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br/geopolitica/as-novas-armas-da-russia-1-o-discurso-historico-de-putin/
[…]
Todos os projetos e prioridades de que falei hoje, como o desenvolvimento urbano,
investimentos em infraestrutura, educação, saúde, meio ambiente, tecnologias e pesquisa de
inovação para apoiar a economia, promover os talentos, a juventude, tudo isso está sendo concebido
para uma tarefa estratégica – o desenvolvimento realmente renovador da Rússia.
Ao mesmo tempo, não podemos esquecer de cobrir, de modo confiável, as questões de
segurança da Rússia.
Colegas,
A operação na Síria mostrou as novas grandes capacidades das Forças Armadas Russas. Em
anos recentes muito foi feito para melhorar o Exército e a Marinha. As Forças Armadas têm hoje
3,7 vezes mais armas modernas. Mais de 300 novas unidades de equipamentos foram postas em
serviço. As forças estratégicas de mísseis receberam 80 novos mísseis balísticos intercontinentais,
102 mísseis balísticos lançáveis de submarinos e três submarinos Borei movidos a energia nuclear e
armados com mísseis balísticos. 12 regimentos de mísseis receberam novos mísseis balísticos
intercontinentais Yars. O número de transportadores de mísseis de longo alcance e alta precisão
aumentou 12 vezes, e o número de mísseis cruzadores guiados foi multiplicado por 30. O Exército,
as Forças Aeroespaciais e a Marinha também são hoje significativamente mais fortes.
Todos, a Rússia e o mundo inteiro, já sabem os nomes de nossos mais novos aviões,
submarinos, armas antiaéreas e sistemas de mísseis teleguiados em terra e embarcados no ar e no
mar. Todos são armas de alta tecnologia, novas em folha. Temos um sólido campo de radar para
alertar no caso de ser concebido algum ataque de míssil em todo o perímetro do território russo
(recurso importantíssimo). Depois que a URSS foi desmantelada, apareceram vários buracos. Hoje
já não há buracos. Foram todos consertados.
Demos um salto adiante no desenvolvimento de aviação tripulada à distância; criamos o
Centro de Controle da Defesa Nacional; e formou-se o comando operacional de zonas marítimas
distantes. O número de profissionais militares foi multiplicado por 2,4, e a disponibilidade de
equipamento nas Forças Armadas cresceu, de 70% para entre 95 e 100%. As longas filas de espera
por moradia permanente foram eliminadas; e o período de espera foi reduzido em 83%.
E agora, afinal, sobre a questão da defesa, importantíssima.
Falarei sobre os mais novos sistemas de armas estratégicas da Rússia que estamos criando
como reação à retirada unilateral dos EUA do Tratado de Mísseis Antimísseis, e ao posicionamento
que eles dão aos seus sistemas de defesa, tanto em território dos EUA como fora das suas fronteiras
nacionais.
Gostaria de rememorar rapidamente uma parte de nosso passado recente.
Em 2000, os EUA anunciaram que se retiravam do Tratado de Mísseis Antimísseis. A
Rússia opôs-se categoricamente a esse gesto. Víamos o Tratado EUA-URSSs sobre Mísseis
Antimísseis, assinado em 1972, como o principal alicerce do sistema de segurança internacional.
Nos termos desse tratado, as partes tinham o direito de instalar sistemas de defesa com mísseis
antimísseis exclusivamente nos limites do próprio território. A Rússia instalou seus sistemas desse
tipo em torno de Moscou; os EUA, em torno de sua base de mísseis antimísseis em terra, em Grand
Forks.
Junto com o Tratado de Redução de Armas Estratégicas, o Tratado ABM não só criou uma
atmosfera de confiança, mas, além disso, também impedia que qualquer dos lados usasse armas
atômicas de modo completamente temerário e irresponsável, porque essas armas põem em risco a
própria vida humana sobre o planeta, e, também, porque o número limitado de mísseis antimísseis
de defesa tornava o agressor potencial vulnerável a um contra-ataque.
Fizemos o máximo possível para dissuadir os EUA da decisão de sair do Tratado. Em vão.
Em 2002, os EUA se desligaram do Tratado de Mísseis Antimísseis. Mesmo depois disso, ainda
insistimos no esforço de construir um diálogo construtivo com os EUA. Propusemos trabalhar
juntos nessa área para aparar arestas e manter a atmosfera de confiança. A um certo ponto, cheguei
a pensar que seria possível algum acordo, mas não. Rejeitaram todas, todas as nossas propostas,
absolutamente tudo. Então, dissemos que teríamos de melhorar nossos modernos sistemas de
ataque, para proteger nossa segurança. Como resposta, os EUA disseram que não criariam um
sistema global de mísseis antimísseis de defesa contra a Rússia, que podíamos fazer o que
quiséssemos, e que os EUA presumiriam que nossas ações não seriam de agressão aos EUA.
As razões por trás dessa posição são óbvias. Depois do colapso da URSS, a Rússia, ainda
chamada no exterior de União das Repúblicas Soviéticas Socialistas, perdeu 23,8% do próprio
território nacional; 48,5% da própria população; 41% do PIB; 39,4% do potencial industrial (quase
metade de nosso potencial, vejam bem), além de 44,6% de sua capacidade militar, por causa da
dispersão das Forças Armadas Soviéticas entre as várias repúblicas ex-soviéticas. O equipamento
militar do exército russo estava ficando obsoleto, e as Forças Armadas estavam em estado
lastimável. Havia terrível guerra civil em curso no Cáucaso, e inspetores dos EUA vigiavam a
operação de nossas principais usinas de enriquecimento de urânio.
Por algum tempo, a questão nem era se conseguiríamos desenvolver algum sistema de armas
estratégicas – havia quem duvidasse de que nosso país fosse capaz de armazenar em segurança e
manter as armas nucleares que herdamos depois do colapso da URSS. A Rússia tinha dívidas
gigantescas, a economia não funcionava sem empréstimos do FMI e do Banco Mundial; era
impossível manter a esfera social.
Aparentemente, nossos parceiros concluíram que seria completamente impossível, na
perspectiva histórica previsível, que nosso país ressuscitasse sua economia, sua indústria, sua
indústria da defesa e suas Forças Armadas, até níveis suficientes para garantir apoio ao
indispensável potencial estratégico. E sendo assim, ninguém precisaria ouvir o que a Rússia tivesse
a dizer; e, para o futuro, bastaria manter aquela grande vantagem militar unilateral, para ditar as
ordens em todas as esferas.
Basicamente, essa posição, essa lógica, se se consideram as realidades daquele momento, é
compreensível, e grande parte da culpa é nossa. Todos esses anos, os 15 anos desde que os EUA se
retiraram do Tratado de Mísseis Antimísseis, nós tentamos insistentemente nos reengajar ao lado
dos norte-americanos, para discussões sérias, tentando acordos na esfera da estabilidade estratégica.
Conseguimos alcançar alguns daqueles objetivos. Em 2010, Rússia e EUA assinaram o
Tratado de Redução de Armas Estratégicas START, com medidas para prosseguir na redução e
limitação de armas estratégicas de ataque. Mas, à luz do plano para construir um sistema global de
mísseis antimísseis, que ainda prossegue até hoje, todos os acordos assinados no contexto do Novo
Tratado START estão agora sendo gradualmente esvaziados, porque, enquanto o número de
transportadores e de armas é reduzido, uma das partes, a saber, os EUA, permite o crescimento
constante não controlado do número de mísseis antimísseis, melhora a qualidade desses mísseis e
constrói novas áreas para lançamento de mísseis. Se não fizéssemos coisa alguma, isso levaria à
completa degradação do arsenal e nossos mísseis poderiam ser simplesmente interceptados.
Apesar de nossos numerosos protestos, a máquina norte-americana foi posta em movimento,
a correia de transmissão foi ligada e posta a andar adiante. Há hoje novos sistemas de mísseis de
defesa instalados no Alasca e na Califórnia; como resultado da expansão da OTAN para o leste,
duas novas áreas para mísseis de defesa foram criadas na Europa Ocidental: uma já está implantada
na Romênia, e o deslocamento do sistema também para a Polônia já está agora praticamente
concluído. O alcance dele será sempre crescente; devem ainda ser criadas novas áreas de
lançamento no Japão e na Coreia do Sul. O sistema global de mísseis de defesa dos EUA também
inclui cinco cruzadores e 30 destroieres, os quais, pelo que sabemos, foram instalados em regiões
muito próximas das fronteiras da Rússia. Não exagero, absolutamente, no que lhes digo; e o
processo avança rapidamente.
Nesse quadro, o que fizemos, além de protestar e alertar? Como a Rússia respondeu a esse
desafio? Pois lhes digo como.
Durante todos esses anos, desde a saída unilateral dos EUA do Tratado de Mísseis
Antimísseis, trabalhamos sem descanso em armas e equipamentos avançados, que nos levaram a
descobertas indispensáveis para desenvolver novos modelos de armas estratégicas.
Permitam-me lembrar que os EUA estão criando um sistema global de mísseis de defesa que
visa, principalmente, a enfrentar armas estratégicas que cumprem trajetórias balísticas. Armas desse
tipo são a espinha dorsal de nossas forças de contenção, como são também a espinha dorsal do
armamento de outros membros do clube nuclear.
Assim sendo, a Rússia desenvolveu e trabalha continuamente para aperfeiçoar sistemas
altamente efetivos, mas de preço razoável, capazes de superar a defesa de mísseis. Estão instalados
em todos os nossos complexos de mísseis balísticos intercontinentais.
Além disso, cuidamos também de desenvolver a próxima geração de mísseis. Por exemplo,
o Ministério da Defesa e empresas da indústria aeroespacial e de mísseis estão em ativa fase de teste
de um novo sistema de mísseis com um pesado míssil intercontinental. Demos a ele o nome de
“Sarmat”.
O sistema Sarmat substituirá o sistema Voevoda criado pela URSS. Seu imenso poder foi
reconhecido universalmente. Nossos colegas estrangeiros deram-lhe até um nome muito ameaçador
[N. do T.: os americanos deram os nomes de “Satan” (Satã) ao Voevoda, e “Satan-2” ao Sarmat].
Isso posto, as capacidades do míssil Sarmat são muito superiores. Pesando mais de 200
toneladas, tem fase de arranque curta, o que torna mais difícil interceptá-lo para os sistemas de
mísseis de defesa. O alcance desse novo míssil pesado, o número e a potência de seus blocos de
combate, é maior que o do Voevoda. O Sarmat será equipado com várias ogivas nucleares de
grande alcance, inclusive hipersônicas, e os mais modernos recursos para escapar dos mísseis de
defesa. O alto grau de proteção dos lançadores desses mísseis e as significativas capacidades de
energia que o sistema oferece permitirá que ele seja usado em quaisquer condições.
Por favor, assistam ao vídeo.
O Voevoda tem alcance de 11 mil quilômetros. O alcance do Sarmat é praticamente
ilimitado.
Como o vídeo mostra, o Sarmat pode alcançar alvos via os dois polos, Norte e Sul.
O Sarmat é um míssil formidável e, dadas as suas características, não pode ser detido nem
pelos mais avançados sistemas de mísseis de defesa.
Mas não paramos nisso. Começamos a desenvolver novos tipos de armas estratégicas que
absolutamente não seguem trajetórias balísticas no caminho até o alvo e, portanto, os sistemas
existentes de mísseis de defesa são inúteis contra ele. Não fazem sentido algum.
Permitam comentar essas novas armas.
As armas avançadas da Rússia são baseadas em tecnologia de ponta, realizações únicas e
exclusivas, descobertas de nossos cientistas, projetistas e engenheiros. Uma dessas descobertas é
uma unidade de energia nuclear pequena e de alto desempenho que pode ser instalada num míssil
semelhante ao nosso míssil X-101, que pode ser disparado de avião, ou num míssil Tomahawk dos
EUA – parecido com isso, mas com alcance dúzias de vezes mais longo, dúzias de vezes,
basicamente tem alcance ilimitado. É um míssil de tipo ‘invisível aos radares’, que voa a baixa
altitude e transporta uma ogiva nuclear. Tem alcance quase ilimitado, trajetória não previsível e
capacidade para contornar os limites conhecidos de interceptação. É invencível contra todos os
sistemas existentes e em estudo de mísseis de defesa e de defesa antiaérea. Hoje repetirei várias
vezes essa informação.
No final de 2017, a Rússia lançou com sucesso seu mais novo míssil movido a energia
nuclear, no campo central de testes. Durante o voo, o motor movido a energia nuclear alcançou a
capacidade prevista no projeto e garantiu a propulsão necessária.
Agora que os testes de lançamento e operação em campo foram bem-sucedidos, podemos
começar a desenvolver um tipo completamente novo de arma, um sistema estratégico de armas
nucleares com um míssil movido a energia nuclear.
Assistam ao vídeo.
Podem ver o modo como o míssil evita os interceptadores. Dado que o alcance é ilimitado, o
míssil pode manobrar pelo tempo que for necessário.
Como os senhores com certeza compreenderam, nenhum outro país desenvolveu qualquer
coisa semelhante a isso. Algum dia aparecerá, mas até lá já teremos inventado algo ainda melhor.
Noutro campo, todos nós sabemos que projetos e desenvolvimento de sistemas de armas
remotamente tripulados é tendência comum no mundo. No que concerne à Rússia, desenvolvemos
veículos submersíveis remotamente tripulados que podem navegar em grandes profundidades
(pode-se dizer, profundidades extremas), intercontinentais, em velocidades várias vezes superiores à
de submarinos, torpedos de última geração e todos os tipos de navios de superfície, mesmo alguns
dos mais rápidos. É realmente fantástico. São objetos silenciosos, altamente manobráveis com
mínimas vulnerabilidades que o inimigo possa tentar explorar. Absolutamente nada há no mundo
capaz de superá-los.
Veículos subaquáticos remotamente tripulados podem transportar ogivas convencionais e
ogivas nucleares, o que os capacita a buscar vários tipos de alvos, incluindo esquadrões de
aeronaves, fortificações litorâneas e infraestrutura.
Em dezembro de 2017, uma unidade de motor nuclear para esse drone subaquático [mas
silencioso] remotamente tripulado completou um ciclo de testes que durou vários anos. Essa
unidade de motor nuclear é excepcional, porque é muito pequena, ao mesmo tempo em que tem
impressionante relação potência-peso. É uma centena de vezes menor que as unidades nucleares que
operam como motores dos modernos submarinos atômicos, mas ainda muito mais potente, e pode
rapidamente ser posta em modo de combate, quero dizer, atingir capacidade máxima, 200 vezes
mais rápido.
Os testes já completados nos permitem começar a desenvolver um novo tipo de arma
estratégica que pode transportar massiva carga nuclear.
Assistam ao vídeo.
Devo dizer que essas duas novas armas estratégicas ainda não têm nome, o míssil cruzador
de alcance global, e o veículo subaquático tripulado à distância. Sugestões, por favor, para o
website do Ministério da Defesa.
Sabe-se que países que têm alto potencial de pesquisa e tecnologia avançada estão
desenvolvendo ativamente as chamadas armas hipersônicas. A velocidade do som é em geral
medida em números Mach, homenagem ao cientista austríaco Ernst Mach, conhecido por sua
pesquisa nesse campo. Mach 1 equivale a 1.062 km/h, em altitude de 11 quilômetros. A velocidade
do som é igual a Mach 1. Velocidades entre Mach 1 e Mach 5 são chamadas supersônicas; e acima
de Mach 5, hipersônicas. Claro que esse tipo de arma oferece vantagens substanciais num conflito
armado. Especialistas militares creem que seja arma extremamente poderosa, e que as velocidades
hipersônicas a tornam invulnerável pelos sistemas de defesa aérea existentes, porque, dito de forma
simplificada, os mísseis interceptores não a alcançam. Assim sendo, é compreensível que todos os
principais exércitos do mundo trabalhem para obter essa arma ideal.
Amigos, a Rússia já tem essa arma.
O estágio mais importante no desenvolvimento de modernos sistemas de armas foi a
construção de um sistema de mísseis hipersônicos de alta precisão. Como os senhores podem ter
certeza, é o único sistema desse tipo no mundo. Os testes foram completados com sucesso e, o mais
importante: dia 01 de dezembro do ano passado, esses sistemas entraram em operação experimental
nas bases aéreas do Distrito Militar Sul.
As características exclusivas da aeronave transportadora de alta velocidade permitem levar o
míssil ao local-alvo em minutos. O míssil que voa a velocidade hipersônica, 10 vezes mais rápido
que a velocidade do som, pode também manobrar em todas as fases da trajetória de voo, o que
também lhe permite superar todos os demais mísseis existentes e, creio, também todos os sistemas
de defesa antiaérea e antimísseis em estudo hoje, transportando ogivas nucleares e convencionais,
com um alcance superior a 2.000 quilômetros. Esse sistema recebeu o nome de Kinzhal (Adaga).
Vídeo, por favor.
Tenho ainda de falar sobre mais um avanço tecnológico realmente revolucionário – o
sistema de míssil estratégico instalada num novo equipamento de combate, uma asa planadora, que
também já foi testada com sucesso.
Repetirei mais uma vez o que dissemos incontáveis vezes aos nossos parceiros norte-
americanos e europeus que são membros da OTAN: nós os russos faremos todos os esforços
necessários para neutralizar todas as ameaças que se apresentem contra nós, que hoje se
concretizam no deslocamento do sistema global de mísseis de defesa dos EUA. Dissemos isso nas
conversações, e também dissemos publicamente.
Em 2004, depois dos exercícios de forças nucleares estratégicas, quando esse sistema foi
testado pela primeira vez, eu mesmo disse o seguinte numa conferência de imprensa (é incômodo
para mim citar palavras minhas, mas ainda é o que há de mais adequado para dizer aqui). Disse eu
em 2004:
“Dado que outros países aumentam o número e a qualidade das próprias armas e do próprio
potencial militar, a Rússia também terá de assegurar que tenha à sua disposição nova geração de
armas e de tecnologia.
Sobre isso, tenho o prazer de informar aos senhores que testes já concluídos com sucesso
durante as recentes manobras nos permitem confirmar que, em futuro próximo, as Forças Armadas
Russas, as Forças de Mísseis Estratégicos, receberão novos sistemas de armas de velocidade
hipersônicas e de alta precisão que podem atingir alvos em distância intercontinental e podem auto-
ajustar a própria altitude e o próprio curso durante o voo. É declaração muito importante, porque
nenhum país do mundo até agora conta com esse tipo de armamento no respectivo arsenal militar.”
[fim da citação].
Claro, cada palavra tem significado relevante, porque falamos da possibilidade de
ultrapassar os limites da percepção. Por que fizemos tudo isso? Por que falamos sobre isso?
Como os senhores podem ver, não fizemos segredo de nossos planos e falamos abertamente
sobre eles, em primeiro lugar, para atrair nossos parceiros à mesa de conversações. Vejam bem,
aquela conferência de imprensa aconteceu em 2004.
É realmente surpreendente que, apesar de todos os problemas com a economia, finanças e
nossa indústria da defesa, a Rússia tenha-se mantido, como ainda é, uma grande potência nuclear.
Mas também é fato que ninguém quis conversar conosco sobre o xis da questão da nossa segurança
nacional. Ninguém quis nos ouvir. Agora, nos ouvirão.
Diferente de todos os tipos hoje existentes de equipamento de combate, esse sistema é capaz
de voar, em distâncias intercontinentais, em velocidades supersônicas de mais de Mach 20.
Como eu mesmo disse em 2004, na rota até o alvo, o bloco míssil planador é capaz das
manobras mais radicais – tanto lateralmente (a distâncias de vários milhares de quilômetros) como
na vertical. É isso que o torna absolutamente invulnerável por quaisquer sistemas de defesa aérea ou
de defesa por míssil. O emprego de novos tipos de materiais possibilita que a asa-bloco planadora
voe longas distâncias praticamente em condições de formar plasma. Voa para seu alvo como um
meteoro, como uma bola de fogo. A temperatura na superfície da asa-bloco alcança de 1.600 a
2.000 graus Celsius, mas a asa-bloco mesmo assim permanece sob controle confiável.
Assistam ao vídeo, por favor.
Por razões óbvias, não podemos mostrar aqui a aparência externa desse sistema. É
importante demais. Espero que os senhores compreendam. Mas posso garantir que, sim, temos
todas essas máquinas e todas funcionam perfeitamente. Além disso, nossas indústrias de defesa já
começaram a produção em massa dessa nova arma estratégica. Chamamos ela de Avangard.
Sabemos perfeitamente que vários outros países estão desenvolvendo armas avançadas com
novas propriedades físicas. Temos todos os motivos para crer que estamos pelo menos um passo à
frente – sob todos os critérios – nas áreas mais essenciais.
Alcançamos progresso notável em armas com laser. Não é simples conceito ou simples
plano. Esse projeto já ultrapassou, mesmo, os estágios iniciais de produção. Desde o ano passado,
nossos soldados já estão equipados com armas com laser.
Não quero revelar mais detalhes, porque ainda não é a hora. Mas os especialistas
compreenderão que, com esse tipo de armas, a capacidade de defesa da Rússia foi multiplicada.
Temos aqui mais um pequeno vídeo.
Os que se interessem por equipamento militar, estão convidados a sugerir um nome para
essa nova arma, para esse sistema de ponta.
Claro que o processo avança e refinaremos também essa tecnologia que hoje é o estado-da-
arte. Obviamente, há muito mais desenvolvimentos do que lhes apresentei hoje. Mas fiquemos por
aqui, por hora.
Quero enfatizar muito especialmente que as novas armas estratégicas que foram
desenvolvidas mais recentemente – são de fato novos tipos de armas estratégicas – não são de modo
algum resultado de algo que tenhamos recebido da União Soviética. Evidentemente, trabalhamos
sobre algumas ideias de nossos engenhosos antecessores. Mas tudo que os senhores viram hoje é
resultado do trabalho dos vários últimos anos, produto de dúzias de organizações de pesquisa,
gabinetes e institutos de projetos.
Milhares, literalmente milhares de nossos especialistas, cientistas renomados, projetistas,
engenheiros, operários apaixonados e talentosos trabalham literalmente há anos, discretos, calados,
sem egoísmos, doando o melhor de cada um, em total dedicação. Muitos desses profissionais são
muito jovens. São nossos heróis, ombro a ombro com nossos soldados, que manifestam todos as
melhores qualidades do Exército Russo quando convocado ao combate.
Quero dirigir-me pessoalmente a cada um deles, e dizer-lhe que não haverá prêmios ou
recompensas. Muitas vezes estive pessoalmente com essas pessoas, e sei que não trabalham à espera
de recompensas. O maior prêmio para eles é a certeza de que assim se garante a segurança de nosso
país e de nosso povo. Como presidente e em nome do povo russo, agradeço muito a todos vocês,
pelo trabalho dedicado e seus resultados. Nosso país precisa muito desse trabalho e desses
resultados.
Como eu já disse, todos os futuros produtos para finalidades militares estão baseados em
avanços notáveis que podem, devem e serão usados nos setores civis de alta tecnologia. Não me
canso de repetir que só um país que tenha alto nível de educação e de pesquisa fundamental,
pesquisa aplicada, tecnologia, infraestrutura industrial e recursos humanos pode desenvolver com
sucesso armas complexas, sem igual no planeta, do tipo que vimos aqui. Pelos resultados, os
senhores podem ver que a Rússia tem todos esses recursos.
Expandiremos nosso potencial e nos focaremos em alcançar as metas ambiciosas que nosso
país se propôs a alcançar em termos de desenvolvimento econômico, social e de infraestrutura.
Nossa defesa efetiva servirá como garantia do desenvolvimento russo de longo prazo.
Permitam-me insistir que cada um dos sistemas de armamentos aos quais me referi aqui tem
sua própria extraordinária importância. Ainda mais importante, todos esses avanços tomados em
conjunto capacitam o Ministério da Defesa e o Alto Comando do Estado-maior para que
desenvolvam um sistema de defesa muito amplo, no qual cada peça do novo equipamento militar
terá sua específica insubstituível função. Acima de armas estratégicas que estão hoje em prontidão
para combate, e se beneficiam de atualizações regulares, a Rússia terá capacidade de defesa que
garantirá a segurança da nação no longo prazo.
Claro que há muitas coisas que teremos de fazer em termos de construção militar, mas uma
coisa já está bem clara: a Rússia possui exército moderno, altamente tecnológico, muito compacto,
dadas as dimensões do território, centrado em seu corpo de oficiais, dedicados ao país e prontos a
sacrificar qualquer coisa pelo povo russo. Mais cedo ou mais tarde, outros exércitos também terão a
tecnologia, as armas, inclusive as mais avançadas. Mas nada disso me preocupa, porque já temos
hoje os melhores armamentos, e melhores ainda teremos no futuro. Nós temos, e eles jamais terão,
gente como Roman Filipov, Major-Aviador russo [N. do T.: Filipov pilotava a aeronave SU-25 da
Força Aérea Russa em missão na Síria que em 03fev2018 foi abatida por terroristas, ejetou-se de
paraquedas e combateu até a morte os terroristas em solo].
Espero que tudo que aqui ficou dito leve agressores potenciais a pensar duas vezes, porque
passos inamistosos contra a Rússia, como instalar mísseis de defesa e trazer a infraestrutura da
OTAN para junto da fronteira russa, tornaram-se inefetivos em termos militares e implicam custos
injustificáveis, tornando inúteis aqueles passos agressivos para os que promovem as agressões.
É nosso dever informar nossos parceiros de tudo que aqui foi dito hoje, nos termos dos
tratados e compromissos internacionais que a Rússia assinou. No momento adequado, especialistas
dos ministérios da Defesa e de Relações Exteriores terão muitas ocasiões para discutir todos esses
assuntos com nossos parceiros. Isso, evidentemente, se nossos parceiros se interessarem e quiserem
trocar ideias.
De minha parte, devo dizer que conduzi todo o trabalho para reforçar a capacidade de defesa
da Rússia dentro do que determinam os acordos vigentes para controle de armas; não estamos
violando coisa alguma. Devo dizer especificamente que a força militar crescente da Rússia não é
ameaça contra ninguém; jamais tivemos planos para usar esse nosso novo potencial para finalidades
ofensivas, muito menos para finalidades agressivas.
Não estamos ameaçando nada nem ninguém. Não atacaremos ninguém nem tomaremos
coisa alguma, de quem quer que seja, pela força das armas, novas ou antigas. A Rússia não precisa
de absolutamente nada. Antes o contrário. Considero indispensável destacar – porque é muito
importante – que o crescente poder militar dos russos é sólida garantia para a paz global. O poder
militar dos russos preserva e sempre preservará a paridade estratégica e o equilíbrio de forças no
mundo, o qual, como se sabe, foi e continua a ser fato chave da segurança internacional desde o
final da 2ª Guerra Mundial, até hoje.
E, àqueles que nos últimos 15 anos se dedicaram a acelerar a corrida armamentista e
buscaram arrancar vantagens unilaterais contra a Rússia, impondo restrições e sanções – que são
ilegais do ponto de vista da Lei Internacional – com vistas a conter o nosso desenvolvimento
nacional, inclusive na área militar, direi o seguinte: ‘Tudo o que tanto vocês tentaram impedir que
acontecesse, com sua política ilegal, já aconteceu. Ninguém conseguiu conter a Rússia’.
Agora temos de estar atentos a essa realidade. Ninguém alimente qualquer dúvida sobre o
que eu disse aqui: não é blefe. Dediquem um momento de reflexão ao que aqui foi dito e feito.
Descartem os que insistem em viver no passado. Parem de sacudir a canoa na qual viajamos todos,
essa nossa Terra comum.
Quanto ao futuro de nossa Terra comum, quero dizer ainda que estamos muito preocupados
com algumas disposições da revisão do posicionamento nuclear recentemente publicadas pelos
EUA, que reduzem as limitações ao uso de armamento nuclear. Por trás das portas fechadas dos
gabinetes, há quem fale de calma. Mas nós estamos lendo o que está escrito. E o que está escrito é
que essa nova estratégia nuclear poderá ser acionada mesmo em resposta a ataques com armas
convencionais, e até mesmo contra algum ciberataque.
Chamo atenção para a evidência de que a doutrina militar da Rússia diz que a Rússia se
reserva o direito de usar armas nucleares exclusivamente em resposta a ataque nuclear, ou a ataque
com outras armas de destruição em massa contra nosso país ou nossos aliados, ou em resposta a ato
de agressão contra nós, com armas convencionais, que ameacem a própria sobrevivência do Estado
russo. Tudo aqui está claramente especificado.
Assim sendo, entendo que é meu dever anunciar o seguinte:
Qualquer uso de armas nucleares contra a Rússia ou contra seus aliados, seja por armas de
pequeno porte, médio porte ou qualquer outro porte será, em todos os casos, considerado
equivalente a ataque nuclear contra nosso país. A retaliação será imediata, com todas as
consequências que se devem esperar de ataque desse tipo contra a Rússia e aliados.
Não deve pairar quanto a isso nenhuma dúvida. O mundo não precisa de mais ameaças. Em
vez disso, vamos sentar à mesa de negociações, para juntos concebermos um novo e relevante
sistema de segurança internacional e desenvolvimento sustentável para a civilização humana. Todo
o tempo, nós repetimos isso. Todas as nossas propostas continuam válidas. A Rússia está pronta
para esses novos tempos.
Nossas políticas jamais serão erigidas sobre declarações de excepcionalismo. Protegemos
nossos interesses e respeitamos os interesses de outros países. Observamos a lei internacional e
acreditamos no papel inviolável da ONU. Esses são os princípios e os modos de abordar a realidade
que nos permitem construir relações fortes, amistosas e iguais com a absoluta maioria dos países.
Exemplo disso é nossa ampla e abrangente parceria estratégica com a República Popular da
China. Rússia e Índia também se beneficiam mutuamente de relação estratégica especial,
privilegiada. Nossas relações com muitos outros países no mundo estão chegando a um estágio de
novo dinamismo.
A Rússia está amplamente envolvida em organizações internacionais. Com nossos parceiros,
estamos promovendo e fazendo avançar associações e grupos como a Organização do Tratado de
Segurança Coletiva (CSTO), a Organização para a Cooperação de Xangai e os BRICS. Estamos
promovendo agenda positiva na ONU, no G20 e na Cooperação Econômica do Pacífico Asiático
(APEC). Estamos interessados em cooperação normal e construtiva com os EUA e a União
Europeia. Esperamos que o bom senso prevaleça, e que nossos parceiros optem pela via do trabalho
honesto, igual e coletivo.
Ainda que nossos pontos de vista colidam vez ou outra em algumas questões, nem por isso
deixamos de ser parceiros, porque temos de trabalhar juntos para conseguir responder aos desafios
mais complexos, garantir a segurança global e construir o mundo do futuro, mais interconectado a
cada dia, com mais e mais processos de integração dinâmica.
A Rússia e seus parceiros na União Econômica Eurasiana querem fazer dela um grupo de
integração econômica globalmente competitivo. A agenda da UEE inclui construir um mercado
comum para eletricidade, petróleo, derivados de petróleo e gás, harmonizando mercados financeiros
e conectando nossas autoridades alfandegárias. E também continuamos a trabalhar numa maior
parceria eurasiana.
Colegas,
Esse é momento de virada para todo o mundo, e os que querem e conseguem mudar, os que
agem e andam adiante fatalmente tomarão a dianteira. A Rússia e os russos expressamos esse desejo
de andar adiante em todos os momentos de definição de nossa história. Em apenas 30 anos, fizemos
mudanças que custaram séculos a outros países.
Continuaremos confiantemente a traçar nossa própria rota, como sempre fizemos. Nos
manteremos unidos, como sempre estivemos. Nossa unidade é o mais firme alicerce para o
progresso futuro. Nos próximos anos, nossa meta é fortalecer sempre mais essa unidade, de modo a
sermos uma só equipe coesa, que compreende que é indispensável mudar sempre e que devota toda
sua energia, seu conhecimento, sua experiência e seu talento a alcançar os objetivos de todos.
Desafios e altos objetivos dão significado especial a nossa vida. Temos de ser claros e
firmes em nossos planos e ações, temos de tomar iniciativas e assumir responsabilidades, temos de
nos fortalecer, o que significa que temos de ser úteis à nossa família, aos nossos filhos e a todo o
país; temos de mudar o mundo e mudar nosso país, sempre para melhor; e temos de construir a
Rússia com a qual todos sonhamos.
Só então a próxima década e todo o século 21 serão com certeza tempos de grandes vitórias
para todos os russos e de sucessos partilhados. Acredito firmemente que assim será.
Obrigado. [Fim da transcrição]
https://jornalggn.com.br/geopolitica/as-novas-armas-da-russia-3-implicacoes-militares/
1. Os porta-aviões são finalmente deslocados para o nicho da mera projeção de poder contra
adversários fracos e indefesos, e para bem longe das áreas marítimas da Rússia, sejam o
Mediterrâneo, o Pacífico ou o Atlântico Norte. Significa também uma zona de exclusão para
qualquer um dos 33 destroieres e cruzadores da Marinha americana equipados com o
sistema Aegis [N. do T.: sistema originalmente defensivo de mísseis antimísseis, que podem
no entanto disparar também mísseis de ataque Tomahawk, que são mísseis de cruzeiro de
difícil detecção, o que sempre representou uma grave preocupação para a Rússia], cruciais
para o escudo dos chamados Mísseis Balísticos de Defesa dos norte-americanos;
2. O míssil Kinzhal torna completamente inúteis e obsoletos as clássicas esquadras de combate
comandadas por porta-aviões, que se tornam imprestáveis como principal força de ataque
contra adversário de força igual ou semelhante. Também deixa sem defesas qualquer navio
de combate de superfície, sejam quais forem as suas defesas antiaérea e antimísseis. O
Kinzhal anula completamente as centenas de bilhões de dólares que foram investidos
naquelas plataformas e armas, que de repente foram convertidas em nada mais que gordos
alvos indefesos. Todo o conceito de Batalha Ar-Mar, que também atende pelo nome de
Conceito Conjunto para Acesso e Manobra nas Áreas Globais em Comum, e que é a pedra
de toque da dominação global pelos EUA, foi também tornado simplesmente inútil. Pode-se
chamar isso de catástrofe completa, doutrinária e orçamentária.
3. O chamado “controle sobre os mares e negação de acesso aos mares” muda completamente
de natureza, as duas coisas se fundem. Quem possui essas armas é simplesmente ‘dono’ de
vastos espaços nos mares cobertos pelos alcances do míssil Kinzhal e das aeronaves que os
transportam. Isso também remove completamente qualquer apoio de superfície, crucial para
os submarinos em todos os casos, expondo-os à aviação e aos navios de superfície de
patrulha e de guerra antissubmarina. O efeito é multiplicativo e é profundo.
Para aqueles interessados nas implicações militares das recentes revelações por Vladimir
Putin a respeito dos novos sistemas de armamento, eu recomendaria o excelente artigo de Andrei
Martyanov intitulado “As Implicações dos Novos Sistemas de Armamento da Rússia” (que foi o
texto anterior publicado nesta série, que oferece uma análise soberba do que essas novas armas
representam para os Estados Unidos, e especialmente para a Marinha americana. O que eu pretendo
fazer aqui é algo um pouco diferente, que é examinar algumas das consequências mais políticas
dessas revelações.
Acrescente a tudo isto uma crença quase-religiosa (um dogma, na verdade) no mito da
superioridade tecnológica americana e você entenderá que os líderes russos começaram a se dar
conta que seus congêneres americanos iam gradualmente se esquecendo que seus traseiros estavam
com um alvo pintado. Então, o que Putin fez foi simplesmente pintar mais alguns alvos, diferentes,
apenas para se certificar que os líderes dos Estados Unidos retornassem à realidade.
O objetivo do discurso de Putin foi também provar que tanto Obama (“a economia russa está
em frangalhos”) quanto McCain (“a Rússia é um posto de gasolina fantasiado de país”) estavam
errados. A mensagem russa para as elites governantes americanas foi simples: não, nós não apenas
não estamos atrás de vocês tecnologicamente, por muitas maneiras nós já estamos décadas à frente
de vocês, a despeito das suas sanções, das suas tentativas de nos isolar, da queda dramática nos
preços da energia, ou das suas tentativas de limitar nosso acesso aos mercados mundiais (o
desenvolvimento bem-sucedido dessa nova geração de sistemas de armamentos é um claro
indicador do estado real da pesquisa básica na Rússia em campos tais como ligas metálicas
avançadas, nanotecnologia, supercomputação etc.)
Aos belicistas do Pentágono, a mensagem foi igualmente clara e firme: nós gastamos menos
de dez por cento do que vocês gastam em agressão global; nós contrabalançaremos a sua vantagem
quantitativa com a nossa superioridade qualitativa. De forma simples, vocês lutam com dólares, nós
lutaremos com neurônios. Os propagandistas dos Estados Unidos, que adoram falar sobre como a
Rússia sempre se utiliza de grandes contingentes de soldados inábeis e de armas toscas porém
brutais, terão agora que lidar com um paradigma que lhes é completamente estranho: um soldado
russo é muito melhor treinado, muito melhor equipado, muito melhor comandado e a sua moral e
força de vontade é quase que infinitamente maior que a de um militar típico dos Estados Unidos.
Para uma cultura militar que repete como um mantra que tudo a respeito de si própria é “o melhor
do mundo” ou mesmo “o melhor da História”, essa nova realidade chegará como um choque muito
doloroso, e a maioria responderá a ela entrando em negação profunda. Para aqueles que acreditaram
na (historicamente, falsa por completo) narrativa sobre os Estados Unidos e Reagan levando a
União Soviética à falência por meio de uma corrida armamentista bem-sucedida, será sentido como
bastante estranho se colocar no “lugar invertido” com a velha e má URSS, e se ver na situação de
ter que encarar a falência induzida pela gastança militar.
Nada vai mudar no Império das Ilusões (ao menos não no futuro previsível)
Por falar em falência, as recentes revelações confirmaram aquilo que os russos vêm
alertando há muitos anos: toda a imensa soma de dinheiro gasto pelos Estados Unidos em defesas
ABM foi completamente desperdiçada. A Rússia descobriu e implantou uma resposta assimétrica
que faz da totalidade do programa ABM algo completamente inútil e obsoleto. Ademais, como
Martyanov também assinalou, a atual estrutura das forças navais de superfície dos Estados Unidos
foi também tornada obsoleta e inútil, ao menos contra a Rússia (mas você pode estar certo que a
China vem logo atrás). Potencialmente, este estado de coisas deveria implicar repercussões imensas,
tectônicas: quantias imensas de dinheiro do contribuinte americano foram completamente
desperdiçadas, as estratégias naval e nuclear dos Estados Unidos foram completamente
equivocadas, a inteligência falhou (tanto a nível de aquisição como de análise), os políticos
americanos tomaram decisões desastrosas, e isso é uma tamanha m**** que deveria desencadear
sabe lá Deus quantas investigações e renúncias, além de numerosas punições, administrativas ou
mesmo criminais. Mas, é claro, absolutamente nada disso vai acontecer, nada mesmo. Nem uma
única cabeça rolará…
No “Império das Ilusões”, os fatos simplesmente não têm a menor importância. De fato, eu
prevejo que o agora claramente inútil programa ABM prosseguirá como se nada tivesse acontecido.
E, de certo modo, isso é verdade. Ao zumbificado público geral dos Estados Unidos não será dito o
que está acontecendo, aqueles que compreenderem serão marginalizados e não terão poder para
efetuar nenhuma mudança, e, quanto aos parasitas corruptos que vêm ganhando milhões e bilhões
por meio desse total desperdício de dinheiro do contribuinte, estes possuem demasiado em jogo
para atirar a toalha. De fato, uma vez que os Estados Unidos são agora governados pelos Neocons
[N. do T.: apelido para neoconservadores], nós podemos muito facilmente prever o que eles irão
fazer. Eles farão o que Neocons sempre fazem: dobrarão a aposta. Assim, após ter se tornado de
conhecimento público que a totalidade das instalações ABM é inútil e desatualizada, pode-se
esperar uma injeção adicional de dinheiro por “congressistas patriotas” (<<== meu esforço para ser
politicamente correto!) rodeados por bandeiras, que explicarão ao público lobotomizado que eles
estão “adotando uma postura firme” contra “o ditador russo”, e que os orgulhosos Estados Unidos
da América não irão ceder à pressão da “chantagem nuclear russa”. As cores da nossa bandeira não
desbotam! Unidos nos erguemos! Etc. etc. etc.
No que diz respeito à Marinha dos Estados Unidos, isso nem mesmo será um tema. Quer
dizer então que um sujeito russo (refiro-me a Martyanov) escreveu alguma coisa para a Unz
Review. E daí? Isso não passa de mais “propaganda russa”, é claro. Será desconsiderado antes
mesmo de poder ser realmente estudado, e inevitavelmente a conclusão reconfortante será “nós
somos número um”, “a América reina sobre os mares” e todo o resto da insensatez ufanista habitual
com que os almirantes dos Estados Unidos vêm alimentando o público há décadas. Tenha ainda em
mente que os sujeitos sagazes na Marinha, e há muitos deles, compreenderam o tempo todo o que
estava se passando, mas eles ou não detêm influência nenhuma ou se mantêm em silêncio por
razões óbvias de carreira.
A realidade é que aquilo que Martyanov denomina “o mito americano da superioridade
tecnológica” se encontra tão profundamente arraigado na psique coletiva dos Estados Unidos que
foi tornado parte da identidade nacional, não podendo jamais ser questionado com êxito. Ainda que
Putin decida que vídeos e discursos simplesmente não bastam e resolva fazer uma demonstração
com munição de verdade, os zumbis agitadores de bandeira na mídia, no governo e no público
encontrarão algum modo de negar por completo, fingir que não aconteceu, ou colocar um sorriso
misterioso na cara e replicar algo na linha de “yeah, legal, mas, se vocês apenas desconfiassem das
superarmas que nós não estamos mostrando para vocês!!” (como um desses drones de fato
escreveu, “há de haver armamento escondido na manga dos Estados Unidos para ser usado no
caso de um ataque”). Assim, para o futuro previsível, espere pela continuidade da negação coletiva.
Esta lista está longe de ser exaustiva, há muito mais que nela falta inclusive novos
submarinos (de propulsão sem oxigênio, de propulsão convencional diesel-elétrica, submarinos
nucleares de ataque e SSBNs), aeronaves de ataque, novos veículos blindados de vários tipos, novos
equipamentos avançados de alta tecnologia individuais para os soldados, novos sistemas de
artilharia, etc. etc. etc. Mas, de longe, o elemento mais importante na prontidão russa para
confrontar e, se necessário, repelir qualquer agressão ocidental é a moral, a disciplina, o treinamento
e a determinação dos soldados russos (tão poderosamente ilustrado por diversos exemplos recentes
na Síria). Vamos dizer apenas que, em comparação, os militares americanos e europeus (ou os seus
comandantes, naquilo que interessa) não são exatamente impressionantes, e vamos ficar por aqui.