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Introdução à Álgebra Geométrica de Clifford

Presentation · November 2020


DOI: 10.13140/RG.2.2.15197.64481

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1 author:

André Mandolesi
Universidade Federal da Bahia
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Geometry, Probability and Information in Everettian Quantum Mechanics View project

Hermitian Linear Geometry and Complex Grassmann Algebra with Applications in Quantum Mechanics View project

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Motivação Produto Álgebra Propriedades Conceitos Aplicações Exemplos Refs.

Introdução à Álgebra Geométrica de Clifford

André L. G. Mandolesi
Instituto de Matemática e Estatı́stica, UFBA.
E-mail: andre.mandolesi@ufba.br

20/11/2020
Motivação Produto Álgebra Propriedades Conceitos Aplicações Exemplos Refs.

Motivação
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Álgebra Geométrica de Clifford é uma álgebra de multivetores, com


aplicações em geometria, fı́sica, robótica, computação gráfica, etc.

Já foi descrita como:


uma álgebra universal que contém todas as outras;
uma nova fundação para a Matemática;
uma linguagem unificada para a Matemática e a Fı́sica;
a cura para o vı́rus matemático das coordenadas.

Em parte isso é um exagero de marketing, que acabou sendo prejudicial à


popularização desse formalismo.

Exageros à parte, essa é uma álgebra bem poderosa e eficiente, que vale
à pena o esforço para dominá-la.

Mas qual a vantagem em relação a outras álgebras ligadas à geometria,


como a vetorial e a de Grassmann?
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Inconveniente dessas álgebras: vários produtos, nenhuma divisão.

Trabalho W = F~ · d,
~ mas dados W e d~ não dá para fazer F~ = W
d~
.

Torque ~τ = ~r × F~ , mas dados ~τ e ~r não dá para determinar F~ .

Bivetor área A = u ∧ v , mas A e v não determinam u.

Seria possı́vel ter divisão por vetor?

Sim, em casos muito especiais: R, C ∼ = R2 , H ∼= R4 e O ∼ = R8 são as


únicas ”álgebras de divisão”, espaços vetoriais (reais) com produto
V × V → V associativo (ou quase) que tem divisão.

Mas se o produto puder ”sair” de V (como o escalar V × V → R e o


exterior V × V → Λ2 V ), há outras possibilidades?
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Razões algébricas para ·, ×, ∧ não terem divisão:

Divisão requer inverso: dado v 6= 0, ter v −1 tal que v ∗ v −1 = 1.

No produto escalar, tomando v −1 = |vv|2 temos v · v −1 = 1.


Problema: um inverso útil deve permitir cancelamentos, (u · v ) · v −1 = u,
mas não é possı́vel encadear dois produtos escalares.

Produto vetorial pode ser encadeado, mas não é associativo, logo mesmo
que algum outro v −1 cancele v não podemos fazer

(u × v ) × v −1 = u × (v × v −1 ) = u.

Além disso, nem há vetor unidade ~1, tal que u × ~1 = u para todo u, para
podermos pedir que v × v −1 = ~1.

Produto exterior da álgebra de Grassmann pode ser encadeado, é


associativo, e tem escalar 1 como unidade, 1 ∧ u = 1u = u.
Mas v ∧ v −1 seria bivetor, logo não tem como dar o escalar 1.
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Razões geométricas:
Dados v e u · v = ±kProjv ukkv k, não há solução u única. Somando
vetores perpendiculares a v obtemos outras.

Dados v e u ∧ v = bivetor A, não há solução u única. Somando vetores


paralelos a v obtemos outras.

Idem para o produto vetorial: u × v = u 0 × v nessa segunda figura.


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Mas sabendo u · v e u ∧ v é possı́vel localizar u de maneira única:

É possı́vel combinar esses 2 pedaços de informação num único produto?

Álgebra de Grassmann permite somar escalar, vetor, bivetor, etc. sem


que essas componentes se “misturem”.

Logo a expressão u · v + u ∧ v faz sentido, e preserva as informações


necessárias.

Mas será que tem boas propriedades?


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Produto de Clifford
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Produto geométrico de Clifford (entre 2 vetores):

uv = u · v + u ∧ v = escalar + bivetor
Carrega informações suficientes para dados v e uv poder achar u.

Ex: em R2 , dados v = 4i + 3j e uv = 10 − 5i ∧ j, fazendo


(xi + yj)(4i + 3j) = 4x + 3y + (3x − 4y )i ∧ j e resolvendo sistema
achamos u = i + 2j . Tem como fazer de forma eficiente?

v −1 = v
|v |2 parece funcionar como inverso:
v v
v v −1 = v · + v ∧ 2 = 1 + 0 = 1.
|v |2 |v |

Ex: no exemplo acima, v −1 = (4i + 3j)/25. Mas para poder fazer


u = (uv )v −1 = (10 − 5i ∧ j)(4i + 3j)/25 falta saber fazer produto com
bivetor, e se é associativo.
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Vamos tentar definir o produto de 3 vetores, impondo distributividade.

(uv )w = (u · v + u ∧ v )w = (u · v )w + (u ∧ v )w .

Definimos o produto (u · v )w de escalar com vetor como usual, e (u ∧ v )w


com um tipo de regra de Leibniz mais um produto exterior de todos,

(u ∧ v )w = u(v · w ) − (u · w )v + u ∧ v ∧ w .
Por quê? Por enquanto a resposta é que vai funcionar. Obtemos

(uv )w = (u · v )w + u(v · w ) − (u · w )v + u ∧v ∧w
| {z } | {z }
vetor trivetor

Como u(vw ) = u(v · w + v ∧ w ) = u(v · w ) + u(v ∧ w ), para ter


associatividade precisamos definir também

u(v ∧ w ) = (u · v )w − v (u · w ) + u ∧ v ∧ w .
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Ex: no exemplo de antes,

25u = (10 − 5i ∧ j)(4i + 3j)


= 40i + 30j − 20(i ∧ j)i − 15(i ∧ j)j
= 40i + 30j − 20[i(j · i) − (i · i)j + i ∧ j ∧ i]
− 15[i(j · j) − (i · j)j + i ∧ j ∧ j]
= 40i + 30j − 20(−j) − 15i
= 25i + 50j.

Logo u = i + 2j, como tı́nhamos obtido.

Deu certo, mas é bem pior que o método de resolver o sistema!


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Calma, vai melhorar! Mas realmente esse caminho não parece promissor.

Dá para generalizar para mais vetores, obtendo um produto que pode ser
encadeado, é associativo, tem unidade e inverso.

Mas fica cada vez mais complicado:


o produto de 2 vetores deu escalar + bivetor;
o de 3 vetores deu vetor + trivetor;
o de 4 vetores daria escalar + bivetor + 4-vetor;
o de 5 vetores daria vetor + trivetor + 5-vetor;
o de 6 vetores daria escalar + bivetor + 4-vetor + 6-vetor;
etc.

Há algum jeito mais simples?


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Álgebra de Clifford
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Seja V espaço vetorial (real, por simplicidade) com forma quadrática q.

Forma quadrática é função q : V → R tal que, ∀ u, v ∈ V , c ∈ R:


q(cv ) = c 2 q(v ).
q(u+v )−q(u)−q(v )
B(u, v ) = 2 é forma bilinear.

B é simétrica, logo define um produto interno u · v = B(u, v ).

Obs: não precisa ser positivo-definido, e pode ser degenerado.

Vice-versa: produto interno u · v dá forma quadrática q(v ) = v · v = |v |2 .

Em Rn ou Rp,q usaremos a forma quadrática dada pelo produto interno.


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Def: Álgebra de Clifford C`(V ) é álgebra associativa com 1, gerada por V ,


tendo como única condição que v 2 = q(v ) para todo v ∈ V .

Ou seja, produto de v1 , v2 , . . . , vn ∈ V é a expressão v1 v2 . . . vn , mas se


vetores adjacentes são iguais seu produto vv é trocado pelo escalar q(v ).

Ex: em R2 , com q(v ) = |v |2 , temos i 2 = j 2 = 1, e ij = −ji pois

2 = q(i + j) = (i + j)(i + j) = i 2 + ij + ji + j 2 = 2 + ij + ji.

C`(R2 ) 1 i j ij
1 1 i j ij
i i 1 ij j
j j ji = −ij 1 jij = −i
ij ij iji = −j i ijij = −1

Parece artificial, mas dá resultado parecido com o de antes, exceto que
no lugar de i ∧ j aparece ij (que também é anti-simétrico!):

(i + 2j)(4i + 3j) = 4i 2 + 3ij + 8ji + 6j 2 = 10 − 5ij


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Na verdade, os produtos são equivalentes! Dados u, v ∈ V temos

(u + v )(u + v ) = q(u + v )
q(u) + uv + vu + q(v ) = q(u + v )
uv + vu = 2B(u, v )
uv + vu
=u·v
2
uv − vu
Definindo também u ∧ v = obtemos
2
uv + vu uv − vu
uv = + = u · v + u ∧ v.
2 2
Esse ∧ é bilinear e anti-simétrico, e coincide com o produto exterior de
Grassmann se definirmos ainda, para v1 , v2 , . . . , vn ∈ V ,
1 X
v1 ∧ v2 ∧ . . . ∧ vn = sgn(σ)vσ(1) vσ(2) . . . vσ(n) .
n!
σ∈Sn

C`(V ) ∼
= ΛV com novo produto, e dim C`(V ) = 2dim V .
Se q = 0 temos uv = u ∧ v , logo Grassmann é caso trivial de Clifford.
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Propriedades
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Distributivo, associativo, unidade 1 ∈ Λ0 V = R


Não é comutativo, mas como uv = u · v + u ∧ v temos:
u, v paralelos comutam:

uv = u · v = vu.

u, v ortogonais anti-comutam:

uv = u ∧ v = −vu.

Para vetores ortogonais v1 , v2 , . . . , vk ∈ V o produto de Clifford


coincide com o produto exterior,

v1 v2 . . . vk = v1 ∧ v2 ∧ . . . ∧ vk .
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Invertibilidade:
Todo vetor v ∈ V com q(v ) 6= 0 tem inverso v −1 = v
q(v ) .

Nem todo multivetor é invertı́vel.


Ex: se v ∈ V com v 2 = 1 então 1 + v não é, pois (1 + v )(1 − v ) = 0.
Versor = produto de Clifford de vetores invertı́veis.
É invertı́vel, com (v1 v2 . . . vk )−1 = vk−1 . . . v2−1 v1−1 .
Blade = produto exterior de vetores v1 ∧ v2 ∧ . . . ∧ vk , representa
volume orientado no subespaço gerado pelos vi ’s.
Pode reescrever em termos de vetores ortogonais v10 ∧ v20 ∧ . . . ∧ vk0 , e
então se torna produto de Clifford v10 v20 . . . vk0 .
É versor (logo invertı́vel) se cada vi0 for invertı́vel.
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Em bases ortonormais é fácil calcular o produto de Clifford: basta


anti-comutar elementos distintos e simplificar iguais adjacentes.

Ex: em R3 temos (j + 2i ∧ k)(i ∧ j ∧ k) = (j + 2 i k) i j k


= j i j k + 2i k i j k
= −i j j k + 2 i i j k k
= −i k + 2j
= −i ∧ k + 2j.

Ex: se (γ0 , γ1 , γ2 , γ3 ) é base ortonormal de R1,3 , com γo2 = +1 e


γ12 = γ22 = γ32 = −1, então

(γ0 ∧ γ1 ∧ γ2 )(γ0 ∧ γ2 ∧ γ3 ) = γ0 γ1 γ2 γ0 γ2 γ3
= γ0 γ0 γ1 γ2 γ2 γ3
= (+1)γ1 (−1)γ3
= −γ1 γ3
= −γ1 ∧ γ3 .
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Ex: V = R5 , base orthonormal (e1 , . . . , e5 ). Notação: e254 = e2 e5 e4 .


A = e14 + e23 + e35 ∈ Λ2 V ,
B = e124 ∈ Λ3 V .
AB = e14 e124 + e23 e124 + e35 e124
= e14124 + e23124 + e35124
= e11244 − e12234 − e12345
= e2 − e134 − e12345 ∈ Λ1 V ⊕ Λ3 V ⊕ Λ5 V .

Juntamos todos vetores (graus se somam) e cancelamos iguais 2 a 2.

Assim, se A é p-vetor e B é q-vetor então AB pode ter componentes de


graus |q − p|, |q − p| + 2, . . . , p + q − 2, p + q.

p, q pares ⇒ todas componentes serão pares.

C`+ (V ) = Λ0 V ⊕ Λ2 V ⊕ Λ4 V ⊕ . . . é a subálgebra par.


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Recapitulando
V espaço vetorial com forma quadrática q(v ) (= v · v em Rn ).
C`(V ) ∼
= ΛV com novo produto associativo tal que v 2 = q(v ).
dim C`(V ) = 2dim V .
Só para vetores: uv = u · v + u ∧ v .
Vetores paralelos adjacentes viram escalar u · v , ortogonais
anticomutam.
Para vetores ortogonais: v1 v2 . . . vp = v1 ∧ v2 ∧ . . . ∧ vp .
v −1 = v
q(v ) se q(v ) 6= 0.

(v1 v2 . . . vk )−1 = vk−1 . . . v2−1 v1−1 .


Se A é p-vetor e B é q-vetor então AB pode ter componentes de
graus |q − p|, |q − p| + 2, . . . , p + q.
Subálgebra par C`+ (V ) = Λ0 V ⊕ Λ2 V ⊕ Λ4 V ⊕ . . .
Obs: a partir daqui usarei (u, v ) para o produto interno usual.
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Conceitos Importantes
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Subprodutos:
Se A é p-vetor, B é q-vetor, e h·ir =componente de grau r , definimos:
Produto exterior A ∧ B = hABip+q .
Junta todos vetores de A e B. Se há interseção, vetores comuns se
cancelam e não há componente de grau p + q.

Produto escalar A ∗ B = hABi0 .


Se anula a menos que p = q (menor grau em AB é |q − p|).
Resulta de projetar todos vetores de A em B e cancelar com os de B.
Quase igual ao produto interno usual: A ∗ B = ±(A, B).
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Contração à esquerda (de A em B) AcB = hABiq−p .


Contração à direita (de B em A) AbB = hABip−q .
Se p > q então AcB = 0.
Se p < q então AbB = 0.
Se p = q então AcB = AbB = A ∗ B.

É comum usar só c, pois contrações de A em B pelos 2 lados


diferem só por sinal, AcB = ±BbA.
Mas o sinal depende de p e q, e para multivetores com componentes
de diferentes graus a diferença fica mais significativa.

Para dar grau q − p, todos vetores de A precisam ter componentes


ao longo de B para cancelarem p vetores de B.
E só sobrarão componentes de B ortogonais a A.
Ou seja, AcB ⊂ B e AcB ⊥ A.
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Contrações são generalizações do produto interno, mas que se p 6= q dão


multivetor ao invés de escalar.
Elas efetuam o produto interno de A com apenas uma parte de B,
mantendo o resto de B:

AcB = (A, BP ) B⊥ ,
(
BP = componente de B na qual A projeta,
onde
B⊥ = componente de B ortogonal a A.
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(
AcB se p ≥ q,
Produto ”fat dot” A • B = hABi|q−p| =
AbB se p < q.
(
A • B se p, q 6= 0,
Produto interno de Hestenes A · B =
0 se p = 0 ou q = 0.
Cuidado: em geral dão multivetor, não escalar.

Como c, b, • e · são muito parecidos, cada autor usa seu favorito.


(
é de Hestenes (papa da álgebra geom.).
A · B é muito usado porque
tem o sı́mbolo mais bonito.
Brincadeiras à parte, alguns autores recomendam o uso de c e b, cuja
assimetria acaba sendo útil, enquanto as condições em • e · atrapalham.

Para confundir ainda mais, alguns (como eu) usam contrações que
diferem dessas por sinais.
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Ex: em R3 , se A = 2i + j + 3k e B = i ∧ j então

AB = (2i + j + 3k)(ij) = 2j − i + 3ijk.

A ∗ B = 0,
AcB = −i + 2j, (⊂ B, ⊥ A)
AbB = 0,
A • B = A · B = −i + 2j,
A ∧ B = 3 i ∧ j ∧ k.

Esses produtos têm várias propriedades que em geral permitem


calculá-los sem precisar fazer todo o produto geométrico.
No caso de 2 vetores todos (exceto ∧) coincidem:
u · v = u • v = ucv = ubv = u ∗ v = (u, v ).

Se a é vetor, aB só terá componentes de graus q − 1 e q + 1, logo

aB = acB + a ∧ B.
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Reversão:

Reversão de A = v1 v2 . . . vp é Ã = vp . . . v2 v1 (ou A† ).
Todo p-vetor A pode ser decomposto em blades de vetores
p(p−1)
ortogonais (que anti-comutam), logo à = (−1) 2 A.
Muda sinal das componentes dependendo do grau, de acordo com
+ + − − + + − − . . . (começando em p = 0).
AB
f = B̃ Ã.

Se A e B têm mesmo grau então (A, B) = Ã ∗ B.


Para todo multivetor, kAk2 = Ã ∗ A.


 kAk2 = ÃA,

Para versores A−1 = Ã/kAk2 ,


kABk = kAkkBk.

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Obs: a prova algébrica de kABk = kAkkBk (p/versores) é simples:

kABk2 = ABAB
f = B̃ ÃAB = kAk2 kBk2 .

Mas há muita geometria por trás! Vamos ver no caso de vetores.
Os produtos escalar e exterior são submultiplicativos porque “perdem
norma” ao projetar num único subespaço.
(
|u · v | = kukkv k cos θ
≤ kukkv k.
ku ∧ v k = kukkv k sin θ

Produto de Clifford guarda todas projeções, por isso preserva a norma:


kuv k2 = ku · v + u ∧ v k2
= |u · v |2 + ku ∧ v k2
= kuk2 kv k2 cos2 θ + kuk2 kv k2 sin2 θ
= kuk2 kv k2 .

Caso geral kABk corresponde a teorema de Pitágoras generalizado.


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Pseudoescalar e dualidade:
(e1 , . . . , en ) base ortonormal orientada (q não degenerada).
I = e1 e2 . . . en é pseudoescalar unitário (n-vetor com I 2 = ±1).
I −1 = ±I (dependendo de n e da signature de q).
Dual A∗ = AcI −1 (dualidade de Hodge, a menos de sinal).
Obs: alguns autores usam a notação A∗ para outra coisa.
Se A é p-blade, A∗ é (n − p)-blade dando complemento ortogonal.

Ex: em R3 , com I = ijk, temos I −1 = −I e

1∗ = −I , i ∗ = −jk, j ∗ = ik, k ∗ = −ij,


∗ ∗ ∗
I = 1, (jk) = i, (ik) = −j, (ij)∗ = k.
(
(u ∧ v )∗ = u × v ,
Relaciona produtos exterior e vetorial
(u × v )∗ = −u ∧ v .
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Aplicações geométricas
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Projeção:
v ·u
Se v , u ∈ V , projeção de v na linha de u é Pu (v ) = u = (v · u)u −1 .
kuk2

Projeção de multivetor A no subespaço de blade B é PB (A) = (AcB)B −1 .


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Reflexão: ra (v ) = reflexão de v pela linha do vetor a.

Decompondo v = vk + v⊥ em componentes paralela e ortogonal ao a,

ra (v ) = vk − v⊥
= a−1 a(vk − v⊥ )
= a−1 vk a + a−1 v⊥ a
= a−1 (vk + v⊥ )a
= a−1 va.
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Reflexão de v pelo hiperplano ortogonal a a:

v 7→ −ra (v ) = −a−1 va.

Reflexão de multivetor A por a:

A 7→ a−1 Aa.
Por ex., A = uv 7→ ra (u)ra (v ) = a−1 uaa−1 va = a−1 (uv )a.

Reflexão de v pelo subespaço de uma k-blade A:

v 7→ (−1)k−1 A−1 vA.


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Rotação: composição de 2 reflexões por vetores a e b dá uma rotação


pelo dobro do ângulo α entre a e b.

Essa rotação é produzida por um rotor R = ab,

rb (ra (v )) = b −1 a−1 vab = R −1 vR.

Funciona em Rn , pois se v tiver componente v⊥ ortogonal a a e b ela


não é afetada: R −1 v⊥ R = b −1 a−1 v⊥ ab = b −1 a−1 abv⊥ = v⊥ .

Rotação de multivetor: A 7→ R −1 AR.


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Vamos reescrever o rotor R = ab = a · b + a ∧ b.

Assumindo a, b unitários temos a · b = cos α e |a ∧ b| = sin α. Assim

R = cos α + i sin α,
a∧b
onde i = |a∧b| = bivetor unitário do plano de a e b.

Em base ortonormal (a0 , b 0 ) do plano, i = a0 ∧ b 0 = a0 b 0 , logo i 2 = −1, e

(ii α)2 (ii α)3


ei α = 1 + i α + + + ...
2  3!
α2 α3
  
= 1− + ... +i α − + ...
2 3!
= cos α + i sin α.

Como α é metade do ângulo de rotação θ, temos

R = cos(θ/2) + i sin(θ/2) = e i θ/2 .


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Composição de rotações em R3 :

R1 = e ijπ/4 , rotor para rotação de 90◦ no plano xy ;

R2 = e jkπ/4 , rotor para rotação de 90◦ no plano yz.

π π π π
R1 R2 = (cos + ij sin )(cos + jk sin )
4 4 4 4
= (1 + ij + jk + ik)/2
= 1/2 + (i + j) ∧ (j + k)/2
√ √
Pondo a = i + j e b = j + k temos |a ∧ b| = 3 e portanto a ∧ b = i 3,
onde i é o bivetor unitário do plano desses vetores. Logo
√ π π
R1 R2 = 1/2 + i 3/2 = cos + i sin
3 3
corresponde a uma rotação de 120◦ no plano de a e b.
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Em R4 , com base ortonormal (i, j, k, l), vamos compor rotações de 180◦


nos planos ij e kl:

e ijπ/2 e klπ/2 = (0 + ij)(0 + kl) = ijkl.


Deu um 4-vetor, não um rotor simples R = ab formado por 2 vetores.

Como os planos são ortogonais, suas rotações são independentes e não


podem ser descritas com um único plano de rotação.

Por outro lado, essa ortogonalidade faz os vetores de um anti-comutarem


com os do outro, e permite mostrar que

e ijπ/2 e klπ/2 = e ijπ/2+klπ/2 .


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Toda rotação em Rn é composta de rotações simples (i.e. com único


plano de rotação), logo pode ser descrita por v 7→ R −1 vR, onde
R = R1 R2 . . . Rk é produto de rotores simples Ri = ai bi .

Ou seja, todo elemento de SO(n) pode ser descrito pelo produto de um


número par de vetores.

Mas −R gera a mesma rotação, pois (−R)−1 v (−R) = R −1 vR.

Isso está ligado ao fato de que R = e i θ/2 gera rotação θ, e significa que
temos na verdade o recobrimento duplo Spin(n) de SO(n).

Spin(n) ∼
= {v1 v2 . . . v2k com vi ∈ Rn , vi2 = 1} ⊂ C`+ (Rn )

Como um número ı́mpar de vetores dá rotação mais reflexão, todos os


produtos de vetores unitários formam recobrimento duplo Pin(n) de O(n).
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Bivetores, que exponenciados dão rotações, formam a álgebra de Lie.

Comutador de Clifford:

[A, B]C` = (AB − BA)/2.

Também representado como A × B, dá a parte anti-simétrica de AB.

É colchete de Lie, e o comutador de bivetores A e B dá bivetor


(componentes hABi0 = A ∗ B e hABi4 = A ∧ B são simétricas).

Ex: em R3 temos Λ2 R3 = span(ij, ik, jk), com

[jk, ik]C` = (jkik − ikjk)/2 = (−ji + ij)/2 = ij,


[ik, ij]C` = . . . = jk,
[ij, jk]C` = . . . = ik.

Mesmos comutadores de so(3), com (jk, ik, ij) ↔ (Lx , Ly , Lz ).


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Ex: (e1 , . . . , en ) base ortonormal de Rn , so(n) = span(ei ej : i 6= j).

Se i, j, k, l forem todos distintos,

[ei ej , ek el ] = (ei ej ek el − ek el ei ej )/2 = 0.

Como também [ei ej , ei ej ] = 0, o comutador só não se anula se houver


exatamente 3 ı́ndices distintos. Se último = primeiro temos, por ex.,

[ei ej , ek ei ] = (ei ej ek ei − ek ei ei ej )/2 = ej ek ,

e reobtemos as relações de so(3) no subespaço 3D gerado por ei , ej , ek .

Assim:
rotação em Rn se decompõe em rotações em planos perpendiculares;
se os planos têm interseção nula, as rotações são independentes;
senão, formam subespaço 3D, onde rotações compõem como em R3 .
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Exemplos importantes
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Várias álgebras importantes podem ser obtidas como casos particulares


ou subálgebras das de Clifford:

C`+ (R2 ) = {x + i y } ∼
= C, onde i = i ∧ j tem i 2 = −1.
C`(R0,1 ) = {x + ı̂y } ∼
= C, onde ı̂ ∈ R é vetor unitário com ı̂2 = −1.
C`+ (R3 ) = {a + bii + cjj + dkk ) ∼
= H, onde os bivetores i = j ∧ k,
j = i ∧ k e k = i ∧ j anti-comutam, i 2 = j 2 = k 2 = −1 e i j = k .
C`(R0,2 ) = {a + bı̂ + c ̂ + dkk } ∼
= H, onde ı̂2 = ̂2 = −1, k = ı̂ ∧ ̂.
números split-complexos: {x + jy : j 2 = 1} ∼
= C`(R) ∼
= C`+ (R1,1 ).
números duais: {x + εy : ε2 = 0} ∼
= C`(R, q = 0) ∼
= ΛR.
etc. etc.
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Álgebra do espaço-tempo de Minkowski:

Base (γ0 , γ1 , γ2 , γ3 ) de R1,3 satisfaz as relações das matrizes de Dirac,

γµ γν + γν γµ = 2ηµν ,

onde ηµν = diag(1, −1, −1, −1) é a métrica.

Bivetores σi = γi γ0 (i = 1, 2, 3) satisfazem as das matrizes de Pauli,

{σi , σj } = 2δij e [σi , σj ] = 2εijk i σk ,

onde i = γ0 γ1 γ2 γ3 satisfaz i 2 = −1 e comuta com os σi ’s.

σ’s anti-comutam e σi2 = +1, logo (σ1 , σ2 , σ3 ) ↔ (ı̂, ̂, k̂) dá isomorfismo
C`+ (R1,3 ) ∼
= C`(R3 ).

Rotores R = e σi α = cosh(α) + σi sinh(α) dão transformações de Lorentz.


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Referências
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Clássicos:
H. Grassmann, Die Lineale Ausdehnungslehre (Linear Extension
Theory), 1844. Traduzido em ”A new branch of mathematics: The
Ausdehnungslehre of 1844, and other works”, Open Court, 1995.
W. Clifford, Applications of Grassmann’s Extensive Algebra, Am. J.
Math. 1, 350-358, 1878.
M. Riesz, Clifford Numbers and Spinors (notas de aula 1957-8),
Springer, 1993.
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Introdutórios:
S. Gull, A. Lasenby, C. Doran, Imaginary numbers are not real – the
Geometric Algebra of Spacetime, 1993.
J. Suter, Geometric Algebra Primer, 2003.
E. Hitzer, Introduction to Clifford’s Geometric Algebra, 2012.
E. Chisolm, Geometric Algebra, 2012.
A. MacDonald, A Survey of Geometric Algebra and Geometric
Calculus, 2019.

Coleção de recursos:
P. Bleyer, Geometric Algebra: A collection of useful resources.
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Livros:
D. Hestenes, Space-time Algebra, 1966.
D. Hestenes, G. Sobczyk, Clifford Algebra to Geometric Calculus: a
Unified Language for Mathematics and Physics, 1984.
C. Doran, A. Lasenby, Geometric Algebra for Physicists, 2003.
L. Dorst, D. Fontijne, S. Mann, Geometric Algebra for Computer
Science: an Object-Oriented Approach to Geometry, 2007.
A. Rosén, Geometric Multivector Analysis: From Grassmann to
Dirac, 2019.

Meu artigo:
A. Mandolesi, Blade products in Grassmann and Clifford algebras,
preprint (interpretações geométricas dos produtos).
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