preservar a
a 8% de todos os tumores intracranianos primários, audição, em casos de tumores maiores que 2,5cm.
sendo originários das células de Schwann da O acesso pela fossa média é extradural e permite
bainha de mielina de um dos nervos vestibulares, uma exposição da porção lateral do meato acústico
no interior do meato acústico interno. Corresponde interno. Esta abordagem é quase exclusivamente
a aproximadamente 80% dos tumores do ângulo utilizada em casos de tumores restritos ao interior do
pontocerebelar. Schwannomas bilaterais ocorrem meato acústico interno. O acesso retrossigmoideo
em 4 a 5% dos casos e são encontrados em pode ser indicado para tumores de todos os
portadores de neurofibromatose tipo 2 27,28
. formatos e é o acesso de escolha da maioria dos
neurocirurgiões. Permite ampla exposição do ângulo
Perda auditiva unilateral progressiva
pontocerebelar, broqueamento do meato acústico
constitui a apresentação clínica mais frequente.
interno e preservação dos nervos facial e coclear,
Tinnitus unilateral ou sintomas vestibulares como
quando possível (Figura 6).
desequilíbrio e tonturas de instalação progressiva
também podem ocorrer. O diagnóstico é feito através A radiocirurgia também tem sido uma opção
de RM. A TC tem utilidade para avaliar a parte não invasiva e eficaz para controle a longo prazo
petrosa do temporal, labirinto e o meato acústico do tumor, sobretudo em pacientes sem condições
interno. A audiometria é utilizada para analisar se o clínicas32.
paciente ainda possui alguma audição útil.
• T2: tumor intrameatal com pequeno com- intracraniana como espinhal, causando sintomas
ponente extrametatal; por compressão das estruturas neurovasculares
adjacentes.
• T3a: tumor preenchendo a cisterna do ân-
gulo pontocerebelar; Aproximadamente 37% dos tumores cerebrais
primários são meningiomas. Em mais de 90% dos
• T3b: tumor tocando o tronco encefálico, casos, são tumores solitários. Há uma ocorrência
sem rechaço; duas vezes maior em mulheres do que em homens,
• T4a: tumor com compressão do tronco en- devido ao envolvimento de receptores de estrogênio
cefálico; e e progesterona. Estima-se de que 20 a 25% dos
meningiomas sejam grau II (atípicos) da OMS e 1
• T4b: tumor com compressão do tronco a 6% sejam grau III (anaplásicos), aumentando
encefálico e rechaço do IV ventrículo, fre-
significativamente as chances de recorrência da
quentemente causando hidrocefalia.
doença após tratamento.
A remoção cirúrgica é um tratamento curativo
Os locais de surgimento são: na foice do
e é a principal modalidade de tratamento29-31. Três
cérebro ou parassagital (20 a 25%), na convexidade
abordagens cirúrgicas são utilizadas no tratamento
(19 a 35%), na asa esfenoidal (17 a 20%), na fossa
Capítulo 42 570
posterior (13%), intraventricular (5%) e no tubérculo tumor e coagulação da base de implanta-
selar e goteira olfatória (3 a 10%) 7,33
. ção dural; 19% de recorrência sintomática
após 10 anos;
Sintomas como cefaleia ou convulsões são
comuns, porém inespecíficos. Sinais localizatórios, • Simpson grau III: remoção completa
como hemiparesia, alterações do estado mental ou do tumor sem coagulação ou remoção
déficit de nervos cranianos ocorrem de acordo com da dura-máter; 29% de recorrência
sintomática após 10 anos;
o local da lesão e efeito de massa adjacente2,8,9.
Capítulo 42 571
aproximadamente 10% das neoplasias primárias transnasal transesfenoidal é indicada para a
intracranianas. Podem prevalecer em uma a cada maioria dos tumores operáveis, sendo os acessos
6 pessoas da população geral por serem achados transcranianos reservados para lesões volumosas
frequentes de imagem sem relevância clínica com infiltração ou extensão para ou retrosselar7,8.
(incidentalomas) e sem necessidade de intervenção
terapêutica.
CRANIOFARINGIOMAS
Os adenomas podem ser divididos quanto a
Craniofaringiomas são tumores de
suas dimensões: menor que 10 mm são considerados
comportamento histologicamente benigno,
microadenomas e são mais frequentes; maior ou
parcialmente císticos. Têm origem presumível de
igual que 10 mm são macroadenomas e podem
remanescentes embrionários da bolsa de Rathke
causar sintomas visuais (hemianopsia heterônima)
e constituem 1,2 a 4,6% de todos os tumores
por compressão do quiasma óptico. A avaliação
intracranianos. Correspondem a 5 a 11% dos tumores
com sequências dinâmicas da RM para a hipófise
intracranianos em crianças de 5 a 14 anos, sendo
é importante para diferenciar a glândula do tumor,
as neoplasias não-neuroepitelial mais comuns nesta
sobretudo em microadenomas. Há um atraso da
faixa etária. Também podem acometer idosos1,38.
lesão em relação à hipófise na captação do contraste
(Figura 8). Geralmente os craniofaringiomas se localizam
na cisterna suprasselar e causarão sintomas
Quanto ao funcionamento hormonal, os
inespecíficos como perda visual (visto em 62 a
adenomas podem ser classificados em não-
84% dos pacientes, sobretudo adultos) e alterações
secretores ou secretores. Os não-secretores
endocrinológicas (visto em 52 a 87% dos pacientes,
tendem a ser assintomáticos, salvo quando
sobretudo crianças). Cerca de 17% das crianças
possuem dimensões grandes o suficiente para
e 30% dos adultos podem evoluir com diabetes
causar compressão quiasmática. Dentre os
insípido e aproximadamente metade dos pacientes
secretores, os prolactinomas constituem cerca de
podem apresentar alterações cognitivas ou de
40% dos adenomas hipofisários e são dez vezes
personalidade. Apesar de ser uma lesão grau I da
mais frequentes em mulheres do que em homens,
OMS, seu tratamento é extremamente complexo
com maior incidência nas segunda e terceira
e desafiador, face às altas taxas de recidiva e de
décadas de vida. Os secretores do hormônio do
complicações a longo prazo.
crescimento (GH) e de ACTH são menos frequentes
e respondem, respectivamente, por 3 e 5% dos Nas imagens T1 pós-contraste da RM, a porção
adenomas hipofisários. O adenoma secretor de GH cística do craniofaringioma é isointensa, com realce
é a principal causa de acromegalia, ocasionando anelar, enquanto a porção sólida é hiperintensa. A
fácies acromegálica e aumento das extremidades, TC é importante para avaliar calcificações.
entre outros achados clínicos característicos; já O tratamento cirúrgico consiste em remoção
o secretor de ACTH causa a doença de Cushing, transcraniana ou endoscópica transnasal
identificável pela fácies cushingoide. transesfenoidal, de acordo com as dimensões e
Enquanto os prolactinomas podem ser localização da lesão. Quando o componente cístico
tratados com medicamentos inibidores como a é predominante, a colocação de um reservatório de
carbergolina ou a bromocriptina, os secretores Ommaya pode se realizada para infusão intracística
de GH e ACTH tendem a depender de cirurgia. A de agentes quimioterápicos, como a bleomicina.
irradiação é utilizada como terapêutica em lesões A irradiação tem papel importante no
infiltrativas, irresecáveis e/ou recidivadas. Dentre tratamento dos craniofaringiomas em casos de
as abordagens cirúrgicas, a cirurgia endoscópica remoção parcial ou recorrência. A terapia sistêmica
Capítulo 42 572
com quimioterápicos adjuvantes pode ter valor em tumores da pineal são pineocitomas. Aparecem na
casos mais agressivos 7,39,40
. RM como lesões fortemente captantes em T1. A
remoção cirúrgica é o tratamento de escolha e o
prognóstico é bom.
TUMORES DA PINEAL O pineoblastoma consiste em uma lesão
Os tumores da região pineal são responsáveis maligna, grau IV da OMS, contando como 35% dos
por aproximadamente 1% de todas as neoplasias tumores da pineal. Pode acometer em qualquer idade,
cerebrais. Acometem principalmente crianças com predileção para menores de 20 anos de idade.
(onde correspondem entre 3 a 8% dos tumores Na RM, se apresenta como massas multilobuladas
intracranianos) ou adultos com menos de 40 anos. na pineal, invadindo estruturas adjacentes, incluindo
Podem ser de um único tipo ou um misto entre teto do mesencéfalo, tálamo e esplênio do corpo
tipos distintos. Em 27% dos casos se originam do caloso. Inchaço e/ou cistos necróticos podem ser
parênquima da pineal . 1,7
observados. A captação de contraste em T1 pode
ser heterogênea.
A graduação dos tumores da pineal varia
conforme o tipo. A sintomatologia se manifesta à Entre 14 e 22% dos tumores da pineal podem
proporção em que crescem e causam efeito de ser gliomas. A maioria destes casos são astrocitomas
massa local, pressionando a lâmina quadrigeminal pilocíticos41,42.
ou obstruindo o aqueduto do mesencéfalo e
cursando com hidrocefalia. Cefaleia e vômitos e/
ou alterações da motricidade ocular são os quadros REFERÊNCIAS
clínicos mais frequentes. Além das imagens de 1. Louis DN, Ohgaki H, Wiestler OD, et al (Eds).
RM, a análise do líquor para dosagem da fosfatase Classification of Tumours of the Central Nervous System.
4th ed. WHO; 2016.
alcalina placentária e da gonadotrofina coriônica
2. Kaye AH, Laws ER (Eds). Brain Tumors. 3th ed. Elsevier;
humana (HCG) fazem parte da rotina diagnóstica. 2014.
Entre os tumores encontrados na pineal estão: 3. QT Ostrom, Gittleman MPHH, Truitt MSG, et al. CBTRUS
Statistical Report: Primary Brain and Other Central Nervous
O germinoma de pineal a lesão mais System Tumors Diagnosed in the United States in 2011–
2015. Neuro-Oncology. 2018;20(4):iv1-iv86.
comum, representando mais de 50% dos tumores
4. Arora RS, Alston RD, Eden TOB, et al. Age–incidence
de pineal e a aproximadamente 80% dos tumores patterns of primary CNS tumors in children, adolescents,
intracranianos de células germinativas. Acomete and adults in England. Neuro-Oncology. 2009;11(4):403-
413.
principalmente pacientes com menos de 20 anos
de idade. Possui origem de células germinativas 5. Desandes E, Guissou S, Chastagner P, Lacour B.
Incidence and survival of children with central nervous
primordiais totipotentes, sendo análogo aos tumores system primitive tumors in the French National Registry of
germinativos gonadais. Na RM, se apresenta como Childhood Solid Tumors. Neuro Oncol. 2014;16(7):975-983.
um tumor de captação heterogênea. A elevação da 6. Lantos PL, Louis DN, Rosenblun MK, Kleihues P.
Tumours of the nervous system. In: Graham DI, Lantos PL
fosfatase alcalina placentária e do HCG liquóricos (eds). Greenfield’s neuropathology. 9th ed. New York: Arnold
é diagnóstica. A irradiação consiste na principal Publishers. 2015.
modalidade terapêutica, com boa resposta e 7. Greenberg MS. Manual de Neurocirurgia. 9 ed. Thieme;
2019.
sobrevida.
8. Kaye AH. Essential Neurosurgery. 4th ed. Malden:
O pineocitoma é um tumor grau I da Blackwell; 2006.
OMS e possui crescimento lento, ocorrendo 9. Winn R. Youmans and Winn Neurological Surgery. 7th ed.
preferencialmente em adultos, mas podendo surgir Elsevier; 2016.
em qualquer faixa etária. Entre 17 e 30% dos 10. Berstein M, Berger MS. Neuro-Oncology: The
Essentials. 3th ed. Thieme; 2015.
Capítulo 42 573
11. Hinojosa AQ, Raza SM. Controversies in Neuro- 29. Koerbel A, Gharabaghi A, Safavi-Abbasi S, Tatagiba
Oncology Best Evidence Medicine for Brain Tumor Surgery. M, Samii M. Evolution of vestibular schwannoma surgery:
Thieme; 2014. the long journey to current success. Neurosurg Focus.
2005;18(4):e10.
12. Nabors LB, Portnow J, Ammirati M, et al. Central
Nervous System Cancers. National Comprehensive Cancer 30. Matthies C, Samii M. Management of 1000 vestibular
Network. disponível em: https://www.nccn.org/professionals/ schwannomas (acoustic neuromas): clinical presentation.
physician_gls/pdf/cns.pdf. Versão 2.2019. 16.09.2019. Neurosurgery. 1997;40(1):1-9.
13. Tihan T, Ersen A, Qaddoumi I, et al. Pathologic 31. Gharabaghi A, Samii A, Koerbel A, Rosahl SK,
characteristics of pediatric intracranial pilocytic astrocytomas Tatagiba M, Samii M. Preservation of function in vestibular
and their impact on outcome in 3 countries: a multi- schwannoma surgery. Neurosurgery. 2007;60(2):ONS124-7.
institutional study. Am J Surg Pathol. 2012;36(1):43-55.
32. Persson O, Bartek J Jr, Shalom NB, Wangerid T,
14. Raizer, J, Parsa, A. Current Understanding and Jakola AS, Förander P. Stereotactic radiosurgery vs.
Treatment of Gliomas. Springer. 2015. fractionated radiotherapy for tumor control in vestibular
schwannoma patients: a systematic review. Acta Neurochir.
15. Yan H, Parsons DW, Jin G, et al. IDH1 and IDH2
2017;159(6):1013-1021.
mutations in gliomas. N Engl J Med. 2009;360(8):765-773.
33. Aguiar PHP, Ramina R, Veiga JCE, Junior OT.
16. Picca A, Berzero G, Di Stefano AL, Sanson M. The
Meningiomas: Diagnóstico e Tratamento Clínico e Cirúrgico
clinical use of IDH1 and IDH2 mutations in gliomas. Expert
- Aspectos Atuais. 1º ed. Thieme; 2006.
Rev Mol Diagn. 2018;18(12):1041-1051.
34. Pamir MN, Black PM, Fahlbusch R. Meningiomas. 1º ed.
17. Duffau H. Diffuse Low-Grade Gliomas in Adults. 2
Elsevier; 2010.
edição. Springer; 2017.
35. Ramina R, Neto MC, Fernandes YB, Aguiar PH, de
18. Maksoud YA, Hahn YS, Engelhard HH. Intracranial
Meneses MS, Torres LF. Meningiomas of the jugular
ependymoma. Neurosurg Focus. 2002;13(3):e4.
foramen. Neurosurg Rev. 2006;29(1):55-60.
19. Hübner JM, Kool M, Pfister SM, Pajtler KW.
36. Pires de Aguiar PH, Aires R, Maldaun MV, et al. Is
Epidemiology, molecular classification and WHO grading of
sagittal sinus resection in falcine meningiomas a factor of
ependymoma. J Neurosurg Sci. 2018;62(1):46-50.
bad surgical outcome? Surg Neurol Int. 2010;1:64.
20. Leeper H, Felicella MM, Walbert T. Recent Advances
37. da Silva EB Jr, Leal AG, Milano JB, da Silva LF Jr,
in the Classification and Treatment of Ependymomas. Curr
Clemente RS, Ramina R. Image-guided surgical planning
Treat Options Oncol. 2017;18(9):55.
using anatomical landmarks in the retrosigmoid approach.
21. Wirsching HG, Galanis E, Weller M. Glioblastoma. Acta Neurochir (Wien). 2010;152(5):905-910.
Handb Clin Neurol. 2016;134:381-97.
38. Torres LF, Reis Filho JS, Netto MR, et al
22. Weller M, Felsberg J, Hartmann C, et al. Molecular Craniofaringiomas. Achados clínicos, epidemiológicos
predictors of progression-free and overall survival in e anatomopatológicos de 25 casos. Arq Neuropsiquiatr.
patients with newly diagnosed glioblastoma: a prospective 1999;57(2A):255-260.
translational study of the German Glioma Network. J Clin
39. Chakrabarti I, Amar AP, Couldwell W, Weiss MH. Long-
Oncol. 2009;27(34):5743-5750.
term neurological, visual, and endocrine outcomes following
23. Stupp R, Mason WP, van den Bent MJ, et al. transnasal resection of craniopharyngioma. J Neurosurg.
Radiotherapy plus concomitant and adjuvant temozolomide 2005;102(4):650-657.
for glioblastoma. N Engl J Med. 2005;352(10):987-996.
40. Ohmori K, Collins J, Fukushima T. Craniopharyngiomas
24. Oberheim Bush NA, Hervey-Jumper SL, Berger MS. in children. Pediatr Neurosurg. 2007;43(4):265-278.
Management of Glioblastoma, Present and Future. World
41. Sonabend AM, Bowden S, Bruce JN. Microsurgical
Neurosurg. 2019;131:328-338.
resection of pineal region tumors. J Neurooncol.
25. Brown TJ, Brennan MC, Li M, et al. Association of 2016;130(2):351-366.
the Extent of Resection With Survival in Glioblastoma:
42. Frappaz D, Conter CF, Szathmari A, Valsijevic A,
A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Oncol.
Mottolese C. The management of pineal tumors as a
2016;2(11):1460-1469.
model for a multidisciplinary approach in neuro-oncology.
26. Millard NE, De Braganca KC. Medulloblastoma. J Child Neurochirurgie. 2015;61(2-3):208-211.
Neurol. 2016;31(12):1341-1353.
27. Cardoso AC, Fernandes YB, Ramina R, Borges G.
Acoustic neuroma (vestibular schwannoma): surgical results
on 240 patients operated on dorsal decubitus position. Arq
Neuropsiquiatr. 2007;65(3A):605-609.
28. Veronezi RJ, Fernandes YB, Borges G, Ramina
R. Long-term facial nerve clinical evaluation following
vestibular schwannoma surgery. Arq Neuropsiquiatr.
2008;66(2A):194-198.
Capítulo 42 574
CAPÍTULO 43
TUMORES DE BASE DO CRÂNIO
Capítulo 43 575
gigantes de goteira olfativa13-15.
O potencial evocado, muitas vezes, pode ser Figura 2: Anatomia do ângulo ponto cerebelar, observa-se
o nervo trigêmeo e a artéria cerebelar superior.
usado em compressão dos tumores, principalmente,
Fonte: Os autores, 2021.
no forame magno4-6,10-12.
ANATOMIA ENVOLVIDA
O andar anterior tem as órbitas como limites
laterais e as clinoides e asa esfenoidal como limites
posteriores e laterais. A lâmina cribiforme fica
entre as duas órbitas e, sem dúvida, essa região
(conhecida como goteira olfativa) é irrigada pelas
artérias etmoidais, que muitas vezes são usadas no
pré-operatório como vias arteriais para embolização
com partículas, principalmente em meningiomas
Capítulo 43 576
causar distúrbios visuais, pela compressão das vias
ópticas. Edema de papila está presente quando
ocorrer hipertensão intracraniana, nos casos de
tumores volumosos e com grande grau de edema.
A atrofia e edema de papila por hipertensão
intracraniana de meningiomas de goteira olfatória
e da asa esfenoidal causam a síndrome de Foster
Kenedy24.
TUMORES PRINCIPAIS
Meningiomas
Os meningiomas são tumores originados na
aracnoide (cap cells) que tem receptores hormonais
(estrógeno, progesterona e testosterona) envolvidos
nos fatores de sinalização e crescimento18. Estas
neoplasias são benignas (85%), atípicas (11%) e
malignas (4%)19,20. Esses tumores são ovalados, com
base de implantação alargada voltada para dura-máter
e nutrição de artérias meníngeas. Edema exuberante
e contornos irregulares e captação irregular de
contraste, nas imagens de RM, estão associados
a malignidade18,21-23. Podem ser meningoteliais,
Figura 4: Nasoangiofibroma, visto na RM (T1).
transicionais, fibrosos, angioblásticos, psamomatosos,
Fonte: Os autores, 2021.
microcísticos e linfoplasmocitários. Os meningiomas
de células claras e cordoides são atípicos; já os
papilíferos e rabdoides são malignos5,21. São mais Os meningioma órbito-esfenoidais podem
incidentes em mulheres em uma relação de 3:1 e nas causar proptose, por invasão da órbita, e danos
idades entre 45 e 60 anos. Está associado a gravidez, a motricidade ocular extrínseca, assim como os
displasia mamária e câncer de mama 3,5,21
. esfenoidais (Figura 5) e os meningiomas do seio
cavernoso (Figura 6)17. Os meningiomas do seio
Quando na base do crânio anterior podem
Capítulo 43 577
cavernoso podem causar estreitamento das artérias Os meningiomas petroclivais, por sua vez,
carótidas intracranianas. Sintomas de oclusão crônica comprimem nervos pontinhos (Figura 5)27-29.
também podem ser detectados, como amaurose
fugaz, em jovens, além de trombose do seio cavernoso
com paralisia dos nervos oculomotores.
Figura 5: Meningioma de asa esfenoidal vista na RM (T1). Figura 7: Meningioma clival visto na RM (T1).
Fonte: Os autores, 2021. Fonte: Os autores, 2021
Capítulo 43 578
Figura 8: Meningioma de forame magno, visão cirúrgica.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 43 579
do meato é mandatória antes da dissecção do tumor,
do esvaziamento e da dissecção de sua cápsula
(Figura 12). O prognóstico é bem favorável quando
a dissecção é completa, porém quando existe lesão
residual de grande volume a radiocirurgia pode estar
indicada19,33.
Schwannomas
Os schwannomas são neoplasias originárias de
bainhas de nervos (nervos periféricos e cranianos) com
predomínio em mulheres, por questões de receptores
hormonais, entre 20 e 60 anos7. Em jovens, pode estar
Figura 12: Posicionamento cirúrgico para schwannoma do
associada a neurofibromatose do tipo 219. Quando acústico.
localizado no ângulo pontocerebelar (Figura 2), é Fonte: Os autores, 2021.
originário dos nervos vestibulares superiores, levado
à perda auditiva por compressão e envolvimento do Podem se originar também do nervo trigêmeo
nervo coclear e, muitas vezes, paralisia facial (Figura (cavo de Meckel, no seio cavernoso ou em qualquer
11) por compressão do nervo facial. Na neuralgia porção do nervo trigêmeo) podendo levar à
trigeminal ou hipoestesia do território do trigêmeo trigeminalgia ou hipoestesia19.
podem ocorrer, quando volumosos . 17
Normalmente, na RM, mostram-se em forma
de ampulheta ou oito, e podem ser císticos ou
completamente sólidos. Os acessos podem ser
retrossigmoideos, fronto-órbito-zigomáticos ou
acessos diretos de fossa média (Figuras 13 e 14) 8,19
.
Capítulo 43 580
Histologicamente, podem ser benignos ou
anaplásicos. Possuem áreas com tecido conjuntivo
denso (Antoni A) e tecido conjuntivo frouxo (Antoni
B). O diagnóstico deve basear-se na RM, nas
imagens de T1 com gadolínio, e T2 (Figuras 13 e
14). No pré-operatório, TC com janela óssea deve
ser feita para detectar erosões, como do meato,
forame jugular e cavo de Meckel.
Adenomas hipofisários
Os adenomas hipofisários constituem
neoplasias frequentes que habitam a sela turca
e podem se expandir para o seio esfenoidal,
suprasselar, terceiro ventrículo e seio cavernoso.
Capítulo 43 581
dosagem de dexametasona noturna34. Importante transesfenoidal clássica sublabial ou endonasal, por
é referir que diagnósticos errados podem levar a meio de microcirurgia ou endoscopia (Figuras 16
adrenalectomia bilateral, com escurecimento da e 17)35. As principais complicações da cirurgia são
pele do paciente pelo efeito melanocítico, devido hipopituitarismo e fístula liquórica. O sangramento
à presença de tumor de hipófise não detectada durante a cirurgia por lesão arterial pode chegar a
(síndrome de Nelson). até 2,5%35,37-39. O microadenoma é mais relacionado
à circulação anterior e o macroadenoma à circulação
Há outros tumores produtores de FSH e
posterior 33.
LH, porém o mais frequente é prolactinoma, por
hiperfunção e displasia das células mamotróficas
da adenohipófise produtoras de prolactina. A
amenorreia primária, perda de libido e galactorreia
são sintomas frequentes.
Capítulo 43 582
Figura 18: Craniofaringioma visto na RM (T2).
Figura 17: Abordagem endonasal endoscópica do tumor
de hipófise. Fonte: Os autores, 2021.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 43 583
Cordomas
Os cordomas de clivus são tumores
embrionários que surgem das células da sincondrose
esfeno-occipital e da região sacral46,47. Acomete
pacientes entre 20 e 50 anos, caucasianos, sem
predomínio de sexo. Na base do crânio, invadem
o clivus e se estendem para a cisterna do forame
magno, e podem comprometer vasos arteriais e
nervos cranianos (Figura 22). Muitas vezes, levam
ao acometimento de quase todos os nervos de um
lado, levando à síndrome de Garçan. As células
Capítulo 43 584
11. Acioly MA, Liebsch M, de Aguiar PHP, Tatagiba M. Facial
nerve monitoring during cerebellopontine angle and skull
base tumor surgery: a systematic review from description
to current success on function prediction. World Neurosurg.
2013;80(6):e271-300.
12. Margalit NS, Lesser JB, Singer M, Sen C. Lateral
approach to anterolateral tumors at the foramen magnum:
factors determining surgical procedure. Neurosurgery.
2005;56(2):324-336
13. Aguiar PHP, Almeida AN. Tratamento cirúrgico dos
meningiomas de goteira olfativa. In: Aguiar PHP, Antunes
ACM, Machado HR, Ramina R, Teixeira MJ, JCE Veiga,
Figura 23: Cordoma do clivus, visão cirúrgica do acesso eds. Tratado de técnica operatória em neurocirurgia. 1ª ed.
parassinusal. São Paulo: Editora Atheneu; 2009. p. 271-286.
Fonte: Os autores, 2021. 14. Aguiar PHP, Almeida AN Antunes ACM. Olfactory
Groove Meningiomas: Pitfalls and Surgical Technique. In:
REFERÊNCIAS Ramina R, Aguiar PHP, Tatagiba M, eds. Samii’s Essentials
1. Kawase T, Shiobara R, Toya S. Anterior transpetrosal- in Neurosurgery. 2 ed. London: Springer Heidelberg; 2014.
transtentorial approach for sphenopetroclival meningiomas: p. 139-148.
surgical method and results in 10 patients. Neurosurgery.
1991;28(6):869-875. 15. Aguiar PHP, Maldaun MVC, Gripp DA, Santiago
NM. Meningiomas de Goteira Olfatória: Tratamento
2. Masini M, Aguiar PHP, Maldaun MVC. Neoplasias do Neurocirúrgico. In: Aguiar PHP, Antunes ACM, Maldaun
Sistema Nervoso Central. In: Takynagui OM, Gagliardi R, MVC, et al, eds. Princípios Técnicos de Neurocirurgia: Atlas
eds. Tratado de Neurologia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; e Texto. 1º ed. São Paulo: Di livros. p. 251-254.
2019. p. 410-415.
16. Dolenc VV. Anatomy of the cavernous sinus. In: Dolenc
3. Aguiar PHP, Georgeto SM, Zicarelli CAM. Meningiomas VV (ed.) Anatomy and Surgery of the Cavernous Sinus.
da Base do Crânio: III. Andar Médio. In: Siqueira MG, ed. New York: Springer-Verla;, 1989.
Tratado de Neurocirurgia. 1 ed. São Paulo: Manole; 2016.
p. 398-402. 17. Mureb MC, Dastazirgada Y, Benjamin C, Golfinos
JG, Kondziolka D. Simultaneous Treatment of Petroclival
4. Aguiar PHP, Georgeto SM, Zicarelli CAM. Meningiomas Meningiomas and the Trigeminal Nerve with Gamma Knife
da base do crânio - andar médio. In: Siqueira MG, ed. Radiosurgery for Tumor-Related Trigeminal Neuralgia.
Tratado de Neurocirurgia. 1 ed. São Paulo: Manole; 2016. World Neurosurg. 2020;139:242-244.
p. 357-402.
18. Aguiar PHP, Tsanaclis AM, Tella OI Jr, Plese JP.
5. Aguiar PHP, Ramina R, Veiga JCE. Meningiomas - Proliferation rate of intracranial meningiomas as defined
diagnóstico e tratamento clínico e cirúrgico: aspectos atuais. by the monoclonal antibody MIB-1: correlation with
1ª ed. Rio de Janeiro: Edotora Revinter; 2006. p. 283. peritumoural oedema and other clinicoradiological and
6. De Tella Jr, Neto MA, Aguiar PH, Herculano MA. histological characteristics. Neurosurg Rev. 2003;26(3):221-
Meningiomas anteriores e antero-laterais do forame magno. 228.
Arq Neuropsiquiatr. 2006;64(2B):437-440. 19. Aguiar PHP, Panagopoulos A, Maldaun M, et al.
7. Starnoni D, Giammattei L, Cossu G, et al. Surgical Vestibular Schwanomas: detailed operative technique and
management for large vestibular schwannomas: a pitfalls to preserve the facial nerve and hearing function. J
systematic review, meta-analysis, and consensus statement Bras Neurocirurg. 2009;20:193-194.
on behalf of the EANS skull base section. Acta Neurochir 20. Maldaun MCV, Aguiar PHP, Zambelli HJL. Epidemiologia
(Wien). 2020;162(11):2595-2617. do sistema nervoso central. In: Maluf FC, Katz A, Corrêa
8. Bartolini A, Gasparetto B, Furlan M, et al. Functional S, eds. Câncer do sistema nervoso central: tratamento
perfusion and blood-brain barrier permeability images in multidisciplinar. 1ª ed. São Paulo: Editora Dendrix; 2009. p.
the diagnosis of cerebral tumors by Angio CT. Comput Med 3-13.
Imaging Graph. 1994;18(3):145-150. 21. Almeida AN. Meningiomas. In: Figueiredo, Eberval
9. Gasparetto EL, Leite Cda C, Lucato LT, et al. Intracranial G, Teixeira, Manoel Jacobsen, eds; Dor; Procedimentos
meningiomas: magnetic resonance imaging findings in 78 Neurocirúrgicos; Sistema Nervoso (Cirurgia); Neurologia.
cases. Arq Neuropsiquiatr. 2007;65(3A):610-614. Manual de Clínica Neurocirúrgica. Rio de Janeiro: Thieme
publicações; 2015. P. 51-54
10. Isolan GR, Aguiar PHP. Tratamento dos tumores da
base do crânio. In: Maluf FC, Katz A, Corrêa S, eds. Câncer 22. Mattei TA, Mattei JA, Ramina R, Aguiar PHP, Plese JP,
do sistema nervoso central: tratamento multidisciplinar. 1ª Marino Jr . Edema and malignancy in meningiomas. Clinics.
ed .São Paulo: Editora Dendrix; 2009. p. 263-278. 2005;60(3):201-206.
Capítulo 43 585
23. Simis A, Pires de Aguiar PH, Leite CC, Santana PA Jr, 36. Knosp E, Steiner E, Kitz K, Matula C. Pituitary
Rosemberg S, Teixeira MJ. Peritumoral brain edema in adenomas with invasion of the cavernous sinus space: a
benign meningiomas: correlation with clinical, radiologic, magnetic resonance imaging classification compared with
and surgical factors and possible role on recurrence. Surg surgical findings. Neurosurgery. 1993;33(4):610-617.
Neurol. 2008;70(5):471-477.
37. Kreutzer J, Buslei R, Wallaschofski H, et al. Operative
24. Kennedy F. Retrobulbar neuritis as an exact diagnostic treatment of prolactinomas: indications and results in a
sign of certain tumors and abscesses in the frontal lobes. current consecutive series of 212 patients. Eur J Endocrinol.
Am J Med Sci. 1911;142:355–68. 2008;158(1):11-18.
25. Aguiar PHP, Almeida AN. Surgery of olfactory groove 38. Kreutzer J, Fahlbusch R. Diagnosis and treatment of
meningiomas. In: Ramina R, Aguiar PHP, Tatagiba MS, pituitary tumors. Curr Opin Neurol. 2004;17(6):693-703.
eds. Samiis essentials in neurosurgery. 1ªed. Heidelberg:
39.Laws E, Aguiar PHP, Getz A, Hwang P. Endoscopic
Springer Verlag, 2008. p. 69-75.
endonasal approach for treatment of pituitary adenomas.
26. Machado AGG, Aguiar PHP, Marino JR. Meningiomas In: Aguiar PHP, Antunes ACM, Machado HR, Ramina R,
de goteira olfatória. In: Aguiar PHP, Ramina R, Veiga JCE, Teixeira MJ, Veiga JCE, eds. Tratado de técnica operatória
Junior OIT, eds. Meningiomas - Diagnóstico e tratamento em neurocirurgia. 1ª ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2009.
clínico e cirúrgico - Aspectos Atuais. 1ª ed. Thieme; 2006. p. p. 705-714.
130-135.
40. Aguiar PHP, Laws JR. Craniofaringiomas: Manejo e
27. Ramina R, Neto MC, Fernandes YB, Silva EB, Mattei Cirurgia. In: Aguiar PHP, Antunes ACM, Maldaun MVC, et al,
TA, Aguiar PH. Surgical removal of small petroclival eds. Princípios Técnicos de Neurocirurgia: Atlas e Texto. 1º
meningiomas. Acta Neurochir (Wien). 2008;150(5):431-438 ed. São Paulo: Di livros. p. 285-292.
28. Tahara A, de Santana PA Jr, Calfat Maldaun MV, 41. Santiago NM, Aguiar PHP, Silva FIF, Canheu AC.
Panagopoulos AT, da Silva AN, Zicarelli CA, Pires de Aguiar Craniofaringiomas na infância. Princípios Técnicos de
PH. Petroclival meningiomas: surgical management and Neurocirurgia. Atlas e Texto. 1ª ed. São Paulo: Di Livros;
common complications. J Clin Neurosci. 2009;16(5):655- 2016. p. 719-724.
659.
42. Hofmann BM, Höllig A, Strauss C, Buslei R,
29. Tella OI, Neto MAP, Herculano MA, Neto AF. Buchfelder M, Fahlbusch R. Results after treatment of
Meningioma da goteira olfatória. Arq Neuropsiquiatr. craniopharyngiomas: further experiences with 73 patients
2006;64(1):83-87. since 1997. J Neurosurg. 2012;116(2):373-384.
30. Aguiar PHP, Neto MAP, Junior OIT. Meningioma de 43. Isolan GR, Antunes ACM, Aguiar PHP. Tratamento
Forame Magno: Tratamento Cirúrgico. In: Aguiar PHP, cirúrgico dos craniofaringiomas. In: Maluf FC, Katz
Antunes ACM, Maldaun MVC, et al, eds. Princípios A, Corrêa S, eds. Câncer do sistema nervoso central:
Técnicos de Neurocirurgia: Atlas e Texto. 1º ed. São Paulo: tratamento multidisciplinar. 1ª ed.São Paulo: Editora
Di livros. p. 445-452. Dendrix; 2009. p. 308-320.
31. Araújo Pereira BJ, Nogueira de Almeida A, Pires 44. Ribeiro Teixeira JA, Plese JP, Marino Jr. R. Tratamento
de Aguiar PH, Paiva WS, Teixeira MJ, Nagahashi dos faringiomas por via trans-esfenoidal – resultados
Marie SK. Multiple Intracranial Meningiomas: A Case e seguimento pós-operatórios. J Bras Neurocirurg.
Series and Review of the Literature. World Neurosurg. 2005;16(1):5-12.
2019;122:e1536-e1541.
45. Zanon N, Cavalheiro S, da Silva MC. Does the choice
32. Mureb MC, Dastazirgada Y, Benjamin C, Golfinos of surgical approach to insert an intratumoral catheter
JG, Kondziolka D. Simultaneous Treatment of Petroclival influence the results of intratumoral cystic treatment? Surg
Meningiomas and the Trigeminal Nerve with Gamma Knife Neurol. 2008;70(1):66-69;
Radiosurgery for Tumor-Related Trigeminal Neuralgia.
46. Isolan GR, Piltcher O, Aguiar PHP. Manejo cirúrgico
World Neurosurg. 2020;139:242-244.
dos cordomas intracranianos. In: Maluf FC, Katz A, Corrêa
33. Neves MWF, de Aguiar PHP, Belsuzarri TAB, de S, eds. Câncer do sistema nervoso central: tratamento
Araujo AMS, Paganelli SL, Maldaun MVC. Microsurgical multidisciplinar. 1ª ed .São Paulo: Editora Dendrix; 2009. p.
Management of Trigeminal Schwannoma: Cohort Analysis 321-327.
and Systematic Review. J Neurol Surg B Skull Base.
47. Isolan GR, Aguiar PHP, Dobrowolski, S. Cordomas
2019;80(3):264-269.
intracranianos. Princípios Técnicos de Neurocirurgia. Atlas e
34. Tella OI, Neto MAP, Herculano MA, Delcello R, Aguiar Texto. 1ª ed. São Paulo: Di Livros; 2016. p. 401-407.
PHP. Adenomas produtores de GH: Análise de 20 casos.
Arq Neuropsiquiatr. 2002;60(1):123-128.
35. Aguiar PHP, Nery B; Laws JR. Acesso endoscópico
endonasal para o tratamento cirúrgico de adenoma
hipofisário. In: Aguiar PH, Antunes ACM, Maldaun MVC, et
al, eds. Princípios Técnicos de Neurocirurgia: Atlas e Texto.
1º ed. São Paulo: Di livros. p. 255-264.
Capítulo 43 586
CAPÍTULO 44
TUMORES INTRARRAQUIANOS
mais precoce e uma definição mais precisa da patologia. pode ser classificado em:
Capítulo 44 587
1) correspondem a 4 a 16% de todos os tumores autores consideram os schwannomas mais comuns
do SNC na população adulta , com mais de2
do que os meningiomas1,6,7.
85% sendo extramedulares (25% epidural, 60%
Quanto aos segmentos vertebrais, os tumores
intradural/extramedular e 5% cauda equina1);
primários ocorrem mais frequentemente na região
aproximadamente 10% são intramedulares1,3, com
torácica (50 a 55%), seguida da região lombossacral
ependimomas e astrocitomas representando mais
(25 a 30%) e, por último, da região cervical/foramen
de 80% destes casos (60 a 70% ependimomas e 30
magnum (15 a 25%)1.
a 40% astrocitomas ). O terceiro tumor intramedular
4
Capítulo 44 588
Figura 1: Fratura patológica por metástase de câncer de prostate. Paciente do sexo maculino, 68 anos, com queixa
de hipoestesia em ambos membros inferiores com início recente durante internação para diagnóstico de câncer de
próstata. A. RM T2, sagital: lesão osteolítica de L2 com significativa estenose do canal vertebral. B. RM T2, axial: lesão
a nível de L2 predominante à esquerda, com infiltração dos pedículos vertebrais e compressão significante do saco
dural. C. TC sagital: característica lítica da lesão, com diminuição de altura do corpo vertebral. O paciente foi submetido
a cirurgia estabilizadora percutânea L1-L3 seguida de laminectomia L2; quadro neurológico permaneceu estável. D.
imagem de radiografia intra-operatória durante punção de pedículo L3 esquerdo; note o apagamento dos pedículos L2,
prncipalmente à esquerda. Paciente transferido para radioterapia.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 589
Figura 2: Metástase intramedular. Paciente do sexo masculino, 43 anos, tabagista, diagnóstico de neoplasia pulmonar
(células pequenas) há 9 meses com metástase óssea e hepática. Paresia progrediente de membro inferior esquerdo
há 3 meses (proximal 4/5, distal 2/5) e de membro superior esquerdo há 3 semanas (proximal 4/5, distal 2/5). A. RM
T1+ sagital: lesão intramedular a nível C5/6 com captação homogênea de contraste e bordas irregulars; B. RM T2
axial: lesão hiperintensa, não-homogênea, ocupando praticamente todo o diâmetro antero-posterior da medula espinhal
à esquerda; C. reconstrução 3D de TC pós-operatória; acesso feito via hemilaminectomia C5 e C6 esquerda (dreno
ainda in situ). O tumor foi parcialmente removido devido à aderência/infiltração no parênquima medular, com melhora
parcial da paresia descrita. Histologia: metástase de neoplasia de pequenas células. Paciente foi encaminhado para
radioterapia.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 590
no canal vertebral (ventral, lateral, dorsal, central); gia para estabilização da coluna; e
do estado geral do paciente; e do tipo histológico
• radicular: devido ao deslocamento ou
do tumor (presença de siringomielia/hidromielia e
compressão de uma ou mais raízes nervo-
edema).
sas; no tórax, comumente bilateral, e nas
A compressão medular por um tumor pode regiões cervical e lombar, normalmente é
causar uma lesão mecânica aos axônios e à bainha unilateral11.
de mielina. Além disso, o crescimento de um tumor Em uma série sobre tumores intramedulares,
no canal intrarraquiano pode afetar tanto o fluxo dor foi o principal sintoma em 72% dos casos3,13.
sanguíneo arterial e venoso para/do parênquima Nos 28% dos casos restantes, o déficit motor foi o
medular, levando a isquemia ou infarto local . 11
segundo sintoma mais comum, estando presente em
O crescimento de um tumor no canal 55% dos pacientes, seguido por déficits sensitivos
intrarraquiano pode afetar também o fluxo sanguíneo (presente em 39%) e distúrbios esfincterianos
Na maioria dos casos, a dor, que pode preceder levando à indicação para uma descompressão de
o surgimento de déficits neurológicos por meses, é emergência, situação especialmente relevante nos
com estenose do canal vertebral por metástase Pacientes com dor crônica, acamados,
apresentam dor no momento do diagnóstico 8,12
. disfunção vesical prévia ou doença degenerativa
Outros sintomas incluem alterações sensitivas da coluna podem ter um quadro semelhante ao de
(batiestesia) e vibração (palestesia), distúrbios exame físico detalhado e exames de imagem são
diferentes graus.
Diagnóstico
De modo geral há três tipos de dor na doença
O aumento da disponibilidade e do acesso
metastática vertebral:
a exames de imagem possibilitam o diagnóstico
• localizada: devido ao estiramento do pe- de um tumor intrarraquiano em um estado mais
riósteo causado pelo crescimento do tu- precoce o que, por sua vez, tem um impacto direto
mor e à inflamação decorrente da necrose no tratamento de escolha.
tumoral liberando substâncias que esti-
O diagnóstico é estabelecido com base
mulam as cininas. Caracterizada por dor
lancinante, frequentemente noturna, que na história clínica, nos achados do exame físico
apresenta melhora com anti-inflamatórios e de imagem, dentre os quais a ressonância
ou atividade física; magnética (RM) é o padrão-ouro para tecidos
moles e a tomografia computadorizada (TC) para
• mecânica: devido a instabilidade vertebral
os ossos. Apesar de certos tumores apresentarem
causada pelo tumor; apresenta piora com
características distintas na RM, somente a
atividade, sem melhora significativa com
anti-inflamatórios, responde bem à cirur- histopatologia é capaz de estabelecer o diagnóstico
Capítulo 44 591
final. A TC pode mostrar o grau de calcificação devido a hemorragia intratumoral é possível. Os
tumoral (por exemplo de um meningioma) ou do sintomas mais comuns incluem dorsolombalgia,
grau de destruição/envolvimento ósseo (como síndrome piramidal (espasticidade dos membros
nas lesões metastáticas), sendo uma ferramenta inferiores, hiperreflexia, clônus e Babinski) ataxia
importante tanto no auxílio diagnóstico como no da marcha e distúrbio sensitivo/parestesia16. Em
planejamento do tratamento. A radiografia é, apesar adultos, ependimomas intrarraquianos ocorrem
de frequentemende solicitada, pouco sensível. com frequência semelhante , ou maior , do que
14 17
ependimomas infratentoriais.
Dentro do diagnóstico diferencial de tumores
intrarraquianos deve-se sempre lembrar das lesões Metade dos ependimomas intrarraquianos
não-tumorais compressivas, tais como abscessos, são, de fato, intramedulares e outra metade está
doenças auto-imunes e lesões vasculares (por localizada na região do cone medular/cauda equina/
exemplo, cavernoma). filum terminale18, onde o tipo mixopapilar é mais
frequentemente encontrado. Em contrapartida, os
Tumores intramedulares ependimomas clássicos são comumente localizados
Os tumores intramedulares primários na região cervical ou cervico-torácica14.
refletem o espectro das neoplasias intracranianas
Ependimomas extradurais, os quais têm
e são classificados de acordo com o sistema de
origem em células ependimais heterotípicas, são
classificação da OMS (Organização Mundial de
raros15.
Saúde).
Macroscopicamente, os ependimomas
têm leve coloração amarronzada e uma textura
Ependimoma esponjosa, ocasionalmente com depósitos de
Ependimomas (Figura 3) são gliomas que têm cálcio. Microscopicamente, trata-se de um glioma
origem nas células ependimárias do canal central da bem circunscrito e delineado, composto por
medula espinhal, raramente invadindo o parênquima pequenas células com núcleo redondo envoltas
medular. Apesar de ser uma lesão intramedular em uma matriz fibrilar. Zonas perivasculares
(aqui, para fins didáticos, incluindo os ependimomas anucleadas, conhecidas como pseudorosetas, são
da cauda equina), alguns ependimomas apresentam características e encontradas em praticamente todos
um componente exofítico. Ependimomas ocorrem os ependimomas; rosetas ependimárias podem ser
de forma esporádica ou em associação com encontradas em um quarto dos casos. O ependimoma
neurofibromatose 2. A associação com outras clássico (grau 2) normalmente apresenta baixa
síndromes hereditárias é rara. Os ependimomas densidade celular e baixa atividade mitótica. A
são classificados, de acordo com a OMS, em grau imunorreatividade para GFAP é normalmente
1 (subependimoma e ependimoma mixopapilar, observada nas pseudorosetas e menos em outras
discutido separadamente); grau 2 (ependimoma partes do tumor. A expressão de proteína S100 e
“clássico”, com subtipos histológicos; porém, vimentina é típica e a imunorreatividade para EMA é
sem significância clínico-patológica); e grau 3 encontrada em quase todos os ependimomas14.
(ependimoma anaplásico). Apesar dos diferentes
Na RM, há captação de contraste e, em
graus histológicos, ainda não foi estabelecida
T2, hiperintensidade em relação ao parênquima
nenhuma associação definitiva entre estes e o
adjacente. A formação de cistos é comum e pode
comportamento biológico do tumor na sobrevida14,15.
aparecer dentro do tumor, em suas margens ou
Pacientes com ependimoma intramedular relacionados a uma siringomielia adjacente. Cistos
podem apresentar queixas inespecíficas durante intratumorais podem conter proteína, necrose e
anos, apesar de que uma deterioração aguda produtos de degradação sanguínea. Os cistos
Capítulo 44 592
Figura 3: Ependimoma. Paciente do sexo masculino, 54 anos, com queixa inespecífica de dor em membro inferior
esquerdo há 2 meses, sem déficit neurológico. A. RM T1+, sagital: lesão intramedular em nível T11/12 com leve
captação de contraste; B. RM T2 axial: lesão intramedular hiperintensa, predominantemente em região dorsal da
medula; C. reconstrução 3D de TC pós-operatória: o acesso cirúrgico foi feito via hemilaminectomia T11 esquerda.
D. RM T2 axial pós-operatória: tumor completamente removido por via posterior, mielotomia mediana. Histopatologia:
ependimoma, grau 1.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 593
propriamente ditos não captam contraste; porém,
Ependimoma mixopapilar
uma captação periférica de contraste pode ser vista,
Este subtipo (Figura 4) corresponde a 9 a
caso o cisto esteja envolto por tumor. A formação
13% de todos os ependimomas e ocorre quase que
de siringomielia está relacionada à obstrução do
exclusivamente na região do cone medular/cauda
canal central, resultando em cistos com intensidade
equina/filum terminale, sendo o tumor mais comum
de fluido cérebro-espinhal e com extensão além
nesta região14. A localização em outros níveis da
das margens do tumor. Hemorragia, especialmente
medula, intraventricular ou até mesmo no parênquima
ao longo da margem da massa tumoral, é comum
cerebral é rara e pode ocorrer primariamente ou
e resulta em um depósito de hemossiderina
devido a disseminação subaracnoidea14. Este tumor
hipointenso em T2 nas margens do tumor6.
se origina na glia ependimária do filum terminale para,
Enquanto lesões sintomáticas são indicadoras então, envolver a cauda equina e apenas raramente
de cirurgia, não há uma definição quanto à indicação invade raízes nervosas ou o osso sacro14. Apesar de
para cirurgia de ependimomas intramedulares não ser um tumor necessariamente intramedular, ele
assintomáticos. O follow-up com repetidos exames será discutido aqui por questões didáticas.
de RM é uma opção válida, porém há autores
A apresentação clínica clássica se caracteriza
que indicam cirurgia para lesões assintomáticas,
por dor local (lombalgia) de longa duração seguida
alegando que a maioria dos pacientes apresentam um
por déficits sensomotores e da marcha, com
quadro clínico semelhante no pré- e pós-operatório
distúrbios vegetativos dependendo da localização e
e que uma ressecção total está relacionada a baixa
tamanho do tumor21.
recidiva e bom prognóstico15.
O termo mixopapilar se refere à aparência
Deve-se tentar uma ressecção em bloco
histológica de áreas mucinosas (representadas
sempre que possível, evitando uma disseminação
pela hiperintensidade em T2) com o arranjo papilar
subaracnoidea de células tumorais19.
das células tumorais formando pseudorosetas
Pacientes com ependimoma de alto grau perivasculares.
devem receber radioterapia adjuvante. Para
Sua aparência macroscópica é lobulada,
ressecções incompletas ou recidivas, tratamento
macia, cinza-amarronzada, frequentemente
conservador, re-operação ou radioterapia são opções
encapsulada. Uma consistência mais gelatinosa,
que devem ser avaliadas de modo interdisciplinar e
formação de cistos e hemorragia intratumoral podem
com o paciente. Devido ao baixo grau de recidivas
ocorrer. Microscopicamente, as células tumorais têm
após ressecção completa, tumores de baixo grau
uma forma que varia de cuboide a alongada, estando
não devem ser irradiados nestes casos. O papel
arranjadas radialmente em uma forma papilar ao
da quimioterapia no tratamento de ependimomas
redor de núcleos fibrovasculares hialinizados.
intrarraquianos ainda não está bem estabelecido.
Há uma imunorreatividade difusa para GFAP, a
De acordo com Klekamp20, os seguintes expressão de S100 ou vimentina é típica e reação
fatores apresentam risco de morbidade permanente: para CD99 e NCAM1 também é frequentemente
nível torácico, idade avançada, história clínica de vista. Imunorreatividade para citoqueratina AE1/AE3
longa duração, hemorragia intratumoral, e cirurgia também é comum14.
para recidivas. A longo prazo, a taxa de recidiva tem
A taxa de sobrevivência em 5 anos é de
correlação com a extensão da ressecção cirúrgica e,
aproximadamente 98,4% após ressecção parcial ou
assim, o objetivo cirúrgico deve ser uma ressecção
total14. Recorrência ou metástases liquóricas podem
completa segura.
ocorrer após ressecção incompleta14. A ressecção
completa deve ser almejada e a radioterapia parece
Capítulo 44 594
Figura 4: Ependimoma mixopapilar Paciente do sexo feminino, 29 anos, com ciatalgia de início agudo, parestesia
transitória em ambos membros inferiores, predominante à direita, sem déficit motor ou vegetativo. A. RM T1+, sagital:
tumor intradural em região da cauda equina com captação homogênea de contraste a nível L1/2; B. RM T2, axial: tumor
mostra-se hiperintenso, com localização intradural à direita. C. radiografia AP pós-operatória: o tumor foi completamente
ressecado via hemilaminectomia L2 e hemilaminectomia parcial L1 à direita, cujos limites cranial e caudal estão
delimitados pela linha vermelha ao lado. Histopatologia: ependimoma mixopapilar, grau 1.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 595
ter um papel mais importante nos ependimomas 19 pacientes com astrocitoma intramedular, 68%
mixopapilares do que nos outros ependimomas apresentaram uma captação não-homogênea de
intramedulares , aumentando a sobrevida livre de
15
contraste; esta característica ajuda a diferenciar os
progressão 14
e sendo reservada para os casos de astrocitomas intramedulares dos ependimomas4.
ressecção incompleta19. Hemorragia intratumoral é, também ao contrário
dos ependimomas, rara6. Outra característica que
A idade mais jovem parece ser o mais forte
ajuda a diferenciar astrocitomas de ependimomas
preditor de recorrência; porém, a expressão de
é a localização assimétrica e excêntrica dos
EGFR tem sido citada como um marcador em
astrocitomas em oposição à localização mais central
potencial para recorrência14.
dos ependimomas10.
Apesar da classificação grau 1, há uma taxa
A apresentação radiológica é de tal modo
de disseminação metastática espinhal de 9% e
variada, que mesmo os astrocitomas pilocíticos
cerebral de 6%14.
podem apresentar uma captação homogênea,
não-homogênea ou mesmo nenhuma captação de
Astrocitomas
contraste10.
Sendo o tumor intramedular primário mais
A extensão da ressecção cirúrgica ainda é um
comum na população pediátrica e o segundo mais
fator que gera debate. Os astrocitomas são, com
comum na população adulta, os astrocitomas
exceção dos pilocíticos, tumores infiltrativos e, deste
intramedulares são, em 75% dos casos, de baixo
modo, uma ressecção radical é raramente possível;
grau e, em 25% dos casos, de alto grau4. Apenas 0,2
assim sendo, há quem sustente que o objetivo
a 1,5% dos astrocitomas intramedulares são grau 4
deve ser uma redução tumoral maior possível15.
(glioblastomas) 6. Na maioria dos casos trata-se de
Entretanto, a relação entre o grau de ressecção
um astrocitoma fibrilar (grau 2) com uma sobrevida
e sobrevida livre de progressão e sobrevida geral
de 5 anos superior a 70%22.
ainda não está bem definida22 e, deste modo, o fator
Estes tumores normalmente são uma lesão prognóstico mais importante não é a extensão da
solitária, mas outras lesões, inclusive de outro ressecção mas, sim, o subtipo histológico19,22,23.
tipo histológico, podem estar presentes nos casos Em uma série de 65 pacientes com astrocitoma
associados à neurofibromatose 1 ou 215. intramedular, Klekamp e Samii15 reportaram uma
Dor é o sintoma inicial mais comum mas sobrevida de 1 e 5 anos de, respectivamente, 92%
ataxia da marcha e déficit motor também são e 77% para tumores benignos; estes valores caíram
frequentes e estão presentes em até 75% dos para, respectivamente, 74% e 27% para os tumores
casos . A apresentação clínica é a mesma para os
15 malignos.
astrocitomas de baixo e alto grau; porém, a evolução Em um estudo retrospectivo de 83 pacientes,
é muito mais rápida neste último grupo15. Fakhreddine23 mostrou que quimioterapia estava
A apresentação radiográfica dos astrocitomas associada a uma maior sobrevida, livre de
intramedulares é variada. Na RM, uma massa progressão, mas sem aumento significativo na
hiperintensa em T2, sem borda bem definida, e sobrevida geral.
com uma extensão média de 4 corpos vertebrais A radioterapia adjuvante, com doses
é a aparência mais comum. Cistos estão fracionadas de 45 a 50Gy19, pode ser administrada
presentes em menos da metade dos casos e, tanto após a cirurgia, quanto para recidiva ou
diferentemente dos astrocitomas intracranianos, ambos24,25 e está reservada para tumores de alto
pode haver uma captação moderada de contraste grau. A radioterapia tem mostrado ser capaz de
em qualquer grau histológico6. Em uma série de diminuir as taxas de recorrência26,27 e de aumentar
Capítulo 44 596
a sobrevida geral28. Não há, atualmente, indicação propriocepção, são comuns13.
para radioterapia adjuvante no tratamento de
Na RM, o hemangioblastoma apresenta
astrocitomas intramedulares de baixo grau.
isointensidade em T1 e hiperintensidade em T2
com um nódulo hipervascular que apresenta uma
Hemangioblastoma captação homogênea de contraste. Entretanto,
Representando 5% dos tumores estas características podem ser bastante variáveis
intramedulares , os hemangioblastomas (Figura
1
devido a hemorragia intratumoral ou, especialmente
5) são, depois dos ependimomas e astrocitomas, em tumores maiores que 1,5 cm, devido ao efeito de
o terceiro tipo de tumor intramedular mais comum. flow void vascular6. Edema perifocal e presença de
Hemangioblastomas podem aparecer tanto em siringomielia ou cistos também são típicos.
casos esporádicos como associados à Síndrome de
Na angiografia, há uma dilatação das artérias
von Hippel Lindau (VHL) e a Tabela 2 ilustra algumas
que suprem o tumor, uma captação nodular intensa
diferenças entre ambos.
e uma drenagem venosa precoce; todavia, este
Hemangioblastomas são lesões benignas, exame deve ser realizado somente nos casos em
de crescimento lento, classificadas como grau 1 e que uma embolização pré-operatória é considerada.
caracterizadas por células estromais neoplásicas
O hemangioblastoma costuma assumir, como
e abundância de pequenos vasos, ocorrendo
citado, uma posição mais posterior na medula
comumente no tronco encefálico, no cerebelo ou na
espinhal e, assim, está normalmente localizado
medula espinhal14.
posterior ao ligamento denteado29. Sua ressecção
Enquanto as células estromais formam o cirúrgica é considerada como um procedimento
componente neoplásico do hemangioblastoma, cirúrgico seguro30 com 96% dos casos mostrando
outras células não-neoplásicas (células endoteliais, uma estabilidade ou melhora do quadro clínico a
pericitos e linfócitos) parecem ter origem devido a uma longo prazo24, de modo que lesões sintomáticas ou
angiogênese reativa resultada de uma sinalização com aumento de tamanho nos exames de imagem
parácrina a partir das células neoplásicas . 14
devem ser operadas. A taxa de recorrência após
ressecção cirúrgica é de 5,5%24.
Em todo caso de hemangioblastoma é
recomendada uma triagem genética para síndrome Quanto à cirurgia para lesões assintomáticas,
VHL14,15, uma vez que os casos sindrômicos não há um consenso. Após análise de 17
devem ser acompanhados mais de perto com RM hemangioblastomas assintomáticos, Kim30 propôs
anual do eixo neural15, assim como por outras que tumores com volume maior que 500mm3 devem
especialidades,como oftalmologia e cirurgia geral. ser ressecados independentemente da presença
de sintomas ou déficits neurológicos, já que lesões
A localização do tumor dentro do espaço
maiores estão associadas ao desenvolvimento de
intrarraquiano é variável e os hemangioblastomas
sintomas e a piores resultados funcionais.
podem ser completamente intramedulares (30%),
parcialmente intra-/extramedulares (50 a 55%) ou Radioterapia adjuvante parece ter melhores
completamente extramedulares (15 a 20%) . 1
resultados para casos de síndrome VHL do que
para casos esporádicos e deve ser considerada
Uma característica típica é a apresentação
como tratamento para tumor residual, recidiva31 ou
clínica: uma vez que os hemangioblastomas
múltiplos tumores com um acometimento medular
frequentemente crescem adjacentes à superfície
extenso24.
pial na coluna posterior (de onde recebem seu
abastecimento arterial6), déficits sensitivos, Por último, a radiocirurgia estereotáxica se
especialmente distúrbios progressivos da mostra como alternativa ao tratamento cirúrgico,
Capítulo 44 597
Figura 5: Hemangioblastoma. Paciente do sexo feminino, 48 anos, síndrome de VHL diagnosticada após ressecção
de um hemangioblastoma cerebelar 10 anos antes. Detecção de crescimento tumoral a nível C5 na RM de controle.
Paciente com leve ataxia, mas sem déficit sensitivo-motor ou vegetativo. A. RM T1+ sagittal; B. RM T1+ axial: lesão
intramedular com captação não-homogênea de contraste, com tamanho cranio-caudal de 17mm, ocupando quase
que toda a secção medular transversal; C. RM T2 sagital: presença de edema medular com extensão até vários níveis
cranialmente e caudalmente assim como presença de cistos adjacentes ao tumor (em nível C4 e C6); além disso,
observa-se área hipointensa ao redor da massa tumoral, compatível com depósito de hemossiderina; D. reconstrução
3D de TC pós-operatória: acesso feito via hemilaminectomia C5 esquerda com hemilaminectomia parcial C4 e C6; e E.
RM T1+ sagital pós-operatória: lesão completamente ressecada. Histopatologia: hemangioblastoma, grau 1.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 598
caso este seja contra-indicado. Em uma revisão positividade para o antígeno epitelial de membrana
sistemática da literatura ,
24
o tratamento com (EMA, epithelial membrane antigen) e para o receptor
radiocirurgia estereotáxica mostrou uma constância de somatostatina 2A. A vimentina é positiva em
(42%) ou redução (56%) do tamanho tumoral com todos os tumores, mas não é específica. Os índices
baixa ocorrência de efeitos adversos no longo prazo mitóticos e de proliferação Ki-67 têm correlação com
e apenas 2% de progressão tumoral. a taxa de crescimento tumoral. Outras características
como a presença de desmossomos e proteína S100
variam de acordo com o subtipo histológico14.
TUMORES INTRADURAIS,
A RM é o padrão-ouro, onde o tumor se apresenta
EXTRAMEDULARES
isointenso a hipointenso em T1 e hiperintenso em
Meningioma T2 com intensa captação de contraste. A captação
Meningiomas intrarraquianos (Figura 6) são de contraste na dura-máter além da massa tumoral
tumores que costumam apresentar crescimento propriamente dita é chamada de cauda dural (do
lento com a maioria sendo classificada como grau inglês, dural tail) e é uma característica típica dos
1, enquanto formas agressivas de grau 2 ou 3 são meningiomas; esta cauda dural, porém, corresponde
raras 6,32
. a tecido fibrovascular reativo e não necessariamente
a uma infiltração tumoral14. Áreas de calcificação se
No gênero feminino (com relação de até
apresentam hipointensas em todas as sequências
9:133) a exposição à radiação ionizante, terapia de
mas são melhor visualizadas na TC; este é um fator
reposição hormonal e neurofibromatose são fatores
importante e deve sempre ser avaliado ao planejar
de risco reconhecidos7.
a cirurgia.
Os casos isolados e com lesão única são mais
A ressecção cirúrgica completa é o tratamento
comuns, mas lesões múltiplas, especialmente nos
de escolha e é obtida em 82 a 98% dos casos, uma
casos de neurofibromatose 2, podem ocorrer.
vez que a maioria dos meningiomas apresenta um
A coluna torácica é, com 80% dos casos, o plano de clivagem claro34. Porém, a presença de
local mais afetado14,33. calcificação tumoral34 e o meningioma em placa35 são
Em uma série de 180 meningiomas dois fatores que não só dificultam uma ressecção
intrarraquianos , dor e disestesia foram os sintomas
15 completa como, também, estão associados a maior
iniciais mais comuns, enquanto distúrbios motores morbidade. Com a ressecção completa sendo
e da marcha foram a principal queixa no momento o objetivo cirúrgico, não há vantagem de uma
do diagnóstico em 67% dos casos, distúrbios ressecção Simpson 1 em relação à Simpson 234.
esfincterianos estiveram presentes em 40%. A cicatriz/fibrose ou acometimento aracnoide
A histologia dos meningiomas intrarraquianos extenso como nos casos de recorrência, meningioma
e intracranianos é, com mais de 15 subtipos, similar . 33 de alto grau ou meningioma em placa são fatores
Em uma série de 33 pacientes com meningiomas independentes relacionados a uma deterioração
intrarraquianos, os subtipos psamomatoso, neurológica pós-cirúrgica34,35.
fibroblástico e meningotelial foram, nesta ordem, os A radiocirurgia estereotáxica apresenta
mais comuns, com o primeiro estando associado a bom controle local e é uma opção para os casos
um desfecho pós-operatório pior33. de recidiva, de tumores de alto grau ou quando a
Macroscopicamente, são tumores firmes, cirurgia é contra-indicada. A maioria dos pacientes
bem demarcados e com adesão à dura-máter. apresentam, com a radiocirurgia, um quadro
Na microscopia há, na maioria dos casos, uma neurológico estável e a mielopatia pós-radiação é
rara e, quando presente, costuma ser passageira34.
Capítulo 44 599
Figura 6: Meningioma. Paciente do sexo feminino, 79 anos, há meses com dor progrediente em região torácica dorsal
com irradiação ventral bilateral. A. RM T1+ sagittal; B. RM T1+ axial: lesão intradural/extramedular bem circunscrita
com captação ávida de contraste em nível T3, localizada posterolateralmente à esquerda da medula espinhal; em meio
à área contrastada nota-se região hipointensa, correspondente a calcificação; e C. TC axial: área calcificada em porcão
lateral do tumor. O tumor foi completamente ressecado por via interlaminar (hemilaminectomia parcial) T2/T3 esquerda.
Histopatologia: meningioma psamomatoso, grau 1.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 600
nos ramos dorsais. Na maioria dos casos, são
Schwannoma
tumores isolados, mas na neurofibromatose 2 ou
Schwannomas intrarraquianos (Figura 7) são
schwannomatose são múltiplos14.
tumores de crescimento lento (taxa de crescimento
de 2 a 7%/ano6) com origem, normalmente,
Figura 7: Schwannoma. Paciente do sexo masculino, 69 anos, com queixa de lombociatalgia à direita com irradiação
ao longo do dermátomo L5 há 4 semanas. Ao exame neurológico apresenta disestesia no hálux direito; nenhum déficit
motor ou vegetativo. A. RM T1+ sagittal; B. RM T1+ axial: lesão intradural a nível L4 à direita com captação não-
homogênea de contraste; C. RM T2 sagital: tumor com hiperintensidade central compatível com componente mixoide
(DD pequena transformação cística); D. RM T2 STIR coronal: tumor com origem em raíz L5 direita. Tumor ressecado
via acesso interlaminar (hemilaminectomia parcial L4 e L5) direita; e E. imagem microcirúrgica: asterisco, tumor; seta,
raiz L5 direita; cabeças de seta: bordas da dura-máter com sutura de retenção. A disestesia no dermátomo L5 distal
permaneceu inalterada, houve melhora completa da dor e nenhum novo déficit neurológico. No décimo dia de pós-
operatório o paciente apresentou coleção subcutânea e cefaleia. Após cirurgia de revisão para tratamento de fístula
liquórica houve melhora completa dos sintomas. Histologia: schwannoma, grau 1.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 44 601
A apresentação clínica se dá normalmente uso de anticoagulantes/antiplaquetários, história
por dor e parestesia relacionada ao dermátomo do prévia incluindo familiar (especialmente quanto a
nervo afetado, enquanto sintomas relacionados à tumores) e duração dos sintomas.
compressão medular podem ocorrer nos casos de
Enquanto os tumores intrarraquianos
tumores grandes6.
extradurais primários são raros e correspondem a
Os schwannomas são, em sua grande maioria, somente 4% de todos os tumores intrarraquianos6,
tumores benignos (grau 1) e subtipos malignos são a maioria dos tumores extradurais se dá por doença
raros .
13
metastática (Figuras 1 e 8), com localização na
coluna torácica em 60% dos casos (30% lumbosacral
Microscopicamente, são tumores bifásicos
e 10% cervical)12. Exemplos de tumores primários
com um componente altamente celular (Antoni A) e
benignos e malignos36-38 estão listados na Tabela 3:
outro componente mixoide, hipocelular (Antoni B).
Há uma imunorreação expressiva para a proteína
S100, presente em todos os casos.
Capítulo 44 602
Benignos Malignos de mielopatia, a extensão e localização precisa do
Osteoma osteoide Cordoma tumor no espaço extradural, padrão de captação
Osteoblastoma Mieloma múltiplo de contraste, detecção de outras lesões menores
Osteocondroma Osteossarcoma possivelmente assintomáticas. A angiografia com
Hemangioma Condrossarcoma embolização tumoral pré-operatória é reservada às
cisto ósseo aneurismático Sarcoma de Ewing metástases altamente vasculares (como carcinoma
Tumor ósseo de células de célula renal, melanoma e tumores tireoidianos)
Linfoma
gigantes
caso uma cirurgia mais invasiva como uma ressecção
Granuloma eosinofílico Plasmocitoma
em bloco for planejada22.
Tabela 3: Tumores primários extradurais.
Fonte: Adaptado de Kelley et al., 200736; Ahlhelm et al., Um fator muito importante e que deve ser
200637; e, Spirig et al., 201138. sempre avaliado no paciente com metástase vertebral
é a estabilidade da coluna, definida pela Spine
Atenção especial deve ser dada à doença Oncology Study Group como “a perda da integridade
metastática, porque com o avanço nas terapias da coluna vertebral como resultado de um processo
oncológicas, a mortalidade geral devido ao câncer neoplásico que está associado com dor relacionada
tem diminuído22. Deste modo, com um aumento ao movimento, com deformidade sintomática ou
na expectativa de vida destes pacientes e uma progressiva, e/ou com comprometimento neuronal
diminuição da mortalidade associada ao tumor em circunstância fisiológica”. Nestas circunstâncias,
de origem nos últimos anos, tem-se uma maior caso não tratada, a instabilidade da coluna pode
ocorrência de doenças metastáticas. Assim sendo, progredir e resultar em deformidade e possível
os pacientes que outrora recebiam um tratamento deterioração neurológica22.
paliativo apresentam maior sobrevida e podem, O tratamento da doença metastática inclui,
assim, receber um tratamento mais agressivo, como em todos os casos oncológicos, uma abordagem
levando a um maior controle local e a uma melhor interdisciplinar e inclui cirurgia (descompressão,
qualidade de vida. estabilização/fusão com ou sem vertebrectomia
Como a maioria dos pacientes com tumor e biópsia), biópsia por agulha, vertebroplastia,
intrarraquiano extradural apresenta dor, radiografia cifoplastia, radioterapia e quimioterapia, assim como
da coluna em AP e perfil são, normalmente, o primeiro analgesia adequada.
exame solicitado a nível de atendimento básico. A A radioterapia é eficaz no tratamento da dor
radiografia, porém, não tem grande valor diagnóstico e na melhora da função neurológica e tem papel
e pode apresentar alterações somente em caso de importantíssimo no tratamento das metástases da
tumores com alteração óssea vertebral incluindo coluna vertebral, mas caso haja instabilidade da
fraturas patológicas (perfil) e apagamento de margem coluna não trará uma melhora satisfatória da dor. A
pedicular (Fig. 1D). A TC é um exame amplamente Tabela 4 mostra exemplos de tumores sensíveis e
disponível e, devido ao frequente envolvimento resistentes à radiação22.
ósseo destes tumores, traz informações importantes
(por exemplo, diferenciação de lesão osteolítica e
osteoblástica, alargamento de forame intervertebral
e calcificação) que ajudam no diagnóstico diferencial
e também auxiliam no planejamento cirúrgico,
especialmente se uma cirurgia estabilizadora for
necessária. Informações valiosas trazidas pela RM
incluem o grau de compressão medular, presença
Capítulo 44 603
Altamente ventral/lateral/dorsal/central à medula es-
Radiosensíveis Radioresistentes pinhal ou dura-máter:
radiosensíveis
Linfoma Mama Renal
• etiologias mais prováveis;
Mieloma múltiplo Próstata Tireoide
Seminoma Ovário Hepatocelular
• expectativas do paciente;
Câncer de pulmão Câncer de pulmão
Tumores
de pequenas de não-pequenas • qual a urgência do caso;
neuroendócrinos
células células
Melanoma • ressecção cirúrgica completa x parcial
Sarcoma x biópsia;
Tabela 4: Exemplos de tumores radiossensíveis e
radioresistentes. • objetivo da cirurgia (histopatologia, re-
Fonte: Adaptado de Kelft, 201622. moção do efeito de massa ou estabili-
zação); e
Capítulo 44 604
o tratamento deve ser baseado não somente em estágios: no planejamento da incisão da pele (pré-
uma avaliação interdisciplinar como, também, após operatoriamente) e após a exposição das lâminas
discussão detalhada com o paciente sobre os prós e vertebrais (intraoperatoriamente).
contras de cada opção.
Uma vez feita a exposição da dura-máter,
deve-se fazer uma hemostasia cuidadosa. O uso
Acesso cirúrgico
de cotonoide com agentes hemostáticos (como
O acesso cirúrgico aos tumores intrarraquianos Floseal®) lateralmente à dura-máter é útil durante a
se dá principalmente por via posterior, para a qual o parte intradural da cirurgia. A incisão da dura-máter
decúbito ventral é o mais utilizado. A posição semi- deve ocorrer somente após o controle hemostático
sentada também pode ser usada para o acesso epidural e deve ser feita com a preservação da
dorsal à coluna cervical e seu uso é baseado, aracnoide. Suturas de retenção irão manter as bordas
principalmente, na experiência e preferência do durais afastadas. Somente então ocorrerá a incisão
cirurgião, ciente da possibilidade de embolia da aracnoide e dos seus septos com a exposição da
gasosa, sendo necessário cateter de infusão no medula espinhal e das raízes nervosas.
átrio direito para aspirar, emergencialmente, o ar
Após a ressecção tumoral e hemostasia
do ventrículo direito. Outros acessos como cervical
meticulosa, a dura-máter deve ser suturada de modo
anterior, torácico, abdominal e retroperitoneal são
impermeável e, se necessário, com uso adicional de
mais invasivos e menos utilizados. Porém, tumores
agentes tais como cola de fibrina, selantes, músculo/
localizados ventralmente à medula espinhal (ou seja,
gordura. A impermeabilidade pode ser verificada com
ao ligamento denteado) ou ventralmente à dura-
o uso da manobra de Valsalva pelo anestesiologista.
máter podem ser melhor abordados por via anterior,
Nós recomendamos repouso de 3 dias em decúbito
especialmente no caso de tumores calcificados.
dorsal a fim de evitar fístula liquórica. Drenos
Ainda, uma via que não a posterior pode ser
cirúrgicos devem ser utilizados sem sucção/vácuo,
escolhida em determinados casos onde a ressecção
a não ser que a cirurgia tenha sido efetuada para
de uma ou mais vértebras (espondilectomia), com
remoção de tumor extradural e sem violação da
subsequente fusão e estabilização, for desejada.
dura-máter.
O acesso posterior pode dar-se por diferentes
técnicas, como por via interlaminar, hemilaminectomia Neuromonitorização
parcial ou total, laminectomia, laminoplastia. Sempre Como as cirurgias para tumores
que possível, deve-se atentar para a preservação intrarraquianos colocam a medula espinhal
da estabilidade da coluna vertebral através da sob risco de lesão devido à sua mobilização e
preservação das articulações facetárias e dos dissecção, a neuromonitorização intraoperatória
ligamentos interespinhais e supraespinhais. Na com potenciais evocados é mandatória. O objetivo
nossa experiência, um acesso posterior unilateral é, da neuromonitorização é o reconhecimento de
na maioria dos casos, suficiente para uma exposição anormalidades motoras e sensoriais em um
além da linha média até o forame intervertebral com estágio precoce e ainda reversível. Atualmente, os
preservação não só dos ligamentos posteriores parâmetros mais utilizados são: o potencial evocado
como, também, da musculatura dorsal contralateral. somatossensitivo (PESS, ou SEP – somatosensory
Porém, uma extensão do acesso cirúrgico tanto a evoked potential); o potencial evocado motor (MEP,
nível de incisão musculocutanea quanto a nível de motor evoked potential) e ondas D (D-waves), para
ressecção óssea uni/bilateral pode ser necessária. vias motoras através dos membros e do espaço
O controle radiológico do nível vertebral a epidural, respectivamente; e o mapeamento das
ser operado ocorre sempre em, no mínimo, dois colunas dorsais com microestimulação para a
Capítulo 44 605
determinação de áreas específicas como, por de compressão ou edema medular, indicamos um
exemplo, o sulco mediano posterior para guiar uma bolus de 20 a 40 mg seguido de uma dosagem de 8
mielotomia mediana . 40
mg três vezes ao dia, a qual é reduzida gradualmente
até sua suspensão completa.
Caso haja uma deterioração dos parâmetros,
o cirurgião deve ter conhecimento sobre as possíveis
causas para tal e como revertê-las. Algumas ações
CONCLUSÃO
que podem reverter a piora dos parâmetros de
Tumores intrarraquianos correspondem a uma
neuromonitorização e, assim, melhorar os resultados
pequena fração dos tumores que envolvem o SNC e
funcionais são27,40,41:
a dor é o sintoma mais comum. Um reconhecimento
• excluir problemas técnicos (por exemplo, precoce, em estágios iniciais da doença, é
deslocamento de eletrodo); possível devido à maior disponibilidade de exames
radiológicos possibilitando, indiretamente, melhores
• pausar o procedimento cirúrgico por até
resultados cirúrgicos, uma vez que a presença de
30 min com a remoção de qualquer ma-
terial que possa exercer pressão sobre a déficits neurológicos é um dos principais preditores
medula (agentes hemostáticos como celu- de resultado. Cirurgia é o tratamento de escolha
lose oxidada, cotonoide e suturas); para a maioria dos tumores sintomáticos. Não há
recomendação clara para tratamento de tumores
• otimizar a perfusão tecidual através do au-
assintomáticos e a decisão sobre terapia invasiva
mento da pressão arterial média; e
ou exames de controle deve ser direcionada para
• irrigação da medula espinhal com soro fi- cada caso específico após discussão interdisciplinar
siológico morno ou papaverina. e com o paciente. O acesso cirúrgico para
Para o acesso cervical posterior, deve-se tumores intrarraquianos deve ser feito levando em
decúbito dorsal, ou seja, antes de virá-lo em decúbito um conhecimento anatômico e funcional profundo
ventral. Nestes casos, quando o paciente é posto tanto vertebral como medular e é essencial para
em decúbito ventral com a cabeça em um fixador resultados satisfatórios, de modo que o tratamento
craniano tipo Mayfield, a medula espinhal pode ser destes tumores deve ocorrer somente em centros
de contraindicação clara) ou epidural (dependendo 05. Tish S, Habboub G, Lang M, et al. The epidemiology of
spinal schwannoma in the United States between 2006 and
do grau de compressão da medula) recebe 2014. Journal of Neurosurgery: Spine. 2020;32(5):661–666.
dexametasona perioperatória. Dependendo do grau
Capítulo 44 606
06. Ledbetter LN, Leever JD. Imaging of Intraspinal Tumors. 24. Bridges KJ, Jaboin JJ, Kubicky CD, Than KD.
Radiologic Clinics of North America. 2019;57(2):341–357. Stereotactic radiosurgery versus surgical resection for spinal
hemangioblastoma: A systematic review. Clinical Neurology
07. Bydon M, Gokaslan ZL. Spinal Meningioma Resection.
and Neurosurgery. 2017;154:59–66.
World Neurosurg. 2015;83(6):1032–1033.
25. Timmons JJ, Zhang K, Fong J, et al. Literature Review
08. Boussios S, Cooke D, Hayward C, et al. Metastatic
of Spinal Cord Glioblastoma. American Journal of Clinical
Spinal Cord Compression: Unraveling the Diagnostic and
Oncology. 2018;41(12):1281–1287.
Therapeutic Challenges. Anticancer Res. 2018;38(9):4987–
4997. 26. Alizada O, Kemerdere R, Ulu MO, et al. Surgical
management of spinal intramedulary tumors: Ten-year
09. Cole JS, Patchell RA. Metastatic epidural spinal cord
experience in a single institution. Journal of Clinical
compression. The Lancet Neurology. 2008;7(5):459–466.
Neuroscience. 2020;73:201–208.
10. Tonn J-C, Grossman SA, Rutka JT, Westphal M. Neuro-
27. Juthani RG, Bilsky MH, Vogelbaum MA. Current
Oncology of CNS Tumors . Berlin, Heidelberg: Springer-
Management and Treatment Modalities for Intramedulary
Verlag Berlin Heidelberg; 2006.
Spinal Cord Tumors. Curr Treat Options in Oncol.
11. Ruppert LM. Malignant Spinal Cord Compression. 2015;16(8):39.
Physical Medicine and Rehabilitation Clinics of North
28. Hamilton KR, Lee SS, Urquhart JC, Jonker BP.
America. 2017;28(1):101–114.
A systematic review of outcome in intramedulary
12. Zukas AM, Schiff D. Epidural Spinal Cord Compression ependymoma and astrocytoma. Journal of Clinical
in Adult Neoplasms. In: Newton HB, ed. Handbook of Neuroscience. 2019;63:168–175.
Neuro-Oncology Neuroimaging. 2a edição. Elsevier; 2016.
29. Lonser RR, Oldfield EH. Microsurgical Resection of
p. 59–62.
Spinal Cord Hemangioblastomas. Operative Neurosurgery.
13. Grimm S, Chamberlain MC. Adult primary spinal 2005;57(4):ONS-372-ONS-376.
cord tumors. Expert Review of Neurotherapeutics.
30. Kim TY, Yoon DH, Shin HC, et al. Spinal Cord
2009;9(10):1487–1495.
Hemangioblastomas in von Hippel-Lindau Disease:
14. Weltgesundheits organisation. Lyon: International Management of Asymptomatic and Symptomatic Tumors.
Agency for Research on Cancer. In: Louis DN, Ohgaki H, Yonsei Med J. 2012;53(6):1073.
Wiestler OD, Cavenee WK, eds. WHO Classification of
31. Koh E-S, Nichol A, Millar B-A, Ménard C, Pond G,
Tumours of the Central Nervous System. 2016. p. 408.
Laperriere NJ. Role of Fractionated External Beam
15. Klekamp J, Samii M. Surgery of spinal tumors: mit 105 Radiotherapy in Hemangioblastoma of the Central Nervous
Tabellen. Berlin: Springer; 2007. p. 526. System. International Journal of Radiation Oncology Biology
Physics. 2007;69(5):1521–1526.
16. Celano E, Salehani A, Malcolm JG, Reinertsen E,
Hadjipanayis CG. Spinal cord ependymoma: a review of 32. Gilard V, Goia A, Ferracci F-X, et al. Spinal meningioma
the literature and case series of ten patients. J Neurooncol. and factors predictive of post-operative deterioration. J
2016;128(3):377–386. Neurooncol. 2018;140(1):49–54.
17. Neumann JE, Spohn M, Obrecht D, et al. Molecular 33. Schaller B. Spinal Meningioma: Relationship Between
characterization of histopathological ependymoma variants. Histological Subtypes and Surgical Outcome? J Neurooncol.
Acta Neuropathol. 2020;139(2):305–318. 2005;75(2):157–161.
18. Goulart CR, Mattei TA, Weicker MA, Mendel E. 34. Westwick HJ, Yuh S-J, Shamji MF. Complication
Neuroimaging for Surgical Treatment Planning of Neoplastic Avoidance in the Resection of Spinal Meningiomas. World
Disease of the Spine. In: Newton HB, ed. Handbook of Neurosurgery. 2015;83(4):627–634.
Neuro-Oncology Neuroimaging. Elsevier; 2016. p. 745–62.
35. Klekamp J, Samii M. Surgical results for spinal
19. Ottenhausen M, Ntoulias G, Bodhinayake I, et al. meningiomas. Surgical Neurology. 1999;52(6):552–562.
Intradural spinal tumors in adults—update on management
36. Kelley SP, Ashford RU, Rao AS, Dickson RA. Primary
and outcome. Neurosurg Rev. 2019;42(2):371–388.
bone tumours of the spine: a 42-year survey from the
20. Klekamp J. Spinal ependymomas. Part 1: Intramedulary Leeds Regional Bone Tumour Registry. Eur Spine J.
ependymomas. Neurosurg Focus. 2015;39(2):E6. 2007;16(3):405–409.
21. Pesce A, Palmieri M, Armocida D, Frati A, Miscusi M, 37. Ahlhelm F, Schulte-Altedorneburg G, Naumann
Raco A. Spinal Myxopapillary Ependymoma: The Sapienza N, Nabhan A, Reith W. Bildgebung extraduraler
University Experience and Comprehensive Literature Raumforderungen. Radiologe. 2006;46(12):1035–1043.
Review Concerning the Clinical Course of 1602 Patients.
38. Spirig, Fournier, Hildebrandt, Gautschi. Spinale Tumoren
World Neurosurgery. 2019;129:245–253.
- Teil 1: Extradurale Tumoren. Epidemiologie, klinische
22. Kelft EV. Surgery of the Spine and Spinal Cord. Cham: Aspekte und Therapie. Praxis. 2011;100(14):839–848.
Springer International Publishing. 2016.
39. Harrop JS, Ganju A, Groff M, Bilsky M. Primary
23. Fakhreddine MH, Mahajan A, Penas-Prado M, et al. Intramedulary Tumors of the Spinal Cord: Spine.
Treatment, prognostic factors, and outcomes in spinal cord 2009;34:S69–77.
astrocytomas. Neuro-Oncology. 2013;15(4):406–412.
Capítulo 44 607
40. Verla T, Fridley JS, Khan AB, Mayer RR, Omeis I. 46. Park CH, Lee C-H, Hyun SJ, Jahng T-A, Kim H-J, Kim
Neuromonitoring for Intramedulary Spinal Cord Tumor K-J. Surgical Outcome of Spinal Cord Hemangioblastomas.
Surgery. World Neurosurgery. 2016;95:108–116. J Korean Neurosurg Soc. 2012;52(3):221.
41. Hussain I, Parker WE, Barzilai O, Bilsky MH. Surgical 47. Ropper AE, Huang KT, Ho AL, Wong JM, Nalbach
Management of Intramedulary Spinal Cord Tumors. SV, Chi JH. Intraoperative Cerebrospinal Fluid Leak
Neurosurgery Clinics of North America. 2020;31(2):237– in Extradural Spinal Tumor Surgery. Neurospine.
249. 2018;15(4):338–347.
42. Bollen L, Dijkstra SPD, Bartels RHMA, et al. Clinical 48. Ropper AE, Ropper AH. Acute Spinal Cord
management of spinal metastases—The Dutch national Compression. N Engl J Med. 2017;376(14):1358-1369.
guideline. European Journal of Cancer. 2018;104:81–90.
49. Takai K, Tanaka S, Sota T, Mukasa A, Komori T,
43. Boström A, Kanther N-C, Grote A, Boström J. Taniguchi M. Spinal Cord Astrocytoma with Isocitrate
Management and outcome in adult intramedulary spinal Dehydrogenase 1 Gene Mutation. World Neurosurgery.
cord tumours: a 20-year single institution experience. BMC 2017;108:991.
Res Notes. 2014;7(1):908.
50. Tovar Martín MI, Ramírez EL, Rojas ES, Castillo GA,
44. Mandigo CE, Ogden AT, Angevine PD, McCormick Herrera MZ. Spinal cord astrocytoma: multidisciplinary
PC. Operative Management of Spinal Hemangioblastoma. experience. Clin Transl Oncol. 2011;13(3):185–188.
Neurosurgery. 2009;65(6):1166–1177.
51. Yeo Y, Park C, Lee JW, et al. Magnetic resonance
45. Nater A, Sahgal A, Fehlings M. Management – spinal imaging spectrum of spinal meningioma. Clinical Imaging.
metastases. In: Levin KH, Chauvel P, eds. Handbook of 2019;55:100–106.
Clinical Neurology. Elsevier; 2018. p. 239–255.
Capítulo 44 608
CAPÍTULO 45
CLASSIFICAÇÃO PATOLÓGICA DOS TUMORES DO
SNC E DAS DOENÇAS NEUROLÓGICAS
Ligia Maria Barbosa Coutinho tipos celulares do tecido nervoso (Figuras 1C e 2 C).
Em 1952, Kernohan e Sayre12 aplicaram a classificação
Arlete Hilbig
de Broders, utilizada em patologia dos tumores, aos
Capítulo 45 609
AUTOR ANO FATO CLASSIFICAÇÃO
Capítulo 45 610
Figura 1: Astrocitoma difuso IDH mutante. A: RM de crânio na sequência T1WI com gadolínio, plano axial, mostra
processo expansivo temporal esquerdo que não realça após a administração de gadolínio EV. B: RM de crânio na
sequência T1WI com gadolínio, plano axial, em que se vê processo expansivo temporal direito que não se reforça
após a administração de gadolínio EV. C: Aspecto microscópico de um astrocitoma difuso na técnica argêntica de Del
Rio Hortega, 40x. D: astrócitos positivos na imuno-histoquímica para GFAP, 20x. E: astrócitos positivos para IDH-1 na
imuno-histoquímica para IDH-1, 20X. F: astrócitos neoplásicos com perda da expressão do ATRX na imuno-histoquímica
para ATRX, 10X.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 611
OMS, em 2000, Kleihues e Cavenee17 atualizaram do SNC de 201619 trazendo pela primeira vez a
a classificação dos tumores do SNC, que foi proposta de um diagnóstico integrado histológico e
novamente revista, em 2007, pela OMS com Louis, molecular, que foi corroborada na classificação de
Ohgaki, Wiestler e Cavenee . 18
202120,21. Muitas das alterações moleculares podem
ser inferidas pela avaliação do padrão de expressão
A Neuropatologia tem presenciado muitas
proteica na imuno-histoquímica (IH), como a
modificações, à medida que a utilização de novas
mutação do IDH-1 (Figura 1E). Entretanto, outras
técnicas de investigação e o conhecimento da
alterações como a co-deleção 1p.19q, observada
genética e da biologia molecular nos permite
em oligodendrogliomas, só podem ser detectadas
diagnósticos mais precisos e individualizados.
por métodos específicos, como hibridização in
Estamos, novamente, frente a uma poderosa situ fluorescente (FISH) e a reação em cadeia de
técnica de Biologia Molecular, que tem modificado o polimerase (PCR). O IDH-1 permite diferenciar
estudo do comportamento das neoplasias do SNC, um glioma difuso de um circunscrito e confirmar a
tornando real o que hoje denominamos de Medicina presença de células neoplásicas em meio a tecido
Personalizada. Com esta nova perspectiva, uma cerebral não neoplásico ou gliótico27. O ATRX pode,
revisão da classificação dos tumores do SNC foi também, ser identificado por IH em tecidos normais
publicada em 201619, que foi reexaminada em e quando há mutação, observa-se ausência de
202120,21, após muitos estudos realizados por expressão nuclear, como ocorre nos astrocitomas
comitês de neuropatologistas22-25. (Ac) difusos (Figura 1F), enquanto demonstra
Uma classificação dos tumores do SNC persistência da expressão nuclear em casos de
baseada na localização dos mesmos é interessante oligodendroglioma (OL) ou em glioblastomas tipo
sob o ponto de vista prático, pois o tipo de neoplasia selvagem (GB) (Figura 2E), quando não há mutação
pode variar conforme a localização das mesmas e a do ATRX. Desta forma, deve-se realizar a técnica
idade dos pacientes, assim alguns tumores do SNC de FISH para detectar a co-deleção do 1p19q, que
são mais comuns em crianças, enquanto outros são caracterizam os OLs. Também gliomas difusos com
mais frequentemente encontrados em adultos e alto grau de malignidade da linha média em crianças,
podem ser identificados não só pelo quadro clínico, localizados em tálamo, ponte ou medula espinhal,
como também por exames complementares, onde podem apresentar uma alteração conhecida como
a Ressonância Magnética tem um papel de grande H3K27, quando a presença da metilação poderá ser
importância (Figuras 1A e 1B e 2A e 2B). Podemos identificada pela IH. A fusão do RELA, que ocorre
observar exemplos desses tumores na Tabela 2 5,26
. em ependimomas (EP) de comportamento biológico
mais agressivo e localizados geralmente no
Faz-se necessário que possamos entender
compartimento supratentorial, poderá ser detectada
quais são as alterações moleculares que podem ser
ao encontrarmos a fusão pela técnica de FISH ou
encontradas nos tumores do SNC e seu significado,
pela expressão das proteínas L1CAM e p65-RELa
assim poderemos observar a classificação
através da técnica imuno-histoquímica.
modificada dos tumores do SNC (2021)20,21, bem
como suas respectivas alterações moleculares e seu
grau de malignidade na Tabela 320,21. Também, na Interessante ressaltar que o diagnóstico
Tabela 420,23,24, poderemos evidenciar as alterações atual dos tumores do SNC, para ser completo,
moleculares que permitem o diagnóstico diferencial deve ser avaliado por técnicas, não só de imuno-
entre o glioblastoma IDH-selvagem e o astrocitoma histoquímica, mas principalmente de Biologia
difuso IDH-mutante grau 4. molecular. Entretanto, muitas delas não serão
A OMS propôs a classificação dos tumores acessíveis a todos os neuropatologistas, assim
Capítulo 45 612
Localização Tumores na infância Tumores em adultos
Tabela 2: Localização das neoplasias do SNC de acordo com a faixa etária4, 20.
Ac - Astrocitoma; ATRT - Tumor teratoide/rabdoide atípico; CAPC - Carcinoma de Plexos Coroides; EP - Ependimoma;
ETMR - Tumor Embrionário formador de rosetas de múltiplas camadas; GB - Glioblastoma; GC - Gangliocitoma; GG -
Ganglioglioma; Germ Cell - Células germinativas; MN - Meningioma; NC - Neurocitoma; OL - Oligodendroglioma; PPC -
Papiloma de Plexos coroides; SEGA - Astrocitoma Subependimário de Células gigantes; SEP - Subependimoma; SCHW
- Schwannoma; TU - Tumor; XAP - Xantoastrocitoma Pleomórfico.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 613
Glioma angiocêntrico MYB
Glioma difuso da linha média, com alteração de H3 K27, TP53, ACVR1, PDGFRA,
H3 K27 EGFR, EZHIP, NTRK GRAU 3 e 4
TSC1, TSC2,
Astrocitoma subependimário de células gigantes GRAU 1
PRKCA
Glioma cordoide
Alteração MN1
Astroblastoma, com alteração de MN1
BRAF
5. Tumores Glioneuronais e neuronais
Ganglioglioma
FGFR1
Tumor neuroepitelial disembrioplástico
Capítulo 45 614
PDFGRA
Tumor glioneuronal mixoide *
KIAA1549-BRAF fusão, 1p
Tumor glioneuronal difuso das leptomeninges (methylome)
Gangliocitoma
MAPK pathway
Tumor neuronal multinodular e vacuolizado * GRAU 1
Liponeurocitoma cerebelar
6. Tumores ependimários
ZFTA (C11orf95), RELA, YAP1,
Ependimoma supratentorial MAML2 GRAU 2 e 3
Subependimoma
Capítulo 45 615
TP53, PTCH1, SUFU, SMO, MYCN,
Meduloblastoma, com ativação da via SHH (sonic
GLI2 (methylome) GRAU 4
hedgehog) e mutação do TP53
Capítulo 45 616
Tumores de tecidos moles
Tumores fibroblásticos e miofibroblasticos
Tumores vasculares
Hemangiomas e malformações vasculares
Hemangioblastoma
Tumores de músculo esquelético
Rabdomiosarcoma
Diferenciação incerta
Tumor mesenquimal intracraniano fusão
positiva de FET-CREB *
Sarcoma com rearranjo de CIC *
Sarcoma intracranial primário, com mutação de
mutação de DICER1
DICER1 *
Sarcoma de Ewing
Tumores Condro-ósseos
Tumores condrogênicos
Condrosarcoma mesenquimal
Condrosarcoma
Tumores da Notocordial
Cordoma (incluído o cordoma pobremente
diferenciado)
Tumores Melanocíticos
NRAS (diffuse); GNAQ, GNA11,
Neoplasias melanocíticas difusas das meninges PLCB4, CYSLTR2 (circumscribed)
Capítulo 45 617
Doença de Rosai-Dorfman
Xanthogranuloma Juvenil
Histiocitose de células de Langerhans
Sarcoma histiocítico
Tumores De Células Germinativas
Teratoma maduro
Teratoma imaturo
Teratoma com malignidade tipo somática
Germinoma
Carcinoma embrionário
Tumor do saco vitelino (“yolk sac”)
Coriocarcinoma
Tumor misto de células germinativas
Tumores da Região Selar
Capítulo 45 618
Ganho do cromossoma 7 Presente Ausente
Deleção do gene
Ausente Presente
CDK2 A/B
Tabela 4: Perfil genético comparativo entre os glioblastomas tipo IDH-selvagem e os astrocitomas difusos grau 420,23,24.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 2: Glioblastoma IDH selvagem ou primário. A: RM de crânio na sequência FLAIR no plano axial demonstra
processo expansivo parietal direito, com edema adjacente e desvio das estruturas da linha média para a esquerda.
B: RM de crânio na sequência T1WI com gadolínio no plano axial mostra o realce periférico do processo expansivo.
C: aspecto histológico de uma necrose em pseudopaliçada na técnica argêntica de Del Rio Hortega – 20x. D: aspecto
microscópico do alto índice mitótico presente também nas células endoteliais na imuno-histoquímica para o MIB1 – 20x.
E: células neoplásicas com a expressão retida da proteína ATRX na imuno-histoquímica para ATRX - 10X.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 619
há opção de utilizar as siglas NOS (not otherwise Shh e não Wnt (40%), chamada de grupo 4, o grupo
specified) e NEC (not elsewhere classified) . O 22
maior de MBs e podem incluir tanto a forma clássica
NOS ou SOE (sem outra especificação) será usado de MB, quanto de grandes células, e o anaplásico.
para situações em que os testes necessários não Atualmente, o fator prognóstico mais importante para
foram utilizados, ou foram realizados e o método estes tumores é quanto ao subgrupo molecular em
não funcionou. O NEC será utilizado para situações que se encontram (subgrupo SHH, subgrupo WNT,
em que os testes diagnósticos necessários foram subgrupos não SHH/WNT ou 3 e 4). A classificação
realizados com sucesso, mas o resultado não permite atual da OMS dos MBs pode ser observada na Tabela
um diagnóstico específico dentro da classificação da 619,20 e um estudo comparativo entre os parâmetros
OMS22. moleculares, histológicos e clínicos das alterações
moleculares e o perfil imuno-histoquímico33 podem
Estudos moleculares demonstram que
ser vistos na Tabela 719, 20.
os EPs com fenótipo similar no neuro-eixo têm
origens diferentes e eventos oncogênicos com O prognóstico dos MBs depende do tipo
significado clínico e terapêuticos distintos 25,29,30
. histológico e do grupo molecular a que pertencem33
Assim, a localização dos EPs está associada ao (Tabela 719, 20
). Quando apresentam imuno-
prognóstico 28-30
, pois os supratentoriais têm melhor histoquímica positiva para GFAP, o prognóstico é pior
prognóstico que os de fossa posterior, especialmente e, quando positivos para fotorreceptores, é melhor. A
em crianças 31,32
, enquanto aqueles da região presença de amplificação do gene MYCN determina
espinhal apresentam melhor prognóstico que os também um pior prognóstico. A ressecção cirúrgica
intracranianos. Mas a classificação molecular dos seguida de radio e quimioterapia melhoraram o
EPs, embora referida no texto do livro da OMS sobre prognóstico de 30 para 70%.
a classificação dos tumores do SNC de 2016 , não 19
Muitas modificações da classificação dos
foi incluída na classificação, com exceção daquele
tumores do SNC de 201619 foram estudadas por um
EP de fusão RELA positivo. No entanto, estudos
grupo de neuropatologistas22-25 tendo em vista os
publicados pelo Comitê de Neuropatologistas25,29
inúmeros trabalhos realizados nos últimos anos, que
indicaram a incorporação dessa classificação
identificam novos subgrupos clinicamente relevantes
molecular dos EPs na quinta edição do livro azul dos
de astrocitomas IDH mutantes, com recomendação
Tumores do SNC, cujo resumo pode ser observado
de mudança de nomenclatura e a designação do
na Tabela 525,28-32, como de fato ocorreu (vide Tabela
grau de malignidade com números arábicos, em vez
3 20).
de números romanos31, como se pode identificar
A classificação molecular dos meduloblastomas na Tabela 820. Muitas das alterações propostas na
(MB) é a mais atual, com quatro rotas moleculares: a classificação dos Tumores do SNC estão resumidas
primeira utiliza a via Shh (sunic hedgehog) (25 a 30%), no artigo cIMPACT-NOW update 6–Utrecht24 e
que controla a organização cerebral (organogênese) podem ser observadas parcialmente na Tabela 924,
e a divisão das células tronco e, geralmente, se pois praticamente todas foram incorporadas pela
encontram nesse grupo os MBs desmoplásicos/ classificação dos tumores do SNC de 202120, como:
nodulares, os MBs de grandes células e os MBs
1) o grau de malignidade das neoplasias do
anaplásicos; a segunda utiliza a via de sinalização
SNC não mais será designado por números
celular Wnt (wingless) (10%) e incluem os MBs
romanos, mas por números arábicos;
clássicos e possuem bom prognóstico; a terceira não
2) os gliomas difusos são divididos de acordo
Shh e não Wnt (20-25%), chamadas simplesmente
com a idade dos paciente em gliomas difusos
de grupo 3 e incluem os MBs de grandes células e os
tipo adulto e gliomas difusos tipo pediátrico;
MBs anaplásicos, de pior prognóstico; a quarta não
3) o grupo dos gliomas difusos tipo adulto está
Capítulo 45 620
Características Patologia Idade de
Local Grupo Prognóstico
genéticas dominante apresentação
adultos bom
ST ST-SE Genoma balanceado subependimoma
grau 1 - OMS
pobre, com
invasão,
Genoma balanceado clássico
IT - LATERAL PF-EPN-A infância recorrência e
(LANA 2) anaplásico
metástases
grau 3 - OMS
Poliploidia
clássico adolescência bom
IT - linha media PF-EPN-B Genoma wide
anaplásico adultos grau 2 - OMS
(NELL2)
bom
IT PF-SE Genoma balanceado subependimoma adultos
grau 1 - OMS
clássico adolescência
SP SP - EPN Mutação NF2 bom
anaplásico adultos
bom
SP SP - MPE Poliploidia mixopapilar adultos
grau 2 - OMS
bom
SP SP - SE Deleção 6q subependimoma adultos
grau 1 - OMS
SP -
SP amplificação Amplificação MYCN anaplásico adultos grau 3 - OMS
mycn
Tabela 5: Alterações moleculares dos ependimomas e correlação com localização, idade, tipo histológico e
prognóstico25,28-32.
ST: Supratentorial; IT: Infratentorial; SP: Espinhal; SE: Subependimoma; MPE: Mixopapilar ependimoma.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 621
Meduloblastomas Geneticamente Definidos %
MB WNT-ativado 10
MB SHH-ativado e TP53 mutante
30
MB SHH-ativado e TP53 selvagem
Capítulo 45 622
deleção
grau de proliferação
anaplasia mitoses necrose homozigótica
diferenciação vascular
CDKN2A/B
astrocitoma IDH ausente ou
bem diferenciado ausente ausente ausente ausente
mutante grau 2 baixa
anaplasia presente
astrocitoma IDH
focal ou de forma ausente ausente ausente
mutante grau 3 -------
dispersa significativa
astrocitoma IDH alto índice
anaplasia presente presente presente
mutante grau 4 ------- mitótico
Tabela 8: Nova classificação dos astrocitomas difusos IDH mutantes e seu grau de malignidade20.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 623
12. Ependimoma fossa posterior a (tipo pediátrico) (vide Tabela 5)
13. Ependimoma fossa posterior b (tipo adulto) (vide Tabela 5)
14. Ependimoma espinhal com MYCN amplificação (vide Tabela 5)
15. Neuroblastoma SNC - FOXR2-ativado
16. Tumor do SNC com duplicação BCOR de fileiras internas (CNS-BCOR ITD)
B. Tipos existentes com sugestão de modificação de nomes
1. Glioma cordoide
2. Ependimoma supratentorial - rela fusão positiva (vide Tabela 5)
C. Tipos existentes sem sugestão de mudança de nomes
1. Tumor glioneuronal difuso das leptomeninges
2. Neurocitoma extraventricular
3. Tumor glioneuronal papilar
4. Astrocitoma pilocítico
5. Xantoastrocitoma pleomórfico atípico
6. Tumor do parênquima da pineal com diferenciação intermediária
c. Lesões sem evidências suficientes para modificar a nomenclatura ou incluí-las na classificação
1. Astrocitoma pilocítico com características anaplásicas
2. Xantoastrocitoma pleomórfico com características anaplásicas
3. Ependimomas mixopapilar com características anaplásicas
4. Outros tumores com características genéticas específicas
Tabela 9. Recomendações do cIMPACT update 6 – Utrecht para a nova classificação dos tumores do SNC–modificada24.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 624
anemia
trombofilias
Alterações hematológicas sídrome antifosfolípide (SAF)
policitemia e hiperviscosidases
anormalidades das plaquetas
Alterações
Fibrilação atrial e outras arritmias, cardiomiopatias, forame oval patente (FOP) e
hemodinâmicas e
defeitos do septo atrial, endocardite; infarto do miocárdio; choque
cardiológicas
Capítulo 45 625
A etiologia pode estar relacionada a: (1) 90% destes aneurismas está na circulação anterior.
doenças dos vasos sanguíneos; (2) alterações Nos aneurismas dissecantes há extravasamento
hematológicas; e (3) alterações hemodinâmicas que de sangue para o interior da parede do vaso por
reduzem o FSC, determinadas especialmente por uma ruptura, geralmente entre as camadas média
doenças cardíacas (Tabela 10). e íntima, associada a dilatação arterial focal. São
comuns na circulação vertebrobasilar e podem
A causa mais frequente de alteração de
ocorrer com trauma banal36.
parede do vaso, bem como a principal causa de
isquemia cerebral, é a aterosclerose, que envolve
principalmente a bifurcação de artérias de grande e
DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS (DN)
médio calibre (artéria carótida extra ou intracraniana
Resultam da perda gradual e progressiva de
e artéria basilar, bem como seus ramos principais).
células nervosas (neurônios e/ou células gliais), por
Os vasos de pequeno calibre (pequenas artérias ou
mecanismo de apoptose, levando à disfunção do
arteríolas perfurantes, vênulas e capilares) podem
SN.
estar envolvidos em vários processos patológicos,
sistêmicos ou exclusivos do SNC – inflamatório, As DN se caracterizam pelo envolvimento
infeccioso, tóxico e hereditário, mas as condições de populações celulares específicas (áreas
mais comuns incluem arterioloesclerose (incluindo vulneráveis), que vão determinar o quadro clínico
doença de Binswanger), angiopatia amiloide cerebral inicial predominante em cada situação, o que pode
(CAA) e arteriopatia autossômica dominante com ser utilizado para classificação em cinco grandes
infartos subcorticais e leucoencefalopatia (CADASIL). categorias: 1) demências: córtex cerebral; 2)
A aterosclerose e a doença de pequenos vasos movimentos anormais–núcleos da base; 3) ataxias
compartilham alguns mecanismos e são as formas mais cerebelares: cerebelo; 4) doenças do neurônio
frequentes de doença arterial com o envelhecimento .35 motor: neurônio motor superior e inferior; e 5)
falência autonômica: sistema nervoso autônomo.
Os processos inflamatórios (vasculite) com
O início é insidioso e a evolução é progressiva
necrose e destruição da parede do vaso podem ser
(com velocidade variável), podendo ocorrer uma
desafiadores para o diagnóstico, tanto clínico quanto
sobreposição considerável de manifestações
patológico. Várias classificações têm sido propostas
clínicas à medida que áreas distintas são envolvidas
baseadas na patologia, calibre dos vasos e etiologia.
no processo patológico.
A forma mais comum é a arterite de células gigantes,
comprometendo artérias extracranianas da cabeça e A maioria compartilha alguns aspectos
pescoço, que afeta especialmente mulheres acima clínicos, patológicos e moleculares. A origem deste
de 50 anos causando cefaleia, sensibilidade e edema grupo de doenças é multifatorial e complexa e
temporal, amaurose temporária ou permanente e AVE. podemos identificar uma contribuição variável da
genética e de fatores ambientais, com presença de
As malformações vasculares resultam de
formas esporádicas e outras de origem genética. A
distúrbios de diferenciação do mesoderma durante a
maioria está associada ao envelhecimento, sendo a
vida embrionária e carregam risco de sangramento
idade o maior fator de risco.
intracraniano. Aneurisma é uma dilatação localizada
e persistente de uma artéria e inclui vários tipos: Na histopatologia existe perda neuronal com
sacular, fusiforme, micótico/infeccioso/séptico, reação astrocítica e microglial variável nas regiões
aterosclerótico e dissecante. Os aneurismas envolvidas, e acúmulo de agregados proteicos
saculares são os mais comuns, localizados próximo insolúveis de estrutura anormal que se acumulam no
ou na bifurcação das artérias e representam a principal SN de forma progressiva, iniciando anos antes das
causa de hemorragia subaracnoidea espontânea; primeiras manifestações clínicas. Estes agregados
Capítulo 45 626
podem ser intra ou extracelulares, em neurônios tem sido proposta nas últimas décadas. As proteínas
ou células gliais. Os agregados são formados por envolvidas com maior frequência na patogênese
proteínas que sofrem mudança na sua conformação, das DN são: tau, β-amiloide, α-sinucleina, proteína
formando monômeros e oligômeros que se priônica, TAR-43 e FUS (Tabela 11 e Figura 3).
agregam, tornando-se insolúveis. Existe ainda um Entretanto, em muitas condições uma apresentação
debate sobre qual destas formas seria responsável clínica similar pode estar relacionada a patologias
pela lesão celular. Uma classificação molecular, distintas, genéticas ou adquiridas, dificultando a
baseada na proteína acumulada em cada doença, correlação clinicopatológica37.
Falência autonômica
α-Synucleína
Falência Autonômica Pura (PAF)
Atrofia de Múltiplos Sistemas
α-Synucleína
(MAS)
Capítulo 45 627
Figura 3: Parkinsonismo atípico – atrofia de múltiplos sistemas. A e B: RM na sequência T1WI nos planos sagital e axial
mostrando atrofia de ponte, bulbo e cerebelo. C: exame macroscópico do encéfalo do caso demonstrado em A e B. D
e E: Técnica imuno-histoquímica para anticorpo anti-α-sinucleina demonstrando as inclusões citoplasmáticas gliais em
oligodendrócitos. D. inclusões perinucleares; e E. na ponte; F: inclusões positivas para o anticorpo anti-α-sinucleína em
oligodendrócitos localizados na substância branca de cerebelo.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 45 628
Em um número crescente de DN, incluindo
DA, DP e ELA, tem sido proposto que a progressão
do processo patológico ocorra através de um
mecanismo denominado príon-like, no qual a proteína
com conformação anormal serviria como “modelo”,
com a capacidade de induzir proteínas normais a
mudarem sua conformação. Desta forma haveria
a propagação do processo patológico de maneira
estereotipada ao longo de conexões neurais, com
disseminação trans-sináptica ou através do espaço
extracelular. Embora este mecanismo não esteja
totalmente esclarecido e ainda seja alvo de debate,
estudos in vitro e in vivo têm sustentado a teoria38.
Capítulo 45 629
Marburg), fulminante, levando ao óbito em torno de
DOENÇAS DESMIELINIZANTES
um ano.
Compreendem um espectro de doenças que
inclui desde situações incomuns nas quais não A patologia da EM é definida pela tríade
produção anormal, causadas especialmente por glial. O processo inflamatório é mais extenso nas
leucodistrofias de base genética, até doenças em fases iniciais, mas pode estar presente em todos
ou da bainha de mielina normalmente formada. O pequenas veias e vênulas dentro da lesão ativa na
último grupo é mais frequente e envolve processos substância branca. A infiltração do parênquima por
nesta categoria: 1) esclerose múltipla (EM), que geralmente, associada à desmielinização ativa ou
esclerose concêntrica (doença de Baló); e 4) bem como a micróglia local ativada, participam do
– SPMS). Alguns pacientes apresentam quadro subtipo de EM, mas atualmente é classificada
progressivo desde início dos sintomas (forma separadamente. A maioria dos pacientes expressam
frequência, uma forma monofásica aguda (tipo água dos astrócitos. A patologia difere da EM,
Capítulo 45 630
apresentando lesões de caráter mais destrutivo, ao hipocampo41.
e tem como alvo principal a medula espinal, com
É caracterizada por um padrão específico de
lesões longitudinalmente extensas, e o sistema
perda neuronal e gliose. O hipocampo afetado pode
óptico.
estar firme e de tamanho reduzido (Figura 5A), com
aumento do corno temporal do ventrículo lateral. Em
um caso típico, a histopatologia mostra envolvimento
EPILEPSIA
das regiões CA1, CA4 e CA3, com preservação de
Epilepsia é um distúrbio neurológico frequente
CA2, associada à gliose e dispersão das células
em que há uma tendência a crises epilépticas
granulares do giro denteado (Figura 5B e C).
recorrentes. Existe um grupo heterogêneo de
doenças e fatores de predisposição associados à
epilepsia (Tabela 12).
Capítulo 45 631
cerebral; FCD tipo II apresenta, além de laminação estudos complementares morfológicos, funcionais
anormal, anormalidades citológicas com neurônios e laboratoriais, incluindo estudos genéticos. A
dismórficos, com ou sem células balonadas (Figura neuroimagem, ressaltando a ressonância magnética
6A, B e C); e FCD tipo III apresenta alteração da (RM), pode demonstrar alterações morfológicas
laminação cortical associada a uma lesão principal com alta qualidade que poderiam ser comparadas à
como EH, tumor, malformação vascular ou outra nitidez das descrições anatomopatológicas de uma
lesão adquirida precocemente na vida. Uma revisão autópsia. A RM funcional pode verificar alterações
recente , ressalta a necessidade de inclusão
43
dos metabólitos do parênquima encefálico, como na
de informações sobre características genéticas espectroscopia, que pode demonstrar, por exemplo,
e moleculares na FCD tipo II, além de aspectos alteração na relação de N-acetil-aspartato (NAA)
clínicos e cirúrgicos validados, com proposta de um e a creatinina (Cr), fato que permite correlacionar
sistema de classificação integrada clinico-patológica as alterações cognitivas com a presença de placas
e genética. senis e emaranhados neuronais nas demências.
Em outras doenças neurológicas, incluindo as
neoplasias do SNC podem ter auxílio importante,
tanto no diagnóstico como na evolução, pela
utilização do estudo espectroscópico. Estudos
funcionais como PET ou SPECT, além de serem
capazes de identificar alterações metabólicas,
já são utilizados com marcadores específicos,
permitindo a identificação de componentes até
pouco tempo identificados apenas em exames do
tecido nervoso. Como exemplo, temos o PET para
β-amiloide, já utilizado para avaliar pacientes com
demência. O conhecimento adquirido através de
estudos anatomo-clínicos, hoje, é já é utilizado em
exames pouco invasivos com informações valiosas
para diagnóstico e acompanhamento de diversas
patologias. A inclusão de aspectos genéticos
nas diversas patologias tem modificado nosso
entendimento e possibilitado grandes avanços na
Figura 6: Epilepsia. A: aspecto macroscópico de displasia
área.
com alteração da forma e da laminação cortical em caso
de FCD tipo II; B: positividade para Nestina em caso
de displasia de células balonadas; C: positividade para
Vimentina nas células balonadas.
Fonte: Os autores, 2021. REFERÊNCIAS
1. Sokal RR. Classification: purposes, principles, progress,
prospects. Science. 1974;185(4157):1115-23.
As doenças que acometem o SNC são 2. Gilles FH. Classification of childhood brain tumors.
Cancer. 1985;56:1850-1857.
complexas e compreendem desde malformações
congênitas a alterações metabólicas hereditárias 3. Virchow R. Die Krankhaften Geschwülste. In: Virchow R,
ed. Vorlesungen über Pathologie. Hirschwald: Berlin. 1865.
ou adquiridas, passando pelas neoplasias. Com o
4. Zülch KJ, Christensen E. Pathologische Anatomie der
desenvolvimento tecnológico nas diferentes áreas, Raumbeengenden Intrakraniellen Prozesse. Handbuch der
atualmente podemos dispor para o diagnóstico Neurochirurgie. 3º edição. Berlin: Springer-Verlag; 1956. p.
1-13.
dessas patologias, além de uma boa avaliação clínica,
Capítulo 45 632
5. Drevelegas A, Papanikolaou N. Epidemiology, Histologic 22.Louis DN, Wesseling P, Paulus W, et al. cIMPACT-
Classification, and Clinical Course of Brain Tumors. In: NOW update 1: Not Otherwise Specified (NOS) and
Drevelegas A, ed. Imaging of Brain Tumors with Histological Not Elsewhere Classified (NEC). Acta Neuropathol.
Correlations. 2º edição. Heidelberg: Springer; 2011. p. 3-12. 2018;135(3):481-484.
6. His W. Die Neuroblasten und deren Entstehung im 23. Brat DJ, Aldape K, Colman H, et al. cIMPACT-NOW
embryonalen Mark. Arch f Anat. 1889;249. update 5: recommended grading criteria and terminologies
for IDH-mutant astrocytomas. Acta Neuropathol.
7. Ramon y Cajal S. Étude sur la neurogènese de quelques
2020;139(3):603-608.
vertèbres. Notes sur l’evolution ontogènique du cervelet.
Madrid,1889. 24.Louis DN, Wesseling P, Aldape K,et al. cIMPACT-
NOW update 6: new entity and diagnostic principle
8. Rio Hortega P del. El tercer elemento de los centros
recommendations of the cIMPACT-Utrecht meeting on
nerviosos: Histogênesis y evolución normal de la microglia.
future CNS tumor classification and grading. Brain Pathol.
Mem. Real Soc. Española Hist. Nat.1921; 21:213-268.
2020;30(4):844-856.
9. Hortega PDR. Tercera aportación al conocimiento
25. Ellison DW, Aldape KD, Capper D, et al. cIMPACT-
morfológico e interpretación funcional de la oligodendroglia.
NOW update 7: advancing the molecular classification of
Mem Soc esp Hist nat. 1928;14.
ependymal tumors. Brain Pathol. 2020;30(5):863-866.
10. Bailey P, Cushing H. A classification of tumor of the
26. Coutinho LMB, Hilbig S, Oliveira FH. Diagnóstico
glioma group on a histogenetic basis with correlation study
Topomorfológico das Neoplasias Intracranianas. Rio de
of prognosis. Lippincott. 1926.
Janeiro: DiLivros; 2017.
11. Hortega PDR. Nomenclatura y clasificación de los
27. Chimelli L. Classificação dos tumores do sistema
tumores del sistema nervioso. López e Etchegoyen. 1945.
nervoso central - OMS 2016. O patologista. 2016;125:10-11.
12. Kernohan JW, Sayre GP. Tumors of the central nervous
28. Ernestus RI, Schröder R, Stützer H, Klug N.
system. Atlas of tumor pathology. Armed Forces Institute of
Prognostic relevance of localization and grading in
Pathology. 1952.
intracranial ependymomas of childhood. Childs Nerv Syst.
13. Zülch KJ. Histological typing of tumors os the central 1996;12(9):522-526.
nervous system. Geneva: World Health Organization.
29. Raghunathan A, Wani K, Armstrong TS, et al.
1979.
Histological predictors of outcome in ependymoma are
14. Kleihues P, Burger PC, Scheithauer BW. Histological dependent on anatomic site within the central nervous
typing of tumors of the central nervous system. 2º edição. system. Brain Pathol. 2013;23(5):584-594.
WHO International histological Classification of tumors. New
30. Pereira ELR, Soares ALP, Soares LP, Soares RP,
York: Springer-Verlag; 1993.
Soares DP, Leitão EM. A nova classificação OMS dos
15. Daumas-Duport C, Scheithauer B, O’Fallon J, Kelly tumores do sistema nervoso. O que neurocirurgiões
P. Grading of astrocytomas. A simple and reproducible precisam saber. J Bras Neurocirur. 2018;29(3):545-552.
method. Cancer. 1988;62(10):2152-2165.
31. Witt H, Mack SC, Ryzhova M, et al. Deliniation of two
16. Sternberger LA, Hardy PH, Jr, Cuculis JJ, Meyer clinically and molecularly distinct subgroups of posterior
HG. The unlabeled antibody enzyme method complex fossa ependymoma. Cancer Cell. 2011;20(2):143-159.
(horseradich peroxidase-antihorseradich peroxidase) and its
32. Pajtler KW, Witt H, Sill M, et al. Molecular Classification
use in identification of spirochetes. J Histochem Cytochem.
of Ependymal Tumors across all CNS Compartments.
1970;18:305-333.
Histopathological Grades and Age Groups. Cancer Cell.
17. Kleihues P Cavenee WK (Eds). Classification of Tumors: 2015;27(5):728-743.
Pathology and Genetics of Tumors of Nervous System.
33. Ellison DW, Kocak M, Dalton J, et al. Definition
Lyon: IARC Press/WHO; 2000.
of disease-risk stratification groups in childhood
18. Louis DN, Ohgaki H, Wiestler OD, Cavenee WK. WHO medulloblastoma using combined clinical, pathological, and
Classification of tumors of central nervous System. Lyon: molecular variables. J Clin oncol. 2011;29(11):1400-1407.
IARC Press/WHO; 2007.
34. Feigin VL, Vos T, Nichols E, et al. The global burden
19. Louis DN, Perry A, Reifenberger G, et al. The 2016 of neurological disorders: translating evidence into policy.
World Health Organization Classification of Tumors of the Lancet Neurol 2020;19:255–265.
Central Nervous System: a summary. Acta Neuropathol.
35. Grinberg LT, Thal DR. Vascular pathology in the aged
2016;131(6):803-820.
human brain. Acta Neuropathol. 2010;119(3):277-290.
20. Louis DN, Perry A, Wesseling P, et al. The 2021 WHO
36. Ferrer I, Vidal N. Neuropathology of cerebrovascular
Classification of Tumors of the Central Nervous System: a
diseases. Handb Clin Neurol. 2017;145:79-114.
summary. Neuro Oncol. 2021;23(8):1231-1251.
37. Dugger BN, Dickson DW. Pathology of
21. Wen PY, Packer RJ. The 2021 WHO Classification of
Neurodegenerative Diseases. Cold Spring Harb Perspect
Tumors of the Central Nervous System: clinical implications.
Biol. 2017;9(7):a028035.
Neuro Oncol. 2021;23(8):1215-1217.
Capítulo 45 633
38. Colin M, Dujardin S, Schraen-Maschke S, et al. From 41. Thom M. Hippocampal sclerosis in epilepsy: a
the prion-like propagation hypothesis to therapeutic neuropathology review. Neuropathol Appl Neurobiol.
strategies of anti-tau immunotherapy. Acta Neuropathol. 2014;40(5):520–543.
2020;139:3–25.
42. Blumcke I, Thom M, Aronica E, et al. The clinico
39. Oliveira FH, Rodrigues Neto E, Fonseca MK, et al. pathologic spectrum of focal cortical dysplasias: a
Neurodegenerative changes in the brainstem and olfactory consensus classification proposed by an adhoc Task Force
bulb in people older than 50 years old: a descriptive study. of the ILAE Diagnostic Methods Commission. Epilepsia.
Arq Neuropsiquiatr. 2015;73(7):569-577. 2011;52(1):158–174.
40. Paterson RW, Brown RL, Benjamin L, et al. 43. Najm IM, Sarnat HB, Blümcke I. Review: The
The emerging spectrum of COVID-19 neurology: international consensus classification of Focal Cortical
clinical, radiological and laboratory findings. Brain. Dysplasia - a critical update 2018. Neuropathol Appl
2020;143(10):3104-3120. Neurobiol. 2018;44(1):18-31.
Capítulo 45 634
PARTE 11
DOR E ESPASTICIDADE
CAPÍTULO 46
DOR
Pedro Antônio Pierro Neto Aristóteles (384-322 a.C.) acreditava que a estimulação
dolorosa iniciava na pele e era conduzida pelo sangue
Giovanna Galafassi
até o coração1,2.
Pedro Henrique Simm Pires de Aguiar Galeno (129-199) definia que a dor era uma
sensação originada no cérebro e que não tinha relação
Paulo Henrique Pires de Aguiar
com nada místico. Leonardo da Vinci (1452-1519)
descreve os nervos do corpo e sua relação com a dor,
sendo a medula como condutora dos estímulos e os
INTRODUÇÃO ventrículos, a estrutura receptora das sensações. No
Os primeiros seres humanos, desde a primeira século XVII, René Descartes (filósofo, físico e matemático
sensação de dor, talvez tenham buscado esclarecer o francês), no seu Traité de l’homme, propôs que o corpo
significado desse desconforto e, muito provavelmente se assemelhava a uma máquina, e que a dor seria uma
tenham criado o primeiro tratamento de saúde realizado. perturbação e propõe a sua descrição da via dolorosa
Inicialmente, as dores se dividiam em duas formas, as (figura 1). Segundo o filósofo, ao encostar o pé em uma
de causas externas (queimaduras, traumas, circuncisão, chama acesa, as partículas de calor penetravam por
etc.) e as de causas internas (cefaleia, dores abdominais, nossa pele e eram levadas até o nosso cérebro através
cólicas menstruais, etc.). As dores de causas externas de um fio condutor. No cérebro, abriam uma cavidade e
eram mais fáceis de explicar, enquanto as de causas liberavam os espíritos animais, que iam até os músculos,
internas eram atribuídas a causas místicas e estaria gerando o movimento necessário para afastar a perna da
relacionada a punições decretadas por deuses ou causa da dor1,2.
demônios. No início de nossa civilização, período
neolítico (9.000 a.C.) e durante muitos séculos, os
atos médicos eram exercidos por sacerdotes (xamãs,
feiticeiros, curandeiros, entre outros) que utilizavam
pequenos procedimentos e remédios naturais para as
dores de causas externas e oferendas e sacrifícios para
as dores de causa internas.
Capítulo 46 636
aguda e localizada, conduzida por fibras do grupo
A. A segunda onda, mais difusa e ainda mais
desagradável, depende de fibras do grupo C, com
lenta velocidade de condução8.
Os receptores para dor são chamados de lateral entram no corno posterior, onde se ramificam
periféricas. Essas fibras são componentes menores No trato espinotalâmico, a maioria das
do grupo A, com bainhas de mielina delgadas, e células possui seus corpos celulares no núcleo
fibras do grupo C amielínicas. A dor pode ser sentida próprio (lâminas IV, V e VI). Os grandes neurônios,
como duas ondas separadas por um intervalo de na extremidade do corno posterior (lâmina I),
poucos décimos de segundo. A primeira onda é também contribuem em pequena proporção com
Capítulo 46 637
as fibras espinotalâmicas. Os axônios das células intenso é exercido por certas vias reticulospinais. A
do trato atravessam o plano mediano na comissura mais conhecida dessa via é o trato da rafe espinhal.
branca anterior. Continuando pelo corno anterior Originado nos neurônios nos núcleos da rafe da
da substância cinzenta, as fibras ascendem no formação reticular bulbar, principalmente do núcleo
trato espinotalâmico, situado na parte anterior do magno da rafe. Os axônios amielínicos desse trato
funículo lateral e na região adjacente do funículo atravessam a parte posterior do funículo lateral da
anterior. Prosseguindo rostralmente, axônios vão medula espinal e acredita-se que utilizem serotonina
se incorporando continuamente à região interna do como neurotransmissor9-11.
trato. Nos níveis cervicais superiores, as fibras do
segmento sacrais são mais superficiais, seguidas Mecanismos espinais
por fibras dos segmentos lombares e torácicos9-11. Acredita-se que a percepção da dor seja
modificada por mecanismos neurais no corno
Os tratos ascendentes continuam no interior da
posterior da medula. A transmissão de impulso
medula oblonga, inicialmente sem alterações, porém,
álgico ao encéfalo é alterada por aferências da
quando encontram o nível do núcleo olivar inferior, o
raiz posterior para outras modalidades sensitivas,
trato espinotalâmico atravessa a zona bulbar lateral,
especialmente fibras de grandes diâmetros para tato
também conhecida como área de Monakow. Nesse
e pressão profunda. Essas fibras possuem conexões
nível e, por todo o restante do tronco encefálico,
sinápticas com dendritos de células da substância
as fibras espinotalâmicas constituem a maior parte
gelatinosa. Sequências de impulsos propagados
do lemnisco espinal, que também recebem fibras
pelas fibras mielínicas de maior diâmetro, podem
do trato espinomesencefálico que se destinam ao
estimular as células da substância gelatinosa,
colículo superior. O lemnisco espinal continua pela
fazendo com que esses interneurônios inibam as
região ântero-lateral da parte posterior da ponte.
células de tratos relacionados à nocicepção. Esse
No mesencéfalo, localiza-se próximo à superfície
mecanismo foi postulado por Melzack e Wall na
do tegmento, estendendo-se pela margem lateral
década de 609.
do lemnisco medial. Em sua passagem pelo tronco
encefálico, as fibras espinotalâmicas originam Desde então, o entendimento sobre os
ramos colaterais que terminam na formação reticular caminhos da dor e seu componente emocional não
pontinha e bulbar e na substância periaquedutal do parou de ser estudado. Novos fármacos e novas
mesencéfalo 9,10
. terapias foram desenvolvidas e, apesar de toda
nossa tecnologia, cerca de 30% da população ainda
A maioria das fibras espinotalâmicas termina
sofre desse mal4.
no núcleo ventral posterior do tálamo. Esse núcleo
consiste em duas partes: ventral póstero-lateral, Vias da dor (Figuras 2 e 3)
onde terminam as fibras espinotalâmicas e do
• trato neoespinotalâmico: ascendente, rá-
lemnisco medial, e a parte ventral póstero medial,
pida, fibras A-δ, aguda e bem localizada,
que recebe fibras trigeminotalâmicas. neurônio localizado na lâmina I de Rexed;
As vias descendentes destacam-se pelo
• trato paleoespinotalâmico: ascendente,
controle das respostas conscientes e reflexas aos lenta, fibras lentas, mal localizada e con-
estímulos álgicos. Contudo, tanto a percepção tínua, neurônio localizado na lâmina V de
subjetiva da dor, como a ocorrência de resposta Rexed:
defensiva podem ser suprimidas sob intenso estresse
• trato espinorreticular: os axônios dos neu-
emocional. Esse efeito pode ser mediado por fibras
rônios das lâminas VII e VIII que terminam
corticospinais que se originam no lobo parietal
na formação reticular (bulbar e pontina),
e terminam no corno posterior. O controle mais para logo ascender até o tálamo. Muitos
Capítulo 46 638
desses axônios ascendem sem cruzar a lar mesencefálica e a substância cinzen-
linha média; ta periaquedutal até os núcleos parabra-
quiais da formação reticular. Esse trato,
• trato espinotectal ou espinomesencefálico: devido as suas conexões com a amígdala,
formado por axônios de neurônios de pro- sugerindo que esse trato contribui com os
jeção das lâminas I e IV que se projetam componentes afetivos da dor12,13.
contralateralmente até a formação reticu-
Capítulo 46 639
Classificação geral das fibras nervosas central e podem surgir meses ou anos
(Figura 4) após a lesão. Geralmente provocadas
por infartos, hemorragias, traumas, le-
• fibras A: grossas, mielinizadas, com alta sões desmielinizantes, entre outros.
velocidade de resposta e são subdivididas Exemplos: dores mielopáticas, dores
conforme seu diâmetro (α, β, γ e δ, em talâmicas;
ordem decrescente);
• periférica: neuropatia actínica entre ou-
• fibras B: fibras eferentes pré-ganglionares tros.
do sistema nervoso autônomo e não en-
contradas nas raízes dorsais; • dor psicogênica: fatores emocionais po-
dem gerar sintomas físicos devido à in-
• fibras C: amielínicas, de baixa velocidade fluência do sistema límbico. O fato de sua
de condução. As fibras Aδ e C – são as origem ser vinculada a um estado emocio-
fibras relacionadas à sensibilidade doloro- nal, assim como as anteriores, não é vo-
sa. luntária e deve ser tratada.
CLASSIFICAÇÃO DA DOR
Etiologia Localização
• dor nociceptiva: provocada pela estimula- • dores primárias: ocorre no local da lesão;
ção excessiva dos nociceptores. Resulta
de afecções somáticas e viscerais, rela- • dores secundárias:
cionadas à lesão de tecidos ósseos, mus-
• irradiadas: superficial ou profunda,
culares ou ligamentares.
consequência direta de um nervo sen-
• dor neuropática: dor primária que resul- sitivo ou misto. Ex.: ciatalgia;
ta de uma resposta anormal do sistema
• referidas: é a projeção na superfície de
nervoso em decorrência de uma lesão ou
uma dor visceral. Ex.: dor em membro
disfunção do mesmo. Podem estar rela-
superior esquerdo na vigência de um
cionadas ao sistema nervoso central ou
infarto arterial miocárdico.
periférico.
Capítulo 46 640
Figura 3: Principais tratos fibrosos na substância branca na medula espinhal cervical.
Fonte: Baseado em Lopes LS, 201614.
Capítulo 46 641
Tempo
• dor aguda: manifesta-se transitoriamente
durante um período relativamente curto,
de segundos a poucos meses, geralmente
Figura 5: Escala visual analógica – EVA.
associadas a lesões em tecidos ou órgãos;
Fonte: extraído de Teixeira et al. 201115.
• dor crônica: tem duração prolongada, que
pode se estender de vários meses a vários
anos e geralmente são as mais comuns e • escada analgésica: apresentada à socie-
por diversos fatores como: traumas, isque- dade médica em 1986, realizada através
mias, compressões, polineuropatias, dor de uma parceria entre Organização Mun-
do membro fantasma, neuralgia pós-her- dial de Saúde (Figura 6) e a Associação
pética, neuralgia do trigêmeo, associada a Internacional para Estudo da Dor. Por
uma doença crônica; meio dessa escada é possível haver uma
padronização nos tratamentos, mas após
• dor recorrente: apresenta períodos de cur- mais 3 décadas de seu lançamento e com
ta duração, no entanto, se repetem com a evolução de fármacos e tratamentos mi-
frequência. nimamente invasivos, fica evidente sua re-
formulação para os dias atuais. Esse mo-
delo ainda é utilizado e tem 3 patamares
Intensidade da dor de tratamento:
• escalas: são usadas para avaliar a percep-
• 1º degrau: dor leve – analgésicos não
ção de dor do paciente. O próprio paciente
opioides + adjuvantes;
classifica sua dor, embora muito eficiente,
os resultados podem sofrer influências re-
• 2º degrau: dor moderada – opioides
ligiosas, culturais, emocionais entre outros
fracos + analgésicos não opioides +
fatores.
adjuvantes;
• escala visual analógica (EVA) – O pa-
• 3º degrau: dor intensa – opioides fortes
ciente observa e escolhe desenho de
+ analgésicos não opioides + adjuvan-
rostos do feliz ao triste referindo a estar
tes
ou não com dor. Trata-se de uma linha
reta contendo seis desenhos de rostos,
cuja a interpretação é o rosto sorrindo
significa sem dor; e o rosto triste, no
final da linha, significa dor intensa (Fi-
gura 5)15;
Capítulo 46 642
adequada aos dias atuais18: O alívio da dor pela morfina é relativamente
seletivo. Diferente dos analgésicos anti-inflamatórios,
• 1º degrau etiológico: tratamento da etiolo-
não existe dose teto, e sim dose suportada pelo
gia da dor;
paciente antes de efeitos adversos limitantes. Os
• 2º degrau dor leve: analgésicos não opioi- principais efeitos adversos são: sedação, confusão
des + adjuvantes; mental, náuseas, vômitos e depressão respiratória.
Da mesma forma que não existe dose teto, também
• 3º degrau dor moderada: opioides fracos
não existe uma dose mínima. Cada indivíduo tem
+ analgésicos não opioides + adjuvantes;
diferenças genéticas nas distribuições e quantidades
• 4º degrau dor intensa: opioides fortes + de receptores opioides, por isso é necessária uma
analgésicos não opioides + adjuvantes; titulação de dose individual18-20:
Capítulo 46 643
Figura 7 - Escada analgésica modificada por Dr. José Oswaldo de Oliveira Júnior.
Fonte: José Oswaldo de Oliveira Júnior. Tratamento cirúrgico da dor: princípios básicos17.
Capítulo 46 644
opioide que menos causa constipação 2. razões farmacodinâmicas como:
tolerância ou hiperalgesia induzida por
intestinal, depressão respiratória
opioides; e
e dependência. Sua potência
3. razões farmacocinéticas como
analgésica, comparada à morfina,
declínio da absorção do opioide,
fica entre 1/6 e 1/10. A dose usual é interação com outros fármacos,
de 50 a 100 mg em intervalos de 4 a acúmulo de metabólitos e/ou falência
renal.
6h ou nas apresentações de liberação
prolongada de 100 a 200 mg a cada b) efeitos adversos incontroláveis/
toxicidade:
12h. A dose máxima diária é 400 mg; e
1. gastrointestinais como: obstipação,
4) metadona: opioide forte, agonista
náuseas e vômitos;
sintético, é uma alternativa à morfina.
2. neurológicos (sedação, sonolência,
Antagonista do NMDA é indicado para alucinações etc).
dor neuropática. Muito utilizada no
c) outras ocorrências:
rodízio de opioides e no tratamento
1. doses máximas em apresentações
de dependência de opioides, pode com dois fármacos;
também ser usado em pacientes com
2. custo do fármaco;
insuficiência renal e hepática. Causa
3. rotura no fornecimento do fármaco;
menos dependência, menos euforia e
e menos sedação que a maioria 4. perda da via.
dos opioides; porém, devido a sua
Conversão de doses nos opioides
imprevisível meia vida e eliminação,
sua prescrição deve ser cautelosa. Primeiro, deve-se sempre converter a dose do
A dose terapêutica pode levar dias. opioide utilizado para morfina e depois no fármaco
que será utilizado20:
Apresentações de 5 e 10 mg são
utilizadas em intervalos de 12/12h. a. morfina EV/SC para morfina VO: deve-se
Deve-se aguardar de 3 a 5 dias antes multiplicar por 3 a dose EV para VO ou,
em situação oposta, dividir por 3. Exem-
de cada aumento.
plos de doses de morfina em suas vias:
5) oxicodona: agonista de receptores 300 mg de morfina oral = 100 mg de morfi-
mu e kappa. No Brasil, só se encontra na endovenosa = 10 mg de morfina epidu-
sua versão de liberação lenta, em ral = 1 mg de morfina intratecal.
Capítulo 46 645
taxa de conversão 10:1; • inibidores da captação de serotonina: não
são eficazes no tratamento da dor, mas
• de 601 a 800 miligramas de morfina a são eficientes nos transtornos de afetivi-
taxa de conversão 12:1; dades provocados por dores crônicas; e
Tratamento cirúrgico
Relaxante muscular
O tratamento cirúrgico da dor só será
Indicados para tratamento da dor ocasionada indicado quando o tratamento etiológico e o
por espasmos, mioclonias e espasticidade. tratamento medicamentoso associado a terapia não
farmacológica se mostrarem ineficazes. Isso pode
ocorrer devido a três possibilidades:
Antidepressivos
a. o tratamento não tem a resposta esperada
• tricíclicos: são os mais usados como adju- em doses terapêuticas;
vantes na dor crônica. Em dose baixa, tem
efeito analgésico e potencializam analgé- b. os efeitos colaterais impedem o aumento
sicos anti-inflamatórios não hormonais; ou a manutenção de uma dosagem eficaz;
e
Capítulo 46 646
c. quando o tratamento oferece risco de mor- circuitos inibitórios cortico-talâmicos e as unidades
te ou agravo da doença, mesmo sendo efi- celulares do sistema supressor do tronco encefálico.
caz, e pela literatura, isso ocorre em me- Embora alguns pacientes não relatem um alívio
nos de 10% dos casos, devido à evolução
considerável na dor, a maioria dos pacientes tratados
dos fármacos e de novas terapias antál-
por esse método, referem um alívio de 50 a 70%
gicas. Quando falamos que nas melhores
expectativas que 30% da população mun- na intensidade da dor. Pode ser realizada de forma
dial sofre de dor crônica e que 10% desse percutânea ou por laminectomia13,21.
número irá necessitar de algum procedi-
Indicações
mento que lhe proporcione uma melhor
qualidade de vida, estamos falando de 3% a. dor crônica radicular;
das pessoas do planeta.
b. neuropatia periférica;
1) bloqueios neurolíticos: indicados para
dores refratárias, preferencialmente oncológicas. c. doença vascular periférica;
Podem ser usados agentes químicos ou térmicos.
Dos agentes químicos, os mais usados são o álcool d. angina instável;
Capítulo 46 647
O sistema consiste em implantar um sistema b. neuropatias de plexo de causas actínicas,
subcutâneo que fornece medicação diretamente no oncológicas ou traumáticas;
espaço intratecal ou ventricular13.
c. neuralgia pós-herpética;
Indicações:
d. dor mielopática;
a. quando a morfina é eficaz, mas os efeitos
colaterais impedem sua permanência ou e. lesão na cauda equina; e
titulação;
f. espasticidade.
b. quando a dose terapêutica oferece risco 5) cordotomias: consistem na interrupção
ao paciente;
do trato espinotalâmico no quadrante anterolateral
c. espasticidade refratária de origem me- da medula espinal oposto ao lado em que a dor é
dular ou cerebral em indivíduos que não referida. Pode ser realizada por técnica percutânea
respondem ou não toleram o uso oral de ou por laminectomia22.
baclofeno.
O método percutâneo utiliza radiofrequência a
Esse procedimento também pode ser realizado 90 graus, por 60 s, e pode ser repetido até se obter
em duas etapas, sendo, a primeira a passagem de um analgesia esperada, utilizando-se de anestesia local
cateter epidural e ministrado morfina em ambiente e leve sedação, pois é obrigatório que o paciente seja
de UTI, ou realizado em fase única de implantação. colaborativo para obter parâmetros neurofisiológicos
Importante ter uma dose inicial sabidamente tolerada seguros. Para pacientes não colaborativos é indicado
pelo paciente e observar por no mínimo 24h. Existem o método a céu aberto. Indicação somente para dor
hoje, no mercado, dois sistemas de infusão de oncológica que acomete unilateralmente abaixo da
bombas. O mais utilizado é o sistema eletrônico que linha do mamilo.
impulsiona o fármaco através do cateter por uma
6) mielotomias: consistem na interrupção das
bomba peristáltica, e permite regular a quantidade
fibras espinorreticulotalâmicas que cruzam a linha
de fármaco, infundido através de telemetria. Outro
média em direção dos quadrantes ântero-laterais
sistema de infusão de fármacos intratecal é através
da medula espinhal e se dirigem às estruturas
de sistemas acionados pela expansão de gás. Esse
suprassegmentares, produzindo analgesia bilateral
sistema permite um fluxo controlado, porém fixo.
e simétrica. O procedimento é realizado a céu aberto
As bombas necessitam ser recarregadas em após laminectomia. A técnica percutânea é pouco
até 90 dias devido à estabilidade dos fármacos. utilizada.
4) lesão do trato de Lissauer e do corno Indicações:
posterior da medula espinal: realizado sob anestesia
geral, após laminectomia visando expor a zona a. em caso de dores oncológicas:
de penetração, na medula espinal, das raízes
• região pelvi-perineal;
correspondentes à inervação das áreas onde a dor
é referida. Então, são realizadas lesões térmicas por • membros inferiores bilateral.
radiofrequência com 2 mm de profundidade e 2 mm
b. dor mielopática;
de distância9.
Capítulo 46 648
como reticulotomia rostral mesencefálica. a) dor do membro fantasma;
Procedimento realizado pelo método estereotáxico,
b) avulsão de plexo; e
visa interromper as vias espino-reticulo-talâmicas.
Apresenta resultados favoráveis em 70% dos c) dor neuropática central pós-AVE.
doentes com anestesia dolorosa em face. Cerca de 10) bloqueios anestésicos: as substâncias
50% em doentes com síndrome talâmica, cerca de comumente administradas são a procaína,
69% dos doentes com avulsão de raízes do plexo lidocaína, prilocaína, bupivacaína e ropivacaína e
braquial e cerca de 50% em casos de dor fantasma podem ser injetadas nas vizinhanças dos troncos
e no coto de amputação. nervosos, plexos, raízes nervosas, espaço epidural
Capítulo 46 649
los definitivos. O alvo fica na extremidade sedação. Identificado o ramo, é realizada
da agulha, o campo elétrico é de maior a lesão, porém não está indicada para o
intensidade. Por não provocar lesão, não ramo oftálmico V1. Avalia-se a hipoestesia
apresenta risco de dor neuropática. álgica antes de terminar o procedimento.
13) neuromodulação de nervos periféricos: 15) neurotomias: podem ser realizadas por
tratamento que tem sua indicação para tratamentos lesões térmicas ou químicas em nervos periféricos
de dores neuropáticas periféricas refratárias ao
a. radiofrequência de esfenopalatino
tratamento convencional. A proposta é modificar
– indicados para cefaleias em
a transmissão sináptica, estimulando ou inibindo
determinados circuitos do sistema nervoso periférico. salva, neuralgia do trigêmeo V2
Um fator que determina o sucesso dessa técnica é e sequela de herpes zoster;
ter bons resultados com bloqueios, mesmo por curto b. glossofaríngeo;
espaço de tempo. Melhores resultados na cefaleia c. vago;
cervicogênica e nas sacroileítes24. d. grande occipital; e
14) neurotomia retrogasseriana: a dor e. ramos recorrentes das raízes
trigeminal acontece devido a uma lesão ou disfunção cervicais.
do V par de nervo craniano e é considerada como 16) nucleotratotomia trigeminal: pode ser
uma das mais intensas síndromes álgicas. Descrita realizada por via estereotaxica ou a céu aberto.
pela primeira vez o século XVI, tem uma maior O método consiste em fazer uma lesão na porção
incidência entre a 5º e 6º década de vida, predomínio oval do núcleo do trato espinal do nervo trigêmeo
no sexo feminino e no lado direito. Seu diagnóstico é (nucleotratotomia do trato espinal do nervo trigêmeo)
clínico e normalmente responde bem a medicações ou na junção entre o terço médio e o terço inferior
antiepiléticas como a carbamazepina. Na falência do da oliva (nucleotratotomia trigeminal pontina).
tratamento clinico, é indicada a intervenção cirúrgica, Indicadas para dor fácil por desaferentação ou dor
que pode ser realizada por diversos métodos. facial atípica, com melhoras entre 62 e 100%, porém
com uma taxa de recidiva em torno de 40% ao longo
• descompressão neuro-vascular: forma
dos anos.
mais eficiente, porém mais invasiva.
Descrita por Frazie em 1901 e intro-
duzida no Brasil pelo Dr. J.R. Portugal,
Vocabulário da dor
teve sua técnica modificada ao longo Alodínia: dor intensa após estímulo não
dos anos; e doloroso. Limiar baixo para dor
Capítulo 46 650
Disestesia: sensação desagradável anormal, 9. Galafassi GZ, Aguiar PHP, Takahashi AA, et al.
Lesionamento da zona de entrada da raiz dorsal: Revisão
espontânea ou evocada.
Sistemática. Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia: Brazilian
Neurosurgery 2021; 40(03): e229-e237.
Dor central: dor iniciada ou causada por uma
10. Galafassi ZG, Aguiar PHSP, Oliveira NM, et tal. Celiac
lesão primária ou disfunção no sistema nervoso
Plexus Neurolysis: Systematic Review. Rev Chil Neurocirug.
central. 2020;46:37-44.
Hiperalgesia: um aumento da resposta a um 11. Seba MCC, Bernardo HNSA, Sarturi NMS, et al.
Cordotomia Cervical em Câncer Terminal: Alívio da Dor
estímulo que normalmente é doloroso. em Tratamento Oncológico. Arquivos Brasileiros de
Neurocirurgia. 2021; 40(1): 71-77.
Hiperestesia: aumento da sensibilidade à
12. Adaptado de Débora Czarnabay. Curso de extensão
estimulação. somatossensorial e função motora. UFGRS, 2017.
Disponível em: http://revendofisiologia.com.br/storage/2017/
Hiperpatia: resposta explosiva e prolongada Sistema%20Somatossensorial%20e%20Fun%E7%E3o%20
a um estímulo. Motora.pdf
13. Galafassi GZ, Simm Pires de Aguiar PH, Si mm RF, et
Hipoalgesia: dor em menor intensidade al. Neuromodulation for Medically Refractory Neuropathic
comparada ao que o estímulo causa. Pain: Spinal Cord Stimulation, Deep Brain Stimulation,
Motor Cortex Stimulation, and Posterior Insula Stimulation.
Hipoestesia: resposta diminuída a um World Neurosurg. 2021;146:246-260.
estímulo. 14. Baseado em Luiza da Silva Lopes. Sistema motor
somático. 2016. Disponível em: https://edisciplinas.
Neurite: inflamação de um ou mais nervos. usp.br/pluginfile.php/2298264/mod_resource/content/1/
sistema%20motor.pdf
Parestesia: sensações anormais não
15. Débora Czarnabay. Curso de extensão
dolorosas. somatossensorial e função motora. UFGRS, 2017.
Disponível em: http://revendofisiologia.com.br/storage/2017/
Somação: percepção da dor com intensidade Sistema%20Somatossensorial%20e%20Fun%E7%E3o%20
crescente. Motora.pdf
16. Teixeira RUF, Zappelini CM, Oliveira LG, et al.
Temporal: aplicação repetitiva do mesmo Correlação entre peak flow nasal inspiratório e escala visual
estímulo doloroso em intervalos curtos. analógica pré e pós uso de vasoconstrictor nasal. Arquivos
Internacionais de Otorrinolaringologia. 2011;15(2):156-162.
doi:10.1590/S1809-48722011000200006.
17. MultiSaude Educacional. https://multisaude.com.br/wp-
REFERÊNCIAS content/uploads/2017/05/escada-analgesica-oms.jpg
1. Kiernan JA. Neuroanatomia Humana de BARR. 7º 18. José Oswaldo de Oliveira Júnior. Tratamento cirúrgico
Edição. Manole; 2002. da dor: princípios básicos. https://www.anestesiologiausp.
2. Silverthorn DU. Fisiologia Humana: Uma abordagem com.br/wp-content/uploads/cir-da-dor-oncol%C3%B3gica.
Integrada. 7ª ed. Artmed; 2017. pdf.
3. Ramozzi-Chiarottino Z, Freire J-J. O dualismo de 19. Chacur M. Introdução a Fisiopatologia da Dor - Histórico
Descartes como princípio de sua Filosofia Natural. Estudos da Dor e Conceitos, Instituto de Ciências Biomédicas
Avançados. 2013, 27(79):157-170. III- ICB/USP, Departamento de Anatomia. Disponível
em: https://www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/
4. Teixeira MJ. Fisiopatologia da Dor. In: Irimar de Paula uploads/23_04_2014_Aula-de-Introdu%C3%A7%C3%A3o-
Posso, Eduardo Grossmann, Paulo Renato Barreiros %C3%A0-Fisiopatologia-da-Dor.pdf.
da Fonseca et al. (eds). Tratado de Dor, vol. 1, 1a Ed.,
Sociedade Brasileira da Dor (SBED), 2017. p. 155–196 20. Ashmowi HA, Introdução a Fisiopatologia da Dor.
Histórico, Circuitos da Dor e Conceitos. Programa
5. Preston RR, Wilson TE. Fisiologia Ilustrada. 1ª ed. de Educação Continuada em Fisiopatologia e
Artmed; 2014. Terapêutica da Dor. USP. 2019. Disponível em: https://
6. Hall JE. Tratado de Fisiologia Médico. 13ª ed. Guanabara www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/uploads/
Koogan; 2017. Introdu%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0-fisiopatologia-da-
dor_2019.pdf.
7. Aires M. Fisiologia 3ª ed. Guanabara Koogan; 2008.
21. Lopes A, Costa CML, Soares FA, et al. Manual de
8. Bear MF, Connors BW, Paradiso MA. Neurociências: Condutas Diagnóstica e Terapêuticas em Oncologia. 4a Ed.
Desvendando o Sistema Nervoso. 4ª ed. Artmed; São Paulo: AC Camargo Cancer Center, 2015.
Capítulo 46 651
22. Camporeze B, Si mm R, Maldaun MVC, Pires de Aguiar 24. Caiado Vencio R, Raffa PEAZ, Ponce ACC, et al. An
PH. Spinal Cord Stimulation in Pregnant Patients: Current unusual case of lead migration in occipital nerve stimulation:
Perspectives of Indications, Complications, and Results A case report and literature review. Surg Neurol Int.
in Pain Control: A Systematic Review. Asian J Neurosurg. 2021;12:189.
2019;14(2):343-355.
25. Aguiar PHP, Buwembo J., Socomom D., et al.
23. Cavalcanti ASB, Pierro Neto PA. Bloqueios Miofaciais. Complex regional pain Syndrome: New Concepts
In: Irimar de Paula Posso, Eduardo Grossmann, Paulo Regarding Diagnosis and Treatments. Revista Chilena de
Renato Barreiros da Fonseca et al. (eds). Tratado de Dor, Neurocirurgia. 2017;43:59-68.
vol. 2, 1a Ed., Sociedade Brasileira da Dor (SBED), 2017, p.
1849–1860.
Capítulo 46 652
CAPÍTULO 47
ESPASTICIDADE
Capítulo 47 653
uma hemiface, tem rotação interna e abdução do (MACS) e a função motora fina bimanual (BFMF),
ombro, aduz o braço e apresenta flexão do cotovelo, ambas com 5 diferentes níveis de classificação, onde
flexão de dedos e de punho, com a coxa rígida em os menores níveis correspondem à maior função15,16.
extensão e o pé posicionado em equino-varo (postura
Os exames complementares consistem
de Wernicke-Mann). A criança espástica apresenta
em imagens, eletrofisiologia, análise de líquido
os joelhos discretamente fletidos, os pés juntos, as
cefalorraquidiano (LCR) e os que visam identificar
coxas com adução (em tesoura), os pés em equino
doenças que possam interferir na espasticidade.
varo e a marcha digitígrada. O lesado medular
Os bloqueios anestésicos para análise funcional de
geralmente apresenta espasmos em extensão dos
membros e ocorrência de deformidades estruturadas
membros inferiores, além de apresentarem sintomas
ajudam a definir as condutas subsequentes. A
neurovegetativos associados5–10.
polieletromiografia, a eletromiografia dinâmica
A avaliação clínica e neurológica detalhada, associada à análise cinemática dos movimentos e
atribuindo especial atenção para com as funções a estimulação elétrica transcraniana do córtex motor
motoras residuais, incluindo-se a marcha, os são os instrumentos utilizados para a avaliação
reflexos e a ocorrência de espasmos espontâneos eletrofisiológica6,9,10. A análise tridimensional de
ou evocados, as funções urinárias, sexuais e marcha tem se mostrado importante instrumento
gastrointestinais, a sensibilidade, a identificação de para definição de tratamento multidisciplinar
escaras, infecções e cálculos urinários, ossificações integrado 17–19
.
heterotópicas, fraturas, unhas encravadas e outras
anormalidades é essencial para a seleção do
tratamento9–12.
TRATAMENTO DA ESPASTICIDADE
Dentre as escalas que quantificam a A espasticidade não deve ser tratada apenas
espasticidade, duas são as mais utilizadas na em função da sua presença, uma vez que pode
neurocirurgia: a escala de Ashworth modificada, que ser útil para compensar o déficit motor ou evitar
tem 6 graus sendo os menores os menos espásticos eventos trombóticos. Deve ser reduzida a hipertonia
(dividida em grau 0; 1; 1+; 2; 3 e 4) e a escala de excessiva que induz prejuízos funcionais adicionais.
espasmos de Penn, dividida em 5 graus, sendo os O tratamento visa a melhorar a amplitude dos
maiores aqueles com mais espasmos (0; 1; 2; 3 e movimentos, a mobilidade articular, a marcha,
4) . A gravidade da função motora em crianças com
13
a adaptação das próteses, o posicionamento e
paralisia cerebral pode ser classificada em cinco níveis a cosmese e a reduzir o consumo de energia, a
de acordo com a GMFCS , baseada nas limitações
14
ocorrência de espasmos, a dor, a sobrecarga dos
funcionais, necessidade de tecnologias assistivas e cuidadores e do aparelho de saúde e a prevenir a
dispositivos de suporte como cadeiras de rodas e instalação de escaras, retrações tendíneas, lesões
andadores como: 1) limitações para o desempenho ou disfunções viscerais. É importante considerar
das atividades como correr normalmente e pular em se déficit motor e de destreza são geralmente
só pé; 2) limitações durante marcha em ambiente mais incapacitantes que a espasticidade. Isto
externo, necessita de corrimão para subir escada; significa que o tratamento da espasticidade deve
3) marcha com o auxílio de dispositivos de suporte; fundamentar-se na seleção adequada dos doentes
4) marcha em ambiente interno com auxílio, para para que os ganhos funcionais dentro de certos
deslocamentos utiliza cadeira de rodas; e 5) ausência limites sejam, pelo menos, satisfatórios e não
de marcha. As escalas funcionais mais utilizadas constituam prejuízos adicionais para os doentes e
para espasticidade em membros superiores são seus cuidadores. Caso não seja impactante, não
a sistema de classificação da habilidade manual necessita tratamento. Influenciam também o plano
Capítulo 47 654
e o momento do tratamento, a idade da criança, a pode ser necessária em muitos doentes, pois a
presença de morbidades associadas, como presença neurólise reduz os reflexos tônicos de estiramento
de contraturas fixas, convulsões e comprometimento rapidamente, porém, de forma fugaz21,25,26. A
cognitivo, capacitar os famíliares e terapeutas . 6
injeção de anestésico local antes da injeção
de fenol ou álcool é recomendável para evitar-
O tratamento da espasticidade deve iniciar-
se a dor em queimor durante o procedimento. A
se com medidas conservadoras, incluindo-se o
neurólise química é realizada em nervos motores
uso de medicações específicas, execução de
em pacientes com sensibilidade preservada ou
programa de reabilitação orientado por médicos
nervos mistos em pacientes com lesão medular
fisiatras e suporte de equipe multidisciplinar
completa. Pode haver necessidade de sedação
(neurologistas, neurocirurgiões, ortopedistas,
ou aplicações de anestésicos locais topicamente
urologistas, psiquiatras, cirurgiões plásticos,
durante a injeção em crianças. As infiltrações
psicólogos, enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas
habitualmente são empregadas para prever os
ocupacionais, etc), preferencialmente em centros
resultados da neurectomia ou da rizotomia e podem,
de referência (especializados) para reabilitação.
adicionalmente, melhorar a dor. A utilização de
Se houver uma doença ativa relacionada com a
métodos complementares nos procedimentos,
espasticidade, a mesma deve ser tratada20, seguida
como eletroneuromiografia, eletroestimulação e uso
de estabilização clínica do doente, resolução das
de ultrassonografia podem otimizar os resultados
condições relacionadas à progressão e agravamento
obtidos, ou mesmo diminuir o volume a ser injetado
da espasticidade (tratamento de inflamação ou
com mesma eficácia27,28. A aplicação de toxina
infecção), resolução das disfunções viscerais,
botulínica é um dos tratamentos mais utilizados para
obstipação, tratamento das escaras, cicatrizes e
a espasticidade, apesar da curta duração de seus
unhas encravadas, redução dos estímulos dolorosos
efeitos, já que pode ser repetido e apresenta baixo
e de outros estímulos sensitivos estimulantes e o
risco de complicações29.
controle dos estresses psicológicos e de outras
anormalidades psíquicas e comportamentais dos A neurocirurgia funcional deve ser considerada
doentes 7,21
. A própria espasticidade pode funcionar quando a espasticidade exagerada não for controlada
como um fator de piora dela mesma. com essas medidas. Devem reduzir a hipertonia
sem comprometer a atividade física, o tono muscular
Os medicamentos mais utilizados na
útil e as funções sensitivas residuais. Quando há
atualidade para tratar a espasticidade (Quadro 1)
preservação da movimentação voluntária, tais
consistem principalmente em miorrelaxantes de
procedimentos visam a readequar a harmonia das
diferentes classes, sendo o baclofeno a medicação
atividades entre os músculos agonistas e paréticos e
de escolha para o tratamento inicial tanto em
os antagonistas espásticos e, quando a motricidade
crianças como em adultos 22
. O tratamento da
voluntária está muito comprometida ou ausente, visam
disreflexia neurovegetativa é feito com nitratos, anti-
prevenir a instalação de deformidades ortopédicas
hipertensivos, bloqueadores de canais de cálcio
e escaras. Os métodos operatórios podem ser
(como nifedipina) e antagonistas adrenérgicos alfa
aplicados em casos de hipertonia generalizada ou
(prazocina) ou beta (propranolol)23,24.
localizada e seus efeitos podem ser temporários ou
O tratamento intervencionista da espasticidade permanentes. Incluem os procedimentos realizados
se dá com uso de agentes neurolíticos (como fenol nos nervos periféricos, nas raízes nervosas, na
ou álcool) ou aplicação de toxina botulínica tipo medula espinal ou no encéfalo30.
A. A infiltração dos pontos motores musculares ou
dos nervos com agentes neurolíticos como o fenol
a 3 a 7%, álcool a 50 a 100% ou toxina botulínica
Capítulo 47 655
TRATAMENTO NEUROCIRÚRGICO Estimulação elétrica da medula espinal
Foi introduzida em 1973 para tratar doentes
Infusão intratecal de fármacos
com espasticidade. Entretanto, os resultados da
A infusão prolongada de baclofeno (mais
intervenção não foram convincentes e o método não
comumente), ou menos frequentemente de
é rotineiramente aplicado para esse fim35–37.
morfina, midazolam, clonidina e/ou bupivacaína
por via intratecal otimiza a eficácia relativa dessas
Procedimentos neuroabalativos
medicações, diminuindo seus efeitos adversos
Representados pelas neurotomias periféricas
sistêmicos e potencializando sua ação junto ao
totais ou seletivas, injeção de neurolíticos por via
sistema nervoso central. Penn (1984)31 foi o pioneiro
intratecal, rizotomias percutâneas ou a céu aberto,
na infusão de baclofeno via intratecal para tratar
lesão do trato de Lissauer e do corno posterior da
doentes com espasticidade. O implante de bomba
substância cinzenta da medula espinal, mielotomias
de infusão intratecal deve ser precedido de um
e dentatotomia cerebelar.
teste para aferir resultados futuros e a reações aos
medicamentos. No teste de baclofeno intratecal,
Neurotomias periféricas seletivas
deve-se inicialmente injetar bolus inicial de 1 mcg/
Kg em crianças pequenas, até 50 a 150 mcg em Indicadas para tratar a espasticidade localizada
Altas doses de baclofeno intratecal podem levar à Podem ser realizadas percutâneamente ou a céu
intoxicação, caracterizada por tonturas, confusão aberto. Foram introduzidas para o tratamento da
mental, depressão respiratória, hipotensão arterial, deformidade do pé espástico por Stoffel37, em 1912,
pode ser tratada com a administração de 1 a 2 mg para sua realização em 1972. Em 1985, Sindou et
origem medular, adultos com espasticidade difusa de bloqueio anterior à ablação, como preditor da
ou crianças com paralisia cerebral (principalmente cirurgia. Os ramos motores devem ser isolados dos
morfina administrada por via intratecal também centímetros e estimulados com correntes elétricas
induz relaxamento muscular, pois inibe a aferência com 1 mA ou 0,5V e 2 a 5Hz. É realizada secção
do sistema fusimotor gama e a hiperexcitabilidade de 50 a 80% dos ramos nervosos com subtração de
infusão de fármacos intratecal é neuromodulário, e Deve-se evitar a secção de fibras sensitivas para
dos efeitos. O alto custo, a necessidade de recargas A neurotomia dos nervos obturatores é
periódicas e de reprogramações são limitações para utilizada para tratar a espasticidade dos músculos
seu uso, principalmente para pacientes que residem adutores das coxas. O ramo posterior deve ser
longe do centro de tratamento. poupado para preservar músculos estabilizadores
do quadril, é um procedimento utilizado para
melhora do padrão da espasticidade em tesoura em
membros inferiores40–42. A neurotomia dos músculos
Capítulo 47 656
isquiotibiais é indicada para tratar a espasticidade
RIZOTOMIAS
que se manifesta em crianças diplégicas e a prevenir
ou evitar a progresssão da deformidade em flexão Rizotomia anterior (motora)
dos joelhos durante o crescimento . 42
Munro45,46, em 1945, pela primeira vez
A neurotomia do nervo tibial é indicada para submeteu 42 doentes com espasticidade intensa
tratar a espasticidade que causa o pé-varo ou acometendo os membros inferiores à rizotomia
equino-varo com flexão dos dedos. As aferências anterior bilateral de T11 a S1. O procedimento
para o músculo sóleo devem ser prioritariamente consistiu da execução de laminectomia seguida
seccionadas, pois ele é o responsável pela da secção das raízes anteriores. Os resultados
patogênese da queda do pé espástico42. A neurotomia são bons quanto à resolução da espasticidade,
do nervo fibular é indicada para tratar a hipertonia mas o procedimento implica em se desnervar
em hiperextensão do hálux42. irreversivelmente os músculos que, além de
prejudicar o processo de recuperação motora, pode
Para membros superiores, a neurotomia do
gerar alterações tróficas e escaras46,47.
nervo mediano é indicada para tratar a espasticidade
da mão em pronação42,43. A neurotomia do nervo
ulnar é indicada para tratar a espasticidade do Rizotomia dorsal (sensitiva)
punho em flexão e em desvio ulnar; a neurotomia Foi desenvolvida por Foerster48, em 1908,
ulnar na mão é indicada para tratar a espasticidade para tratamento da espasticidade. Tem a finalidade
em flexão dos dedos, dependente do músculo flexor de reduzir as aferências facilitatórias exteroceptivas
digitorum profondus, assim como, para tratar a e proprioceptivas, especialmente as oriundas
espasticidade em adução e ou flexão dependente dos fusos musculares que mantêm ou agravam a
do músculo adutor do polegar combinadamente com espasticidade, sem alterar o trofismo muscular e
a neurotomia do nervo mediano42,43. ou comprometer a possibilidade de recuperação da
motricidade voluntária. Foerster realizou rizotomias
A neurotomia do músculo cutâneo é eficaz
sensitivas de L2 a S1 e preservou somente a raiz
no tratamento da espasticidade resultando em
L4 de 157 doentes, sendo 88 crianças com paralisia
flexão isolada do cotovelo42. As neurotomias dos
cerebral e observou que ocorreu redução marcante
nervos mediano e ulnar são eficazes no tratamento
da espasticidade, à custa de intensa hipotonia
da espasticidade distal dos membros superiores,
e ataxia. Realizou também, a secção das raízes
resultando em hiperflexão dos dedos e do punho42,43.
posteriores de C4 a T2 poupando a raiz C6 para
A neurotomia dos nervos relacionados aos músculos
tratar doentes com espasticidade dos membros
rotadores externos do ombro proporcionou melhora
superiores. Gros observou que ocorreram menos
da espasticidade e da amplitude dos movimentos
complicações quando preservou 20% das radículas,
dos ombros42.
recomendando a preservação da inervação dos
As neurotomias proporcionam mais músculos responsáveis pelo tono útil (músculos
relaxamento muscular que as infiltrações com toxina quadríceps, abdominais e glúteos músculos) em
botulínica44. As complicações pós-operatórias mais crianças com espasticidade dos membros inferiores49.
comuns são a ocorrência de hematomas e infecção, Em 1977, Fraioli e Guidetti50 desenvolveram a
mas são raros. técnica da rizotomia sensitiva parcial que consistia
em seccionar as radículas alguns milímetros antes
de sua penetração no sulco dorsolateral. Em
1976, Fasano et al.51,52 descreveram a rizotomia
sensitiva funcional, baseada na estimulação
Capítulo 47 657
bipolar intraoperatória das radículas posteriores os resultados foram excelentes em 12 de 15
concomitantemente à observação das respostas doentes com espasticidade grave decorrente de
clínicas e eletromiográficas. O procedimento esclerose múltipla. De acordo com a meta-análise
proporcionou melhora significativa da espasticidade por McLaughlin et al. 59
(1998), quanto maior a
sem comprometimento importante da propriocepção percentagem de radículas seccionadas, maiores os
ou da sensibilidade. Peacock e Arens , em 1982, 53
ganhos nas pontuações da escala GMFM. Em dois
descreveram uma série de pacientes operados com a ensaios clínicos randomizados, observou-se que a
técnica de rizotomia junto ao forame de conjugação, rizotomia acompanhada de fisioterapia intensa foi
conforme a técnica descrita por Fasano . 52
mais eficaz do que apenas a fisioterapia em relação
às pontuações do GMFM60,61. Em recente estudo
As rizotomias a céu aberto consistem da
realizado em pacientes com PC GMFCS I, II e III,
execução de laminectomias ou laminotomias, sob
o resultado confirmou a melhora funcional e em
anestesia geral, idealmente sem uso de relaxantes
qualidade de vida, além de ser um procedimento
musculares. Com o auxílio do microscópio cirúrgico,
custo-efetivo se comparado com o tratamento de
deve-se abrir a dura-máter para a exposição
crianças não operadas, levando assim o governo
das raízes sensitivas, estimular suas radículas
britânico a subsidiar o procedimento em seu sistema
e, de acordo com a evocação das contrações
de saúde62,63.
musculares que induzem evidenciadas com a
inspeção da musculatura a ser tratada e/ou com As melhoras promovidas pela rizotomia dorsal
métodos eletromiográficos, seccionar aquelas seletiva não se restrigem apenas à liberação da
mais relacionadas ao arco reflexo em questão, espasticidade em membros superiores, havendo
conforme sugerido por Fasano . Aproximadamente
51
inúmeros relatos de melhoras adicionais em membros
50 a 70% das radículas de uma raiz espinal podem superiores, bexiga, deglutição, fala, cognição entre
ser sacrificadas sem adicionar déficits sensitivos outros6,60,64–66. Salame et al.65 (2002) observaram
significativos. melhora da espasticidade dos membros inferiores em
todos os doentes submetidos à secção de 50% das
Em doentes com lesão medular completa
radículas sensitivas lombares e sacrais e melhora
os resultados são melhores quando se seccionam
da amplitude do movimento em 80% dos casos, da
60% a 80% das raízes sensitivas. Kottke54, em
marcha em 76% da capacidade de deambular em
1970, e Heimburger et al.55 (1973) recomendaram as
20%, da bexiga espástica em 42%, da espasticidade
rizotomias sensitivas de C1 a C3 para proporcionar
dos membros superiores em 57% e da fala e da
redução da espasticidade do membro superior ao
cognição em 47% em um ano de acompanhamento;
reduzir os reflexos tônicos cervicais, poupando a raiz
ocorreu hipoestesia temporária em 12 doentes,
C4 para não comprometer a função do diafragma e
sendo permanente em quatro, incontinência urinária
as raízes C5 a T1 para não alterar a sensibilidade
temporária em seis, infecção da parede cirúrgica
do membro superior. Bertelli et al.56 descreveram a
em cinco e amiotrofia em dois. Cole et al. 66 (2007)
rizotomia dorsal seletiva na altura do plexo braquial
trataram 19 crianças com espasticidade decorrente
para melhora de espasticidade em membros
de paralisia cerebral com rizotomia lombar seletiva
superiores. Wen-Dong et al.57 (2011) descreveram
e observaram melhoria do exame clínico, da
a técnica de secção da raiz C7 e reinervação do
cosmese, dos parâmetros temporais, da cinética
tronco médio do plexo braquial do lado acometido
e cinemática da marcha e da pontuação na escala
com a raiz correspondente contralateral para tratar a
GMFM. Oki et al. 67
(2010) trataram treze crianças
espasticidade em flexão da mão e do dos dedos de
com hemiparesia espástica com espasticidade com
crianças com paralisia cerebral.
rizotomia lombossacral e observaram redução do
Sindou et al.58 (1980) observaram que tono dos adutores das coxas, flexores e extensores
Capítulo 47 658
do joelho e flexores plantares do tornozelo, melhora 90 s com radiofrequência. Sua eficácia aguda é
que se manteve durante dois anos do comprimento semelhante à da rizotomia a céu aberto, mas as
da passada e da qualidade e velocidade da marcha. anormalidades sensitivas induzidas são maiores,
assim como pode ocorrer recidiva após alguns meses
As crianças tratadas com rizotomia dorsal
ou anos. Turnbull75 (1983) tratou a espasticidade
seletiva tiveram melhor necessidade de realização
de 21 doentes paraplégicos com rizotomia espinal
de cirurgias ortopédicas quando comparadas com
percutânea e observou melhora imediata em 19,
crianças não-operadas68. Usualmente, durante o
havendo manutenção prolongada da melhora
período pós-operatório, ocorre alguma recidiva da
em seis e durante período de acompanhamento
espasticidade devido à reorganização sináptica na
durante sete a 18 meses; em quatro de seis doentes
substância cinzenta da medula espinal69. Portanto,
em que havia alguma sensibilidade preservada,
a rizotomia sensitiva seletiva é tratamento eficaz em
ocorreu agravamento da hipoestesia pré-operatória.
crianças com paralisia cerebral diplégica espástica
Atualmente o método é sugerido como opção para
e proporciona melhora da força global, velocidade
pacientes com lesão medular completa (Frankel A),
e cinemática da marcha nestes casos, além de ser
podendo o procedimento ser repetido em caso de
procedimento custo-efetivo e seguro.
recidiva.
O procedimento deve ser seguido de programa
Vles et al.77 (2010) trataram 17 crianças com
intensivo de fisioterapia visando a remobilizar a
espasticidade decorrente de paralisia cerebral (todas
criança e melhorar sua força. Há manutenção
GMFCS V) com rizotomias lombares percutâneas
da redução da espasticidade na maioria das
com rediofrequência sobre o gânglio da raiz dorsal e
crianças com paralisia cerebral em longo prazo70,
observaram melhora da espasticidade e da dor, mas
mas até 27% delas necessita de medicamentos
ausência de melhora na escala GMFM.
antiespásticos, procedimentos neurolíticos
periféricos ou infiltrações com toxina botulínica
complementarmente69. Pacientes submetidos a Rizotomias químicas
rizotomia dorsal seletiva apresentam melhora na Raramente são utilizadas atualmente.
marcha, mesmo em seguimento de longo prazo , 71
Consistiam na injeção de soluções hipobáricas,
podendo apresentar ganho no GMFCS em até 58% como o álcool78,79 ou hiperbáricas, como o fenol
dos operados; assim como ocorre um ganho de a 5 até 20%80, em glicerina81, no compartimento
força muscular para a marcha, relacionado com a intratecal. É necessário adotar posições estratégicas
melhora da espasticidade . 72
para correto escorrimento da medicação, guiada
por marcador e radioscopia. Não são realizadas
Rizotomias percutâneas (não seletivas) frequentemente porque é difícil dirigir o agente lítico
em 1974, para tratar doentes paraplégicos com disso, a neurólise não é seletiva para lisar as fibras
lesão medular completa e crises de espasmos ou relacionadas ao controle do tono muscular do que
para debilitados sem condições de se submeter resultam complicações quanto às funções motoras e
percutânea por radiofrequência também se revelou vesical). Além destas complicações, cefaleia e
Capítulo 47 659
do trato de Lissauer e a preservar as inibitórias85.
medula espinal (LTLCPME)
A monitorização eletrofisiológica com o registro dos
A LTLCPME (popularmente chamada de
potenciais evocados somatossensitivos pode ser
“DREZ”) foi descrita em 1972 por Sindou82 para
útil para identificar os segmentos da medula espinal
tratar a espasticidade do membro superior de
a serem tratados86, assim como a utilização de
doentes hemiplégicos83 ou com espasticidade dos
ultrassonografia intraoperatória87.
membros inferiores de doentes paraplégicos39
especialmente quando acamados como resultado Após a cirurgia ablativa na zona de entrada
dos espasmos em flexão ou com dor rebelde e da raiz dorsal, há significativa ou eliminação da
razões que sugerem que a LTLCPME seja eficaz no doentes, respectivamente, e da dor sem abolição
e permita que doentes com deficiência grave possam pós-operatório com duração média de três anos39.
sentar e deitar confortavelmente com melhora na Sindou83 (1986) tratou 16 doentes hemiplégicos com
qualidade de vida. A LTLCPME visa a interromper LTLCPME de um membro superior e observou que
preferencialmente as fibras finas nociceptivas e as houve melhora discreta em dois, melhora acentuada
fibras miotáticas calibrosas presentes nas raízes em nove e abolição total da espasticidade em cinco.
sensitivas e localizadas lateralmente no local de sua Após a operação, tornou-se possível melhorar os
penetração na medula espinal, assim como grande movimentos voluntários em oito doentes e, pelo
contingente do corno posterior da substância cinzenta menos, adquirir boa mobilização passiva em sete.
da medula espinal onde se alojam os circuitos A bexiga hiperativa de doentes que se submetem
na espasticidade39. A lesão do componente medial espasticidade dos membros inferiores pode também
do trato de Lissauer reduz a excitabilidade neuronal beneficiar-se com o prolongamento da cirurgia para
laminectomia ou laminotomia visando a expor o local geralmente para pacientes com lesão medular
de penetração na medula espinal das raízes nervosas completa que foram refratários a outros tipos de
que processam o fenômeno espástico. A seguir, abolição das atividades reflexas da bexiga, intestino
com o auxílio do microscópio cirúrgico, realiza-se e ereção; devendo ser indicada apenas abaixo do
a estimulação elétrica bipolar das raízes sensitivas nível em lesões medulares completas. A mielomia
visando induzir respostas motoras para, a seguir, lateral longitudinal desenvolvida por Bischof90,
realizar-se lesões na zona de entrada da raiz dos em 1951, visava interromper as conexões entre
com eletrodo específico para isso, ultrassom, comprometer a função motora e sensitiva residual em
laser, bisturi ou pinça bipolar, angulados a 25 a 45o doentes com lesões incompletas. A mielotomia pode
medial e ventralmente, a lesões seriadas no sulco ser repetida quando há espasmos ou contraturas
Capítulo 47 660
com espasticidade associada às discinesias
Dentatomomia cerebelar
proporcionou resultados melhores do que apenas as
O núcleo denteado está envolvido no
dentatotomias. Siegfried e Verdie102 (1977) trataram
planejamento da sequência de movimentos, e
50 doentes com dentatotomia ventrolateral, sendo
já foi alvo de cirurgias ablativas para tratamento
que em 42 dos quais apresentavam síndrome
de espasticidade, e ainda é alvo de investigação
espástica resultante da paralisia cerebral, com 109
sobre procedimentos neuromodulatórios 93,94
. Sua
dentatotomias, sendo 41 bilaterais e observaram
destruição altera o tono muscular e a postura
que ocorreu melhora da espasticidade em 44% dos
de animais descerebrados95. O maior efeito
casos em acompanhamento em longo prazo, assim
da dentatomia é a redução da espasticidade
como em 28% dos pacientes com atetose e em 75%
ipsilateral95–97. Em 1960, Hassler et al.98 (1960)
com coreoatetose.
realizaram a primeira destruição estereotáxica do
núcleo fastigial e observaram melhora temporária
da da espasticidade do tronco em um doente com
REFERÊNCIAS
paralisia cerebral, efeito que se manteve durante um
1. Lance J. Symposium synopsis. In: Feldman RG, Young
ano. Em 1963, Heimburger e Whitlock realizaram a RR, Koella WP, CIBA-GEIGY Corporation, eds. Spasticity,
primeira dentatomia estereotáctica96. Ocorre melhora disordered motor control. Miami, FL; Chicago: Symposia
Specialists; 1980.
do controle motor voluntário e da coordenação dos
2. Elbasiouny SM, Moroz D, Bakr MM, Mushahwar VK.
movimentos em 50% dos casos, assim como da Management of spasticity after spinal cord injury: current
violência e frequência dos movimentos involuntários techniques and future directions. Neurorehabil Neural
Repair. 2010;24(1):23-33.
e coreiformes. Em 2/3 dos pacientes ocorreu
3. Martin A, Abogunrin S, Kurth H, Dinet J. Epidemiological,
redução dos movimentos anormais de torção axial e
humanistic, and economic burden of illness of lower limb
discinesias faciais geralmente contralateralmente96. spasticity in adults: a systematic review. Neuropsychiatr Dis
Treat. 2014;10:111-122.
Nashold e Slaughter (1969) 99
observaram melhora
do tono ipsilateral a dentatotomia medial e lesão 4. Ranatunga KW. Skeletal muscle stiffness and
contracture in children with spastic cerebral palsy. J Physiol.
do núcleo interpositus. O efeito ipsilateral foi mais 2011;589(11):2665.
evidente da operação e também ocorre houve pouco 5. Ghai A, Garg N, Hooda S, Gupta T. Spasticity -
efeito contralateral. Heimburger100 (1970) tratou 61 Pathogenesis, prevention and treatment strategies. Saudi J
Anaesth. 2013;7(4):453.
doentes, e observou que 50 usufruíram melhora, com
6. Tilton A. Management of Spasticity in Children With
duração de 4 a 60 meses, durante os quais, ocorreu Cerebral Palsy. Semin Pediatr Neurol. 2009;16(2):82–89.
recorrência em onze. Concluiu que a melhora foi 7. Behari M. Spasticity. Neurol India. 2002;50(3):235.
mais significativa em casos de paralisia cerebral,
8. Davis R. Spasticity following spinal cord injury. Clin
espasticidade e movimentos coreoatetóticos. Orthop. 1975;(112):66–75.
Guidetti e Fraioli84 (1977) trataram 47 doentes 9. Gros C. Spasticity-Clinical Classification and Surgical
submetidos à dentatotomia lateral e intermediária Treatment. In: Krayenbühl H, Brihaye J, Loew F, et al.,
eds. Advances and Technical Standards in Neurosurgery.
e observaram que ocorreu melhora em cinco de Vienna: Springer; 1979. p. 55–97.
sete doentes com hemiplegia espástica infantil e 10. Penn RD. History and Current Neurosurgical
em sete de onze casos de diplegia espástica. Os Management of Spasticity. In: Lozano AM, Gildenberg PL,
Tasker RR, eds. Textbook of Stereotactic and Functional
resultados foram melhores quando as lesões foram Neurosurgery. Berlin, Heidelberg: Springer; 2009. p.
alocadas nas regiões dorsolateral, ventrolateral 1925–1933.
e intermediária do núcleo denteado e quando as 11. Beneton C. The spastic bladder and its treatment. In:
Sindou MP, Abbott IR, Keravel Y, eds. Neurosurgery for
operações foram bilaterais. Mundinger e Ostertag 101
Spasticity: A Multidisciplinary Approach. Wien: Springer-
(1977) observaram que as tálamo-subtalamotomias Verlag; 1991.
combinadas com as dentatotomias em doentes
Capítulo 47 661
Droga Dose inicial Dose máxima (dia) Doses/dia Crianças
Dantrolene 25 mg 400 mg 4 3 mg /kg/dia
40 mg (2 a 7 anos)
Baclofeno (VO) 5 mg 80 mg 4 60 mg (8 a 11 anos)
80 mg (12 anos ou mais)
Diazepam 5 mg 60 mg 3a4 0,8 mg /kg/dia
Clorazepato 7,5 mg 90 mg 2a3 0,3 mg /kg/dia
Cetazolam 15 mg 270 mg 1 NA
Clonazepam 0,5 mg 20 mg 2a3 20 mg /dia
Piracetam 2,4 g/dia 12 g 2a3 3,2 g/dia
Progabida 14,3 mg /kg/dia 45 mg /kg/dia 3 NA
Tizanidina 2 mg 36 mg 3a4 NA
Clonidina 50 mcg 2,4 mg 2a4 3 mcg/Kg/dia
Ciproheptadina 4 mg 36 mg 3 0,5 mg /kg
0,1 mg /kg/dia (IV)
Timoxamina 900 mg (VO) 1 NA
40 mg (VO)
Orphenadrina 60 mg 200 mg 2 NA
Ciclobenzaprina 5 mg 40 mg 3 5-30 mg
THC/CBD 2,7/2,5 mg 32,4/30 mg 3 2,7/2,5 mg
Cada 12
Toxina Botulínica A 100U 400U 50U
sem
Ziclague (Spray cutâneo) 3,5 mg 21 mg 1 3,5 mg
Fenotiazinas
1 mg 1600 mg 1a6 1 mg
(Clorpromazina)
Carisoprodol 125 mg 1,4g 1a4 125 mg (16 anos)
Gabapentina 300 mg 3,6g 3 25-35 mg /Kg/dia
Baclofeno (intratecal) 25 mcg 1000 mcg Contínuo 700 mcg/dia
Morfina (Intratecal) 5 mcg/Kg/dia 10 mg /dia Contínuo 3-5 mcg/Kg/dia
Quadro 1: Quadro com as principais medicações utilizadas no tratamento da espasticidade.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 47 662
12. Madersbacher H. The various types of neurogenic 28. Chang MC, Boudier-Revéret M. Management of elbow
bladder dysfunction: an update of current therapeutic flexor spasticity with ultrasound-guided alcohol neurolysis
concepts. Spinal Cord. 1990;28(4):217–229. of the musculocutaneous nerve. Acta Neurol Belg.
2020;120(4):983–984.
13. Pierson SH. Outcome measures in spasticity
management. Muscle Nerve Suppl. 1997;6:S36-60. 29. Lukban MB, Rosales RL, Dressler D. Effectiveness
of botulinum toxin A for upper and lower limb spasticity
14. Hodgkinson I, Vadot J-P, Bérard C. [Clinical assessment
in children with cerebral palsy: a summary of evidence. J
of spasticity in children]. Neurochirurgie. 2003;49(2-3):199–
Neural Transm Vienna Austria 1996. 2009;116(3):319–331.
204.
30. Simpson RKJ, Leis AA. Neurosurgical Management
15. Eliasson AC, Krumlinde-Sundholm L, Rösblad B,
of Spasticity Part I: Evaluation and Medical Management.
et al. The Manual Ability Classification System (MACS)
Contemp Neurosurg. 1995;17(19):1–6.
for children with cerebral palsy: scale development and
evidence of validity and reliability. Dev Med Child Neurol. 31. Penn RD, Kroin JS. Intrathecal baclofen alleviates spinal
2006;48(7):549-554. cord spasticity. Lancet Lond Engl. 1984;1(8385):1078.
16. Beckung E, Hagberg G. Neuroimpairments, activity 32. Yaksh TL, Reddy SV. Studies in the primate on the
limitations, and participation restrictions in children with analgetic effects associated with intrathecal actions
cerebral palsy. Dev Med Child Neurol. 2002;44(5):309–316. of opiates, alpha-adrenergic agonists and baclofen.
Anesthesiology. 1981;54(6):451–467.
17. Joanna M, Magdalena S, Katarzyna BM, Daniel S,
Ewa LD. The Utility of Gait Deviation Index (GDI) and Gait 33. Erickson DL, Lo J, Michaelson M. Control of intractable
Variability Index (GVI) in Detecting Gait Changes in Spastic spasticity with intrathecal morphine sulfate. Neurosurgery.
Hemiplegic Cerebral Palsy Children Using Ankle-Foot 1989;24(2):236-238.
Orthoses (AFO). Children (Basel). 2020;7(10):149.
34. Rogano LA, Greve JM, Teixeira MJ. Use of intrathecal
18. Armand S, Decoulon G, Bonnefoy-Mazure A. Gait morphine infusion for spasticity. Arq Neuropsiquiatr.
analysis in children with cerebral palsy. EFORT Open Rev. 2004;62(2):403–405.
2016;1(12):448–460.
35. Dimitrijevic MM, Dimitrijevic MR, Illis LS, Nakajima K,
19. Ghorbani S, Mahdaviani K, Thaler A, et al. MoVi: A large Sharkey PC, Sherwood AM. Spinal cord stimulation for
multi-purpose human motion and video dataset. PloS One. the control of spasticity in patients with chronic spinal cord
2021;16(6):e0253157. injury: I. Clinical observations. Cent Nerv Syst Trauma J Am
Paralys Assoc. 1986;3(2):129–144.
20. Chatley A, Jaiswal AK, Jain M, Behari S. Congenital
irreducible atlantoaxial dislocation associated with cervical 36. Dimitrijevic MR, Illis LS, Nakajima K, Sharkey PC,
intramedullary astrocytoma causing progressive spastic Sherwood AM. Spinal cord stimulation for the control of
quadriparesis. Neurol India. 2008;56(4):477–479. spasticity in patients with chronic spinal cord injury: II.
Neurophysiologic observations. Cent Nerv Syst Trauma J
21. Khot A, Sloan S, Desai S, Harvey A, Wolfe R, Graham
Am Paralys Assoc. 1986;3(2):145–152.
HK. Adductor release and chemodenervation in children
with cerebral palsy: a pilot study in 16 children. J Child 37. Nagel SJ, Wilson S, Johnson MD, et al. Spinal Cord
Orthop. 2008;2(4):293–299. Stimulation for Spasticity: Historical Approaches, Current
Status, and Future Directions. Neuromodulation J Int
22. Delgado MR, Hirtz D, Aisen M, et al. Practice
Neuromodulation Soc. 2017;20(4):307–321.
Parameter: Pharmacologic treatment of spasticity in children
and adolescents with cerebral palsy (an evidence-based 38. Stoffel A. The treatment of spastic contractures. Am J
review). Neurology. 2010;74(4):336–343. Orthop Surg. 1912;10:611–644.
23. Rabchevsky AG, Kitzman PH. Latest Approaches for 39. Sindou M, Abdennebi B, Sharkey P. Microsurgical
the Treatment of Spasticity and Autonomic Dysreflexia selective procedures in peripheral nerves and the posterior
in Chronic Spinal Cord Injury. Neurotherapeutics. root-spinal cord junction for spasticity. Appl Neurophysiol.
2011;8(2):274–282. 1985;48(1–6):97–104.
24. Pranzatelli MR, Pavlakis SG, Gould RJ, De Vivo 40. Ren S, Liu W, Wang L, Guo C, Pang Q. Utilization of
DC. Hypothalamic-midbrain dysregulation syndrome: electromyography during selective obturator neurotomy to
hypertension, hyperthermia, hyperventilation, and treat spastic cerebral palsy accompanied by scissors gait. J
decerebration. J Child Neurol. 1991;6(2):115–122. Integr Neurosci. 2019;18(3):305–308.
25. Simon O, Yelnik AP. Managing spasticity with drugs. Eur 41. Sitthinamsuwan B, Chanvanitkulchai K, Phonwijit L,
J Phys Rehabil Med. 2010;46(3):401–410. Nunta-Aree S, Kumthornthip W, Ploypetch T. Improvement
of sitting ability and ambulation status after selective
26. Ozcakir S, Sivrioglu K. Botulinum toxin in poststroke
peripheral neurotomy of the sciatic hamstring nerve together
spasticity. Clin Med Res. 2007;5(2):132–138.
with obturator branches for severe spasticity of the lower
27. Matsumoto ME, Berry J, Yung H, Matsumoto M, extremities. Stereotact Funct Neurosurg. 2012;90(5):335–343.
Munin MC. Comparing Electrical Stimulation With and
42. Sindou MP, Simon F, Mertens P, Decq P. Selective
Without Ultrasound Guidance for Phenol Neurolysis to the
peripheral neurotomy (SPN) for spasticity in childhood.
Musculocutaneous Nerve. PM R. 2018;10(4):357–364.
Childs Nerv Syst ChNS Off J Int Soc Pediatr Neurosurg.
2007;23(9):957–970.
Capítulo 47 663
43. Puligopu AK, Purohit AK. Outcome of selective motor 59. McLaughlin JF, Bjornson KF, Astley SJ, et al. Selective
fasciculotomy in the treatment of upper limb spasticity. J dorsal rhizotomy: efficacy and safety in an investigator-
Pediatr Neurosci. outubro de 2011;6(1):S118-125. masked randomized clinical trial. Dev Med Child Neurol.
1998;40(4):220–232.
44. Bollens B, Gustin T, Stoquart G, Detrembleur C,
Lejeune T, Deltombe T. A randomized controlled trial of 60. McLaughlin J, Bjornson K, Temkin N, et al. Selective
selective neurotomy versus botulinum toxin for spastic dorsal rhizotomy: meta-analysis of three randomized
equinovarus foot after stroke. Neurorehabil Neural Repair. controlled trials. Dev Med Child Neurol. 2002;44(1):17–25.
2013;27(8):695–703.
61. Wright FV, Sheil EM, Drake JM, Wedge JH, Naumann
45. MUNRO D. The rehabilitation of patients totally S. Evaluation of selective dorsal rhizotomy for the reduction
paralyzed below the waist, with special reference to of spasticity in cerebral palsy: a randomized controlled tria.
making them ambulatory and capable of earning their own Dev Med Child Neurol. 1998;40(4):239–247.
living. V. An end-result study of 445 cases. N Engl J Med.
62. Summers J, Coker B, Eddy S, et al. Selective dorsal
1954;250(1):4-14.
rhizotomy in ambulant children with cerebral palsy: an
46. Munro D. The rehabilitation of patients totally paralyzed observational cohort study. Lancet Child Adolesc Health.
below the waist, with special reference to making them 2019;3(7):455–462.
ambulatory and capable of earning their living. N Engl J
63. Pennington M, Summers J, Coker B, et al. Selective
Med. 1947;236(7):223-235.
dorsal rhizotomy; evidence on cost-effectiveness from
47. Freeman LW, Heimburger RF. The surgical relief of England. PloS One. 2020;15(8):e0236783.
spasticity in paraplegic patients: anterior rhizotomy. J
64. Engsberg JR, Ross SA, Collins DR, Park TS. Effect of
Neurosurg. 1947;4(5):435–443.
selective dorsal rhizotomy in the treatment of children with
48. Foerster. Resection of the posterior nerve roots of spinal cerebral palsy. J Neurosurg. 2006;105(1):8–15.
cord. The Lancet. 1911;178(4584):76–79.
65. Salame K, Ouaknine GER, Rochkind S, Constantini
49. Privat JM, Benezech J, Frerebeau P, Gros C. Sectorial S, Razon N. Surgical treatment of spasticity by selective
posterior rhizotomy, a new technique of surgical treatment posterior rhizotomy: 30 years experience. Isr Med Assoc J
for spasticity. Acta Neurochir (Wien). 1976;35(1):181–195. IMAJ. 2003;5(8):543–6.
50. Fraioli B, Guidetti B. Posterior partial rootlet section in 66. Cole GF, Farmer SE, Roberts A, Stewart C, Patrick JH.
the treatment of spasticity. J Neurosurg. 1977;46(5):618– Selective dorsal rhizotomy for children with cerebral palsy:
626. the Oswestry experience. Arch Dis Child. 2007;92(9):781–
785.
51. Fasano VA, Barolat-Romana G, Zeme S, Squazzi
A. Electrophysiological assessment of spinal circuits in 67. Oki A, Oberg W, Siebert B, Plante D, Walker ML, Gooch
spasticity by direct dorsal root stimulation. Neurosurgery. JL. Selective dorsal rhizotomy in children with spastic
1979;4(2):146–151. hemiparesis. J Neurosurg Pediatr. 2010;6(4):353–358.
52. Fasano VA, Broggi G, Barolat-Romana G, Sguazzi A. 68. Chicoine MR, Park TS, Kaufman BA. Selective dorsal
Surgical treatment of spasticity in cerebral palsy. Childs rhizotomy and rates of orthopedic surgery in children with
Brain. 1978;4(5):289–305. spastic cerebral palsy. J Neurosurg. 1997;86(1):34–39.
53. Peacock WJ, Arens LJ. Selective posterior rhizotomy 69. Mittal S, Farmer J-P, Al-Atassi B, et al. Functional
for the relief of spasticity in cerebral palsy. South Afr Med J performance following selective posterior rhizotomy:
Suid-Afr Tydskr Vir Geneeskd. 1982;62(4):119–24. long-term results determined using a validated evaluative
measure. J Neurosurg. 2002;97(3):510–518.
54. Kottke FJ. Modification of Athetosis by Denervation of
Tonic Neck Reflexes. Developmental Medicine and Child 70. Tedroff K, Löwing K, Jacobson DNO, Åström E. Does
Neurology. 1970;12:236. loss of spasticity matter? A 10-year follow-up after selective
dorsal rhizotomy in cerebral palsy. Dev Med Child Neurol.
55. Heimburger RF, Slominski A, Griswold P. Cervical
2011;53(8):724–729.
posterior rhizotomy for reducing spasticity in cerebral palsy.
J Neurosurg. 1973;39(1):30–34. 71. Langerak NG, Tam N, Vaughan CL, Fieggen AG,
Schwartz MH. Gait status 17-26 years after selective dorsal
56. Bertelli JA, Ghizoni MF, Frasson TR, Borges KSF.
rhizotomy. Gait Posture. 2012;35(2):244–249.
Brachial plexus dorsal rhizotomy in hemiplegic cerebral
palsy. Hand Clin. 2003;19(4):687–699. 72. Kainz H, Hoang H, Pitto L, et al. Selective dorsal
rhizotomy improves muscle forces during walking in children
57. Xu W-D, Hua X-Y, Zheng M-X, Xu J-G, Gu Y-D.
with spastic cerebral palsy. Clin Biomech Bristol Avon.
Contralateral C7 nerve root transfer in treatment of cerebral
2019;65:26–33.
palsy in a child: case report. Microsurgery. 2011;31(5):404–
408. 73. Uematsu S, Udvarhelyi GB, Benson DW, Siebens AA.
Percutaneous radiofrequency rhizotomy. Surg Neurol.
58. Sindou M, Millet MF, Mortamais J, Eyssette M. Results
1974;2(5):319–325.
of selective posterior rhizotomy in the treatment of painful
and spastic paraplegia secondary to multiple sclerosis. Appl 74. Smith HP, McWhorter JM, Challa VR. Radiofrequency
Neurophysiol. 1982;45(3):335–340. neurolysis in a clinical model. Neuropathological correlation.
J Neurosurg. 1981;55(2):246–253.
Capítulo 47 664
75. Turnbull IM. Percutaneous lumbar rhizotomy for spasms 89. Maccarty CS. The treatment of spastic paraplegia by
in paraplegia. Paraplegia. 1983;21(2):131–136. selective spinal cordectomy. J Neurosurg. 1954;11(6):539–
545.
76. Young B, Mulcahy JJ. Percutaneous sacral rhizotomy
for neurogenic detrusor hyperreflexia. J Neurosurg. 90. Bischof W. [On dorsal longitudinal myelotomy].
1980;53(1):85–87. Zentralblatt fur Neurochirurgie. 1967;28(3):123–6.
77. Vles GF, Vles JS, van Kleef M, et al. Percutaneous 91. Laha RK, Dujovny M, Osgood CP. Dorsal longitudinal
radiofrequency lesions adjacent to the dorsal root ganglion myelotomy. Paraplegia. 1976;14(3):189–194.
alleviate spasticity and pain in children with cerebral palsy:
92. Livshits A, Rappaport ZH, Livshits V, Gepstein R.
pilot study in 17 patients. 2010;10:52.
Surgical treatment of painful spasticity after spinal cord
78. Shelden CH, Bors E. Subarachnoid alcohol block injury. Spinal Cord. 2002;40(4):161–166.
in paraplegia; its beneficial effect on mass reflexes and
93. Cooperrider J, Momin A, Baker KB, Machado AG.
bladder dysfunction. J Neurosurg. 1948;5(4):385–391.
Cerebellar Neuromodulation for Stroke. Curr Phys Med
79. Evangelou M, Adriani J. Chemical rhizotomy Rehabil Rep. 2020;8(2):57–63.
(intrathecal alcohol) for paraplegic clonus. Anesthesiology.
94. Horisawa S, Kohara K, Nonaka T, Mochizuki T,
1955;16(4):594–597.
Kawamata T, Taira T. Case Report: Deep Cerebellar
80. Nathan PW. Intrathecal phenol to relieve spasticity in Stimulation for Tremor and Dystonia. Front Neurol.
paraplegia. The Lancet. 1959;274(7112):1099–1102. 2021;12:642904.
81. Kelly RE, Smith PCG. Intrathecal phenol in the 95. Moruzzi G, Pompeiano O. Crossed fastigial influence
treatment of reflex spasms and spasti city. Lancet. on decerebrate rigidity. J Comp Neurol. dezembro de
1959;274(7112):1102–1105. 1956;106(2):371–392.
82. Sindou M. Étude de la jonction radiculo-médullaire 96. Heimburger RF, Whitlock CC. Stereotaxic destruction of
postérieure, la radicellotomie postérieure sélective dans la the human dentate nucleus. Confin Neurol. 1965;26(3):346–
chirurgie de la douleur. Vaulx en Velin. 1972. 358.
83. Sindou M, Mifsud JJ, Boisson D, Goutelle A. Selective 97. Hitchcock E. Dentate lesions for involuntary movement.
posterior rhizotomy in the dorsal root entry zone for Proc R Soc Med. setembro de 1973;66(9):877–879.
treatment of hyperspasticity and pain in the hemiplegic
98. Hassler R, Riechert T, Mundinger F, Umbach W,
upper limb. Neurosurgery. 1986;18(5):587–595.
Ganglberger JA. Physiological observations in stereotaxic
84. Guidetti B, Fraioli B. Neurosurgical treatment of operations in extrapyramidal motor disturbances. Brain J
spasticity and dyskinesias. Acta Neurochir (Wien). Neurol. 1960;83:337–350.
1977;(24):27–39.
99. Nashold BS, Slaughter DG. Effects of stimulating or
85. Teixeira MJ, Souza ECD, Yeng LT, Pereira WC. A lesão destroying the deep cerebellar regions in man. J Neurosurg.
do trato de Lissauer e do corno posterior da substância 1969;31(2):172–186.
cinzenta da medula espinal e a estimulação elétrica do
100. Heimburger F. The Role of the Cerebellar Nuclei in
sistema nervoso central para o tratamento da dor por
Spasticity. Stereotact Funct Neurosurg. 1970;32(2–5):105–
avulsão de raízes do plexo braquial. Arq Neuropsiquiatr.
113.
1999;57:56–62.
101. Mundinger F, Ostertag C. Multilocular lesions in
86. Jeanmonod D, Sindou M, Magnin M, Boudet M. Intra-
the therapy of cerebral palsy. Acta Neurochir (Wien).
operative unit recordings in the human dorsal horn with a
1977;(24):11–14.
simplified floating microelectrode. Electroencephalogr Clin
Neurophysiol. 1989;72(5):450–454. 102. Siegfried J, Verdie JC. Long-term assessment of
stereotactic dentatotomy for spasticity and other disorders.
87. Monaco BA de, Lopes AJM, Teixeira MJ. Ultrasound-
Acta Neurochir (Wien). 1977;(24):41-48.
Guided DREZotomy: Technical Note. Stereotact Funct
Neurosurg. 2019;97(2):127–131.
88. Sindou M. Microsurgical DREZotomy (MDT) for pain,
spasticity, and hyperactive bladder: a 20-year experience.
Acta Neurochir (Wien). 1995;137(1–2):1–5.
Capítulo 47 665
CAPÍTULO 48
NEUROMODULAÇÃO
Capítulo 48 666
(Food and Drug Administration) para tratamento da magnetoencefalografia (MEG), entre outras. Da
doença de Parkinson . 2,3
mesma forma que o desenvolvimento da estimulação
cortical invasiva para estudos neurofisiológicos
Em paralelo, com o desenvolvimento das
possibilitou a invenção do DBS, é esperado
estimulações elétricas, estavam os estudos com a
que o melhor entendimento do funcionamento
estimulação cerebral com eletromagnetismo, cujas
cerebral resulte em grande avanço nas técnicas
primeiras descrições são de 1896, por d'Arsonval.
de neuromodulação. Ainda, técnicas utilizando
Nesses, foram realizados experimentos nos quais os
outros meios físicos estão sendo desenvolvidas,
participantes entravam dentro de uma grande bobina,
como ultrassom e a luz. Assim, em função do
ou colocavam a bobina ao redor da cabeça, sendo
desenvolvimento de novos métodos, provavelmente
produzido sensações como vertigem e fosfenos.
a definição de neuromodulação passará por
Quase um século depois, em 1985, foi desenvolvido
modificações . 7
o sistema contemporâneo de estimulação magnética
transcraniana (EMT, ou TMS do inglês Transcranial
Magnetic Stimulation). Inicialmente, o objetivo da
PRINCÍPIOS DA TDCS E TMS
TMS era o uso para avaliações neurofisiológicas das
vias corticomotoras vista que com a TMS é possível Nesse capítulo abordaremos apenas as
despolarizar os neurônios do córtex motor primário principais técnicas de neuromodulação não invasiva
e gerar o potencial evocado motor (PEM) de forma (tDCS e TMS). Embora sejam técnicas com princípios
indolor e não invasiva4. e métodos de aplicação distintos, a tDCS e a TMS
têm sido utilizadas com semelhantes propósitos,
Destaca-se que foi utilizando a TMS que
como descritas a seguir.
Nitsche e Paulus conseguiram demonstrar em 2000
os efeitos inibitórios e excitatórios da estimulação
Estimulação magnética transcraniana
elétrica transcraniana por corrente contínua (ETCC, (EMT ou TMS)
ou tDCS do inglês transcranial direct current
A TMS foi desenvolvida com base na
stimulation), sendo um dos marcos para os estudos
lei da indução de Faraday, ou lei da indução
de neuromodulação não invasiva baseados nos
eletromagnética, segundo a qual um campo
efeitos neurofisiológicos5.
magnético rapidamente variável no tempo é capaz
Umas das primeiras aplicações clínicas da de induzir correntes elétricas num condutor. O
TMS foi com a estimulação do córtex motor para equipamento de TMS produz campo magnético
tratamento da dor crônica, em 2001. Interessante variável, produzido pela bobina magnética, com
que a abordagem utilizada nesses estudos com uma intensidade de aproximadamente 2 Tesla.
TMS foi embasada em estudos com implantes de Esse campo penetra no cérebro e induz correntes
eletrodos no córtex motor para tratamento da dor elétricas diretamente nos neurônios, resultando em
crônica, realizados em 1991. O uso clínico da TMS despolarização neuronal. Quando aplicado sobre o
ganhou maior visibilidade após a aprovação pelo córtex motor primário é capaz de despolarizar as
FDA em 2008 para tratamento da depressão, tendo vias corticomotoras resultando no potencial evocado
ocorrido cerca de uma década após os primeiros motor (PEM)7.
estudos clínicos6.
A TMS foi inicialmente desenvolvida para
O desenvolvimento das técnicas de avaliações neurofisiológicas, tendo a vantagem
neuromodulação está sendo impulsionado pelas de ser não invasiva e relativamente indolor em
evoluções das ferramentas de estudos funcional comparação com as técnicas existentes até então.
do cérebro, como a ressonância magnética Para o uso diagnóstico são aplicados pulsos
funcional, a eletroencefalografia quantitativa, o
Capítulo 48 667
simples ou pareados. Para o uso terapêutico efeitos da tDCS são comumente descritos de forma
(neuromodulatórios) são utilizados pulsos repetitivos simplificada e divididos em excitatórios (estimulação
(rTMS). De forma simplificada, a estimulação com anódica) e inibitórios (estimulação catódica)5,8.
baixa frequência (1Hz) induz um efeito inibitório, já
a estimulação de alta frequência (>5Hz) resulta no Mecanismos de ação da TMS e da tDCS
aumento da excitabilidade cortical. Embora essa
Embora TMS e tDCS sejam técnicas com
seja a forma como didaticamente os efeitos da TMS
princípios físicos diferentes, os mecanismos de ação
são descritos, atualmente se sabe que os efeitos
para os efeitos terapêuticos de ambas as técnicas
dependem de uma série de fatores como o estado
são semelhantes. Ambas as técnicas induzem um
de excitabilidade basal, doenças neurológicas,
efeito de curta duração (aumentando ou diminuindo
uso de medicamentos, entre outros. Existem ainda
a excitabilidade cortical), mas também um efeito de
outras formas de aplicar os pulsos repetitivos da
longa duração9,10.
TMS, como o Theta-burst stimulation (TBS), na qual
são aplicadas “rajadas” de curta duração em altas Propõem-se que os efeitos terapêuticos e
frequências, sendo realizadas cinco “rajadas” por potenciais benefícios clínicos estão relacionados
Capítulo 48 668
et al.7 evidenciaram que 20 min de estimulação com distúrbios do movimento e epilepsia11. Para isso, são
o ânodo sobre o córtex motor de sujeitos saudáveis utilizados protocolos que avaliam a integridade das
resultou na diminuição da excitabilidade neuronal, vias corticomotoras e a excitabilidade cortical, como
sendo o efeito oposto ao que era esperado. Os o tempo de condução do motor central (CMCT),
autores sugerem que os mecanismos de homeostase técnica de estimulação tripla (TST), limiar motor
neuronal e a metaplasticidade possam explicar (MT), período silente (SP), e na técnica de pulso
essa aparente resposta paradoxal. Pesquisas mais pareado. Para essas avaliações o equipamento de
recentes demonstraram que os resultados das TMS é utilizado em associação com equipamento de
estimulações (TMS e tDCS) são influenciados pelos eletromiografia, o que permite quantificar de forma
parâmetros da estimulação (como intensidade, mais precisa o potencial evocado motor (PEM). Os
duração, frequência das sessões), pelo estado basal protocolos estão descritos pelo comitê da IFCN em
de excitabilidade neuronal (estando alterado em 20157,11,12.
diversas doenças neurológicas), uso de medicação,
No Brasil, a resolução do Conselho Federal
características genéticas, entre outros9,10.
de Medicina (CFM 1.986/2012) reconhece o uso da
Essa dificuldade na predição dos efeitos da TMS para o mapeamento cortical e planejamento
estimulação é um dos principais desafios para o neurocirúrgico, sendo para isso necessário acoplar
uso das terapias na prática clínica. Para superar a TMS a sistemas específicos de neuronavegação13.
essa importante limitação, pesquisadores propõe
a realização de ensaios clínicos com grande
casuística e análises que possibilitem a identificação POTENCIAIS USOS CLÍNICOS
de preditores clínicos da melhor resposta as O desequilíbrio das atividades inibitórias e
terapias, além do uso de biomarcadores como os excitatórias de redes neuronais está relacionado
neurofisiológicos, estruturais do encéfalo e genético. com diversas doenças psiquiátricas e neurológicas,
A busca atual de marcadores de resposta terapêutica tendo assim as técnicas de TMS e tDCS uma ampla
não é exclusividade da área da neuromodulação, gama de possibilidades de aplicações.
sendo amplamente abordada no contexto da
Entre as doenças estudas destacam-se
“medicina de precisão” 9,10
.
dor crônica, fibromialgia, depressão, transtorno
obsessivo compulsivo, AVE, lesão medular, doença
de Parkinson, drogadição, síndromes demenciais,
USO DA TMS PARA AVALIAÇÕES entre outras. As regiões cerebrais estimuladas
NEUROFISIOLÓGICAS dependem do objetivo terapêutico e de conhecimento
A aplicação da TMS para avaliações prévio da relação anatomofuncional do córtex
neurofisiológicas já está validada para algumas cerebral. Os alvos mais comumente utilizados são
utilizações e continua sendo desenvolvida, o córtex motor primário, para melhora da dor e do
especialmente no âmbito do biomarcador déficit motor de diferentes etiologias, além do córtex
diagnóstico, prognóstico, substitutivo e preditivo. pré-frontal dorsolateral (CPFDL) para tratamento da
Segundo o último relatório do comitê da International depressão14,15.
Federation of Clinical Neurophysiology (IFCN),
Adiante citaremos as condições mais
a TMS possui aplicabilidade diagnóstica para
comumente estudadas e o nível de evidência
mielopatia, esclerose lateral amiotrófica e esclerose
científica atual. Importante notar que, diferentemente
múltipla, e ainda, com potencial aplicação para
dos estudos com medicamentos orais, a maioria
avaliação do AVE, dor crônica, enxaqueca, doenças
das pesquisas com tDCS e TMS foram lideradas
cerebelares, demências, doenças do nervo facial,
por pesquisadores independentes e livres de
Capítulo 48 669
incentivos proprietários. Ainda, existem mais de mil uma porcentagem considerável de pacientes não
ensaios clínicos com essas técnicas, sendo muitos responde ao tratamento, ou respondem por um curto
com alta qualidade metodológica (ensaios clínicos período, assim, a identificação de marcadores da
randomizado, duplo cego e placebo controlado), no resposta ao tratamento é um dos grandes desafios
entanto, a maioria dos estudos são exploratórios e da área (como descrito acima)16-19.
muito baixo rigor metodológico, o que torna peculiar
Já a tDCS é considerada como nível de
a avaliação do nível de evidência científico de
evidência B (provavelmente eficaz), com tamanho de
efetividade, havendo diferentes interpretações entre
efeito moderado para dor neuropática, fibromialgia,
autores. Assim, utilizaremos como referência três
enxaqueca, analgesia e dor pós-operatória. Embora
importantes revisões sobre o assunto16-18. Nestes, o
com menor nível de evidência, os resultados são
nível de evidência foi classificado em “A”, “B”, “C”
promissores, havendo um grande potencial para uso
ou “sem recomendação”. Para tanto, os estudos
na prática clínica16-18.
incluídos foram classificados em I, II, III e IV,
considerando o tamanho da amostra e a qualidade Acidente vascular encefálico (AVE)
do método16-18.
As técnicas de neuromodulação estão
sendo utilizadas com o objetivo de potencializar
Depressão a reabilitação dos pacientes com AVE para
O tratamento da depressão é uma das sintomas motores, disfagia, cognitivos, afasias,
indicações mais estudadas nas diferentes técnicas heminegligência, hemianopsia e psiquiátricos (em
de estimulação cerebral não invasiva. Para a TMS, especial a depressão). Embora muito se avançou
essa foi aprovada para uso clínico pelo FDA em nos conhecimentos para as indicações citadas,
2008 e pelo CFM em 2012. Já para a tDCS não a única indicação que atingiu o nível de evidência
está regulamentada para o uso clínico, até a data considerado A é o uso da TMS de baixa frequência
da publicação desse livro, tanto o FDA com o CFM, aplicada no hemisfério contralateral ao AVE na fase
embora existam equipamentos no Brasil com registro subaguda. A tDCS foi considerada como nível de
na ANVISA. evidência B para a reabilitação motora pós-AVE,
com menor nível para as demais indicações16-18.
Para a tDCS16, consideraram a estimulação
anódica do CPFDL esquerdo como nível “A”
Outras indicações
(definitivamente eficaz) para melhorar a depressão
Muitas indicações terapêuticas têm sido
no transtorno depressivo maior, com um tamanho de
estudadas em vários centros de pesquisa acadêmicos
efeito moderado na redução dos sintomas. No caso
ao redor do mundo. Os resultados promissores de
da TMS, a estimulação do CPFDL esquerdo com
estudos fase 2 estão atraindo interesse de empresas
alta frequência é também classificada como nível A
de equipamentos médicos que estão financiando
(definitivamente eficaz) para melhorar a depressão
estudos fase 3 e acelerando o processo de validação
no transtorno depressivo maior, com tamanho de
das técnicas. Entre os destaques recentes está o
efeito alto16-18.
BrainsWay deep transcranial magnetic stimulation
(TMS) system, que teve a aprovação pelo FDA em
Dor crônica
2017 para o tratamento do transtorno obsessivo
A TMS é considerada com nível de evidência A compulsivo e, em 2021, para o tratamento da adição
para tratamento da dor neuropática crônica, quando ao tabaco. Outros estudos financiados por empresas
aplica com alta frequência no córtex motor primário, estão em andamento, sendo promissores para
tendo em média um tamanho de efeito moderado tratamento das síndromes demenciais, doenças de
com a duração de cerca de 3 meses. Por outro lado, Parkinson, entre outros. Importante destacar que
Capítulo 48 670
nem todos os estudos fase 3 tiveram resultados 10. Chervyakov AV, Chernyavsky AY, Sinitsyn DO, Piradov
MA. Possible Mechanisms Underlying the Therapeutic
positivos, sendo também relevantes para consolidar
Effects of Transcranial Magnetic Stimulation. Front Hum
a evidência científica de abordagem ineficazes20. Neurosci. 2015;9:303.
11. Chen R, Cros D, Curra A, et al. The clinical diagnostic
utility of transcranial magnetic stimulation: report of an IFCN
committee. Clin Neurophysiol. 2008;119(3):504-532.
CONCLUSÃO
12. Rossini PM, Burke D, Chen R, et al. Non-invasive
Em resumo, as técnicas de neuromodulação electrical and magnetic stimulation of the brain, spinal
avançaram consideravelmente nas últimas décadas, cord, roots and peripheral nerves: Basic principles and
procedures for routine clinical and research application.
com perspectivas de manterem um crescimento An updated report from an I.F.C.N. Committee. Clin
exponencial. A TMS já é uma realidade para uso Neurophysiol. 2015;126(6):1071-1107.
como instrumento diagnóstico e no tratamento 13. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM
1.986/2012. 2012. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.
de algumas condições clínicas, em especial nas br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2012/1986.
doenças psiquiátricas e na dor neuropática crônica. 14. Rossi S, Hallett M, Rossini PM, Pascual-Leone A; Safety
É esperado, para os próximos anos, que outras of TMS Consensus Group. Safety, ethical considerations,
and application guidelines for the use of transcranial
indicações e técnicas sejam validadas para o uso magnetic stimulation in clinical practice and research. Clin
clínico, trazendo assim grandes benefícios aos Neurophysiol. 2009;120(12):2008-2039.
pacientes. 15. Lucena MFG, Teixeira PEP, Bonin Pinto C, Fregni F. Top
100 cited noninvasive neuromodulation clinical trials. Expert
Rev Med Devices. 2019;16(6):451-466.
16. Fregni F, El-Hagrassy MM, Pacheco-Barrios K, et
REFERÊNCIAS al. Evidence-Based Guidelines and Secondary Meta-
1. INS. Sobre a Sociedade Internacional de Analysis for the Use of Transcranial Direct Current
Neuromodulação (INS). 2022. Disponível em: https://www. Stimulation in Neurological and Psychiatric Disorders. Int J
neuromodulation.com/about-the-ins. Neuropsychopharmacol. 2021;24(4):256-313.
2. Gardner J. A history of deep brain stimulation: 17. Lefaucheur JP, Aleman A, Baeken C, et al. Evidence-
Technological innovation and the role of clinical assessment based guidelines on the therapeutic use of repetitive
tools. Soc Stud Sci. 2013;43(5):707–728. transcranial magnetic stimulation (rTMS): An update (2014-
2018). Clin Neurophysiol. 2020;131(2):474-528.
3. Barker AT, Jalinous R, Freeston IL. Non-invasive
magnetic stimulation of human motor cortex. Lancet. 18. Lefaucheur JP, Antal A, Ayache SS, et al. Evidence-
1985;1(8437):1106-1107. based guidelines on the therapeutic use of transcranial
direct current stimulation (tDCS). Clin Neurophysiol.
4. Pascual-Leone A, Tormos J, Keenan J, et al. Study and 2017;128(1):56-92.
modulation of human cortical excitability with transcranial
magnetic stimulation. J Clin Neurophysiol. 1998;15:333– 19. Razza LB, Afonso Dos Santos L, Borrione L, et al.
343. Appraising the effectiveness of electrical and magnetic brain
stimulation techniques in acute major depressive episodes:
5. Nitsche M, Cohen L, Wassermann E, et al. Transcranial an umbrella review of meta-analyses of randomized
direct current stimulation: state of the art 2008. Brain controlled trials. Braz J Psychiatry. 2021;43(5):514-524.
Stimulation. 2008;1(3):206–223.
20. Cohen SL, Bikson M, Badran BW, George MS. A
6. Lefaucheur JP, Hatem S, Nineb A, et al. Somatotopic visual and narrative timeline of US FDA milestones for
organization of the analgesic effects of motor cortex rTMS in Transcranial Magnetic Stimulation (TMS) devices. Brain
neuropathic pain. Neurology. 2006;67(11):1998-2004. Stimul. 2022;15(1):73-75.
7. Simis M, Imamura M, Sampaio de Melo P, Marduy A,
Battistella L, Fregni F. Deficit of Inhibition as a Marker
of Neuroplasticity (DEFINE Study) in Rehabilitation:
A Longitudinal Cohort Study Protocol. Front Neurol.
2021;12:695406.
8. McLaren ME, Nissim NR, Woods AJ. The effects of
medication use in transcranial direct current stimulation: A
brief review. Brain Stimul. 2018;11(1):52-58.
9. Soundara Rajan T, Ghilardi MFM, Wang HY, et al.
Mechanism of Action for rTMS: A Working Hypothesis
Based on Animal Studies. Front Physiol. 2017;8:457.
Capítulo 48 671
PARTE 12
TRANSTORNO DO SONO
CAPÍTULO 49
DISTÚRBIOS DO SONO
Capítulo 49 673
Para a indução do sono é necessário uma encontrando a pressão ideal para o tratamento. As
ação ativa do sistema gabaérgico e do hormônio proporções de cada estágio do sono durante uma
controlador da melanina para inibir a FR. noite típica, sem fenômenos anormais e com duração
compatível com as necessidades do indivíduo são:
A atividade da FR é máxima de durante a
5 a 10% de estágio N1, 50 a 60% de estágio N2, 20
vigília e substancialmente inativada pelo sistema
a 25% de estágios N3 (ou sono de ondas lentas)
inibitório do núcleo GABAérgico do hipotálamo
e 20 a 25% de estágio REM. A chamada eficiência
anterior durante o sono NREM e REM.
de sono compreende a proporção do tempo em que
Informações fornecidas pela polissonografia um indivíduo dorme, em relação ao tempo total e
A polissonografia é um exame muito útil que se manteve na cama para o sono noturno. É
no auxílio da avaliação dos distúrbios do sono. É considerada normal a partir de 85%. Em relação à
fundamental para avaliação da síndrome de apneia apneia e hipopneia, até 5 apneias/hiponeias por hora
e hipopneia obstrutiva do sono (SAHOS). O paciente é considerado normal; de 5 a 15 eventos por hora é
passa a noite no laboratório do sono. Em caso de considerado aumento leve; de 15 a 30 eventos por
SAHOS e quando a opção de tratamento é com hora temos um aumento moderado e acima de 30
o CPAP, deverá ser realizado outro exame para eventos por hora, aumento grave.
realizar a polissonografia para titulação do CPAP,
Figura 1: Arquitetura do sono: representação gráfica dos estágios do sono e períodos de despertares de um indivíduo
normal.
Fonte: modificado de Fernandes, 20061.
Capítulo 49 674
Na classificação mais recente da arquitetura
Quadro clínico
do sono, o estágio I corresponde a N1, estágio II
O paciente com insônia pode apresentar queixa
corresponde ao estágio N2 e os estágios III e IV
de sonolência diurna, fadiga, déficit de concentração,
correspondem ao estágio N3.
baixo rendimento cognitivo, irritabilidade, alteração
Classificação internacional dos distúrbios do de humor e maior risco de acidentes.
sono (ICSD-3) – 2017
A insônia predomina no sexo feminino e
A ICSD de 2017 divide as patologias aumenta sua prevalência com o aumento da idade.
relacionadas ao sono em:
Diagnóstico
• insônias;
O diagnóstico é realizado pela anamnese
• doenças respiratórias relacionadas ao detalhada. Rotineiramente não necessita de
sono; polissonografia para diagnóstico de insônia, mas em
casos específicos pode ser utilizado este recurso. A
• hiperssonias de origem central;
polissonografia pode auxiliar avaliando a arquitetura
• doenças do sono relacionadas ao ritmo de do sono, o tempo de latência do sono, eficiência do
sono; sono, tempo total de sono e verificando se há apneia
obstrutiva do sono.
• parassonias;
Capítulo 49 675
aumenta o tempo total do sono, aumenta a latência grande impacto na qualidade do seu sono, podendo
do sono REM, aumenta o estágio N2, reduz o sono ajudar a proporcionar um sono saudável ou contribuir
de ondas lentas). O EEG pode apresentar aumento para episódios de insônia. Seguem sugestões
da atividade rápida acima de 12 Hz. não farmacológicas para melhorar a qualidade e
quantidade do sono:
Hipnóticos não benzodiazepínicos (zolpidem,
zaleplona e zopiclona): o zolpidem é um dos 1. mantenha uma rotina de sono: procure
hipnóticos mais prescritos no mundo. É um bom deitar-se e levantar-se sempre no mesmo
medicamento para tratamento sintomático das horário todos os dias, incluindo finais de
insônias. A dose terapêutica é de 10 mg para adultos semana e feriados;
e 5 mg para idosos. Altera pouco a estrutura do
2. evite o consumo de bebidas com cafeína:
sono e apresenta pouca probabilidade de causar
bebidas com cafeína, tal como café,
tolerância e dependência. chás ou refrigerantes à base de cola são
estimulantes e, por isso, podem mantê-
Antidepressivos sedativos lo acordado. Evite consumir este tipo de
Trazodona: é um antagonista do receptor produto por pelo menos 4h antes de se
deitar;
serotoninérgico 5-HT2 e inibidor da recaptação da
serotonina. Pode apresentar aumento do sono REM 3. evite o consumo de bebidas alcoólicas:
e redução dos despertares. Tem apresentação de logo após consumidas, as bebidas
50mg, 100mg e outra de liberação controlada de 150 alcóolicas podem ter efeito hipnótico,
mg. Pode ser utilizada em dose única noturna. porém, algumas horas depois fragmentam
o sono, aumentando a frequência de
Mirtazapina: tem boa ação nas depressões despertares e piorando a qualidade do
moderadas e graves, com efeito sedativo sono;
significativo. Tem como efeito colateral frequente a
hiperfagia e ganho de peso. 4. vá para cama quando estiver com sono:
espere estar com sono para deitar-se;
Valeriana: seu efeito sedativo é, provavelmente,
relacionado ao sesquiterpeno, ácido valerênico e 5. crie no seu quarto um ambiente que
aos valepotriatos. Alguns estudos relacionam seu induza ao sono: mantenha o ambiente
com pouca luminosidade, em silêncio, com
mecanismo de ação ao GABA. Pode, também, ter
temperatura agradável e roupas de cama
relação com receptores melatoninérgicos – MT1 e
confortáveis. Evite televisor, computador e
MT2. materiais relacionados ao trabalho;
Antipsicóticos: estas substâncias podem
6. não fique monitorando o relógio: o hábito
melhorar a eficiência do sono e aumentar o sono de
de checar as horas a todo momento pode
ondas lentas. Pode haver redução do sono REM. influenciar negativamente na sua tentativa
Estimulantes: são medicamentos que de adormecer;
Capítulo 49 676
de se deitar pode ser indigesto e ocasionar
DISTÚRBIOS RESPIRATÓRIOS DO SONO
insônia. Tente jantar algumas horas antes
de dormir e dê preferência a alimentos Apneia central
leves. Ficar sem alimentar-se antes de
A apneia central é caracterizada pela presença
dormir também pode ser prejudicial para o
sono; de cessação do fluxo inspiratório durante o sono, por
um período mínimo de 10 s, na ausência de esforço
9. crie uma rotina antes de dormir: atividades respiratório. A apneia central na polissonografia
relaxantes que precedem o momento pode ser fisiológica ou ter várias causas. Um índice
de dormir podem ser benéficas para a
maior que 5 por hora é considerado anormal.
qualidade do sono. Tente tomar um banho
Associa-se a diversas condições como insuficiência
morno, ler um livro, assistir à sua série
favorita ou praticar exercícios relaxantes cardíaca sistólica, hipertensão arterial pulmonar,
antes de se deitar. Evite aparelhos altas altitudes, pós-acidente vascular encefálico,
eletrônicos, por pelo menos 30 min, antes quadros de hipoventilação alveolar, alterações de
de se deitar; tronco cerebral, desordens neuromusculares, uso
de medicamentos, alterações endocrinológicas
10. controle a ingestão de líquido: o consumo
adequado de líquido evitará que você (acromegalia, hipotireoidismo), associada ao uso
desperte por sede ou para ir ao banheiro. de CPAP ou desordens de vias aéreas inferiores4.
Lembrando que a hidratação é fundamental Em muitos destes casos não se sabe os exatos
para uma vida saudável, apenas evitando mecanismos causadores da apneia.
no período próximo ao horário de dormir.
Sua ocorrência fisiológica é rara, podendo
11. mantenha uma rotina de atividade física: ocorrer no início do sono, após despertar ou suspiro
a prática de atividade física é importante e, ocasionalmente durante o sono REM4.
para manter o corpo e a mente em alerta,
evitando que seja pelo menos 4h antes de Serão descritos com mais detalhes seus
se deitar. principais tipos:
12.
evite a privação de sono: permita- • apneia primária: etiologia idiopática. Con-
se dormir o tempo necessário para o dição rara e diagnóstico de exclusão6.
descanso adequado, a maioria dos adultos Ventilação e esforço ventilatório cessam
necessitam de pelo menos 7h. Devemos de maneira repetitiva durante a noite, po-
considerar que esta necessidade é dendo levar à fragmentação do sono com
individual e tem indivíduos que necessitam sonolência diurna e despertares frequen-
de mais tempo e outras pessoas que se tes. Podem apresentar até mesmo qua-
sentem bem com um tempo menor de dro de insônia. Ocorre normalmente em
sono; e homens idosos. Normalmente possuem
pressão arterial de CO2 normal na vigília.
13. exposição à luz natural: a luz natural é um Uma resposta ventilatória exacerbada ao
aliado do seu relógio biológico, por isso CO2 parece ser um fator predisponente,
deixe que a luz da manhã entre no seu levando a uma instabilidade do controle
quarto. Faça pequenas pausas no trabalho ventilatório3,7. Estudos não randomizados
para se expor a ela. Em contrapartida, evite mostraram a eficácia da acetazolamida
se expor a ambientes muito iluminados à no seu tratamento8. Bipaps não estão in-
noite. dicados e o uso de SERVO pode ser uma
opção5. Seus principais diagnósticos dife-
renciais são a apneia obstrutiva, apneia re-
lacionada à respiração de Cheyne Stokes
e quadros de hipoventilação/hipoxemia3;
Capítulo 49 677
• respiração de Cheyne Stokes: é carac- • apneia central devido a condições médi-
terizada por um episódio recorrente de cas (exceto Cheyne Stokes): a maioria
apneias e/ou hipopneias alternados com destes pacientes apresentam as condi-
períodos prolongados de hiperpneia com ções clínicas já citadas acima, principal-
volume respiratório com padrão em cres- mente lesões de tronco (vascular, neoplá-
cendo e decrescendo. Ocorre, tipicamen- sicas, degenerativas, desmielinizantes ou
te, no sono NREM, desaparecendo ou traumáticas);
atenuando-se no REM. Características
associadas são a fragmentação do sono, • apneia central devido ao uso de drogas:
sonolência excessiva diurna, insônia e ocorre principalmente com uso prolonga-
dispneia noturna episódica. Em muitos do de opioides, mais comumente a me-
casos os pacientes são assintomáticos. tadona e hidrocodona3. A apneia central
Pode ocorrer durante a vigília e asso- devido ao uso crônico destes medicamen-
ciar-se a condições médicas como insu- tos é bastante prevalente. Pode ocorrer
ficiência cardíaca, AVE e falência renal simultaneamente à apneia obstrutiva e ser
e geralmente em pacientes com mais de resistente ao uso de CPAP4; e
60 anos. Como já citado, a principal con-
• apneia central primária da infância: é ca-
dição clínica associada é a insuficiência
racterizada por apneias centrais, mistas
cardíaca congestiva atingindo 25 a 40%
ou obstrutivas associadas a comprometi-
destes pacientes, e sua presença indica
mento fisiológico como hipoxemia e bra-
um pior prognóstico3. Mecanismos pato-
dicardia. Trata-se de distúrbio do controle
lógicos da insuficiência cardíaca levam
respiratório associado à imaturidade do
ao padrão respiratório do Cheyne Stokes
centro respiratório ou secundário a outras
(por exemplo, hiperventilação crônica). O
condições médicas3.
mecanismo da apneia central associa-se
ao aumento da quimiossensibilidade ao
CO2, à reserva de PCO2 e à não elevação Apneia Obstrutiva
da PCO2 no início do sono4. Na polisso-
nografia, ocorre tipicamente na transição Definição e fisiopatologia
da vigília para o sono NREM e durante os
A apneia obstrutiva do sono é caracterizada
estágios I e II. Acompanha-se de queda da
pela cessação do fluxo inspiratório durante o sono,
oxihemoglobina, raramente abaixo de 80
a 85%. por um período mínimo de 10 s, na presença de
esforço respiratório. Na hipopneia ocorre a redução
• devido à alta altitude: caracterizados por parcial do fluxo inspiratório acompanhado de
períodos cíclicos de apneia e hiperpneia dessaturação da oxihemoglobina. A maioria dos
que ocorrem em altitudes normalmente
eventos dura entre 10 e 30 s, mas ocasionalmente,
acima de 7000 metros 3. O ciclo periódi-
pode durar 1 min ou mais. Tanto a apneia quanto
co da respiração é mais curto quando
comparado ao encontrado na insuficiên- hipopneia são acompanhados pela queda da oxi-
cia cardíaca congestiva9. O mecanismo hemoglobina no sangue. No entanto, como na apneia
fisiopatológico relaciona-se à hipoxemia, a redução do fluxo inspiratório é parcial, para sua
diminuição da diferença dos níveis de caracterização torna-se obrigatória a observação da
PCO2 (na eupneia e apneia) e aumento queda da saturação3.
da quimiossensibilidade ao PCO24. Ocorre
fragmentação do sono e redução do sono Na apneia obstrutiva do sono ocorre
profundo. Inalação de oxigênio suplemen- colabamento da via aérea superior. A inspiração
tar ou pequenas quantidades de CO2 dimi- gera uma coluna de pressão negativa que predispõe
nuem a respiração periódica. A acetazola- à obstrução do espaço aéreo. O esforço respiratório
mida melhora a dessaturação4;
que se segue não consegue vencer esta resistência
Capítulo 49 678
e então ocorre a apneia. Durante o evento, ocorre lembrar a importância da classificação da Mallapati
ativação do sistema nervoso autônomo. O aumento (relação da língua com a orofaringe), pois quanto
do esforço para vencer a resistência e ativação maior a sua classificação, maior o índice de apneia
simpática culmina na superficialização do sono e hipopneia14.
ou mesmo despertar. Como consequência, ocorre
Pacientes apneicos tèm a via aérea com
aumento do tônus muscular e o paciente volta a
menor diâmetro e com formato elíptico, o que
respirar.
facilita o colabamento. A diminuição do lúmen se
As causas do colapso são multifatoriais. dá não só pelo depósito de gordura, mas também
O tamanho da via aérea superior, que é pelo espessamento das paredes musculares. O
significativamente afetada pela obesidade e espessamento da parede lateral da faringe com
alterações craniofaciais tem papel central. No redução do diâmetro transverso é um dos fatores
entanto, o aumento da colapsibilidade da via aérea mais importantes na apneia15.
superior e a resposta neuromuscular inadequada
O diagnóstico da apneia obstrutiva do
não são totalmente compreendidas 10
. Novas
sono requer a polissonografia de noite inteira,
direções apontam fatores como neuropatia faríngea,
considerado exame padrão-ouro. A polissonografia
instabilidade ventilatória e deslocamentos de fluidos
quantifica estes eventos, nos informando o índice de
no pescoço além das já documentadas obesidade e
apneia/hipopneia por hora (IAH), além de evidenciar
alterações craniofaciais11.
a presença de dessaturação da oxi-hemoglobina
acompanhando estes eventos, distúrbios do ritmo
cardíaco, alterações na arquitetura do sono, posição
Diagnóstico corporal e fases do sono em que ocorrem os eventos,
Os principais sintomas da síndrome da apneia presença de ronco, dentre outras informações16.
obstrutiva são fadiga, sonolência diurna, déficit de Com o crescente interesse pela apneia e dificuldades
atenção, dificuldade de memorização, diminuição de realização de polissonografia de noite inteira
da libido, noctúria e irritabilidade . Em crianças, a
12
no laboratório, novas ferramentas e estratégias
principal manifestação são as alterações cognitivas, diagnósticas vêm sendo apresentadas. Monitores
hiperatividade e baixo rendimento escolar. portáteis e exames realizados em casa vêm sendo
validados em alguns casos, como em pacientes com
Existem vários questionários que têm o objetivo
alta probabilidade da doença e sem comorbidades17.
de predizer a presença de distúrbio respiratório do
sono (por exemplo, questionário de Berlim)13, bem
Síndrome da apneia obstrutiva do sono
como quantificar a sonolência diurna, como a escala
A síndrome da apneia obstrutiva do sono é
de Epworth, que avalia a probabilidade de cochilo ou
definida como:
adormecimento.
Capítulo 49 679
finalmente, como grave (se IAH for maior que 30)16. cardiovascular e endócrino. Sabe-se que a apneia
obstrutiva do sono é fator de risco independente para
doenças endócrinas e cardiovasculares e muitos
Tratamento autores a consideram uma manifestação da síndrome
metabólica21. Relaciona-se com aumento da
O tratamento da síndrome da apneia
resistência à insulina, hipertensão arterial sistêmica
obstrutiva varia de acordo com sua causa e grau de
e doenças cardiovasculares como AVE, doença
severidade. O tratamento padrão-ouro para apneia
coronariana, insuficiência cardíaca congestiva e
grave e moderada é o uso de aparelhos de pressão
arritmias22. A apneia do sono é atualmente também
positiva (PAPs) com CPAP, BIPAP e APAP12. Estes
considerada uma desordem inflamatória. Evidências
também estão indicados para pacientes com apneia
sugerem que a hipóxia crônica intermitente e,
leve e sonolência excessiva diurna.
possivelmente a fragmentação do sono elevam
Apesar do uso do CPAP reduzir morbidade e vários marcadores inflamatórios, aumentam o
mortalidade, o paciente deve ser seguido de perto, estresse oxidativo e atividades procoagulantes e
pois a aderência ao tratamento é fundamental trombóticas. Estas alterações contribuem para a
para redução de apneia leve. A cirurgia de avanço disfunção endotelial e metabólica, aterosclerose e
maxilo-mandibular é uma opção para apneia grave distúrbios cardiovasculares associados à apneia do
em casos específicos, como em pacientes com ou sono. No entanto, muitas vezes, estas alterações
sem alterações esqueléticas que não se adaptam são comorbidades em pacientes apneicos, tornando
ao CPAP18. Ronco primário e apneia leve podem ser difícil a distinção entre as consequências e fatores
tratados com aparelhos intraorais19 e cirurgias como associados à apneia23. Daí, podemos ter uma ideia
adenotonsilectomia e uvulopalatofaringoplastia . 20
da importância do diagnóstico e tratamento desta
condição médica.
Capítulo 49 680
Parassonias do sono REM de fadiga, sonolência diurna, déficit de atenção,
déficit de concentração, distúrbio de memória,
Distúrbio comportamental do sono REM:
disfunção social, comprometimento profissional,
caracterizado por movimentos bruscos, sendo
deficiência acadêmica, irritabilidade, propensão a
comum a agressão a quem está ao lado, geralmente
erros, maior risco de acidentes, cefaleia e sintomas
associado a sonho de luta. Pode preceder doença
gastrointestinais podem estar presentes nestes
de Parkinson por vários anos. A polissonografia
pacientes. A presença de comorbidades como
pode detectar alteração do tônus muscular durante
ansiedade e distúrbio do humor pode agravar os
o sono REM.
sintomas relacionados ao sono e à dor. Estudos
Pesadelos: o paciente acorda ansioso e tem clínicos e experimentais sugerem a associação entre
lembrança vívida do sonho. sono não reparador e as manifestações dolorosas,
com redução do limiar de dor24.
Distúrbios do movimento relacionados ao
sono A fibromialgia pode apresentar intrusão de
Bruxismo: caracterizado pelo movimento de ritmo alfa durante o sono de ondas lentas, também
apertar ou ranger os dentes. Pode haver desgaste chamado de padrão alfa-delta do sono NREM. Este
dos dentes. A ansiedade e fatores estressantes padrão de sono não é patognomônico de fibromialgia.
Síndrome das pernas inquietas (SPI): outras) devem ser investigados sobre sua qualidade
parestesia tipo formigamento, levando a desconforto fatores emocionais e uso de medicamentos que
intenso, pior durante o repouso, obrigando o podem interferir no sono. O tratamento dos distúrbios
Capítulo 49 681
• hipóxia: está relacionada a aumento da das ao sono. Estas queixas podem prece-
frequência cardíaca e da pressão arterial der ao diagnóstico da tireoidopatia;
sistêmica, levando a um aumento do me-
tabolismo do miocárdio, apesar da menor • hipotireoidismo: geralmente provoca so-
oferta de oxigênio; e nolência excessiva e maior propensão a
apneia obstrutiva do sono. A arquitetura
• despertares: geralmente estão associados do sono pode alterar (diminuição do sono
a apneia obstrutiva. de ondas lentas);
Capítulo 49 682
sono e vigília estão entre os sintomas não co, distúrbio de ansiedade generalizada,
motores mais frequentes da DP. Na fase fobia social, estresse pós-traumático) são
inicial, é comum aumento da latência do frequentemente associados com queixas
sono, aumento dos despertares e diminui- relacionadas ao sono. A dificuldade para
ção da eficiência do sono. Até 60% dos iniciar o sono e despertares abruptos são
pacientes com DP apresentam insônia. De queixas comuns destes pacientes25. Os
15 a 59% apresentam distúrbio comporta- achados polissonográficos frequentes
mental do sono REM e 30% apresentam nestes pacientes são: aumento da latência
sonolência excessiva diurna. O distúrbio do sono, podendo ultrapassar 1h, aumen-
comportamental do sono REM pode iniciar to de N1 e N2 e redução do REM. A queixa
vários anos antes do início dos sintomas de sono não reparador também é frequen-
da DP. Um estudo revisou o impacto do te nestes pacientes24. Distúrbios do humor
transtorno comportamental do sono REM (depressão maior e transtorno do humor
na DP, mostrando que há evidências de bipolar) são comumente associados a dis-
maiores incidências de sintomas não mo- túrbios do sono. Os distúrbios do sono fa-
tores e piora mais rápida dos sintomas mo- zem parte dos critérios diagnósticos des-
tores em pacientes com DP associados ao tas patologias. A queixa de insônia é mais
transtorno comportamental do sono REM. frequente. Alguns pacientes com distúrbio
Os distúrbios do sono em portadores de do humor queixam-se de hipersonia. A in-
doença de Parkinson podem ter influência sônia e a hipersonia estão relacionadas
das alterações dos neurotransmissores com piora do humor, tornando um ciclo vi-
envolvidos na etiologia da patologia, do cioso. O tratamento dos sintomas depres-
uso dos medicamentos para tratamento sivos associado ao tratamento das quei-
da doença e em decorrência dos sintomas xas de sono otimizam o tratamento.
motores como o tremor e a bradicinesia;
Capítulo 49 683
9. Siegel J. Clues to the function of mammalian sleep. 18. Peyron C, Tighe DK, Van den Pol AN. Neurons
Nature. 2005; 437:1264-1271. containing hypocretin (orexin) project to multiple neuronal
systems. J Neurosci. 2002;18:9996-10015.
10. Espanha R, Scammell TE. Sleep neurobiology for the
clinician. Sleep. 2004;27:811-20. 19. Van Gelder RN. Recent insights into mammalian
circadian rhythms. Sleep. 2004;27:166-71
11. Adamantidis A, De Leccea L. Physiological arousal: a
role for hytalamic systems. Cell. Mol. LifeSci. 2008;65:1475- 20. Sakurai T, Amemiya A, Ishii M. Orexins and orexin
1488. receptors: a family of hypothalamic neuropeptides and G
protein-coupled receptors that regulate feeding behavior.
12. Steriade M. Arousal: revisiting the reticular activating
Cell. 1998,92:573-585.
system. Science. 1996;272:225-236.
21. Sherin JE, Shiromani PJ, McCarley RW et al. Activation
13. Curtis DR, Hosli L, Johnston GA et al. The
of ventrolateral preoptic neurons during sleep. Science.
hyperpolarization of spinal motorneurons by glycine and
1996;271:216-219.
related amino acids. Exp Brain Res. 1968;5:235-258.
22. Lu J, Sherman D, Devor M, Saper CB. A putative flip–
14. Sakurai T, Amemiya A, Ishii M et al. Orexins and orexin
flop switch for control of REM sleep. Nature. 2006;441(1):
receptors: a family of hypothalamic neuropeptides and G
589-594.
protein-coupled receptors that regulate feeding behavior.
Cell. 1998;92:573-585. 23. Porkka-Heiskanen T, Alanko L, Kalinchuk A. Adenosine
and sleep Sleep Medicine Reviews. 2002;6:321-332.
15. De Lecea L, Kilduff TS, Peyron C. The hypocretins:
hypothalamus-specific peptides with neuroexcitatory activity. 24. Tufik S. Medicina e biologia do sono: Instituto Do Sono.
Proc Natl Acad Sci. 1998;95:322-327. 1ª edição. Manole; 2007.
16. Kilduff TS, Peyron C. The hypocretin/orexin ligand- 25. Quan SF, Griswold ME, Iber C, et al. Short-term
receptor system: implications for sleep and sleep disorders. variability of respiration and sleep during unattended
Trends Neurosci. 2000;23:359-65. nonlaboratory polysomnography--the Sleep Heart Health
Study. Sleep. 2002;25(8):843-9.
17. Espanha RA, Baldo BA, Kelley AE et al. Wake-
promoting and sleep-suppressing actions of hypocretin
(orexin): basal forebrain sites of action. Neuroscience.
2001;106:699-715.
Capítulo 49 684
PARTE 13
PRINCÍPIOS EM NEUROINTENSIVISMO
CAPÍTULO 50
NEUROINTENSIVISMO
Capítulo 50 686
para identificação precoce de lesões que cursam mas que após continuado aumento gera um
com hipoperfusão. Nesse aspecto, a utilização de aumento significativo e rápido na PIC, podendo
Doppler transcraniano (DTC) e saturação de bulbo gerar herniações de tecidos cerebrais, isquemia da
jugular apresentam maior importância. O DTC utiliza região herniada e a morte, como demonstra a Curva
da técnica de ultrassom para avaliar, de forma de Langfitt (Figura 2)².
não invasiva, a velocidade de fluxo sanguíneo nas
Após essas descobertas, a primeira aferição
artérias cerebrais e permite desde o diagnóstico
da PIC ocorreu em 1916, realizada por Hans
de alterações de fluxos, como vasoespasmo ou
Queckenstedt, por meio de uma agulha de punção
recanalização de vasos após terapia trombolítica,
lombar conectada a um manômentro de tubo em
à confirmação de morte encefálica. Por sua vez,
U¹. Com a possibilidade de monitorização da PIC
a saturação de bulbo jugular permite analisar
outros métodos foram se desenvolvendo com o
o balanço entre oferta e consumo de oxigênio
tempo, permitindo uma maior monitorização da
cerebral. Ademais, técnicas modernas, como
PIC e acompanhamentos para evitar possíveis
oximetria tissular cerebral, técnica de microdiálise
danos cerebrais. Atualmente, a monitorização da
e tomografia computadorizada com perfusão devem
PIC é realizada como em casos de traumatismo
ainda ser consideradas na monitorização.
cranioencefálico (TCE), hemorragia intracraniana,
hemorragia subaracnoidea, edema cerebral,
hidrocefalia, isquemia cerebral e encefalopatia
MONITORIZAÇÃO DA PRESSÃO
INTRACRANIANA (PIC) hepática³. A monitorização da PIC é dividida
cefalorraquidiano (LCR) por Nicola Massa, em 1538, aos invasivos eles podem ser feitos por meio de
e a primeira menção sobre a pressão intracraniana sistemas baseados na aferição da pressão de fluidos
(PIC) por Alexander Monro, em 1783¹, foi possibilitada e por meio do implante de microtransdutores4. Já os
a descoberta de diversas aplicações clínicas e métodos não invasivos são exame físico, exames
Os trabalhos de Monro e George Kellie acoplados do nervo óptico que possuem aplicações úteis em
do funcionamento da PIC e como ela se mantinha. da utilização de métodos invasivos³. Em relação aos
Por meio da compreensão da composição craniana métodos invasivos baseados na aferição da pressão
(Figura 1) foi estabelecida a doutrina de Monro-Killie de fluidos existem a derivação ventricular externa
que relacionou as estruturas imóveis (encéfalo e (DVE) e o método subaracnoideo por meio de parafuso
relação à PIC, além da interrelação entre o influxo e PIC e permite a drenagem de LCR e a administração
o efluxo de sangue e a produção e efluxo de LCR, de antibióticos durante a monitorização. Além disso,
em que o aumento de um resultaria na diminuição de possui de 5 a 20% de risco de infecção não podendo
outro além da alteração da PIC¹. Com mecanismos ser de uso prolongado e sendo necessário grande
controlada dentro de um limiar de normalidade. de cateter impregnado por prata a fim de diminuir
edema cerebral, hidrocefalia, tumores e outros – a inserção errônea e de hemorragia no uso de DVE6.
PIC pode ser alterada. Essa alteração inicialmente é Já o método subaracnoideo é realizado por meio
Capítulo 50 687
Figura 1: Composição craniana.
Fonte: Modificada de Harary et al., 20214.
Capítulo 50 688
não possuindo capacidade de drenagem do LCR Por fim, vale ressaltar que os métodos
e contendo grande risco de infecção . Quanto
4
de análise da PIC ainda não são consenso na
ao implante de microtransdutores podem ser por comunidade cientifica, possuindo contradições
dispositivos medidores de tensão, sensores de dentro da literatura sobre sua acurácia, diminuição
fibra óptica ou sensores pneumáticos. A maioria da mortalidade e também possíveis aumento: no
deles são inseridos intraparenquimal, podendo ser tempo de internação nos pacientes submetidos a
inserido em outros locais e não podem, à exceção esses procedimentos. O estudo de Chesnut et al.21
do sensor pneumático, serem recalibrados após trouxe a conclusão de não melhora em pacientes
colocados, também possuem menores riscos de sobre a monitorização de PIC pelos métodos
infeção e hemorragia que os DVE e são utilizados convencionais, como DVE, em relação à avaliação
em casos em que não se pode realizar o uso de clínica e por exames de imagem, como TC, e
DVE ou que não será necessária a drenagem de aumento no tempo de internação. Contudo, ainda
LCR . Na Figura 3, notamos três tipos de métodos
4
assim os métodos de análise da PIC são utilizados
de análise: um inserido no espaço ventricular, outro e existe vasta literatura com dados positivos da
intraparenquimatoso e outro subdural. avaliação constante da PIC, como por meio de DVE,
a exemplo da recomendação nível IIB pela Fundação
Como dito, os métodos invasivos possuem
Brain Trauma na quarta edição de seu guidelines
riscos em sua utilização e há casos em que não
para o uso de monitorização da PIC em pacientes
podem ser utilizados. Com isso, o desenvolvimento
com TCE grave.
de métodos não invasivos tem sido cada vez mais
promissor a fim de retirar os riscos de infecções,
hemorragias, erros na colocação e de aumento
OXIMETRIA DE BULBO JUGULAR
no tempo de internação. O exame físico analisa
A oximetria de bulbo jugular é uma técnica
o estado geral e de consciência do paciente,
invasiva de monitoramento da oxigenação encefálica
possuindo boa especificidade e baixa sensibilidade³.
que requer a inserção, guiada por ultrassonografia,
O DTC utiliza do ultrassom para analisar possíveis
de um oxímetro de fibra óptica por canulação
mudanças no fluxo sanguíneo e hemorragia
retrógrada da veia jugular interna ou a amostragem
subaracnoidea com vasoespasmo, sendo limitado
sanguínea intermitente desse vaso8. A confirmação
devido a difícil monitorização constante e em
do posicionamento do catéter, posteriormente ao
pacientes com alteração no crânio4. A medida do
processo mastoide e acima do corpo vertebral de
diâmetro da bainha do nervo óptico é útil devido
C1, deve ser feita por meio da obtenção de imagens
seu revestimento pela subaracnoide que transmite o
radiográficas, devido à proximidade da veia facial
aumento da PIC para a bainha do nervo possuindo
e ao consequente risco de “contaminação” das
sensibilidade de 90% e especificidade de 85%.
medidas com sangue oxigenado proveniente de
Contudo não pode ser utilizado em pacientes com
tecidos extracranianos8. Essa técnica, descrita
trauma ou outras condições que alterem o tamanho
pela primeira vez em humanos na década de
da bainha do nervo4. A TC e a ressonância magnética
1940, permite a avaliação do grau de saturação do
(RM) também são métodos que possibilitam analisar
sangue venoso (SjvO2) proveniente da circulação
possíveis alterações típicas e causas das alterações
intracraniana, cujos valores de referência situam-se
na PIC, sendo a TC a mais recomendada para
entre 55 a 75%9. Sua comparação com a saturação
análise. Entretanto, ambas não descartam prévio
do sangue arterial fornece informações importantes
aumento nem possível aumento de PIC não sendo,
acerca da extração de oxigênio decorrente do
portanto, suficientes para análise da PIC³. Na Figura
metabolismo encefálico, assim como medidas
4, analisamos à direita um quadro de hipertensão.
indiretas do fluxo sanguíneo cerebral . Como a
8
Capítulo 50 689
Figura 3: Monitorização de PIC.
Fonte: modificado de Giugno et al., 20037.
Capítulo 50 690
extração de oxigênio tende a aumentar cerca de ainda existe o risco do posicionamento errôneo
24h antes do desenvolvimento de vasoespasmo do cateter (o que comprometeria a qualidade das
sintomático, os valores de saturação mencionados medidas)8, de infecção e da formação de trombos
permitem a identificação precoce de anormalidades com consequente embolia pulmonar ou trombose
hemodinâmicas, de modo que, quando inferiores a venosa jugular, a qual pode precipitar a elevação da
50% e persistentes por mais de 10 a 15 minutos, são pressão intracraniana12 . Desse modo, a oximetria
indicativos de isquemia cerebral e pior prognóstico, de bulbo jugular é usada com menos frequência
respectivamente . Quando combinada com o doppler
9
no monitoramento do paciente neurocrítico devido
transcraniano, a oximetria do bulbo jugular pode à sua menor acurácia quando comparada a outros
auxiliar na diferenciação entre hiperemia cerebral marcadores da oxigenação encefálica, ao seu
e vasoespasmo após hemorragia subaracnoidea, caráter invasivo e às suas possíveis complicações13.
sendo a primeira suspeitada quando ambos os As recomendações fornecidas pela International
valores estão elevados, e a segunda quando apenas Multidisciplinary Consensus Conference on
a saturação está baixa, mas a velocidade do fluxo Multimodality Monitoring orientam seu uso em
sanguíneo fornecida pelo doppler permanece alta. associação com outros métodos de monitoramento9
Outra aplicação dessa técnica envolve a monitorização ,como a avaliação da pressão intracraniana, dando
intra e peri operatória desses pacientes, guiando a preferência ao uso de monitores teciduais da
terapia para otimização da oxigenação encefálica , 8
oxigenação encefálica quando os valores desta são
assim como daqueles submetidos a cirurgias almejados12. Entretanto, essa técnica pode ser útil
vasculares torácicas com hipotermia profunda e na avaliação de pacientes que sofreram traumatismo
parada circulatória total ou bypass cardiopulmonar,
8
crânioencefálico ou algum acometimento sistêmico
uma vez que dessaturações venosas encefálicas com risco de isquemia cerebral9, os quais, tendo sua
estão presentes em cerca de 23% dos pacientes de saturação venosa jugular inferior ao limiar de 55%,
cirurgias cardíacas e se correlacionam com piora da devem ser alvos de intervenção terapêutica, de
função cognitiva no pós-operatório . No entanto,
10
modo a promover melhora prognóstica e a prevenir
como todas as demais técnicas de monitoramento a ocorrência de dano encefálico irreversível12,13.
da função encefálica, ela apresenta limitações: as
oscilações da saturação venosa jugular não são
específicas, podendo indicar uma miríade de cenários VENTILAÇÃO MECÂNICA NO
clínicos, como anemia, hipotensão, febre, hipóxia NEUROCRÍTICO
ou hipertensão intracraniana11. Isso porque a sua A ventilação mecânica (VM) é utilizada
queda pode decorrer tanto do aumento da extração em pacientes neurocríticos, quando o nível de
de oxigênio pelo tecido quanto da redução da oferta consciência está comprometido com a ECG ≤ 8 e
de oxigênio, enquanto, de forma contrária, sua que são incapazes de realizar a própria proteção
elevação pode indicar tanto a queda na extração de das vias aéreas. Este rebaixamento da consciência
oxigênio quanto o aumento da oferta deste . Outras 10
é um dos principais fatores para o desenvolvimento
limitações incluem sua reduzida sensibilidade, uma de danos cerebrais como alterações nos parâmetros
vez que pelo menos 13% do volume cerebral deve de perfusão cerebral e adequação da hemodinâmica
estar isquêmico para que os valores da saturação cerebral. Considerando estas alterações, a VM
venosa jugular sofram alguma alteração, e o fato tem como principal objetivo minimizar os riscos de
desta ser uma medida da oxigenação encefálica lesões secundárias cerebrais e os seus benefícios
global, o que a torna pouco útil na detecção de são promover a proteção dos parâmetros cerebrais
isquemia focal . Por outro lado, apesar de não
11
básicos, como pressão intracraniana (PIC), pressão
estar associada a complicações significativas, de perfusão cerebral (PPC) e fluxo sanguíneo cerebral
Capítulo 50 691
(FSC)14. As medidas iniciais visam a estabilização
Causas neurológicas Causas Respiratórias
hemodinâmica com manutenção adequada de
PPC, bem como a prevenção da hipertensão Glasgow <8 Broncoaspiração
Capítulo 50 692
jugular de oxigênio (SvjO2) ou a medida tecidual sabido que as taxas de falha de extubação são altas
(PbtO2) para monitorar a possível isquemia nos pacientes críticos neurológicos. Além disso,
cerebral secundária. Um fluxograma levando em as recentes diretrizes não abordam o desmame da
consideração todos esses fatores pode auxiliar o VM especificamente nesse grupo de pacientes36.
manuseio racional dos valores de PaCO2 durante o No entanto, o desmame só deve ser iniciado após
tratamento de pacientes com HIC . A hiperoxia deve
16
o controle da HIC, com valor de PIC abaixo de 20
ser evitada em virtude de sua toxicidade e pela falta mmHg e PPC > 60 mmHg por, no mínimo, 48 h. A
de evidências favoráveis, mesmo em pacientes com seguir, retira-se a sedação e o nível de consciência
diagnóstico de encefalopatia anóxico-isquêmica . 28
indicará se o desmame irá ou não progredir. Um
Havendo HIC, os pacientes devem ser mantidos com valor mínimo de 8 na ECG é o limite aceitável.
a cabeceira do leito em 30 graus, visando a melhora Contudo, recentes estudos identificaram quatro
do retorno venoso encefálico e a diminuição da parâmetros preditores de uma extubação bem-
influência da PEEP sobre a PIC, além de melhorar a sucedida. Observou-se que, em pacientes nos quais
complacência pulmonar . 29
estavam presentes três dos quatro critérios – idade
menor que 40 anos, busca visual pelo paciente,
A utilização da PEEP reduz a incidência de
tentativa de deglutição e Glasgow > 10 – houve 90%
lesão pulmonar induzida por ventilação mecânica
de sucesso nas extubações37. Além destes, outro
(VILI, do inglês ventilator induced lung injury),
trabalho acrescentou balanço hídrico negativo e
aumenta a CRF e evita a utilização de altas FIO2.
tosse como preditores de sucesso. A estabilidade dos
Embora o nível seguro da PEEP seja controverso
demais parâmetros, ventilatórios e hemodinâmicos,
no paciente com TCE grave sem monitoramento
é a mesma observada para pacientes sem lesão
da PIC, esses efeitos hemodinâmicos foram
cerebral38. A associação de TCE com SDRA (20%)
seguramente superestimados ao longo dos anos30.
ou com pneumonia associada à VM (PAVM 40%)
Em condições de estabilidade hemodinâmica,
são fatores que dificultam o desmame e prolongam
aumentos da PEEP até valores de 10 a 15 mmHg
a VM26. Embora ainda existam divergências sobre
para otimizar a oxigenação não se associam à
o tempo adequado de traqueostomia, sugere-se,
redução de PPC ou FSC30,31. A PEEP, por outro
nessas situações, a realização de traqueostomia
lado, especialmente em pacientes hipovolêmicos e
precoce (até 7 dias). Um estudo recente comparou
em valor elevado, pode contribuir para redução do
a realização de traqueostomia precoce contra
FSC e aumento da PIC32. É importante assinalar que
tardia em pacientes vítimas de TCE e observou
o aumento da pressão intratorácica pode reduzir a
menos pneumonias, menor duração de VM e menor
PAM e a PPC com maior magnitude, especialmente
tempo de permanência em UTI15. Outro estudo de
em pacientes com pulmões com complacência
coorte com 1.811 pacientes também demonstrou
normal, quando comparados a pacientes com
favorecimento à traqueostomia precoce após análise
complacência reduzida33. A necessidade de utilizar
do escore de propensão. Sugere-se, portanto,
PEEP elevada (> 12 cmH2O) em pacientes com
também realizar traqueostomia precoce nos
TCE grave deve ser orientada pelo monitoramento
pacientes com TCE grave (ECG < 8), que geralmente
da PIC15,33,34. A realização de fisioterapia respiratória
necessitam de suporte ventilatório prolongado16. A
deve ser cuidadosamente avaliada durante as
VM é utilizada para assegurar a adequada evolução
primeiras horas do TCE grave, individualizando caso
de pacientes com grave comprometimento do nível
a caso, assim como a necessidade e a frequência
de consciência. Apesar dos seus benefícios, a VM
da aspiração das secreções traqueais. Embora
pode produzir efeitos indesejados na hemodinâmica
não exista uma recomendação expressa para a
sistêmica e cerebral, com consequente redução da
sua utilização, o sistema fechado de aspiração
PPC16. Como princípios gerais, é fundamental evitar
pode minimizar a manipulação das vias aéreas35. É
Capítulo 50 693
hipoxia, hipotensão arterial, hiper ou hipocapnia, sendo que segundo a American Heart Association
e fatores associados à evolução desfavorável. esses pacientes devem ser submetidos a um controle
Sugere-se utilizar o modo VCV para pacientes com de temperatura com manutenção entre 32 e 36 °C43.
lesão neurológica grave na fase aguda, visando Há evidências de que um grande efeito protetor da
evitar oscilações do VC 21,23,24,26
. A hiperventilação hipotermia no fluxo cerebral deve-se pelo bloqueio
está, portanto, contraindicada como medida da libertação dos radicais reativos de oxigênio e
rotineira, reservada para situações com riscos de do processo inflamatório que ocorre no momento
herniação cerebral, e por curto período, até que da reperfusão após a isquemia, consequentemente
medidas adicionais para o controle da PIC sejam reduzindo a hiperemia que se segue à reperfusão.
adotadas 14,25
. Outro mecanismo de atuação importante para o
sucesso dessa terapia é a preservação da barreira
hematoencefálica após os efeitos de reperfusão
TEMPERATURA CEREBRAL pós-isquemia, lesão traumática ou administração
A temperatura cerebral é determinada pela de manitol sobre esta. Em ambos os casos evita-
produção local de calor pelo metabolismo cerebral, se o aumento da PIC. Acredita-se, também, que a
pela temperatura do sangue arterial, a qual hipotermia melhora a utilização de glicose pelo tecido
normalmente é menor que a cerebral, e pelo fluxo cerebral40,42.
sanguíneo que tem como função a dissipação do
calor produzido39. A atividade cerebral possui uma
relação íntima com a temperatura corporal e cerebral
OXIMETRIA CEREBRAL
do paciente. O aumento da temperatura cerebral
No contexto de terapia intensiva neurológica
faz com que ocorra um aumento exponencial no
e na monitorização neurológica multimodal, a
consumo de oxigênio pelo cérebro, assim como
medida contínua da pressão intracraniana (PIC) e,
elevação dos níveis de aminoácidos excitatórios,
consequentemente, da pressão de perfusão cerebral
dos radicais livres, ácido lático e piruvato, aumento
(PPC) são consideradas o padrão-ouro, sobretudo
da despolarização isquêmica, quebra da barreira
para intervenções precoces que visem a prevenção
hematoencefálica (BHE) e prejuízo das funções
de lesões secundárias ao SNC. Contudo, vários
enzimáticas cerebrais40. O acréscimo de 1 °C na
estudos têm demonstrado que tais lesões podem
temperatura corporal eleva em 13% o consumo de
ocorrer com essas medidas dentro da normalidade,
oxigênio cerebral, desencadeando em aumento da
o que acarreta em desfechos desfavoráveis44. Na
pressão intracraniana (PIC). Por isso é importante
mesma linhagem, a oximetria de bulbo jugular,
a monitorização da temperatura corporal e cerebral
tecnologia idealizada para monitorizar a extração
dos pacientes. Essa monitorização é feita através da
cerebral global de oxigênio não é um bom preditor para
aferição da temperatura retal, timpânica, esofágica,
áreas regionais sob estresse metabólico, sobretudo
vaginal, vesical ou cerebral40. Esta última é realizada
áreas de penumbra, estando sujeita a variações na
através de um eletrodo polarográfico cujo monitor
posição do cateter na VJI e outros artefatos45,46. Com
utilizado, fornece diversos dados além da temperatura
o intuito da monitorização mais precisa e regional/
cerebral, como a PO2 cerebral (PTiO2), PIC e pressão
local da demanda metabólica de oxigênio e possível
de perfusão cerebral (PPC). Diante disso, a hipotermia
melhora nos desfechos clínicos, foi desenvolvida a
terapêutica (HT) representa um importante avanço
monitorização da pressão parcial tissular cerebral de
no tratamento de diversas situações de isquemia
oxigênio (PbtiO2). A empresa Integra desenvolveu o
neuronal, com amplos efeitos neuroprotetores. Os
sistema Licox®, consistindo em um probe de 3 vias,
usos mais comuns incluem pacientes adultos que
o qual é inserido na área de interesse – áreas de
sofreram AV ou parada cardiorrespiratória (PCR)41,42,
penumbra, hemisfério contralateral ao lado da lesão
Capítulo 50 694
ou ambos. A técnica de inserção consiste em um vulsivantes; e
procedimento neurocirúrgico, com a abertura óssea
• febre: considerar antipiréticos.
em burr-hole e inserção do dispositivo, que deve ser
confirmado com TC de crânio pós-operatória. Após a • redução na oferta de O2
confirmação da posição desejada, deve ser realizado
um teste de bom funcionamento, durante 2 a 5 min • hipotensão. Considerar restauração da
volemia e/ou vasopressores;
com elevação da FiO2 para 100% (FiO2 prévia abaixo
de 80%). Caso haja alteração da PbtiO2, a posição • hipovolemia. Considerar restauração
está confirmada e o funcionamento confiável. Caso de volemia com SF 0,9%;
contrário, o probe deve ser reinserido através de
• anemia. Considerar transfusão sanguí-
um novo orifício de trépano. As outras duas vias
nea; e
do Licox® destinam-se à inserção dos cateteres de
monitorização de temperatura cerebral e PIC. • hipóxia. Considerar aumento de FiO2 e/
ou PEEP.
Os valores normais da PbtiO2 situam-se entre
25 a 50 mmhg. Valores abaixo de 15 mmhg denotam • altos valores de PbtiO2 (>50 mmhg)
isquemia e, abaixo de 5 mmhg, morte celular46. Esta
modalidade de monitorização deve ser empregada • consumo reduzido de O2
em pacientes comatosos (ECG<8). Alguns protocolos
• sedação/bloqueio neuromuscular: con-
foram desenvolvidos para tratamento dirigido através siderar suspensão/redução das drogas
da PbtiO2, considerando o start point de valores <20 ou não tratar.
mmhg. Entretanto, é importante ressaltar que estes
valores não devem ser considerados isoladamente. • oferta aumentada de O2
Capítulo 50 695
esta tecnologia para diálise perfusional in vivo, em são as alterações na pressão de perfusão cerebral,
macacos. Simultaneamente, coube a Ungerstedt oxigenoterapia, transfusões de concentrados de
e Pycock , grandes pesquisadores na área de
53
hemácias e controle metabólico (glicose sérica
neuroquímica e conexões do SNC no Instituto e nutrição). A barreira hematoencefálica limita
Karolinska, Suécia, a primeira MDC aplicada em a difusão para o tecido encefálico de diversas
seres humanos, através do estudo de monoaminas substâncias presentes no sangue, e a MDC tem
em gânglios basais em paciente com doença de contribuído significativamente para o entendimento
Parkinson, em 1987; e o primeiro estudo utilizando do seu funcionamento, incluindo captação e efluxo
esta técnica em paciente com HSA data de 1992 . 52
de antibióticos, citocinas e agentes quimioterápicos.
Persson e Hillered introduziram neste mesmo ano Os principais metabólitos mensurados e captados
a MDC para estudos das lesões no TCE grave . O 53
por esta técnica até o momento são o glutamato,
funcionamento deste sistema consiste em mensurar glicerol, lactato e piruvato, cada um possuindo
metabólitos em áreas de lesão cerebral, através particularidades. Outros metabólitos coletados para
da introdução no espaço intersticial de probes estudos e pesquisas são a uréia e enolase.
perfundidos com solução dialítica.
Glutamato: é um neurotransmissor excitatório,
O hardware dos dispositivos atuais é composto podendo estar presente em concentração aumentada
por uma microbomba (como 106MD Pump, M Dialysis no fluido intersticial em casos de hiperexcitação
Inc, Estocolmo, Suécia) que perfunde o probe cerebral, sobretudo crises convulsivas e status
dialítico duplo lúmen inserido em área de interesse epileticus não convulsivo (crises epilépticas
no parênquima intracraniano com líquido dialisato à subclínicas), isto porque a hiperexcitação neuronal
velocidade de 0,3 mcl/min por 10 mm de membrana. libera estes aminoácidos em excesso na fenda
O líquido utilizado consta de solução salina 0,9% ou sináptica. O glutamato também é encontrado em
líquor aritificial, com mesma densidade e ph, porém excesso nas áreas de penumbra de contusões
sem conteúdo proteico ou glicolítico, o que facilita cerebrais, protagonizando importante efeito na
a difusão passiva das moléculas para o interior do fisiopatogenia destas lesões. Este aminoácido liga-
liquido dialisato no probe, sendo então este aspirado se ao seu receptor na membrana celular glioneural,
através de uma via externa craniana, coletado favorecendo a entrada de Ca2+ (em excesso, nestes
e submetido a análise em aparelho analisador a casos) , culminando no efeito final que é a iniciação
cada hora. O tamanho das moléculas coletadas da cascata de apoptose celular.
no fluido dialisato depende do diâmetro dos poros
Glicerol: este metabólito, quando encontrado
na ponta do probe. Os comercialmente disponíveis
no contexto da microdiálise cerebral, representa
atualmente possuem diâmetros de 20-KD e 100-KD,
morte celular e fragmentação de suas membranas,
embora estes sejam mais específicos para coleta
levando à liberação de diversos lipídios, onde o
de citocinas para estudos, grandes proteínas e
glicerol é detectado no fluido intersticial. Importante
substâncias inflamatórias.
destacar que o glicerol pode estar elevado em casos
Estudada há anos para estudos quantitativos de quebra da barreira hematoencefálica, e em
de substâncias cerebrais, sobretudo concentrações qualquer condição subjacente, este metabólito pode
de neurotransmissores, drogas e proteínas; o intuito levar até 24h para demonstrar elevação na MDC.
desta modalidade é o diagnóstico, monitorização
Lactato e piruvato: a glicose é submetida a
e consequente intervenção neurocrítica visando a
glicólise no citosol celular e convertido em piruvato,
lesão secundária do tecido nervoso e os possíveis
rendendo 2 moléculas de ATP. Em condições
meios de evitar a sua progressão52. As intervenções
normais, o piruvato é convertido em acetil-Coenzima
terapêuticas passíveis de serem avaliadas pela MDC
A através da piruvato desidrogenase. Já no interior
Capítulo 50 696
Figura 6: TC pós-operatória demonstrando probe de MDC inserido em área perilesional.
Fonte: modificado de Ungerstedt et al.,201253.
Capítulo 50 697
da mitocôndria, a acetilCoA entra no ciclo do ácido
REFERÊNCIAS
cítrico, um processo aeróbio, liberando mais 36 1. Sonig A, Jumah F, Raju B, Patel NV, Gupta G, Nanda A.
ATP. Em condições anaeróbias, a enzima lactato The Historical Evolution of Intracranial Pressure Monitoring.
World Neurosurg. 2020;138:491-497.
desidrogenase converte piruvato em lactato,
processo este que gera apenas 2 ATP para cada 2. Koizumi MS. MONITORIZAÇÂO DA PRESSÃO
INTRACRANIANA. Revista da Escola de Enfermagem da
molécula de glicose metabolizada. Aumento nos USP. 1981;15(2):147-154.
níveis de lactato e redução nos níveis de piruvato 3. Moraes FM, Silva GS. Noninvasive intracranial pressure
são demostrados em casos de hipóxia tecidual, e monitoring methods: a critical review. Arq Neuropsiquiatr.
2021;79(5):437-446.
podem ser captados na MDC. Aumentos nos níveis
4. Harary M, Dolmans RGF, Gormley WB. Intracranial
de lactato associados a níveis normais de piruvato Pressure Monitoring-Review and Avenues for Development.
podem ser vistos em casos de hiperglicólise. A Sensors (Basel). 2018;18(2):465.
medida de melhor valor prognóstico na MDC é a 5. Lavinio A, Menon DK. Intracranial pressure: why we
monitor it, how to monitor it, what to do with the number and
relação lactato/piruvato (L/P), que em condições
what’s the future? Curr Opin Anaesthesiol. 2011;24(2):117-
habituais não ultrapassa o valor de 20. L/P> 25 é 123.
patológico. 6. Tavakoli S, Peitz G, Ares W, Hafeez S, Grandhi
R. Complications of invasive intracranial pressure
A relação aumentada L/P sobrevém dois tipos; monitoring devices in neurocritical care. Neurosurg Focus.
2017;43(5):E6.
• tipo 1: isquêmico. Aumento no lactato e re- 7. Giugno KM, Maia TR, Kunrath CL, Bizzi JJ. Tratamento
dução no piruvato; e da hipertensão intracraniana. Jornal de Pediatria.
2003;79(4):287-296.
• tipo 2: não-isquêmico. Redução primária 8. Scheeren TWL, Kuizenga MH, Maurer H, Struys
nos níveis de piruvato. MMRF, Heringlake M. Electroencephalography and Brain
Oxygenation Monitoring in the Perioperative Period. Anesth
Analg. 2019;128(2):265-277.
9. Le Roux P, Menon DK, Citerio G, et al. Consensus
summary statement of the International Multidisciplinary
Consensus Conference on Multimodality Monitoring in
Neurocritical Care : a statement for healthcare professionals
from the Neurocritical Care Society and the European
Society of Intensive Care Medicine. Intensive Care Med.
2014;40(9):1189-1209.
10. Dhawan V, DeGeorgia M. Neurointensive care
biophysiological monitoring. J Neurointerv Surg.
2012;4(6):407-413.
11. Al-Mufti F, Lander M, Smith B, et al. Multimodality
Monitoring in Neurocritical Care: Decision-Making Utilizing
Direct And Indirect Surrogate Markers. J Intensive Care
Med. 2019;34(6):449-463.
12. Yang MT. Multimodal neurocritical monitoring.
Biomedical Journal (Elsevier). 2020;43:226-230.
13. Rivera Lara L, Püttgen HA. Multimodality Monitoring
in the Neurocritical Care Unit. Continuum (Minneap Minn).
2018;24(6):1776-1788.
14. Brain Trauma Foundation; American Association of
Neurological Surgeons; Congress of Neurological Surgeons;
Figura 9: Metabolismo glicolítico celular.
et al. Guidelines for the management of severe traumatic
Fonte: baseado em Hutchinson et al., 201548. brain injury. VIII. Intracranial pressure thresholds. J
Neurotrauma. 2007;24(1):S55-8.
15. Haddad SH, Arabi YM. Critical care management of
severe traumatic brain injury in adults. Scand J Trauma
Resusc Emerg Med. 2012;20:12.
Capítulo 50 698
16. Silva ER, Gardenghi G. Ventilação mecânica em 32. McGuire G, Crossley D, Richards J, Wong D. Effects
pacientes neurocríticos. Revista Eletrônica Saúde e of varying levels of positive end-expiratory pressure on
Ciencia. 2021. intracranial pressure and cerebral perfusion pressure. Crit
Care Med. 1997;25(6):1059-1062.
17. Gentile JKA, Himuro HS, Rojas SSO, Veiga VC,
Amaya LEC, Carvalho JC. Condutas no paciente com 33. Silva TH da, Massetti T, Silva TD da, et al. Influence of
trauma crânioencefálico. Rev da Soc Bras Clínica Médica. severity of traumatic brain injury at hospital admission on
2011;9(1):74–82. clinical outcomes. Fisioter e Pesqui. 2018;25(1):3–8.
18. Silva CHR da, Pereira SM, Brochado VM. Ventilação 34. Cinotti R, Bouras M, Roquilly A, Asehnoune K.
mecânica em neurocirurgia. Rev Médica Minas Gerais. Management and weaning from mechanical ventilation in
2014;24(8):33–42. neurologic patients. Ann Transl Med. 2018;6(19):381.
19. Oliveira-abreu M, Almeida L De. Manuseio da ventilação 35. Asehnoune K, Seguin P, Lasocki S et al. Extubation
mecânica no trauma cranioencefálico : hiperventilação e success prediction in a multicentric cohort of patients with
pressão positiva expiratória final. Rev Bras Ter Intensiva. severe brain injury. Anesthesiology. 2017;127(2):338-346.
2009;21(1):72–79.
36. Dos Reis HFC, Gomes-Neto M, Almeida MLO et
20. Stocchetti N, Maas AI, Chieregato A, van der Plas al. Development of a risk score to predict extubation
AA. Hyperventilation in head injury: a review. Chest. failure in patients with traumatic brain injury. J Crit Care.
2005;127(5):1812- 1827. 2017;42:218-222.
21. Chesnut RM, Marshall LF, Klauber MR, et al. The role of 37. Hyde GA, Savage SA, Zarzaur BL et al. Early
secondary brain injury in determining outcome from severe tracheostomy in trauma patients saves time and money.
head injury. J Trauma. 1993;34(2):216-222. Injury. 2015;46(1):110-114.
22. Barbas CSV, Ísola AM, Farias AMC, et al. 38. Alali AS, Scales DC, Fowler RA et al. Tracheostomy
Recomendações brasileiras de ventilação mecânica 2013. timing in traumatic brain injury: A propensity-matched cohort
Parte I. Rev. Bras. Ter. Intensiva. 2014;26(2):89-121. study. J Trauma Acute Care Surg. 2014;76(1):70-76.
23. Jaskulka R, Weinstabl C, Schedl R. The course of 39. Alcântara TFDL, Marques IR. Avanços na monitorização
intracranial pressure during respiratory weaning after severe neurológica intensiva: implicações para a enfermagem.
craniocerebral trauma. Unfallchirurg. 1993;96(3):138-141. Revista Brasileira de Enfermagem, 62(6):894–900.
24. Curley G, Kavanagh BP, Laffey JG. Hypocapnia and 40. Neto AM. MONITORIZAÇÃO EM
the injured brain: more harm than benefit. Crit Care Med. NEUROINTENSIVISMO. Sociedade Brasileira de
2010;38(5):1348-1359. Neurorradiologia Diagnóstica e Terapêutica. 2021.
Disponivel em: https://sbnr.org.br/monitorizacao-em-
25. Marion DW, Puccio A, Wisniewski SR, et al. Effect
neurointensivismo/.
of hyperventilation on extracellular concentrations of
glutamate, lactate, pyruvate, and local cerebral blood flow 41. Prado CD, Rodrigues AC, Magalhães CD et al.
in patients with severe traumatic brain injury. Crit Care Med. Hipotermia neuroprotetora tardia. Rev Soc Bras Clin Med.
2002;30(12):2619-2625. 2017;15(2)120-123.
26. Pelosi P, Ferguson ND, Frutos-Vivar F, et al. 42. Gomes PJSB. Hipotermia terapêutica no doente
Management and outcome of mechanically ventilated neurológico agudo. [Mestrado]. Instituto de Ciências
neurologic patients. Crit Care Med. 2011;39(6):1482-1492. Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto; 2016.
27. Bellomo R, Bailey M, Eastwood GM, et al. Arterial 43. Corrêa LVO, Silveira RS, Mancia JR, et al. Hipotermia
hyperoxia and in-hospital mortality after resuscitation from terapêutica: efeitos adversos, complicações e cuidados de
cardiac arrest. Crit Care. 2011;15(2):R90. enfermagem. Enferm Foco. 2018;9(4):55-59.
28. Mascia L, Majorano M. Mechanical ventilation for 44. Stiefel MF, Spiotta A, Gracias VH, et al. Reduced
patients with acute brain injury. Curr Opin Crit Care. mortality rate in patients with severe traumatic brain injury
2000;6(1):52-56. treated with brain tissue oxygen monitoring. J Neurosurg.
2005;103(5):805-811.
29. Dutton RP, McCunn M. Traumatic brain injury. Curr Opin
Crit Care. 2003;9(6):503-509. 45. Imberti R, Bellinzona G, Langer M. Cerebral tissue PO2
and SjvO2 changes during moderate hyperventilation in
30. Caricato A, Conti G, Della Corte F, et al. Effects of PEEP
patients with severe traumatic brain injury. J Neurosurg.
on the intracranial system of patients with head injury and
2002;96(1):97-102.
subarachnoid hemorrhage: the role of respiratory system
compliance. J Trauma. 2005;58(3):571-576. 46. Jakobsen M, Enevoldsen E. Retrograde catheterization
of the right internal jugular vein for serial measurements
31. Videtta W, Villarejo F, Cohen M, et al. Effects of
of cerebral venous oxygen content. J Cereb Blood Flow
positive end-expiratory pressure on intracranial pressure
Metab. 1989;9(5):717-720.
and cerebral perfusion pressure. Acta Neurochir Suppl.
2002;81:93-97. 47. Bratton Sl, Chestnut RM, Ghajar J, et al. X. Brain
Oxygen Monitoring and Thresholds. Journal of
Neurotrauma. 2007;24(1):65-70.
Capítulo 50 699
48. Hutchinson PJ, Jalloh I, Helmy A, et al. Consensus 52. Person L, Hillered L. Chemical monitoring of
statement from the 2014 International Microdialysis Forum. neurosurgical intensive care patients using intracerebral
Intensive Care Med. 2015;41(9):1517–1528. microdialysis. J Neurosurg. 1992;76(1):72-80.
49. Poulsen FR, Schulz M, Jacobsen A, et al. Bedside 53. Ungerstedt U, Pycock C. Functional correlates of
evaluation of cerebral energy metabolism in severe dopamine neurotransmission. Bull Schweiz Akad Med Wiss.
community-acquired bacterial meningitis. Neurocrit Care. 1974;30:44.
2015;22(2):221–228.
54. Sánchez Guerrero A. High-resolution microdialysis to
50. Bartek Jr J, Thelin EP, Ghatan PH, Glimaker M, detect metabolic dysfunction after traumatic brain injury.
Bellander BM. Neuron-specific enolase is correlated to [Tese Doutorado da Universitat Autònoma de Barcelona.
compromised cerebral metabolism in patients suffering from Departamento de Medicina]. 2017. Disponível em: http://hdl.
acute bacterial meningitis: an observational cohort study. handle.net/10803/402271
PLoS One. 2016;11(3):e0152268.
51. Phang I, Zoumprouli A, Papadopoulos MC, Saadoun S.
Microdialysis to optimize cord perfusion and drug delivery in
spinal cord injury. Ann Neurol. 2016;80(4):522–531.
Capítulo 50 700
CAPÍTULO 51
HIPERTENSÃO INTRACRANIANA
Capítulo 51 701
isquêmica (>20 ml/100g/min) e até morte neuronal
(<10 ml/100g/min). Da mesma maneira, valores altos
de PPC (>150 mmHg) podem passar a capacidade
de compensação do FSC, gerando hiperemia com
edema cerebral e encefalopatia hipertensiva4.
Capítulo 51 702
Figura 2: Diagrama representativo da Doutrina de Monro-Kellie.
Fonte: Adaptado de Guerra et al., 19997.
diferentes causas: edema do parênquima encefálico, • cefaleia (clássico: pior no período matuti-
aumento do compartimento liquórico (hidrocefalias e no, com melhora ao longo do dia);
higromas), ou do compartimento vascular (swelling
e hiperemia) e surgimento de novos componentes • vômitos: podem ou não ser em jato (prece-
dido por náuseas);
(tumores e hematomas).
Capítulo 51 703
descerebração); e estímulo sensorial (visual, auditivo ou elé-
trico) ou motor. No neurointensivismo, o
• alterações cardiorrespiratórias (clássico: PE permite a avaliação da integridade das
tríade de Cushing – hipertensão arterial, estruturas que compõem uma dada via
bradicardia, irregularidade do ritmo respi- neuronal. Ausência de potencial evocado
ratório), podendo haver hipotensão arterial somatossensitivo (PESS) pode indicar le-
e arritmias cardíacas. são cervical alta ou na transição craniocer-
vical, justificando a falta de resposta aos
estímulos periféricos. A avaliação conjunta
DIAGNÓSTICO DA HIC de PE auditivo e PESS é de extrema utili-
dade no paciente em coma, pois apresen-
O suprimento de oxigênio abaixo da demanda
ta implicação prognóstica. Por exemplo,
leva a alteração da função neurológica. Uma vez
se ambos estão ausentes, a morte ence-
que esta alteração funcional ocorre antes da perda fálica é muito provável. É importante res-
da integridade celular, ela sinaliza precocemente saltar que o coma barbitúrico não leva ao
uma oferta inadequada de oxigênio, permitindo uma desaparecimento do PE auditivo nem das
intervenção em tempo hábil. latências do PESS, mesmo na ausência
de atividade cortical ao EEG10.
Podemos monitorizar a função neurológica
das seguintes formas:
Monitorização não invasiva da PIC
a. exame neurológico: não requer grandes Não substitui a monitorização invasiva, mas
recursos técnicos e pode ser repetido serve como ferramenta complementar e ajuda a
de forma liberal; deve ser direcionado decidir se há necessidade de monitorização invasiva.
(nível de consciência, reflexos de tronco,
repostas motoras e verbal). No entanto, no Tomografia computadorizada (TC) do crânio:
ambiente de terapia intensiva, encontra-se Permite avaliação de achados específicos que
bastante limitado, dadas as condições clí- asseguram o diagnóstico de HIC, tais como: desvio
nicas dos pacientes e a capacitação hete- de estruturas da linha mediana, edema cerebral,
rogênea dos profissionais;
hidrocefalia, compressão das cisternas da base e
b. dificultando um exame fidedigno; alteração na diferenciação entre substâncias branca
e cinzenta.
c. eletroencefalograma: com um número va-
riável de canais, registra a atividade elétri- Ressonância magnética (RM) do encéfalo:
ca cortical espontânea. A dependência do mostra em maior detalhe lesões do parênquima
especialista para interpretá-lo é comumen- encefálico que não poderiam ser visualizadas na
te uma limitação. Formas mais acessíveis TC, por exemplo: lesão axonial difusa. O tempo
surgiram recentemente, utilizando a ele- prolongado do exame e a necessidade de posição
troencefalografia quantitativa e facilitando
supina em decúbito zero (que agrava a HIC) limitam
sua interpretação. Permite diagnóstico de
seu uso no ambiente de neurointensivismo.
crise convulsiva subclínica, além de diag-
nóstico precoce de isquemia cerebral em Doppler transcraniano (DTC): as ondas do
paciente em coma. Também tem grande ultrassom permitem avaliar a velocidade do fluxo
valia na monitorização contínua e trata-
sanguíneo cerebral, através dos vasos sanguíneos
mento do estado de mal epiléptico, além
cerebrais mais calibrosos, mais comumente a
do diagnóstico diferencial de movimentos
involuntários no paciente neurocrítico; e artéria cerebral média. As janelas utilizadas são
o osso temporal, a órbita e o forame magno. Em
d. potencial evocado (PE): registro da ativi- cerca de 10 a 15% dos doentes, o espessamento
dade elétrica no SNC deflagrada por um ósseo não permite uma insonação de boa qualidade.
Capítulo 51 704
Basicamente, o princípio do exame consiste na
reflexão, pelas células do sangue em movimento,
das ondas de ultrassom em direção ao sensor com
velocidade e frequência diferentes das iniciais. Essa
mudança de direção e frequência se dá pelo efeito
doppler e dependem da direção e velocidade do
fluxo sanguíneo.
Capítulo 51 705
nal* (Nível II) ou de líquor e os dispositivos que detectam parâmetros
como pressão parcial tecidual de oxigênio (PtiO2) e
• TC crânio normal (Marshall I), porém com
fluxo sanguíneo cerebral15.
dois ou mais dos seguintes fatores para
risco de HIC (Nível III): Os cateteres subdural e epidural são úteis
em situações específicas (pacientes com distúrbios
I. idade cima de 40 anos
de coagulação), pois são menos suscetíveis a
II. hipotensão arterial (PA < 90 x 60 provocar hemorragia ou infecção. No entanto, não
mmHg)
permitem a drenagem de líquor, têm menor acurácia
III.
postura em decorticação ou e a qualidade da curva de onda da PIC não é
descerebração ao exame motor satisfatória9.
(uni ou bilateral)
* hematomas, contusões,
compressão de cisternas Ondas da PIC
basais, herniação ou edema A onda da PIC tem três picos consecutivos
sobrepostos (P1, P2 e P3) relacionados com o ciclo
Esses critérios são extrapolados para lesões
cardíaco (Figura 5) .
cerebrais não traumáticas graves em pacientes
comatosos (ECG la ≤ 8) como acidentes vasculares A onda P1 (onda de percussão) representa
cerebrais; pós-operatório de ressecção de “lesões” a chegada de sangue arterial no compartimento
intracranianas (hematomas, tumores) em pacientes intracraniano ou o pulso arterial sistólico; costuma
que permanecerão sedados e no manejo de doenças ser a mais alta das ondas.
sistêmicas com comprometimento do nível de
A P2 (tidal wave) reflete o estado de elastância
consciência, como insuficiência hepática fulminante
intracraniana.
associada a encefalopatia grau III ou IV1.
O significado de P3 (onda dicrótica) é
desconhecido. Início da fase diastólica cardíaca,
casos de edema cerebral extenso é desafiadora. que estão além do escopo deste capítulo, como:
Além disso, esse tipo de monitorização implica maior pressão parcial de oxigênio no tecido cerebral (PtiO2),
Capítulo 51 706
Figura 4: Tipos de dispositivos para monitorização da PIC.
Fonte: Adaptado de Kukreti et al., 201418.
Figura 6: Onda de PIC em situação de HIC (P2>P1), elastância aumentada (complacência diminuída).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 51 707
CONDUTA “Degraus” no tratamento da hipertensão
intracraniana
Objetivos
A hipertensão intracraniana tem sido
PIC mais estudada no contexto do traumatismo
cranioencefálico. É nele que se baseiam grande
Classicamente se recomenda tratar pacientes
parte das condutas e as indicações da monitorização
com PIC>20 mmHg6,19,20 pela maior mortalidade em
da PIC. Nos últimos anos, o tratamento da
pacientes com níveis de PIC acima desse (nível
hipertensão intracraniana tem sido feito de acordo
II de recomendação).Atualmente o limiar de PIC
com um modelo de “degraus”, ou seja, por níveis de
considerado é 22 mmHg21. Sabe-se, entretanto,
terapia. Esse modelo varia de acordo com o serviço.
que pode haver herniação com níveis de PIC
O modelo adotado na UTI do Hospital das Clínicas
abaixo de 20 mmHg. Portanto, além de valores da
da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP),
PIC, a decisão sobre o tratamento deve levar em
baseia-se em publicação no New England Journal
conta critérios clínicos e tomográficos (nível III de
of Medicine19.
recomendação)1,6.
Medidas gerais
PPC
Medidas universais devem ser tomadas no
O alvo recomendado de valor da PPC que
manejo de um paciente com suspeita/diagnóstico de
implica maior sobrevida e melhor desfecho é entre
hipertensão intracraniana5:
60 e 70 mmHg. Porém, esse valor ainda não está
claro, principalmente em casos em que há alteração 1. elevar a cabeceira 30 a 45 graus,
da autorregulação1,20,21. mantendo a cabeça sem rotação para
evitar diminuição do retorno venoso por
estase jugular;
Tratamento da PIC baseado na etiologia
Após estabilização clínica do paciente 2. suporte ventilatório adequado;
com suspeita de HIC (ABCDE), o primeiro passo
3. evitar hipotensão (PAS <90 mmHg) bem
no tratamento é identificar possíveis sinais de
como hipertensão arterial; e
herniação através do exame neurológico e diante
disso tomar condutas imediatas para redução da PIC 4. corrigir distúrbios metabólicos e eletrolíticos
(intubação, elevação do decúbito, hiperventilação e (temperatura, sódio e glicemia) além de
evitar fluidos hipotônicos que possam
administração fluídos hiperosmolares). Em seguida,
agravar o edema cerebral.
realiza-se o exame de neuroimagem para auxiliar na
definição da etiologia e eventualmente diagnosticar
lesões eminentemente cirúrgicas; nestes casos, a
Tratamento cirúrgico
cirurgia é indispensável para o controle hipertensão
intracraniana. Concomitantemente à realização da Após realização das medidas iniciais, seguida
imagem, deve-se otimizar condições metabólicas e de intubação e sedação, se necessário, aqueles
ventilatórias que possam piorar o controle da PIC. A pacientes com sinais de herniação podem passar
monitorização invasiva da PIC deve ser considerada para o quarto passo (Figura 9) e receber soluções
(conforme discutido previamente). O quadro a seguir hiperosmolares até realização da TC de crânio.
resume as principais etiologias da HIC com seu Após realização da mesma, as lesões com conduta
respectivo tratamento (Tabela 2) .
19 cirúrgica devem ser prontamente tratadas. Nesse
Capítulo 51 708
Etiologia Tratamento
Causas Intracranianas
Hematoma (Epidural, subdural, intracerebral e Drenagem/craniectomia descompressiva
contusão)
Hidrocefalia Derivação
Crises epilépticas Anticonvulsivantes
Tumores Corticoterapia em doses altas, microcirurgia
Infarto cerebral Craniectomia descompressiva
Edema cerebral Fluidos hiperosmolares, craniectomia
descompressiva
Vasodilatação (inchaço cerebral) Hiperventilação moderada, barbitúricos
Causas Extracranianas
Obstrução de vias aéreas Intubação/crico/traqueo/desobstrução
Hipoxemia Oxigenação e ventilação
Hipercapnia Ventilação
Hipertensão Considerar analgesia/sedação se dor ou anti-
hipertensivos
Distensão abdominal Sonda nasogástrica
Febre Antipiréticos
Hiposmolaridade Fluídos hiperosmolares
Capítulo 51 709
momento é instalado o cateter para monitorização Soluções hiperosmolares
da pressão intracraniana. Naqueles pacientes em
Segunda medida medicamentosa a ser
que haja benefício da drenagem liquórica para
adotada no tratamento da hipertensão intracraniana.
auxílio no tratamento da HIC, a preferência é pelo
Pode ser usada como uma ponte em pacientes com
cateter ventricular.
sinais de herniação até a realização da cirurgia
ou como terapêutica em casos de hipertensão
intracraniana refratária às medidas iniciais:
Medicações
• manitol: 0.25–1 mg/kg em bolus (menos <
De forma didática, podemos dividir o tratamento
20 min), seguido por 0,25 mg/kg IV (mais
medicamentoso da hipertensão intracraniana em 3
de 20 min) a cada 6h, se PIC> 20. Dados
fases: recentes da literatura sugerem que 1,4 mg/
kg de dose inicial é mais efetivo. Se ainda
a. sedação e analgesia;
houver PIC elevada, e a osmolaridade es-
b. soluções hiperosmolares; e tiver < 320 mOsm/L, é possível aumentar
em 1 mg/kg a dose do manitol e encurtar o
c. supressão metabólica (barbitúricos) intervalo das doses; e
• sufentanil: 10 a 30 mcg dose teste, segui- de novas lesões potencialmente cirúrgicas. A partir
do 0,05 a 2 mcg/kg/hr IV contínuo; do resultado negativo da imagem é possível entrar
na terceira fase do tratamento medicamentoso para
• midazolam: 2 mg dose-teste, seguido 2 a manejo da HIC, que é a supressão metabólica com
4 mg/h IV contínuo;
barbitúricos. Importante realizar EEG para exclusão
• propofol contínuo: 0,5 mg/kg dose teste, de estado de mal não convulsivo.
seguido 20 a 75 mcg/kg/min IV contínuo. A suspensão do barbitúrico deve ser efetuada
Evite altas doses de propofol (não exceder
lentamente (quatro a cinco dias), após observada a
83 mcg/kg/min);
normalização da PIC.
• succinilcolina 100 mg: diluir para 5 ml. 1,5
• pentobarbital: 3 a 5 mg/Kg IV em bolus.
mg/kg IV; e
Essa dose pode ser repetida após 15 min.
• rocurônio 50 mg/5ml: 0,6 mg/kg, seguido Manutenção é de 100 a 200 mg/hora;
de 0,2 mg/kg IV.
Capítulo 51 710
• tiopental: bolus de 2 a 4 mg/kg e infusão 3 4. Hora EC, Aguiar AFM, Sousa RM. O paciente com
a 6 mg/kg/h. hipertensão intracraniana na UTI. In: Padilha KG,
Fernandes MF, Vattimo, Silva SCd, Kimura M, Watanabe
Em relação aos corticosteroides, estes M, eds. Enfermagem em UTI: cuidando do paciente crítico.
Barueri: Manole; 2016. p. 443-467.
somente têm indicação para redução de HIC em
5. Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery. New York:
casos de abscessos e neoplasias encefálicas Thieme; 2016.
associados a edema vasogênico 22. 6. Balzi A, FS M. Neurointensivismo e Pediatria. In: Siqueira
M, ed. Tratado de Neurocirurgia. Barueri: Manole; 2016. p.
2171-2179.
ATUALIZAÇÕES NO TRATAMENTO DA HIC 7. Guerra SD. Traumatismo cranioencefálico em pediatria. J
Pediatr. 1999;75(2):s279-s93.
Os limiares recomendados de PIC ( PIC
8. FS M, EK F. Edema Encefálico em Lesão Encefálica
> 22 mmHg) e PPC ( entre 60 e 70 mmHg) foram Aguda. In: Siqueira M, ed. Tratado de Neurocirurgia.
revisados20,21. Barueri: Manole; 2016. p. 2141-2149.
9. Tavares WM, Amorim RLO, Paiva WS, Andrade AF.
Pacientes com PAS < 110 mmHg devem ser Hipertensão Intracraniana. In: Andrade AF, Figueiredo EG,
considerados hipotensos20,21. Teixeira MJ, Taricco MA, Amorim RLO, Paiva WS, eds.
Neurotraumatologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
Hipotermia profilática não é uma estratégia 2015. p. 30-37.
neuroprotetora primária23. 10. AC S, FS M. Monitorização Neurológica Multimodal. In:
Siqueira M, ed. Tratado de Neurocirurgia. Barueri: Manole;
Há evidências insuficientes em termos de 2016. p. 2111-2117.
desfechos clínicos que favoreçam o uso de qualquer 11. Abraham M, Singhal V. Intracranial pressure monitoring.
agente hiperosmolar específico21. J Neuroanaesthesiol Crit Care. 2015;2:193-203.
12. Bellner J, Romner B, Reinstrup P, Kristiansson KA,
Embora a hipotermia terapêutica reduza a Ryding E, Brandt L. Transcranial Doppler sonography
PIC, ela parece não melhorar o desfecho a longo pulsatility index (PI) reflects intracranial pressure (ICP).
Surg Neurol. 2004;62(1):45-51.
prazo24,25.
13. Nag DS, Sahu S, Swain A, Kant S. Intracranial pressure
Exceto hemorragia intracraniana espontânea, monitoring: Gold standard and recent innovations. World J
Clin Cases. 2019;7(13):1535-53.
dados recentes encorajadores têm apontado
14. Wakerley BR, Kusuma Y, Yeo LL, et al. Usefulness
efeito positivo da cirurgia precoce, em termos of transcranial Doppler-derived cerebral hemodynamic
de mortalidade, nos pacientes com hemorragia parameters in the noninvasive assessment of intracranial
pressure. J Neuroimaging. 2015;25(1):111-116.
intracerebral traumática26,27.
15. Schizodimos T, Soulountsi V, Iasonidou C, Kapravelos
No estudo RESCUEicp a craniectomia N. An overview of management of intracranial hypertension
descompressiva para HIC refratária ao tratamento in the intensive care unit. J Anesth. 2020;34(5):741-57.
convencional reduziu mortalidade mas não melhorou 16. Rajajee V, Vanaman M, Fletcher JJ, Jacobs TL. Optic
nerve ultrasound for the detection of raised intracranial
o desfecho funcional em pacientes com TCE28. pressure. Neurocrit Care. 2011;15(3):506-515.
17. Dubourg J, Javouhey E, Geeraerts T, Messerer
M, Kassai B. Ultrasonography of optic nerve sheath
REFERÊNCIAS diameter for detection of raised intracranial pressure: a
systematic review and meta-analysis. Intensive Care Med.
1. Bullock MR, Chesnut RM, Clifton GL, et al. Guidelines
2011;37(7):1059-1068.
for the management of severe traumatic brain injury. Brain
Trauma Foundation. J Neurotrauma. 2000;17:449-554. 18. Kukreti V, Mohseni-Bod H, Drake J. Management of
raised intracranial pressure in children with traumatic brain
2. Jantzen JP. Prevention and treatment of intracranial
injury. J Pediatr Neurosci. 2014;9(3):207-215.
hypertension. Best Pract Res Clin Anaesthesiol.
2007;21(4):517-538. 19. Stocchetti N, Maas AI. Traumatic intracranial
hypertension. N Engl J Med. 2014;371(10):972.
3. Go KG. The normal and pathological physiology of brain
water. Adv Tech Stand Neurosurg. 1997;23:47-142. 20. Foundation BT, Surgeons AAoN, Surgeons CoN.
Guidelines for the management of severe traumatic brain
injury. J Neurotrauma. 2007;24(1):S1-106.
Capítulo 51 711
21. Carney N, Totten AM, O’Reilly C, et al. Guidelines for 26. Mendelow AD, Gregson BA, Rowan EN, et al.
the Management of Severe Traumatic Brain Injury, Fourth Early Surgery versus Initial Conservative Treatment
Edition. Neurosurgery. 2017;80(1):6-15. in Patients with Traumatic Intracerebral Hemorrhage
(STITCH[Trauma]): The First Randomized Trial. J
22. Sadoughi A, Rybinnik I, Cohen R. Measurement and
Neurotrauma. 2015;32(17):1312-23.
Management of Increased Intracranial Pressure. Open Crit
Care Med J. 2013;6:56-65. 27. Mendelow AD, Gregson BA, Rowan EN, et al. Early
surgery versus initial conservative treatment in patients with
23. Cooper DJ, Nichol AD, Bailey M, et al. Effect of Early
spontaneous supratentorial lobar intracerebral haematomas
Sustained Prophylactic Hypothermia on Neurologic
(STICH II): a randomised trial. Lancet. 2013;382(9890):397-
Outcomes Among Patients With Severe Traumatic Brain
408.
Injury: The POLAR Randomized Clinical Trial. JAMA.
2018;320(21):2211-2220. 28. Hutchinson PJ, Kolias AG, Timofeev IS, et al. Trial of
Decompressive Craniectomy for Traumatic Intracranial
24. Andrews PJ, Sinclair HL, Rodriguez A, et al.
Hypertension. N Engl J Med. 2016;375(12):1119-1130.
Hypothermia for Intracranial Hypertension after Traumatic
Brain Injury. N Engl J Med. 2015;373(25):2403-2412.
25. Flynn LM, Rhodes J, Andrews PJ. Therapeutic
Hypothermia Reduces Intracranial Pressure and Partial
Brain Oxygen Tension in Patients with Severe Traumatic
Brain Injury: Preliminary Data from the Eurotherm 3235
Trial. Ther Hypothermia Temp Manag. 2015;5(3):143-51.
Capítulo 51 712
CAPÍTULO 52
TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO
Capítulo 52 713
fratura da região mastoidea), fístulas liquóricas (oto Variáveis Escore
e rinoliquorreia) e hemotímpano4. Espontânea 4
Resposta
Examinar o couro cabeludo em busca de ocular Ao estímulo verbal 3
Ao estímulo doloroso 2
lacerações e sinais de fratura, como desníveis
Ausente 1
ósseos, exposição de massa encefálica e grandes
Orientado 5
hematomas subgaleais, também é fundamental. Resposta Confuso 4
Lacerações com hemorragias de couro cabeludo verbal
Palavras inapropriadas 3
sem fraturas evidentes, se negligenciadas, podem Sons incompreensíveis 2
levar a um quadro de perda sanguínea expressivo. Ausente 1
Além disso, auxiliar na graduação da gravidade Obedece a comando 6
do TCE, pois traumas com fratura exposta e Localiza estímulo doloroso 5
Resposta
desnivelamento do crânio apresentam maior grau de motora Retirada ao estímulo doloroso 4
mortalidade. Excluídas lesões em outros sistemas Decorticação (flexão anormal) 3
Capítulo 52 714
sintomas persistirem ou se o raio-X de crânio sugerir Classificação Definição
fratura8.
I Sem alteração visível
Capítulo 52 715
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO MECANISMO DE TRAUMA
Capítulo 52 716
Figura 2: Cortes coronais de TC de crânio evidenciando fratura de osso frontal à direita de teto da órbita direita.
Fonte: Arquivo pessoal Dr. Robson Amorim.
Capítulo 52 717
nas lâminas da cápsula organizada pela rica consciência, por vezes, progredindo rapidamente
vascularização, ou seja, quando há dúvida para o coma, hemiparesia contralateral e
diagnóstica, este artifício deve ser utilizado. O que dilatação pupilar ipsilateral. Consiste em causa de
se vê na TC é um realce periférico sendo mantido o hipertensão intracraniana rapidamente progressiva,
centro hipoatenuante. lesão neurológica por isquemia cerebral global e
síndromes de herniação cerebral. Esta situação
é de grande urgência e, se diâmetro superior 1
cm, tem indicação cirúrgica imediata, pois a lesão
neurológica é proporcional ao tempo de isquemia
cerebral pela presença do hematoma ocupando
espaço no compartimento intracraniano. Há uma
relação inversa do bom prognóstico com o tempo
que se leva para estes pacientes serem levados à
cirurgia.
Capítulo 52 718
Figura 4: A e B. Cortes axiais de TC de Crânio
evidenciando HED lesões hiperatenuantes biconvexas.
Observe que a localização do hematoma tanto na primeira
quanto na segunda imagem favorece a interpretação
de lesão da artéria meníngea média. C. Representação
esquemática de HED frontal. HED: Hematoma epidural.
Fonte: Imagens radiológicas. Arquivo pessoal Dr Robson
Amorim. Imagem esquemática: autoria. Bruna Dutra.
Contusão cerebral
As contusões cerebrais são as lesões
parenquimatosas mais comuns nos traumatismos
cranioencefálicos. São produtos do choque do
tecido cerebral contra proeminências cranianas
internas durante os movimentos inerciais de Figura 5: A, B, C. Cortes axiais de TC de crânio
evidenciando contusão cerebral temporal E, caracterizada
aceleração e desaceleração. São mais frequentes por áreas de hiperatenuação, caracterizando a
na base e no polo dos lobos (frontal e temporal) hemorragia, rodeadas de parênquima e áreas de
hipoatenuação, caracterizando o edema secundário. D.
pela presença de irregularidade de seu assoalho. Representação esquemática da contusão cerebral.
No entanto, podem acometer qualquer região
Fonte: Imagens radiológicas. Arquivo pessoal Dr Robson
que esteja diametralmente oposta ao local do Amorim. Imagem esquemática: autoria, Bruna Dutra.
traumatismo direto no crânio. Tem componente de
hemorragia, necrose, isquemia e edema. O aspecto
Lesão axonial difusa
destas lesões à TC é heterogêneo, com áreas de
hiperdensidade (hemorragia) juntamente com áreas A lesão axonial difusa (LAD) é causada por
pode variar bastante, ou seja, pode haver lesões axônio (Figura 6). Embora esteja presente em algum
com predominância de hipodensidade e outras com grau na maioria dos traumas em que há perda de
em torno da lesão que corresponde ao edema paciente com TCE grave com perda de consciência
perilesional e tende a aumentar com a evolução por mais de 6h (após exclusão de causas isquêmicas
dos dias, contribuindo com o efeito de massa tardio ou expansivas). Por ter um mecanismo de lesão
Capítulo 52 719
Figura 6: A, B, C. Cortes axiais de TC de crânio Figura 7: Cortes axiais de TC de crânio evidenciando FAF.
evidenciando LAD. Note as pequenas áreas A, B. Note os projéteis alojados na junção parieto-occipital
hiperatenuantes, geradas pela hemorragia secundária esquerda, produzindo efeito cavitário, sem transfixação da
ao trauma. São mais frequentes na transição cortiço- linha mediana. C. FAF transfixante, evidenciando ainda o
subcortical, no tronco encefálico e no corpo caloso. efeito de passagem e lesão de estruturas adjacentes.
A. presentes no tronco encefálico e nas seguintes na
transição cortico-subcortical. C. apresentada pelas setas Fonte: Arquivo pessoal Dr Robson Amorim.
azuis, há ainda hemorragia subaracnoidea traumática.
Fonte: Arquivo pessoal Dr Robson Amorim.
Capítulo 52 720
o dreno ventricular externo (DVE) é considerado sulcos e cisternas, que podem corresponder a um
padrão-ouro, não apenas por sua acurácia, mas aumento na PIC.
também servindo de proposta terapêutica através da
drenagem de líquido cerebroespinal. Esse método
permite o monitoramento conforme a pressão no CONDUTA
cateter se equilibra com a pressão intraventricular.
Essa pressão é transmitida para um tubo externo Fratura de crânio
com solução salina, por meio de um transdutor com A fratura de crânio na convexidade sem
manômetro, a partir do qual é feita a medição da desnivelamento de tábua óssea não requer
pressão15. Outros métodos invasivos contam com tratamento cirúrgico. No entanto, podem originar
microtransdutores instalados em diferentes regiões fístula liquórica por lesão de dura-máter subjacente.
cerebrais, todavia são pouco acessíveis. Nesses casos, quando não há solução de
continuidade com o meio externo, geralmente
Já os métodos não-invasivos demonstram,
evoluem para resolução espontânea. Em crianças,
de forma indireta, alterações na PIC, adotados
esse tipo de fratura pode se manifestar como as
geralmente quando não há cateteres disponíveis
chamadas fraturas em crescimento, nas quais, a
para monitoração da PIC de forma invasiva. Alguns
falha óssea é mantida por reabsorção de tecido
exames podem revelar essas alterações, como a
ósseo nas bordas da fratura. Estas necessitam de
tomografia de crânio, evidenciando desvio de linha
tratamento cirúrgico com correção da falha óssea e
média ou apagamento de sulcos e cisternas de base18;
da dura-máter.
Doppler transcraniano, revelando aumento do índice
de pulsatilidade; e ultrassonografia da bainha do As fraturas de crânio com desnivelamento
nervo óptico, evidenciando valores progressivamente de tábua óssea devem ser analisadas mais
elevados. 14
Para entender como funciona o Doppler cuidadosamente. Em fraturas cujo desnivelamento
transcraniano, deve-se considerar que o aumento excede a espessura da tábua óssea ou nos casos
da PIC pode afetar o FSC nos principais vasos de fraturas abertas, a correção cirúrgica é a mais
cerebrais que possuem paredes compatíveis. Esses indicada. Quando o desnivelamento ósseo é
vasos estão sujeitos à pressão externa (PIC) e claramente maior do que a espessura da tábua
interna representada pela pressão arterial (PA). óssea, ou há fragmentos cominutivos no parênquima,
Durante a PIC elevada, pode-se observar mudanças a probabilidade de haver lesão dural é muito grande.
na velocidade do FSC no Doppler transcraniano, Nesta circunstância, associada à lesão de pele
tais como: fluxo sanguíneo cerebral diastólico, onda suprajacente, torna-se caso de urgência e deve ser
de pico e maiores índices de pulsatilidade durante encaminhado para correção cirúrgica em menos de
a PIC alta, mas, também, hipotensão arterial e 6h para evitar infecção secundária. A introdução
hipocapnia 22-25
. As desvantagens estão relacionadas de antibióticos profiláticos é controversa. O intuito
por ser um exame operador-dependente e fornecer deste tratamento é limpeza cirúrgica, remoção
informações pontuais, se não houver um dispositivo de hematomas e corpos estranhos, hemostasia e
acoplado na cabeça que permita aferição contínua. correção na dura-máter e do crânio fraturado19.
A ultrassonografia da bainha do nervo óptico é,
Fratura na base de crânio
também, considerada método não-invasivo de
avaliação da PIC, por meio da mensuração do Raramente é vista com clareza nas
diâmetro da bainha, que encontra-se aumentada nos radiografias simples de crânio. No entanto, a TC de
casos de elevação da PIC. Os métodos baseados crânio com janela óssea tem alta sensibilidade para
em imagem (TC e RM) utilizam como parâmetro o este tipo de fratura. Estas fraturas comumente estão
desvio de estruturas anatômicas ou apagamento de associadas a pneumoencéfalo e/ou fístula liquórica.
Capítulo 52 721
As manifestações clínicas incluem: fístula liquórica Os pneumoencéfalos não hipertensivos devem
nasal ou auricular, hemotímpano, equimoses ser acompanhados com observação neurológica
mastoideas, equimoses periorbitárias (sinal do rigorosa e com TCs seriadas, raramente precisam
guaxinim), lesão do nervo facial ou auditivo, lesão ser abordados cirurgicamente. O pneumoencéfalo
do nervo olfatório por fratura e arrancamento deste hipertensivo é menos comum, geralmente está
na lâmina cribiforme, lesão do nervo óptico no canal associado à fístula liquórica de alto débito e
óptico e lesão do nervo abducente em fraturas que mecanismo de válvula, ou seja, há entrada de
envolvem o clivus. ar e saída de líquor formando um ambiente com
pressão positiva no compartimento intracraniano.
Em geral, a maioria das fraturas de base
Essa condição deve ser considerada de urgência e
de crânio não requer tratamento cirúrgico, mesmo
tratada de forma invasiva com abordagem cirúrgica
quando associadas a fístula liquórica. Devemos
e correção do mecanismo de válvula.
estar atentos pois, na presença de sinais que
indiquem este diagnóstico, a sonda gástrica deve
ser introduzida pela cavidade oral (orogástrica) Hematoma epidural
devido o risco de lesão na base do lobo frontal via Um hematoma epidural maior que 30 cm3 deve
lâmina cribiforme fraturada. Alguns casos não têm ser removido cirurgicamente, independentemente
resolução espontânea e necessitam de outro tipo da pontuação da ECG do paciente. Um HED menor
de tratamento. Há várias opções que são utilizadas que 30 cm3 e com menos de 15 mm de espessura e
em ordem de necessidade, iniciando por punções com menos de 5 mm de desvio da linha média em
lombares diárias repetidas, com o intuito de se pacientes com uma pontuação de ECG maior que
promover um regime de hipotensão liquórica. De 8 sem déficit focal pode ser tratado de forma não
uma forma mais incisiva a derivação lombar externa cirúrgica com TC e observação neurológica rigorosa
pode ser utilizada nos casos que não obtiveram (BTF). A cirurgia consiste em programar a craniotomia
êxito com as punções repetidas. Esta deve ser para que seja suprajacente ao hematoma, retirada
sempre realizada em ambiente asséptico, pois o do hematoma, hemostasia da fonte de sangramento
cateter é inserido no espaço liquórico. A drenagem (óssea, arterial ou venosa) e ancoramento dural na
do líquor deve ser sempre feita para um sistema tábua óssea interna.
estéril e fechado. A drenagem liquórica contínua
pode ocasionar sintomas de hipotensão liquórica, Hematoma subdural agudo
como cefaleia de posição ortostática e sentada. Este Os HSDA laminares (espessura < 0,5 cm)
tipo de cefaleia dificilmente responde a analgésicos, com desvio das estruturas da linha mediana (DLM)
mas melhora com a menor drenagem de líquor, com < 5 mm, volume < 30 cm3 (quando supratentoriais),
elevação da bolsa de drenagem ao nível do ombro. ou 16 cm3 (quando infratentoriais) e cisternas
As fístulas nasais que têm alto débito liquórico, mais basais patentes podem ter conduta conservadora.
frequentemente, necessitam de tratamento cirúrgico. Quando localizados na fossa média ou posterior, em
pacientes com 14 ou 15 pontos na ECG que piorem
Pneumencéfalo clinicamente (queda de dois pontos na ECG) ou TC
Também conhecido como aerocele ou revelando aumento de volume devem ser submetidos
estar associado a cefaleia, convulsões, tontura, de consciência. A craniotomia deve ser ampla para
ou sonolência quando tem caráter hipertensivo. facilitar a remoção do coágulo e controlar pontos de
hemorragia que se aproximem da linha mediana.
Capítulo 52 722
Deve-se sempre considerar a monitoração da PIC dias, com necessidade de serem feitas TCs de
no mesmo ato cirúrgico, pois pode haver inchaço controle (a primeira TC de controle deverá ser feita
cerebral após a reperfusão do hemisfério antes dentro de 24h do trauma, especialmente em doentes
adjacente à lesão. Em alguns casos, procede-se com história de coagulopatia). Por volta do terceiro
a craniectomia descompressiva, que é a remoção ao quinto dia de evolução, geralmente as contusões
do tecido ósseo para permitir a expansão cerebral atingem o pico de edema lesional estabilizando
que por ventura pode ocorrer. Neste contexto, seu efeito de massa. Quando presentes nos lobos
muitos serviços no Brasil utilizam o “índice de temporais, principalmente em seus polos, são de
Zumkeller” para definição se haverá reposição ou maior risco, pois podem desencadear facilmente
não do retalho ósseo. Quando o DLM é superior à a síndrome de herniação uncal. Nesses casos,
espessura do hematoma, pressupõe-se inchaço quando há aumento do volume nos polos temporais,
cerebral associado (“índice de Zumkeller positivo”). o uncus é deslocado medialmente e comprime o
Nestes casos, não há reposição do retalho ósseo mesencéfalo juntamente com o nervo oculomotor (III
(craniectomia descompressiva primária). Ressalta- NC), originando midríase ipsilateral e hemiparesia ou
se que a craniectomia deve sempre ser maior ou mesmo postura em extensão contralateral. Portanto,
igual a 15 cm no diâmetro posterior e maior ou igual contusões temporais são mais frequentemente
a 12 cm na altura, tendo-se o cuidado de realizar a operadas que contusões frontopolares ou
craniotomia no porção mais cranial, 3 cm lateral a occipitais. No entanto, quando atingem volumes
sutura sagital superior .
20
que exerçam efeito expansivo importante, devem
ser encaminhadas para tratamento cirúrgico. A
Hematoma subdural crônico cirurgia consiste em craniotomia e retirada do
O seu tratamento é cirúrgico, pois há risco de hematoma e tecido desvitalizado. As lacerações
aumento de volume e piora neurológica. Consiste corticais são lesões semelhantes às contusões,
em uma ou mais trepanações dirigidas às áreas no entanto, apresentam mecanismo de trauma
de maior volume do hematoma, drenagem de seu diverso. Quando o traumatismo veicula alta energia
conteúdo, que é geralmente de característica transferida ao crânio, há lesão óssea, dural e cortical
“petroleosa”, lavagem intensiva com soro fisiológico, direta. Frequentemente, dão origem a outras lesões
marsupialização da cavidade subdural e colocação como hematomas subdurais por extravasamento
de dreno no espaço subdural por 24 a 72h. A de sangue da laceração. A gravidade é variável,
colocação de dreno no espaço subdural está mas tendem a serem operadas após a admissão
associada a redução do risco de recidiva e deve ser hospitalar quando associadas a fraturas abertas
realizado sempre que possível. Quando demonstra ou HSDA. É comum se observar a realização de
heterogeneidade com imagem que sugiram craniectomias descompressivas após a drenagem
agudizações recentes, isto é, novos sangramentos, do hematoma. Entretanto, esta deve ser reservada
deve-se optar por craniotomia que oferece acesso apenas se a contuão cerebral estiver associada a
mais amplo e permite retirada de todo o coágulo e hematoma subdural e mecanismo de alta energia
das septações. cinética. Em idosos, por exemplo, podem ocorrer
hematomas contusionais devido a quedas de altura,
Contusão cerebral craniotomias pequenas e retirada do hematoma por
Podem comportar-se de forma evolutiva com pequena corticectomia é suficiente21.
aumento do efeito expansivo, por sangramento ou
aumento da área de edema. Por isso os pacientes Lesão penetrante por projétil de arma de
fogo
com contusões cerebrais, quando não operados nas
primeiras horas, devem ser observados por vários Os pacientes sem resposta motora ou
Capítulo 52 723
pupilar na ausência de choque hemodinâmico, presente, em períodos suficientemente prolongados,
muito provavelmente não se beneficiam de uma pode contribuir para piora do prognóstico neurológico
craniotomia. A indicação cirúrgica deve levar em destes pacientes. Há medidas clínicas que podem
conta o estado neurológico, assim como o resultado ser utilizadas para diminuir a PIC temporariamente,
cirúrgico e prognóstico. Como medidas locais, o auxiliando no tratamento destes pacientes, no
sangramento do couro cabeludo deve ser controlado entanto não substituem o tratamento cirúrgico, pois a
com enfaixamento ou rápida sutura, antes mesmo de melhor e mais eficiente forma de tratar a hipertensão
encaminhamento do paciente à unidade radiológica. intracraniana é eliminar a causa primária da mesma.
Como métodos diagnósticos, a radiografia de Isto é verdadeiro quando estamos diante de uma
crânio simples em incidências anteroposterior e lesão passível de ser removida cirurgicamente,
perfil, fornecem a posição espacial do projétil e como hematomas intracranianos ou mesmo lesões
mostram prováveis fraturas e deslocamentos dos tumorais. Entretanto, em muitas situações, não
fragmentos ósseos. A realização de TC de crânio é possível tratar a causa primária, pois não é
é indispensável, pois o trajeto pode ser visibilizado facilmente removível ou é difusamente intrínseca
com clareza, assim como lesões associadas. ao parênquima cerebral. Portanto, o tratamento da
Ocasionalmente, a angiotomografia ou a angiografia hipertensão intracraniana nestes casos, visa a paliar
cerebral é indicada na suspeita de lesão vascular para que se minimize o dano tecidual cerebral ou
direta, em casos de hemorragia aguda ou tardia ou mesmo no período que precede a cirurgia, em casos
se a trajetória do projétil estiver próxima aos grandes de extrema urgência.
vasos intracranianos ou do pescoço.
Os objetivos destas medidas terapêuticas são:
O intuito inicial do tratamento cirúrgico é
• prevenir lesões secundárias ou agrava-
a retirada de tecido desvitalizado, remoção de
mento das lesões já existentes;
hematomas, remoção do projétil quando facilmente
acessível, assim como fragmentos ósseos, • diagnosticar precocemente as alterações
auxiliando o controle da pressão intracraniana. Após que podem causar as lesões secundárias;
a limpeza e hemostasia dos tecidos, é importante que
• o tratamento da PIC acima de 22 mmHg é
se proceda o fechamento dural hermético. Em geral,
recomendado porque valores acima deste
são necessários retalhos de periósteo, isolando a nível estão associados a aumento da mor-
cavidade intradural do meio externo ou dos seios talidade25; e
paranasais. A retirada do projétil nem sempre é
realizada, pois a sua tentativa pode ocasionar lesões • uma combinação de valores da PIC, acha-
dos clínicos e de achados tomográficos
adicionais que frequentemente tomam localizações
pode ser usada para direcionar a condu-
de difícil acesso, ou mesmo diametralmente opostas
ta25.
ao orifício de entrada. Devido o mecanismo grave
destas lesões, pode indicar-se a craniectomia Prevenir e diagnosticar precocemente implica
descompressiva primária além do controle local em em monitorar o paciente, pois as alterações fisiológicas
ambientes onde não há disponibilidade de monitores que podem ser detectadas através da monitoração
Capítulo 52 724
clínica é midazolam com fentanil. Dose de ataque:
MEDIDAS GERAIS
midazolam (IV, 7,5 a 15 mg, 1 a 2 min) + fentanil (3
As medidas clínicas para tratamento da PIC
mg/kg); dose de manutenção: midazolam (75 mg) +
em UTI iniciam-se com medidas preventivas como:
fentanil 50 ml (2,5 mg) diluído em SG (5%, 200 ml),
elevação no dorso do leito a 30 graus com o plano
ministrada a 5 a 15 ml/h.
horizontal; manutenção do paciente em alinhamento
neutro evitando flexões, extensões e movimentos Barbitúricos
laterais cervicocranianos > 15 graus; manutenção de O efeito protetor dos barbitúricos nas
vias aéreas pérvias e ventiladas para boa difusão de lesões do sistema nervoso central foi estudado
O2 pulmonar. Recomendamos níveis de Hb > 10 mg/ em vários grupos de pacientes, demonstrando-
dl para se otimizar suporte de oxigênio adequado, se que estas substâncias conferem uma maior
evitando-se lesões secundárias. Deve-se, também, tolerância do cérebro à anoxia e isquemia. O coma
manter a euvolemia e os distúrbios hidroeletrolíticos barbitúrico deve ser ajustado por meio de registro
corrigidos. A febre aumenta o metabolismo eletrencefalográfico até a ocorrência de supressão
cerebral e a hiperglicemia relaciona-se com um da atividade elétrica cerebral, devendo ser evitada a
pior prognóstico no TCE grave, portanto devem isoeletricidade durante a infusão.
ser tratadas agressivamente. As crises convulsivas
Deve-se administrar tiopental. A partir da
são evitadas por meio de profilaxia medicamentosa
manutenção, deve-se ajustar a dose de acordo
(fenitoína ou valproato), que deverá ser suspensa
com o aparecimento de surto-supressão ao EEG. O
após 1 semana do evento agudo se não houver
traçado isoelétrico ao EEG no coma barbitúrico não
suspeita de crises. Lembrando que pacientes em
é desejável, pois os pacientes podem evoluir com
coma podem estar apresentando crises epilépticas
pior prognóstico.
não-convulsivas. Portanto, o eletroencefalograma
na UTI tem fundamental importância nesses casos. Esta terapia pode levar a hipotensão,
depressão cardíaca, hipotermia, pneumonia,
Sedação hipoxemia, riscos estes que podem tornar sombria a
Os pacientes neurológicos tratados em evolução do tratamento da hipertensão intracraniana.
unidades de terapia intensiva têm frequentemente
Não há estudos que demonstrem que exista
que ser mantidos em ventilação assistida, com
evidente vantagem na evolução de pacientes tratados
tubo endotraqueal, por estarem com nível de
profilaticamente com barbitúricos ou em substituição
consciência rebaixado e não conseguirem manter
ao tratamento básico inicial até hoje recomendado,
a permeabilidade das vias aéreas. No entanto,
entretanto, os barbitúricos efetivamente reduzem a
a presença do tubo é um incômodo muito grande
PIC. Todos os pacientes, antes da indução do coma
podendo provocar agitação psicomotora. Pacientes
barbitúrico, devem ser avaliados rigorosamente do
agitados podem acidentalmente retirar de forma
ponto de vista hemodinâmico, pois a hipotensão que
traumática sondas e cateteres e provocar lesões
pode ser induzida por esses agentes é mais deletéria
indesejáveis além de haver dificuldade de ventilação.
do que os benefícios dos barbitúricos.25
Alguns anestésicos centrais têm a propriedade de
reduzir a necessidade de O2 do parênquima cerebral
Hiperventilação controlada
por desacelerar o metabolismo celular. A sedação
O FSC depende diretamente da pressão de
tem a finalidade de facilitar a ventilação e reduzir a
perfusão cerebral contra a resistência dos vasos
HIC que ocorre em virtude da agitação por aumento
cerebrais, que é dado pelo grau de constrição das
repetitivo da pressão intratorácica (Manobra de
arteríolas pré-capilares. O controle é mediado
Valsalva). A associação mais comum na prática
metabolicamente através da variação no pH
Capítulo 52 725
extracelular. Este controle químico de modulação
Drenagem do líquor
do fluxo sanguíneo cerebral pode ser modificado
O volume liquórico participa com 10% do
pelo sistema tampão HCO3–, que é regulado
volume intracraniano total e, em situações em que
pela ventilação pulmonar e, portanto, pode ser
a complacência cerebral está diminuída, a retirada
terapeuticamente manipulado por meio do controle
de pequenas quantidades do conteúdo intracraniano
da frequência respiratória revertida em alterações
pode aliviar a PIC de forma importante. Em pacientes
na PCO2. A hiperventilação resulta em diminuição
que possuem cateterização ventricular como método
aguda da PCO2 alterando o pH intersticial, pois o
de monitoração de PIC, a drenagem do líquor é um
CO2 equilibra-se rapidamente através da barreira
método efetivo e rápido para diminuir a PIC, podendo
hematoencefálica e como o íon HCO3–, requer de 12
ser de grande valia em situações de emergência
a 72h para se equilibrar. Há uma proporção entre
como adjuvante no controle de HIC. O uso de
a diminuição do FSC de 4% para cada mmHg de
drenagem do LCR para diminuir a PIC em pacientes
PCO2 até 25 mmHg. A hiperventilação profilática
com GCS < 6 durante as primeiras 12h após a lesão
prolongada com pressão parcial de dióxido de
pode ser considerado. A sua limitação reporta-se a
carbono no sangue arterial (PaCO2) de 25 mm Hg
situações, nas quais há uma dificuldade de punção
ou menos não é recomendada.25
ventricular como em ventrículos colabados por
A acidose ou alcalose metabólica só tem inchaço cerebral ou desvios de estruturas de linha
efeito sobre o fluxo sanguíneo cerebral se estiverem mediana.25
acompanhadas de variações compensatórias da
PCO2, pois o íon HCO3– não se difunde rapidamente
Anticonvulsivantes
para o líquido cerebral extracelular. Por outro
lado, a hiperventilação pode levar a alterações Crises convulsivas podem aumentar a PIC,
cardiopulmonares secundárias ou ao aumento da pois provocam contrações musculares involuntárias
pressão intratorácica decorrente da taquipneia. repetitivas de grandes grupamentos musculares,
Estas alterações incluem diminuição do retorno incluindo a musculatura respiratória e abdominal
venoso e do débito cardíaco, e elevação da pressão que fazem aumentar a pressão intratorácica e,
venosa central que influem diretamente na PIC. por consequência, diminuem o retorno venoso
encefálico. Convulsões aumentam de forma
A hiperventilação controlada produzindo
repentina o consumo de O2 pelas despolarizações
hipocapnia é eficaz em curto prazo para reduzir a
celulares repetidas, a acidose tecidual, produção de
PIC por diminuição do FSC e do VSC. Consideramos
CO2 (que, por consequência, provoca vasodilatação
que a principal aplicação da hiperventilação é no
arteriolar aumentando a PIC). Em situações limítrofes
resgate de pacientes em vigência de herniação
de complacência, uma crise pode descompensar a
cerebral. Deve-se manter a PCO2 em torno de 30
HIC e ser fatal.
a 35 mmHg nesses casos. Há evidências de que
a hiperventilação prolongada pode ser deletéria. O valor do uso profilático de anticonvulsivantes
Quando a PaCO2 diminui, os vasos cerebrais se em pacientes com lesões pós-traumáticas não está
contraem até a ocorrência da vasoconstrição que bem definido. No entanto, pacientes que possuem
é atingida com PaCO2 de cerca de 20 mmHg. lesões que aumentem o risco de convulsões devem
Se a PaCO2 diminui abaixo de 25 mmHg, pode receber anticonvulsivantes por curto período de
ocorrer isquemia. Atualmente, não se recomenda tempo, principalmente na fase aguda da doença,
hiperventilação profilática. como tumores ou hemorragias corticais. Durante
o tratamento da hipertensão intracraniana,
particularmente, as convulsões podem ser
Capítulo 52 726
mascaradas em pacientes inconscientes, curarizados
Hipotermia
ou sedados. Por essa razão, alguns autores preferem
Trata-se de uma opção terapêutica para
utilizar sistematicamente anticonvulsivantes e, em
situações em que a sedação/analgesia, a drenagem
casos selecionados, monitorar com EEG.
liquórica, o decúbito elevado e o restante das medidas
O uso profilático de fenitoína ou valproato citadas não reduzem a PIC a níveis compatíveis com
não é recomendado para prevenir convulsões pós- uma boa perfusão encefálica. O efeito da hipotermia
traumáticas (CPT) tardias. A fenitoína é recomendada no cérebro é complexo. Com a diminuição de 1ºC
para diminuir a incidência de CPT precoce (dentro na temperatura cerebral, sua taxa de metabolismo
de 7 dias após a lesão), quando o benefício geral decresce em 6%. Como a taxa de metabolismo
supera as complicações associadas a tal tratamento. cerebral de oxigênio é o principal determinante do FSC,
No entanto, o CPT precoce não foi associado a a hipotermia induzida pode melhorar o suprimento de
piores resultados. No momento, não há evidências oxigênio a áreas isquêmicas do cérebro. A hipotermia
suficientes para recomendar o levetiracetam ao invés diminui, também, a HIC provavelmente por diminuição
da fenitoína com relação à eficácia na prevenção de do volume sanguíneo cerebral decorrente da
convulsões pós-traumáticas precoces e toxicidade25. vasoconstrição arteriolar. Entretanto, o seu uso rotineiro
é controverso. Vários estudos controlados falharam em
Terapêutica osmótica
demonstrar seu real benefício. Porém, o tratamento
Os agentes osmóticos têm um importante papel com hipotermia nos doentes que foram submetidos a
no tratamento da hipertensão intracraniana por meio de retirada de hematomas parece apresentar benefício
vários mecanismos de ação, como a vasoconstrição e nessa população. Além disso, seu uso está associado
a criação de um gradiente osmótico através da barreira a uma maior incidência de distúrbios respiratórios,
hematoencefálica, que reduz o volume do fluido arritmias e distúrbios de coagulação.
extracelular. Há evidências de que esse efeito ocorra
tanto nas áreas cerebrais normais, como naquelas
Esteroides
lesadas. Os agentes osmóticos também diminuem
O uso de esteroides não é recomendado para
a viscosidade sanguínea, resultando em uma
melhorar o desfecho ou reduzir a PIC. Em pacientes
vasoconstrição arteriolar reflexa, que diminui a pressão
com TCE grave, a metilprednisolona em altas doses
intracraniana. Normalmente, usa-se manitol (IV, bolus,
foi associada ao aumento da mortalidade e é contra-
0,25 a 1 g/kg de peso). Quando utilizado com muita
indicada25.
frequência, induz o paciente a um estado hiperosmolar
por perda excessiva de líquido livre, tornando-o
ineficiente e podendo desencadear insuficiência Outros medicamentos
renal. Nos pacientes submetidos a uso prolongado Recentemente, um ensaio clínico randomizado
de manitol, devem-se ter os eletrólitos rigorosamente pragmático identificou o provável benefício do ácido
controlados, assim como a osmolaridade plasmática, a tranexâmico em pacientes vítimas de TCE, quando
qual deve ser < 320 mOsm/L. O efeito inicial do manitol tratados com menos de 3h de trauma. Apesar de não
na diminuição da PIC é secundário à vasoconstrição ter havido diferença no desfecho primário do estudo,
e rápido. O efeito mais tardio é secundário à retirada houve redução da mortalidade no subgrupo de
de líquidos do tecido cerebral. Alguns autores já pacientes com TCE moderado, com 3h de trauma,
consideram o uso de soluções salinas hipertônicas sem alteração pupilar.
(NaCl 3,5 a 20%) como primeira escolha em pacientes
Para melhora do quadro crônico do TCE, há falta
com TCE, principalmente quando há instabilidade
de dados de alta qualidade que atestem os benefícios
hemodinâmica, quando há contra-indicação ao uso do
de qualquer medicação, com exceção da amantadina.
manitol.
Capítulo 52 727
Em um ensaio clínico randomizado, com 184 pacientes 10. Simões MG, Amorim RLO. Traumatismo
Cranioencefálico e Modelos Prognósticos: Revisão de
em estado vegetativo persistente ou estado mínimo de literatura. J Bras Neurocirurg. 2015;26(1):57-67.
consciência entre quatro e 16 semanas após TCE, o 11. Henninger N, Compton RA, Khan MW, Carandang
uso de amantadina (200 a 400 mg / dia) acelerou a R, Hall W, Muehlschlegel S. “Don’t lose hope early”:
Hemorrhagic diffuse axonal injury on head computed
taxa de recuperação funcional durante as primeiras tomography is not associated with poor outcome in
moderate to severe traumatic brain injury patients. J Trauma
quatro semanas de tratamento, em comparação com Acute Care Surg. 2018;84(3):473-482.
o placebo (p = 0,007). Portanto, o uso de amantadina 12. Marehbian J, Muehlschlegel S, Edlow BL, Hinson HE,
para melhorar a funcionalidade de pacientes que Hwang DY. Medical Management of the Severe Traumatic
Brain Injury Patient. Neurocrit Care. 2017;27(3):430-446.
estejam em estado mínimo de consciência entre quatro
13. Harary M, Dolmans RGF, Gormley WB. Intracranial
e 16 semanas, é recomendado23. Pressure Monitoring-Review and Avenues for Development.
Sensors (Basel). 2018;18(2):465.
14. Zhang X, Medow JE, Iskandar BJ, et al. Invasive and
noninvasive means of measuring intracranial pressure: a
CONCLUSÕES review. Physiol Meas. 2017;38(8):R143-R182.
O TCE é extremamente comum em nosso meio. 15. de Amorim RLO, de Andrade AF, Paiva WS, et al.
Infelizmente, ainda não há tratamento que possa Management of Diffuse Lesions in Traumatic Brain Injury in
Brazil. Austin J Neurosurg. 2014;1(3):1011.
reverter as lesões fisiopatológicas primárias. Portanto,
16. Czosnyka M, Pickard JD, Steiner LA. Principles of
se as medidas de prevenção não foram suficientes, intracranial pressure monitoring and treatment. Handb Clin
Neurol. 2017;140:67–89.
devemos focar toda nossa linha de pensamento em
17. Klingelhöfer J, Conrad B, Benecke R, Sander D,
evitar lesões secundárias e dar condições para a Markakis E. Evaluation of intracranial pressure from
reabilitação e inserção social do paciente. transcranial Doppler studies in cerebral disease. J
Neurol. 1988;235(3):159–162.
18. Amorim RL, Morais BA, Pereira FOC, et al. Evaluation of
Head Computed Tomography Assessment of Brain Swelling
after Acute Traumatic Brain Injury: A Pilot study. Arq Bras
REFERÊNCIAS Neurocir. 2019;38:257–262.
1. Taylor CA, Bell JM, Breiding MJ, Xu L. Traumatic 19. Neville IS, Amorim RL, Paiva WS, Sanders FH,
Brain Injury-Related Emergency Department Visits, Teixeira MJ, de Andrade AF. Early surgery does not seem
Hospitalizations, and Deaths - United States, 2007 and to be a pivotal criterion to improve prognosis in patients
2013. MMWR Surveill Summ. 2017;66(9):1-16. with frontal depressed skull fractures. Biomed Res Int.
2. Magalhães A, Cruz de Souza L, Faleiro R, Teixeira A, 2014;2014:879286.
Miranda A. Epidemiologia do traumatismo cranioencefálico 20. Amorim RLO, de Andrade AF, Paiva WS, et al.
no Brasil. Rev Bras Neurol. 2017;53(2). Management of Diffuse Lesions in Traumatic Brain Injury in
3. Paiva WS, Andrade AF, Mathias Júnior L, et al. Brazil. Austin J Neurosurg. 2014;1(3):4.
Management of supratentorial epidural hematoma in 21. Nascimento CN, Amorim RL, Mandel M, et al.
children: report on 49 patients. Arq Neuropsiquiatr. Endoscopic-assisted removal of traumatic brain
2010;68(6):888–892. hemorrhage: case report and technical note. J Surg Case
4. Andrade AF de, Figueiredo EG, Teixeira MJ, Taricco MA, Rep. 2015;2015(11):rjv132.
Amorim RLO de, Paiva WS. Neurotraumatologia. 2015:396. 22. Rubiano AM, Maldonado M, Montenegro J, et al. The
5. Dixon KJ. Pathophysiology of Traumatic Brain Evolving Concept of Damage Control in Neurotrauma:
Injury. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2017;28(2):215–225. Application of Military Protocols in Civilian Settings with
Limited Resources. World Neurosurg. 2019;125:e82-e93.
6. Amorim RL, Nagumo MM, Paiva WS, Andrade AF,
Teixeira MJ. Current clinical approach to patients with 23. Giacino JT, Whyte J, Bagiella E, et al. Placebo-
disorders of consciousness. Rev Assoc Med Bras. controlled trial of amantadine for severe traumatic brain
2016;62(4):377-384. injury. N Engl J Med. 2012;366(9):819-26.
7. Andrade AF, Paiva WS, Soares MS, de Amorim RLO, 24. Harary M, Dolmans RGF, Gormley WB. Intracranial
Tavares WM, Teixeira MJ. Classification and management Pressure Monitoring-Review and Avenues for
of mild head trauma. Int J Gen Med. 2011;4:175–179. Development. Sensors (Basel). 2018;18(2):465.
8. Munakomi S. A comparative study between Marshall and 25. Hansen HC, Helmke K. The subarachnoid space
Rotterdam CT scores in predicting early deaths in patients surrounding the optic nerves. An ultrasound study of the
with traumatic brain injury in a major tertiary care hospital in optic nerve sheath. SRA. 1996;18:323–328
Nepal. Chinese J Traumatol - English Ed. 2016;19:25–27. 26. Carney N, Totten AM, O’Reilly C, et al. Guidelines for
9. .Amorim RLO, de Andrade AF, Paiva WS, et al. the Management of Severe Traumatic Brain Injury, Fourth
Management of Diffuse Lesions in Traumatic Brain Injury in Edition. Neurosurgery. 2017;80(1):6-15.
Brazil. Austin J Neurosurg. 2014;1(3):4.
Capítulo 52 728
CAPÍTULO 53
TRAUMATISMO RAQUIMEDULAR
O traumatismo raquimedular (TRM) pode ser A lesão secundária é resultante de reações celulares
descrito como uma lesão osteoligamentar decorrente e inflamatórias subsequentes ao trauma inicial, tendo
da ação de forças externas sobre a região da coluna como ponto central o processo inflamatório, a formação
vertebral, acompanhado ou não de comprometimento do edema, a ativação da cascata de coagulação e a
neurológico . Afeta cerca de 1,3 milhões de norte-
1 isquemia tecidual. A autodestruição neuronal, propiciada
americanos, com aproximadamente 17.700 novas lesões pela resposta bioquímica a lesão, origina estímulo para
por ano. No Brasil, estima-se que a incidência seja de 16 a resposta inflamatória de mediação celular, na qual há
a 26 por milhão por ano .
2,3 liberação de citocinas, prostaglandinas e tromboxano,
originando um ambiente que impossibilita a regeneração
Traumas na coluna vertebral e lesão medular
neuronal5,7. A apoptose de oligodendrócitos e a
são responsáveis por uma fonte de comprometimento
proliferação de astrócitos nos estágios posteriores da
a longo prazo, incapacidade e até mesmo morte4,5.
lesão prejudicam a regeneração neuronal3.
Desproporcionalmente, o TRM afeta jovens do sexo
masculino, sendo o mecanismo de trauma mais comum
os acidentes de trânsito (38%), seguidos por quedas
QUADRO CLÍNICO
(31%) e atos violentos (14%)1,3,5.
O quadro clínico de um paciente com TRM
As regiões de transição são as mais vulneráveis a varia desde queixas leves como dor e desconforto em
lesões, devido às suas características anatômicas que casos simples a pacientes inconscientes com déficits
conferem uma menor estabilidade. A coluna cervical neurológicos. O comprometimento do nível de consciência
é especialmente vulnerável, uma vez que suporta a e a presença de outras lesões podem encobrir o quadro
caixa torácica, suas facetas articulares são menores em de TRM1.
relação à coluna toracolombar e sustenta o crânio. Por
Em pacientes politraumatizados, admitidos com
essas razões, a coluna cervical é a localização de 55%
imobilização da coluna, a definição de diagnóstico de
das lesões, enquanto 30% ocorrem na lombossacra e
lesão medular é uma das prioridades no atendimento
15% são lesões torácicas puras5,6.
emergencial. Os exames clínico e neurológico são
A fisiopatologia da lesão medular traumática pode fundamentais para a avaliação e definição da conduta
ser dividida em lesão primária e secundária. A lesão desses pacientes. Em pacientes conscientes que
primária é relacionada com etiologia mecânica e pode relatam dor cervical, pacientes com alteração do nível
ocorrer por contusão, laceração, transecção, concussão,
Capítulo 53 729
de consciência, radiológica ou exame inconclusivo é
Classificação do dano neurológico
necessária manutenção da imobilização e realização
A severidade da injúria traumática na medula
de testes diagnósticos adicionais5.
espinhal pode ser graduada pela ferramenta
A instabilidade da coluna vertebral é apresentada pela American Spinal Injury Association
preocupante no TRM, porém, é improvável que (ASIA), após estabilização inicial do paciente. Esta
ocorra instabilidade na ausência de dor cervical ferramenta possui dois componentes a serem
ou sensibilidade e movimentação do pescoço avaliados: o sensitivo e o motor. O componente
totalmente preservada4,6. sensitivo é avaliado a partir de um teste em cada um
Ao exame clínico e neurológico, o médico dos 28 dermátomos, em ambos os lados do corpo.
deve analisar os níveis sensitivos e motor, a força Toque leve e sensação de alfinete também são
muscular, o tônus do esfíncter anal, os reflexos testados e cada modalidade recebe uma pontuação
tendinosos profundos e a presença de outras entre 0 (ausente) e 2 (intacta). O exame motor
lesões5. O quadro neurológico dependerá do nível avalia a função dos principais grupos musculares
de lesão neurológica, considerado como o último correspondentes a 10 miótomos emparelhados. A
segmento mais caudal da medula espinhal com contração voluntária do esfíncter anal também deve
funções sensitivas e motoras preservadas em ambos ser testada. A força deve ser classificada de acordo
os lados6 (Tabela 1). com o sistema de classificação do Medical Research
Council, de 0 a 51,2,6 (Tabela 2).
Algumas síndromes medulares apresentam
quadros neurológicos característicos, que
dependem da localização da lesão na medula
espinhal. O choque medular se inicia imediatamente
DIAGNÓSTICO
após o trauma e termina entre 24 e 48h, com quadro A investigação diagnóstica dos pacientes
clínico de paralisia flácida, arreflexia e perda da com TRM depende do estado de consciência e
sensibilidade abaixo do nível da lesão. A extensão da presença de lesões associadas. Os métodos
do déficit neurológico só pode ser definida após o diagnósticos mais utilizados para o TRM
término do choque medular7,8. compreendem a radiografia simples, a tomografia
computadorizada (TC) e a ressonância magnética
O choque neurogênico decorre da ruptura
(RM)5,10.
do controle supraespinhoso com perda do tônus
simpático, provocando vasodilatação, bradicardia A radiografia simples empregada em três
e pressão sistólica abaixo de 90 mmHg7,8. Os incidências das colunas cervical, torácica e lombar
sinais característicos de um paciente com choque é o primeiro exame complementar empregado na
neurogênico são a cessação da condução axonal e suspeita de TRM5. No segmento cervical, é importante
disfunção simpática5. que a radiografia se estenda até a primeira vértebra
torácica, podendo ser empregadas incidências
A síndrome medular anterior ocorre por infarto
anteroposterior e transoral. Se for detectada uma
da artéria espinal anterior, originado por oclusão
lesão, deve-se avaliar a ocorrência de outras
da artéria ou compressão anterior da medula e
lesões associadas ou não1. As três incidências mais
causa perda sensorial dissociada abaixo da lesão,
recomendadas são anteroposterior, perfil e transoral
paraplegia ou quadriplegia9.
para a avaliação inicial dos pacientes11.
A síndrome da medula posterior é conhecida
Nos pacientes com alteração do estado de
como contusão cervical posterior, produz dor e
consciência, a TC é o exame complementar inicial,
parestesias no pescoço, braço e tronco9.
pois possui maior sensibilidade para detecção de
Capítulo 53 730
Segmento medular Músculo Ação
C5, C6 Deltoide Abdução do braço
C5, C6 Bíceps Flexão do ombro
C6, C7 Extensor radial do carpo Extensão do punho
C7, C8 Tríceps Extensão do ombro
C8, T1 Flexor profundo dos dedos Prensa
C8, T1 Intrínsecos da mão Abdução dos dedos
L1, L2, L3 Iliopsoas Flexão do quadril
L2, L3, L4 Quadríceps Extensão do joelho
L4, L5, S1, S2 Bíceps femoral, semitendinoso, semimembranoso Flexão do joelho
L4, L5 Tibial anterior Dorsoflexão do tornozelo
L5, S1 Extensor longo do hálux Extensão do hálux
S1, S2 Gastrocnêmico Flexão plantar do tornozelo
S2, S3, S4 Bexiga, esfíncter anal Tônus retal voluntário
Graduação da força muscular
Grau 5: Normal
Grau 4: Flexão ativa contra resistência e gravidade
Grau 3: Flexão ativa contra gravidade, mas não resistência
Grau 2: Movimentação ativa somente sem gravidade
Grau 1: Esboça contração
Grau 0: Sem movimento ou contração
Tabela 1: Inervação dos segmentos medulares e musculatura e escala graduada para avaliação.
Fonte: Silva et al., 20165.
Capítulo 53 731
fraturas e subluxação6. A TC é o melhor exame
CONDUTA
para avaliar pacientes com risco moderado ou alto
O manejo de um paciente com TRM deve ser
de lesão, sendo indicada quando há permanência
iniciado no pré-hospitalar, por meio da imobilização
da suspeita de TRM após radiografia, auxílio na
da coluna cervical e estabilização sistêmica. A
indicação do tratamento, presença de dor, outras
imobilização cervical só deve ser retirada após
lesões e intoxicação ou necessidade de sedação1,5.
confirmada a ausência de lesão, como modo de
É capaz de detectar fraturas ocultas à radiografia
prevenir a lesão secundária medular5,7. O tratamento
simples, oferecendo a melhor visualização dos
clínico do TRM objetiva minimizar os danos ao tecido
contornos ósseos. A TC com corte axial fino e
afetado e também facilitar a regeneração deste1.
reconstrução sagital e coronal pode ser utilizada
como exame inicial11. A conduta inicial envolve restabelecer as
funções vitais do paciente em níveis aceitáveis, em
A RM, exceto em casos específicos, tem
especial o estabelecimento de via aérea pérvia e
papel complementar aos outros estudos5,10,12.
taxas de respiração e circulação dentro do normal.
Permite a visualização direta e específica de
Na manutenção de vias aéreas, qualquer manobra
estruturas nervosas, discos intervertebrais, bem
deve ser acompanhada de imobilização da coluna
como apresenta melhor capacidade de detectar as
cervical, evitando tração axial, priorizando a
estruturas responsáveis pela compressão, alterações
obtenção de uma via aérea definitiva. A identificação
parenquimatosas e lesões ligamentares3,5,6. No
de lesões associadas ao TRM é importante, como
TRM, a RM é indicada quando o paciente apresenta
traumatismo torácico com hemo e pneumotórax,
déficit neurológico, suspeita de lesão medular
uma vez que podem piorar o quadro clínico se não
ou alteração vascular1,5,12. A RM fornece imagem
diagnosticados durante o exame inicial5,7.
com maior detalhes, permitindo a visualização de
contusão e rupturas da medula, lesões em partes A manutenção da função cardiorrespiratória
moles, hematomas, edema, lesões ligamentares e e da pressão arterial média acima de 85 mmHg na
ruptura de disco intervertebral 13,14
. fase aguda e manutenção da pressão arterial média
entre 85 e 90 mmHg por uma semana após o trauma
Morais et al. descreveram as sequências
possuem bom prognóstico sobre a recuperação
de RM na vítima de TRM como sendo: Sagital
das funções neurológicas6,7. Pacientes com lesão
T1 para anatomia;Sagital T2 para visualizar
medular acima de T6 podem apresentar choque
medula;ligamentos;edema medular e disco
neurogênico, causados pela perda do controle
intervertebral; sagital T2 SPIR/FAT para visualizar
simpático para o coração, medula da glândula adrenal
edema ósseo e ligamentos; axial T2 para visualizar
e da resposta vasomotora e termorregulatória7,15.
medula, os ligamentos, edema medular e os discos
Nesses pacientes, ressuscitação volêmica, uso de
intervertebrais; axial MPGR T2 para visualizar a
meias elásticas e administração de vasopressores
medula e hemorragias ou contusões; e coronal DP
colaboram para a normalização da pressão arterial.
para lesões ligamentares altas.
Também, deve-se atentar para que o paciente
Outros exames de imagem, como a apresente níveis adequados de débito urinário,
vista radiográfica dinâmica, a mielografia e a oximetria venosa central e de lactato venoso central
angiotomografia cervical com contraste, são e periférico5.
empregados em casos específicos 5,6,10
.
O uso de cateterismo vesical de demora na
fase aguda evita a distensão da bexiga e contribui
para o tratamento da instabilidade cardiovascular.
Também, deve-se avaliar a função gastrointestinal
Capítulo 53 732
por meio de palpação e ausculta abdominal diária5. sua estabilidade, evitando a ocorrência de lesões
secundárias e favorecendo a recuperação7.
Tratamento farmacológico
Durante a fase aguda, dentro da janela
Os corticosteroides, em especial a terapêutica (até 8h após a lesão), o tratamento deve
metilprednisolona, já foram empregados para visar a atenuação das lesões secundárias medulares
prevenção da lesão secundária medular devido ao pelo emprego de métodos neuroprotetores e ações
seu potencial anti-inflamatório. Porém, com base em para recuperação da lesão neurológica7.
estudos recentes, a utilização dos corticosteroides
O tratamento definitivo deve ser realizado
em altas doses na fase aguda do tratamento do TRM
assim que as condições clínicas do paciente
não é rotineiramente recomendada2,7.
permitam. Quando a cirurgia precoce não é possível,
Os gangliosídios estimulam a recuperação a tração halocraniana pode ser aplicada como forma
neurológica, bem como diminuem o edema de descompressão indireta das fraturas cervicais,
proveniente da lesão secundária5,7. Atualmente, os promovendo a redução da fratura por ligamentotaxia,
gangliosídios também não são mais recomendados2. promovendo uma estabilização da fratura. A tração
A administração de relaxantes musculares, halocraniana é contraindicada em pacientes
bem como de outros analgésicos podem ser inconscientes, com fratura de crânio ou com lesão
utilizados para o tratamento da dor, porém, sua ligamentar grave por mecanismo de distração7.
administração não deve se estender por mais do que
duas semanas, devido aos seus efeitos colaterais14.
CONDUTAS ESPECÍFICAS
Tratamento conservador
TRAUMA EM COLUNA CERVICAL
O tratamento conservador, quando indicado,
deve ser a primeira opção terapêutica. Em traumas Fratura de côndilo occipital
na coluna cervical, as órteses variam de colares É classificada em três tipos: tipo A, fraturas
cervicais macios e duros, que permitem amplitude impactadas do côndilo occipital; tipo B, fratura
de movimento limitada, suporte com halo-colete e do côndilo e da rama basilar; e tipo C, fratura por
imobilização mais rígida10. avulsão de fragmento ósseo do côndilo occipital
conectado ao ligamento alar16,17.
Tratamento cirúrgico
Fraturas em tipo A e B possuem tratamento
O tratamento cirúrgico possui três indicações
conservador, através de colar ou órtese cervical por
principais: descompressão da medula, alinhamento
seis a oito semanas16 (Figura 1). Fraturas do tipo
das estruturas e restauração da estabilidade da
B com separação do côndilo do crânio necessitam
coluna vertebral1. A descompressão e a estabilização
utilização de halo-colete por seis a oito semanas17.
não devem ser postergadas para realização de
procedimentos desnecessários, de modo que, ao Fraturas do tipo C requerem imobilização com
se realizar uma cirurgia espinhal precoce, possa halo-gesso por oito a doze semanas e, nos casos em
ocorrer uma melhor recuperação neurológica, que ocorre instabilidade atlanto-occipital, artrodese
Capítulo 53 733
Figura 1: Fratura de côndilo occipital tipo A, onde: A. TC coronal com fraturas bilaterais através do côndilo occipital. B,C.
TC axial mostra deslocamento mínimo das fraturas.
Fonte: Looby et al.10.
Capítulo 53 734
baseado na estabilidade, avaliando o desvio
Luxação atlanto-occipital
lateral das massas laterais nas radiografias em AP.
É uma lesão instável, necessitando de
Se o desvio das massas for menor que 8 mm na
artrodese occipito-cervical após redução da lesão
radiografia, pode-se empregar imobilização com
por meio de tração16. Todas as luxações atlanto-
halo-gesso, gesso minerva ou órteses cervicais
occipitais devem ser tratadas cirurgicamente17.
rígidas por doze semanas. Se após esse período
ainda houver instabilidade, é indicada a artrodese
Lesão do ligamento transverso
C1-C216.
Esta lesão geralmente decorre de hiperflexão
aguda da coluna cervical, podendo ocorrer rotura Em fraturas com desvio das massas laterais
das fibras do ligamento ou avulsão da inserção na do atlas maior que 8 mm, o tratamento inicial pode
massa lateral do atlas. Roturas devem ser tratadas ser a tração com halo por quatro a seis semanas,
através de artrodese C1-C2. A avulsão pode ser seguida por imobilização com halo-gesso por oito
tratada com imobilização por halo-gesso e, se não semanas. É recomendada a tração no leito por
ocorrer consolidação, artrodese C1-C2 é indicada quatro a seis semanas até a formação do calo ósseo
para diminuir a instabilidade do atlas16. para impedir que ocorram desvios dos fragmentos16.
Capítulo 53 735
ou fraturas com cominuição significativa, tendo o geralmente é o indicado para o tratamento dessas
tratamento com estabilização atlantoaxial posterior lesões. A presença de cifose significativa pode
apresentado melhor resultados .18
necessitar de tratamento cirúrgico20.
Fraturas do tipo I e do tipo III devem ser Fraturas em explosão geralmente afetam a
tratadas com imobilização externa (Figuras 2 e 3).
18
medula por retropulsão de osso no canal vertebral.
O tratamento cirúrgico emprega uma abordagem
Espondilolistese traumática do áxis anterior, com corpectomia, substituição do corpo
Nesta fratura, também chamada fratura do vertebral com ou sem o uso de gaiolas metálicas e
TRAUMATISMOS SUBAXIAIS
LESÕES NA JUNÇÃO CÉRVICOTORÁCICA
Os pacientes com traumas cervicais devem
ter imobilização da coluna cervical, em especial A junção cervicotorácica, que compreende os
pacientes com dor ou sensibilidade da coluna segmentos vertebrais entre C7 e T4 é uma região
vertebral, qualquer dor com história de trauma, em que lesões traumáticas geralmente passam
presença de déficit motor, alteração de consciência tratamento cirúrgico pode ser realizado por acesso
ou fraturas com aspecto de distração. Não é anterior, posterior ou uma combinação de ambos1,22.
Fraturas por compressão não apresentam de manubriotomia. A localização espacial dos vasos
falha na coluna anterior. O uso de colar cervical anterior. Quando apenas metade do diâmetro dos
vasos cruza a linha de visão, estes podem sofrer
Capítulo 53 736
ligeira retração para a realização da cirurgia22.
LESÕES TRAUMÁTICAS DA COLUNA
A linha de visão pode ser caracterizada como SACRAL
uma linha paralela ao platô inferior da vértebra O tratamento de fraturas sacrais está
superior saudável e sua correlação com o manúbrio, associado à sua estabilidade. O tratamento não
não sendo necessária a manubriotomia se as cirúrgico está indicado em fraturas unilaterais do
linhas se cruzarem acima do manúbrio. Porém, nos sacro, com pouco ou nenhum desvio e sem déficit
casos de corpectomia de um nível, a indicação de neurológico. É composto por repouso em leito e
manubriotomia depende somente da inclinação do posterior uso de andador ou muletas, com o tempo
corpo da vértebra superior saudável . 22
variando de acordo com a instabilidade da fratura26.
Capítulo 53 737
3. Talbott JF, Huie JR, Ferguson AR, Bresnahan JC, Beattie 16. Defino HLA. Lesões traumáticas da coluna cervical alta.
MS, Dhall SS. MR Imaging for Assessing Injury Severity and Rev Bras Ortop. 2002;37(4):99-107.
Prognosis in Acute Traumatic Spinal Cord Injury. Radiol Clin
17. Dantas FLR. Lesões traumáticas da junção
North Am. 2019;57(2):319-339.
craniocervical. In: Siqueira MG, ed. Tratado de
4. Morrow KD, Podet AG, Spinelli CP, et al. A case series neurocirurgia. 1ª ed. Barueri: Manole, 2016.
of penetrating spinal trauma: comparisons to blunt trauma,
18. Grauer JN, Shafi B, Hilibrand AS, et al. Proposal of
surgical indications, and outcomes. Neurosurg Focus.
a modified, treatment-oriented classification of odontoid
2019;46(3):E4.
fractures. Spine J. 2005;5(2):123-129.
5. Silva FGV, Guirado VMP. Traumatismo Raquimedular. In:
19. Ferro FP, Borgo GD, Letaif OB, Cristante AF, Marcon
Siqueira MG, ed. Tratado de neurocirurgia. 1ª ed. Barueri:
RM, Lutaka AS. Espondilolistese traumática do áxis:
Manole, 2016. p 2209-2220.
epidemiologia, conduta e evolução. Acta ortop. Bras.
6. Ropper AE, Ropper AH. Acute spinal cord compression. 2012;20(2):84-87.
N Engl J Med 2017;376:1358-1369.
20. Botelho RV, Campos RR, Oliveira MF. Traumatismos da
7. Ono AHA, Cristante AF, Rocha ID. Trauma Raquimedular. Coluna cervical subaxial. In: Siqueira MG, ed. Tratado de
In: Defino HLA, Pudles E, Rocha LEM, eds. Coluna neurocirurgia. 1ª ed. Barueri: Manole; 2016.
Vertebral. Porto Alegre: Artmed; 2020. p 211-232.
21. Winn HR. Youmans neurological surgery. 6ª ed.
8. Hagen EM. Acute complications of spinal cord injuries. Philadelphia: Elselvier Saunders; 2011.
World J Orthop. 2015;6(1):17-23.
22. Falavigna A, Moraes OJS. Diagnóstico e tratamento das
9. Greenberg MS. Manual de neurocirurgia. 7ª ed. Porto lesões traumáticas da junção cervicotorácica. In: Siqueira
Alegre: Artmed; 2010. MG, ed. Tratado de neurocirurgia. 1ª ed. Barueri: Manole;
2016.
10. Looby S, Flanders A. Spine trauma. Radiol Clin North
Am. 2011;49(1):129-63. 23. Moon MS, Choi WT, Moon YW, Kim YS, Moon JL.
Stabilisation of fractured thoracic and lumbar spine with
11. Morais DF, Neto JSM, Spotti AR, Meguins LC, Mussi SE,
Cotrel-Dubousset instrument. J Orthop Surg. 2003;11(1):59-
Tognola WA. Image diagnosis of patients submitted to spinal
66.
injury. J Bras Neurocirurg. 2013;24(1):33-39.
24. Vialle LR, Vialle E. Diagnóstico e tratamento das lesões
12. Guarnieri G, Izzo R, Muto M. The role of
traumáticas da coluna torácica e lombar. In: Siqueira MG,
emergency radiology in spinal trauma. Br J Radiol.
ed. Tratado de neurocirurgia. 1ª ed. Barueri: Manole; 2016.
2016;89(1061):20150833.
25. Wood K, Buttermann G, Mehbod A, Garvey T, Jhanjee
13. Fernandes PCR, Fernandes M, Ribeiro Jr MAF. Trauma
R, Sechriest V. Operative compared with nonoperative
Raquimedular. In: Ribeiro Jr MAF, ed. Fundamentos da
treatment of a thoracolumbar burst fracture without
Cirurgia do Trauma. 1ª ed. Rio de Janeiro: Roca; 2016.
neurological deficit. A prospective, randomized study. J
14. Spiegl UJ, Fischer K, Schmidt J, et al. The Conservative Bone Joint Surg Am. 2003;85(5):773-781.
Treatment of Traumatic Thoracolumbar Vertebral Fractures.
26. Wajchenberg M, Alvarenga JALS, Martins DE, Puertas
Dtsch Arztebl Int. 2018;115(42):697-704.
EB. Diagnóstico e tratamento das lesões traumáticas
15. Paolillo FR, Paolillo AR, Cliquet Jr A. Respostas cardio- da coluna sacral. In: Siqueira MG, ed. Tratado de
respiratórias em pacientes com traumatismo raquimedular. neurocirurgia. 1ª ed. Barueri: Manole; 2016.
Acta ortop. bras. 2005;13(3):149-152.
Capítulo 53 738
CAPÍTULO 54
COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS ASSOCIADAS
ÀS INTOXICAÇÕES EXÓGENAS E AOS
DISTÚRBIOS METABÓLICOS
Capítulo 54 739
Figura 1: Principais síndromes associadas às intoxicações exógenas. * MAO: monoamino-oxidase, ** MDMA:
metilenodioximetanenfetamina, ***LSD: ácido lisérgico.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 740
apresentação, e pode ser de difícil manejo clínico. (como agitação, ansiedade e confusão mental)8.
Em relação às possibilidades medicamentosas, A tendência é que a fase inicial se manifeste com
o uso dos benzodiazepínicos pode minimizar os taquicardia, midríase e diaforese. A partir disso,
sintomas hiperadrenérgicos . 4
evolui com hipertensão, hipertermia, hiperreflexia
(especialmente nos membros inferiores e no tendão
Síndrome serotoninérgica patelar) e ansiedade em quadros clínicos moderados.
A serotonina, também denominada Em casos a avançados, pode haver delirium, rigidez
5-hidroxitriptamina (5-HT), é um neurotransmissor muscular e choque circulatório7.
sintetizado a partir do aminoácido triptofano Em um estudo prospectivo com pacientes que
especialmente no trato gastrointestinal, o qual apresentaram síndrome serotoninérgica, tremor e
também armazena a maior quantidade de serotonina tontura foram os principais sintomas reportados,
presente no organismo. Após a liberação do 5-HT enquanto os distúrbios de marcha foram o principal
na fenda sináptica, parte é recapturada no neurônio motivo que levou os pacientes a buscarem
pré-sináptico, enquanto a porção remanescente auxílio médico. Todos os pacientes apresentaram
sofre degradação pela enzima monoamino-oxidase hiperreflexia, enquanto taquicardia e clônus foram
(MAO)6. observados em 82% dos pacientes avaliados10-12.
Os neurônios serotoninérgicos são encontrados Os principais diagnósticos diferenciais
sobretudo na rafe do tronco encefálico e projetam- são feitos com crise de ansiedade, síndrome
se para o encéfalo e para a medula espinhal. neuroléptica maligna, hipertermia maligna, síndrome
No encéfalo, algumas áreas são especialmente anticolinérgica ou simpaticomimética e infecções do
ricas em terminações serotoninérgicas: núcleo sistema nervoso central (SNC)7,9.
supraquiasmático, corpo geniculado ventrolateral,
A interrupção das substâncias serotoninérgicas
amígdala e hipocampo6. A serotonina tem
e o tratamento suportivo das manifestações
importantes ações no organismo, incluindo controle
autonômicas e neurológicas são suficientes na maioria
de temperatura, comportamento, humor, ciclo sono-
dos casos. Para casos que necessitem de sedação,
vigília, motilidade gastrointestinal, tônus motor e
deve-se optar pelos benzodiazepínicos, evitando os
vascular6,7.
efeitos anticolinérgicos dos antipsicóticos. Medidas
O excesso de 5-HT no organismo pode de resfriamento podem ser adotadas, auxiliando
culminar na síndrome serotoninérgica. Dentre no controle da temperatura corpórea e dos sinais
as drogas associadas a esse quadro clínico, vitais9. Além do tratamento suportivo, alguns relatos
destacam-se os inibidores da MAO (IMAOs), sugerem o uso de ciproeptadina (12 mg por via oral)
antidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos da ou clorpromazina (25 a 50 mg por via endovenosa)
recaptação de serotonina, opioides, antibióticos, como tratamentos específicos para a síndrome
fármacos anti-migranosos, lítio, levodopa, triptofano, serotoninérgica8.
substâncias anorexígenas e drogas de abuso (como
metilenodioximetanenfetamina ou MDMA, ácido
lisérgico ou LSD, cocaína e anfetamina)7–9.
Síndrome anticolinérgica
A acetilcolina (ACh) é um neurotransmissor
As manifestações clínicas desta síndrome
sintetizado no citoplasma do terminal nervoso e
potencialmente fatal são caracterizadas pela tríade
armazenado em vesículas sinápticas que o liberam
de hiperatividade neuromuscular (com hiperreflexia,
por exocitose. Posteriormente, o neurotransmissor
rigidez e clônus), instabilidade autonômica
é hidrolisado pela acetilcolinesterase (AChE),
(taquicardia, hipertensão, midríase, diaforese
enzima encontrada em altas concentrações na placa
e hipertermia) e alterações de estado mental
Capítulo 54 741
terminal pós-sináptica na junção neuromuscular retenção urinária e constipação. Casos mais
(JNM). Neste ponto, a enzima realiza a remoção graves podem evoluir para hipertermia, movimentos
imediata da ACh, evitando seu efeito em receptores mioclônicos espasmódicos, coreia, rabdomiólise e
adjacentes . A ACh atua em dois tipos de receptores:
6
coma6,8,13.
muscarínicos (predominantes no hipocampo, córtex
Os principais diagnósticos diferenciais
e tálamo e no SNP, apresentando cinco subtipos: M1
provavelmente são as infecções de SNC,
a M5) e nicotínicos (predominantes na JNM)13.
uremia, síndrome serotoninérgica, síndrome
Dentre os locais de ação da ACh no organismo, simpaticomimética e intoxicação por salicilato14.
destacam-se coração (efeitos cronotrópico, inotrópico A ausência da sudorese na intoxicação por
e dromotrópico negativos), olhos (miose), SNC anticolinérgicos é útil na diferenciação com
(cognição, controle motor e nocicepção), glândulas intoxicação por compostos simpaticomiméticos14.
sudoríparas (aumento da sudorese), salivares Devem também ser consideradas as intoxicações
(aumento da salivação), pulmões (broncoconstrição mistas, em vez de puramente anticolinérgicas,
e aumento das secreções brônquicas), bexiga especialmente importantes no uso de antidepressivos
(aumento da pressão miccional e do peristaltismo tricíclicos ou fenotiazinas14.
ureteral) e trato gastrointestinal (aumento da
O tratamento suportivo com especial atenção
motilidade e das secreções gastrointestinais) 6,13
.
à via aérea e ao status volêmico é usualmente
Nesses sítios, os medicamentos anticolinérgicos
suficiente8,14. O tratamento específico em casos
exercem um antagonismo competitivo8. Contudo,
graves é realizado com a neostigmina, um inibidor
nos receptores nicotínicos, o efeito destes fármacos
da AChE de atuação periférica (útil no tratamento do
é praticamente nulo14.
íleo paralítico)8,14. O uso de carvão ativado é benéfico
A intoxicação por anticolinérgicos (atropina, principalmente na primeira hora após a intoxicação.
escopolamina, biperideno, ipratrópio, tiotrópio, Procedimentos como hemodiálise, hemoperfusão e
hiosciamina, dentre outros) ou fármacos de outras diálise peritoneal aparentemente não são eficientes
classes que possuem atividade anticolinérgica (anti- nesse cenário8. Benzodiazepínicos e medidas de
histamínicos, antipsicóticos, antiespasmódicos, resfriamento são úteis no tratamento da agitação e da
antiparkinsonianos, antidepressivos tricíclicos e hipertermia, respectivamente14. Fluidos IV devem ser
relaxantes musculares) são as principais medicações administrados para hipotensão e/ou rabdomiolise14 e
associadas à síndrome anticolinérgica. Além disso, em caso de QRS alargado no eletrocardiograma, o
drogas ilícitas e substâncias encontradas na tratamento de escolha é o bicarbonato de Sódio13.
natureza podem exercer efeitos anticolinérgicos:
heroína, cocaína, beladona (Atropa belladonna), Síndrome colinérgica
trombeta (Datura stramonium) e agário-das-
A síndrome colinérgica ocorre devido a uma
moscas (Amanita muscaria)6,8,14. Provavelmente
hiperestimulação dos receptores muscarínicos e
em decorrência do amplo acesso, a intoxicação por
nicotínicos. As situações que mais comumente
anticolinérgicos é principalmente causada pelo uso
estão associadas à síndrome colinérgica são:
de anti-histamínicos14.
pacientes portadores de miastenia gravis em uso
Ao bloquear a ação da ACh nos receptores de altas doses de inibidores de AChE; pacientes
muscarínicos, estas substâncias exercem efeito que receberam altas doses de inibidores da AChE
antagônico da ACh. Nas intoxicações, estes efeitos para reverter bloqueio neuromuscular; pacientes
são intensificados e podem ocorrer taquicardia, expostos a substâncias inativadoras da AChE
aumento do intervalo QT, midríase, confusão mental, (como por pesticidas como os organofosforados e
irritabilidade, alucinações, delirium, xerostomia, carbamato15,16); e pacientes em uso de compostos
Capítulo 54 742
com atuação anticolinesterásica e/ou colinérgica na prática clínica. As vitaminas A e B6 geram
para disfunções vesicais crônicas . Outros sinais
16
neurotoxicidade direta22. A vitamina D é comumente
clínicos incluem ataxia, coma e convulsões16. envolvida em “hipersuplementação” em idosos e
vem sendo muito estudada no autismo assim como
Os sintomas e sinais da síndrome colinérgica
em portadores doenças imunomediadas nos últimos
podem ser subdivididos em nicotínicos e
anos23,24. Por fim, a vitamina K cuja importância reside
muscarÍnicos16:
no fato dela ser o alvo da varfarina, um anticoagulante
• sintomas nicotínicos: a ligação da acetilco- muito prescrito na prevenção secundária de
lina com receptores nicotínicos na junção acidentes vasculares cerebrais isquêmicos . Abaixo
25
Capítulo 54 743
Capítulo 54 744
Tabela 1: Miscelânea de substâncias potencialmente causadoras de intoxicação.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 745
metabolismo da glicose é crucial para a fisiologia
DISTÚRBIOS METABÓLICOS
normal do sistema nervoso.
Introdução aos distúrbios metabólicos
Os desarranjos adquiridos ou secundários
Os distúrbios metabólicos que acometem o no metabolismo de carboidratos, como diabetes
SNC se caracterizam pela ausência ou disfunção de mellitus (DM), cetoacidose diabética (CAD), coma
uma enzima necessária para uma reação química hiperosmolar e hipoglicemia, são acompanhados por
específica no corpo30. Essa alteração metabólica numerosas alterações estruturais, comportamentais
pode causar danos progressivos e permanentes e bioquímicas do SNC32. Estudos já relacionam a
secundários ao acúmulo de uma substância a níveis DM com várias condições comórbidas, incluindo
tóxicos no corpo; privar o corpo de componentes depressão, ansiedade e disfunções cognitivas33,34.
essenciais (como aminoácidos); ou utilizar vias
metabólicas acessórias.
Distúrbios neurológicos associados à
As manifestações neurológicas são os sinais glicose
e sintomas proeminentes nesse grupo de doenças, O metabolismo da glicose abre um leque de
compondo os erros inatos do metabolismo (EIM), que doenças (agudas ou crônicas) de vasta amplitude
acometem principalmente a faixa etária pediátrica. na neurociência, como: manifestações neurológicas
As apresentações clínicas dos EIM incluem ataxias, associadas à DM, espectro de síndromes do
distúrbios do movimento, epilepsias infantis e transportador de glicose tipo 1 (GLUT1), crises
neuropatia periférica , as quais serão abordadas
31
hipercatabólicas em erros inatos de metabolismo
individualmente de acordo com o erro inato a ser da glicose, espectro do metabolismo da glicose
descrito no corpo do texto. em síndromes demenciais, distúrbios da glicose na
Embora os distúrbios metabólicos sejam abordagem aos eventos cerebrovasculares, dentre
raros, a detecção e intervenção precoces são vários outros.
inestimáveis em alguns pacientes, pois o dano Alguns dos distúrbios neurológicos associados
neurológico representa uma carga significativa para à glicose são abordados em diferentes momentos
os pacientes e suas famílias. Com os testes de do livro e até mesmo desse capítulo. Nesse tópico,
triagem neonatal, é possível prevenir as disfunções o foco se dará às manifestações clínicas mais
metabólicas, assim, avaliando e garantindo marcos prevalentes. Nesse momento, cabe-nos frisar os
de neurodesenvolvimento normais ou quase sinais/sintomas neurológicos associados à DM com
normais30. seu espectro de disfunções crônicas e agudas.
As terapias atuais ainda são limitadas para
os EIM. Terapias de reposição enzimática estão
disponíveis para algumas doenças e o transplante Manifestações neurológicas crônicas na
diabetes mellitus (DM)
de medula óssea pode ser uma opção para alguns
pacientes. Outras terapias incluem restrições ou Essa doença engloba um conglomerado
suplementação dietéticas. de distúrbios metabólicos heterogêneos que se
aglutinam fisiopatologicamente na hiperglicemia
Neste capítulo, também abordaremos
crônica. O gatilho chave para a expressão do
aspectos dos distúrbios no metabolismo da
fenótipo da DM pode ocorrer por déficit da secreção
glicose, o qual desempenha um importante papel
de insulina assim como um distúrbio no efeito da
relacionado na neuroenergética, neurotransmissão,
insulina (por resistência periférica, por exemplo)35. A
armazenamento de energia, biossíntese e
doença pode se expressar na gestação em mulheres
defesa oxidativa. Assim sendo, a manutenção do
com DM gestacional e uma disfunção na resistência
Capítulo 54 746
à insulina que, geralmente, é diagnosticada pela método para confirmar o diagnóstico. O tratamento
primeira vez durante a gravidez .36
da síndrome metabólica e das neuropatias
associadas à resistência à insulina deve incluir
Na maioria dos pacientes com DM tipo 1,
reeducação alimentar com dieta balanceada, prática
expressa a doença secundariamente à destruição de
de exercícios físicos, manutenção da normoglicemia
células β pancreáticas, o que leva a uma deficiência
e terapia farmacológica direcionada para fatores de
absoluta de insulina (como por auto-anticorpos
risco modificáveis39.
que atuam contra o próprio pâncreas do doente).
Entretanto, a DM tipo 1 também por ser induzida Além disso, em longo prazo, o aumento do
por inibidores de checkpoint e pode se manifestar risco de AVE é marcante e a DM por si só é um fator
no fenótipo LADA ou diabetes autoimune latente em de risco independente para AVE. Pesquisas recentes
adultos .
37
têm sugerido também que a DM aumenta o risco de
depressão, déficit cognitivo leve e de síndromes
Já a DM tipo 2, pode variar de uma resistência
demenciais. Por essa razão, o diagnóstico e o
à insulina predominante com uma deficiência
tratamento precoces são os fatores que mais mudam
relativa de insulina a um defeito amplamente
o desfecho desses pacientes em longo prazo40–42.
secretor com resistência à insulina. Nesse caso, há
frequentemente associação a outras doenças (por
exemplo, a síndrome metabólica)37.
Manifestações neurológicas agudas na DM
Nos dois subtipos, as grandes manifestações
Além disso, são muito prevalentes como
neurológicas são as neuropatias. As principais
disfunções agudas no paciente diabético, a
formas englobam o acometimento da via visual com
hipoglicemia e os estados hiperosmolares (CAD e
a retinopatia diabética, manifestações de neuropatia
estado hiperosmolar hiperglicêmico ou EHH).
diabética com padrão de ‘’botas e luvas’’ nas
extremidades dos membros, acometimento de plexo
celíaco na gastroparesia diabética e disfunções
Hipoglicemia
sexuais em homens (como disfunção erétil) após
acometimento da inervação autonômica sacral para Como a glicose é o principal substrato
Capítulo 54 747
glicemia de aproximadamente 50 mg / dl (2,8 mmol episódios de hipoglicemia48,49.
/ l) ou menos 43.
sudorese, calor, náusea e fome). Os sinais/sintomas graves e com risco de morte aos pacientes com
neuroglicopênicos incluem fraqueza, alterações DM. Esses quadros clínicos são analisados como
disartria, tontura / desmaio, amnésia, letargia, neurológico eles serão discutidos juntos nessa seção
que a morte encefálica ocorre em casos nos quais a hiperglicêmicas. Tanto a CAD quanto o EHH podem
com suspeita clínica de AVE em qualquer serviço de baixa adesão ao tratamento com insulina é a causa
Capítulo 54 748
médico. Além disso, as avaliações laboratoriais de Fluxograma 3). Já na CAD, os pilares do manejo
glicemia e eletrólitos, pH venoso, bicarbonato e gap dessa complicação hiperglicêmica aguda se
aniônico devem ser repetidas a cada 2 a 4h com dão com: análise da gasometria arterial a fim de
gasometrias seriadas 56,57
. considerar reposição de bicarbonato (Fluxograma
4), insulinoterapia de emergência (Fluxograma 5),
No EHH, é crucial a correção da hiperglicemia
avaliação com manejo da calemia (Fluxograma 6) e
com insulinoterapia de emergência (como mostrado
reexpansão volêmica (Fluxograma 7).
no Fluxograma 1), a avaliação com manejo da
calemia (como mostrado no Fluxograma 2) e a
pronta reexpansão volêmica (como mostrado no
Capítulo 54 749
Fluxograma 2.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 750
Fluxograma 4. CAD. Análise da gasometria arterial para reposição de bicarbonato.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 751
Fluxograma 6. CAD. Reexpansão volêmica.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 752
do crescimento, hepatomegalia, cardiomiopatia,
Erros inatos do metabolismo
paraplegia espástica, atraso ou regressão do
Introdução desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM)61,62.
EIMs podem ser encontrados em todos os sistemas órgãos, terapia genética. Sendo assim, a identificação
gastrointestinais costumam ser as mais frequentes, casos, o início precoce de um tratamento efetivo,
estando presentes em cerca de 80% dos casos61. evitando progressão de sintomas e, eventualmente,
Capítulo 54 753
Figura 2 – Representação esquemática dos mecanismos fisiopatológicos dos EIMs.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 754
reciclagem que permite um ciclo de troca contínua proteínas, sendo a maioria enzimas e moléculas
entre células e nutrientes trazidos pela alimentação transportadoras (Tabela 3)60,61.
e respiração. Compreende uma vasta gama de
Fazem parte deste conjunto EIMs que levam de compostos normais/anormais próximos aos
a uma apresentação clínica de intoxicação aguda bloqueios metabólicos (Tabela 4)60.
(podendo ser progressiva) através do acúmulo
Capítulo 54 755
Capítulo 54 756
Tabela 4: Exemplos de desordens do metabolismo intermediário afetando moléculas pequenas.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 757
Mitocondriopatias são as mais graves e acidemias lácticas congênitas (defeitos do ciclo
geralmente intratáveis. Englobam defeitos da de Krebs, etc), desordens da cadeia respiratória
oxidação aeróbica da glicose manifestando-se como mitocondrial, entre outras (Tabela 6)59.
Capítulo 54 758
Defeitos energéticos citoplasmáticos são, celulares (mitocôndria, lisossomos, peroxissomos,
geralmente, menos graves e incluem desordens da retículo endoplasmático, etc)59. Sintomas
glicólise, metabolismo do glicogênio, defeitos do geralmente são progressivos e não apresentam
transportador de glicose (todas tratáveis), desordens relação com condições sobrepostas (como
do metabolismo da creatina (parcialmente tratáveis) infecções e alimentação). A maioria dos portadores
e EIMs das vias da fosfato pentose (intratáveis) .
61
não apresentará crises agudas59–61. Fazem parte
deste conjunto as desordens de armazenamento
lisossomal (Tabela 7), desordens peroxissomais
(Tabela 8), erros inatos da purina e da pirimidina
Desordens envolvendo moléculas
complexas (afetam o metabolismo de ácidos nucleicos), erros
inatos da síntese de colesterol (como a xantomatose
Grupo de patologias que afetam a síntese,
cerebrotendínea), dentre outras60,61.
o processamento, o controle de qualidade e o
catabolismo de moléculas complexas em organelas
Tabela 7: Lisossomopatias.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 759
Tabela 8: Peroxissomopatias.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 54 760
em uma disfunção cerebral global denominada
Miscelânea
encefalopatia (Tabela 9). A reversibilidade pode
Alterações tóxico-metabólicas decorrentes
ocorrer dependendo da causa base e do tratamento
de processos sistêmicos diversos podem resultar
precoce65–67.
Capítulo 54 761
17. Ohbe H, Jo T, Matsui H, Fushimi K, Yasunaga H.
REFERÊNCIAS Cholinergic Crisis Caused by Cholinesterase Inhibitors: a
1. Ozdemir E, Karaman MG, Yurteri N, Erdogan A. A Retrospective Nationwide Database Study. J Med Toxicol.
case of suicide attempt with long-acting methylphenidate 2018;14(3):237-241.
(Concerta). Atten Defic Hyperact Disord. 2010;2(3):103-105.
18. Huang X, Liu WB, Men LN, et al. Clinical features of
2. Patel V, Krishna AS, Lefevre C, Kaagaza M, Wittkamp M. myasthenia gravis in southern China: a retrospective review
Methylphenidate Overdose Causing Secondary Polydipsia of 2,154 cases over 22 years. Neurol Sci. 2013;34(6):911-
and Severe Hyponatremia in an 8-Year-Old Boy. Pediatr 917.
Emerg Care. 2017;33(9):e55-e57.
19. Hetherington KA, Losek JD. Myasthenia gravis:
3. Morton WA, Stockton GG. Methylphenidate Abuse and myasthenia vs. cholinergic crisis. Pediatr Emerg Care.
Psychiatric Side Effects. Prim Care Companion J Clin 2005;21(8):546-548.
Psychiatry. 2000;2(5):159-164.
20. Liu HX, Liu CF, Yang WH. Clinical study of continuous
4. Goldstein S, Richards JR. Sympathomimetic Toxicity. micropump infusion of atropine and pralidoxime chloride for
2021. treatment of severe acute organophosphorus insecticide
poisoning. J Chin Med Assoc. 2015;78(12):709-713.
5. Jamshidi N, Dawson A. The hot patient: acute drug-
induced hyperthermia. Aust Prescr. 2019;42(1):24-28. 21. Abedin MJ, Sayeed AA, Basher A, Maude RJ, Hoque
G, Faiz MA. Open-label randomized clinical trial of atropine
6. Brunton L, Chabner B, Knollmann B. Goodman and
bolus injection versus incremental boluses plus infusion for
Gilman’s the Pharmacological Basis of Therapeutics. Focus
organophosphate poisoning in Bangladesh. J Med Toxicol.
Altern Complement Ther. McGraw Hill; 2017.
2012;8(2):108-117.
7. Boyer EW, Shannon M. The serotonin syndrome. N Engl
22. Snodgrass SR. Vitamin neurotoxicity. Mol Neurobiol.
J Med. 2005;352(23):2454-2456.
1992;6(1):41-73.
8. Olson KR (ed). Manual de Toxicologia Clínica. 6. ed.
23. Duffy E, Brassill MJ. Hypercalcaemia due to
Porto Alegre: AMGH, 2014. McGraw Hill; 2014.
Hypervitaminosis D in a Self-Supplementing Multiple
9. Simon LV, Keenaghan M. Serotonin Syndrome. In: Sclerosis Patient: A Case Report. Ir Med J. 2019;112(6):953.
StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls
24. Asif A, Farooq N. Vitamin D Toxicity. 2021 Apr 29. In:
Publishing; 2021. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.
StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls
gov/books/NBK482377/
Publishing; 2021. PMID: 32491799.
10. Prakash S, Rathore C, Rana KK, Dave A, Joshi H, Patel
25. Zirlik A, Bode C. Vitamin K antagonists: relative
J. Refining the Clinical Features of Serotonin Syndrome: A
strengths and weaknesses vs. direct oral anticoagulants for
Prospective Observational Study of 45 Patients. Ann Indian
stroke prevention in patients with atrial fibrillation. J Thromb
Acad Neurol. 2019;22(1):52-60.
Thrombolysis. 2017;43(3):365-379.
11. White MG, Luca LE, Nonner D, et al. Cellular
26. Mello ALMF, Melo KR, Sousa ALMD, Rolim Neto PJ,
mechanisms of neuronal damage from hyperthermia. Prog
Silva RMFD. Product indiscriminate use of vitamin risks: A
Brain Res. 2007;162:347-371.
review. Crit Rev Food Sci Nutr. 2020;60(12):2067-2082.
12. Slettedal JK, Nilssen DO, Magelssen M, Løberg EM,
27. Rowland PL, Pedley TA. Merritt’s Neurology. 12ª edição.
Maehlen J. Brain pathology in fatal serotonin syndrome:
Lippincott Williams & Wilkins; 2015.
presentation of two cases. Neuropathology. 2011;31(3):265-
270. 28. Bertolucci PHF, Ferraz HB, Félix EPV, Pedroso JL. Guia
de Neurologia. Manole; 2011.
13. Migirov A, Datta AR. Physiology, Anticholinergic
Reaction. [Updated 2021 Aug 9]. In: StatPearls [Internet]. 29. Halmo L, Nappe TM. Lead Toxicity. 2021 Jul 10. In:
Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan- StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls
. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/ Publishing; 2021. PMID: 31082141.
NBK546589/
30. Karimzadeh P. Approach to neurometabolic diseases
14. Broderick ED, Metheny H, Crosby B. Anticholinergic from a pediatric neurological point of view. Iran J Child
Toxicity. 2021 Nov 14. In: StatPearls [Internet]. Treasure Neurol. 2015;9(1):1-16.
Island (FL): StatPearls Publishing; 2022 Jan–. PMID:
31. McShane T, Clayton P, Donaghy M, Surtees R.
30521219.
Neurometabolic disorders. 12ª edição. Oxford University
15. BBC. Alexei Navalny: Russia opposition leader poisoned Press; 2009.
with Novichok - Germany; 2020. Disponível em: https://
32. Thakur A., Tyagi S, Shekhar N. Comorbid brain
www.bbc.com/news/world-europe-54002880.
disorders associated with diabetes: therapeutic potentials
16. Adeyinka A, Kondamudi NP. Cholinergic Crisis. In: of prebiotics, probiotics and herbal drugs. Transl med
StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls commun. 2019;4:12.
Publishing; 2020 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.
nih.gov/books/NBK482433/
Capítulo 54 762
33. Mazloom Z, Ekramzadeh M, Hejazi N. Efficacy of 49. Amiel SA, Aschner P, Childs B, et al. Hypoglycaemia,
supplementary vitamins C and E on anxiety, depression and cardiovascular disease, and mortality in diabetes:
stress in type 2 diabetic patients: a randomized, single-blind, epidemiology, pathogenesis, and management. Lancet
placebo-controlled trial. Pak J Biol Sci. 2013;16(22):1597- Diabetes Endocrinol. 2019;7(5):385-396.
1600.
50. Ennis ED, Stahl EJB, Kreisberg RA. The hyperosmolar
34. Butterfield DA, Di Domenico F, Barone E. Elevated risk hyperglycemic syndrome. Diabetes Rev. 1994;2:115–126.
of type 2 diabetes for development of Alzheimer disease: a
51. Fayfman M, Pasquel FJ, Umpierrez GE. Management
key role for oxidative stress in brain. Biochim Biophys Acta.
of Hyperglycemic Crises: Diabetic Ketoacidosis and
2014;1842(9):1693-1706.
Hyperglycemic Hyperosmolar State. Med Clin North Am.
35. Petersmann A, Müller-Wieland D, Müller UA, et al. 2017;101(3):587-606.
Definition, Classification and Diagnosis of Diabetes Mellitus.
52. Umpierrez GE, Kelly JP, Navarrete JE, Casals MM,
Exp Clin Endocrinol Diabetes. 2019;127(S 01):S1-S7.
Kitabchi AE. Hyperglycemic crises in urban blacks. Arch
36. Johns EC, Denison FC, Norman JE, Reynolds RM. Intern Med. 1997;157(6):669-675.
Gestational Diabetes Mellitus: Mechanisms, Treatment, and
53. Randall L, Begovic J, Hudson M, et al. Recurrent
Complications. Trends Endocrinol Metab. 2018;29(11):743-
diabetic ketoacidosis in inner-city minority patients:
754.
behavioral, socioeconomic, and psychosocial factors.
37. Schmidt AM. Highlighting Diabetes Mellitus: The Diabetes Care. 2011;34(9):1891-1896.
Epidemic Continues. Arterioscler Thromb Vasc Biol.
54. Maldonado MR, Chong ER, Oehl MA,
2018;38(1):e1-e8.
Balasubramanyam A. Economic impact of diabetic
38. Hicks CW, Selvin E. Epidemiology of Peripheral ketoacidosis in a multiethnic indigent population: analysis
Neuropathy and Lower Extremity Disease in Diabetes. Curr of costs based on the precipitating cause. Diabetes Care.
Diab Rep. 2019;19(10):86. 2003;26(4):1265-1269.
39. Cortez M, Singleton JR, Smith AG. Glucose intolerance, 55. Musey VC, Lee JK, Crawford R, Klatka MA, McAdams
metabolic syndrome, and neuropathy. Handb Clin Neurol. D, Phillips LS. Diabetes in urban African-Americans. I.
2014;126:109-122. Cessation of insulin therapy is the major precipitating cause
of diabetic ketoacidosis. Diabetes Care. 1995;18(4):483-
40. Chen R, Ovbiagele B, Feng W. Diabetes and Stroke:
489.
Epidemiology, Pathophysiology, Pharmaceuticals and
Outcomes. Am J Med Sci. 2016;351(4):380-386. 56. Van Zyl DG, Rheeder P, Delport E. Fluid management
in diabetic-acidosis--Ringer’s lactate versus normal saline: a
41. Bădescu SV, Tătaru C, Kobylinska L, et al. The
randomized controlled trial. QJM. 2012;105(4):337-343.
association between Diabetes mellitus and Depression. J
Med Life. 2016;9(2):120-125. 57. Umpierrez G, Korytkowski M. Diabetic emergencies
- ketoacidosis, hyperglycaemic hyperosmolar state and
42. Li W, Huang E, Gao S. Type 1 Diabetes Mellitus and
hypoglycaemia. Nat Rev Endocrinol. 2016;12(4):222-232.
Cognitive Impairments: A Systematic Review. J Alzheimers
Dis. 2017;57(1):29-36. 58. Stenton SL, Kremer LS, Kopajtich R, Ludwig C,
Prokisch H. The diagnosis of inborn errors of metabolism
43. Towler DA, Havlin CE, Craft S, Cryer P. Mechanism
by an integrative “multi-omics” approach: A perspective
of awareness of hypoglycemia. Perception of neurogenic
encompassing genomics, transcriptomics, and proteomics. J
(predominantly cholinergic) rather than neuroglycopenic
Inherit Metab Dis. 2020;43(1):25-35.
symptoms. Diabetes. 1993;42(12):1791-1798.
59. Saudubray JM, Baumgartner MR, Walter JH. Inborn
44. DeRosa MA, Cryer PE. Hypoglycemia and the
Metabolic Diseases Diagnosis and Treatment. 6ª edição.
sympathoadrenal system: neurogenic symptoms are
Springer; 2016.
largely the result of sympathetic neural, rather than
adrenomedullary, activation. Am J Physiol Endocrinol 60. Saudubray JM, Garcia-Cazorla À. Inborn Errors of
Metab. 2004;287(1):E32-41. Metabolism Overview: Pathophysiology, Manifestations,
Evaluation, and Management. Pediatr Clin North Am.
45. Cryer PE. Hypoglycemia, functional brain failure, and
2018;65(2):179-208.
brain death. J Clin Invest. 2007;117(4):868-870.
61. Saudubray JM, Garcia-Cazorla A. An overview of
46. Sugawara E, Kudo Y, Johkura K. [Hypoglycemic
inborn errors of metabolism affecting the brain: from
Hemiplegia]. Brain Nerve. 2017;69(2):101-110.
neurodevelopment to neurodegenerative disorders.
47. Kittah NE, Vella A. Management of endocrine disease: Dialogues Clin Neurosci. 2018;20(4):301-325.
Pathogenesis and management of hypoglycemia. Eur J
62. Ferreira CR, Hoffmann GF, Blau N. Clinical and
Endocrinol. 2017;177(1):R37-R47.
biochemical footprints of inherited metabolic diseases. I.
48. Rehni AK, Dave KR. Impact of Hypoglycemia on Movement disorders. Mol Genet Metab. 2019;127(1):28-30.
Brain Metabolism During Diabetes. Mol Neurobiol.
63. Leão E, Corrêa EJ, Mota JAC, Vianna MB. Pediatria
2018;55(12):9075-9088.
Ambulatorial. 4ª edição. Belo Horizonte: Coopmed; 2005.
64. Pearson TS, Pons R, Ghaoui R, Sue CM. Genetic
mimics of cerebral palsy. Mov Disord. 2019;34(5):625-636.
Capítulo 54 763
65. Frontera JA. Metabolic encephalopathies in the critical 67. Rubinos C, Ruland S. Neurologic Complications
care unit. Continuum (Minneap Minn). 2012;18(3):611-39. in the Intensive Care Unit. Curr Neurol Neurosci Rep.
2016;16(6):57.
66. Berisavac II, Jovanović DR, Padjen VV, et al. How to
recognize and treat metabolic encephalopathy in Neurology
intensive care unit. Neurol India. 2017;65(1):123-128.
Capítulo 54 764
CAPÍTULO 55
TRATAMENTO CIRÚRGICO DO INFARTO
ISQUÊMICO MALIGNO DA ARTÉRIA CEREBRAL
MÉDIA. INDICAÇÕES E LIMITAÇÕES DA
CRANIOTOMIA DESCOMPRESSIVA
Ápio Antunes
Rafael Winter
Marco Stefani
Capítulo 55 765
tecido gliótico: “se a cirurgia for considerada, e do território de perfusão da ACM está comprometido.
realizada, e sua exploração for negativa para tumor Alguns autores preconizam que, se 50% do território
cerebral, e a congelação indicar infarto cerebral de perfusão da ACM estiver acometido e associado
(encefalomalácia), a remoção de áreas necróticas a sinais de isquemia nos núcleos da base, já é o
parece ser benéfica.” suficiente para predizer um comportamento maligno
na evolução12,13. Um volume de área infartada maior
Nos anos 70, Ivamoto et al.4 descreveram 18
do que 145 cm14, visualizado na sequência de
casos da literatura em que a cirurgia descompressiva
difusão nos exames de imagem, é outro preditor de
havia sido indicada para o tratamento da isquemia
um infarto maligno15,16.
cerebral associada a edema e efeitos compressivos
a estruturas vizinhas, com uma mortalidade de
39%. Até então, o tratamento preconizado nesses
HEMICRANIECTOMIA DESCOMPRESSIVA
pacientes era conservador.
O principal objetivo da cirurgia é remover
Quanto maior o território cerebral acometido,
uma parte da calota craniana, no lado acometido,
maior a lesão celular e maior o edema resultante. De
permitindo a expansão do cérebro isquêmico e
todas as artérias intracranianas, a artéria cerebral
edemaciado evitando o comprometimento de áreas
média (ACM) é responsável pela perfusão da maior
ainda viáveis de tecido cerebral, potencialmente
área dentro de um hemisfério. A condição mais
prejudicadas por uma diminuição da perfusão,
grave envolvendo o comprometimento de todo o
consequência do aumento da pressão intracraniana
território da artéria cerebral média é denominada
e herniação cerebral. Como tal, isso poderia levar
"infarto maligno" e se manifesta com uma síndrome
ao restabelecimento da oxigenação do tecido ainda
caracterizada por hemiparesia/hemiplegia, desvio
saudável17.
do olhar conjugado e sinais corticais superiores,
seguidos de cefaleia, vômitos, edema papilar e Gupta et al.12, em uma metanálise publicada em
depressão da consciência5,6. 2004, identificaram a idade como maior fator preditivo
de um pior prognóstico funcional nos pacientes
Essa deterioração neurológica, após as
submetidos a hemicraniectomia descompressiva.
primeiras horas do ictus, é devida a edema cerebral
Zaho et al.18, em 2012, e Jüttler et al.19, em 2014,
difuso. A elevada taxa mortalidade desses pacientes
concluiram que, em pacientes com idade entre 60
(80%) é consequente da herniação transtentorial,
e 80 anos, a hemicraniectomia reduzia também a
decorrente de uma importante elevação na pressão
taxa de mortalidade às custas de um prognóstico
intracraniana, normalmente, acima de 30 mmHg7-10.
funcional desfavorável. Outros fatores como escala
A incidência anual desta condição é de 10 a de Glasgow na admissão, deterioração neurológica
20 por 100.000 pessoas, sendo os pacientes mais nas primeiras horas e envolvimento de outros
jovens mais suscetíveis, devido à diminuição do territórios vasculares, também são descritos como
espaço potencialmente compensatório dentro da preditivos de um pior prognóstico funcional17,20-22.
cavidade intracraniana5,11.
Ensaios clínicos randomizados, DESTINY13,
HAMLET23 e DECIMAL24, publicados a partir de 2007,
comprovaram a clara diminuição na mortalidade
OCLUSÃO DA ARTÉRIA CEREBRAL dos pacientes submetidos a hemicraniectomia
MÉDIA: FATORES PREDITORES DE
descompressiva. Entretanto, a melhora funcional
EVOLUÇÃO
desses pacientes não foi esclarecida, visto critérios
Nem toda isquemia devido à oclusão da
distintos terem sido utilizados (mRs 3 ou 4).
ACM irá evoluir de forma grave. O infarto maligno
caracteriza-se por uma definição radiológica onde 2/3 Em 2007, foi publicado o estudo, atualizado
Capítulo 55 766
em 2009 com os dados finais do HAMLET, que et al., avaliando todos os estudos disponíveis na
analisou os resultados destes três ensaios clínicos literatura até então, não confirmaram a hipótese
de forma agrupada. Foram analisados 109 pacientes de que a descompressão cirúrgica realizada mais
com idade entre 18 e 60 anos, com infarto da ACM tardiamente estava associada a uma mortalidade
tratados em até 48h do início dos sintomas. O maior ou a um pior prognóstico12,25.
objetivo era analisar 3 fatores: a) escala de Rankin
Com relação ao hemisfério cerebral
modificada em 1 ano, dicotomizada entre favorável
acometido, dados da literatura não contraindicam a
(0-4) e desfavorável (5 e morte), b) escala de
cirurgia quando o lado infartado for o dominante. O
Rankin modificada dicotomizada entre favorável (0-
prognóstico funcional não difere uma vez que a afasia
3) e desfavorável (4 - morte); e c) mortalidade em
normalmente não é completa mesmo em pacientes
1 ano. A redução do risco absoluto com relação à
com infarto maligno ou esta não é mais incapacitante
mortalidade foi de 49,9% nos pacientes submetidos
que os sintomas gerais resultados de uma isquemia
a hemicraniectomia descompressiva comparada ao
maligna do hemisfério não dominante12,13,23,24,28,29,.
tratamento conservador. Com relação ao prognóstico
funcional (escala de Rankin modificada), houve uma Em 2020, Goedemans et al.30, avaliando
desfavorável (mRs 5 e morte). Entretanto, quando concluiram que o prognóstico não era diferente
comparado um melhor prognóstico funcional (mRs daqueles operados até 48h, conforme preconizado
0 – 3) com um desfavorável (mRs 4 – morte), não nos ensaios randomizados publicados 13,23,24
sejam melhores para esta avaliação, ainda é motivo estudo que avaliou os fatores do pós-operatório
de discussão. Entretanto, quando pacientes e/ou relacionados com um melhor prognóstico funcional.
optariam novamente pelo procedimento realizado, realizadas após 24h do procedimento, os fatores
a maior parte afirma que sim, independentemente para um melhor prognóstico funcional foram: 1)
Capítulo 55 767
Critérios de inclusão TÉCNICA CIRÚRGICA
• NIH > 15; O paciente é posicionado em decúbito dorsal,
dorsal lateralizado ou lateral, a cabeça é fixada
• sinais neurológicos clínicos de oclusão horizontalmente, paralela ao chão. Uma incisão
da ACM maligno: hemiparesia completa frontotêmporo-occipital, tipo question mark, extensa
contralateral à lesão, desvio conjugado do
é marcada, levando em consideração o tragus, na
olhar, distúrbio da linguagem, heminegli-
porção temporal, o opistocrânio (ponto occipital de
gência;
maior diâmetro a partir da glabela), posteriormente,
• idade ≤ 60 anos (acima de 60 anos a deci- a linha média, correspondente à sutura sagital,
são deve ser individualizada; e e o início da linha de implantação do cabelo,
anteriormente (Figura 3).
• TC de crânio evidenciando hipodensidade
córtico subcortical > 50% do território da Um artigo publicado por Lyon et al.33, em 2019,
ACM. sugere uma abordagem modificada com relação a
incisão na pele. Diferentemente do habitual, a incisão
Critérios de exclusão é realizada até 2 cm posterior a orelha e 1cm acima
• outras doenças incapacitantes associadas do seio transverso, na linha do zigoma (evitando
(músculo esqueléticas, neurológicas, clíni- estender-se até o tragus). Segundo os autores,
cas); isso mantém a possibilidade de uma craniectomia
com as dimensões mínimas de 12 cm de diâmetro,
• doença terminal;
sem a necessidade de dissecar a artéria temporal
• condições clínicas com elevado risco de superficial, evitando sua lesão acidental.
mortalidade cirúrgica (distúrbios da coa-
A pele é incisada em plano único até o nível do
gulação, instabilidade hemodinâmica); e
osso. Um retalho miocutâneo é dissecado e descolado
• sinais de deterioração neurológica grave anteriormente ao crânio até próximo ao tragus,
no momento da cirurgia (midríase paralí- onde a artéria temporal superficial é identificada e
tica uni ou bilateral, sinais de extensão ou preservada (ramo frontal e parietal) (Figura 4).
flexão patológicas).
Trepanações são realizadas para que a
São realizadas tomografias de crânio a
craniectomia tenha no mínimo 12 cm de diâmetro
cada 12h nos pacientes candidatos a craniotomia
(12 x 15 cm)34 (Figura 5) e seja feita da forma
descompressiva, até completar 48h da admissão
mais segura. Conforme Tanrikulu et al.35, uma
hospitalar
craniectomia maior não é mais eficaz em diminuir a
pressão intracraniana. Não existe uma quantidade
mínima de trepanações, mas o cirurgião deve levar
INDICAÇÃO PARA HEMICRANIECTOMIA
DESCOMPRESSIVA em conta alguns aspectos: evitar distâncias muito
grandes entre duas trepanações subsequentes, na
• deterioração neurológica; e
linha média, trepanar 2 cm lateralmente à sutura
• presença de alteração na TC de crânio, sagital, uma trepanação sobre a sutura coronal para
que sugira um comportamento maligno facilitar o descolamento da meninge aderida nesta
(aumento da hipodensidade e/ou sinais de região, uma trepanação parietal, no ponto médio
efeito expansivo). entre a trepanação frontal e occipital, uma temporal
e uma logo abaixo da linha temporal superior e a
frente do ptérion (Figura 6).
Capítulo 55 768
Figura 3: A. Marcações. B. 1) tragus, 2) zigoma, 3) opistocrânio, 4) sutura sagital – linha média.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 55 769
Figura 5: A-D. Craniectomia com no mínimo 12 cm de diâmetro (12 x 15 cm).
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 6: A, B. 1) trepanação temporal, 2) frontal sobre a sutura coronal, 3) occipital, 4) uma parietal, abaixo da linha
temporal superior, e X) a frente do ptérion.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 55 770
O descolamento da dura-máter é realizado (sem o fechamento da dura-máter) comparada à
com auxílio de dissectores curvos, em movimentos duroplastia, não está associada a um maior número
circulares, com a força sendo exercida em direção de complicações, além de tornar o procedimento
ao osso. Procede-se ao levantamento do retalho mais rápido36-38. O benefício da duroplastia pode
ósseo, continuando o restante do descolamento até estar em um segundo momento, na cranioplastia,
a separação completa da dura-máter em relação ao ou na reposição do retalho ósseo, por acrescentar
crânio (Figura 7). uma camada entre o parênquima cerebral e o
tecido miocutâneo, facilitando a dissecção e
reduzindo o tempo operatório . Apesar de alguns
trabalhos sugerirem não haver diferença39, são
necessários estudos maiores e estatisticamente
mais significativos para responder a essa dúvida.
Capítulo 55 771
perpendicular à linha média na região do flanco suporte ósseo e à ação da pressão atmos-
abdominal. férica diretamente sobre o couro cabeludo,
há compressão sobre o parênquima cere-
Alternativamente, tem sido proposta uma bral subjacente podendo resultar em uma
técnica em que o retalho ósseo é mantido fixo ao diminuição da perfusão ou, até mesmo,
crânio, através de uma placa em formato de “Y”, herniação cerebral contralateral, levando
na linha média, criando um tipo de dobradiça. a uma deterioração do quadro neurológi-
Outras duas placas são presas apenas no retalho co51; e
ósseo para evitar um afundamento após a redução
• crises convulsivas e epilepsia14.
da pressão intracraniana, evitando-se assim a
necessidade de um segundo procedimento para
reconstrução do defeito ósseo40-45. Kenning et
CONCLUSÃO
al.46, encontraram um aumento na mortalidade
intrahospitalar dos pacientes submetidos a essa A craniotomia descompressiva, descrita ainda
técnica, embora o procedimento tenha resultado no século XIX para o tratamento do traumatismo
em menos complicações transoperatórias e a um cranioencefálico em pacientes que apresentassem
prognóstico funcional melhor a longo prazo. fratura de crânio e sinais de deterioração neurológica,
teve seu conceito associado à hipertensão
intracraniana apenas no século XX.
Capítulo 55 772
6. Heiss WD. Malignant MCA Infarction: Pathophysiology 22. Uhl E, Kreth FW, Elias B, et al. Outcome and prognostic
and Imaging for Early Diagnosis and Management factors of hemicraniectomy for space occupying cerebral
Decisions. Cerebrovasc Dis. 2016;41(1-2):1-7. infarction. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2004;75(2):270-
274.
7. Hacke W, Schwab S, Horn M, Spranger M, De Georgia
M, von Ku mmer R. ‘Malignant’ middle cerebral artery 23. Hofmeijer J, Kappelle LJ, Algra A, et al. Surgical
territory infarction: clinical course and prognostic signs. Arch decompression for space-occupying cerebral infarction (the
Neurol. 1996;53(4):309-315. Hemicraniectomy After Middle Cerebral Artery infarction
with Life-threatening Edema Trial [HAMLET]): a multicentre,
8. Moulin DE, Lo R, Chiang J, Barnett HJ. Prognosis in
open, randomised trial. Lancet Neurol. 2009;8:326–333.
middle cerebral artery occlusion. Stroke. 1985;16(2):282-
284. 24. Vahedi K, Vicaut E, Mateo J, et al. Sequential-
Design, Multicenter, Randomized, Controlled Trial of Early
9. Saito I, Segawa H, Shiokawa Y, Taniguchi M, Tsutsumi
Decompressive Craniectomy in Malignant Middle Cerebral
K. Middle cerebral artery occlusion: correlation of computed
Artery Infarction (DECIMAL trial). Stroke. 2007;38:2506–
tomography with clinical outcome. Stroke. 1987;18:863-868.
2517.
10. Scarcella G. Encephalomalacia simulating the clinical
25. Vahedi K, Hofmeijer J, Juettler E, et al. Early
and radiological aspects of brain tumor; a report of 6 cases.
decompressive surgery in malignant infarction of the middle
J Neurosurg. 1956;13(4):278-292.
cerebral artery: a pooled analysis of three randomised
11. Treadwell SD, Thanvi B: Malignant middle cerebral controlled trials. Lancet Neurol. 2007;6(3):215-222.
artery (MCA) infarction: pathophysiology, diagnosis and
26. Rahme R, Zucarello M, Kleindorfer D, Adeoye OM,
management. Postgrad Med J. 2010;86:235–242.
Ringer AJ. Decompressive hemicraniectomy for malignant
12. Gupta R, Connolly S, Mayer S, Elkind MSV. middle cerebral artery territory infarction: is life worth living?
Hemicraniectomy for massive middle cerebral artery territory J Neurosurg. 2012;117(4):749-754.
infarction: a systematic review. Stroke. 2004;35(2):539-43.
27. Vahedi K, Benoist L, Kurtz A, et al. Quality of life
13. Jüttler E, Schwab S, Schmiedek P, et al. Decompressive after decompressive craniectomy for malignant middle
Surgery for the Treatment of Malignant Infarction of the cerebral artery infarction. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
Middle Cerebral Artery (DESTINY): a randomized, controlled 2005;76(8):1181-1182.
trial. Stroke. 2007;38(9):2518-2525.
28. Woertgen C, Erban P, Rothoerl RD, Bein T, Brawanski A.
14. Brondani R, de Almeida AG, Abrahim CP, et al. High Quality of life after decompressive craniectomy in patients
Risk of Seizures and Epilepsy after Decompressive suffering from supratentorial brain ischemia. Acta Neurochir.
Hemicraniectomy for Malignant Middle Cerebral Artery 2004;146:691–695.
Stroke Cerebrovasc Dis Extra. 2017;7(1):51-61.
29. Kastrau F, Wolter M, Huber W, Block F. Recovery from
15. Oppenheim C,Samson Y, Manaï R, et al. Prediction aphasia after hemicraniectomy for infarction of the speech-
of malignant middle cerebral artery infarction by di! usion- dominant hemisphere. Stroke. 2005;36(4):825-829.
weighted imaging. Stroke. 2000;31:2175–2181.
30. Goedemans T, Verbaan D, Coert BA, et al. Outcome
16. Thomalla GJ, Kucinski T, Schoder V, et al. Prediction After Decompressive Craniectomy for Middle Cerebral
of malignant middle cerebral artery infarction by early Artery Infarction: Timing of the Intervention. Neurosurgery.
perfusion- and difusion-weighted magnetic resonance 2020;86(3):E318-E325.
imaging. Stroke 2003;34:1892–1899.
31. Fatima N, Razzaq S, El Beltagi A, Shuaib A, Saqqur
17. Huttner HB, Schwab S. Malignant middle cerebral artery M. Decompressive Craniectomy: A Preliminary Study of
infarction: clinical characteristics, treatment strategies, and Comparative Radiographic Characteristics Predicting
future perspectives. Lancet Neurol. 2009;8(10):949-958. Outcome in Malignant Ischemic Stroke. World Neurosurg.
2020;133:e267-e274.
18. Zhao J, Su YY, Zhang Y, et al. Decompressive
hemicraniectomy in malignant middle cerebral artery infarct: 32. Bongiorni GT, Hockmuller MCJ, Klein C, Antunes ACM.
a randomized controlled trial enrolling patients up to 80 Decompressive craniotomy for the treatment of malignant
years old. Neurocrit Care. 2012;17(2):161-171. infarction of the middle cerebral artery: mortality and
outcome. Arq Neuropsiquiatr. 2017;75(7):424-428.
19. Jüttler E, Unterberg A, Woitzik J, et al. Hemicraniectomy
in older patients with extensive middle-cerebral-artery 33. Lyon KA, Patel NP, Zhang Y, Huang JH, Feng D.
stroke. N Engl J Med. 2014;370(12):1091-1100. Novel Hemicraniectomy Technique for Malignant Middle
Cerebral Artery Infarction: Technical Note. Oper Neurosurg
20. Mori K, Nakao Y, Yamamoto T, Maeda M. Early external
(Hagerstown). 2019;17(3):273-276.
decompressive craniectomy with duroplasty improves
functional recovery in patients with massive hemispheric 34. Jiang JY, Xu W, Li WP, et al. Efficacy of standard
embolic infarction: timing and indication of decompressive trauma craniectomy for refractory intracranial hypertension
surgery for malignant cerebral infarction. Surg Neurol. with severe traumatic brain injury: a multicenter,
2004;62:420–429. prospective, randomized controlled study. J Neurotrauma.
2005;22(6):623-628.
21. Schwab S, Steiner T, Aschoff A, et al. Early
hemicraniectomy in patients with complete middle cerebral
artery infarction. Stroke. 199;29(9):1888-1893.
Capítulo 55 773
35. Tanrikulu L, Oez-Tanrikulu A, Weiss C, et al. The 45. Kenning TJ, Gandhi RH, German JW. A comparison
bigger, the better? About the size of decompressive of hinge craniotomy and decompressive craniectomy
hemicraniectomies. Clin Neurol Neurosurg. 2015;135:15-21. for the treatment of malignant intracranial hypertension:
early clinical and radiographic analysis. Neurosurg Focus.
36. Vieira E, Guimarães TC, Faquini IV, et al. Randomized
2009;26(6):E6.
controlled study comparing 2 surgical techniques for
decompressive craniectomy: with watertight duraplasty 46. Kenning TJ, Gooch MR, Gandhi RH, Shaikh MP, Boulos
and without watertight duraplasty. J Neurosurg. AS, German JW. Cranial decompression for the treatment
2018;129(4):1017-1023. of malignant intracranial hypertension after ischemic
cerebral infarction: decompressive craniectomy and hinge
37. Frank JI, Schu mm LP, Wroblewski K, et al.
craniotomy. J Neurosurg. 2012;116(6):1289-1298.
Hemicraniectomy and durotomy upon deterioration from
infarction-related swelling trial: randomized pilot clinical trial. 47. Cooper DJ, Rosenfeld JV, Murray L, et al.
Stroke. 2014;45(3):781-787. Decompressive craniectomy in diffuse traumatic brain injury.
N Engl J Med. 2011;364(16):1493–1502.
38. Moringlane RB, Keric N, Freimann FB, et al.
Efficacy and safety of durotomy after decompressive 48. Flint AC, Manley GT, Gean AD, Hemphill JC 3rd,
hemicraniectomy in traumatic brain injury. Neurosurg Rev. Rosenthal G. Post-operative expansion of hemorrhagic
2017;40(4):655-661. contusions after unilateral decompressive hemicraniectomy
in severe traumatic brain injury. J Neurotrauma.
39. Güresir E, Vatter H, Schuss P, et al. Rapid closure
2008;25(5):503-512.
technique in decompressive craniectomy. J Neurosurg.
2011;114(4):954-960. 49. Fung C, Murek M, Z’Graggen WJ, et al. Decompressive
hemicraniectomy in patients with supratentorial intracerebral
40. Goettler CE, Tucci KA. Decreasing the morbidity of
hemorrhage. Stroke. 2012;43(12):3207–3211.
decompressive craniectomy: the Tucci flap. J Trauma.
2007;62(3):777-778. 50. Kurland DB, Khaladj-Ghom A, Stokum JA, et al.
Complications Associated with Decompressive Craniectomy:
41. Khoo JC. Replacement of a self-adjusting bone flap.
A Systematic Review. Neurocrit Care. 2015;23(2):292-304.
Technical note. J Neurosurg. 1976;45(5):589-591.
51. Honeybul S, Ho KM. Long-term complications of
42. Ko K, Segan S. In situ hinge craniectomy. Neurosurgery.
decompressive craniectomy for head injury. J Neurotrauma.
2007;60(4):255-258.
2011;28(6):929–935.
43. Schmidt JH 3rd, Reyes BJ, Fischer R, Flaherty SK. Use
of hinge craniotomy for cerebral decompression. Technical
note. J Neurosurg. 2007;107(3):678-682.
44. Hsu YC, Huang APH, Xiao FR, Kuo LT, Tsai JC, Lai
DM. Decompressive Cranioplasty (Osteoplastic Hinged
Craniectomy): A Novel Technique for Increased Intracranial
Pressure-Initial Experience and Outcome. World Neurosurg.
2019:S1878-8750(18)32935-32938.
Capítulo 55 774
CAPÍTULO 56
TRAUMATISMO CRÂNIO-ENCEFÁLICO GRAVE.
PAPEL DA CRANIOTOMIA DESCOMPRESSIVA
Ápio Claudio Martins Antunes com manitol ou solução salina hipertônica, e terapia de
supressão metabólica com barbituratos. A hipertensão
Marco Antonio Stefani
intracraniana também pode ser tratada cirurgicamente,
consequente lesão cerebral traumática (LCT) – pode tarde no curso do paciente – tipicamente para tratar a
ocorrer quando a cabeça atinge, ou é atingida por um elevação da PIC refratária a outros tratamentos.
A rápida avaliação da situação clínica e o início dias de permanência na UTI, podendo ser utilizada como
Capítulo 56 775
Figura 1A – Craniotomia Descompressiva para hematoma subdural agudo; figura B. Corte tomográfico pré-operatório;
C. pós-operatório imediato de craniotomia descompressiva mostrando a drenagem do hematoma e a reversão do
desvio de linha média.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 56 776
tamanho e com recolocação do retalho ósseo. seio e a foice são divididos com tesoura.
Desde o relato seminal de Kocher, em 1901, o uso
Nos anos subsequentes às décadas de 60 a
de CD grande tem sido sugerido como opção, em
80, a técnica de CD foi questionada e os poucos
casos selecionados, para pacientes com pressão
artigos relacionados da época relatam mortalidade
intracraniana elevada após TCE, onde o alívio da
variando entre 46 a 96%, provocando o abandono
pressão não poderia ser alcançado apenas pela
do seu uso rotineiro na maioria dos centros
trefinação. Esta estratégia também era adotada
mundiais6. A possibilidade de acentuada morbidade
por Harvey Cushing: em 1908, ele descreveu a CD
nos sobreviventes foi sugerida, em 1975, por Venes
subtemporal para as complicações intracranianas
e Collins, em uma análise retrospectiva de 13
associadas a fraturas cranianas, com redução de
pacientes submetidos à CD bifrontal primária para
mortalidade comparativamente a casos, nas quais
o tratamento do edema cerebral pós-traumático,
não foi realizada, dado que foi referendado em
apesar da diminuição significativa na mortalidade7.
séries subsequentes surgidas a partir da segunda
Já a experiência de Cooper e seu grupo, com 50
guerra mundial e das guerras da Coreia e Vietnã3.
pacientes, parecia estabelecer o fim da CD como
A evolução da hemicraniectomia teria uma prática padrão para limitar a hipertensão
representado o meio mais popular de CD por vários intracraniana ligada ao edema cerebral no TCE grave,
anos. Ransohoff et al. relataram sua experiência em com taxa total de sobrevivência de 10% e de 4%
trinta e cinco pacientes com hematoma subdural de recuperação funcional, sem nenhuma correlação
agudo unilateral associado a contusões e lacerações com a sobrevida e a idade do paciente, estado
cerebrais subjacentes predominantemente neurológico pré-operatório, achados angiográficos e
unilaterais. A técnica de hemicraniectomia de aparência transoperatória do cérebro8.
Ransohoff propunha um retalho de pele e periósteo
A técnica voltou a ganhar popularidade nas
estendido da glabela ao longo da linha média,
décadas de 70 e 80, como alternativa quando todas
terminando 4 cm acima da protuberância occipital
as tentativas clínicas para redução da hipertensão
externa, com extensão lateral ao nível do seio
intracraniana tivessem falhado9. Nos anos
transverso4. Uma craniotomia frontoparietal,
subsequentes, a CD ampla unilateral ou bifrontal
occipital e temporal revelava quase toda a superfície
foi sendo adotada por alguns centros, mas o
do hemisfério, sendo o retalho ósseo descartado ou
assunto permaneceu sem consenso, sendo apenas
colocado em banco de ossos quando disponível. A
brevemente mencionada nas diretrizes do manejo
dura-máter seria amplamente aberta e articulada na
do TCE grave, publicadas em 2000 pela American
inserção do seio sagital superior.
Association of Neurological Surgeons (AANS),
A craniectomia bifrontal, relatada por Kjellberg em uma compilação de estudos científicos sobre
e Prieto, em 1971, foi realizada em 50 pacientes trauma grave classificados de acordo com o grau
com TCE, descrita com um orifício trepanado sobre de evidências10. A CD foi classificada como medida
o seio frontal, orifícios na porção zigomática do osso de segunda opção para tratamento da HIC, atrás
frontal na inserção anterior do músculo temporal, um de outras medidas conservadores neurointensivas,
orifício de trépano 1 cm posterior à sutura coronal na principalmente devido à ausência de ensaios clínicos
linha média e dois orifícios lateralmente na região randomizados que tratassem especificamente desta
temporal, seguindo o plano coronal . Estes buracos
5
técnica. Recentemente, estudos têm avaliado a
são conectados por uma serra e o osso frontal é eficácia da CD quando aplicada precocemente
removido, normalmente em duas metades. A dura- em pacientes vítimas de TCE grave e com HIC,
máter é incisada bilateralmente acima das cristas mostrando resultado superior sobre a aplicação
supraorbitais até o seio sagital anteriormente e o tardia ou quando comparada às medidas clínicas
Capítulo 56 777
específicas (coma barbitúrico e hipotermia) 11. do DECRA publicaram os dados dos resultados de
12 meses do seu estudo que foram semelhantes aos
A relação entre CD secundária e resultado
observados aos 6 meses13. Aos 12 meses, houve
neurológico após TCE grave foi investigada em muitos
uma tendência a piores resultados funcionais no
estudos; no entanto, 2 RCTs fornecem a melhor
grupo de craniectomia (OR 1,68; IC 95% 0,96-2,93;
evidência atualmente disponível. Os dois estudos
P = 0,07), embora esses resultados não tenham sido
são DECRA12,13 e RESCUEicp14,15, ambos fornecendo
estatisticamente significativos. Uma análise post hoc
evidência de classe I.
exploratória observou que entre os sobreviventes
após a craniectomia, houve menor quantidade de
bons resultados (OR 0,33; IC 95% 0,12-0,91; P =
DECRA
0,03) e mais pacientes vegetativos (OR 5,12; IC
O ensaio clínico australiano e neo-zelandês
95% 1,04-25,2; P = 0,04).
DECRA, publicado em 2011, comparou os
resultados de 155 pacientes com lesão cerebral
difusa e hipertensão intracraniana (acma de 20
RESCUEicp
mmHg sustentada por 15 min) refratária a medidas
No ensaio clínico RESCUEicp foram
de neurointensivismo de primeira linha nas primeiras
comparados os resultados de pacientes que
72h tratados com CD bifronto-temporal precoce com
receberam CD como tratamento de resgate para
aqueles tratados com manejo clínico exclusivo,
elevação de PIC acima de 25 mmHg por 1 a 12h
excluindo-se pacientes com lesões expansivas
até o décimo dia de internação, com aqueles com
intracranianas. Foram utilizados três métodos
mesmas características que receberam manejo
primários para comparação: 1) comparação das
neurointensivo conservador apenas15. Enquanto o
diferenças dos grupos no controle da PIC, dias de
desenho do DECRA teve como objetivo os efeitos
ventilação mecânica, dias em unidade de terapia
da CD aplicada aos estágios iniciais da hipertensão
intensiva (UTI) e mortalidade; 2) pontuação mediana
intracraniana de difícil controle, o estudo europeu
de cada grupo na escala estendida de desfechos
RESCUEicp estudou pacientes com resistência à
de Glasgow (GOS-E) de 8 itens para calcular as
lesão mais estabelecida. O desenho deste estudo
chances de piores resultados; e 3) dicotomização da
diferiu do estudo DECRA, pois foi tolerada a
escala GOS-E de 8 itens para calcular as chances
elevação da ICP por um período mais longo antes
de resultados desfavoráveis12.
da inclusão, além de ter sido planejado para estudar
No desfecho primário avaliado após 6 meses, pacientes com lesões expansivas intracranianas e
o grupo CD tinha valores menores de PIC, menos submetidos a descompressões laterais. O limiar de
dias em ventilação mecânica e de UTI, sem nenhuma tratamento da PIC foi mais alto e a duração do tempo
diferença entre os grupos para mortalidade. A razão acima desse limiar foi maior no RESCUEicp do que
de chances não ajustada (OR) para piores resultados no DECRA. Apesar destas diferenças, o estudo
no grupo CD foi de 1,84 (IC 95% 1,05-3,24), P = 0,03 acabou envolvendo predominantemente pacientes
usando-se a pontuação média para cada grupo do com lesões difusas, e embora o protocolo admitisse
GOS-E medido em 6 meses após a lesão (3: com descompressões unilaterais, a maioria dos pacientes
CD, 4: sem CD), porém após o ajuste estatístico, foi submetida à descompressão bifrontal, tornando
o OR não era mais significativo(1-4 vs 5-8). As os pacientes incluídos muito semelhantes a aqueles
chances não ajustadas e ajustadas de resultados incluídos no DECRA. O RESCUEicp usou 2 métodos
desfavoráveis foram significativamente maiores de comparação: 1) as diferenças de grupo no controle
no grupo CD, quando se empregou a pontuação de PIC, mortalidade e distribuição das classificações
dicotomizada. Mais recentemente, os investigadores GOS-E; e 2); dicotomização da escala GOS-E de
Capítulo 56 778
8 itens para comparar os resultados favoráveis e magnitudes menores e os valores P tornaram-se não
desfavoráveis entre os grupos. Foi observada, neste significativos aos 12 meses. No entanto, isso é mais
grande ensaio clínico, uma taxa de mortalidade 22% bem interpretado como uma redução na magnitude
menor no grupo de CD que no grupo de manejo dos danos associados à CD14.
clínico, porém com maior taxa de pacientes que
apresentaram como desfechos estado vegetativo,
deficiência grave e deficiência grave (pontuações na TÉCNICA CIRÚRGICA
GOS-E 2, 3 e 4, respectivamente) nas avaliações A decisão de realizar uma hemicraniectomia
6 meses após a lesão (desfecho primário). Usando bifrontal ou unilateral primária deve ser feita baseada
a pontuação dicotomizada (1-3 contra 4-8) diferente na presença, localização e extensão das lesões
daquela usada no DECRA, 42,8% dos pacientes de massa (extra-axiais ou intraparenquimatosas),
no grupo CD tiveram resultados favoráveis contra lesões penetrantes e desvio da linha média. Em
34,6% dos pacientes no grupo sem CD (P = 0,12). casos de edema cerebral difuso sem lesão de
As variáveis analisadas em 12 meses (desfecho massa ou desvio da linha média, uma CD secundária
secundário) também resultaram em desfechos unilateral ou bifrontal do hemisfério não dominante
favoráveis estatisticamente significativos, com pode ser usada. Caso contrário, o lado com maior
45,4% dos pacientes no grupo CD com resultados volume de lesão ou edema cerebral é escolhido para
favoráveis comparado a 32,4% dos pacientes no descompressão unilateral. Ocasionalmente, o lado
grupo sem CD (P = 0,01). Se utilizada a mesma não dominante é selecionado para descompressão
dicotomização do estudo DECRA, que considerava unilateral em pacientes com sinais mínimos ou não
desfecho bom uma pontuação maior que 5 (o que é lateralizantes16.
aceito pela maioria dos autores, visto que no escore 4
os pacientes são dependentes para suas atividades
de vida diária), as diferença entre os grupos seriam HEMICRANIECTOMIA UNILATERAL
muito menos pronunciadas aos 6 meses (14,1% vs O procedimento é realizado após infiltração da
12,8% de 389 pacientes avaliados), fato observado pele com lidocaína a 1% com vasoconstritor e uma
da mesma forma aos 12 meses (16,6% contra 13,6% incisão ampla que começa 1 cm à frente do tragus,
em 373 pacientes avaliados). na altura da borda superior do arco zigomático,
Os estudos DECRA e RESCUEicp foram estendendo-se posteriormente acima da orelha,
consistentes em demonstrar que a CD reduz a em direção superior na região parieto-occipital,
PIC e a duração do tratamento intensivo, mas curvando-se para frente e correndo próximo à linha
ambos também detectaram um aumento na taxa de média até a linha do cabelo na região frontal. Após
desfechos ruins na GOS-e (pontuação de 2 a 4) com o afastamento do retalho único galeo-periostal e da
uso de CD. Os achados relacionados à mortalidade incisão (com cautério) e rebatimento da musculatura
foram diferentes entre os estudos, com um benefício da região temporal realiza-se uma craniotomia
de mortalidade observado no RESCUEicp, mas utilizando craniótomo ou serra de Gigli com abertura
nenhum no DECRA. Embora tenha usado uma no limite da fossa anterior e do assoalho da fossa
medida de resultado secundário com um esquema temporal, procurando manter uma distância de um
de dicotomização mais generoso, os dados de centímetro da linha média (Figura 2). O retalho
12 meses no RESCUEicp parecem indicar que de partes moles deve ser reparado com pinças
os benefícios da descompressão continuam a hemostáticas ou clipes de couro cabeludo e enrolado
melhorar além do período de teste pré-especificado em uma compressa quando rebatido inferiormente.
de seis meses. Este mesmo efeito é sugerido A hemicraniectomia é realizada a partir da retirada
no estudo DECRA, uma vez que os ORs tiveram de parte da calota craniana desde a fossa temporal
Capítulo 56 779
em direção ao arco zigomático, estendendo-se clipes. Uma craniotomia utilizando craniótomo ou
dorsalmente a uma linha que conecta o tragus ao serra de Gigli com abertura no limite do assoalho
astério, respeitando os limites horizontais do crânio da fossa craniana anterior, estendida ao assoalho
na região parietal superior. É importante que a da fossa temporal bilateralmente limitado pelo bordo
craniotomia tenha um tamanho grande, não inferior superior do arco zigomático e posteriormente até a
a 12 x 15 cm ou com 15 cm de diâmetro e que altura do vértex na altura da sutura coronal (Figura
propicie a descompressão do lobo temporal junto ao 4). Da mesma forma, é importante que a craniotomia
assoalho da fossa temporal (Figura 3). tenha um tamanho grande, não inferior a 12 x 15
cm ou com 15 cm de diâmetro e que propicie a
Na técnica clássica, o retalho ósseo retirado
descompressão dos lobos frontal e temporal junto
deve ser armazenado para posterior reconstrução da
à base craniana da região frontotemporal. O retalho
calota craniana com utilização de enxerto autólogo.
ósseo retirado igualmente deve ser armazenado
Para isso, pode-se armazenar o osso em congelador
para posterior reconstrução da calota craniana com
específico dentro de uma rotina estabelecida e
utilização de enxerto autólogo, seja em banco de osso
validada institucionalmente para manejo de ossos
ou sepultado no tecido subcutâneo. A dura-máter é
armazenados, técnica muitas vezes questionada
aberta junto à base da craniotomia bilateralmente,
devido ao risco teórico de aumento da taxa de
sem necessidade de seccionar o seio e a foice.
contaminação assim como do seu custo elevado.
Outra opção muito utilizada é a implantação do A dura-máter em ambas as técnicas é
retalho ósseo no plano subcutâneo abdominal, reconstituída com retalho de galea aponeurótica e
porém com maior chance de reabsorção óssea, o retalho de partes moles é fechado com pontos de
além da manipulação cirúrgica adicional. A técnica ancoragem subcutânea seguidos de sutura contínua
do retalho de Tucci retorna o osso craniano removido ou separada da pela. O curativo deve ser pensado
ao local da craniotomia, ancorado parcialmente de forma a não provocar compressão sobre o retalho
nas bordas superiores por miniplacas de titânio e, e um grande aviso de que se trata de uma área sem
embora resulte em significativa descompressão, osso deve ser fixado sobre ele.
pode limitar o espaço para expansão cerebral ganho
na craniotomia, além de acarretar dificuldades no
fechamento dos tecidos moles superficiais. A dura- CONCLUSÃO
máter é aberta de forma curvilínea acompanhando O uso da CD no TCE vem mostrando
a borda inferior da craniotomia e a base craniana, resultados promissores, porém muitos pontos ainda
deixando-se uma margem para sutura do enxerto na necessitam de esclarecimento. Estudos futuros
plastia dural se for o caso. Alternativamente pode são necessários para orientar o tratamento e
ser aberta de forma radial com 3 ou 4 incisões, a evitar intervenções fúteis, estudando o prognóstico
partir do centro. dos pacientes, estratificado por características
individuais e incluindo variáveis como idade,
comorbidades, trauma associado, pontuação na
CRANIOTOMIA BIFRONTAL ECG após reanimação, reação pupilar, duração
Após infiltração da pele com lidocaína a 1% da hipertensão intracraniana e tempo de baixa
com vasoconstritor e uma incisão bicoronal ampla pressão de perfusão cerebral, avaliação de imagens
que começa 1 cm à frente do trágus na altura da (pontuação de Marshall, Rotterdam e Helsinque),
borda superior do arco zigomático, estendendo- entre outras. Uma pontuação de prognóstico pode
se superiormente em sentido coronal, rebatendo ser construída a partir dessas variáveis, vindo a
o retalho cutâneo após hemostasia com pinças ou constituir uma ferramenta valiosa no processo
Capítulo 56 780
Figura 2: Esquema de planejamento de craniotomia descompressiva projetado sobre vista lateral de um crânio.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 3: Preparação anatômica simulando uma craniotomia descompressiva mostrando os limites inferiores (setas)
junto à base do temporal.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 56 781
Figura 4: A. Esquema de planejamento de craniotomia descompressiva projetado sobre vista frontal de um crânio. B.
Esquema de planejamento de craniotomia descompressiva projetado sobre vista lateral de um crânio.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 56 782
de tomada de decisão, com base em uma boa 9. Rengachary SS, Batnitzky S, Morantz RA, Arjunan K,
Jeffries B. Hemicraniectomy for acute massive cerebral
perspectiva de sobrevivência e bons resultados para
infarction. Neurosurgery. 1981;8(3):321-328.
o paciente de forma individualizada.
10. The Brain Trauma Foundation. The American
Association of Neurological Surgeons. The Joint Section
on Neurotrauma and Critical Care. Critical pathway for
the treatment of established intracranial hypertension. J
REFERÊNCIAS Neurotrauma. 2000;17(6-7):537-538.
1. Chaves MF, Finkelsztejn A, Stefani MA. Rotinas em
11. Narayan RK, Michel ME, Ansell B, et al. Clinical trials in
Neurologia e Nurocirurgia. Artmed; 2008.
head injury. J Neurotrauma. 2002;19(5):503-557.
2. Hawryluk GWJ, Rubiano AM, Totten AM, et al.
12. Cooper DJ, Rosenfeld JV, Murray L, et al.
Guidelines for the Management of Severe Traumatic Brain
Decompressive craniectomy in diffuse traumatic brain injury.
Injury: 2020 Update of the Decompressive Craniectomy
N Engl J Med. 2011;364(16):1493-1502.
Recommendations. Neurosurgery. 2020;87(3):427-434.
13. Cooper DJ, Rosenfeld JV, Murray L, et al. Patient
3. Rossini Z, Nicolosi F, Kolias AG, Hutchinson PJ, De
Outcomes at Twelve Months after Early Decompressive
Sanctis P, Servadei F. The history of decompressive
Craniectomy for Diffuse Traumatic Brain Injury in the
craniectomy in traumatic brain injury. Frontiers in Neurology.
Randomized DECRA Clinical Trial. J Neurotrauma.
2019;10:458.
2020;37(5):810-816.
4. Ransohoff J, Benjamin MV, Gage EL Jr, Epstein F.
14. Hutchinson PJ, Kolias AG, Timofeev IS, et al. Trial of
Hemicraniectomy in the management of acute subdural
Decompressive Craniectomy for Traumatic Intracranial
hematoma. J Neurosurg. 1971;34(1):70-76.
Hypertension. N Engl J Med. 2016;375(12):1119-1130.
5. Kjellberg RN, Prieto A Jr. Bifrontal decompressive
15. Hutchinson PJ, Kolias AG, Timofeev IS, et al.Trial of
craniotomy for massive cerebral edema. J Neurosurg.
Decompressive Craniectomy for Traumatic Intracranial
1971;34(4):488-493.
Hypertension. N Engl J Med. 2016;375:1119-1130.
6. Clark K, Nash TM, Hutchison GC. The failure of
16. Webb S, Timmons SD. Indications and Techniques for
circumferential craniotomy in acute traumatic cerebral
Cranial Decompression after Traumatic Brain Injury. In:
swelling. J Neurosurg. 1968;29(4):367-371.
Winn R, ed. Youmans Neurological Surgery. 7ª edição.
7. Venes JL, Collins WF. Bifrontal decompressive Elsevier; 2011.
craniectomy in the management of head trauma. J
Neurosurg. 1975;42(4):429-433.
8. Cooper PR, Rovit RL, Ransohoff J. Hemicraniectomy in
the treatment of acute subdural hematoma: a re-appraisal.
Surg Neurol. 1976;5(1):25-8.
Capítulo 56 783
CAPÍTULO 57
INFECÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Capítulo 57 784
antimicrobianos1,7. cerebral1,3,4,7. Os pacientes que apresentarem
rebaixamento do nível de consciência, papiledema
O aumento da pressão intracraniana,
ou sinal neurológico focal têm indicação de
hipertensão intracraniana (HIC), compõe o curso
realização de exame de neuroimagem previamente
das meningites bacterianas, sendo essa a principal
ao procedimento1,3,4.
etiologia do rebaixamento do nível de consciência
nesses pacientes1,3,4. Os sinais de HIC incluem O líquido cefalorraquidiano característico
redução do nível de consciência, papiledema das meningites bacterianas apresenta: leucocitose
bilateral, pupilas dilatadas e pouco reativas, paralisia polimorfonuclear >100 células/uL, consumo de
do VI nervo craniano, e nos casos mais graves, glicose marcado pela razão glicemia liquórica/
posturas patológicas, além da tríade de Cushing glicemia plasmática <0,4 ou glicemia liquórica < 2,2
composta por bradicardia, hipertensão arterial e mmol/L, hiperproteínorraquia marcada por >0,45g/
irregularidade respiratória 1,3,4,6
. dL e ainda aumento da pressão de abertura, definida
por >180mmH2O1,3–6. A cultura do líquor mostra-se
Na população pediátrica, os sinais e sintomas
positiva em 80% dos casos1,3,4,7.
de irritação meníngea estão ausentes em mais
de 50% dos casos, sendo nessa faixa etária as Por outro lado, as características do líquor
manifestações clínicas mais prevalentes mal- das infecções virais são compostas por: pleocitose,
estar inespecífico, irritabilidade, choro intenso e concentração normal ou ligeiramente aumentada de
persistente, queda do estado geral 1,3,4,6
. proteínas 0,2 a 0,8 g/L, nível normal de glicose e
ainda pressão de abertura normal1,3–6. A contagem
Nas infecções por Neisseria meningitidis a
máxima de células nas meningites virais é de 25-
presença de exantema maculopapular com evolução
500/uL com predomínio linfocitário1. Nas meningites
rápida para petéquias, com distribuição em tronco,
virais, o estudo por neuroimagem é indicado
membros inferiores, mucosas, conjuntivas e palmo-
como avaliação complementar para pacientes que
plantar, sugere o diagnóstico de meiningococcicemia
apresentem alteração do nível de consciência,
associada à meningite, condição grave que pode
crises convulsivas, sinais neurológicos focais, perfis
evoluir rapidamente para choque séptico1,3–7.
atípicos da análise do líquor ou ainda condições
Nos quadros virais a sintomatologia se subjacentes que causem imunodeficiência1,3,7.
difere da bacteriana ao apresentar com maior
Outros exames laboratoriais úteis no
frequência sintomas constitucionais como mal-
diagnóstico e acompanhamento das meningites
estar, mialgia, anorexia, náuseas, vômitos, dor
são: hemograma, provas de função hepática e
abdominal e diarreia1,4. A cefaleia nesses casos
renal, velocidade de hemossedimentação, proteína
apresenta geralmente distribuição frontal e retro-
C reativa e glicose1,3–7.
orbitária1,3,4. Crises convulsivas e síndrome de HIC
não são comuns nas meningites virais e estão O tratamento da meningite bacteriana
associadas geralmente a um processo de encefalite consiste na administração de antibioticoterapia de
subjacente1,3,4,6. amplo espectro de forma precoce, visto que essa
condição é uma emergência clínica1,3–6. A realização
O diagnóstico das meningites é realizado
da punção lombar e/ou de estudo de neuroimagem
primordialmente através da análise do líquido
não deve retardar o início da terapia antimicrobiana,
cefalorraquidiano obtido através da punção
visto que o retardo no tratamento está associado a
lombar1,3,4,6. A realização de estudo de neuroimagem
piores desfechos, sendo esses déficits neurológicos
previamente à punção lombar não é obrigatória,
permanentes ao paciente ou até mesmo a morte1,3–6.
conduta é preconizada para identificar os pacientes
A instituição da terapia com antibióticos poucas
que apresentem risco elevado de herniação
horas antes da realização da punção lombar não
Capítulo 57 785
altera significativamente o padrão do líquor1. A implementação de antirretroviral, como o
aciclovir, é indicado no esquema de tratamento das
O esquema antimicrobiano sugerido
infecções bacterianas, visto que a encefalite por
para tratar de maneira empírica as meningites
herpes simplex virus é um dos principais diagnósticos
bacterianas adquiridas na comunidade é composto
diferenciais, e de mesma forma apresenta pior fator
por uma cefalosporina de terceira ou quarta geração
prognóstico no atraso da instituição terapêutica1,3.
associada a vancomicina1,3–6.
Nas meningites virais, o tratamento é de suporte
Nas meningites bacterianas é preconizada
com antipiréticos, analgesia e antieméticos1,3–6. O
ainda a utilização de terapia adjuvante com
aciclovir oral ou endovenoso é indicado para os
dexametasona, a fim de reduzir o edema intracraniano
pacientes com suspeita de meningite causada pelo
e aliviar a pressão intracraniana (PIC)1,3,7. Os
HSV-11,3.
pacientes que apresentem aumento sustentado
da PIC devem receber terapia direcionada, sendo Por fim, vale ressaltar que a vacinação constitui
essa composta por: elevação da cabeceira entre 30 um método efetivo em prevenir o desenvolvimento
a 45 graus, manitol ou solução salina hipertônica, de meningites e outras complicações neurológicas
e nos casos não responsivos às medidas clínicas das infecções virais e bacterianas1,3–6.
ou que apresentem hidrocefalia comunicante aguda
é indicada a realização de derivação ventricular
externa para alívio e monitorização da pressão ENCEFALITES VIRAIS
intracraniana 1,2,7,8
. As infecções virais do SNC podem acometer
a medula espinal, o cérebro, as meninges e o tronco
encefálico. Após o vírus atingir a corrente sanguínea,
ele precisa atravessar a barreira hematoencefálica
para poder se disseminar no parênquima cerebral9,10.
No Brasil, a taxa de internação hospitalar por
encefalites virais, em 2018, foi de 0,99 para 100.000
habitantes, com um risco para o sexo masculino 1,29
vezes superior ao feminino11. Ainda, a faixa etária
de 1 a 4 anos é a que representa maior associação
significativa com internações hospitalares por
encefalites virais .11
Capítulo 57 786
infecção ou autoimunidade9,10. A inflamação deve (líquido cefalorraquiano) com diferencial, proteínas,
ser suspeitada quando o paciente apresentar um lactato e glicose e fazer os testes para HSV-1/2,
quadro clínico com cefaleia, diminuição do nível de enterovírus, EBV13.
consciência, convulsões, déficits focais, papiledema
O tratamento constitui-se de tratamento
e alterações comportamentais de forma aguda, em
de suporte, correção de distúrbios eletrolíticos,
torno de 24 a 72h9,10. Juntamente com o quadro
alterações renais e hepáticas como medidas
agudo, o paciente poderá apresentar manifestações
iniciais 9,10,12
. Ainda, é importante tratar possíveis
sistêmicas como febre, linfadenopatia, erupção
convulsões e estado epiléptico não convulsivo9,10.
cutânea, artralgia, mialgia, sintomas respiratórios,
Caso não seja possível descartar a encefalite viral nas
sintomas gastrointestinais ou história de exposição
primeiras 6h de internação, é recomendado iniciar
a fatores de risco conhecidos9,10.
o tratamento empírico com aciclovir, um antiviral
Pode-se considerar como fatores de riscos contra o herpes vírus e alguns vírus associados,
viagens para áreas endêmicas, mordidas de animais vírus mais comumente identificados em quadros
e exposição a insetos, sendo a identificação de tais de encefalite9,12. A posologia do medicamento
fatores importante para detecção de alguns agentes indicada para adultos é de 30 mg/kg/dia, dividida
etiológicos 9,10
. em três doses, por um período de 14 a 21 dias, via
intravenosa. Entretanto, é importante monitorar o
O diagnóstico pode ser feito de acordo com
paciente em uso de aciclovir por longos períodos
as recomendações do International Encephalitis
devido ao risco de nefropatia por cristais9,10,12,13.
Consortium em que elencou alguns critérios:
As encefalites virais podem deixar
1. critério principal: obrigatório. Pacientes
sequelas tais como comprometimento cognitivo
que buscaram auxílio médico com estado
e comportamental, distúrbios afetivos e crises
mental alterado com duração ≥ 24h sem
causa alternativa identificada12; e epilépticas11. Entretanto, o prognóstico dependerá
do agente causal da encefalite14. Nas encefalites
2. critérios menores: 2 necessários para cuja etiologia seja por herpes vírus, as sequelas
possível encefalite e ≥ 3 requeridos para
podem ser paralisia cerebral, hemiplegia, alterações
encefalite provável ou confirmada. Os
no comportamento e epilepsia15. Já nas encefalites
critérios são febre documentada ≥38 ºC
nas 72h antes ou após a apresentação; causadas por arboviroses, as sequelas são graves e
convulsões generalizadas ou parciais podem causar demência, dificuldades de equilíbrio
não totalmente atribuíveis a um distúrbio e deglutição, distúrbios de memória, convulsões e
convulsivo pré-existente; novo início sinais deficitários focais em até 50% dos casos14,16.
de achados neurológicos focais;
contagem de leucócitos no LCR ≥ 5/mm3;
anormalidade do parênquima cerebral ABSCESSOS CEREBRAIS
à neuroimagem, sugestiva de encefalite
O abscesso cerebral representa uma
que é nova de estudos anteriores ou
parece aguda no início; e anormalidade infecção supurativa focal localizada no interior do
na eletroencefalografia compatível com parênquima encefálico, circundada por uma cápsula
encefalite e não atribuível a outra causa12. vascularizada1,2. Esse processo piogênico representa
uma incomum e grave doença que acomete o SNC,
Após a identificação de uma provável ou
possuindo uma incidência de 1,3:100.000 indivíduos
possível encefalite viral, é recomendado fazer a
ao ano1,18-20. A demora na detecção e instituição de
pesquisa etiológica12. O International Encephalitis
tratamento adequado aos abscessos cerebrais eleva
Consortium recomenda coletar pelo menos 5 ml de
as chances de complicações, déficits neurológicos
fluido, identificar a contagem de leucócitos no LCR
Capítulo 57 787
permanentes ao paciente e morte18. momento do diagnóstico1,2. As coleções piogênicas
intracranianas se apresentam como lesões
Os abscessos cerebrais possuem três
intraparenquimatosas expansivas, gerando sinais e
fisiopatologias possíveis, se desenvolvendo a partir
sintomas neurológicos compressivos ou síndrome
de infecções contíguas da região craniana, após
de hipertensão intracraniana1,3,7,18,22,23.
traumatismo cranioencefálico ou instrumentação
neurocirúrgica, e ainda por conta de disseminação O sintoma mais comum é a cefaleia estando
hematogênica de diversas infecções corporais, em presente em 75% dos casos1,3,18. Aproximadamente
25% dos casos1,2,18. Vale ressaltar que a literatura 60% dos pacientes apresentarão déficits
descreve a ocorrência de abscessos cerebrais neurológicos focais, sendo a hemiparesia o mais
idiopáticos em 25% dos casos, sendo que nesses frequente1,3,7. A febre é presente em apenas 50% dos
não se identifica fonte primária de infecção, tendo casos e sua ausência não exclui o diagnóstico1,3,7,18.
causa criptogênica1,18. Crises epilépticas são observadas em 15 a 35% dos
indivíduos1,7. Não há a presença de meningismo, a
Infecções contíguas do crânio, como
não ser que o processo infeccioso rompa a cápsula
otites médias agudas, otites colesteatomatosas,
e curse com meningite ou meningoencefalite1.
otomastoidites e rinossinusites, associadas à
osteomielite, e infecções dentárias, possuem relação A hipertensão intracraniana se manifesta
com à formação de abscessos intracranianos 1,18-22
. por um aumento sustentado da PIC, associado
Estudos de caso demonstram que os abscessos a papiledema bilateral, náuseas, vômitos e
otogênicos possuem predileção pelos lobos rebaixamento do nível de consciência, estando
temporais em 55 a 75% e pelo cerebelo em 20 a presente especialmente em lesões localizadas
30% 1,18,20-22
. na fossa craniana posterior, por compressão do
aqueduto cerebral e/ou IV ventrículo1,3,7,18.
A endocardite infecciosa representa um dos
principais fatores de risco para abscesso cerebral O diagnóstico é realizado através de estudos
por disseminação hematogênica . No caso dos 18
de neuroimagem, com associação em casos
abscessos hematogênicos há maior frequência de específicos de pesquisa laboratorial de infecção
localização no território da artéria cerebral média primária de sítio distante em conjunto com culturas
com implantação na junção cortico-subcortical 1,19
. para identificação do agente etiológico1,2,7,19.
Capítulo 57 788
Figura 2 – TC de crânio com contraste em cortes axial (A), coronal (B) e sagital (C) que evidenciam coleção de conteúdo
hipodenso com captação periférica de contraste, compatível com abscesso cerebral. Paciente com histórico de
craniectomia descompressiva pós-trauma penetrante do crânio.
Fonte: Acervo pessoal da Dra. Danielle de Lara, 2020.
Capítulo 57 789
estereotáxica1–3,7,26. sensibilidade local à palpação digital, limitação
importante da amplitude de movimentos devido ao
espasmo muscular, podendo evoluir com síndromes
ESPONDILODISCITE E ABSCESSO compressivas medulares e déficits neurológicos
ESPINHAL
como paresias, plegias, alterações de sensibilidade
Os processos infecciosos localizados nas
e marcha, além de disfunções esfincterianas27,30. Em
vértebras e no espaço intervertebral recebem o nome
aproximadamente 50% dos casos há ausência de
de espondilodiscites26,27, representando cerca de 1
febre30.
a 7% dentre as infecções ósseas26,28. Localizadas
principalmente nos seguimentos lombares, seguidos Em 33 a 65% dos casos é possível localizar
pela coluna torácica e menos comumente na um foco infeccioso concomitante fora da coluna
região cervical, essas infecções podem se instalar vertebral, sendo os sítios mais comuns trato genito-
Capítulo 57 790
com contraste paramagnético, apresentando 91% ser evitada durante o ato cirúrgico para minimizar o
de sensibilidade para o diagnóstico, permitindo a risco de disseminação do processo infecioso para o
delimitação da extensão do processo infeccioso espaço intradural30.
e a diferenciação entre outras causas de lesões
vertebrais degenerativas, inflamatórias e/ou
tumorais 26–30
. NEUROCISTICERCOSE
Nas espondilodiscites, a RM demonstra A neurocisticercose é uma infecção do
tipicamente destruição dos platôs discais, com SNC causada pela Taenia solium, e representa
hipossinal em T1 e hipersinal em T2 nos corpos um importante problema de saúde pública,
vertebrais acometidos27. especialmente em regiões carentes de condições
sanitárias31–33.
O abscesso espinhal, na análise da RM,
apresenta-se como uma lesão encapsulada, No ciclo biológico da teníase-cisticercose, o
isointensa ou hipointensa na ponderação em T1, ser humano apresenta-se como hospedeiro definitivo
hiperintensa em T2, exercendo efeito de massa do parasita após ingerir carne suína contaminada,
local, podendo estar localizada no espaço extra desenvolvendo a teníase, representada pela
dural, epidural ou intramedular, com realce da presença do parasita adulto alojado no trato
cápsula após injeção de gadolínio30. gastrointestinal do paciente31,32.
Capítulo 57 791
Figura 3 – Paciente com diagnóstico de abscesso vertebral por Salmonella sp. TC em corte sagital (A) e em reconstrução
multidimensional (B) e corte coronal (C): coleção intratorácica, extrapleural, no aspecto posterolateral do hemitórax
esquerdo, coleção paravertebral com gás em seu interior envolvendo o corpo vertebral de T4, T6 e principalmente T5,
gás no interior do corpo vertebral de T5 e T4, bem como colapso do corpo vertebral de T5 (setas).
Fonte: Acervo pessoal da Dra. Danielle de Lara, 2021.
Figura 4 – (A) TC de crânio sem contraste: observa-se múltiplas lesões hiperdensas esparsas pelo parênquima cerebral,
com implantação na junção cortiço-subcortical, sendo compatíveis com neurocisticercose em estágio de calcificação.
Cortes axial (B) e sagital (C) de RM contrastada ponderada em T1 demonstram lesão focal (seta) adjacente à foice
inter-hemisférica na face mesial do giro frontal superior E, apresentando realce anelar ao meio de contraste, e lesão de
aspecto cístico (seta) localizada no interior do IV ventrículo adjacente à sua abertura mediana (Forame de Magendie).
Fonte: Acervo pessoal da Dra. Danielle de Lara, 2021.
Capítulo 57 792
permanecer presente mesmo após a degeneração e crises epilépticas, fator importante para a qualidade
calcificação do cisticerco 31–33,35
. de vida do paciente, sendo indicada terapia com
anticonvulsivantes de primeira linha como a fenitoína
Pacientes com múltiplos cisticercos possuem
ou carbamazepina31,35. Pacientes com importante
pior prognóstico e podem desenvolver epilepsia de
componente edematoso podem se beneficiar do uso
difícil controle31. Além disso, sugere-se uma correlação
de corticoterapia oral31.
entre a neurocisticercose e o desenvolvimento
de esclerose hipocampal, necessitando ainda de Drogas antiparasitárias como o praziquantel
estudos futuros para confirmação da associação . 35
ou o albendazol, são utilizadas para reduzir o número
e tamanho dos cisticercos, consequentemente
Por outro lado, o parasita pode se alojar
reduzindo o estresse ao parênquima cerebral31–33.
no sistema ventricular, gerando uma alteração
Os pacientes que mais se beneficiam do uso de
ou obstrução do fluxo liquórico, produzindo uma
drogas antiparasitárias são os que apresentam
hidrocefalia obstrutiva, com clínica de hipertensão
lesões múltiplas, sem possibilidade de excisão
intracraniana presente em aproximadamente 12%
neurocirúrgica31,32. Lesões extra-parenquimatosas
dos pacientes31–35. Apesar da possibilidade de o
não apresentam resposta satisfatória ao uso das
cisticerco se alojar em qualquer região do sistema
drogas antiparasitárias33.
ventricular, o quarto ventrículo é a região mais
acometida31. A forma racemosa é uma das indicações
de abordagem neurocirúrgica, sendo indicada a
Por fim, o cisticerco pode ocupar o espaço
craniotomia com ressecção do cisto33. Outra clássica
subaracnoide, com maior tropismo pela fissura
indicação de cirurgia é a presença de hidrocefalia
de Sylvius, podendo atingir grandes diâmetros
obstrutiva e/ou hipertensão intracraniana. Nesses
gerando cistos gigante, os quais podem gerar
casos a depender da localização do cisticerco
sintomas compressivos como hidrocefalia,
pode-se adotar abordagem através da craniotomia
hipertensão intracraniana, hemiparesia, entre outros
com ressecção da lesão ou da neurocirurgia
sinais neurológicos focais31–34. Nessa forma de
endoscópica31,33.
neurocisticercose, a lesão apresenta um aspecto
que remete a um cacho de uvas, sendo classificada A intervenção neurocirúrgica também é
como neurocisticercose racemosa . 31
indicada para controle de sintomas de hipertensão
intracraniana e hidrocefalia, podendo ser adotadas
O diagnóstico da neurocisticercose se baseia
técnicas como a colocação de válvulas de derivação
em estudos de neuroimagem, que localizam a lesão
ventrículo-peritoneal, ou a terceiroventriculostomia
no SNC, associado a pesquisa de reação antígeno-
endoscópica31–33.
anticorpo no líquor32,33,35.
Capítulo 57 793
A transmissão do HIV acontece através de O diagnóstico baseia-se na história clínica,
relações sexuais, transmissão materno-infantil e no exame neurológico e cognitivo, como também
agulhas contaminadas . O SNC é o segundo local
10
através da exclusão de outras causas por métodos
mais acometido pelo vírus com as manifestações de imagem e líquido cefalorraquidiano. Nos estágios
neurológicas estando presentes em 40% a 70% dos iniciais, o paciente pode apresentar dificuldade de
pacientes com HIV. A infecção no SNC acontece concentração, apatia e lentidão mental, sintomas que
através da ruptura da barreira hematoencefálica, o podem levar ao diagnóstico errôneo de depressão37.
que propicia o desenvolvimento de complicações
A evolução da demência ocorre em semanas e
neurológicas37.
meses e seus critérios diagnósticos se fundamentam
No SNC, a microglia e os macrófagos são em déficit adquirido combinado de habilidades
fundamentais para a replicação do HIV, assim cognitivas e isso inclui as funções motoras,
como os astrócitos têm papel fundamental nas cognitivas e comportamentais do paciente37.
complicações neurológicas causadas pelo vírus,
O tratamento se sustenta na utilização de
pois servem de reservatório viral e produtor de
antirretroviral para todos os pacientes HIV, esses com
mediadores inflamatórios. Assim, o HIV pode
contagem de CD4 ≤ 500 células/mm³. Entretanto,
comprometer o SNC tanto de forma indireta através
é necessário cuidado com os fármacos do “grupo
da imunossupressão e doenças oportunistas quanto
D”, pois esses podem causar neuropatia sensitiva,
de maneira direita ocasionando manifestações
frequentemente dolorosa e de difícil diferenciação
como a neuropatia, mielopatia e encefalopatia pelo
da neuropatia causada pelo HIV10.
HIV10,36,38.
A neuropatia sensitiva é uma neuropatia axonal
Dentre as manifestações presentes no
tóxica dose-dependente, sendo causada por certos
quadro clínico, demência e mielopatia podem
nucleosídeos antirretrovirais. Os medicamentos do
estar presentes mesmo que não haja infecções
“grupo D” ou dideoxi-nucleosídeos são os maiores
oportunistas, auxiliando no diagnóstico de HIV.
responsáveis pelo risco aumentado do efeito adverso.
Além disso, a neuropatia é a patologia neurológica
A neuropatia periférica vai ocorrer em pacientes com
direta que está mais comumente associada ao
histórico prévio de quadro semelhante e que estejam
vírus10. Alguns exemplos de outras manifestações
no primeiro ano de tratamento. O mecanismo se dá
neurológicas associadas à infecção pelo HIV se
por um efeito tóxico sinérgico quando dois dideoxi-
encontram na Tabela 1:
nucleosídeos tenham sido utilizados juntamente39.
Capítulo 57 794
NEUROINFECÇÕES PRIÔNICAS REFERÊNCIAS
1. Jameson JL, Fauci AS, Kasper DL, Hauser SL, Longo
As neuroinfecções priônicas consistem em um
DL, Loscalzo J. Medicina Interna de Harrison. 20ª edição.
conjunto de distúrbios neurodegenerativos causados McGraw-Hill; 2020. p. 1272.
por partículas proteináceas infecciosas chamadas 2. Greenberg MS. Handbook of Neurosurgery. 9ª edição.
príons, que mudam a conformação das proteínas, Thieme Medical Publishers; 2019. p. 1784.
sendo a doença mais comum em seres humanos a 3. Leal AG. Manual de Neurocirurgia: do diagnóstico ao
tratamento. 1ª edição. Curitiba: CRV; 2019.
doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) 10,38
.
4. Sousa ÉGD, Orsini M, Freitas MR de, et al. Meningite
O quadro clínico consiste na demência aguda bacteriana na população infantojuvenil: principais
agentes e métodos para diagnóstico - Uma revisão da
rapidamente progressiva, mioclonia e ataxia. literatura. Rev bras neurol. 2016;52(3):34–36.
Comum em pacientes na faixa etária de 40 a 80 5. Branco RG, Amoretti CF, Tasker RC. Doença
anos, a apresentação da tríade supracitada deve ser meningocócica e meningite. J Pediatr. 2007;83(2):46–53.
objetivo de investigação para DCJ10,38. 6. Teixeira DC, Diniz LMO, Guimarães NS, Moreira HM
de AS, Teixeira CC, Romanelli RM de C. Risk factors
A demência é tipicamente cortical, havendo associated with the outcomes of pediatric bacterial
comprometimento da memória, concentração, meningitis: a systematic review. 2020;96(2):159–167.
linguagem, comportamento ou visão. Pode ocorrer 7. Daroff RB, Fenichel GM, Jankovic J, Mzziotta JC.
Bradley’s Neurology in Clinical Pratice. 6ª edição. Elsevier;
também alterações psiquiátricas como alucinações 2012.
e delírios. A ataxia frequentemente é cerebelar 8. Siqueira MG. Tratado de Neurocirurgia. 1ª edição.
sendo mais comum o desequilíbrio da marcha que Manole; 2015. p. 2398.
sinais apendiculares ou oculares10,38. 9. Costa BK da, Sato DK. Viral encephalitis: a practical
review on diagnostic approach and treatment. J Pediatr.
O diagnóstico da DCJ e de outras doenças 2020;96:12–19.
priônicas constitui-se na história e exame clínico 10. Louis ED, Mayer SA, Rowland LP. Merritt - Tratado de
Neurologia. 13ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
do paciente. Sintomas neurológicos que ocorram
2018. p. 1428.
sem uma causa explicável, seja ela metabólica,
11. Silveira EC. Perfil das internações por encefalite viral
infecciosa ou inflamatória evidente, deve ser no Brasil em 2018 por unidade da federação, sexo e faixa
investigada para essa proteína. Apesar que a tríade etária. Med (Ribeirão Preto). 2020;53(3):268–274.
é altamente suspeita para doença priônica, essa 12. Louis ED, Mayer SA, Rowland LP. Merritt - Tratado de
Neurologia. 13ª edição. Guanabara Koogan; 2018. p. 1428.
pode se manifestar de modo atípico, além de existir
13. Venkatesan A, Tunkel AR, Bloch KC, et al. Case
outros distúrbios com apresentação semelhante. definitions, diagnostic algorithms, and priorities in
Exames de imagem e laboratoriais podem auxiliar encephalitis: Consensus statement of the international
encephalitis consortium. Clin Infect Dis. 2013;57(8):1114–
na confirmação da patologia10,38. 1128.
Não existem medicamentes comprovados 14. Filho AMRDC, Moreira ASS. Meningites E Encefalites
De Etiologia Viral. 2019;3:85–95.
que possam modificar o quadro e o prognóstico
da doença priônica já estabelecida. O tratamento 15. Araújo AQ, Sc M. Aspectos clínicos das encefalites e
meningites virais. Clínica Neurológica HC/FMUSP. 1996;15.
consiste, então, em suporte em aspectos físicos
16. Simão C, Gomes AL. Encefalite Herpética : Diagnóstico
como leitos hospitalares e cadeiras de rodas, e Terapêutica. 1996;26.
suporte social, cuidados paliativos e algumas 17. Lopes N, Nozawa C, Linhares REC. Características
intervenções farmacológicas para tratamento das gerais e epidemiologia dos arbovírus emergentes no Brasil.
Rev Pan-Amazônica Saúde. 2014;5(3):55–64.
crises epilépticas ou mioclonia como a levetiracetam
18. Lo DS, Borrero LC, Gilio A. Enteroviral encephalitis
ou valproato.10,38. with neurological sequelae treated successfully with
corticosteroids. Pediatrics. 2020;146:176-177.
19. Tiziotto G, Grande P, Grande P. Abscesso cerebral:
relato de caso clínico. 2017;37–48.
Capítulo 57 795
20. Morais LT, Zanardi VDA, Faria AV. Magnetic resonance 30. Brito JS, Ramalho D, Henriques R, Tirado A, Fernandes
spectroscopy in the diagnosis and etiological definition P. Cirurgia para tratamento de abcessos na espondilodiscite
of brain bacterial abscesses. Arq Neuropsiquiatr. tuberculosa. Rev Port Ortop e Traumatol. 2018;26(2):114–
2007;65(4):1144–1148. 126.
21. Tuon FF, Russo R, Nicodemo AC. Brain abscess 31. Pereira CU. Abscesso extradural da coluna vertebral
secondary to frontal osteomyelitis. Rev Inst Med Trop Sao – Revisão de literatura. Arq Bras Neurocir Brazilian
Paulo. 2006;48(4):233–235. Neurosurg. 2012;31(01):34–40.
22. Penido N de O, Chandrasekhar SS, Borin A, Maranhão 32. Takayanagui OM. Neurocysticercosis. Arq
AS de A, Gurgel Testa JR. Complications of otitis Neuropsiquiatr. 2013;71(9 B):710–3.
media - a potentially lethal problem still present. Braz J
33. Togoro SY, De Souza EM, Sato NS. Diagnóstico
Otorhinolaryngol. 2016;82(3):253–262.
laboratorial da neurocisticercose: revisão e perspectivas. J
23. Miura MS, Krumennauer RC, Lubianca Neto JF. Bras Patol e Med Lab. 2012;48(5):345–355.
Complicações intracranianas das otites médias crônicas
34. Paiva ALC, Araujo JLV, Ferraz VR, et al. Tratamento
supurativas em crianças. Rev Bras Otorrinolaringol.
cirúrgico da neurocisticercose. Estudo de coorte
2005;71(5):639–643.
retrospectivo e um caso ilustrativo. Sao Paulo Med J.
24. Montessi J, Montessi FD, Almeida EP. Tratamento 2017;135(2):146–149.
cirúrgico da bronquiectasia. Rev Pulmão RJ. 2014;23(3):33–
35. Giraldo JC, Chala DM, Reinel Vásquez L, Zamora TÓ,
36.
Casas JC. Sintomatología asociada a neurocisticercosis
25. Haimes AB, Zimmerman RD, Morgello S, et al. en personas del área urbana y periurbana del municipio de
MR imaging of brain abscesses. Am J Neuroradiol. Coyaima del departamento del Tolima y posibles variables
1989;10(2):279–291. asociadas. Rev Med. 2016;24(2):10–22.
26. Velasco IT, Neto RAB, Souza HP, Marino LO, Marchini 36. Carpio A, Romo ML. The relationship between
JFM, Alencar JCG. Medicina de Emergência: Abordagem neurocysticercosis and epilepsy: An endless debate. Arq
Prática. 15ª edição. Manole; 2021. Neuropsiquiatr. 2014;72(5):383–390.
27. Ozturk C, Tezer M, Mirzanli C, Bilen FE, Aydogan 37. Silva AKBL da. Alterações no Sistema Nervoso
M, Hamzaoglu A. An uncommon cause of paraplegia: Ocasionadas pelo HIV-Aids. 2018.
Salmonella spondylodiskitis. J Spinal Cord Med.
38. Christo PP. Alterações cognitivas na infecção pelo HIV e
2006;29(3):234–236.
Aids. Rev Assoc Med Bras. 2010;56(2):242–247.
28. Vaz-Guimarães FA, Ramalho CO, Suriano ÍC, Zymberg
39. Hauser SL, Josephson SA. Neurologia Clínica de
ST, Cavalheiro S. Neuroendoscopic surgery for unilateral
Harrison. 3rd ed. AMGH; 2015. p. 704.
hydrocephalus due to inflammatory obstruction of the monro
foramen. Arq Neuropsiquiatr. 2011;69(2):227–231. 40. Silva CM da. Polineuropatia em indivíduos infectados
pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). VITTALLE -
29. Sebben AL, Graells XS, Benato ML, Del Santoro
Rev Ciências da Saúde. 2011;23(1):57–66.
PG, Kulcheski ÁL. High cervical spine spondylodiscitis
management and literature review. Rev Assoc Med Bras.
2017;63(1):18–20.
Capítulo 57 796
PARTE 14
DOENÇAS NEUROLÓGICAS DA INFÂNCIA
CAPÍTULO 58
SEMIOLOGIA NEUROLÓGICA PEDIÁTRICA
Capítulo 58 798
de vida. No entanto, malformações podem causar O examinador deve classificar o nível de
craniotabes adquiridas, a exemplo do raquitismo. consciência do RN, que aqui é conhecido por estado
No extremo oposto, existem as craniossinostoses, comportamental, em cada item do exame1.
que se caracterizam pelo fechamento precoce
Os itens do exame são:
das fontanelas no recém-nascido, gerando cristas
ósseas à palpação1. • habituação: definida como uma diminui-
ção da resposta da criança a partir de estí-
O tempo de fechamento fisiológico das
mulos repetitivos provocados pelo exami-
fontanelas varia muito, podendo acontecer entre 6 e nador1;
18 meses de vida. O fechamento precoce é visto em
crianças normais sem prejuízos, no entanto, atrasos • postura: inicialmente tira-se a roupa do
bebê, deixando-o apenas com fralda. A
no fechamento devem ser investigados1.
postura deve ser avaliada em posição su-
pina e o examinador deve registrar a pos-
Percussão do crânio tura predominante da criança, visto que
A percussão digital do crânio pode ser útil em ela pode se modificar ao longo do exame1;
casos de hipertensão intracraniana com disjunção
• tônus apendicular: durante o exame da
das suturas (ao nível dos temporais e parietais),
postura, o examinador já deve atentar ao
provocando um som timpânico e levemente metálico tônus apendicular. Essa avaliação ainda
chamado de sinal de Macewen ou sinal do pote é composta por manobras de palpação
rachado1. dos diferentes grupos musculares, de mo-
vimentação e balanço passivo dos mem-
bros, tração de membros superiores e in-
Ausculta do crânio
feriores, rechaço, manobra do cachecol e
Sempre deve ser realizada sob suspeita de de ângulo poplíteo1;
malformações vasculares intracranianas. Utilizando
a campânula do estetoscópio, o examinador • tônus axial: deve ser avaliado com a
posiciona a criança em posição ereta, e ausculta criança sentada. Sua cabeça penderá
levemente para anterior. Em seguida, o
seis pontos padronizados: globos oculares, fossas
examinador inclina a criança para trás,
temporais e regiões mastoideas ou retroauriculares1.
observando a ação e contração dos mús-
A presença de sopros intracranianos culos do compartimento anterior do pes-
espontâneos é comum em crianças, no entanto, coço. Adiante, tracionar ao mesmo tempo
os membros superiores, observando a
sopros patológicos podem ser observados e se
postura de reação da cabeça e flexão dos
caracterizam por tonalidades mais graves e de maior
cotovelos. Ainda, suspender verticalmen-
intensidade1. te a criança pelas axilas, observando sua
postura e movimentação1; e
Capítulo 58 799
possíveis tremores, caracterizando quanto à plantar1.
localização, frequência, amplitude e velocidade. Por
Existe uma série de reações transitórias que
fim, registrar possível presença de reação de Startle,
podem ser encontradas, no exame neurológico de
e pesquisar presença de movimentos ou posturas
recém-nascidos e lactentes, as quais representam
anormais1.
imaturidade do SNC, dentre elas algumas fazem
• reflexos: avalia-se os reflexos do recém- parte do exame clínico habitual1:
-nascido da mesma maneira que se avalia
• reação de Moro: aparece entre 28 e 32
adultos ou crianças mais velhas. O foco é
semanas de gestação, estando presente
verificar a presença de assimetrias. Pes-
em todos os recém-nascidos de termo e
quisar reflexos: bicipital, tricipital, patelar,
devendo desaparecer até o sexto mês de
aquileu e o cutâneo-plantar1; e
vida. Observam-se movimentos de exten-
• reações transitórias: examinado com a são e abdução dos membros superiores
pesquisa das reações de sucção, voraci- com abertura das mãos e, em seguida,
dade, preensão palmar e plantar, marcha de adução e flexão dos membros supe-
e Moro1. riores. Esses movimentos costumam ser
acompanhados de choro audível. A crian-
ça deve ser colocada em posição supina
sobre superfície e, a seguir, a cabeça deve
REFLEXOS E REAÇÕES PRIMITIVAS
ser levantada com suporte suficiente para
A avaliação do desenvolvimento dos reflexos levantar o corpo da criança do colchão,
primitivos e reações transitórias permite que seja a cabeça deve então ser liberada subita-
constatada a integridade do sistema nervoso central mente e com cuidado, possibilitando um
(SNC), de acordo com uma expectativa relacionada rápido movimento de queda. Em seguida,
à idade cronológica da criança. Esses reflexos e a cabeça deve novamente ser apoiada
pelo examinador2 ;
reações são fisiológicos e devem estar presentes em
todos os recém-nascidos a termo, desaparecendo • reação de sucção: ao tocar os lábios do
após os primeiros meses de vida. A ausência de recém-nascido são produzidos vigorosos
reflexos primitivos e/ou reações transitórias no início movimentos de sucção. Essa reação deve
da vida ou sua permanência tardia sugere alterações desaparecer por volta do sexto mês de
vida1;
patológicas a serem investigadas2.
Capítulo 58 800
são plantar desaparece por volta dos 12 de meningite ou hemorragia subaracnoidea, por
meses de idade2 . exemplo. Nos lactentes, esses sinais podem estar
ausentes, e o que pode ser mais preditivo é o
abaulamento de fontanela¹,³. Salvo essa exceção,
TROFISMO, FUNÇÕES os sinais pesquisados na criança são os mesmos
NEUROVEGETATIVAS E SINAIS pesquisados no adulto, sendo eles:
MENINGORRADICULARES
As alterações das funções neurovegetativas e • rigidez de nuca: resistência a movimenta-
ção passiva de flexão do pescoço3;
distúrbios tróficos são comuns em lesões do SNC
ou periférico. Na anamnese, é preciso interrogar • sinal de Brudzinski: flexão espontânea
sobre a presença de distúrbios vasomotores das das pernas quando é realizado movimento
extremidades, hipotensão postural, modificações passivo de flexão do pescoço3;
da salivação e transpiração, alterações do
• sinal de Kernig: com a criança em decúbi-
controle esfincteriano, priapismo, disfunção erétil e
to dorsal, ao realizar a flexão da coxa so-
incontinência urinária e fecal1,4. bre a bacia em um ângulo reto e, a seguir,
A inspeção busca verificar o estado nutricional, a extensão da perna sobre a coxa, encon-
tra-se uma resistência a essa extensão e
a presença de deformidades osteoarticulares, o
o paciente refere dor lombar. Pode haver
ritmo respiratório, o aspecto da pele e anexos e o
ainda flexão da perna contralateral, o que
trofismo muscular4. representa o sinal da perna contralateral
Ademais, é pertinente uma investigação de Brudzinski ¹,³; e
urológica do sistema nervoso autônomo,
• sinal de Lasègue: em decúbito dorsal e
especialmente em pacientes já acometidos por perna estendida, ao realizar a elevação da
lesões na medula espinhal. Será feita uma palpação perna, a criança refere dor no território do
e percussão abdominal, para detecção de distensão nervo isquiático 3.
da vesícula, seguida da averiguação dos esfíncteres1.
Capítulo 58 801
por oscilações corpóreas. Além disso, o critérios do Medical Research Council;
paciente deverá fazer a prova ou teste de
Romberg, solicitado apenas para crianças • tônus: pode ser avaliado por meio de ins-
acima de 4 anos, que é uma etapa do exa- peção, palpação e movimentação passiva
me neurológico a qual avalia as colunas de um segmento corporal1. Por meio da
dorsais da medula espinal e busca pos- palpação, é possível perceber a consis-
síveis alterações no equilíbrio estático do tência do músculo. O método mais utili-
indivíduo. Para isso, deve-se solicitar ao zado para realizar o diagnóstico consiste
paciente que se fechem os olhos na mes- na realização da movimentação passiva,
ma posição anterior, de modo que, qual- em que o examinador movimentará os
quer tendência a queda, indica um sinal de segmentos corpóreos, com o intuito de ob-
Romberg positivo, confirmando uma alte- servar o grau de resistência passiva e o
ração no equilíbrio estático do paciente1; balanço passivo dos segmentos distais do
membro1;
• marcha: em primeiro lugar, deve-se co-
meçar essa etapa do exame de motrici- • coordenação: é testada solicitando ao pa-
dade observando o andar espontâneo da ciente que incline o corpo para frente, para
criança ao entrar na sala de consulta. Em os lados e para trás, verificando as corre-
seguida, avalia-se a corrida da criança lações apropriadas. Em relação à coorde-
descalça. Pode ser feito de forma descon- nação apendicular, pode ser avaliada em
traída jogando um brinquedo e pedindo crianças pequenas por meio da observa-
que a criança busque. Nesta etapa, deve- ção da manipulação de brinquedos1. Caso
-se estar atento a qualquer anormalidade a criança se mostre cooperativa, o exami-
ou dificuldade, seja por balanço dos mem- nador pode realizar as provas específicas:
bros superiores, alargamento de base ou
• prova índex-nariz: solicitar ao pacien-
imperfeição nos passos. Ademais, existe
te para tocar a ponta do nariz com o
a possibilidade da realização da marcha
dedo, mantendo o braço abduzido, em
em tandem, acima dos 5 anos. A criança
ângulo reto com o tronco. Para aumen-
caminha colocando o calcanhar em con-
to de sensibilidade, o teste deve ser
tato com os dedos do pé contralateral, de
realizado com o paciente de olhos fe-
forma que qualquer dificuldade para reali-
chados. Caso haja erros de direção e
zá-la indica um distúrbio no equilíbrio1;
medida, indicam uma possível lesão
• força: a avaliação da força deve ter tanto a cerebelar1;
topografia quanto a sua intensidade como
• prova calcanhar-joelho: paciente em
parâmetros para o exame. Primeiramente,
decúbito dorsal, solicita-se que ele co-
se observam os movimentos da criança.
loque o calcanhar sobre o joelho opos-
Para isso, analisamos os movimentos es-
to, caso ocorra algum erro, é indicativo
pontâneos e, se necessário, solicitamos a
para ataxia1; e
realização de comandos mais específicos.
Em seguida, são utilizadas as manobras
• prova das marionetes: paciente senta-
de contraposição, nas quais o examinador
do e com os antebraços semifletidos e
usará de sua força física para aplicar uma
com as palmas repousando sobre as
resistência, e o paciente terá que vencê-
coxas, pede-se que ele realize movi-
-la. Na sequência, realizam-se as provas
mentos alternantes rápidos de prona-
deficitárias, que são utilizadas em crian-
ção e supinação do antebraço. A inca-
ças muito pequenas e não cooperativas,
pacidade de realizá-los é denominada
apesar de serem utilizadas também em
disdiadocinesia1.
crianças mais velhas quando o déficit de
força é leve. Por fim, existe um sistema de
gradação da força muscular, segundo os
Capítulo 58 802
que o corpo humano consegue distinguir
SENSIBILIDADE
temperaturas com um mínimo de 2ºC de
Esse exame é bastante dependente da diferença, sendo essa a resposta fisiológi-
cooperação do paciente, o que o torna especialmente ca esperada ao fim do exame1, 5;
complicado de ser realizado em crianças pequenas1.
• palestesia ou sensibilidade vibratória: a
Ele também é subjetivo e busca constatar queixas
pesquisa da palestesia ou sensibilidade
específicas ou encontrar distúrbios da sensibilidade
vibratória é feita aplicando-se vibração no
associados à condição do paciente1. Sua realização paciente, a fim de estimular os corpúscu-
é dispensável quando não houver a presença de los de Pacini, o que deve ser feito na dire-
reclamações ou sinais de alteração da sensibilidade1. ção distal-proximal, começando pelo local
onde acredita-se não estar acometido1,5.
O ideal é que o paciente esteja de olhos
Para esse exame, necessita-se de um
fechados e despido durante o exame1. diapasão, preferencialmente de 128 Hz,
o qual deve ser colocado sobre as emi-
• sensibilidade superficial: a sensibilidade
nências ósseas (como maléolos e apófise
superficial avaliada se refere ao tato, à dor
estiloide da ulna)1,5. O exame de sensibili-
e, em alguns casos, à temperatura5. A pes-
dade deve sempre ser comparativo, por-
quisa é feita em diferentes áreas do corpo
tanto, o limiar de percepção do paciente
do paciente, de proximal para distal, sem-
deve ser comparado entre os hemicorpos
pre comparando as respostas entre si e
para avaliar a simetria1, 5 . Pode, também,
com o hemicorpo contralateral1,5. Uma vez
ser comparado com o limiar de percepção
identificada uma área de sensibilidade al-
do próprio examinador ou de outro indiví-
terada, segue-se a pesquisa de seu centro
duo hígido5; e
para fora, delimitando mais precisamente
a extensão do acometimento 5; • propriocepção consciente: a pesquisa da
artrestesia, propriocepção consciente ou
• sensibilidade tátil: percebida por recepto-
sensibilidade cineticopostural é feita solici-
res de Ruffini e Meissner, e é pesquisada
tando ao paciente que, de olhos fechados,
com o auxílio de um pequeno tufo de algo-
indique a posição final de um segmento
dão seco, uma gaze ou um pincel.1, 2 Pro-
movido passivamente pelo examinador,
cura-se não utilizar o dedo, a fim de evitar
o que ativa receptores proprioceptivos,
estímulo pressórico e comprometer a acu-
como fusos musculares1, 5. Esse exame é
rácia da resposta do paciente ao exame5;
feito em direção distal-proximal, começan-
• sensibilidade dolorosa: o estímulo aos do-se pelo lado do corpo que o paciente
nociceptores pode ser realizado utilizan- refere não estar alterado, e não necessita
do-se uma espátula de madeira partida do uso de ferramentas ou materiais espe-
diagonalmente ou um monofilamento, vis- cíficos 5. É importante que a movimenta-
to que não se deve provocar lesões nos ção do segmento para cima e para baixo
pacientes1,5. É imprescindível o descarte seja feita segurando-se nas bordas late-
do material utilizado ao fim do exame 5; rais, para que o paciente não perceba a
movimentação pela pressão dos dedos do
• sensibilidade térmica: para pesquisar a examinador 5.
sensibilidade térmica, desencadeadas
Alterações na palestesia e artrestesia
por termoceptores, é necessário um tubo
indicam acometimento nas vias proprioceptivas,
de ensaio contendo água quente (40 a
45ºC) e outro com água fria (não abaixo sendo importante pesquisar a presença de
de 15ºC)1,5. As indicações de temperatura polirradiculoneuropatias . 5
Capítulo 58 803
sensitivos, por não fornecerem informações seguras doloroso, com um leve toque por uma es-
da delimitação destes .5 pátula de madeira6. A função motora da
mandíbula é analisada pedindo ao pacien-
te para apertar com força os dentes1;
Capítulo 58 804
cognitiva, o raciocínio, a linguagem, o pensamento 4. Nitrini R. Bacheschi LA. A neurologia que todo médico
deve saber. 2ª ed. São Paulo: Atheneu; 2003.
e a autoestima .7
consideração a opinião dos pais ou cuidadores e das 8. Ministério da Saúde. Saúde da criança: crescimento e
desenvolvimento. Cadernos de Atenção Básica. Brasília.
escolas/creches ao avaliar o desenvolvimento da 2012. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/
criança, pois possuem maior contato com elas. Além publicacoes/saude_crianca_crescimento_desenvolvimento.
pdf.
disso, diversos fatores extrínsecos podem interferir
9. Sociedade Brasileira de Pediatria. Documento Científico:
na consulta, como sono, irritabilidade e fome, os
Consenso Do Departamento Científico de Pediatria
quais irão comprometer a sua avaliação pontual. Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria. Rio
de Janeiro; 2004. Disponível em: https://www.sbp.com.
As técnicas para avaliar o desenvolvimento br/fileadmin/user_upload/img/documentos/doc_pediatria_
são importantes para estimar o grau de ambulatorial.pdf.
CONCLUSÃO
É fundamental reconhecer os achados
normais do exame neurológico da criança, a fim de
desenvolver um olhar crítico diante das manifestações
patológicas. Além disso, a sistematização da
abordagem por fases do desenvolvimento direciona
o raciocínio clínico para as hipóteses diagnósticas
mais prevalentes em cada faixa etária. O exame,
por si só, pode ser motivo de grande incômodo para
a criança, por esse motivo é proveitoso manter a
criança no colo sempre que possível e reservar para
o final do exame os testes mais desconfortáveis.
REFERÊNCIAS
1. Rodrigues MM, Vilanova LCP. Tratado de Neurologia
Infantil. 1ª ed. Rio de Janeiro: Atheneu; 2016.
2. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento
Científico de Pediatria do Comportamento e
Desenvolvimento. Caderneta de Saúde da Criança
Instrumento e Promoção do Desenvolvimento: como avaliar
e intervir em crianças. Guia Prático de Atualização; 2017.
3. Campbell W W. DeJong. O exame neurológico. 7ª ed. Rio
de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2014.
Capítulo 58 805
Idade Motor Social Linguagem
Rotaciona a cabeça
Preferência visual pela face Choro por fome ou
< 1 mês Membros fletidos
humana desconforto
Preensão reflexa
2 meses Suspensão moderada da cabeça Sorriso social incipiente Vocalizações (“a”, “e”, “u”)
Sustento cefálico completo
Preensão voluntária das mãos Sorriso social Antecipa a chegada
Lalação
4 meses Pernas estendidas do alimento
Ri alto
Direciona o olhar para um objeto Pode chorar à separação dos pais
ou som
Postura simétrica
6 meses Discrimina estranhos Balbucia (“ah-oh-oh-uh)
Senta-se com apoio
Acena adeus
Senta-se sem apoio Fala “mama” e “papa”
9 meses Bate palmas
Engatinha Imita sons
12 meses Anda com apoio Solta objeto quando solicitado Fala quatro palavras
Anda sem apoio Obedece a ordens simples Pode falar nomes de
15 meses
Arrasta-se para subir em objetos objetos de difícil pronúncia
Come sozinha
Ao correr, movimenta o corpo em Fala dez palavras
18 meses Controle dos esfíncteres durante
bloco
o dia
Corre com desenvoltura Ajuda no vestir Começa a formar frases
2 anos
Sobe em escadas com apoio Come parte sozinho e derrama Fala o próprio nome
Veste-se e despe-se
Forma frases longas
Pergunta sobre o significado de
Ampliação de habilidades
5 anos palavras
cognitivas
Interage bem com crianças
Controle esfincteriano consolidado
Quadro 1: Marcos do desenvolvimento.
Fonte: Adaptado de Rodrigues et al., 20171; e Brasil, 20128.
Capítulo 58 806
CAPÍTULO 59
HIDROCEFALIA NA INFÂNCIA
Tatiana Protzenko
Antônio Bellas
EPIDEMIOLOGIA
A hidrocefalia é a doença mais comum tratada
INTRODUÇÃO por neurocirurgiões pediátricos e responde por
Hidrocefalia é uma condição comum no que se aproximadamente 2 bilhões de gastos com saúde nos
refere à neurocirurgia pediátrica. Apesar disso, pode Estados Unidos1. A prevalência de hidrocefalia infantil é
ser muitas vezes heterogênea em sua natureza e de aproximadamente 1 caso a cada 1000 nascimentos2,
complexa quanto à patogênese. Como consequência, mas pode ser maior em países em desenvolvimento.
existem múltiplas definições e sistemas de classificação Somente na África Subsaariana, os novos casos de
na literatura, que podem por muitas vezes confundir o hidrocefalia infantil podem exceder 200.000 por ano,
Capítulo 59 807
Rekate et al.5 já propõem que, com exceção constante na hidrocefalia e seria capaz de modificar
dos tumores que acometem o plexo coroide, todas as dramaticamente as propriedades mecânicas do
hidrocefalias teriam um componente obstrutivo entre tecido cerebral tornando-o mais rígido7. Outro
o seu ponto de produção e o ponto de absorção. mecanismo a ser melhor compreendido é a relação
Sendo assim, hidrocefalia causada por papiloma entre os astrócitos e os canais de aquaporinas. Hoje
do plexo coroide seria o modelo de hidrocefalia sabemos que aquaporina 1 tem papel na produção
comunicante verdadeira. liquórica e aquaporina 4 seria a responsável pelo
fluxo liquórico para fora do tecido cerebral8. Estudos
Entretanto, este modelo clássico vem sendo
in vivo também demonstraram claramente o papel
questionado na literatura recente. De acordo com
do sistema glinfático, com importante absorção
uma nova hipótese, LCR não seria produzido
liquórica descrita nos tecidos adjacentes ao nervo
principalmente pelo plexo coroide. Ao contrário
olfatório.
disso, fluiria dentro do sistema liquórico como
resultado do equilíbrio entre as forças hidrostática Com esses novos modelos de hidrocefalia,
e osmótica entre os capilares, volume liquórico e o possivelmente a melhor classificação seria descrição
volume de fluido intersticial .
6
em forma congênita ou adquirida. Quando existir uma
condição extrínseca responsável pela hidrocefalia
Isto significa que existem outros mecanismos
está caracterizada a hidrocefalia adquirida, como por
fisiopatogênicos para explicar a hidrocefalia
exemplo nos casos de hemorragia da prematuridade.
(Figura 1). Quando observamos publicações
sobre anatomia patológica, a gliose é um achado
Figura 1: Fisiopatogênese da hidrocefalia e a correlação entre o modelo clássico e o novo modelo hidrodinâmico.
Fonte: Os autores, 2022.
Capítulo 59 808
ETIOLOGIA FORMAS CONGÊNITAS
Independente do modelo utilizado para definir
Mutação L1CAM
a hidrocefalia, podemos classificar em formas
Hidrocefalia ligada ao X associada à estenose
adquiridas ou congênitas.
do aqueduto de Sylvius é a forma hereditária mais
comum de hidrocefalia, responsável por até 10%
das hidrocefalias idiopáticas isoladas no sexo
FORMAS ADQUIRIDAS
masculino12. Mutações no gene L1CAM são a
A causa mais comum de hidrocefalia adquirida
principal causa genética de estenose de aqueduto.
é a hemorragia intracraniana, mais frequentemente
Isto porque o produto do gene L1CAM é uma
relacionada à prematuridade. Outra importante causa
molécula de reconhecimento neural que tem papel
se relaciona à neoplasia ou infecções, usualmente
fundamental no processo de migração neuronal.
meningite bacteriana. Nestas situações, pode existir
Quando mutada, dá origem a inúmeras alterações
ambiguidade em relação à causa da hidrocefalia.
estruturais que podem obstruir o fluxo liquórico e
Isso porque a hemorragia intraventricular pode
elas acontecem mais frequentemente no aqueduto. A
causar dilatação ventricular progressiva mesmo na
mutação, também, pode estar associada à anomalia
ausência de evidências clínicas de sangramento. Em
no corpo caloso, hipoplasia ou aplasia do trato
uma série de 28 autopsias em fetos de gestações
corticoespinhal e polegares em adução. Desta forma,
interrompidas por hidrocefalia, 4 apresentavam
o teste para a mutação L1CAM deve ser fortemente
sinais de hemorragia críptica, com aqueduto sem
considerado em meninos com hidrocefalia idiopática
alterações estruturais9. Desta forma, algumas
e com história familiar ou polegares em adução12.
hidrocefalias aparentemente idiopáticas podem
acontecer devido a hemorragia intraventricular pré-
Defeitos do tubo neural
natal não diagnosticada2.
A hidrocefalia é observada na maior parte
Em paralelo, a infecção intrauterina pré-
das crianças com MMC e associada à malformação
natal não reconhecida também pode causar
de Chiari do tipo II (mCh II). McLone e Knepper
hidrocefalia. Infecções intrauterinas por enterovírus,
descrevem a mCh II como uma consequência do
coriomeningite linfocítica, citomegalovírus (CMV) e
escape liquórico através do defeito espinhal; levando
toxoplasmose têm sido associadas à hidrocefalia,
à incapacidade de manter a distensão do sistema
porém sua frequência é subestimada. Um estudo-
ventricular, gerando uma fossa posterior pequena,
piloto recente descreve que crianças com hidrocefalia
incapaz de acomodar suas estruturas13.
apresentavam mais resultados sorológicos
indicativos de infecção por CMV ou toxoplasmose Os fatores que podem causar hidrocefalia em
do que crianças sem hidrocefalia10. Esses resultados associação a MCh II foram sintetizados por Milhorat
sugerem que alguns casos de hidrocefalia (1972), Rekate (1991) e por Dias e McLone (1993),
identificadas como idiopáticas, eram na verdade que seriam13:
causadas por infecções virais não diagnosticadas.
• posição dos orifícios de saída do IV ven-
Atualmente, soma-se ao grupo TORCH, a infecção trículo: orifícios de Luschka e Magendie
pelo Zika vírus, que demonstrou importante tropismo encontram-se no nível do canal cervical,
pelo SNC podendo gerar hidrocefalia11. dificultando ou impedindo a drenagem li-
quórica;
Capítulo 59 809
e comprimido na porção superior do canal 15% dos indivíduos com síndrome de deleção
cervical, mesmo que o LCR consiga sair 22q13.3, esse diagnóstico deve ser considerado em
pelos orifícios do IV ventrículo e circular qualquer pessoa em que a gravidade do atraso no
pelo espaço subaracnoide espinhal, o flu-
desenvolvimento pareça desproporcional ao grau de
xo em direção à convexidade seria impe-
hidrocefalia.
dido por este bloqueio;
A base genética das malformações císticas
• estenose secundária do aqueduto ce-
complexas é reconhecida há muito tempo.
rebral: na MCh II, a tenda do cerebelo é
Várias síndromes com fenótipos sobrepostos
verticalizada e a incisura tentorial incom-
petente, permitindo a herniação do verme são caracterizadas por malformações cerebrais
superior entre os lobos occipitais. A con- císticas complexas que podem causar hidrocefalia
sequente aglomeração de estruturas no progressiva18. Mutações em CC2D2A, que causam as
ápice da fossa posterior pode levar à com- síndromes de Joubert e Meckel, foram recentemente
pressão do aqueduto cerebral; e encontradas associadas ao aumento ventricular19.
Cistos de aracnoide intracranianos são causas I (NF1). A hidrocefalia pode se associar a essas
de LCR dentro das meninges, o que poderia ser malformação de Chiari I na síndrome de Noonan e
Capítulo 59 810
do tentório25.
VACTERL-H
A associação de características VACTERL
(defeitos vertebrais, atresia anal, defeitos cardíacos,
Causas
fístula traqueo-esofágica, anomalias renais e
Hidrocefalia Adquirida
anomalias dos membros) com hidrocefalia foi relatada
- Inflamatória
pela primeira vez em 198423, e posteriormente
Infecção ou hemorragia
foi designada síndrome VACTERL-H. Pode estar Aracnoidite
ventricular/ subaracnoide
associada ou não à herança ligada ao X e é uma - Neoplasias
forma de hidrocefalia congênita. Tumores do parênquima
Efeito de massa
cerebral
Tumores da medula Alteração da composição
Complexo Dand-Walker espinhal liquórica
A hidrocefalia se desenvolve em mais de 80% Disseminação tumoral Infiltração leptomeníngea
Capítulo 59 811
do escalpe ingurgitadas e o sinal de Parinaud (sinal rubéola, citomegalovírus, herpes simplex) ou
do sol poente – Figura 2) ocorre por compressão do amniocentese. Em casos conhecidos de portadoras
núcleo do III nervo craniano no mesencéfalo. maternas de mutação L1CAM, amniocentese
pode ser oferecida para diagnóstico pré-natal de
Em crianças mais velhas, com a fontanela
hidrocefalia ligada ao X.
fechada, os sinais clínicos são mais semelhantes
aos da população adulta, principalmente quando No pós-natal, uma criança com fontanela
os pacientes conseguem se expressar de forma aberta pode ser rastreada para ventriculomegalia
adequada. Nestes casos, cefaleia, vômitos, por ultrassonografia. Nesses casos, continua sendo
sonolência, letargia, diplopia e turvação visual o exame de escolha por ser de fácil acesso e não
podem acontecer. O déficit de aprendizado pode se há exposição à sedação ou radiação. Além disso,
manifestar na pré-adolescência, não sendo rara a medidas indiretas de hipertensão intracraniana
descoberta de “hidrocefalia compensada” em casos podem ser percebidas através do índice ventricular
de estenose de aqueduto. e do índice de resistência das artérias cerebrais.
Desta forma, a ultrassonografia associada ao exame
Endocrinopatias e puberdade precoce também
clínico com medida do perímetro cefálico pode ser
podem acompanhar o quadro clínico.
suficiente para decidir tratar a hidrocefalia.
CONDUTA
Uma vez diagnosticada a hidrocefalia, o
Capítulo 59 812
diferencial – o dispositivo abre quando a pressão cria uma saída no assoalho do terceiro ventrículo.
através da válvula excede um determinado limite Isso permite que o LCR escape para a cisterna pré-
e fecha quando a pressão cai abaixo desse nível. pontina, que pode circular no espaço subaracnoideo
Atualmente, existem mecanismos mais modernos extracerebral e ser absorvido no seio sagital superior.
de controle da drenagem, com dispositivos anti-sifão O paciente ideal para este procedimento é a criança
ou reguladores do fluxo liquórico, a fim de evitar a mais velha que tem obstrução ao nível do aqueduto
hiperdrenagem. Em 2000, um estudo randomizado de Sylvius causando alargamento dos ventrículos
comparou válvulas de pressão diferencial com laterais e terceiro, mas não o quarto ventrículo, e
duas novas válvulas (Orbis Sigma ® e Delta®) e que não tenha necessitado de DVP previamente31.
não demonstrou diferença entre elas em relação ao
A ventriculostomia é realizada através de um
tempo para a primeira disfunção28.
endoscópio, que permite visualização da anatomia
Em crianças com menos de 1 ano de idade, intraventricular. O endoscópio é inserido no ponto
principalmente antes dos 6 meses, a derivação de Kocher, através do manto cerebral para a região
ventrículo-peritoneal é o tratamento de escolha. lateral ventrículo. O forame de Monro é identificado e
Segundo protocolo sugerido por Choux et al. , com
29
o endoscópio é direcionado através do forame para o
o intuito de evitar infecções e aumentar a sobrevida terceiro ventrículo. O assoalho do terceiro ventrículo
dos dispositivos, as cirurgias devem ser realizadas é inspecionado, e o orifício é feito anteriormente
no primeiro horário do dia, com número reduzido de aos corpos mamilares e posterior ao recesso
pessoas no bloco cirúrgico e colocando-se em prática infundibular, ou seja, no tuber cinéreo (Figura 4A
o protocolo no-touch evita-se o contato excessivo ). Se a anatomia não for claramente identificável, o
ao dispositivo, com troca de luvas entre a fase do endoscópio é removido e uma DVP é inserida em
acesso cirúrgico e a fase de inserção da DVP, assim seu lugar. É importante ressaltar que os ventrículos
como troca de material (mesa de instrumental para não diminuem de tamanho na medida em que
acesso e para inserção do shunt separados). diminuem quando instalada uma DVP, e determinar
a função da TVE pode ser difícil. A ressonância
Apesar de todos esses cuidados, sabemos
magnética mostra um fluxo através do assoalho
que os dispositivos de drenagem se associam
do terceiro ventrículo, e estudos de fluxo de LCR
a um número de falhas bastante significativo. A
na ressonância magnética também demonstram
taxa de falha geral é de 40% em um ano após a
patência (Figura 4B). A TVE foi tentada em muitos
inserção e 50% em dois anos30. A falha ocorre
outros tipos de hidrocefalia, mas parece menos
por muitas razões (obstrução proximal, obstrução
bem-sucedida na pós-hemorrágica e hidrocefalia
distal, desconexões, infecções e falha na absorção
pós-meningite. Além disso, os resultados têm sido
peritoneal) e geralmente requer reoperação,
ruins em lactentes com menos de seis meses de
aumentando a morbidade. O pior cenário se instala
idade. Isso não significa que a TVE não possa ser
quando o peritônio não é mais capaz de absorver
realizada nestes pacientes, mas é necessário o
o volume liquórico drenado pela DVP. Neste caso,
estudo da anatomia individual e a avaliação do risco
deve haver modificação do sítio de implantação do
em caso de falha do procedimento.
cateter distal, sendo este na maior parte das vezes
atrial. A Figura 3 mostra outras soluções alternativas: Independente do tipo de tratamento escolhido,
videolaparoscopia para retirada de bridas, derivação os pacientes com DVP ou submetidos a TVE
ventrículo-sinusal e derivação ventrículo-biliar. necessitam de acompanhamento regular ao longo
da vida com neurocirurgião pediátrico. Assim como
Neste contexto de alta morbidade relacionada
os pacientes que têm derivações são dependentes
aos shunts, a terceiroventriculostomia endoscópica
de função de derivação adequada para o resto de
(TVE) surge como um tratamento promissor. A TVE
Capítulo 59 813
suas vidas, na TVE os pacientes são dependentes 14. Bartsch O, Kirmes I, Thiede A, et al. Novel VANGL1
Gene Mutations in 144 Slovakian, Romanian and German
da abertura no assoalho do terceiro ventrículo para
Patients with Neural Tube Defects. Mol Syndromol.
o resto de suas vidas. Assim, é um erro pensar na 2012;3(2):76-81.
TVE como “curados da hidrocefalia”. Pelo contrário, 15. Allache R, De Marco P, Merello E, Capra V, Kibar Z.
o fechamento da ventriculostomia pode ser muito Role of the planar cell polarity gene CELSR1 in neural tube
defects and caudal agenesis. Birth Defects Res A Clin Mol
mais agudo do que a disfunção de DVP. Teratol. 2012;94(3):176-181.
16. Seo JH, Zilber Y, Babayeva S, et al. Mutations in the
planar cell polarity gene, Fuzzy, are associated with neural
tube defects in humans. Hum Mol Genet. 2011;20(22):4324-
REFERÊNCIAS 4333.
1. Simon TD, Riva-Cambrin J, Srivastava R, et al. Hospital
care for children with hydrocephalus in the United States: 17. Al-Dosari MS, Al-Owain M, Tulbah M, et al. Mutation
utilization, charges, comorbidities, and deaths. J Neurosurg in MPDZ causes severe congenital hydrocephalus. J Med
Pediatr. 2008;1(2):131-137. Genet. 2013;50(1):54-58.
2. Tully HM, Dobyns WB. Infantile hydrocephalus: a review 18. Doherty D, Chudley AE, Coghlan G, et al. GPSM2
of epidemiology, classification and causes. Eur J Med mutations cause the brain malformations and hearing
Genet. 2014;57(8):359-368. loss in Chudley-McCullough syndrome. Am J Hum Genet.
2012;90(6):1088-1093.
3. Warf BC, Alkire BC, Bhai S, et al. Costs and benefits of
neurosurgical intervention for infant hydrocephalus in sub- 19. Bachmann-Gagescu R, Ishak GE, Dempsey JC,
Saharan Africa. J Neurosurg Pediatr. 2011;8(5):509-521. et al. Genotype–phenotype correlation in CC2D2A
-related Joubert syndrome reveals an association
4. Dandy WE, Blackfan KD. An experimental, clinical and with ventriculomegaly and seizures. J Med Genet.
pathological study: Part 1.—Experimental Studies. Am J Dis 2012;49(2):126–137.
Child. 1914;VIII(6):406-482.
20. Coll G, El Ouadih Y, Abed Rabbo F, Jecko V, Sakka
5. Rekate HL. The definition and classification of L, Di Rocco F. Hydrocephalus and Chiari malformation
hydrocephalus: a personal recommendation to stimulate pathophysiology in FGFR2-related faciocraniosynostosis: A
debate. Cerebrospinal Fluid Res. 2008;5:2. review. Neurochirurgie. 2019;65(5):264-268.
6. Bulat M, Klarica M. Recent insights into a new 21. Still M, Miller P, Dodd W, Moor R, Lucke-Wold B, Porche
hydrodynamics of the cerebrospinal fluid. Brain Res Rev. K, Foote K. Chiari I malformation and Noonan’s syndrome:
2011;65(2):99-112. Shared manifestations of RASopathy. J Clin Images Med
7. Miller JM, McAllister II JP. Reduction of astrogliosis and Case Rep. 2021;2(5):1334.
microgliosis by cerebrospinal fluid shunting in experimental 22. Nix JS, Blakeley J, Rodriguez FJ. An update on the
hydrocephalus. Fluids Barriers CNS. 2007;4(1):5. central nervous system manifestations of neurofibromatosis
8. Verkman AS, Tradtrantip L, Smith AJ, Yao X. Aquaporin type 1. Acta Neuropathol. 2020 Apr;139(4):625–41.
Water Channels and Hydrocephalus. Pediatr Neurosurg. 23. Briard ML, le Merrer M, Plauchu H, Dodinval P,
2017;52(6):409-416. Lambotte C, Moraine C, et al. [Association of VACTERL
9. Lategan B, Chodirker BN, Del Bigio MR. Fetal and hydrocephalus: a new familial entity]. Ann Genet.
hydrocephalus caused by cryptic intraventricular 1984;27(4):220–3.
hemorrhage. Brain Pathol. 2010 Mar;20(2):391-398. 24. Hirsch J-F, Pierre-Kahn A, Renier D, Sainte-Rose C,
10. Simeone RM, Rasmussen SA, Mei JV, et al. A pilot study Hoppe-Hirsch E. The Dandy-Walker malformation: A review
using residual newborn dried blood spots to assess the of 40 cases. Journal of Neurosurgery. 1984 Sep;61(3):515–
potential role of cytomegalovirus and Toxoplasma gondii in 22.
the etiology of congenital hydrocephalus. Birth Defects Res 25. Spennato P, Mirone G, Nastro A, Buonocore
A Clin Mol Teratol. 2013;97(7):431-436. MC, Ruggiero C, Trischitta V, et al. Hydrocephalus in
11. Jucá E, Pessoa A, Ribeiro E, et al. Hydrocephalus Dandy–Walker malformation. Childs Nerv Syst. 2011
associated to congenital Zika syndrome: does shunting Oct;27(10):1665–81.
improve clinical features? Childs Nerv Syst. 2018;34(1):101- 26. Quencer RM. Intracranial CSF flow in pediatric
106. hydrocephalus: evaluation with cine-MR imaging. AJNR Am
12. Stumpel C, Vos YJ. L1 Syndrome. In: Adam MP, J Neuroradiol. 1992 Apr;13(2):601–8.
Ardinger HH, Pagon RA, et al, eds. GeneReviews. Seattle: 27. McLone DG. Treatment of myelomeningocele:
University of Washington, Seattle; 1993. arguments against selection. Clin Neurosurg. 1986;33:359–
13. McLone DG, Knepper PA. The cause of Chiari 70.
II malformation: a unified theory. Pediatr Neurosci. 28. Kestle J, Drake J, Milner R, Sainte-Rose C, Cinalli G,
1989;15(1):1-12. Boop F, et al. Long-Term Follow-Up Data from the Shunt
Design Trial. Pediatr Neurosurg. 2000;33(5):230–6.
Capítulo 59 814
Figura 3: Derivações alternativas: DVP. A, B. realizada por videolaparoscopia; C, D. derivação ventrículo-sinusal; e E, F.
derivação ventrículo-biliar.
Fonte: Os autores, 2021.
Figura 4: A. Visualização do túber cinéreo durante terceiroventriculostomia endoscópica. B. Ressonância magnética com
estudo de fluxo liquórico pós-operatória demonstrando fluxo na cisterna pré-pontina.
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 59 815
29. Choux M, Genitori L, Lang D, Lena G. Shunt 31. Kulkarni AV, Riva-Cambrin J, Browd SR. Use of the
implantation: reducing the incidence of shunt infection. ETV Success Score to explain the variation in reported
Journal of Neurosurgery. 1992 Dec;77(6):875–80. endoscopic third ventriculostomy success rates among
published case series of childhood hydrocephalus: Clinical
30. Drake JM, Kestle JRW, Milner R, Cinalli G, Boop F, Piatt
article. PED. 2011 Feb;7(2):143–6.
J, et al. Randomized Trial of Cerebrospinal Fluid Shunt
Valve Design in Pediatric Hydrocephalus. Neurosurgery.
1998 Aug;43(2):294–303.
Capítulo 59 816
CAPÍTULO 60
PARALISIA CEREBRAL INFANTIL
Capítulo 60 817
• fatores de risco maternos: como idade que o risco de PC pode ser reduzido em até 30%
abaixo de 20 anos e acima de 34 anos, nas crianças prematuras, se medidas de prevenção
baixo nível socioeducacional, múltiplas forem adotadas no seu devido tempo. Sulfato de
gravidezes, nuliparidade, entre outros;
magnésio deve ser administrado na mãe, quando
• fatores de risco antenatal: fertilização in existe risco de parto prematuro10.
vitro, muito às custas de gemelaridade e A administração de corticosteroides, como
baixo peso ao nascimento; crescimento in-
betametasona, deve ser realizada em mulheres
trauterino retardado (CIUR) e infecção in-
entre 24 e 34 semanas gestacionais, sempre que
trauterina de etiologia viral ou bacteriana;
houver risco de parto prematuro, com a finalidade
• fatores de risco perinatal: parto prematuro de acelerar a maturação pulmonar fetal e minimizar
(abaixo de 37 semanas de gestação), as- o risco de hemorragia intracraniana11.
piração meconial, encefalopatia hipóxico
isquêmica, infarto isquêmico perinatal e Cafeína é uma das medicações mais usadas
crises convulsivas neonatais; e em recém-nascidos pré-termos. Os benefícios da
terapia já são bem documentados na literatura,
• fatores de risco pós-natal: estes são me-
tanto sobre o aspecto pulmonar, quanto do
nos frequentes e correspondem a menos
neurodesenvolvimento. As evidências são robustas
de 10% dos casos de PC. Os mais co-
muns são traumatismo cranioencefálico, sobre o uso de doses padrão para prevenção
semiafogamento e infecção do sistema da apneia da prematuridade e/ou para facilitar a
nervoso central. extubação12.
Capítulo 60 818
Figura 1: Intervenções preventivas com melhores níveis de evidência.
Fonte: Baseado em Novak et al., 20209.
Capítulo 60 819
desde o início dos anos 2000 e com o advento somados os dados da história clínica, exames de
do sequenciamento de última geração e arrays, imagem, exame neurológico padronizado para
tem sido possível identificar um número crescente idade, como o exame neurológico de Hammersmith
de bases genéticas para a paralisia cerebral. (Hammersmith infantile neurological examination -
Entretanto, em recente revisão sistemática, HINE) e a avaliação do repertório motor do lactente
observa-se perda de qualidade na metodologia (general movements)14.
dos estudos que relatam casos de PC de origem
Romeo et al., 2016, em artigo de revisão,
genética, com um número limitado de pacientes e
sugerem fortemente que o HINE deve ser usado para
não conformidade com os critérios internacionais
avaliar crianças termo e pré-termo de risco para PC,
de conceituação da paralisia cerebral. Dificultando,
de três a 24 meses. O exame neurológico infantil
assim, o completo entendimento da neurobiologia
de Hammersmith (HINE) avalia 26 itens do exame
da PC e o desenvolvimento de novas possibilidades
neurológico de forma padronizada, de modo que
terapêuticas16.
cada item receba um escore de zero a três e, ao final
Existem mais de 800 condições genéticas nas do exame, seja obtido um escore global da criança,
bases de dados genéticos, relacionadas ao fenótipo mínimo de zero e máximo de 78. Escores maiores
de paralisia cerebral. Espera-se para um futuro de 60 estão relacionados a um melhor prognóstico19.
próximo, um grande aumento neste número, com
O HINE não só identifica crianças de risco,
a melhoria na qualidade dos testes genéticos e do
como também prediz informações adicionais sobre o
maior conhecimento nas áreas de Medicina Fetal e
tipo e a gravidade das sequelas motoras cerebrais19.
Genética17.
Movimentos gerais do lactente, em inglês,
Em 2018, o grupo responsável pelo consórcio
general movement assessment são uma avaliação
internacional sobre as bases genéticas da paralisia
do repertório motor espontâneo do lactente.
cerebral desenvolveu um consenso, reiterando
Estudos prévios têm indicado que o reflexo tônico
as diretrizes da Survaillance Cerebral Palsy
cervical assimétrico persistente – entre outros
Europe – SCP, em que PC é uma desordem do
padrões assimétricos – pode ser indicativo de
neurodesenvolvimento, diagnosticada com bases
lesões unilaterais, enquanto a rigidez de tronco
clínicas e não etiológicas. Isso quer dizer que o
e membros está mais relacionada a diplegia
diagnóstico etiológico não deve mudar o diagnóstico
espástica ou tetraparesia espástica. A avaliação
clínico de PC e os indivíduos com esse diagnóstico
dos movimentos gerais do lactente tem cerca de
devem continuar incluídos nos registros de saúde,
98% de sensibilidade e 91% de especificidade para
receber terapias de neurorreabilitação, ter acesso à
predizer paralisia cerebral. No entanto, não deve ser
saúde e apoio financeiro e social a que eles e suas
levada em conta isoladamente. É necessário estar
famílias têm direito18.
dentro do contexto de uma injúria cerebral prévia e
ser analisada conjuntamente com a história clínica,
exame neurológico e exame de imagem20.
DIAGNÓSTICO PRECOCE
A importância do diagnóstico precoce se deve
ao fato de poderem ser implantadas intervenções CLASSIFICAÇÃO
precocemente, possibilitando melhor prognóstico
Classificação clínica
ao paciente e orientação mais precisa às famílias.
É possível obtermos alto grau de acurácia e Devido à sua grande complexidade e
Capítulo 60 820
Colver et al.22 relacionaram cinco eixos de Na prática clínica, os pacientes com PC
classificação: são subdivididos de acordo com o distúrbio motor
predominante. Exemplo: paralisia cerebral espástica
1. sítio anatômico lesionado: córtex cerebral,
(piramidal), discinética – distônica e atetoide ou
trato piramidal, sistema extrapiramidal e/
atáxica (extrapiramidal). No entanto, muitas vezes,
ou cerebelo;
os sinais piramidais e extrapiramidais podem
2. sinais e sintomas clínicos: espasticidade, coexistir, sendo difícil a distinção exata entre eles. A
discinesia (formas distônicas e esses casos chamamos de PC mista24,25.
coreoatetoides) e/ou ataxia;
Na casuística de Reid et al., em 2011, o
3. envolvimento topográfico das tipo motor mais frequentemente encontrado foi o
extremidades: diplegia, quadriplegia ou espástico (em 91% dos casos), seguido de ataxia
hemiplegia;
(5%) e discinesia (4%)26. Esses dados estão de
4. tempo presumido do insulto: pré-natal, acordo com os relatados por Novak et al., 2013, em
intraparto, pós-natal; e uma revisão sistemática, na qual os quatro tipos
motores estavam assim distribuídos: espasticidade
5. tônus muscular: isotônico, hipotônico ou (85 a 91% dos casos); discinesia, incluindo distonia
hipertônico.
e atetose (4 a 7%); ataxia (4 a 6%) e hipotonia
(2%). Nos tipos atáxico, discinético e hipotônico,
A hipertonia está presente em 89 a 98% geralmente há o acometimento dos quatro membros,
dos casos de PC, incluindo os pacientes enquanto na forma espástica, um ou mais membros
espásticos e discinéticos14. Sanger et al., podem ser afetados 14,27
.
Capítulo 60 821
na coreoatetose. Os membros superiores Novak, 201435, encontrou dois estudos
tendem a ser mais afetados. No entanto, o populacionais, onde os pacientes hemiplégicos
tronco, a região cervical, os olhos e a boca correspondiam a 39% dos casos de PC; os
são frequentemente acometidos pelos mo-
diplégicos, 38%; e os quadriplégicos, 23% (Figura
vimentos involuntários. As lesões isoladas
3). Esses percentuais se mantiveram em uma nova
do tálamo e dos gânglios da base estão
associadas com uma maior gravidade da revisão sistemática de Novak et al., 201714.
coreoatetose, mas não da distonia30,31; e
Classificação motora funcional
• PC atáxica é uma condição acompanha-
da por hipotonia, sendo caracterizada por Sistema de classificação da função motora
uma alteração na coordenação motora, grossa – Gross Motor Function Classification
resultando em marcha atáxica, instabilida- System (GMFCS)
de do tronco, dismetria e tremor24. Muitos Devido à necessidade de um sistema
autores concordam que as formas atáxi-
padronizado para classificar as habilidades motoras
cas de PC são difíceis de serem distingui-
da criança com PC, Palisano et al.36, em 1997,
das de doenças cerebelares progressivas
neurodegenerativas. Dessa forma, faz-se desenvolveram um Sistema de Classificação da
necessária uma mínima investigação para Função Motora Grossa (GMFCS). Essa classificação
causas metabólicas e/ou genéticas, frente é uma das mais utilizadas na prática clínica, bem
a um paciente com paralisia cerebral atá- como para publicação científica37. O GMFCS avalia
xica3. cinco níveis de comprometimento motor, em cinco
A definição e a classificação das diferentes grupos etários: menor que dois anos, de dois a
síndromes motoras presentes na PC não são quatro anos, de quatro a seis anos, de seis a 12
simples. Elas requerem uma grande acurácia na anos e de 12 a 18 anos38. Na Figura 4, podemos
anamnese e exame neurológico, que deve se basear observar os cinco níveis de comprometimento motor
em uma cuidadosa observação da postura passiva, dos pacientes com PC entre seis e 12 anos de idade.
ativa e compensatória da criança, bem como de sua
movimentação voluntária e involuntária. Seguindo
para a avaliação do tônus muscular, flutuação do
tônus, reflexos tendinosos profundos, movimentação
passiva das articulações e avaliação de dor29.
Classificação topográfica
PC é a principal causa de espasticidade na
infância33. Os pacientes espásticos podem ser
classificados de acordo com a topografia das áreas
motoras afetadas e são divididos em monoplégicos,
hemiplégicos, diplégicos, triplégicos e quadriplégicos
(Figura 2) 34.
Capítulo 60 822
Figura 2: Descrição topográfica na PC. Na monoplegia, um membro é afetado, e geralmente é o membro inferior.
Na hemiplegia, um lado do corpo é afetado, e geralmente o membro superior é mais afetado que o inferior. Na
diplegia, todos os membros são afetados, mas os membros inferiores são muito mais afetados que os superiores, os
quais geralmente apresentam apenas uma dificuldade na coordenação motora fina. Na triplegia, o padrão usual é o
envolvimento do membro superior e bilateral e assimétrico dos membros inferiores. Na quadriplegia, todos os quatro
membros e o tronco estão envolvidos.
Fonte: Baseado em Graham et al., 201610.
Capítulo 60 823
Figura 4: GMFCS Expandido e revisado entre seis e 12 anos de idade.
Fonte: Descrição de Palisano et al., 199736; e, adaptado de Paulson e Vargus-Adams, 201737.
Capítulo 60 824
comorbidades. Dor, distúrbios de comportamento
Deficiência intelectual
e distúrbios do sono são comorbidades tratáveis,
Cerca de metade dos pacientes com PC
muito frequentes e, no entanto, subdiagnosticadas
apresentam algum grau de deficiência intelectual
nas crianças com PC. A investigação clínica do
(DI) e, mesmo em pacientes hemiplégicos, com
paciente deve incluir uma vigilância constante para
leve comprometimento motor, é possível observá-
todas as comorbidades mais frequentes (Figura 5),
la. Uma intervenção precoce por meio de avaliações
e o tratamento específico para cada uma delas deve
psicométricas faz-se necessária para uma
ser proposto o mais breve possível, a fim de melhorar
abordagem terapêutica adequada . 46
a qualidade de vida, os resultados nas terapias
propostas e minimizar o risco de complicações35. Tetraplegia espástica, epilepsia e
Para tanto, faz-se necessária a presença de uma malformações cerebrais estão associadas mais
equipe multidisciplinar afinada e coesa, trabalhando frequentemente a comprometimento intelectual.
incansavelmente pelo mesmo objetivo, pensando Normalmente, déficit cognitivo pode ser considerado
a longo prazo em uma vida adulta autônoma e quando o quociente intelectual (QI) é abaixo de 70.
funcional .
42
No entanto, essa não deve ser única forma de avaliar
e diagnosticar a deficiência intelectual. Vários são
Dor os fatores que podem interferir e piorar o quociente
intelectual. Exemplos: incoordenação motora fina,
A dor é a comorbidade tratável,
déficit atencional, déficit visual, entre muitos outros47.
subdiagnosticada, mais frequentemente encontrada
na PC, principalmente naqueles pacientes menores Cerca de 81 a 89% das crianças com
e com comunicação limitada. É mais comumente espasticidade unilateral têm cognição normal com
referida nos níveis III, IV e V do GMFCS, sendo QI acima de 70, enquanto crianças com diplegia
que os locais mais comuns de queixa são: joelhos, espástica têm QI acima de 70, em 67 a 78% dos
pés, quadril, coluna lombar, abdome e pernas. casos. Na diplegia espástica em termos e pré-
A identificação do sítio e da intensidade da dor é termos, são comumente encontradas alterações
fundamental para o correto manejo terapêutico, visuoespaciais que podem conferir maior dificuldade
seja ele postural, medicamentoso e/ou cirúrgico, nesses pacientes. No subgrupo quadriplégico, existe
visando minimizar o impacto na qualidade de vida uma correlação direta entre o grau de acometimento
do paciente . 44 motor e déficit cognitivo e cerca de 90 a 100% dos
pacientes têm QI abaixo de 7047,48.
Estudos demonstram que uma em cada
duas crianças experimentam dor durante as suas Intervenções precoces com treinos
terapias, procedimentos intervencionistas, uso de atencionais, visuo-espaciais e de linguagem podem
gesso seriado e pós-operatório. Dor crônica é uma atuar para um melhor prognóstico e rendimento
condição complexa e heterogênea, envolvendo acadêmico. Alguns estudos demonstram que
múltiplos mecanismos inibitórios e excitatórios crianças com PC que frequentam escolas regulares
no sistema nervoso central e periférico, que têm melhor desempenho em matemática e leitura do
podem servir como perpetuantes da dor ou, em que aquelas que frequentam escolas especiais47,49.
contrapartida, possíveis alvos para tratamento.
Ainda são poucas as evidências para o manejo Luxação de quadril
da dor na PC, mas sabidamente, crianças e Luxação e subluxação de quadril têm a sua
adolescentes com dor crônica, deformidades osteo- incidência relacionada à gravidade da forma clínica,
articulares, espasticidade e distonia, demandam sendo maiores nos níveis IV e V do GMFCS, e podem
maior atenção 9,45
. variar de 7%, nos pacientes ambulantes, até 60%, nos
Capítulo 60 825
Figura 5: Infográfico. Paralisia cerebral e principais comorbidades.
Fonte: Adaptado de World CP Day – October 6th. World Cerebral Palsy Day. Disponível em https:/worldcpday.org43.
Capítulo 60 826
não ambulantes. A subluxação de quadril não tratada PC. Cerca de 85% dos pacientes com distúrbios do
pode evoluir para displasia acetabular e luxação do neurodesenvolvimento apresentam distúrbios do
quadril, levando a deformidades, dificuldades de sono. Em recente artigo de revisão sistemática, os
higienização e ainda para manter-se sentado, bem autores encontraram evidências de que crianças
como dor acentuada. Medidas posturais, fisioterapia com PC mais velhas, com mais comorbidades e
motora, toxina botulínica e/ou baclofeno intratecal, maior apresentação fenotípica, têm mais distúrbios
quando instituídas precocemente, podem prevenir a de sono. As consequências dos distúrbios do sono
sua progressão 50,51
. afetam, além da criança, também os seus pais e
cuidadores. Estes experimentam noites insones,
Em 2014, o grupo australiano revisou,
aumento de irritabilidade, ansiedade e sono ao longo
baseado em evidências, e renomeou o consenso de
do dia, contribuindo para uma piora na qualidade de
vigilância do quadril daquele país, passando assim
vida55.
a se chamar “protocolo australiano de vigilância do
quadril para crianças com PC”. Assim, conseguiram Os distúrbios do sono mais frequentemente
melhor definir a frequência de avaliação clínica e encontrados foram: dificuldade para acordar de
radiológica para os diferentes níveis de GMFCS. manhã, insônia, pesadelos, dificuldade de iniciar e
Mas sempre tendo em mente que o ideal é um manter o sono à noite e parassonias56. O tratamento
percentual de migração estável ou inferior a 30% deve ser instituído, tão logo o diagnóstico seja feito.
entre as avaliações clínico-ortopédicas. Na Figura A primeira linha adotada deve ser a comportamental,
6, está sistematizada a frequência radiológica para seguida pelo tratamento medicamentoso, quando
cada nível GMFCS . 52
necessário, visando melhorar o desenvolvimento,
o crescimento e o comportamento da criança, bem
Epilepsia como a qualidade de vida de todos que convivem
branca. Nesses casos, não é rara a suspensão dos vida normal. Apenas de 5% a 10% delas morrem
A investigação e o tratamento de uma síndrome deficiência intelectual e grave deficiência física eleva
epiléptica devem ser iniciados tão logo surjam o risco de pobre prognóstico e morte prematura35.
crises, independente da etiologia da PC. Para tanto, Pais, cuidadores, familiares, médicos e
deve ser levada em consideração a idade de início, terapeutas devem trabalhar juntos, com objetivos
a semiologia das crises, o padrão ictal e interictal ao claros, para projetar um futuro saudável e cheio de
eletroencefalograma (EEG), comorbidades, resposta possibilidades a esses pacientes55.
ao tratamento e o curso clínico. O diagnóstico de uma
síndrome epiléptica pode fornecer dados valiosos
sobre o prognóstico e os tratamentos específicos,
INTERVENÇÃO E TRATAMENTO
como na síndrome de West54.
O diagnóstico da PC deve ser precoce, para
que sejam instituídos os tratamentos/intervenções
Distúrbios do sono específicos, em um período quando há maior
Os distúrbios do sono são subdiagnosticados neuroplasticidade. Dessa forma, os ganhos
e subtratados na maioria dos casos de crianças com funcionais poderão ser otimizados . O diagnóstico
27
Capítulo 60 827
preciso e precoce da etiologia implicará em são os principais fatores contribuintes para a
tratamento adequado, melhor prognóstico, manejo neuroplasticidade.
das comorbidades e melhor qualidade de vida para
Hipertonia generalizada é, frequentemente,
pacientes, familiares e cuidadores14.
tratada com medicações orais. Vários medicamentos
Dada a grande heterogeneidade clínica orais têm sido usados para a redução da
da PC, seu manejo mais adequado e que trará espasticidade, porém, ainda sem comprovação
mais benefícios ao paciente, é aquele quando de atuação na funcionalidade. Os medicamentos
uma equipe multidisciplinar atua de forma mais comumente utilizados no tratamento da
integrada por objetivos claros que visem a melhor espasticidade são baclofeno oral, diazepam,
funcionalidade e qualidade de vida para o paciente clonazepam, clonidina, tizanidina e dantrolene.
e seus cuidadores. A seguir, citaremos algumas Todos, com exceção do dantrolene, atuam no sistema
das muitas especialidades clínicas e cirúrgicas que nervoso central. Os principais efeitos colaterais são
compõem o universo da PC: Neurologia, Neurologia sedação e sonolência. A maioria das medicações
Infantil, Ortopedia, Fisiatria, Endocrinologia, orais pode ser usada em combinação57. No entanto,
Gastroenterologia, Genética, Neurocirurgia, apenas o diazepam tem o melhor nível de evidência,
Odontologia, Oftalmologia, Otorrinolaringologia, luz verde, pelo sistema de tráfego de luz na revisão
Cirurgia Pediátrica, Enfermagem, Assistência Social, de Novak et al., 20209.
Nutrição, Fonoaudiologia, Fisioterapia, Psicologia,
Em relação à forma discinética da PC, o uso de
Terapia Ocupacional, entre muito outros42.
medicações orais tem se mostrado controverso, sem
As intervenções direcionadas ao manejo evidências que aprovem ou desaprovem o uso das
motor e do tônus muscular correspondem ao maior principais drogas utilizadas: trihexyfenidyl, levodopa,
número de publicações, e são aquelas onde existem tetrabenazina, levetiracetam e gabapentina58.
os melhores níveis de evidência, recebendo luz Acredita-se que essa perda de evidências se deve à
verde, pelo sistema de tráfego de luz . 9
dificuldade de classificação e desenhos dos estudos
até o momento59. Gabapentina recebeu luz amarela,
A espasticidade é a principal causa de dor e
possivelmente efetiva, pelo sistema de tráfego de
limitação funcional na criança com PC. O manejo
luz na revisão de Novak et al., 20209.
adequado da espasticidade visa reduzir a dor e
os espasmos musculares, melhorar a postura, Na Tabela 1 estão as principais medicações
minimizar e/ou evitar contraturas e deformidades, e doses utilizadas no tratamento da hipertonia
facilitar a mobilidade e a destreza, melhorar e (espasticidade e distonia)57.
facilitar os cuidados com o paciente33.
Capítulo 60 828
Nome
Uso Dose Mecanismo de ação Efeitos colaterais
genérico
Iniciar 2,5mg 3x/
dia.
Sedação (menor que os
Espasticidade Dose máxima Agonista do receptor
Baclofeno benzodiazepínicos)
Distonia 80mg/dia dividido GABA B
Constipação
em 3 x em crianças
maiores de 8 anos
Espasticidade 0,01-0,3mg/kg/dia Agonista do receptor Sedação, salivação
Clonazepam
Distonia Dividido 2 a 3x/dia GABA A constipação
Iniciar 0,05mg/dia
Aumentar 0,05mg/
Agonista adrenérgico alfa 2 Sedação, hipotensão,
Espasticidade Clonidina semana, até
de ação central bradicardia
0,3mg/dia dividido
em 3 x
0,5mg/kg dividido
Interfere na liberação de
em 2x Fraqueza, sedação (menor
Espasticidade cálcio do retículo
Dantrolene Aumento semanal que outros fármacos),
Distonia sarcoplasmático
até o máximo hepatotoxicidade
do músculo esquelético
de 12 mg/kg/dia 4x
0,05 - 0,1mg/kg/dia
Espasticidade Agonista do receptor Sedação, constipação,
Diazepam dividido em
Distonia GABA A retenção urinária
2x a 4x
Iniciar 10-15mg/kg/
dia em 2x, Sedação, labilidade
Espasticidade Gabapentina Desconhecido
titular até 60mg/kg/ emocional
dia em 3x
Raramente efetivo em PC,
mais
25/100: iniciar
efetivo em distonia genética
0,25-0,5 cp. em 2x,
Carbidopa/ Precursor da dopamina, Efeitos gastrointestinais.
Distonia dose máxima
levodopa receptor agonista indireto Adicionar
800mg/dia em 2x
carbidopa para reduzir
ou 3x
efeitos
adversos. Sedação
Iniciar 1 - 2mg à
noite
Agonista adrenérgico alfa 2 Sedação, hipotensão,
Espasticidade Tizanidina Manutenção 0,3-
de ação central hepatotoxicidade
0,5mg/kg/dia
em 3 x ou 4x
Iniciar 2-2,5mg/dia
Aumentar2-2,5mg/ Sedação, constipação,
Distonia Trihexifenidil semana Anticolinérgico retenção urinária,
Dose máxima boca seca, tiques motores
60mg/dia 2x ou 3x discinesias
Tabela 1: Medicações orais para manejo da espasticidade/distonia.
Fonte: Baseado em Dy e Roge, 202057.
Capítulo 60 829
Sobre os canabinoides, canabidiol (CBD)
e tetra-hidrocanabinol (THC), ainda não existe Apresentação Dose
Toxina botulínica
nenhum nível de evidência ou robustez de dados por frasco recomendada
que suporte a sua indicação para o tratamento da nome genérico
U (unidades)
comercial
hipertonia na PC57.
10–15 U/kg por
A quimiodenervação com toxina botulínica membro
Dose máxima:
faz parte do arsenal terapêutico no manejo da Abobotulinumtoxin A 300 U 30U/kg para
hipertonia na PC há quase três décadas, e vem se (Dysport) 500 U injeções
bilateral ou
firmando como uma das mais importantes terapias dose total de
adjuvantes no controle da espasticidade e distonia 1000U
focal ou generalizada60. Sua eficácia é comprovada 12-15U/kg
IncobotulinumtoxinA
100U Dose máxima
na redução da espasticidade, prevenção de (Xeomin)
total 300U
deformidades músculo-esqueléticas e contraturas, 12-16U/Kg
no adiamento de procedimentos cirúrgicos, na (GMFCS V)
Dose máxima
redução de dor, facilitação da higienização, promove 50U
OnabotulinumtoxinA total 300U
100U
melhor desenvolvimento motor e reduz a carga de (Botox) 16-20U/kg
200U
(GMFCS I-IV
cuidados sobre pais e cuidadores61. Dose máxima
total 400-600U
A toxina botulínica (TB) é uma grande
2.500U em 0,5 Não há doses
proteína de 150 kilodaltons, produzida pela bactéria RimabotulinumtoxinA ml publicadas
Clostridium botulinum. Existem sete sorotipos, mas (Myobloc) 5.000U em 1 ml para
10.000U em crianças
apenas dois em uso clínico: A e B. A aplicação 2 ml
da toxina botulínica se dá por meio de injeções
Tabela 2: Toxina botulínica comumente usada em paralisia
intramusculares, quando atua promovendo uma cerebral, forma de apresentação e doses recomendadas.
denervação reversível na placa motora, impedindo GMFCS: Gross Motor Function Classification System.
a liberação de acetilcolina na fenda pré-sináptica, Fonte: Baseado em Dy e Roge, 202057.
reduzindo, dessa forma, a contração muscular no
músculo ou grupo muscular que se queira tratar ou
O papel analgésico da toxina botulínica é
denervar62. Seu uso deve estar sempre associado
complexo e ainda não totalmente esclarecido. No
a um planejamento multidisciplinar com fisioterapia
entanto, seu uso em diversas neuralgias já conta
motora, uso de bandagens, órteses, gesso seriado
com nível de evidência B. Dor músculo-esquelética
e, em alguns casos, cirurgias ortopédicas e/
é o maior problema clínico em muitas crianças com
ou neurocirúrgicas. É, geralmente, utilizada em
PC e parece estar aumentada na segunda década
maiores de dois anos de idade, mas em casos mais
de vida e em adultos jovens. A hipertonia piora dor
graves, selecionados individualmente, e com doses
e dor piora espasmos. Este ciclo pode ser quebrado
ajustadas, crianças menores de dois anos também
com as aplicações de toxina botulínica65.
podem se beneficiar do tratamento . 63
Capítulo 60 830
profunda parece promissora para distúrbios ção oral sensório motora, contam com os
do movimento e dor, mas ainda necessita de melhores níveis de evidência e recebem
mais estudos para mais evidências9. Ambas as luz verde no sistema de tráfego de luz de
Novak et al., 20209;
intervenções serão abordadas mais adiante, ainda
neste capítulo. • disfunções oftalmológicas devem ser diag-
As técnicas cirúrgicas, ortopédicas e/ou nosticadas precocemente e, sempre que
possível, instituída a estimulação visual;
neurocirúrgicas devem ser individualizadas e
adaptadas para cada tipo de PC. Faz-se necessário • distúrbios alimentares devem ser avalia-
o acompanhamento de longo tempo, com análise dos de forma individualizada. Disfagia está
de marcha, escalas de avaliação funcional e de presente em metade dos pacientes com
qualidade de vida para determinar a necessidade PC, as intervenções terapêuticas, como
e o tempo ideal do procedimento cirúrgico e estimulação elétrica, somada a estimula-
ção oral sensório motora, têm demonstra-
os resultados obtidos a longo prazo. Cirurgias
do alguma eficácia e recebem luz amarela
ortopédicas são raramente necessárias antes dos
no sistema de tráfego de luz da recente
seis anos de idade e não serão abordadas neste revisão de Novak et al., 20209:
capítulo10.
• quando a alimentação oral não é possí-
Na terapia com células-tronco para o tratamento vel, deve ser indicada a gastrostomia,
da PC, as células do cordão umbilical são as mais sob o risco de broncoaspiração e mor-
frequentemente utilizadas. A segurança de curto te, nos casos graves; e
prazo está presente, mas estudos randomizados de
• déficit ponderal deve ser avaliado e
melhor qualidade são necessários para uma melhor
seguido de forma constante, a fim de
avaliação de sua eficácia funcional66.
serem evitados os quadros de desnu-
Algumas das intervenções com os melhores trição e consequentes infecções.
níveis de evidência para sintomas não motores
incluem9,14:
FISIOTERAPIA NA PC
• medidas para evitar o risco de úlcera de
A área de atuação da fisioterapia
pressão;
neurofuncional tem passado por transformações nos
• bifosfonatos para melhorar a densidade últimos anos. Com o aumento da produção científica,
óssea; a presença de diferentes resultados relacionados
ao mesmo fenômeno pesquisado e a necessidade
• manejo das crises convulsivas com fárma-
de se realizar práticas de intervenção motora mais
cos antiepilépticos;
seguras e eficazes tornaram indispensável a análise
• incontinência ou retenção urinária devem da acurácia metodológica das diversas pesquisas
ser investigadas, devido ao risco aumen- e, cada vez mais, fundamentam a implementação
tado de malformações do trato urinário;
da prática baseada em evidência. Nesse sentido,
• sialorreia pode ser controlada com toxina a tomada de decisão na escolha das intervenções
botulínica do tipo A, benztropina, triexifeni- deve considerar as melhores evidências científicas
dil ou glicopirrolato; tratamento importante disponíveis, a expertise clínica do fisioterapeuta
devido ao contexto social, risco de bron- e as preferências dos pacientes e/ou da família67,
coaspirações e pneumonia de repetição. impactando diretamente na vida e no viver dos
Toxina botulínica injetada nas glândulas
pacientes.
salivares, estimulação elétrica e estimula-
Capítulo 60 831
Além disso, a visão geral do tratamento, antes de marcha em esteira, associada ou não com a
reducionista, centrada em deficiências nas estruturas suspensão parcial de peso, passou a fazer parte da
e funções do corpo do indivíduo, tem passado para realidade clínica no processo fisioterapêutico desses
uma abordagem mais ampla, considerando os pacientes, inclusive dos níveis funcionais mais
demais âmbitos da funcionalidade, nos níveis de graves (GMFCS IV-V). A implementação do andar
atividades e participação .
68
influencia em ganhos motores, potencializando o
controle postural, além de melhorar as habilidades
Todas as intervenções devem se basear nos
locomotoras, permitindo mais independência e
princípios do cuidado centrado na família, que são69:
autonomia. Estes treinos têm sido alvos de buscas
1. respeito pelas crianças e famílias; constantes pelos pais dessas crianças73,74.
2. valorização do impacto da família no bem- Os treinamentos aeróbicos de resistência e
estar da criança; e força muscular, antes pouco descritos para crianças
3. colaboração família-profissional. e adolescentes com PC, ganharam notoriedade nos
últimos anos. Os indivíduos com PC, em qualquer
Existem altos níveis de evidência na literatura
faixa etária, apresentam como consequência da
destacando opções de intervenção fisioterapêutica
imobilidade uma maior prevalência de osteopenia,
para crianças com PC em diferentes estágios da
osteoporose e fraturas75, além das alterações
vida. Atualmente, a implementação dos programas
morfológicas do sistema músculo-esquelético76,77.
de intervenção precoce, com a presença do
A proposta desses treinos com foco no movimento
fisioterapeuta na estruturação da equipe de
ativo é melhorar a função e reduzir as limitações em
reabilitação, é considerada imprescindível, pois os
atividades e participação, proporcionando também
resultados desses protocolos indicam melhora nos
mudanças em estrutura e função de corpo76,77. Ainda
diferentes domínios da vida dessas crianças, o
sobre os desfechos de desempenho motor, podemos
que extrapola os aspectos motores, mas também
citar a eficácia de intervenções adjuvantes, que
envolve funções cognitivas, emocionais e afetivas70.
quando combinadas com o treinamento motor para
Grande parte da evidência atual investiga tarefas específicas, podem aumentar os efeitos
a função motora dessas crianças, com dados positivos do tratamento, incluindo-se a estimulação
de ensaios clínicos substanciais, que apoiam a elétrica periférica, a estimulação transcraniana
eficácia de intervenções baseadas em treinamento por corrente contínua (tDCS), a realidade virtual,
ativo, com prática motora estruturada, intensiva a hidroterapia e a bandagem. Entre os benefícios
e específica. A terapia de contenção induzida e o dessas técnicas incluem-se a preferência dos
treino de atividades bimanuais têm sido objetos de pacientes pela estimulação elétrica78 e bandagens em
estudo para potencialização da destreza manual relação ao uso de órteses tradicionais na perspectiva
de crianças com PC. Esses métodos possuem de conforto e estética79, aumento da motivação em
diferentes estruturações de treinamento. Porém, intervenções com jogos, com favorecimento da
os resultados indicam que, mesmo com diferentes aptidão cardiorrespiratória e integração social80. No
sistematizações, há melhora em domínios de entanto, para essas modalidades de intervenção,
atividade e participação relacionados com a maior mais pesquisas são necessárias9.
quantidade de prática supervisionada71,72.
Considerando o desfecho tônus, apesar de
Abordagens terapêuticas que buscam os procedimentos médicos (aplicação de toxina
melhorar as habilidades locomotoras de crianças botulínica, rizotomia seletiva dorsal, administração
com PC também têm sido destaques na literatura. de diazepam e baclofeno intratecal) serem
A utilização de tecnologias robóticas e/ou treino apontados como aqueles com maior nível de
Capítulo 60 832
evidência, algumas intervenções fisioterapêuticas do envelhecimento, somados às limitações de oferta
são promissoras na redução da espasticidade, tais e acesso aos serviços de reabilitação especializados
como: a neuromodulação não invasiva, a acupuntura em outros ciclos de vida, o que ameaça a sua
e a vibração de corpo inteiro . 9
capacidade de manejar suas atividades de vida diária
e continuar a cumprir as funções e responsabilidades
A prevenção e o manejo de contraturas também
associadas ao trabalho, à família, ao contexto social
fazem parte rotineiramente da assistência aos
e lazer81.
indivíduos com PC. Para prevenção de contraturas,
fraqueza e desuso, a recomendação mais atual de “Futuro” é uma das palavras apontadas por
especialistas, e que vem sendo testada em ensaios um grupo de pesquisadores canadenses que visam
clínicos, envolve também movimentação ativa de trazer novas formas de pensar sobre a incapacidade
alta intensidade. Após a instalação de contraturas, infantil, denominadas em inglês F-words (function,
o treinamento de força e a terapia orientada à tarefa fitness, family, friendship, fun, and future). Abordagens
são estratégias eficazes após o gesso, com ou sem de função, família, preparo físico, diversão e amigos
toxina botulínica . Além disso, o treinamento motor
9
parecem ideias óbvias, mas que são muitas vezes
e a sustentação de peso são partes importantes do negligenciadas dentro de modelos biomédicos, e
manejo multidisciplinar de vigilância e prevenção da o uso dessas palavras reforça constantemente o
luxação de quadril . 53
que é importante no desenvolvimento ao longo dos
ciclos de vida56.
Em contrapartida, as intervenções motoras
passivas (por exemplo, alongamentos passivos
isolados) têm, cada vez mais, se mostrado ineficazes
para melhora da função e do movimento de crianças REFERÊNCIAS
com PC . Isso também embasa uma mudança de
9 1. Bax M. Terminology and classification of cerebral palsy.
Neurology. 1964;6:295-297.
visão sobre o desenvolvimento motor e o sistema
2. Bax M, Goldstein M, Rosenbaum P, et al. Proposed
nervoso, cuja interação não é mais considerada um definition and classification of cerebral palsy, April 2005.
resultado apenas do aumento da maturação cortical, Dev Med Child Neurol. 2005;47(8):571–576.
mas sim de uma complexa rede de interações 3. Smithers-Sheedy H, Badawi N, Blair E, et al. What
constitutes cerebral palsy in the twenty-first century? Dev
contínuas entre indivíduo, tarefa e ambiente.
Med Child Neurol. 2014;56(4):323–328.
Apesar de a intervenção precoce estar 4. Fahey MC, Maclennan AH, Kretzschmar D, Gecz J, Kruer
bem reconhecida cientificamente e estabelecida MC. The genetic basis of cerebral palsy. Dev Med Child
Neurol. 2017;59(5):462–469.
clinicamente como uma estratégia para otimizar a
5. Rosenbaum P. Cerebral palsy: is the concept still viable?
plasticidade neural, motora e cognitiva, prevenir Dev Med Child Neurol. 2017;59(6):564.
complicações secundárias da PC e melhorar o 6. Oskoui M, Coutinho F, Dykeman J, Jetté N, Pringsheim T.
bem-estar do cuidador74, o cuidado em saúde e a An update on the prevalence of cerebral palsy: A systematic
review and meta-analysis. Dev Med Child Neurol.
assistência fisioterapêutica diminuem em outras 2013;55(6):509–519.
fases da vida. 7. Michael-Asalu A, Taylor G, Campbell H, Lelea LL, Kirby
RS. Cerebral Palsy: Diagnosis, Epidemiology, Genetics, and
Indivíduos com PC costumam participar
Clinical Update. Adv Pediatr. 2019;66:189-208.
extensivamente de programas de intervenção
8. Stavsky M, Mor O, Mastrolia SA, Greenbaum S, Than
na infância, seguido por um declínio durante a NG, Erez O. Cerebral Palsy-Trends in Epidemiology and
adolescência, quando muitas vezes são orientados Recent Development in Prenatal Mechanisms of Disease,
Treatment, and Prevention. Front Pediatr. 2017;5:21.
que nada mais poderia ser feito para melhorar as
9. Novak I, Morgan C, Fahey M, et al. State of the Evidence
suas habilidades e, na vida adulta, experimentam Traffic Lights 2019: Systematic Review of Interventions for
declínios importantes nas habilidades funcionais Preventing and Treating Children with Cerebral Palsy. Curr
Neurol Neurosci Rep. 2020;20(2):3.
conquistadas anteriormente, associados aos efeitos
Capítulo 60 833
10. Graham HK, Rosenbaum P, Paneth N, et al. Cerebral 26. Reid SM, Carlin JB, Reddihough DS. Distribution
palsy. Nat Rev Dis Primers. 2016;2:15082. of motor types in cerebral palsy: How do registry data
compare? Dev Med Child Neurol. 2011;53(3):233–238.
11. Roberts D, Brown J, Medley N, Dalziel SR. Antenatal
corticosteroids for accelerating fetal lung maturation for 27. Novak I, Mcintyre S, Morgan C, et al. A systematic
women at risk of preterm birth. Cochrane Database Syst review of interventions for children with cerebral palsy: State
Rev. 2017;3(3):CD004454. of the evidence. Dev Med Child Neurol. 2013;55(10):885–
910.
12. Rostas SE, McPherson, Christopher. Caffeine Therapy
in Preterm Infants: The Dose (and Timing) Make the 28. Tilton A. Management of spasticity in children with
Medicine. Neonatal Netw. 2019;38(6):365–374. cerebral palsy. Semin Pediatr Neurol. 2009;16:86–89.
13. McIntyre S, Taitz D, Keogh J, Goldsmith S, Badawi N, 29. Quality Standards Subcommittee of the American
Blair E. A systematic review of risk factors for cerebral palsy Academy of Neurology and the Practice Committee of
in children born at term in developed countries. Dev Med the Child Neurology Society, Delgado MR, Hirtz D, et al.
Child Neurol. 2013;55(6):499–508. Practice parameter: pharmacologic treatment of spasticity
in children and adolescents with cerebral palsy (an
14. Novak I, Morgan C, Adde L, et al. Early, Accurate
evidence-based review): report of the Quality Standards
Diagnosis and Early Intervention in Cerebral Palsy:
Subcommittee of the American Academy of Neurology and
Advances in Diagnosis and Treatment. JAMA Pediatr.
the Practice Committee of the Child Neurology Society.
2017;171(9):897-907.
Neurology. 2010;74(4):336-343.
15. Ashwal S, Russman BS, Blasco PA, et al. Practice
30. Monbaliu E, de Cock P, Ortibus E, Heyrman L, Klingels
parameter: diagnostic assessment of the child with cerebral
K, Feys H. Clinical patterns of dystonia and choreoathetosis
palsy: report of the Quality Standards Subcommittee of
in participants with dyskinetic cerebral palsy. Dev Med Child
the American Academy of Neurology and the Practice
Neurol. 2016;58(2):138–144.
Committee of the Child Neurology Society. Neurology.
2004;62(6):851-863. 31. Monbaliu E, De La Peña M-G, Ortibus E, Molenaers G,
Deklerck J, Feys H. Functional outcomes in children and
16. Pham R, Mol BW, Gecz J, et al. Definition and diagnosis
young people with dyskinetic cerebral palsy. Dev Med Child
of cerebral palsy in genetic studies: a systematic review.
Neurol. 2017;59(6):634–640.
Dev Med Child Neurol. 2020;62(9):1024–1030.
32. Masson R, Pagliano E, Baranello G. Classification of
17. Emrick LT, DiCarlo SM. The Expanding Role of
cerebral palsy and potential role of video recording. Eur J
Genetics in Cerebral Palsy. Phys Med Rehabil Clin N Am.
Paediatr Neurol. 2018;22(1):209-210.
2020;31(1):15-24.
33. Tilton A, Vargus-Adams J, Delgado MR. Pharmacologic
18. MacLennan AH, Lewis S, Moreno-De-Luca A, et
treatment of spasticity in children. Semin Pediatr Neurol.
al. Genetic or Other Causation Should Not Change the
2010;17(4):261–267.
Clinical Diagnosis of Cerebral Palsy. J Child Neurol.
2019;34(8):472–476. 34. Yeargin-Allsopp M. Distribution of motor types in
cerebral palsy: how do registry data compare? Dev Med
19. Romeo DM, Ricci D, Brogna C, Mercuri E. Use of the
Child Neurol. 2011;53(3):199-200.
Hammersmith Infant Neurological Examination in infants
with cerebral palsy: A critical review of the literature. Dev 35. Novak I. Evidence-Based Diagnosis, Health Care, and
Med Child Neurol. 2016;58(3):240–245. Rehabilitation for Children With Cerebral Palsy. J Child
Neurol. 2014;29(8):1141–1156.
20. Kwong AKL, Fitzgerald TL, Doyle LW, Cheong JLY,
Spittle AJ. Predictive validity of spontaneous early infant 36. Palisano R, Rosenbaum P, Walter S, Russell D, Wood
movement for later cerebral palsy: a systematic review. Dev E, Galuppi B. GMFCS – E & R Sistema de Classificação
Med Child Neurol. 2018;60(5):480–489. da Função Motora Grossa. Dev Med Child Neurol.
1997;39:214–233.
21. Morris C. Definition and classification of cerebral
palsy: A historical perspective. Dev Med Child Neurol. 37. Paulson A, Vargus-Adams J. Overview of Four
2007;49(2):3–7. Functional Classification Systems Commonly Used in
Cerebral Palsy. Children. 2017;4(4):30.
22. Colver A, Fairhurst C, Pharoah POD. Cerebral palsy.
Lancet. 2014;383(9924):1240–1249. 38. Palisano RJ, Rosenbaum P, Bartlett D, Livingston MH.
Content validity of the expanded and revised Gross Motor
23. Sanger TD, Delgado MR, Gaebler-Spira D, Hallett M,
Function Classification System. Dev Med Child Neurol.
Mink JW. Classification and Definition of Disorders Causing
2008;50(10):744–750.
Hypertonia in Childhood. Pediatrics. 2003;111(1):e89–97.
39. Towns M, Rosenbaum P, Palisano R, Wright FV. Should
24. Eggink H, Kremer D, Brouwer OF, et al. Spasticity,
the Gross Motor Function Classification System be used for
dyskinesia and ataxia in cerebral palsy: Are we sure we can
children who do not have cerebral palsy? Dev Med Child
differentiate them? Eur J Paediatr Neurol. 2017;21(5):703–
Neurol. 2017;(3):1–8.
706.
25. Smithers-Sheedy H, Badawi N, Blair E, et al. What
constitutes cerebral palsy in the twenty-first century? Dev
Med Child Neurol. 2014;56(4):323–328.
Capítulo 60 834
40. Schiariti V, Mahdi S, Bölte S. International Classification 55. Rosenbaum P, Gorter JW. The “F-words” in childhood
of Functioning, Disability and Health Core Sets for disability: I swear this is how we should think. Child Care
cerebral palsy, autism spectrum disorder, and attention- Health Dev. 2012;38(4):457–63.
deficit–hyperactivity disorder. Dev Med Child Neurol.
56. Lélis ALPA, Cardoso MVLM, Hall WA. Sleep disorders
2018;60(9):933–941.
in children with cerebral palsy: An integrative review. Sleep
41. Schiariti V, Selb M, Cieza A, O’Donnell M. International Med Rev. 2016;30:63–71.
Classification of Functioning, Disability and Health Core
57. Dy R, Roge D. Medical Updates in Management of
Sets for children and youth with cerebral palsy: A consensus
Hypertonia. Phys Med Rehabil Clin N Am. 2020;31(1):57–
meeting. Dev Med Child Neurol. 2015;57(2):149–158.
68.
42. Patel DR, Neelakantan M, Pandher K, Merrick J.
58. Fehlings D, Brown L, Harvey A, et al. Pharmacological
Cerebral palsy in children: A clinical overview. Transl
and neurosurgical interventions for managing dystonia in
Pediatr. 2020;9(1):S125–135.
cerebral palsy: a systematic review. Dev Med Child Neurol.
43. World Cerebral Palsy Day 2020 – October 6th. World 2018;60(4):356–66.
Cerebral Palsy Day. Disponível em: https:/worldcpday.org
59. Masson R, Pagliano E, Baranello G. Efficacy of
44. Westbom L, Rimstedt A, Nordmark E. Assessments oral pharmacological treatments in dyskinetic cerebral
of pain in children and adolescents with cerebral palsy: a palsy: a systematic review. Dev Med Child Neurol.
retrospective population-based registry study. Dev Med 2017;59(12):1237–128.
Child Neurol. 2017;59(8):858–863.
60. Love SC, Novak I, Kentish M, Desloovere K, Heinen
45. Ostojic K, Paget SP, Morrow AM. Management of pain in F, Molenaers G, et al. Botulinum toxin assessment,
children and adolescents with cerebral palsy: a systematic intervention and after-care for lower limb spasticity in
review. Dev Med Child Neurol. 2019;61(3):315–321. children with cerebral palsy: International consensus
statement. Eur J Neurol. 2010;17(2):9–37.
46. Downs J, Blackmore AM, Epstein A, et al. The
prevalence of mental health disorders and symptoms in 61. Fonseca PR, Calhes Franco De Moura R, Galli M,
children and adolescents with cerebral palsy: a systematic Santos Oliveira C. Effect of physiotherapeutic intervention
review and meta-analysis. Dev Med Child Neurol. 2017;1– on the gait after the application of botulinum toxin in children
10. with cerebral palsy: Systematic review. Eur J Phys Rehabil
Med. 2018;54(5):757–765.
47. Stadskleiv K. Cognitive functioning in children with
cerebral palsy. Dev Med Child Neurol. 2020;62(3):283–289. 62. Strobl W, Theologis T, Brunner R, et al. Best clinical
practice in botulinum toxin treatment for children with
48. Stadskleiv K, Jahnsen R, Andersen GL, von Tetzchner
cerebral palsy. Toxins (Basel). 2015;7(5):1629–1648.
S. Neuropsychological profiles of children with cerebral
palsy. Dev Neurorehabil. 2018;21(2):108–120. 63. Pascual-Pascual SI, Pascual-Castroviejo I. Safety of
botulinum toxin type A in children younger than 2 years. Eur
49. Jenks KM, De Moor J, Van Lieshout ECDM, Maathuis
J Paediatr Neurol. 2009;13(6):511–515.
KGB, Keus I, Gorter JW. The effect of cerebral palsy on
arithmetic accuracy is mediated by working memory, 64. Hareb F, Bertoncelli CM, Rosello O, Rampal V, Solla F.
intelligence, early numeracy, and prinstruction time. Dev Botulinum Toxin in Children with Cerebral Palsy: An Update.
Neuropsychol. 2007;32(3):861–879. Neuropediatrics. 2020;51(1):1–5.
50. Picciolini O, LE Métayer M, Consonni D, et al. Can 65. Multani I, Manji J, Hastings-Ison T, Khot A, Graham
we prevent hip dislocation in children with cerebral palsy? K. Botulinum Toxin in the Management of Children with
Effects of postural management. Eur J Phys Rehabil Med. Cerebral Palsy. Paediatr Drugs. 2019;21(4):261-281.
2016;52(5):682-690.
66. Vankeshwaram V, Maheshwary A, Mohite D, Omole JA,
51. Wynter M, Gibson N, Willoughby KL, et al. Australian Khan S. Is Stem Cell Therapy the New Savior for Cerebral
hip surveillance guidelines for children with cerebral palsy: Palsy Patients? A Review. Cureus. 2020;12(9):1–11.
5-year review. Dev Med Child Neurol. 2015;57(9):808–820.
67. da Silva TM, Costa Lda C, Garcia AN, Costa LO. What
52. Palisano R, Rosenbaum P, Walter S, Russell D, Wood do physical therapists think about evidence-based practice?
E, Galuppi B. Development and reliability of a system to A systematic review. Man Ther. 2015;20(3):388-401.
classify gross motor function in children with cerebral palsy.
68. Anaby D, Korner-Bitensky N, Steven E, et al. Current
Dev Med Child Neurol. 1997;39(2):214–223.
Rehabilitation Practices for Children with Cerebral Palsy:
53. Horwood L, Li P, Mok E, Shevell M, Constantin E. A Focus and Gaps. Phys Occup Ther Pediatr. 2017;37(1):1-
systematic review and meta-analysis of the prevalence 15.
of sleep problems in children with cerebral palsy: how do
69. King G, Chiarello L. Family-centered care for
children with cerebral palsy differ from each other and from
children with cerebral palsy: Conceptual and practical
typically developing children? Sleep Heal. 2019;5(6):555–
considerations to advance care and practice. J Child Neurol.
571.
2014;29(8):1046–1054.
54. Petersen S, Francis KL, Reddihough DS, Lima S,
Harvey A, Newall F. Sleep problems and solution seeking
for children with cerebral palsy and their parents. J Paediatr
Child Health. 2020;56(7):1108–1113.
Capítulo 60 835
70. Hadders-Algra M, Boxum AG, Hielkema T, Hamer EG. 76. Gillett JG, Boyd RN, Carty CP, Barber LA. The impact
Effect of early intervention in infants at very high risk of of strength training on skeletal muscle morphology and
cerebral palsy: a systematic review. Dev Med Child Neurol. architecture in children and adolescents with spastic
2017;59(3):246–258. cerebral palsy: A systematic review. Res Dev Disabil.
2016;56:183–196.
71. Chiu HC, Ada L. Constraint-induced movement therapy
improves upper limb activity and participation in hemiplegic 77. Armstrong EL, Spencer S, Kentish MJ, Horan SA, Carty
cerebral palsy: A systematic review. J Physiother. CP, Boyd RN. Efficacy of cycling interventions to improve
2016;62(3):130–137. function in children and adolescents with cerebral palsy:
a systematic review and meta-analysis. Clin Rehabil.
72. Hoare BJ, Wallen MA, Thorley MN, Jackman ML, Carey
2019;33(7):1113–29.
LM, Imms C. Constraint-induced movement therapy in
children with unilateral cerebral palsy. Cochrane Database 78. Moll I, Vles JSH, Soudant DLHM, et al. Functional
Syst Rev. 2019;4(4):CD004149. electrical stimulation of the ankle dorsiflexors during walking
in spastic cerebral palsy: a systematic review. Dev Med
73. Emara HA, El-Gohary TM, Al-Johany AA. Effect of body-
Child Neurol. 2017;59(12):1230–1236.
weight suspension training versus treadmill training on gross
motor abilities of children with spastic diplegic cerebral 79. Jackman M, Novak I, Lannin N. Effectiveness of hand
palsy. Eur J Phys Rehabil Med. 2016;52(3):356-363. splints in children with cerebral palsy: A systematic review
with meta-analysis. Dev Med Child Neurol. 2014;56(2):138–
74. Ammann-Reiffer C, Bastiaenen CHG, Meyer-Heim AD,
147.
van Hedel HJA. Effectiveness of robot-assisted gait training
in children with cerebral palsy: A bicenter, pragmatic, 80. Rathinam C, Mohan V, Peirson J, Skinner J, Nethaji KS,
randomized, cross-over trial (PeLoGAIT). BMC Pediatr. Kuhn I. Effectiveness of virtual reality in the treatment of
2017;17(1):1–9. hand function in children with cerebral palsy: A systematic
review. J Hand Ther. 2019;32(4):426-434.
75. Gudjonsdottir, B. & Mercer VS. Effects of a Dynamic
Versus a Static Prone Stander on Bone Mineral Density 81. Moll LR, Cott CA. The paradox of normalization through
and Behavior in Four Children with Severe Cerebral Palsy. rehabilitation: growing up and growing older with cerebral
Pediatr Phys Ther. 2002;14:38–46. palsy. Disabil Rehabil. 2013;35(15):1276-1283.
Capítulo 60 836
PARTE 15
OUTROS
CAPÍTULO 61
A NEUROPSICOLOGIA NOS TRATAMENTOS
NEUROCIRÚRGICOS
Samanta Fabricio Blattes da Rocha decisão médica, na avaliação dos efeitos de intervenções
clínicas e neurocirúrgicas e na reabilitação na área
Rachel Schlindwein-Zanini
das lesões cerebrais adquiridas e das desordens do
desenvolvimento neurológico da infância. As abordagens
Capítulo 61 838
do desenvolvimento infantil. O espectro de atuação súbita ou crescente pode indicar um desequilíbrio
é muito amplo, portanto, neste capítulo serão hídrico intraventricular; segundo, dar subsídios
abordados aspectos neuropsicológicos relacionados para os pais sobre aspectos do desenvolvimento
com as subáreas de distúrbios da circulação do das funções mentais superiores que precisam de
líquido cefalorraquidiano (LCR) da infância à terceira intervenção técnica por profissionais da saúde ou da
idade (hidrocefalias), AVEs e epilepsias. área da educação.
Capítulo 61 839
comportamentais infanto-juvenis, maior o impacto Lindquist et al. 10
acompanharam
na qualidade de vida. longitudinalmente um grupo de crianças (6 a 17 anos)
com HI, devido a causas múltiplas (malformações
As multiplicidades etiológicas e evolutivas
congênitas, fatores perinatais como hemorragias
colaboram para perfis cognitivos que parecem
e infecções, fatores de risco pré ou perinatais sem
divergentes, assim como a variação de testes
motivos óbvios ou causas desconhecidas) e que
usados para medi-las. Contudo, há fatores em
implantaram válvula. Selecionaram deste grupo,
comum entre as hidrocefalias e um dos mais
25 indivíduos (quatro tinham epilepsia e quatro
importantes é a ocorrência do aumento da pressão
paralisia cerebral moderada) que apresentaram
intracraniana, pois sua elevação aumenta o risco
QI normal (coeficiente de inteligência medido
de a criança apresentar déficits uma vez que o
através da escala de inteligência infantil WISC)
estresse mecânico afeta o metabolismo cerebral
e os testaram novamente na vida adulta (30 a 41
e reduz o nível de neurotransmissores e peptídios
anos) através da escala WAIS-III com esse grupo
neuromodulatórios locais, o que ocasiona disfunção
apresentando QI médio 101 (83-120, dentro do
neuronal e consequentes déficits cognitivos7.
intervalo de normalidade) de forma similar aos
Platenkamp et al.8 levantaram dados sobre a escores da infância 101 (84 a 124). Apresentou,
escolarização de 142 crianças recém-tratadas com sobretudo, prejuízo cognitivo na memória de trabalho
válvula devido a etiologias diferentes. Isto incluiu e na velocidade de processamento mental, porém
mielomeligocele (MMC), dilatação ventricular pós- manteve o coeficiente de inteligência normal na vida
hemorrágica (DVPH), tumores cerebrais, estenose adulta, mesmo nos casos de disfunções recorrentes
de aqueduto, cistos, infecções, hidrocefalia externa da válvula.
(HE), hemorragia (não DVPH) e outras etiologias.
O impacto da hidrocefalia, à medida que as
Observaram que 59% das crianças estavam
crianças atingem a idade adulta, dependerá do tipo
frequentando escolas normais, 33% estavam
de problema específico que a criança enfrenta e sua
incluídas em escolas de educação especial e 7%
gravidade, quais os recursos internos de que ela
tinham comprometimento motor e/ou cognitivo
dispõe para lidar com seus problemas, o suporte
graves que as impediam de frequentar a escola. A
familiar e o acesso que ela terá ao sistema de saúde,
totalidade de crianças com HE estavam em escola
envolvendo atendimento médico e multiprofissional.
normal, embora 100% delas também apresentassem
comprometimento motor. A condição mais prevalente Em jovens adultos com estenose de aqueduto
neste grupo foi de MMC (n=39) e 39% das crianças e meningite são observados prejuízos de funções
tinha condições de frequentar a escola normal. cognitivas variados que dependem do funcionamento
Através do uso do HOQ verificaram que os escores dos lobos temporais, parietais e/ou frontais tais
de “saúde geral” da escala variaram muito entre os como funções visuais, semânticas, memória de
subgrupos por etiologia e que os escores do domínio trabalho, visuoconstrutiva e funções executivas
“cognitivo” estavam positivamente correlacionados provavelmente causados pela hidrocefalia 7.
com o tipo de escola frequentada pelas crianças,
Sob o ponto de vista do continumm das
independente da origem da hidrocefalia.
fases da vida, a hidrocefalia é mais prevalente
Os estudos de crianças com hidrocefalia em na infância, com uma participação importante
decorrência da espinha bífida mostram uma variedade da mielomelingocele, e na terceira idade, com a
de disfunções que englobam desde aprendizagem hidrocefalia de pressão normal. O número de casos
verbal, memória de trabalho espacial, alternância diminui durante a vida adulta11 e em sua grande
de foco atencional, velocidade psicomotora ou em maioria são casos de hidrocefalia secundária.
tarefas complexas de sequenciamento . 9
A hidrocefalia do adulto engloba: 1) indivíduos
Capítulo 61 840
em transição (diagnosticados e/ou tratados na mais comuns e relacionadas com a hidrocefalia
infância); 2) adultos identificados com hidrocefalia incluem dificuldade para iniciar tarefas, lentidão
congênita crônica (síndrome da hidrocefalia em psicomotora, diminuição da atenção e esquecimento.
adultos jovens e de meia-idade [SHYMA] ou
O impacto destes déficits sobre as sequelas
ventriculomegalia manifesta de longa data em adultos
cognitivas é preponderante uma vez que habilidades
[LOVA]); 3) adultos com hidrocefalia adquirida com
primárias como a capacidade em manter a atenção e
uma etiologia identificável (por exemplo, hemorragia
iniciar tarefas são essenciais em qualquer etapa da
subaracnoide, trauma cerebral ou infecção); e
reabilitação das funções instrumentais (linguagem,
4) pacientes com suspeita ou comprovação de
orientação espacial e funções visuais) ou executivas
hidrocefalia idiopática de pressão normal (HPNI),
(planejamento, controle inibitório e memória de
esta última mais frequente a partir da sexta década
trabalho). Os retrocessos comportamentais devem
de vida.
ser também objeto de atenção nos indivíduos
A hidrocefalia no adulto é menos prevalente em recuperação neurológica, pois podem ser
do que a infantil e a do idoso ; e, habitualmente,
11
decorrentes da falha de equilíbrio do fluxo liquórico.
são casos de hidrocefalias adquiridas. As duas
Acima de 65 anos, é comum a ocorrência
causas mais prevalentes são de origem vascular e
da hidrocefalia de pressão normal idiopática
os tumores cerebrais 12,13
. A incidência das causas
(HPNI), descrita por Hakim e Adams, em 1965.
de hidrocefalias secundárias varia de acordo com
Situa-se entre as hidrocefalias comunicantes e
as décadas de vida, de forma que meningites
pode ser classificada como “provável”, “possível”
e traumatismos cranianos são mais comuns na
e “improvável” a partir de critérios envolvendo: 1)
terceira década de vida, os pseudotumores mais
história clínica; 2) imagem cerebral; 3) achados
comuns na quarta década, tumores cerebrais e
físicos; e 4) critérios fisiológicos 15,16
. Caracteriza-
causas vasculares na sexta década e a hidrocefalia
se pelo aumento gradativo dos ventrículos laterais
normotensa (HPN), mais comum entre as oitava e
associado à tríade clássica de sintomas: distúrbio
nona décadas de vida.
da marcha (hipocinética), alteração cognitiva e
As hidrocefalias secundárias (HS) podem incontinência urinária17. Habitualmente, o distúrbio
agregar déficits cognitivos aos que já foram da marcha está associado com um segundo sinal
desencadeados eventualmente pelas causas (incontinência ou cognição).
primárias. Nas situações que estas causas primárias
O funcionamento cognitivo na HPNI
são lesões cerebrais adquiridas (traumáticas ou
caracteriza-se pela evidência de pelo menos duas
vasculares) os déficits são mais graves logo após a
das condições seguintes: a) lentidão psicomotora
injúria e tendem a evoluir por recuperação espontânea
(aumento do tempo de latência); b) redução da
e/ou com a ajuda de um processo de reabilitação
velocidade; c) redução da acurácia motora fina;
que pode envolver condutas em neuropsicologia,
d) dificuldade em manter ou dividir a atenção;
fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia.
e) evocação comprometida, especialmente para
No período de recuperação, a ocorrência eventos recentes; f) disfunção executiva, como
de novos déficits ou o retrocesso de melhoras comprometimento em procedimentos seriais
já adquiridas podem representar novos eventos (múltiplas etapas); g) memória de trabalho; h)
neurológicos, dentre os quais o início de uma HS abstração; i) insight; e j) mudanças comportamentais
comunicante. A estagnação da melhora durante a ou de personalidade15.
reabilitação precoce, discordante com a gravidade
Os transtornos psiquiátricos mais comuns
da lesão14, pode ser um sinal precoce de uma HS
são depressão, mania, agressividade, distúrbio
secundária ao TCE. As anormalidades cognitivas
obsessivo-compulsivo e psicoses, incluindo
Capítulo 61 841
paranoia, alucinações e distúrbios do controle diagnóstico adequado37-39.
do impulso18. A síndrome asteno-emocional é um
Para seleção dos pacientes que responderão
quadro comportamental comum na HPNI, assim
à cirurgia de derivação do LCR há dois grupos de
como o comprometimento do estado de alerta19.
testes: testes de medição da conformidade do espaço
Mudanças na memória, atenção, habilidades cranioespinal ou de resistência ao fluxo de saída do
motoras e funções executivas são citadas em LCR e os testes que medem o efeito temporário da
muitos estudos 20-23
. Diferentes padrões de dilatação drenagem do LCR, fazendo sua retirada em grandes
ventricular podem resultar em diferentes tipos de volumes (20 a 50 ml), por meio de punção lombar
disfunções cognitivas 24-26
. Em termos anatômicos, (PL) ou da drenagem lombar externa contínua. A
a perda de memória de trabalho é normalmente técnica de retirada do LCR por PL foi originalmente
atribuída à disfunção do circuito dorso-lateral; descrita por Adams17. Wilkkelsø et al.40 aprimoraram-
estudos de imagem funcional têm associado o mau na usando métodos quantitativos para avaliar o efeito
desempenho em teste de atenção (teste de Stroop) da PL sobre a marcha e a cognição e ela passou a
com a ativação alterada de redes neuronais que ser conhecida como tap test (TT). É realizada para
incluem o córtex pré-frontal dorso-lateral e cingulado que se possa simular temporariamente o efeito de
anterior . A compressão de fibras parieto-occipitais,
27
uma derivação e analisar o impacto desta drenagem
por dilatação dos cornos occipitais, pode resultar na sobre os sintomas da tríade.
predominância de disfunção visuoespacial na HPN . 26
Melhoras cognitivas em conjunto com a melhora
O sistema fronto-estriatal tem sido implicado por
da marcha devem ser consideradas como fatores
alguns investigadores enquanto outros enfatizam a
preditivos de melhora após o implante da válvula20,41.
importância de estruturas subcorticais, o que inclui
Embora o tap test tenha alta especificidade (73 a
fibras de projeção passando próximo aos ventrículos
100%)37,40,42-44, sua sensibilidade é baixa (26 a 79%)
laterais28,29.
e muitos esforços têm sido feitos para melhorá-la45.
As funções de marcha e de esfíncteres O valor preditivo positivo (VPP) do teste fica entre
apresentam melhora precoce (dias) após a cirurgia 73% e 100%, ao passo que o valor preditivo negativo
de derivação e as funções cognitivas evoluem (VPN) fica entre 18 e 50%28,45. O elevado VPP
mais tardiamente. Embora 80% dos pacientes permite um elevado grau de segurança de resposta
submetidos à derivação não retornem ao padrão favorável ao tratamento cirúrgico quando o TT é
cognitivo inicial 30,31
observaram melhora importante positivo. Em contrapartida, o baixo VPN não permite
da cognição dos pacientes aos doze meses após a exclusão segura de indivíduos com TT negativo
a cirurgia; as melhoras cognitivas prosseguem como não responsivos ao tratamento cirúrgico.
ocorrendo mesmo ao longo do segundo ano pós-
A investigação motora e cognitiva durante o
cirúrgico32. Isto depende de fatores como tempo de
TT apresenta uma grande variação entre os diversos
evolução da doença, idade do paciente na data da
centros no mundo. Protocolos diferem quanto às
cirurgia21,33,34 e existência de comorbidades como
variáveis avaliadas, quanto ao intervalo de tempo
doença de Alzheimer (DA), doença de Parkinson
entre a PL e a investigação cognitiva/motora,
(DP) ou demência vascular (DV).
quanto aos parâmetros usados para classificação
Alguns autores acreditam que a melhora de melhoras, quanto ao volume de LCR retirado e
dos prejuízos cognitivos decorre da melhora quanto ao número de PLs realizadas, o que dificulta a
pós-operatória do sistema de ativação cerebral, comparação entre os vários centros especializados.
da redução da sonolência diurna e melhora da Os resultados em relação à função cognitiva,
iniciativa 35,36
. A doença avançada, por si só, pode habitualmente, diferem entre os estudos porque os
acarretar má resposta à cirurgia, mesmo com o testes usados são variados e alguns autores usam
Capítulo 61 842
escalas específicas34,38,46. após a mesma40. A maioria dos estudos sobre o
TT que fazem alusão ao tempo usado para avaliar
Os testes cognitivos mais frequentemente
a cognição propõe punção única34,37,38,40,42,43,47,50,51.
empregados na investigação durante a realização
Em nosso centro52, um protocolo de TT seriado foi
do TT podem ser vistos na Tabela 1:
desenvolvido no qual os testes de orientação (WMS),
RAVLT, teste de Stroop, dígitos, FAR-Animais, CFT,
MEEM e FAB foram aplicados. Melhora acentuada
Teste Função Estudo
foi observada na velocidade de atenção após a
Benejam, Katzen,
MEEM Rastreio primeira PL e após a segunda houve melhora na
Saito
FAB Rastreio Benejam orientação, memória verbal, atenção, memória
Memória visual e no mini-exame do estado mental (MEEM). A
RAVLT Benejam
verbal melhora significativa em vários domínios cognitivos
Memória de Benejam, Katzen,
Digit Span (DS) em um intervalo de tempo tão curto sugeriu que as
trabalho Saito
mudanças são resultantes das punções repetidas e
Teste de Stroop Atenção
Fluência Benejam, Katzen,
não meramente da passagem do tempo, em especial
FAR
verbal lexical Saito após a segunda PL.
Fluência
A melhora cognitiva após a PL e após a cirurgia
Cowa - animais verbal Benejam, Katzen
semântica para implante da válvula já está bem reconhecida,
Memória muito embora ainda haja muito a esclarecer sobre sua
CFT Bugalho
visuo-espacial caracterização e qual o papel que as comorbidades
Purdue pegboard Velocidade dos idosos, como os quadros demenciais, exercem
Benejam, Katzen
test motora
para refrear esta melhora. Reconhecer o tempo certo
Alternância de
TMT A/B Benejam, Katzen para a intervenção cirúrgica nas HPNIs dos idosos,
foco
Tabela 1: Testes cognitivos realizados no tap test. trazendo o maior benefício em termos de reversão
LEGENDA: Testes: MEEM - miniexame do estado mental; e estabilidade de sintomas motores e cognitivos,
FAB - bateria de avaliação frontal; Digit Span - teste de ainda é um dos grandes desafios a serem vencido.
dígitos; RAVLT - teste da lista de palavras de Rey; FAS -
teste de fluência verbal lexical; COWA - teste de fluência
verbal semântica; CFT - teste da figura complexa de Rey;
Purdue pegboard test - teste de destreza manual; TMT A/B ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO
- teste de trilhas forma A e B.
Fonte: Baseada em Katzen et al., 201123; Benejam et al., O acidente vascular encefálico (AVE) consiste
200831; Saito et al., 201148. na interrupção brusca do fluxo de sangue para
alguma região cerebral, sendo isquêmico (AVEI) ou
apresentar melhora imediata (30 a 60 min) ou, até e comportamental (como em memória, linguagem,
mesmo, após uma semana20,34,43,47 depois da PL. Kang funções visuoespaciais e executivas, distúrbios de
et al.49 descreveram um paciente que, inicialmente, humor e do controle de impulsos) depende de vários
havia sido considerado não responsivo ao TT em fatores, dos quais os principais são: extensão do
uma avaliação da marcha com 24h após a PL, mas território cerebral afetado, tipo de evento (hemorragia
que evoluiu tardiamente com melhora temporária da x isquemia) e tempo decorrente entre o evento e
marcha (após sete dias) e teve melhora significativa o atendimento, genética, inflamação, neogênese
melhoras cognitivas após PL, tanto nos períodos (medido pela escala de coma de Glasgow (ECG)
entre 30 a 60 min após a PL, como até 12 a 24h e/ou National Institute of Health Stroke Scale –
NIHSS). Para Rohde et al.53, o déficit cognitivo pode
Capítulo 61 843
permanecer, sendo que após cinco anos do AVE, a funcionamento executivo, e que esses domínios
prevalência é de 35,6%. não linguísticos desempenham um papel importante
nas habilidades dos pacientes com afasia crônica.
Os fatores de risco incluem hipertensão
Assim, mesmo diante da importância dos prejuízos
arterial, dislipidemia, tabagismo, obesidade,
linguísticos, a avaliação da cognição não verbal
sedentarismo, estresse, etilismo e drogadicção,
neste grupo de pacientes é fundamental.
mas a lista de possíveis etiologias é extensa54. No
caso de indivíduos sobreviventes ao AVE, se estes A afasia é uma condição prejudicial à
fatores não forem modificados, acresce-se ainda qualidade de vida dos sobreviventes dos AVEs e de
o impacto potencial da não adesão ao tratamento seus cuidadores. Laberton et al. (2020)58 citaram
farmacológico de prevenção secundária 53
. Neste que o aumento da gravidade do AVE na admissão
panorama, sequelas comportamentais e/ou traços hospitalar, medido pelo NIHSS, pode prever a perda
de personalidade pré-mórbidos podem agravar de qualidade de vida (QDV) subsequente entre
ou atenuar o comportamento de não adesão ao sobreviventes do AVE até 12 meses após o evento.
tratamento pós-AVE.
Segundo a National Stroke Association, no
Algumas complicações neurológicas tocante à reabilitação, 10% dos sobreviventes se
podem ocorrer nos AVEs, como o edema recuperam quase integralmente; 25% se recuperam
cerebral, hipertensão intracraniana, hidrocefalia, com sequelas mínimas; 40% mostram incapacidade
transformação hemorrágica, crises epilépticas moderada a grave, carente de acompanhamento
e recorrência precoce . Estes fatores pioram o
55
específico; 10% precisam de tratamento a longo
prognóstico do indivíduo, inclusive no âmbito da prazo em unidade especializada; 15% falecem
cognição e comportamento. Dentre os prejuízos pouco após o episódio; e 14% dos sobreviventes
mais marcantes estão as sequelas relacionadas ao têm um segundo episódio ainda ao longo do
comprometimento em áreas irrigadas pelos ramos primeiro ano. Entretanto, o Scottish Intercollegiate
da artéria cerebral média (em hemisfério dominante), Guidelines Network (2002)59, salienta que através
sobretudo no acometimento das funções de da reabilitação, o paciente com AVE pode readquirir
linguagem. capacidades, aprender novas formas de concretizar
certas tarefas e compensar por disfunções residuais,
As alterações ocorridas após o AVE
existindo um forte consenso entre os especialistas
dependem da extensão da lesão, do hemisfério, da
que o elemento mais importante em qualquer
localização como anterior (distribuição da artéria
programa de reabilitação é a prática direta, bem
carotídea), ou posterior (circulação vertebrobasilar),
orientada e repetitiva.
e da etiologia (isquêmica ou hemorrágica). Para
efetuar a avaliação neuropsicológica, necessita-se A reabilitação neuropsicológica é uma
da compreensão das disfunções causadas, como, intervenção complementar útil na melhora dos
por exemplo, ter conhecimento de que as afasias déficits cognitivos e psicológicos associados e a
clássicas resultam de lesão no hemisfério esquerdo qualidade de vida após uma lesão cerebral. Kaur
do cérebro, enquanto negligência unilateral ocorre (2020)60 adotou uma intervenção padronizada,
na lesão no hemisfério direito56. de oito semanas baseada em tarefas focadas,
visando áreas de linguagem (compreensão, fluência
O estudo de Schumacher et al. (2020)57
e nomeação) e cognição (memória de trabalho,
aponta que há uma consciência crescente de que
atenção e concentração, funcionamento executivo
a afasia após um derrame pode incluir déficits em
e inibição de resposta). O trabalho resultou em
outras funções cognitivas e que essas são preditivas
melhora, em especial, da linguagem, qualidade de
da recuperação e reabilitação. Há uma gama de
vida e depressão, embora todas as tarefas tenham
regiões do cérebro envolvidas na atenção e no
Capítulo 61 844
sido eficazes em discriminar o desempenho de No sentido nosológico, é de grande
sobreviventes dos controles; as melhoras foram utilidade avaliar a condição do paciente a partir
medidas por meio da Indian Aphasia Battery (IAB), da Classificação Internacional de Funcionalidade,
Stroke-Specific Quality of Life (SS-QOL), Hindi Incapacidade e Saúde (CIF) bem como a partir da
version of Stroke Aphasia Depression Questionnaire Classificação Internacional de Doenças (CID-10)
(SADQ-H) e a Visual Analog Scale (VAS). complementando informações entre si, conforme
sugere a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Prejuízos de atenção são frequentes em
A CIF agrupa, sistematicamente, diferentes
pacientes com AVE. Uma avaliação abrangente deve
domínios de uma pessoa com uma determinada
envolver os dois processos fundamentais: processos
condição de saúde (o que uma pessoa com dada
intensivos (alerta e vigilância) e atenção seletiva
doença consegue ou não fazer) e a CID-10 fornece
(foco e atenção dividida). Os processos intensivos,
informações de base etiológica (OMS, 2004). O uso
de acordo com Leclercq e Zimmermann (2002)61,
da CIF após o AVE permite aos profissionais terem
são provavelmente pré-requisitos para processos
uma visão mais ampla do nível de funcionalidade
atencionais mais complexos como a seletividade.
dos pacientes o que facilita o planejamento de
Além disto, os processos atencionais são necessários
condutas em uma perspectiva integralista 63
. Além
para a realização de tarefas cognitivas instrumentais;
disso, a avaliação inicial da equipe de reabilitação
seu comprometimento constitui um obstáculo à
deve incluir a aplicação da escala funcional de
reabilitação neuropsicológica, em especial no que
Rankin modificada (mRS) para todos os pacientes
tange à funcionalidade no cotidiano, pois diferentes
com diagnóstico de AVE e o índice de Barthel para
subprocessos da atenção se localizam em cada
os pacientes diagnosticados e em acompanhamento
um dos hemisférios cerebrais: atenção intrínseca
com a equipe de fisioterapia.
(refere-se ao controle cognitivo do estado de alerta)
e atenção sustentada no hemisfério direito ao passo O papel dos familiares/cuidadores na
que o estado de alerta fásico (capacidade de elevar assistência aos sobreviventes de AVE é de suma
o nível geral de atenção mesmo que por um curto importância e envolvê-los é uma estratégia legítima
período de tempo, em resposta a um estímulo para melhorar a adesão ao tratamento farmacológico
externo) no hemisfério esquerdo. e não farmacológico nestes pacientes.
Embora não haja total consenso sobre esta Para as intervenções nas atividades de vida
especialização hemisférica, Spaccavento et al. diária, Requena e Rebok (2019)64 sugeriram que
(2019)62 descrevem tarefas nas quais os processos um atendimento preciso, verifica as circunstâncias
complexos de atenção estão preferencialmente (motivacionais), as tarefas que apresentam maior
relacionados com o hemisfério esquerdo. Cabe dificuldade, os processos cognitivos ou emocionais
ressaltar que sintomas cognitivos relacionados envolvidos (memória, tomada de decisões, inibição,
com especialização hemisférica como negligência iniciativa ou estado de ânimo) e a estrutura cerebral
unilateral, anosognosia (hemisfério direito) e comprometida, permitindo uma avaliação focada na
quadros de afasia (hemisfério esquerdo) podem pessoa.
apresentar uma sinergia com os déficits atencionais,
O prognóstico melhor após um AVE é
ocasionando um comprometimento cognitivo mais
relacionado com a rapidez do diagnóstico inicial e
intenso.
conduta médica apropriada, e implica também em
Em tarefas de atenção seletiva, atenção uma avaliação para orientação de familiares e para
dividida, atenção concentrada e perfil do distúrbio o planejamento da reabilitação neuropsicológica
atencional dependerá do local e do lado da lesão especializada. A orientação aos familiares e
cerebral. cuidadores é dinâmica, e vai se modificando à
Capítulo 61 845
medida que as mudanças decorrentes do processo Aqueles sem evidência objetiva de comprometimento
de reabilitação vão ocorrendo. A disposição cognitivo podem perceber-se como tendo disfunção
necessária à reabilitação física e neuropsicológica, de memória; esses são os pacientes que mais
em muitos casos prolongada, pode sofrer abalos requerem avaliações subjetiva e objetiva da
ao longo do processo, o que requer atenção às cognição, incluindo avaliações dos cuidadores, para
necessidades psicológicas tanto do paciente quanto se estabelecer a natureza de seus sintomas.
dos cuidadores. É neste sentido que a psicologia da
As epilepsias refratárias compreendem de 20
reabilitação traz ferramentas úteis para lidar com as
a 30% dos casos de epilepsia e constituem desafio
sensações de fadiga, impotência bem como com a
clínico68. Os dois quadros mais comuns acometem
tristeza e a irritabilidade que podem surgir ao longo
o lobo temporal e lobo frontal. Quando refratária,
do processo de reabilitação.
a epilepsia promove prejuízos ainda mais intensos
na cognição (distúrbios de memória, aprendizagem,
linguagem e funções executivas) desenvolvimento
EPILEPSIAS neuropsicomotor, comportamento (depressão,
A epilepsia é uma das doenças cerebrais autonomia, autoestima e socialização) e dinâmica
graves mais comuns que afetam mais de 50 milhões familiar, implicando em cuidados e diagnósticos mais
de pessoas no mundo; 80% delas estão em países complexos por parte de equipe multiprofissional69.
em desenvolvimento, e destas, 80 a 90% recebem
Transtornos mentais em pessoas com crises
tratamento inadequado ou nenhum tratamento 65.
epilépticas (PCEs) ocorrem entre 30% a 70%
A síndrome epiléptica consiste no dos casos70, com fortes traços neuróticos, como
distúrbio epiléptico marcado pela apresentação ansiedade, culpa, ruminação, baixa autoestima,
frequentemente conjunta de sintomas e sinais clínicos comportamento antissocial e somatizações. A
(dados médicos, psicológicos/neuropsicológicos, depressão é a mais comum das comorbidades
histórico e caracterização das crises) que deve associadas à epilepsia do lobo temporal (ELT)71.
ser acompanhada do resultado confirmatório de
Estima-se que um quarto ou mais das
exames complementares (como neuroimagem e
pessoas com epilepsia manifestem psicoses
eletroencefalograma) e pode ser de fácil manejo ou
esquizofreniformes, depressão, transtornos de
refratária ao tratamento farmacológico66.
personalidade ou alterações da sexualidade72.
A epilepsia repercute na vida dos adultos, As crises generalizadas em série podem atuar
mesmo quando não é refratária. Samarasekera, sobre neurotransmissores dopaminérgicos do
Helmstaedter e Reuber (2015) 67
investigaram lobo temporal, disparando sintomas psicóticos
pacientes por meio de instrumentos de triagem e mimetizando quadros esquizofreniformes por
breve, como escala hospitalar de ansiedade descargas do sistema límbico73. Têm importante
e depressão (HADS), EpiTrack (versão 1), relação com lobo temporal, que abriga estruturas
questionário ABNAS (AB Neuropsychological relacionadas às funções nobres, como memória,
Assessment Schedule) voltado à percepção aprendizagem, comportamento (medo, raiva,
subjetiva do desempenho cognitivo e uma versão do agressividade e prazer), envolvendo circuitos
ABNAS preenchida por cuidadores (C-ABNAS) para ligados aos processos motivacionais básicos à
documentar suas opiniões. Os resultados indicaram sobrevivência (por exemplo, sede, fome e sexo) e
que os questionários de autorrelato ou relato do ao sistema nervoso autônomo.
cuidador identificam pacientes com epilepsia com
Os estados psicóticos interictais são mais
comprometimento cognitivo objetivo com mais
frequentes que os ictais, podendo ocorrer episódios
precisão do que pacientes com cognição intacta.
interictais “esquizofrenia-símiles”, sendo as
Capítulo 61 846
alucinações e os delírios paranoides os sintomas global da criança, incluindo a satisfação dos pais,
psicóticos mais marcantes. Estes, por sua vez, se a evolução do desenvolvimento neuropsicomotor e
manifestam principalmente na ausência de alterações social, as atividades da vida diária, as modificações
do afeto, contrastando com as anormalidades comportamentais e o rendimento escolar79.
comumente presentes na esquizofrenia74.
Quando há sofrimento cerebral precoce no
Manifestações cognitivas ou emocionais hemisfério dominante, em razão de lesões que
também podem ocorrer como características promovem crises convulsivas, é comum que a
semiológicas de crises, e se restringem ao período linguagem se distribua de uma forma mais atípica nos
ictal. A partir da classificação proposta pela ILAE hemisférios cerebrais, podendo se localizar no todo
(International League Against Epilepsy) os indivíduos ou em parte, no hemisfério contralateral (o direito). A
podem ter crises do tipo cognitiva (referente lateralização das memórias segue a mesma lógica:
a alterações cognitivas específicas durante a habitualmente a memória verbal de longa duração
crise, como afasia, apraxia, negligência, déjà vu, se localiza no mesmo hemisfério cerebral em que
jamais vu, ilusões ou alucinações) e emocional está localizada a linguagem e a memória não verbal
(relativa a uma crise focal não motora que pode ter no hemisfério contralateral. Nas injúrias precoces
manifestações emocionais, como medo, alegria, que acometem o lobo temporal esquerdo (ELTE), a
manifestações afetivas com expressão emocional memória verbal também pode se distribuir de forma
sem o componente subjetivo, como o que ocorre em atípica. Considera-se que o hemisfério esquerdo,
crises gelásticas ou dacrísticas) .
75
tido como hemisfério dominante, estaria relacionado
ao raciocínio lógico, enquanto o hemisfério direito
É na infância, quando o SNC desenvolve-se
(não-dominante), seria mais voltado as relações
rapidamente, a época em que muitas epilepsias
perceptivas e espaciais.
interferem no desenvolvimento infantil. Sabe-se
que a epilepsia pode respeitar o desenvolvimento Seguindo critérios de tratamento clínico, uma
intelectual normal, mas também pode ser um vez constatada a resistência das crises ao tratamento
importante fator incapacitante, à medida que pode medicamentoso, o paciente pode ser investigado
ser acompanhada de graves transtornos mentais, para a correta localização da área responsável pelas
cognitivos e comportamentais . Por essa razão,
76
crises, utilizando-se o vídeo-EEG para registro das
muitas epilepsias de início idade-dependente, com crises, a avaliação neuropsicológica e os exames
curso clínico durante a maturação, são consideradas funcionais e anatômicos de neuroimagem com o
transtornos ao desenvolvimento. Certamente, a objetivo de investigar sua elegibilidade à cirurgia
idade precoce do início das crises pode interferir para controle das crises.
no desenvolvimento cerebral e, consequentemente,
A avaliação das epilepsias refratárias do lobo
provocar, em longo prazo, impacto na cognição por
temporal (ELT) considera a especialização funcional
inibição na atividade mitótica, afetando a mielinização
hemisférica. O hemisfério direito geralmente é
e reduzindo o número de células, justificando, assim,
predominante para o processamento de informações
um pior prognóstico para o desenvolvimento cognitivo
não-verbais e o esquerdo frequentemente dominante
nas encefalopatias idade-dependentes77. Souza et
para o processamento de estímulos que tenham
al. (2021)78 destacaram a relação significativa entre
uma conotação linguística, incluindo encadeamento
a memória de evocação imediata e tardia e o tipo
sequencial e analítico dos estímulos. Uma bateria
de crises e escolaridade, respectivamente, sendo
de testes para este fim deve contemplar funções
relevante a adoção de testagem de rastreio na
verbais e não-verbais, diferenças no processamento
avaliação da cognição e da memória em pacientes
hemisférico, atenção, funções executivas, linguagem
com epilepsia. É importante manter o seguimento
e memória. Há instrumentos úteis, como os da família
Capítulo 61 847
do Wechsler Adult Intelligence Scale – WAIS-R, hemisfério cerebral, as homólogas contralaterais
Wechsler Memory Scale – WMS, Rey-Osterrieth passam a trabalhar sozinhas e assim, pode-se
Complex Figure Test – CFT, Boston Naming Test – estimar sua reserva funcional, ou seja, o que esta
BNT, Teste de Fluência Verbal, Rey Auditory Verbal região é capaz de executar em termos neurológicos.
Learning Test – RAVLT , Inventário de Alterações
80
Na ELT, a função investigada é a memória e o exame
Neuropsicológicas – NEUROPSIC-R , questionário
81
funciona como uma simulação de como aquele
de lateralidade, entre outros. cérebro se comportaria se estruturas das regiões
mesiais temporais fossem retiradas. A lateralização
A qualidade de vida se constitui um importante
da área da linguagem é crucial uma vez que esta
elemento e pode ser estimada através do Quality
função está relacionada com a lateralização das
of Life in Epilepsy (QOLIE-10), questionário
funções de memória no cérebro, quanto ao tipo
autoaplicável desenvolvido a partir do QOLIE-89
de material armazenado (verbal ou não verbal)87.
original. Sajatovic et al. (2019)82 apontam que as
Também há variação em relação aos critérios usados
intervenções de autocuidado podem melhorar a
para que se considere que um indivíduo passou
qualidade de vida, a saúde em geral, minimizar a
ou falhou no teste de Wada (reserva contralateral,
gravidade de sintomas depressivos e a probabilidade
reserva ipsilateral e assimetria inter-hemisférica)88.
de complicações relacionadas à epilepsia.
Originalmente realizado com o amobarbital,
na última década tem sido desenvolvido em alguns
TESTE DO AMITAL SÓDICO (TESTE DE centros com uso do etomidato, em especial com a
WADA) população pediátrica89.
O exame das discrepâncias entre as habilidades
A determinação da área da linguagem já
verbais e visuais/não verbais auxilia a identificar as
foi em parte substituída pelo uso da ressonância
áreas de disfunção (presumivelmente relacionadas
magnética funcional (fMRI) com a grande vantagem
ao foco da crise). Habilidades verbais são usadas
de ser um método menos invasivo90-92. Embora
como marcador do funcionamento do hemisfério
seja um método altamente concordante com outros
dominante, enquanto habilidades visuoperceptuais/
indicadores clínicos de lateralidade da linguagem,
não verbais são utilizadas como marcador para o
há também uma alta frequência de divergência entre
funcionamento do hemisfério não dominante. Junto à
os achados de fMRI e outros índices clínicos que
escuta dicótica e às características das crises, essa
podem dificultar a determinação da dominância e a
discrepância também pode auxiliar a determinar o
tomada de decisão cirúrgica83.
lado dominante na linguagem83, entretanto outras
técnicas fornecem informações mais consistentes. Embora haja muita discussão sobre a vida
útil do teste de Wada93, ainda é utilizado em casos
A investigação pré-operatória para cirurgia
selecionados, como na esclerose mesial temporal
de epilepsia pode incluir, além da testagem
esquerda, ou em lesões neoplásicas quando uma
neuropsicológica, outras modalidades de
neurocirurgia ablativa tem como alvo o sistema
mapeamento cognitivo, como o teste de Wada84
hipocampal do hemisfério cerebral esquerdo. Mais
(vide revisão histórica em Kundu et al., 2019)85.
do que lateralizar funções, o teste de Wada estima
O teste de Wada é utilizado para a lateralização o nível de reserva funcional, em especial no tocante
das funções de linguagem e de memória . Através
86
às funções de memória em estreita correlação
da injeção de um anestésico de curta duração via com a avaliação neuropsicológica. Neste sentido,
cateterismo na carótida interna, a região cerebral os exames menos invasivos da atualidade ainda
irrigada pela artéria cerebral média é seletivamente não substituem ainda totalmente as informações
anestesiada. Ao anestesiar uma região de um fornecidas pelo teste de Wada.
Capítulo 61 848
2 Brown G. The Past and Future of Neuropsychology:
CONSIDERAÇÕES FINAIS Introduction to a Special Issue. American Psychol Assoc.
Podcast. Disponivel em: https://www.apa.org/pubs/
No cenário das neurocirurgias, outro aspecto
highlights/podcasts/episode-27.
a se considerar é a importância da psicoeducação
3 Vinchon M, Rekate H, Kulkarni AV. Pediatric
(apesar de frequentemente negligenciada) para hydrocephalus outcomes: a review. Fluids Barriers CNS.
pacientes e suas famílias na adesão ao tratamento 2012;9(1):18.
clínico bem como nos períodos pré e pós cirúrgicos, 4 Harrison P, Oakland T. Adaptive behavior assessment
system. 2ª edição. New York: The Psychological
uma vez que conduz à percepção de melhores Corporation; 2003.
resultados. O estudo de Dicpinigaitis et al.94, em 5 Kulkarni AV, Rabin D, Drake JM. An instrument to
indivíduos com lesões cerebrovasculares, doença measure the health status in children with hydrocephalus:
the Hydrocephalus Outcome Questionnaire. J Neurosurg.
degenerativa da coluna, concussão/lesão cerebral
2004;101(2):134-140.
traumática, distúrbios de movimento, tumor
6 Kulkarni AV, Donnelly R, Shams I. Comparison of
cerebral, epilepsia e em outros procedimentos Hydrocephalus Outcome Questionnaire scores to
eletivos espinhais, detectou aumento na satisfação neuropsychological test performance in school-aged
children. J Neurosurg Pediatr. 2011;8(4):396-401.
do paciente após intervenções que incluíram
7 Bakar EE, Bakar B. Neuropsychological assessment
modalidades baseadas em texto (13,3%), em of adult patients with shunted hydrocephalus. J Korean
multimídia (incluindo vídeo e e-book) (20%), Neurosurg Soc. 2010;47(3):191-198.
aplicativos interativos em celular e tablet (33,3%), 8 Platenkamp M, Hanlo PW, Fischer K, Gooskens RH.
Outcome in pediatric hydrocephalus: a comparison between
modelos tridimensionais (3D) impressos (20%) e previously used outcome measures and the hydrocephalus
experiências de realidade virtual (VR) imersivas outcome questionnaire. J Neurosurg. 2007;107(1):26-31.
(13,3%). Os procedimentos adotados pelos autores 9 Iddon JL, Morgan DJ, Loveday C, Sahakian BJ, Pickard
JD. Neuropsychological profile of young adults with spina
foram variados, incluindo cartas de expectativa,
bifida with or without hydrocephalus. J Neurol Neurosurg
brochura com nomes, fotografias e especialidade/ Psychiatry. 2004;75(8):1112-1118.
informações de treinamento sobre os profissionais 10 Lindquist B, Persson EK, Fernell E, Uvebrant P.
de saúde da equipe, folheto com explicações sobre Very long-term follow-up of cognitive function in adults
treated in infancy for hydrocephalus. Childs Nerv Syst.
condição, tratamento, diagnóstico, procedimentos, 2011;27(4):597-601.
fatores de risco, físicos e psicológicos após o 11 Isaacs AM, Riva-Cambrin J, Yavin D, et al. Age-specific
tratamento, e explicação dos termos-chave de global epidemiology of hydrocephalus: Systematic review,
metanalysis and global birth surveillance. PLoS One.
modo facilmente compreensível. Além de recursos 2018;13(10):e0204926.
multimídia, como vídeos em 3D com representações 12 Bir SC, Patra DP, Maiti TK, et al. Epidemiology of adult-
de doenças cerebrovasculares, e-book com onset hydrocephalus: institutional experience with 2001
patients. Neurosurg Focus. 2016;41(3):E5.
informações acerca do consentimento informado,
fotos, filmes curtos e perguntas frequentes com 13 Chahlavi A, El-Babaa SK, Luciano MG. Adult-onset
hydrocephalus. Neurosurg Clin N Am. 2001;12(4):753-60.
respostas escritas em linguagem simples para leigos
14 Oberholzer M, Müri RM. Neurorehabilitation of Traumatic
geram resultados positivos e colocam em evidência Brain Injury (TBI): A Clinical Review. Med Sci (Basel).
o efeito que o processo de psicoeducação tem na 2019;7(3):47.
Capítulo 61 849
18 Pereira RM, Mazeti L, Lopes DCP, Pinto FCG. 32 Friedland RP. ‘Normal’-pressure hydrocephalus and the
Hidrocefalia de pressão normal: visão atual sobre a saga of the treatable dementias. JAMA. 1989;262(18):2577-
fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. Revista de 2581.
Medicina. 2012;91(2):96-109.
33 Petersen RC, Mokri B, Laws ER Jr. Surgical treatment
19 Tullberg M, Hellström P, Piechnik SK, Starmark of idiopathic hydrocephalus in elderly patients. Neurology.
JE, Wikkelsö C. Impaired wakefulness is associated 1985;35(3):307-311.
with reduced anterior cingulate CBF in patients with
34 Yamada S, Ishikawa M, Miyajima M, et al. Disease
normal pressure hydrocephalus. Acta Neurol Scand.
duration: the key to accurate CSF tap test in iNPH. Acta
2004;110(5):322-330.
Neurol Scand. 2017;135(2):189-196.
20 Schmidt H, Elster J, Eckert I, et al. Cognitive
35 Caruso R, Cervoni L, Vitale AM, Salvati M. Idiopathic
functions after spinal tap in patients with normal pressure
normal-pressure hydrocephalus in adults: result of shunting
hydrocephalus. J Neurol. 2014;261(12):2344-2350.
correlated with clinical findings in 18 patients and review of
21 Koivisto AM, Alafuzoff I, Savolainen S, et al. Poor the literature. Neurosurg Rev. 1997;20(2):104-107.
cognitive outcome in shunt-responsive idiopathic normal
36 Tullberg M, Hellström P, Piechnik SK, Starmark
pressure hydrocephalus. Neurosurgery. 2013;72(1):1-8.
JE, Wikkelsö C. Impaired wakefulness is associated
22 Hellström P, Edsbagge M, Archer T, Tisell M, Tullberg M, with reduced anterior cingulate CBF in patients with
Wikkelsø C. The neuropsychology of patients with clinically normal pressure hydrocephalus. Acta Neurol Scand.
diagnosed idiopathic normal pressure hydrocephalus. 2004;110(5):322-330.
Neurosurgery. 2007;61(6):1219-1226.
37 Wikkelsø C, Hellström P, Klinge PM, Tans JT; European
23 Katzen H, Ravdin LD, Assuras S, et al. Postshunt iNPH Multicentre Study Group. The European iNPH
cognitive and functional improvement in idiopathic normal Multicentre Study on the predictive values of resistance to
pressure hydrocephalus. Neurosurgery. 2011;68(2):416-419. CSF outflow and the CSF Tap Test in patients with idiopathic
normal pressure hydrocephalus. J Neurol Neurosurg
24 Donnet A, Schmitt A, Dufour H, Giorgi R, Grisoli F.
Psychiatry. 2013;84(5):562-568.
Differential patterns of cognitive impairment in patients with
aqueductal stenosis and normal pressure hydrocephalus. 38 Ishikawa M, Hashimoto M, Mori E, Kuwana N, Kazui
Acta Neurochir. 2004;146(12):1301-1308. H. The value of the cerebrospinal fluid tap test for
predicting shunt effectiveness in idiopathic normal pressure
25 Iddon JL, Pickard JD, Cross JJ, Griffiths PD, Czosnyka
hydrocephalus. Fluids Barriers CNS. 2012;9(1):1.
M, Sahakian BJ. Specific patterns of cognitive impairment
in patients with idiopathic normal pressure hydrocephalus 39 Ishikawa M, Yamada S, Yamamoto K. Early and delayed
and Alzheimer’s disease: a pilot study. J Neurol Neurosurg assessments of quantitative gait measures to improve the
Psychiatry. 1999;67(6):723-732. tap test as a predictor of shunt effectiveness in idiopathic
normal pressure hydrocephalus. Fluids Barriers CNS.
26 Bugalho P, Alves L, Miguel R, Ribeiro O. Profile of
2016;13(1):20.
cognitive dysfunction and relation with gait disturbance in
Normal Pressure Hydrocephalus. Clin Neurol Neurosurg. 40 Wikkelsø C, Andersson H, Blomstrand C, Lindqvist
2014;118:83-88. G. The clinical effect of lumbar puncture in normal
pressure hydrocephalus. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
27 Nee DE, Wager TD, Jonides J. Interference resolution:
1982;45(1):64-69.
insights from a metaanalysis of neuroimaging tasks. Cogn
Affect Behav Neurosci. 2007;7(1):1-17. 41 Halperin JJ, Kurlan R, Schwalb JM, Cusimano MD,
Gronseth G, Gloss D. Practice guideline: Idiopathic
28 Marmarou A, Bergsneider M, Klinge P, Relkin N, Black
normal pressure hydrocephalus: Response to shunting
PM. The value of supplemental prognostic tests for the
and predictors of response: Report of the Guideline
preoperative assessment of idiopathic normal-pressure
Development, Dissemination, and Implementation
hydrocephalus. Neurosurgery. 2005;57(3):S17-28.
Subcommittee of the American Academy of Neurology.
29 Eide PK, Brean A. Intracranial pulse pressure amplitude Neurology. 2015;85(23):2063-2071.
levels determined during preoperative assessment
42 Damasceno BP, Carelli EF, Honorato DC, Facure
of subjects with possible idiopathic normal pressure
JJ. The predictive value of cerebrospinal fluid tap-test
hydrocephalus. Acta Neurochir. 2006;148(11):1151-1156.
in normal pressure hydrocephalus. Arq Neuropsiquiatr.
30 Hellström P, Edsbagge M, Blomsterwall E, et al. 1997;55(2):179-185.
Neuropsychological effects of shunt treatment in
43 Walchenbach R, Geiger E, Thomeer RT, Vanneste
idiopathic normal pressure hydrocephalus. Neurosurgery.
JA. The value of temporary external lumbar CSF
2008;63(3):527-535.
drainage in predicting the outcome of shunting on normal
31 Benejam B, Poca MA, Junqué C, Solana E, Sahuquillo pressure hydrocephalus. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
J. Alteraciones cognitivas en pacientes con hidrocefalia 2002;72(4):503-506.
crónica del adulto (“normotensiva”). Propuesta de un
44 Malm J, Kristensen B, Karlsson T, Fagerlund M,
protocolo para su evaluación clínica [Cognitive impairment
Elfverson J, Ekstedt J. The predictive value of cerebrospinal
in normal pressure hydrocephalus (NPH). A proposal
fluid dynamic tests in patients with th idiopathic adult
for clinical evaluation protocol]. Neurocirugia (Astur).
hydrocephalus syndrome. Arch Neurol. 1995;52(8):783-789.
2008;19(4):309-321.
Capítulo 61 850
45 Mihalj M, Dolić K, Kolić K, Ledenko V. CSF tap 60 Kaur H, Nehra A, Chopra S, et al. Development and
test - Obsolete or appropriate test for predicting shunt Validation of a Comprehensive Neuropsychological and
responsiveness? A systemic review. J Neurol Sci. Language Rehabilitation for Stroke Survivors: A Home-
2016;362:78-84. Based Caregiver-Delivered Intervention Program. Ann
Indian Acad Neurol. 2020;23(2):S116-S122.
46 Kubo Y, Kazui H, Yoshida T, et al. Validation of grading
scale for evaluating symptoms of idiopathic normal- 61 Zimmermann P, Leclercq M. Neuropsychological aspects
pressure hydrocephalus. Dement Geriatr Cogn Disord. of attentional functions and disturbances. In: Leclercq M,
2008;25(1):37-45. Zimmermann P, eds. Applied Neuropsychology of Attention.
Theory, Diagnosis and Rehabilitation. Psychology Press;
47 Kahlon B, Sundbärg G, Rehncrona S. Comparison
2002. p. 58–85
between the lumbar infusion and CSF tap tests to
predict outcome after shunt surgery in suspected normal 62 Spaccavento S, Marinelli CV, Nardulli R, et al.
pressure hydrocephalus. J Neurol Neurosurg Psychiatry. Attention Deficits in Stroke Patients: The Role of
2002;73(6):721-726. Lesion Characteristics, Time from Stroke, and
Concomitant Neuropsychological Deficits. Behav Neurol.
48 Saito M, Nishio Y, Kanno S, et al. Cognitive profile of
2019;2019:7835710.
idiopathic normal pressure hydrocephalus. Dement Geriatr
Cogn Dis Extra. 2011;1(1):202-11. 63 Santana MTM, Chun RYS. Linguagem e funcionalidade
de adultos pós-Acidente Vascular Encefálico (AVE):
49 Kang K, Hwang SK, Lee HW. Shunt-responsive
avaliação baseada na Classificação Internacional de
idiopathic normal pressure hydrocephalus patient with
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). CoDAS.
delayed improvement after tap test. J Korean Neurosurg
2017; 29(1):e20150284.
Soc. 2013;54(5):437-440.
64 Requena, C, Rebok G. Avaliação neuropsicológica dos
50 Virhammar J, Cesarini KG, Laurell K. The CSF tap test in
erros e microerros nas atividades da vida diária de idosos.
normal pressure hydrocephalus: evaluation time, reliability
IN: Schlindwein-Zanini, R, Cruz, RM. Neuropsicologia dos
and the influence of pain. Eur J Neurol. 2012;19(2):271-276.
distúrbios motores. Ed. Pearson. 2019. P. 223-256.
51 Williams MA, Malm J. Diagnosis and Treatment of
65 Meinardi H, Scott RA, Reis R, et al. of the ILAE
Idiopathic Normal Pressure Hydrocephalus. Continuum
Commission on the Developing World. The treatment
(Minneap Minn). 2016;22(2):579-599.
gap in epilepsy: the current situation and the way
52 da Rocha SFB, Kowacs PA, de Souza RKM, Pedro forward. Epilepsia. 2001;42:136– 49.
MKF, Ramina R, Teive HAG. Serial Tap Test of patients
66 Schlindwein-Zanini, R. Contexto neuropsicológico
with idiopathic normal pressure hydrocephalus: impact on
e suas repercussões na síndrome epilética. In: Riechi
cognitive function and its meaning. Fluids Barriers CNS.
TIS, Valiati MRMS, Antoniuk SA, eds. Práticas em
2021;18(1):22.
neurodesenvolvimento infantil: Fundamentos e Evidências
53 Rohde D, Gaynor E, Large M, et al. Cognitive impairment Científicas – 2ª edição. Curitiba: Ithala; 2017. p. 203-236
and medication adherence post-stroke: A five-year follow-up
67 Samarasekera SR, Helmstaedter C, Reuber M. Cognitive
of the ASPIRE-S cohort. PLoS One. 2019;14(10):e0223997.
impairment in adults with epilepsy: The relationship between
54 Correia JP, Figueiredo AS, Costa HM, Barros P, Veloso subjective and objective assessments of cognition. Epilepsy
LM. Investigação Etiológica do Acidente Vascular Cerebral Behav. 2015;52:9-13.
no Adulto Jovem. Medicina Interna. 2018;25(3):213-223.
68 Meneses MS, Rocha SFB, Simão C, Santos HNHL,
55. Gagliardi , Rubens J, Raffin, et al. Primeiro Pereira C, Kowacs PA. Vagus nerve stimulation may be
Consenso Brasileiro do Tratamento da Fase Aguda do a sound therapeutic option in the treatment of refractory
Acidente Vascular Cerebral. Arquivo Neuropsiquiatria. epilepsy. Arq. Neuro-Psiquiatr. 2013;71(1):25-30.
2001;59(4):972-980.
69 Schlindwein-Zanini R, Melo A, Porto Seleme R.
56. Foerch C, Misselwitz B, Sitzer M, et al. Difference in Reabilitação neuropsicológica: programa do Núcleo de
recognition of right and left hemispheric stroke. Lancet. Neuropsicologia e Saúde - HU/UFSC. In: Schlindwein-
2005;366(9483):392-3. Zanini R, Cruz RM, eds. Neuropsicologia dos distúrbios
motores. São Paulo, SP: Pearson; 2019. p. 257-310
57. Schumacher R, Bruehl S, Halai AD, Lambon Ralph MA.
The verbal, non-verbal and structural bases of functional 70 Nowack WJ. Psychiatric disorders associated with
communication abilities in aphasia. Brain Commun. epilepsy. 2006 - Last update. Rev Med Minas Gerais.
2020;2(2):fcaa118. 2008;18(4):S98-S106.
58. Labberton AS, Augestad LA, Thommessen B, Barra M. 71 Kanner AM. Depression and epilepsy: a new
The association of stroke severity with health-related quality perspective on two closely related disorders. Epilepsy Curr.
of life in survivors of acute cerebrovascular disease and 2006;6(5):141-146.
their informal caregivers during the first year post stroke: a
72 Cantilino A, Carvalho JA. Psicoses relacionadas à
survey study. Qual Life Res. 2020;29(10):2679-2693.
epilepsia: um estudo teórico. Revista Neurobiologia.
59 Scottish Intercollegiate Guidelines Network. Management 2001;64(3-4):109-116.
of Patients with Stroke. Rehabilitation, Prevention and
73 Lee E-K. Periodic left temporal sharp waves during acute
Management of Complications, and Discharge Planning.
psychosis. J Epilepsy. 1998;11:79-83.
Guideline 64. 2002.
Capítulo 61 851
74 Kaplan I, Sandock BJ. Compêndio de Psiquiatria. Artes 86 Rocha SFB, Meneses MS, Kowacs PA, Simão C,
Médicas, Porto Alegre, 1997 Larocca H, Hunhevicz SC. O methohexital sódico
(Brevital®) no teste de Wada: relato de dois casos. J.
75 Fisher RS, Cross JH, French JA, et al. Operational
epilepsy clin. neurophysiol. 2005;11(2):87-90.
classification of seizure types by the International
League Against Epilepsy: Position Paper of the ILAE 87 Vingerhoets G, Miatton M, Vonck K, Seurinck R, Boon
Commission for Classification and Terminology. Epilepsia. P. Memory performance during the intracarotid amobarbital
2017;58(4):522-530. procedure and neuropsychological assessment in medial
temporal lobe epilepsy: the limits of material specificity.
76 Schlindwein-Zanini R, Portuguez MW, Costa DI,
Epilepsy Behav. 2006;8(2):422-428.
Marroni SP, Da Costa JC. Refractory epilepsy: Rebound of
Quality of Life of Child and his Caretaker. J Epilepsy Clin 88 Rathore C, Alexander A, Sarma PS, Radhakrishnan K.
Neurophysiol. 2007;13(4):159-162. Memory outcome following left anterior temporal lobectomy
in patients with a failed Wada test. Epilepsy Behav.
77 Visioli-Melo JF, Rotta NT. Avaliação pelo P300 de
2015;44:207-12.
crianças com e sem epilepsia e rendimento escolar. Arq.
Neuro-Psiquiatr. 2000;58(2). 89 Gulati P, Jain P, Lou Smith M, et al. Reliability and safety
of Etomidate speech test in children with drug resistant focal
78 Souza MC, Paulo CO, Miyashiro L, Twardowschy CA.
epilepsy. Epilepsy Res. 2019;156:106150.
Comparison of screening tests in the evaluation of cognitive
status of patients with epilepsy. Dement. neuropsychol. 90 Szaflarski JP, Gloss D, Binder JR, et al. Practice
2021;15(1):145-152. guideline summary: Use of fMRI in the presurgical
evaluation of patients with epilepsy: Report of the Guideline
79 Costa JC, Portela EJ. Tratamento cirúrgico
Development, Dissemination, and Implementation
das epilepsias na criança. J. epilepsy clin.
Subcommittee of the American Academy of Neurology.
neurophysiol. 2006;12(1):32-43.
Neurology. 20174;88(4):395-402.
80 Lezak, MD, Howieson, DB, Bigler, ED, Tranel,
91 Ishikawa T, Muragaki Y, Maruyama T, Abe K, Kawamata
D. Neuropsychological assessment. 5ª edição. Oxford
T. Roles of the Wada Test and Functional Magnetic
University Press; 2012.
Resonance Imaging in Identifying the Language-dominant
81 Schlindwein-Zanini R, Cruz RM, Zavareze TE. A Hemisphere among Patients with Gliomas Located near
percepção dos professores de Ensino Fundamental sobre Speech Areas. Neurol Med Chir. 2017;57(1):28-34.
a criança com epilepsia na escola em Santa Catarina. J
92 Trimmel K, Caciagli L, Xiao F, et al. Impaired naming
epilepsy clin Neurophysiol. 2011;17(1):7-9.
performance in temporal lobe epilepsy: language fMRI
82 Sajatovic M, Johnson EK, Fraser RT, et al. Self- responses are modulated by disease characteristics.
management for adults with epilepsy: Aggregate Managing Journal of neurology. 2021;268(1):147–160.
Epilepsy Well Network findings on depressive symptoms.
93 Quigg M. The Wada test: the best steam engine on the
Epilepsia. 201;60(9):1921-1931.
tracks. Epilepsy Res. 2019;156:106157.
83 Omisade A, O’Grady C, Sadler RM. Divergence between
94 Dicpinigaitis AJ, Li B, Ogulnick J, McIntyre MK, Bowers
functional magnetic resonance imaging and clinical
C. Evaluating the Impact of Neurosurgical Educational
indicators of language dominance in preoperative language
Interventions on Patient Knowledge and Satisfaction: A
mapping. Hum Brain Mapp. 2020;41(14):3867-3877.
Systematic Review of the Literature. World Neurosurg.
84 Wada J, Rasmussen T. Intracarotid injection of sodium 2020;147:70-78.
amytal for the lateralization of cerebral speech dominance. J
Neurosurg. 2007;106(6):1117-1133.
85 Kundu B, Rolston JD, Grandhi R. Mapping language
dominance through the lens of the Wada test. Neurosurg
Focus. 2019;47(3):E5.
Capítulo 61 852
CAPÍTULO 62
APLICAÇÕES CLÍNICAS DE MODELOS DE
MANUFATURA ADITIVA EM NEUROCIRURGIA
Matheus Kahakura Franco Pedro particularmente útil para os cirurgiões, uma vez que as
imagens 2D podem não ser facilmente compreendidas
Beatriz Luci Fernandes em relação às estruturas anatômicas e irregularidades
anatômicas complexas4.
Mauren Abreu de Souza
É notório que os exames de imagem disponíveis
Percy Nohama podem garantir aos cirurgiões uma boa visualização da
morfologia dos órgãos; entretanto, em algumas ocasiões,
não são eficazes para o planejamento cirúrgico adequado.
INTRODUÇÃO Embora os gráficos digitais tenham se tornado muito
Os contínuos avanços nas ciências da computação semelhantes à realidade, a simulação de um procedimento
trouxeram novas perspectivas para o campo da medicina. cirúrgico ainda é difícil e está longe de ser aplicada,
A possibilidade de visualização dos órgãos internos por mesmo quando tecnologias avançadas são adotadas.
ultrassonografia (US) e tomografia computadorizada Simuladores de realidade virtual foram desenvolvidos
(TC) foi acompanhada de um avanço significativo, com para cirurgia neurológica na tentativa de solucionar
melhor definição das imagens por meio da ressonância esse problema. No entanto, eles são baseados em um
magnética (RM), e os horizontes médicos tornaram-se uso extensivo de gráficos com feedback tátil limitado.
mais amplos. Recentemente, tornou-se possível alterar o Apesar de fornecer imagens virtuais 3D, a interpretação
formato do banco de dados bidimensionais (2D) tornam- dessas imagens depende do raciocínio do cirurgião, que
se imagens tridimensionais (3D). Desde então, com o precisa transformar as imagens 2D em imagens virtuais
aprimoramento da miríade de hardwares e softwares, a 3D. Por outro lado, modelos reais de estruturas cerebrais
imagem médica virtual 3D tornou-se mais conveniente, podem fornecer uma expressão tátil, sem a necessidade
fácil de usar e com melhor resolução e interação com o de qualquer capacidade visuoespacial do cirurgião para
usuário1,2. processar as imagens 2D, uma vez que um modelo 3D
Os avanços tecnológicos foram impulsionados real e palpável está disponível5.
pelas necessidades da indústria e, atualmente, pelo Na área cirúrgica, a aplicação da MA atinge
advento das técnicas de manufatura aditiva (MA). Isso, especialidades como Cirurgia Bucomaxilofacial,
no campo da medicina, permite a produção de modelos Otorrinolaringologia (ORL), Ortopedia, Cirurgia Cardíaca
3D de estruturas humanas, denominados biomodelos, a e Neurocirurgia.
partir de dados adquiridos em exames de imagem . 1,3
Na Cirurgia Bucomaxilofacial, os modelos 3D
Atualmente, a MA tem sido utilizada por são aplicados no planejamento cirúrgico de pacientes
Capítulo 62 853
ortognáticos, uma vez que a anatomia e os por computador. Esses métodos são bastante
procedimentos nesta área são bastante complexos. peculiares, uma vez que os materiais podem ser
As tecnologias de impressão tridimensional fornecem unidos, camada por camada, com o objetivo de
melhores resultados funcionais e estéticos e maior constituir o objeto projetado3.
satisfação dos pacientes devido ao planejamento
O termo “rápido” associado a esses processos
cirúrgico preciso6–9.
é relativo, uma vez que a construção de alguns
Na área de ORL, os procedimentos podem protótipos pode levar de 2 a 72h dependendo do
representar desafios significativos, mesmo para os tamanho e da complexidade do objeto15-17.
cirurgiões mais experientes, durante a ressecção de
Um software específico, que consiste na
doenças tumorais infiltrativas e para a reconstrução
interface entre o modelo 3D (CAD) e a máquina
de estruturas anatômicas, principalmente na
MA, decompõe o modelo CAD em várias camadas
abordagem endoscópica e nas doenças da base do
finas, que são empilhadas uma a uma. O processo
crânio. O uso da MA permite a produção de modelos
de MA combina camadas de material com o objetivo
paciente-específicos, proporcionando melhor
de criar um objeto sólido. A criação de objetos com
planejamento cirúrgico e simulação pré-operatória.
características internas complicadas é realizada pela
Já na Ortopedia, essa tecnologia afetou natureza aditiva desse processo, que não pode ser
principalmente o planejamento cirúrgico, sendo realizada por outros processos como, por exemplo,
aplicada em lesões de coluna, quadril, pelve e usinagem, fresagem e furação, que são processos
ombro. Além disso, próteses sob medida podem ser subtrativos18,19.
adaptadas à anatomia de cada indivíduo11.
A impressão tridimensional consiste em um
As doenças cardiovasculares também obtêm processo de construção de objetos 3D a partir de
benefícios, uma vez que os biomodelos podem um arquivo digital. Neste processo, um objeto digital
desempenhar um papel importante no diagnóstico e 3D é criado usando o software de design (CAD).
tratamento. A tecnologia é particularmente útil para Esses objetos 3D digitais são salvos em um arquivo
intervenções cirúrgicas e endovasculares, como cujo formato é reconhecido pela impressora 3D
o implante de endopróteses arteriais. Da mesma (geralmente, no formato STL)20. Todos os processos
forma, na literatura, muitos relatos descrevem de MA existentes, até agora, consistem em cinco
o uso de biomodelos no tratamento de doenças estágios básicos (Figs. 1, 2 e 3):
valvares 12-14
.
1. criação de um modelo CAD do objeto que
No que tange à Neurocirurgia, a MA tem está sendo projetado;
inúmeras aplicações, que serão apresentadas em
2. conversão do arquivo CAD em arquivo STL;
detalhes a seguir.
3. decomposição do arquivo STL em finas
camadas transversais;
4. construção física do modelo, empilhando
MANUFATURA ADITIVA: CONCEITO uma camada sobre outra; e
Desde o seu início, na década de 1980, a MA
5. limpeza e acabamento do modelo.
foi revolucionária no desenvolvimento de objetos.
Anteriormente denominada prototipagem rápida, a
manufatura aditiva é popularmente conhecida como
impressão 3D e designa um conjunto de tecnologias
para a fabricação de objetos físicos diretamente de
um banco de dados gerado por projeto auxiliado
Capítulo 62 854
Nesta tecnologia, vários processos de
produção diferentes estão envolvidos. Dependendo
do processo de impressão 3D, a produção do
modelo pode ser classificada em 7 categorias, de
acordo com a norma ISO/ ASTM 52900 (2015)19,21-23:
Capítulo 62 855
cerebrais é aprimorada com o uso de biomodelos cerebrovasculares, endovasculares, neuro-
3D antes da cirurgia. Além disso, a impressão 3D oncológicas, neuropediátricas e funcionais.
configura uma oportunidade promissora para o
As diretrizes ideais para a aquisição de
treinamento pré-operatório do neurocirurgião. Sabe-
imagens de TC foram avaliadas e determinaram que
se que a manipulação excessiva de nervos ou vasos
as imagens adquiridas deveriam ter uma espessura
intracranianos durante a ressecção de um tumor
de 2 mm, e esses dados foram adaptados para a
cerebral, por exemplo, retarda a cirurgia e constitui
criação de modelos 3D29,30.
um fator que pode acarretar déficits neurológicos,
que, por vezes, são irreversíveis25. Porém, com os avanços das tecnologias
de TC e impressora 3D, as imagens adquiridas
Hoje, na prática cirúrgica, a disponibilidade
apresentam cortes mais finos (0,6 mm), conforme
de uma cirurgia guiada por imagem configura um
apresentado em artigo por um dos autores (Leal AG)
componente no desenvolvimento de habilidades
deste estudo17, e podem gerar modelos com mais
cirúrgicas26. Ademais, os sistemas de realidade
detalhes e precisão.
virtual (VR) para simulação cirúrgica demonstram
resultados promissores27. Além disso, a ressonância magnética(RM)
foi avaliada para aquisição de dados 3D, mas os
No entanto, esses sistemas geralmente são
modelos resultantes eram de qualidade inferior
caros e fornecem apenas feedback tátil limitado. No
quando comparados com os biomodelos derivados
Brasil, o uso de espécimes de cadáveres ainda é
da TC. No entanto, quando o cérebro é prototipado,
muito restrito, pois depende da disponibilidade de
as imagens de RM são mais adequadas devido à
recursos, além das questões de risco biológico.
baixa definição da TC para tecidos moles31.
Por outro lado, estudos em animais levantam
questões éticas e nem sempre podem fornecer uma Biomodelos de aneurismas intracranianos
representação realista da anatomia humana. (AI) têm sido estudados para planejamento pré-
operatório e treinamento cirúrgico32-34. Alguns
A projeção e fabricação de biomodelos
estudos publicados relataram que os biomodelos
anatômicos são motivadas pela necessidade
eram anatomicamente precisos quando comparados
de modelos realistas e reprodutíveis para
com a anatomia real do paciente adquirida por meio
planejamento cirúrgico, treinamento e simulação.
de imagens de angiografias cerebrais35-37. Dentre
O desenvolvimento de modelos 3D tem o potencial
esses estudos, um dos autores do presente estudo
de proporcionar uma série de vantagens para a
(Leal AG) pode ser citado (Fig. 4)17.
Neurocirurgia, como uma perspectiva educacional
para médicos e pacientes, e até mesmo possibilitar
uma simulação cirúrgica.
Capítulo 62 856
Figura 4: Aneurisma de artéria comunicante anterior
(flecha).
Fonte: Os autores, 2021.
Capítulo 62 857
modelos impressos contribuíram para o planejamento que essas imagens forneçam detalhes importantes
cirúrgico . A tecnologia de manufatura aditiva é
44
para o planejamento pré-operatório, algumas
utilizada para confeccionar modelos 3D de MAVs e dificuldades ainda persistem na diferenciação
facilitar a conversa pré-operatória com o paciente, entre as lesões tumorais e as estruturas cerebrais
além ser um instrumento útil para a educação de subjacentes. A tecnologia de manufatura aditiva
jovens cirurgiões 45,46
. permitiu que os dados de RM fossem traduzidos
em biomodelos feitos sob medida, descrevendo a
A endarterectomia carotídea (EC) também
relação entre tumor, vasculatura e tecido cerebral,
entrou na era da MA. Antes disso, a CE dependia
facilitando o entendimento e, consequentemente,
da exposição cirúrgica dos pacientes. Este
resultando no planejamento do tratamento mais
procedimento exige um cirurgião experiente e com
eficaz52.
baixíssima incidência de complicações. O alto risco
desse procedimento, bem como a diminuição do A validade dessa técnica foi confirmada por
número dessas cirurgias realizadas anualmente relatos de planejamento pré-operatório por meio
devido ao advento da técnica endovascular, criou da tractografia em modelos 3D, principalmente
uma lacuna na formação de jovens neurocirurgiões e quando utilizada em cirurgias de ressecção tumoral
cirurgiões vasculares. Modelos 3D para a simulação complexas, como as de gliomas. Os gliomas
de EC fornecem um treinamento abrangente e difusos de baixo grau são tumores infiltrativos que
permitem que os residentes obtenham habilidades permeiam as estruturas corticais e subcorticais do
antes de operar um paciente . 47
cérebro. O entendimento das relações anatômicas,
caso a caso, é fundamental para o sucesso da
Da mesma forma, os biomodelos também
terapia neurocirúrgica. A MA com base em imagens
foram validados para planejamento pré-operatório
de tractografia pode aprimorar as habilidades do
no tratamento endovascular de doenças vasculares
cirurgião para planejar e tratar esses tipos de lesões.
com moldagem por microcateter48,49 e no tratamento
Esse processo pode reduzir o tempo cirúrgico e
endovascular de estenose arterial intracraniana50.
contribuir para aumentar a segurança do paciente
Modelos tridimensionais foram usados em em cirurgias de ressecção de tumor quando os
tumores cerebrais para avaliar a associação entre tratos nervosos estão envolvidos ou fazem parte da
tecidos neoplásicos saudáveis e adjacentes e ajudar abordagem do tumor53.
a delinear as bordas da ressecção. A impressão
As cirurgias de tumores de base do crânio
tridimensional de tumores cerebrais usa a fusão
também se beneficiam do uso de MA devido à
de imagens de TC e RM como base, melhorando a
extrema dificuldade de abordagem cirúrgica e à
compreensão anatômica.
complexidade anatômica54,55. Nessas lesões, áreas
Atualmente, o planejamento pré-operatório mais profundas não são visíveis nos modelos
neuro-oncológico é baseado em exames de imagem, prototipados confeccionados com materiais opacos.
principalmente na RM, já que esta fornece imagens As técnicas de fabricação aditiva foram aprimoradas
detalhadas dos tecidos cerebrais. O uso de técnicas ao longo dos anos e, agora, materiais translúcidos
de perfusão e tractografia também pode fornecer podem ser impressos proporcionando uma melhor
detalhes importantes para a escolha da abordagem visualização das estruturas envolvidas com a lesão56.
a ser utilizada pelo neurocirurgião. Da mesma
O uso da impressão 3D trouxe o
forma, a estereotaxia e a neuronavegação passaram
desenvolvimento de simuladores criados a partir
a facilitar o planejamento pré e intraoperatório, uma
da construção do crânio, com todos os seus
vez que fornecem a localização das estruturas
componentes, utilizando uma variedade de materiais
intracranianas, em tempo real, nos exames de
com consistência e densidade muito próximas da
imagem previamente adquiridos51. Porém, mesmo
Capítulo 62 858
realidade. A tecnologia Polyjet se tornou o método modelos 3D, o tempo de cirurgia foi reduzido quando
preferido para imprimir dispositivos para essa comparado com procedimentos que não utilizavam
finalidade .57
essa tecnologia63.
Capítulo 62 859
MA é a ventriculostomia de terceiro ventrículo
endoscópica (ETV).
Capítulo 62 860
A impressão tridimensional com material à implementação generalizada. O processo de
base de gesso foi utilizada para confeccionar um construção do modelo pode ser parcialmente
modelo anatômico físico e não virtual da coluna automatizado, mas para uso clínico, alguns cuidados
lombossacra de acordo com a imagem da TC. devem ser tomados durante esse processo. A
Esses modelos podem ser usados para realizar uma qualidade final dos biomodelos depende da qualidade
variedade de procedimentos, incluindo intervenções da imagem adquirida nos exames de imagem
no tratamento da dor, como bloqueios epidurais e cerebral. Uma análise cuidadosa é necessária
das raízes dos nervos, injeções de facetas e tampão quando a segmentação é feita manualmente,
em casos de hipotensão do líquido cefalorraquidiano devido à complexidade, aos tamanhos reduzidos e
(LCR) .
80
aos percursos irregulares das estruturas cerebrais.
A manipulação especializada dos programas de
As anomalias da articulação craniovertebral
segmentação por MA, imagem e técnicos de geração
podem ser muito difíceis de serem tratadas
de arquivos em 3D é de extrema importância. O
cirurgicamente. As informações pré-operatórias sobre
conhecimento técnico de sistemas operacionais e
anomalias ósseas, o trajeto das artérias vertebrais,
software de segmentação é de importância crucial.
o tamanho dos pedículos ósseos e a localização
dos forames transversais são importantes para os A qualidade final do biomodelo depende
cirurgiões. Os tamanhos das placas e parafusos a das diversas etapas de sua produção, desde a
serem utilizados, bem como o ângulo de inserção aquisição das imagens por meio de tomografia
do parafuso, podem ser calculados com base nos computadorizada(TC) e RM até a impressão final
dados dos modelos 81,82
. propriamente dita. A qualidade dos equipamentos
utilizados também influencia no resultado das
Além disso, esta técnica pode ser aplicada
peças. As maiores discrepâncias na produção dos
no tratamento da invaginação basilar atlantoaxial
biomodelos correspondem às suas dimensões,
e deslocamento. A impressão tridimensional
que estão relacionadas à espessura de cada corte
pode fornecer informações detalhadas sobre as
impresso. Taft et al.85 descreveram que a magnitude
anormalidades da estrutura óssea e do trajeto da
absoluta do erro era pequena e dentro da faixa de
artéria vertebral. É útil para configurar a estratégia
tolerância geralmente aceita para o tratamento de
cirúrgica e projetar o ponto de acesso e a via do
um paciente. Portanto, as etapas de controle de
parafuso, evitando consequentemente lesões da
qualidade ou validação do modelo são fundamentais
artéria vertebral e da medula óssea83.
quando os modelos impressos em 3D são utilizados
As técnicas de neuromodulação podem para o dimensionamento do dispositivo. Deve-se
fornecer um tratamento analgésico para pacientes sempre considerar um levantamento das avaliações
com dor crônica. Às vezes, essas técnicas de dos modelos, por exemplo, por meio da avaliação
tratamento podem falhar devido a um erro no acesso das imagens dos biomodelos com as mesmas
ao espaço peridural. A impressão tridimensional técnicas de imagem que os originaram. No caso dos
pode fornecer informações adicionais para melhorar biomodelos AI, a avaliação pode ser processada
as chances de acesso quando a anatomia está comparando as medidas do pescoço, da altura do
distorcida84. aneurisma e do diâmetro das artérias cerebrais
envolvidas43.
Capítulo 62 861
envolvem preços elevados e são difíceis de serem existem equipamentos de TC e RM que geram
obtidos. arquivos ".STL" automaticamente, possibilitando a
apresentação dos resultados dos exames tanto em
Uma das principais limitações da MA é que
2D quanto em impressão 3D.
as tecnologias atuais não conseguem imprimir
diretamente materiais ultra maleáveis, como os A produção sob medida de biomateriais já é um
tecidos cerebrais humanos. Um novo método foi fato. No entanto, o futuro imaginado é a impressão
proposto para criar um modelo 3D – anatômico e de tecidos humanos. A bio-impressão alcançou finas
tátil – do cérebro humano a partir de imagens de camadas de tecidos que são biologicamente ativos
RM e TC. O processo de produção consiste em e podem ser usados para testes farmacêuticos.
três etapas e utiliza o modelo 3D sólido do cérebro, Uma área de desenvolvimento promissora é a
seguido da construção de um molde negativo de bioimpressão 3D de unidades neurovasculares e
silício do primeiro modelo e utilizando-o como a contribuição dos diferentes tipos de células para
modelo para a criação de uma peça produzida com a função neurovascular. Além disso, as disfunções
uma gelatina que lembra a consistência original do podem ser estudadas nos níveis molecular e
cérebro humano 86,87
. celular20,89-92.
Capítulo 62 862
múltiplos cenários clínicos, sua ampla aplicação em 8 - D’Urso PS, Barker TM, Earwaker WJ, et al.
Stereolithographic biomodelling in cranio-maxillofacial
Neurocirurgia, no futuro, parece inevitável.
surgery: a prospective trial. J Craniomaxillofac Surg.
1999;27(01):30–37.
A manufatura aditiva oferece uma forma
9 - Lin HH, Lonic D, Lo LJ. 3D printing in orthognathic
exclusiva de replicação direta das patologias
surgery - A literature review. J Formos Med Assoc.
específicas do paciente. Pode identificar a variação 2018;117(7):547-558.
anatômica e fornecer um caminho para a construção 10 - Chan HH, Siewerdsen JH, Vescan A, Daly MJ, Prisman
rápida de modelos de treinamento, permitindo que E, Irish JC. 3D Rapid Prototyping for Otolaryngology-
Head and Neck Surgery: Applications in Image-Guidance,
o médico residente e o neurocirurgião experiente Surgical Simulation and Patient-Specific Modeling. PLoS
pratiquem as etapas cirúrgicas antes da operação. One. 2015;10(09):e0136370.
11 - Eltorai AE, Nguyen E, Daniels AH. Three-
Como uma perspectiva futura, é necessário Dimensional Printing in Orthopedic Surgery. Orthopedics.
ir além do estado atual dos biomodelos 3D que 2015;38(11):684–687.
representam reconstruções anatômicas 3D reais. 12 - Sheth R, Balesh ER, Zhang YS, Hirsch JA,
Khademhosseini A, Oklu R. Three-Dimensional Printing:
Esses modelos ainda não oferecem simulações
An Enabling Technology for IR. J Vasc Interv Radiol.
de manobras mais delicadas, que envolvem 2016;27(06):859–865.
consequências reais de sangue. A utilização de 13 - Dankowski R, Baszko A, Sutherland M, et al. 3D heart
materiais com consistência semelhante à dos model printing for preparation of percutaneous structural
interventions: description of the technology and case report.
tecidos cerebral e espinhal, bem como a simulação Kardiol Pol. 2014;72(06):546–551.
de sangramento, deve ser desenvolvido. Portanto, 14 - Sardari Nia P, Heuts S, Daemen J, et al. Preoperative
as próximas etapas devem superar esses desafios. planning with three-dimensional reconstruction of patient’s
anatomy, rapid prototyping and simulation for endoscopic
mitral valve repair. Interact Cardiovasc Thorac Surg.
2017;24(02):163–168.
REFERÊNCIAS 15 - Volpato N. Prototipagem Rápida. Tecnologias e
1 - McGurk M, Amis AA, Potamianos P, Goodger NM. Aplicações. São Paulo: Blucher; 2007. pp. 272.
Rapid prototyping techniques for anatomical modelling in
medicine. Ann R Coll Surg Engl. 1997;79(03):169–174. 16 Erbano BO, Opolski AC, Olandoski M, et al. Rapid
prototyping of three-dimensional biomodels as an adjuvant
2 - Lo LJ, Chen YR. Three-dimensional computed in the surgical planning for intracranial aneurysms. Acta Cir
tomography imaging in craniofacial surgery: morphological Bras. 2013;28(11): 756–761.
study and clinical applications. Chang Gung Med J.
2003;26(01):1–11. 17 - Leal AG, Pagnan LB, Kondo RT, Foggiatto JA,
Agnoletto GJ, Ramina R. Elastomers three-dimensional
3 - Nishimura PLG, Rodrigues OV, Botura G Jr, Silva LA. biomodels proven to be a trustworthy representation
Prototipagem rápida: um comparativo entre uma tecnologia of the angiotomographic images. Arq Neuropsiquiatr.
aditiva e uma subtrativa. Blucher Design Proceedings. 2016;74(09):713–717.
2016;9(02):4481–4491.
18 - Gorni AA. Introdução à prototipagem rápida e seus
4 - Esses SJ, Berman P, Bloom AI, Sosna J. Clinical procesos. Rev Past Ind. 2001;230-239.
applications of physical 3D models derived from MDCT data
and created by rapid prototyping. AJR Am J Roentgenol. 19 - Grimm T. User’s guide to rapid prototyping. Dearborn,
2011;196(6):W683-688. MI: Society of Manufacturing Engineeers; 2004. pp. 404.
6 - Louvrier A, Marty P, Barrabé A, et al. How useful is 3D 21 - International Standard. ISO/ASTM 52900:2015(E):
printing in maxillofacial surgery? J Stomatol Oral Maxillofac Additive manufacturing – General principles – Terminology
Surg. 2017;118(04):206–212. 2015. Disponível em: https://www.iso.org/standard/69669.
html.
7 - Velasco I, Vahdani S, Ramos H. Low-cost Method for
Obtaining Medical Rapid Prototyping Using Desktop 3D 22 - Berry E, Brown JM, Connell M, et al. Preliminary
printing: A Novel Technique for Mandibular Reconstruction experience with medical applications of rapid prototyping by
Planning. J Clin Exp Dent. 2017;9(09):e1103–e1108. selective laser sintering. Med Eng Phys 1997;19(01):90–96
23 - Park J, Tari MJ, Hahn HT. Characterization of the
laminated object manufacturing (LOM) process. Rapid
Prototyping Journal. 2000;6(01):36–50.
Capítulo 62 863
24 - D’Urso PS, Thompson RG, Atkinson RL, et al. 39 - Rinne J, Hernesniemi J, Niskanen M, Vapalahti M.
Cerebrovascular biomodelling: a technical note. Surg Management outcome for multiple intracranial aneurysms.
Neurol. 1999;52(05):490–500. Neurosurgery. 1995;36(01):31–37.
25 - Iacoangeli M, Nocchi N, Nasi D, et al. Minimally 40 - Kimura T, Morita A, Nishimura K, et al. Simulation
Invasive Supraorbital Key-hole Approach for the Treatment of and training for cerebral aneurysm clipping with
of Anterior Cranial Fossa Meningiomas. Neurol Med Chir. 3-dimensional models. Neurosurgery. 2009;65(04):719–725.
2016;56(04):180–185.
41 - Mashiko T, Otani K, Kawano R, et al. Development
26 - Garrido BJ, Wood KE. Navigated placement of of three-dimensional hollow elastic model for cerebral
iliac bolts: description of a new technique. Spine J. aneurysm clipping simulation enabling rapid and low cost
2011;11(04):331–335. prototyping. World Neurosurg. 2015;83(03):351–361.
27 - Balachandran R, Fitzpatrick JM, Labadie RF. Accuracy 42 - Mashiko T, Kaneko N, Konno T, Otani K, Nagayama
of image-guided surgical systems at the lateral skull base as R, Watanabe E. Training in cerebral aneurysm clipping
clinically assessed using bone-anchored hearing aid posts using self-made 3-Dimensional models. J Surg Educ.
as surgical targets. Otol Neurotol. 2008;29(8):1050-1055. 2017;74(04):681–689.
28 - Randazzo M, Pisapia JM, Singh N, Thawani JP. 3D 43 - Leal A, Souza M, Nohama P. Additive Manufacturing
printing in neurosurgery: A systematic review. Surg Neurol of 3D Biomodels as Adjuvant in Intracranial Aneurysm
Int. 2016;7(33):S801–S80929. Clipping. Artif Organs. 2019;43(01):E9–E15.
29 - Hopper KD, Pierantozzi D, Potok PS, et al. The 44 - Weinstock P, Prabhu SP, Flynn K, Orbach DB, Smith
quality of 3D reconstructions from 1.0 and 1.5 pitch E. Optimizing cerebrovascular surgical and endovascular
helical and conventional CT. J Comput Assist Tomogr. procedures in children via personalized 3D printing. J
1996;20(05):841–847. Neurosurg Pediatr. 2015;16(05):584–589.
30 - Barker TM, Earwaker WJ, Lisle DA. Accuracy of 45 - Dong M, Chen G, Qin K, et al. Development of three-
stereolithographic models of human anatomy. Australas dimensional brain arteriovenous malformation model for
Radiol. 1994;38(02):106–111. patient communication and young neurosurgeon education.
Br J Neurosurg. 2018;32(06):646–649.
31 - Hespel AM. Three-Dimensional Printing Role in
Neurologic Disease. Vet Clin North Am Small Anim Pract. 46 - Shah A, Jankharia B, Goel A. Three-dimensional model
2018;48(1):221-229. printing for surgery on arteriovenous malformations. Neurol
India. 2017;65(06):1350–1354.
32 - Abla AA, Lawton MT. Three-dimensional hollow
intracranial aneurysm models and their potential role 47 - Santangelo G, Mix D, Ghazi A, Stoner M, Vates GE,
for teaching, simulation, and training. World Neurosurg. Stone JJ. Development of a Whole-Task Simulator for
2015;83(01):35–36. Carotid Endarterectomy. Oper Neurosurg. 2018;14(06):697–
704.
33 - Wurm G, Tomancok B, Pogady P, Holl K, Trenkler
J. Cerebrovascular stereolithographic biomodeling 48 - Ishibashi T, Takao H, Suzuki T, et al. Tailor-made
for aneurysm surgery. Technical note. J Neurosurg. shaping of microcatheters using three-dimensional printed
2004;100(01):139–145. vessel models for endovascular coil embolization. Comput
Biol Med. 2016;77:59–63.
34 - Ishikawa T, Morita A, Fukushima T, Ono H. Three-
Dimensional Cerebral Aneurysm Models for Surgical 49 - Namba K, Higaki A, Kaneko N, Mashiko T, Nemoto
Simulation and Education - Development of Aneurysm S, Watanabe E. Microcatheter shaping for intracranial
Models with Perforating Arteries and for Application of aneurysm coiling using the 3-dimensional printing rapid
Fenestrated Clips. Open Journal of Modern Neurosurgery. prototyping technology: preliminary result in the first 10
2014;4(02):59–63. consecutive cases. World Neurosurg. 2015;84(01):178–186.
35 - Anderson JR, Thompson WL, Alkattan AK, et al. 50 - Xu WH, Liu J, Li ML, Sun ZY, Chen J, Wu JH. 3D
Three-dimensional printing of anatomically accurate, patient printing of intracranial artery stenosis based on the source
specific intracranial aneurysm models. J Neurointerv Surg. images of magnetic resonance angiograph. Ann Transl Med.
2016;8(05):517–520. 2014;2(08):74.
36 - Ionita CN, Mokin M, Varble N, et al. Challenges and 51 - Silva Jr EB, Aurich LA, Silva LFM, Milano JB, Ramina
limitations of patient-specific vascular phantom fabrication M. Neuronavigation for Intracranial Meningiomas. J Bras
using 3D Polyjet printing. Proc SPIE Int Soc Opt Eng. Neurocirurg. 2011;22(04):143–149.
2014;9038:90380M.
52 - Oishi M, Fukuda M, Yajima N, et al. Interactive
37 - Kondo K, Nemoto M, Masuda H, et al. Anatomical presurgical simulation applying advanced 3D imaging and
Reproducibility of a Head Model Molded by a Three- modeling techniques for skull base and deep tumors. J
dimensional Printer. Neurol Med Chir. 2015;55(07):592–598. Neurosurg. 2013;119(01):94–105.
38 - Lawton MT, Spetzler RF. Surgical management of giant 53 - Gargiulo P, Árnadóttir Í, Gíslason M, Edmunds K,
intracranial aneurysms: experience with 171 patients. Clin Ólafsson I. New Directions in 3D Medical Modeling:
Neurosurg. 1995;42:245–266. 3D-Printing Anatomy and Functions in Neurosurgical
Planning. J Healthc Eng. 2017;2017:1439643.
Capítulo 62 864
54 - Wanibuchi M, Noshiro S, Sugino T, et al. Training for 69 - Narayanan V, Narayanan P, Rajagopalan R, et al.
Skull Base Surgery with a Colored Temporal Bone Model Endoscopic skull base training using 3D printed models
Created by Three Dimensional Printing Technology. World with pre-existing pathology. Eur Arch Otorhinolaryngol.
Neurosurg. 2016;91:66–72. 2015;272(03):753–757.
55 - Muelleman TJ, Peterson J, Chowdhury NI, Gorup 70 - Waran V, Menon R, Pancharatnam D, et al. The
J, Camarata P, Lin J. Individualized Surgical Approach creation and verification of cranial models using three-
Planning for Petroclival Tumors Using a 3D Printer. J Neurol dimensional rapid prototyping technology in field of
Surg B Skull Base. 2016;77(03):243–248. transnasal sphenoid endoscopy. Am J Rhinol Allergy.
2012;26(05):132–136.
56 - Kondo K, Harada N, Masuda H, et al. A neurosurgical
simulation of skull base tumors using a 3D printed rapid 71 - Naftulin JS, Kimchi EY, Cash SS. Streamlined,
prototyping model containing mesh structures. Acta Inexpensive 3D Printing of the Brain and Skull. PLoS One.
Neurochir. 2016;158(06):1213–1219. 2015;10(08):e0136198.
57 - Waran V, Narayanan V, Karuppiah R, Owen SL, Aziz 72 Wilcox B, Mobbs RJ, Wu AM, Phan K. Systematic
T. Utility of multimaterial 3D printers in creating models with review of 3D printing in spinal surgery: the current state of
pathological entities to enhance the training experience of play. J Spine Surg. 2017;3(03):433–443.
neurosurgeons. J Neurosurg. 2014;120(02):489–492.
73 - D’Urso PS, Askin G, Earwaker JS, et al. Spinal
58 - Lara WC, Schweitzer J, Lewis RP, Odum BC, Edlich biomodeling. Spine. 1999;24(12):1247–1251.
RF, Gampper TJ. Technical considerations in the use of
74 - Izatt MT, Thorpe PL, Thompson RG, et al. The use of
polymethylmethacry late in cranioplasty. J Long Term Eff
physical biomodelling in complex spinal surgery. Eur Spine
Med Implants. 1998;8(01):43–53.
J. 2007;16(09):1507–1518.
59 - Cheng AC, Wee AG. Reconstruction of cranial
75 - Wu ZX, Huang LY, Sang HX, et al. Accuracy and safety
bone defects using alloplastic implants produced from a
assessment of pedicle screw placement using the rapid
stereolithographically-generated cranial model. Ann Acad
prototyping technique in severe congenital scoliosis. J
Med Singap. 1999;28(05):692–696.
Spinal Disord Tech. 2011;24(07):444–450.
60 - Wulf J, Busch LC, Golz T, et al. CAD generated mold
76 - Provaggi E, Leong JJH, Kalaskar DM. Applications of
for preoperative implant fabrication in cranioplasty. Stud
3D printing in the management of severe spinal conditions.
Health Technol Inform. 2005;111:608-610.
Proc Inst Mech Eng H. 2017;231(06):471–486.
61 - Tan ET, Ling JM, Dinesh SK. The feasibility of
77 - Lu S, Xu YQ, Zhang YZ, et al. A novel computer-
producing patientspecific acrylic cranioplasty implants with a
assisted drill guide template for lumbar pedicle screw
low-cost 3D printer. J Neurosurg. 2016;124(05):1531–1537.
placement: a cadaveric and clinical study. Int J Med Robot.
62 - Coelho G, Chaves TMF, Goes AF, Del Massa EC, 2009;5(02):184–191.
Moraes O, Yoshida M. Multimaterial 3D printing preoperative
78 - Phan K, Sgro A, Maharaj MM, D’Urso P, Mobbs RJ.
planning for frontoethmoidal meningoencephalocele
Application of a 3D custom printed patient specific spinal
surgery. Childs Nerv Syst. 2018;34(04):749–756.
implant for C1/2 arthrodesis. J Spine Surg. 2016;2(04):314–
63 - Martelli N, Serrano C, van den Brink H, et al. 318.
Advantages and disadvantages of 3-dimensional printing in
79 - Mobbs RJ, Coughlan M, Thompson R, Sutterlin
surgery: A systematic review. Surgery. 2016;159(06):1485–
CE III, Phan K. The utility of 3D printing for surgical
1500.
planning and patient-specific implant design for complex
64 - LoPresti M, Daniels B, Buchanan EP, Monson L, spinal pathologies: case report. J Neurosurg Spine.
Lam S. Virtual surgical planning and 3D printing in repeat 2017;26(04):513-518.
calvarial vault reconstruction for craniosynostosis: technical
80 - Javan R, Bansal M, Tangestanipoor A. A Prototype
note. J Neurosurg Pediatr. 2017;19(04):490–494.
Hybrid GypsumBased 3-Dimensional Printed Training
65 - Ghizoni E, de Souza JPSAS, Raposo-Amaral CE, et Model for Computed Tomography-Guided Spinal Pain
al. 3D-Printed Craniosynostosis Model: New Simulation Management. J Comput Assist Tomogr. 2016;40(04):626–
Surgical Tool. World Neurosurg. 2018;109:356-361. 631.
66 - Nahumi N, Shohet MR, Bederson JB, Elahi 81 - Goel A, Jankharia B, Shah A, Sathe P. Three-
E. Frontorbital Fibrous Dysplasia Resection and dimensional models: an emerging investigational revolution
Reconstruction With Custom Polyetherlatone Alloplast. J for craniovertebral junction surgery. J Neurosurg Spine.
Craniofac Surg. 2015;26(8):e720-722. 2016;25(06):740–744.
67 - Waran V, Narayanan V, Karuppiah R, et al. 82 Gao F, Wang Q, Liu C, Xiong B, Luo T. Individualized
Neurosurgical endoscopic training via a realistic 3D printed model-assisted posterior screw fixation for
3-dimensional model with pathology. Simul Healthc. the treatment of craniovertebral junction abnormality: a
2015;10(01):43–48. retrospective study. J Neurosurg Spine. 2017;27(01):29–34.
68 - Ryan JR, Chen T, Nakaji P, Frakes DH, Gonzalez 83 - Yin Y, Yu X, Tong H, Xu T, Wang P, Qiao G. [Exploratory
LF. Ventriculostomy Simulation Using Patient-Specific study of 3D printing technique in the treatment of basilar
Ventricular Anatomy, 3D Printing, and Hydrogel Casting. invagination and atlantoaxial dislocation]. Zhonghua Yi Xue
World Neurosurg. 2015;84(05):1333–1339. Za Zhi. 2015;95(37):3004–3007.
Capítulo 62 865
84 - Taverner MG, Monagle JP. Three-Dimensional 89 - Ma X, Qu X, Zhu W, et al. Deterministically patterned
Printing: An Aid to Epidural Access for Neuromodulation. biomimetic human iPSC-derived hepatic model via rapid 3D
Neuromodulation. 2017;20(06):622–626. bioprinting. Proc Natl Acad Sci. 2016;113(08):2206–2211.
85 - Taft RM, Kondor S, Grant GT. Accuracy of rapid 90 - Potjewyd G, Moxon S, Wang T, Domingos M,
prototype models for head and neck reconstruction. J Hooper NM. Tissue Engineering 3D Neurovascular Units:
Prosthet Dent. 2011;106(06):399–408. A Biomaterials and Bioprinting Perspective. Trends
Biotechnol. 2018;36(04):457–472.
86 - Ploch CC, Mansi CSSA, Jayamohan J, Kuhl E. Using
3D Printing to Create Personalized Brain Models for 91 - Zhu W, Cui H, Boualam B, et al. 3D bioprinting
Neurosurgical Training and Preoperative Planning. World mesenchymal stem cell-laden construct with core-
Neurosurg. 2016;90:668–674. shell nanospheres for cartilage tissue engineering.
Nanotechnology. 2018;29(18):185101.
87 - Mashiko T, Konno T, Kaneko N, Watanabe E. Training
in Brain Retraction Using a Self-Made Three-Dimensional 92 - Daly AC, Pitacco P, Nulty J, Cunniffe GM, Kelly DJ.
Model. World Neurosurg. 2015;84(02):585–590. 3D printed microchannel networks to direct vascularisation
during endochondral bone repair. Biomaterials.
88 - Konno T, Mashiko T, Oguma H, Kaneko N, Otani K,
2018;162:34–46.
Watanabe E. [Rapid 3-Dimensional Models of Cerebral
Aneurysm for Emergency Surgical Clipping]. No Shinkei
Geka. 2016;44(8):651-660.
Capítulo 62 866
Sobre os editores
AFONSO HENRIQUE ARAGÃO - Médico residente de Neurocirurgia, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),
Curitiba, Paraná
ALESSANDRA SHENANDOA HELUANI - Psicóloga clínica. Psicóloga hospitalar do Instituto Dante Pazzanese
de Cardiologia. Especialista em avaliação e reabilitação neuropsicológica pelo HC-FMUSP. Mestre em ciências
pela FMUSP. Doutoranda em Ciências da Saúde pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público
Estadual (IAMSPE).
ALEXANDRE LUIZ LONGO - Departamento de Neurologia, Hospital Municipal São José e Clínica Neurológica,
Joinville, Santa Catarina
ALEXANDRE SOUZA BOSSONI - Neurologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Doutorando em Neurociência pela Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo
ALYSSON ALVES MARIM - Acadêmico de Medicina. Liga Acadêmica de Neurocirurgia, Universidade Federal
do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
ANA MARIA MENDES FERREIRA - Acadêmicoa de Medicina. Liga Acadêmica de Neurocirurgia, Universidade
Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
ANDRÉ GIACOMELLI LEAL - Neurocirurgião do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná.
Coordenador do Departamento de Neurocirurgia Vascular do INC. Mestrado em Cirurgia, Pontifícia Universidade
Católica do Paraná - PUCPR. Doutorado em Tecnologia em Saúde, PUCPR. Coordenador do Departamento das
Ligas Acadêmicas da Academia Brasileira de Neurocirurgia, ABNc
ANTÔNIO BELLAS - Departamento de Cirurgia Pediátrica, Serviço de Neurocirurgia Pediátrica. Instituto Nacional
de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira, IFF/ Fiocruz, Rio de Janeiro - RJ
ÁPIO CLAUDIO MARTINS ANTUNES - Professor Associado, Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Chefe do Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Clínicas de Porto
Alegre (HCPA)
ARLETE HILBIG - Professora Titular de Neurologia, Departamento de Clínica Médica da Universidade Federal
de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Porto Alegre/RS
ARYA NABAVI - Chefe do Departamento de Neurocirurgia, Hospital Nordstadt, Hanover, Baixa Saxônia,
Alemanha.
BEATRIZ A. ANJOS GODKE VEIGA - Médica Neurologista e Membro Titular da Academia Brasileira de
Neurologia. Mestre em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo com enfoque em Distúrbios de
Movimento. Médica Preceptora da Neurologia da Residência de Clínica Médica do Hospital Ipiranga. Docente
do Curso de Medicina da Universidade Nove de Julho.
BRUNO DIÓGENES IEPSEN - Neurologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Especialista em Neurologia Cognitiva e do Comportamento pelo HC-
FMUSP. Membro colaborador do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento (GNCC) do HC-FMUSP
CAMILA LORENZINI TESSARO - Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná. Liga
Acadêmica de Neurologia e Neurocirurgia (LAANc - INC), Instituto de Neurologia de Curitiba, INC.
CAMILA SPELTZ PERUSSOLO - Neurologista. Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná
CARLA HELOISA CABRAL MORO - Departamento de Neurologia, Hospital Municipal São José e Clínica
Neurológica, Joinville, Santa Catarina
CAROLINY TREVISAN TEIXEIRA - Médica residente de Neurologia, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),
Curitiba, Paraná
CÁSSIA ELISA MARIN - Neurologista, Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUCRS). Instituto do Cérebro (InsCer), Porto Alegre/RS.
CINDY CAETANO DA SILVA - Acadêmica de Medicina da Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná, Curitiba
DANIEL CLIQUET - Acadêmico de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP
DANIELLE DE LARA - Neurocirurgiã. Especialização em Minimally Invasive Skull Base Surgery pela
Universidade de Ohio (EUA). Professora do Departamento de Neurocirurgia da Universidade Regional de
Blumenau. Preceptora do serviço de Residência médica em Neurocirurgia do Hospital Santa Isabel. Membro
Internacional da Sociedade Norte Americana de Base de Crânio (NASBS). Orientadora da Liga de Neurociências
da Universidade Regional de Blumenau. Hospital Santa Isabel, Blumenau, Santa Catarina.
DARA LUCAS DE ALBUQUERQUE - Residência Médica de Neurologia, Hospital Municipal São José, Joinville,
Santa Catarina
DUANA DOS SANTOS BICUDO - Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Membro da Liga Acadêmica de Neurologia e Neurocirurgia do Instituto de Neurologia de Curitiba (LANNc-INC)
EBERVAL GADELHA FIGUEIREDO - Divisão de Neurocirurgia, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo
EDSON BOR SENG SHU - Livre Docente pela Faculdade de Medicina da USP, Responsável pelos serviços de
Neurosonologia, Hospital Albert Einstein e Sírio Libanês
ERASMO BARROS DA SILVA JR - Neurocirurgião, Mestrado em Cirurgia pela PUC-PR. Membro titular da
Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e da Academia Brasileira de Neurocirurgia Membro da Society for Neuro-
Oncology. Membro da European Association of Neurosurgical Societies (EANS), Serviço de Neurocirurgia,
Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná. Ex- acadêmica da Liga acadêmica de neurocirurgia
da Universidade Federal do Paraná (LiANCx-UFPR).
FERNANDA LOPES ROCHA COBUCCI - Acadêmica de medicina da Faculdade de Medicina da ABC e estagiária
acadêmica do Hospital Santa Paula-DASA
FERNANDO HENRIQUE DOS REIS SOUSA - Médico Residente. Disciplina Neurocirurgia, Universidade Federal
do Triângulo Mineiro, Uberaba-MG
FRANCISCO FLÁVIO LEITÃO DE CARVALHO FILHO - Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Geral
de Fortaleza. Neurocirurgião do Instituto José Frota. Coordenador da Neurocirurgia do Hospital São Camilo
GABRIELLA GOMES LOPES PRATA - Acadêmica de Medicina. Liga Acadêmica de Neurocirurgia, Universidade
Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
GUILHERME MARCONI GUIMARÃES MARTINS HOLANDA - Divisão de Neurocirurgia, Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
GUSTAVO DA CUNHA RIBAS - Neurologista, Distúrbio dos Movimentos. Residência Médica em Neurologia pelo
Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Residência Médica em Neurologia Geral/Distúrbios do
Movimento pelo Hospital de Clínicas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná
GUSTAVO SIMIANO JUNG - Neurocirurgião, Serviço de Neurocirurgia, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),
Curitiba, Paraná
HAMZAH YOUSSEF SMAILI - Médico residente de Neurocirurgia, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),
Curitiba, Paraná
HANAIÊ CAVALLI - Neurologista, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Setor de Neuroimunologia, Curitiba,
Paraná.
HÉLIO A. GHIZONI TEIVE - Professor Associado de Neurologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Coordenador do Setor de Distúrbios do Movimento do Hospital de Clínicas da UFPR.
HELIO RODRIGUES GOMES - Neurologista, Doutor em Medicina pela FMUSP, Médico do Centro de
Investigações em Neurologia/LIM 15 da FMUSP, Diretor coordenador pelo Setor de Líquido Cefalorraquiano do
HCFMUSP
HENRIQUE MARTINS - Médico Neurocirurgião. Mestrando em Ciências da Saúde pela Universidade Federal
do Amazonas. Manaus, AM
ISABELA CAIADO CAIXETA VENCIO - Acadêmica de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, PUC/SP
JAKELINE SILVA SANTOS - Acadêmica de Medicina. Liga Acadêmica de Neurocirurgia, Universidade Federal
do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
JERÔNIMO BUZETTI MILANO - Neurocirurgião do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná.
Doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP). Coordenador do
Departamento de Coluna da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia. Chairman do capítulo brasileiro da AOSpine
JOÃO GUILHERME BRASIL VALIM - Acadêmico de Medicina da Universidade Regional de Blumenau (ATM
2022). Presidente da Liga Acadêmica de Neurociências da Universidade Regional de Blumenau. Membro
Aspirante Estudante da Academia Brasileira de Neurocirurgia (MAE01739).
JOÃO PEDRO DE OLIVEIRA JR. - Médico Residente. Disciplina Neurocirurgia, Universidade Federal do
Triângulo Mineiro, Uberaba-MG
JORGE LUIS NOVAK FILHO - Médico Residente de Neurocirurgia, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),
Curitiba, Paraná. Presidente da Liga Acadêmica de Neurologia e Neurocirurgia do Instituto de Neurologia de
Curitiba - LANNc-INC (2019 e 2020). Presidente da Liga Acadêmica de Neurologia do Hospital Universitário
Evangélico Mackenzie, NEUROLIGA HUEM (2018)
JULIANA SILVA DE ALMEIDA MAGALHÃES - Diretora Técnica do Centro de Referência Estadual para Pessoas
com Transtorno do Espectro Autista (CRE-TEA). Preceptora da Residência Médica de Neurologia Pediátrica do
Hospital Martagão Gesteira. Mestre em Neurologia e Neurociências pela Universidade Federal de São Paulo.
Neurologista Pediátrica, Universidade Federal de São Paulo. Pediatra, Universidade Federal de São Paulo.
KAIO HENRIQUE VIANA GOMES - Acadêmico de Medicina. Liga Acadêmica de Neurocirurgia, Universidade
Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
KRISTEL LARISA BACK MERIDA- Neurologista, Setor de Neurologia, Neurologia Vascular e Doppler
Transcraniano. Fellowship em Neurologia Vascular. Certificação em Doppler Transcraniano. Instituto de
Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná
LEANDRO JOSÉ HAAS - Neurocirurgia Endovascular do Hospital Santa Isabel de Blumenau, Santa Catarina.
Professor Titular da Disciplina de Neurocirurgia da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Coordenador
do Grupo de Pesquisa em Neurocirurgia Endovascular de Blumenau.
LEONARDO VALENTE CAMARGO - Professor Adjunto-Doutor da PUCPR, Londrina, PR. Chefe do Serviço de
Neurologia e Supervisor do Programa de Residência Médica em Neurologia do Hospital Evangélico de Londrina,
PR. Doutor em Neurologia pela FMUSP
LÍVIA GRIMALDI ABUD FUJITA - Médica Endocrinologista. Disciplina Neurocirurgia, Universidade Federal do
Triângulo Mineiro, Uberaba, MG
LORENA MARIA DERING - Biomédica. Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná. Mestranda
em Tecnologia em Saúde pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Coordenadora INC 3D
Technology Lab
LUIZ FERNANDO ALVES PEREIRA - Médico Residente. Disciplina Neurocirurgia, Universidade Federal do
Triângulo Mineiro, Uberaba-MG
LUIZ ROBERTO AGUIAR - Neurocirurgião. Doutorado em Medicina pela Universidade Livre de Berlim e pela
Universidade Federal de São Paulo. Neurocirurgião no Hospital Care - Pilar Hospital, Curitiba
MARCELO DE LIMA OLIVEIRA - Médico Neurosonologista pelo Hospital Albert Einstein, doutorado pela
FMUSP. São Paulo, SP.
MARCO ANTONIO STEFANI - Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Professor
Titular, Departamento de Ciências Morfológicas, Instituto de BioCiencias, Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, Laboratório de Neuroanatomia
MARCOS LEONARDO CONDÉ - Neurologista do Centro Especializado em Reabilitação II, Unileste, Ipatinga,
MG. Neurofisiologista Clínico do Hospital Márcio Cunha. Membro titular da Academia Brasileira de Neurologia.
Membro titular da Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica.
MARIANA TANUS STEFANI - Acadêmica Faculdade de Medicina PUC RS, estagiária Neurocirurgia HCPA
MATHEUS FRANCO ANDRADE OLIVEIRA - Acadêmico de Medicina pela Escola Bahiana de Medicina e
Saúde Pública
MATHEUS KAHAKURA FRANCO PEDRO - Neurologista do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba,
Paraná. Neurorradiologista Intervencionista, INC. Mestrando - Programa de Pós-Graduação em Tecnologia em
Saúde, PUCPR. Membro da Academia Brasileira de Neurologia, American Academy of Neurology e European
Stroke Organization.
MATHEUS PEDRO WASEM - Neurologista, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Setor de Neuroimunologia,
Curitiba, Paraná.
NATALLY SANTIAGO - Neurocirurgiã e Preceptora da Residência e Internato Médico no Hospital Prof. Dr. Alípio
Correa Neto. Neurocirurgiã da BP, A Beneficência Portuguesa de São Paulo. Neurocirurgiã do Grupo de Dor
Aguda e Dor Crônica Amil.
NATASHA CONSUL SGARIONI - Médica Neurologista, com Título de Especialista e Membro Titular da Academia
Brasileira de Neurologia. Especialista em Distúrbios do Movimento e aplicação de Toxina Botulínica terapêutica
pela Unifesp/EPM. Preceptora de Neurologia do Curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP).
OLGA FRANCIS PITA CHAGAS - Médica Neurologista do Departamento de Neurologia, Instituto de Neurologia
de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná. Especialista em Dor pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre
em Medicina Interna e Ciências da Saúde, com área de atuação em Dor, pela UFPR
PAMELA TORQUATO DE AQUINO - Neurologista pela UNESP, Neurossonologista pela FMUSP. São Paulo, SP.
PAULO DE CARVALHO JR. - Departamento de Neurocirurgia, Hospital Nordstadt, Hanover, Baixa Saxônia,
Alemanha.
PAULO HENRIQUE PIRES DE AGUIAR - Neurocirurgião. Professor livre docente de neurocirurgia pela Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo. Professor de Neurologia Clínica da Faculdade de Ciências Médicas
da Pontifícia Universidade Católica de Sorocaba. Pesquisador da Faculdade Medicina do ABC, Santo André.
Coordenador da Neurocirurgia do Hospital Santa Paula de São Paulo (DASA)
PAULO SERGIO FARO SANTOS - Médico Neurologista. Membro da Sociedade Brasileira de Cefaleia, Membro
da International Headache Society.
PEDRO ANDRÉ KOWACS - Neurologista, Neurofisiologista, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba,
Paraná. Mestrado em Medicina Interna pela Universidade Federal do Paraná. Membro da International Headache
Society, Academia Brasileira de Neurologia, Sociedade Brasileira de Cefaleia e Sociedade Paranaense de
Ciências Neurológicas
PEDRO ANTÔNIO PIERRO NETO - Neurocirurgião Funcional, Membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia,
SBN, Sociedade Brasileira para Estudos da Dor, SBED.
PEDRO HENRIQUE SIMM PIRES DE AGUIAR - Acadêmico da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (FCMS-PUC), Sorocaba, São Paulo
PEDRO S. C. MAGALHÃES - Departamento de Neurologia, Hospital Municipal São José e Clínica Neurológica,
Joinville, Santa Catarina
RAFAEL WINTER - Neurocirurgião, Serviço de Neurocirurgia, Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA)
RAFAELA ALMEIDA ALQUÉRES - Neurologista pela FMABC, Neurologista Vascular e Neurossonologista pela
FMUSP. São Paulo, SP.
RAQUEL QUEIROZ SOUSA LIMA - Médica pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Membro do Corpo
Clínico da Emergência do Hospital São Mateus. Ex-membro da Liga Acadêmica de Neurologia, Neurocirurgia,
Genética e Psiquiatria (LANNGEP) da UNIFOR. Ex- membro do grupo de pesquisa em Neurocirurgia Pediátrica.
RENATO ANGHINAH - Neurologista e Encefalografista. Doutor em Neurologia pela Universidade de São Paulo.
Coordenador do Grupo de Reabilitação Cognitiva Pós-TCE da Divisão de Neurologia do HC-FMUSP
ROBSON LUIS OLIVEIRA DE AMORIM - Médico Neurocirurgião. Professor Livre-Docente pela Universidade de
São Paulo. Docente na Universidade de São Paulo e da Universidade Federal do Amazonas. Coordenador da
Liga Universitária de Neurologia e Neurocirurgia do Amazonas. Manaus, AM
SAMANTA FABRÍCIO BLATTES DA ROCHA - Neuropsicóloga Sênior. Preceptora das Residências Médicas
de Neurologia e Neurocirurgia do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba, Paraná. Especialista em
Farmacologia. Mestre em Biologia Celular. Doutora em Medicina interna, HCUFPR. Coordenadora do Comitê
de Bioética (INC). Coordenadora do Comitê de Ética de Pesquisa em Seres Humanos (INC), Curitiba, Paraná
SAMIR ALE BARK - Médico Neurocirurgião do Hospital do Rocio, Preceptor da residência Médica em
Neurocirurgia do Hospital do Rocio, Curitiba, Paraná.
SARAH SCHEUER TEIXEIRA - Médica graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR)
(2021). Ex-presidente Liga Acadêmica de Neurologia e Neurocirurgia do INC (LANNc-INC) (2020, 2021). Ex-
membro Aspirante da Academia Brasileira de Neurologia (ABN).
SÉRGIO SOUZA ALVES JUNIOR - Médico Cardiologista do Hospital do Rocio, com certificado de atuação na
área de ecocardiografia e Doppler vascular
SHEILA WAYSZCEYK - Acadêmica de Medicina da Universidade Regional de Blumenau (ATM 2024). Diretora
Científica da Liga Acadêmica de Neurociências da Universidade Regional de Blumenau.
SIMONE CONSUELO DE AMORIM - Neurologista infantil, neurofisiologista clínica, Serviço de neurologia infantil
do departamento de neurologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo, HCFMUSP, São Paulo, SP
SONIVAL CÂNDIDO HUNHEVICZ - Neurocirurgião funcional, Instituto de Neurologia de Curitiba (INC), Curitiba,
Paraná
TARCILA MARINHO CIPPICIANI - Neurologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo - HC FMUSP. Especialização em Neurologia Cognitiva e do Comportamento da
Clínica Neurológica do HC FMUSP
THIAGO GONÇALVES GUIMARÃES - Neurologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Especialista em Distúrbios do Movimento e Estimulação Cerebral
Profunda (DBS) pelo HC-FMUSP. Fellow em Neurogenética pelo HC-FMUSP. Neurologista colaborador do
grupo de Distúrbios do Movimento e DBS do HC-FMUSP
THIAGO SILVA PARESOTO - Médico Residente. Disciplina Neurocirurgia, Universidade Federal do Triângulo
Mineiro, Uberaba-MG
VANESSA RIZELIO - Neurologista, Mestre em Cirurgia. Certificação em Doppler Transcraniano. Membro titular
da Academia Brasileira de Neurologia. Coordenadora do Setor de Neurologia Vascular e Doppler Transcraniano
do Instituto de Neurologia de Curitiba (INC),Curitiba, Paraná. Vice-diretor da liga Acadêmica de Anatomia Testut
- LAAT (2017-2018)
VICTOR MARINHO SILVA - Neurologista pela Santa Casa de Belo Horizonte, Neurologista Vascular e
Neurossonologista pela FMUSP. São Paulo, SP.
VITOR NAGAI YAMAKI - Divisão de Neurocirurgia, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
VIVIANE ALINE BUFFON - Médico Neurocirurgiã. Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital do Rocio,
Supervisora do Programa de Residência Médica em Neurocirurgia do Hospital do Rocio, Curitiba, Paraná
WELLINGSON SILVA PAIVA - Neurocirurgião funcional. Doutorado em Ciências pela Universidade de São
Paulo. Ex-Secretário Departamental de Trauma da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia. Neurocirurgião e
médico supervisor da Unidade de Emergência e do Grupo de Neuro-oncologia da Divisão de Neurocirurgia
do Hospital das Clínicas da FMUSP. Professor Livre Docente e Orientador Pleno do Mestrado/Doutorado em
Neurologia da USP. Ex-Coordenador do Núcleo de Pesquisa do Hospital Samaritano