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Políticas

públicas de
educação:
dilemas público e privado
Elione Maria Nogueira Diógenes
Maria das Graças Correia Gomes
Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Políticas
públicas de
educação:
dilemas público e privado

Arapiraca | Alagoas | 2020


UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS
Reitor: Odilon Máximo de Morais
Vice-Reitor: Anderson de Almeida Barros
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CONSELHO EDITORIAL DA EDUNEAL

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Revisão: Giuliano Martins Porto de Souza


Capa: Adelmiran Silva de Oliveira
Diagramação:
Ed Vasconcelos

Esta obra teve apoio financeiro da Fapeal para sua impressão.

Catalogação na Fonte
Universidade Estadual de Alagoas -
Sistema de Bibliotecas- SiBi
Biblioteca Ineide Nogueira - Divisão de Tratamento Técnico da Informação
Bibliotecária Responsável: Márcia Janaina Souza

P769 Políticas Públicas de Educação: dilemas público e privado. / Elione Maria


Nogueira Diógenes; Maria das Graças Correia Gomes; Wellyngton
Chaves Monteiro da Silva (Organizadores). – Arapiraca: Eduneal, 2020.
161 p.:il.:
Inclui bibliografia
ISBN:978-65-86680-18-8

1. Educação. 2. Políticas públicas. 3. Educação e Estado. I.


Diógenes, Elione Maria Nogueira (Org.); II. Gomes, Maria das Graças
Correia. (Org.). III. Silva, Wellyngton Chaves Monteiro da (Org.)
IV. Título.

CDU 37.014.5(81)

Direitos desta edição reservados à


Eduneal - Editora da Universidade Estadual de Alagoas
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.......................................................................... 7

PREFÁCIO.................................................................................... 11

1. A GESTÃO ESCOLAR NO PROGRAMA DINHEIRO


DIRETO NA ESCOLA: implicações para uma atuação
democrática..................................................................................... 17
Andréia da Silva Mafassioli,
Nalú Farenzena

2. AVALIAÇÃO NACIONAL E “PROVA BRASIL”:


uma análise à luz da governamentalidade....................................... 39
Izabella da Silva Vieira,
Karla de Oliveira Santos,
Laura Cristina Vieira Pizzi

3. O GLOBAL E O LOCAL NO CONTEXTO DAS


POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: globalização
e financeirização no ciclo da economia capitalista......................... 63
Wellyngton Chaves Monteiro da Silva

4. GERENCIALISMO E EMPRESARIADO: hegemonia


conceitual nas formulações das políticas educacionais.................. 85
Maria das Graças Correia Gomes
6 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

5. PERSPECTIVAS DECOLONIAIS NO ENSINO DE


INGLÊS: reflexões sobre a formação inicial de professores
e o seu papel social....................................................................... 111
Jonatha Rodrigues da Silva,
Joyce Rodrigues da Silva Magalhães,
Sérgio Ifa

6. POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: desafios


contemporâneos............................................................................ 137
Elione Maria Nogueira Diógenes

SOBRE OS/AS AUTORES/AS.................................................. 155


APRESENTAÇÃO

Quando pensamos em publicar um livro, não o fazemos


por vaidade acadêmica. O que nos move, então? A necessidade de
socializar o conhecimento, porque a produção e a publicização dos
conhecimentos, cientificamente construídos, devem ser partilhados
com a sociedade, pois fazem parte da cultura.
Uma sociedade que despreza a cultura científica é uma
sociedade que se fechou para o pensamento crítico-reflexivo.
A ciência não é um deus ou coisa que o valha, mas não pode ser
desprezada, tendo em vista que é um conhecimento validado a partir
de sucessivas formas rigorosas de aproximação e distanciamento
com a realidade concreta.
Dito isso, a ciência é uma cultura social política, econômica,
histórica etc., em outros termos, essencialmente humana. Ao nos
remetermos à ciência, enquanto cultura, estamos alertando para
um desafio que precisamos enfrentar com coragem e serenidade: o
obscurantismo que tem dominado mentes e comportamentos avessos
ao pensamento científico no Brasil a partir da ascensão ao poder de
um grupo social fanático e conservador a um só tempo. Destarte,
a Ciência está em perigo, em particular, as Ciências Humanas e as
Ciências Sociais Aplicadas.
Daí, a importância deste livro, “pequeno”, em se tratando
da vaidade, que não guia seus/suas autores/as; todavia, “grande”,
8 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

em termos de defesa da educação pública e gratuita em tempo


de “privatização do público”, como o título sugere. A educação é
dimensão importante da vida social, onde são germinados os sentidos
vividos, coletivamente, pelos seres humanos, no que toca aos modos
de agir, de pensar, de sentir e de se comportar em si e para si, isto é,
consigo e com o mundo.
Esta é a proposta do livro POLÍTICAS PÚBLICAS DE
EDUCAÇÃO: dilemas público e privado, que se configura numa
oportunidade de retornar à sociedade os esforços na formação de
seus/suas pesquisadores/as, ao tempo que reafirma o papel e o
valor da Ciência, justamente, quando vem sendo questionada de
modo leviano.
O/A leitor/a irá se debruçar em textos relacionados às políticas
públicas da educação numa perspectiva crítica, expondo interesses e
percepções daqueles/as que pesquisam e estudam políticas públicas,
neles revelam os pressupostos defendidos nos objetivos de seus
grupos de pesquisa de origem e no Grupo de Pesquisa em Gestão,
Avaliação e Políticas Públicas (GAPP).
Agradecemos aos pesquisadores e pesquisadoras que
contribuíram com os seus trabalhos, enriquecendo a discussão
em torno das políticas públicas de educação. Para nós, é apenas o
começo, visto que a realidade é complexa e necessita – mais do que
nunca – de olhares sensíveis e gestos de transformação no sentido de
melhorar a qualidade do ensino público.
Agradecemos às nossas famílias, que estão sempre nos
apoiando em nossos projetos e lutas diárias em nossos trabalhos, tão
essenciais e ao mesmo tempo desvalorizados.
Agrademos aos nossos companheiros/as de trabalho,
pois sabemos que educação não é um ato individual, e sim
coletivo, social, por excelência, que nos remete à solidariedade,
à comunhão.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 9

Enviamos um agradecimento especial à Universidade


Estadual de Alagoas (Uneal), que, através da Eduneal, viabilizou a
publicação deste livro.

Prof.ª Dr.ª Elione Maria Nogueira Diógenes


Prof.ª Dr.ª Maria das Graças Correia Gomes
Prof. Me. Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
PREFÁCIO

Vivemos um tempo realmente paradoxal, pois, em termos


de correlações de forças frente à disputa por recursos coletivos,
nos deparamos com uma configuração de atores políticos que
torna a medida do que seja uma sociedade justa para todas as
pessoas, difícil de ser equacionada. Por um lado, temos uma
frente progressista (esquerda) dividida em duas opções políticas:
uma que deixou de preocupar-se com o fim do capitalismo,
centrando sua criatividade em uma aliança com este, buscando
minimizar os custos sociais da acumulação de capital econômico
dominada pelos princípios do individualismo (ao revés da
comunidade), a competência (ao revés da reciprocidade), a taxa
de lucro (ao revés da complementariedade e da solidariedade).
Esta opção é reconhecida, politicamente, como a social-
democracia, o keynesianismo, o Estado de bem-estar social e o
Estado desenvolvimentista dos anos 60 do século passado. Esta
opção política traz, para o século XXI, uma social-democracia
de novo tipo, o qual não se assenta em direitos universais e
sim em significativas transferências de recursos aos grupos
considerados vulneráveis socialmente; ela é, também, um Estado
neodesenvolvimentista que articula o nacionalismo econômico
mitigado com a obediência resignada à ortodoxia do comércio
internacional e das instituições do capitalismo global. Esta opção
permite alguma redução das desigualdades sociais, contudo, sem
alterar a matriz de reprodução classista (SANTOS, 2010).
12 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

A outra opção progressista vive intensamente a dificuldade


de imaginar como será o fim do capitalismo. A dificuldade é dupla;
a primeira reside em imaginar alternativas pós-capitalistas depois
do colapso do “socialismo real” e, a segunda, implica imaginar
alternativas pré-capitalistas anteriores à conquista e ao colonialismo.
Esta corrente política, quando usa a noção de “socialismo”, busca
qualificá-la de várias maneiras – a mais conhecida é o “socialismo
do século XXI” – para mostrar a diferença entre o que propõe e o que
se apresentou no século anterior como socialismo. As duas opções
progressistas apresentadas são as que mais caracterizam o continente
latino-americano na atualidade (SANTOS, 2010).
Com o acirramento das disputas pela direção dos Estados
nacionais, em consonância com o avanço de uma regulação global
sobre as políticas públicas locais, de cariz neoliberal, outras opções
políticas (de extrema-direita) passam a ser cogitadas frente à
iminente falência das propostas neoliberais, emergidas da crise
de produção e consumo na década de 1970, para dar conta das
desigualdades sociais materializadas pela intensificação da pobreza
mundial e do desemprego estrutural. Com a esquerda progressista
partida em duas opções políticas e a direita neoliberal desacreditada,
as sociedades abrem-se à retomada de projetos político-ideológicos
de base autoritária (neoconservadores); porém, legitimados por meio
de processos democráticos.
Em meio a esses desdobramentos no campo político
do mundo ocidental, pensar em políticas públicas com justiça
social de redistribuição socioeconômica e de reconhecimento das
diferenças culturais, conforme anuncia Fraser (2001), torna-se um
grande desafio para os Estados nacionais contemporâneos; cuja
marca maior, desde sua gênese, sempre foi a produção de políticas
sociais de redistribuição aos mais pobres, ou, àqueles que, por “sua
incapacidade”, não conseguem obter sucesso no mercado capitalista,
e, do falso reconhecimento cultural, já que produz e reproduz uma
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 13

cultura dominante (BOURDIEU, 2013). Essa estratégia para as


políticas públicas tem assegurado alguma “coesão social”, com
efeito, garantindo a reprodução do sistema social dominante.
A obra Políticas Públicas de Educação: dilemas público
e privado inscreve-se no contexto enunciado acima. O primeiro
capítulo, de autoria de Andréia da Silva Mafassioli e Nalú Farenzena,
discute uma política redistributiva de assistência técnica da União aos
estados e municípios chamada Programa Dinheiro Direto na Escola
(PDDE). No estudo, chegam a constatar problemas em relação à
gestão democrática dos recursos do PDDE no âmbito da unidade
escolar. Apontam que o enfrentamento desses problemas está
diretamente relacionado com a resistência à nova ordem política e
econômica estabelecida no país e que modificou os rumos da política
educacional, bem como fragilizou os processos democráticos.
O segundo capítulo, de autoria de Izabella da Silva Vieira,
Karla de Oliveira Santos e Laura Cristina Vieira Pizzi, dedica-
se a analisar a mudança da política curricular com a criação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a utilização da avaliação
governamental em larga escala, a exemplo da Prova Brasil, para
a educação básica. As autoras argumentam que estratégias têm
sido armadas para que professores e professoras se apoderem dos
conhecimentos relacionados à Prova Brasil de modo a preparar os
alunos e as alunas para o exame. Afirmam que essa forma de controle
governamental, ao ser aliada aos PCN, reforça os objetivos, os saberes
e as práticas estabelecidas no âmbito oficial do governo, atuando
como práticas normalizadoras e controladoras dos saberes docentes,
diminuindo significativamente seu grau de autonomia profissional
e simplificando os saberes transmitidos aos estudantes, na direção
oposta à qualidade defendida nos discursos governamentais oficiais.
No capítulo três, de autoria de Wellyngton Chaves Monteiro
da Silva, aborda-se as consequências da relação entre o global e o
local sobre as políticas públicas de educação e seus efeitos danosos
14 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

para os trabalhadores e trabalhadoras do setor. Alude, ainda, que


essa relação, que traz em sua base uma noção de educação como
mercadoria, impacta na formação dos/das estudantes; sendo esse
processo fruto da submissão dos Estados periféricos aos Estados
centrais. O autor argumenta sobre o aumento da exclusão social e
da fragmentação dos laços sociais que os processos de globalização
promovem em âmbito local, em especial nos Estados periféricos.
Já o capítulo quatro, de autoria de Maria das Graças
Correia Gomes, preocupa-se em expor como o gerencialismo e
o empresariado interferem nas políticas educacionais elaboradas
nas secretarias de educação de todo o Brasil. A autora, ao
centrar seu estudo nas políticas para o ensino médio, conclui
que, historicamente, as políticas educacionais brasileiras sempre
foram fortemente direcionadas para atenderem às leis de mercado,
incorporando estratégias de preparação de mão de obra para o
atendimento das necessidades dos empresários e das novas formas
de gerenciamento capitalistas.
Na sequência, o capítulo cinco, de autoria de Jonatha
Rodrigues da Silva, Joyce Rodrigues da Silva Magalhães e Sérgio
Ifa, traz uma reflexão sobre a formação inicial de professores e
professoras e o ensino de inglês numa perspectiva decolonial. O
estudo insere-se na linguística aplicada, a qual considera a linguagem
em uso a partir de suas imbricações sociopolíticas. As reflexões
revelam a importância de ser decolonial e de usar a sala de aula
como um espaço para visibilidade do outro. Também mostrou que a
língua inglesa pode assumir um papel fundamental, fazendo com que
professores/as tomem os problemas sociais emergentes para reflexão
sobre as práticas docentes e a cidadania, atrelando o processo de
ensino e aprendizagem com políticas educacionais e práticas sociais
nas quais a língua(gem) tem um papel central.
Para finalizar, o capítulo seis, de autoria de Elione Maria
Nogueira Diógenes, baseada na argumentação de Souza (2006),
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 15

trata das políticas públicas de educação no cenário contemporâneo,


compreendendo que, desde meados da década de 1990, no Brasil, com
a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC/1995-
2002), a expressão “políticas públicas” passou a fazer parte da
terminologia burocrática e institucional dos gabinetes estatais, do
planejamento nos diferentes setores institucionais e nas pesquisas
desenvolvidas na Academia. A argumentação da autora discorre
sobre as diferentes performances dos governos de FHC a Bolsonaro
no que tange às políticas públicas.

Porto Alegre, 20 de agosto de 2020.

Neusa Chaves Batista


Professora Associada da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, Pierre. Espíritos de Estado: gênese e estrutura do campo


burocrático. In: BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: sobre a teoria da
ação. Campinas, SP: Papirus, 2013. p. 91-136.

FRASER, Nancy. Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da


justiça na era pós-socialista. In: SOUZA, Jessé (org.). Democracia hoje:
novos desafios para a teoria democrática contemporânea. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 2001. p. 245-282.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Descolonizar el saber, reinventar el


poder. Montevideo, Uruguay: Ediciones Trilce, 2010.
CAPÍTULO 1
A GESTÃO ESCOLAR NO PROGRAMA
DINHEIRO DIRETO NA ESCOLA:
implicações para uma atuação democrática
Andréia da Silva Mafassioli
Nalú Farenzena

1. INTRODUÇÃO

Entre os imensos desafios para a melhoria da qualidade da


educação brasileira, faz-se necessário discutir e aprofundar quais
recursos têm sido disponibilizados às escolas públicas, como são
acessados e gastos, quem realiza sua gestão e se são suficientes para
garantir o atendimento com qualidade. Nessa perspectiva, este texto
apresenta elementos que discutem a gestão escolar, com ênfase na sua
dimensão financeira, da política de assistência da União à educação
básica chamada Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). O
programa, gerenciado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), do Ministério da Educação (MEC), reúne várias
ações e objetiva a melhoria da infraestrutura física e pedagógica
das escolas e o reforço da autogestão escolar nos planos financeiro,
administrativo e didático, contribuindo para elevar os índices de
desempenho da educação básica.
18 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

O tema será abordado tendo em conta uma pesquisa


acadêmica1 que analisou vinte anos de implementação do PDDE. É
elaborado um recorte sobre as condições que essa política pública
apresenta para a gestão de escolas públicas, numa perspectiva
democrática, sendo discutidas influências e interferências e
indicados vigores e fragilidades dessa política para a gestão escolar,
decorridos mais de 23 anos de sua implantação em escolas da rede
pública de ensino.
Além dessa introdução, o texto é composto por outras quatro
seções. Numa primeira, apresentamos a caracterização do PDDE,
destacando atores responsáveis pela sua implementação, objetivo e
funcionamento dessa política de assistência financeira da União à
educação básica que propicia às escolas o recebimento, a gestão e a
fiscalização de recursos públicos. Na sequência, enfocamos a gestão
escolar na perspectiva da gestão democrática. No item seguinte, a
partir de algumas pesquisas realizadas sobre o programa, discutimos
implicações do PDDE e suas modalidades para a gestão escolar.
Nos comentários finais, reforçamos a necessidade de constituição de
equipes gestoras que conduzam o trabalho na perspectiva da gestão
democrática, atendendo ao principal objetivo do PDDE que, além de
fazer o recurso chegar exatamente onde será utilizado, é de fomentar
a participação da comunidade escolar para resolver os problemas
imediatos da escola. Mas, para isso, é necessário enfrentar a nova
ordem política e econômica estabelecida no país, nos últimos três
anos, que modificou os rumos da política educacional e fragilizou os
processos democráticos.


1
Tese de doutorado de Mafassioli (2017), que apresenta uma análise documental das (re)
formulações ocorridas em 20 anos de implementação da política pública PDDE (1995-
2015) e sua execução na educação pública brasileira.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 19

2. O PDDE ENQUANTO POLÍTICA PÚBLICA: caracterização


e implicações

2.1 Caracterização do PDDE

O PDDE, criado no ano de 1995, é uma política pública de


descentralização de recursos da educação e de financiamento da União
à educação básica. Esse foi o primeiro programa de transferência
de recursos financeiros do governo federal diretamente para escolas
públicas; propiciou o recebimento, a gestão e a fiscalização dos
recursos no âmbito escolar. Desde a criação dessa política, era
repassado um valor anual (PDDE básico/universal) de acordo com
o número de alunos da instituição escolar. Na década de 1990, havia
uma grande precariedade das condições físicas e pedagógicas de
trabalho na escola pública brasileira, traduzida no sucateamento dos
prédios e equipamentos, intensificada pela falta de recursos de toda
ordem. Portanto, nessas condições, é difícil imaginar como o PDDE
poderia, efetivamente, representar uma estratégia de melhoria da
qualidade do ensino público com a injeção de valores ínfimos diante
dos desafios que as escolas públicas enfrentavam.
O PDDE é um dos programas de assistência financeira
do MEC2 com maior tempo de duração. Somente o Programa
Nacional da Alimentação Escolar (Pnae) é mais antigo. Em volume
de recursos, é a quarta maior ação de assistência financeira. Está
atrás da complementação da União ao Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb), da repartição da receita do


2
O PDDE, formulado em 1995, era identificado como Programa de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental (PMDE). Iniciou no governo Fernando
Henrique Cardoso, atendendo somente ao ensino fundamental. Estabeleceu-se numa
configuração de Estado capitalista com predomínio de políticas macroeconômicas de
ajuste fiscal.
20 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

salário educação com estados e municípios e da alimentação escolar3.


Em todo o território nacional, foram, em 2015 (período em que
essa política estava em ascensão), dois bilhões de reais em recursos
repassados via PDDE para todas as unidades beneficiárias, variando
em função do número de alunos e da tipologia das instituições.
A operacionalização e o acompanhamento do programa
envolvem diferentes atores responsáveis pela formulação e
implementação de cada procedimento e de suas ações agregadas
para seu pleno funcionamento. O quadro 1 identifica os dois grupos
de atores do PMDE/PDDE, os formuladores e os implementadores,
e suas respectivas atribuições:

Quadro 1: Atores formuladores e implementadores do PDDE


Atores formuladores do PMDE/PDDE Atores implementadores do PMDE/PDDE
• MEC • MEC/FNDE
• FNDE, autarquia vinculada ao • Unidade Executora Própria
MEC que atua no financiamento de • Entidade Executora
ações suplementares voltadas para a
educação básica. Órgão formulador e • Entidade Mantenedora
executor do PDDE. • Diretores das escolas
• Órgãos de controle externo e interno
das comunidades escolares, como,
por exemplo, conselhos escolares,
APMs.
Fonte: Mafassioli (2017)

A União, por meio do MEC, direciona recursos financeiros aos


estados, ao Distrito Federal (DF), aos municípios e a organizações
não governamentais sem fins lucrativos para atendimento à
educação básica. O FNDE é o principal responsável pela execução
de políticas educacionais de assistência técnica e financeira do

A rigor, as cotas estaduais e municipais do salário educação são repartição de receita


3

e, desse modo, o PDDE seria a terceira maior transferência, em termos de volume de


recursos.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 21

MEC aos entes subnacionais e se tornou importante parceiro dos 26


estados, dos 5.570 municípios e do DF no repasse dos recursos para
o atendimento à educação básica. Para fazer o cálculo do repasse dos
recursos do PDDE, o FNDE conta com critérios fundamentados na
legislação brasileira e em políticas públicas que visam à diminuição
da desigualdade social. Além das escolas, há previsão de repasse de
recursos a polos da Universidade Aberta do Brasil (UAB).
De acordo com o fluxograma de repasses dos recursos,
o FNDE repassa dinheiro na conta bancária aberta em nome da
Unidade Executora Própria (UEx) do estabelecimento de ensino. Se
o estabelecimento de ensino não possuir UEx, os recursos das escolas
até 50 alunos são repassados para as Entidades Executoras (EEx),
ou seja, prefeituras ou secretarias estaduais e distrital de educação,
conforme a vinculação da unidade educacional. Os critérios e a
forma de cálculo do valor destinado a cada escola e polo de apoio
presencial da UAB são estabelecidos por resoluções do Conselho
Deliberativo do FNDE.
A assistência é o instrumento que viabiliza o exercício das
funções redistributiva e supletiva da União. As formas de assistência
da União na educação aos demais entes federados são duas: a
técnica e a financeira. A “assistência técnica” ocorre por meio da
oferta de programas de formação inicial de professores, programas
de capacitação de profissionais ou membros de conselhos da área
da educação, disponibilização de ferramentas de planejamento,
gestão e monitoramento de políticas e ações e realização de estudos,
levantamentos e avaliações. Já a “assistência financeira” ocorre pela
transferência de recursos financeiros, tais como o PDDE, ou de bens
materiais, tais como equipamentos de informática, livros de referência,
distribuição de acervos bibliográficos para a educação básica e livros
didáticos, entre outros materiais (FARENZENA 2012).
Conforme pesquisa realizada por Mafassioli (2017), sobre
as (re)formulações do PDDE, passados mais de vinte anos de sua
22 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

implementação, constatou-se que o mecanismo de transferência de


recursos financeiros a escolas públicas, dentro de programas e ações
específicas, ampliou-se, mais fortemente, a partir de 2004, já no
governo do presidente Lula da Silva.
O que se observou, de forma mais significativa, foi que,
entre os anos de 2004 e 2014, ao lado PDDE básico/universal foram
criadas outras modalidades conhecidas como “ações agregadas ou
complementares”, que integram o formato de transferência automática
para as escolas e o consequente montante de recursos financeiros,
que, acompanhando o volume de programas e projetos financiados,
também aumentou. Essas parcelas adicionais de recursos a algumas
unidades executoras, com propósitos específicos, que podem ser de
natureza continuada ou não, foram distribuídas em quatro eixos de
atendimento, conforme indicado no quadro 2:

Quadro 2: Eixos de atendimento do PDDE


EIXO PDDE EIXO PDDE EIXO PDDE EIXO PDDE
BÁSICO QUALIDADE INTEGRAL ESTRUTURA
Recurso anual Recursos para Recursos para Recursos para suprir
enviado para todas melhoria de ações ampliação da infraestrutura física.
as escolas públicas, pedagógicas. jornada escolar. Programas:
de acordo com o Programas: Programa:
número de alunos. Escola Acessível,
PDE Escola, Escola Mais Educação. Água na Escola e
Aberta, Ensino Escola do Campo.
Médio Inovador,
Atleta na Escola,
Escola Sustentável,
Mais Cultura na
Escola.
Fonte: Mafassioli (2017)

O PDDE básico foi repassado como parcela única até o ano


de 20134. Em 2007, as escolas públicas que alcançaram as metas


4
Em 2014 e 2015, devido à crise política e econômica estabelecida no país, essa regra foi
alterada e as escolas passaram a receber em duas parcelas.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 23

do Ideb receberam uma parcela extra de 50% do PDDE básico. Até


o ano de 2008, o PDDE atendia somente ao ensino fundamental. A
partir do ano de 2009, passou a atender a todos os níveis da educação
básica, incluindo a educação infantil e o ensino médio. Ao longo dos
anos de implementação e (re)formulações do programa, nos eixos de
atendimento ‘qualidade’, ‘integral’ e ‘estrutura’, foram criadas dez
novas modalidades, apresentadas no quadro 3:

Quadro 3: Modalidades do PDDE, criadas de 2004 a 2014


MODALIDADES DO PDDE OBJETIVO DA MODALIDADE
1. PDDE Escola Aberta (2004) Destinar recursos para abertura de escolas públicas em
fins de semana (em territórios de vulnerabilidade social).
2. PDDE Educação Integral Destinar recursos para adoção de educação integral
(2007) pelas escolas, com a oferta de, no mínimo, sete horas
Programa Mais Educação diárias de atividades de aprendizagem, lazer, artísticas
e culturais.
3. PDDE: PDE Escola (2007) Destinar recursos para auxiliar na implementação de um
plano de ações elaborado pelas escolas e validado pelo
MEC.
4. PDDE Escola Acessível Destinar recursos para o atendimento da educação
(2008) especial. Adequação para acessibilidade física.
5. PDDE Escola do Campo Destinar recursos para melhoria da qualidade do ensino
(2009) nas escolas públicas do campo das redes municipais,
estaduais e distrital.
6. PDDE Ensino Médio Destinar recursos para propostas curriculares inovadoras
Inovador (2009) em escolas de ensino médio.
7. PDDE Água na Escola Destinar recursos para garantir o abastecimento de
(2010) água (escolas do campo) para consumo e esgotamento
sanitário.
8. PDDE Escolas Sustentáveis Destinar recursos para promover ações e apoiar as
(2013) escolas públicas no desenvolvimento de iniciativas
voltadas à sustentabilidade.
9. PDDE Atleta na Escola Destinar recursos para difundir a prática desportiva
(2013) entre os estudantes brasileiros; desenvolver valores
olímpicos e paralímpicos.
10. PDDE Mais Cultura nas Destinar recursos para ações que promovam o encontro
Escolas (2014) entre o PPP de escolas públicas contempladas com os
programas Mais Educação e Ensino Médio Inovador.
Fonte: Mafassioli (2017)
24 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Essas inúmeras modalidades do PDDE, estabelecidas pelo


MEC/FNDE, evidenciam que a política educacional desse período
encaminhava políticas diversificadas, que almejavam a melhoria da
qualidade da educação básica, e apresentam um caráter inclusivo
e democrático, atendendo a demandas da educação historicamente
deixadas de lado. Entre essas demandas, por exemplo, a acessibilidade
para alunos do público-alvo da educação especial, recursos para
escolas do campo, para melhoria da infraestrutura e, inclusive,
minimização da falta de água.
A política pública PDDE está presente em todas as escolas
públicas no Brasil e, pelo seu grau de abrangência, tornou-se
uma das políticas mais importantes de financiamento da União,
com transferência direta de recursos para as escolas públicas
estaduais e municipais no atendimento à educação básica. A
gestão desses recursos recai em grande parte sobre o gestor
escolar, juntamente com a UEx (conselho escolar, associação de
pais e mestres, entre outros). Para o gestor, é mais uma tarefa,
que se soma a muitas outras.
Nas últimas décadas, frente às inúmeras políticas e demandas
destinadas às instituições públicas de ensino no Brasil, ocorreu
uma intensificação no trabalho exercido pelos gestores escolares,
ampliando suas atribuições, principalmente em ações avaliativas,
administrativas e financeiras.
Entre os objetivos da política PDDE está o reforço da
autogestão escolar nos planos financeiro, administrativo e
didático, contribuindo para elevar os índices de desempenho da
educação básica. Portanto, este texto trata das implicações desse
programa nos processos de gestão escolar com ênfase para a
gestão financeira. Para isso, na sequência do texto, apresentamos
alguns conceitos centrais para o exercício democrático da gestão
escolar nas escolas públicas.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 25

2.2 A gestão escolar na perspectiva da gestão democrática

A progressiva autonomia (financeira, pedagógica e


administrativa) das escolas, estabelecida pela LDB de 1996,
promoveu mudanças na gestão de redes e escolas públicas. Entre as
mudanças, está a descentralização de recursos financeiros que são
diretamente encaminhados à escola.
Há modelos e práticas bastante diferentes de gestão
democrática e de controle público e social dos recursos da área
da educação em nosso país. Muitos deles objetivam desencadear
processos de descentralização democrática, de autonomia financeira
e de participação de segmentos sociais ou de comunidades no
planejamento, na execução ou no acompanhamento da gestão
financeira de redes de ensino e de instituições escolares. Ou
seja, ao lado de intenções de maior agilidade e desconcentração
na aplicação dos recursos financeiros, encontram-se orientações
para o alargamento dos espaços democráticos, para o exercício
da cidadania, para a responsabilidade coletiva (FARENZENA;
ARAÚJO, 2006, p. 109).
A descentralização da gestão financeira é entendida como
a transferência, a assunção ou a ampliação de competências e
responsabilidades de planejamento, gestão e controle do uso de
recursos financeiros da educação e compreende um movimento
que vai das administrações centrais às escolas. A descentralização
democrática congrega o controle público e social da gestão financeira.
O controle social pressupõe publicização das contas públicas, seja
no âmbito das escolas ou dos sistemas de ensino. Exige capacitação,
para que os sujeitos possam exercer de forma qualificada as tarefas
de planejar, acompanhar e avaliar a gestão financeira. Demanda
responsabilidade individual e coletiva para com o uso de recursos
que se destinam à oferta de um bem público. Assim, as ações de
26 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

participação em conselhos, por exemplo, são, antes de tudo, ações


de cidadania, de conjugação de esforços para contemplar interesses
coletivos, de vigilância responsável sobre recursos, que, sendo
públicos, devem destinar-se ao cumprimento dos deveres do poder
público e das escolas para com a educação escolar.
Dessa forma, a descentralização financeira, numa perspectiva
democrática, requer a participação dos diferentes segmentos da
comunidade escolar em todas as fases de uso dos recursos públicos
(lista de prioridades, definição de gastos, planejamento, orçamentos,
compras, prestação de contas, publicização dos gastos). Todo esse
processo é caracterizado como gestão e controle social sobre recursos
que são públicos.
Além dos recursos federais repassados, muitas escolas
recebem recursos estaduais (rede estadual) e municipais (rede
municipal), ao que se somam, comumente, recursos próprios gerados
pelas instituições. Esses últimos incluem, por exemplo, geração de
rendas de festas, bazares, bingos, rifas e sorteios em geral, venda de
espaços publicitários, prestação de serviços, parcerias com o setor
privado da economia local, doações em geral. Essa prática evidencia
que necessidades da escola pública, a serem providas pelo poder
público direta ou indiretamente (com ações diretas ou com recursos
transferidos), acabam tendo sua solução orquestrada pela própria
escola que, com isso, financia a si mesma.
Os recursos financeiros dão suporte aos serviços escolares
que envolvem o atendimento aos professores e alunos no processo
de ensino-aprendizagem, com materiais pedagógicos e de apoio,
limpeza, manutenção, conservação, vigilância, como também
têm que suprir demandas diretamente relacionadas à aquisição de
conhecimentos histórico-culturais dos diferentes componentes
curriculares e de ferramentas, como bibliotecas e museus públicos,
estruturas desportivas, parques, zoológicos, rádio, cinema, televisão.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 27

Em inúmeras escolas públicas do país, nos estados e municípios


que regulamentaram a gestão democrática, o mais comum é que
a definição de onde gastar os recursos (prioridades) e a prestação
de contas seja acompanhada e aprovada por órgãos colegiados
(conselho escolar ou assemelhados). As demais tarefas que envolvem
o levantamento de preços, contato com fornecedores, solicitação
de orçamentos, compras, pagamento e elaboração das planilhas de
prestação de contas é realizada pela direção da escola ou por um agente
financeiro, de acordo com orientações da mantenedora daquela rede
de ensino. Após a aprovação pelos colegiados, as prestações de contas
são encaminhadas às mantenedoras, as quais as repassam ao FNDE.
Durante esse processo, se as contas são aprovadas, a escola permanece
recebendo os recursos. Porém, se forem observadas irregularidades,
os recursos são temporariamente cancelados pelo FNDE.
É importante considerar que, nas décadas de 1980 e até os
anos finais dos anos de 1990, as escolas públicas não recebiam
recursos. A escassez era ainda maior do que na atualidade. Nessa
época, para dispor de recursos financeiros, o gestor escolar contava
somente com recursos oriundos de promoção de eventos pela escola
ou contribuições das famílias. Esse cenário de escassez, no que diz
respeito a muitas redes públicas do país, foi se modificando a partir
nos anos finais da década de 1990.
Uma nova responsabilidade atribuída ao gestor escolar
iniciou-se, em diferentes estados e municípios brasileiros, por
meio da descentralização financeira de recursos, repassados
pelas mantenedoras5 às escolas. O instrumento é identificado, por
exemplo, como autonomia financeira na rede estadual de ensino
do Rio Grande do Sul (RS) ou como repasse municipal, plano de
aplicação de recursos ou descentralização financeira em algumas
redes municipais de ensino.
Secretaria de Estado da Educação (Seduc) e Secretarias Municipais de Educação
5

(SME).
28 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Além desses repasses locais, as escolas passaram a


administrar, também, os recursos financeiros vindos da União,
recursos de descentralização financeira depositados em conta
bancária aberta pelo FNDE, via PDDE básico (1995) para o ensino
fundamental, ampliado a partir do ano de 2004 pela utilização do
mesmo mecanismo, contemplando várias modalidades do PDDE
e para toda a educação básica (2009). Com as novas modalidades
do PDDE, a União direcionava recursos para as escolas públicas e
regiões conforme os critérios especificados nas resoluções do FNDE.
Com a destinação de recursos às escolas públicas, a intenção
manifesta é a de corrigir algumas desigualdades educacionais,
ampliando a participação das comunidades e a jornada escolar
dos estudantes com atividades culturais, artísticas e de incentivo à
aprendizagem, assim como minimizar dificuldades, como a falta
de água, falta de acessibilidade, entre outros desafios. Ações de
incentivo à sustentabilidade, ao esporte e à ampliação de espaços
culturais foram efetivados em diversas escolas públicas distribuídas
nas cinco regiões do país. São várias as possibilidades de aplicação
desses recursos e, de maneira geral, eles fazem parte de programas
que possuem destinação específica, isto é, são recursos financeiros
ou materiais destinados a uma ação específica: alimentação escolar;
transporte escolar; livro didático; biblioteca escolar; saúde escolar e
manutenção da escola.
No período entre 2004 e 2014, os programas que chegaram
às escolas públicas, por meio do PDDE, modificaram as atribuições
da gestão escolar. A chegada desses recursos às escolas, por um lado,
facilitou o trabalho dos gestores na administração da escola, inclusive
na promoção de melhorias nas condições físicas e pedagógicas. Por
outro lado, ampliou as responsabilidades na gestão financeira.
Os gestores escolares passaram a ter um compromisso maior
na gestão dos recursos financeiros, pois o volume de recursos
circulando na escola foi ampliado, assim como as tarefas para a
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 29

execução desses recursos. Essa nova função envolve o levantamento


de prioridades, a elaboração de planos de aplicação financeira, a
pesquisa de orçamentos, a compra de materiais, pagamentos e, por
fim, a prestação de contas, entre outras tarefas. Algumas escolas
tinham de três a seis contas para realizar a movimentação de recursos
financeiros. Todas essas tarefas ocupam tempos e espaços na gestão
escolar, e assuntos pedagógicos e administrativos, muitas vezes,
correm o risco de ser secundarizados.
Portanto, para garantir mais qualidade na aplicação dos
recursos, para além das tarefas burocráticas de elaboração de planos
financeiros, licitações, compras, pagamentos, entre outras rotinas
que envolvem a questão financeira, defendemos o exercício de uma
gestão financeira da escola numa perspectiva democrática. Esse
exercício se efetiva com a participação dos segmentos escolares
nas várias etapas dessa gestão, por meio de reuniões e assembleias,
coordenadas pelo conselho de representantes. A ideia de envolver
as pessoas, tornando-as parte desse processo, promove um maior
compromisso dessa comunidade escolar com o projeto político
pedagógico da instituição de ensino. É de mencionar também a
oportunidade de trabalhar com a educação fiscal no âmbito escolar,
pois o conhecimento da origem, do uso e do controle dos recursos
viabiliza a compreensão de processos de financiamento e gasto
públicos, na educação e no Estado.
Na próxima seção, apresentamos os resultados de pesquisas e
avaliações sobre o PDDE e suas implicações para os gestores escolares
no decorrer de mais de 20 anos de execução dessa política pública.

2.3 Implicações do PDDE e suas modalidades para a gestão escolar

Com base na extensa pesquisa bibliográfica e documental sobre


a política de financiamento PDDE realizada por Mafassioli (2017) e
30 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

considerando as principais pesquisas sobre o tema, selecionamos


algumas implicações dessa política pública de financiamento da
educação para a gestão escolar em escolas públicas de educação básica.
A pesquisa da Universidade Federal do Paraná, organizada
por Gouveia e Souza (2004), tratou do custo aluno/ano em 13 escolas
públicas do Estado do Paraná. Realizada para o Instituto Nacional
de Pesquisas Educacionais (Inep), analisou o impacto dos recursos
administrados diretamente pelas escolas no custo aluno/ano e a fonte
desses recursos.
Para os autores, esses programas voltam-se, de alguma forma,
para a objetividade da escola pública, apresentando elementos que
se propõem a alterar a sua organização, particularmente no que se
refere à gestão dos recursos financeiros e que, por diversas vezes,
são necessidades das escolas públicas historicamente não (ou mal)
atendidas pelo poder público. Vale dizer, o recebimento de recursos
financeiros pelas escolas, se trouxe problemas para a sua gestão, no
sentido da ampliação de tarefas, também concorreu para garantir,
mesmo que de modo insuficiente, um pequeno aporte de dinheiro
para a solução de problemas mais imediatos que não eram resolvidos
a contento pelo poder público até então; em que pese isso tudo poder,
de alguma forma, representar a falta de comprometimento do poder
público com a manutenção da escola nos moldes que ela necessita
(GOUVEIA; SOUZA, 2004).
Adrião e Peroni, em 2007, desenvolveram uma pesquisa
referente à implementação do PDDE em diferentes estados brasileiros.
O programa foi identificado como um dos principais elementos da
descentralização da gestão financeira para a escola, com implicações
diretas para gestão educacional, especificamente à democratização
da gestão da escola, à relação público e privado e à relação entre
descentralização e centralização. Algumas dessas implicações
destacadas pelas pesquisadoras são: processos de homogeneização/
padronização da gestão educacional; secundarização do exercício das
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 31

práticas democráticas nas decisões; concentração das opções de política


escolar nas mãos dos diretores; inviabilização do controle social sobre
os recursos descentralizados; e redução da visão no âmbito escolar das
consequências em longo prazo e de natureza mais geral do programa.
Nesse estudo, as autoras concluíram que a relação público-
privado traz à tona dois problemas. O primeiro é o de responsabilização
em caso de má gestão dos recursos públicos, uma vez que, sendo
a UEx uma associação de pais e mestres, um representante dos
pais, junto ao responsável pela escola, assina os cheques referentes
aos gastos do programa. A pergunta que as autoras levantam é:
“Afinal, no âmbito da escola, quem responde por tais recursos: o
representante da administração pública, no caso o responsável pela
unidade escolar, ou o representante da sociedade civil, pai ou mãe do
aluno?” (ADRIÃO; PERONI, 2007, p. 264).
O segundo problema é o da preservação da natureza pública
da escola quando as UEx, sejam elas APMs ou conselhos escolares,
têm autonomia frente à administração pública da escola, como
entidades de direito privado. Esses problemas e implicações indicam
que a descentralização da gestão financeira para a escola constitui-se
em grande desafio para uma educação pública de qualidade e para
a democratização do financiamento e da gestão tanto na esfera local
como federal (ADRIÃO; PERONI, 2007).
Segundo estudos de Moreira (2012, p. 11), observa-se, com
a implantação do PDDE, a predominância de um tipo de autonomia
relativa das escolas para gerir recursos financeiros, posto que “[...]
seu poder de decisão é previamente parametrizado por uma instância
central e a aplicação dos recursos é fragmentada em distintas ações”.
Nesse estudo, a autora apresentou alguns resultados de uma pesquisa
realizada pelo FNDE6, em 2011, sobre a satisfação dos beneficiários


6
Fonte: Pesquisa de Satisfação dos Beneficiários do PDDE, maio a outubro de 2011.
Sistema PDDEWeb, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), 2012.
32 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

do PDDE. A respeito da capacidade da equipe de gestão administrar


recursos financeiros públicos, considerando pessoal e tempo para
essa atividade, a maior parte (88%) das escolas afirma não encontrar
dificuldades na gestão do PDDE. Os elementos de maior dificuldade
estão em realizar pesquisa de preços para as despesas; achar pessoas
para compor a UEx; reunir a comunidade escolar e realizar os
procedimentos de prestação de contas. Na mesma pesquisa, a maioria
das escolas informou que o PDDE contribuía para a melhoria da
infraestrutura física e pedagógica e promovia a participação social
na gestão da escola.
A partir dessas respostas, a autora enfatiza que a gestão
financeira integra diversas dimensões: política, pedagógica e
administrativa, destacando a importância de uma autonomia
construída, que integre e fundamente essas dimensões na identidade
institucional da escola. E argumenta que, desse modelo de gestão
financeira descentralizada, nas novas relações que se estabelecem
entre a instância central e a local, emergem conflitos por diferentes
razões. Entre eles, cita “[...] as fortes disparidades econômicas,
políticas, sociais, culturais e educacionais [...] que dizem respeito
ainda à organização dos sistemas de ensino – estaduais, municipais
e do DF – e ao processo histórico de construção de cultura de gestão
nas escolas participantes do programa” (MOREIRA, 2012, p. 31).
A sistematização desses estudos torna possível destacar
algumas implicações dessa política para a gestão financeira da escola,
assim como indicar vigores e fragilidades do PDDE, decorridos mais
de 20 anos de sua implementação, para o fortalecimento da gestão
democrática e melhoria da qualidade da educação pública.
Entre os vigores, destacamos a chegada de recursos, de forma
descentralizada, às escolas públicas e a ampliação desses recursos
para viabilizar outras modalidades. A expansão do PDDE ocorreu
pelo aumento do investimento do governo federal na educação
brasileira, e também por ser um programa que alcança a gestão e a
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 33

autonomia escolar sem intermediários na liberação dos recursos. O


repasse desses diferentes recursos às escolas públicas, quando bem
geridos, viabilizaram mudanças significativas nos espaços escolares,
podendo qualificar processos pedagógicos.
Algumas pesquisas avaliaram a implementação de uma das
modalidades com maior volume de recursos do PDDE, o Programa
Mais Educação (PME), em escolas de diferentes regiões do país. Por
exemplo, foi evidenciado no estudo realizado por Mosna (2014) “um
alto grau de satisfação dos beneficiários e dos implementadores, que
permite dizer que o Programa tem efetividade social e que, de certa
maneira, tem efetividade institucional”. Na pesquisa realizada por
Moreira e Bertolin (2016), com os usuários do PME, foi evidenciado
que as ações do programa contribuem para melhorar a aprendizagem,
reduzir a evasão e a repetência, evitar a exposição dos alunos a
situações de risco, bem como para o desenvolvimento de habilidades
comportamentais e socioafetivas dos alunos. Ademais, foi possível
melhorar as condições de infraestrutura, acessibilidade, construção
de espaços de convivência, compra de jogos, livros, instrumentos
musicais, entre outros recursos materiais necessários para qualificar
as aulas e as oficinas.
Pesquisas do FNDE indicam que o PDDE é bem avaliado pelas
escolas e pelos sistemas de ensino. Durante décadas, os gestores das
escolas públicas tinham que organizar rifas, festas e contribuições
espontâneas para gerir a escola, pois os recursos eram escassos. Os
recursos do PDDE modificaram essa realidade; mesmo ampliando
as funções do gestor escolar, as escolas públicas tiveram uma
“autonomia” relativa para adquirir material de consumo, recursos
didáticos, realizar reparos, melhorar a estrutura física e promover
ações para qualificar os processos de ensino e de aprendizagem e o
desenvolvimento de atividades educacionais do projeto pedagógico.
Além desses aspectos positivos, destacamos algumas
fragilidades na implementação do PDDE. Uma delas refere-se à
34 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

capacidade técnica e pedagógica de equipes gestoras de escolas para


utilizar com qualidade os recursos enviados para efetivação das ações
do programa. A maior parte dos gestores não tem formação na área de
gestão financeira e não domina todos os trâmites burocráticos que o
programa exige. Com o acréscimo de várias modalidades no PDDE,
a partir do ano de 2004, ocorreu uma intensificação no trabalho dos
gestores. Devido aos inúmeros procedimentos a serem executados,
multiplicaram-se as suas responsabilidades. Entre elas: administrar
diferentes contas, fazer orçamentos, elaborar planos de ação, fazer
compras, prestar contas e, além de tudo isso, principalmente,
mobilizar e envolver a comunidade escolar em todo esse processo.
Para dar conta dessas tarefas, várias redes de ensino e escolas deixam
a gestão financeira sob a responsabilidade de uma pessoa, um agente
financeiro, ou um professor da escola com essa habilidade. Esse
processo e a tomada de decisão mais individualizada fragilizam o
exercício da gestão democrática.
Também foi identificada a presença de uma autonomia
relativa nas escolas, pois essas foram outorgadas a ações específicas,
determinadas pelo próprio programa, sem possibilidade de efetivo
poder de decisão; as decisões centralizadas sobre os gastos públicos
e seu rigoroso controle por parte do governo federal, inclusive, com
os recursos sendo fixados para despesas de custeio e de capital.
Outro aspecto importante de ser destacado, com as mudanças
promovidas pelo PDDE nas escolas públicas, diz respeito à relação
entre uma gestão escolar eficiente e uma gestão de fato democrática
e participativa. Nesse sentido, é possível afirmar que os inúmeros
procedimentos gerencialistas, nos moldes escola-empresa, ocorridos
nos últimos anos nas escolas públicas, dificultam e enfraquecem as
práticas de gestão democrática no ambiente escolar. Isso ocorre pelo
fato de que um dos articuladores principais da prática desse princípio
na escola, o gestor escolar, vê-se envolvido com inúmeras tarefas
burocráticas que não permitem tempos e espaços qualificados para
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 35

mediar processos pedagógicos que envolvam todos os segmentos da


comunidade escolar na tomada de decisão.
Para além de todos esses desafios constatados pelas pesquisas
e estudos realizados durante os mais de 23 anos de implementação
da política PDDE, a situação mais agravante ocorreu no ano de 2016,
com o afastamento irregular da presidenta Dilma Rousseff, eleita
democraticamente. A nova ordem política e econômica estabelecida
no país fragilizou os processos democráticos e demarcou inflexões
em inúmeras políticas sociais, entre elas, a educação. Isso ocorreu
devido aos recentes cortes de recursos para a educação brasileira
que resultam da Emenda Constitucional nº 95/2016 (EC 95/2016),
conhecida durante sua tramitação como “PEC das Desigualdades”,
pois instituiu um novo regime fiscal que congela os gastos federais
primários por vinte anos, ou seja, até o ano de 2036.
Esse duro golpe, que alterou a Carta Magna, afetou inúmeros
programas federais desenvolvidos nas escolas públicas. Entre eles, o
PDDE básico e as outras dez modalidades que foram implementadas
até o ano de 2016. Nos anos seguintes, 2017 e 2018, as modalidades
do PDDE foram extintas em várias escolas públicas do país. No
período atual, somente o PDDE básico continua sendo repassado às
escolas públicas. Portanto, a gestão escolar e financeira nas escolas
públicas, mesmo com todas as fragilidades para gerir os recursos
do PDDE e suas modalidades, volta a se deparar com a escassez de
recursos e com a redução de despesas que qualificavam inúmeras
ações previstas em seus projetos pedagógicos.

3. PARA FINALIZAR

O presente texto teve por objetivo apresentar implicações


que o PDDE, uma importante política de financiamento da União
à educação básica, decorridos mais de 23 anos de sua implantação,
36 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

apresenta para a gestão financeira de escolas públicas. No exercício


das funções de administração financeira, defendemos a necessidade
de constituição de equipes gestoras que conduzam o trabalho na
perspectiva da gestão democrática, atendendo ao objetivo do PDDE
de fomentar a participação da comunidade escolar para resolver os
problemas imediatos da escola.
Segundo as pesquisas revisadas para discutir o tema, a
administração dos recursos do PDDE e de suas modalidades interferiu,
intensificou e modificou a atuação dos gestores escolares, os quais
passaram a desempenhar uma nova função: a gestão financeira. Nas
instituições onde a gestão escolar e financeira e o controle social
foram efetivos, envolvendo a participação dos diferentes segmentos
da comunidade escolar em todas as fases de uso dos recursos
públicos (lista de prioridades, definição de gastos, planejamento,
orçamentos, compras, prestação de contas, publicização dos gastos),
as ações pedagógicas foram qualificadas e refletiram na melhoria
dos processos de ensino e de aprendizagem. Nessa perspectiva
democrática de gestão dos recursos do PDDE, o gestor escolar não
fica sobrecarregado, pois envolve e compromete as pessoas com as
dimensões administrativa, financeira e pedagógicas da organização
das escolas.
Mesmo com esses avanços, os valores do PDDE repassados
às escolas ainda são parcos e não atendem às reais necessidades
político-pedagógicas das instituições escolares. É imprescindível
ampliar o volume de recursos da assistência financeira suplementar da
União às escolas públicas. Tal constatação pode ser considerada uma
das razões da ausência de resultados reais na melhoria da qualidade
da educação básica brasileira. Mesmo que o financiamento por si
só não garanta a qualidade do ensino, sabemos de sua fundamental
importância para promover ações que possam reverter o fracasso
escolar, ampliando situações de ensino e de aprendizagem com
qualidade para todos os estudantes da educação básica brasileira.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 37

Porém, a nova ordem política e econômica estabelecida


no país, nos últimos três anos, modificou os rumos da política
educacional e fragilizou os processos democráticos. O novo regime
fiscal, estabelecido pela EC nº 95/16, diminui drasticamente
os recursos para a educação brasileira e inviabiliza inúmeros
programas federais que chegavam as escolas públicas, entre eles
o PDDE, que foi reduzido, deixando de encaminhar recursos para
as modalidades (ações agregadas). Além disso, o maior agravante
dessas medidas tem sido o de inviabilizar o cumprimento das
metas do Plano Nacional de Educação 2014-2024, o qual prevê,
na Meta 20, uma ampliação significativa de aportes financeiros
para a educação. Portanto, o momento agora é de luta, resistência e
reorganização da comunidade educacional em defesa da democracia
e da educação pública.

REFERÊNCIAS

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outubro de 1988. Brasília, 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br.

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38 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
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Fundamental público: estudo de caso de Rio Verde (GO). Comunicações,
ano 23, n. 1, p. 107-125, jan./abr. Piracicaba, 2016.

MOSNA, Rosa Maria Pinheiro. Avaliação da política pública


‘Programa Mais Educação’ em escolas de ensino fundamental da
rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul. 2014. Tese (Doutorado
em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade
em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,
2014.
CAPÍTULO 2
AVALIAÇÃO NACIONAL
E “PROVA BRASIL”:
uma análise à luz da governamentalidade
Izabella da Silva Vieira
Karla de Oliveira Santos
Laura Cristina Vieira Pizzi

1. SOBRE O CONCEITO DE GOVERNAMENTALIDADE


EM MICHEL FOUCAULT E A EDUCAÇÃO

Os anos 1980 no Brasil foram marcados pela reabertura


democrática, substituindo o regime de ditadura militar. Nesse período,
o país também enfrentou uma intensa crise econômica, crescimento
da inflação e consequente aumento das desigualdades sociais, que, por
suas vezes, representavam um entrave do ponto de vista neoliberal
para o crescimento da nação. Sem condições de financiar suas dívidas,
o governo brasileiro recorreu ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário
Internacional, que, em contrapartida, exigiram uma série de reformas
no âmbito econômico, político e institucionais.
Dentro desse pacote de mudanças exigido pelos organismos
internacionais, a educação foi tratada, na ótica da teoria do capital
40 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

humano capitalista, como elemento de desenvolvimento econômico.


Sob o argumento de fracasso da escola pública, esses organismos
internacionais justificaram a necessidade de fornecer a agenda de
mudança para a educação, e, assim, foram implementadas várias
políticas no campo educacional. Para se expandir os sistemas
de ensino, foram desenvolvidas novas estratégias de gestão e de
financiamento. O discurso das competências teve forte impacto
na política curricular e se desdobrou em mudanças na política de
avaliação, atingindo também a formação de professores. Vale
destacar que houve inicialmente uma concentração nas políticas
direcionadas ao ensino fundamental.
Nesse sentido, foi elaborada uma agenda de compromissos
com a educação como uma decorrência “natural” das mudanças
econômicas. Nessa agenda, foi defendida a necessidade de estabelecer
também metas avaliativas dos seus resultados. De acordo com Ferreira
(2009, p. 257), “a política de descentralização criou a necessidade de
controle dos resultados, medida adotada com a institucionalização do
sistema de avaliação em larga escala”. Utilizando como argumento a
necessidade de medir o grau de sucesso (ou fracasso) da educação no
país, e ainda para servir como orientador de políticas que busquem a
qualidade da educação escolar, o governo federal criou um instrumento
avaliativo que tem o papel de verificar a aprendizagem dos/as alunos/
as na educação básica, a Prova Brasil.
As reformas atuais têm se caracterizado por práticas globais
que têm como objetivo mudanças nos padrões de regulação
social. Tanto as reformas quanto as políticas educacionais estão
relacionadas à gestão dos indivíduos. “Para isso, estabelecem
uma série de regulamentações, mobilizam discursos e tecnologias
(como o currículo, a didática, modalidades de organização e gestão
escolar etc.), tornando a alma e as capacidades humanas objetos de
disputa e governo” (GARCIA, 2010, p. 446). Daí a necessidade de
tomar o conceito de governamentalidade e das questões referentes
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 41

às estratégias de controle da educação, levando em consideração


a racionalidade da política neoliberal, que se instala em tempo
atuais, para o entendimento do funcionamento da educação e, mais
especificamente, da avaliação como dispositivo de controle do
currículo e das práticas curriculares docentes.
A política avaliativa proposta pelo governo para todos
os níveis educacionais, sobretudo, para o ensino fundamental,
a exemplo da Prova Brasil, tem se mostrado um forte dispositivo
de controle curricular, com a intenção de controlar os saberes
desenvolvidos em sala de aula pelos professores. Os processos de
avaliação a que os alunos são submetidos, e que avaliam também o
desempenho dos professores e das escolas, indicam que essa forma
de controle governamental, e, ao serem aliados aos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN), reforça os objetivos, os saberes e as
práticas estabelecidas no âmbito oficial do governo, atuando como
práticas normalizadoras e controladores dos docentes.
Dessa forma, lançamos a seguinte problemática: Como o
professor sente a ingerência do governo a partir do discurso da Prova
Brasil no seu currículo? Esta pesquisa teve como objetivo analisar
de que maneira, a partir da implantação da Prova Brasil, o currículo
oficial (PCN) tem se tornado o modelo predominante. Dessa forma,
tem também controlado e padronizado a prática curricular docente.
A noção de governamentalidade desenha-se claramente nos
estudos de Michel Foucault, no seu curso no Collège de France,
no ano de 1978, depois publicada especificamente em sua obra
Segurança, território, população.
Foucault (2013, p. 429) elabora três afirmações sobre
governamentalidade:

1) o conjunto constituído pelas instituições,


procedimentos, análises e reflexões, cálculos
42 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

e táticas que permitem exercer esta forma


bastante específica e complexa de poder, que
tem por alvo a população, por forma principal
de saber a economia política e os instrumentos
técnicos essenciais os dispositivos de segurança.
2) a tendência que em todo Ocidente conduziu
incessantemente, durante muito tempo, à
preeminência deste tipo de poder, que se pode
chamar de governo, sobre todos os outros
– soberania, disciplina, etc. – e levou ao
desenvolvimento de uma série de aparelhos
específicos de governo e de um conjunto de
saberes. 3) o resultado do processo através do qual
o Estado de justiça da Idade Média, que se tornou
os séculos XV e XVI Estado administrativo, foi
pouco a pouco governamentalizado.

Nesse sentido, a governamentalidade é a “arte de governar”


relacionada a tipos de racionalidade que envolvem conjuntos
de procedimentos, mecanismos, táticas, saberes, técnicas e
instrumentos destinados a dirigir a conduta dos homens. De
acordo com Temple (2013), é constituído por meio de um tripé de
problematizações: soberania, disciplina e população, ou, ainda, lei,
disciplina e população.
A arte de governar irá se revestir cada vez mais de uma
dimensão técnica, fazendo uso de um tipo de saber, a economia
política, e de tecnologias próprias e adequadas à gestão desse novo
campo e, ou, objeto de intervenção política, a população, como
campo e objeto econômico (GADELHA, 2009). Essa arte inclui o
estudo do governo de si, o governo dos outros e as relações entre o
governo de si e o governo dos outros, possibilitando aos indivíduos
livres controlar a si mesmos e a outras pessoas, contribuindo para a
criação de indivíduos governáveis, através do controle e da norma.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 43

O termo “governo” está associado a uma racionalidade


política que centra sua atenção na “conduta da conduta” ou na
previsão de um campo de possibilidades para o controle da ação dos
outros (FOUCAULT, 1990 apud CASTRO, 2009) e a ação do sujeito
sobre si próprio. O Estado na Modernidade tornou-se um Estado de
“governo”, processo histórico que Foucault (1990 apud CASTRO,
2009) chamou de a governamentalização do Estado moderno,
pressupondo a introdução da arte de governo entendido como a arte
de bem dispor as “coisas” a fim de alcançar riqueza e progresso ao
nível do Estado (GARCIA, 2010, p. 448). As sociedades modernas
não são apenas sociedades de disciplinarização, mas também de
normalização, dos indivíduos e da população (CASTRO, 2009).
Governar consiste em conduzir condutas e almas. Governar
é governar as coisas. É uma maneira de atuar sobre um ou vários
sujeitos. É uma conduta que objetiva agir sobre outras condutas;
que almeja incitar, induzir, desviar, facilitar ou dificultar o
comportamento dos sujeitos. Governar também implica na relação
que se pode estabelecer consigo mesmo, na ação do sujeito sobre si
próprio (FOUCAULT, 2013).
Trata-se, portanto, de analisar toda uma nova “arte de
governar” que envolve não somente o exercício prático do governo,
mas também as formas de pensar o governo, a razão (ou saber)
que orienta essas práticas. O Estado não é analisado do ponto de
vista de um ideal filosófico ou jurídico, mas como um conjunto
de mecanismos, práticas, saberes e instituições voltadas para o
exercício concreto do governo de uma determinada população-
território (SILVEIRA, 2015). Ele torna-se um campo de disputa
pelo controle de normalização, hierarquização e classificação de
saberes, que interferem nas instituições sociais, como a família, a
escola, o hospital etc.
Na medida em que o governo pode ser definido enquanto
técnica de condução das condutas, a governamentalidade deve ser
44 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

entendida como regime de poder e como um campo estratégico


permeado por relações de forças, no qual se entrecruzam ao tempo
que também se articulam práticas de governo, ou de regularização e
estabilização das condutas. “A governamentalidade contemporânea
supõe, então, que o Estado dê conta politicamente do todo e de cada
um, o que implica em estratégias macro e micro políticas” (PRADO
FILHO, 2006, p. 82). Ou seja, que as estratégias macro de governo
sejam eficientes no plano micro.
Segundo Temple (2013), é por meio dessa estratégia
biopolítica que no liberalismo a noção de liberdade “natural” é
politicamente criada e regulamentada. A ideia do governo liberal é a
noção de uma ideia de um governo dos homens, por isso administra,
sobretudo, as coisas que os homens querem, pensam e desejam.
Peters, Marshall e Fitzsimons (2004) apontam que Foucault
baseia suas investigações sobre o governo em três conceitos:
segurança, população e governo. E ainda afirmam:

Ele sustenta que houve uma explosão do


interesse na “arte de governar” no século XVI,
motivada por questões diversas: o governo de si
mesmo (a conduta pessoal); o governo de almas
(a doutrina pastoral); e o governo de crianças (a
problemática da pedagogia). Foucault diz que
a problemática do governo pode ser localizada
na interseção entre duas tendências opostas:
centralização do Estado e uma lógica de
dispersão. Essa é uma problemática que propõe
questões a respeito do como do governo, ao
invés de sua legitimação, e busca “articular uma
espécie de racionalidade que era intrínseca à arte
de governar sem subordiná-la à problemática do
príncipe e de sua relação com o principado do
qual é lorde e mestre (PETERS; MARSHALL;
FITZSIMONS, 2004, p. 79).
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 45

É no nascimento de táticas totalmente novas que a população


emerge como um fim, mas também como um instrumento para
o governo. É a população que será levada em consideração nas
observações do governo, primordial para se conseguir governar de
forma racional e planejada. “A constituição de um saber de governo
é absolutamente indissociável da constituição de um saber sobre
todos os processos referentes à população em sentido lato, daquilo
que chamamos precisamente de ‘economia’” (FOUCAULT, 2013, p.
426). Para Bert (2013), governar pessoas é um equilíbrio que oscila
entre as técnicas que asseguram a coerção e procedimentos pelos
quais o si se constrói e se modifica a si mesmo.
A governamentalidade pode ser definida como o conjunto de
práticas e estratégias que os indivíduos livres utilizam para controlar
ou governar a si mesmos e outras pessoas. Diz respeito a criticar,
problematizar, inventar, imaginar e mudar a forma do pensável. Mas
não é só isso, a governamentalidade não se limita a apenas técnicas
disciplinares, mas repousa também sobre aparatos específicos
de governo, de instrumentos e de dispositivos de segurança,
verdadeiros instrumentos de regulação, mais importantes do que as
leis do aparato jurídico e as disciplinas produzidas pelas instituições,
entre elas, a escola. Dessa forma, o “controle torna-se uma prática
de governo que busca, através do conhecimento das atividades das
pessoas, dirigir políticas e determinar os objetivos que devem ser
alcançados (e desejados) por todos os indivíduos” (DEL PINO;
VIEIRA; HYPÓLITO, 2009, p. 115).
No neoliberalismo, a arte de governar consiste em manter a
autonomia do governo diante da impossibilidade de administrar a
totalidade dos processos econômicos. Para tanto, a razão do Estado
cria um novo espaço de atuação que é a sociedade civil. Há ainda a
necessidade de flexibilização no modo de governar os indivíduos,
que devem ser regulados, pois o importante para o Estado é o
exercício do poder.
46 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

O sentido discutido por Foucault do termo governamentalidade


ajuda a construir as ferramentas necessárias para entender a
racionalidade política neoliberal ou o novo gerencialismo, que tem
se constituído como a base das reformas do Estado e dos princípios
mais gerais que têm orientado as reformas educacionais na atualidade
(GARCIA, 2010).
Podemos observar que a gestão das políticas educacionais
neoliberais no Brasil, desde a década de 1990, tem incorporado a
lógica do novo gerencialismo público nas práticas de gestão dos
sistemas de ensino e das escolas nas três esferas administrativas
da federação. O modelo está alicerçado na busca de melhoria
da qualidade na educação, entendida como objeto mensurável e
quantificável em termos estatísticos e que poderá ser alcançada a
partir de inovações incrementadas na organização e na gestão do
trabalho na escola.
De acordo com os autores Peters, Marshall e Fitzsimons
(2004, p. 89), “As verdadeiras especificações para a liberdade do
indivíduo, que são proporcionadas pelas formas gerencialistas de
educação, então não são nada mais do que um momento em um
processo individualizante e totalizante, a governamentalidade”.
Os autores ampliam a discussão do conceito de
governamentalidade e sua relação com a educação afirmando que o
novo gerencialismo funciona como uma tecnologia de governança
emergente e cada vez mais racionalizada e complexa, que opera em
diversos níveis: o individual (do estudante autogerido e professor),
a sala de aula (técnicas de gestão da sala de aula), o programa
acadêmico (com a promoção explícita dos objetivos de autogestão)
e a escola ou instituição educacional (instituições autogeridas).
No campo da racionalidade política, a governamentalidade
deve ser analisada enquanto tecnologias de governo, que dirige
a intenção de obter o máximo de resultados a custos mínimos ou
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 47

previsíveis. “As racionalidades políticas modernas são formas


de poder político referidas ao Estado e implicam em tecnologias
de poder individualizador, que passam por regimes de verdade e
conhecimento” (GARCIA, 2010, p. 449).
A arte de governar característica da razão de Estado envolve
uma série de racionalidades específicas (como o exame, as estratégias,
os cálculos, as análises) sobre a população para que o Estado esteja
apto a governá-la (TEMPLE, 2013).
Para Marshall (2011), nessa lógica, uma nova forma de
racionalidade do Estado é uma exigência neoliberal. Se o Estado
precisa ser fortalecido e sua capacidade e meios para ampliá-lo
devem ser estabelecidos, para que isso ocorra é necessária uma
forma de conhecimento político, diferente das teorias políticas sobre
a natureza do Estado e sua legitimação. Torna-se necessário um certo
conhecimento concreto, preciso e específico.
O conceito de governamentalidade é crucial para podermos
entender como vêm se dando as articulações entre a administração
estatal e as instituições educativas. Na medida em que as leis, as
regulamentações, as diretrizes governamentais, as instituições
educacionais, os saberes especializados voltados para a infância
visam produzir determinados modos de ser, pode-se perceber como
tais propósitos se conectam com uma racionalidade política que
atravessa a Modernidade.
Com a governamentalidade, pode-se, por exemplo,
compreender melhor por que a educação escolar tornou-se, ao
mesmo tempo, objeto e objetivo centrais para o Estado moderno.
E, na medida em que a escola se tornou a instituição capaz de
melhor e mais vigorosamente articular a genealogia do sujeito com a
genealogia do Estado, também se compreende que a escola tem um
papel preponderante nas transformações do mundo contemporâneo
(VEIGA-NETO; TRAVERSINI, 2009).
48 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

A ampliação da noção de governamentalidade nos permite


pensar que as práticas educativas e pedagógicas se encontram
vinculadas aos dispositivos de governo das populações, mas também
às práticas de governamento de si mesmo, daí poder-se-ia dizer que
os discursos educativos e pedagógicos produzem e articulam formas
políticas e formas éticas de governamento (MARÍN, 2011).

2. AS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL E SEUS


IMPACTOS NA EDUCAÇÃO NACIONAL

A década de 1990 foi marcada por reformas no sistema


educacional brasileiro, propondo políticas que garantissem a
inserção e a permanência de crianças no sistema público de
ensino, com um nível mínimo de qualidade educacional e social.
Algumas mudanças envolveram desde a organização de referenciais
curriculares nacionais e a formação de professores, até investimentos
financeiros para amplos programas em âmbito nacional e em nível
local, destinados a cada escola de cada município do país, buscando
uma maior eficiência, eficácia, efetividade, controle de qualidade e
descentralização de responsabilidades.
Souza (2009) afirma que a proposta neoliberal para o Estado
é marcada por uma ideia reguladora: a da privatização, baseada na
defesa das competências, na eficiência da iniciativa privada e na sua
superioridade em relação às ações públicas, coletivas. Para Vieira
(2011), as táticas do neoliberalismo para a educação apontam para
uma descentralização das responsabilidades do Estado e, ao mesmo
tempo, a centralização do controle da gestão, além de formas
alternativas de financiamento e de responsabilização direta das
instituições escolares.
Garcia (2010) afirma que os contratos, metas, indicadores
(como o Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e os
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 49

bancos de dados que resultam dos exames nacionais, por exemplo,


currículos prescritos, políticas de avaliação e auditoria, garantem o
governo a distância, a responsabilização individualizada dentro de
metas e estratégias definidas centralmente.
Segundo Peroni (2003, p. 59):

A administração pública gerencial tem, como


estratégias, a definição precisa de objetivos e a
autonomia do administrador para gerir recursos
humanos, materiais e financeiros. Mas essa
autonomia é cobrada através de resultados,
verificando-se se foram ou não atingidos os
objetivos propostos no contrato.

Esse modelo, portanto, vem promovendo mudanças marcadas


predominantemente pelos aspectos quantitativos, em detrimento dos
qualitativos, que tendem a ignorar os diferentes contextos da realidade
educacional brasileira, historicamente marcada pelas desigualdades
econômicas, culturais, políticas, educacionais e sociais, favorecendo
o controle social através da competitividade.
Ao analisarmos a dinâmica das políticas públicas
educacionais, é possível perceber que os/as alunos/as, para os/as
quais essas políticas são destinadas, no nosso caso em particular as
crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, não têm tido um
reconhecimento, de um lado, de sua participação ativa no processo
e, de outro, do seu direito à infância dentro do sistema escolar,
enquanto sujeitos de direitos. Há uma resistência em reconhecer e
dar visibilidade para a condição de direitos das crianças, limitando
a infância ao assistencialismo. No entanto, as políticas públicas
reduzem as crianças e adolescentes em mercadorias treináveis para
a empregabilidade, o controle e o disciplinamento, agindo sobre
a conduta e sua subjetividade, transformando o seu eu em um ser
50 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

passivo, apesar de toda a retórica da formação para a cidadania,


presente na maioria dos documentos oficiais.
Popkewitz (2004, p. 114) aponta que os discursos científicos
da reforma escolar que circulam entre as nações e em fóruns
internacionais vão além das maneiras de representar abordagens
mais eficientes à escola; eles incorporam as imagens e os princípios
de um cidadão que deve participar e agir dentro dos diferentes
sistemas nacionais.
Ainda segundo o autor, as reformas educacionais atuais
reconstituem a imagem que governa a criança. As identidades
sociais coletivas e normas universais incorporadas em reformas
anteriores são substituídas por imagens da identidade local,
comunal e flexível. As reformas inscrevem um cidadão
descentralizado que é ativo, automotivado, participativo e que
busca resolver problemas, desde que alinhados aos interesses do
mercado. O professor e a criança são construídos como tendo
identidades múltiplas, orientados para o trabalho colaborativo,
participando de uma “comunidade” local e com uma disposição
flexível para a resolução de problemas, visando torná-los
produtivos numa sociedade de profundas desigualdades.
Há uma ênfase em adotar um modelo de avaliação de
resultados (e produtos) e, consequentemente, desvalorizar a
avaliação dos processos, como é o caso dos exames nacionais que
reduzem a complexidade do processo educativo apenas ao que é
mensurável. É preciso definir se a avaliação será instrumento de
controle ou de desenvolvimento, de promoção do ser humano e da
escola (SOUZA, 2009). Ainda segundo Souza (2009), o processo
de mudança das relações entre o Estado e a sociedade e da reforma
da administração pública, a avaliação, vem assumindo a condição
de instrumento estratégico quase sempre fundamentado nos famosos
três “Es”: eficiência, eficácia e efetividade.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 51

Arroyo (2011) argumenta que entre reduzir as crianças a


mercadorias treináveis para a empregabilidade ou reconhecê-la como
sujeitos de direitos há um ganho incalculável de qualidade humana e
política. Ganho este que eleva a escola a uma qualidade social, como
um espaço público de garantia de direitos.
Nesse contexto, acontece uma intensificação na formulação
e implementação de políticas no campo educacional, objetivando
a adequação do sistema educacional brasileiro ao setor produtivo,
através da inserção no mercado globalizado e pela aplicação de
políticas neoliberais que tendem a aprofundar as desigualdades
educacionais.
De acordo com Faria e Filgueiras (2007), amplas reformas
têm sido discutidas e implementadas em uma perspectiva de ênfase
na educação básica, de descentralização dos sistemas, de busca de
melhoria da qualidade dos serviços oferecidos e de ampliação do
papel do setor privado em sua provisão.
Segundo Salermo (2009), a redefinição do papel do Estado,
o qual deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento
econômico e social pela via da produção de bens e serviços para
ser o promotor e regulador desse desenvolvimento, culminou com
a reforma administrativa e normativa da estrutura e financiamento
do sistema educacional brasileiro, mudanças no contexto curricular,
como a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e
novas formas de gestão do sistema educacional e da escola.
As reformas atuais são práticas globais que visam mudanças
nos padrões de regulação social e nos regimes éticos que capacitam os
sujeitos para as relações sociais, como também incorporam sistemas
de razão e conhecimento como práticas de inclusão e exclusão que
produzem posições de sujeito, sistemas de classificações e distinções,
que formam o horizonte ético do indivíduo consigo mesmo e com os
outros (GARCIA, 2010). Ainda segundo a autora, essas reformas
52 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

direcionam e guiam o trabalho escolar e docente, estabelecendo uma


série de regulamentações, mobilizam discursos e tecnologias (como
o currículo, a didática, modalidades de organização e gestão escolar
etc.), tornando a alma e as capacidades humanas objetos de disputa
e governo.
A escola torna-se lócus de produção, moldagem e
objetificação de sujeitos dóceis a uma nova dominação política que
garante a governamentalidade em termos modernos, tendo um papel
preponderante nas transformações do mundo contemporâneo.
Pensando acerca dessas implicações, partimos do que afirma
Cervi (2013, p. 37):

Avalia-se continuamente, apresentam-se os


resultados almejados, propõem-se as reformas,
criam-se as leis, organizam-se formações para
aprender. Espera-se que quase todos estejam
na escola por um tempo cada vez maior. Nela,
o que está em jogo é ocupar todo o tempo,
gestar a inteligência, acreditar na democracia, na
participação; acreditar que se é livre, e autônomo,
consumir e estar no fluxo.

A partir do exposto, a escola vem sendo transformada em


um espaço que permite a produção de saberes para as crianças,
imersa em um processo de vigilância e controle, criando processos
de subjetivação, através de mecanismos e práticas de governo e de
autogoverno, criando tecnologias de regulação e de autorregulação,
disciplinando os corpos e as mentes das crianças.
Há um governo que observa, vigia e controla a criança,
conduzindo-a para que a sua vontade não seja contrária à sociedade,
almejando que cada um e todos sejam governáveis. É um governo
que reconhece certa naturalidade dos comportamentos infantis.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 53

No entanto, são necessárias práticas disciplinares para alcançar o


autogoverno dos indivíduos.
De acordo com Marín (2011), desenha-se, desse modo,
uma forma de governo que procura garantir, através das práticas
educativas, o governo dos indivíduos por eles mesmos e, com isso,
a autorregulação da população. Ainda segundo a autora, a educação
é uma estratégia de governamento articulada à razão de governo
liberal e que, embora trabalhe com indivíduos, os indivíduos só são
os instrumentos e a condição para realizar o governo da população.
Ampliando a discussão acerca do sentido de governamento,
Bujes (2008, p. 107-108) expõe o seguinte:

O governamento, portanto, pode resultar tanto


de uma ação tendente a conduzir a conduta
alheia, quanto daquelas empreendidas por todos
nós no sentido de conduzirmos nossas próprias
condutas. Tais ações, de um sujeito sobre os
outros ou sobre si mesmo, remetem à ideia de
que o exercício do poder se dá pela utilização de
determinadas tecnologias.

Cervi (2013), ao pensar a escola moderna e analisar os


documentos oficiais das políticas públicas educacionais, afirma que
o conjunto de tecnologia da governamentalidade difundiu a nova
linguagem e a nova agenda para a educação, as quais se apoiam em
conceitos como: liberdade, flexibilidade, competitividade, eficiência,
descentralização, autonomia, democracia e gestão.
O que temos observado é uma educação liberal e despolitizada
em nome de uma qualidade que está sendo a todo tempo negociada
com os estudantes e os pais (comunidade escolar) para se obter
desempenhos específicos de forma contratual a fim de cumprir as
tarefas delegadas.
54 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Hofling (2001) afirma que, numa sociedade extremamente


desigual e heterogênea como a brasileira, a política educacional
deve desempenhar importante papel ao mesmo tempo em relação
à democratização da estrutura ocupacional que se estabeleceu e à
formação do cidadão, do sujeito, em termos mais significativos,
tornando-o competitivo frente à ordem mundial globalizada.
Temos visto a implementação de políticas públicas
educacionais de base neoliberal, com novas estruturas de
responsabilização e financiamento, que controlam e regulamentam
a vida da população, guiando, individualizando e normalizando,
garantindo a manutenção do Estado.
No que tange à necessidade de controle da aplicação dessas
políticas, tomando como justificativa a melhoria da qualidade
educacional, o governo federal, através do Ministério da Educação
brasileiro, tem seguido as orientações de organismos financeiros
internacionais estabelecendo metas avaliativas dos seus resultados.
Para Ferreira (2009, p. 257), “a política de descentralização criou
a necessidade de controle dos resultados, medida adotada com a
institucionalização do sistema de avaliação em larga escala”. Na
seção seguinte, analisaremos a política nacional de avaliação em
larga escala denominada de Prova Brasil como um instrumento de
controle curricular e do trabalho docente.

3. AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA NO BRASIL: A Prova


Brasil em questão

A Prova Brasil é uma avaliação em larga escala do ensino


fundamental brasileiro, de caráter censitário, capaz de fornecer os
resultados médios de desempenho de cada município e cada escola
do território brasileiro. A primeira edição aconteceu em 2005 e
atualmente examina todos/as os/as alunos/as das turmas de 5º e 9º
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 55

anos do ensino fundamental, representando o fim da primeira etapa


e da segunda etapa do ensino fundamental. A avaliação acontece a
cada dois anos.
A Prova Brasil teria como objetivo avaliar habilidades nas
áreas consideradas prioritárias, ou seja, a Língua Portuguesa, tendo
como foco a leitura, e a Matemática, com foco na resolução de
problemas. É constituída por questões de múltiplas escolhas, com
quatro alternativas. As questões são classificadas com base no
grau de complexidade em médias, fáceis e difíceis, considerando
o raciocínio que o aluno necessita para resolvê-la. A partir dos
resultados da Prova Brasil, junto com o Censo Escolar, o governo
federal estabelece o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(Ideb), que funciona como indicador para verificação do cumprimento
das metas estabelecidas a partir do Decreto nº 6.094/20077.
No Brasil, o caráter das políticas de avaliação em larga escala
tem assumido o caráter de definidora de conteúdos. No caso da
Prova Brasil, também acaba por assumir uma função classificadora,
uma vez que seus resultados podem ser calculados por escola e
são amplamente divulgados, de acesso público, consequentemente
capazes de promover a responsabilização de gestores, professores e
dos próprios alunos.
Na investigação dessa problemática, fizemos um recorte de
duas escolas públicas de ensino fundamental da rede municipal de
São Miguel dos Campos, município situado no interior do Estado de
Alagoas. Essas escolas foram escolhidas com base no desempenho da
Prova Brasil e no resultado obtido no Ideb. Elas também participaram
da 1ª, da 2ª e da 3ª edição da Prova Brasil, respectivamente em 2005,
2007 e 2009. Ambas estão localizadas na zona urbana e tiveram boas
notas no Ideb em relação às outras escolas do mesmo município.
Dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso pela Educação,
7

pela União Federal, em regime de colaboração com os municípios, Distrito Federal e


estados, e a participação das famílias e da comunidade.
56 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Além disso, as duas escolas possuem número semelhante de


alunos/as matriculados/as. Foram selecionados para as entrevistas
especificamente os/as professores/as das turmas de 4º e 5º anos do
ensino fundamental, por serem ofertadas pelas duas escolas, sendo
dois professores da escola A e seis da escola B, totalizando um
universo de oito professores.
Ao tomar como objeto de estudo a avaliação como dispositivo
produtivo para a governamentalidade neoliberal, a pesquisa investiga
e busca mostrar como os discursos referentes à Prova Brasil operam
como via de circulação da política curricular e instrumento de
controle do currículo escolar.
Nas escolas, houve uma preparação do corpo docente
através de cursos de formação de professores e dos alunos, via
aplicação de testes simulados da Prova Brasil e acompanhamento
direto da coordenação pedagógica sobre o trabalho dos descritores
e distratores da Prova Brasil, cujos conteúdos orientam os testes
nos anos em que houve avaliação. É importante destacar que há
permanente divulgação dos resultados dos testes na comunidade
escolar, tendo sido observado que, na escola que obteve maior nota
na avaliação, havia cartazes espalhados com a nota alcançada no
Ideb. Essa exibição de cartazes nas escolas que obtiveram boas
notas na Prova Brasil exibe um comportamento que estimula
a competitividade, uma das condutas desejáveis dessa política
avaliativa. O mesmo comportamento tende a não ser observado
nas escolas com notas baixas.
Em todas as entrevistas, os docentes demostraram uma
inclinação aos desígnios da política nacional, sem qualquer
questionamento sobre a legitimidade da imposição de saberes,
da sobreposição de conteúdos e de disciplinas em relação a
outros saberes, ou mesmo a falta de autonomia para lidar com
as demandas locais. Os docentes têm permitido que seu trabalho
seja controlado tanto em forma quanto em conteúdo. Assim, as
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 57

práticas curriculares cotidianas sofrem com a crescente perda da


autonomia dos professores, desenvolvendo o processo contínuo
de padronização dos conhecimentos trabalhados em sala de aula e
controle do trabalho docente.
Entendemos que o controle ocorre especialmente sobre a ação
do currículo ao colocar conteúdos do seu campo em funcionamento
e ao movimentar a avaliação desses conteúdos, voltando-se à
conformação moral dos docentes.
Observamos que a política de avaliação nacional, aliada à
política curricular nacional, tem mudado o uso do tempo escolar,
os conhecimentos abordados em sala de aula, selecionando apenas
aqueles conhecimentos que serão testados na Prova Brasil. Os
conhecimentos relacionados às ciências, história, artes, educação física
e geografia ficaram em segundo plano ou foram totalmente ignorados
pelos/as docentes. Desenvolveu-se uma forma de regulação dentro
da qual o/a docente é submetido à perda da autonomia. “A avaliação
e seus resultados funcionam como reguladores e indicadores do
processo educacional, visto que os próprios mecanismos utilizados na
construção curricular já delimitam como e até aonde (sic) o professor e
aluno podem e devem atuar” (BARREIROS, 2002, p. 4), introduzindo
moldes de submissão que tentam fornecer determinada habilidade.
Assim, a avaliação permite que o controle possa ser exercido
sobre o currículo, sobre o trabalho dos professores, as crianças e as
escolas que são mensuradas e categorizadas conforme desempenho.
Aos docentes, é ainda colocada a função de autocontrole sobre o
seu trabalho, incorporando o discurso das políticas e passando eles
mesmos a se cobrarem por melhores resultados na avaliação. Quase
todos os entrevistados atribuíram a si o resultado alcançado na Prova
Brasil. A pesquisa apontou uma postura dos/as professores/as como
gerentes de si mesmos, alinhando suas práticas curriculares à proposta
imposta pela Prova Brasil, mediante o discurso da eficiência, no trato
dos conteúdos exigidos na Prova Brasil em sala de aula.
58 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendemos que a Prova Brasil, enquanto dispositivo de


controle governamental, tem por objetivo não apenas medir o
desempenho dos estudantes, mas também o controle do trabalho
docente, de sua conduta e do currículo desenvolvido por eles.
Nas sociedades contemporâneas, a avaliação exerce um papel
importante de controle, tanto em relação aos docentes quanto às
crianças. Sua faceta mais extraordinária é conseguir induzir nos sujeitos
a autorregulação, sobretudo dos professores e de seus trabalhos.
O professor vem assumindo a política avaliativa sem
refletir se de fato esse procedimento vem melhorando a qualidade
do ensino e de suas aulas. Toma como verdade o resultado gerado
por essa avaliação, ainda que esta apresente uma concepção
de avaliação problemática, na medida em que é extremamente
limitadora dos saberes ensinados e empobrecedora do currículo
escolar, como estratégia de homogeneização. Esses dados não
podem ser considerados como indicadores de qualidade das escolas
e muito menos de um sistema educacional público. A pobreza, o
sucateamento, a desqualificação e a precarização do sistema escolar
público brasileiro são decorrência da própria política educacional
neoliberal adotada, e não diretamente do desempenho docente.

REFERÊNCIAS

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CAPÍTULO 3
O GLOBAL E O LOCAL NO CONTEXTO DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO:
globalização e financeirização no ciclo da
economia capitalista
Wellyngton Chaves Monteiro da Silva

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O campo das políticas é um espaço de permanente incerteza e


conflito, sendo fortemente influenciado por diferentes determinações
históricas ao serem formuladas e implantadas, além das perspectivas
e visões de mundo dos atores envolvidos e das condições
materialmente disponibilizadas desde a sua elaboração até a sua
execução. Assim, não há neutralidade nessas ações, e por isso mesmo
as pressões exercidas por grupos sociais antagônicos dependem das
forças exercidas pelas instâncias nos níveis internacional, nacional
e local.
Assim é que as políticas globais são planejadas, considerando-
se um contexto macro, sendo padronizadas e seguindo determinações
específicas. São vistas, na sua totalidade, sem direcionamento
específico para determinado local, e, muitas vezes, seguem padrões
64 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

já estabelecidos ou que lograram êxito e provocam inúmeras


transformações, nem sempre da mesma forma, recrudescendo
desigualdades. Integram algumas regiões e estados, exclui outros,
numa disparidade econômica, política e social.
É nesta perspectiva que trataremos das consequências
da relação entre o global e o local sobre as políticas públicas de
educação e os efeitos danosos aos trabalhadores dessa área, bem
como a formação oferecida ao estudante a partir desse modelo de
educação enquanto mercadoria, e com consequente efeito sobre os
Estados periféricos e sua submissão aos Estados centrais.
Enfocaremos, ainda, como o local interfere nas
políticas advindas das instâncias nacionais, adaptando-se às
especificidades dos sujeitos envolvidos na implantação, uma
vez que a política é transformada de acordo com a realidade
vivenciada, e por isso é modificada para se adequar àqueles que
estão concretizando essas políticas.

2. GLOBALIZAÇÃO E FINANCEIRIZAÇÃO DA ECONOMIA


CAPITALISTA: interferências nas políticas da educação

Em políticas hegemônicas a favor do controle econômico e


não para a melhoria das condições humanas, nas quais o homem
deixou de ser o centro do mundo, o discurso consensual é o do
crescimento econômico (SANTOS, 2001). Nesse contexto, a
existência humana depende do econômico, uma vez que, em última
instância, a economia dá o tom das relações sociais. Ademais, é o
que proporciona vivermos outras dimensões humanas necessárias à
sobrevivência. Assim, o que questionamos é a preponderância do
econômico que defende explicitamente as ideias neoliberais, com
ênfase no individualismo, no consumismo, no produtivismo, na
mercadorização e na indústria cultural.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 65

As políticas de caráter transnacional são advindas do processo


de globalização, a qual não se reduz apenas à dimensão econômica,
envolvendo outras dimensões: social, política e cultural. De
acordo com Santos (2002) e Burbules e Torres (2004), há algumas
especificidades que as caracterizam. A partir do momento em que as
empresas multinacionais, baseadas num modelo econômico liberal,
abrem-se aos mercados mundiais, exigem a interferência mínima
do Estado na economia, e, por sua vez, este precisa reduzir o peso
das políticas sociais no orçamento. Nesse contexto, dominam as
agências multilaterais – Fundo Monetário Internacional (FMI),
Banco Mundial (BM), Organização Mundial do Comércio
(OMC) – que impõem aos países periféricos e semiperiféricos um
receituário neoliberal como forma de agenciamento de recursos
para o pagamento da dívida externa.
Na dimensão econômica, a globalização é sustentada pelo
consenso econômico neoliberal: 1) novo tipo de regulação estatal;
2) direitos da propriedade internacional; e 3) a subordinação dos
Estados nacionais às agências multilaterais: BM, FMI, OMC. Desse
modo, os Estados periféricos e semiperiféricos ficam sujeitos às
imposições do receituário neoliberal como condição de negociação
da dívida externa, e as agências multilaterais impõem programas
de ajustamento estrutural, e dentro desses ajustamentos está a
redução dos custos salariais, tidos como responsáveis pelo aumento
da inflação (SANTOS, 2002). Com isso, ocorrem mudanças nas
relações comerciais, na formação do livre comércio e na redução
de importação, os processos bancários passam por uma reforma,
as formas de produção adquirem outro formato com a ascensão de
novas indústrias pós-fordistas, novas tecnologias e novos padrões de
consumo (BURBULES; TORRES, 2004).
Os Estados acabam perdendo sua força e ficam subordinados
a novos sujeitos, cujos interesses centrais vão ao encontro da nova
economia mundial numa escala global. Empresas multinacionais
66 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

passam a determinar as leis de mercado, com flexibilidade nos


processos de produção, revolução nas tecnologias de informação
e comunicação, dominados pelos três capitalismos transnacionais:
Estados Unidos da América (EUA), Japão e União Europeia.
Processos essenciais da nova economia mundial sustentada pelo
consenso econômico neoliberal ou Consenso de Washington. Na
globalização mundial, países em desenvolvimento, como o Brasil, são
os mais direcionados às imposições do receituário neoliberal, visto
que as agências multinacionais impõem esse modelo como condição
para renegociação de dívidas e liberação de novos financiamentos.
Quanto à dimensão social, fazem parte da globalização
as desigualdades. De um lado, as empresas multinacionais e uma
nova burguesia de executivos, composta pela elite empresarial,
diretores de empresas, altos funcionários do Estado, líderes políticos
e profissionais influentes; no ramo internacional: gestores das
empresas multinacionais e dirigentes das instituições financeiras
internacionais. Do outro, a nova pobreza globalizada, que não resulta
de falta de recursos humanos ou materiais, mas do desemprego, da
destruição das economias de subsistência e da minimização dos
custos salariais. Na perspectiva da globalização, o conceito de
consumidor substitui o de cidadão, e o critério de inclusão deixa
de ser o direito para ser a solvência, e, nesse cenário, os pobres são
os insolventes, e por isso devem adotar medidas compensatórias de
luta contra a pobreza (SANTOS, 2002). Com a globalização, novas
desigualdades sociais são produzidas e, à medida em que empresas
de grande porte e centralizadas em países desenvolvidos dominam o
mercado mundial, muitas outras vão à falência, e nesse acúmulo de
riqueza por poucos pelo ramo internacional, os nacionais passam a
ficar cada vez mais dependentes. Como consequência produzida pela
globalização neoliberal, temos a concentração de riqueza dos países
centrais: “no final da década de oitenta, segundo dados do Federal
Reserv Bank, 1% das famílias norte-americanas detinha 40% da
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 67

riqueza do país e as 20% mais ricas detinham 80% da riqueza do


país” (SANTOS, 2002, p. 34).
A desigualdade da globalização social e o consenso neoliberal
advogam que o problema está nos custos salariais, com isso, é preciso
proibir a indexação dos salários aos ganhos de produtividade e aos
ajustamentos em relação ao custo de vida e eliminando aos poucos
a legislação sobre salário mínimo, com o objetivo de impedir o
crescimento da inflação advindo dos aumentos salariais. No que diz
respeito ao político, os Estados centrais reduzem a autonomia política
dos Estados periféricos a uma nova ordem da divisão internacional
do trabalho, conjugada com uma nova economia a favor do mercado,
o que causa mais dependência. Os acordos políticos interestatais
(União Europeia, Tratado Norte-Americano de Livre Comércio
- Nafta, Mercosul) ganham força. No caso da União Europeia,
esses acordos evoluíram no sentido de uma soberania conjunta ou
partilhada. O que faz perceber que o Estado-nação tem perdido a sua
centralidade tradicional, no tocante à iniciativa econômica, social e
política. O Estado-nação enfraquece, perde sua soberania e seu papel
passa a ser o de moderador que busca equilibrar uma variedade de
limitações e pressões internas e externas, e que precisa atender às
demandas do capital transnacional, às estruturas políticas globais e
às pressões locais.
A globalização cultural assumiu um relevo especial na década
de 1980 com a “viragem cultural”, quando houve uma mudança de foco
na ênfase das Ciências Sociais, onde os fenômenos socioeconômicos
deixaram de ser o foco dos debates passando o foco para o cultural.
A questão está em analisar se as dimensões normatizantes e culturais
do processo de globalização desempenharam um papel primário ou
secundário. Outra questão levantada é saber se emergiu nas últimas
décadas uma cultura global (SANTOS, 2002). Países centrais têm
criado atores sociais e significados culturais como uma cultura para
todo o mundo, numa ideia de cultura global, mas com resistências
68 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

devido à diversidade cultural existente nas diversas partes do mundo.


Certo é que, quanto ao interesse no campo do domínio cultural, a
globalização econômica se faz presente:

No domínio cultural, o consenso liberal é


muito seletivo. Os fenômenos culturais só
lhe interessam na medida em que se tornam
mercadorias que como tal devem seguir o trilho
da globalização econômica. Assim, o consenso
diz, sobretudo, respeito aos suportes técnicos e
jurídicos da produção e circulação de produtos
das indústrias culturais, como, por exemplo, as
tecnologias de comunicação e informação e os
direitos de propriedade intelectual (SANTOS,
2002, p. 49).

Por conta de toda essa realidade, bastante complexa, as


políticas públicas de educação para o ensino médio no Brasil só
podem ser analisadas ao se levar em conta a relação global-local. Isso
tendo em vista que as políticas sofrem influências da globalização, e,
nessa medida, foram pensados e formulados novos direcionamentos
para esse nível de ensino, numa tentativa de adequá-lo ao mundo
globalizado através de políticas hegemônicas que atendessem
às mudanças ocorridas no cenário mundial. Nos debates sobre
globalização, a ideia de homogeneização é determinante como meta
a ser seguida por todos os países, numa espécie de cartilha para o
desenvolvimento. Nesse sentido:

A “globalização” é frequentemente considerada


como representando um inelutável progresso
no sentido da homogeneidade cultural, como
um conjunto de forças que estão a tornar os
estados-nação obsoletos e que pode resultar em
algo parecido com uma política mundial, e como
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 69

reflectindo (sic) o crescimento irresistível da


tecnologia da informação (DALE, 2004, p. 424).

Dale (2004) conceitua globalização como um conjunto de


dispositivos políticos econômicos para organização da economia
global, conduzido pela necessidade de manter o sistema capitalista.
Não existe a globalização, e sim globalizações (SANTOS, 2002), e a
possibilidade de globalizações hegemônicas e contra-hegemônicas,
estas podendo ocorrer em dois campos: no campo das práticas
capitalistas globais, onde a transformação contra-hegemônica
consiste na globalização das lutas que tornem possível a distribuição
democrática da riqueza, e no campo das práticas sociais e culturais
transnacionais, onde a transformação contra-hegemônica consiste
na construção do multiculturalismo emancipatório (SANTOS,
2002). Apple (2011) cita o “orçamento participativo” e a “Escola
Cidadã” adotados em Porto Alegre como ações contra-hegemônicas.
A intenção de abordar algumas características da globalização é
no sentido de compreender alguns dos aspectos que influenciaram
as políticas públicas do Estado brasileiro, os quais atingiram as
políticas educacionais com a intenção de reformas na educação de
acordo com as experiências dos países centrais.
Como isso influenciou a educação? É consenso de alguns
autores – dentre eles Cassassus (2001), Santos (2002), Dale
(2004), Morrow (2004), Burbules e Torres (2004), Aplle (2005)
– que a globalização implantada por organizações multilaterais e
internacionais nos países centrais é imposta aos países periféricos
e semiperiféricos através de uma agenda para a reforma no âmbito
da educação, em que privilegia políticas de financiamento, de
avaliação, da formação de professores e do currículo, de acordo com
os mecanismos do mercado para regulação e a imposição de modelos
de administração e de eficiência advindos do setor empresarial como
um mecanismo para resolução dos problemas na educação.
70 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

O processo de globalização é um processo concreto que


permite aos países centrais, que dominam a economia mundial,
exercer controle sobre os países semiperiféricos e periféricos,
com a tentativa de homogeneizar a cultura eurocêntrica e norte-
americana e desvalorizar a cultura local. As agências multilaterais,
através dos acordos firmados com o governo brasileiro, definem
programas direcionados para a área de educação, os quais elaboram
normas e agendas que devem ser cumpridas para atender ao mercado
(OLIVEIRA, 2006; FRIGOTTO, 2010). A partir da década de
1990, inúmeros encontros foram realizados em diversos países da
América Latina para organizar um agenda única para as reformas
educacionais nesses países. Para Casassus (2001), ocorreram dois
ciclos da reforma: o primeiro ciclo se deu na década de 1960 e teve
por característica comum a expansão dos sistemas educativos e o
segundo ciclo está se configurando por processos mais complexos
que estão relacionados com temas como os de gestão de sistemas e
de qualidade (CASASSUS, 2001).
O autor refere-se ainda aos marcos da reforma: 1) a
Conferência Mundial para Todos, realizada na Tailândia em 1990,
que tinha por objetivo gerar um contexto político favorável para
a educação e orientar as políticas educacionais para fortalecer a
educação básica; 2) o Programa Para Reforma Educacional na
América Latina e Caribe (Promedlac) IV, uma reunião de ministros
de Educação convocados pela Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que tinha a intenção
de analisar o desenvolvimento do Projeto Principal da Educação
para a América Latina e o Caribe, cuja reunião ocorreu em Quito,
em 1991; nessa reunião, determinou-se que o novo tipo de gestão
facilitaria a abertura do sistema; o estabelecimento de novas
alianças; um vasto processo de descentralização, pondo fim ao
centralismo histórico e à passagem da ênfase na quantidade para a
ênfase na qualidade; 3) 24ª Reunião da Comissão Econômica para
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 71

a América Latina e Caribe (Cepal), ocorrida em Santiago do Chile,


em 1992, que convocou os ministros da Economia e Finanças para
um conceito de que o investimento nacional em educação seria o
mecanismo para o desenvolvimento; 4) Promedlac V, também em
Santiago, em 1993, onde foram discutidas ações que permitissem
melhorar os níveis de qualidade de aprendizagens, com a criação de
sistemas nacionais de avaliação e o desenvolvimento de programas
de discriminação positiva, com a atenção direcionada para a escola
e seus processos; e 5) Seminário Internacional, promovido pela
Unesco sobre descentralização e currículo, ocorrido no mesmo país,
em 1993, que tinha como discussões: descentralização curricular e
as possibilidades de representar o comum e o diverso no currículo
com a redistribuição de competência em matéria curricular no nível
mais amplo, e, no específico, a introdução de conteúdos locais.
Esses encontros expunham que as reformas educacionais tinham
por objetivos principais: posicionar a educação e o conhecimento
como centro do desenvolvimento de cada país e adotar uma nova
proposta de gestão baseada nos processos de descentralização
e na melhoria do nível de qualidade do aprendizado. Todos esses
momentos de debates e elaboração de uma agenda da educação
na América Latina expostos por Casassus (2001) demonstram o
cumprimento e a formulação de várias políticas educacionais, de
acordo com essa agenda, as quais foram implantadas pelo Brasil a
partir da década de 1990, direcionando-se para a educação básica.
Dentre as políticas formuladas para a América Latina,
percebemos que algumas são intenções defendidas por
grupos progressistas, principalmente no que diz respeito à
melhoria da aprendizagem do aluno, não obstante, a forma de
operacionalização dessas políticas são contraditórias, as quais
demonstram uma direção apenas para a eficácia funcional do
sistema socioeconômico, apresentada como via única para a
educação em um mundo globalizado.
72 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Dessa configuração, faz-se necessário compreender que


existem outras possibilidades para as formulações das políticas
educacionais, e com as interferências das políticas globais sendo
impostas como verdades não podem ser consideradas como único
caminho para a educação. É preciso um olhar crítico para outras
formas de globalização:

[...] devemos considerar a existência de pelo


menos três mundos num só. O primeiro seria o
mundo tal como nos fazem vê-lo: a globalização
como fábula; o segundo seria o mundo tal como
ele é: a globalização como perversidade; e o
terceiro, o mundo como ele pode ser: uma outra
globalização (SANTOS, 2001, p. 18).

As políticas globais elaboradas em agendas únicas estão


incluídas dentro da globalização como perversidade, pois são
impostas como a única saída para a crise e para a resolução dos
problemas que afligem a sociedade. Não se pode ver a globalização
apenas no aspecto econômico, uma vez que as intervenções que ela
proporciona se direcionam para outros setores, como o social e o
cultural. Dentro do social, tem-se a educação, vista como caminho
para o processo de globalização em relação ao mercado de trabalho,
e onde ocorre uma intenção em considerar o objetivo precípuo
da educação a preparação para esse mercado. Nesse contexto, ao
demonstrar a incapacidade da escola pública, vê-se um incentivo
à iniciativa privada como sendo essa a única capaz desse tipo de
formação, induzindo à privatização da educação. Quanto a isso,
Burbules e Torres (2004, p. 15) reforçam:

Esse processo de privatizar a educação está


ocorrendo no contexto de novas relações e
arranjos entre nações, caracterizado por uma
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 73

nova divisão global do trabalho, uma integração


econômica de economias nacionais, a crescente
concentração do poder em organizações
supranacionais, e aquilo que chamamos de
“internacionalização” do Estado.

Inexiste um consenso sobre a definição do que é globalização.


Alguns consideram como possibilidades de ampliação do mercado
e a oportunidade de acesso às diversas culturas, não obstante, outros
a veem como responsável pelo desemprego, exclusão social e
aumento das diferenças entre ricos e pobres. Evoluções tecnológicas
e de comunicação ocorreram; o mundo tornou-se mais próximo com
as mudanças vinculadas ao desenvolvimento científico-tecnológico,
os quais influenciam de forma significativa no modo de pensar e agir
do homem. No entanto, a maioria da população, principalmente dos
países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, não se apropria
desse desenvolvimento, e revela a desigualdade social.
A globalização serviu para revitalizar o sistema capitalista
em mais uma crise, e, nessa superação, novas formas de domínio
de capital são pensadas, o que resvala sobre os complexos sociais
e interferem de forma contundente sobre todos os níveis na vida
dos homens, em que a crise estrutural não está confinada à esfera
socioeconômica (MÉSZÁROS, 2005). Dentre esses complexos está
a educação, pois, numa nova realidade, com o avanço tecnológico,
as exigências aumentam cada vez mais com pressões para novos
conhecimentos e novas habilidades na educação formal, e para
isso se faz necessária uma mudança nas estruturas educacionais
para acompanhar as mudanças do mundo global. Nesse processo
de globalização, na educação, principalmente dos países em
desenvolvimento, como o Brasil, o que se vê é a sua mercantilização
em dois aspectos: um é o tratamento da educação como mercadoria
na venda de serviços educacionais com o objetivo de gerar lucros
74 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

para grandes empresas; e o outro, o direcionamento do currículo da


escola para as áreas consideradas essenciais pelo capital e servem
como parâmetro nos indicadores da educação e atendimento às
metas pré-estabelecidas.
Assim, foram criadas estratégias do capital para o
fortalecimento da educação enquanto mercadoria. Como um dos
exemplos, temos a criação do Movimento Todos pela Educação,
em 2006, gerenciado por grandes empresários brasileiros. Esse
movimento ganhou força com o passar dos anos, “e apresenta
diversas metas para a educação, contando com diversas Fundações
e Institutos que passam a interferir diretamente nas escolas públicas
em todo o Brasil” (GOMES; SILVA, 2020, p. 3). Ao mesmo tempo
em que esses organismos cresceram assustadoramente nos anos
seguintes, estabeleceram-se como um poder paralelo de definição
dos rumos da educação no país e definiram para si uma imagem
de isenção político-partidária, de lisura e de preocupação com a
educação do país.
Shiroma, Campos e Garcia (2011) analisam o documento
Todos pela educação: rumo a 2022, que revela a educação como
principal mecanismo de mudança cultural na relação Estado e
sociedade civil e o envolvimento do empresariado nesse pacto para
uma organização na vida social. E, para galgar essa qualidade da
educação – “qualidade na perspectiva empresarial agora é reduzida
aos resultados de aprendizagem, medidos através dos testes de
rendimentos e pela avaliação das performances dos estabelecimentos
escolares” (SHIROMA; CAMPOS; GARCIA, 2011, p. 238) –,
necessitaria da criação de mecanismos de avaliação de resultados e
da responsabilização de todos os envolvidos, direta ou indiretamente,
na instituição escolar, para realizar as mudanças necessárias.
Como ressaltam Gomes e Silva (2020), “essas fundações e
institutos vêm interferindo nas secretarias de educação em todo o
país, com pacotes prontos apontando soluções salvacionistas para
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 75

melhorar a educação e traz em suas pretensões a preparação para


o mercado”. Dentre essas políticas para o mercado, e como dito
anteriormente faz parte da agenda única para a América Latina, há
o sistema de avaliação como integrante das reformas educacionais.
E, nessa medida, o mercado valoriza e considera como
essenciais para o educando dois componentes curriculares, a língua
portuguesa e a matemática, disciplinas exigidas para o cálculo do
Índice da Educação Básica (Ideb). Com esse foco, é natural que,
como aponta Orso (2017), os índices aumentem, o que acaba
refletindo no governo como sinônimo de melhoria da educação, mas
dentro de uma proposta de formação que promove a submissão e o
adestramento ao mercado.
Nesse sentido, tais ações, além de contribuírem com
a elevação dos índices e uma suposta melhoria na educação,
constituem-se políticas educacionais voltadas exclusivamente
ao mercado e que tentam apagar a memória (com a exclusão das
ciências humanas desse contexto) e o mínimo de possibilidade
e de capacidade crítica, impedindo que os educandos pensem e
tenham atitudes de reação e lutem diante de todos “os ataques, de
acordo como o ‘novo’ espírito positivista da ‘ordem e progresso’
– uma nova forma de viabilizar a escola ‘sem’ partido e a ‘lei da
mordaça’, adequadas ao mercado” (ORSO, 2017, p. 68). E essa
adequação ao mercado segue a cartilha da globalização com
reformas educacionais hegemônicas em todo o mundo.
Santos (2002) propõe uma globalização contra-
hegemônica, que consiste nas lutas para a democratização da
riqueza e no multiculturalismo emancipatório. De outro lado,
Burbules e Torres (2004) trazem o papel da pesquisa-ação e
participante, a educação popular e a luta democrática multicultural
como mecanismos de perspectivas críticas, apontam caminhos
de luta contra os efeitos nefastos que provocam esse processo
de globalização. Por sua vez, Santos (2001) ao propor uma nova
76 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

globalização, apoia-se nas bases comunicativas para outros


objetivos, postas a serviço de outros fundamentos sociais e
políticos e enumera uma série de fatos que colaboram para uma
nova história: a miscigenação dos povos, raças, culturas, em
todo continente; diferentes filosofias; aglomeração de pessoas
em áreas cada vez menores; existência de uma sociodiversidade;
e emergência de uma cultura popular, que dão bases de
reconstrução e de sobrevivência das relações locais. Apesar do
otimismo dos autores em propor caminhos diferentes para uma
globalização mais humana e menos mercadológica, isso se torna
uma utopia em um país periférico que adota o sistema capitalista.
Provas disso são as inúmeras ações que vão ao encontro de uma
política democrática e participativa descontínua, políticas que
ocorrem de forma pontual, frágil e sem solidez.
Mesmo com toda a pressão para impor políticas globais,
numa tentativa de homogeneizar a educação, sem considerar as
diferenças regionais e locais, as políticas educacionais, quando são
implantadas, sofrem interferências do local, uma vez que nenhuma
política ocorre de forma uniforme, sendo redefinidas e ressignificadas
de acordo com as especificidades locais e de seus sujeitos. O certo
é que se precisa fortalecer as demandas locais. A defesa se faz por
políticas educacionais em que os espaços locais tenham condições de
autonomia para decidir suas próprias ações, como defende Dowbor
(2008, p. 5):

Estamos sem dúvida na era da globalização.


Mas nem tudo é global: a qualidade das nossas
escolas, das nossas ruas, a riqueza cultural
da nossa cidade, o médico da família, boas
infraestruturas de esporte e lazer, o urbanismo
equilibrado – tudo isso depende eminentemente
de iniciativas locais.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 77

Dowbor (2008) defende o poder local como imprescindível


para as transformações sociais de uma cidade, de um bairro ou
até mesmo de uma escola. Em seu estudo, expõe uma série de
argumentos sobre a importância das pessoas se sentirem partícipes
desse processo e não dependerem do Estado para as ações. Dois
pontos podem ser vistos como empecilhos na autonomia local: 1)
a desresponsabilização do Estado, com uma sobrecarga no local
e eximindo o Estado de apoiar nos aspectos financeiros, técnicos
e administrativos; 2) a centralização dos recursos no Estado e a
dependência administrativa. Segundo Dowbor (2008), os processos
participativos da sociedade nas decisões políticas são o foco do
poder local com ênfase nas cidades. E acrescenta:

As instâncias superiores podem e precisam


ajudar, mas a iniciativa e o ordenamento das
ações têm de ser eminentemente locais. De
certa forma, estamos manejando uma máquina
administrativa centralizada, típica do século
passado, para um conjunto de desafios que
exigem soluções de gestão participativa e
descentralizada (DOWBOR, 2008, p. 7).

Percebemos que o local também reproduz uma política global


determinada pelos padrões economicistas, o qual incorpora uma
carapuça de democrático para reproduzir a desigualdade social sem
a interferência real da comunidade. Dowbor (2008) defende uma
democracia participativa, com a participação de grupos comunitários
nas decisões, pessoas que convivem diretamente com os problemas
de sua cidade e que se mobilizariam para a luta por melhores
condições. Enfatiza:

A participação comunitária constitui hoje


claramente o mecanismo mais racional de
78 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

regulação das principais atividades da área social,


da urbanização, da pequena e média produção,
além de constituir um “lastro” indispensável para
o equilíbrio do conjunto das atividades no nível
macroeconômico (DOWBOR, 2008, p. 15).

Não raro, Dowbor (2008) cita ações exitosas em várias


cidades brasileiras, com iniciativas que visam o desenvolvimento
local. Nos exemplos demonstrados pelo autor, a estrutura dessas
cidades apresenta condições mais viáveis de independência e de
projetos que disponibilizam mais recursos financeiros. No entanto, ao
observarmos a maioria dos municípios brasileiros, eles apresentam
uma economia bastante vulnerável, uma dependência à União e
ao seu Estado para o repasse de recursos, falta de estrutura para os
serviços básicos essenciais à população e sem as mínimas condições
de oferecer uma vida de qualidade à população mais desfavorecida,
em que a maioria dos governos municipais vive com um limitado
orçamento fiscal. Prevalece a má distribuição de renda, em que
poucos detêm a concentração de riqueza, com domínio nas terras,
casas e comércio, os mesmos, na maioria dos casos, que gerenciam
a cidade e não possuem nenhum interesse no desenvolvimento local.
Nisso, são necessárias políticas nacionais que levem em
conta as necessidades locais, o que não ocorre nas políticas públicas
formuladas no Brasil, pois seguem uma padronização ao serem
direcionadas para as diversas localidades de todo o país, o que não
significa que são adotadas da mesma forma, uma vez que cada espaço
local tem a sua especificidade e procura adaptar ao seu contexto.
Dessa forma, a política ganha um novo significado no âmbito local,
que tanto pode ser de transformação, como de acomodação ou até
mesmo de rejeição.
Outro ponto abordado por Dowbor (2008) consiste no
interesse das pessoas ao que é seu (minha casa, minha rua, meu
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 79

bairro, minha cidade) e desejam um funcionamento adequado


e, consequentemente, poderá ser um poderoso instrumento de
ordenamento local onde vivem. São processos participativos que
podem ser construídos com a sociedade e se tornam o centro do
poder local. O mesmo pode ser direcionado às escolas. Na maioria
dos casos, as pessoas da comunidade não a veem com proximidade
ou pertencente a sua vida. São prédios isolados em um bairro, com
altos muros e distantes dos anseios da comunidade, e com essa
distância muitas são roubadas ou invadidas sem a defesa de seus
vizinhos. E, sem essa cumplicidade, as políticas implantadas nas
escolas se reservam apenas aos professores, gestores e alunos; sem
contar com a comunidade de seu bairro, pode acarretar dificuldades
para a implementação de uma política.
Além da participação político-partidária e sindical-trabalhista,
existe a organização comunitária como espaço de ação: o bairro,
o município, o espaço local. Assim, valorizar as organizações da
sociedade civil em ações que não seja específica dos prefeitos, mas da
própria comunidade, e relatar exemplos de cidades que organizaram
os bairros com subprefeituras são ações políticas importantes no
fortalecimento do plano local (DOWBOR, 2008). Na prática, em
alguns locais, resultou em propaganda partidária de subprefeitos
para galgarem um cargo político no âmbito municipal, pressionando
a comunidade a votar em alguém que defende os interesses do bairro.
Está cada vez mais acentuado o discurso da importância
do local. Teixeira (2001) expõe que o local está se constituindo
num espaço de experiências inovadoras na área de gestão e na
ação cidadã, principalmente no que diz respeito à descentralização
das decisões. Mas alerta para as ambiguidades e limitações dessas
ações, que, na maioria das vezes, servem como estratégia de
legitimações dos governos. É imprescindível que nas discussões
da importância de políticas locais haja o questionamento político
dos seus interesses, para que elas não sirvam como estratégias
80 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

de diminuição de recursos e desresponsabilização dos governos


centrais, bem como o enfraquecimento da luta política coletiva por
melhores condições nas localidades e nem reforce o estigma de que
o problema é apenas de gestão. Pois esses discursos acabam sendo
incorporados de forma tão verdadeira que proporcionam a falta de
assistência às políticas locais.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa relação entre o global e o local, a globalização com seus


processos de desenvolvimento técnico-científico ocorre de forma
desigual tanto entre os países como no interior dos seus territórios,
acarretando a exclusão e a fragmentação, pois nem todos se adequam
ao mundo globalizado e são excluídos, principalmente em locais
de pouco desenvolvimento tecnológico e baixo desenvolvimento
econômico, uma vez que a sua base de sustentabilidade é o econômico.
Por sua vez, o local poderá assumir diferentes conotações, tanto de
aceitação como de resistência. E é onde se materializam as políticas,
no seio das relações sociais em que as pessoas vivem e interagem
com o meio e, portanto, não pode ser desconsiderado.
Na adoção de políticas globais e locais, outros elementos
surgem para revitalização dessas políticas no sentido de
incorporar normas e padrões à educação, antes só utilizadas
no setor privado. Assim, os setores públicos, principalmente
o educacional, passam a ter interferências de outras formas
de gestão, como ocorre com o gerencialismo, cujo interesse
é fortalecer o mercado e atender às exigências das agências
multilaterais. E, nesse processo, há a presença do empresariado
na educação, com modelos prontos e salvadores que não têm
um direcionamento para os problemas sociais e sim atender
unicamente a um novo processo de globalização.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 81

Destarte, a globalização defendida pelos países centrais impõe


agendas aos países periféricos e que precisam ser cumpridas, e nessa
agenda incluem-se várias instâncias da educação, que propõem
modelos e direcionamentos específicos com vistas à preparação dos
estudantes para o mercado de trabalho. Todavia, ao se chegar no
local, é modificada de acordo com os interesses de quem a implanta,
podendo divergir ou não da política global.

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CAPÍTULO 4
GERENCIALISMO E EMPRESARIADO:
hegemonia conceitual nas formulações das
políticas educacionais
Maria das Graças Correia Gomes

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A partir do final da década de 1970, o capitalismo entrou em


um novo período de crise, identificada, sobretudo, como esgotamento
do modelo de acumulação taylorista/fordista (MÉSZÁROS, 2005).
Assim, um novo modo de produção difundiu-se nos anos de 1980,
o toyotismo, com novos padrões tecnológicos na produção flexível
que modifica a rigidez do modelo fordista.
Com a crise afetando os países centrais, principalmente
EUA e Inglaterra, como saída, passaram a adotar outras formas de
administração, deixando de lado a keynesiana e o Estado do bem-
estar social. Nessa reestruturação do capitalismo, ao mesmo tempo,
intensificaram-se os processos de globalização, bem como novas
formas de organização, gestão e a financeirização da economia,
e novos padrões surgiram no mercado mundial, adequando-se à
pressão exercida pela globalização.
86 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Diante desse contexto, houve uma ressignificação do papel


do Estado, cuja função passou a ser a de cuidar dos direitos de
propriedade com pouca interferência no mercado e nas políticas
sociais, chamado Estado mínimo. Abrem-se as possibilidades da
evidência do setor privado nas políticas públicas.
Nesse cenário, verifica-se a interferência do setor privado na
educação pública, e novos direcionamentos são dados para garantir
a mudança na educação. Dentre eles, a forma de gestão através do
gerencialismo, incorporando à educação novos conceitos e novas
palavras, tais como controle, mensuração e eficiência.

2. POLÍTICAS EDUCACIONAIS

2.1 Direcionamento para a iniciativa privada

As políticas são planejadas a partir de diversos fatores.


Um deles nos remete à discussão em torno do Estado e o seu
papel frente à essa nova configuração mundial, cujo poder
hegemônico é concentrado pelo capital, o qual utiliza de toda
a sua influência para interferir diretamente na (re)definição do
papel do Estado, com consequências objetivas na sociedade
através de suas políticas.
Assim, recorremos a Mészáros (2005, 2007), que previa que
o sistema capitalista traria efeitos nefastos à maioria da população,
com interesses no lucro, e o ser humano seria considerado um ser
individual e não social. Este, responsável por suas atitudes, sucessos
e fracassos, bem como um sujeito competitivo necessário à produção
do capital, e, destarte, desligado da humanidade, levando a atitudes
cujos interesses são os bens materiais, a riqueza e a acumulação.
Teoria reforçada por Frigotto (2010, p. 17), quando afirma que “[...]
o capitalismo deste final de século enfrenta sua crise estrutural mais
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 87

profunda e sua perversa composição vem se materializando nas


inúmeras formas de violência, exclusão e barbárie”.
Dentre o pacote de medidas defendidas pelo movimento
liberal, envolve-se o Estado ao mínimo às questões sociais, e ampliam-
se políticas públicas condizentes com os interesses empresariais,
oportunizando liberdade para o crescimento sem qualquer
interferência estatal. Esse novo estágio do capitalismo mundial tem
novas características, denominado por alguns de mundialização, e
por outros de transnacionalização ou de globalização, surgidas com
o intuito de levar as empresas a combater a recessão econômica e as
pressões competitivas internacionais.
A globalização serviu, portanto, para a reorganização e salvação
do capitalismo após uma grave crise, a qual atingia principalmente
os países centrais capitalistas, EUA e Inglaterra (MORAES, 2004;
SANTOS, 2002), e suas principais implicações envolviam a abertura
das economias nacionais ao mercado mundial, priorização das
exportações, mínima regulação estatal na economia e redução do
orçamento do Estado nas políticas sociais. Sem a intervenção do
Estado no mercado, aparecem as agências multilaterais com uma
concentração de poder econômico (SANTOS, 2002). Por outro lado,
a globalização possibilita o acesso a diferentes realidades, onde o
mundo se torna mais próximo do homem e a tecnologia fica cada
vez mais acessível. Nesse direcionamento, Estados periféricos e
semiperiféricos buscam reformas para enquadrar as novas leis do
mercado mundial na busca para a solução dos problemas econômicos.
Com a crise do Estado, eram necessárias reformas que o
desburocratizasse, para que pudessem responder com rapidez e
eficiência às mudanças do mercado global e às demandas sociais,
exercendo um papel mais decisivo na reestruturação produtiva e
diversificando as fontes de financiamento (CARVALHO, 2009).
Assim, necessitaria de um novo modelo de gestão pública,
denominado de gerencial, o qual influenciou as reformas
88 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

administrativas em vários países, principalmente Inglaterra e


EUA. Esse modelo é a favor de organizações mais flexíveis, da
administração descentralizada, autônoma e participativa e da
redefinição das relações entre as esferas públicas e privadas. E qual
seria o papel do Estado nesse paradigma?

O Estado deixa de ser investidor e mantenedor,


eximindo-se a responsabilidade direta de produzir
e fornecer bens ou serviços e assumindo o papel
de regulador e facilitador da iniciativa privada
[...] sua intervenção consiste em redistribuir
ou realocar recursos, em introduzir regras
orientadoras das relações entre os prestadores
públicos e privados, em avaliar previamente
necessidades e recursos disponíveis [...] separa-
se, assim, a função de governar e a de executar
(CARVALHO, 2009, p. 1148).

Com a reforma do Estado brasileiro e os seus idealizadores,


Luiz Carlos Bresser Pereira e Fernando Henrique Cardoso, na década
de 1990, os pressupostos do gerencialismo foram mais evidenciados
e, dessa forma, essa gestão tinha como meta:

O governo, em seu projeto de “reconstrução


do Estado”, identificou quatro problemas que
o Estado brasileiro devia enfrentar: o tamanho
do Estado; a necessidade de redefinição do
papel regulador do Estado; a recuperação da
governança; a governabilidade. Com o objetivo
de sanar esses problemas e de supostamente
“quebrar com o clientelismo e o burocratismo”,
o governo utilizou como ideias forças a parceria,
a flexibilização e a privatização (SILVA, 2003,
p. 80).
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 89

Nessa configuração, está a reforma do Estado brasileiro,


cujos objetivos estão explícitos nos artigos escritos por Bresser
Pereira8 (1997, 1998, 2000), em que o foco maior centralizava-se
nas ideias da administração gerencial para o serviço público, maior
produtividade e menos burocracia e, acima de tudo, o fortalecimento
do Estado. Todos esses aspectos, segundo Pereira, levaria o Brasil
ao Estado social-liberal do século XXI. Ele analisa quatro aspectos
básicos para a reconstrução do Estado: a delimitação de sua
abrangência institucional e os processos de redução do tamanho
do Estado; a demarcação de seu papel regulador e os processos de
desregulamentação; o aumento de sua capacidade de governança; e
o aumento de sua governabilidade.
Ao direcionar a reforma do Estado ao modelo gerencial,
demonstra-se o direcionamento para uma reforma cujo intuito era
fortalecer o mercado e atender às exigências do novo processo de
globalização e as agências internacionais. Tal modelo difere de uma
administração pública com a vertente societal (PAULA, 2005).
Ball e Mainardes (2011) expõem diversas características
sobre o gerencialismo: modelo de organização centrado nas pessoas,
em que desperta um espírito empreendedor de todos os empregados;
motivação das pessoas em produzir com qualidade, no esforço em
busca da excelência; gerentes tornam-se líderes para promover um
compromisso coletivo da corporação em ser o melhor. Essa nova
forma de gerir deixaria o Estado menos burocrático e mais eficaz, e
nas políticas educacionais um novo rumo para a qualidade, os quais
deveriam seguir os preceitos da qualidade no setor privado.
O gerencialismo é uma forma de administração já adotada em
países centrais. Ball e Mainardes (2011, p. 23), em seu estudo sobre
uma avaliação das políticas educacionais no Reino Unido, revelam

8
Bresser Pereira foi ministro da Administração Federal e Reforma do Estado durante os
anos de 1995 e 1998 – período de existência desse ministério na gestão de Fernando
Henrique Cardoso.
90 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

que “esse processo de reestruturação, tanto como estratégia econômica


quanto como projeto hegemônico de revigoramento da sociedade
civil, esteve articulado mais claramente às políticas ideológicas do
neoliberalismo thatcherista”. Ball e Mainardes (2011), ao analisarem
a realidade do Reino Unido com a adoção do novo gerencialismo,
enfatizam que, na educação, o segmento dos diretores de escola é o
principal segmento em que se dá a incorporação desse novo modelo,
sendo importante para a transformação da organização escolar, o que
acarreta uma mudança nas lideranças das escolas. No entanto, o autor
alerta que o foco não deverá ser apenas as mudanças que ocorreram
nos diretores e nas escolas, mas, sim, em primeira instância, as
mudanças nos documentos legais, constituição e leis da educação, e
refere-se ao Ato Educacional de 1988 e atos subsequentes,

[...] que estabeleceu a infraestrutura e os


incentivos na forma de mercado e introduziu a
“direção” das possibilidades de financiamento e
responsabilização (accountability) relacionadas
a performance. A imposição e o cultivo da
performatividade na educação e no setor público,
somados a importação e disseminação do
gerencialismo, também requerem e encorajam
maior conjunto de formas de organização e
culturas institucionais e aproximam formas
e culturas dos modos de regulação e controle
predominantes no setor privado (BALL;
MAINARDES, 2011, p. 25, grifo no original).

A performatividade é como uma tecnologia, uma cultura


e um método de regulamentação que julga, compara e demonstra
como meio de controle, atrito e mudança. O desempenho individual
ou da instituição serve de parâmetro de resultado, demonstração
de qualidade ou de momento para promoção ou inspeção. Ela é
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 91

alcançada mediante a publicação de informações e de indicadores


para estimular, julgar e comparar profissionais em relação aos
resultados, sua tendência é nomear, diferenciar e classificar. Significa
ainda a qualidade ou valor de um indivíduo ou organização dentro de
uma determinada forma de avaliação, e o problema de quem controla
essa avaliação é crucial. Assim, o principal ponto no movimento da
reforma educacional são as discussões em torno do controle dessas
avaliações, nos quais irão determinar a eficiência, a efetividade e
a qualidade do que foi avaliado (BALL, 2002, 2005). Assim, nas
instituições públicas o novo gerencialismo tem como base as teorias e
técnicas da gerência empresarial ao valorizar o “culto da excelência”
(BALL, 2002).
Ball (2002, 2005), ao analisar a reforma educacional, expõe
uma série de fatores que demonstram como ela é perspicaz em
suas orientações, com o intercruzamento entre mercado, gestão e
performatividade, sendo apresentadas como dando aos gestores
e instituições maiores poderes e retirando entraves na gestão de
recursos financeiros e humanos como processos de regulação,
em que estabelece uma nova forma de controle. Nesse modelo,
os gestores têm flexibilidade e autonomia no uso dos recursos
financeiros e humanos para se preocuparem mais com as ações que
melhorem os resultados.
Nas análises do autor, encontram-se semelhanças ao se
comparar a implantação das políticas educacionais no Brasil.
Aspectos como regulação, responsabilização, descentralização,
autonomia e performance são detectados nas análises realizadas
nas políticas implantadas na educação brasileira. Sabe-se que
são realidades diferentes e que as condições, recursos, histórias e
contextos locais serão diferenciados e que a concretização da política
irá, dessa forma, diferir.
O modelo adotado privilegia a liberdade, não no sentido
da emancipação do ser humano, mas enquanto consumidor para
92 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

escolhas no mercado, e valoriza a autonomia, a flexibilidade e a


descentralização para a capacidade de cada instância ou indivíduo
se responsabilizar pelos padrões de eficiência e eficácia. Assim, o
gerencialismo adentra no espaço educativo em que palavras como
controle, mensuração e eficiência se fazem presentes:

Novas identidades, focadas em acentuada


proficiência técnica, e um conjunto de suposições
de que problemas arraigados à educação e
toda esfera social podem ser solucionados
aumentando a eficiência e mantendo as pessoas
mais rigorosamente responsáveis por seus atos
[...] (APPLE, 2005, p. 54).

É preciso uma reflexão de que modelos precisam ser


interpretados e aplicados de acordo com a realidade local. Dessa forma,
questionar as intenções ao se formular uma política, sua axiologia e
suas concepções inter-relacionadas e de como são redesenhadas em
cada contexto específico se faz necessário nos estudos das políticas
educacionais. É perceptível a correspondência das políticas ao
modelo gerencial nos programas e ações implantados no governo
Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, no programa Acorda
Brasil, de 1995, cujo objetivo central era mobilizar a sociedade para
assumir compromissos com a escola pública, a responsabilização
de todos (CARVALHO, 2009; SAVIANI, 2011). Temos a mesma
relação com o projeto Amigos da Escola, de 1999, em parceria com
a maior rede de telecomunicação do país.
Azevedo (2002) analisa os reflexos da forma de gestão
gerencial nas políticas educativas, com ênfase na municipalização,
em que se atinge a universalização do acesso ao ensino fundamental,
mas sem a qualidade que se esperava. Questiona, ainda, que o acesso
a todos se deu apenas nesse segmento e que o atendimento à educação
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 93

infantil e ao ensino médio está longe de atingir seu ápice. Em relação


às mudanças de ação do Estado, expõe:

Como sabemos, o novo padrão de ação do


Estado vai aparecer, com maior nitidez,
durante o primeiro governo de Fernando
Henrique Cardoso (FHC), muito embora
tenha começado a ser esboçado no final dos
anos 80. Ao tornar público o seu programa
de governo, a nova coalizão que assumiu o
poder colocou como medida imprescindível a
necessidade de reformar o Estado, por entender
que o modelo de administração burocrática dos
serviços públicos, cuja afirmação remontava
aos anos 30 do século XX, era um dos fortes
empecilhos para assegurar a superação da crise
fiscal e econômica e, portanto, para ajustar o
país aos requerimentos da nova ordem mundial
(AZEVEDO, 2002, p. 56).

Azevedo (2002) expõe, ainda, que vários parâmetros da reforma


do Estado nos anos de 1990 foram distintos dos que reclamavam a
sociedade civil, um exemplo é a ideia de descentralização que obteve
um novo caráter, completamente diferente do que originalmente era
defendido, que visava maior participação democrática nas decisões.
E acrescenta (AZEVEDO, 2002, p. 58, grifo da autora):

Os parâmetros da reforma administrativa


brasileira inseriram-se, pois, na solução
concebida pelo governo para ajustar o país aos
novos requerimentos impostos pelos modelos
econômicos e políticos, em face das exigências
que os rumos do processo da acumulação
plasmaram para os mercados e em face
da postura subordinada das nossas elites a
94 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

essas imposições. Em tal contexto, no discurso


governamental, a adoção da administração
gerencial, entre outros modos, foi justificada
afirmando-se que a sociedade brasileira havia
atingido um nível cultural e político no qual as
práticas patrimonialistas não mais poderiam ser
toleradas e o burocratismo impedia a prestação
eficiente dos serviços públicos.

Nas transformações mundiais, a valorização do mercado, a


globalização, a nova visão de Estado e, principalmente, a importância
da educação para os modelos econômicos interferiram nas reformas
educacionais no Brasil, na tentativa de transformação das práticas
pedagógicas e da seleção de conhecimentos que envolvem o ensino e
a aprendizagem. Por outro lado, a redução dos gastos na solução dos
problemas das questões sociais, principalmente na educação, criou a
possibilidade de surgimento de novos grupos sociais para investir na
educação, onde se inclui, nesse cenário, as agências multilaterais, as
organizações não governamentais e as empresas privadas.
Ao entender as políticas educacionais, faz-se importante
conhecer o contexto social e econômico que vivencia a sociedade,
uma vez que estão inter-relacionados. A proposta de uma política
educacional advém de uma demanda social que, na maioria dos
casos, não busca uma sociedade igualitária. É preciso reconhecer
que o público está “no Estado de direito, o indivíduo tem, em face
do Estado, não só direitos privados, bem como direitos públicos.
O Estado de direito é o Estado dos cidadãos” (BOBBIO, 2004, p.
31). Nesse sentido, é necessário lutar pelo público sendo direito
do cidadão e “interesse público ou comum, numa coletividade...”
(BOBBIO, 2004, p. 51).
A forte interferência dos mercados mundiais, principalmente
dos países que detêm o poder econômico, nas reformas que ocorrem
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 95

no Brasil, revela uma submissão que vai de encontro aos anseios


da sociedade e nas quais traz consequências perversas à maioria da
população, principalmente a com menor poder aquisitivo, as quais
são excluídas dos seus direitos. Isso está relacionado diretamente com
o papel da livre iniciativa no Brasil, isto é, o poder que a classe dos
empresários tem na determinação das políticas públicas. Shiroma,
Campos e Garcia (2011) citam diversas ações e movimentos, na
década de 1990, que demonstram a preocupação dos empresários
pela qualidade da educação brasileira.
As autoras contextualizam a partir da década de 1990
vários movimentos dos empresários brasileiros, principalmente
a organização de fóruns e documentos que apontavam metas para
orientar a reforma na educação brasileira, citando o destaque da
pedagogia das competências, trabalhador de novo tipo, sujeitos
empregáveis e a relação da eficácia empresarial com a de justiça
social no documento Competitividade com equidade (CEPAL, 1992,
s/p), temas relevantes nos discursos empresariais e dos organismos
multilaterais. O que se vê desde o início da década de 1990 são as
interferências, tanto no âmbito global como no local, e a adoção de
políticas adequadas aos interesses privados do capital nacional e
internacional, na intervenção direta do Estado para direcionar metas
com vistas à reforma educacional brasileira no âmbito das demandas
do capital. Essa influência do empresariado brasileiro, que se inicia
no governo Fernando Henrique Cardoso, é assim descrita por
Oliveira (2005, p. 104):

O empresariado “nacional” é plenamente


responsável e cúmplice do projeto de
desenvolvimento implementado pelo então
governante brasileiro, fortemente influenciado
pelas imposições/recomendações do Fundo
Monetário Internacional e do Banco Mundial.
Essa parcela de representantes das elites
96 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

políticas e econômicas brasileiras é tão


responsável pelo aumento da exclusão social
quanto pelo aprofundamento da relação de
subordinação da nossa economia na divisão
internacional do trabalho.

Cada vez mais a interferência empresarial se faz presente,


mesmo nos governos subsequentes ao de Fernando Henrique Cardoso;
dessas vezes, com discursos em que trazem preceitos democráticos,
que envolvem a sociedade em geral, todos como responsáveis para a
melhoria da educação, lançando a bandeira da qualidade da educação
através dos indicadores, baseando-se nas avaliações externas como
forma de controle da sociedade e dos estabelecimentos escolares.
Todos são responsáveis: comunidade, gestores, professores e pais,
pela implementação das mudanças necessárias para uma educação
eficaz. Numa tentativa de incutir um discurso hegemônico em prol
da educação no país, mas que implicitamente vem carregado de
interesses que divergem de uma sociedade igualitária e sem exclusão.
Nesse discurso, altos investimentos públicos são direcionados à
iniciativa privada para seu próprio enriquecimento. Na contrapartida,
o que repassam à educação pública ocorre de forma reduzida e
excludente, privilegiando poucos, numa valorização às exceções.
E, quando isso ocorre, em que alguns conseguem êxito, a alocução
é do esforço individual, mérito próprio, de que lutou e conseguiu,
pois são dadas condições igualitárias para todos alcançarem seus
objetivos, dependendo do esforço de cada um. Nesse processo, a
realidade da perversa distribuição de renda e os altos repasses às
empresas privadas são acobertados por esse discurso neoliberal.
Nos pressupostos do gerencialismo, a atenção é focada para
os resultados, na verificação da eficiência e eficácia dos serviços.
Por isso, a necessidade de uma gestão descentralizada para que
a decisão esteja mais próxima do local no qual será aplicada a
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 97

prestação dos serviços. Dessa forma, é preciso a avaliação de quem


recebe os serviços, os clientes, e torna-se imprescindível ambientes
competitivos dentro das instituições públicas e de objetivos
direcionados à produtividade. Nessa nova forma de gestão, o Estado
assume outra postura e passa a administrar os recursos e as políticas,
saindo do Estado provedor para o Estado regulador (BALL, 2004).
Uma regulação a serviço do mercado e não aos que necessitam, a
classe mais desfavorecida.
Muitas políticas educacionais foram elaboradas de acordo
com os paradigmas do gerencialismo, a forma de gestão das empresas
privadas. A presença do Estado distributivo, descentralizador e
ao mesmo tempo regulador é explícita nas políticas, programas e
ações adotados para mudar a realidade da educação no país, em
que o viés economicista ainda é muito forte. Todavia, as diferentes
disputas dos diversos segmentos para a formulação das políticas
lutam por políticas públicas educacionais que podem ser readaptadas
e direcionadas para outros caminhos que tenham uma visão mais
humanista, no olhar para o ser humano e não para o mercado.
No entanto, a presença de novas personalidades no
planejamento das políticas educacionais direciona para uma
valorização à mercadorização da educação, cada vez mais forte no
cenário brasileiro. Assim é que, no tópico seguinte, passaremos a
relacionar tais contextos com as políticas para o ensino médio.

2.2 Políticas públicas para o ensino médio: conceitos transversais

No processo de elaboração das políticas para o ensino médio,


tanto nacionais como locais, torna-se visível a ação dos grupos com
interesses distintos que buscam atender às suas necessidades, de
um lado relacionados aos interesses economicistas para atender ao
mercado e, do outro, à preocupação com uma formação mais humana.
98 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Ao analisar uma política pública, é preciso saber que a elaboração de


uma ação pública (policy) é decidida em um contexto de relações de
poder determinadas pela dimensão processual (politics) (AZEVEDO,
2004), que envolvem grupos partidários, movimentos sociais, cargos
políticos e outros segmentos com interesses específicos. E assim
surge, na própria política, ideias divergentes.
Essa dicotomia se dá devido à participação de diversos setores
na elaboração da política. Na evolução dos estudos sobre políticas
públicas, pleiteou-se um novo conceito de que essas políticas não
pode se resumir à ação governamental. Isso se deu devido a diversas
mudanças ocorridas na sociedade contemporânea, que ocasionaram
o surgimento de novos problemas e desafios com interseção de
antigos dilemas. Isso foi substancial nas sociedades democráticas
devido à complexidade da interação entre o Estado e a sociedade,
em que a política pública é vista como uma forma de poder. Assim,
para a formulação de uma política pública, há uma diversidade de
aspectos da política, da economia, das relações sociais, da cultura,
num cenário em que as disputas por direitos e partilha são constantes.
As políticas públicas implantadas advêm de interesses de
determinados segmentos da sociedade, em especial daqueles que
possuem forças para impor quais problemas são prioritários e quais
ações devem ser planejadas no intuito de minimizá-los. Todavia, não
ocorre de forma consensual, pois geralmente quem tem o poder de
decisão dessas políticas traz em seu bojo pressupostos que atendem
um grupo minoritário, geralmente os detentores do poder econômico,
que determinam as ações mais importantes para o desenvolvimento
do país.
Dentre inúmeros conceitos, Azevedo (2004, p. 5) expõe as
políticas públicas como um “espaço teórico – analítico próprio, que
representa a materialidade da intervenção do Estado, ou o ‘Estado
em ação’, pois toda política pública tem o intuito de dar visibilidade
ao Estado, revelando-o através das ações”. Ao se investigar uma
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 99

política pública, é preciso ter ciência de que ela surge a partir de


um problema de um determinado setor, e de como esse problema
será reconhecido pelo Estado e se se transformará em uma política
pública, mas, especificamente, deverá ser uma situação que se torne
um problema social e exija a atuação do Estado (AZEVEDO, 2004).
Nessa assertiva, em uma sociedade que os direitos dos cidadãos não
são respeitados, os problemas são diversos; entra em cena a disputa
dos setores para que determinado problema seja reconhecido e se
torne uma política pública. A exemplo do ensino médio regular no
Brasil, que só no final do século XX teve formulada, implantada
e implementada uma política pública específica para as escolas
médias brasileiras, através de um programa, a materialização de
uma política para melhorar a estrutura das escolas e universalizar
o ensino médio.
É explícito que algumas políticas públicas são decorrentes
de pressões, sejam elas de orgãos internacionais, que exigem uma
mudança no mercado para que possam receber investimentos, ou da
sociedade civil, através de seus representantes que buscam atender a
seus anseios. Em relação a essa questão, Azevedo (2004, p. 5, grifo
nosso) acrescenta:

Em um plano mais concreto, o conceito de


políticas públicas implica considerar os recursos
de poder que operam na sua definição e que tem
nas instituições do Estado, sobretudo na máquina
governamental, o seu principal referente.
Outra importante dimensão [...] é que as
políticas públicas são definidas, implementadas,
reformuladas ou desativadas com base na
memória da Sociedade ou do Estado em que tem
lugar e que por isso guardam estreita relação
com as representações sociais que cada
sociedade desenvolve de si própria.
100 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

As políticas públicas não devem ser reduzidas a ações


provisórias, com programas que têm prazos determinados para
finalizar. Devem ir mais além, como reforça Sposito (2003, p. 59):

Em sua acepção mais genérica, a ideia de


políticas públicas está associada a um conjunto
de ações articuladas com recursos próprios
(financeiros e humanos), envolve uma dimensão
temporal (duração) e alguma capacidade de
impacto. Essa noção, do mesmo modo, não
reduz a política à implantação de serviços e nem
ao eixo da articulação de programas e ações,
embora esses dois aspectos possam estar nela
contidos. Desse modo, o termo compreende
a dimensão ético-política dos fins da ação, e
deve-se aliar, necessariamente, a um projeto de
desenvolvimento econômico-social e implicar
formas de relação do Estado com a sociedade.

Ao planejar políticas públicas, são necessárias ações mais


amplas e contínuas em prol da sociedade, mas, na realidade, o que
ocorre é o contrário, pois há uma fragmentação da política social
em muitas ações que a torna ineficaz, porque não consegue atingir
as causas dos problemas. As políticas públicas adotadas revelam um
conjunto de elementos específicos da realidade social, quais são as
prioridades e ao que se tem dado mais atenção. Ao serem implantadas,
revelam as concepções e ideologias que estão por trás dessas políticas,
os interesses específicos e a quem se destina. Um exemplo são as
políticas públicas adotadas para a juventude, com ações pontuais, cujo
interesse é tirar o jovem da situação de risco, em que ele precisa ficar
o dia inteiro na escola para que não entre no mundo da criminalidade.
Não é específico para a juventude, com o viés de uma política universal,
mas focalizada em um grupo marginalizado.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 101

Quem elabora essas políticas traz a ideia de que o jovem é uma


ameaça, especialmente os jovens da periferia, e para isso precisa de
ações que os afastem dos riscos. Kerstenetzky (2006) irá denominar
focalização como residualismo, o qual incide sobre segmentos que estão
à margem dos processos econômicos e integradores, indo de encontro
aos ideais de justiça distributiva. A autora (2006, p. 569) acrescenta
que “na medida em que a política social sofre, nesta abordagem do
problema, uma compartimentalização, seu vínculo com a noção de
direitos sociais universais perde força, e ela se torna um coadjuvante
do objetivo de eficiência econômica”. É visível que, apesar de ser um
direito constitucional, os escassos recursos disponíveis para as áreas
sociais inviabilizam a universalização do atendimento e exigem a
prioridade de grupos mais vulneráveis e a focalização de políticas,
onde se percebe a falta de políticas universais para garantir o acesso,
a permanência e a aprendizagem do aluno do ensino médio na escola,
pois, segundo Bueno (2000, p. 20), “apesar do sem-número de projetos
em andamento, a dubiedade, a indefinição e a incerteza prevalecem no
interior da escola média pública”.
Há inúmeras definições sobre políticas públicas, mas
observa-se uma relevância naquela em que considera o governo
como responsável por implantar e implementar ações que sanem os
problemas que afetam a vida social. Na realidade, constata-se que
“as políticas públicas historicamente têm atuado como estratégias
de dominação da classe burguesa e/ou frações dela, no sentido de
reproduzir as condições de acumulação capitalista” (DIÓGENES,
2010, p. 77). Assim, as políticas públicas, por serem elementos
que fazem parte de um tema contemporâneo, suas investigações e
análises precisam estar relacionadas com o mundo social, político,
econômico e cultural, que está sempre em mutação e envolve,
ainda nas investigações, as relações de poder, os conflitos sociais,
os processos de decisão e as múltiplas dimensões que formam uma
política pública.
102 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

É importante salientar que qualquer política pública tem sua


ideologia, suas concepções e interesses, o que não difere da política
educacional. A educação, idealizada como mecanismo de melhoria
das condições sociais, um bom emprego, um melhor salário,
consequentemente, uma vida social digna. Baseando-se nessa
idealização, os países mais desenvolvidos exercem uma pressão
nos menos desenvolvidos para planejar políticas educacionais que
consigam alcançar os objetivos propostos. Não há como desvincular
o planejamento de políticas educacionais com a realidade social,
política e econômica do Estado que a implanta.
No Brasil, nas últimas duas décadas, tem aumentado
significativamente o número de programas, tidos como políticas de
governo, e com possibilidades de término a cada mudança de gestão,
o que inviabiliza a sua continuidade e não atinge os problemas
pelos quais foi elaborado. Outro agravante é que muitos se tornam
publicidades para as campanhas eleitorais, e que os candidatos os
adotam como propriedades e deixam transparecer à sociedade que
podem ser extintos no caso da não continuidade do governo.
O entendimento do que seja uma política pública conduz a
um direcionamento de que, ao analisar as políticas educacionais
para o ensino médio, o olhar se volta para a ação pública em seu
conjunto, capaz de identificar quais foram consideradas centrais e
que posteriormente foram implementadas, bem como as disputas
dos setores e em qual contexto social, político e econômico. Pois,
a ideia de que apenas o governo é o responsável pelas políticas
públicas é questionável.
Verifica-se nas ações implantadas pelo governo a definição
de políticas a partir de problemas que afetam a sociedade, o que
relaciona-se aos programas formulados para resolver as demandas
do ensino médio brasileiro na busca pela universalização,
preconizada pela Constituição Federal de 1988 e perseguida até
os dias atuais. Além disso, os programas buscam minimizar a
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 103

precariedade das escolas, as quais não apresentam uma estrutura


adequada, com falta de recursos materiais e humanos, e muitos
outros problemas. Dessa forma, diante de tantas fragilidades,
foram elaboradas políticas públicas com o intuito de reverter esse
quadro. Assim, foi implantado em 1997 o Programa de Melhoria
do Ensino Médio (Promed) como a primeira política pública para
as escolas públicas regulares do ensino médio em todo o Brasil, e,
em 2009, o segundo programa, o Programa Ensino Médio Inovador
(ProEMI), com o intuito de ampliar o tempo escolar e ter um
currículo diferenciado, com a intenção para a formação humana
integral do sujeito da escola pública.
Azevedo (2004, p. 59) demonstra que as políticas
educacionais possuem especificidades próprias decorrentes do
espaço social em que são implantadas, e para analisá-las os
caminhos são desafiantes, refletem as posições e ações do Estado e
sociedade, e, principalmente, porque

[...] não se pode esquecer que a escola e


principalmente a sala de aula, são espaços
em que se concretizam as definições sobre a
política e o planejamento que as sociedades
estabelecem para si próprias, como projeto ou
modelo educativo que se tenta pôr em ação. O
cotidiano escolar, portanto, representa o final
de uma complexa cadeia que se monta para
dar concretude a uma política – a uma policy –
entendida aqui como um programa de ação.

Portanto, para o estudo das políticas educacionais no cotidiano


escolar é imprescindível romper com a racionalidade lógica, que
envolve no seu âmbito científico uma abordagem linear e sequencial,
com etapas fixas – formulação, implementação, resultados e avaliação
–, e que reduz a política a um conjunto de estratégias organizacionais,
104 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

numa visão limitada de políticas públicas. A abordagem sequencial


é uma visão bastante linear da ação pública com a ideia de que o
objeto das políticas é a solução de problemas, os quais acarretam dois
efeitos: a supervalorização das decisões das políticas e a distância da
função política da sociedade.
Contrapondo-se à ideia da abordagem sequencial, faz-
se necessária uma postura de análise da ação pública como
compreensão de sentidos pelos quais o Estado intervém na sociedade
e nos processos complexos e evolutivos entre Estado e sociedade.
Essa acepção vai além da compreensão dos resultados de decisão
do Estado e inclui o questionamento da participação dos cidadãos
nesse processo de deliberações, no sentido de uma análise sistêmica
da ação pública. Incluem-se as escolas, no sentido de saber qual
papel elas exercem nos processos de decisão e desenvolvimento das
políticas públicas da educação. Dessa forma, os contextos locais
a ressignificam, pois, a forma como cada estado, município ou
instituição a implanta, através das ações, demonstra a sua proposta
de educação. A lei regulamenta a política pública e ao analisá-la é
preciso criticidade para a interpretação dos interesses, concepções
e intenções para que possam ser modificados e praticados de uma
forma que fuja aos interesses dominantes. Pois, o que se constata,
é um desinteresse em definir a educação pública como prioridade
social e política em primeiro lugar (SAVIANI, 2011).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na realidade brasileira, as políticas educacionais demonstram


contradições em que, de um lado, orientam-se pela ampliação do
acesso, inclusão, orientação para a cidadania e ao mesmo tempo
seguem a privatização, mercantilização, formação de competências
e difundem a crença de que os problemas reais estão nos indivíduos.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 105

Políticas que vêm sendo universalizadas de forma precarizada e não


garantem o acesso ao saber científico pela maioria da população.
Assim, ao analisar o cotidiano escolar, a atenção deverá
direcionar-se para os sujeitos que se envolvem com a política
educacional como principais nesse processo e ao mesmo tempo
receptores. Nessa perspectiva, há que se considerar que as políticas
globais direcionadas ao ensino médio tinham a finalidade de uma
preparação específica para o mercado de trabalho, com um discurso
de que alunos bem preparados entrariam com facilidade no mercado
de trabalho e contribuiriam para mudar o cenário econômico do país.
Assim, a intenção foi direcionada para as locais, que procuraram
formas mais reguladoras de conseguir tal intento, numa relação
global e local. Contrapondo-se a uma educação unilateral, busca-
se por uma formação “desinteressada” (GRAMSCI, 1982), sem que
haja uma especificidade, mas que sirva para a vida do aluno, com a
articulação das dimensões: trabalho, ciência, tecnologia e cultura.
Inúmeras políticas educacionais se fizeram presentes para
a mudança do ensino médio, entre as quais poderíamos citar as
legislações, os pareceres, os decretos e as diretrizes curriculares.
Nas políticas educacionais para o ensino médio no Brasil,
no que diz respeito ao direcionamento curricular para essa etapa,
percebe-se três movimentos: 1) direcionado para a qualificação
profissional com ênfase nos cursos técnicos como essenciais para
a formação dos alunos de baixa renda; 2) a mudança do viés da
qualificação para as competências e habilidades dos jovens de ensino
médio para as mudanças ocorridas no mundo globalizado; e 3) novo
redirecionamento, não mais na ênfase das competências, mas numa
formação humana integral, não de forma unívoca, defendida por
diferentes segmentos com interesses ambíguos.
Portanto, ao conhecer a história brasileira no que se refere às
políticas educacionais adotadas pelo Estado, o direcionamento segue
106 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

as leis do mercado, com estratégias de preparação para a mão de obra


com novas formas de produção que não absorvem a totalidade dos
trabalhadores, e sim uma minoria que consegue entrar no mercado
de trabalho, os mais capacitados e que atendem aos anseios dos
empresários e se adequam às novas formas de gerenciamento.

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CAPÍTULO 5
PERSPECTIVAS DECOLONIAIS
NO ENSINO DE INGLÊS:
reflexões sobre formação inicial
de professores e o seu papel social
Jonatha Rodrigues da Silva
Joyce Rodrigues da Silva Magalhães
Sérgio Ifa

É na língua(gem) que o homem constrói


sua existência dentro de certas condições
socioeconômicas que desencadeiam sua
produção cultural, sua representatividade e suas
necessidades humanas de se agregar socialmente,
de se mostrar como indivíduo. (ALAGOAS,
2019, p. 415)

1. INTRODUÇÃO

Que cidadão queremos formar? é o questionamento


principal (ou primeiro) do Referencial Curricular do Estado de
Alagoas (ALAGOAS, 2019) que poderia balizar os cursos de
112 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

licenciatura e as reuniões pedagógicas das escolas públicas (e


privadas) do Brasil. Considerando nosso contexto social-político-
histórico atual, no presente trabalho buscamos identificar o papel da
Língua Inglesa (doravante LI) nas políticas públicas educacionais,
observando desde a sua importância para a formação intelectual e
cidadã do/da aluno/a.
O conceito de educação em vários documentos oficiais
(LDB, PCN, BNCC, OCEM) e para muitos (teóricos, pesquisadores,
professores, coordenadores e outros/as) vai além da aprendizagem
de conteúdos; pretende formar a/o aluna/o cidadã/o, que sabe
conviver com as diferenças, e que está preparada/o para o mercado
de trabalho. A educação, desse modo, é compreendida como uma
forma de diálogo com a sociedade e o ambiente escolar, como “um
organismo vivo e complexo e não apenas a sala de aula” (IFA, 2014,
p. 104), porque é nele que circulam inúmeros sujeitos com diferentes
modos de pensar, ser, construir conhecimento e viver.
Com este contexto em mente, na formação inicial de
professores se faz necessário um diálogo entre teoria e prática de
forma significativa, pois, segundo Dewey (1938, p. 40 apud IFA,
2014, p. 102), “uma experiência não acontece isoladamente, pois
ela está sempre atrelada a experiências anteriores e, ao mesmo
tempo, interferindo em futuras experiências”. Propor no curso de
licenciatura em Letras/Língua Inglesa esses momentos relevantes e
reflexivos que dialogam prática e teoria ajuda para conscientizar o/a
futuro/a professor/a de seu papel político-profissional.
Sendo assim, desenvolvemos este trabalho, que surgiu de
nossas inquietações como professores (da educação básica e do
ensino superior), visto que buscamos identificar o papel da LI e
o seu papel para formação cidadã, seja de alunos/as da educação
básica, seja para conscientização e preparação do professor pré-
serviço para o enfrentamento de situações únicas em sala de aula,
considerando que a sala de aula é sempre fluida e tem alunos/as que
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 113

demandam professores/as que adotem novas metodologias e (re)


pensem suas práticas docentes em função das mudanças sociais. Por
enfocar língua(gem) em contextos sócio-históricos-políticos reais,
este trabalho se insere na LA.
Apresentamos agora a estrutura deste trabalho: 1) a priori,
discutimos a formação do/da professor/a pré-serviço, mostrando qual
o papel da universidade e como esta pode ser capaz de formar um/
uma professor/a transformador/a; 2) discutimos a concepção de LI
que considera fatores sociais-políticos-ideológicos, mostrando como
aprender uma língua estrangeira pode ser também uma experiência
enriquecedora para além da sala de aula; e, em seguida, 3) discutimos
o papel do/da professor/a de Inglês na contemporaneidade e
refletimos sobre seu papel político frente às lutas sociais de raça,
gênero e sex(o)ualidade9.
Por fim, nas considerações finais, levantamos novas
problemáticas a partir dos pontos discutidos anteriormente.

2. DECOLONIALIDADE NO ENSINO DE LÍNGUA INGLESA

2.1 Perspectivas decoloniais na formação inicial de professores

Diante das mudanças da sociedade contemporânea, olhar


para a Educação faz-se necessário e desafiador, sobretudo no cenário
político-educacional atual. Em paralelo, ao direcionarmos um olhar

9
Usamos esta construção morfológica para falar de sexo e sexualidade, pois buscamos
dar visibilidade às diferentes posições de gênero e sexualidade, indo além da lógica
binária que usualmente se concebe “homem e mulher como pólos opostos que se
relacionam dentro de uma lógica invariável de dominação-submissão” (LOURO,
[1997]2003, p. 31). Bem como não usamos o masculino como regra para se referir a
homens e mulheres, por exemplo, optando, desse modo a usar formas não sexistas como
alunos/as, professores/as, ou usando ambos os gêneros. Nas palavras de Guacira Lopes
Louro, “a linguagem não apenas expressa relações, poderes, lugares, ela os institui; ela
não apenas veicula, mas produz e pretende fixar diferenças” ([1997]2003, p. 65).
114 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

mais apurado à Educação, devemos nos ater, especialmente, à


formação de professores e professoras, uma vez que as demandas
requeridas pela sociedade também estão em constante mudança.
Nesse sentido, se, outrora, os cursos de formação de professores
exigiam deles o conhecimento teórico, bem como o conhecimento
estritamente técnico, hoje, no entanto, as exigências se apresentam
de maneiras diferentes do século anterior, configurando-se de
maneira diversificada. Em suma, novos saberes e habilidades são
demandados aos/às alunos/as do século XXI e, consequentemente,
aos/às seus/suas professores/as. Ainda, o momento contemporâneo
opera em um campo que envolve uma série de novos significados,
modos de produção de sentido, práticas, técnicas, instituições,
procedimentos de subjetivação e relações discursivas, as quais
necessitam de explicações causais mais complexas a respeito dos
fenômenos sociais existentes (FABRÍCIO, 2006).
Ademais, no cenário político atual, a educação superior
tem sido alvo de discursos que colocam em dúvida o significado
de fazer ciência. Nesse sentido, em se tratando de produção de
conhecimento, quando se ingressa na universidade, em especial,
nos cursos de humanas, “o cânone do pensamento a ser ensinado é
fundamentalmente encontrado numa teoria produzida por homens
dos cinco países da Europa ocidental” (SANTOS, 2010 apud
GROSFOGUEL, 2016, p. 27). Esses países – Estados Unidos,
Inglaterra, Alemanha, Itália e França – monopolizaram a ciência
e tiveram o privilégio epistemológico, ou “violência epistêmica”
(GROSFOGUEL, 2016, p. 78) que desqualifica conhecimentos
produzidos em outras partes do mundo.

Como resultado, nosso trabalho na universidade


ocidentalizada é basicamente reduzido a
aprender essas teorias oriundas da experiência
e dos problemas de uma região particular
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 115

do mundo, com suas dimensões espaciais/


temporais muito particulares e “aplicá-las” em
outras localizações geográficas, mesmo que as
experiências espaciais/temporais destas sejam
completamente diferentes daquelas citadas
anteriormente (GROSFOGUEL, 2016, p. 27).

Com essa realidade, estudiosos propõem uma subversão


epistêmica, o que Boaventura de Sousa Santos (SANTOS, 2018)
denomina Epistemologias do Sul, que nascem das injustiças
“causadas pelo capitalismo, pelo colonialismo e pelo patriarcado,
os três principais modos de dominação moderna” (SANTOS,
2018, p. 24). O Sul de que fala o autor não é o geográfico, mas
o geopolítico; é o sul subalterno que começa a quebrar essa
hierarquia de conhecimento denominada pelo capitalismo,
colonialismo e patriarcado.
Desse modo, esse contexto justifica a necessidade de discutir
tais formas de entendimento, percorrendo o caminho de crítica
decolonial e refletindo sobre a formação inicial de professores/as,
a partir dos imbricamentos existentes entre linguagem, sujeitos e
políticas educacionais.
Com base na perspectiva bakhtiniana, a linguagem tem
sua natureza social e seus sentidos são construídos por sujeitos
localizados em contextos sócio-políticos-históricos específicos
(BAKHTIN, 2009). Por esse motivo, acreditamos que problematizar
esses aspectos na formação de professores/as é uma possibilidade de
compreendermos de que modo as diferenças, sobretudo as de classe,
gênero e raça foram interpretadas de forma binária, com o objetivo
de privilegiar um grupo por meio do apagamento de outros.
Desse modo, se a universidade deve ser um espaço plural e
democrático, pensar uma formação docente decolonial nos ajuda a
desafiar a estrutura disciplinar e os saberes compartimentalizados
116 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

que ainda caracterizam o ensino superior. Além disso, um projeto


decolonial nos possibilita refletir outros binarismos como: professor/
a-aluno/a, prática-teoria, ensino-pesquisa e reconhece a universidade
como espaço de entrecruzamento de saberes diversos e várias
formas de construção de saberes, além de transgredir a hierarquia
do conhecimento científico em detrimento de outras formas de
saberes (BORELLI, 2018). Santos ([1987]2018) considera essa
transgressão como “paradigma emergente”, que vai de encontro com
o que é tradicional – nesse caso, o paradigma dominante – para que o
conhecimento produzido (seja dentro ou fora das universidades, pois
o ser decolonial é reconhecer e valorizar diferentes conhecimentos)
seja de fato não dualista,

[...] um conhecimento que se funda na superação


das distinções tão familiares e óbvias que até
há pouco considerávamos insubstituíveis, tais
como natureza/cultura, natural/artificial, vivo/
inanimado, mente/matéria, observador/observado,
subjetivo/objetivo, coletivo/individual, animal/
pessoa (SANTOS, [1987]2018, p. 69).

Nesse sentido, para compreendermos de que forma a


formação docente pode ser desenvolvida na perspectiva decolonial,
faz-se necessário esclarecer o entendimento do termo decolonial
nesse estudo. Esse termo tem origem de uma perspectiva teórica
advinda de um grupo de intelectuais latino-americanos de diversas
áreas que questionam a “geopolítica do conhecimento”. Para o
grupo, o termo decolonial faz referência “às possibilidades de um
pensamento crítico a partir dos subalternizados pela modernidade
capitalista” (OLIVEIRA, 2016, p. 35).
Nesse contexto de repensar a decolonização do conhecimento,
a formação inicial de professores/as se torna um campo propício
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 117

à reflexão a respeito das estruturas de conhecimento modernas/


coloniais, uma vez que elas se justificam a partir da epistemologia
fundante das universidades ocidentalizadas (GROSFOGUEL,
2016). É importante destacar que, segundo Mignolo (2005, p. 75),
“a colonialidade é constitutiva da modernidade, e não derivada”, isto
é, uma está contida na outra. Oliveira (2016, p. 35) complementa a
reflexão afirmando que:

modernidade e colonialidade são as duas faces


da mesma moeda. Graças à colonialidade, a
Europa pode produzir as ciências humanas
com um modelo único, universal e objetivo na
produção de conhecimentos, além de deserdar
todas as epistemologias da periferia do ocidente
(OLIVEIRA, 2016, p. 35).

Partindo dessa premissa, objetiva-se, portanto, propor


reflexões acerca da construção de um projeto teórico que possibilite
um repensar crítico e transdisciplinar, sobretudo na formação
inicial de professores e professoras, o qual caracterize-se também
como força política, capaz de contrapor às tendências acadêmicas
dominantes de cunho eurocêntrico na construção do conhecimento
histórico e social (OLIVEIRA, 2016).
Dito isso, este estudo está arraigado em três conceitos
fundantes que sinalizam o percurso decolonial pelo qual acreditamos
que a formação inicial de professores/as de Inglês pode trilhar. São
eles: a diferença colonial (MIGNOLO, 2003), a interculturalidade
crítica e a pedagogia decolonial (WALSH, 2005).
A diferença colonial é um termo criado por Mignolo (2003)
que significa pensar a partir das margens e das experiências criadas
pela colonialidade na estruturação do mundo moderno/colonial,
de modo que os sujeitos subalternos possam intervir em um novo
118 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

horizonte epistemológico. A perspectiva da diferença colonial


também supõe o interesse por produções de conhecimentos distintas
da modernidade eurocêntrica. Desse modo, os/as professores/as
de Inglês compreenderiam que a língua inglesa está presente em
diversos contextos, inclusive em contextos locais e valorizariam
toda e qualquer cultura.
Já a interculturalidade crítica é entendida como ferramenta
dos movimentos sociais e subalternos na construção de um projeto
político que visa a interação entre os conhecimentos subalternizados
e os ocidentais e questiona os hegemônicos em detrimento do
apagamento de outros (WALSH, 2005). Nas palavras de Catherine
Walsh (2005), a interculturalidade crítica é a

(re)construção de um pensamento crítico-outro


- um pensamento crítico de/desde outro modo -,
precisamente por três razões principais: primeiro
porque está vivido e pensado desde a experiência
vivida da colonialidade [...]; segundo, porque
reflete um pensamento não baseado nos legados
eurocêntricos ou da modernidade e, em terceiro,
porque tem sua origem no sul, dando assim uma
volta à geopolítica dominante do conhecimento
que tem tido seu centro no norte global (WALSH,
2005, p. 25).

A interculturalidade crítica pode ser capaz de empoderar


professores e professoras, de diversas áreas do conhecimento, a
lutarem a favor dos subalternizados ao lhes proporcionarem espaço
para construir conhecimento sobre a sua influência social e ao lhes
fazerem reconhecer que o seu conhecimento técnico e cultural é tão
importante quanto o conhecimento advindo de países do norte global.
Diante disso, a pedagogia decolonial conecta-se com os
dois conceitos anteriores para relacionar as questões educacionais,
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 119

ao denunciar o colonialismo que desumaniza o subalterno como


imposição da modernidade europeia e possibilita uma crítica
teórica à “geopolítica do conhecimento”. A pedagogia decolonial
também defende o enfrentamento e a transformação de estruturas
e instituições que são fundadas em práticas de caráter epistêmico
ocidental (OLIVEIRA, 2016). Entendemos que ela pode se tornar
peça fundamental em sala de aula, como instrumento transformador
no enfrentamento das injustiças sociais.
Para Mignolo (2017), o conhecimento se ancora numa relação
histórica, econômica e política, por isso a necessidade de questionar
sua criação e transformação, uma vez que seus rumos são feitos com
base em interesses maiores e necessidades particulares. Portanto,
esse é o cordão que imbrica a relação decolonialidade, formação
docente e políticas educacionais e que constitui-se como o fio
condutor deste estudo decolonial, uma vez que, ao problematizar e
“colocar em interrogação a enunciação (quando, por quê, onde, para
quê) nos dota do conhecimento necessário para criar e transformar,
o que parece necessário para imaginar e construir futuros globais”
(MIGNOLO, 2017, p. 24).
Nesse sentido, o processo de questionamento da formação
inicial de professores é o pontapé inicial para um projeto decolonial
que busca ressignificar o papel sócio-histórico-político do/da
professor/a e estreitar os laços entre a formação inicial e o ensino
prático de Inglês, uma vez que “[u]m problema perene em programas
tradicionais de formação de professores mantidos por faculdades e
universidades tem sido a falta de conexão entre os cursos de formação
de professores nessas unidades e o campo da prática” (ZEICHNER,
2010 apud BORELLI, 2018, p. 483-484).
Assim, a valorização das perspectivas locais no ensino
de línguas estrangeiras, nesse caso na LI, nos permite construir
alteridades locais mais firmes que possibilitam uma reflexão e
comparação dos valores globais e locais. Essa postura por parte da
120 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

universidade e, consequentemente, do/da professor/professora de


inglês possibilita a preservação das identidades locais e fortalece as
alteridades, promovendo a tolerância nas relações sociais por meio
das distinções entre valores e da facilidade de inserção dos indivíduos
aos meio de produção, de informação e de acesso ao conhecimento
(STELLA; TAVARES, 2012).
Dito isso, é por meio de um projeto decolonial que proporcione
uma sintonia entre universidades, professores em formação inicial
e necessidades sociais, que seremos capazes de minimizar as
desigualdades sociais.

2.2 O Ensino de Língua Inglesa nas escolas públicas: uma opção


decolonial?

Neste tópico, discutiremos o papel da LI e sua importância


para o/a aluno/a de escola pública, alunos/as de um contexto sem
tantos recursos financeiros e que aprender inglês pode ser uma
oportunidade de “acesso ao conhecimento, bem como a inserção
no contexto global contemporâneo” (CRUZ, 2016, p. 16) e
oportunidade de crescimento profissional. O próprio Referencial
Curricular do Estado de Alagoas deixa claro que aprender inglês é
uma “possibilidade de ascensão no trabalho, valorização salarial e
oportunidade de viagens para turismo ou a negócios” (ALAGOAS,
2019, p. 412).
Todavia, em Alagoas, quando tratamos de ensino e
aprendizagem de LI, muitas vezes há um olhar de desconfiança, como
é exposto no Referencial (ALAGOAS, 2019, p. 416). Isso vem de
uma crença que não é possível aprender inglês nas escolas regulares,
e a situação é mais agravante quando falamos de escola pública. Em
uma discussão mais aprofundada, Makiyama (2015) argumenta que
há uma crença de que o ensino de LI na escola regular é ineficiente,
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 121

sendo necessários cursos livres (privados) de idiomas. “[I]isso cria


um fator de exclusão violento porque aqueles que podem pagar e,
portanto, estudar inglês, poderão conseguir melhores empregos,
acessar informações em locais distantes e interagir com o outro”
(ALAGOAS, 2019, p. 417).
E esse fator de exclusão não é um fato que aconteceu
isoladamente ou que não tem nenhum viés ideológico por trás.
Durante muito tempo, o ensino era voltado para um método
conteudista, ou seja, só se educava quando se transmitia conteúdos;
quando a escola formava o “cidadão dócil e o operário competente”
(CURY, 1995, p. 62). Outra realidade é que por um bom tempo o
ensino de LI era elitizado devido ao seu prestígio, tudo por conta de
seu poder hegemônico/capitalista. Assim, “o mercado tornou-se o
princípio organizador dos domínios político, econômico e social”10
(HARVEY, 2005 apud BERNSTEIN et al., 2015, p. 5). Vilson
Leffa (2007, p. 8) afirma que a ideia excludente desse contexto
capitalista era que “[S]se todos os alunos saíssem da escola falando
uma língua estrangeira, aqueles que hoje a falam perderiam muito
de seu status social”.
Ou seja, maior é o valor de algo se este é inacessível para
a grande maioria, e isso vai do conhecimento, da aquisição de
automóveis e roupas de grifes, vinhos raros e pratos gourmet. Muito
dessa visão elitista ainda existe hoje no que tange ao ensino de LI
(só se educa quando transmite o conteúdo), tendo o foco voltado
para a gramática, e a língua é aqui vista como estrutura, e aspectos
socioculturais, políticos e ideológicos não têm muito ou nada a ver
com o processo ensino-aprendizagem de LI.
Nesses contextos, o ensino de LI tem como ponto de referência
o falante nativo e mantinham (ou ainda mantém?) as alteridades

Nossa tradução do original: “[...] market has become the organizing principle for
10

political, economic, and social domains”.


122 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

apagadas – ou, nas palavras de Ponzio (2010), “alteridades fracas”


– porque o/a aluno/a está em “um ambiente de dominação contra o
qual os participantes não se opõem e onde acontecem os processos de
exclusão porque são ambientes em que os participantes enxergam-se
iguais e, portanto, rechaçam o diferente” (STELLA; CRUZ, 2014, p.
153). Essa ideia é o que Holiday (2005 apud KUMARAVADIVELU,
2016, p. 71) chama de Native Speakerism, que “tem privilegiado o
falante nativo e marginaliza o não nativo, em questões relacionadas
ao uso da língua, aprendizagem de línguas e ensino de línguas”11. O
método de submissão de nossa cultura à cultura americana utilizado
por professores/as como ponto de referência vai ao encontro da ideia
de dominação cultural por meio da língua, assim,

professores de outros países e outras culturas


têm a certeza de que este é o correto e que o
papel deles é adaptá-lo aos seus alunos ou os
alunos a ele [...] eles promovem a competência
linguística presumida do falante nativo, estilos
de aprendizagem, padrões de comunicação,
máximas de conversação, crenças culturais e até
sotaque como a norma a ser aprendida e ensinada
(KUMARAVADIVELU, 2016, p. 73).

Esse pensamento neoliberal organiza, comanda os contextos


econômicos, políticos e até educacionais e, debatendo sobre o papel
do/da professor/a neste cenário, Apple (2006, p. 24) critica a noção
de que o/a professora “precisa ser disciplinado para competição de
mercado para torná-los mais eficientes e eficazes”12. A educação,
nesse sentido, serve para atender às demandas capitalistas e
11
Nossa tradução do original: “[…] has been privileging native speakers and marginalizing
nonnative speakers in matters related to language use, language learning, and language
teaching”.
12
Nossa tradução do original: “need to be disciplined by market competition in order to
make them more efficient and effective”.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 123

patriarcais, preparando o/a aluno/a para o mercado de trabalho,


incentivando “o desenvolvimento de um espírito empreendedor,
incluindo a ênfase na competição como caminho para melhores
resultados”13 (BERNSTEIN et al., 2015, p. 5).
Para caminhar em direção à valorização do contexto local e
para atender às demandas sociais para uma educação mais crítica e
cidadã, é necessária “ruptura epistêmica” (WALSH, 2007, p. 50).
Para tanto, expomos aqui dois meios que achamos cruciais.
O primeiro meio é o conhecimento de “alteridades firmes”. Para
Ponzio (2010), é o entendimento das singularidades, considerando
que somos seres únicos que têm suas individualidades, histórias
de vida e identidade, e não parte homogeneizante de um todo. Nas
aulas de Inglês, logo nos primeiros contatos com a língua, mesmo
que na forma estrutural aprendendo o verbo to be, aprendemos a
falar de nós mesmos. Para Pessoa (2019, p. 38), “aulas de língua
na contemporaneidade geralmente envolvem o uso de repertórios
linguísticos para falar de quem somos e como vivemos”, como, por
exemplo, no livro do 6º ano da coleção Alive! (MENEZES, 2018),
onde as unidades 1 e 2 são intituladas “Who am I?” e “Family
and home”, respectivamente. Já na coleção Peacemaker (AMOS;
CONDI, 2018), só no 6º ano vemos as unidades “Identities” e “We
all have a Family” (unidades 2 e 3, respectivamente) e “This is
me” (unidade 8). Carregamos também o lugar onde vivemos como
construção dessa identidade.
Identificamos no Referencial alguns pontos que passam a
considerar o contexto local para, assim, atingir níveis globais de
conhecimento, pois, para esse documento,

o trabalho didático-pedagógico desenvolvido


pela escola, a partir dos componentes
Nossa tradução do original: “[...] the development of an entrepreneurial spirit, including
13

an emphasis on competition as the path to better outcomes”.


124 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

curriculares, deve se organizar considerando


as identidades dos estudantes que, em linhas
gerais se constituem uma rica heterogeneidade,
presente no rosto das diversidades da sociedade
brasileira, especialmente do território alagoano,
advindas dos aspectos sociais, econômicos,
políticos, religiosos, culturais e ecológico
(ALAGOAS, 2019, p. 40).

O segundo é uma concepção de linguagem que considere o


sujeito-falante como o centro da comunicação em uma constante
relação com o seu meio, portanto, língua como interação. Não
entendemos linguagem apenas como “manifestação externa do
pensamento (algo que vem depois do pensamento), mas o que a
torna possível” (FARACO, 2009, p. 111), nem apenas em sua forma
estrutural. Para Bakhtin/Volochinov ([1929]2017, p. 218-219, grifos
do autor), que define fala como interação verbal,

a realidade efetiva da linguagem não é o


sistema abstrato de formas linguísticas nem o
enunciado monológico isolado, tampouco o
ato psicofisiológico de sua realização, mas o
acontecimento social da interação discursiva que
ocorre por meio de um ou vários enunciados [...]
Desse modo, a interação discursiva é a realidade
fundamental da língua.

No referencial curricular de Alagoas e na Base Nacional


Comum Curricular (BNCC), a linguagem é compreendida em suas
múltiplas funções, sendo elas corporal, visual, sonora e digital, além
de ser compreendida como fundamental para participação nas práticas
sociais de linguagem, sendo ela mutável e em constante evolução
de acordo com seu uso. A linguagem, assim, é resumida como uma
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 125

interação social entre indivíduos dentro de um contexto social e o


sujeito não é neutro, mas um ser respondente. Nesse cenário, a LI traz
para o/a aluno/a a possibilidade de fazer uso vivo da linguagem e de
“melhorar sua comunicação, aumentar seu repertório cultural, inserir-se,
responsavelmente, na cultura digital e argumentar usando textos, orais
e escritos, para efetivar seus argumentos” (ALAGOAS, 2019, p. 54).
Com esses dois meios que discutimos nos últimos parágrafos,
mostramos um arcabouço teórico-metodológico para que possamos
defender o Inglês como opção decolonial. Mas, o que é ser decolonial?
No Referencial Curricular de Alagoas, bem como na BNCC,
a LI é apresentada como Língua Franca – ILF14, termo polêmico
e que demanda atenção de quem lê tais documentos. Para Jenkins
(2006, p. 160 apud DUBOC, 2019, p. 11-12), ILF é a “língua de
contato entre falantes cujas primeiras línguas diferiam”, ou seja,
além de propor um diálogo entre dois indivíduos de países diferentes,
propõe a tradução cultural, fazendo com que ambas culturas também
dialoguem e estereótipos sejam quebrados. É quebrada, então, a
episteme de que o Inglês pertence apenas aos Estados Unidos ou à
Inglaterra (o que chamamos de dominação euro-americana) e que
estes são o ponto de referência para quem aprende Inglês. Assumir
Inglês como Língua Franca, para o Referencial, é considerar o Inglês
como uma língua

[...] de comunicação internacional e que não


pertence somente a esses grupos, mas que
vai além dos limites territoriais, uma vez
Termo, segundo Duboc (2019, p. 11), polêmico e polissêmico. Conforme Jenkins (2006
14

apud DUBOC, 2019), o ILF é uma língua que, além de contato/tradução entre culturas
distintas, também carrega consigo fatores históricos, sociais, culturais, identitários,
políticos e ideológicos. No Plano Nacional do Livro Didático (PNLD) para o ensino
fundamental, o termo Língua Estrangeira agora “é criticada por seu caráter eurocêntrico,
pela idealização do falante nativo e por desconsiderar uma legião de usuários que
utilizam a língua inglesa para interagir com falantes de culturas e línguas diversas ao
redor do mundo” (BRASIL, 2019, p. 5).
126 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

que, diferentes usuários com seus variados


repertórios linguísticos e culturais, deixam
suas marcas nessa língua franca ao realizarem
suas práticas discursivas mundo afora, o que
se remete a uma educação linguística voltada
para a interculturalidade que se pontua no (re)
conhecimento das (e o respeito às) diferenças
e compreensão do outro enquanto usuário do
idioma, superando qualquer tipo de preconceito
linguístico (ALAGOAS, 2019, p. 420).

Entendemos o uso de ILF nos documentos supracitados, mas


discordamos porque pensamos que tal termo, novamente, hierarquiza
a LI e reforça seu posicionamento liberal e hierarquizante, pois os
questionamentos que fazemos são: 1) se o Inglês é adotado como Língua
Franca, só ele o é?; 2) e as outras línguas?; 3) aprender outra língua,
como Espanhol, Francês ou Tâmil15, também possibilita o contato entre
culturas e desenvolve a empatia em quem aprende ou este é um privilégio
somente do Inglês? Defendemos, neste trabalho, a ideia de que aprender
uma nova língua (o Inglês e quaisquer outras) é desenvolver também
a empatia, pois, ao estar em contato com a língua, o/a aluno/a também
está em contato com diferentes modos de ser/viver, descobrindo e
aceitando essas diferenças e ajudando a situar sua própria posição como
indivíduo. Essa noção corrobora com a ideia de Brydon (2010, p. 3) de
que “aprender inglês pode ser uma experiência enriquecedora e que a
aprendizagem cidadã para a democracia em níveis locais e globais pode
ser melhorada”. Assim, mais do que possibilitar fazer o uso com simples
construções de frases em inglês,

a língua inglesa tem tido como um dos objetivos


oportunizar ao aprendiz conhecer e apreender essa

Língua falada no sul da Índia. Língua nativa do professor Bala Kumaravadivelu (ver
15

página 67 do artigo referenciado neste trabalho).


POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 127

nova língua para fruição, informação, compreensão


de outros modos de vida, desenvolvendo com
criticidade sua visão sobre as desigualdades sociais
(de gênero, raça, classe, sexualidade, dentre outros)
(ALAGOAS, 2019, p. 416).

E, diante das lutas sociais de raça, gênero e sex(o)ualidade, a


LI assume um papel fundamental, pois tais questões estão presentes
no contexto de sala de aula, bem como no livro didático, a exemplo
a unidade “Go, girls!”, unidade 6 da coleção Bridges (PEREIRA [et
al.], 2018) do 9º ano – dentre outras obras.
Discutimos nesta parte do trabalho a questão decolonial
da LI, mostrando como esta pode ser importante para um diálogo
entre culturas, fazendo o/a aluno/a aprender sobre outros modos de
estar no mundo e divulgar e valorizar sua própria cultura e, por ser
língua(gem), nela estão imbricadas valores culturais e éticos. Também
analisamos no Referencial Curricular de Alagoas as orientações
para atender às demandas da BNCC valorizando o contexto local,
expondo a LI como a língua para alcançar níveis globais, assim
como oportunidade de crescimento profissional.
A formação inicial crítica envolve questionar as visões
ofertadas no Referencial e na BNCC. Diante destes e de outros
documentos, o/a professor/a deve fazer uma leitura crítica e reflexiva,
que seria “engajar-se em uma consideração ou pensamento cuidadoso,
resgatando e avaliando informações e envolvendo-se num processo
de crítica intelectual disciplinada, a qual faz uso de um julgamento
balanceado” (MINOTT, 2011, p. 76 apud ZACCHI, 2012, p. 6). Ser
crítico é sempre trabalhar vários lados do que é oferecido. Por fim,
mostramos que decolonial é ir de encontro a padrões excludentes
e, ou, hierarquias epistêmicas, e, no caso da LI, essa hierarquia é
mostrada como o falante nativo americano/britânico como detentor
da língua e de cultura dominante.
128 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

A seguir, apresentamos nossas considerações finais, não no


sentido de que a discussão se encerra aqui, neste capítulo, ou que
temos todas as respostas, pois, como este é um trabalho inserido na
Linguística Aplicada e como vemos esta como uma ciência social,
corroboramos com Santos ([1987]2018, p. 39), quando afirma que
“a ciência social será sempre uma ciência subjetiva”, não havendo
espaço para verdades cristalizadas/unas/mumificadas.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, propusemos reflexões sobre o ensino de


LI frente ao nosso contexto político-histórico atual, partindo da
formação inicial de professores e professoras até as políticas
públicas educacionais. Defendemos o ensino de LI não somente
como oportunidade para melhores condições de trabalho, mas como
opção decolonial, visto que aprender uma língua é abrir-se para o
diálogo e enxergar/respeitar novos/diferentes modos de ser/viver/
estar no mundo.
Atualmente, vimos observando diversas lutas sociais em
vários campos da sociedade. Nas redes sociais, por exemplo, são
constantes debates políticos em diversos grupos e páginas, o que
acabou facilitando a abordagem de temas outrora vistos como
tabus, nem sempre enfrentados sem esforço no face a face (MOITA
LOPES, 2010. p. 401), o que deu força a multidões marginalizadas16.
Silva (2019, p. 55) discute que a “escola tem sido historicamente
um espaço para a forma padrão heteronormativa no tocante a
questões de sexualidade, dando uma disciplinarização desta temática
exclusivamente da disciplina de Ciências no ensino fundamental”.
Chamamos multidões marginalizadas porque acreditamos que chamar negros, LGBT
16

e mulheres de minorias é confirmar sua posição inferior. Todavia, são multidões que,
através de um discurso neoliberal e patriarcal, ficam posicionadas como sendo inferiores
à heteronormatividade e ao padrão eurocêntrico/americano branco capitalista.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 129

Ou quando educação sexual se resume em métodos contraceptivos,


higiene pessoal, gravidez na adolescência. O contexto escolar (não
apenas a sala de aula) vai além, pois questões de gênero e sexualidade
estão nos corredores, nas pichações, no compartilhamento de
pornografias e na linguagem dos alunos e das alunas. Vemos a escola
como um espaço sexualizado, além de um campo onde, atualmente,
multidões marginalizadas estão, aos poucos, ganhando espaço,
fazendo com que professores/as e pesquisadores/as problematizem
a escola.
De acordo com os PCN (BRASIL, 1997, p. 2), “a escola
ensina o que é comportamento de menino e menina, organizando
o conteúdo curricular da forma padrão heteronormativa, o que não
reconhecem a diversidade de desejos e relações sexuais e afetivas”.
Além de uma onda de tradicionalismo que vem se instalando no
Brasil e que não permite tais abordagens por acreditar ser uma
“doutrinação” ideológica, feminista e gayzista17 que vai de encontro
aos valores religiosos e familiares.
Uma frente tradicional não quer que questões de gênero e
sexualidade, cultura afro e movimento feminista adentrem na escola,
nos impedindo de “notar que, no interior das atuais escolas, circulem
e se agrupem de formas distintas” (LOURO, [1997]2003, p. 60)
diferentes identidades, diferentes estudantes que buscam visibilidade
dentro da escola.
No primeiro tópico, discutimos a formação de professores/
as nas universidades e percebemos como esta, historicamente,
vem reproduzindo os conhecimentos de uma forma padrão

Alguns grupos creem que, se abordadas nas escolas as temáticas sobre gênero, sexualidade,
17

identidade de gênero e diversidade, estes grupos LGBT – historicamente massacrados pela


heteronormatividade – irão crescer e instaurar uma ditadura gayzista no Brasil, obrigando
crianças a também serem gays/lésbicas. Discussão em SANTOS FILHO, I. I. A guerra em
torno da identidade sexual. Observatório da imprensa. São Paulo, 14/07/2015 na edição
859. Disponível em: <http://observatoriodaimprensa.com.br/tv-em-questao/a-guerra-em-
torno-da-identidade-sexual/>. Último acesso em: 13 abr. 2020.
130 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

euro-americana. Levantamos o questionamento de como tais


conhecimentos se tornaram superiores aos conhecimentos do resto
do mundo, desqualificando todas as formas que não se encaixam nos
padrões impostos pelo capitalismo, colonialismo e o patriarcado, o
que Boaventura de Sousa Santos (SANTOS, 2018, p. 24) chama de
mecanismos de opressão. Em suma, levantamos possibilidades de
uma universidade decolonial, principalmente nos cursos de formação
de professores e professoras para o reconhecimento que proporcione
uma sintonia entre universidades, professores e professoras em
formação inicial e necessidades sociais, que seremos capazes de
minimizar as desigualdades sociais.
No segundo tópico, observamos o que há nas diretrizes legais
em se tratando de reconhecimento/valorização do contexto local. Em
seguida, dialogamos sobre a importância de se aprender inglês para
o/a aluno/a da escola regular, principalmente os/as de escola pública,
mostrando como essa língua, apesar de ter traços coloniais e de ser
historicamente uma língua de status social, também pode contribuir
para construção de um/uma cidadã(o) acolhedor/a e que desenvolva
a empatia por diferentes modos de ser/viver, além de valorizar nosso
contexto local para atingir níveis globais de conhecimento.
Por fim, enfatizamos aqui a importância de levar para sala de
aula questões referentes aos problemas sociais, onde a linguagem
assume papel central, seja homofobia, xenofobia, racismo, reflexões
sobre pobreza, bullying, machismo. A escola é um espaço plural, e
nessas abordagens há um quê de representatividade quando alunos
e alunas pertencentes a essas não mais minorias, mas multidões
marginalizadas, sentem naquela aula como sendo respeitados/as/
representados/as.
Os resultados das nossas discussões, aqui neste trabalho,
visaram lidar com a pergunta “que cidadãos queremos formar?”
ao entender a importância do debate em sala de aula sobre questões
sociais, fazendo com que nós, professores e professoras, tomemos
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 131

as problemáticas emergentes como um momento para reflexão sobre


nossas práticas, relacionando o processo de ensino-aprendizagem
com políticas educacionais e práticas sociais nas quais a língua(gem)
tem um papel central.

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CAPÍTULO 6
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO:
desafios contemporâneos
Elione Maria Nogueira Diógenes

Toda política pública é uma forma de regulação


ou intervenção na sociedade. (SILVA, 2001, p. 37)

1. INTRODUÇÃO

É consenso entre os estudiosos da área das políticas públicas


que estas surgiram no contexto do pós-Segunda Guerra Mundial
como resposta à séria crise social, econômica, política e cultural que
os países diretamente envolvidos nessa guerra estavam atravessando
(BALL, 2002; FORTINI, ESTEVES, DIAS, 2008; SILVA, 2001;
VIANA, 1988). Portanto, as políticas públicas só podem ser
compreendidas nesse contexto histórico. Como tais, são formas de
intervenção estatal para garantir o “bom funcionamento” do modo
de produção capitalista e na reprodução da força de trabalho através
de políticas sociais. Assim, são relações de poder hegemônicas e de
controle (DIÓGENES, 2014).
Em se tratando de Europa, as políticas públicas caracterizaram-
se como o “Estado do Bem-Estar Social”, baseado na teoria
138 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

econômica de John Maynard Keynes, na qual o Estado deve adotar


uma função reguladora da economia, no sentido de moderar e mediar
as diferentes forças sociais que dinamizam a economia capitalista.
Por outro lado, nos Estados Unidos da América, as políticas públicas
passaram, primeiro, pelo campo dominante da academia. Nisso,
nasceu como subárea da Ciência Política, enquanto disciplina
multidisciplinar, na primeira metade do século XX.
Consoante Bucci (2008, p. 251), as “políticas públicas são
arranjos institucionais complexos, expressos em estratégias ou
programas de ação governamental, que resultam de processos
juridicamente regulados, visando adequar meios e fins”. Isto é,
dinamizam programas, projetos e ações que são engendrados
em territórios institucionais e que deslocam-se para o interior da
sociedade civil.
Daí que as políticas públicas podem ser de Estado, quando
têm propósito de intervir na questão social enquanto problemática
que afeta grande parte da sociedade; portanto, têm longa duração.
Podem ser de governo, quando se limitam a servir a um determinado
período de gestão de um partido (seja de uma tendência de direita ou
não); certo é que os programas e os projetos formulados implantados
têm “durabilidade curta” e o selo do partido que está no poder.
Essa linha de análise leva a pensar a transposição das
políticas públicas para o Brasil e o modelo, aqui, adotado. Primeiro,
ao considerar que não tivemos experiência com o Estado do bem-
estar social, isto é, políticas públicas universais, desmarcou-se esta
opção. Então, o modelo de políticas públicas no Brasil adotado se
deu a partir do surgimento tardio dessas, ou seja, somente nos anos
1930, com o tardio capitalismo que se desenvolvia no país.
Sua consolidação foi visível no pós-redemocratização:
“quando os movimentos sociais passam a demandar políticas sociais
universalizadas como direito de cidadania” (SILVA, 2001, p. 46);
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 139

ainda: “crítica ao padrão de políticas sociais desenvolvidas na América


Latina” (SILVA, 2001, p. 46), em especial no Brasil pelo “mal uso do
dinheiro público e a desfocalização dos programas sociais em relação
à população que mais necessita” (SILVA, 2001, p. 46).
No subtópico a seguir, a temática aborda o tema na era das
gestões que assumiram a governabilidade no Brasil a partir de
meados de 1990 até 2016, isso porque as políticas de educação
implantadas assumiram um caráter em que priorizaram a educação
enquanto área estratégica de desenvolvimento econômico, de modo
que não houve alterações significativas entre essas, apesar do viés
ideológico dos partidos que assumiram o poder na Presidência da
República do Brasil.

2. POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO NA ERA FHC E


NO LULISMO

Nesta parte do texto, as políticas públicas de educação são


abrangidas a partir da era FHC e do lulismo, pois é possível afirmar
que, apesar dos inúmeros conflitos que vicejaram após Lula assumir
o posto da Presidência da República em substituição a FHC, não
houve muitas rupturas com o ideário econômico-social que permeava
a sociedade brasileira à época.
Lula, em verdade, afastou-se da radicalidade política que
sempre o norteou enquanto político e vestiu outro manto, do
consenso (VIZENTINI, 2005). Daí que adotada três dimensões:
diplomacia econômica, política da boa vizinhança e políticas
públicas de caráter social. Interessa para este capítulo a última, isto
é, as políticas públicas de educação, tendo em vista que Lula deu
continuidade às da era FHC e complementou com outras, porém,
a concepção, em si, não se modificou. Nos próximos tópicos,
abordamos melhor essas questões.
140 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

2.1 Políticas públicas de educação na era FHC

O governo de FHC (1995/2002) consolidou-se em meio


ao caos herdado de uma política econômica e social subalterna
aos interesses do capital transnacional. Na sua gestão, as políticas
públicas centrais implantadas na área educacional tiveram influência
da globalização e dos organismos multilaterais, como a Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco)
e da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
Em tal sentido, as políticas públicas de educação da
gestão FHC seguiram as orientações neoliberais advindas desses
organismos multilaterais, assim: conceitos como eficiência, eficácia
e produtividade articularam-se com o de qualidade, equiparando
os princípios da educação pública com os da iniciativa privada. As
concepções políticas e sociais estabelecidas pelo Estado nas últimas
décadas do século XX permeavam o ideário de serviço público com
o de competitividade (KRAWCZYK; CAMPOS; HADDAD, 2000).
Conforme o pensamento de Azevedo (2004), as políticas
públicas de educação implantadas na década de 1990 tencionavam,
por meio do incentivo à escolarização universal, expandir a economia
brasileira, melhorando sua estrutura de produção, tecnologia e
recrudescendo o mercado consumidor. Nessa perspectiva, as
reformas desenvolvidas previam a permanente qualificação da
mão de obra para o mercado de trabalho, bem como a técnica e a
profissionalização. Os programas e os projetos implantados nessa
época possuíam fortes vínculos com as diretrizes econômicas
definidas para os países pobres e subdesenvolvidos, como o Brasil
(SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007).
O processo de universalização e melhoria da qualidade
da educação acarretaria, de forma consequente, a redução das
desigualdades (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007). O
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 141

Brasil, país que manifestava altos índices de analfabetismo, implantou


programas de acesso à educação, de combate ao analfabetismo e de
melhoria da qualidade da educação. Com a promulgação do Plano
Decenal de Educação para Todos (1993-2003), o país pretendia
delinear um amplo mapa de melhoria da educação que impactaria
gerações. Segundo Shiroma, Moraes e Evangelista (2007, p. 52):
“[...] com esse plano, o Brasil traçava metas locais a partir do acordo
firmado em Jomtien e acenava aos 5 organismos multilaterais que o
projeto educacional por eles prescrito seria aqui implantado”.
Obediente à prescrição da Declaração de Jomtien, o Brasil
passou a dedicar maior interesse pelas políticas públicas da educação,
principalmente, com a qualidade educacional, visto que, por meio
das políticas públicas da educação, antevia-se o crescimento
econômico e social do país. Nessa perspectiva, a educação tornou-se
um elemento promotor do desenvolvimento econômico e humano.
Com isso, as ações propostas para a área da educação visavam
erradicar a repetência, a evasão e o analfabetismo (problemas antigos
da educação brasileira). As metas para as políticas públicas primaram
pela: 1) busca pela qualidade da educação básica pública; 2) equidade
frente ao ensino privado; 3) igualdade de condições e de formação
entre os variados extratos societários (CEPAL, 1996). As ações de
“[...] democratização da educação – expansão, equidade e integração
– vincula-se aos princípios de competitividade, desempenho e
descentralização” (KRAWCZYK; CAMPOS; HADDAD, 2000, p. 2).
Em tal conjuntura, as políticas públicas de educação
passaram a ter importância estratégica (SHIROMA; MORAES;
EVANGELISTA, 2007). Nesse cenário histórico, foi promulgada a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96 e a Lei nº 9.424,
que criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), instituído
pela Emenda Constitucional nº 14 e o Decreto nº 2.264, de junho
de 1997.
142 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

A padronização pelo mínimo de qualidade na educação era


a meta articulada à conjuntura política articulada e às questões
sociais, e, conforme Libâneo (2012, p. 19), um “[...] pacote restrito
e elementar de destrezas úteis para a sobrevivência e para as
necessidades imediatas e mais elementares das pessoas […]”. Nisto,
há uma contradição entre o discurso oficial e a realidade concreta,
tendo em vista que não há sociedade igualitária sem a garantia dos
direitos básicos da vida.
Em tal cenário, a qualidade e o acesso à educação eram a pauta
de governo. Seus princípios norteadores foram a descentralização
e a privatização (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003). FHC e sua
gestão podem ser caracterizados como neoliberais, com ênfase na
competitividade e na eficácia dos sistemas públicos de ensino.
As políticas públicas de educação sofreram diferentes
reformas, cujos fundamentos foram: qualidade, eficiência,
equidade, cidadania, produtividade e competitividade (FRIGOTTO;
CIAVATTA, 2003). O princípio da descentralização diz respeito
à mudança nas atribuições das diferentes instâncias das esferas de
governo, modificando o próprio processo de formulação das políticas
públicas de educação, tendo em vista a parceria entre o público e o
privado (VIEIRA, 2008).

Na era FHC, a prioridade centrou-se na


universalização do ensino fundamental, pois: [...]
como um dos setores estratégicos para dar suporte
ao sucesso do novo modelo de desenvolvimento,
destaca-se a necessidade de universalizar o
acesso à educação básica no intuito de atenuar
as consequências advindas da baixa qualificação
da mão de obra, sobretudo a elevação dos índices
de exclusão social e a baixa produtividade e
competitividade dos setores produtivos nacionais
(CASTRO; MENEZES, 2002, p. 89).
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 143

Como já registrado no texto, a parceria entre o público e o


privado consolidou-se, definitivamente, na gestão FHC: “[...] O
papel do MEC envolve também o setor privado e de que é preciso
buscar parcerias ‟com a área privada” (VIEIRA, 2008, p. 188. Grifos
da autora). Outras reformas da era FHC: 1) reordenamento dos
currículos, através dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)
e das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs); implantação do
Conselho Nacional de Educação (CNE); 3) criação do Sistema de
Avaliação da Educação Básica (Saeb); 4) implantação do Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem); 5) implantação do Exame
Nacional de Cursos (Provão); 6) criação do Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (Fundef), 7) Promulgação da Lei de Diretrizes e Bases
(LBD), nº 9.394/96.
Decerto, FHC, antes mesmo de assumir a Presidência
da República, tinha um projeto de Nação, tendo em vista que foi
ministro da Fazendo do ex-presidente Itamar Franco (1992-1994):
“um projeto claro em andamento, que começa a nascer antes mesmo
da posse” (VIEIRA, 2008, p. 199).

2.2 As políticas públicas no período do lulismo

A referência ao lulismo reconhece a hegemonia da liderança


de Lula à frente da governança junto à Presidência da República
no Brasil, mesmo quando a ex-presidenta Dilma foi eleita em
2010, sendo reeleita em 2014 e destituída em 2016 através de um
impeachment. Em um primeiro momento, o texto segue uma linha
de abordagem sobre o lulismo (compreendendo que a gestão de
Dilma é parte dela).
Lula, conhecido assim desde o movimento do Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, é ainda um dos grandes líderes da esquerda
144 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

brasileira em ação. É, hoje, indicado como o presidente que mais


se dedicou a implantar políticas públicas de educação favoráveis à
população vulnerável (MARQUES; MENDES, 2007). As políticas
públicas de educação no período lulista desenvolveram programas
através de parcerias com estados, municípios e as escolas públicas,
sem mediação, às vezes, dos estados ou municípios.
Assim, há um diferencial em relação à gestão de FHC. Há,
contudo, convergências e continuidade com a gestão anterior quando
se trata das parcerias público-privadas. Programas como Prouni,
Acelera Brasil e outros têm sido realizados com organizações não
governamentais (ONGs), setores privados de educação e organização
da sociedade civil de interesse público (Oscip). É de conhecimento
público que tal modelo de gestão de políticas públicas de educação
originaram-se na reforma do Estado na gestão de FHC.
Portanto, Lula e Dilma não mudaram, de modo substancial,
as políticas públicas de educação da era FHC. Em verdade,
praticamente todas as políticas da gestão anterior foram mantidas.
Houve um acrescimento, a saber: a criação do Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb), regulamentado pela Medida
Provisória nº 339, de 28/12/2006, posteriormente regulamento pela
Lei nº 11.494, de 20/6/2007. O Fundeb expandiu o financiamento
da educação básica para as três etapas, conforme estabelece e Lei
nº 9.394/96: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio,
cuja permanência previa 14 anos.
Um programa social que impactou na política pública de
educação foi o Bolsa Família, implantado através do decreto nº 5.209,
de 17 de setembro de 2004. Sendo uma política social, tem contribuído
para a permanência das crianças do ensino fundamental na escola, vez
que uma das condicionalidades do programa é a frequência na escola
por meio de uma declaração da direção; já existem estudos sobre isto
(RICO, 2009; CAVALCANTI, COSTA e SILVA, 2013).
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 145

A implantação do Plano de Ações Articuladas (PAR) também


foi importante por se tratar de um programa que articulou junto aos
municípios uma cultura de parceria para melhorar as condições de
trabalho das escolas, com isso, melhorando a qualidade do ensino. A
criação do Ideb, a partir do Decreto nº 6.094 de 24 de abril de 2007, e
do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação constituíram-
se em instrumentos importantes para regulamentação do regime de
colaboração entre a União, os estados e os municípios.
Contudo, as iniciativas, no que diz respeito às políticas
públicas de educação no lulismo, foram marcadas pela ambiguidade,
reproduzindo muitas ações da era FHC e “bradando” que é
antagônico. Bem, há que se pensar, de fato, quais as heranças
positivas do lulismo para as políticas públicas de educação. O que
dizer? Talvez, o protagonismo central do MEC como promotor de
políticas públicas de educação; criação do Fundeb; criação do Ideb e
ações paliativas de acesso às populações historicamente destituídas
do direito humano à educação.
No mais, o lulismo não avançou: ficou entre manter os
interesses da iniciativa privada na área educacional e recuperar o
protagonismo do Estado nas políticas de educação a favor das
classes sociais maceradas deste país. Lula terminou o mandato,
elegeu Dilma, que deu continuidade às suas diretrizes políticas em
2011. Não governou. No próximo subtópico, esta questão é mais
bem discutida.

2.3 Desconstrução das políticas de educação no cenário de mando


político da direita e da extrema-direita

Antes de iniciar a temática, é necessário refletir sobre o que é


extrema-direita. Como essa categoria se materializa social, política,
histórica, cultura, religiosa e de forma econômica em tempos
146 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

pretéritos e na contemporaneidade? E no Brasil, a extrema-direita


é fenômeno novo? Ou, só após o golpe de 2016, esse fenômeno
tornou-se mais evidente nos últimos anos? Já é certo que a extrema-
direita orgulha-se de assim ser, ostenta seus símbolos, figura sua
simbologia cristã, prega o segregacionismo, o ódio, a intolerância,
a desigualdade social, a violência contra grupos potencialmente
vulneráveis e são fortemente organizados.
O fato de a extrema-direita estar cada vez mais consolidada,
não apenas nos grupos sociais elitistas, mas nas classes sociais
vulnerabilizadas, classes médias e outros segmentos sociais, é sinal
de que a sociedade banalizou há muito tempo a miséria, a violência
em suas diferentes formas, e a apologia ao crime como forma
identitária de grande parte da população é uma forma de ser e de
estar no mundo. O atual presidente não é, em si, a extrema-direita,
ele representa o ideário e a possibilidade de materializar esse ideário
em ação programática necessária à supremacia de práticas racistas,
xenofóbicas, homofóbicas, sexistas e opressoras.
No Brasil, paraíso da extrema-direita, lutar pelos direitos das
classes sociais vulneráveis é um “carta de morte”, pois, devido à
própria formação sócio-histórica, cujas bases foram a colonização, o
escravagismo (mão de obra para a acumulação primitiva do capital),
o patriarcalismo, o filhotismo, o mandonismo/coronelismo e outras
formas de exploração; as elites não permitem qualquer forma de
organização social e política que não seja a da opressão. Essas nunca
permitiram à população brasileira o direito humano à educação
pública de qualidade.
No cenário contemporâneo, as políticas públicas de
educação, a partir de meados da década de 1990 até as décadas
iniciais do século XX, tornaram-se, de algum modo, prioridade por
conta do movimento transnacional da globalização. Infelizmente,
quando do golpe de 2016 e ascensão ao poder do presidente Jair
Messias Bolsonaro, representante da extrema-direita, as políticas
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 147

públicas de educação das gestões anteriores têm sido “tijolo a tijolo”


desconstruídas.
Para demonstrar que não havia quaisquer compromissos com
as agendas referentes às políticas públicas das gestões anteriores
(FHC, Lula e Dilma), o ministro da Educação Ricardo Vélez
Rodríguez, nomeado por Jair Bolsonaro, anunciou em seu discurso
de posse que era desfavorável ao ensino público e gratuito. As
sucessivas declarações “atacando” de forma iníqua os profissionais
da área da educação foram também uma marca registrada dessa
gestão, que foi substituída por outra, não menos desqualificada.
Voltando ao ex-ministro, uma das polêmicas refere-se à sua frase:
“que as universidades não seriam para todos, mas apenas para uma
‘elite intelectual’” (grifos do autor). Ou seja, a meritocracia de volta
à universidade pública e gratuita e a reprodução da miséria livre
para reinar. De tanto acumular “argumentos sem propósitos”, foi
exonerado, e assumiu o MEC Abraham Weintraub, em 30 de abril de
2019, cujo primeiro ato foi o corte de 30% dos recurso destinados à
Universidade de Brasília (UnB), à Universidade Federal Fluminense
(UFF) e à Universidade Federal da Bahia (UFBA).
O segundo ministro do MEC tem o estranho hábito de macular
a imagem das universidades públicas, justificando o corte das verbas
com um argumento de promoção de “balbúrdia” pelas instituições de
ensino superior e da utilização da verba pública “para fazer bagunça
e evento ridículo”18, e exemplifica: “sem-terra dentro do campus,
gente pelada dentro do campus” (isso sem qualquer tipo de prova).
Por meio do Decreto nº 9.741/2019, avançou com os cortes para
todas as universidades e institutos federais de educação. Os ataques
continuaram quando passou a fazer cortes na área de Humanas,
especialmente, Filosofia e Sociologia.

Disponível em: https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,mec-cortara-verba-de-


18

universidade-por-balburdia-e-ja-mira-unb-uff-e-ufba,70002809579. Acesso em: 24


abr. 2020.
148 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

A desconstrução das políticas públicas iniciava pelo corte do


financiamento às instituições de nível superior, responsáveis pela
formação de profissionais na área da graduação e pós-graduação no
Brasil. Mas, não ficou apenas nisso. O presidente Jair Bolsonaro, por
meio de decretos e projetos de leis na área da educação brasileira,
demonstra que tem uma agenda de desmonte da educação pública e
gratuita, no sentido de atender aos interesses da iniciativa privada.
No plano político, Bolsonaro está alinhado aos grupos sociais
conservadores, reacionários e de extrema-direita aliados do capital
estrangeiro, principalmente, norte-americano e o setor ruralista
empresarial. O presidente se mostrava servil à extrema-direita
conservadora e perversa. Portanto, as políticas públicas de educação
do MEC destacam: “[...] atitudes e habilidades socioprofissionais
múltiplas e flexíveis aliadas a competências técnicas e científicas
que deem conta dos aspectos mais gerais do conhecimento e da
atuação profissional e também dos mais específicos e mutáveis
(DIAS SOBRINHO, 2005, p. 116).
Isto é, as políticas públicas de educação são anuladas em
seu ciclo mais importante: financiamento. Se não existe orçamento
para concretização dessas, não há como materializá-las. O
ensino básico também sofreu um corte para realização de suas
ações fundamentais, no valor R$ 2,4 bilhões. Tais cortes levarão
o sistema público de ensino ao colapso. Além do mais, tais são
autocráticas e obscurantistas. De fato, o bolsonarismo tem como
política pública de educação o autocratismo, que se materializa no
anti-intelectualismo (STANLEY, 2018). Na obra Como o Fascismo
Funciona: as políticas do nós e eles (2018), Jason Stanley aponta
diversas ações que poderiam ser qualificadas como políticas
fascistas, isto é, estratégias que visam à consolidação de uma
narrativa que justifica a adoção de uma postura autoritária.
Uma dessas políticas consiste no anti-intelectualismo, ou seja,
na promoção de ataques a universidades e a sistemas educacionais
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 149

como um todo. A ideia é ridicularizar os professores, torná-los


pessoas desvalorizadas pela sociedade em geral, baixar mais ainda
seus parcos salários, combater a resistência crítica dos docentes. A
lei da mordaça é uma séria ameaça nesse contexto.
A repressão ao direito do docente de expor seu pensamento
quanto a esse ou àquele tema social, histórico, econômico, político,
religioso ou cultural, virou uma “pandemia punitiva”, pois alunos são
incentivados a gravar/filmar aulas com professores/as ministrando
os conteúdos, tornando esses profissionais inseguros e angustiados.
A agenda das políticas públicas de educação no governo
Bolsonaro pauta-se pela violência, pela intolerância, pela
incapacidade de buscar o diálogo. A liberdade de expressão só existe
para a extrema-direita, os outros grupos sociais silenciam. A ordem
é “doutrinar”, por isto, a descredibilidade das disciplinas e áreas de
estudo, questionadoras/reflexivas.
Paulo Freire é o intelectual brasileiro mais odiado por
Bolsonaro, que ameaçou retirar dele o título de Patrono da Educação
Brasileira. Para ele, Paulo Freire é um doutrinador-mor da esquerda e
do comunismo. Esses são os medos do bolsonarismo. O que ele quer?
Como ele mesmo afirmou: “queremos uma garotada que comece a
não se interessar por política”. Para Stanley (2018), desinteressar-se
pela política é uma forma de germinar líderes fascistas, visto que não
há mais quem possa confrontar narrativas diferentes.

3. CONCLUSÕES

As políticas públicas de educação pós-golpe de 2016, com


razão, sofreram profundas transformações a partir do fato de que
estão descredibilizadas, descontruídas e desmontadas. O que se põe
em seu lugar? Ações de um período obscuro da história do Brasil
(1964/1985) que são fragmentárias e que não sabemos, ainda, os
150 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

impactos – em termos de retrocesso – que possam vir acarretar à


sociedade em geral.
O que é certo afirmar: as políticas públicas de educação estão
esvaziadas porque não mais estamos em uma democracia real, e
sim em democracia aparente. Temos imprensa, temos instituições,
temos os três poderes funcionando “normalmente”. Todavia, o que
sabemos de fato? Uma junta militar está no Palácio do Planalto? E
os três filhos do Bolsonaro são o QG da presidência. Enquanto isso,
grupos da extrema-direita avançam sobre os setores vulnerabilizados
da sociedade. Há um silêncio. Como interpretá-lo?
As políticas públicas de educação em tempos de ruptura
democrática têm caráter antidemocrático. Os acontecimentos políticos
que ocorreram a partir do impeachment da ex-presidenta Dilma
provocaram uma crise profunda nas políticas públicas de educação
e a iniciativa privada aproveita-se desse momento para investir no
campo da educação escolar, que é vista como mercadoria e reduzida
ao papel de doutrinação. Isto é particularmente interessante, visto que
a classe dominante brasileira não aceita a inserção social igualitária
da população na economia, na cultura, socialmente, politicamente
e na educação. As elites no Brasil alimentam um ódio pelas classes
sociais baixas desde a escravização, posto que o interesse das elites
está na manutenção do status quo, de modo que, ascensão social é
discurso liberal, e, no Brasil, nada mais “conservador” do que um
liberal no poder.
Quando da redemocratização (1985) e da gestão democrática
nas escolas públicas (1996), a elite brasileira reacionária “engoliu”,
mas não digeriu. Portanto, o Movimento Escola Sem Partido,
mesmo sendo inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal,
encontra ressonância em camadas diversas da sociedade. Isto é
reacionário, mas está a serviço dos interesses dominantes porque
defende a neutralidade da educação em relação à política.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 151

Portanto, as gestões de FHC e o lulismo demarcaram um certo


“progresso” no âmbito das políticas públicas da educação no Brasil, mas
não o suficiente para consolidar essa tendência, pois veio o golpe contra
a Dilma e a extrema-direita entra “sem dó”, “sem piedade” e com uma
sede inexorável de “espoliar” o Estado, pois, em sendo o capitalismo
brasileiro predatório, tem pressa em transformar tudo em mercadoria.
O capitalismo, em si, já traz esse germe. No Brasil, ganhou
uma superpotência. No Manifesto do Partido Comunista, Marx e
Engels (1968, p. 25) apontam que a burguesia “afogou os fervores
sagrados do êxtase religioso [...] nas águas geladas do cálculo
egoísta” e “fez da dignidade pessoal um simples valor de troca”. Está
aí a contradição. O que levou Bolsonaro à presidência? A cultura do
ódio e da violência. E ele continua apostando nela como sustentáculo
para permanecer no mais alto posto da República. Daí a preocupação
com o pensamento crítico-reflexivo prescrito nas leis educacionais e
presente nos currículos escolares. O medo ao poder dos professores;
por isto os ataca e os humilha publicamente.
A cultura de perseguição aos professores em todos os níveis,
desqualificação e a desmoralização desses perante a sociedade.
Resumindo: essa é uma face das políticas públicas de educação do
governo de Bolsonaro. Portanto, o incentivo à violência estrutural
e os ataques às minorias sociais, étnicas e de gênero têm omitido
outro alvo preferencial da família Bolsonaro: os professores. Desde
2014, o clã bolsonarista apadrinhou os projetos de lei “Escola Sem
Partido” com o pretexto de combater uma pretensa doutrinação
marxista e a “ideologia de gênero” nas escolas. Ao abraçar essa
proposta, o clã Bolsonaro elegeu a categoria dos professores como
“bodes expiatórios” de todas as mazelas sociais no país.
A base das políticas públicas de educação no bolsonarismo é
o moralismo cristão. No campo econômico, é o ultraneoliberalismo,
que coloca a educação técnica a serviço do capital, isto é, os pobres
trabalham com o mínimo de qualificação para acumulação do capital
152 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

(em prol dos empresários). Além do mais, herdeiros dos empresários


(filhos das elites) devem ter acesso ao trabalho intelectual, que
implica em dirigir, controlar, organizar etc. Portanto, isto é a marca
das políticas públicas de educação, a dualidade estrutural.

REFERÊNCIAS

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externa (1995-2005). Civitas, Porto Alegre, v. 5 n. 2 jul.-dez. 2005. p.
381-397.
SOBRE OS/AS AUTORES/AS

Andréia da Silva Mafassioli


É doutora e mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), com especialização lato sensu em Educação
Especial e Processos Inclusivos pela UFRGS e especialização lato
sensu em Educação Psicomotora pela Faculdade Porto-Alegrense;
possui licenciatura em Pedagogia com habilitação em supervisão
escolar pela Faculdade Porto-Alegrense. É especialista em Educação
no sistema municipal de ensino de Gravataí (RS), onde exerce a
função de coordenadora pedagógica em escola de educação básica.
E-mail: andreiamafassioli@gmail.com

Elione Maria Nogueira Diógenes


É professora associada II da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).
Concluiu o doutorado em Políticas Públicas pela Universidade
156 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Federal do Maranhão (UFMA), onde também terminou o seu


Estágio Pós-Doutoral na mesma área. É professora permanente
do Programa de Pós-Graduação em Educação do Cedu/Ufal e
do Programa de Avaliação de Políticas Públicas da Universidade
Federal do Ceará (UFC). E é líder do Grupo de Pesquisa sobre
Estado, Políticas Sociais e Educação Brasileira (Gepe), certificado
pelo CNPq.
E-mail: elionend@uol.com.br

Izabella da Silva Vieira


É graduada em Pedagogia (2006), com especialização em Docência
do Ensino Superior (2007), possui mestrado em Educação
Brasileira (2011) e doutorado em Educação Brasileira (2017)
pelo PPGE/Cedu/Ufal, vinculada à Linha de Pesquisa Processos
Educativos. É membro do grupo de pesquisa Currículo, Atividade
Docente e Subjetividades. Dedica-se ao estudo/pesquisa nas
seguintes áreas: políticas educacionais de avaliação e currículo,
trabalho docente e subjetividades. Atualmente, é docente do
curso de Pedagogia do Centro Universitário Mário Pontes Jucá
(UMJ) e coordenadora pedagógica na Escola Estadual Dorgival
Gonçalves (AL).
E-mail: izabellas.vieira@gmail.com
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 157

Jonatha Rodrigues da Silva


É doutorando e mestre em Linguística pelo Programa de Pós-
Graduação em Linguística e Literatura da Faculdade de Letras da
Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Possui graduação em Letras/
Inglês pela Universidade Estadual de Alagoas (Uneal/Campus I) e
especialização em Metodologia do Ensino de Língua Inglesa pelo
Centro Universitário Barão de Mauá – Jardim Paulista. Desenvolve
pesquisas em Linguística Aplicada, Decolonialidade, Ensino de
Línguas, Letramento e Língua(gem), Gênero e Sexualidade. Tem
experiência na área de educação, com ênfase em ensino de Língua
Inglesa, Letramentos e abordagens de questões sociais nas aulas de
Inglês. É professor efetivo de Língua Inglesa da Secretaria Municipal
de Educação de Craíbas (Semed/Craíbas).
E-mail: jonathaletras@gmail.com

Joyce Rodrigues da Silva Magalhães


É graduada em Letras - Inglês e Suas Respectivas Literaturas pela
Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), especialista em Língua
Inglesa (lato sensu) pelo Centro de Ensino Superior Arcanjo Mikael de
Arapiraca (Cesama) e em Linguagens e Práticas Sociais pelo Instituto
Federal de Alagoas (Ifal) e doutoranda em Letras e Linguística pelo
158 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da Fale/Ufal.


Atualmente, é professora assistente do Curso de Letras-Inglês da
Universidade Estadual de Alagoas (Campi I e III) e coordenadora
de cursos de graduação na Pró-reitoria de Graduação da Uneal. Tem
experiência na formação de professores e ensino-aprendizagem de
línguas adicionais com ênfase no uso das TIC, letramentos digitais
e decolonialidade.
E-mail: joyce.magalhaes@uneal.edu.br

Karla de Oliveira Santos


É graduada em Pedagogia, especialista em Gestão Escolar, mestre em
Educação e doutora em Educação. Atualmente, é professora adjunta
da Universidade Estadual de Alagoas, Campus II, em Santana do
Ipanema, como também instrutora da Academia de Polícia Militar
Senador Arnon de Mello, da Polícia Militar de Alagoas. É membro
dos Grupos de Pesquisa: Infâncias, Bebês e Crianças (Uneal),
Currículo, Atividade Docente e Subjetividade (Ufal) e Educação,
Currículos e Diversidades (Ufal). Dedica-se ao estudo/pesquisa
nas seguintes áreas: Currículo, Avaliação Educacional, Diversidade
Cultural, Relações Étnico-raciais, Gestão Educacional, Políticas
Públicas e Infância. É representante docente no Conselho Superior
da Uneal.
E-mail: karla.oliveira@uneal.edu.br
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 159

Laura Cristina Vieira Pizzi


Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de
Uberlandia/MG (1988), mestrado em Educação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (1992) e doutorado em Educação:
Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1999).
Visiting scholar na School of Education da University of Berkeley
- Califórnia/EUA (2002) e pós-doutorado sênior no Dipartimento di
Scienze della Formazione e Psicologia da Università degli Studi di
Firenze/Itália (2014). Atualmente, é professora titular no Centro de
Educação da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), atuando no
mestrado e no doutorado. Coordena o grupo de pesquisa (CNPq)
Currículo, atividade docente e subjetividades, com foco nos temas
do currículo e do trabalho docente, nas seguintes problemáticas:
políticas curriculares, controle do trabalho docente, currículo e
subjetividades relacionadas ao gênero, à cidadania e à pobreza,
especialmente nos anos iniciais do ensino fundamental.
E-mail: lauracvpizzi@gmail.com

Maria das Graças Correia Gomes


É professora adjunta da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal)
e coordenadora do Curso de Licenciatura em Pedagogia do Campus
160 Elione Maria Nogueira Diógenes | Maria das Graças Correia Gomes | Wellyngton Chaves Monteiro da Silva
(Organizador/as)

Zumbi dos Palmares, da Uneal. É doutora em Educação pela


Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e líder do Grupo de
Pesquisa em Gestão, Avaliação e Políticas Públicas (GAPP), da Uneal.
E-mail: graca.gomes@uneal.edu.br

Nalú Farenzena
É doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS). É professora titular da UFRGS e professora
permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da
UFRGS. Integra o Núcleo de Estudos de Política e Gestão da
Educação da UFRGS e ocupa a presidência da Associação Nacional
de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca) pelo biênio
2019-2021. Atua na área da Educação, principalmente nos seguintes
temas: políticas públicas de educação básica, financiamento da
educação, análise e avaliação de políticas educacionais; legislação
da educação; administração da educação e gestão da educação.
E-mail: nalu.farenzena@ufrgs.br

Sérgio Ifa
É doutor em Linguística Aplicada (Lael/PUC-SP) e atua na graduação
e na pós-graduação (PPGLL) na Faculdade de Letras da Ufal.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: dilemas público e privado 161

Desenvolveu estudos pós-doutorais no DLM/USP (2015). É líder


do grupo de pesquisa Letramentos, Educação e Transculturalidade
(LET/Ufal). Está na coordenação do Projeto de Extensão Casas de
Cultura no Campus (CCC) e do Idiomas sem Fronteiras (ISF/MEC/
Sesu).
E-mail: sergio@fale.ufal.br

Wellyngton Chaves Monteiro da Silva


É professor assistente da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal)
e coordenador de Pós-graduação da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-
graduação (PROPEP) da Uneal. Faz doutorado em Educação pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É o segundo
líder do Grupo de Pesquisa em Gestão, Avaliação e Políticas Públicas
(GAPP) da Uneal, e membro do Núcleo de Estudos de Política e
Gestão da Educação da UFRGS.
E-mail: wellyngton.silva@uneal.edu.br
Formato: 155mm x 215mm
Tipologia: Times New Roman
Papel miolo: Pólen 70g/m²
Papel capa: Cartão Supremo 250g/m²
Impresso em 2020.

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