Você está na página 1de 34

INTERNATIONAL BIOCENTRIC FOUNDATION

CURSO DE FORMAÇÃO DOCENTE DE BIODANZA

ASPECTOS PSICOLÓGICOS
DE BIODANZA

Prof. Rolando Toro


Biodanza

ASPECTOS PSICOLÓGICOS
DE BIODANZA

Sumário

Introdução 3
Antecedentes Psicológicos de Biodanza: Freud, Jung, Reich, Bachelard, Fornari,
Rogers, Hillman 3
Escala de Desenvolvimento do Instinto à Emoção 5
Teoria dos Instintos 6
Biodanza: O Resgate dos Instintos 10
Vinculação com as Fontes Originárias da Vida 11
Auto-avaliação segundo o Esquema dos Instintos 11
Emoções: para uma Fenomenologia das Emoções 12
Origem Biológica e Desenvolvimento Primal das Emoções 13
O Córtex Cerebral e a Região Límbico-Hipotalâmica 13
Centros Neurológicos das Emoções 14
Experiências sobre Emoção e Expressão 15
Estudos Antropológicos 16
Neurofisiologia e Psicologia das Emoções 18
Psicologia das Emoções 19
Expressão das Emoções em Psicoterapia 20
Modelo Multidimensional das Emoções de Robert Plutchik 22
A Expressão das Emoções pelo Pranto 23
Sorriso Verdadeiro e Sorriso Falso 23
Respostas Psicossomáticas às Emoções 25
Centros Cerebrais das Emoções 26
Efeito das Emoções sobre a Saúde 26
Emoção e Enfermidades Psicossomáticas 27
Considerações Antropológicas sobre a Agressividade e a Violência 29
Reflexões sobre Emoções e Ecologia 33
Expressão de emoções em Biodanza 35
Bibliografia 35

Copyright by Rolando Toro

2
INTRODUÇÃO

Biodanza apresenta uma perfeita continuidade com as ciências humanas: Biologia, An-
tropologia, Etologia e Psicologia.
Biodanza, portanto, não é uma técnica "alternativa", mas sim uma extensão das ciências
humanas tradicionais.
Incorporei à teoria da Biodanza os importantes aportes de Sigmund Freud, C.G. Jung,
Wilhelm Reich, Hillman, Eibl-EIbesfeldt. Ao mesmo tempo, integrei as novas concepções de
Edgar Morin, Ilya Prigogine, Henry Atlan, David Bohn, Frijof Capra, Francisco Varela,
Humberto Maturana, René Thom e outros.
Biodanza não tem compromissos ideológicos e/ou religiosos ou mágicos. Suas bases
usam procedimentos científicos. Estou de acordo com Carl Sagan de que a ciência é uma dis-
ciplina que possui em si mesma a capacidade de corrigir erros.
Os estudos sobre instintos e emoções se apoiam em investigações realizadas por reco-
nhecidos pensadores contemporâneos.

ANTECEDENTES PSICOLÓGICOS DE BIODANZA: FREUD, JUNG, RE-


ICH, LACAN, BACHELARD, FORNARI, ROGERS, HILLMAN
a. O grande holograma da psicologia contemporânea

O desenvolvimento da Psicologia não depende de determinadas correntes do pensamen-


to psicológico, mas da integração delas.
Muitas vezes me perguntaram se sou freudiano, reichiano ou lacaniano. Biodanza não é
uma concepção isolada do contexto da Psicologia atual.
A teoria de Biodanza se nutriu de muitas ideias geniais sobre psicogênese, embriologia
da conduta, psicanálise, psicossomática, psicologia da identidade, psicologia da expressão,
etc. O importante não é a tendência ou metodologia de determinadas escolas psicológicas,
mas a integração das ideias-forças que surgiram sobre o ser humano, sobre a dinâmica de seu
psiquismo e de seu comportamento.
A imagem do ser humano atual não é obra de um só pensador, mas de uma verdadeira
constelação de cientistas, filósofos, antropólogos e artistas geniais que fecundaram recipro-
camente as ideias uns dos outros.
Biodanza, a partir do “Princípio Biocêntrico”, encontra inspiração e confirmações teóri-
cas em uma infinidade de pensadores. As ideias de Inconsciente Pessoal, de Freud, e de In-
consciente Coletivo, de Jung, estão profundamente relacionadas com a ideia de Inconsciente
Vital que é proposta por Biodanza.
As proposições de Freud e Reich sobre repressão sexual constituem um sistema comple-
to, apesar de suas diferenças.
As noções de Reich acerca da importância das emoções e sua influência sobre as ten-
sões musculares e viscerais estão vinculadas às concepções de F. Dumbar, Franz Alexander e
Fornari em Psicossomática, e estas, por sua vez, com as ideias de Schavelson e Fornari sobre
a etiologia psicológica do câncer.
O conceito de Continente Estruturado, de Bion, se relaciona com as ideias de René Spitz
sobre as doenças psicotóxicas por carência afetiva. Fornari, com a concepção do código ma-
terno, Rof Carballo, descrevendo a regulação córtico-hipotalâmica, e Spitz, com seu aporte
sobre Hospitalismo, descobrem a importância da afetividade no comportamento celular.

Estes autores, junto com Lopez Ibor, que realça a importância do humor endógeno no
psiquismo global e nas neuroses, inspiraram a concepção sobre Inconsciente Vital, o psiquis-
mo das células.

3
Jung e Hillman se orientam para o estudo profundo do psiquismo arquetípico e dos refe-
renciais eternos da alma humana.
Lacan, Piaget e Arnold Gesell se complementam com suas ideias sobre o desenvolvi-
mento da identidade, apesar de suas diferenças. Lacan, através de suas ideias de evolução da
identidade em relação à linguagem da autoimagem e da autoestima, se vincula com psicólo-
gos como Adler, Fischer e Gessel.
Todos os autores citados se integram nas poderosas concepções sobre expansão de
consciência de Albert Hofmann, Aldous Huxley, Stalislav Grof e Claudio Naranjo.
Esta reflexão sobre a fecundidade do pensamento contemporâneo e a rede de seus cria-
dores é muito incompleta. Desejamos somente que se compreenda que a imagem do ser hu-
mano, tal como é desenhada hoje em dia, é um holograma de ideias geniais relacionadas umas
com as outras, e que o Modelo Teórico de Biodanza, a Teoria do Inconsciente Vital e o Prin-
cípio Biocêntrico constituem um desenvolvimento natural deste holograma.
Biodanza, portanto, não é uma disciplina alternativa, mas sim uma extensão das Ciên-
cias Humanas.

b. Freud e o modelo teórico das três instâncias psíquicas

O Modelo Teórico de Freud das três instâncias psíquicas permitiu a investigação das
neuroses e a compreensão dos mecanismos de defesa.
O impulso instintivo se manifesta como o desejo primordial. Este impulso foi denomi-
nado “Ego”. O “Ego” é reprimido pelas normas sociais introjetadas desde a infância, criando-
se assim um conflito psíquico entre o instinto e a força repressora, chamada por Freud “Super
Ego”.
Frente a esta separação entre “Ego” y “Super Ego”, vai se estruturando lentamente o
“Eu”, cuja função é a de modular e adaptar estas duas forças ao “Princípio de Realidade”.
Desta maneira, o instinto pode chegar a encontrar caminhos para expressar-se.
Quando o “Eu” não consegue a adaptação ao real, a força do “Super Ego” triunfa com
seu poder repressor e a pessoa envia seus medos e frustrações ao inconsciente, dando origem
a sintomas neuróticos.

Princípio de Realidade
Ego/Eu

Id Super Ego
(Impulsos) (Repressão)

Princípio do Prazer

Fracasso do Eu

Neurose

4
c. Wilhelm Reich

Wilhelm Reich deu ao “Ego” uma localização corporal. Estendeu o conceito de “Super
Ego” ao campo da repressão político–social. O efeito da repressão foi considerado por Reich
como a causa das doenças psicossomáticas e das tensões musculares.
O inconsciente, para Reich, é o corpo e os órgãos.
A importância de Reich é a de haver dado dimensão corporal ao inconsciente e de ter
localizado a repressão dos instintos e das emoções nas tensões musculares (couraça muscu-
lar).
Reich denunciou, em seu livro “A Função do Orgasmo”, a repressão que exercem os
sistemas totalitários sobre a sexualidade como forma de domínio sobre as pessoas. O mesmo
esquema pode ser aplicado em Biodanza para compreender o conflito entre instinto e repres-
são.

d. A concepção de Biodanza

Dentro da concepção teórica de Biodanza, o instinto é, na realidade, uma rede orgânica


de impulsos hereditários destinados à auto-conservação. Não se trata somente do instinto se-
xual, mas de todos os instintos, cuja função é a conservação da vida.
O instinto de conservação é anulado pelas concepções militaristas. O instinto alimentar
é destruído pelos hábitos de alimentação criados pela publicidade e pelo consumo de alimen-
tos adulterados. O instinto de ninho ou caverna é destruído pela construção de cidades com
base na perversão do espaço por causa da economia, etc.
A repressão não é só a das normas morais introjetadas ou das estruturas político-sociais,
mas por toda uma cultura dissociativa que se perpetua através da História.
Dissociação corpo–alma, dissociação sagrado–profano, matéria–energia, homem–
natureza, etc.
A noção freudiana do Eu “diplomático” se transformou em um espectro individualista,
perverso, estéril e oportunista que, em Biodanza, é substituído pela “identidade” em sua ex-
pressão afetiva e criadora.

ESCALA DE DESENVOLVIMENTO DO INSTINTO À EMOÇÃO


As emoções e os sentimentos são o resultado de uma elaboração neurológica cada vez
mais complexa dos impulsos instintivos.
1 - Os instintos são impulsos inatos que, ao pôr-se em contato com os estímulos exterio-
res, geram as protovivências do recém-nascido.
2 - As protovivências, mais tarde, evoluem e dão origem a vivências altamente diferen-
ciadas. As vivências são estados cenestésicos intensos que têm a característica do aqui-agora,
mas que influem nos processos de autorregulação.
3 - As emoções são impulsos de origem instintivo que promovem ações de aproximação
frente às circunstâncias agradáveis, e de rechaço e fuga frente a situações desagradáveis. As
emoções possuem expressão e padrões motores diferenciados em dimensões neurovegetati-
vas, endócrinas e imunológicas. As emoções agradáveis são a alegria, a felicidade, o erotismo,
a paz. As emoções desagradáveis são a raiva, o medo, os ciúmes, a angústia.
4 - Os sentimentos estão constituídos por conjuntos complexos de emoções que têm du-
ração no tempo, possuem componentes simbólicos e elementos de consciência.
Em ordem de complexidade, o desenvolvimento instintivo tem evolução até a consciên-
cia:
1 - Instintos; 2 - Protovivências; 3 - Vivências; 4 - Emoções; 5 - Sentimentos.

5
TEORIA DOS INSTINTOS

“O instinto nunca atua como uma fonte impulsiva momentânea, mas sempre como uma
força constante. Não provindo do mundo exterior, mas do interior do corpo, é inútil fugir de-
le”.
(Sigmund Freud)
Definição
O instinto é uma conduta inata hereditária que não requer aprendizagem e que se desen-
cadeia frente a estímulos específicos. Sua finalidade biológica é a adaptação ao meio para a
sobrevivência da espécie.
Segundo Darwin, uma conduta é instintiva desde o momento em que se realiza sem ex-
periência prévia e é repetida por um grande número de indivíduos da mesma espécie.
De acordo com Mac Dougall, o instinto é uma disposição psicofísica herdada inata que
determina que o indivíduo perceba certos objetos específicos que o impulsionam a atuar de
uma forma precisa frente a eles.
Mac Dougall propõe que toda conduta, inclusive a conduta social do homem, é explica-
da em termos de impulsos inatos. Algumas investigações demonstraram que a conduta pode
ser seriamente influenciada pela aprendizagem de padrões culturais.
Skinner chegou a negar a importância do instinto. Os psicólogos culturalistas foram es-
pecialmente influenciados pela investigação antropológica de Margaret Mead, que observou
enormes diferenças de comportamento em tribos primitivas, de acordo com o contexto cultu-
ral de cada povo, minimizando as bases instintivas universais do comportamento humano.
Somente as pesquisas de etólogos modernos, como Vitus B. Droscher, Eibl-Eibesfeldt e
Konrad Lorenz, esclareceram, através de pacientes observações, que os instintos possuem
uma poderosa influência no comportamento, embora a aprendizagem e a experiência modifi-
quem esses impulsos de diversas maneiras.
Segundo a abordagem de Biodanza, a cultura obstrui, desorganiza e perverte os instin-
tos, dando origem à patologia social e individual. Nossa tarefa mais urgente é resgatar a base
instintiva da vida e buscar orientação nestes impulsos primordiais.
Existe um medo generalizado com respeito à liberação dos instintos e, ainda mais, uma
atitude de violência frente a qualquer manifestação do primitivo. Minha abordagem é a de
salvar esta selva interior e realizar, não apenas uma ecologia da mente, mas uma ecologia dos
instintos. É necessário olhar as manifestações instintivas sob a perspectiva biológica de exal-
tação da vida e da graça natural.
Organizei, sistematicamente, em um esquema, os instintos e suas interações com base
em dados etológicos e neurofisiológicos. Os instintos constituem uma rede sistemática com
representação bioquímica e efeitos comportamentais que se projetam sobre o estilo de vida.
A aprendizagem pode permitir a manifestação dos instintos ou obstruí-los, perverte-los
ou desorganizá-los.
A obstrução dos instintos consiste em impedir suas manifestações.
A perversão é o desvio do sentido biológico do instinto.
A desorganização é a dissociação caótica dos instintos.
Esta concepção sistêmica dos instintos considera não somente a inter-relação entre eles,
mas também suas formas orgânicas de autorregulação.
O instinto básico se relaciona com o impulso de sobrevivência e, em íntima relação com
este, se organizam os outros instintos.
O instinto de sobrevivência e conservação da vida se relaciona dinamicamente com a
força da identidade. É nesse ponto onde esta concepção dos instintos se vincula com o modelo
teórico de Biodanza e com o Princípio Biocêntrico formulados por mim.

6
A evolução individual não se baseia nos rendimentos alcançados dentro de nossa cultu-
ra, mas sim no desenvolvimento e integração dos cinco canais de expressão do potencial ge-
nético: vitalidade, sexualidade, criatividade, afetividade e transcendência. O processo de
integração induz estados de plenitude. Estes estados permitem ao ser humano transcender sua
própria programação filogenética sem trair os germens da vida.
O futuro não está completamente contido no passado. O potencial genético é uma força
ativa que pertence ao presente e possui um dom de gênese atual.
A transcendência consiste em criar mais vida a partir da vida.
Contrariamente ao que sustenta a grande maioria dos místicos orientais e ocidentais que,
para alcançar o estado supremo de conexão com o divino, é necessário abandonar os instintos
e negar o corpo, nossa abordagem sustenta que não há possibilidade alguma de evolução e
transcendência quando se trai as forças que conservam a vida e que a nutrem.
A transcendência não consiste em “transcender o corpo” ou dominar os instintos mas
sim permitir que se manifestem como hierofanias.

Expressão genética dos impulsos


Denominaremos “impulsos inatos” a certas linhas de forças organizadoras da conduta
que, partindo do potencial genético, possuem aparentemente um caráter teleonômico destina-
do a conservar a vida e canalizar a expressão dos potenciais genéticos. O termo “instinto” foi
desvirtuado por uma Psicologia sem antecedentes biológicos. Os impulsos inatos (ou instin-
tos) constituem verdadeiros “mandatos biocósmicos” que estruturam, através da vida, as mo-
tivações existenciais.
A Psicologia, a partir de John B. Watson, fundador do condutivismo, atacou vigorosa-
mente a doutrina dos instintos e sustentou que o comportamento é organizado amplamente pe-
la aprendizagem. Margaret Mead e Ruth Benedict, através de seus estudos antropológicos em
povos primitivos, concluíram que não há evidências para pensar na existência de motivações
humanas universais. Veremos mais adiante que estes autores não conseguiram compreender a
raiz biológica de padrões de resposta social aparentemente tão diferentes.
Murphy (1954) sustentou que o número e a variedade de motivos sociais específicos
manifestados no comportamento humano são virtualmente infinitos e que a matéria prima do
comportamento humano não são os instintos, mas a cultura. Estes autores são os representan-
tes de uma filosofia antropocêntrica caduca e superficial. Os impulsos inatos chamados instin-
tos estruturam, na realidade, o desenvolvimento nos sistemas vivos e, através deles, se expres-
sam os potenciais humanos.
Os estudos etológicos de Eibl-Eibesfeldt e Konrad Lorenz dão fortes evidências de que
tais diferenças culturais são aparentes.

Bipolaridade dos Instintos


Os instintos apresentam, frequentemente, aspectos complementares entre si, o que torna
possível sua autorregulação. Assim, por exemplo, o ato de succionar o peito materno do bebe
com fome, estimula o fluxo de leite na mãe em um verdadeiro sistema complementar de re-
flexos neuroendócrinos. No homem, o impulso de penetração genital é complementar com o
desejo que a mulher sente de ser penetrada.
É como se existisse um pacto prévio nos organismos para conectar-se sem experiência
anterior.
As relações entre os instintos são complexas e possuem um caráter sistêmico.
Muitos instintos têm seus opostos complementares. A bipolaridade dos instintos é, em
realidade, uma expressão da lógica da vida, que permite resolver problemas de adaptação em
uma escala muito ampla. Assim, frente a um perigo, o animal tem várias opções: luta, fuga ou
reflexo de imobilidade.

7
Há um hábito cultural de associar o instinto ao irracional; sem dúvida, a função instinti-
va revela uma forma de inteligência cósmica que possui sua própria lógica. O comportamento
instintivo possui uma infraestrutura neuroendócrina de grande precisão.

Aspectos instintivos bipolares e complementares


Migratório Regressivo
Territorial, guarida, caverna, ninho Exploratório
Curiosidade, busca de estímulos novos Necessidade de Regularidades
Sedução, exibição Ocultamento, mimetismo
Fome Saciedade
Luta Fuga
Gregário Isolamento
Repouso Atividade

Características dos Instintos


Os instintos são:
1) Inatos: As condutas instintivas se realizam sem aprendizagem, mas se reforçam com
a experiência. Os instintos estão programados geneticamente para a sobrevivência.
2) Invariáveis: Possuem pautas fixas e são executados sempre nas mesmas formas e se-
qüências.
3) Específicos: São compartilhados por todos os membros da espécie e, às vezes, por
espécies afins.
4) Involuntários: São desencadeados ante certos estímulos externos ou internos, como
respostas adaptativas.
5) Seqüenciais: Continuam até sua consumação, mesmo na ausência do estímulo que o
provocou.
6) Diferenciados: Possuem uma estrutura mais complexa que um simples reflexo con-
dicionado, mas a fronteira é imprecisa no caso de cadeias reflexas de certa complexi-
dade.
7) Função de sobrevivência: Têm um sentido de sobrevivência para o indivíduo e para
a espécie. Todos os instintos se organizam em torno ao de conservação da vida.
8) Autorregulados: A força do impulso instintivo diminui na medida em que se satis-
faz. A autorregulação dos instintos tem base orgânica. Por esta razão, não existe pe-
rigo na liberação dos instintos.

8
9
BIODANZA: O RESGATE DOS INSTINTOS
A parte instintiva do ser humano foi fortemente reprimida através da história pelas reli-
giões e ideologias. Não obstante, os instintos têm a função de conservar a vida e permitir seu
desenvolvimento.
A repressão dos instintos trouxe como consequência o deterioramento dos estilos de vi-
da e colocou a Humanidade em perigo de extinção. A decadência se observa em todos os âm-
bitos.
O instinto de conservação naufragou no meio das incitações à guerra e dos simbolismos
territoriais.
O instinto alimentar foi destruído pelas campanhas de propaganda de alimentos envasa-
dos.
A perversão do instinto alimentar se manifesta no aumento da obesidade e da anorexia.
O instinto sexual está condicionado pelo puritanismo e pelo medo. A relação entre ho-
mens e mulheres é cada vez mais dramática. O instinto de ninho, de caverna, de lar, foi perdi-
do pela intromissão da TV nos lares e pela falta de motivação para o aconchego do lar. O ins-
tinto de luta degenerou em massacres totalitários, terrorismos e violência urbana.
O instinto de solidariedade intra-espécie desaparece com as políticas do individualismo
anglo-saxão e as economias neoliberais. O ressentimento social e a solidão são as expressões
de um capitalismo selvagem.
A progressiva e implacável aniquilação dos instintos na civilização contemporânea de-
rivou para a destruição ecológica do ar, do mar e da terra com suas florestas.
A extinção das espécies animais devido à capacidade do homem é uma tragédia que se
volta contra o próprio homem.
A ideia de que os instintos são perigosos provém da tendência humana, manifesta nas
religiões orientais e ocidentais, de regular o comportamento espontâneo e amortecer a vitali-
dade para dar aceso ao crescimento "espiritual". Não obstante, não há a menor possibilidade
de evolução até o divino sem a base instintiva da vida.
O problema é que os instintos podem facilmente perverter-se e gerar comportamentos
opostos à essência mesma do instinto. O instinto de conservação cria muitas vezes estruturas
paranóides e complexos de ameaça.
A necessidade de proteger o território cria extraordinária violência entre os povos, os
quais não optam geralmente por soluções pacíficas.
No fundo, trata-se de um subdesenvolvimento do sentimento de identidade. Os estra-
nhos se transformam em inimigos. A discriminação gera o ódio.
As propostas de Biodanza são:
1. Resgatar os instintos cuja função é a conservação da vida.
2. Dar às pessoas a oportunidade de comunhão e empatia.
3. Lutar contra as ideologias e os preconceitos.
4. Reforçar e expressar a Identidade e a segurança em si mesmo, eliminando os fatores
paranóides.
5. Devolver à consciência da Humanidade o sentido de Sacralidade da vida.
6. Aumentar a consciência ética cuja fonte é a inteligência do coração.
O resgate dos instintos deverá ser no futuro a tarefa essencial para criar uma Civilização
para a Vida.
Foram os trabalhos de Lorenz, Tinbergen, Eibl-Eibesfeldt e Droscher que tornaram pos-
sível a fundamentação de uma Ecologia Humana, acabando com a disputa entre “instintivis-
tas” e “culturalistas”.
Muitas ações instintivas são reforçadas por estados internos como fome, sede, necessi-
dade sexual. Nestes casos os estímulos do ambiente são selecionados pelo animal em relação
com a necessidade. Como o ambiente se modifica constantemente, as solicitações mudam e os

10
animais devem modificar adaptativamente seu comportamento através da experiência para
sobreviver.
Para realizar modificações profundas da expressão instintiva, o Projeto Minotauro (uma
extensão de Biodanza) cria um ambiente com solicitações extremas, de estimulação instintiva.
A ação estimuladora se realiza através de “desafios”, no nível motor arcaico, no nível receptor
(como mecanismos de desencadeamento inato), no nível dos impulsos endógenos viscerais e,
finalmente, nas disposições inatas para a aprendizagem.

VINCULAÇÃO COM AS FONTES ORIGINÁRIAS DA VIDA


Reparentalizar, voltar à origem, recuperar a criança livre, conectar-se com a energia
cósmica, recuperar o orgasmo, são algumas das propostas da moderna intuição em Psicotera-
pia.
Superando os eufemismos, creio que devemos reencontrar o significado do conceito de
instinto e restabelecer seu valor para a terapia, a Antropologia e a Educação.
É grotesco que em um hospital psiquiátrico estejam mais preocupados com o processo
de socialização dos enfermos através de grupos operativos que em cuidar-lhes a dentadura e
melhorar sua alimentação (instinto de fome), facilitar-lhes as relações sexuais e amorosas
(instinto sexual), oferecer-lhes uma privacidade mínima (instinto de guarida), etc..
Também é surpreendente a insensibilidade dos sistemas de educação que, em lugar de
restaurar os instintos, estão preocupados em reforçar as aptidões cognitivas e a percepção
simbólica e abstrata.

AUTO-AVALIAÇÃO SEGUNDO O ESQUEMA DOS INSTINTOS

INSTINTO 1 2 3
1- ALIMENTAR
2- MATERNAL, ALTRUÍSTA
3- SEXUAL
4- SEDUÇÃO, ENFEITE, EXIBIÇÃO, GUARIDA
5- GUARIDA
6- MIGRATÓRIO
7- LUTA - FUGA
8- EXPLORATÓRIO, JOGO, CURIOSIDADE, AVENTURA, DESAFIO
9- GREGÁRIO, SOLIDARIEDADE, SINTONIZAR COM OS OUTROS
10- EQUILÍBRIO, PAZ, REPOUSO
11- AUTOCENTRISMO
12- FUSÃO

AS EMOÇÕES: PARA UMA FENOMENOLOGIA DAS EMOÇÕES


Se é certo que existem padrões básicos de resposta emocional, tais como alegria, triste-
za, amor, ódio, medo, as emoções no ser humano se dão quase sempre combinadas e alcan-
çam uma grande complexidade. Toda resposta emocional é uma gestalt, que tem estrutura, in-
tensidade, matizes, coloridos e significações próprias.
A literatura, a pintura, a poesia, a música são capazes de suscitar vivências sumamente
complexas e sutis, de uma grande intensidade. Um poema, uma canção, podem arrancar lá-
grimas. Um conto pode provocar pavor, gargalhadas ou insondáveis sentimentos de mistério.

11
Na pintura está toda a iconografia das paixões, instintos e emoções humanas. Bruegel, Jerô-
nimo Bosch, Dürer, Leonardo da Vinci, Rembrandt, Goya, revelaram - junto com seu gênio
pictórico - a mais profunda penetração psicológica do ser humano.
As emoções possuem sempre várias dimensões. O ódio, por exemplo, pode ir unido ao
desespero. O abatimento, unido à dor. A surpresa pode ir combinada com pânico. O desejo,
com timidez, etc. Um mesmo sentimento de alegria pode ter qualidades muito diferentes. A
alegria eufórica que explode em uma festa, é uma forma completamente diferente da alegria
íntima que arranca lágrimas de felicidade. A alegria extática que suscita escutar “A paixão se-
gundo São João”, de Bach, é diferente da que provoca a visão do oceano ao amanhecer.
Os grandes gênios literários, poetas e novelistas, são quem melhor descreveram as emo-
ções.
O medo, com seus letais matizes e suas arrepiantes máscaras, foi descrito por Edgar Al-
lan Poe, Bradbury, Lovecraft. A angústia sem saída frente à malignidade humana foi expressa
por Kafka. As emoções sutis frente aos fatos cotidianos, a alegria ingênua, os temores sim-
ples, o pudor, estão nos contos de Katharine Mansfield. A paixão lésbica, com seus abismos e
seus prazeres, está genialmente descrita em “A Bastarda”, de Violette Leduc. O amor homos-
sexual em sua manifestação puramente sublime, não genital, em “Demian”, de Herman Hesse
e em “Morte de Veneza”, de Thomas Mann. O amor homossexual de um homem por uma cri-
ança, descrito por Oscar Wilde em “O sacerdote e o acólito”. Os tormentos da culpa estão ge-
nialmente tratados por Dostoievsky. As mais complexas emoções no trato das pessoas e a
compreensão profunda dos sentimentos reprimidos estão em “As ondas”, de Virginia Wolf. O
inquietante amor de um homem maduro por uma adolescente, em Nobokov.
O sentimento de fatalidade e de impotência frente ao destino, em Ésquilo. A alegria di-
onisíaca, em “As Bacantes”, de Eurípides.
Shakespeare foi um dos mais geniais visionários das paixões humanas. A malignidade, a
ambição, a vingança, em “Macbeth”. A revelação contra os desígnios do Universo depois de
haver perdido o poder e a gloria, em “O Rei Lear”. As dúvidas metafísicas, em “Hamlet”. O
amor puro de adolescente, em “Romeu e Julieta”. O amor não correspondido que, em seu des-
consolo, busca a loucura como único refugio, na divina Ofélia. Os ciúmes que levam ao as-
sassinato, em “Otelo”.
A lista de obras e autores seria interminável, mas sem dúvida a descrição e o testemu-
nho das paixões humanas, das emoções e sentimentos, foram realizados pelos gênios da litera-
tura e não pelos psicólogos, os quais, em geral, têm uma visão reduzida, simplista e superfici-
al do mundo das emoções.
A Psicologia apresenta um enorme vazio no estudo de sentimentos fundamentais, como
os de plenitude, fraternidade, desejo sexual, êxtase, intimidade, assombro e, consequentemen-
te, das vivências estética e mística.

ORIGEM BIOLÓGICA E DESENVOLVIMENTO PRIMAL


DAS EMOÇÕES
A opinião mais generalizada entre psicólogos e educadores é de que as emoções se es-
truturam na infância. As investigações de C. Bulher, Freud, René Spitz, Arnold Gessel, Ama-
truda, Bouldin, etc... dão fortes evidências de que a estrutura do mundo emocional se consoli-
da na primeira infância.
Sem dúvida, existe uma infraestrutura biológica situada na região límbico-hipotalâmica
do cérebro, que gera padrões viscero-musculares expressivos das diversas emoções.
As crianças que recebem continente afetivo e nutrição oportuna em sua primeira infân-
cia mielinizam perfeitamente as vias nervosas córtico-hipotalâmicas. Por outro lado, as crian-
ças abandonados por suas mães não conseguem completar essa etapa de maturação devido ao
esforço orgânico que é deslocado ao telencéfalo, região neurológica de vínculo externo.

12
Este fato constitui uma catástrofe psicológica irreversível que leva ao marasmo e à de-
pressão anaclítica. Se a criança sobrevive, terá tendência à depressão e/ou ao comportamento
psicológico.
As emoções de alegria, afeto, raiva, medo, tristeza, são moduladas pelo córtex cerebral.
A conduta flexível é modulada pelo lóbulo límbico (hipocampo, amígdala) e pelo hipo-
tálamo.
A estruturação neurológica da identidade depende do amor que a criança recebe em seus
primeiros anos de vida.
A consciência da identidade permite o desenvolvimento de emoções e sentimentos for-
tes e coerentes de vínculo afetivo.
A identidade débil gera estruturas emocionais caóticas que são fontes de insegurança
permanente.

O CÓRTEX CEREBRAL E A REGIÃO LÍMBICO-HIPOTALÂMICA


Os centros reguladores das emoções estão no interior do cérebro. Rof Carballo chamou
a este conjunto de estruturas neurológicas de “cérebro interior”. Abarca, principalmente, a re-
gião límbico-hipotalâmica e a amígdala.
As funções de fome e de saciedade, sexualidade e, em geral, dos instintos e emoções es-
tão reguladas por estes centros da região límbico-hipotalâmica.
O córtex cerebral tem uma ação inibidora destes centros dos instintos e da emoção.
Existe, sem dúvida, uma perfeita articulação entre o córtex cerebral e a região límbico-
hipotalâmica através de circuitos neurológicos.
O pensamento conceitual e a aprendizagem modulam as expressões emocionais. Esta
função moduladora do córtex pode muitas vezes transformar-se em uma força repressora das
emoções.
Biodanza estimula, através da música, da dança e de situações de encontro em grupo, as
funções límbico-hipotalâmicas (emoções) e evita, portanto, a atividade inibidora do córtex
(verbalização e análise) durante as vivências.

QUADRO: Na figura, a zona central, escura, representa o “mundo emocional”.

13
CENTROS NEUROLÓGICOS DAS EMOÇÕES
As reações frente a situações de prazer ou desagrado não são iguais em todos os indiví-
duos. Dependem de fatores genéticos e ambientais.
O cérebro combina emoções, lembranças e pensamentos para gerar uma resposta pesso-
al.
Os estímulos do mundo exterior se dirigem até distintas áreas cerebrais elaborando sen-
sações e percepções agradáveis ou desagradáveis e um tom afetivo particular. O sistema vivo
busca o prazer e foge do desprazer.
Através de sistemas experimentais de estimulação intracraniana foram ativadas áreas ce-
rebrais que produzem êxtase, tranquilidade e orgasmos repetidos.
Estes efeitos prazerosos são produto da liberação de uma substância chamada Dopamina
em uma região da base do cérebro denominada Substância Negra (núcleo acumbens).
A descoberta deste centro do prazer tem uma importância fundamental para compreen-
der o mecanismo da dependência a certas drogas. Drogas leves como a maconha e drogas pe-
sadas como a heroína atuam sobre o mesmo núcleo acumbens liberando Dopamina.
Outra estrutura nervosa fundamental do sistema límbico é a amígdala, a qual aumenta
sua atividade frente a situações desagradáveis.
A atividade da amígdala desencadeia reações de luta e fuga, gera ansiedade, faz bater o
coração com mais força e mais velozmente para levar sangue e oxigênio aos músculos, detém
a atividade do estômago e do intestino para economizar energia, dilata os brônquios e pul-
mões para incorporar maior quantidade de oxigênio. Assim, o indivíduo aumenta sua capaci-
dade para enfrentar perigos.
No homem, os mecanismos neurológicos dos centros de prazer e desprazer são modula-
dos pelo córtex cerebral, de modo que esteja capacitado para encontrar soluções refinadas e
adaptativas frente às dificuldades.

EXPERIÊNCIAS SOBRE EMOÇÃO E EXPRESSÃO


Um dos fenômenos mais interessantes relativo à relação entre o padrão de resposta fi-
siológica (expressão) e a experiência subjetiva das emoções é a possibilidade de desencadear
a emoção sem motivo real, ativando voluntariamente o padrão expressivo.
Assim, evocando a raiva, por exemplo, e realizando os gestos e uma forma de respira-
ção inerentes a essa emoção, é possível chegar a sentir raiva. Esta é uma tarefa para atores de
teatro ou cinema.
Em Biodanza, as emoções são induzidas de forma natural, a partir da música e de situa-
ções de encontro real.
Isto significa que o circuito entre expressão fisiológica e experiência subjetiva está per-
feitamente integrado e o processo pode iniciar-se a partir de ambos os extremos:
(Expressão subjetiva) ------------------------------------ (Expressão fisiológica)
Susana Bloch experimentou com atores estimulando voluntariamente o padrão efetor de
diversas emoções e registrou as respostas neurofisiológicas.
Apresentamos aqui um registro do ritmo cardíaco, do ritmo respiratório e um eletromio-
grama. O eletromiograma registrou os níveis de tensão nos músculos orbiculares, masséter,
braquio-radiais, retos abdominais e quadriceps femurais.

14
ESTUDOS ANTROPOLÓGICOS
Há um século, Charles Darwin, em sua obra “A expressão das emoções no homem e nos
animais”, sustentava que a expressão facial das emoções é universal.
Seus adversários afirmavam, por outro lado, que as expressões do rosto são moduladas
pela cultura.
Recentes investigações experimentais permitiram comprovar que nas sociedades oci-
dentais e na sociedade da Nova-Guiné, os homens expressam e percebem as emoções da
mesma maneira. Estes estudos tendem a demonstrar que as expressões faciais das emoções
são inatas.
Cucelogiu utilizou desenhos estilizados das expressões faciais combinando diversos ti-
pos de sobrancelhas, de olhos e de bocas.
Certas emoções complexas são, sem dúvida, difíceis ou impossíveis de serem identifi-
cadas desde um ponto de vista anatômico.

In: E.C.Dickey & F.H. Knower, Amer. J. Sociol. 47, 190, 1941.

15
MOSTRA ESQUEMÁTICA DE ROSTOS INTEGRADOS E DISSOCIADOS

16
NEUROFISIOLOGIA E PSICOLOGIA DAS EMOÇÕES
A Dra. Susana Bloch definiu a emoção como um estado funcional do organismo que
implica uma ativação fisiológica (reações neuromusculares, posturais e faciais) e uma experi-
ência subjetiva (a emoção).
As chamadas emoções fundamentais se encontram presentes nos animais superiores e
no homem desde a etapa pós-natal.
Bloch e Santibañez analisaram os modelos efetores de 6 emoções fundamentais:
1 - Alegria (riso)
2 - Tristeza (pranto, tristeza, depressão)
3 - Medo (angústia, terror, pânico)
4 - Erotismo (sensualidade, sexualidade)
5 - Ternura (amor maternal / paternal, amor fraternal)
Bloch e Guido (1950) registraram as variações fisiológicas que se produzem durante di-
versas emoções, tais como:
* ritmo cardíaco,
* ritmo respiratório,
* pressão arterial,
* eletromiograma.
Concluíram que existe, para cada emoção, um componente expressivo diretamente co-
municável de órgãos efetores e que são visíveis para o observador, e um componente subjeti-
vo (emocional) que somente pode comunicar-se através da linguagem.

Esquema sistemático de quatro emoções básicas e suas relações


com respostas comportamentais (Susana Bloch).

17
PSICOLOGIA DAS EMOÇÕES
As emoções foram estudadas desde um ponto de vista psicológico através de testes e lis-
tas de palavras que descrevem estados internos. Estas provas dão uma descrição subjetiva das
emoções.
É possível estabelecer uma correlação entre emoções, comportamento e expressão fun-
cional.
Três linguagens utilizadas para descrever estados emocionais:

Linguagem Subjetiva Linguagem Comportamental Linguagem Funcional


Medo, terror Retirar-se, fugir Proteção
Raiva, fúria Atacar, luta Destruição
Alegria, êxtase Possuir Reprodução
Tristeza, desafogo Perda, chorar de dor Reintegração
Aceitação, conter Ingerir Incorporação
Repugnância Vomitar, defecar Expulsão
Vigilância, expectativas Sentir, contatar Exploração
Surpresas, espanto Parar, alertar Orientação

Desde o ponto de vista psicológico, deve-se diferenciar entre “emoções básicas” e ou-
tros estados emocionais.
A teoria das emoções básicas foi proposta por J. P. Scotott, em 1958. As emoções bási-
cas seriam respostas adaptativas que se encontram em todos os níveis filogenéticos, seja na
mosca ou no elefante.
Exemplos destas respostas são:
 função de ingestão
 luta e fuga
 função de alimentação
 investigação, exploração
Em uma investigação de Paul Ekuran, realizada com estudantes de cinco países, estes
deviam interpretar a emoção expressada por rostos fotografados. A experiência se realizou a
partir de trinta fotografias, das quais somente reproduzimos seis como exemplo. Os resultados
globais que acompanham as fotos demonstraram que as porcentagens de concordância eram
muito elevadas.
Estudantes de diferentes culturas identificam da mesma forma uma mímica facial que
reflete uma emoção determinada. Sem dúvida, este resultado não permite por si só afirmar
que a expressão facial das emoções é universal, já que os indivíduos consultados pertencem
todos a culturas nas quais, através dos meios de comunicação, puderam aprender a dar um
significado comum à expressão facial das diferentes emoções.

18
EXPRESSÃO DAS EMOÇÕES EM PSICOTERAPIA
O mundo das emoções é o menos conhecido pela Psicoterapia e o melhor explorado pe-
la literatura e pela poesia.
Aqueles que trabalham com emoções em Psicoterapia, deveriam conhecer mais a Dos-
toievski, Kafka ou Virginia Wolf.
As emoções se dão sempre como conjuntos, plenos de matizes, e não como categorias
isoladas da nosologia Psicológica.
Algumas técnicas psicoterapêuticas empregam o método de “expressão de emoções”
baseadas na hipótese de que as emoções que não são tiradas para fora buscam caminhos insi-
diosos e se manifestam, cedo ou tarde, em forma patológica.
Freud postulou que a repressão sistemática dos impulsos sexuais origina neurose.
Margolin afirma que toda emoção que não se expressa se acumula nos órgãos e termina
por gerar transtornos funcionais.
A Análise Transacional oferece, às vezes, “Maratonas de Emoções”, nas quais se dari-
am as possibilidades de expressão da “criança livre”, permitindo a análise do argumento vital.
Em Psicodrama, as emoções reprimidas se expressam em diálogo com o “eu auxiliar”.
A dinâmica das emoções surgidas em situações “como se”, são logo interpretadas de maneira
que o enfermo aprenda a reagir melhor no futuro.
Alguns exercícios de Terapias de Grupo consistem em expressar intensamente raiva e
frustração dando golpes sobre uma almofada, insultando os membros do grupo ou quebrando
objetos contra um muro.
A hipótese consiste em que descarregar as emoções reprimidas teria um efeito terapêuti-
co. Isto não é exatamente assim. Só se produz um alivio temporal da tensão.
Entre as emoções positivas que Biodanza reforça podemos nomear as seguintes:
 Alegria
 Desejo sexual
 Afeto fraternal
 Bondade
 Segurança em si mesmo
 Plenitude
 Serenidade feliz
 Amor
Muito mais importante que a expressão de emoções como desafogo, é a expressão ade-
quada e sincera de emoções, a coerência da expressividade.
Entretanto, o enfermo não possui essa coerência expressiva. Sua expressão está dissoci-
ada. Pode ter olhar triste e estar sorrindo, ou mesmo manifestar o medo nos olhos e uma falsa
segurança nos lábios apertados.
Uma das dissociações mais frequentes é a do rosto em relação ao resto do corpo. Um
indivíduo pode mostrar sensualidade nos movimentos corporais e indiferença no rosto (caso
típico na histeria).
A dissociação da expressividade representa sempre diversos graus de patologia. A inte-
gração expressiva do rosto e do corpo são sinais de saúde.
Nas páginas seguintes apresentamos uma mostra esquemática de rostos “integrados“ e
“dissociados”.
Sem dúvida, o indivíduo saudável expressa com espontaneidade suas emoções frente a
circunstâncias concretas, enquanto o enfermo as freia, as dissimula, ou as oculta, ou mesmo as
descarrega sobre vítimas inocentes. O saudável seria então que os indivíduos tivessem a es-

19
pontaneidade e sinceridade necessárias para reagir com as emoções adequadas a cada situa-
ção.
A tristeza pode surgir durante os exercícios, quando diminuem as defesas ao se
relaxarem as zonas tensas do corpo. Os exercícios de sensibilização facilitam, às vezes, a
manifestação do pranto. Em Biodanza não se “reprime” o pranto, mas tampouco se estimula.
Quando surge espontaneamente em algum aluno, ele é abraçado, “lhe damos” continente em
silêncio. Depois de fluir a emoção através do pranto, o aluno se sente aliviado. O importante é
que no momento da tristeza, sua identidade desolada encontre regaço, acolhimento.
Biodanza trabalha no reforço de emoções positivas e na expressão coerente delas em re-
lação a circunstancias reais.
A tristeza é apaziguada no abraço.
A agressividade é descarregada na criatividade vital.
O desenvolvimento da espontaneidade afetiva e erótica não permite a acumulação de
tensões, produtos da repressão e o ressentimento.
Com a criatividade pode dar-se curso a uma agressividade que gera harmonia.
As emoções podem expressar-se através de caminhos saudáveis ou patológicos.
Mas, estimular a produção global de emoções em situações artificiais e irreais, tais co-
mo insultar a um “eu auxiliar” ou golpear um almofada para descarregar a raiva que se tem
contra alguém, resulta em uma ficção, uma ação teatral que se desenvolve dentro do campo da
fantasia. Este tipo de desafogo e “expressão” de emoções é absurdamente condutiva, mas não
possui a vitalidade e organicidade das ações integradas a situações reais. Segundo entendo, es-
tes exercícios somente reforçariam a capacidade de expressão de emoções em situações fictí-
cias.
Charles Darwin, em sua obra “A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais”,
observa que toda emoção que se expressa reiteradamente, se reforça. Aqui se cumpririam as
leis do reforço da aprendizagem aplicado ao mundo emocional. Uma pessoa que expressa
com frequência a raiva, se desafoga temporariamente, mas se torna cada vez mais raivosa.
A aprendizagem não só se cumpre a nível cognitivo. Existe aprendizagem dos afetos e
sentimentos e também aprendizagem visceral.
Assim como se aprende a raiva, o medo, a agressividade, a tendência à depressão, pode
aprender-se também o altruísmo, o erotismo, a bondade.
Expressar as emoções não é liberar-se delas, mas sim manifestá-las de forma adequada.
Em Biodanza reforçamos, em situações reais, a produção de emoções saudáveis de ple-
nitude e afeto.

MODELO MULTIDIMENCIONAL DAS EMOÇÕES


DE ROBERT PLUTCHIK
Cada seção do cone de emoções representa uma emoção básica ou primária diferente. A
dimensão vertical representa a intensidade da emoção. O círculo reflete os graus de semelhan-
ça que guardam entre si.
As emoções podem ser aproximadamente descritas através do “relatório pessoal” ou a-
través das respostas a questionários do tipo: “Tenho medo a enlouquecer”, “Tenho muita raiva
guardada”, etc. A escala de ansiedade de Hamilton permite também descrever estados emo-
cionais, sobretudo de angústia.
Cada uma destas respostas comportamentais tem um padrão fisiológico. Assim, por e-
xemplo, o aumento do ritmo cardíaco e da pressão sanguínea facilita o comportamento de luta
e fuga, levando mais irrigação aos músculos.
As respostas emocionais frente aos estímulos são avaliadas pelo organismo; se são boas
induzem aproximação, se são negativas, afastamento.

20
Tipos de respostas emocionais possíveis
Exploração
Aproximação Orientação
Alimento
Estímulo agradável
Luta
Evento desagradável Corrida
 Afastamento Pedido de ajuda
Vômito

A EXPRESSÃO DE EMOÇÕES PELO PRANTO


Ocasionalmente, o aluno de Biodanza pode começar a chorar durante algum exercício,
em especial durante a Regressão ao Estado de Infância, as posições Geratrizes de Maternidade
e Intimidade, acariciamento durante o Grupo Compacto, depois dos exercícios de Transe,
Canto do Nome, Canto interior e outros.
Nestes casos, trata-se sempre da liberação de emoções reprimidas, ao suprimir-se a ação
frenadora do córtex. Estes prantos, sem dúvida, têm distintos matizes:
a) Pranto produzido por revivescência triste: lembrança de uma separação amorosa,
etc.).
b) Pranto de beatitude: a emoção de amor e de beleza pode ser tão forte que as lágrimas
começam a fluir docemente pelo rosto.
c) Pranto histérico: que surge com dificuldade e logo se libera convulsivamente. Sua
principal motivação é chamar a atenção e pedir carícias exclusivas.
d) Pranto primal: É um pranto que surge de uma zona profunda, antiga e desconhecida e
que se dá com soluços muito sinceros. Este pranto não tem uma causa consciente
nem se baseia em uma lembrança triste.

21
Eventualmente este pranto pode levar a uma espécie de “insight” existencial:
 “Tenho vivido muito só. De agora em diante me darei mais às pessoas”.
 “Nunca tive confiança em mim mesmo, mas agora já sei que dentro de mim há amor”
 “Nunca havia sentido que as pessoas eram tão lindas”
Em todos os casos, os companheiros de grupo devem dar continente á pessoa, através do
abraço fraternal, sem reprimir, por nenhum motivo, o curso de seu pranto. Pelo contrário, lhe
dando a entender que pode chorar, que isto lhe fará bem e que se sentirá aliviada. No caso de
choro histérico (pranto que se prolonga indefinidamente, com altos e baixos), sucessivos
companheiros lhe dão abraços curtos, em posição de pé, e se procura reforçar sua identidade
com músicas ativadoras.

SORRISO VERDADEIRO E SORRISO FALSO

Roger Perry e colaboradores reconheceram que as lesões do sistema límbico debilitam o


processamento das emoções primárias, enquanto a lesão das capas corticais pré-frontais com-
promete a elaboração da expressão motora das emoções.
O controle motor de um movimento emocional não está localizado na mesma região que
o controle do ato voluntário.
Antonio R. Damásio, em seu livro “O Erro de Descartes”, expressa que a atividade neu-
rológica relativa às emoções dispara em regiões diferentes do cérebro, embora o proscênio do
gesto/rosto/musculatura seja o mesmo.
O mecanismo neural para o controle da musculatura facial no verdadeiro sorriso de uma
situação emocional (acima) é diferente do mecanismo para o controle voluntário (não emo-
cional) da mesma musculatura.
O sorriso verdadeiro é controlado a partir das capas corticais límbicas e provavelmente
utiliza os gânglios basais para expressar-se (A. R. Damásio). O primeiro que observou a dife-
rença entre emoções genuínas ou imitadas foi Charles Darwin em “A expressão das emoções
no homem e nos animais (1872)”.

22
Guillaume Benjamin Duchenne observou a diferença entre o sorriso real e o falso sorri-
so (com um controle voluntário da musculatura facial).
Duchenne determinou que o sorriso real requeria a contração involuntária e combinada
de dois músculos, o zigomático maior e o orbicular palpebral inferior (Figura abaixo).

Descobriu ainda que o orbicular palpebral inferior só podia se mover involuntariamente


e não havia maneira de ativá-lo voluntariamente.
Os ativadores involuntários do orbicular palpebral inferior, dizia Duchenne, eram as do-
ces emoções da alma. Por outro lado, o zigomático maior pode ser ativado por nossa vontade
ou involuntariamente e é, então, o meio adequado para sorrisos de cortesia.

RESPOSTAS PSICOSSOMÁTICAS ÀS EMOÇÕES


As emoções estão intimamente vinculadas com o funcionamento dos órgãos.
Eis aqui três exemplos que ilustram a relação entre o ritmo cardíaco e as emoções.

Ritmo cardíaco de uma


pessoa normal durante12
horas registrado por meio
de Holter. O ritmo médio
é de 72 pulsações por mi-
nuto.

23
Ritmo cardíaco de um cantor
submetido ao estresse do pal-
co cênico. O ritmo sobe a 150
bpm durante o espetáculo, en-
tre 21 e 22 horas.

* A adrenalina estimula o miocárdio e aumenta o rendimento do coração.


* A noradrenalina não atua diretamente sobre o coração, mas induz vasoconstrição das arté-
rias e aumento da pressão arterial.
A acetilcolina induz vasodilatação das artérias e diminuição da pressão arterial

Ritmo cardíaco de um piloto


de avião. O ritmo sobe a 184
bpm durante três atos acrobá-
ticos, devido à emoção e ao
esforço físico.

As emoções modificam permanentemente os umbrais de resposta neuroendócrina no hi-


potálamo cerebral. Assim, o medo, a raiva, a alegria, o desejo sexual, a vivência de êxtase,
provocam mudanças nas taxas de hormônios e neurotransmissores que, por sua vez, influem
sobre a atividade dos órgãos.
Assim, por exemplo, uma caricia recebida pode elevar temporariamente os níveis de
hormônios gonadotrópicos e ativar o sistema simpático-adrenérgico, o que é acompanhado,
entre outras coisas, de excitação e aceleração das batidas do coração.
Mac Lean e Papez estabeleceram que o sistema límbico é o principal centro regulador
do funcionamento víscero-emocional.
Existem ligações anatômicas entre o tálamo e hipotálamo que formam um verdadeiro
“cérebro interno” de emoções.

CENTROS CEREBRAIS DAS EMOÇÕES


As emoções são o resultado de uma elaboração complexa de mensagens nervosas. A in-
vestigação, através de estimulação intracraniana, demonstrou que existem centros diferencia-
dos para distintas emoções. (Ver figura da página seguinte).

24
EFEITO DAS EMOÇÕES SOBRE A SAÚDE
Vários investigadores demonstraram que as emoções podem ter efeitos sobre a saúde e
produzir enfermidades orgânicas.
Estas investigações resultaram nas Medições Psicossomáticas que tratam das enfermi-
dades de origem emocional tais como a hipertensão arterial, a asma ou as enfermidades auto-
imunes como a artrite.
A raiva reprimida, o medo irônico, a perda afetiva, a carência de amor podem afetar
gravemente os órgãos.

No gráfico se destacam centros diferenciados de raiva, felicidade, ansiedade e medo.


Os centros de sensações prazerosas atuam pela liberação do neurotransmissor Dopamina

Victor Von Weizsaker estabeleceu o caminho que vai da emoção patológica até a lesão
orgânica. Em Biodanza se busca fazer um caminho diferente: a partir da emoção feliz até a
cura.
As emoções que não se expressam, se acumulam nos órgãos vitais. Muitas pessoas são
incapazes de expressar a alegria, a raiva, a tristeza, o erotismo ou a ternura. As emoções re-
primidas de forma crônica terminam por atacar o sistema neurovegetativo e as defesas imuni-
tárias.
Um modo saudável de manter o equilíbrio interno e estabelecer uma relação coerente
com o mundo externo consiste em aprender a expressar as próprias emoções.

25
EMOÇÃO E ENFERMIDADES PSICOSSOMÁTICAS
Hayer, Dumbar, Alexander e outros observaram uma alta correlação entre certas emo-
ções e algumas enfermidades psicossomáticas. Nestas enfermidades influem também fatores
ambientais.

Enfermidade Emoções Efeitos terapêuticos


Psicossomática predominantes através de Biodanza

Colitis Ulcerosa e di- Esforços sem esperança de Desafio de “caminhar pela vida”.
arreias psicógenas realização. Medo de caminhar Exercícios de expressão da identidade.
pela vida. Desespero.

Asma Dependência, submissão. Exercícios euforizantes de mediana in-


Falta de continente afetivo de tensidade
parte de pessoas significati- Exercícios da linha de afetividade (re-
vas. Repressão do pranto na ceber continente)
criança. Dificuldade de co- Diálogo íntimo evocando os genitores
municar a intimidade.

Hipertensão Inibição da raiva. Todos os exercícios de Regressão


Hostilidade reprimida. Exercícios de expressão da raiva
Medo de ser rechaçado. Exercícios de sexualidade

Artrite reumatoide Ênfase na expressão de emo- Danças de expressão de emoções por


ções por via muscular e re- via muscular.
pressão rígida de tais impul- Danças Yin.
sos.

Neurodermatite Necessidade de contato Encontros e Acariciamento


físico
Hipertiroidismos Temor básico pela sobrevi- Exercício de expressão da identidade.
vência, necessidade de de-
pendência.

Conjuntos de Emoções que podem atuar especificamente


sobre o sistema cardiocirculatório.
Pauta de Exame Psicológico (Rolando Toro).

26
Estresse Emocional Autorregulação afetiva

Depressão Alegria
Perda afetiva Fortes estímulos para viver
Carência ou frustração sexual Relações de amor ou amizade
Fracasso profissional Êxito profissional
Separação amorosa Plenitude sexual
Sofrimento
Decepção

Medo Serenidade
Angústia Paz interior
Ansiedade Segurança
Pânico Confiança em si mesmo
Insegurança

Raiva Afeto
Hostilidade reprimida Amor
Ressentimento Simpatia
Ciúmes Confiança na pessoa amada
Ódio Ternura

Opressão Liberação
Repressão de emoções Expressão das emoções
Autorrepressão Criatividade
Humilhação Autoestima
Sentimento de impotência

CONSIDERAÇÕES ANTROPOLÓGICAS SOBRE


A AGRESSIVIDADE E A VIOLÊNCIA
Agressividade e Violência

A agressividade é um instinto.
A violência é uma enfermidade mental.
A agressividade está vinculada aos instintos de conservação e luta pela sobrevivência. A
conduta agressiva permite superar os obstáculos e construir um mundo cultural em meio às di-
ficuldades.
A violência, por outro lado, é uma perversão do instinto agressivo e do instinto territori-
al. A violência é uma enfermidade da identidade, a expressão do medo da diversidade. Esta
perversão deu lugar aos regimes totalitários, ao racismo e às lutas étnicas e religiosas.

27
Antecedentes Paleo-Antropológicos

A investigação antropológica aporta algumas hipóteses acerca da pergunta fundamental:


É a agressividade uma condição inerente ao ser humano?
Foi levantada a hipótese de que o Homem descenderia de uma espécie predatória. O
mais antigo hominídeo que se pode supor como ancestral do Homem é o Ramapithecus, que
vivia na Índia há cerca de 14 milhões de anos. De acordo com o estudo de suas mandíbulas,
mais parecidas com as do Homem do que com as dos chimpanzés, não se pode supor que te-
nha sido um animal predatório. Os fósseis hominídeos mais primitivos depois do Ramapithe-
cus são os Australopithecus robustus e o mais avançado, o Australopithecus africanus, que
viveu há cerca de 2 milhões de anos. A maioria dos paleontólogos opina que os Australopi-
thecus eram homicidas, mas Simons (1965), por exemplo, acredita que o africanus pode ser
considerado como a primeira aparição do Homem. Os pesquisadores concordam em que este
era um animal onívoro, que comia pequenos répteis, pássaros ou roedores, raízes e frutas, mas
que não era um caçador. A técnica da caça apareceu na Ásia, uns 500 mil anos A.C.
Em resumo, os Australopithecus, embora fossem carnívoros, não eram animais predado-
res devido à ausência de um equipamento instintivo e morfológico como o que caracteriza os
predadores carnívoros como o leão ou o lobo. Não obstante, alguns importantes paleontólogos
como D. Freeman, identificam o Australopithecus como o Adão paleontológico, que cometeu
o pecado original da destrutividade, sendo uma “adaptação carnívora” com predileções preda-
tórias, assassinas e canibalescas.
Desta maneira, a Paleo-antropologia propõe uma base filogenética para a conclusão so-
bre a agressão humana como uma adaptação predatória conseguida pelos carnívoros Austra-
lopithecus do sul da África, no pleistoceno inferior.
Erik Fromm e Julian Huxley afirmam o fato, aceito hoje amplamente, de que uma dieta
vegetal ou de carne não está relacionada com a agressividade.
Neste momento, grande quantidade de antropólogos afirma que não se pode responsabi-
lizar a agressividade humana aos ancestrais do Homem.
A pergunta poderia centrar-se na Biologia para determinar se existe um gene predatório
na raça humana.
Os estudos antropológicos sustentam que a motivação do caçador primitivo não era o
prazer do ato de caçar, mas sim a realização, em um nível adequado, de suas “perícias”, isto é,
o desenvolvimento do próprio Homem.

Antecedentes Etológicos.

Sociedades Hedônicas e Sociedades Agonistas entre os Primatas


Michael Chance, um dos etólogos mais relevantes de nossa época, observou as socieda-
des de macacos, entre outros os macacos japoneses rhesus e javanês e, por outra parte, os gru-
pos de grandes símios, como o chimpanzé e o gorila.
Os grandes símios constituem hierarquias fechadas, enquanto os macacos vivem em
campo aberto.
Chance classifica dois tipos de sociedades observadas entre os primatas:

A.- Sociedade agonística.


Agonismo é um termo utilizado para descrever uma tensão que intervém entre fuga e
evitação (esquivamento) ou entre fuga e agressão em uma sociedade cujos membros devem
permanecer todos juntos para beneficiar-se com a proteção do macho dominante, quando este
mesmo é fonte de ameaça.
Tal estado de coisas gera nestes animais uma tensão que comanda os movimentos de
avanço e retrocesso frente ao macho, o que exerce um efeito de ativação sobre os símios.

28
B.- Sociedade hedônica.
Chance denominou modo hedônico (e não hedonista) ao dos grandes chimpanzés, que
se caracteriza por um comportamento extremamente sensível de contato: beijar, tocar, tocar a
mão, apertar a mão, abraçar, o que não acontece em a sociedade agonística.
A maioria dos animais que vivem de maneira agonística são separados uns dos outros,
sendo a agressão feita através de ameaça; e todas as reações à ameaça se fazem à distância.
No modo agonístico, a ativação está sob o controle do córtex (vigilância). No modo he-
dônico, as relações estão controladas pelo contato. O contato constante tranquiliza e impede o
aumento da excitação. As relações sociais estão ligadas a uma recíproca atenção e cuidado.
Com seus movimentos, parecem dizer que eles estão de acordo.
Em resumo, as sociedades agonísticas de macacos se caracterizam por uma estrutura fe-
chada, rígida, de permanente vigilância, baseada no perigo que representa o macho mais forte,
e as relações são à distância. Os fenômenos de agressão e fuga caracterizam a permanente
tensão dentro desta sociedade.
A sociedade hedônica, dos grandes primatas como o chimpanzé, se caracteriza por uma
relação sensível, de contato e comunhão de objetivos.

Aspectos Fisiológicos

Existe um centro fisiológico da agressão?


Alguns investigadores, como Hess e José Delgado, sugeriram que os impulsos agressi-
vos são controlados por diferentes áreas neurais no cérebro. Foi demonstrado, por exemplo,
que a reação de ódio e seu padrão correspondente de comportamento agressivo, poderiam ser
ativados pela estimulação elétrica direta de:
* a amígdala
* o hipotálamo lateral
* alguns pontos do mesencéfalo e da matéria cinzenta central
E que a mesma poderia ser inibida estimulando-se outras estruturas como:
* o septo
* a circunvolução do cíngulo e
* o núcleo caudal.
Foi estabelecida uma dupla conexão entre essas áreas específicas. Foi possível desenca-
dear comportamento intensamente agressivo por estimulação dos centros inibidores.
Arnold, em 1945, demonstrou a possibilidade de uma base fisiológica da expressão e-
mocional de raiva.

RAIVA: Movimentos corporais tensos


Voz tonante
Vasoconstrição
Midríase (dilatação da pupila)
Espasmo intestinal
Taquipnéia
Taquicardia
Inibição dos reflexos sexuais
Contração vesical
Boca seca
Suores e
Hiperglicemia.

29
Papez demonstrou a importância dos mecanismos hipotalâmicos nas reações de raiva e
formulou que a expressão depende (???) tálamo. Sugeriu, além disso, que a expressão e a ex-
periência emocional são fenômenos que podem se dar de forma dissociada e que a experiência
subjetiva da emoção requer a participação do córtex.
Em resumo, o hipotálamo é o mecanismo efetor da pressão emocional, mas somente o
córtex cerebral permite a experiência afetiva de medo, de raiva, de amor, combinando-as com
estados sensoriais.
Não podemos, na atualidade, pensar na emoção de raiva e no seu padrão de comporta-
mento agressivo, sem relacioná-la com outras duas emoções fundamentais: o medo e o amor.
O medo tem um padrão de comportamento de fuga, evitação ou imobilidade, e o amor, incluí-
do no instinto sexual, tem como padrão de comportamento a carícia e o contato.
Existem algumas evidências de que o medo depende mais da secreção de adrenalina e a
raiva, de noradrenalina.
Estudos feitos por Ax, em 1959, revelaram esta diferença bioquímica. Em ambos os ca-
sos, ocorre hipertensão, mas os mecanismos neuroendócrino da raiva e do medo são diferen-
tes.
Funkenstein observou uma correlação entre adrenalina, medo, passividade e depressão
por um lado, e noradrenalina, raiva e atividade, por outro, e que esta correlação se estende a-
través das espécies. Demonstrou que a medula suprarrenal de espécies agressivas, como o le-
ão, contém concentrações relativamente altas de noradrenalina, enquanto que espécies menos
agressivas, como o coelho ou o babuíno, tendem a ter mais adrenalina na corrente sanguínea.
A distribuição do sangue nestes dois estados, de agressão e medo, é também diferente.
Recordemos o rosto vermelho, de raiva, e o rosto pálido, de medo. No estômago se observam
dois padrões, também diferenciais opostos de reação, sob condições emocionais diferentes:
a) Padrão de função crescente, com aumento de reserva sanguínea, de secreção de ácido
clorídrico, de atividade dos músculos estomacais e enrubescimento da mucosa. Com a raiva,
não só o rosto se torna vermelho, mas também a mucosa.
b) Padrão de função decrescente, em que a mucosa perde sua cor, conforme o sangue se
retira, e tanto a secreção de ácido quanto a atividade muscular sofre redução.
Existe um paralelo entre essas reações e as observadas no resto do corpo. A depressão e
o medo são, à primeira vista, emoções qualitativamente bem diferentes. Mas têm em comum o
padrão de resposta passiva, contrastando com o padrão de resposta mais intensa da raiva.
O sistema nervoso simpático e a medula da suprarrenal são os órgãos realizadores da re-
ação de emergência de Canon.
A síndrome geral de adaptação, de Hans Selye, está vinculada com a aprendizagem de
fuga e de resposta de estresse.
Hess polariza duas funções orgânicas antagônicas:
a) Função ergotrópica, que põe o organismo em condições de agredir e defender-se do
meio exterior.
b) Função trofotrópica, que põe o organismo em um estado de harmonia e tranquilidade,
para reparar os desgastes produzidos pelo estresse e a luta.
A investigação atual neuroendócrina estabeleceu sensacionais conexões entre as emo-
ções de raiva, medo e amor.
Foi, também, descrita uma oposição fundamental entre resposta ao estresse e compor-
tamento sexual. Existe um antagonismo entre respostas de estresse e comportamento sexual, e
restauração dos tecidos danificados e combate à infecção.
Richter realizou um extenso estudo sobre o antagonismo medo e sexo. Ao comparar ra-
tos da Noruega domesticados com ratos selvagens, demonstrou que o rato domesticado é me-
nos agressivo para com o ser humano e para com sua própria espécie. Mas, também se obser-
vou a diferença em uma profunda alteração no sistema neuroendócrino do rato domesticado.
A importância e a eficiência das glândulas suprarrenais diminuíram consideravelmente
nos ratos domesticados e muitas de suas funções foram assumidas pelas glândulas sexuais.

30
Havia uma diferença de um oitavo no peso das glândulas suprarrenais em relação ao dos ratos
selvagens.
Outra experiência demonstrou a transferência da função das suprarrenais para as gôna-
das no rato domesticado; este tem relações sexuais em qualquer época do ano enquanto o rato
selvagem só tem na primavera e no outono. As fêmeas do rato selvagem eram férteis em todas
as épocas e idades.
Anderson (1938) investigou a resposta de medo em relação com o comportamento se-
xual de ratos medindo a defecação emocional. Chegou à conclusão que, quanto mais ame-
drontado está o rato macho, menos potente em seu comportamento sexual. Na fêmea se evi-
denciou a mesma correlação. Portanto, existe um antagonismo fundamental tanto no compor-
tamento quanto no sistema neuroendócrino, entre o medo (ou, de modo mais geral, compor-
tamento induzido por estresse) e as funções sexuais. Este antagonismo se apresenta por igual
em machos e fêmeas.
Como responder à violência?
Em Biodanza se trabalha em feedback. Se, se recebe amor, se responde com amor. Se,
se recebe violência, se devolve a agressão. Se a força que está contra é muito forte, é necessá-
rio escapar (como os animais, que reagem com os instintos de luta e fuga).
O comportamento de “oferecer a outra face” resultou ineficaz.
Eis aqui, como referencial, o poema de Eduardo Alves Costa:

“Um passeio com Maiakovski”

“Na primeira noite, Até que um dia,


eles se aproximam o mais frágil deles
e colhem uma flor entra sozinho em nossa casa,
e não dizemos nada. nos rouba a lua
Na segunda noite e, conhecendo nosso medo,
já não se escondem: nos arranca a voz da garganta.
pisam as flores, E porque não dissemos nada,
matam nosso cachorro já não podemos dizer nada.”
e não dizemos nada.

Se não há reação o agressor, em vez de permanecer tranquilo, insiste em suas agressões.


São necessários coragem e risco existencial para agir de forma adequada.
A agressão no neurótico é a transformação da libido frustrada. Quando a tendência amo-
rosa não pode se realizar, o Eros torturado toma caminhos patológicos e se transforma em
destrutividade. Eros se transforma em Tanatos (Freud).

REFLEXÕES SOBRE EMOÇÕES E ECOLOGIA

Quando Gregory Bateson formulou, pela primeira vez, o conceito de Ecologia da Men-
te, estava inaugurando, talvez sem sabê-lo, uma nova forma de pensamento para as ciências
humanas. O valor heurístico desta abordagem tem incalculável importância no desenvolvi-
mento dos modelos biológicos, psicológicos e terapêuticos.
Decidi desenvolver, com o maior rigor possível, essa abertura teórica.
Há dez anos, iniciei a investigação sobre a “família ecológica”.

31
Minha proposta é de que as relações humanas que têm um caráter de continuidade e fre-
quência íntima criam uma rede neuroendócrina devido à interação entre os membros do par
(casal).
Esta rede representa verdadeiras funções novas dentro do sistema vivo de cada um.
Poderíamos dizer que as pessoas que nós frequentamos se instalam em nossas células.
Esta é a razão pela qual a separação dos amantes é vivenciada como uma morte. Mas não se
trata apenas de uma morte psicológica, com fantasias autodestrutivas. No meu modo de ver, a
separação dos amantes é uma catástrofe biológica.
Investigações sobre a Psicologia do câncer revelam que uma alta porcentagem de pesso-
as descobre o aparecimento de seus sintomas no transcurso de dois ou três meses depois de
uma grave perda afetiva.
Hipoteticamente, podemos sugerir que a depressão é causada pela perda, cujas variáveis
bioquímicas, em especial sobre o metabolismo cerebral e o sistema imunológico, favorecem o
aparecimento dos focos cancerígenos.
É evidente que a perda influi de múltiplas maneiras, nos processos de autorregulação do
organismo, aumentando temporariamente a entropia do sistema.
Penso que o estresse emocional forte, produz turbulências nos circuitos de integração,
criando as possibilidades de mudança e, também, provocando certa instabilidade nos meca-
nismos reguladores.
Neste ponto de nossa meditação, desejo aventurar uma hipótese: o estresse emocional se
reflete em diferentes níveis de profundidade no organismo:
1º nível, é o psicológico.
2º nível, é o da motricidade (alteração do tônus)
3º nível, é o imunológico (alterações do Inconsciente Vital).

Detalhe da pintura “Guernica”, de Pablo Picasso, na qual expressa


o desespero durante o bombardeio daquela cidade espanhola.

32
EXPRESSÃO DE EMOÇÕES EM BIODANZA
A expressão de emoções em Biodanza é muito intensa.
Os exercícios induzem emoções de alegria, erotismo, ternura e estados de regressão, a-
través de danças integrativas e de comunhão com o grupo.

BIBLIOGRAFIA
Aspectos Antropológicos e Etológicos da Agressão.
CENTRO ROYAUMONT PARA UMA CIÊNCIA DE HOMEM - A Unidade do Homem.
Vol. Do primata ao Homem: continuidades e rupturas. São Paulo: Cultrix/EDUSP,
1978.
EIBL - EIBESFELDT, Irenaus - Amor y odio. B.Aires: Século Veintiuno. 2ª Ed., 1974.
EIBL - EIBESFELDT, Irenaus - El Hombre Preprogramado. Madrid: Alianza Universidad,
1977.
FROMM, Erick - Anatomia da Destrutividades Humana. S. Paulo: Zahar Edit.
GADAMER & VOGLER - Nova Antropologia. Vol.1. Antropologia Biológica.1. S.Paulo:
EPU/EDUSP, 1977.
GADAMER & VOGLER - Nova Antropologia. Vol.2. Antropologia Biológica. 2. S.Paulo:
EPU/EDUSP, 1977.
MARINO Jr., Raul - Filosiologia das Emoções. S.Paulo: Sarvier, 1975.

Medicina Psicossomática e Agressão


DARWIN, Charles - A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais.
GRAY, Jeffrey - A Psicologia do medo e do ”stress”. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 1976.

33
ROCHE: SCIENTIFIC SERVICE - From Emotion to Lesion. Lab. Roche. R.J. 1969.
WITTKOWER, Erick D. e Colaboradores - Progresos en Medicina Psicosomatica. Buenos
Aires: Eudeba, 1966.

Aspectos Psicológicos da Agressão.


HILGARD, Ernest R.; ATKINSON, Richard C. - Introdução à Psicologia. S.Paulo: Comp.
Edit. Nacional, 1976.
REUCHLIN, Maurice: Introdução à Psicologia. R. Janeiro: Zahar Edit., 1979.
WHITTAKER, James O. - Psicologia. R. Janeiro: Interamericana, 1976.

Aspectos Socio-Políticos da Agressão.


ADORNO, Theodore - A personalidad autoritaria.
ANÁLISE SHALOM - Holocausto. S. Paulo: Shalom, 1979.
ARENDT, Hannah - Crises da República. S.Paulo: Perspectiva, 1973.
ARENDT, Hannah - As Origens do Totalitarismo: Imperialismo, a expansão do poder.
R.Janeiro: Documentário, 1976.
BERKOWITZ, Leonard - Os efeitos da observação da violência. “ A Ciência Social num
Mundo em Crise”. Textos do Scientific American. S.Paulo: Perspectiva, 1973.
FOUCAULT, Michel - Microfisica do Poder. R.Janeiro: Graal, 1979.
RUTHERFORD, Ward - Genocidio. História Ilustrada da II Guerra Mundial. Tomo IV. R. de
Janeiro: Renes, 1976.

34

Você também pode gostar