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Motrivivência Ano XXII, Nº 34, P. 40-60 Jun.

/2010
DOI:10.5007/2175-8042.2010n34p40

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA


INCLUSÃO DIGITAL NAS ESCOLAS

Maria Helena Silveira Bonilla

Resumo Abstract
A partir do lançamento do Livro Since the presentation of the Green
Verde do Programa Sociedade da Book of the Society of Information
Informação no Brasil, em 2000, Program in Brazil, in 2000, the
a discussão sobre inclusão digital discussion about digital inclusion
toma o cenário nacional; no entanto, takes national scene, however,
só começa a ser incorporada starts being incorporated by the
pelas escolas a partir de 2007, schools since 2007, with the Proin-
com a reformulação do Proinfo.
fo reformulation. Although the the-
Apesar do tema estar presente nos
matic is present in the documents,
documentos, ainda está distante das
is far of pedagogic practices yet.
práticas pedagógicas. Este artigo
discute essa problemática a partir This article discuss this problem
da análise das políticas públicas since the analysis of public policies
para inclusão digital nas escolas for digital inclusion in Brazilian
brasileiras, apontando pontos críticos schools, underling critical points
dessa articulação e indicando como of that articulation and indicating

1 Professora da FACED/UFBA, integrante do GEC (Grupo Educação e Comunicação).


Contato: bonilla@ufba.br.
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possibilidade de superação da as a possibility of getting over the


perspectiva instrumental da escola, instrumental perspective of school,
a abertura para a vivência plena da the opening for the digital culture
cultura digital. entire living.
Palavras-Chave: políticas públicas, Key-words: public policies, digital
inclusão digital, escola pública inclusion, public school

A partir do lançamento do ter apelo midiático e ter provocado


Livro Verde do Programa Sociedade um movimento na sociedade brasi-
da Informação no Brasil, em 2000, leira em prol da universalização do
o país incorpora em sua agenda po- acesso às TIC. Naquele momento
lítica a universalização do acesso às inicial, o acesso, ou a infraestrutura
tecnologias da informação e comuni- de informações era tomado como
cação – TIC – e a promoção da “al- o primeiro estágio rumo à Socieda-
fabetização digital” (BRASIL, 2000) de da Informação, tendo, claro, a
da população, com o objetivo de informatização da economia como
assegurar que a economia brasileira o segundo e fundamental estágio
tivesse condições de competir no (BRASIL, 2000, p. 108). Ao tornar o
mercado mundial. Nesse momento, crescimento econômico a principal
ainda não estava posto na sociedade preocupação política, a ponto de
o termo “inclusão digital”. Este surge, elevar, segundo Dahrendorf (1996,
e se consolida, a partir dos debates p.19), a economia à ideologia políti-
em torno do Livro Verde e das aná- ca, as questões sociais foram ignora-
lises que são elaboradas sobre o das ou então convertidas em valores
programa brasileiro. econômicos. No entanto, os debates
Apesar do termo “inclu- e a participação social nas iniciativas
são” ser uma positivação de uma de universalização das TIC geraram
problemática social, a da exclusão, uma outra dinâmica, mais em sinto-
implicar o “entendimento do social nia com as necessidades sociais da
a partir de uma concepção dual do população brasileira.
dentro e do fora” (BONETI, 2005, Também, com a mudança
p. 3), limitar a análise e bloquear a de governo, em 2003, o Programa
percepção da complexidade dos pro- Sociedade da Informação no Brasil
cessos, carrega como potencialidade é deixado de lado, e as iniciativas
o fato de ser facilmente compreen- governamentais para inclusão di-
sível pela maioria da população, gital são incrementadas. Passam a
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compor as pautas de debates ques- quanto tais abordagens contribuem


tões relacionadas à capacitação da para que os sujeitos se articulem
população para o uso, oferta de ativamente nas dinâmicas sociais
serviços e conteúdos e as formas contemporâneas, através das tecno-
de utilização dessas tecnologias, logias, para gerar as transformações
questão esta, no nosso entender, necessárias às suas demandas so-
fundamental para uma efetiva ciais, culturais e políticas. Também
democratização das TIC, além, é fundamental discutir sobre o papel
claro, das questões relacionadas da escola nesse contexto.
à infraestrutura tecnológica. Estas
questões são fundamentais, mas Inclusão digital e educação
não suficientes para dar conta das
necessidades sociais. Consideramos Em geral, observa-se que
que é necessário ultrapassar a ideia as questões culturais e educacionais
de uso das TIC como ferramenta estão presentes quando se discute
de capacitação para o mercado de inclusão digital. No entanto, quase
trabalho, através de cursos técnicos sempre presentes de forma insu-
para a população de baixa renda, ficiente. Na maioria das análises
ou então como meras ferramentas não está presente a perspectiva da
didáticas para continuar ensinando produção de conteúdos, da cola-
os mesmos conteúdos na escola, boração, da autoria e co-autoria
espaços onde normalmente é proi- dos sujeitos no mundo digital,
bido o acesso a salas de bate-papo, dimensão que efetivamente pode
jogos, comunidades virtuais e a uma ser significativa educacionalmente
outra variedade de sites. Enquanto para as comunidades, uma vez que
isso acontece nos espaços de aces- somente se apropriando dessas pos-
so público, os filhos das famílias sibilidades é que os sujeitos sociais
com melhor poder aquisitivo estão poderão efetivamente participar das
explorando ampla e livremente os dinâmicas da web 2.0.
ambientes digitais, vivenciando a Observamos com frequ-
cultura, a interatividade, a produ- ência, e outras pesquisas também
ção colaborativa, a partir de seus apontam nessa direção (OLIVEIRA,
computadores pessoais, em casa. 2007; BUZATO, 2007), que a arti-
Obviamente, promover uma inicia- culação entre os projetos de inclu-
ção da população, no uso das TIC, a são digital e a educação resume-se
chamada alfabetização digital, não à realização de atividades escolares
deixa de ser uma ação social válida. (pesquisas!) nos centros de acesso
No entanto, o que se discute é o público. Isso é bastante significativo
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para os estudantes que não possuem professores não possuem formação


conexão em casa, nem na escola. É para propor outras atividades, além
uma oportunidade de interação com das tradicionais pesquisas.
o contexto digital. No entanto, con- Mais recentemente, no
tinua a perspectiva do consumo de Brasil, começa a aparecer nos proje-
informações, característica da web tos governamentais a perspectiva de
1.0. Não está proposta, prevista, ou promover inclusão digital nas esco-
estimulada pelas políticas públicas las públicas. No entanto, ainda con-
uma articulação mais efetiva entre tinua a percepção de que inclusão
escola e demais espaços públicos digital está numa dimensão e educa-
de acesso. Para os gestores públi- ção em outra. O Conselho de Altos
cos, educação está em um plano Estudos e Avaliação Tecnológica da
de abordagem, e inclusão digital Câmara dos Deputados, ao avaliar
em outro, totalmente diferente, a experiência Um Computador por
inclusive com responsabilização de Aluno - UCA, reconhece que
secretarias e ministérios específicos,
sem articulação entre eles. inclusão digital ora aparece como
Na verdade, as próprias objetivo principal de programas
escolas públicas enfrentam grandes de disseminação das TICs nas
dificuldades de ordem estrutural, escolas, ora como um subpro-
pedagógica e tecnológica. Poucos duto da fluência que as crianças
alunos têm acesso às tecnologias ganham ao usar computador e
em suas escolas e mais reduzido Internet. A meta é a qualidade do
ainda é o número de professores processo de ensino-aprendiza-
que propõem atividades de apren- gem, sendo o letramento digital
dizagem articuladas diretamente decorrência natural da utilização
com as TIC. Quando acontece, elas frequente dessas tecnologias.
são utilizadas numa perspectiva (CÂMARA DOS DEPUTADOS,
instrumental, com cursos básicos 2008, p.52)
em torno de algum software, ou
para fazer uma pesquisa na internet, Como podemos perceber,
que em nada muda as dinâmicas já a cultura digital não é considerada
instituídas pela escola e largamente como parte integrante dos processos
criticadas; também porque essas pedagógicos e das aprendizagens
atividades, muitas vezes, são coor- dos alunos. Continua a desarticu-
denadas pelos responsáveis pelos lação entre escola e sociedade e
laboratórios e não pelos professores a supervalorização da perspectiva
de sala de aula, ou então porque os conteudista da escola.
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De acordo com Wars- precisamos investir na democratiza-


chauer (2006, p. 21), “para pro- ção do uso e na formação dos sujei-
porcionar o acesso significativo as tos sociais, em especial, dos profes-
novas tecnologias, o conteúdo, a sores. Algumas escolas, a partir de
língua, o letramento, a educação iniciativas da própria comunidade,
e as estruturas comunitárias e insti- estão abrindo seus laboratórios
tucionais devem todos ser levados para uso da comunidade nos finais
em consideração”. Em vista disso, de semana, configurando-se em
consideramos a escola como locus centros públicos de acesso às TIC,
primeiro e natural dos processos potencializando a inclusão digital
de inclusão digital, aqui entendida de toda a comunidade escolar.
como formação da cultura digital, Ou seja, a escola começa
uma vez que se constitui ela em a se constituir em espaço estratégico
espaço de inserção dos jovens na para promoção da inclusão digital.
cultura de seu tempo – e o tempo Essa perspectiva também está presen-
contemporâneo está marcado pelos te no projeto Um Computador por
processos digitais. Como a escola Aluno, que propõe, como uma de
deve ser espaço-tempo de crítica dos suas premissas, a posse do laptop pelo
saberes, valores e práticas da socie- aluno, “a fim de garantir que ele (e sua
dade em que está inserida, é da sua família) possa levar o laptop para casa
competência, hoje, oportunizar aos e se beneficiar de um maior tempo de
jovens a vivência plena e crítica das uso” (CÂMARA DOS DEPUTADOS,
redes digitais. Logo, é responsabili- 2008, p. 44). No entanto, muito
dade do professor, profissional dessa precisa ser investido para que escola
instituição, a formação dos jovens se transforme num espaço de forma-
para a vivência desses novos espaços ção, dos professores, dos alunos e da
de comunicação e produção. No en- comunidade escolar, para a vivência
tanto, um professor “excluído” digi- plena da cultura digital, como parte
talmente não terá a mínima condição integrante de sua proposta pedagógi-
de articulação e argumentação no ca. Observamos que esta perspectiva
mundo virtual, e, por conseguinte, parece estar ainda distante das atuais
suas práticas não contemplarão as formulações políticas.
dinâmicas do ciberespaço.
Portanto, para efetivamen- As políticas públicas
te transformar a escola num locus de
inclusão digital, não basta o acesso O que podemos perce-
às TIC (embora este seja fundamen- ber dentre os programas e ações
tal, e necessário ser de qualidade!), de inclusão digital adotados pelo
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Governo Federal é que as ações Seminário, segundo Oliveira (1997,


do MEC ainda são incipientes. Até p. 29), tomou-se a posição de que
o momento, o principal programa o uso do computador deveria ser
que oportuniza o acesso das escolas visto como ferramenta auxiliar do
à tecnologia digital é o Proinfo - processo ensino-aprendizagem.
Programa Nacional de Informática No II Seminário, os pesquisadores
na Educação, criado em abril de recomendavam a
1997, com o objetivo de melhorar
a qualidade do processo de ensino- necessidade de que a presença
aprendizagem, possibilitar a criação de computadores na escola fos-
de uma nova ecologia cognitiva nos se encarada como um meio au-
ambientes escolares, propiciar uma xiliar no processo educacional,
educação voltada para o desenvol- jamais deveria ser visto como
vimento científico e tecnológico e um fim em si mesmo, e, como
educar para uma cidadania global tal, deveria submeter-se aos fins
(MORAES, 1997). As estratégias da educação e não determiná-
para alcançar esses objetivos foram los. Reforçava-se ainda a idéia
implantar laboratórios de informáti- de que o computador deveria
ca nas escolas públicas de educação auxiliar o desenvolvimento
básica e capacitar os professores, da inteligência do aluno, bem
gestores e outros agentes educacio- como desenvolver habilidades
nais para a utilização pedagógica intelectuais específicas requeri-
das tecnologias. das pelos diferentes conteúdos.
Apesar dos objetivos se- (MORAES, 1993, p. 20)
rem amplos, as estratégias sempre
foram limitadas. Inclusive, sempre Foi nessa perspectiva que
foi limitada a concepção que articu- o Proinfo se pautou, desde sua im-
la tecnologia e educação. Desde o plantação, até porque um dos seus
início do processo no Brasil, as TIC principais objetivos, o de conectar
são entendidas como ferramentas as escolas à internet, só começou
de apoio à educação. Essa perspec- a ser viabilizado a partir de 2008,
tiva foi desenvolvida na década de com o Programa Banda Larga nas
1980, a partir das discussões que Escolas. Restava, então, formar os
marcaram o I e o II Seminário Na- professores numa perspectiva ins-
cional de Informática na Educação, trumental, com cursos sobre como
promovidos pela SEI, MEC e CNPq, utilizar determinados softwares, vi-
em 1981, em Brasília, e 1982, em sando animar as dinâmicas pedagó-
Salvador, respectivamente. No I gicas e torná-las mais atraentes, mas
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sem questionar o modelo instituído; uma boa opção, considerando que


ao contrário, reforçando-o. Essa o programa passou a englobar as
forma de utilização da tecnologia, diferentes mídias, o que conferiu a
segundo Pretto (1996, p. 114), re- ele uma maior abrangência. Agora,
duz as suas possibilidades e esvazia cabe questionar a troca dos termos
as TIC de suas características fun- “na Educação” por “Educacional”.
damentais, transformando-as em Quais os sentidos que estão postos
animadoras da velha educação. nesses termos? Consideramos que
Somente 10 anos após o termo “na Educação” carrega um
sua implantação, a SEED/MEC, em sentido mais amplo, inferindo que
2007, no contexto do Plano de é possível, na educação, utilizarmos
Desenvolvimento da Educação - toda e qualquer tecnologia que
PDE, desenvolveu a reformulação esteja disponível na sociedade, de
do Proinfo, através do Decreto nº forma a proporcionar a vivência,
6.300, de 12 de dezembro de 2007. na escola, de todas as possibilida-
O programa passou a chamar-se des disponíveis nas redes digitais,
Programa Nacional de Tecnologia contribuindo para a formação da
Educacional – Proinfo, e dividiu-se cultura digital de todos. Já o termo
em dois: Proinfo Urbano e Proinfo “Educacional” carrega um sentido
Rural, com o objetivo de atender mais restrito, inferindo que existe
também as escolas situadas nas zo- uma tecnologia própria para a
nas rurais. Além da troca do nome educação, uma vez que o “educa-
e do alargamento da abrangência de cional” está posto como marca de
cobertura, o programa adota, atual- um determinado tipo de tecnologia,
mente, a proposta de integração das ou seja, que só podemos utilizar na
mídias na educação e traz como educação aquelas tecnologias que
objetivo “contribuir com a inclusão foram desenvolvidas especialmente
digital por meio da ampliação do para o ambiente escolar, o que, do
acesso a computadores, da conexão nosso ponto de vista, constitui-se
à rede mundial de computadores e numa simplificação das suas poten-
de outras tecnologias digitais, be- cialidades, e pouco contribui para
neficiando a comunidade escolar os processos de inclusão digital dos
e a população próxima às escolas” alunos e professores. Justamente
(BRASIL, 2007). quando incorpora como objetivo
A primeira questão que o uso das mídias e a promoção
se coloca é: por que trocar o nome da inclusão digital, o que exige a
do programa? Substituir “Informá- vivência plena do mundo digital,
tica” por “Tecnologia” parece ser o programa fecha-se em torno de
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tecnologias específicas? Difícil com- à banda larga, o programa visava,


preender o motivo que levou à troca ao designar as teles para conectar
de nome do programa. 56 mil escolas da rede pública ur-
Frente a estes novos obje- bana do país até 20103 e oferecer
tivos do Proinfo, e considerando a gratuitamente o acesso, atualizando
política nacional de inclusão digital, periodicamente a velocidade até
conectar as escolas à internet passou 2025 (período em vencem os atuais
a ser fator estratégico do governo. contratos de concessão das teles),
Para tanto, em 04 de abril de 2008, disponibilizar o serviço para os
através do Decreto Presidencial demais setores da sociedade.
n. 6.424, foi lançado o Programa Com esse acordo, o gover-
Banda Larga nas Escolas, com a no abriu mão de usar sua própria
participação das operadoras de infra-estrutura para fazer inclusão
telefonia e da Agência Nacional de digital no país4, bem como dificul-
Telecomunicações. Para conseguir tou o surgimento de experiências
a distribuição do serviço de banda de redes comunitárias, utilizando
larga nas escolas, o governo fez um tecnologia de redes sem fio, organi-
acordo com as teles: elas deixaram zadas pela sociedade civil ou pelos
de fornecer Postos de Serviços poderes públicos locais, como já
Telefônico (PST) em cada cidade acontecia em Piraí no Rio de Ja-
brasileira, passando a distribuir neiro, Tiradentes em Minas Gerais
seus backhauls2 em todos os mu- e Sud Menucci em São Paulo, as
nicípios. Como no país, de acordo primeiras totalmente conectadas
com Gindre (2008), mais de 2000 no país, e também no Pará e de
municípios não possuíam backhaul Santa Catarina, estados que já se
nessa época, ou seja, não contavam mobilizavam, investindo em redes
com cabeamento lógico e, em fun- próprias como estratégia de redução
ção disso, não podiam se conectar de custos e de maior autonomia

2 Backhaul, segundo a Wikipedia (http://pt.wikipedia.org/), é a “porção de uma rede hierárquica


de telecomunicações responsável por fazer a ligação entre o núcleo da rede, ou backbone, e
as subredes periféricas”, ou seja, o backhaul das operadoras de telefonia, no Brasil, interliga o
backbone de cada operadora às cidades.
3 Até meados de 2010, 47.204 escolas públicas urbanas de todo o Brasil contavam com acesso à
internet, o que representa 72,75% dos estabelecimentos municipais, estaduais e federais locali-
zados em zona urbana no país (ANATEL, 2010).
4 Essa perspectiva foi parcialmente revertida em 2010, no escopo do Programa Nacional de Banda
Larga - PNBL, quando o governo brasileiro reativa a Telebrás para ser a gestora do processo e
coordenar o uso da infraestrutura do governo no programa, de forma a atender as regiões onde
as teles não chegam.
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(FONSECA, 2008, p. 18-20). Com projetos de governo; a cada nova


o acordo, as teles gestão, a maioria dos projetos em
andamento são desconsiderados e
ganharam o direito de explorar uma nova leva emerge, de acordo
sozinhas a rede que irão cons- com o modelo e as concepções do
truir para chegarem até as esco- novo governo.
las. Essa rede passará na porta Também cabe analisar as
de milhares de residências e condições que essas escolas terão,
obviamente as teles a usarão objetivamente, para elaborarem
para vender seus serviços de projetos pedagógicos com o uso das
banda larga. A proposta do go- TIC. O programa Banda Larga nas
verno não obriga a que as teles
Escolas faz parte da política do MEC
tenham que partilhar essa rede
para informatização das instituições
com os provedores locais (o tal
de ensino e prevê a instalação de
unbundling). Com backhauls
e redes de “última milha” para
computadores nas escolas, a capa-
uso exclusivo, as teles acaba- citação de professores e a oferta de
ram de ganhar o monopólio conteúdos educacionais, através do
da banda larga em todo o país. Portal do Professor5 e do Banco Inter-
(GINDRE, 2008) nacional de Objetos Educacionais6,
“destinados a auxiliar os professores
E após 2025, quem se na oferta de conteúdos curriculares
responsabilizará pela conexão das com recursos de multimídia” (MEC,
escolas? Nada está previsto para a 2008). Os computadores nas esco-
continuidade do oferecimento da las e a capacitação dos professores
conectividade. Ficamos dependentes são efetivados através do Proinfo,
da política do governo da época, sendo que a capacitação ocorre em
e correndo o risco de termos uma cursos a distância, acompanhados
descontinuidade nos projetos da pela SEED/MEC.
maioria das escolas, uma vez que, E aqui voltamos mais uma
historicamente, as mesmas não têm vez à problemática da formação dos
condições de pagar por esse serviço. professores. Como formar professo-
Mas isso não será de causar estranhe- res que não possuem qualquer fami-
za, uma vez que a descontinuidade liaridade com os ambientes digitais,
tem sido a marca dos programas e em cursos a distância? Interagir com

5 http://portaldoprofessor.mec.gov.br/
6 http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/
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ambientes que apresentam uma conectadas, com laboratórios, e


lógica completamente diferenciada limitando o trabalho à oferta dos
daquela que nos constituiu, não é famosos cursinhos de informática,
tarefa simples. A presença de inter- ou às pesquisas na internet, práticas
locutores é fundamental, pois são já difundidas e que não requerem
eles que dão o apoio necessário envolvimento dos professores; basta
para superar os medos, as angús- um, responsável pelo laboratório da
tias, as inseguranças, ajudando os escola, e muitas vezes formado ape-
professores a superá-las, até mesmo nas em cursos técnicos. Ou seja, as
segurando na mão para manusear o escolas estarão conectadas “mas o
mouse (BONILLA; PRETTO, 2007, sistema educacional, em última ins-
p. 83). Os Núcleos de Tecnologia tância, pode permanecer o mesmo:
Educacional – NTE – do Proinfo ofe- hierárquico, vertical, centralizado
recem esse apoio, mas, para muitos de forma exagerada. Uma velha
professores ele é insuficiente, visto escola velha, com cara de moder-
que o tempo para a familiarização na. Ou, quem sabe, pós-moderna!”
é diferente para cada um de nós. (PRETTO, 2002, p.124).
Alguns se ambientam rapidamente, Apesar de toda essa pro-
compreendem a lógica do digital blemática, podemos considerar
e vão em frente, explorando, des- que estamos caminhando para a
cobrindo e aprendendo. Outros universalização do acesso à internet
não, necessitam de muito estímulo, nas escolas urbanas do país, o que,
apoio, estratégias intensivas e dife- por si só, apesar de insuficiente,
renciadas para provocar o desejo de significa a abertura da possibilida-
interagir e conhecer os ambientes. de de gerarmos um movimento de
Para estes, o processo pode ser formação da cultura digital nesse
bastante demorado, prologando-se contexto, quer entre os alunos, quer
por meses, ou até anos, conforme entre os professores. Agora, cabe
vivenciamos em nosso Programa perguntar: qual é a política pública
de Formação de Professores em para a conexão das escolas rurais,
Exercício na Faced/UFBA7. e para formação dos professores
Os NTE também não con- destas escolas?
seguem atender a todos os pro- Através da Portaria 431, de
fessores das redes públicas do 23 de julho de 2009, do Ministério
país. Então, muitas escolas estarão das Comunicações, foi instituído o

7 http://www2.faced.ufba.br/
50

Programa Nacional de Telecomu- ensino, o que representa cerca de


nicações Rurais, com a finalidade 50% das escolas do País (207.234)
de permitir à população localizada (INEP/MEC, 2007).
em áreas rurais o acesso a serviços, A previsão é que a Anatel
de interesse coletivo, de telefonia e realize a licitação para a venda de
de dados em banda larga (internet), licença para a prestação do servi-
sendo que a oferta desses serviços ço em 2010, mas ainda sem data
deverá ser simultânea, e privilegian- definida, o que significa que o cro-
do o uso de frequências do espectro nograma já está atrasado. Ou seja,
radioelétrico na faixa de 450-470 como historicamente acontece no
Mhz (BRASIL, 2009a), ou seja, Brasil, as políticas, os programas,
busca-se, dessa forma, promover o os projetos são instituídos, mas a
incremento da oferta de aplicações sua implementação é lenta, fazendo
em banda larga sem fio no país. A com que se gere a expectativa da
opção por essas faixas se deve ao oferta dos serviços, e ao mesmo
fato de elas possibilitarem ótimas tempo a percepção da ineficiência
condições de propagação, sendo das políticas públicas. A grande
possível utilizar antenas com raio expectativa volta-se então para
de cobertura de aproximadamente o Programa Nacional de Banda
50km, o que permite atender várias Larga – PNBL, instituído em 2 de
comunidades rurais com uma única maio de 2010, através do Decreto
estação rádio base. É, portanto, a nº 7175, que se encontra em fase
mais apropriada para as zonas rurais de implantação. O Decreto não
e de baixa densidade. prevê prazo para a universalização
A Portaria 431, em seu art. dos serviços, mas segundo o Plano
2º, define o início do atendimento Nacional de Banda Larga, a meta é
para 2010, devendo ser universali- atingir 90 milhões de acessos banda
zado o serviço em cinco anos com larga em 2014, atendendo 100%
a conexão de todas as escolas públi- dos órgãos de Governo, incluindo
cas rurais (BRASIL, 2009a). Um dos escolas públicas ainda não atendi-
objetivos do programa é levar cone- das (mais de 70.000 rurais) (BRASIL,
xão banda larga para 80.000 escolas 2009b, p. 14).
rurais até o final de 2014 (BRASIL, Enquanto isso, apenas al-
2009b), o que não cobre toda a rede gumas escolas rurais são atendidas
de escolas da área rural, a qual, de com conexão via satélite, pelo
acordo com os dados levantados no Programa GESAC, visto este não
Censo Escolar de 2005, é constituí- ter capacidade para atender toda a
da por 96.557 estabelecimentos de demanda. No final de 2009, o GE-
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SAC contava com 11.000 pontos de escolas urbanas. Compete aos NTE
presença em 4.750 municípios bra- formar os professores das escolas
sileiros, atendendo escolas e órgãos que recebem os laboratórios do
públicos, sindicatos, aldeias indíge- Proinfo Rural, mas como a maioria
nas, comunidades quilombolas e dos cursos do NTE se efetivam na
ribeirinhas, zonas rurais, periferias modalidade a distância, e a maioria
urbanas, telecentros comunitários e dos professores e das escolas não
pontos remotos de fronteira, sedes de contam com conexão internet, fica
organizações não-governamentais e/ difícil a esses professores partici-
ou onde já existam outros projetos parem das formações. Ou seja, as
de inclusão digital do Governo Fe- políticas públicas precisam estar
deral (BRASIL, 2010). integradas (políticas para cone-
Como pode-se perceber, a xão, infraestrutura, equipamentos,
universalização do acesso internet formação dos professores), para
nas escolas rurais ainda está longe que efetivamente possamos falar
de se efetivar. Enquanto isso, através em inclusão digital nas escolas,
do Proinfo Rural, laboratórios com especialmente nas escolas rurais,
solução multiterminal (5 terminais considerando as carências enfren-
de acesso com 1 CPU) estão sendo tadas por estas no Brasil. O que
distribuídos às escolas com mais de presenciamos, é um conjunto de
30 alunos, e que possuam energia programas e projetos, iniciativas
elétrica. Até o final de 2009, cerca válidas, mas que no processo de
de 19.000 escolas haviam recebido implementação não conseguem
os equipamentos, o que correspon- fortalecer-se mutuamente e atender
de a 20% das escolas rurais brasilei- a todas as demandas das escolas.
ras, e significa um longo caminho Um outro projeto que faz
até a universalização do acesso aos parte desse conjunto, e que visa
equipamentos nessas escolas, inclu- potencializar a inclusão digital dos
sive porque não depende apenas da professores que estão ativos, tanto
disponibilização dos equipamentos. nas redes públicas, quanto na rede
Também é necessário investir em in- privada de educação básica, profis-
fraestrutura básica – energia elétrica sional e superior, é o Projeto Com-
e salas adequadas -, o que muitas putador Portátil para Professores,
escolas não possuem. instituído em 04 de julho de 2008,
A formação dos profes- através do Decreto Presidencial n.
sores dessas escolas também está 6504, no âmbito do Programa de
sujeita aos mesmos problemas Inclusão Digital, com a participação
enfrentados pelos professores das da Empresa Brasileira de Correios e
52

Telégrafos - ECT. O previsto é que o os professores, a falta de conheci-


projeto possibilite a cada professor mento e domínio do ambiente e da
a compra de um notebook pelo lógica digital provoca estranhamen-
valor de até R$1.400,00. O enten- to e medo pelo desconhecido, pois,
dimento é que os notebooks podem ao entrar em contato com essa nova
“auxiliar na formação intelectual realidade, o professor fica diante
e pedagógica dos professores, a de fatos que eram inexistentes em
partir da interação com as novas sua cultura de origem e, na maioria
tecnologias da informação e comu- das vezes, foi inexistente em sua
nicação” bem como “propiciar um formação inicial.
ambiente favorável à inovação na Bonilla e Pretto (2007),
área de educação, paralelamente ao ao analisarem a relação que os
desenvolvimento de futuras tecno- professores, participantes do Pro-
logias na área pedagógica e social, grama de Formação Continuada
contribuindo assim para a melhoria de Professores para o município
da qualidade do ensino público de Irecê – BA, desenvolvido pela
brasileiro” (BRASIL, 2008). Faced/UFBA, estabelecem com as
Consideramos que o aces- TIC, reconhecem a importância do
so dos professores aos computa- acesso, mas consideram que este
dores é fundamental, até porque não é condição suficiente para a
a maioria deles não dispõe dessa construção da cultura digital e a
tecnologia em suas casas ou escolas. produção de conhecimentos reque-
No entanto, sem uma política forte ridos pelas dinâmicas de um curso
de formação para o seu uso, como de formação. Para viabilizar tais
poderá o professor, sozinho, formar- dinâmicas, é necessário a abertura
se intelectual e pedagogicamente, para a liberdade de experimentar
inovar e desenvolver tecnologia? diversas possibilidades oferecidas
Atribuir essa função ao professor, pelas TIC, compartilhando desco-
individualmente tem como base bertas e aprendizados, de forma a
a concepção de que os sujeitos quebrar a máxima “cada um por si”
aprendem espontaneamente a in- e instituir uma organização colabo-
teragir com os ambientes digitais, rativa que propicie a multiplicação
online e offline. Essas aprendiza- de ideias e a constituição de uma
gens acontecem efetivamente, mas nova cultura, a cibercultura.
são mais comuns entre os jovens, O Projeto Computador
desejosos de viver e experimentar Portátil para Professores foi criado
a não-linearidade da cultura digital. em julho de 2008, mas sua imple-
Entre os adultos, e mais ainda entre mentação foi iniciada apenas no
Ano XXII, n° 34, junho/2010 53

final de agosto de 2009, abrangendo aquisição de 150 mil laptops para a


inicialmente 64 municípios, numa fase II do projeto, mas no início de
fase de testes. A segunda fase iniciou 2008 cancelou o pregão, em virtude
em meados de outubro de 2009, de os preços dos laptops estarem
atendendo todos os municípios acima do projetado. No final de
brasileiros. No site dos Correios, 2008, nova licitação foi aberta e,
em setembro de 2010, apenas uma uma vez mais, o andamento do
opção de computador estava dispo- processo foi paralisado por ordem
nível8 para venda. Ou seja, mais um do Tribunal de Contas da União, em
projeto com implementação lenta, virtude de denúncias de irregulari-
cheio de limitações e de retrocessos, dades no edital.
uma vez que não são oferecidas as Em meio a essas idas e
condições básicas (diversidade de vindas, em 05 de julho de 2008,
oferta e/ou articulação entre os di- o jornal Folha de São Paulo divul-
versos setores envolvidos) para que gou uma nota informando que o
os mesmos possam ser colocados à Presidente Lula havia desistido de
disposição da população. comprar os laptops por considerar
Outro projeto vinculado que o projeto ficou caro demais e
ao MEC é o UCA (Um Compu- que teria menos eficiência do que
tador por Aluno) que vem sendo instalar laboratórios de informática
desenvolvido desde 20079 e “visa nas 55 mil escolas públicas do país.
criar e socializar novas formas de No entanto, o Conselho de Altos
utilização das tecnologias digitais Estudos e Avaliação Tecnológica da
nas escolas públicas brasileiras, Câmara dos Deputados, ao avaliar a
para ampliar o processo de inclu- experiência, reconhece que a monta-
são digital escolar e promover o gem de laboratórios de informática,
uso pedagógico das tecnologias de a exemplo do Proinfo, restringe o
informação e comunicação” (UCA, uso dos alunos a uma carga horária
2009, p. 1). Este é outro projeto reduzida, e a uma grade de discipli-
com implementação lenta, devido a nas, mantendo as mesmas dinâmicas
problemas nos processos de aquisi- do sistema tradicional de ensino,
ção dos computadores. No final de não adequado aos espaços-tempos
2007 o governo abriu licitação para necessários para a construção do

8 O modelo disponível no site dos Correios, em setembro de 2010, era o CCE WIN ILP 232 - Notebook
14.1” Intel Pentium Dual Core T4.200 2,0Ghz 2GB HD320GB, no valor de R$ 1.199,00.
9 De 2007 a 2009 o programa encontrava-se em sua fase pré-piloto, em desenvolvimento em
cinco escolas brasileiras: Porto Alegre, São Paulo, Brasília, Palmas e Piraí-RJ.
54

conhecimento na contemporanei- dos curriculares? É a perspectiva de


dade. Essa metodologia também não uso da tecnologia como ferramenta
propicia a vivência plena da cultura de ensino? Qual a relação entre a
digital, componente fundamental dimensão pedagógica e a inclusão
dos processos de inclusão digital. digital? Apesar de essas questões
não estarem em discussão, nem
A imersão tecnológica da escola haver clareza sobre a imbricação
propicia o desenvolvimento de entre elas, a avaliação do Conselho
uma “cultura digital”, na qual de Altos Estudos e Avaliação Tecno-
os alunos têm suas possibilida- lógica da Câmara dos Deputados já
des de aprendizagem ampliadas indicava que “nos moldes atuais, a
pela interação com uma multipli- inclusão digital oferecida pelos pro-
cidade de linguagens ao mesmo gramas pré-piloto é um tanto quanto
tempo em que se potencializa a limitada, ainda que mais efetiva do
inclusão digital de toda a comu- que a ofertada pelos laboratórios de
nidade escolar. (CÂMARA DOS informática” (CÂMARA DOS DEPU-
DEPUTADOS, 2008, p. 16) TADOS, 2008, p. 161). Isso porque,
nessa fase pré-piloto, mesmo levan-
Apesar dessa potencialida- do os laptops para casa, os alunos
de estar presente no projeto UCA, não dispunham de conexão internet.
uma vez que os alunos estarão em Também, quase todas as escolas es-
contato mais intenso e livre com os tabeleceram políticas de restrição de
laptops, podendo se comunicar, pro- conteúdos, bloqueando o acesso a
duzir vídeos, explorar os mais diver- determinados sites. O documento da
sos ambientes online, não estava ex- Câmara dos Deputados anuncia que
plicitada nos primeiros documentos alguns docentes e gestores revelaram
essa perspectiva de inclusão digital. que, no primeiro mês, foi preciso
Tais documentos, quando referiam- ser tolerante e permitir a exploração
se à inclusão digital, reportavam-se de aplicativos, orkut, games e sítios
à possibilidade de uso pela família de interesse da garotada, mas que,
de cada aluno e também ao acesso após essa fase inicial de exploração,
a serviços do governo eletrônico os bloqueios foram impostos. Ou
disponíveis online. O foco do pro- seja, exploração desses ambientes,
jeto era o potencial pedagógico dos para formação da cultura digital, é
laptops na sala de aula. E nem isso confundida com “tolerância”, e con-
estava claramente definido. O que siderada como algo “menor”, sem
é entendido como pedagógico? Essa valor educacional e que, portanto,
dimensão está limitada aos conteú- deve ser excluída da escola.
Ano XXII, n° 34, junho/2010 55

Apesar de todas essas li- professores começaram o processo


mitações na implementação do de formação. Como os processos
projeto e no trato com o tema da de inclusão digital, ou seja, de for-
inclusão digital em sua fase pré- mação da cultura digital serão de-
piloto, durante todo o ano de 2009 sencadeados a partir daqui depende
o projeto prosseguiu, com a tra- dos encaminhamentos dados pelas
mitação do pregão para a compra equipes das IES durante a formação,
dos equipamentos, a seleção das mas também das diretrizes postas
escolas que comporiam a próxi- nos documentos do projeto.
ma fase (piloto) e a realização da Os documentos elabora-
avaliação das cinco experiências, dos para esta nova fase apresentam
com cada instituição elaborando um alargamento na perspectiva de
relatórios sobre a escola (descrição inclusão digital e de uso dos com-
e contexto), a infra-estrutura e as putadores nas escolas. O livreto
questões técnicas, os problemas e Formação Brasil (UCA, 2009) con-
as soluções relacionados à gestão tinua destacando a importância do
da escola, e ainda sobre as expe- uso pedagógico dos laptops, mas
riências educativas relacionadas também destaca a necessidade de
ao uso dos equipamentos. Então, criação de uma cultura de redes
em janeiro de 2010 foi divulgado
cooperativas, de utilização das
que o consórcio CCE/DIGIBRAS/
ferramentas interativas da web 2.0,
METASYS foi vencedor do pregão
do desenvolvimento de processos
para o fornecimento de 150.000
cooperativos e solidários, de um
laptops educacionais, a um preço
uso mais intenso dos processos co-
unitário de R$550,00, para as 300
municacionais, da movimentação
escolas públicas selecionadas nos
da escola no sentido de constituir-
estados e municípios para integrar
a próxima etapa do projeto. A par- se uma organização aprendente,
tir de então o mesmo ganha força, que se desenvolve e reestrutura a
com a organização das equipes de partir das práticas horizontaliza-
formação e pesquisa e o envolvi- das que vão sendo propostas. São
mento das IES na operacionalização justamente esses objetivos que po-
da fase piloto do projeto – formação dem viabilizar a imersão da escola
dos professores das 300 escolas e (alunos, professores e comunidade)
acompanhamento do processo. É na cultura digital, desde que efeti-
nesta fase que se encontra o projeto vamente todos tenham a liberdade
neste momento. Os laptops chega- de explorar a multiplicidade de
ram às escolas selecionadas e os linguagens e ambientes online.
56

Caso contrário, teremos de informações. O que nós


mais uma vez a redução dos lap- precisamos— e essa é a cha-
tops a uma mera ferramenta, a ser ve do que eu defendo — é
enquadrada na rigidez e na chatice formar cidadãos produtores
da escola, bem como a manuten- de cultura e de conhecimen-
ção do modelo comunicacional de to. E, para isso, a tecnologia
transmissão de informações. Neste é fascinante. (PRETTO apud
caso, a tecnologia continuará a ser DIAS, 2006).
tomada como um recurso a mais,
que serve apenas para complemen- Bonilla e Picanço (2005,
tar ou animar uma prática já instituí- p. 224-225) afirmam que para
da e não para transformar as formas ultrapassar essa perspectiva instru-
de pensar e produzir conhecimento. mental, as TIC devem ser tomadas
Alguns pesquisadores apontam a como elementos estruturantes das
limitação desta perspectiva. Nelson ações, mais especificamente, que
Pretto, em entrevista à Revista ARe- a REDE deve ser incorporada às
de, afirma que práticas presenciais de forma pa-
ralela, integrada e integrante com
apropriar-se dessas tecno- o conjunto das demais atividades,
logias como uma mera fer- de forma a favorecer a vivência
ramenta, do meu ponto de da interatividade, da colaboração,
vista, é jogar dinheiro fora. da auto-organização, da conecti-
Colocar computador, recur- vidade plena e efetiva com outros
sos multimídia e não sei mais nós que vão surgindo ao longo do
o quê para a mesma educação processo e não apenas com aqueles
tradicional, de consumo de delineados a priori. Desta forma, o
informações, é um equívoco. imprevisto, o diverso, o múltiplo
Ou nós trazemos essas tecno-
integra o processo educativo, que
logias com a perspectiva de
se transforma em um processo di-
modificar a forma de como se
ensina e de como se apreende nâmico, em constante movimento.
— e isso significa, fundamen- As subjetividades, as culturas, os
talmente, entender a intera- conhecimentos entrelaçam-se nas
tividade e a possibilidade da vivências desses novos espaços-
interatividade como sendo o tempos, transformando os sujeitos
grande elemento modificador e as sociedades.
dessas relações —, ou vamos Tais perspectivas estão em
continuar formando cidadãos sintonia com os estudos de Casto-
que são meros consumidores riadis (1987), quando afirma que
Ano XXII, n° 34, junho/2010 57

um objeto técnico não é um “ins- É o que podemos viven-


trumento” puro; deve ser tomado ciar, contemporaneamente, com
em uma rede de significações, que as redes digitais, especialmente na
depende da cultura e cuja eficácia geração da Web 2.0, que valoriza
produtiva é só um momento desse as práticas colaborativas, a comuni-
processo. Dessa forma, cação, a resolução de problemas, a
autoria, em comunidades virtuais,
objeto não é nada como objeto que se articulam em torno de obje-
técnico fora do conjunto técnico tivos comuns, independentemente
[...] a que pertence. [..] [Também] do local de origem de cada um de
não é nada fora das desteridades seus membros. Essas comunidades
corporais e mentais (que não são criam um movimento horizontal
absolutamente evidentes nem que fortalece aqueles que se en-
automaticamente induzidas pela contram às margens dos centros de
simples existência do objeto) poder de decisão da sociedade, ou
que condicionam sua utilização; as “bordas da rede” (PRIMO, 2008,
a ferramenta como tal, [...] ‘só é p. 64), transformando as formas de
o testemunho da exteriorização ser, conhecer, comunicar e produzir
de um gesto eficaz’. Conjunto em sociedade.
técnico e desteridades podem Promover a inclusão digi-
tanto induzir à invenção, ou ao tal é, na nossa percepção, oportu-
empréstimo de um objeto, quan- nizar que cada sujeito social pos-
to modificar, às vezes ‘regressi- sa, efetivamente, participar desse
vamente’, as suas modalidades movimento, não sujeitando-se às
de uso [...] ou condicionar o seu práticas que o condicionam a mero
produto. Enfim esse objeto é ele consumidor, seja de informações,
próprio um produto; sua gênese seja de bens, seja de cultura. O
contribui portanto à totalidade papel da educação é favorecer a
da existência social da coleti- “luta pela prevalência da colabora-
vidade que o originou: não só ção e do compartilhamento sobre a
suas ‘aptidões mentais’, mas sua competição e o aprisionamento do
organização do mundo e o viés conhecimento” (BRANT, 2008, p.
específico que o caracteriza. [...] 73), ser um espaço de crítica e res-
O próprio conjunto técnico é significação de todos os processos
privado de sentido, [técnico ou sociais, de forma a tornar-se um fa-
outro], se o separarmos do con- tor de liberdade do conhecimento,
junto econômico e social. (CAS- dos sujeitos, da sociedade. Para tan-
TORIADIS, 1987, p.251) to, as políticas públicas de inclusão
58

digital na escola necessitam estar BONILLA, Maria Helena;


articuladas, não só na origem, mas, PRETTO, Nelson De Luca.
especialmente, na implementação, Formação de Professores: as
bem como envolver toda o processo TIC estruturando dinâmicas
que leva à formação da cultura digi- curriculares horizontais. In:
tal da comunidade escolar, urbana ARAÚJO, Bohumila; FREITAS,
e rural, desde a conexão à internet, Katia S. (coords.). Educação
passando pela infraestrutura, pela a Distância no contexto
disponibilidade dos esquipamentos, brasileiro: experiências em
pela formação dos professores, até a formação inicial e formação
reorganização dos espaços-tempos continuada. Salvador: ISP/
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