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Capítulo 25
1 APRESENTAÇÃO
Políticas públicas, programas e projetos desenvolvidos pelo governo provocam, geralmente,
duas emoções: o entusiasmo inicial deflagrado com a formulação ou reformulação de ações
do poder público e, em seguida, a decepção decorrente dos resultados concretos alcançados
por tais iniciativas. A aproximação destes dois polos é tarefa que cabe à avaliação de políticas
públicas, seja pela provisão de subsídios que informem melhor o desenho e a formulação de
políticas, seja pela produção de conhecimento que aprimore seu funcionamento e ajude-as
a gerar melhores resultados. Tais funções se fazem ainda mais relevantes no contexto de
sociedades em constante processo de complexificação, nas quais novas demandas são propostas
continuamente ao Estado, ao mesmo tempo que antigas demandas são revistas. Em meio a
este dinamismo, a reflexão sobre o Estado e suas intervenções deve ser permanente para
permitir os necessários ajustes, reformulações e redirecionamentos nas suas políticas públicas.
Este desiderato, porém, não se alcança sem complicações, uma vez que avaliar políticas
públicas, seus resultados e impactos não constitui tarefa simples, tanto do ponto de vista
político quanto metodológico ou operacional.
Este capítulo tem como objetivo apontar e discutir as potenciais contribuições de
métodos de pesquisa qualitativa para a avaliação de políticas públicas. O foco neste conjunto
específico de técnicas tem por finalidade resgatar a contribuição singular que tais métodos
podem oferecer ao cumprimento do objetivo último da tarefa de avaliação da atuação estatal:
colaborar para seu aperfeiçoamento contínuo. Por estas razões, este capítulo não visa retomar
as já ultrapassadas querelas entre métodos de pesquisa quantitativos e qualitativos (BRADY
e COLLIER, 2004; KING, KEOHANE e VERBA, 1994), mas buscar compreender a
utilidade e contribuição de técnicas de coleta e análise de dados qualitativos para um melhor
entendimento sobre o funcionamento de políticas públicas e para a produção de conhecimento
útil e aplicável ao seu aprimoramento.
Argumenta-se que métodos qualitativos oferecem oportunidades para a formulação de
descrições aprofundadas de contextos, processos e mecanismos que permitem explicar os
resultados obtidos a partir das características e circunstâncias de operação de programas e
projetos. Isto se torna possível uma vez que a pesquisa qualitativa permite a exploração da
natureza complexa da organização social e do conjunto de variáveis que se articulam tanto no
plano dos incentivos institucionais e organizacionais quanto no plano dos valores, percepções
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e práticas compartilhadas pelos indivíduos e grupos que executam políticas ou que são afetados
por elas. Alguns pressupostos comportamentais que frequentemente informam o desenho de
políticas públicas e orientam os modelos formais próprios da análise quantitativa somente
podem ser efetivamente atestados e compreendidos na observação do fazer prático dos atores
envolvidos. Assim, mesmo reconhecendo-se os méritos das técnicas de pesquisa quantitativa e
os avanços inestimáveis por elas proporcionados, deve-se observar que os métodos qualitativos
de avaliação contribuem principalmente para a correção e produção de noções que sejam não
apenas mais voltadas para a compreensão de processos concretos, mas também mais diretamente
aplicáveis aos fazeres práticos das burocracias implementadoras de políticas públicas.
O capítulo encontra-se organizado da seguinte forma. A segunda seção, após esta
introdução, revê brevemente a constituição do campo de avaliação de políticas públicas
nos anos 1960 e 1970, explicitando suas origens, pretensões e dois pressupostos-chave que
guiaram o seu desenvolvimento até o presente: a ideia de um fluxo linear no ciclo de atividades
envolvidas na produção de políticas públicas e o foco no binômio objetivo–resultado enquanto
orientador dos esforços de análise. Na sequência, resgata-se a literatura sobre implementação de
políticas públicas, enfatizando-se como os achados de estudos nesta área colocaram em questão
os aludidos pressupostos, ao demonstrarem as inconsistências ou não linearidades introduzidas
pelos elementos humanos, institucionais e organizacionais que medeiam a transformação de
decisões sobre políticas em ações e procedimentos produtores de resultados.
Os questionamentos levantados sugerem oportunidades importantes para a aplicação de
métodos de pesquisa qualitativa na avaliação de políticas públicas. Ao perscrutar o universo dos
operadores de políticas, seus comportamentos, crenças, práticas, opiniões e narrativas baseadas
na experiência cotidiana, a aplicação de métodos qualitativos oferece uma compreensão mais
refinada sobre os elementos contextuais, simbólico-valorativos e institucionais que permitem
explicar os resultados obtidos a partir das características e circunstâncias de operação de
políticas, programas e projetos. Com o objetivo de dar maior concretude a tais discussões,
a terceira seção apresenta exemplos de avaliações qualitativas já realizadas, destacando suas
principais contribuições para a reflexão e o aprimoramento de políticas públicas. Por fim,
a conclusão aponta perspectivas para a maior utilização deste tipo de avaliação no contexto
das políticas públicas brasileiras.
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1. O periódico Evaluation Review, lançado em 1976, foi provavelmente o primeiro dedicado exclusivamente ao tema, seguido posteriormente
por quase uma dúzia de publicações de natureza semelhante, como Evaluation Practice, American Journal of Evaluation, Evaluation and Program
Planning e Evaluation: The International Journal of Theory, Research, and Practice. Com relação aos encontros científicos e associações profissionais,
destacam-se as associações americana, canadense, australasiana e europeia de avaliação. Para um mapeamento mais completo dos periódicos e
encontros científicos da área de avaliação, ver Rossi, Lipsey e Freeman (2004).
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2. A ideia de um ciclo de políticas públicas é alvo de intenso debate tanto do ponto de vista teórico quanto aplicado. Para uma análise que proble-
matiza esta noção e reconstitui as tensões entre planejamento e gestão no governo federal brasileiro ao longo do século XX, ver Cardoso (2010).
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3. O conceito de eficácia está ligado ao alcance dos objetivos e metas de um projeto ou política pública em um dado período de tempo
com relação a um determinado público-alvo. Refere-se ao resultado de um processo e sua correspondência com os objetivos originalmente
traçados. Assim, uma política é tão mais eficaz quanto mais os resultados por ela alcançados se aproximem dos objetivos a ela atribuídos.
A eficiência, por sua vez, corresponde à utilização competente de recursos para se atingir determinados resultados. Uma política é tão mais
eficiente quanto mais racionalmente utilize os recursos para a sua implementação, isto é, quanto mais otimize os fatores disponíveis. Já o
conceito de efetividade situa os resultados produzidos por uma política – e, assim, a própria política – em um contexto mais amplo. A efetivi-
dade envolve, muitas vezes, a avaliação de impactos, pois procura diagnosticar reflexos mais abrangentes de uma intervenção em contextos
não imediatamente ligados à sua produção. Neste caso, não existe uma preocupação específica com os custos envolvidos ou com os objetivos
específicos previamente estipulados (Universidade de Campinas, 1999; Rossi, Lipsey e Freeman, 2004). A definição dos conceitos de eficácia,
eficiência e efetividade é objeto de intensa discussão, tendo em vista que diferentes autores acabam atribuindo diferentes funções a estes
elementos de avaliação. O objetivo deste capítulo não é entrar neste debate, mas apenas mobilizar tais noções no sentido de mostrar as
dificuldades inerentes à avaliação de políticas públicas.
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4. O estudo de Pressman e Wildavsky (1973) figura entre os pioneiros na incorporação do conflito aos debates sobre avaliação. Porém, o estudo do
conflito nas políticas públicas tem trajetória mais longa. Décadas atrás, Lindblom (1959) já havia alertado para a inevitabilidade do conflito na con-
dução de políticas públicas, uma vez que elas resultam do confronto de distintos interesses e pressões por parte de variados atores. Posteriormente,
autores como Allison (1969) e Lowi (1972) construíram tipologias sobre como diferentes tipos de conflito afetam políticas públicas. Kingdon (1995)
frisou o papel do conflito na etapa de formulação de políticas e definição da agenda pública (agenda setting).
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A partir dos anos 1980, surge outra resposta ao problema da discrepância entre objetivos
e resultados alcançados, a qual enfatiza a natureza necessariamente política do processo de
implementação. Nesta vertente, pesquisadores questionaram a percepção da implementação
enquanto uma etapa de um processo mecânico e linear de tradução de metas em rotinas
de operação – o “ciclo de políticas públicas”. Estes autores argumentaram que a etapa de
implementação diz respeito a questões, conflitos e decisões fundamentais sobre “quem recebe o
quê?”. Os estudos de Grindle e Thomas (1989;1990), Allison (1969), Nakamura e Smallwood
(1980) e BID-Ipes (2006) ressaltam que os objetivos e formatos organizacionais de políticas e
programas são afetados e constantemente remodelados por barganhas entre gestores públicos,
elites políticas e grupos de interesse, devido a disputas por recursos administrativos e poder,
e a diferentes visões sobre uma política.
Uma terceira linha de pesquisa desagregou o Estado e suas organizações para investigar o
papel desempenhado por burocratas de linha de frente (street-level bureaucrats) e sua influência
no desempenho e na redefinição dos objetivos de uma política pública. Neste campo, citem-se
os trabalhos de Lipsky (1980), Wilson (1968; 1989), Silbey (1981; 1984), Silbey e Bittner
(1982), Tendler (1997), Maynard-Moody e Musheno (2003).5 Esta resposta ao “problema
da implementação” introduziu uma mudança paradigmática, visto que demonstrou o papel
crucial desenvolvido por atores até então ignorados nas avaliações de políticas públicas.
De acordo com esta vertente, burocratas de linha de frente gozam inevitavelmente de um
alto grau de discricionariedade (em virtude da escassez de recursos, objetivos ambíguos,
dificuldade de supervisão etc.) na tomada de decisões sobre como implementar a política.6
Por consequência, não se pode compreender a implementação de políticas e o desempenho
organizacional sem consideração às regras, pressões e situações vivenciadas pelos funcionários
de linha de frente (professores, policiais, fiscais etc.) em seu cotidiano de trabalho.7
Os impactos da literatura relativa aos “burocratas de linha de frente” foram
consideráveis. Primeiramente, ela trouxe para os estudos sobre a implementação de políticas
públicas conceitos já consolidados na teoria organizacional (por exemplo, os conceitos de
5. A percepção de que os funcionários de linha de frente possuem discricionariedade na condução de suas tarefas laborais cotidianas já era corrente em
estudos sobre corporações policiais ou agentes do judiciário desde os anos 1960 e 1970 (ver Davis, 1969; Wilson, 1968; Van Maanen, 1973; Bittner, 1967).
6. As burocracias de linha de frente (street-level bureaucracies) são caracterizadas pela gestão de recursos escassos diante de demandas abundantes
e objetivos ambíguos. Seus funcionários frequentemente lidam com “clientes” não voluntários (beneficiários de programas) e trabalham em campo,
distantes de seus supervisores, em situações complexas e não reduzíveis a objetivos programáticos. O argumento principal de Lipsky (1980) é que,
sob estas condições, burocratas de linha de frente “definem” as políticas que originalmente eles eram responsáveis por implementar, à medida que
lidam com as circunstâncias, pressões e incertezas envolvidas em seu trabalho.
7. O livro Administrative Behavior, de Herbert Simon (1947), já continha uma percepção semelhante: “A tarefa concreta de realização dos objetivos
de uma organização recai sobre as pessoas que operam nos níveis mais baixos da hierarquia administrativa. (…) No estudo de organizações, o
funcionário de nível operacional deve ser o foco de atenção, pois o sucesso da estrutura será julgado com base em seu desempenho dentro dela.
Uma melhor compreensão sobre a estrutura e o funcionamento de uma organização pode ser obtida por meio da análise da maneira pela qual as
decisões e os comportamentos de tais funcionários são influenciados pela organização em seu âmbito” (p. 1-2, tradução livre).
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8. Esses conceitos emergiram fundamentalmente enquanto críticas à abordagem da escolha racional, chamando a atenção para limitações inerentes
ao processo de tomada de decisão racional, tais como falta de informações e conhecimento prévio sobre as consequências de decisões, e incapaci-
dade de prever os desdobramentos de diversos cursos de ação. Estas críticas foram sintetizadas por March (1994) na oposição entre as noções de
satisficing e maximizing. De acordo com o autor, agentes racionais tomam, de fato, decisões satisfatórias (good enough), isto é, as decisões melhores
possíveis dadas as limitações cognitivas e informacionais inerentes ao processo, não se verificando empiricamente o comportamento maximizador
previsto pela abordagem clássica da escolha racional.
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9. Em texto sobre a “sistematização de experiências”– outra modalidade de produção de conhecimento para o aperfeiçoamento de políticas
públicas, cujo desenvolvimento deve mais à tradição crítica latino-americana que à tradição analítica norte-americana –, Jara sugere que
a tarefa de “conhecer a realidade para transformá-la” (2006, p. 39) engloba três possibilidades: a pesquisa, a avaliação e a sistematização.
À terceira possibilidade se atribui o foco “nas dinâmicas dos processos” (2006, p. 40). Ao longo do texto, o autor traça o limite entre “avaliação”
e “sistematização” segundo se trate de examinar a política pelo ângulo dos beneficiários ou dos implementadores: os efeitos para fora seriam
compreendidos mediante estratégias de avaliação, enquanto os efeitos para dentro seriam compreendidos mediante estratégias de sistematização.
Embora longe de ser consensual, esta distinção tem a virtude de revelar, mais uma vez, um ponto no qual este texto tem buscado insistir: como
experiência social significativa, a implementação de políticas públicas gera aprendizados que não podem ser ofuscados pela preocupação exclusiva
com a mensuração de resultados, ainda que os procedimentos para efetuá-la tenham as suas peculiaridades.
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Entre uma variedade de instrumentos para a produção de dados qualitativos, destacam-se como
os mais utilizados: entrevistas, observações sistemáticas e pesquisa documental. Entrevistas visam
captar opiniões declaradas, percepções individuais e relatos de experiências pessoais sobre assuntos
de relevância para a pesquisa. Variam quanto ao seu grau de estruturação prévia (roteiro) e quanto ao
número de sujeitos entrevistados. Em relação ao primeiro eixo, entrevistas podem seguir roteiros total
ou parcialmente predeterminados (estruturados ou semiestruturados), ou podem ser abertas. Entrevistas
abertas se orientam por algumas questões centrais (preocupações avaliativas) e tiram proveito de sua
indeterminação para explorar assuntos relevantes à pesquisa que o pesquisador não teria antevisto ou
pensado em perguntar. Em relação ao segundo eixo de variação, entrevistas podem ser respondidas por
indivíduos e por grupos de respondentes, o grupo focal. Grupos focais reúnem conjuntos de indivíduos
que ofereçam um espectro informativo de opiniões sobre um assunto, com formações e características
propositadamente semelhantes ou diferentes, dependendo do objetivo da pesquisa, ou que reajam a uma
discussão provocada sobre um tópico de interesse mútuo.
(Continua)
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(Continuação)
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10. A fiscalização exercida pela SIT/MTE integra, por força da Constituição de 1988, com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Justiça do
Trabalho, o tripé institucional para proteção e garantia dos direitos trabalhistas. Por um lado, o MPT e a Justiça do Trabalho, respectivamente, incitam
e julgam processos judiciais, reforçando ou criando interpretações das leis. Estes órgãos fortificaram suas capacidades de intervenção na produção
da regulação do trabalho a partir da década de 1990. Por outro lado, cabe à inspeção do trabalho a tarefa de “polícia administrativa”, por meio da
fiscalização contínua de ambientes de trabalho e da autuação imediata dos infratores da lei (multas administrativas). Visando ao cumprimento de
tal função no âmbito deste ambiente institucional, a SIT/MTE elabora as diretrizes nacionais de inspeção e supervisiona as atividades dos auditores
fiscais do trabalho distribuídos em 27 superintendências regionais de trabalho e emprego (SRTEs).
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11. Esses e diversos outros casos são objeto de análise e discussão pormenorizada em Pires (2009).
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diversos. Nestes casos, funcionários de uma mesma agência tinham sua base centralizada e
distante dos funcionários de outras agências, assim como dos colonos. Por estarem localizados
relativamente mais próximos às pequenas cidades da região, com suas próprias opções de
entretenimento e diversão, os centros administrativos destes projetos não possuíam atividades
de socialização e recreação, como no outro tipo de projeto analisado.
Assim, diferenças no desempenho do programa e o fracasso de alguns de seus projetos
puderam ser explicados com base em distintas formas de interação e solidariedade entre
funcionários das diversas agências envolvidas, os quais, por sua vez, eram sustentados por
diferentes padrões de habitação e moradia.12
12. Em seu estudo, Bunker (1988) detalha diversos episódios ocorridos nos dois tipos de projeto, ilustrando de forma bastante concreta e convin-
cente os achados da sua avaliação.
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4 Conclusão
Avaliar políticas públicas ou programas e projetos desenvolvidos e implementados por
organizações do Estado não constitui tarefa simples. Para tal, existem diversas ferramentas à
disposição de avaliadores, cada qual ancorada em distintas tradições e perspectivas teórico-
metodológicas. Este capítulo pretendeu iluminar a potencial contribuição de métodos
qualitativos para a avaliação de políticas públicas.
Por meio de exemplos de avaliações qualitativas, tais como os apresentados na seção
anterior, percebe-se o potencial destas estratégias não apenas para diferenciar projetos
bem-sucedidos daqueles que falham em produzir os resultados esperados, mas também
para construir explicações sobre os elementos de ordem contextual, simbólico-valorativa,
institucional e organizacional que se associam diretamente às consequências mais imediatas
da intervenção. A identificação destes elementos faz-se relevante, pois são os aspectos cuja
interferência, alteração e reformulação encontram-se ao alcance dos atores governamentais
encarregados de produzir políticas públicas.
Além da identificação e compreensão do papel desses aspectos corriqueiros de uma
política pública, a aplicação de instrumentos de análise qualitativa abre oportunidades para
a construção de posturas reflexivas voltadas para o constante aperfeiçoamento de políticas,
programas e projetos, inspirado no aprendizado a partir de erros e acertos.
Por fim, espera-se que as percepções e argumentos revelados neste texto sirvam como
estímulo adicional a um processo já em andamento de desenvolvimento e aplicação crescente
de técnicas qualitativas para a avaliação de políticas públicas.
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