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Resumo
A Ayahuasca é uma bebida de uso ritual fruto da decocção de um cipó e de uma folha
amazônica. Com o aumento do número de consumidores deste chá e de informações e
conceitos errôneos a respeito, o trabalho analisa tais situações de consumo, seus efeitos
fisiológicos e terapêuticos. Buscou-se descrever seus efeitos, expor e contextualizar seu uso
desde as etnias indígenas até a atualidade, apresentar as questões legais e identificar
possíveis efeitos terapêuticos. Trata-se de um trabalho de revisão bibliográfica, utilizado 16
textos datados a partir de 2003, em língua portuguesa, usando duas bases online, além de
um livro referência sobre o assunto. Conclui-se que os efeitos do consumo da Ayahuasca,
chá sem datação de origem, geram benefícios na conduta individual, na ampla saúde mental
e na expansão de âmbitos socioculturais dos consumidores, agregando grande sabedoria
ritualística e cultural. Inclusa exteriormente de sua naturalidade, o chá aduz questões de
legalidade social em busca de equilíbrio para todos os setores. De relevância concluinte, a
Ayahuasca age em estados de desequilíbrio da saúde humana, compreendendo
beneficiamento em inúmeros setores patológicos.
Abstract
Ayahuasca is a drink for ritual use resulting from the decoction of a vine and an Amazonian
leaf. With the increase in the number of consumers of this tea and information and
misconceptions about it, the work analyzes such consumption situations, their physiological
and therapeutic effects. We sought to describe its effects, expose and contextualize its use
from indigenous ethnic groups to the present, present legal issues and identify possible
therapeutic effects. This is a bibliographic review, using 16 texts dated from 2003, in
Portuguese, using two online databases, in addition to a reference book on the subject. It is
concluded that the effects of the consumption of Ayahuasca, tea with no date of origin,
generate benefits in individual behavior, in broad mental health and in the expansion of
sociocultural scopes of consumers, adding great ritualistic and cultural wisdom. Including
externally of its naturalness, tea raises questions of social legality in search of balance for all
sectors. Of concluding relevance, Ayahuasca acts in states of human health imbalance,
comprising improvement in numerous pathological sectors.
Introdução
Ayahuasca é uma bebida de uso ritualístico, referida como chá, feita pela decocção
do cipó Jagube/ Mariri (Banisteriopsis caapi) e da folha da planta arbórea Chacrona/Rainha
(Psychotria viridis). Seu consumo em religiões como Santo Daime, a União do Vegetal e a
Barquinha fomenta pesquisas científicas em farmacologia, psicologia, psiquiatria,
antropologia, entre outras. Há necessidade de interpretação de seu uso nas culturas
indígenas, e em vários outros contextos da sociedade, com explicações dos efeitos de seu
consumo, e a possibilidade da utilização terapêutica em estados desequilíbrios da saúde
humana. Este trabalho tem o propósito de explicar, contextualizar e apresentar os estudos
sobre o tema.
Objetivos
Metodologia
Para Rita Barreto de Sales Oliveira e Renilda Gonçalves do Amaral (2016), a história
da Ayahuasca é totalmente desconhecida uma vez que não há registros escritos na região
Amazônica após a invasão espanhola no fim do século XV. Tudo que há são vários mitos e
tradições orais passados por gerações. Todavia, um cálice de mais de 2.500 anos que foi
encontrado no Equador contém traços de Ayahuasca. Sabe-se que essa bebida é usada em
muitos países da América do Sul, inclusive Brasil, Equador, Venezuela, Colômbia, Peru e
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Bolívia, e por, no mínimo, 70 diferentes etnias indígenas das Américas. As tradições orais
dos povos ayahuasqueiros indígenas recebem vários tipos de versões sobre diversos mitos.
Observa-se entre os povos Makuna, Barasana, Tatuyo Kaxinawá e Ashananki uma rica
tradição mitológica constituída pelo consumo deste chá.
A Ayahuasca e substâncias similares são encontradas em um arco que vai das
nascentes do Ucayali às cabeceiras do Rio Negro, apresentando refinada farmacologia e
ricas cosmologias de 72 povos indígenas da Amazônia Ocidental dos troncos linguísticos
Pano, Aruák e Tukano. (MAURO ALMEIDA apud LABATE E ARAÚJO, 2009)
Segundo Luna (1986), a Ayahuasca além do xamanismo nativo exporta-se para
culturas de vegetalismo, uma forma de medicina popular à base de alucinógenos vegetais,
cantos e dietas feito por curandeiros de populações rurais do Peru e Colômbia mesclando
conhecimentos indígenas e esoterismo europeu.
Keifenheim apud Labate e Araújo (2009), explica que assim que o xamã do povo
anuncia que vai procurar cipós para preparo de Ayahuasca, a maioria dos participantes
prepara-se para a ocasião, cumprindo determinadas regras de dietas. Relata ainda:
Quanto aos ingredientes, distinguem-se três subtipos do cipó Banisteriopsis
caapi, que trazem o nome de xawan huni, baka huni e xane huni. Conforme
foi relatado, estes três tipos não se diferenciam externamente, mas sim de
acordo com o seu efeito. Alguns xamãs mencionam expressamente que
cada um desses tipos define as cores dominantes específicas, assim como
os motivos predominantes das visões por ele provocadas. Via de regra, o
Nixi pae primeiro é bebido por alguém experiente, que espera o início do
efeito da droga para então comunicar aos outros participantes de que tipo
de cipó se trata. O cipó xawen huni provoca, segundo diversas declarações
unânimes, visões de cor predominantemente vermelha (taxipa), dominadas
por motivos de sangue e fogo, consideradas as mais fortes e mais terríveis.
As visões provocadas pelo cipó xane huni são descritas como
predominantemente azul-verde (nanketapa) e relacionadas a imagens de
aldeias despovoadas. Em contrapartida, para as alucinações vaporosas-
esbranquiçadas (hene hexa) do cipó baka huni, frequentemente são
mencionados motivos de seca e de sede. As visões de serpentes são
consideradas – independentemente do tipo de cipó – como uma constante
de todas as experiências alucinógenas. Porém, cada tipo de cipó define a
cor na qual as serpentes são visualizadas. Conforme infere-se de diversos
relatos, as serpentes tanto podem aparecer em sua forma completa, quanto
na forma de língua de serpente enquanto atributo de outras aparições. Por
exemplo, ao se vislumbrar um pássaro nas visões xane huni, este aparece
com uma língua de serpente azul-verde, assim correspondendo à cor
dominante provocada pelo cipó xane huni.
Ott (1994) cita 98 espécies de 39 famílias de plantas que podem ser adicionadas à
Ayahuasca. Também se utilizam outras espécies do gênero Psychotria, tais como
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Santa Catarina, passou por um processo de agregação da Ayahuasca em sua cultura afim
do resgate e da revitalização cultural do povo, através de uma equipe multidisciplinar de
médicos e religiosos. A própria aldeia tem uma visão ainda mais favorável a respeito dos
benefícios que essas práticas trouxeram para a comunidade. A realização das cerimônias
com Ayahuasca contribuiu para reverter a situação de perda cultural, resultando num
processo de “resgate”. Esse contribuiu para o reestabelecimento das relações de
compadrio, renovação do cultivo de plantas sagradas, redução da violência doméstica e do
abuso de álcool, e assim por diante. Porém, muitos Guarani, principalmente de outras
aldeias, não concordam com o uso da bebida, afirmando que se trata de “coisa de brancos”.
Na própria aldeia de Águas Claras, algumas famílias deixaram de participar das cerimônias,
e certas pessoas passaram a criticá-las. Entre os Guarani da rede das aldeias do litoral
catarinense, e mesmo entre os moradores de Águas Claras, não existe um ponto de vista
homogêneo ou um consenso sobre a Ayahuasca (ISABEL SANTANA DE ROSE e ESTHER
JEAN LANGDON LANGDON, 2010).
costumam dizer que “na verdade o ouro era o Daime e que graças a Deus o encontraram”
(ARNEIDE BANDERIA CEMIN apud LABATE e ARAÚJO, 2009).
A análise das formas de consumo da bebida Ayahuasca entre os seringueiros é um
vasto campo de estudos para compreender o aparecimento e a constituição do Santo
Daime, da União do Vegetal e da Barquinha. Segundo diversos relatos, a estrutura do ritual,
as chamadas (cânticos considerados sagrados, entoados durante o ritual) e as histórias que
constituem a mitologia dessas religiões podem ser encontradas, com determinadas
variações, é claro, em diversas regiões da Amazônia Ocidental (LABATE, 2009).
A cultura da Ayahuasca é considerada por muitos como a última das tradições
xamânicas que se conserva com maior grau de pureza do planeta. Aqui podemos afirmar
que esta foi extrapolada de seu contexto xamânico e se integra definitivamente numa forma
neo-religiosa. A Ayahuasca se converte agora em um novo Eldorado da cultura moderna
(ZUALAGA apud LABATE e ARAÚJO, 2009).
Conceição (2009) afirma que a Ayahuasca poderá operar também como um
orientador na condução da vida prática. Isto acontece quando as pessoas que o ingeriram
procuram saber, ou “futurar”, sobre o seu trabalho, viagens ou mesmo suas amizades.
Pode-se ingeri-la também em busca de cura para doenças, ou de “limpeza” do organismo.
Existem casos de que, na época dos seringueiros, a Ayahuasca promovia mudanças morais
em suas vidas, como parar de ingerir bebidas alcoólicas, de fumar cigarro e de se envolver
em festas e jogos de futebol, principais ocasiões em que brigas têm chance de ocorrer no
seringal.
Finalmente, com o auge das experiências psicodélicas no mundo ocidental, muitas
pessoas buscam a experiência da Ayahuasca com o único fim de experimentar as
sensações alucinatórias desta bebida. Alguns querem uma experiência “autêntica” e viajam
em busca de “verdadeiros xamãs”, enquanto outros ingressam nesta experiência guiados
pelas oportunidades à sua volta. Hoje é fácil conseguir uma garrafa de Ayahuasca pela
internet; nos Estados Unidos se oferecem viagens organizadas com destino ao Equador,
Peru e Brasil praticamente com o único objetivo de consumir esta substância visionária
através das mãos de algum pretenso xamã indígena a serviço de uma agência de viagens
(ZUALAGA apud LABATE e ARAÚJO).
consciência é alcançar um estado mental que permite uma reflexão profunda, semelhante à
meditação. Já a alucinação é uma percepção alterada da realidade (DIONATAS ULISSES
DE OLIVEIRA MENEGUETTI e NAILA FERNANDA SBSCZK PEREIRA MENEGUETTI,
2014).
Segundo José Arturo Costa Escobar (2012), a Ayahuasca é considerada, em geral,
pelos diversos grupos religiosos, como uma substância capaz de permitir ao usuário o
contato com o Divino ou dimensão divina, daí retirando conhecimentos, força e luz, que
permitam a evolução material e espiritual, atuando também como modo de orientação da
conduta diária. Atualmente, a Ayahuasca emerge em um contexto mundial, tornando-se uma
das mais importantes e mais conhecidas substâncias psicodélicas de uso ritual. Culturas
que normalmente não possuíam a Ayahuasca como elemento central de suas religiosidades
passam hoje a incorporar em suas cosmologias e rituais de cura, principalmente, a
Ayahuasca. Levando a autorização da bebida ritual, deve-se também o reconhecimento
como patrimônio cultural e histórico sendo de utilidade pública.
Motta (2013) assegura que o chá Ayahuasca é definido como uma substância
(bebida) psicoativa que segundo a Secretaria Nacional Antidrogas (2004) é qualquer
substância química, natural ou sintética, proscrita ou não, que altera o comportamento, o
humor e a cognição, agindo preferencialmente nos neurônios, afetando o Sistema Nervoso
Central.
No Brasil, a primeira política importante relativa à Ayahuasca foi gerada em 1985
pela Divisão Nacional de Vigilância Sanitária de Medicamentos (DIMED), que classificou a
Ayahuasca como uma substância proibida (Portaria, 1985). Um Grupo de Trabalho foi em
seguida proposto pelo Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN), predecessor do
CONAD, para aprofundar o tema (Resolução, 1985). No ano seguinte, como recomendação
do Grupo de Trabalho, a Ayahuasca foi temporariamente desclassificada como substância
ilegal (Resolução, 1986). Após encontros extensivos com as comunidades ayahuasqueiras
brasileiras, o Grupo de Trabalho, por unanimidade de votos, recomendou definitivamente a
legalização da Ayahuasca e a autorização de seu “uso ritual e religioso”. Segundo o
Relatório Final, a bebida não causa dependência química (Relatório Final, 1987). Essas
recomendações foram aprovadas em uma reunião oficial do CONFEN (LABATE e KEVYN
FEENEY, 2012).
Segundo Motta (2013), o processo de legalização teve continuidade com a
Resolução Nº 4 do Conselho Nacional Anti-Drogas (CONAD), de 4 de novembro de 2002,
que reconheceu o direito ao uso do chá em contextos religiosos por menores de idade e
grávidas, decisão essa que foi reiterada pela Resolução nº 1/2010. Segundo a resolução, o
uso da Ayahuasca por menores de 18 (dezoito) anos deve permanecer como objeto de
deliberação dos pais ou responsáveis, e cabem as grávidas a responsabilidade do uso,
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Funções terapêuticas
A Ayahuasca pode ser utilizada, ainda em pequenas doses diárias como tratamento
de algumas moléstias, febres, dores de cabeça, diarreias, pois considera-se que se a
pessoa precisa de limpeza, assim, o chá faz com que evacue e vomite e, em caso de
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Considerações finais
Sem datações do surgimento e uso entre nativos, mas carregando grandes traços
socioculturais, o consumo da Ayahuasca se expande na primeira metade do século IXX
culminando o surgimento de religiões presentes até hoje. A legislação para o consumo deste
chá engloba credenciamentos de instituições e frequentadores, anamnese de novos
consumidores e fiscalizações ambientais, sociais e comerciais. O consumo humano traz
benefícios em patologias psicológicas e psiquiátricas, Alzheimer, Parkinson, Doença de
Chagas, Leishmaniose entre outras.
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