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PERSONAGENS: 5 (3 h e 2 m)
Cenário: Largo de aldeia. Ao fundo, à esquerda porta com letreiro “Hotel do André – Petiscos”. Junto à porta
uma mesa e várias cadeiras sob um chapéu de sol.
Ao subir o pano, vê-se a Baratinha à porta do hotel
Baratinha – Não se vê ninguém, mais um dia sem clientes. (avança até à boca do
palco e fala para o público) Minhas senhoras e meus senhores, cá na
terra chamam-me Baratinha, não porque eu tenha o cheiro do bicho, mas
porque me chamo Maria Barata. Já tive muitas ocupações, mas
presentemente sou recepcionista, cozinheira e ainda empregada de
limpeza aqui8 no Hotel do André. Aqui a Barata anda às moscas, pois o
patrão não tem clientes. Esteve aqui hospedada uma companhia de teatro
chamada Pinto, Leitão & Cia., mas o patrão pô-los na rua porque não
pagavam. E aqui estou eu nesta pasmaceira. Eu que nasci para andar
numa roda viva… por falar em roda, ontem comprei uma cautela. Ah! Se
apanho a sorte grande, então é que a Barata se vende cara!
Bem, enquanto a minha sorte não chega, vou à cozinha virar o lombo do
porco e em seguida descansar o meu.
Pinto entra da plateia, ridiculamente pensativo. Pára no meio da cena.
Pinto (teatral) – Comer ou não comer… Eis a Questão.
Ingrata humanidade. Quem diria que o distinto artista José Galo dos
Santos Pinto, que, além de outros predicados tem o de ser pinto e galo ao
mesmo tempo, não come há dois dias… (acena com a cabeça) Pois é
verdade, o desalmado André, o dono desta espelunca, suspende-nos o
farnel e o lençol também.
Tira um cordel do bolso Vou enforcar-me! É fino, mas é comprido. Amanhã saberão que eu morri
pela garganta. Pela garganta não, pela barriga é que morro, porque morro
de fome. Daqui a pouco morre o Pinto e dentro de sete dias poderão
assistir à missa do galo. A humanidade perde um génio e eu a vida.
Põe o cordel à volta do pescoço E a minha Violeta? Oh violeta, a corda me acorda o teu amor… Vou
guardar o cordel antes que o confunda com esparguete e me tente a
comê-lo. Hoje só cá está a Baratinha. Vou chamá-la e quando ela vier aqui
à procura de clientes eu vou pelos fundos, à cozinha ver o que há para dar
ao dente.
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PINTO, LEITÃO & CIA.
Bate na mesa e chama Oh da casa! Aí vem ela. E agora Baratinha dá passagem ao proscrito, que à
cozinha vai ver se há peixe frito.
Pinto vai para trás da casa e sai para EA quando Baratinha sai pela porta.
Baratinha – Temos lombo assado simples, lombo assado com batatas, batatas com
lombo guisado e… Não está cá ninguém! Julguei ouvir uma voz. Já sonho
com clientes! O melhor é voltar para a cozinha.
Baratinha sai para a porta do hotel. Entra Leitão vindo da plateia. Vem com roupa velha e remendada.
Leitão – Resolvi morrer, mas que ninguém chore a minha morte. Digo isto para que
poupem nos lenços. O mundo perde uma celebridade cómica… trágica,
lírica e coreográfica. Tudo porque o dono da casa resolveu pôr-nos na rua.
Quando chegares, André, encontrarás à tua porta, o cadáver da tua
vítima!
Tira uma faca velha sem bico Para pôr termo à vida arranjei esta faca. Foi a melhor que consegui
arranjar pelo preço; arranjei-a de graça. Eu sou muito económico, não
quero uma morte cara. A faca não tem ponta, mas é o mesmo. Nem
sempre a ponta aponta certeira ao coração.
Encosta a faca ao peito mas (voz esganiçada) Ah pai infame! Suspende o teu gesto. E a tua filha? A tua
Segura o braço com a outra mão filha Violeta? (voz normal) Deve ser a voz da consciência… Vou dar uma
volta para espairecer...
Sai para a DA. Aparece baratinha à porta do hotel.
Baratinha – Decididamente anda por aqui bicho. Ainda há pouco vim cá fora porque
pareceu-me ouvir um cliente e quando regressei à cozinha, o lombo
assado tinha desaparecido. Deve ter sido um gato. Deixa-me voltar antes
que desapareça também o guisado.
Entra Violeta da plateia. Vem com vestido muito colorido e chapéu com laçarotes. Sobe ao palco chama o
público como se fosse um pinto.
Violeta – Pitinho… pito… pitinho! (ao público) Não viram por aí o meu Pinto? O
Galo, o meu namorado? Ele tem um olho a menos mas vê perfeitamente
do outro. Vivemos os três, eu, meu pai e ele, na barraca em que damos
representações. Ele há pouco saiu da barraca como quem quer atentar
contra os seus dias. Tenho por ele um grande amor! Um não, dois: o amor
da arte e o da mulher.
Mas onde estará o meu Pinto? (ao público) Pito, pintinho, pitinho… Talvez
a Baratinha saiba. (volta-se para o hotel e chama) Olá! Ó da casa! Deve
estar na cozinha, vou pelos fundos (chama) Baratinha, Baratinha…
Vai a sair pela EA quando entra Lobo da plateia que a segue mas não sai. Aparece Baratinha à porta do
hotel
Baratinha – Temos lombo... (pára). Ninguém! Ora esta, pareceu-me ouvir chamar o
meu nome…
Lobo – Menina! Ó menina!
Baratinha (à parte) – Finalmente um cliente (alto) Temos lombo guisado com
batatas, o dito sem batatas, o dito assado e o dito com o dito…
Lobo – Está dito. Daqui a pouco ir-te-ei ao lombo!
Baratinha – O quê? Quer-me bater?
Lobo – Eu não... Vou-te ao lombo assado, mas mais daqui a bocado. Agora quero
uma informação…
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PINTO, LEITÃO & CIA.
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PINTO, LEITÃO & CIA.
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PINTO, LEITÃO & CIA.
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PINTO, LEITÃO & CIA.
Lobo – Nado num mar de desespero. Porque não me preveniste que eles eram
doidos?!
Baratinha – Doidos? Não são nada. Esfomeados sim.
Lobo – Pois se eles chamaram-me Ofélia e queriam que eu entrasse para um
convento e me fizesse freira…
Baratinha (ri com vontade) – Ah Ah Ah… Eles estiveram a representar.
Lobo – A representar?
Baratinha – Como a pequena está apaixonada pelo zarolho tive que lhe dizer que o
senhor era um empresário de teatro para que ela aceitasse conversar
consigo.
Lobo – Então eles são actores? Tive uma ideia… Se os levar para Lisboa, talvez os
possa impingir como celebridades. (chama-os alto) Meus caros artistas!...
Mas será que não param de comer? Ou me ouvem ou perdem o contrato.
Os três param e ficam a olhar para Lobo
Lobo – os senhores são artistas dramáticos, não é assim?
Pinto – Pinto
Leitão – Leitão
Violeta – & Companhia… Já lhe mostrámos as nossas habilidades.
Lobo – Pois bem, se chegarmos a acordo, contrato-os a todos. Vamos para Lisboa e
lá tentarei arranjar o resto da companhia.
Baratinha – Não se esqueça de mim. Já trabalhei no teatro e tenho muito jeito.
Lobo – Não, não. Tu serás a minha secretária particular. Para já podes tomar nota
do que aqui se passou e que será assunto para uma comédia.
Baratinha – E que nome vai dar à peça?
Lobo – Pinto, leitão & Cia.
Pinto – Baratinha, vai buscar uma caixinha para levarmos o resto do almoço.
Aponta para a plateia Baratinha – Já vou, mas antes deixem-me despedir destes senhores.
Pinto – Alto lá! Isso compete-me a mim que sou o actor principal
Adeus! Adeus!
Não chorem não!
Que brevemente
Temos outra actuação!
FIM