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1. Preliminares
A primeira definição de sintaxe encontrada nos estudos gramaticais do mundo ocidental é
de Prisciano (século V d.C.), para quem a sintaxe é "a disposição que visa a obtenção de uma
oração perfeita" (cf. SILVA:1989, 20). Considerando tal fato, minha reflexão sobre o tema proposto
passa pela explicitação dos aspectos fundamentais que caracterizam duas fases da reflexão sobre a
linguagem na civilização ocidental:
(i) uma tradição gramatical - iniciando-se com os antigos gregos (século V a.C.) e indo até o
século XIX - que, além de ter como preocupação essencial a relação língua/pensamento, o paren-
tesco entre as línguas e a evolução das formas lingüísticas de línguas particulares, busca estabelecer
as regras da "arte de falar e escrever corretamente";
(ii) a chamada Lingüística Moderna - compreendendo os estudos realizados ao longo deste
século XX -, na qual a língua é assumida como objeto de estudo e a preocupação prescritivista é
abandonada.
O meu objetivo principal é, portanto, explicitar a noção predominante de sintaxe assumida:
1º) nos estudos gramaticais realizados na fase pré-Lingüística, que serviram de base à
chamada Gramática Tradicional;
2º) em alguns modelos de análise formulados no âmbito da Lingüística.
Em função desse objetivo, o presente texto está organizado da seguinte maneira: a seção 2
sintetiza o tratamento dado aos fatos sintáticos na Tradição Gramatical e a seção 3 explicita os
pressupostos teóricos básicos que caracterizam as principais correntes da Lingüística, buscando
colocar em evidência a concepção de sintaxe assumida na Gramática Gerativa.
priorizam a elaboração de uma teoria das "partes do discurso" - resultam: descrições sintáticas
baseadas nas relações entre o verbo e o substantivo e entre essas duas "partes do discurso" e as
demais (para Dionísio de Trácia, a sintaxe cuidava da combinação de elementos: letras, que formam
sílabas, que formam palavras, cujos significados formam frases), a distinção entre transitividade e
intransitividade, as noções de palavra regente e palavra regida.
As especulações filosóficas dos clássicos são retomadas pelos estudos Renascentistas,
estendendo-se até o século XVIII. Nessa época, consolida-se a preocupação pedagógica dos estudos
gramaticais, entre os quais se destaca a Grammaire Générale et Raisonné, de Lancelot & Arnauld,
publicada em 1660 - nessa gramática, o capítulo "Da sintaxe ou construção das palavras em
conjunto" (cf. Gramática de Port Royal, Martins Fontes, 1992, p. 137-43) trata da regência, da
concordância e de figuras de construção.
As concepções nas quais se fundamentam tais estudos nos chegam através de gramáticas
pedagógicas, ou seja, compêndios de fatos e "regras" gramaticais, elaborados com fins escolares e
tomando por base a "língua" de textos literários.
1º) as frases são constituídas de palavras, o que permite dizer que, em (1) abaixo, doze
palavras formam uma frase (e, também, um período), contendo as três orações listadas em (2):
(1) Muitas pessoas acreditam que os Mamonas pressentiam que morreriam num acidente aéreo.
2º) as palavras preenchem funções sintáticas (de sujeito, predicado, objeto, etc.), ou seja,
constituem os (ou núcleos dos) termos da oração; em (2), por exemplo, a palavra pessoas é o núcleo
do sujeito da 1ª ORAÇÃO, que tem como predicado acreditam, um verbo transitivo que tem como
objeto direto a 2ª ORAÇÃO.
Nessa abordagem:
a) o período, que pode se constituir de uma única oração (período simples), se contém duas
ou mais orações classifica-se em composto por coordenação e composto por subordinação; nesse
último caso, figura, no mínimo, uma oração principal, ou seja, uma oração que tem uma outra
oração como um de seus termos e que recebe o nome de oração subordinada;
b) uma oração constitui-se de dois termos essenciais - o sujeito e o predicado - e,
dependendo das propriedades do verbo e de nomes nela contidos, uma oração apresenta termos
integrantes, que incluem os complementos verbais (objeto direto, objeto indireto e agente da
passiva) e o complemento nominal; além disso, a oração pode conter termos acessórios (adjunto
adnominal, adjunto adverbial e aposto).
estruturalismos), entre as quais se destaca o descritivismo americano - a escola contra a qual surge,
então, na década de 50, a Gramática Gerativa.
Essa sentença é constituída de duas grandes partes, que se constituem de partes menores,
que podem ser decompostas em outras partes menores até se chegar às palavras, conforme mostra a
representação contida em (4):
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A sentença (5) pode ser interpretada como: (a) O João comprou o carro que pertencia ao
Pedro; (b) O João comprou um carro que lhe foi vendido por Pedro, embora não pertencesse a
Pedro. Tal fato se explica por ser a sentença (5) o resultado de duas estruturas profundas - uma que
explica a interpretação (a) e outra que explica a interpretação (b), que podem ser representadas
através de (7a) e (7b), respectivamente:
A sentença (6) não apresenta o sujeito expresso, o que se explica pelo fato de ser tal
sentença derivada de uma estrutura profunda sobre a qual se aplicou uma regra de transformação,
conforme ilustrado através de (8):
um conjunto finito de opções na aplicação desses princípios (parâmetros) explicam o fato de haver,
ao mesmo tempo, semelhanças e diferenças entre as línguas naturais. Sob tal perspectiva, assume-
se, então, que:
a) as línguas não têm regras nem construções gramaticais (orações passivas, relativas, etc.),
a não ser como artefatos taxonômicos - ou seja, a variação entre as línguas se reduz à variação nos
valores associados aos parâmetros;
b) a gramática é um sistema de princípios, que se relacionam aos diversos subsistemas da
teoria: teoria X-Barra, teoria-θ, teoria de Caso, teoria da Ligação, teoria da Regência, teoria da
Fronteira e a teoria do Controle;
c) o léxico é visto como um componente central da teoria gramatical (cf. RAPOSO:1992,
89: "o léxico é o dicionário da gramática"), já que fornece as informações fonológicas, semânticas e
sintáticas das categorias lexicais relevantes (N, V, A, P), que são núcleos de categorias
sintagmáticas; mais exatamente: a estrutura de uma expressão lingüística - compreendendo dos
itens lexicais à frase - compõe-se, segundo FUKUI & SPEAS(1986), de projeções máximas
lexicais (NP, VP, AP e PP, cujos núcleos são, respectivamente as categorias lexicais N, V, A e P) e
projeções máximas funcionais, que são: IP ("Inflectional Frase"), que tem como núcleo a flexão; CP
("Complementizer Frase"), cujo núcleo é o complemenizador; o DP ("Determiner Frase"), que tem
como núcleo o determinante;
d) as regras de supressão deixam de existir;
e) as regras de deslocamento se reduzem a Mover , que se aplica em consonância com o
Princípio da Subjacência (incluído na teoria da Fronteira e responsável pelas condições sobre a
distância que um constituinte pode percorrer ao ser deslocado) e o Princípio das Categorias Vazias
(PCV) - que impõe condições sobre o licenciamento das categorias sem realização fonética, cuja
presença na estrutura está relacionada à teoria- e cuja natureza remete à teoria da Ligação (cf.
CHOMSKY:1982, uma categoria vazia (CV) pode ser: um vestígio = +anafórico, -pronominal;
uma variável = -anafórico, -pronominal; PRO = +anafórico, +pronominal; pro = -anafórico,
+pronominal).
Esse o modelo - denominado representacional, em oposição a derivacional - resulta da
articulação entre os vários níveis de representação da gramática: o componente de base deriva o
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O conjunto (10) contém frases interrogativas indiretas do inglês, nas quais se verifica a ex-
tração de objeto: em (10a), t1 (um vestígio) é tematicamente regido pelo verbo; t2 (outro vestígio)
ocupa a posição de Especificador de CP e a estrutura não apresenta barreira nem para regência nem
para o movimento.
Em (10b), tj é regido por antecedência por how porque não há barreira entre how e tj.
Quanto a ti, esse é um vestígio tematicamente regido pelo verbo (solve), satisfazendo portanto o
PCV; no entanto, há na estrutura uma barreira por herança (CP), o que provoca violação fraca da
subjacência; ou seja, a marginalidade da sentença (10b) deve-se apenas à violação da subjacência
em relação a ti.
Em síntese: O nível FL representa as propriedades semânticas determinadas pela estrutura
sintática das FRASES, entre as quais: a relação sujeito-predicado, as funções semânticas dos
argumentos da FRASE, a relação de co-referência entre argumentos, etc.. Além dessas
propriedades, existem aspectos da significação (tais como a coesão discursiva), que integram o
conhecimento do falante/ouvinte e que são ativados, de modo a ser permitida a interpretação global,
a articulação e o uso adequado das frases no discurso; esses aspectos, no entanto, não são
representados em FL - isso significa que, embora dignos de estudo sistemático, esses aspectos não
pertencem à gramática, ou seja, ao sistema formal da linguagem.
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(10) X"
/ \
ZP X'
/ \
X YP
REFRÊNCIAS
ARNAUD, Antoine e LANCELOT, Claude (1660) Gramática de Port-Royal ou Gramática Geral e
Razoada [Grammaire Generale et Raisonée] Tradução para o português: Bruni Fegni Bassetto e Henrique
Graciano Murachco, 1992. Martins Fontes, São Paulo.
CHOMSKY, N. (1968) Linguagem e Pensamento [Language and Mind] Tradução para o português:
Francisco M. Guimarães. 1971, Editora Vozes, Petrópolis/RJ.
CHOMSKY, N. (1981) Lectures on Government and Binding: The Pisa Lectures. Foris. Dordrecht.
CHOMSKY, N. (1982) Some Concepts and Consequence of the Theory of Government and Binding. The
MIT Press, Cambridge, Massachusetts.
CHOMSKY, N. (1986) Knowledge of Language: its nature, origin and use. Praeger, New York.
CUNHA, Celso & CINTRA, L. F. (1985) Nova Gramática do Português Contemporâneo, Rio de Janeiro,
Nova Fronteira.
FUKUI, N. & M. SPEAS (1986) “Specifiers and projection”. MITWPL 10. MIT, Massachusetts.
PERINI, M.: (1995) Gramática Descritiva do Português. SP, Ática
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