Conflito, angústia e processos de

defesa no Método de Rorschach

(Escola de Paris)
Bruno Cavaignac Campos Cardoso
Doutorando do PPG-PCC- Universidade de Brasília.
Mestre em Psicologia Clínica e Cultura- UnB
Psicólogo e Docente de Ensino Superior (IESB)
 (1)
Conflito Angústia

(2)

Mecanismo de Defesa

(e) Ganho
(4)
Secundário
(3)
(ou) Sintomas**
Estrutura Neurótica ou Psicótica Normal*

A noção de estrutura (Bergeret, 2000; Fenichel,

*Para Freud (1924), a Estrutura Psicótica não pode ser “normal”
1981) o sintoma seja um produto da patologia da estrutura, o sintoma não compõe a estrutura saudável, portanto, não é possível fazer um diagnóstico apenas a partir
**Embora
da descrição dos sintomas. É preciso fazer o caminho inverso da formação do sintoma para entender a natureza do conflito, tipo de angústia e mecanismos de defesa
utilizados.
 Estrutura e • “O verdadeiro individuo “saudável” não é simplesmente alguém que se

normalidade declara como tal, nem, sobretudo, um doente que se ignora” (Bergeret,

2000, p.21)

O sujeito “saudável” também tem conflitos.

1. Mas apresenta uma estruturas estável (Neuróticas ou

Psicóticas) o que é distinto da eclosão de uma “neurose” ou da
“psicose”.

2. A normalidade independe do tipo de estrutura, desde que

esta seja uma estrutura verdadeira e estável, na qual as
necessidades pulsionais são flexíveis e a organização defensiva
superior as dificuldades encontradas.

3. O sujeito normal considera a realidade, é capaz de se adaptar-se

a ela, embora tal adaptação não seja sinônimo de
submissão. Ver Freud, 1924, p. 170 e Freud, 1924b, p.207)
A noção de normalidade (Bergeret, 2000, A noção de estrutura (Bergeret,
p.21) 2000)
A normalidade envolve flexibilidade
das necessidades pulsionais e das
A normalidade e aloplástia
defesas.
“Desse modo*, as incoerências,
excentricidades e loucuras dos
homens apareceriam sob uma
luz semelhante às perversões
sexuais, através de cuja
aceitação poupam a si próprios
repressões” (Freud, 1924, p.170).
* A depender da magnitude das forças em conflito
e da capacidade do Ego deformar-se ou dividir-se,
sem romper-se. Ver Freud (1937) Análise
terminável e interminável.
“A neurose não repudia a realidade,
apenas a ignora; a psicose a
repudia e tenta substituí-la.
Chamamos de comportamento
“normal” ou sadio se ele combina
certas características de ambas as
reações: se repudia a realidade tão
pouco quanto uma neurose, mas se
depois se esforça, como faz uma
psicose, por efetuar uma alteração
da realidade” (Freud, 1924b, p.207).
 Desenvolvimento do Ego

PSICOSES Casos-Limite* NEUROSES

A noção de estrutura (Bergeret, 2000)

*Casos-Limite não estruturas para J.Bergeret
 Contribuições da psicanálise na compreensão do borderline: Freud e Lacan
Freud e Lacan: Não tratam sobre o tema dos

pacientes boderline, casos-limite, etc. Dividem as

PSICOS NEUROS
estruturas em três tipos: Neurose, Psicose e a E Rejeição E Recalque
Perversão. A distinção se refere a natureza do
conflito e das defesas principais contra a
castração: Recalque (Neuroses); Rejeição ou
Forclusão (Psicose); Recusa (Perversão). PERVERSÃO
Recusa

• Para o lacaniano, o Borderline, deste ponto de

vista, “não existe” — a tendência seria
considerá-lo histeria grave ou perverso.
 Terreno da Psicanálise Aplicada,
que nos permite utilizar os
Como utilizar a conceitos extraídos da
referência psicanálise, interditando-se de
psicanalítica sem estabelecer correspondências
confundir-se? sistemáticas entre os fenômenos
que se manifestam em uma cura
psicanalítica e aqueles que
surgem no decurso de uma
sequência única e limitada de um
protocolo de Rorschach.
 Os referencias teóricos
Noções básicas de
do sistema de
interpretação do transferência (Freud) e
Rorschach a partir da contratransferência (Ferenczi)
escola de Paris (Chabert,
Fundamentação
1998; 2020) teórica clássica,
reportada do Vocabulário de
A noção de conteúdo manifesto
Psicanálise feito por Laplanche e
Pontalis em 1976. e conteúdo latente.

Referência a Winnicott (1975) e ao Freud (1900) A interpretação

conceito de área transitiva e
dos sonhos.
fenômenos transicionais.
 Contribuições de J.
Bergeret
Psicoses
Angústia: Fragmentação
Conflito: Ego x Realidade
Instância dominante: Id
Defesas: Rejeição,
Clivagem, Projeção
Tipo de Relação: Fusional
Neuroses
Angústia: Castração
Conflito: Id x Ego
Instância dominante: Superego
Defesas: Recalque
Tipo de Relação: Genital
Casos Limite
Angústia: Perda de objeto
Conflito: Ideal do Eu com o Id + a Realidade
Instância dominante: Ideal do Eu
Defesas: Clivagem de objeto
Tipo de Relação: Dependência
As defesas no Rorschach (Chabert,
2020):
Visam proteger o Eu das exigências pulsionais (p. 177). As defesas alimentam o
conflito, ao mesmo tempo em que tendem eliminar os conflitos psíquicos.
O objetivo final dos processos defensivos é amenizar a angústia, embora as defesas
não atuem diretamente sobre a angústia, mas sobre o conflito.
No Rorschach, as defesas podem aparecer pelas manifestações verbais e não
verbais durante a passagem pelo método, mas também a certos fatores da cotação,
como a qualidade de uma resposta ou uma sequência associativa.
Chabert (2020) propõe a classificação das modalidades de defesa em: modalidades
rígidas, lábeis, pela via da inibição, narcísicas e projetivas...
As Defesas Rígidas

RESUMO: Utilizam-se preferencialmente pelas qualidades perceptivas do

material. Visam evitar ou minimizar o surgimento de elementos da
realidade interna. São permeadas pela expressão de justificativas e
racionalizações objetivantes (Chabert, 2020, p 177).

O QUE INDICAM QUANTO A ESTRUTURA:

Geralmente, indica uma neurose obsessiva, desde que a angústia de
castração esteja presente.
As Defesas Rígidas: VERBALIZAÇÃO.
- PRECAUÇÕES VERBAIS: “Poderia ser..”; “Se olharmos bem atentamente”; “A rigor, eu poderia ver isto”.

- DÚVIDAS, BEM MARCADAS PELA RUMINAÇÃO: “Eu não tenho certeza se é bem isto”; “Isso não está perfeito, mas..”

- O APEGO AS MÍNUCIAS DAS MANCHAS SE EXPRIME NOS COMENTÁRIOS, independente do modo de apreensão. Mesmo em
respostas globais, há uma expressão detalhada das partes que foram o todo.

- As precisões numéricas são raras, mas aparecem acompanhadas de uma tentativa de decomposição escrupulosa de certos elementos do
material.

- DENEGAÇÃO: tanto da representação suscitada internamente, quanto do percebido externamente: “Isto não está claro”; “Eu não vejo bem”.

- FORMAÇÕES REATIVAS: Remetem a polidez, a deferência. “Obrigado”; “Esta é bem organizada, bem clara, bem ordenada”

ASPECTOS GERAIS: Verbalização é altamente específica, carregada, termos “emprestados”, caracterizada por um ir e vir, ausência de posição
clara. A produção pode ser abundante (Número alto de respostas), apesar do aspecto geral dos comentários estar a serviço evitar representações e
sobretudo afetos ligados a estas representações. .
As Defesas Rígidas: FATORES ESPECÍFICOS.
- F% elevado: Formalização é excessiva, muita descrição, foco é nos contornos externos.

- Numerosos F+/-: Dúvida, medo de engajamento, falta de posição clara e determinada.

- TRI e respostas sensoriais são pouco numerosas. Luta contra a emergência dos afetos. K >
Somatório de Cor, embora os dois lados não sejam muito números (F% elevado).

- Intelectualização é indicada pela combinação de G secundárias, de determinantes

cinestésicos e conteúdos específicos (Art, Geo, Abst..)

- O excesso de um tipo de apreensão, G, D ou Dd, está serviço da sustentação dos processos

puramente perceptivos e contenção dos movimentos pulsionais internos.
As Defesas Rígidas: AS RESPOSTAS E SEQUÊNCIA DAS
RESPOSTAS.
- DENEGAÇÃO: “Alguma coisa menos uma águia... nem é um raptor, é algum
pássaro menos agressivo”

- ISOLAMENTO: “Dois cachorros prestes a... Não, não os vejo,... O vermelho,

manchas.... de sangue

- DÚVIDA E HESITAÇÃO ENTRE DUAS IMAGENS: “Dois personagens,

do sexo masculino ou duas mulheres, Não penso mais em personagens
masculinos, mas, usam sapato alto.. Então seria mais personagens femininos.
As Defesas Lábeis

RESUMO: Emergência lábil dos afetos que indica uma valência defensiva
contra as representações (Chabert, 2020, p 178).

O QUE INDICAM QUANTO A ESTRUTURA:

Geralmente, indica uma estrutura histérica, desde que a angústia de
castração esteja presente.
As Defesas Lábeis: VERBALIZAÇÃO.
- REATIVIDADE IMEDIATA AS MANCHAS E COMENTÁRIOS SOBRES ELAS: “Nossa!”

- LABILIDADE DA LINGUAGEM: Precipitações, associações por contiguidade ou por consonância, jogos de palavras.

- DRAMATIZAÇÃO: Caracteriza-se por um excesso de verbalização, com expressões exageradas de prazer e desprazer. “Isto que você me
mostrou é horrível”: “Agradabilíssima esta imagem. Linda”

- LABILIDADE E CONTRASTE EMOCIONAL ACOMPANHA O CLIMA DAS MANCHAS: Comentários negativos nas pranchas preto e
brancas, comentários positivos nas pranchas pastéis (VIII;IX X)

- RECALCAMENTO: indicado pela ênfase O “NÃO SABER”, SOBRE A FALTA DE IMAGINAÇÃO OU DE INSPIRAÇÃO. “Nossa,
não sei, acho que não estou muito inspirado hoje”.

ASPECTOS GERAIS: O recalcamento, típico de alguns protocolos lábeis, sobretudo o dos histéricos, aparece tanto na verbalização, como na
cotação, conforme veremos a seguir.
As Defesas Lábeis: FATORES ESPECÍFICOS.
- APREENSÃO GLOBAL, VAGA OU IMPRESSIONISTA: Outro indício do recalcamento. A resposta é dada mais pela
sensação suscitada do que pela exploração do material.

- TRI EXTRATENSIVO: Afetos e emoções são colocados a frente da representação para evita-la.

- SUGESTIONABILIDADE: Traduzida pela alta sensibilidade as variações do estímulo, em particular as mudanças de cor.

- F% baixo ou na média: Grande reatividade subjetiva.

- F+% Baixo ou próximo a média: Os F- são dinâmicos nas histerias, e traduzem uma relaxamento das defesas e emergência de
processos primários.

ASPECTOS GERAIS: G% alto; Gv% e Gimp% elevado; TRI= K<∑C; F% nunca é elavado; F+% abaixo da média quase
sempre. Distinguir os F- entre os F- bizarros ou F- dinâmicos.
As Defesas Lábeis: AS RESPOSTAS E SEQUÊNCIA DAS
RESPOSTAS.
- RECALCAMENTO: RECUSA OU DIFICULDADE DE FORNECER
RESPOSTAS NAS PRANCHAS DE TEMÁTICA SEXUAL (II; III; IV; VI;
VII)

- DENEGAÇÃO FUNCIONA CONTRA A EMERGÊNCIA DE CERTAS

REPRESENTAÇÕES, sobretudo as sexuais.

- EROTIZAÇÃO DAS RELAÇÕES é colocada em cena por meio de

respostas cinestésicas: “Uma mulher dançando tango entre dois
homens”; “Um casal se beijando”; “Dois pássaros namorando”.
As Defesas pela Inibição
RESUMO: Número de respostas restrito, poucos comentários, pouca utilização do “eu”, longos tempos de
latência, precauções verbais, recusas de prancha, silêncios longos, processos de apoio, respostas corporais de
ansiedade (sudorese), atitude de “petrificação”, busca de apoio do clínico, banalidades aumentadas (Chabert,
2020, p 180).

O QUE INDICAM QUANTO A ESTRUTURA:

Geralmente, em casos marcados por mecanismos fóbicos ou pela dificuldade de mentalização. Pode indicar
neuroses ou casos limite. Pessoas resistentes ao processo de testagem, ou que estão sentindo-se ameaçadas
pelo exame, o que pode remeter tanto a questões situacionais quanto estruturais.
As Defesas pela via da inibição: VERBALIZAÇÃO.
- POUCOS COMETÁRIOS.

- POUCA UTILIZAÇÃO DO PRONOME “EU”

- MÍMICAS, SORRISOS DE ANGÚSTIA, SUDORESE.

- POBREZA DAS ASSOCIAÇÕES.

As Defesas pela via da inibição: FATORES ESPECÍFICOS
- MODOS DE APREENSÃO SÃO DEMASIADAMENTE DEPENDENTES DAS
QUALIDADES ESTRUTURAIS DAS MANCHAS (COMPACTAS, DISPERSAS).

- F% ELAVADO, com MUITO F+/-: Dificuldades de implicação, dificuldade de afirmar

posições.

- TRI e Fc pouco expressivos.

- Reatividade sensorial é específica ao escuro (Clob, C´, E): Indicativos de traços de angústia
e sofrimento depressivo.
As Defesas pela via da inibição: RESPOSTAS E
SEQUÊNCIA DE RESPOSTAS.
- NEUTRALIDADE DOS PERSONAGENS HUMANOS: DUAS PESSOAS;

- MINIMIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS PROJETIVOS: Ações tem pouca

precisão.

- Evitação de localizações particulares (D vermelho, lacunas intramaculares, certos

apêndices)

- Muita banalização, imagens estereotipadas servem de escudo contra uma

expressão mais espontânea.
As Defesas Narcísicas

RESUMO: Defesas que lutam contra toda representação que pode suscitar uma
confrontação perante a autossuficiência, pela idealização e congelamento pulsional, e
perante a perda de objeto (“Se eu depender apenas de mim mesmo, não preciso sofrer
pela perda de amor do outro”) (Chabert, 2020, p 178).

O QUE INDICAM QUANTO A ESTRUTURA:

ESTRUTURAS NARCÍSCAS OU FUNCIONAMENTOS MUITOS MARCADOS POR
DEFESAS NARCÍSICAS.
As Defesas Narcísicas: VERBALIZAÇÃO e ASPECTOS
QUALITATIVOS.
- CENTRAÇÃO NARCÍSICA: As referências frequentemente dizem a respeito
ao próprio sujeito. Cenas um personagem ocupa o centro, desde que haja um
congelamento pulsional.

- REJEIÇÃO AO TESTE OU DA SITUAÇÃO DE TESTAGEM.

- PROJEÇÕES PERMEADAS POR IDEALIZAÇÃO E

DESIDELIZAÇÃO: Permeadas de posições rígidas, inteiras, sem nuances,
congeladas na construção do UM.
As Defesas Narcísicas: FATORES ESPECÍFICOS
- F% e F+% elevados: O sobreinvestimento dos contornos assegura as fronteiras entre o
dentro e o fora.

- Ênfase na simetria: Movimentos centrípedos e negação da diferença.

- Sobreinvestimento dos C´, principalmente ao branco extramacular pelo recurso a periferia, a

superfície, que visa proteger o sujeito da emergência da pulsão.

- H neutros: Sem identificação sexual, frequentemente investidos na sua função (Advogado,

imperador), com valência idealizada ou desidelizada. (H) numerosos.

- Respostas Pele.
As Defesas Narcísicas: RESPOSTAS E SEQUÊNCIAS DE
RESPOSTAS.
- K especulares nas pranchas bilaterais (Par ou Reflexo): “Alguém que se

olha no espelho”

- K narcísicas a-relacionais: “Um rei sentado em seu trono”.

As Defesas Projetivas

RESUMO: Protocolo marcado por um excesso de projeção, que se sobrepõe

sobre os processos perceptivos, de modo a revelar uma “rejeição” da realidade.

O QUE INDICAM QUANTO A ESTRUTURA:

ESTRUTURAS PSICÓTICAS OU ESTADOS PSICÓTICOS AGUDOS.
As Defesas Projetivas: ASPECTOS QUALITATIVOS E
VERBALIZAÇÃO.
- Desconfiança; extrema vigilância e reticência pode revelar um luta contra a

angústia penetrante e persecutória.

- Respostas mais interpretativas que perceptivas.

- Prolixidade, multiplicação de respostas, verbalização abundante,

neologismos: Indicadores de manifestações bizarras.

As Defesas Projetivas: FATORES ESPECÍFICOS
- Emergência do processo primário: Avaliar se pontuais ou reiteradas.

- Falha do D% e do F+%, sem a compensação do F+%extendido: A má qualidade compromete o ancoragem na realidade.

- K interpretativos, delirantes e desrealizantes.

- TRI marcado pela predominância de respostas de C pura.

- Conteúdos poucos socializados: Ausência e pouca frequência de banalidades, H, A. Muitas (H), (A), Hd, Ad e Anat

- Ausência de reatividade afetiva as variações formais e cromáticas da pranchas.

- Perseverações.

- Contaminações verdadeiras
• Um trabalho de articulação entre a análise dos conflitos e a organização
defensiva constitui o cerne da apreciação diagnóstica.

• Um trabalho de síntese é necessário para situar a dinâmica conflitual, a

natureza da angústia e os processos de defesa.
REFERÊNCIAS:

Bergeret, J (2000). O normal e o patológico. Climepsi.

Chabert, C (1998). A clínica do Rorschach no adulto. Climepsi.

Chabert, C et al. (2020). Manuel du Rorschach et du TAT: Interprétation psychanalytique. Dunod.

Fenichel, O (1981). Teoria geral das neuroses. Atheneu.

Freud, S (1996). Neurose e Psicose. In. Edição Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud.
Imago. Originalmente publicado em 1924.

Freud, S (1996b). A perda da realidade na neurose e psicose. In. Originalmente publicado em 1924.

Freud, S (1996). Análise terminável e interminável. In. Edição Brasileira das Obras Completas de
Sigmund Freud. Imago. Originalmente publicado em 1937.