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Curso EaD Tratamento da Dependência Química no contexto Hospitalar

(Hospital Geral e Hospital Psiquiátrico) e das Clínicas Especializadas


GOVERNO FEDERAL REPRESENTANTE-RESIDENTE ASSISTENTE E
COORDENADORA DA ÁREA PROGRAMÁTICA Apresentação Geral
PRESIDENTE DA REPÚBLICA Maristela Baioni
Jair Messias Bolsonaro COORDENADORA DA UNIDADE DE PAZ
VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA E GOVERNANÇA Olá!
Antônio Hamilton Martins Mourão Moema Freire Bem-vindos ao curso de Tratamento da Dependência Química no contexto Hospitalar (Hospital
GERENTE DE PROJETO
Geral e Hospital Psiquiátrico) e das Clínicas Especializadas.
MINISTRO DE ESTADO DA CIDADANIA
Ronaldo Vieira Bento Rosana Tomazini
A Dependência Química é considerada uma doença multifatorial, crônica e recidivante,
ASSISTENTE DE PROJETO caracterizada pelo uso compulsivo da substância em questão, apesar das consequências
SECRETÁRIO NACIONAL DE CUIDADOS
Aline Santana
E PREVENÇÃO ÀS DROGAS negativas - mas é também, reconhecidamente, tratável.
Quirino Cordeiro Junior
DIRETORA DE PREVENÇÃO, EQUIPE PROJETO EDITAL Nº 02/2021 A complexidade desse transtorno requer, em seu tratamento, estratégias igualmente
CUIDADOS E REINSERÇÃO SOCIAL PRESIDENTE - CEPP complexas. A evolução da ciência da dependência química nas últimas décadas revolucionou
Cláudia Gonçalves Leite Thiago Marques Fidalgo nossa compreensão sobre esse fenômeno, trazendo consigo respostas mais efetivas.
COORDENADORA-GERAL FORMAÇÃO VICE-PRESIDENTE - CEPP
Elis Viviane Hoffmann Andrea de Abreu Feijó de Mello O profissional que atua na área da dependência química se depara com constantes desafios
que permeiam os espectros psicológicos, sociais e biológicos, tornando assim, fundamental
COORDENADOR GERAL DO PROJETO que possua no seu arcabouço teórico conhecimentos sólidos em todas essas dimensões que
Cláudio Jerônimo da Silva
compõem a etiologia da dependência química e através das quais ela se manifesta. Em uma
PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS COORDENADORA PEDAGÓGICA DO PROJETO doença em que a recidiva é a regra, não a exceção, cabe ao profissional atuante se aprimorar
PARA O DESENVOLVIMENTO Clarice Sandi Madruga e instrumentalizar de forma constante.
(PNUD)
CONTEUDISTAS ESPECIALISTAS
REPRESENTANTE-RESIDENTE Ana Paula Dias Pereira Reunimos aqui um time único e altamente qualificado de profissionais que atuam nas
Katyna Argueta André de Queiroz Constantino Miguel áreas da clínica psiquiátrica, psicológica, da pesquisa e do ensino, trazendo para você
Leonardo Gomes Moreira uma oportunidade de consolidar e atualizar seus conhecimentos sobre tratamento da
REPRESENTANTE-RESIDENTE ADJUNTO
Maria de Fátima Padim dependência química.
Carlos Arboleda
Ronaldo Ramos Laranjeira
Sérgio Marsiglia Duailibi
Esperamos que o curso proporcione não só o aperfeiçoamento de técnicas e protocolos
Susana Mesquita Barbosa
de atuação para cada modalidade de serviço e profissional atuante, mas também propiciar
Todo o conteúdo do Curso Tratamento da Dependência Química no contexto Hospitalar (Hospital Geral e Hospital Psiquiátrico) e das Clínicas Especializadas, da Secretaria
reflexões e críticas, muitas vezes fundamentais para o estabelecimento de práticas mais
Nacional de `Políticas sobre Drogas, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, da Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas, do Ministério do Estado e da
Cidadania do Governo Federal 2022 e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, da Organização das Nações Unidas, está licenciado sob a Licença Pública
efetivas no processo da recuperação.
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nd/4.0/deed.pt_BR

Bons estudos.
BY NC NO
Coordenação do Curso
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MÓDULO 6
Abordagens de tratamento baseadas em evidência
Nesse módulo iremos apresentar as principais abordagens utilizadas no tratamento
da dependência química, focando especialmente naquelas que tem um corpo robusto
de evidência de eficácia.

As técnicas psicoterápicas serão apresentadas de forma simples e prática, visando


sua implementação na rotina de trabalho de diferentes modalidades de serviços que
atuam com a dependência química.

Também discutiremos sobre a avaliação inicial e o processo de triagem de pacientes


com dependência química, bem como traremos o embasamento teórico e prático para
a elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA).

Por fim, abordaremos a importância da elaboração do PIA no tratamento da dependência


química, com o intuito de que os profissionais passem a introduzir essas práticas em
seu serviço e perceber os ganhos na evolução do tratamento, bem como oferecer
oportunidades e aprimoramento entre profissionais que já utilizam essa ferramenta na sua
Autoria prática clínica.
André Queiroz Constantino Miguel
Clarice Sandi Madruga
Kátia Isicawa de Sousa Barreto
Rogério Adriano Bosso
Bons estudos!
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OBJETIVOS DO MÓDULO sumário

SUMÁRIO
UNIDADE 1 – AS ABORDAGENS PSICOSSOCIAIS COM EVIDÊNCIA DE EFICÁCIA E MELHORES PRÁTICAS.............05
Evidências de Eficácia e Efetividade na Prática Clínica
Estudos sobre a Eficácia de Abordagens Psicossociais
Melhores Práticas no Tratamento Psicossocial da Dependência Química 1. Estabelecer os critérios
Intervenção Breve
Entrevista Motivacional utilizados para a determinação
Modelo Transteórico para Motivação de evidência de eficácia das
Terapia Cognitivo-Comportamental
Atuação abordagens psicossociais.
Prevenção de Recaída
Manejo de Contingências
Aplicação Prática do Manejo de Contingências 2. Descrever as cinco
abordagens psicossociais
UNIDADE 2: TRIAGEM, AVALIAÇÃO E PROJETO TERAPÊUTICO.................................................................................29 com evidência de eficácia no
Triagem e avaliação inicial
Projeto Terapêutico tratamento da dependência
Plano Individual de Atendimento química: Intervenção Breve,
Plano Individual de Atendimento
a Entrevista Motivacional,
UNIDADE 3: O TRATAMENTO PSICOSSOCIAL NO CONTEXTO DOS HOSPITAIS E CLÍNICAS ESPECIALIZADAS.......38 a Terapia Cognitivo
Comportamental, o Manejo
ENCERRAMENTO DO MÓDULO.....................................................................................................................................40 de Contingência e a
Prevenção à Recaída.
REFERÊNCIAS...............................................................................................................................................................41

3. Discorrer sobre triagem


e avaliação inicial de
dependentes químicos.

4. Apresentar elementos
importantes na elaboração
do Plano Individual de
Atendimento (PIA).

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sumário
sumário

UNIDADE 1
AS ABORDAGENS PSICOSSOCIAIS COM EVIDÊNCIA DE EFICÁCIA E MELHORES PRÁTICAS

Evidências de eficácia e efetividade O que são indicadores?


Indicadores de saúde são parâmetros utilizados
na Prática Clínica internacionalmente com o objetivo de avaliar e fornecer
subsídios aos planejamentos de saúde. São medidas que
Em módulos anteriores, já discutimos sobre a determinação
servem para descrever determinado fenômeno ou problema,
de eficácia e efetividade na ciência da saúde. Porém, resta
permitindo comparações, detecção de mudanças ou
indagar quais são as particularidades desses critérios
tendências. Este conhecimento permite a avaliação da
quando consideramos os resultados de estudos sobre
execução das ações durante um período.
a eficácia de intervenções específicas utilizadas no
tratamento da dependência química?
É importante saber que o uso de um único indicador
Antes de tudo é necessário definir quais serão os isoladamente não possibilita o conhecimento da
indicadores de performance ou sucesso comumente complexidade de um evento, mas a associação de vários
utilizados para a avaliação de abordagens psicossociais indicadores e suas comparações permitem a compreensão
em dependência química. de fenômenos complexos, como a Dependência Química (DQ).

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Para que servem os indicadores?


• Oportunidade para alinhar concepções
• Apresentam informaçõs sintéticas >> GRANDE poder
de comunicação
• Documentam a qualidade da Assitência - prestação
de serviços
• Documentam a melhora dos indivíduos (quantitativos)
• Permitem o estabelecimento de prioridades
• Demonstração da confiabilidade e transparência dos
serviços prestados frente à sociedade
• Permitem o aperfeiçoamento dos serviços prestados

Alguns dos indicadores comumente utilizados na avaliação


da eficácia ou efetividade de intervenções terapêuticas
para dependência química são:

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Estudos sobre a eficácia de


abordagens psicossociais
O julgamento de estudos que demonstram resultados sobre
abordagens psicossociais deve ser baseado em parâmetros
relacionados aos critérios para a pressuposição de
causalidade. Só é possível pressupor que uma intervenção
“causou” a redução do consumo, ou a diminuição do número
de recaídas, se tais critérios forem demonstrados através
de evidências suficientemente significativas.

É muito comum que intervenções sejam largamente aceitas


e aplicadas sem que tais critérios sejam estabelecidos.
Muitas vezes as estatísticas que mostram os baixos
índices de sucesso no tratamento da dependência
química se dão em decorrência do uso de abordagens
com pouca (ou nenhuma) evidência de eficácia. Por outro
lado, intervenções que ao serem testadas preenchem tais
critérios tem alta chance de sucesso.

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SAIBA MAIS do Serviço Social diminuíram a probabilidade de abandono,


e os pacientes que foram atendidos por um profissional de
Evidências sobre Adesão e Tempo de Tratamento Psicologia também diminuíram a probabilidade de abandono.
Estudos conduzidos por Fernandes et al. (2017) mostraram
que pacientes em tratamento para transtornos mentais
com Transtornos por Uso de Substâncias possuem chances
aumentadas de abandonar o tratamento. A autora apontou Melhores práticas no tratamento
também que o tempo de tratamento se torna um pré- psicossocial da dependência química
requisito para o seu sucesso da recuperação, bem como
existe uma correlação entre a ocorrência de intervenções São inúmeras as abordagens de intervenções terapêuticas
positivas e a duração do tratamento. A autora também para o tratamento da dependência química. Vimos nos
ressalta sobre a importância da análise dos fatores que últimos anos, uma evolução e expansão significativas no
possam estar relacionados diretamente à adesão ou à não desenvolvimento de tratamentos psicossociais baseados
adesão do paciente no processo de tratamento. em evidências para abuso e dependência de substâncias.
Tratando-se de uma doença multifatorial, os usuários
De acordo com Fernandes et al. (2017), o risco de abandonar problemáticos de drogas e álcool relatam problemas em
o tratamento diminui nos primeiros meses e que a várias áreas, incluindo problemas de saúde, psicológicos e
probabilidade de abandono de pacientes com apenas um sociais, requerendo abordagens e estratégias terapêuticas
mês de tratamento é cinco vezes maior; a mesma diferença que incorporem essas diferentes demandas que vão muito
se dá entre um paciente recém-chegado e aquele com um além das relacionadas à saúde.
mês de tratamento. O estudo, ainda, mostrou que pacientes
que foram atendidos pelo menos uma vez pelo profissional O desenvolvimento e padronização de tratamentos

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psicossociais baseados em evidência tem progredido tanto SAIBA MAIS


no mundo como no Brasil, e os tratamentos psicossociais
são considerados componentes essenciais para qualquer
Abordagens psicossociais sugeridas pelo NIDA (National
programa abrangente de tratamento de transtornos por
Institute on Drug Abuse) do Instituto Nacional de Saúde
uso de substâncias atualmente.
Americano, para cada substância de abuso, incluindo a
população com melhores resultados e graus de evidência
As intervenções psicossociais para o tratamento de
científica.
problemas de álcool e drogas abrangem uma ampla gama
de intervenções de tratamento, que têm origens teóricas
variadas. Essas intervenções visam provocar mudanças
nos comportamentos de uso de drogas do paciente, bem
como outros fatores, como cognição e emoção, usando a Tratamento psicossociais sugeridos pelo NIDA
interação entre terapeuta e paciente. Grau de
Tratamento Substâncias Populaçõse
evidência

Terapia cognitiva Álcool, maconha, cocaína,


Traremos aqui as abordagens que demonstram maiores comportamental metanfetamina e tabaco
Adultos, adolescentes Nível 3

graus de evidência e são amplamente recomendadas pelos Manejo de contigências


Álcool, maconha,
cocaína, crack, heroína,
Adultos, adoslescentes, mulheres
grávidas, moradores de rua,
Nível 3
pessoas com comorbidades
principais órgãos de referência no Brasil e no Mundo. metanfetamina e tabaco
psiquiátricas graves, LGBT

Em outros módulos abordamos as diretrizes propostas pelos Tratamento por reforçamento


comunitário associado a Álcool, cocaína, apióides
Adulto, adolescentes, moradores
Nível 2
de rua
principais órgãos de referência, citando as modalidades e manejo de contigências

Terapia de aumento de
abordagens de tratamento que compõem suas diretrizes. motivação
Álcool, maconha e nicotina Adultos, mulheres grávidas Nivel 2

Traremos aqui o aprofundamento sobre cada uma das 12 passos


Álcool, estimulantes
Adultos, moradores de rua,
pessoas com comorbidade Nível 3
opióides
principais abordagens. psiquiátricas graves, LGBT

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Intervenção Breve suficientes de que a Intervenção Breve contribui, de forma


efetiva e duradoura, para evitar o consumo de risco em
A Intervenção Breve é uma abordagem rápida e com pessoas sem dependência.
foco bem delimitado, promovendo o alcance do objetivo
inicialmente planejado para o atendimento. Destaca-se que
em virtude dessa técnica ter uma abordagem com foco
delimitado, o profissional precisa realizar um planejamento
minucioso e habilidade para estabelecer qual o campo
específico a ser tratado no paciente, dentre vários campos
que precisarão ser manejados. Essa técnica é realizada, por
exemplo, com o estabelecimento de conversa com escuta
qualificada, possibilitando a aplicação de teste para facilitar
e nortear o diálogo (BRASIL, 2019).

Essa abordagem também pode ser realizada para motivar


indivíduos que se encontram em estado de ambivalência,
bem como para orientar os indivíduos o que estão
solicitando ajuda para tratamento (BRASIL, 2019).
Entrevista motivacional
De forma geral, a abordagem da Intervenção Breve é A Entrevista Motivacional surgiu nos anos 1980, como
utilizada desde 1970, com indivíduos que ainda não tomaram uma contraproposta às abordagens confrontativas
a decisão de ficarem abstinentes ou de se tratarem. Assim, comumente utilizadas no tratamento de dependentes de
destaca-se que estudos mostraram que há evidências álcool. Para William Miller e Steve Rollnick, teóricos que

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desenvolveram a Entrevista Motivacional, as abordagens da TCC possuem vantagem significativa dentro do arcabouço
confrontativas produziriam efeito iatrogênico e até mesmo do MTM, pois são condizentes com os processos de mudança
contraproducente (FIGLIE, 2013). que se presumem operar em muitos dos estágios. (ROTGERS;
NGUYEN, 2008, p. 279).
Essa concepção é baseada no modelo Transteórico para Assim, a Entrevista Motivacional consiste em abordagem
Motivação, desenvolvido por Diclemente e Prochaska (1998) de grande utilidade em variados estágios de tratamento,
mas sendo bastante útil para pessoas que estejam
ambivalentes ou resistentes. Essa abordagem é
Modelo Transteórico para Motivação fundamentada na motivação, ambivalência e prontidão
Observando-se que a motivação para a mudança é um para mudança.
processo que está em constante oscilação, foi desenvolvido
por Diclemente e Prochaska (1998) o Modelo Transteórico da Quando uma pessoa que sofre por um transtorno devido ao
Motivação (MTM). De acordo com este modelo, os estágios uso de substâncias psicoativas busca por ajuda, ela pode
para mudanças são: Pré-contemplação, Contemplação, ter uma série de dúvidas, medos e defesas; ou seja, ela
pode chegar carregada de histórias e querendo justificar
Planejamento, Ação e Manutenção.
cada uma delas.
Presume-se que os estágios sejam sequencialmente não
variáveis, de forma que o indivíduo deve passar por eles na
ordem durante cada episódio de tentativa de mudança. Cada
estágio do MTM envolve diferentes processos cognitivos,
comportamentais e afetivos que servem para facilitar ou
inibir o movimento em direção à mudança. [...] As abordagens

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pode voltar com a mesma rapidez, ou seja, o grau de


motivação para mudança é muito volátil ou oscila como uma
chama de uma vela acesa (BRASIL, 2019).

Segundo Prochaska e DiClemente (2008), as fases da


motivação são divididas desde a fase de pré-contemplação,
passando pela contemplação, até a ação, incluindo também
a recaída – considerada como uma fase (PROCHASKA,
2008), conforme exemplifica a figura a seguir.

Por isso, o primeiro passo na entrevista motivacional é tão


importante: prestar muita atenção. Só assim perceberemos
qual a motivação que o indivíduo possui naquele momento
e como ela flutua ou, ainda, o que a influencia. Mesmo
as pessoas mais decididas e motivadas podem, por um
momento, se questionar ou se verem tentadas a abandonar
o projeto de mudança. Essa tentação pode vir na forma de
um pensamento muito rápido e automático, que a pessoa
quase não percebe, assim como a persistência no propósito

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A seguir colocaremos as características deseja emagrecer, mas continua comendo alimentos que
prejudicam esse processo.
de cada uma dessas fases e como estão
relacionadas ao atendimento: Ação: Os indivíduos realizam medidas eficazes para alterar o
comportamento e o ambiente, visando superar o problema.
Pré-contemplação: Os indivíduos não estão convencidos Quando colocam em prática o novo hábito, estão no estágio
de que necessitam mudar, acreditam que as coisas estão da ação.
bem e não estão dispostos a realizar a mudança, apesar A teoria também se refere a fases intermediárias, como a
dos prejuízos demonstrados pelo ambiente e pelas pessoas preparação para mudança, o lapso, a recaída, conforme
que convivem com eles. Assim, pessoas que estão na pré- demonstrado no ciclo da figura a seguir.
contemplação até podem realizar pequenas alterações no
comportamento por pressão externa, porém só as manterão
enquanto essa pressão existir.

Contemplação: Os indivíduos reconhecem o problema


e estão ativamente considerando a possibilidade de
modificá-lo, mas ainda com bastante ambivalência, ou
seja, quando comparam os prós e contras relacionados ao
comportamento, ainda não têm a clareza da necessidade
de mudança com perdas de prazeres. Um exemplo
claro é o desejo de continuar o uso sem os prejuízos ou,
trazendo para outro comportamento bastante comum,

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AS INTERVENÇÕES NA ENTREVISTA MOTIVACIONAL SEGUEM


CINCO PRINCÍPIOS ESSENCIAIS QUE FORMAM A BASE PARA SUA
Terapia cognitivo-comportamental
APLICAÇÃO. SÃO ELES:
Expressar empatia Acolha, aceite e compreenda o ponto de
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é o resultado
vista do paciente (sem necessariamente concordar com ele). da junção de técnicas da terapia comportamental com
1
Faça uma escuta reflexiva, levando em conta seus sentimentos as técnicas e entendimento da psicologia cognitiva. Essa
e suas perspectivas, sem julgar, criticar ou culpabilizar. terapia foi inicialmente postulada e difundida por Aron Beck
Desenvolver discrepância Ajude o paciente a compreender (1976), na década de 1960.
a discrepância entre a situação presente e como ele
2 gostaria de estar no futuro. A percepção da diferença entre o A premissa dessa técnica é que os pensamentos
comportamento atual e seus valores e objetivos de vida pode influenciam as emoções e os comportamentos das pessoas.
motivar a mudança.
Neste sentido, um determinado evento pode ser interpretado
Evitar a confrontação: Evite confrontar diretamente. de formas diferentes pelos indivíduos, consequentemente
Abordagens desse tipo criam resistência à intervenção.
3 provocando emoções e comportamentos diferentes
Coloque seus argumentos de modo claro, mas sempre
convidando o paciente a pensar sobre o assunto. (FALCONE, 2013).

Lidar com a resistência: É natural que haja resistência às


A TCC parte do pressuposto de que, ao crescer, o indivíduo
sugestões e propostas de mudanças feitas por você. Lembre-
4 se de que o paciente não é um adversário a ser derrotado. cria crenças sobre si, sobre os outros e sobre o mundo à sua
Novas informações e alternativas podem ser apresentadas, volta. Esse processo está estruturado em três grandes eixos:
e não impostas. • Crenças Centrais: crenças desenvolvidas na infância
Fortalecer a autoeficácia: Se o paciente acreditar que é capaz, e estruturam o modo como a pessoa vê as outras
5 a chance de conseguir mudar seu comportamento aumentará pessoas e se relaciona com elas. Podem ser: a visão
incrivelmente!

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de não ser amado ou a de ser desamparado. A partir Níveis de cognição segundo a TCC
de uma crença central, se desenvolvem as crenças
Pressuposto de que ao crescer, o indivíduo cria crenças
intermediárias.
sobre si mesmo, sobre os outros e sobre o mundo a sua
• Crenças intermediárias: são as mais elaboradas, volta. Existem crenças nucleares, ou centrais, que são a
relacionadas ao resultado do processo de base da nossa personalidade e as crenças subjacentes,
aprendizagem e baseadas na crença central. Ditam ou intermediárias.
regras, atitudes ou suposições. Por exemplo: “Só serei
amado se for perfeito”; “Se não der conta não mereço
mais a atenção de ninguém”. E essas crenças disparam
os pensamentos automáticos.

• Pensamentos automáticos: são conscientes e partem


do fluxo natural dos pensamentos. Contudo, muitas
vezes não nos damos conta deles, devido à rapidez e
à naturalidade como ocorrem: são automáticos! Um
exemplo é aquele que traz conclusões, como: “Só
cerveja não faz mal...”; “Agora, eu já consigo”; “Hoje, eu
mereço”; “Agora que comecei, vou usar até acabar”, “Já
que quebrei a abstinência, agora vou usar”; “Eu não vou
segurar à vontade” (BECK, 2013; WRIGHT, et al., 2018;
BRASIL, 2019).

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Dependendo de como foram as experiências de vida A TCC trouxe novas ferramentas para o tratamento do
desse indivíduo, essas crenças podem ser distorcidas Transtorno por Uso de Substância (TUS), em especial,
ou disfuncionais, que levam a pensamentos igualmente quando percebemos, por meio do monitoramento dos
disfuncionais, e por consequência, comportamentos pensamentos automáticos, como eles influenciam as
inadequados. (BECK, 2013; GREENBERGER; PADESKY, 2016; emoções e como essa terapia pode ser útil na prevenção
WRIGHT, et al., 2018; BRASIL, 2019). de recaídas e, consequentemente, na manutenção da
abstinência.
A terapia cognitivo-comportamental se baseia em quebrar
o ciclo: crença, pensamento e comportamento.
Principais técnicas:
• Monitoramento cognitivo
• Registro diário de pensamentos automáticos
disfuncionais (RPD)
• Identificação de pensamentos automáticos (PA)
• Avaliação e questionamento de PA
• Avaliação e modificação de crenças
• Resolução de problemas
• Treinamento de assertividade e habilidades emocionais
• Exame das vantagens e desvantagens
• Exposição gradual e dificuldade crescente
• Experimentos comportamentais
• Cartões de enfrentamento

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• Técnicas de relaxamento / distração Comportamento: para desenvolver um novo comportamento


• Exercício físico frente à sua dependência química, o paciente passa por
• Dramatização processo gradual e crescente de experimentações de
situações de enfrentamento, que permita gerenciar os
seus pensamentos e atitudes, percebendo as possíveis
distrações que possam levá-lo à recaída, fortalecendo suas
Atuação atitudes por meio de atividades físicas e treinamento de
Pensamentos automáticos: durante a terapia o paciente novas habilidades.
começa a identificar os pensamentos automáticos, o que
possibilita avaliar e questionar, por meio dos registros É importante destacar que a abordagem utilizada deve ser
diários dos pensamentos disfuncionais (RPD). escolhida a partir do estado de motivação para mudança
do paciente.
Crenças: na terapia as crenças são acessadas, através A terapia cognitivo-comportamental é uma abordagem que
de um processo contínuo e cíclico, o que faz com que o pressupõe um tempo de tratamento limitado ou reduzido.
paciente identifique e avalie as crenças que norteiam sua As sessões são bastante esquematizadas, o que facilita a
atitude frente à dependência química. sua aplicação como estratégia de saúde em larga escala.
(ZANELATTO; LARANJEIRA, 2013).
Problema: a partir da percepção da crença que conduz a sua
ação, o paciente consegue perceber o seu problema, por
meio de processo de análise dos prós e contras, buscando
assim, a sua solução.

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SAIBA MAIS

Para saber mais sobre os modelos conceituais e das


aplicações da terapia cognitivo-comportamental, acesse
os artigos abaixo:

SILVA, C. J. e SERRA, A. M. Terapias Cognitiva e Cognitivo-


Comportamental em dependência química. Brazilian Journal
of Psychiatry [online]. 2004. Disponível em: https://doi.org/10.1590/
S1516-44462004000500009
KNAPP, P e BECK, A. Fundamentos, modelos conceituais,
aplicações e pesquisa da terapia cognitiva. Rev Bras
Psiquiatr. 2008;30(Supl II):S54-64. Disponível em https://www.
scielo.br/j/rbp/a/HLpWbYk4bJHY39sfJfRJwtn/?format=pdf&lang=pt Prevenção de recaída
A manutenção da abstinência é o foco principal de todo
dependente químico em recuperação. Inúmeras são
as técnicas para manter a abstinência e uma delas é a
Prevenção à Recaída (ZANELATTO, 2011).

Estudos sobre Transtornos por Uso de Substâncias


mostraram uma alta taxa de incidência de recaída,

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principalmente nos primeiros 90 dias sendo os nove meses não estar atento a sentimentos negativos, tais como
seguintes também considerados parte do período de risco tristeza, dor, frustração, raiva, e, sentimentos positivos,
de recaída. como euforia e alegria. (JUNGERMAN, 2013)
Já as Decisões Aparentemente Irrelevantes são decisões
A prevenção à recaída surge como estratégia que traz do dia a dia, corriqueiras, que parecem ser inofensivas,
responsabilidade ao indivíduo e busca o seu autocontrole mas que acabam levando o indivíduo a situações de risco.
para lidar com a recaída. É, portanto, a partir do (JUNGERMAN, 2013)
aprendizado e da observação dos hábitos e pensamentos
de cada acolhido, que são trabalhadas as técnicas a Assim, estratégias especificas da prevenção de recaída são
serem desenvolvidas nos processos cognitivos ligados desenvolvidas, dentre elas: treinamento de habilidades,
à dependência química, são elas: a autoeficácia, os reestruturação cognitiva e intervenção no estilo de vida.
resultados esperados, as atribuições de causalidade e
os processos de tomada de decisões (BECK, 1976 apud
MARLATT; GORDON, 1993; BRASIL, 2019).
Manejo de contingências
No processo de prevenção à recaída, é importante destacar
Atualmente é possível afirmar que o Manejo de Contingência
dois conceitos: Situações de Alto Risco e Decisões (MC) é uma das intervenções psicossociais que apresenta
Aparentemente Irrelevantes. maior consenso entre os principais órgãos de referência
quanto a sua eficácia no tratamento da dependência
Nas Situações de Alto Risco observa-se evidente o risco química (HIGGINS et al, 2008). Higgins publicou um conjunto
ao uso de drogas, como por exemplo, manter vínculo de de estudos que demonstram a eficácia do MC na redução
amizade com pessoas que fazem uso de álcool e drogas, do consumo de substâncias, em promover a abstinência

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continuada bem como aumentar a participação e a adesão Esse condicionamento é persistente ainda que já sejam
ao tratamento de pessoas com TUS. Além disso, o MC pode ser manifestadas as consequências aversivas relacionadas ao
aplicado como um componente terapêutico para praticamente uso abusivo. Nesse sentido, o MC consiste em manipular
todo modelo e estrutura de tratamento para os TUS. variáveis do ambiente atual do indivíduo, visando o aumento
de reforçadores contingentes a essas respostas alternativas
Os resultados obtidos por estudos com MC no tratamento e/ou incompatíveis ao consumo
de TUS foram tão robustos ao demonstrarem eficácia
no tratamento de Dependência Química que, em 1998, o
National Institute on Drug Abuse (NIDA) desenvolveu um As técnicas baseadas em MC derivam diretamente da
manual prático de como implementar de forma adequada Teoria Comportamental de B. F Skinner que diz respeito
o MC nos serviços de tratamento aberto para usuários de ao condicionamento operante. Essa teoria propõe
cocaína. No ano de 2007, foi quando o National Institute for que o comportamento de consumir substâncias é um
Health and Clinical Excellence (NICE) recomendou a adesão comportamento operante e por sua vez, controlado pelas
ao tratamento por MC à Agência Nacional do Tratamento do consequências que produz. (MIGUEL, A. Q. C., 2019). Nesse
Abuso de Substância do Reino Unido sentido, o manejo de contingências (MC) é uma estratégia
utilizada no tratamento do uso de álcool e outras drogas que
O MC é uma intervenção baseada em princípios do
incentiva a mudança para um comportamento mais saudável
condicionamento operante. De acordo com essa abordagem
(BRASIL, 2019). Em outras palavras, a técnica se baseia em
da psicologia, o consumo problemático de determinada
promover consequências reforçadoras quando os indivíduos
substância é mantido devido às suas consequências
reforçadoras (por exemplo, seus efeitos fisiológicos que atingem as metas objetivadas em tratamento (presença no
geral prazer e euforia, ou também a satisfação decorrente a tratamento ou manutenção da abstinência). A perspectiva
sensação pertencimento a um grupo social etc.) e pela falta do uso da técnica do MC garante que o condicionamento
de outros reforçadores contingentes a respostas alternativas operante tem um papel central nos comportamentos ligados
e/ou incompatíveis a esse consumo (Higgins et al., 2004). ao uso e dependência de substâncias.

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A ideia central é que a manipulação das contingências


fornecimento de reforço (e.g., através de dinheiro,
do ambiente aumenta a disponibilidade de reforçadores vales e prêmios), de maneira imediata e com
alternativos àqueles ligados ao uso de substância. magnitude crescente, para a produção de evidências
2
Sendo assim, o objetivo do uso do MC em serviços de que o comportamento-alvo foi emitido (e.g.,
para dependência química é promover a mudança resultado negativo no teste de urina para o uso de
de comportamentos (relacionados ao consumo de cocaína);
substâncias) ao manipular certas contingências retenção de reforçadores quando a medida objetiva
presentes no dia a dia da pessoa com TUS. Essas indicar que o comportamento-alvo não ocorreu
contingências podem ser organizadas para propiciar (e.g., resultado positivo no teste de urina para o uso
3
de cocaína), além da diminuição da magnitude do
reforçadores positivos (recompensas) após a emissão reforço para a próxima vez que ele voltar a emitir o
do comportamento a ser buscado. comportamento-alvo.

Existem muitos comportamentos considerados prejudiciais no


repertório de uma pessoa com TUS, como, por exemplo, um
PRINCÍPIOS PARA A APLICAÇÃO DO MC:
usuário de cocaína grave vivendo nas ruas, muitas vezes, pode
definição objetiva e monitoramento constante do
se prostituir, traficar e roubar. Todos esses comportamentos são
comportamento-alvo, com a frequência definida a partir
das características do comportamento e da forma de claramente prejudiciais para a pessoa com TUS, bem como para
1 a sociedade. No entanto, na grande maioria das vezes, a pessoa
mensuração escolhida (e.g., duas vezes por semana no
caso do comportamento de uso da cocaína monitorado com TUS apresenta esse comportamento para conseguir o
por teste de urina); dinheiro para o uso da cocaína. Se conseguirmos eliminar o
comportamento de usar drogas, é muito provável que o paciente
pare de emitir (ou reduza muito) esses comportamentos.

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A efetividade do MC para o tratamento da dependência o de ensaios controlados randomizados. Sendo assim, os


crack foi comprovada também no Brasil em 2016, através usuários de crack que utilizavam o serviço que sediou o
de um ensaio controlado randomizado realizado por André estudo foram divididos aleatoriamente em dois grupos:
Constantino Miguel para a obtenção do título de doutorado. controle e experimental.
O autor utilizou o mesmo modelo proposto por Higgins
substituindo o pagamento em dinheiro por vales. O Grupo Controle recebeu o tratamento ambulatorial
padrão (TP) oferecido pela instituição, que consistia em
atendimentos individuais com clínicos gerais, psiquiatras,
psicólogos, terapeutas ocupacionais e enfermeiros,
Aplicação Prática do Manejo bem como a participação de grupos onde princípios
de Contingências da entrevista motivacional eram utilizados juntamente
com técnicas de prevenção de recaída e treinamento
Descreveremos a aplicação do MC a partir do método de habilidades (grupo motivacional e prevenção de
utilizado no primeiro estudo de efetividade realizado no recaída). No TP também eram oferecidos atendimentos
Brasil, no qual a efetividade da técnica foi avaliada em de terapia ocupacional.
um contexto realista de tratamento para dependência do O grupo experimental recebeu exatamente o mesmo
crack, onde grande parte dos pacientes encontrava-se em tratamento padrão oferecido ao grupo controle com
situação de rua e a larga maioria em situação de extrema a inclusão do tratamento Manejo de Contingências
vulnerabilidade social. (MC). Assim como para o grupo controle, durante as 12
semanas de tratamento, o participante recebendo MC foi
Como vimos anteriormente, estudos que avaliam efetividade encorajado a deixar amostras de urina e bafômetro três
de intervenções usam a metodologia ouro, sendo chamados vezes por semana. Toda vez que o participante submetia

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um exame negativo para crack/cocaína sua abstinência cocaína, o participante também deixava uma amostra
era valorizada pela equipe. Quando o exame submetido negativa de bafômetro. Além disso, um bônus extra de
estava positivo para crack/cocaína, a equipe valorizava o 10,00 reais era dado quando todos os 3 exames semanais
fato de o participante continuar aderido ao tratamento e o submetidos estivessem negativos para crack/cocaína,
encorajava a tentar ficar abstinente no próximo exame. No álcool e THC. Ressalva-se que, vales para exames negativos
entanto, diferente do procedimento do grupo controle, no para álcool e THC somente eram dados quando o exame
procedimento experimental, o participante recebia vales para crack/cocaína também estivesse negativo.
com certo valor monetário como reforço por ficar abstinente
de crack/cocaína. Os vales podiam ser trocados por Quando o participante faltava, recusava a fazer os exames,
produtos disponíveis na comunidade em um raio de 1 km do ou deixava uma amostra positiva para crack/cocaína,
serviço, com acompanhamento de um dos pesquisadores. ele não recebia nenhum vale naquele dia, e tinha seu o
esquema de reforçamento reiniciado no valor de 5,00
Após a emissão do primeiro exame de urina negativo para reais. Caso o participante estivesse presente em todos os
crack/cocaína o participante recebia imediatamente um vale encontros e apresentasse todos os exames negativos, ele
com valor monetário de 5,00 reais. Esse valor aumentava receberia um total de 942,00 reais em vales ao longo das
em 2,00 reais para cada exame consecutivo negativo para 12 semanas do tratamento. O procedimento envolvendo
crack/cocaína até chegar ao valor máximo de 15,00 reais. exames de urina e recebimento de vales não excedeu mais
Desta maneira, aumentando de 5,00 reais para 7,00, 9,00, de 10 minutos por dia.
11,00, 13,00 e 15,00 reais, respectivamente. Se o participante
deixasse os três exames semanais negativos para essas
substâncias ele também recebia um bônus de 20,00 reais.
Para incentivar a abstinência de álcool 2,00 reais a mais
eram dados quando, junto ao exame negativo para crack/
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Resultados de Adesão:
A intervenção teve 12 semanas de duração. Duas avaliações
de seguimento foram realizadas 3 e 6 meses após as
12 semanas do procedimento de intervenção. Após o
seguimento do sexto mês os participantes do grupo
controle foram convidados a participar de mais 12 semanas
de tratamento recebendo o procedimento experimental.
Com isso participantes do grupo experimental foram
acompanhados por 9 meses enquanto participantes
inicialmente destinados ao grupo controle foram
acompanhados por 12 meses.Os resultados desse estudo
demonstram o quanto esses tratamentos para dependência
Resultados de abstinência:
de crack podem se tornar significativamente mais eficazes
com a inclusão das técnicas do MC no que se refere a
participação no tratamento, a adesão ao tratamento, a
redução no padrão do consumo de crack, e na promoção
da abstinência continuada.

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O resultado mais expressivo desse estudo foi que ao final possível usar essa metodologia para reforçar outros
das 12 semanas da intervenção, mais de metade (51,5%) comportamentos como a participação em diferentes tipos
dos participantes que receberam MC se mantinham de tratamentos, bem como para a adesão a tratamentos
em tratamento em comparação a nenhum participante farmacológicos.
que recebeu o tratamento convencional/padrão (TP). As
chances de completar todo tratamento foram quase 70x O manejo de contingências serve como técnica facilitadora
maiores entre os usuários de crack que fizeram o manejo da adesão ao tratamento, sendo complementar a uma
de contingências em relação ao grupo controle. diversidade de intervenções que possam promover
significado, inclusive nos Planos de Atendimento Singular
Além disso, embora não tenham sido alvos primários, a (PAS). Nem todos os indivíduos são percebidos como
intervenção também reduziu sintomas de depressão e motivados para programas de tratamento, devemos
ansiedade (MIGUEL et al., 2017). Além disso, mais de 90% considerar, assim, que a falta de desejo e problemas de
dos participantes no grupo experimental acharam o MC conduta também podem influenciar negativamente o
de fácil compreensão; todos relataram gostar de sua estabelecimento de um ambiente terapêutico.
experiência com o MC; mais de 80% disseram que o MC os
ajudou consideravelmente; e mais de 90% indicaram que o
MC poderia ajudar muito outras pessoas com dependência O MC aplicado ao tratamento dos TUS é um dos tratamentos
de crack (MIGUEL et al., 2018). psicossociais mais estudados na literatura internacional,
por meio de ensaios clínicos e estudos de metanálise. Todos
Os resultados encontrados no Brasil são consistentes os estudos sustentam que o tratamento por MC aplicado
com uma série de ensaios de efetividade realizados em sozinho, ou em conjunto com outros tratamentos, é eficaz em
diferentes países e com usuários de outras substâncias. promover a abstinência continuada e a adesão ao tratamento
Outro ponto importante, é que, embora os melhores para pessoas com TUS. Mais especificamente, estudos de
resultados de estudos envolvendo MC no quesito manter metanálise encontraram que o MC apresenta um tamanho
abstinência utilizavam o comportamento de ficar abstinente de efeito que varia de moderado a alto, sendo esse o maior
como comportamento alvo que se deseja reforçar, é tamanho deda Dependência
Curso EaD Tratamento efeito Química
encontrado para
no contexto Hospitalar qualquer
(Hospital tratamento
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28
psicossocial para TUS. (SIMÕES, YAMAUCHI e MIGUEL, 2022)
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UNIDADE 2
TRIAGEM, AVALIAÇÃO E PROJETO TERAPÊUTICO
A identificação precoce de usuários de substâncias em risco, A prevenção secundária é destinada a sujeitos que já
bem como o manejo apropriado desses casos, pode ser evidenciam algum sintoma do problema, o que, no caso do
determinante para prevenir o agravamento da situação e o consumo de drogas, pode ser extrapolado para o grupo que já
aumento de exposição a riscos diversos. fez a experimentação de álcool e outras drogas e que pode ou
não fazer uso ocasional. Essa ação visa evitar que esse uso
Classificamos os tipos de intervenção dentro do espectro se torne abusivo e problemático, reduzindo as chances de
dos diferentes graus de agravamento da exposição ao que o abuso se transforme em dependência (BRASIL, 2022).
risco. Para além dos três níveis de intervenções preventivas
(primária, secundária e terciária), existem as intervenções de Por sua vez, a prevenção terciária é destinada aos usuários
tratamento, que têm como linha de partida a identificação do que já apresentam uso problemático e, nesse caso, a
problema (BRASIL, 2022). intervenção preventiva é o tratamento com profissionais
especializados para redução dos danos associados ao
De acordo com a classificação proposta por Leavell e Clark abuso da substância em questão e, eventualmente, a busca
(1958), as ações preventivas podem ser identificadas como da abstinência (BRASIL, 2022).
primárias, secundárias ou terciárias.
O tratamento com abordagem multidisciplinar deve
A prevenção primária é aquela que ocorre numa fase anterior levar em conta as diferentes demandas de apoio e
ao desenvolvimento da doença e, nesse caso, adaptando o assistência. Sendo assim, ações assistenciais devem ser
conceito à prevenção do uso de drogas, com o objetivo de correspondentes ao estágio de motivação do indivíduo em
evitar a experimentação inicial de drogas (BRASIL, 2022). suspender o uso da substância em questão (BRASIL, 2022).
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Triagem e avaliação inicial E por qual motivo se avalia o padrão de consumo


de drogas e a gravidade?
A avaliação inicial de uma pessoa que resolve buscar por
tratamento é uma etapa muito importante e temos que dar A avaliação sobre o padrão de consumo e a gravidade
total atenção e apoio, bem como facilitar os meios para o ajudará os profissionais a encontrar uma hipótese
acesso ao tratamento. diagnóstica, realizar o planejamento adequado de cuidados
e realizar também possíveis encaminhamentos.
No contexto hospitalar ou de clínicas especializadas, Também deve-se identificar quais processos levam a pessoa
é necessário que seja realizada uma triagem, que para o uso de drogas para que posteriormente, esses
nada mais é que uma investigação sobre aspectos processos possam ser abordados e levantados como pontos
importantes da história de vida, da história de tentativas a serem trabalhados no tratamento, com a finalidade de se
de tratamento já existente, do padrão de consumo de traçar estratégias de enfrentamento (LOURENÇO et al, 2020).
drogas e sua gravidade.
O olhar do profissional, bem como sua conduta deve
Em uma avaliação inicial, os profissionais irão ser acolhedor e empático, pois a pessoa que busca por
coletar dados da pessoa para identificá- tratamento, têm outras questões interligadas e que devem
la em seu contexto social, econômico, seu ser tratadas, além da dependência de drogas. Sendo assim,
estado de saúde física e mental atuais, o tratamento deve ser amplo e abranger além das questões
se existe possíveis alterações nesses exclusivas da dependência.
aspectos, irá investigar também sua
história clínicae seus antecedentes Vale lembrar que a queixa inicial pode ser o uso de drogas,
familiares (ROSELI et al., 2019). mas não necessariamente esse é o único problema que a

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pessoa carrega consigo e que leva ao uso (PERRONE, 2014). Introdução: contém o panorama geral, epidemiológico e
Outro ponto importante observado é que os familiares que as referências de boas práticas presente na literatura
acompanham as pessoas que estão em busca de ajuda, científica em serviços semelhantes.
muitas vezes estão tão adoecidos quanto o dependente Objetivos: contém os objetivos gerais e específicos
e precisavam de acolhimento, orientações e devem ser do serviço.
encaminhados para grupos específicos para familiares,
como por exemplo, o Amor Exigente, para que possam ter Plano assistencial: descreve em detalhes as linhas
um suporte e entender como lidar com seu familiar nesse de cuidado assistenciais.
momento tão decisivo de sua vida. Processos clínicos: descreve os principais processos
clínicos assistenciais contextualizados dentro das
linhas de cuidados.

Projeto Terapêutico
Considera-se fundamental um projeto terapêutico que
seja desenvolvido no contexto de hospitais e clínicas
especializadas, assim como em qualquer outro tipo de
serviço de tratamento do TUS. Ele deverá ser fundamentado
em práticas baseadas em evidências e elaborado com a
colaboração de toda equipe multidisciplinar. Para elaborar
um projeto terapêutico, é importante compreender que ele
deverá conter os seguintes itens.

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Plano Individual de Atendimento Para mais efetividade na construção do PIA, é essencial


avaliar as condições do portador de transtorno por uso
O Plano Individual de Atendimento é construído entre de substâncias psicoativas e, somente após, traçar
o indivíduo que busca o tratamento, familiares e os as estratégias pelos diversos membros da equipe
profissionais que estão atuando neste caso, e consiste multiprofissional.
nas ações e atividades que o indivíduo passará durante
o processo de tratamento (BRASIL, 2019).

Esse plano de atendimento possui diferentes nomes, de


acordo com os serviços. Mas é fácil memorizar: os serviços
do Sistema Único de Saúde (SUS) utilizam o nome “Projeto
Terapêutico Singular (PTS)” e os serviços do Sistema Único
de Assistência Social (SUAS) e do Sistema Nacional de
Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD) utilizam o nome
“Plano Individual de Atendimento (PIA)”. Mas independente
do nome, o PIA é um dispositivo importante por organizar
o processo de trabalho e possibilitar o cuidado com o
paciente, ou acolhido, respeitando a sua singularidade.

Esse plano deve agrupar as contribuições interdisciplinares


de várias especialidades e de distintos profissionais.

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Sugere-se que o Plano Individual de Atendimento seja


elaborado em parceria entre terapeuta e paciente, e inicia
com a reflexão sobre quais serão as metas terapêuticas
a serem atingidas no processo, ordenadas conforme as
prioridades por ela determinadas. É importante considerar
dois pontos:

METAS: a curto prazo são aquelas que podem ou devem


ser alcançadas nos primeiros seis meses de tratamento.
Tal diferenciação é importante para tornar viável as
metas de forma que sejam realistas e possivelmente
atingíveis, a fim de evitar a frustração quando o objetivo
É muito comum que a prioridade determinada seja a redução
não é atingido.
ou abstinência do consumo de uma dada substância.
Também pode haver outras prioridades, como melhorar a
PRIORIDADES: qualquer avaliação pré-tratamento,
situação familiar e no trabalho, retornar à escola etc. Essa
para qualquer espécie de tratamento oferecido,
determinação das metas deve combinar perspectivas de
necessita, antes de tudo, da verificação da gravidade
diferentes domínios e consequentemente será enriquecida
da dependência e da abordagem inicial para
com a contribuição de diferentes profissionais (ex:
desintoxicação ou exclusão de qualquer outra urgência
psicólogo, psiquiatra, enfermeiros, terapeutas ocupacionais
ou emergência médica etc.). Nesse momento, é importante identificar o estágio do
tratamento, bem como a motivação do acolhido em relação
à definição e perseguição das metas.

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É importante destacar que o PIA deve conter não somente processo, sendo esses, no caso de crianças e adolescentes,
a programação das atividades a serem desenvolvidas dentro passíveis de responsabilização civil, administrativa e criminal,
da instituição, mas também o planejamento após a alta, nos termos da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da
incluindo as estratégias de enfrentamento e prevenção Criança e do Adolescente.
à recaída. § 4º O PIA será inicialmente elaborado sob a responsabilidade
da equipe técnica do primeiro projeto terapêutico que atender o
O PIA é flexível e deve ser aprimorado ao longo do processo usuário ou dependente de drogas e será atualizado ao longo das
de recuperação. diversas fases do atendimento.
§ 5º Constarão do plano individual, no mínimo:
SAIBA MAIS I - os resultados da avaliação multidisciplinar;
II - os objetivos declarados pelo atendido;
III - a previsão de suas atividades de integração social ou
A elaboração do PIA é prevista por lei, conforme as capacitação profissional;
legislações listadas abaixo: IV - atividades de integração e apoio à família;
Lei 13.840/2019 – Art.23-B. V - formas de participação da família para efetivo cumprimento
§ 1º A avaliação prévia da equipe técnica subsidiará a elaboração do plano individual;
e execução do projeto terapêutico individual a ser adotado, VI - designação do projeto terapêutico mais adequado para o
levantando-se no mínimo: cumprimento do previsto no plano; e
I - o tipo de droga e o padrão de seu uso; e VII - as medidas específicas de atenção à saúde do atendido.
II - o risco à saúde física e mental do usuário ou dependente de § 6º O PIA será elaborado no prazo de até 30 (trinta) dias da data
drogas ou das pessoas com as quais convive. do ingresso no atendimento.
§ 3º O PIA deverá contemplar a participação dos familiares § 7º As informações produzidas na avaliação e as registradas no
ou responsáveis, os quais têm o dever de contribuir com o plano individual de atendimento são consideradas sigilosas.

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Vale ressaltar a importância da participação da família


Vale ressaltar também que, além dessas informações no processo de construção do PIA. A família poderá se
necessárias conforme descrito na lei nº 13.840/2019, outras estabelecer como corresponsável pelo bom resultado do
informações são extremamente importantes para constar processo terapêutico, trabalhando com ela de uma forma
no PIA, dentre elas: que possa compreender sua importância no processo de
recuperação, bem como a importância de validar, fazer
• Dados pessoais do indivíduo, da família e de outros valer e sustentar as orientações passadas pela equipe
vínculos significativos; de tratamento.
• Histórico de saúde (doenças pregressas e tratamentos);
• Acompanhamento de serviços de saúde anteriores ao Uma possibilidade para a inserção da família no PIA é
tratamento. realizar visitas domiciliares, pois nessas visitas pode-se
• Realizar o levantamento das necessidades/habilidades vivenciar a realidade da família e ter maior compreensão
do acolhido para encaminhamentos aos serviços de: do caso e sua complexidade, além de promover a
regulamentação de documentos, saúde, escolarização, aproximação da família com a equipe do serviço,
capacitação profissional, entre outros. esclarecendo dúvidas em relação ao tratamento que
está sendo ofertado (BRASIL, 2019).
Observa-se que o termo “plano” se refere a uma
discussão prospectiva, com a ideia de construção futura,
e não retrospectiva (referindo ao passado), e deve ser
elaborado sempre com base nas necessidades de cada
indivíduo, não excluindo, de forma alguma, suas opiniões,
sonhos e o principal: seu projeto de vida (COVELO;
BADARO- MOREIRA, 2015).
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UNIDADE 3
O TRATAMENTO PSICOSSOCIAL NO CONTEXTO DOS HOSPITAIS E CLÍNICAS ESPECIALIZADAS
As abordagens psicossociais fornecem não só um alicerce • Estágio de motivação: Abordagens psicodinâmicas ou
teórico para a compreensão do fenômeno da dependência técnicas que requerem maior adesão no tratamento,
química, caso a caso, mas, também, um arcabouço de como por exemplo exercícios para fazer fora do
técnicas e estratégias de manejo e manutenção do tratamento. contexto do tratamento da Psicoterapia Cognitivo-
Comportamental serão menos efetivos entre
Ainda que os profissionais atuantes no campo da saúde pacientes que se encontram “pré-contemplativos, ou
mental disponham de formações teóricas diversas, as seja, sem motivação para o tratamento.”
quais irão embasar a compreensão e tomada de decisões • Perfil psicológico: O uso de algumas técnicas de
em cada caso, a complexidade do tratamento exige Psicoterapia Cognitivo-Comportamental será limitado
sempre uma diversificação de técnicas, que muitas vezes em pacientes ainda no período de desintoxicação
extrapolam a abordagem teórica propriamente dita. É ou entre aqueles que sofrem mais das sequelas
muito comum que profissionais que atuam na dependência neurológicas do uso abusivo. Nesses casos as
química utilizem em sua prática clínica um amplo “cardápio” abordagens mais comportamentais serão mais
de técnicas advindas de diferentes abordagens. efetivas
• Contexto: A aplicação de algumas técnicas de
O uso dessas ferramentas deve ser ponderado,
Prevenção de Recaída entre pacientes internados,
considerando o contexto que o paciente se encontra, a
que não tem risco de recaída.
depender de diversos fatores tais como:

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• Período de tratamento: A escolha da abordagem e técnicas motivacionais para impulsionar a manutenção do


técnicas usadas também depende do tempo de estadia tratamento após desligamento.
do paciente no serviço. Os equipamentos que oferecem
sessões únicas, deverão priorizar a Intervenção Breve Finalmente, qualquer que seja a abordagem teórica, é
e Entrevista Motivacional. fundamental que o profissional que atua no tratamento
da dependência química no contexto de hospitais e
A estadia de média e longa duração no contexto de clínicas especializadas leve em consideração a utilização
Hospitais e Clínicas Especializadas permite a utilização de de técnicas terapêuticas baseadas em evidências e
diferentes abordagens. que visem todo o percurso da recuperação, planejando
estrategicamente o retorno do paciente aos ambientes que
É importante, contudo, considerar que o contexto antes propiciavam o uso de substâncias.
de “proteção” que o paciente se encontra deva ser
considerado e otimizado. O contexto da internação propicia
um ambiente seguro onde é possível explorar técnicas
que requerem a abstinência e o distanciamento de PROTOCOLO PARA UTILIZAÇÃO DE ABORDAGENS TEÓRICAS E
TÉCNICAS NO CONTEXTO HOSPITALAR E CLÍNICAS ESPECIALIZADAS
situações de risco. Nesses casos, o uso das abordagens
Cognitivas-Comportamentais têm um papel importante, 1. É ideal que sejam oferecidas sessões em grupos
no sentido de estimular a reflexão sobre fatores internos e com frequência semanal;
e sobre o ambiente que permeiam o comportamento de 2. É preciso um planejamento de sessões estruturadas,
uso, explorar as relações familiares e planejamento de com focos específicos
estratégias de prevenção à recaída. O contexto protegido
também é um ambiente propício para a aplicação de

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Temáticas sugeridas para trabalho em grupo: ENCERRAMENTO DE MODULO


• Prevenção da recaída: como lidar com a fissura,
trabalhar fatores de risco e proteção, como pedir Nesse módulo tivemos a oportunidade de explorar
ajuda, acesso a serviços, como impedir que um as principais abordagens terapêuticas utilizadas no
lapso se transforme em recaída, tratamento da dependência química. Fizemos um maior
aprofundamento sobre as intervenções psicossociais
• Identificação de crenças e pensamentos
da Terapia Cognitivo Comportamental e do Manejo de
automáticos subjacentes a cada comportamento
Contingências, ambas largamente estabelecidas e com um
de risco.
corpo robusto de evidências de sua eficácia no tratamento
• Análise do processo da recaída (identificação de de Transtorno por Uso de Substância.
gatilhos e fatores de risco)
Aspectos relevantes sobre as avaliações de triagem
• Monitoramento Cognitivo: Identificação/
e elaboração de projeto terapêutico e Plano Individual
monitoramento de pensamentos automáticos
de Atendimento no contexto hospitalar e de clínicas
permissivos relacionados ao consumo.
especializadas foram descritos e discutidos.
• Treinamento de habilidades de enfrentamento
e recusa.

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REFERÊNCIAS: Saúde Mental: a participação dos familiares no cuidado do sofrimento psíquico.


Interface - Comunicação, Saúde, Educação [online]. 2015, v. 19, n. 55, pp. 1133-
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e Princípios Teóricos. O tratamento da dependência química e as terapias
BECK, A. T. Cognitive therapy and the emotional disorders. New York: cognitivo comportamentais: um guia para terapeutas. ZANELATTO, N. A.;
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BECK, J.S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. 2ª ed. Porto FERNANDES, S. S. et al. Evasão do tratamento da dependência de drogas:
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BOSSO, R. A., 2020. Estruturação de programas de reinserção social
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para pessoas com transtornos por uso de substâncias. O Tratamento da
462X2017000200131&lng=pt&nrm=iso .2017
Dependência Química: um guia de boas práticas. Rogério Adriano Bosso (org.) &
Juliano Pereira dos Santos (org.). Edição. Curitiba: Appris. FIGLIE, N. B. Entrevista Motivacional e Terapia Cognitivo-Comportamental no
Tratamento Do Uso De Substâncias Psicoativas. IO tratamento da dependência
BRASIL. Ministério da Cidadania. Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção
química e as terapias cognitivo comportamentais: um guia para terapeutas.
às Drogas. Modulo X. In: BRASIL. Ministério da Cidadania. Secretaria Nacional de
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Curso EaD Tratamento da Dependência Química no contexto Hospitalar
Química no contexto Hospitalar (Hospital (Hospital Geral e Hospital Psiquiátrico) e das Clínicas Especializadas

Geral e Hospital Psiquiátrico) e das CENTRO DE ESTUDOS PAULISTA GESTOR DO PROJETO


Marcello Renato de Souza
DE PSIQUIATRIA - CEPP
Clínicas Especializadas COORDENADOR GERAL DO PROJETO
Cláudio Jerônimo da Silva FACULDADE PAULISTA DE
CIÊNCIAS DA SAÚDE - SPDM
COORDENADORA PEDAGÓGICA DO PROJETO
Clarice Sandi Madruga DIRETOR GERAL FPCS
Nacime Salomão Mansur
CONTEUDISTAS ESPECIALISTAS
Ana Paula Dias Pereira GERÊNCIA ADMINISTRATIVA
André de Queiroz Constantino Miguel Daniela Junqueira Stefani
Kátia Isicawa de Sousa Barreto
Leonardo Gomes Moreira NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Maria de Fátima Padin
Ronaldo Ramos Laranjeira COORDENAÇÃO
Sérgio Marsiglia Duailibi Susana Mesquita Barbosa
Susana Mesquita Barbosa
EQUIPE
CONTEUDISTAS CONVIDADOS Bruna Veroneze Léo
Eduarda de Oliveira Barbosa Claudia Scheidt Guimarães
Gleuda Simone Apolinário Eudes Miranda Bomfim
Guilherme Athayde Ribeiro Franco Expedito Alexandre da Silva Neto
Guilherme S. de Godoy Filho Juliana Prado Ferrari Spolon
Homero Pinto Vallada Filho Maycon Anderson Pires Novais
Joselaine Ida da Cruz
Juliane Piasseschi de Bernardin Gonçalves PROJETO EDITORIAL
Mario Sergio Sobrinho Guerra Comunicação
Neliana Buzi Figlie
Paula Maria Greco Cipro
Quirino Cordeiro Junior
Rogério Adriano Bosso
Zila Van Der Meer Sanchez

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