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A VERDADE SOBRE OS LABORATÓRIOS FARMACÊUTICOS

MARCIA ANGELL

“Todos os dias, os americanos são expostos a uma sucessão interminável de publicidade da


indústria farmacêutica. Associada a recomendações de algum medicamento específico – que
geralmente mostra pessoas de bela aparência divertindo-se ao ar livre –, vem uma mensagem mais
abrangente. Reduzida à sua essência, ela diz o seguinte: ‘é verdade, os remédios são caros mesmo,
mas isso só mostra como são valiosos. Além disso, nossos curtos de pesquisa e desenvolvimento
são enormes, e precisamos cobri-los de algum modo. Como empresas ‘dependentes da pesquisa’,
produzimos um fluxo ininterrupto de medicamentos inovadores que prolongam a vida, melhoram
sua qualidade e vitam cuidados médicos mais caros”. (ANGELL, 2010, p. 09).

“E alguma parte disso tudo é verdade? Bem, sem dúvida a primeira parte é. Os custos dos
medicamentos de fato são altos – e continuam a subir com rapidez. Atualmente, os americanos
gastam o assombroso total de US$ 200 bilhões por ano em medicamentos vendidso sob prescrição
médica, e esse valor está crescendo a uma taxa de 12% ao ano (uma redução em relação à taxa
máxima de crescimento, de 18%, em 1999)”. (ANGELL, 2010, p. 10).

“O aumento no gasto com remédios reflete, em partes quase iguais, o fato de que as pessoas estão
tomando muito mais medicamentos do que antes, de que é mais provável que esses medicamentos
sejam drogas recentes, em vez das mais velhas e mais baratas”. (ANGELL, 2010, p. 10).

“Pagar por medicamentos vendidos sob prescrição médica já não é problema exclusivo dos pobres.
À medida que a economia continua em dificuldades, o seguro-saúde está encolhendo.
Empregadores passam a exigir que seus empregados paguem do próprio bolso uma parte maior dos
custos; e muitas empresas estão desistindo de vez de oferecer benefícios referentes à saúde”.
(ANGELL, 2010, p. 11)

“Eles deixam de comprar medicamentos para poder pagar as despesas de calefação ou alimentação.
Alguns tentam “esticar” a medicação, tomando-a com frequência menor do que a prescrita, ou
divindo-a com um cônjuge. Outros, envergonhados demais para admitir que não têm condições de
comprar a medicação, deixam o consultório médico levando consigo a prescrição, mas não
adquirem os medicamentos. Além de esses pacientes ficarem sem o tratamento necessários, seus
médicos podem chegar à conclusão equivocada de que a medicação prescrita não fez efeito e
prescrever ainda outros medicamentos, agravando, desse modo, a situação”. (ANGELL, 2010, p.
11)

Você já deixou de comprar algo porque deveria comprar o medicamento? Você já dividiu o
medicamento com alguém, para render mais? Quando o médico fez a prescrição, ele já acrescentou
ou pediu para trocar o medicamento?

“Naquela época, em geral, os idosos conseguiram comprar com seu próprio dinheiro qualquer
medicação de que precisassem”. (ANGELL, 2010, p. 12)

“Em 2001, quase um em cada quatro idosos relatou ter saltado doses ou deixado de adquirir
medicamentos prescritos por causa do custo”. (ANGELL, 2010, p. 12)

Você toma corretamente os medicamentos? Qual a prescrição feita pelo médico? Já suspendeu o
medicamento alguma época?

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“[…] Os preços são muito altos exatamente para quem mais precisa dos medicamentos e tem menos
condições de adquiri-los”. (ANGELL, 2010, p. 12)

“Em primeiro lugar, Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) é uma parte relativamente pequena dos
orçamentos das grandes empresas do setor farmacêutico – um valor ínfimo em comparação com
suas despesas com marketing e administração, e menor até mesmo que seus lucros”. (ANGELL,
2010, p. 13)

“Em 2003, pela primeira vez, ela perdeu o primeiro lugar, caindo para terceiro, atrás somente da
‘mineração, produção de petróleo bruto’ e dos bancos comerciais”. (ANGELL, 2010, p. 13)

Medicamentos Novos?
“A grande maioria de medicamentos ‘novos’ não é ‘nova’, de modo algum, mas apenas variações de
drogas anteriores já à venda no mercado”. (ANGELL, 2010, p. 14)

“Se eu sou um fabricante e posso mudar uma molécula para conseguir, com isso, mais vinte anos de
direitos de patente, e se eu conseguir convencer os médicos a prescrever e os consumidores a exigir
a próxima forma de Prisolec ou o Prozac semanal, em vez do Prozac diário, tudo isso no exato
momento em que minha patente está vencendo, por que eu haveria de gastar dinheiro numa
iniciativa muito menos garantida, que é a pesquisa por medicamentos totalmente novos”.
(ANGELL, 2010, p. 14)

“Este livro revelará a verdadeira face da indústria farmacêutica – uma indústria que, ao longo das
daus últimas décadas, afastou-se enormente do seu nobre propósito original de descobrir e produzir
novos medicamentos úteis. Agora, tendo-se tornado essencialmente uma máquina de marketing para
vender medicamentos de benefício duvidoso, essa indústria usa sua fortuna e seu poder para cooptar
cada instituição que possa se interpor em seu caminho, aí incluídos o Congresso americano, a Food
and Drug Administration, os centros médicos acadêmicos e a própria profissão médica”. (ANGELL,
2010, p. 16)

“Vi laboratórios começarem a exercer um nível de controle sobre o modo de conduzir pesquisas que
era inexistente quando iniciei meu trabalho na revista. E o objetivo nítido era o de viciar os dados
para garantir que seus medicamentos apresentassem bom desempenho”. (ANGELL, 2010, p. 16)

“Às vezes, os laboratórios farmacêuticos simplesmente não permitem que os resultados sejam
publicados, quando não são favoráveis aos medicamentos que produzem”. (ANGELL, 2010, p. 17)

Preços Intoleráveis
“Além disso, o público está se tornando cada vez mais cético com relação às suas alegações
exageradas, e os consumidores de medicamentos estão começando a se queixar abertamente dos
preços intoleráveis”. (ANGELL, 2010, p. 17)

Marketing
“Mesmo assim, em vez de investir mais em drogas inovadoras e na moderação dos preços, as
empresas farmacêuticas estão despejando dinheiro em marketing, em manobras jurídicas para
prorrogar direitos e patentes e em lobby, para impedir que o governo adote qualquer forma de
regulação de preços”. (ANGELL, 2010, p. 17)

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“Se os medicamentos vendidos sob prescrição médica fossem como qualquer bem de consumo
comum, tudo isso talvez não tivesse tanta importância. Mas os medicamentos são diferentes. As
pessoas dependem deles para manter a saúde e até mesmo a vida”. (ANGELL, 2010, p. 17)

“Ao contrário do que dizem os serviços de relações públicas da indústria, o consumidor não paga
exatamente pelo que recebe. O fato é que essa indústria está nos passando a perna, e não haverá
nenhuma reforma de verdade sem um público alerta e determinado a fazer com que ela aconteça”.
(ANGELL, 2010, p. 18)

“De 1960 a 1980, as vendas de medicamentos vendidos sob prescrição médica eram bastante
estacionárias como percentual do produto interno bruto dos EUA; mas, entre 1980 e 2000, elas
triplicaram”. (ANGELL, 2010, p. 19)

“Essas leis significam que os laboratórios farmacêuticos já não precisam depender de sua própria
pesquisa para novos medicamentos; e poucos dos maiores ainda o fazem”. (ANGELL, 2010, p. 23)

“Ainda pior é o fato de existirem pouquíssimos medicamentos em processo de criação prontos para
assumir o lugar dos campeões de vendas que perdem a patente. Na realidade, esse é o maior
problema enfrentado atualmente pelo setor, e seu segredo mais bem guardado. Todos os esforços de
relações públicas sobre inovação destinam-se a encobrir exatamente esse fato. A corrente de novos
medicamentos reduziu-se a um fio, e poucos deles são inovadores em qualquer sentido do termo.
Pelo contrário, a grande maioria é de variações de medicamentos velhos, porém eficazes – as drogas
de imitação”. (ANGELL, 2010, p. 32)

“Dos 78 medicamentos aprovados pela FDA em 2002, somente 17 continham novos princípios
ativos, e apenas sete deles foram classificados pela FDA como aperfeiçaomentos em relação a
medicamentos mais antigos. Os outros 71 medicamentos aprovados naquele ano eram variantes de
medicamentos antigos ou não foram considerados superiores aos medicamentos já à venda”.
(ANGELL, 2010, p. 32)

“A maioria dos medicamentos aprovados que entram em comercialização não é de fato nova ou foi
adquirida de terceiros, ou as duas coisas. Meu palpite é que o custo real por medicamento esteja
bem abaixo de US$ 100 milhões. Se estivesse em qualquer ponto nas proximidades dos US$ 802
milhões alegados, o setor não cercaria os dados com tanto sigilo”. (ANGELL, 2010, p. 62)

“Um recente estudo publicado na revista Health Affairs informa que em 1998 somente cerca de
15% dos artigos científicos citados em solicitações de patentes para medicamentos clínicos eram
originários de pesquisa realizada pela indústria, enquanto 54% vinham de centros acadêmicos, 13%
do governo e os demais, de várias outras instituições públicas e sem fins lucrativos”. (ANGELL,
2010, p. 81)

“Estamos acostumados a ouvir falar de paciente com AIDS no Terceiro Mundo privados de um
tratamento que pode salvar vidas, mas agora isso pode estar acontecendo nos Estados Unidos. Os
preços altos têm consequências reais, às vezes fatais”. (ANGELL, 2010, p. 85)

“Esse disfarce torna-se possível em razão de um ponto vulnerável de importância crucial na lei – os
laboratórios farmacêuticos somente precisam demonstrar à FDA que os medicamentos novos são
“eficazes”. Eles não precisam mostrar que esses medicamentos são mais eficazes que (nem mesmo
tão eficazes quanto) o que já está sendo usado para aquela mesma condição. Só precisam mostrar
que são melhores do que nada. E é exatamente isso o que os laboratórios estão fazendo. Em ensaios

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clínicos, comparam suas novas drogas com placebos (pílulas de açúcar) em vez de compará-las com
o melhor tratamento disponível”. (ANGELL, 2010, p. 92)

“O Prozac perdeu sua patente protegida em agosto de 2001, e agora é vendido como um genérico
fluoxetina por cerca de 80% menos do valor que costumava custar”. (ANGELL, 2010, p. 99)

“Por este motivo, os medicamentos de imitação geralmente tratam de condições comuns, que duram
a vida inteira – tais como artitre, depressão, pressão alta ou colesterol elevado. As condições não tão
tão graves a ponto de apresentarem uma letalidade iminente, mas também não desaparecem. Às
vezes são pouco mais que inconvenientes, como, por exemplo, a febre do feno. Consequentemente,
grandes quantidades de pessoas podem tomar o medicamento durante anos, gerando um volume
enorme e constante de vendas”. (ANGELL, 2010, p. 100)

“Doenças letais matam os clientes. Portanto, os medicamentos para tratá-las também não costumam
ser campeões de vendas”. (ANGELL, 2010, p. 101)

“Não adianta nada para o faturamento produzir medicamentos para clientes não-pagantes. É por isso
que a indústria farmacêutica tem um desinteresse extremo por desenvolver medicamentos para
tratar doenças tropicais, como a malária, a doença do sono ou a esquistossomose (uma doença
extremamente comum no Terceiro Mundo, causada por vermes parasíticos). Embora sejam muito
disseminadas, essas doenças não são importantes para a indústria, já que as pessoas acometidas por
elas estão em países pobres demais para poderem comprar medicamentos”. (ANGELL, 2010, p.
101)

“É impressionante o contraste com a abundância de medicamentos para reduzir o colesterol, tratar


transtornos emocionais, febre do feno ou azia”. (ANGELL, 2010, p. 101)

“Da mesma forma, o limite para o colesterol elevado foi reduzido ao longo dos anos. Houve uma
época em que era reservado para níveis de colesterol acima de 280 miligramas por decilitro. Depois,
foi reduzido para 240, e agora a maioria dos médicos tenta reduzir o colesterol para abaixo de 200.
assim como no caso da pré-hipertensão, muitos médicos recomendarão dieta e exercício para atingir
esse nível, mas as pessoas acham muito difícil colocar essa recomendação em prática, e o passo
seguinte é procurar uma estatina”. (ANGELL, 2010, p. 102)

“Foram-se os tempos em que os laboratórios farmacêuticos anunciavam medicamentos para tratar


doenças. Agora frequentemente é o inverso. Eles anunciam doenças para encaixar seus
medicamentos. Quase todo mundo tem azia de vez em quando. O remédio costumava ser um copo
de leite ou um antiácido de venda livre, para aliviar os sintomas. Mas agora a azia passou a se
chamar ‘doença do refluxo ácido’ ou ‘doença do refluxo gastresofágico’ […] e a ser anunciada,
juntamente com o medicamento para tratá-la, como um prenúncio de uma grave doença do esófago
– o uque normalmente não é o caso”. (ANGELL, 2010, p. 102/103)

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